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Processo nº 1007819-27.2024.4.01.3504

ID: 313825615

Tribunal: TRF1 Órgão: Juizado Especial Cível e Criminal da SSJ de Aparecida de Goiânia-GO Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1007819-27.2024.4.01.3504

Data de Disponibilização: 02/07/2025

Polo Ativo:

REGINA GONCALVES DA COSTA

Polo Passivo:

Sentença Tipo A

Advogados:

TAIS RODRIGUES DA SILVA MOURA

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Aparecida de Goiânia-GO Juizado Especial Cível e Criminal da SSJ de Aparecida de Goiânia-GO SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1007819-27.2024.4.01.35… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Aparecida de Goiânia-GO Juizado Especial Cível e Criminal da SSJ de Aparecida de Goiânia-GO SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1007819-27.2024.4.01.3504 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) POLO ATIVO: REGINA GONCALVES DA COSTA REPRESENTANTES POLO ATIVO: TAIS RODRIGUES DA SILVA MOURA - GO41841 POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS SENTENÇA Trata-se de demanda proposta por REGINA GONCALVES DA COSTA contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, por meio da qual pretende a concessão do benefício assistencial de prestação continuada a pessoa portadora de deficiência (LOAS). Fundamento e decido. O artigo 20 da Lei 8.742/1993 (LOAS) estatui que “o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família”. No caso da pessoa com deficiência, a lei exige a demonstração de uma deficiência importante e compatível com os dizeres normativos da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que possui status constitucional no Brasil, além da caracterização da situação de vulnerabilidade econômico-social. Segundo o §2º do art. 20 da Lei nº 8.742/93, considera-se deficiente a pessoa que “tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”. Note-se que nem todo impedimento físico ou psíquico equivale à deficiência no conceito jurídico. Com efeito, a lei exige a demonstração de uma deficiência em grau grave a ponto de impedir a participação plena da pessoa na vida em sociedade, considerando as barreiras impostas pelo meio em que vive, além da caracterização da situação de vulnerabilidade econômico-social. Cabe destacar a Súmula n. 48 da TNU, com sua nova redação: “para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, é imprescindível a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde a data do início sua caracterização”. O conceito de família para o cálculo da renda per capita, por sua vez, é definido no §1º do citado artigo, dispondo que, para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, além dos irmãos solteiros, filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. A Lei n. 14.176/2021, alterou a Lei n. 8.472/1993 (LOAS), a fim de estabelecer o critério de renda familiar per capita para acesso ao benefício de prestação continuada, estipulando parâmetros adicionais de caracterização da situação de miserabilidade e de vulnerabilidade social. Segundo o critério objetivo da lei, terão direito ao benefício financeiro de que trata o caput do art. 20, a pessoa com deficiência ou a pessoa idosa com renda familiar mensal per capita igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, podendo-se ampliar este limite para até 1/2 (meio) salário-mínimo. Nesta condição, deverão ser observados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e da situação de vulnerabilidade, a saber: Art. 20-B (...) I – o grau da deficiência; II – a dependência de terceiros para o desempenho de atividades básicas da vida diária; e III – o comprometimento do orçamento do núcleo familiar de que trata o § 3º do art. 20 desta Lei exclusivamente com gastos médicos, com tratamentos de saúde, com fraldas, com alimentos especiais e com medicamentos do idoso ou da pessoa com deficiência não disponibilizados gratuitamente pelo SUS, ou com serviços não prestados pelo SUS, desde que comprovadamente necessários à preservação da saúde e da vida. Ainda, conforme o art. 34, § único, da Lei n° 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) e o art. 20, §14, da LOAS, em sua redação atual: "O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família". Do caso concreto Para analisar o requisito deficiência da parte autora, foi realizada perícia médica judicial (ID 2178342582). Realizada a perícia médica judicial, a perita constatou que a parte autora, com 58 anos, apresenta impedimento de natureza física, decorrente de doença pulmonar obstrutiva crônica, hipertensão arterial, nefrolitíase, diabetes mellitus, hérnias discais lombares e ansiedade (CID: J44, I10, N20, E10, M54.9 eF41), apresentando dificuldades para deambular e realizar quaisquer esforços físicos com dispneia aos esforços. Informou, ainda, que o impedimento se iniciou em 2023 e é considerado de longo prazo. Restou comprovada, portanto, a deficiência. Realizada perícia socioeconômica (ID 2181859512), a perita assistente social informou que a parte autora reside só em casa alugada. A construção é de alvenaria, piso de cimento queimado, paredes apresentando desgaste natural com sinais de rachaduras e infiltrações, a cobertura é de telha cerâmica. A residência é composta por um quarto, sala, cozinha e banheiro, em estado de conservação ruim. O mobiliário é modesto, suscinto em estado de conservação ruim e características de ter sido adquirido ao longo do tempo. Colhe-se das fotos anexadas ao laudo que a construção não possui forro e não possui reboco na parte externa, bem como que o terreno é murado. O bairro é de classe média média com pavimentação asfáltica, energia, água encanada, iluminação pública precária, transporte público, coleta de resíduos, escola pública e comércio em geral. A rua em questão fica próximo à região central do setor. Não foi avistado policiamento durante a averiguação ao bairro e procura por endereço. Não há tratamento de esgoto, nem unidades de atendimento à saúde pública, as quais são localizadas em bairros afastados. No tocante à renda, consta no laudo que a parte autora já trabalhou, principalmente, como doméstica e diarista, mas retirou-se do trabalho informal após os problemas de saúde em 2023. Informou que, eventualmente, recebe uma cesta básica de uma amiga e que os filhos arcam com as despesas de consumo e o essencial para a sobrevivência, contudo, também enfrentam limitações econômicas e, frequentemente, entram em conflito quanto às despesas da autora. Foi informado, ainda, que a autora viveu em união estável por 29 anos, mas separou-se há dez anos, que não tem contato com o pai, que a mãe, com 85 anos, vive em Xambioá/TO, que possui três filhos: João Godoy Neto, 38 anos, solteiro, não soube informar a profissão e renda, residente no Setor Parque das Laranjeiras em Goiânia, com quem tem pouco contato; Cleiton Gonçalves Adriano, 34 anos, casado, trabalha em escritório com renda desconhecida, a esposa é do lar e residem em Santo Antônio do Descoberto/GO; e Régis Gonçalves Adriano, 30 anos, casado, pedreiro autônomo com renda desconhecida, a esposa trabalha em função administrativa com renda desconhecida, possuem um filho menor e residem em imóvel alugado no Setor Buriti Sereno em Aparecida de Goiânia. Foi declarado pela autora que não possui bens e direitos com valor destacado, tendo comprovado não ser proprietária de veículos (ID 2187515847). Quanto às despesas, foi dito que tem gasto de R$252,73 com energia (valor referente a dois imóveis localizados no terreno, a autora paga a metade), R$400,00 com moradia e R$320,00 com medicação. A alimentação e o transporte são custeados pelos filhos. No tocante à saúde, foi informado que a autora apresenta o quadro descrito na perícia médica judicial e que faz uso contínuo de medicação. Ao final do laudo, a perita concluiu que nota-se situação de miserabilidade. Com efeito, colhe-se dos autos, que a parte autora reside só, conforme informado no Cadnúnico (ID 2164003184) e tem sobrevivido do auxílio precário dos filhos e de terceiros. No tocante às condições de moradia, verifica-se que a parte autora reside em imóvel simples, em estado de conservação ruim, o que confirma o estado de miserabilidade alegado na inicial, portanto, impõe-se a concessão do benefício para conferir um patamar mínimo de dignidade à parte autora. Dos juros e da correção monetária Tendo em vista tratar-se de demanda contra a Fazenda Pública, aplique-se o índice oficial de remuneração da caderneta de poupança para o cálculo dos juros moratórios e o INPC para a correção monetária (art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 e art. 41-A da Lei n. 8.213/91, nos termos do REsp 1.492.221, julgado pela Primeira Seção do STJ em 22/02/2018, até 08/12/2021. A partir de 09/12/2021, inclusive em relação ao precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente (EC n. 113/21, art. 3º, publicada em 09/12/2021). DISPOSITIVO Com tais considerações, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, CPC, para o fim de condenar o INSS a conceder o benefício de amparo social ao portador de deficiência à parte autora, observados os seguintes parâmetros: Quadro-síntese de parâmetros Espécie: B87 CPF: 334.691.301-59 DIB: 05/08/2024 DIP: 01/06/2025 Cidade do pagamento: Aparecida de Goiânia/GO Condeno, ainda, o INSS a pagar as parcelas pretéritas, desde a DIB até a véspera da DIP, após o trânsito em julgado, por meio de RPV, descontando eventuais valores recebidos pelo autor sob o título de tutela antecipada, auxílio emergencial e/ou outros benefícios previdenciários inacumuláveis, com juros e correção nos termos acima. Diante do caráter alimentar do benefício e da cognição exauriente exercida, defiro a tutela de urgência para determinar a implantação do benefício no prazo máximo de 30 (trinta) dias úteis e partir da intimação acerca desta sentença, devendo o INSS comprovar o cumprimento desta decisão nos autos. Defiro o requerimento de gratuidade de justiça. Sem condenação em custas e honorários advocatícios, por força do art.55, da Lei nº 9.099/95. Havendo recurso(s) inominado(s), a Secretaria deverá intimar o recorrido para contrarrazões, e, em seguida, encaminhar o processo para a Turma Recursal, independentemente de juízo de admissibilidade. Se não houver recurso inominado, após o trânsito em julgado, intime-se o INSS para apresentar cálculos das parcelas pretéritas no prazo de 30 (trinta) dias úteis, dando-se vista à parte autora pelo prazo de 5 (cinco) dias úteis. Após, expeçam-se as RPVs. Efetuado o pagamento, arquivem-se. A presente sentença não afasta a prerrogativa de o INSS verificar, de tempos em tempos, a continuidade da deficiência e da condição de miserabilidade da parte autora, na medida em que a coisa julgada, em relações de trato sucessivo, está sujeita à cláusula rebus sic stantibus, devendo ceder em caso de alteração no quadro fático. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Goiânia/GO, data da assinatura eletrônica.

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José Carlos Gomes Junior x Eletropaulo Metropolitana Eletricidade De São Paulo S.A.

ID: 335156783

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Itapevi - 2ª Vara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1009107-77.2024.8.26.0271

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

JOSé CARLOS GOMES JUNIOR

Polo Passivo:

ELETROPAULO METROPOLITANA ELETRICIDADE DE SãO PAULO S.A.

Intimação

Advogados:

CAMILA DE NICOLA FELIX

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ANTONIO RODRIGO SANT ANA

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Processo 1009107-77.2024.8.26.0271 - Procedimento Comum Cível - Práticas Abusivas - José Carlos Gomes Junior - Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo S.A. - Vistos. JOSÉ CARLOS GOMES J… Processo 1009107-77.2024.8.26.0271 - Procedimento Comum Cível - Práticas Abusivas - José Carlos Gomes Junior - Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo S.A. - Vistos. JOSÉ CARLOS GOMES JUNIOR ajuizou uma AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS em face de ELETROPAULO METROPOLITANA ELETRICIDADE DE SÃO PAULO S.A.. Alegou a parte autora que reside na Rua dos Pernambucanos, nº 860, sendo consumidora dos serviços da ré e que no ano de 2023 recebeu uma fatura muito mais alta do que a média consumida e que devido a isso tentou entrar em contato administrativamente para solucionar o problema, sem êxito. Foi-lhe informado que a fatura alta estava sendo cobrada em detrimento das faturas anteriores que haviam sido cobradas por um consumo menor. A ré alegou que o consumo real entre o ano 2022 e 2023 foi de 7.969,000 kWh e que 6.852,100 KwH nunca haviam sido apurados, inscrevendo ainda o nome da parte autora no cadastro de inadimplentes. Apreensiva, a parte autora entrou em contato com a ré, sem êxito. A única alternativa concedida foi o parcelamento do montante em doze vezes. Com base em tais argumentos, requereu, preliminarmente: (i) justiça gratuita; (ii) antecipação dos efeitos da tutela provisória a fim de excluir o nome da parte autora nos órgãos de proteção de crédito. No mérito, requereu: (i) a exclusão da dívida no montante de R$ 2.386,43; (ii) confirmação da tutela provisória e exclusão definitiva dos apontamentos da ré; (iii) condenação da ré ao pagamento de R$ 65.600,00 (sessenta A decisão de fls. 67 deferiu a justiça gratuita e indeferiu a tutela de urgência. Citada, a ré apresentou contestação de fls. 73/94. Preliminarmente, alegou: (i) ausência de interesse de agir por falta de contato administrativo; (ii) que a presente lide se enquadra como demanda predatória; (iii) litigância de má-fé dos patronos da parte autora. No mérito, alegou que a parte autora possui um débito incontroverso junto a ré e que é obrigatório o parcelamento desse débito quando não há pagamento vigente. Defendeu ainda que é do direito da ré inscrever o nome da parte autora junto aos órgãos de proteção, posto que a mesma vem cumprindo com seu serviço, mas não recebeu sua contraprestação. Requereu, assim, improcedência total dos pedidos. Houve réplica (fls. 137/157). Instadas sobre a produção de provas (fls. 158), a parte autora pugnou pelo julgamento antecipado da lide (fls. 61/165), enquanto a parte ré quedou-se inerte. Este é o relatório. Fundamento e decido. O processo comporta julgamento no estado em que se encontra, consoante o disposto no art. 355, I, do CPC, uma vez que a questão é eminentemente de direito e, no que se refere aos fatos, já estão devidamente comprovados nos autos com os documentos que foram juntados pelas partes. Primeiramente, afasto a preliminar de falta de interesse de agir, eis que ainda que não tenha a parte autora entrado em contato com a ré anteriormente ao ajuizamento da presente ação, não há condicionamento ao prévio exaurimento da via administrativa para a formulação de pedido judicial. Além disso, a mera apresentação de contestação demonstra, por si só, resistência ao pedido inicial, o que basta para justificar o ajuizamento da demanda. Outrossim, afasto a alegação referente à litigância predatória, uma vez que não restou demonstrada sua ocorrência no presente processo. Caso assim entenda pertinente, poderá a parte ré diligenciar diretamente aos órgãos de fiscalização administrativos que julgar oportunos, sem a necessidade de ingerência deste Juízo para tanto. Não havendo outras preliminares ou prejudiciais a apreciar, passo a analisar o mérito dos pedidos. O pedido é parcialmente procedente. A relação entre as partes classifica-se como de consumo, uma vez que o polo ativo se enquadra no conceito de consumidor e o polo passivo no de fornecedor, à luz dos arts. 2º e 3º do CDC. Tratando-se de relação consumerista, é possível a aplicação da inversão do ônus probatório às alegações formuladas pelas partes, conforme o art. 6º,VIII do CDC, desde que verossímeis ou que seja hipossuficiente o autor dessas alegações. No caso vertente, contudo, sequer é necessário recorrer à inversão, considerando que incumbia à ré, nos termos do art. 14, §3º, fazer prova da ausência de falha na prestação dos serviços. Vale destacar que a controvérsia cinge-se à (in)validade da cobrança retroativa das mensalidades entre o ano de 2022 e 2023 no montante de R$ 2.386,43, equivalente a três ciclos, mesmo não tendo sido a parte autora notificada previamente sobre a cobrança. A Resolução Normativa nº 1.000 de 2021, da ANEEL, de fato autoriza as concessionárias de energia a promoverem cobrança da diferença de consumo aferidas em situações análogas. Para tanto, prevê os procedimentos que devem ser adotados pela concessionária. Ocorre, todavia, a referida Resolução impõe à concessionária o dever de comunicar ao usuário tão logo verifique a impossibilidade de promover a medição: Art. 278. Nos ciclos de faturamento em que ocorrer impedimento de acesso para fins de leitura, a distribuidora deve: I - armazenar evidências que comprovem o impedimento e a presença do leiturista na unidade consumidora na data e horário informados; II - faturar a unidade consumidora conforme art. 289; III - oferecer ao consumidor as alternativas dispostas no art. 279; e IV - comunicar ao consumidor: a) a data e horário em que a distribuidora esteve na unidade consumidora e ocorreu o impedimento de acesso para fins de leitura; b) a obrigação de manter o livre acesso ao sistema de medição utilizado para faturamento; c) a forma que a unidade consumidora será faturada no ciclo de faturamento em questão; d) as alternativas que podem ser adotadas pelo consumidor para desimpedir o acesso, com o custo ou a informação de necessidade de solicitação de orçamento; e) o número de ciclos consecutivos em que o impedimento de acesso ocorreu na unidade consumidora; f) a possibilidade de suspensão do fornecimento de energia elétrica a partir do terceiro ciclo consecutivo de impedimento de acesso; e g) outras informações que a distribuidora julgar pertinentes. Pela análise dos autos, não há como concluir que a ré agiu nos moldes que dela se exigiam. Constatado o impedimento, deveria a concessionária realizar a cobrança segundo as respectivas médias aritméticas dos valores faturados nos 12 (doze) últimos ciclos de faturamento anteriores à constatação do impedimento, além de comunicar por escrito o consumidor sobre o impedimento. Por respeito ao princípio da transparência, deveria a concessionária justificar como chegou aos valores constantes nas faturas, bem como notificar o consumidor sobre as diligências voltadas à medição do consumo e os meses em que isso ocorreu. Contudo, nada disso foi observado e o débito consolidado foi arbitrariamente lançado nas faturas de energia elétrica do consumidor, ferindo os princípios mais básicos do Código de Defesa do Consumidor, como o da informação (art. 6º, III, do CDC). Nesse sentido: CONTRATO - Prestação de serviços - Fornecimento de energia elétrica - Revisão de fatura de consumo - Possibilidade - Cobrança excessiva - Ocorrência - Alegação de Impedimento de acesso ao relógio medidor - Não comprovação - Ônus da prova que incumbia à Ré, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC - Ausência de notificação específica, para que a consumidora providenciasse o acesso - Precedentes deste Egrégio Tribunal - Cobrança não observou a média de consumo dos últimos 12 meses, conforme determina o art. 87, caput, da Resolução ANEEL 414/2010 - Corte do fornecimento de energia elétrica para cobrança de débitos pretéritos - Inviabilidade - Fatura deve ser revista para que a cobrança seja feita pela média dos 12 meses anteriores ao alegado impedimento de acesso - Pleito revisional procedente. RESPONSABILIDADE CIVIL - Indenização - Dano moral - Inocorrência - Embora procedente a revisão da fatura, a cobrança indevida não gerou comunicado aos órgãos de proteção ao crédito,de modo a inserir o nome da Autora em cadastro de inadimplentes - Apesar de a Autora ter se aborrecido com o fato, o mero dissabor, o aborrecimento, a mágoa, a irritação ou a sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral - Indenização indevida. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Sucumbência recíproca Aplicação do art. 21, caput, do CPC/1973. Recurso parcialmente provido. (TJ/SP - Apelação nº 1005072-73.2014.8.26.0320; Relator Álvaro Torres Júnior, 20ª Câmara de Direito Privado; j. 26/06/2017) PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. ENERGIA ELÉTRICA. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO COM PEDIDOS DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E DE TUTELA DE URGÊNCIA. Confissão de dívida. Cobrança dos serviços pelo valor mínimo, durante seis meses, em razão de impedimento do acesso ao relógio medidor. Cobrança de kWh acumulados do período, com base no efetivo consumo após medição. Valor não correspondente à média de consumo da unidade. Ausência, ademais, de prova da impossibilidade de acesso ao medidor. Ônus da concessionária (CDC, art. 6º, VIII). Cobrança que deve observar o cálculo da média aritmética dos 12 últimos ciclos de faturamento. Recurso desprovido.(TJ/SP - Rel. Milton Carvalho, Órgão julgador: 36ª Câmara de Direito Privado, j. 23/11/2017). PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO, COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA PARA RELIGAÇÃO DE ENERGIA C.C. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Autor que recebeu, em setembro/2022, cobrança por faturamento incorreto e/ou ausência de faturamento de consumo de energia elétrica entre 24/09/2021 a 25/07/2022, totalizando 3.995.640 kWh, no valor total de R$898.105,59. Ré que posteriormente indica que aquele mesmo consumo real do autor teria sido calculado com base na diferença das leituras coletadas em seu medidor nos dias 21/02/2022 e 23/08/2022, apurando-se período do faturamento a menor de 22/02/2022 a 25/07/2022, resultando em 3.992.405,4 kWh não faturados, já descontados os consumos de kWh cobrados nos referidos meses e o consumo do mês de 3.234,6 kWh. Novo programa de cobrança de consumo acumulado limitada a 3 ciclos de faturamento apontado como sendo de 9.703,8 kWh, correspondente ao valor de R$7.474,36 (incluindo tributos), a ser parcelado em 10 (dez) vezes. Defesa indireta de mérito lastreada em fato superveniente dito modificativo do direito do autor, cuja consideração pelo julgador não importa em nulidade por julgamento "extra petita" ou "ultra petita". Ausência de prova suficiente de consumo da energia cobrada, tampouco de irregularidade e/ou impedimento à medição. Ré que não tornou indene de dúvidas se quaisquer dos valores cobrados encontrou algum substrato na realidade, permitindo a exata verificação quanto à correta aplicação da Resolução nº 1.000/2021 da ANEEL. Falta de comprovação, contudo, que não poderia conduzir a uma declaração judicial inequívoca e final a respeito da (completa) inidoneidade daquela nova cobrança, inclusive porque não foi objeto de qualquer pedido. Correta a sentença ao afastar tal defesa indireta de mérito e declarar a inexigibilidade dos valores descritos na inicial, relativos ao período de faturamento a menor e/ou ausência de faturamento de 24/09/2021 a 25/07/2022. Danos morais caracterizados. Possibilidade de formulação de pedido genérico de compensação por dano moral, conforme jurisprudência do STJ. Valor indenizatório fixado em R$10.000,00 que não comporta redução, de acordo com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade verificados em função das peculiaridades do caso. Sentença mantida. Recurso desprovido.(TJSP; Apelação Cível 1007819-65.2022.8.26.0271; Relator (a):Maria de Lourdes Lopez Gil; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro de Itapevi -1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 24/04/2025; Data de Registro: 24/04/2025) Ressalta-se que tratando-se de relação de consumo e sendo patente a hipossuficiência da parte autora, incontestável que competia à concessionária, enquanto fornecedora de serviços, desincumbir-se do ônus de demonstrar que agiu em consonância com os ditames normativos, o que não o fez (artigo 373, II, do código de Processo Civil e artigo 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor). Na hipótese vertente, a parte ré não trouxe aos autos prova suficiente de haver a parte autora consumido a energia cobrada, tampouco de que tenha havido alguma irregularidade e/ou impedimento à medição, notadamente por fato imputável à parte autora. Destaca-se, ademais, que seria impossível a produção de prova negativa por parte da autora no sentido de que não recebeu a notificação, tratando-se de inexigível prova diabólica. Considerando que a parte ré não comprovou a origem e regularidade da dívida, ônus que lhe incumbia (art. 373, II, do CPC; art. 6º, VIII, do CDC), procedem os pedidos de declaração de inexistência do débito no montante de R$ 2.386,43, bem como de cancelamento das cobranças contra a parte autora, inclusive perante o órgão de restrição ao crédito. Em relação aos danos morais, a inscrição indevida em cadastro de inadimplentes caracteriza ato ilícito passível de reparação. Em casos desta natureza, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que o dano moral é considerado in re ipsa, ou seja, decorre do próprio fato, sendo desnecessária a comprovação do prejuízo, ainda que a parte prejudicada seja pessoa jurídica (AgInt no AREsp n. 2.634.490/CE, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 23/9/2024, DJe de 25/9/2024.) A indenização por dano moral deve ser arbitrada de acordo com o método bifásico, que, segundo o STJ, é o que melhor atende às exigências de um arbitramento equitativo da indenização por danos extrapatrimoniais (AgInt no AREsp n. 2.453.559/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 20/5/2024, DJe de 23/5/2024). Assim, observadas as circunstâncias do caso concreto citadas acima, e a extensão do dano (art. 944 do CC), aliado ao princípio da proporcionalidade, bem como considerando o patamar que vem sendo adotado pelo TJSP em casos semelhantes (TJSP; Apelação Cível 1001028-85.2022.8.26.0334; Relator (a): Salles Vieira; Órgão Julgador: 24ª Câmara de Direito Privado; Foro de Macaubal - Vara Única; Data do Julgamento: 21/11/2024; Data de Registro: 21/11/2024), fixo o valor da indenização em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Ante o exposto, rejeitadas as preliminares, JULGO PROCEDENTES os pedidos, extinguindo o feito com resolução do mérito, com fundamento no art. 487, I, do CPC, para: a) DECLARAR a inexistência da dívida que ensejou a propositura da presente ação no montante de R$ 2.386,43 (dois mil, trezentos e oitenta e seis reais e quarenta e três centavos); b) DETERMINAR que a ré cancele a cobrança contra a parte autora, inclusive perante o "Serasa Experian"; c) CONDENAR o réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ .000,00 (cinco mil reais), a ser atualizada a partir da presente data (Súmula n. 362 do STJ), sem prejuízo dos juros moratórios, estes a contar da citação. Diante da sucumbência, condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais. Condeno, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte contrária, que fixo em 10% sobre o valor da condenação. Em caso de recurso de apelação, intime-se a parte recorrida a ofertar contrarrazões. Após, remetam-se os autos ao e. TJSP com nossas homenagens de estilo. Não havendo recurso, certifique-se o trânsito em julgado, intimando-se a parte interessada, sendo o caso, para instauração do cumprimento de sentença, com tramitação em apartado, e, exaurida a prestação jurisdicional da fase de conhecimento, providencie-se a baixa do processo e se arquivem os autos. P. I. C. - ADV: ANTONIO RODRIGO SANT ANA (OAB 234190/SP), CAMILA DE NICOLA FELIX (OAB 338556/SP)

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Clea Almeida Coelho x Renata Martins Gomes

ID: 295138099

Tribunal: TJCE Órgão: 2ª Vara Cível da Comarca de Crato Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0203267-66.2022.8.06.0071

Data de Disponibilização: 11/06/2025

Polo Ativo:

CLEA ALMEIDA COELHO

Polo Passivo:

RENATA MARTINS GOMES

INTIMAÇÃO DA SENTENÇA

Advogados:

RENATA MARTINS GOMES

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

CLEA ALMEIDA COELHO

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ 2ª Vara Cível da Comarca de Crato Rua Álvaro Peixoto, S/N, São Miguel - CEP 63100-000 Fone: (85) 98159-6341, Crato-CE - E-mail: crato.2civel@tjce.jus.br Proce… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ 2ª Vara Cível da Comarca de Crato Rua Álvaro Peixoto, S/N, São Miguel - CEP 63100-000 Fone: (85) 98159-6341, Crato-CE - E-mail: crato.2civel@tjce.jus.br Processo nº 0203267-66.2022.8.06.0071 Processos Associados: [] Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Assunto: [Indenização por Dano Material, Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Indenização por Dano Moral] AUTOR: MANUELA BEZERRA AIRES DE ALENCAR REU: TODOS EMPRENDIMENTOS LTDA - EPP SENTENÇA Vistos em autoinspeção. Manuela Bezerra Aires de Alencar propõe ação declaratória de inexistência de débito c/c repetição de indébito e danos morais contra Todos Empreendimentos Ltda., alegando que aderiu ao "Cartão de Todos" em 05/06/2020 e, ainda antes de completar um ano, manifestou expressamente sua vontade de cancelar o contrato, insatisfeita com os serviços prestados. Segundo relata, tentou por diversas vezes efetivar o cancelamento por telefone, e-mail, WhatsApp e pessoalmente, mas enfrentou obstáculos impostos pela ré, como a exigência de cancelamento exclusivamente presencial mediante agendamento. Apesar de suas tentativas, a cobrança persistiu, inclusive com descontos lançados em um cartão de crédito que ela afirma não ter fornecido, o que também configura, segundo a autora, violação ao seu sigilo de dados. A autora sustenta que houve cobranças indevidas após o primeiro ano do contrato, com valores que totalizam R$ 370,00, requerendo a devolução em dobro conforme artigo 42, parágrafo único, do CDC, além da condenação da ré por danos morais, em razão da persistência das cobranças mesmo após sua clara manifestação de cancelamento e da conduta considerada abusiva e lesiva à sua dignidade como consumidora. Fundamenta seus pedidos nos artigos 441 e 443 do Código Civil, e nos artigos 6º, 39, 42 e 47 do Código de Defesa do Consumidor, requerendo ainda a tutela antecipada para cessação imediata das cobranças. Destaca a hipossuficiência econômica e jurídica, pleiteando a inversão do ônus da prova e os benefícios da justiça gratuita. Pede seja a presente ação julgada procedente, para o fim de decretar a nulidade das cobranças a título de "CARTÃO DE TODOS - IPATINGA" da fatura da parte autora; Condenar a instituição requerida a devolver em dobro os valores descontados indevidamente direto na conta do autor, inclusive os que vierem a ser descontados no curso da presente ação, que até o presente momento perfaz a quantia dobrada de R$ 740,00 (setecentos e quarenta reais), corrigido nos termos do artigo 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor; condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Concedida parcialmente tutela de urgência no ID 107595923. A Administradora de Cartão de Todos Cariri Ltda. comparece espontaneamente aos autos no ID 107597841, alegando ser a verdadeira contratante da autora, e não a empresa inicialmente demandada, Todos Empreendimentos Ltda.. Sustenta que atua como franquia autônoma e independente dentro do sistema "Cartão de Todos", sem qualquer ingerência da franqueadora, que não teria responsabilidade pela contratação ou administração do serviço. No mérito, a empresa reconhece a adesão contratual da autora, firmada em 05/06/2020, com anuência às cláusulas de pagamento via cartão de crédito e renovação automática do contrato após o primeiro ano. Alega que, até o ajuizamento da ação, não havia registro formal de pedido de cancelamento por parte da autora, sendo necessário, conforme contrato, que a solicitação fosse feita presencialmente e por escrito, mediante aviso prévio de 30 dias. Afirma que as cobranças realizadas decorreram da vigência contratual e que não houve cobrança indevida, pois a autora teria autorizado a utilização do cartão de crédito. Defende a legalidade do procedimento e afirma que não há demonstração de abalo moral que justifique indenização. Pleiteia, ao final, a improcedência total dos pedidos iniciais, afirmando ter agido em conformidade com o contrato e com boa-fé objetiva. A empresa Todos Empreendimentos Ltda., inicialmente incluída no polo passivo, contesta no ID 107597843 os pedidos sustentando sua ilegitimidade passiva, por não ser parte da relação jurídica firmada com a autora. Alega que não comercializa diretamente os serviços do "Cartão de Todos", atuando apenas como franqueadora, com atividade econômica centrada em gestão de ativos intangíveis e cobrança, sem qualquer envolvimento nas contratações específicas com consumidores. Sustenta que a relação contratual foi firmada com a franquia local, Cartão de Todos Cariri Ltda., que possui autonomia administrativa e operacional. Reforça que a franqueadora não integrou a cadeia de fornecimento, não praticou ato ilícito, nem teve qualquer tratativa direta com a autora. Em reforço, a empresa afirma que a autora aderiu ao contrato ciente das regras, inclusive quanto ao cancelamento, que deveria ocorrer presencialmente, por escrito e com aviso prévio. Com base nisso, requer a exclusão do polo passivo, ou, subsidiariamente, a improcedência dos pedidos. Destaca ainda que diligenciou junto à franqueada para obter informações e documentos, reiterando não ter responsabilidade pelo alegado descumprimento contratual. A autora apresentou réplicas de ID 107597854. Intimadas para dizerem se pretendiam produzir outras provas, a ré nada requereu (ID 107597861), enquanto a autora requereu que fossem apresentados pela parte ré áudios da ligação e histórico de utilização do cartão (ID 107597862). Tentativa de conciliação infrutífera (ID 107597872). Decisão saneadora no ID 138069973 postergou a análise da preliminar de ilegitimidade passiva para esta sentença e deferiu o pedido de provas formulado pela autora. As partes foram intimada, mas a parte ré deixou transcorrer o prazo para a juntada da prova pleiteada sem qualquer providência (ID 144684594). É O RELATÓRIO. DECIDO: 1. Da relação de consumo e da legitimidade passiva Está configurada a relação de consumo entre as partes, nos moldes dos artigos 2º e 3º da Lei 8.078/90, sendo a autora consumidora final e as rés fornecedoras de serviço. A Todos Empreendimentos Ltda., embora alegue não ter sido parte na contratação, atua como franqueadora do serviço "Cartão de Todos". Já a Administradora de Cartão de Todos Cariri Ltda. se apresenta como franquia executora da relação contratual. No entanto, não há nos autos comprovação inequívoca do vínculo contratual entre a autora e a unidade Cariri. As provas constantes nos autos (extratos bancários, faturas e e-mails) indicam cobrança sob o rótulo "Cartão de Todos - Ipatinga", sede da franqueadora. Tampouco as rés trouxeram aos autos o contrato de franquia que fundamentaria a autonomia operacional alegada. A ausência de clareza e transparência sobre quem realiza a cobrança direta ao consumidor, associada ao uso da marca "Cartão de Todos" de modo indistinto, atrai a responsabilidade solidária entre as rés, nos termos do artigo 7º, parágrafo único, e artigo 25, §1º, do CDC, os quais são expressamente mencionados nas defesas. Rejeita-se, assim, a preliminar de ilegitimidade passiva arguida por Todos Empreendimentos Ltda. 2. Do cancelamento e das cobranças indevidas A controvérsia central do presente processo reside na validade das cobranças efetuadas após a manifestação da autora em não renovar o contrato do "Cartão de Todos". A autora afirma que, antes da conclusão do primeiro ano contratual, expressamente manifestou seu desejo de cancelar o serviço, o que teria sido feito por diversos canais de comunicação (telefone, WhatsApp, e-mail e tentativa presencial). Alega que, mesmo após reiteradas tentativas e comunicações, a requerida não processou o distrato, prosseguindo com as cobranças e chegando, inclusive, a utilizar cartão de crédito que não teria sido fornecido por ela, fato que a autora entende configurar não apenas cobrança indevida, mas também indevida manipulação de seus dados pessoais financeiros. A defesa, por sua vez, sustenta que não houve formalização válida do pedido de cancelamento, nos moldes do contrato, o qual exigiria solicitação presencial e escrita, mediante aviso prévio de 30 dias. Reforça que, por não ter havido esse cumprimento contratual, a renovação automática teria ocorrido legitimamente, autorizando a continuidade das cobranças. Contudo, à luz dos elementos constantes nos autos, a alegação da autora encontra verossimilhança substancial. Há comprovação de tentativas administrativas de cancelamento documentadas por e-mails enviados à empresa, protocolo de atendimento telefônico nº 1053811009 (ID 107598799 - fl. 3), e inclusive extratos bancários que demonstram cobranças feitas mesmo após essas tentativas. Tais evidências materializam a existência de comunicação efetiva da intenção de não renovar o contrato, ainda que esta não tenha se dado na forma escrita presencial exigida pela empresa. Ora, a própria narrativa da inicial, corroborada por documentos juntados, revela que a empresa criou obstáculos desproporcionais ao exercício do direito de cancelamento, como a exigência de agendamento para atendimento presencial, negando a possibilidade de cancelamento pelos mesmos canais utilizados na adesão, notadamente WhatsApp e atendimento telefônico. A imposição de forma específica e restritiva para o cancelamento, sem justificativa técnica ou jurídica plausível, compromete a boa-fé objetiva, uma vez que impede o consumidor de exercer um direito básico - o de não continuidade contratual - de forma razoável e eficaz. No tocante à utilização de cartão de crédito não autorizado, a autora apresenta extratos que indicam lançamentos de valores em cartão com final diverso daquele supostamente informado no momento da adesão. A defesa, ao tentar justificar tais cobranças, limita-se a invocar gravação de autorização do primeiro cartão fornecido, sem demonstrar como obteve os dados do segundo cartão, e sem apresentar qualquer documento que comprove autorização expressa ou tácita para o uso do novo meio de pagamento. Tal conduta, além de contrariar o princípio da confiança, afasta-se dos padrões aceitáveis de atuação contratual. Não se ignora que o contrato, de fato, prevê cláusula de renovação automática e estabelece procedimentos para o distrato. Contudo, a interpretação dessa cláusula deve considerar o contexto concreto e a realidade da contratação. A expressa manifestação de vontade da autora no sentido de não mais desejar a manutenção do vínculo - reiterada em diferentes canais -, aliada à recusa injustificada da empresa em acatar tal manifestação, torna ilegítima a renovação contratual automática e, por consequência, indevidas todas as cobranças realizadas após esse marco temporal. Nesse sentido: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CANCELAMENTO DE CARTÃO DE CRÉDITO - PEDIDO FORMULADO PELO CLIENTE - PROCEDÊNCIA - MANUTENÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - VALOR BAIXO DA CAUSA - FIXAÇÃO - CRITÉRIO EQUITATIVO . - O pedido de cancelamento do cartão de crédito formulado pelo consumidor deve ser acolhido, haja vista que não é possível obrigá-lo a manter o vínculo contratual que não mais deseja; esta possibilidade, contudo, não possui o condão de cancelar a dívida eventualmente existente, que poderá ser exigida pelo credor através da ação apropriada - Verificando-se que o valor da causa expressa valor ínfimo, os honorários advocatícios deverão ser fixados de forma equitativa, conforme estabelece o § 8º, do artigo 85, do CPC/2015 e com a observância do disposto nos incisos do § 2º, do referido artigo. (TJ-MG - AC: 10112150010398001 Campo Belo, Relator.: Pedro Bernardes, Data de Julgamento: 02/05/2018, Câmaras Cíveis / 9ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 16/05/2018) AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - CARTÃO DE CRÉDITO FREE - Pedido de cancelamento do cartão não atendido pelo réu - Continuidade na emissão de faturas para pagamento de seguro que culminou na negativação do nome da autora no cadastro dos órgãos de proteção ao crédito - Sentença de procedência que condenou o réu a pagar indenização por danos morais na quantia de R$ 12.000,00. Pretensão do apelante de afastamento ou de redução da quantia fixada - ADMISSIBILIDADE EM PARTE: Aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Restou comprovado o pagamento pelo valor total da fatura vencida em 6 .7.2019 no valor de R$309,20 e incontroverso o pedido de cancelamento do cartão em 12.7.2019 . Indevida continuidade na emissão de faturas para pagamento de seguro. (...). (TJ-SP - AC: 10078192920208260047 SP 1007819-29 .2020.8.26.0047, Relator.: Israel Góes dos Anjos, Data de Julgamento: 01/06/2021, 18ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 01/06/2021) Por fim, a soma das parcelas indevidamente cobradas (R$ 75,00 referentes a julho, agosto e setembro de 2021 e R$ 295,00 de valores posteriormente lançados) totaliza R$ 370,00. Como não restou demonstrada qualquer justificativa plausível ou erro material escusável por parte da ré, é devida a restituição em dobro do valor cobrado indevidamente, conforme pedido expresso da autora com base no parágrafo único do artigo 42 do CDC, dispositivo cuja aplicação, embora dependa de análise do caso concreto, encontra respaldo na má conduta da requerida demonstrada nos autos. A conduta da empresa, portanto, revela-se abusiva, desrespeitando os limites da confiança contratual e violando direitos básicos da consumidora, razão pela qual a cobrança posterior à manifestação de cancelamento deve ser considerada ilegal e nula, gerando os efeitos reparatórios pleiteados. 3. Do dano moral A controvérsia sobre a ocorrência de dano moral neste caso exige a análise detida dos efeitos produzidos pela conduta das rés em face dos direitos da autora, à luz do que se extrai dos autos. A jurisprudência consolidada do ordenamento jurídico brasileiro reconhece que nem toda falha na prestação de serviço gera, por si só, o dever de indenizar por dano extrapatrimonial. O dano moral não decorre de meros aborrecimentos cotidianos ou de falhas pontuais, mas sim de situações que atingem bens jurídicos existenciais, como a honra, a dignidade, a tranquilidade psíquica ou a esfera de autodeterminação da pessoa. Neste caso, a conduta das rés ultrapassa o patamar do dissabor contratual. Conforme amplamente demonstrado nos autos, a autora buscou, por diversas vezes e canais, manifestar sua vontade de cancelar o serviço contratado, ainda dentro da vigência inicial, a fim de evitar a renovação automática. Essa manifestação, embora clara, reiterada e documentada, não foi respeitada pelas empresas, que impuseram entraves burocráticos e inadequados à finalidade do ato - como a exigência de comparecimento presencial mediante agendamento, em pleno contexto de serviço originalmente contratado por meio remoto. Além disso, a situação se agrava com o fato de que, mesmo após a autora ter deixado clara sua vontade de não continuar com o serviço, valores continuaram sendo debitados, inclusive em cartão de crédito que ela afirma não ter fornecido, e cuja substituição ocorreu por razões alheias à relação contratual. Não há, por parte das rés, prova documental de autorização para uso dos novos dados bancários, tampouco comprovação da origem lícita do acesso a esses dados. A realização de débitos em cartão de crédito sem autorização expressa, após a tentativa frustrada e negligenciada de cancelamento, revela uma prática abusiva. Essa prática, para além de gerar prejuízo econômico, compromete o direito da consumidora de autodeterminar-se financeiramente, criando situação de angústia, insegurança e impotência frente a um serviço que já havia expressamente recusado. O impacto dessa conduta transcende o mero desconforto. A autora teve que enfrentar perseverantes cobranças não consentidas, expôs-se a uma série de esforços infrutíferos para resolver a situação por vias administrativas, e, por fim, foi forçada a acionar o Poder Judiciário para ver respeitada uma vontade legítima, relacionada ao simples encerramento de um contrato de adesão. Tal circunstância comprometeu seu tempo, sua tranquilidade e sua autonomia patrimonial. Ademais, o tempo de exposição à prática indevida - mais de um ano após a manifestação de cancelamento - evidencia a persistência da lesão, o que agrava o quadro fático. Não se trata de um erro isolado, mas de postura sistemática de resistência da empresa à descontinuidade do serviço, com cobrança de débitos em situação de manifesta controvérsia. Dessa forma, reconhece-se a ocorrência de dano moral indenizável, uma vez que a autora foi submetida a constrangimento e frustração de sua legítima expectativa de cancelamento, além de violação de sua esfera privada de controle sobre seus dados financeiros. A reparação, nesse contexto, não se presta apenas a compensar o abalo, mas também a desestimular a reiteração da conduta empresarial lesiva. Considerando os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, bem como a extensão da lesão, o porte econômico das partes e o caráter pedagógico da indenização, fixa-se o valor do dano moral em R$ 2.000,00 (dois mil reais), quantia compatível com a gravidade da conduta e com o padrão indenizatório adotado em casos similares, sem gerar enriquecimento indevido. DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo PROCEDENTES os pedidos formulados por MANUELA BEZERRA AIRES DE ALENCAR para: Declarar a inexistência do débito relativo às cobranças realizadas após o término do primeiro ano de contrato; Condenar solidariamente as rés, TODOS EMPREENDIMENTOS LTDA. e ADMINISTRADORA DE CARTÃO DE TODOS CARIRI LTDA., à restituição em dobro da quantia de R$ 370,00, totalizando R$ 740,00 (setecentos e quarenta reais), com correção monetária desde o desembolso pelo IPCA até a citação, quando passa a incidir a taxa SELIC como juros legais e correção monetária; Condenar solidariamente as rés ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), com juros de mora pela taxa SELIC, decotado o IPCA que a compõe, entre a citação e a presenta data, quando passa a incidir a taxa SELIC normal como juros e correção monetária. Condeno as rés solidariamente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, §2º do CPC. P. R. I. Crato/CE, 9 de junho de 2025. José Flávio Bezerra Morais Juiz de Direito Assinado digitalmente, nos termos do art. 1º, §2º, III, alínea a da Lei nº 11.419/2006.

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Processo nº 0000613-93.2016.8.11.0093

ID: 310851142

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000613-93.2016.8.11.0093

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.

Acórdão

Advogados:

JOSE CARLOS SKRZYSZOWSKI JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000613-93.2016.8.11.0093 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). MARCOS RE… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000613-93.2016.8.11.0093 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. - CNPJ: 07.207.996/0001-50 (APELADO), JOSE CARLOS SKRZYSZOWSKI JUNIOR - CPF: 040.837.379-21 (ADVOGADO), BENTO RABELLO LEITE - CPF: 887.367.411-91 (APELANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE CONSTITUIÇÃO VÁLIDA EM MORA. NOTIFICAÇÃO ENVIADA A ENDEREÇO INCOMPLETO. VÍCIO INSANÁVEL. SENTENÇA ANULADA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESTITUIÇÃO DO VEÍCULO AO APELANTE OU CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta por Bento Rabello Leite contra sentença que julgou procedente a ação de busca e apreensão movida pelo Banco Bradesco Financiamentos S.A., reconhecendo a posse e a propriedade do bem exclusivamente em favor do banco. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se houve a regular constituição em mora, requisito indispensável à propositura da ação de busca e apreensão, considerando que a notificação extrajudicial foi enviada a endereço incompleto, retornando com a anotação de “endereço insuficiente”. III. RAZÕES DE DECIDIR A constituição válida em mora é pressuposto processual indispensável para o ajuizamento da ação de busca e apreensão, conforme dispõe o art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 911/69 e a Súmula 72 do STJ. O Tema 1132 do STJ estabelece que é suficiente o envio da notificação ao endereço constante no contrato, dispensando-se a prova do recebimento, desde que corretamente direcionada. No caso concreto, a notificação extrajudicial foi enviada a endereço incompleto, suprimindo informação essencial para a efetiva localização do devedor, o que impossibilitou seu recebimento e configura vício insanável. O protesto apresentado não supre a ausência de notificação válida, por não demonstrar a efetiva ciência do devedor acerca da mora. A ausência de constituição válida em mora acarreta a extinção do processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC. Deve ser determinada a restituição do veículo apreendido ao apelante ou, na impossibilidade, a conversão em perdas e danos. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido. Tese de julgamento: A constituição válida em mora, mediante notificação extrajudicial enviada ao endereço completo constante no contrato, é pressuposto indispensável para o ajuizamento da ação de busca e apreensão fundada em alienação fiduciária. A notificação encaminhada a endereço incompleto, retornada com a anotação de “endereço insuficiente”, não supre a exigência legal, configurando vício insanável que conduz à extinção do processo sem resolução de mérito. Na ausência de constituição válida em mora, deve ser determinada a imediata restituição do bem apreendido ao devedor ou, se impossível, a conversão da obrigação em perdas e danos. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação cível interposto por Bento Rabello Leite contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito Humberto Resende Costa, da Vara Única de Feliz Natal, que, nos autos da ação de busca e apreensão movida pelo Banco Bradesco Financiamentos S.A., julgou procedente a demanda para reconhecer a posse e a propriedade do bem descrito na exordial exclusivamente em favor do banco autor. Em suas razões, o Apelante sustenta, em síntese, a necessidade de reforma da sentença, ao argumento de que não restou configurada a constituição em mora, uma vez que a notificação extrajudicial encaminhada pela instituição financeira não foi enviada ao endereço completo constante no contrato, tendo sido suprimida informação essencial para a efetiva localização, fato que motivou o retorno do aviso de recebimento (AR) com a anotação de “endereço insuficiente”. Defende que a falha no envio da notificação caracteriza vício insanável, à luz do que dispõe o art. 3º do Decreto-Lei nº 911/69 e da tese fixada no Tema 1132 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual é suficiente o envio da notificação extrajudicial ao endereço indicado no contrato, sendo desnecessária a prova do recebimento, desde que corretamente direcionada. Diante disso, pugna pela anulação da sentença, com o consequente reconhecimento da ausência de pressuposto processual de constituição válida e regular, para que a ação seja julgada extinta sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inciso IV, do CPC, com a devolução do veículo apreendido ao requerido. Contrarrazões no ID 194047828, oportunidade em que a instituição financeira suscitou preliminar de violação ao princípio da dialeticidade. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R V O T O (PRELIMINAR) – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Arguiu a Apelada que o recurso interposto pelo Apelante Bento Rabello Leite não deve ser conhecido, pois não há nas razões da apelação a impugnação aos fundamentos da sentença. É cediço que a apelação deve atacar os fundamentos da sentença, em atendimento aos requisitos dispostos no artigo 1.010 do Código de Processo Civil. Nos termos do artigo supracitado, tem-se que a motivação constitui um dos pressupostos do recurso, devendo constar a fundamentação na qual a parte recorrente baseia seu pedido de reforma da sentença. Tal fundamentação é responsável por limitar a matéria que será devolvida ao juízo de segundo grau. Extrai-se do ensinamento acima a evidência de que a parte apelante deve atacar, especificamente, os fundamentos da sentença que deseja rebater. Sobre o tema, o seguinte julgado: “[...] não há falar-se em ofensa ao princípio da dialeticidade se constatado que o recorrente ataca especificamente todos os pontos da sentença objurgada, apontando inclusive supostos equívocos cometidos pelo julgador singular. [...]"(TJMT, 2ª Câmara Cível, apelação nº 63258/2012, relatora Desembargadora Marilsen Andrade Addario, Dje 12/12/2012). No caso em exame, denota-se das razões recursais que a parte recorrente atendeu ao princípio da dialeticidade e aos requisitos previstos no artigo 1.010, III, do Código de Processo Civil, pois apresentou as razões de seu pedido de reforma, com os fundamentos de fato e de direito, e expresso pedido de que a sentença merece ser reformada. Além disso, a reiteração de algumas das razões expostas na Primeira Instância, por si só, não impede o conhecimento do recurso, desde que, pela leitura do apelo, seja possível identificar claramente os motivos pelos quais se requer a reforma da sentença. Deste modo, rejeito a preliminar suscitada. É como voto. V O T O (MÉRITO) EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Como visto, trata-se de recurso de apelação cível interposto por Bento Rabello Leite contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito Humberto Resende Costa, da Vara Única de Feliz Natal, que, nos autos da ação de busca e apreensão movida pelo Banco Bradesco Financiamentos S.A., julgou procedente a demanda para reconhecer a posse e a propriedade do bem descrito na exordial exclusivamente em favor do banco autor. Na origem, o requerido foi citado por edital e permaneceu inerte, motivo pelo qual a Defensoria Pública foi nomeada como curadora especial, apresentando contestação. Na oportunidade, alegou a ausência de regular constituição em mora, requisito indispensável à propositura da demanda, nos termos do artigo 3º do Decreto-Lei nº 911/69. O juízo de primeiro grau, contudo, julgou procedente o pedido inicial, nos seguintes termos: “Vistos etc. Trata-se de ação de busca e apreensão ajuizada por BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A em face de BENTO RABELLO LEITE. Decisão no id 59557593 (fls. 15/16), concedendo a tutela antecipada de urgência vindicada. Certidão de busca e apreensão do veículo alvo desta lide lançada no id 59557595 à fl. 39. Após infrutíferas tentativas de citação pessoal da parte requerida, sobreveio decisão no id 161435605 com a determinação da citação editalícia e a nomeação da Defensoria Pública na condição de curadora especial, acaso transcorrido o prazo legal sem manifestação. Contestação por negativa geral, apresentada pela Defensoria Pública, na condição de curadora especial, no id 184758754. Réplica no id 186092830. É o breve relatório. Decide-se. I. Do julgamento antecipado da lide: Levando-se em consideração que se trata de ré revel citada por edital, com a apresentação de contestação por negativa geral pela curadora especial (a Defensoria Pública Estadual), entende-se que o feito comporta o julgamento antecipado, nos termos do art. 355, I, do CPC. Afinal, verifica-se que o conjunto probatório colhido nos autos se mostra suficiente para a perfeita aferição da controvérsia, sendo desnecessária a dilação probatória. Dessa maneira, passa-se ao julgamento antecipado da presente ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente. II. Do mérito: Pois bem, cuida-se de ação de busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente como garantia de adimplemento do contrato celebrado entre as partes, respaldada no Decreto Lei nº 911/69. Os documentos juntados ao feito pelo requerente são aptos a comprovar que o contrato foi regularmente firmado entre as partes (id 59557593 – fls. 09/11). Ademais, a mora está devidamente comprovada pela notificação acostada no id 59557593, à fl. 12, encaminhada e recebida no mesmo endereço do negócio jurídico em foco. Como disposto no art. 2º, §2º, do Decreto-lei 911/69: “a mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registada expedida por intermédio de Cartório de Títulos e Documentos ou pelo protesto do título, a critério do credor”. Tendo o credor enviado a comunicação para o endereço constante do contrato e havendo a informação de entrega, considera-se realizada a notificação. Nesse sentido, recente entendimento pacificado pelo C. STJ, no julgamento do Tema 1.132, “in verbis”: Tema 1.132 STJ: “Para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é suficiente o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual, dispensando-se a prova do recebimento, quer seja pelo próprio destinatário, quer por terceiros”. Observa-se, por oportuno, que a referida notificação traz informações específicas sobre a dívida, constando o número da parcela vencida, a data de vencimento, seu valor original, bem como os acessórios legais e contratuais incidentes em razão do inadimplemento, saldo devedor parcial e total, além de informações sobre as consequências caso não fosse purgada a mora pelo devedor. Portanto, verifica-se que o banco autor logrou êxito em demonstrar a constituição de sua pretensão inicial, pois a peça vestibular veio instruída com os documentos necessários para comprovar os fatos narrados. Por outro lado, a parte ré revel citada por edital se ateve a apresentar contestação por negativa geral, não se desincumbindo do ônus de comprovar a existência de eventual fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da parte autora (art. 373, II, do CPC), razão pela qual é caso de acolhimento do pleito inaugural. Sobre o tema, seguem julgados: [...] Logo, eis que houve o descumprimento do avençado e não se implementou a purgação da mora extrajudicialmente ou o pagamento integral da dívida judicialmente, devida a consolidação da propriedade e posse do veículo descrito na petição inicial nas mãos da Instituição Financeira autora, nos termos do art. 3º do Decreto-Lei nº 911/69. III. Da conclusão: Diante do exposto, JULGA-SE PROCEDENTE A PRETENSÃO INICIAL, confirmando a liminar concedida no id 59557593 (fls. 15/16) para reconhecer a posse e a propriedade do bem descrito na exordial exclusivamente em favor do banco autor, facultando-se a venda respectiva, na forma da lei, comunicando-se à parte ré a existência de eventual saldo em seu favor, extinguindo o feito com resolução de mérito, em conformidade com o art. 487, I, do CPC. Outrossim, condena-se o réu no pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios de sucumbência, que se fixa em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado. (...)” Inconformado, o requerido/apelante sustenta, em síntese, a necessidade de reforma da sentença, ao argumento de que não restou configurada a constituição em mora, uma vez que a notificação extrajudicial encaminhada pela instituição financeira não foi enviada ao endereço completo constante no contrato, tendo sido suprimida informação essencial para a efetiva localização, fato que motivou o retorno do aviso de recebimento (AR) com a anotação de “endereço insuficiente”. Defende que a falha no envio da notificação caracteriza vício insanável, à luz do que dispõe o art. 3º do Decreto-Lei nº 911/69 e da tese fixada no Tema 1132 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual é suficiente o envio da notificação extrajudicial ao endereço indicado no contrato, sendo desnecessária a prova do recebimento, desde que corretamente direcionada. Diante disso, pugna pela anulação da sentença, com o consequente reconhecimento da ausência de pressuposto processual de constituição válida e regular, para que a ação seja julgada extinta sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inciso IV, do CPC, com a devolução do veículo apreendido ao requerido. Pois bem. Nos termos do art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei 911/1969, a comprovação da mora deve ser feita por carta registrada expedida por Cartório de Títulos e Documentos ou pelo protesto do título. Já o art. 3º do mesmo diploma prevê que a busca e apreensão somente poderá ser concedida se a mora estiver devidamente caracterizada. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reforça essa exigência por meio da Súmula 72: "A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente." Com isso, nota-se a especial atenção dada pelo legislador à necessidade de ciência do devedor para a válida constituição em mora, medida absolutamente indispensável dentro do contexto jurídico em questão. Isso porque, no espectro dos princípios ideológicos da alienação fiduciária, embora a legislação favoreça significativamente a instituição financeira – com vistas a garantir a credibilidade e efetividade do sistema financeiro e a segurança do crédito, que são colunas estruturais do modelo capitalista – permitindo-lhe a imediata e liminar apreensão do bem sem qualquer possibilidade de prévia contestação, torna-se necessário, em contrapartida, estabelecer mecanismos mínimos de proteção ao devedor. Portanto, para a salvaguarda elementar dos direitos da parte apontada como devedora, é imperativo que a notificação seja realizada em estrita conformidade com as exigências estabelecidas pelo Decreto Lei 911/69. Em outras palavras, para preservar sua legitimidade constitucional como instrumento de proteção ao sistema financeiro, é imperativo que a concessão da busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente seja condicionada à demonstração cabal e inequívoca dos pressupostos legais autorizadores da medida, assegurando ao devedor supostamente inadimplente o devido processo legal antes da privação da posse direta do bem. No presente caso, verifica-se dos autos que a tentativa de notificação extrajudicial realizada pela instituição financeira foi infrutífera, tendo o aviso de recebimento retornado com a anotação “endereço insuficiente”, justamente porque a autora não utilizou o endereço completo constante no contrato, suprimindo a informação de que, ao atingir determinado ponto (Km 15 da Estrada Santa Terezinha), dever-se-ia seguir à esquerda para a correta localização do imóvel. A omissão desse dado, evidentemente relevante para a efetiva localização do endereço, inviabilizou o cumprimento da diligência pelos Correios, o que afasta, portanto, o atendimento dos requisitos fixados no Tema 1132. Frise-se: o entendimento consolidado pelo STJ parte do pressuposto de que a notificação seja enviada exatamente ao endereço completo e correto fornecido no contrato, não sendo admitida flexibilização quando o próprio credor, por erro, fornece dados incompletos. No mais, embora haja nos autos comprovação de protesto do título, o documento acostado não demonstra a efetiva ciência do devedor acerca do protesto, circunstância que também inviabiliza sua utilização como meio de constituição válida em mora. Certo é que a simples juntada de certidão de protesto, sem a correspondente comprovação de intimação válida do devedor, é insuficiente para atender aos requisitos legais. A fim de ratificar este entendimento, destaca-se: “Nas hipóteses de alienação fiduciária, a mora deve ser comprovada por meio de notificação extrajudicial expedida por cartório de títulos e documentos ou por carta registrada com aviso de recebimento e entregue no domicílio do devedor, sendo dispensada a notificação pessoal. No caso em que a notificação extrajudicial retorna com a informação "não procurado", é correta a extinção da ação de busca e apreensão em razão da ausência de comprovação da mora, tendo em vista que a notificação expedida não foi sequer encaminhada ao endereço do devedor. É possível a comprovação da mora na ação de busca e apreensão por intermédio do protesto do título por edital, desde que esgotados todos os meios de localização do devedor. [...]” (STJ - AgInt no REsp: 2007339 RS 2022/0173250-8, Relator.: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 13/03/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/03/2023, grifo nosso) “CONSUMIDOR. NEGATIVAÇÃO E PROTESTO SEM NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. ERRO DO CREDOR AO INFORMAR O ENDEREÇO DO DEVEDOR. RESPONSABILIDADE CONFIGURADA. DANO MORAL CABÍVEL. SENTENÇA REFORMADA. Apesar de o protesto e negativação terem se originados a partir de uma mora legítima, faz-se necessário, como requisito do protesto, o envio de notificação prévia ao endereço do devedor. Para isso, é dever do credor informar ao cartório de notas o endereço correto em que tal procedimento se realizará.” (TJ-SP - AC: 10078199120198260361 SP 1007819-91.2019.8 .26.0361, Relator.: Artur Marques, Data de Julgamento: 11/02/2020, 35ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/02/2020, grifo nosso) “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PROCESSO EXTINTO POR FALTA DE CONSTITUIÇÃO EM MORA DO DEVEDOR. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL NÃO ENTREGUE AO DESTINATÁRIO NO ENDEREÇO INDICADO EM CONTRATO. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. NUMERAL DO ENDEREÇO DIGITADO ERRADO NO CONTRATO. DESCUIDO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. NÃO OBSERVADA MÁ-FÉ DO DEVEDOR. MORA NÃO CONFIGURADA. AFASTAMENTO DA TESE 1.132 DO STJ POR “DISTINGUISHING”. [...]” (TJ-PR 00017452020248160174 União da Vitória, Relator.: Ramon de Medeiros Nogueira, Data de Julgamento: 14/10/2024, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 14/10/2024, grifo nosso) De mais a mais, importa consignar que a tentativa posterior de notificação no município de Várzea Grande, que resultou no retorno do AR com a anotação “mudou-se”, é juridicamente irrelevante para os fins da presente análise, porquanto realizada após o ajuizamento da demanda, não se prestando, portanto, para suprir a ausência da constituição prévia da mora, exigência legal expressa no artigo 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 911/69. Diante desse cenário, constata-se, de forma inequívoca, a ausência de regular constituição em mora, o que configura vício insanável, por se tratar de pressuposto processual objetivo de constituição e desenvolvimento válido do processo. Nessa linha, é firme a jurisprudência deste egrégio Sodalício: “Para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é necessário o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual. A comprovação da mora é pressuposto de constituição válida e regular do processo em Ação de Busca e Apreensão fundada em alienação fiduciária. A comprovação da mora do devedor é requisito indispensável ao ajuizamento da ação de busca e apreensão com amparo no Decreto-Lei nº 911/1969. Se não foi comprovada a mora do devedor, há ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, que deve então ser julgado extinto o processo sem resolução de mérito.” (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 1005652-61.2024.8 .11.0000, Relator.: JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Data de Julgamento: 14/05/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/05/2024) Portanto, a r. sentença deve ser reformada, a fim de extinguir o feito sem resolução do mérito, na forma do artigo 485, inciso IV, do CPC. Por via de consequência, deve ser determinada a restituição do veículo apreendido ao apelante, nos termos do Decreto-Lei nº 911/69, ou, se impossível a devolução do bem em razão de eventual alienação, a ação poderá ser convertida em perdas e danos. Por fim, visando evitar a oposição de embargos declaratórios, saliento que reputo prequestionados todos os dispositivos legais invocados. Ressalta-se que os pedidos formulados foram examinados com base na legislação pertinente e jurisprudência dominante, sendo desnecessário exame pontual de cada artigo suscitado no recurso. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso de apelação para, nos termos do artigo 485, inciso IV, do CPC, reconhecer a ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, extinguindo-se o feito sem resolução de mérito. Na oportunidade, determino a imediata restituição do veículo apreendido ao apelante ou, caso o veículo já tenha sido vendido, impossibilitando a obrigação de devolução do bem, a presente ação poderá ser convertida em perdas e danos. Por conseguinte, provido o recurso e modificada a sentença, inverto os ônus sucumbenciais, condenando a parte apelada ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor do proveito econômico obtido. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025

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