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Processo nº 1031352-04.2022.8.11.0002

ID: 278328541

Tribunal: TJMT Órgão: Órgão Especial Classe: AGRAVO REGIMENTAL CíVEL Nº Processo: 1031352-04.2022.8.11.0002

Data de Disponibilização: 26/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JUCINEIA DE ARRUDA

Acórdão

Advogados:

THAIANE ERICA CORREA DOS SANTOS

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO ÓRGÃO ESPECIAL Número Único: 1031352-04.2022.8.11.0002 Classe: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). NILZA MARIA … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO ÓRGÃO ESPECIAL Número Único: 1031352-04.2022.8.11.0002 Classe: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO Turma Julgadora: [DES(A). NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). HELIO NISHIYAMA, DES(A). JOSE LUIZ LEITE LINDOTE, DES(A). JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). MARIA EROTIDES KNEIP, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [JUCINEIA DE ARRUDA - CPF: 026.960.981-40 (APELADO), THAIANE ERICA CORREA DOS SANTOS - CPF: 051.636.651-38 (ADVOGADO), STONE PAGAMENTOS S.A. - CNPJ: 16.501.555/0001-57 (APELANTE), DOMICIANO NORONHA DE SA - CPF: 085.741.367-86 (ADVOGADO), MARCELO NEUMANN MOREIRAS PESSOA - CPF: 029.483.497-45 (ADVOGADO), DOMICIANO NORONHA DE SA - CPF: 085.741.367-86 (ADVOGADO), STONE PAGAMENTOS S.A. - CNPJ: 16.501.555/0001-57 (APELADO), JUCINEIA DE ARRUDA - CPF: 026.960.981-40 (APELANTE), THAIANE ERICA CORREA DOS SANTOS - CPF: 051.636.651-38 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a ÓRGÃO ESPECIAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGOU PROVIMENTO AO AGRAVO REGIMENTAL, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA. E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. FRAUDE BANCÁRIA. FORTUITO INTERNO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. APLICAÇÃO DO TEMA 466/STJ. DECISÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Agravo interno interposto por instituição financeira contra decisão da Vice-Presidência que negou seguimento ao recurso especial, com fundamento no artigo 1.030, I, “b”, do CPC, ao aplicar o entendimento fixado no Tema 466 do STJ. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se as instituições financeiras devem responder objetivamente pelos danos gerados por fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, conforme a jurisprudência do STJ. III. Razões de decidir 3. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento dos REsps 1.197.929/PR e 1.199.782/PR, firmou a tese no Tema 466, estabelecendo que instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos oriundos de fraudes bancárias, caracterizando-se como fortuito interno. 4. O acórdão recorrido está em consonância com a Súmula 479 do STJ, que dispõe que "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". 5. A alegação de inexistência de dano extrapatrimonial não afasta a responsabilidade objetiva, pois restou comprovado o impacto negativo na esfera moral da parte recorrida, caracterizando o dever de indenizar. 6. Aplicação da Súmula 83 do STJ, que impede o conhecimento de recurso especial quando a decisão recorrida está alinhada à jurisprudência dominante do Tribunal. IV. Dispositivo e tese 7. Agravo interno desprovido. Tese de julgamento: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, nos termos do Tema 466/STJ.” Dispositivos relevantes citados: Código Civil, arts. 186, 187, 884 e 927; Código de Processo Civil, art. 1.030, I, “b”. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.197.929/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, j. 24/08/2011, DJe 12/09/2011; STJ, Súmula 479, STJ; Súmula 83. R E L A T Ó R I O ÓRGÃO ESPECIAL AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL N. 1031352-04.2022.8.11.0002 AGRAVANTE: STONE PAGAMENTOS S. A. AGRAVADA: JUCINEIA DE ARRUDA RELATÓRIO DESEMBARGADORA NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO Egrégio Plenário: Trata-se de Agravo Interno interposto por STONE PAGAMENTOS S. A., contra decisão da Vice-Presidência que negou seguimento ao Recurso Especial, com fundamento no artigo 1.030, I, “b”, do CPC (Tema 466), e o inadmitiu com fulcro no inciso V do mesmo dispositivo (Súmula 7/STJ). O agravante alega que a aplicação mecânica dos precedentes ignora a complexidade fática do presente caso e a realidade das relações contratuais que o envolvem; aduz que a jurisprudência não pode ser empregada de maneira a desconsiderar as peculiaridades que permeiam cada caso concreto. Assevera que a decisão recorrida não levou em conta a especificidade da relação entre as partes, em que se evidenciam indícios de falhas na segurança das operações realizadas, bem como a ausência de resposta adequada às reclamações apresentadas pelo agravante. Argumenta que a responsabilidade das instituições financeiras deve ser avaliada à luz dos princípios da boa-fé objetiva e do risco do empreendimento, exigindo, assim, uma apreciação cautelosa de todas as circunstâncias. Requer seja reconsiderada a decisão que negou seguimento ao Recurso Especial, permitindo o seu processamento apreciação pelo E. STJ; alternativamente, pugna pelo provimento do Agravo Interno para que o Recurso Especial tenha regular seguimento (id. 259032182). Recurso tempestivo, conforme certidão de id. 259089155. Em contrarrazões a agravada pugna pelo desprovimento do recurso; condenação da agravante ao pagamento de honorários recursais (art. 85, § 11, do CPC); aplicação de multa de 5% sobre o valor atualizado da causa (art. 134-A, § 2º, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso) (id. 266891287). É o relatório. Cuiabá/MT, datado e assinado digitalmente. Desa. Nilza Maria Pôssas de Carvalho Vice-Presidente V O T O R E L A T O R V O TO DESEMBARGADORA NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO Egrégio Plenário: Como relatado, trata-se de Agravo Interno interposto por STONE PAGAMENTOS S. A., contra decisão da Vice-Presidência que negou seguimento ao Recurso Especial, com fundamento no artigo 1.030, I, “b”, do CPC (Tema 466), e o inadmitiu com fulcro no inciso V do mesmo dispositivo (Súmula 7/STJ). De início, pertinente o registro que o agravante apenas se insurge contra o ponto da decisão agravada que negou seguimento ao Recurso Especial, com fundamento no artigo 1.030, I, “b”, do CPC (Tema 466). Sobre a parte que inadmitiu o recurso, o agravante interpôs Agravo ao STJ. Pois bem. Em resumo, a agravante interpôs Recurso Especial com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea “a” e “c”, da Constituição Federal, em face do v. acórdão prolatado pela Egrégia Terceira Câmara de Direito Privado (id 236859169). Ampara sua pretensão na suposta violação aos arts. 186, 187, 884 e 927 do Código Civil e argumenta a inexistência do dano extrapatrimonial pela agravada, de modo que não há falar em responsabilidade do agravante e, muito menos, em indenização a qualquer título além de divergência jurisprudencial. A questão está afetada pela sistemática de recursos repetitivos, sendo necessária, portanto, a sua aplicação no caso. Nesse passo, o aresto recorrido está em conformidade com a orientação da Corte Superior, visto que as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias. Por oportuno, transcrevo trecho da decisão agravada por entender que os argumentos e fundamentos lançados nas razões recursais não bastam para alterá-la: “Da sistemática de recursos repetitivos Alega-se violação aos artigos 186, 187 e 927, todos do Código Civil, sob a assertiva de que não havendo a comprovação de existência de qualquer dano, não há que se falar em responsabilidade da Recorrente e, muito menos, em indenização a qualquer título. A questão abordada encontra-se afetada pela sistemática de recursos repetitivos, sendo necessária a sua aplicação no caso. No julgamento dos recursos paradigmas REsps ns. 1.197.929/PR e 1.199782/PR, Tema 466, o Superior Tribunal de Justiça concluiu que as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, consoante ementa a seguir transcrita: “RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS. DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FORTUITO INTERNO. RISCO DO EMPREENDIMENTO. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno. 2. Recurso especial provido”. (REsp 1197929/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/08/2011, DJe 12/09/2011). (g.n) O órgão fracionário deste Tribunal, por sua vez, entendeu que “É exatamente o que preceitua a Súmula 479 do STJ, segundo a qual “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.” (SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/06/2012, DJe 01/08/2012). (g.n) Assim, observa-se que o aresto recorrido se encontra em conformidade com a orientação do STJ, pois, para este caso, ambos os Tribunais entenderam que as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, devendo o recurso ser inadmitido. Quanto às demais controvérsias discutidas neste recurso, não foi encontrado nenhum outro afetado no Superior Tribunal de Justiça que se aplique a esta decisão, razão pela qual passo ao exame dos demais pressupostos de admissibilidade. Decisão em conformidade com o STJ (Súmula 83 do STJ) A Súmula 83 do STJ preconiza que “não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida”. In casu, a parte recorrente alega ofensa aos artigos 186, 187, 884 e 927 do Código Civil, que não houve dano extrapatrimonial por parte da Recorrida, não havendo a comprovação de existência de qualquer dano, não há que se falar em responsabilidade da Recorrente e, muito menos, em indenização a qualquer título além de divergência jurisprudencial. Quanto a este ponto, no acórdão impugnado ficou consignado in verbis: “(...) Quanto aos danos morais, verifica-se dos fatos narrados na inicial, que houve falha na prestação do serviço do requerido, culminando com a utilização de documentos da autora para abertura de conta corrente e prática de atos ilícitos, gerando prejuízos para a consumidora, já que a autora foi processada pela vítima do suposto golpe discutido nos autos de n. 1008866-83.2022.8.11.0015. A abertura não autorizada de uma conta bancária em seu nome e a utilização dessa conta para a prática de crimes, seguida pela citação judicial, demonstram claramente a negligência da instituição financeira requerida. Esta falhou em validar corretamente as solicitações de abertura de conta e na identificação pessoal dos clientes, resultando em graves consequências para a autora, que viu sua integridade moral e emocional seriamente afetadas. Assim, todo esse ocorrido, causou transtornos na vida da parte autora, ultrapassando a esfera do mero aborrecimento cotidiano, sendo possível verificar malferimento de direitos de personalidade. Observa-se que o entendimento do órgão fracionário deste Tribunal está em consonância com a jurisprudência pacífica do STJ no sentido de que As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno, conforme se extrai da ementa do julgado abaixo: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS. DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FORTUITO INTERNO. RISCO DO EMPREENDIMENTO. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno. 2. Recurso especial provido. (REsp n. 1.199.782/PR, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 24/8/2011, DJe de 12/9/2011.) Desse modo, deve ser aplicado o referido verbete sumular quanto à suposta afronta aos 186, 187, 884 e 927 do Código Civil, visto que o entendimento exposto no acórdão recorrido se encontra em sintonia com a orientação sedimentada no STJ. Por fim, consigne-se que, embora a Súmula 83 do STJ tenha sido formulada quando a alegação for fundada no permissivo da alínea “c” do artigo 105, III, da CF, esta é plenamente aplicável na hipótese da alínea “a”. A propósito: PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. USINA HIDRELÉTRICA DE ESTREITO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. TEORIA DA ACTIO NATA. CIÊNCIA DO ATO ILÍCITO GERADOR DO DIREITO. DECISÃO RECORRIDA CONFORME A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 83/STJ. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA N. 283 DO STF. DECISÃO MANTIDA. (...) 3. A Súmula n. 83 do STJ aplica-se aos recursos especiais interpostos com fundamento tanto na alínea ‘c’ quanto na alínea ‘a’ do permissivo constitucional. (...) 5. Agravo interno a que se nega provimento”. (AgInt no AREsp n. 1.544.832/MA, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 28/11/2022, DJe de 5/12/2022). Diante desse quadro, inviável a admissão do recurso neste ponto.” Nesse contexto, o acórdão está suficientemente fundamentado, o que denota-se que a Vice-Presidência aplicou de forma adequada a tese prevista no Tema 466/STJ, sendo o caso de se manter a negativa de seguimento do Recurso Especial, por ordem da alínea “b” do inciso I do artigo 1.030 do CPC. Portanto, os fundamentos apresentados pela agravante não são suficientes para alterar o entendimento já esposado na decisão agravada no ponto em questão, não demonstram sua impropriedade e nem apresentam os requisitos necessários para sua modificação. Sem majoração dos honorários recursais. Deixo de aplicar a multa pretendida pela agravada. Antes o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/05/2025

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Processo nº 1008958-61.2022.8.11.0015

ID: 298490024

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1008958-61.2022.8.11.0015

Data de Disponibilização: 13/06/2025

Polo Ativo:

JOSE ROBERTO DA SILVEIRA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

LUIZ PIRES ROCHA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008958-61.2022.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação, Promessa de Com… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008958-61.2022.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação, Promessa de Compra e Venda] Relator: Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [JOSE GILBERTO DE PAULA - CPF: 595.266.028-20 (APELADO), ANELISE INES ANDRUCHAK - CPF: 615.599.891-49 (ADVOGADO), ELIZANGELA BRAGA SOARES ALTOE - CPF: 042.841.076-66 (ADVOGADO), CLOVIS ALEXANDRE STASIAK NERIS - CPF: 903.931.551-53 (ADVOGADO), JOSE ROBERTO DA SILVEIRA - CPF: 825.790.918-15 (APELANTE), LUIZ PIRES ROCHA - CPF: 325.623.141-15 (ADVOGADO), PEDRO EDUARDO TEIXEIRA COELHO DE OLIVEIRA - CPF: 721.327.011-72 (ASSISTENTE), DAVID BORGES SEVERINO - CPF: 551.409.801-00 (ASSISTENTE), VALMIR PEREIRA DA SILVA - CPF: 362.675.891-53 (ASSISTENTE), JANE YONE GRUBER SILVA - CPF: 535.854.291-49 (ASSISTENTE), ANTONIO SERGIO MARQUES BARBOSA - CPF: 256.409.548-84 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Direito Civil. Ação Anulatória. Golpe Do Intermediário Na Venda De Veículo. Dolo De Terceiro. Culpa Grave Do Comprador. Negócio Anulado. Recurso Desprovido. I. Caso em exame 1. Ação anulatória ajuizada por vendedor de veículo em face do comprador, alegando vício de consentimento decorrente de golpe de “intermediação fraudulenta” praticado por terceiro (estelionatário), com pedido de anulação do negócio, manutenção da posse do veículo e devolução de chaves e documentos. 2. Comprador defende boa-fé e validade do negócio, sustentando ter pago parte do valor ajustado. II. Questão em discussão 3. A questão controvertida consiste em verificar (i) a existência de vício de consentimento por dolo de terceiro; e (ii) a responsabilidade do comprador por ter realizado o pagamento a terceiro estranho à relação jurídica. III. Razões de decidir 4. O dolo de terceiro autoriza a anulação do negócio jurídico quando vicia o consentimento de uma das partes (art. 171, II, CC), especialmente se há contribuição culposa do contratante. 5. A conduta do comprador demonstrou culpa grave, ao transferir valor inferior ao anunciado para conta bancária de pessoa desconhecida, sem verificar a titularidade e sem comunicação direta com o vendedor. 6. O comportamento do comprador violou o dever de diligência e a boa-fé objetiva, contribuindo para a fraude e afastando a presunção de boa-fé. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: "O comprador que, ciente da identidade do real vendedor, efetua pagamento a terceiro estranho à relação, por valor muito inferior ao ajustado, responde pela anulação do negócio por vício de consentimento e não pode alegar boa-fé". ____________________________ Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 171, II, e 308. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, Recurso Inominado 1001006-27.2023.8.11.0005; TJ-RR, AC 0825841-83.2021.8.23.0010. R E L A T Ó R I O RECURSO DE APELAÇÃO N.º 1008958-61.2022.8.11.0015 Trata-se de Recurso de Recurso de Apelação interposto por José Roberto da Silveira em virtude da sentença única proferida pelo Juiz da 3ª Vara Cível da Comarca de Sinop, que julgou 02 (duas) ações conexas: Ação Anulatória de Negócio Jurídico ajuizada por José Gilberto de Paula, representado pelo procurador Antônio Sérgio Marques Barbosa, em face de José Roberto da Silveira, e; Ação Cautelar Incidental nº 1008866-83.2022.8.11.0015 manejada por José Roberto da Silveira em face de José Gilberto de Paula, seu procurador e de Jucineia de Arruda. A controvérsia refere-se à venda do veículo Toyota Corolla (2012/2013, placa BBA2924), no valor de R$ 72.000,00 (setenta e dois mil reais), mediante anúncio na rede social Facebook, que teria sido intermediada por terceiro fraudador (identificado como “Cristiano”), que conduziu ambas as partes a negociarem de forma desconexa, causando prejuízo ao vendedor José Gilberto de Paula, que não recebeu qualquer valor pela alienação, mas assinou o documento de transferência do veículo, que está na posse do Recorrente. O Juiz de 1º grau julgou procedente o pedido feito na Ação Anulatória ao fundamento de que houve vício de consentimento (dolo) do vendedor e imprudência do comprador, além de falta de pagamento ao credor legítimo. Determinou a restituição da posse do veículo, no prazo de 05 (cinco) dias, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), até o limite de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Lado outro, na Ação Cautelar, julgou extinta, sem resolução do mérito, em face de Jucineia de Arruda. E, no mérito, julgou improcedente o pedido de consolidação da propriedade por parte do comprador, e revogou a liminar de busca e apreensão. Compeliu o Recorrente a arcar o ônus da sucumbência tanto na Ação Anulatória, quanto na Ação Cautelar, cujos honorários foram fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa em cada uma das demandas; no entanto, suspendeu a exigibilidade por ser beneficiário da justiça gratuita. Inconformado, o Recorrente alegou que a venda foi concretizada mediante assinatura do recibo de transferência, cujo preenchimento foi feito pelo procurador do vendedor, Sr. Antônio Sérgio Marques Barbosa. Contudo, após a transferência formal e efetuado o pagamento do preço, o procurador se recusou a entregar o bem, alegando não ter recebido o valor do intermediário, e que se tratava de fraude ("golpe da OLX"). Sustentou, em síntese, a boa-fé objetiva e subjetiva. Afirmou desconhecer o golpe e que agiu com diligência, tanto que buscou auxílio de terceiros para realizar a compra. Disse que pagou o valor anunciado, com desconto correspondente a débitos de IPVA (R$ 3.055,13), no total de R$ 49.100,00 (quarenta e nove mil reais), seguindo à risca as orientações do intermediário “Cristiano”, mediante o depósito feito na conta corrente de Jucineia de Arruda. Arguiu que o procurador do Recorrido é pessoa experiente no comércio e preencheu o recibo com valor menor (R$ 50.000,00), o que revela seu consentimento e ausência de erro essencial. Afirmou que quem foi negligente ao confiar em “Cristiano”, sem formalidades, é o próprio vendedor. Disse que, mesmo quitado o preço da negociação, foi forçado a ajuizar a Ação Cautelar para obter a posse do veículo, tendo sido deferida a busca e apreensão liminarmente. Arguiu que, também, foi vítima do golpe perpetrado por “Cristiano” (art. 148, CC), e que não há prova de intenção dolosa ou participação na fraude. Com suporte nesses argumentos, pediu a reforma integral da sentença, a fim de julgar improcedente o pedido anulatório, e procedente o pedido de consolidação da posse e propriedade do veículo, confirmando-se a liminar de busca e apreensão. Contrarrazões anexadas no ID 274743528. É o relatório. V O T O R E L A T O R Eminentes Pares, José Gilberto de Paula, representado por Antônio Sérgio Marques Barbosa, ajuizou Ação Anulatória em face de José Roberto da Silveira, sob o fundamento de vício de consentimento decorrente de dolo de terceiro, praticado por meio de fraude eletrônica conhecida como golpe de “intermediação fraudulenta”, usual em plataformas digitais como “OLX” ou Facebook. Narrou que, em maio de 2022, anunciou no Facebook a venda do veículo Toyota Corolla 2013/2013, XEI20FLEX, placa BBA2924, CHASSI 9BRBD48E7D2606645, Renavam 00526972262, cor prata, álcool/gasolina, pelo valor de R$ 72.000,00 (setenta e dois mil reais). Passados alguns dias, foi contatado por um indivíduo que se apresentou como “Cristiano”, afirmando intermediar a quitação de dívida do comprador, ora Recorrente. Após a avaliação do veículo por José Roberto, o falso intermediador orientou o preenchimento do documento de transferência por valor inferior ao anunciado (R$ 50.000,00), supostamente para fins tributários. O vendedor, no entanto, condicionou a conclusão do negócio à efetiva quitação do valor integral anunciado. Ocorre que, induzido em erro pelo fraudador, recebeu comprovante falso de TED e, acreditando no pagamento, entregou os documentos e a posse do veículo. Apenas posteriormente constatou que o valor não fora creditado. Considerando que as chaves estavam com o Recorrente, este retornou para buscar o veículo e, somente nesse momento, disse que havia transferido a importância de R$ 49.100,00 (quarenta e nove mil e cem reais), a pedido de “Cristiano”, para a conta corrente de Jucineia de Arruda. Identificado o golpe, o Recorrido ficou com a posse do veículo, ao passo que o Recorrente com as chaves e o documento. Em razão dos fatos, o Recorrido (vendedor) pediu a anulação de negócio jurídico, manutenção da posse do veículo, devolução das chaves e documentos do automóvel, e o impedimento de transferência junto ao Detran. Invocou o vício de vontade por dolo de terceiro, o que macula de nulidade o negócio jurídico. Argumentou que agiu de boa-fé e não concorreu para o resultado danoso. Defendeu que o reconhecimento de firma no CRV – Certificado de Registro de Veículo não caracteriza a tradição (art. 1.267 do CC), tanto que o bem não fora entregue fisicamente. Imputou a culpa exclusiva do Recorrente (comprador), face sua negligência, pois pagou quantia inferior (R$ 49.100,00) ao anunciado (R$ 72.000,00) e na conta corrente de Jucineia de Arruda, pessoa totalmente desconhecida do Recorrido e estranha à relação. Argumentou que o Recorrente deveria ter se certificado com o Recorrido (na pessoa do seu procurador) o valor da operação, e que não se atentou à discrepância entre o valor depositado e o valor de mercado (veículo vendido abaixo da FIPE), o que significa que teria agido com intuito de se beneficiar da intermediação fraudulenta. Na defesa, o Recorrente confirmou que o veículo foi anunciado por R$ 72.000,00 (setenta e dois mil reais), e que a negociação foi conduzida por “Cristiano”. Sustenta ter adquirido o veículo, de boa-fé, pelo valor de R$ 52.000,00 (cinquenta e dois mil reais), dos quais R$ 49.100,00 (quarenta e nove mil e cem reais) foram transferidos para a conta indicada pelo “intermediário”, com ciência e presença do procurador do Recorrido, que acompanhou a transação, assinou o recibo de transferência e autorizou a vistoria do veículo. Alegou que o valor preenchido no documento, de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), é compatível com o bem, sobretudo porque foram ajustados com “Cristiano” os descontos de pendências, como por exemplo, o IPVA em atraso (R$ 3.055,13). Argumentou que somente depois de concretizado o pagamento na conta de Jucineia Arruda, o Recorrido passou a alegar o golpe, com a recusa de entrega do veículo. Afirmou que em golpes iniciados ou realizados por meio de plataformas de venda (OLX, Facebook), o prejuízo deve ser suportado por aquele assumiu os riscos da negociação sem a devida diligência, devendo buscar a reparação diretamente do fraudador. No mais, aduziu ter manejado Ação Cautelar (processo conexo) e obteve liminar de busca e apreensão. Deferida a prova oral, tomou-se o depoimento das partes e foram ouvidas testemunhas – ID 274743513. Logo em seguida, a instrução foi encerrada. Ao prolatar a sentença, o Juiz da causa acolheu o pedido do vendedor (Recorrido) e anulou o negócio jurídico com o retorno do estado anterior, mediante a devolução do veículo negociado. Lado outro, julgou improcedente o pedido feito na Ação Cautelar, ajuizada pelo comprador (Recorrente), de consolidação da propriedade do bem. Na Ação Anulatória, o Juiz reconheceu a existência de vício de consentimento (dolo) nos termos do art. 171, II, do Código Civil, e considerou que o comprador agiu com culpa grave, ao efetuar pagamento a terceiro estranho à relação jurídica, pois transferiu valor para conta bancária de Jucineia de Arruda, mesmo ciente da titularidade do veículo, e sem se certificar das condições legítimas de pagamento. Destacou que o Recorrente agiu de forma omissa e em doloso, pois ocultou do vendedor (Recorrido) o real valor que seria pago - R$ 49.100,00 (quarenta e nove mil reais) em vez de R$ 72.000,00 (setenta e dois mil reais) – e, livremente, aceitou proposta sabidamente incompatível com o valor de mercado, o que evidenciou seu intuito de obtenção de vantagem indevida. Fundamentou que a prova oral apontou comportamento imprudente e ausência de diligência mínima do comprador. Obtemperou, à luz do art. 308 do Código Civil, que “quem paga mal, paga duas vezes”, não sendo possível impor ao real proprietário a responsabilidade pela negligência do adquirente. Na Ação Cautelar, reconheceu a ilegitimidade passiva de Jucineia de Arruda, diante da comprovação de que a conta utilizada na transação fraudulenta foi aberta, indevidamente, em seu nome, mediante golpe, consoante sentença proferida no bojo do Processo nº 1031352-04.2022.8.11.0002. No mérito, rechaçou o pedido cautelar feito pelo comprador Recorrente, e revogou a liminar de busca e apreensão, diante da comprovação de que o próprio comprador contribuiu dolosamente para concretude da fraude. Inconformado, o comprador recorreu. Com efeito, o art. 171, II, CC, autoriza a anulação do negócio jurídico por vício de consentimento. O argumento central da apelação é a de que é adquirente de boa-fé, com base em sua idade e inexperiência. No entanto, a boa-fé não se presume quando os fatos demonstram imprudência grave ou mesmo dolo eventual. Depois de estudar este caso, não tenho dúvidas em confirmar a sentença. A prova dos autos demonstra que o consentimento do Recorrido (vendedor) foi viciado por dolo de terceiro (estelionatário), agravado pela conduta imprudente e omissiva do Recorrente (comprador). Isso porque, mesmo ciente da identidade do real vendedor e munido de informações sobre a documentação do veículo, o Recorrente optou por pagar a uma terceira pessoa, desconhecida, ignorando os riscos. Ficou demonstrado que o Recorrente efetuou pagamento a pessoa estranha à cadeia negocial, sem relação jurídica com o bem (Sra. Jucineia de Arruda), mesmo com acesso à documentação que indicava, claramente, quem era o proprietário do veículo e seu procurador legal. Além disso, a prova oral produzida deixou evidente que o Recorrente não questionou o valor muito inferior ao anunciado (R$ 72.000,00) e, também, ao praticado no mercado à época (avaliado em R$ 65.932,00), isto é, pagou a importância de R$ 49.100,00 (quarenta e nove mil e cem reais), com a clara intenção de benefício próprio. A prova oral, também, deixou claro que o Recorrente recebeu orientação de testemunhas para não efetuar pagamento sem garantias, o que ignorou, e agiu com euforia e pressa para concluir o negócio, como se observa nos áudios arquivados nos autos. Tais elementos de prova corroboram a conclusão do Juiz de origem, de que o Recorrente não pode ser tido como vítima da situação, mas sim como alguém que contribuiu para o resultado fraudulento, ao agir com temeridade e expectativa de lucro fácil. A alegada inexperiência do comprador, embora relevante, não elide sua responsabilidade por ignorar alertas e sinais de fraude. Além disso, o art. 308 do CC invalida o pagamento feito a quem não é credor ou representante. Com efeito, é certo que a jurisprudência entende que, em fraudes do tipo “golpe do OLX”, tanto comprador quanto vendedor podem ser vítimas, mas essa conclusão não é estanque, e sim casuística. E, neste caso, o Recorrente assumiu os riscos do seu comportamento desidioso, ao pagar preço inferior ao da venda e na conta de alguém desconhecido do vendedor. Nesse sentido, trago jurisprudências: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. VENDA DE VEÍCULO. GOLPE OLX. ESTELIONATÁRIO INTERMEDIADOR. VENDEDOR E COMPRADOR VÍTIMAS DA FRAUDE. FALTA DE CAUTELA DO COMPRADOR. TRANSFERÊNCIA BANCÁRIA PARA TERCEIRO ESTRANHO AOS AUTOS. VÍCIO NO NEGÓCIO JURÍDICO. DOLO DE TERCEIRO. ANULAÇÃO CABÍVEL. RETORNO DAS PARTES AO STATUS QUO ANTE. AUSENTES OS ELEMENTOS JURÍDICOS CONFIGURADORES DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJ-RR - AC: 0825841-83 .2021.8.23.0010, Relator.: ALMIRO PADILHA, Data de Julgamento: 14/06/2024, Câmara Cível, Data de Publicação: 17/06/2024). RECURSO INOMINADO – AÇÃO DECLARATÓRIA – GOLPE OLX (GOLPE DO INTERMEDIÁRIO) - ANÚNCIO NA INTERNET – VENDA DE VEÍCULO - TRANSFERÊNCIA DO DINHEIRO EFETUADA NA CONTA DE TERCEIRO – FRAUDE EVIDENCIADA – AUSÊNCIA DA CULPA DO RECORRIDO – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO CONHECIDO E DESROVIDO. A falta de cautela na compra de um veículo anunciado pela internet, sobretudo com o depósito de valores em conta de terceiros, desconhecidos e alheios à negociação, não pode impor qualquer responsabilização ao proprietário do veículo. (TJ-MT - RECURSO INOMINADO: 1001006-27.2023.8.11 .0005, Relator.: EULICE JAQUELINE DA COSTA SILVA CHERULLI, Data de Julgamento: 04/12/2023, Primeira Turma Recursal, Data de Publicação: 07/12/2023) Além disso, o Recorrente tenta transferir a responsabilidade ao procurador do Recorrido, ao argumento de que assinou o recibo e entregou a documentação. A despeito disso, é incontroverso que o procurador do recorrido assinou o recibo sob a condição do recebimento do preço, o que não ocorreu. De toda sorte, dúvidas não há de que ambas as partes foram manipuladas por “Cristiano”; no entanto, não há como se imputar culpa exclusiva do vendedor, ou do seu procurador, muito menos a culpa concorrente, em virtude da prova concreta de que o Recorrente assumiu o risco do pagamento irregular. Em vista de todo o exposto, é de rigor a confirmação da sentença única que julgou procedente os pedidos formulados na ação anulatória, por vício de consentimento (dolo de terceiro com negligência do comprador), na violação da boa-fé objetiva e no pagamento feito a pessoa errada, e improcedente a pretensão cautelar de consolidação da posse. Feitos esses esclarecimentos, nego provimento ao apelo. De conseguinte, majoro os honorários advocatícios para 12% (doze por cento) sobre o valor da causa em cada uma das demandas (Anulatória e Cautelar); no entanto, confirmo a suspensão da exigibilidade por ser beneficiário da justiça gratuita. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025

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Processo nº 1008958-61.2022.8.11.0015

ID: 298490026

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1008958-61.2022.8.11.0015

Data de Disponibilização: 13/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JOSE GILBERTO DE PAULA

Acórdão

Advogados:

ANELISE INES ANDRUCHAK

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ELIZANGELA BRAGA SOARES ALTOE

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

CLOVIS ALEXANDRE STASIAK NERIS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008958-61.2022.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação, Promessa de Com… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008958-61.2022.8.11.0015 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação, Promessa de Compra e Venda] Relator: Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [JOSE GILBERTO DE PAULA - CPF: 595.266.028-20 (APELADO), ANELISE INES ANDRUCHAK - CPF: 615.599.891-49 (ADVOGADO), ELIZANGELA BRAGA SOARES ALTOE - CPF: 042.841.076-66 (ADVOGADO), CLOVIS ALEXANDRE STASIAK NERIS - CPF: 903.931.551-53 (ADVOGADO), JOSE ROBERTO DA SILVEIRA - CPF: 825.790.918-15 (APELANTE), LUIZ PIRES ROCHA - CPF: 325.623.141-15 (ADVOGADO), PEDRO EDUARDO TEIXEIRA COELHO DE OLIVEIRA - CPF: 721.327.011-72 (ASSISTENTE), DAVID BORGES SEVERINO - CPF: 551.409.801-00 (ASSISTENTE), VALMIR PEREIRA DA SILVA - CPF: 362.675.891-53 (ASSISTENTE), JANE YONE GRUBER SILVA - CPF: 535.854.291-49 (ASSISTENTE), ANTONIO SERGIO MARQUES BARBOSA - CPF: 256.409.548-84 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Direito Civil. Ação Anulatória. Golpe Do Intermediário Na Venda De Veículo. Dolo De Terceiro. Culpa Grave Do Comprador. Negócio Anulado. Recurso Desprovido. I. Caso em exame 1. Ação anulatória ajuizada por vendedor de veículo em face do comprador, alegando vício de consentimento decorrente de golpe de “intermediação fraudulenta” praticado por terceiro (estelionatário), com pedido de anulação do negócio, manutenção da posse do veículo e devolução de chaves e documentos. 2. Comprador defende boa-fé e validade do negócio, sustentando ter pago parte do valor ajustado. II. Questão em discussão 3. A questão controvertida consiste em verificar (i) a existência de vício de consentimento por dolo de terceiro; e (ii) a responsabilidade do comprador por ter realizado o pagamento a terceiro estranho à relação jurídica. III. Razões de decidir 4. O dolo de terceiro autoriza a anulação do negócio jurídico quando vicia o consentimento de uma das partes (art. 171, II, CC), especialmente se há contribuição culposa do contratante. 5. A conduta do comprador demonstrou culpa grave, ao transferir valor inferior ao anunciado para conta bancária de pessoa desconhecida, sem verificar a titularidade e sem comunicação direta com o vendedor. 6. O comportamento do comprador violou o dever de diligência e a boa-fé objetiva, contribuindo para a fraude e afastando a presunção de boa-fé. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: "O comprador que, ciente da identidade do real vendedor, efetua pagamento a terceiro estranho à relação, por valor muito inferior ao ajustado, responde pela anulação do negócio por vício de consentimento e não pode alegar boa-fé". ____________________________ Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 171, II, e 308. Jurisprudência relevante citada: TJ-MT, Recurso Inominado 1001006-27.2023.8.11.0005; TJ-RR, AC 0825841-83.2021.8.23.0010. R E L A T Ó R I O RECURSO DE APELAÇÃO N.º 1008958-61.2022.8.11.0015 Trata-se de Recurso de Recurso de Apelação interposto por José Roberto da Silveira em virtude da sentença única proferida pelo Juiz da 3ª Vara Cível da Comarca de Sinop, que julgou 02 (duas) ações conexas: Ação Anulatória de Negócio Jurídico ajuizada por José Gilberto de Paula, representado pelo procurador Antônio Sérgio Marques Barbosa, em face de José Roberto da Silveira, e; Ação Cautelar Incidental nº 1008866-83.2022.8.11.0015 manejada por José Roberto da Silveira em face de José Gilberto de Paula, seu procurador e de Jucineia de Arruda. A controvérsia refere-se à venda do veículo Toyota Corolla (2012/2013, placa BBA2924), no valor de R$ 72.000,00 (setenta e dois mil reais), mediante anúncio na rede social Facebook, que teria sido intermediada por terceiro fraudador (identificado como “Cristiano”), que conduziu ambas as partes a negociarem de forma desconexa, causando prejuízo ao vendedor José Gilberto de Paula, que não recebeu qualquer valor pela alienação, mas assinou o documento de transferência do veículo, que está na posse do Recorrente. O Juiz de 1º grau julgou procedente o pedido feito na Ação Anulatória ao fundamento de que houve vício de consentimento (dolo) do vendedor e imprudência do comprador, além de falta de pagamento ao credor legítimo. Determinou a restituição da posse do veículo, no prazo de 05 (cinco) dias, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), até o limite de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Lado outro, na Ação Cautelar, julgou extinta, sem resolução do mérito, em face de Jucineia de Arruda. E, no mérito, julgou improcedente o pedido de consolidação da propriedade por parte do comprador, e revogou a liminar de busca e apreensão. Compeliu o Recorrente a arcar o ônus da sucumbência tanto na Ação Anulatória, quanto na Ação Cautelar, cujos honorários foram fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa em cada uma das demandas; no entanto, suspendeu a exigibilidade por ser beneficiário da justiça gratuita. Inconformado, o Recorrente alegou que a venda foi concretizada mediante assinatura do recibo de transferência, cujo preenchimento foi feito pelo procurador do vendedor, Sr. Antônio Sérgio Marques Barbosa. Contudo, após a transferência formal e efetuado o pagamento do preço, o procurador se recusou a entregar o bem, alegando não ter recebido o valor do intermediário, e que se tratava de fraude ("golpe da OLX"). Sustentou, em síntese, a boa-fé objetiva e subjetiva. Afirmou desconhecer o golpe e que agiu com diligência, tanto que buscou auxílio de terceiros para realizar a compra. Disse que pagou o valor anunciado, com desconto correspondente a débitos de IPVA (R$ 3.055,13), no total de R$ 49.100,00 (quarenta e nove mil reais), seguindo à risca as orientações do intermediário “Cristiano”, mediante o depósito feito na conta corrente de Jucineia de Arruda. Arguiu que o procurador do Recorrido é pessoa experiente no comércio e preencheu o recibo com valor menor (R$ 50.000,00), o que revela seu consentimento e ausência de erro essencial. Afirmou que quem foi negligente ao confiar em “Cristiano”, sem formalidades, é o próprio vendedor. Disse que, mesmo quitado o preço da negociação, foi forçado a ajuizar a Ação Cautelar para obter a posse do veículo, tendo sido deferida a busca e apreensão liminarmente. Arguiu que, também, foi vítima do golpe perpetrado por “Cristiano” (art. 148, CC), e que não há prova de intenção dolosa ou participação na fraude. Com suporte nesses argumentos, pediu a reforma integral da sentença, a fim de julgar improcedente o pedido anulatório, e procedente o pedido de consolidação da posse e propriedade do veículo, confirmando-se a liminar de busca e apreensão. Contrarrazões anexadas no ID 274743528. É o relatório. V O T O R E L A T O R Eminentes Pares, José Gilberto de Paula, representado por Antônio Sérgio Marques Barbosa, ajuizou Ação Anulatória em face de José Roberto da Silveira, sob o fundamento de vício de consentimento decorrente de dolo de terceiro, praticado por meio de fraude eletrônica conhecida como golpe de “intermediação fraudulenta”, usual em plataformas digitais como “OLX” ou Facebook. Narrou que, em maio de 2022, anunciou no Facebook a venda do veículo Toyota Corolla 2013/2013, XEI20FLEX, placa BBA2924, CHASSI 9BRBD48E7D2606645, Renavam 00526972262, cor prata, álcool/gasolina, pelo valor de R$ 72.000,00 (setenta e dois mil reais). Passados alguns dias, foi contatado por um indivíduo que se apresentou como “Cristiano”, afirmando intermediar a quitação de dívida do comprador, ora Recorrente. Após a avaliação do veículo por José Roberto, o falso intermediador orientou o preenchimento do documento de transferência por valor inferior ao anunciado (R$ 50.000,00), supostamente para fins tributários. O vendedor, no entanto, condicionou a conclusão do negócio à efetiva quitação do valor integral anunciado. Ocorre que, induzido em erro pelo fraudador, recebeu comprovante falso de TED e, acreditando no pagamento, entregou os documentos e a posse do veículo. Apenas posteriormente constatou que o valor não fora creditado. Considerando que as chaves estavam com o Recorrente, este retornou para buscar o veículo e, somente nesse momento, disse que havia transferido a importância de R$ 49.100,00 (quarenta e nove mil e cem reais), a pedido de “Cristiano”, para a conta corrente de Jucineia de Arruda. Identificado o golpe, o Recorrido ficou com a posse do veículo, ao passo que o Recorrente com as chaves e o documento. Em razão dos fatos, o Recorrido (vendedor) pediu a anulação de negócio jurídico, manutenção da posse do veículo, devolução das chaves e documentos do automóvel, e o impedimento de transferência junto ao Detran. Invocou o vício de vontade por dolo de terceiro, o que macula de nulidade o negócio jurídico. Argumentou que agiu de boa-fé e não concorreu para o resultado danoso. Defendeu que o reconhecimento de firma no CRV – Certificado de Registro de Veículo não caracteriza a tradição (art. 1.267 do CC), tanto que o bem não fora entregue fisicamente. Imputou a culpa exclusiva do Recorrente (comprador), face sua negligência, pois pagou quantia inferior (R$ 49.100,00) ao anunciado (R$ 72.000,00) e na conta corrente de Jucineia de Arruda, pessoa totalmente desconhecida do Recorrido e estranha à relação. Argumentou que o Recorrente deveria ter se certificado com o Recorrido (na pessoa do seu procurador) o valor da operação, e que não se atentou à discrepância entre o valor depositado e o valor de mercado (veículo vendido abaixo da FIPE), o que significa que teria agido com intuito de se beneficiar da intermediação fraudulenta. Na defesa, o Recorrente confirmou que o veículo foi anunciado por R$ 72.000,00 (setenta e dois mil reais), e que a negociação foi conduzida por “Cristiano”. Sustenta ter adquirido o veículo, de boa-fé, pelo valor de R$ 52.000,00 (cinquenta e dois mil reais), dos quais R$ 49.100,00 (quarenta e nove mil e cem reais) foram transferidos para a conta indicada pelo “intermediário”, com ciência e presença do procurador do Recorrido, que acompanhou a transação, assinou o recibo de transferência e autorizou a vistoria do veículo. Alegou que o valor preenchido no documento, de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), é compatível com o bem, sobretudo porque foram ajustados com “Cristiano” os descontos de pendências, como por exemplo, o IPVA em atraso (R$ 3.055,13). Argumentou que somente depois de concretizado o pagamento na conta de Jucineia Arruda, o Recorrido passou a alegar o golpe, com a recusa de entrega do veículo. Afirmou que em golpes iniciados ou realizados por meio de plataformas de venda (OLX, Facebook), o prejuízo deve ser suportado por aquele assumiu os riscos da negociação sem a devida diligência, devendo buscar a reparação diretamente do fraudador. No mais, aduziu ter manejado Ação Cautelar (processo conexo) e obteve liminar de busca e apreensão. Deferida a prova oral, tomou-se o depoimento das partes e foram ouvidas testemunhas – ID 274743513. Logo em seguida, a instrução foi encerrada. Ao prolatar a sentença, o Juiz da causa acolheu o pedido do vendedor (Recorrido) e anulou o negócio jurídico com o retorno do estado anterior, mediante a devolução do veículo negociado. Lado outro, julgou improcedente o pedido feito na Ação Cautelar, ajuizada pelo comprador (Recorrente), de consolidação da propriedade do bem. Na Ação Anulatória, o Juiz reconheceu a existência de vício de consentimento (dolo) nos termos do art. 171, II, do Código Civil, e considerou que o comprador agiu com culpa grave, ao efetuar pagamento a terceiro estranho à relação jurídica, pois transferiu valor para conta bancária de Jucineia de Arruda, mesmo ciente da titularidade do veículo, e sem se certificar das condições legítimas de pagamento. Destacou que o Recorrente agiu de forma omissa e em doloso, pois ocultou do vendedor (Recorrido) o real valor que seria pago - R$ 49.100,00 (quarenta e nove mil reais) em vez de R$ 72.000,00 (setenta e dois mil reais) – e, livremente, aceitou proposta sabidamente incompatível com o valor de mercado, o que evidenciou seu intuito de obtenção de vantagem indevida. Fundamentou que a prova oral apontou comportamento imprudente e ausência de diligência mínima do comprador. Obtemperou, à luz do art. 308 do Código Civil, que “quem paga mal, paga duas vezes”, não sendo possível impor ao real proprietário a responsabilidade pela negligência do adquirente. Na Ação Cautelar, reconheceu a ilegitimidade passiva de Jucineia de Arruda, diante da comprovação de que a conta utilizada na transação fraudulenta foi aberta, indevidamente, em seu nome, mediante golpe, consoante sentença proferida no bojo do Processo nº 1031352-04.2022.8.11.0002. No mérito, rechaçou o pedido cautelar feito pelo comprador Recorrente, e revogou a liminar de busca e apreensão, diante da comprovação de que o próprio comprador contribuiu dolosamente para concretude da fraude. Inconformado, o comprador recorreu. Com efeito, o art. 171, II, CC, autoriza a anulação do negócio jurídico por vício de consentimento. O argumento central da apelação é a de que é adquirente de boa-fé, com base em sua idade e inexperiência. No entanto, a boa-fé não se presume quando os fatos demonstram imprudência grave ou mesmo dolo eventual. Depois de estudar este caso, não tenho dúvidas em confirmar a sentença. A prova dos autos demonstra que o consentimento do Recorrido (vendedor) foi viciado por dolo de terceiro (estelionatário), agravado pela conduta imprudente e omissiva do Recorrente (comprador). Isso porque, mesmo ciente da identidade do real vendedor e munido de informações sobre a documentação do veículo, o Recorrente optou por pagar a uma terceira pessoa, desconhecida, ignorando os riscos. Ficou demonstrado que o Recorrente efetuou pagamento a pessoa estranha à cadeia negocial, sem relação jurídica com o bem (Sra. Jucineia de Arruda), mesmo com acesso à documentação que indicava, claramente, quem era o proprietário do veículo e seu procurador legal. Além disso, a prova oral produzida deixou evidente que o Recorrente não questionou o valor muito inferior ao anunciado (R$ 72.000,00) e, também, ao praticado no mercado à época (avaliado em R$ 65.932,00), isto é, pagou a importância de R$ 49.100,00 (quarenta e nove mil e cem reais), com a clara intenção de benefício próprio. A prova oral, também, deixou claro que o Recorrente recebeu orientação de testemunhas para não efetuar pagamento sem garantias, o que ignorou, e agiu com euforia e pressa para concluir o negócio, como se observa nos áudios arquivados nos autos. Tais elementos de prova corroboram a conclusão do Juiz de origem, de que o Recorrente não pode ser tido como vítima da situação, mas sim como alguém que contribuiu para o resultado fraudulento, ao agir com temeridade e expectativa de lucro fácil. A alegada inexperiência do comprador, embora relevante, não elide sua responsabilidade por ignorar alertas e sinais de fraude. Além disso, o art. 308 do CC invalida o pagamento feito a quem não é credor ou representante. Com efeito, é certo que a jurisprudência entende que, em fraudes do tipo “golpe do OLX”, tanto comprador quanto vendedor podem ser vítimas, mas essa conclusão não é estanque, e sim casuística. E, neste caso, o Recorrente assumiu os riscos do seu comportamento desidioso, ao pagar preço inferior ao da venda e na conta de alguém desconhecido do vendedor. Nesse sentido, trago jurisprudências: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. VENDA DE VEÍCULO. GOLPE OLX. ESTELIONATÁRIO INTERMEDIADOR. VENDEDOR E COMPRADOR VÍTIMAS DA FRAUDE. FALTA DE CAUTELA DO COMPRADOR. TRANSFERÊNCIA BANCÁRIA PARA TERCEIRO ESTRANHO AOS AUTOS. VÍCIO NO NEGÓCIO JURÍDICO. DOLO DE TERCEIRO. ANULAÇÃO CABÍVEL. RETORNO DAS PARTES AO STATUS QUO ANTE. AUSENTES OS ELEMENTOS JURÍDICOS CONFIGURADORES DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJ-RR - AC: 0825841-83 .2021.8.23.0010, Relator.: ALMIRO PADILHA, Data de Julgamento: 14/06/2024, Câmara Cível, Data de Publicação: 17/06/2024). RECURSO INOMINADO – AÇÃO DECLARATÓRIA – GOLPE OLX (GOLPE DO INTERMEDIÁRIO) - ANÚNCIO NA INTERNET – VENDA DE VEÍCULO - TRANSFERÊNCIA DO DINHEIRO EFETUADA NA CONTA DE TERCEIRO – FRAUDE EVIDENCIADA – AUSÊNCIA DA CULPA DO RECORRIDO – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO CONHECIDO E DESROVIDO. A falta de cautela na compra de um veículo anunciado pela internet, sobretudo com o depósito de valores em conta de terceiros, desconhecidos e alheios à negociação, não pode impor qualquer responsabilização ao proprietário do veículo. (TJ-MT - RECURSO INOMINADO: 1001006-27.2023.8.11 .0005, Relator.: EULICE JAQUELINE DA COSTA SILVA CHERULLI, Data de Julgamento: 04/12/2023, Primeira Turma Recursal, Data de Publicação: 07/12/2023) Além disso, o Recorrente tenta transferir a responsabilidade ao procurador do Recorrido, ao argumento de que assinou o recibo e entregou a documentação. A despeito disso, é incontroverso que o procurador do recorrido assinou o recibo sob a condição do recebimento do preço, o que não ocorreu. De toda sorte, dúvidas não há de que ambas as partes foram manipuladas por “Cristiano”; no entanto, não há como se imputar culpa exclusiva do vendedor, ou do seu procurador, muito menos a culpa concorrente, em virtude da prova concreta de que o Recorrente assumiu o risco do pagamento irregular. Em vista de todo o exposto, é de rigor a confirmação da sentença única que julgou procedente os pedidos formulados na ação anulatória, por vício de consentimento (dolo de terceiro com negligência do comprador), na violação da boa-fé objetiva e no pagamento feito a pessoa errada, e improcedente a pretensão cautelar de consolidação da posse. Feitos esses esclarecimentos, nego provimento ao apelo. De conseguinte, majoro os honorários advocatícios para 12% (doze por cento) sobre o valor da causa em cada uma das demandas (Anulatória e Cautelar); no entanto, confirmo a suspensão da exigibilidade por ser beneficiário da justiça gratuita. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025

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