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"1009895-57.2023.8.26.0229" - Resultados da Busca – Página 27 de 27

Processo nº 1011067-88.2025.8.11.0000

ID: 310336772

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1011067-88.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

FABRICA - QUIMICA, PETROLEO E DERIVADOS LTDA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ISABELA NUGOLI SILVA BASTOS

OAB/MS XXXXXX Desbloquear

FERNANDO FREITAS FERNANDES

OAB/MS XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011067-88.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Adimplemento e Extinção, Desconsideração … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011067-88.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Adimplemento e Extinção, Desconsideração da Personalidade Jurídica] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [ISABELA NUGOLI SILVA BASTOS - CPF: 067.398.021-90 (ADVOGADO), FABRICA - QUIMICA, PETROLEO E DERIVADOS LTDA - CNPJ: 05.853.347/0001-09 (AGRAVANTE), SENNA AUTO PECAS LTDA - CNPJ: 09.000.698/0001-10 (AGRAVADO), BENEDITA BRAS FERREIRA - CPF: 502.588.931-68 (AGRAVADO), SEBASTIAO DE ALENCAR - CPF: 453.738.331-34 (AGRAVADO), FERNANDO FREITAS FERNANDES - CPF: 934.189.812-91 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE BENS DA EMPRESA EXECUTADA. CONTINUIDADE DA ATIVIDADE EMPRESARIAL PELOS MESMOS SÓCIOS EM NOVA RAZÃO SOCIAL. INDÍCIOS DE DESVIO DE FINALIDADE E CONFUSÃO PATRIMONIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INAPLICABILIDADE. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada Senna Auto Peças Ltda., bem como condenou a parte agravante ao pagamento de honorários advocatícios, no curso do cumprimento de sentença vinculado à Ação Monitória n. 1001666-57.2016.8.11.0040. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se a ausência de bens da pessoa jurídica, aliada à continuidade da atividade econômica pelos mesmos sócios sob nova razão social, justifica a desconsideração da personalidade jurídica, nos termos do art. 50 do CC/2002; e (ii) saber se é cabível a condenação em honorários advocatícios no âmbito do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, diante da ausência de previsão legal expressa. III. Razões de decidir 3. Restou demonstrado nos autos que a empresa executada encontra-se com inscrição inapta por omissão fiscal, que foram infrutíferas as tentativas de localização de bens penhoráveis, e que os sócios passaram a atuar no mesmo ramo e endereço por meio de nova empresa, evidenciando indícios de desvio de finalidade e confusão patrimonial (art. 50, §§ 1º e 2º, do CC/2002). 4. A utilização da personalidade jurídica como instrumento de evasão patrimonial, frustrando a legítima satisfação do crédito, autoriza a sua desconsideração, estendendo os efeitos da obrigação aos sócios. 5. No tocante à condenação da parte agravante em honorários advocatícios no incidente, a jurisprudência do STJ firmou entendimento de que, por se tratar de procedimento acessório, não há previsão legal para imposição de sucumbência (art. 85, § 1º, do CPC/2015). IV. Dispositivo e tese 6. Recurso provido. Tese de julgamento: "1. É cabível a desconsideração da personalidade jurídica quando evidenciados indícios de desvio de finalidade e confusão patrimonial, caracterizados pela continuidade das atividades empresariais sob nova razão social pelos mesmos sócios e ausência de bens penhoráveis da empresa original. 2. Não é cabível a condenação em honorários advocatícios no incidente de desconsideração da personalidade jurídica, por ausência de previsão legal específica." Dispositivos relevantes citados: CC/2002, art. 50, §§ 1º e 2º; CPC/2015, arts. 133, 134 e 85, § 1º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 2193642/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 20.03.2023; TJ-MT, AI 1009649-52.2024.8.11.0000, Rel. Des. Marilsen Addario, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 03.07.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO O. SABOIA RIBEIRO (Relator) Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento apresentado por FÁBRICA QUÍMICA PETRÓLEO E DERIVADOS LTDA contra SENNA AUTO PEÇAS LTDA, BENEDITA BRAS FERREIRA e SEBASTIÃO DE ALENCAR, com o objetivo de obter a reforma da decisão interlocutória que julgou improcedente o pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada e, ainda, afastou a condenação em honorários advocatícios, proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Sorriso, nos autos do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica nº 1009895-59.2023.8.11.0040, vinculado ao cumprimento de sentença da Ação Monitória nº 1001666-57.2016.8.11.0040. Alega a recorrente que, esgotadas as tentativas de expropriação de bens da empresa devedora, como consultas SISBAJUD, RENAJUD e buscas por imóveis, restou evidenciado que a pessoa jurídica vem sendo utilizada como escudo para ocultação de bens e frustração de credores. Sustenta que houve encerramento irregular da sociedade, sem a fase de liquidação, além da abertura de nova empresa no mesmo endereço e ramo de atividade, pelos mesmos sócios, configurando fraude e confusão patrimonial, nos termos do art. 50 do Código Civil e art. 34 da Lei n. 12.529/2011. Em suas palavras, “[...] o desvio de todo o capital social de forma irregular configura evidente abuso da personalidade jurídica, uma vez que a Agravada se desfez de todo seu patrimônio sem quitar suas dívidas, fato esse que enseja a desconsideração da personalidade jurídica”. Aduz ainda que o Juízo de Origem incorreu em erro ao condenar a parte agravante ao pagamento de honorários advocatícios, pois o incidente de desconsideração da personalidade jurídica não enseja condenação em custas ou honorários, diante da ausência de previsão legal no art. 85, §1º, do CPC, conforme reiterada jurisprudência do STJ. Por fim, requer a reforma da decisão agravada, com o consequente acolhimento do pedido de desconsideração da personalidade jurídica e afastamento da condenação em honorários. Em contrarrazões (Id: 292020379), os agravados alegaram que não há demonstração suficiente de desvio de finalidade ou confusão patrimonial, afirmando que o encerramento da empresa decorreu de crise econômica e não de má-fé, e que os documentos apresentados não demonstram fraude. Argumentam que a simples ausência de bens ou encerramento irregular não autoriza a desconsideração da personalidade jurídica, e requerem a manutenção da decisão proferida pelo juízo de origem. A parte agravada apresentou contrarrazões, manifestando pelo desprovimento do recurso de agravo de instrumento (Id: 292020380). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO O. SABOIA RIBEIRO (Relator) Egrégia Câmara: Conforme relatado anteriormente, trata-se de agravo de instrumento apresentado por FÁBRICA QUÍMICA PETRÓLEO E DERIVADOS LTDA contra SENNA AUTO PEÇAS LTDA, BENEDITA BRAS FERREIRA e SEBASTIÃO DE ALENCAR, com o objetivo de obter a reforma da decisão interlocutória que julgou improcedente o pedido de desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada e, ainda, afastou a condenação em honorários advocatícios. A parte agravante argumenta que não houve registro do distrato social e muito menos a fase de liquidação, tendo o capital social da agravada simplesmente desaparecido. Alega que o desvio de todo o capital social de forma irregular configura evidente abuso da personalidade jurídica, uma vez que a recorrida se desfez de todo o seu patrimônio sem quitar suas dívidas, fato esse que enseja a desconsideração da personalidade jurídica. Além disso, alega que o encerramento e posterior abertura de outra empresa no mesmo endereço pelos sócios, comprovam o encerramento irregular e a lapidação do patrimônio tanto da empresa antecessora quanto dos agravados. A controvérsia gira em torno da possibilidade de deferimento da desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada, com base no art. 50 do Código Civil e nos arts. 133 e 134 do CPC/15, à vista da ausência de bens da pessoa jurídica para satisfação da obrigação, somada à atuação continuada dos sócios sob novo arranjo societário, no mesmo ramo e endereço físico. No caso dos autos, verifica-se que A empresa executada encontra-se com registro inapto por omissão de declarações fiscais, que foram realizadas diversas tentativas de localização de bens (SISBAJUD, RENAJUD, ARISP), todas infrutíferas, bem como que os sócios da empresa devedora passaram a atuar sob nova razão social, com atividade empresarial idêntica e no mesmo endereço físico, o que revela, ao menos em juízo de cognição exauriente, fortes indícios de desvio de finalidade e confusão patrimonial. De acordo com o art. 50, § 1º, do Código Civil, o desvio de finalidade configura-se quando a pessoa jurídica é utilizada para lesar credores. Já a confusão patrimonial, nos termos do § 2º, ocorre quando não há separação fática entre os patrimônios. Cito: “Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. § 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza.” O quadro fático demonstra que a personalidade jurídica da SENNA AUTO PEÇAS LTDA. tem sido utilizada para encobrir a prática de atos que impedem a satisfação legítima do crédito da parte exequente. A inexistência de bens penhoráveis, somada à continuidade simulada das atividades pelos mesmos sócios, sugere o uso indevido da forma societária como instrumento de evasão patrimonial. Tal como assentado pela Segunda Câmara de Direito Privado: “EMENTA RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DE AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURIDICA INDEFERIDA – INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURIDICA EM AUTOS APARTADOS – DESNECESSIDADE – COMPROVADA AUSÊNCIA DE PATRIMÔNIO PARA SATISFAÇÃO DO CREDOR – AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE BENS PELA DEVEDORA – REQUISITOS DEMONSTRADOS SUFICIENTES – DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA – POSSIBILIDADE – DECISÃO REFORMADA – RECURSO PROVIDO. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica pode ser instaurado por petição simples, nos autos da execução ou cumprimento de sentença, não sendo necessária a instauração de processo autônomo. O que se deve analisar, tal como destaca o § 4º do art. 134 do CPC/15, é o preenchimento ou não dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica contidos no art . 50 do CC/2005, com redação dada pela Lei n. 13.874/2019, o qual detalha as hipóteses configuradoras de desvio de finalidade empresarial ou de confusão entre o patrimônio da empresa e o do sócio. A regra de que os direitos e deveres da sociedade não se confundem com os do sócio não é absoluta, sendo possível em algumas situações afastar a personalidade jurídica da empresa para que os sócios respondam pelas suas obrigações a fim de resguardar os interesses dos credores prejudicados . Ademais, a inexistência de bens penhoráveis aliada à ausência de indicação de bens para penhora pela empresa executada, constitui indício de abuso de direito, desvirtuando um dos pressupostos previstos no artigo 50 do Código Civil, autorizando, deste modo, a desconsideração da personalidade jurídica.-“ (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 10096495220248110000, Relator.: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 03/07/2024, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/07/2024) (destaquei) Dessa forma, a decisão de origem deve ser reformada, acolhendo-se o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, a fim de incluir no polo passivo da execução os sócios Benedita Bras Ferreira e Sebastião de Alencar, para que respondam pessoalmente pela obrigação inadimplida. Quanto à condenação da parte agravante ao pagamento de honorários advocatícios no incidente, impõe-se seu afastamento, tendo em vista a natureza acessória do procedimento, sem previsão legal específica para condenação sucumbencial em tal hipótese. Nesse sentido, firmou entendimento o Superior Tribunal de Justiça: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA . CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NÃO CABIMENTO. ART. 85, § 1º, DO CPC . 1. Consoante a jurisprudência desta Corte, é inviável a condenação nos ônus sucumbenciais em incidente de desconsideração da personalidade jurídica, diante da ausência de previsão legal excepcional. 2. Agravo interno não provido.” (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 2193642 SP 2022/0263052-4, Relator.: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/03/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/03/2023) (destaquei) Ante ao exposto, DOU PROVIMENTO ao Agravo de Instrumento, para Reformar a decisão agravada e acolher o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, determinando a inclusão dos sócios Benedita Bras Ferreira e Sebastião de Alencar no polo passivo do cumprimento de sentença da Ação Monitória n. 1001666-57.2016.8.11.0040 e; Afastar a condenação ao pagamento de honorários advocatícios, em razão da inexistência de previsão legal específica para tanto no âmbito do incidente. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025

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Processo nº 1009895-90.2022.8.11.0041

ID: 291094700

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1009895-90.2022.8.11.0041

Data de Disponibilização: 06/06/2025

Polo Ativo:

UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1009895-90.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Serviços Hospitalares, Obrigação de Fazer / Nã… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1009895-90.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Serviços Hospitalares, Obrigação de Fazer / Não Fazer, Tratamento médico-hospitalar, Planos de saúde] Relator: Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (APELANTE), JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), R. J. C. N. - CPF: 101.626.781-93 (APELADO), RISSA LANE CARNIEL - CPF: 012.101.771-02 (ADVOGADO), REMI JOSE CARNIEL JUNIOR - CPF: 703.644.861-04 (APELADO), REMI JOSE CARNIEL JUNIOR - CPF: 703.644.861-04 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Direito Civil E Consumidor. Apelação Cível. Plano De Saúde. Paciente Com Transtorno Do Espectro Autista. Tratamento Multidisciplinar Com Método Aba, Fonoterapia E Terapia Ocupacional. Custeio Em Ambiente Clínico. Exclusão Do Custeio Em Escola E Domicílio. Recurso Parcialmente Provido. I. Caso Em Exame 1. Recurso de apelação interposto contra sentença de procedê ncia do pedido de obrigação de fazer para determinar a cobertura integral de tratamento multidisciplinar prescrito a menor diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista – TEA, incluindo terapias em ambiente clínico, escolar e domiciliar. A sentença condenou a operadora de saúde ao custeio de terapias com método ABA, fonoterapia e terapia ocupacional conforme prescrição médica. A ré sustentou a ausência de previsão contratual e a não obrigatoriedade da cobertura conforme rol da ANS. II. Questão Em Discussão 2. Há duas questões em discussão: i) saber se é obrigatória a cobertura, pelo plano de saúde, de tratamento multidisciplinar prescrito para paciente com TEA, ainda que não previsto no rol da ANS; e ii) saber se a operadora é obrigada a custear terapias realizadas fora do ambiente clínico, em escola e domicílio. III. Razões De Decidir 3. Os contratos de plano de saúde estão submetidos ao CDC, impondo-se a interpretação mais favorável ao consumidor em casos de cláusulas restritivas. 4. O STJ, ao julgar o Tema 1.082 (EREsp 1.886.929/SP), fixou que o rol da ANS é taxativo em regra, mas admite exceções diante de prescrição médica fundamentada, inexistência de tratamento alternativo e comprovação de eficácia. 5. A RN nº 539/2022 da ANS assegura cobertura obrigatória de tratamentos multidisciplinares, inclusive pelo método ABA, com número ilimitado de sessões. 6. O custeio de terapias em ambiente clínico está amparado em prescrição médica fundamentada, eficácia comprovada e previsão normativa. 7. A cobertura de atendimentos fora do ambiente clínico, em escola ou domicílio, com acompanhante terapêutico, não encontra respaldo técnico ou normativo, tendo natureza pedagógica, alheia à cobertura contratual assistencial. IV. Dispositivo E Tese 7. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. O plano de saúde é obrigado a custear tratamento multidisciplinar prescrito para paciente com Transtorno do Espectro Autista, quando houver prescrição médica fundamentada e eficácia comprovada. 2. A operadora não está obrigada a custear terapias realizadas fora do ambiente clínico, como em escola ou domicílio, por se tratar de atividades de natureza pedagógica.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CC, art. 927; CDC, arts. 6º, III, e 47; Lei nº 9.656/1998, art. 12, VI; RN ANS nº 465/2021; RN ANS nº 539/2022. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 1.886.929/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª Seção, j. 08.06.2022; STJ, AgRg no AREsp 354.006/DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 12.08.2013; TJMT, Apelação 1031268-80.2022.8.11.0041, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 01.03.2025. R E L A T Ó R I O Trata-se de Recurso de Apelação interposto por Unimed Cuiabá Cooperativa de Trabalho Médico em virtude da sentença proferida pelo Juízo da 8ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, nos autos da ação ordinária de obrigação de fazer com pedido de tutela antecipada, ajuizada por R.J.C.N., criança representada por seu genitor, Remi José Carniel Júnior, que julgou procedente o pedido formulado na petição inicial, para condenar a Ré a autorizar/custear, de forma contínua, todo o tratamento prescrito ao Autor, qual seja, “Terapia intensiva baseada no conceito ABA com profissional especializado (psicólogo, atendente terapêutico), em ambiente de clínica, escola e domicílio – 40 horas semanais; Terapia ocupacional com foco em integração sensorial - 3 horas semanais; Fonoterapia - 3 horas semanais” pelo método indicado pelo médico assistente, dentro das horas/sessões indicadas pelo profissional de saúde, conforme laudo médico. Em suas razões recursais, alega a Apelante, em síntese, que o tratamento com acompanhante terapêutico, entre outros, não possui cobertura obrigatória por não constar no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) à época da solicitação. Sustenta a legalidade da negativa de cobertura com base na Lei n. 9.656/98, nos contratos firmados entre as partes e nas normativas da ANS vigentes. Requer, ao final, a reforma integral da sentença para julgar improcedentes a demanda, ou subsidiariamente, a redução dos honorários advocatícios. Contrarrazões apresentadas pelo Apelado em que, preliminarmente, suscita perda parcial do objeto por ter migrado de plano de saúde, e no mérito, sustenta a legitimidade do pedido inicial, a necessidade das terapias prescritas e a abusividade da recusa da cobertura pela operadora. Pugna pela manutenção integral da sentença. A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Doutor Paulo Ferreira Rocha, opina pelo parcial provimento do Recurso, apenas para afastar a obrigação da Apelante em fornecer o tratamento fora do ambiente clínico (escolar e domiciliar). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMA. SR.ª DES.ª CLARICE CLAUDINO DA SILVA (RELATORA) Egrégia Câmara: De início, quanto à preliminar de perda superveniente parcial do objeto suscitada nas contrarrazões ao argumento de que o Autor migrou para novo plano de saúde, vinculado à operadora UNIMED FESP/SP, a partir de 27/07/2023, anoto que embora tenha mencionado o fato como “preliminar”, a parte não postulou a extinção parcial do feito, tampouco houve desistência ou renúncia à pretensão de condenação pelo período anterior à referida data. Ao revés, requereu a manutenção integral da sentença proferida, inclusive, com majoração dos honorários recursais. De toda forma, a alegação deve ser compreendida não como causa extintiva, mas como elemento delimitador da obrigação da operadora ao período em que efetivamente perdurou o vínculo contratual entre as partes, até 27/07/2023. Assim, rejeita-se a preliminar de perda parcial do objeto, sem prejuízo de consideração fática no mérito. R.J.C.N. alega que, ao ser diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA), apresentou atrasos no desenvolvimento da fala, na interação social e na motricidade, sintomas que se agravaram nos meses anteriores à propositura da ação. Diante desse quadro clínico, houve expressa recomendação médica para início imediato de tratamento multidisciplinar intensivo, com terapias específicas baseadas no método ABA, fonoaudiologia e terapia ocupacional com foco em integração sensorial. A operadora do plano de saúde, no entanto, negou cobertura integral ao tratamento, sob o argumento de ausência de previsão contratual e de não inclusão no rol da ANS das técnicas recomendadas, especialmente em ambiente escolar e domiciliar. O Juiz a quo deferiu a tutela de urgência para determinar o custeio imediato do tratamento conforme prescrição médica. No mérito, julgou procedentes os pedidos, impondo à operadora a obrigação de fazer, com custeio integral das terapias indicadas. Inconformada, a Ré interpôs este Recurso de Apelação. A controvérsia consiste em analisar a obrigatoriedade de a operadora de plano de saúde custear tratamento multidisciplinar prescrito para paciente diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista – TEA, notadamente quanto à extensão da cobertura para ambientes extra clínicos (escolar e domiciliar). Começo por pontuar que, os contratos de plano de saúde estão submetidos às normas do Código de Defesa do Consumidor, nos termos do Verbete 608 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.”. Assim, na hipótese, deve prevalecer a interpretação mais favorável ao consumidor (art. 47, CDC), especialmente em casos que envolvem cláusulas restritivas de direito, como o rol de cobertura da ANS. No caso, foi expressamente prescrita terapia intensiva pelo método ABA (Análise do Comportamento Aplicada) com profissional especializado, além de fonoterapia e terapia ocupacional com foco em integração sensorial, em ambientes clínico, escolar e domiciliar, consoante está no relatório médico: “[...] O paciente já foi avaliado por equipe multidisciplinar, cujos relatórios e laudos encontram-se em anexo. Em conjunto, optamos por iniciar o tratamento por meio da intervenção precoce, de maneira integrativa e intensiva, já bem respaldada pela literatura médica. Esta deverá ocorrer por tempo indeterminado, da seguinte maneira: - Terapia intensiva baseada no conceito ABA (Análise do Comportamento Aplicada) com profissional especializado (psicólogo, atendente terapeutico), em ambiente de clínica, escola e domicílio – 40 horas semanais. -Terapia ocupacional com foco em integração sensorial - 3 horas semanais -Fonoterapia - 3 horas semanais.” [...]. (relatório médico, Id 271799411). Quanto à alegação de ausência de cobertura no rol da ANS, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento, no julgamento do EREsp 1.886.929/SP (Tema 1.082) publicado no DJE em 03/08/2022, que o rol é taxativo em regra, admitindo exceções apenas quando: i) não houver substituto terapêutico no rol; ii) houver prescrição médica fundamentada; iii) o tratamento for eficaz segundo a medicina baseada em evidências; e iv) houver recomendação de órgãos técnicos como Conitec ou Natjus. Em relação a limitação do número de sessões, o mesmo julgado reconheceu a abusividade da restrição contratual e impulsionou a edição da Resolução Normativa ANS n. 539/2022, que alterou a RN n. 465/2021 para assegurar sessões ilimitadas com fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas no tratamento dos transtornos globais do desenvolvimento (CID F84). Logo, no caso, constata-se que o tratamento prescrito, especialmente a terapia ABA, a terapia ocupacional e a fonoterapia em ambiente clínico, encontra respaldo em recomendação médica fundamentada e possui reconhecimento técnico quanto à sua eficácia, pelo que preenchem tais requisitos, inclusive com amparo na Resolução Normativa ANS n. 539/2022, que passou a prever expressamente a cobertura de tratamentos multidisciplinares para TEA com base no método indicado pelo médico assistente. A propósito, a Resolução Normativa ANS nº 539/2022, vigente desde 1º de julho de 2022, tornou obrigatória a cobertura, pelas operadoras de planos de saúde, de quaisquer métodos ou técnicas indicadas pelo médico assistente, em número ilimitado de sessões com profissionais como fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas, para o tratamento dos transtornos globais do desenvolvimento. Referida norma alterou a RN nº 465/2021 e, em seu art. 6º, § 4º, estabelece que o atendimento deve ser prestado por profissional habilitado para aplicar o método ou técnica prescritos, a impor às operadoras o dever de garantir cobertura integral e irrestrita para o tratamento multidisciplinar indicado. É de se registrar que, mesmo antes da edição da mencionada Resolução, já havia orientação consolidada do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que “é abusiva a cláusula restritiva de direito que exclui do plano de saúde o custeio dos meios necessários ao melhor desempenho do tratamento” (AgRg no AREsp 354.006/DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 12/08/2013). Por outro lado, quanto ao custeio de atendimento fora do ambiente clínico, notadamente em ambiente escolar ou domiciliar, com a presença de acompanhante terapêutico, não há respaldo técnico, normativo ou contratual, tampouco enquadramento nas exceções da tese firmada. Tais atendimentos têm natureza predominantemente pedagógica ou adaptativa, o que extrapola os limites da cobertura assistencial médico-hospitalar dos contratos de saúde suplementar. Em situações semelhantes, cujos fundamentos em tudo aqui se aplicam, as Câmaras de Direito Privado têm assim decidido essa questão: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR DE PACIENTE COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. LIMITAÇÃO DE REEMBOLSO E REDE CREDENCIADA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta pelo plano de saúde contra sentença que determinou o custeio integral de tratamentos multidisciplinares prescritos à parte autora, diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista (TEA), excetuando o acompanhamento escolar, sem limitação de número de sessões e permitindo coparticipação. A recorrente sustenta ausência de cobertura contratual e a impossibilidade de impor métodos específicos não contemplados pelo plano. II. Questão em discussão: Há duas questões em discussão: (i) saber se o plano de saúde é obrigado a custear o tratamento indicado, apesar da ausência de previsão contratual e da alegada taxatividade do rol da ANS; e (ii) se é válida a limitação do atendimento a profissionais da rede credenciada ou ao reembolso segundo a tabela contratual. III. Razões de decidir: A Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS inclui o tratamento multidisciplinar de pessoas com TEA, estabelecendo que o atendimento deve ser realizado por prestadores aptos a executar a técnica prescrita. A preferência pelo uso de rede credenciada deve ser observada. Caso o paciente opte por tratamento fora da rede, o reembolso das despesas limita-se aos valores previstos na tabela contratual, nos termos do art. 12, VI, da Lei n. 9.656/98. O custeio dos métodos indicados (ABA e Denver) deve ser garantido, mas o acompanhamento escolar não se enquadra como obrigação do plano de saúde, sendo função pedagógica, não constituindo obrigação contratual de planos de saúde. IV. Dispositivo e tese: Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. O plano de saúde deve custear tratamentos multidisciplinares para beneficiário com Transtorno do Espectro Autista, observada a técnica prescrita e os limites contratuais de reembolso quando fora da rede credenciada. 2. O acompanhamento em ambiente escolar não se inclui nas obrigações assistenciais do contrato de plano de saúde.” (TJMT, Terceira Câmara de Direito Privado, apelação 1031268-80.2022.8.11.0041, relator Desembargador Carlos Alberto Alves Da Rocha, publicado no DJE 01/03/2025) Dessa forma, impõe-se o parcial provimento do recurso, tão somente para afastar a obrigatoriedade de cobertura das terapias realizadas fora do ambiente clínico (escola e domicílio), mantendo-se a condenação ao custeio das terapias indicadas (ABA, fonoaudiologia e terapia ocupacional) em ambiente clínico, no período em que vigente o contrato entre as partes, isto é, até 27/07/2023. Por fim, o pedido de redução dos honorários sucumbenciais, não merece acolhida. O valor fixado na sentença (R$ 2.000,00) observa os critérios do art. 85, §8º, do CPC, pelo que compatível com a natureza da causa, sua baixa complexidade e a ausência de condenação pecuniária líquida. Logo, ausente desproporcionalidade, mantém-se a verba como arbitrada. Com essas considerações, dou parcial provimento ao Recurso de Apelação tão somente para afastar a obrigatoriedade de custeio das terapias fora do ambiente clínico (escolar e domiciliar), e por conseguinte, mantenho os demais termos da sentença. Não se aplica a majoração prevista no artigo 85, § 11, do CPC, diante do provimento parcial do Apelo. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/06/2025

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Processo nº 1009895-90.2022.8.11.0041

ID: 291094706

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1009895-90.2022.8.11.0041

Data de Disponibilização: 06/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

R. J. C. N.

Acórdão

Advogados:

RISSA LANE CARNIEL

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1009895-90.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Serviços Hospitalares, Obrigação de Fazer / Nã… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1009895-90.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Serviços Hospitalares, Obrigação de Fazer / Não Fazer, Tratamento médico-hospitalar, Planos de saúde] Relator: Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (APELANTE), JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), R. J. C. N. - CPF: 101.626.781-93 (APELADO), RISSA LANE CARNIEL - CPF: 012.101.771-02 (ADVOGADO), REMI JOSE CARNIEL JUNIOR - CPF: 703.644.861-04 (APELADO), REMI JOSE CARNIEL JUNIOR - CPF: 703.644.861-04 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Direito Civil E Consumidor. Apelação Cível. Plano De Saúde. Paciente Com Transtorno Do Espectro Autista. Tratamento Multidisciplinar Com Método Aba, Fonoterapia E Terapia Ocupacional. Custeio Em Ambiente Clínico. Exclusão Do Custeio Em Escola E Domicílio. Recurso Parcialmente Provido. I. Caso Em Exame 1. Recurso de apelação interposto contra sentença de procedê ncia do pedido de obrigação de fazer para determinar a cobertura integral de tratamento multidisciplinar prescrito a menor diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista – TEA, incluindo terapias em ambiente clínico, escolar e domiciliar. A sentença condenou a operadora de saúde ao custeio de terapias com método ABA, fonoterapia e terapia ocupacional conforme prescrição médica. A ré sustentou a ausência de previsão contratual e a não obrigatoriedade da cobertura conforme rol da ANS. II. Questão Em Discussão 2. Há duas questões em discussão: i) saber se é obrigatória a cobertura, pelo plano de saúde, de tratamento multidisciplinar prescrito para paciente com TEA, ainda que não previsto no rol da ANS; e ii) saber se a operadora é obrigada a custear terapias realizadas fora do ambiente clínico, em escola e domicílio. III. Razões De Decidir 3. Os contratos de plano de saúde estão submetidos ao CDC, impondo-se a interpretação mais favorável ao consumidor em casos de cláusulas restritivas. 4. O STJ, ao julgar o Tema 1.082 (EREsp 1.886.929/SP), fixou que o rol da ANS é taxativo em regra, mas admite exceções diante de prescrição médica fundamentada, inexistência de tratamento alternativo e comprovação de eficácia. 5. A RN nº 539/2022 da ANS assegura cobertura obrigatória de tratamentos multidisciplinares, inclusive pelo método ABA, com número ilimitado de sessões. 6. O custeio de terapias em ambiente clínico está amparado em prescrição médica fundamentada, eficácia comprovada e previsão normativa. 7. A cobertura de atendimentos fora do ambiente clínico, em escola ou domicílio, com acompanhante terapêutico, não encontra respaldo técnico ou normativo, tendo natureza pedagógica, alheia à cobertura contratual assistencial. IV. Dispositivo E Tese 7. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. O plano de saúde é obrigado a custear tratamento multidisciplinar prescrito para paciente com Transtorno do Espectro Autista, quando houver prescrição médica fundamentada e eficácia comprovada. 2. A operadora não está obrigada a custear terapias realizadas fora do ambiente clínico, como em escola ou domicílio, por se tratar de atividades de natureza pedagógica.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CC, art. 927; CDC, arts. 6º, III, e 47; Lei nº 9.656/1998, art. 12, VI; RN ANS nº 465/2021; RN ANS nº 539/2022. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 1.886.929/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª Seção, j. 08.06.2022; STJ, AgRg no AREsp 354.006/DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 12.08.2013; TJMT, Apelação 1031268-80.2022.8.11.0041, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 01.03.2025. R E L A T Ó R I O Trata-se de Recurso de Apelação interposto por Unimed Cuiabá Cooperativa de Trabalho Médico em virtude da sentença proferida pelo Juízo da 8ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, nos autos da ação ordinária de obrigação de fazer com pedido de tutela antecipada, ajuizada por R.J.C.N., criança representada por seu genitor, Remi José Carniel Júnior, que julgou procedente o pedido formulado na petição inicial, para condenar a Ré a autorizar/custear, de forma contínua, todo o tratamento prescrito ao Autor, qual seja, “Terapia intensiva baseada no conceito ABA com profissional especializado (psicólogo, atendente terapêutico), em ambiente de clínica, escola e domicílio – 40 horas semanais; Terapia ocupacional com foco em integração sensorial - 3 horas semanais; Fonoterapia - 3 horas semanais” pelo método indicado pelo médico assistente, dentro das horas/sessões indicadas pelo profissional de saúde, conforme laudo médico. Em suas razões recursais, alega a Apelante, em síntese, que o tratamento com acompanhante terapêutico, entre outros, não possui cobertura obrigatória por não constar no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) à época da solicitação. Sustenta a legalidade da negativa de cobertura com base na Lei n. 9.656/98, nos contratos firmados entre as partes e nas normativas da ANS vigentes. Requer, ao final, a reforma integral da sentença para julgar improcedentes a demanda, ou subsidiariamente, a redução dos honorários advocatícios. Contrarrazões apresentadas pelo Apelado em que, preliminarmente, suscita perda parcial do objeto por ter migrado de plano de saúde, e no mérito, sustenta a legitimidade do pedido inicial, a necessidade das terapias prescritas e a abusividade da recusa da cobertura pela operadora. Pugna pela manutenção integral da sentença. A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Doutor Paulo Ferreira Rocha, opina pelo parcial provimento do Recurso, apenas para afastar a obrigação da Apelante em fornecer o tratamento fora do ambiente clínico (escolar e domiciliar). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMA. SR.ª DES.ª CLARICE CLAUDINO DA SILVA (RELATORA) Egrégia Câmara: De início, quanto à preliminar de perda superveniente parcial do objeto suscitada nas contrarrazões ao argumento de que o Autor migrou para novo plano de saúde, vinculado à operadora UNIMED FESP/SP, a partir de 27/07/2023, anoto que embora tenha mencionado o fato como “preliminar”, a parte não postulou a extinção parcial do feito, tampouco houve desistência ou renúncia à pretensão de condenação pelo período anterior à referida data. Ao revés, requereu a manutenção integral da sentença proferida, inclusive, com majoração dos honorários recursais. De toda forma, a alegação deve ser compreendida não como causa extintiva, mas como elemento delimitador da obrigação da operadora ao período em que efetivamente perdurou o vínculo contratual entre as partes, até 27/07/2023. Assim, rejeita-se a preliminar de perda parcial do objeto, sem prejuízo de consideração fática no mérito. R.J.C.N. alega que, ao ser diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA), apresentou atrasos no desenvolvimento da fala, na interação social e na motricidade, sintomas que se agravaram nos meses anteriores à propositura da ação. Diante desse quadro clínico, houve expressa recomendação médica para início imediato de tratamento multidisciplinar intensivo, com terapias específicas baseadas no método ABA, fonoaudiologia e terapia ocupacional com foco em integração sensorial. A operadora do plano de saúde, no entanto, negou cobertura integral ao tratamento, sob o argumento de ausência de previsão contratual e de não inclusão no rol da ANS das técnicas recomendadas, especialmente em ambiente escolar e domiciliar. O Juiz a quo deferiu a tutela de urgência para determinar o custeio imediato do tratamento conforme prescrição médica. No mérito, julgou procedentes os pedidos, impondo à operadora a obrigação de fazer, com custeio integral das terapias indicadas. Inconformada, a Ré interpôs este Recurso de Apelação. A controvérsia consiste em analisar a obrigatoriedade de a operadora de plano de saúde custear tratamento multidisciplinar prescrito para paciente diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista – TEA, notadamente quanto à extensão da cobertura para ambientes extra clínicos (escolar e domiciliar). Começo por pontuar que, os contratos de plano de saúde estão submetidos às normas do Código de Defesa do Consumidor, nos termos do Verbete 608 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.”. Assim, na hipótese, deve prevalecer a interpretação mais favorável ao consumidor (art. 47, CDC), especialmente em casos que envolvem cláusulas restritivas de direito, como o rol de cobertura da ANS. No caso, foi expressamente prescrita terapia intensiva pelo método ABA (Análise do Comportamento Aplicada) com profissional especializado, além de fonoterapia e terapia ocupacional com foco em integração sensorial, em ambientes clínico, escolar e domiciliar, consoante está no relatório médico: “[...] O paciente já foi avaliado por equipe multidisciplinar, cujos relatórios e laudos encontram-se em anexo. Em conjunto, optamos por iniciar o tratamento por meio da intervenção precoce, de maneira integrativa e intensiva, já bem respaldada pela literatura médica. Esta deverá ocorrer por tempo indeterminado, da seguinte maneira: - Terapia intensiva baseada no conceito ABA (Análise do Comportamento Aplicada) com profissional especializado (psicólogo, atendente terapeutico), em ambiente de clínica, escola e domicílio – 40 horas semanais. -Terapia ocupacional com foco em integração sensorial - 3 horas semanais -Fonoterapia - 3 horas semanais.” [...]. (relatório médico, Id 271799411). Quanto à alegação de ausência de cobertura no rol da ANS, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento, no julgamento do EREsp 1.886.929/SP (Tema 1.082) publicado no DJE em 03/08/2022, que o rol é taxativo em regra, admitindo exceções apenas quando: i) não houver substituto terapêutico no rol; ii) houver prescrição médica fundamentada; iii) o tratamento for eficaz segundo a medicina baseada em evidências; e iv) houver recomendação de órgãos técnicos como Conitec ou Natjus. Em relação a limitação do número de sessões, o mesmo julgado reconheceu a abusividade da restrição contratual e impulsionou a edição da Resolução Normativa ANS n. 539/2022, que alterou a RN n. 465/2021 para assegurar sessões ilimitadas com fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas no tratamento dos transtornos globais do desenvolvimento (CID F84). Logo, no caso, constata-se que o tratamento prescrito, especialmente a terapia ABA, a terapia ocupacional e a fonoterapia em ambiente clínico, encontra respaldo em recomendação médica fundamentada e possui reconhecimento técnico quanto à sua eficácia, pelo que preenchem tais requisitos, inclusive com amparo na Resolução Normativa ANS n. 539/2022, que passou a prever expressamente a cobertura de tratamentos multidisciplinares para TEA com base no método indicado pelo médico assistente. A propósito, a Resolução Normativa ANS nº 539/2022, vigente desde 1º de julho de 2022, tornou obrigatória a cobertura, pelas operadoras de planos de saúde, de quaisquer métodos ou técnicas indicadas pelo médico assistente, em número ilimitado de sessões com profissionais como fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas, para o tratamento dos transtornos globais do desenvolvimento. Referida norma alterou a RN nº 465/2021 e, em seu art. 6º, § 4º, estabelece que o atendimento deve ser prestado por profissional habilitado para aplicar o método ou técnica prescritos, a impor às operadoras o dever de garantir cobertura integral e irrestrita para o tratamento multidisciplinar indicado. É de se registrar que, mesmo antes da edição da mencionada Resolução, já havia orientação consolidada do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que “é abusiva a cláusula restritiva de direito que exclui do plano de saúde o custeio dos meios necessários ao melhor desempenho do tratamento” (AgRg no AREsp 354.006/DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 12/08/2013). Por outro lado, quanto ao custeio de atendimento fora do ambiente clínico, notadamente em ambiente escolar ou domiciliar, com a presença de acompanhante terapêutico, não há respaldo técnico, normativo ou contratual, tampouco enquadramento nas exceções da tese firmada. Tais atendimentos têm natureza predominantemente pedagógica ou adaptativa, o que extrapola os limites da cobertura assistencial médico-hospitalar dos contratos de saúde suplementar. Em situações semelhantes, cujos fundamentos em tudo aqui se aplicam, as Câmaras de Direito Privado têm assim decidido essa questão: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR DE PACIENTE COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. LIMITAÇÃO DE REEMBOLSO E REDE CREDENCIADA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta pelo plano de saúde contra sentença que determinou o custeio integral de tratamentos multidisciplinares prescritos à parte autora, diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista (TEA), excetuando o acompanhamento escolar, sem limitação de número de sessões e permitindo coparticipação. A recorrente sustenta ausência de cobertura contratual e a impossibilidade de impor métodos específicos não contemplados pelo plano. II. Questão em discussão: Há duas questões em discussão: (i) saber se o plano de saúde é obrigado a custear o tratamento indicado, apesar da ausência de previsão contratual e da alegada taxatividade do rol da ANS; e (ii) se é válida a limitação do atendimento a profissionais da rede credenciada ou ao reembolso segundo a tabela contratual. III. Razões de decidir: A Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS inclui o tratamento multidisciplinar de pessoas com TEA, estabelecendo que o atendimento deve ser realizado por prestadores aptos a executar a técnica prescrita. A preferência pelo uso de rede credenciada deve ser observada. Caso o paciente opte por tratamento fora da rede, o reembolso das despesas limita-se aos valores previstos na tabela contratual, nos termos do art. 12, VI, da Lei n. 9.656/98. O custeio dos métodos indicados (ABA e Denver) deve ser garantido, mas o acompanhamento escolar não se enquadra como obrigação do plano de saúde, sendo função pedagógica, não constituindo obrigação contratual de planos de saúde. IV. Dispositivo e tese: Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. O plano de saúde deve custear tratamentos multidisciplinares para beneficiário com Transtorno do Espectro Autista, observada a técnica prescrita e os limites contratuais de reembolso quando fora da rede credenciada. 2. O acompanhamento em ambiente escolar não se inclui nas obrigações assistenciais do contrato de plano de saúde.” (TJMT, Terceira Câmara de Direito Privado, apelação 1031268-80.2022.8.11.0041, relator Desembargador Carlos Alberto Alves Da Rocha, publicado no DJE 01/03/2025) Dessa forma, impõe-se o parcial provimento do recurso, tão somente para afastar a obrigatoriedade de cobertura das terapias realizadas fora do ambiente clínico (escola e domicílio), mantendo-se a condenação ao custeio das terapias indicadas (ABA, fonoaudiologia e terapia ocupacional) em ambiente clínico, no período em que vigente o contrato entre as partes, isto é, até 27/07/2023. Por fim, o pedido de redução dos honorários sucumbenciais, não merece acolhida. O valor fixado na sentença (R$ 2.000,00) observa os critérios do art. 85, §8º, do CPC, pelo que compatível com a natureza da causa, sua baixa complexidade e a ausência de condenação pecuniária líquida. Logo, ausente desproporcionalidade, mantém-se a verba como arbitrada. Com essas considerações, dou parcial provimento ao Recurso de Apelação tão somente para afastar a obrigatoriedade de custeio das terapias fora do ambiente clínico (escolar e domiciliar), e por conseguinte, mantenho os demais termos da sentença. Não se aplica a majoração prevista no artigo 85, § 11, do CPC, diante do provimento parcial do Apelo. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/06/2025

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Processo nº 1010668-58.2022.8.11.0002

ID: 324732988

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1010668-58.2022.8.11.0002

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010668-58.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Efeitos, Tratament… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010668-58.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Efeitos, Tratamento médico-hospitalar, Planos de saúde] Relator: Des(a). MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (APELANTE), JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), NAIR THAYMARA DA SILVA - CPF: 054.844.861-22 (APELADO), PAULINHO REIS DE SOUZA JUNIOR - CPF: 020.263.011-07 (ADVOGADO), L. D. D. S. A. - CPF: 094.817.641-50 (APELADO), NAIR THAYMARA DA SILVA - CPF: 054.844.861-22 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Ementa: DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). CUSTEIO DE TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. MÉTODO ABA. ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO EM AMBIENTE ESCOLAR. NATUREZA EDUCACIONAL. EXCLUSÃO DA OBRIGAÇÃO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta por Unimed Cuiabá contra sentença da 2ª Vara Cível de Várzea Grande/MT, que, nos autos de ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, ajuizada por Luiz Diego da Silva Araújo, representado por sua genitora, Nair Thaymara da Silva, julgou parcialmente procedentes os pedidos para determinar o custeio de tratamento multidisciplinar (psicologia, fonoaudiologia e terapia ocupacional) e condenar a operadora ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00. II. Questão em discussão Há duas questões em discussão: 2. (i) saber se o plano de saúde é obrigado a custear tratamento multidisciplinar prescrito a paciente com TEA, incluindo terapias pelo método ABA; e (ii) saber se recai sobre a operadora a obrigação de custear Acompanhante Terapêutico (ADI) em ambiente escolar e se está configurado o dever de indenizar por dano moral decorrente da negativa de cobertura. III. Razões de decidir 3. O custeio do tratamento multidisciplinar (psicologia, fonoaudiologia e terapia ocupacional), incluindo o método ABA, encontra respaldo na Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS e na L. nº 14.454/2022, que conferem prevalência à prescrição médica, tornando obrigatória sua cobertura, independentemente da previsão no rol da ANS. 4. O custeio de Acompanhante Terapêutico (ADI) em ambiente escolar não se insere no âmbito assistencial dos contratos de plano de saúde, pois possui natureza educacional, sendo responsabilidade da instituição de ensino, conforme previsto na L. nº 12.764/2012 e no Decreto nº 8.368/2014. 5. A negativa de cobertura do serviço de Acompanhante Terapêutico não configura ato ilícito indenizável, porquanto amparada em cláusulas contratuais e entendimento técnico-jurídico plausível, não extrapolando os limites do mero dissabor. 6. Diante da sucumbência recíproca, impõe-se a redistribuição proporcional das custas processuais e dos honorários advocatícios entre as partes. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de apelação parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. O plano de saúde é obrigado a custear tratamento multidisciplinar, incluindo o método ABA, prescrito para paciente com Transtorno do Espectro Autista, desde que haja prescrição médica fundamentada e eficácia comprovada. 2. Não é obrigação da operadora de plano de saúde o custeio de Acompanhante Terapêutico (ADI) em ambiente escolar, cuja responsabilidade recai sobre a instituição de ensino, por se tratar de serviço de natureza educacional. 3. A negativa de cobertura de serviço não integrante do escopo contratual, especialmente quando fundada em interpretação razoável da legislação e de cláusulas contratuais, não configura dano moral.” R E L A T Ó R I O Cuida-se de recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande/MT, que nos autos da ação de “Obrigação de Fazer e Reparação por Danos Morais” (Número Único 1010668-58.2022.8.11.0002), ajuizada contra a apelante por LUIZ DIEGO DA SILVA ARAÚJO, representado por sua genitora, NAIR THAYMARA DA SILVA, julgou parcialmente procedente os pedidos iniciais, para determinar que a ré/apelante autorize/custeie o tratamento multidisciplinar conforme recomendação médica, bem como condenou a requerida ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais, acrescido de juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária (INPC) a partir do arbitramento. Além disso, condenou a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor atualizado da condenação (cf. Id. nº 280691906). A cooperativa/apelante sustenta, preliminarmente, que, em razão do princípio da especialidade, aplica-se ao caso a Lei nº 9.656/1998, que disciplina as normas dos contratos de plano de saúde, afastando-se a incidência do Código de Defesa do Consumidor. No mérito, defende que a sentença merece reforma, uma vez que “não há ilicitude no ato da apelante ao negar o Acompanhante Terapêutico”, argumentando que, à época da negativa, não havia obrigatoriedade de cobertura para os tratamentos multidisciplinares, os quais passaram a ser obrigatórios apenas com a edição da Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS. Alega, ainda, que o custeio do serviço de Acompanhante Terapêutico (auxiliar de sala de aula - ADI) é de responsabilidade da instituição de ensino, conforme previsão da Lei nº 12.764/2012 e do Decreto nº 8.368/2014, não integrando a cobertura dos contratos de assistência médico-hospitalar. Aponta, também, que o próprio Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp nº 1.886.929/SP, firmou entendimento no sentido da taxatividade do rol da ANS, ressalvadas hipóteses específicas, as quais não se aplicariam ao presente caso. Sustenta, por fim, a inexistência de dano moral, haja vista que agiu no exercício regular de direito, amparada em cláusulas contratuais e normas regulatórias, inexistindo, portanto, qualquer ato ilícito capaz de ensejar responsabilidade civil. Pugna, assim, pelo provimento do recurso, para que a sentença seja reformada, a fim de julgar totalmente improcedentes os pedidos formulados na inicial, ou, subsidiariamente, para que seja afastada a condenação por danos morais (Id nº 280691908). Devidamente intimado, o apelado não apresentou contrarrazões (Id nº 280691912). A douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo provimento do recurso (Id nº 285969893). O recurso foi regularmente processado, encontrando-se apto à apreciação. É o relatório. Cuiabá, data registrada no sistema. MARCIO APARECIDO GUEDES Relator V O T O R E L A T O R Inicialmente, constato a tempestividade do recurso, porquanto interposto dentro do prazo legal de 15 (quinze) dias úteis, nos termos do artigo 1.023 do Código de Processo Civil, conforme ID 280691908. O autor ajuizou a presente ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, objetivando a condenação da operadora de plano de saúde à autorização e/ou custeio de consultas médicas psiquiátricas, bem como de tratamentos psicológicos pelo método ABA/Modelo Denver. Requereu, ainda, a proibição da cobrança de coparticipação, além da condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). A sentença determinou que a requerida autorizasse e custeasse o tratamento multidisciplinar, conforme recomendação médica constante no laudo juntado aos autos, confirmando a tutela antecipada anteriormente deferida, além de condená-la ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de juros de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação, e correção monetária, pelo INPC, a partir do arbitramento. Inconformada, a operadora de plano de saúde sustenta, em síntese, a legalidade da negativa de cobertura quanto ao Acompanhante Terapêutico (auxiliar de sala de aula – ADI), sob o argumento de que esse serviço não está contemplado no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS. Pois bem. Quanto ao primeiro ponto, verifico que o tratamento multidisciplinar com psicólogo (método ABA), fonoaudiólogo e terapeuta ocupacional para pacientes diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista – TEA passou a ter cobertura obrigatória pelos planos de saúde, com a edição da Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS, que alterou a Resolução Normativa nº 465/2021, acrescentando-lhe o § 4º ao artigo 6º, nos seguintes termos: “§ 4º Para a cobertura dos procedimentos que envolvam o tratamento/manejo dos beneficiários portadores de transtornos globais do desenvolvimento, incluindo o transtorno do espectro autista, a operadora deverá oferecer atendimento por prestador apto a executar o método ou técnica indicados pelo médico assistente para tratar a doença ou agravo do paciente.” Embora, à época da propositura da demanda e da negativa inicial da operadora, ainda estivesse em vigor a Resolução Normativa nº 465/2021 da ANS, a qual não previa, de forma expressa, a obrigatoriedade de cobertura para os métodos específicos de tratamento do TEA, sobreveio a Lei nº 14.454/2022, que pacificou a questão ao atribuir caráter exemplificativo ao rol da ANS, consignando em seu artigo 10, §§ 12 e 13: “§ 12. O rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, atualizado pela ANS a cada nova incorporação, constitui a referência básica para os planos privados de assistência à saúde contratados a partir de 1º de janeiro de 1999 e para os contratos adaptados a esta Lei e fixa as diretrizes de atenção à saúde. § 13. Em caso de tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não estejam previstos no rol referido no § 12 deste artigo, a cobertura deverá ser autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde, desde que: I - exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou II - existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais”. No caso dos autos, o laudo médico juntado no ID 280690489 prescreve ao paciente tratamento multidisciplinar com psicóloga (método ABA) até 20 (vinte) horas semanais, fonoaudióloga (ABA) três vezes por semana e terapia ocupacional com integração sensorial duas vezes por semana. Consta, ainda, a indicação da necessidade de “auxiliar de sala (ADI) e sala de recurso (AEE)”, em ambiente escolar. Com efeito, quanto às terapias multidisciplinares – psicologia, fonoaudiologia e terapia ocupacional –, considerando o disposto na Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS e na Lei nº 14.454/2022, que conferem prevalência à prescrição médica e estabelecem a obrigatoriedade de cobertura dos procedimentos necessários ao tratamento de pacientes com TEA, é inegável a responsabilidade da operadora de plano de saúde em custear tais procedimentos, razão pela qual não há que se falar em reforma da sentença nesse aspecto. Todavia, quanto ao Acompanhante Terapêutico (auxiliar de sala de aula – ADI), a questão demanda análise específica. O Parecer Técnico nº 25/GCITS/GGRAS/DIPRO/2022, citado pela apelante, esclarece que: “O Acompanhamento Terapêutico caracteriza-se por atendimento, em regra, realizado no ambiente do paciente (casa, escola ou outros espaços de convivência familiar e/ou social), ou seja, fora da clínica ou estabelecimento de saúde, visando à sua reinserção social e ao desenvolvimento de repertórios alternativos, entre outros.” De igual modo, o Parecer Técnico nº 39/GCITS/GGRAS/DIPRO/2022 assinala que a garantia de cobertura do atendimento está condicionada à sua execução em estabelecimento de saúde, ou por meio de telessaúde, e desde que realizado durante a execução de procedimentos com cobertura prevista no rol. A Lei nº 12.764/2012, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, dispõe, em seu artigo 3º, parágrafo único, que: “em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 1º, terá direito a acompanhante especializado”. Por sua vez, o Decreto nº 8.368/2014, que regulamenta referida lei, estabelece, no artigo 4º, § 2º, que: “Caso seja comprovada a necessidade de apoio às atividades de comunicação, interação social, locomoção, alimentação e cuidados pessoais, a instituição de ensino em que a pessoa com transtorno do espectro autista ou com outra deficiência estiver matriculada disponibilizará acompanhante especializado no contexto escolar”. Dessa normativa, depreende-se que a responsabilidade pelo fornecimento de acompanhante especializado no contexto escolar recai sobre a instituição de ensino, e não sobre a operadora de plano de saúde, cuja obrigação contratual se limita à cobertura de procedimentos médico-hospitalares. A jurisprudência pátria, inclusive deste Tribunal, tem-se consolidado no sentido de que não é possível impor aos planos de saúde a obrigação de custear Acompanhante Terapêutico em ambiente escolar, por se tratar de medida de natureza educacional. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PLANO DE SAÚDE – RECUSA INJUSTIFICADA DE TRATAMENTO MÉDICO – TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) – INDICAÇÃO FEITA POR PROFISSIONAL ESPECIALISTA – ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO EM AMBIENTE ESCOLAR/DOMICILIAR – AUSÊNCIA DE COBERTURA OBRIGATÓRIA – SENTENÇA MODIFICADA NO PONTO – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Havendo a previsão no contrato firmado de cobertura para determinada doença, deve a seguradora de saúde garantir todos os meios de tratamento na busca da cura do segurado, quando este cumpre com suas obrigações contratuais, por mais moderna e inédita que seja a técnica, caso se mostre mais eficiente, sendo irrelevante o fato de não constar no rol da ANS. “A terapia com acompanhante terapêutico em ambiente escolar ou domiciliar apresenta natureza educacional e não integra o escopo dos contratos de planos e seguros de saúde. Assim, extrapolado o âmbito clínico não há que se falar em cobertura obrigatória pelas operadoras de saúde.” (N.U 1016733-07.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/09/2024, Publicado no DJE 27/09/2024).” “Direito Civil E Consumidor. Apelação Cível. Plano De Saúde. Paciente Com Transtorno Do Espectro Autista. Tratamento Multidisciplinar Com Método Aba, Fonoterapia E Terapia Ocupacional. Custeio Em Ambiente Clínico. Exclusão Do Custeio Em Escola E Domicílio. Recurso Parcialmente Provido. I. Caso Em Exame 1. Recurso de apelação interposto contra sentença de procedê ncia do pedido de obrigação de fazer para determinar a cobertura integral de tratamento multidisciplinar prescrito a menor diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista – TEA, incluindo terapias em ambiente clínico, escolar e domiciliar. A sentença condenou a operadora de saúde ao custeio de terapias com método ABA, fonoterapia e terapia ocupacional conforme prescrição médica. A ré sustentou a ausência de previsão contratual e a não obrigatoriedade da cobertura conforme rol da ANS. II. Questão Em Discussão 2. Há duas questões em discussão: i) saber se é obrigatória a cobertura, pelo plano de saúde, de tratamento multidisciplinar prescrito para paciente com TEA, ainda que não previsto no rol da ANS; e ii) saber se a operadora é obrigada a custear terapias realizadas fora do ambiente clínico, em escola e domicílio. III. Razões De Decidir 3. Os contratos de plano de saúde estão submetidos ao CDC, impondo-se a interpretação mais favorável ao consumidor em casos de cláusulas restritivas. 4. O STJ, ao julgar o Tema 1.082 (EREsp 1.886.929/SP), fixou que o rol da ANS é taxativo em regra, mas admite exceções diante de prescrição médica fundamentada, inexistência de tratamento alternativo e comprovação de eficácia. 5. A RN nº 539/2022 da ANS assegura cobertura obrigatória de tratamentos multidisciplinares, inclusive pelo método ABA, com número ilimitado de sessões. 6. O custeio de terapias em ambiente clínico está amparado em prescrição médica fundamentada, eficácia comprovada e previsão normativa. 7. A cobertura de atendimentos fora do ambiente clínico, em escola ou domicílio, com acompanhante terapêutico, não encontra respaldo técnico ou normativo, tendo natureza pedagógica, alheia à cobertura contratual assistencial. IV. Dispositivo E Tese 7. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. O plano de saúde é obrigado a custear tratamento multidisciplinar prescrito para paciente com Transtorno do Espectro Autista, quando houver prescrição médica fundamentada e eficácia comprovada. 2. A operadora não está obrigada a custear terapias realizadas fora do ambiente clínico, como em escola ou domicílio, por se tratar de atividades de natureza pedagógica.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CC, art. 927; CDC, arts. 6º, III, e 47; Lei nº 9.656/1998, art. 12, VI; RN ANS nº 465/2021; RN ANS nº 539/2022. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 1.886.929/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª Seção, j. 08.06.2022; STJ, AgRg no AREsp 354.006/DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 12.08.2013; TJMT, Apelação 1031268-80.2022.8.11.0041, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 01.03.2025. (N.U 1009895-90.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CLARICE CLAUDINO DA SILVA, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/06/2025, Publicado no DJE 05/06/2025)”. Outrossim, o Superior Tribunal de Justiça, em recente precedente (REsp 2.064.964/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 20/02/2024, DJe 08/03/2024), sedimentou entendimento no sentido de que, salvo previsão contratual expressa, não há obrigatoriedade de custeio, pelos planos de saúde, de acompanhamento terapêutico em ambiente escolar e/ou domiciliar, por profissional da área da educação. Portanto, diferentemente das terapias multidisciplinares realizadas em estabelecimentos de saúde, o Acompanhante Terapêutico em ambiente escolar não se enquadra no rol de procedimentos médico-hospitalares de cobertura obrigatória, tratando-se de serviço de natureza educacional, cuja responsabilidade compete à instituição de ensino, nos termos da legislação específica. Assim, o recurso comporta parcial provimento, para excluir da condenação a obrigação da operadora de plano de saúde de custear o Acompanhante Terapêutico (auxiliar de sala de aula – ADI) em ambiente escolar. Quanto aos danos morais, Carlos Alberto Bittar leciona que “qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos das personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social)” (Reparação civil por danos morais, n.º 7, p. 41, in CAHALI, Yussef Said). Pablo Stolze Gagliano em Novo curso de direito civil, 2. ed., São Paulo: Saraiva, 2004, vol. III, p. 85, pondera que: “Superadas, portanto, todas as objeções quanto à reparabilidade do dano moral, é sempre importante lembrar, porém, a advertência brilhante de Antônio Chaves, para quem ‘propugnar pela mais ampla ressarcibilidade do dano moral não implica no reconhecimento de todo e qualquer melindre, toda suscetibilidade exacerbada, toda exaltação do amor próprio, pretensamente ferido, à mais suave sombra, ao mais ligeiro roçar de asas de uma borboleta, mimos, escrúpulos, delicadeza excessivas, ilusões insignificantes desfeitas, possibilitem sejam extraídas da caixa de pandora do Direito centenas de milhares de cruzeiros”. No caso concreto, entendo que não restaram configurados os elementos da responsabilidade civil, uma vez que, ao negar o custeio do tratamento prescrito, a operadora limitou-se a seguir as cláusulas contratuais, com interpretação amparada em seu entendimento técnico e jurídico, sem extrapolar os limites do mero dissabor ou ocasionar ofensa à dignidade da parte autora. Neste sentido, é farta a jurisprudência deste Tribunal e de outros tribunais pátrios, inclusive dos Tribunais Superiores: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – PLANO DE SAÚDE - NEGATIVA DE COBERTURA - PROCEDIMENTO CIRÚRGICO - GARANTIA A SAÚDE – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO - MERO DISSABOR - MULTA PECUNIÁRIA – EXCLUSÃO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – REDUÇÃO. RECURSO DESPROVIDO – SENTENÇA RETIFICADA PARCIALMENTE. As cláusulas restritivas ao direito do consumidor devem ser interpretadas da forma mais benéfica em relação e este, não sendo razoável a seguradora de plano de saúde negar cobertura do tratamento médico, mormente quando comprovados a urgência no procedimento cirúrgico e a adimplência do segurado, todavia, não configura dano moral a ensejar indenização o mero dissabor ante a negativa de cobertura de plano de saúde. (...) (TJMT – 4ª Câmara Cível - Apelação/Remessa Necessária 79919/2014 - DESA. NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO – Julg. em 03/11/2015) “EMENTA: AÇÃO DE COBRANÇA. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA. PRÓTESE DE COLUNA. CONTRATO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 9656/98. APLICABILIDADE. NORMA MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR. COBERTURA DE PRÓTESE INDISSOCIÁVEL AO TRATAMENTO. DANO MORAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. COMPENSAÇÃO. SÚMULA 306/STJ. SENTENÇA MANTIDA. 1) Ainda que o contrato de seguro de saúde tenha sido celebrado antes do advento da Lei 9.656/98, as previsões nele encerradas devem ser interpretadas à luz e em consonância com as disposições do Código de Defesa do Consumidor. 2) A cláusula excludente de cobertura de implantação de prótese perde seu sentido quando, pela evolução das técnicas médicas, o seu emprego é parte indissociável do tratamento, pois, do contrário, sua aplicação representaria verdadeira negativa do tratamento coberto. 3) A recusa da cobertura do seguro baseada em interpretação de cláusula contratual, não gera danos morais indenizáveis.4) (...). (TJMG - 11ª Câmara Cível - Apelação Cível nº 1.0344.10.001676-7/001 – Rel. Des. MARCOS LINCOLN - Julgamento em 25/06/2013 – DJe do dia 01/07/2013) Diante do exposto, dou parcial provimento ao recurso, para afastar da condenação a obrigação de custeio do tratamento com Acompanhante Terapêutico (ADI) em ambiente escolar, bem como a indenização por danos morais. Em face da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios na proporção de 50% para cada, fixando os honorários em 15% sobre o valor da causa, observado, quanto ao autor, o disposto no art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025

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Processo nº 1010668-58.2022.8.11.0002

ID: 324732990

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1010668-58.2022.8.11.0002

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

L. D. D. S. A.

Acórdão

Advogados:

PAULINHO REIS DE SOUZA JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010668-58.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Efeitos, Tratament… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010668-58.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Efeitos, Tratamento médico-hospitalar, Planos de saúde] Relator: Des(a). MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO - CNPJ: 03.533.726/0001-88 (APELANTE), JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY - CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), NAIR THAYMARA DA SILVA - CPF: 054.844.861-22 (APELADO), PAULINHO REIS DE SOUZA JUNIOR - CPF: 020.263.011-07 (ADVOGADO), L. D. D. S. A. - CPF: 094.817.641-50 (APELADO), NAIR THAYMARA DA SILVA - CPF: 054.844.861-22 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A Ementa: DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA). CUSTEIO DE TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. MÉTODO ABA. ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO EM AMBIENTE ESCOLAR. NATUREZA EDUCACIONAL. EXCLUSÃO DA OBRIGAÇÃO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta por Unimed Cuiabá contra sentença da 2ª Vara Cível de Várzea Grande/MT, que, nos autos de ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, ajuizada por Luiz Diego da Silva Araújo, representado por sua genitora, Nair Thaymara da Silva, julgou parcialmente procedentes os pedidos para determinar o custeio de tratamento multidisciplinar (psicologia, fonoaudiologia e terapia ocupacional) e condenar a operadora ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00. II. Questão em discussão Há duas questões em discussão: 2. (i) saber se o plano de saúde é obrigado a custear tratamento multidisciplinar prescrito a paciente com TEA, incluindo terapias pelo método ABA; e (ii) saber se recai sobre a operadora a obrigação de custear Acompanhante Terapêutico (ADI) em ambiente escolar e se está configurado o dever de indenizar por dano moral decorrente da negativa de cobertura. III. Razões de decidir 3. O custeio do tratamento multidisciplinar (psicologia, fonoaudiologia e terapia ocupacional), incluindo o método ABA, encontra respaldo na Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS e na L. nº 14.454/2022, que conferem prevalência à prescrição médica, tornando obrigatória sua cobertura, independentemente da previsão no rol da ANS. 4. O custeio de Acompanhante Terapêutico (ADI) em ambiente escolar não se insere no âmbito assistencial dos contratos de plano de saúde, pois possui natureza educacional, sendo responsabilidade da instituição de ensino, conforme previsto na L. nº 12.764/2012 e no Decreto nº 8.368/2014. 5. A negativa de cobertura do serviço de Acompanhante Terapêutico não configura ato ilícito indenizável, porquanto amparada em cláusulas contratuais e entendimento técnico-jurídico plausível, não extrapolando os limites do mero dissabor. 6. Diante da sucumbência recíproca, impõe-se a redistribuição proporcional das custas processuais e dos honorários advocatícios entre as partes. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de apelação parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. O plano de saúde é obrigado a custear tratamento multidisciplinar, incluindo o método ABA, prescrito para paciente com Transtorno do Espectro Autista, desde que haja prescrição médica fundamentada e eficácia comprovada. 2. Não é obrigação da operadora de plano de saúde o custeio de Acompanhante Terapêutico (ADI) em ambiente escolar, cuja responsabilidade recai sobre a instituição de ensino, por se tratar de serviço de natureza educacional. 3. A negativa de cobertura de serviço não integrante do escopo contratual, especialmente quando fundada em interpretação razoável da legislação e de cláusulas contratuais, não configura dano moral.” R E L A T Ó R I O Cuida-se de recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por UNIMED CUIABA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande/MT, que nos autos da ação de “Obrigação de Fazer e Reparação por Danos Morais” (Número Único 1010668-58.2022.8.11.0002), ajuizada contra a apelante por LUIZ DIEGO DA SILVA ARAÚJO, representado por sua genitora, NAIR THAYMARA DA SILVA, julgou parcialmente procedente os pedidos iniciais, para determinar que a ré/apelante autorize/custeie o tratamento multidisciplinar conforme recomendação médica, bem como condenou a requerida ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais, acrescido de juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária (INPC) a partir do arbitramento. Além disso, condenou a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor atualizado da condenação (cf. Id. nº 280691906). A cooperativa/apelante sustenta, preliminarmente, que, em razão do princípio da especialidade, aplica-se ao caso a Lei nº 9.656/1998, que disciplina as normas dos contratos de plano de saúde, afastando-se a incidência do Código de Defesa do Consumidor. No mérito, defende que a sentença merece reforma, uma vez que “não há ilicitude no ato da apelante ao negar o Acompanhante Terapêutico”, argumentando que, à época da negativa, não havia obrigatoriedade de cobertura para os tratamentos multidisciplinares, os quais passaram a ser obrigatórios apenas com a edição da Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS. Alega, ainda, que o custeio do serviço de Acompanhante Terapêutico (auxiliar de sala de aula - ADI) é de responsabilidade da instituição de ensino, conforme previsão da Lei nº 12.764/2012 e do Decreto nº 8.368/2014, não integrando a cobertura dos contratos de assistência médico-hospitalar. Aponta, também, que o próprio Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do REsp nº 1.886.929/SP, firmou entendimento no sentido da taxatividade do rol da ANS, ressalvadas hipóteses específicas, as quais não se aplicariam ao presente caso. Sustenta, por fim, a inexistência de dano moral, haja vista que agiu no exercício regular de direito, amparada em cláusulas contratuais e normas regulatórias, inexistindo, portanto, qualquer ato ilícito capaz de ensejar responsabilidade civil. Pugna, assim, pelo provimento do recurso, para que a sentença seja reformada, a fim de julgar totalmente improcedentes os pedidos formulados na inicial, ou, subsidiariamente, para que seja afastada a condenação por danos morais (Id nº 280691908). Devidamente intimado, o apelado não apresentou contrarrazões (Id nº 280691912). A douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo provimento do recurso (Id nº 285969893). O recurso foi regularmente processado, encontrando-se apto à apreciação. É o relatório. Cuiabá, data registrada no sistema. MARCIO APARECIDO GUEDES Relator V O T O R E L A T O R Inicialmente, constato a tempestividade do recurso, porquanto interposto dentro do prazo legal de 15 (quinze) dias úteis, nos termos do artigo 1.023 do Código de Processo Civil, conforme ID 280691908. O autor ajuizou a presente ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, objetivando a condenação da operadora de plano de saúde à autorização e/ou custeio de consultas médicas psiquiátricas, bem como de tratamentos psicológicos pelo método ABA/Modelo Denver. Requereu, ainda, a proibição da cobrança de coparticipação, além da condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). A sentença determinou que a requerida autorizasse e custeasse o tratamento multidisciplinar, conforme recomendação médica constante no laudo juntado aos autos, confirmando a tutela antecipada anteriormente deferida, além de condená-la ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de juros de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação, e correção monetária, pelo INPC, a partir do arbitramento. Inconformada, a operadora de plano de saúde sustenta, em síntese, a legalidade da negativa de cobertura quanto ao Acompanhante Terapêutico (auxiliar de sala de aula – ADI), sob o argumento de que esse serviço não está contemplado no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS. Pois bem. Quanto ao primeiro ponto, verifico que o tratamento multidisciplinar com psicólogo (método ABA), fonoaudiólogo e terapeuta ocupacional para pacientes diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista – TEA passou a ter cobertura obrigatória pelos planos de saúde, com a edição da Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS, que alterou a Resolução Normativa nº 465/2021, acrescentando-lhe o § 4º ao artigo 6º, nos seguintes termos: “§ 4º Para a cobertura dos procedimentos que envolvam o tratamento/manejo dos beneficiários portadores de transtornos globais do desenvolvimento, incluindo o transtorno do espectro autista, a operadora deverá oferecer atendimento por prestador apto a executar o método ou técnica indicados pelo médico assistente para tratar a doença ou agravo do paciente.” Embora, à época da propositura da demanda e da negativa inicial da operadora, ainda estivesse em vigor a Resolução Normativa nº 465/2021 da ANS, a qual não previa, de forma expressa, a obrigatoriedade de cobertura para os métodos específicos de tratamento do TEA, sobreveio a Lei nº 14.454/2022, que pacificou a questão ao atribuir caráter exemplificativo ao rol da ANS, consignando em seu artigo 10, §§ 12 e 13: “§ 12. O rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, atualizado pela ANS a cada nova incorporação, constitui a referência básica para os planos privados de assistência à saúde contratados a partir de 1º de janeiro de 1999 e para os contratos adaptados a esta Lei e fixa as diretrizes de atenção à saúde. § 13. Em caso de tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não estejam previstos no rol referido no § 12 deste artigo, a cobertura deverá ser autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde, desde que: I - exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou II - existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais”. No caso dos autos, o laudo médico juntado no ID 280690489 prescreve ao paciente tratamento multidisciplinar com psicóloga (método ABA) até 20 (vinte) horas semanais, fonoaudióloga (ABA) três vezes por semana e terapia ocupacional com integração sensorial duas vezes por semana. Consta, ainda, a indicação da necessidade de “auxiliar de sala (ADI) e sala de recurso (AEE)”, em ambiente escolar. Com efeito, quanto às terapias multidisciplinares – psicologia, fonoaudiologia e terapia ocupacional –, considerando o disposto na Resolução Normativa nº 539/2022 da ANS e na Lei nº 14.454/2022, que conferem prevalência à prescrição médica e estabelecem a obrigatoriedade de cobertura dos procedimentos necessários ao tratamento de pacientes com TEA, é inegável a responsabilidade da operadora de plano de saúde em custear tais procedimentos, razão pela qual não há que se falar em reforma da sentença nesse aspecto. Todavia, quanto ao Acompanhante Terapêutico (auxiliar de sala de aula – ADI), a questão demanda análise específica. O Parecer Técnico nº 25/GCITS/GGRAS/DIPRO/2022, citado pela apelante, esclarece que: “O Acompanhamento Terapêutico caracteriza-se por atendimento, em regra, realizado no ambiente do paciente (casa, escola ou outros espaços de convivência familiar e/ou social), ou seja, fora da clínica ou estabelecimento de saúde, visando à sua reinserção social e ao desenvolvimento de repertórios alternativos, entre outros.” De igual modo, o Parecer Técnico nº 39/GCITS/GGRAS/DIPRO/2022 assinala que a garantia de cobertura do atendimento está condicionada à sua execução em estabelecimento de saúde, ou por meio de telessaúde, e desde que realizado durante a execução de procedimentos com cobertura prevista no rol. A Lei nº 12.764/2012, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, dispõe, em seu artigo 3º, parágrafo único, que: “em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 1º, terá direito a acompanhante especializado”. Por sua vez, o Decreto nº 8.368/2014, que regulamenta referida lei, estabelece, no artigo 4º, § 2º, que: “Caso seja comprovada a necessidade de apoio às atividades de comunicação, interação social, locomoção, alimentação e cuidados pessoais, a instituição de ensino em que a pessoa com transtorno do espectro autista ou com outra deficiência estiver matriculada disponibilizará acompanhante especializado no contexto escolar”. Dessa normativa, depreende-se que a responsabilidade pelo fornecimento de acompanhante especializado no contexto escolar recai sobre a instituição de ensino, e não sobre a operadora de plano de saúde, cuja obrigação contratual se limita à cobertura de procedimentos médico-hospitalares. A jurisprudência pátria, inclusive deste Tribunal, tem-se consolidado no sentido de que não é possível impor aos planos de saúde a obrigação de custear Acompanhante Terapêutico em ambiente escolar, por se tratar de medida de natureza educacional. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – PLANO DE SAÚDE – RECUSA INJUSTIFICADA DE TRATAMENTO MÉDICO – TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) – INDICAÇÃO FEITA POR PROFISSIONAL ESPECIALISTA – ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO EM AMBIENTE ESCOLAR/DOMICILIAR – AUSÊNCIA DE COBERTURA OBRIGATÓRIA – SENTENÇA MODIFICADA NO PONTO – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Havendo a previsão no contrato firmado de cobertura para determinada doença, deve a seguradora de saúde garantir todos os meios de tratamento na busca da cura do segurado, quando este cumpre com suas obrigações contratuais, por mais moderna e inédita que seja a técnica, caso se mostre mais eficiente, sendo irrelevante o fato de não constar no rol da ANS. “A terapia com acompanhante terapêutico em ambiente escolar ou domiciliar apresenta natureza educacional e não integra o escopo dos contratos de planos e seguros de saúde. Assim, extrapolado o âmbito clínico não há que se falar em cobertura obrigatória pelas operadoras de saúde.” (N.U 1016733-07.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/09/2024, Publicado no DJE 27/09/2024).” “Direito Civil E Consumidor. Apelação Cível. Plano De Saúde. Paciente Com Transtorno Do Espectro Autista. Tratamento Multidisciplinar Com Método Aba, Fonoterapia E Terapia Ocupacional. Custeio Em Ambiente Clínico. Exclusão Do Custeio Em Escola E Domicílio. Recurso Parcialmente Provido. I. Caso Em Exame 1. Recurso de apelação interposto contra sentença de procedê ncia do pedido de obrigação de fazer para determinar a cobertura integral de tratamento multidisciplinar prescrito a menor diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista – TEA, incluindo terapias em ambiente clínico, escolar e domiciliar. A sentença condenou a operadora de saúde ao custeio de terapias com método ABA, fonoterapia e terapia ocupacional conforme prescrição médica. A ré sustentou a ausência de previsão contratual e a não obrigatoriedade da cobertura conforme rol da ANS. II. Questão Em Discussão 2. Há duas questões em discussão: i) saber se é obrigatória a cobertura, pelo plano de saúde, de tratamento multidisciplinar prescrito para paciente com TEA, ainda que não previsto no rol da ANS; e ii) saber se a operadora é obrigada a custear terapias realizadas fora do ambiente clínico, em escola e domicílio. III. Razões De Decidir 3. Os contratos de plano de saúde estão submetidos ao CDC, impondo-se a interpretação mais favorável ao consumidor em casos de cláusulas restritivas. 4. O STJ, ao julgar o Tema 1.082 (EREsp 1.886.929/SP), fixou que o rol da ANS é taxativo em regra, mas admite exceções diante de prescrição médica fundamentada, inexistência de tratamento alternativo e comprovação de eficácia. 5. A RN nº 539/2022 da ANS assegura cobertura obrigatória de tratamentos multidisciplinares, inclusive pelo método ABA, com número ilimitado de sessões. 6. O custeio de terapias em ambiente clínico está amparado em prescrição médica fundamentada, eficácia comprovada e previsão normativa. 7. A cobertura de atendimentos fora do ambiente clínico, em escola ou domicílio, com acompanhante terapêutico, não encontra respaldo técnico ou normativo, tendo natureza pedagógica, alheia à cobertura contratual assistencial. IV. Dispositivo E Tese 7. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. O plano de saúde é obrigado a custear tratamento multidisciplinar prescrito para paciente com Transtorno do Espectro Autista, quando houver prescrição médica fundamentada e eficácia comprovada. 2. A operadora não está obrigada a custear terapias realizadas fora do ambiente clínico, como em escola ou domicílio, por se tratar de atividades de natureza pedagógica.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CC, art. 927; CDC, arts. 6º, III, e 47; Lei nº 9.656/1998, art. 12, VI; RN ANS nº 465/2021; RN ANS nº 539/2022. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 1.886.929/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª Seção, j. 08.06.2022; STJ, AgRg no AREsp 354.006/DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 12.08.2013; TJMT, Apelação 1031268-80.2022.8.11.0041, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 01.03.2025. (N.U 1009895-90.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CLARICE CLAUDINO DA SILVA, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/06/2025, Publicado no DJE 05/06/2025)”. Outrossim, o Superior Tribunal de Justiça, em recente precedente (REsp 2.064.964/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 20/02/2024, DJe 08/03/2024), sedimentou entendimento no sentido de que, salvo previsão contratual expressa, não há obrigatoriedade de custeio, pelos planos de saúde, de acompanhamento terapêutico em ambiente escolar e/ou domiciliar, por profissional da área da educação. Portanto, diferentemente das terapias multidisciplinares realizadas em estabelecimentos de saúde, o Acompanhante Terapêutico em ambiente escolar não se enquadra no rol de procedimentos médico-hospitalares de cobertura obrigatória, tratando-se de serviço de natureza educacional, cuja responsabilidade compete à instituição de ensino, nos termos da legislação específica. Assim, o recurso comporta parcial provimento, para excluir da condenação a obrigação da operadora de plano de saúde de custear o Acompanhante Terapêutico (auxiliar de sala de aula – ADI) em ambiente escolar. Quanto aos danos morais, Carlos Alberto Bittar leciona que “qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos das personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social)” (Reparação civil por danos morais, n.º 7, p. 41, in CAHALI, Yussef Said). Pablo Stolze Gagliano em Novo curso de direito civil, 2. ed., São Paulo: Saraiva, 2004, vol. III, p. 85, pondera que: “Superadas, portanto, todas as objeções quanto à reparabilidade do dano moral, é sempre importante lembrar, porém, a advertência brilhante de Antônio Chaves, para quem ‘propugnar pela mais ampla ressarcibilidade do dano moral não implica no reconhecimento de todo e qualquer melindre, toda suscetibilidade exacerbada, toda exaltação do amor próprio, pretensamente ferido, à mais suave sombra, ao mais ligeiro roçar de asas de uma borboleta, mimos, escrúpulos, delicadeza excessivas, ilusões insignificantes desfeitas, possibilitem sejam extraídas da caixa de pandora do Direito centenas de milhares de cruzeiros”. No caso concreto, entendo que não restaram configurados os elementos da responsabilidade civil, uma vez que, ao negar o custeio do tratamento prescrito, a operadora limitou-se a seguir as cláusulas contratuais, com interpretação amparada em seu entendimento técnico e jurídico, sem extrapolar os limites do mero dissabor ou ocasionar ofensa à dignidade da parte autora. Neste sentido, é farta a jurisprudência deste Tribunal e de outros tribunais pátrios, inclusive dos Tribunais Superiores: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – PLANO DE SAÚDE - NEGATIVA DE COBERTURA - PROCEDIMENTO CIRÚRGICO - GARANTIA A SAÚDE – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO - MERO DISSABOR - MULTA PECUNIÁRIA – EXCLUSÃO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – REDUÇÃO. RECURSO DESPROVIDO – SENTENÇA RETIFICADA PARCIALMENTE. As cláusulas restritivas ao direito do consumidor devem ser interpretadas da forma mais benéfica em relação e este, não sendo razoável a seguradora de plano de saúde negar cobertura do tratamento médico, mormente quando comprovados a urgência no procedimento cirúrgico e a adimplência do segurado, todavia, não configura dano moral a ensejar indenização o mero dissabor ante a negativa de cobertura de plano de saúde. (...) (TJMT – 4ª Câmara Cível - Apelação/Remessa Necessária 79919/2014 - DESA. NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO – Julg. em 03/11/2015) “EMENTA: AÇÃO DE COBRANÇA. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA. PRÓTESE DE COLUNA. CONTRATO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 9656/98. APLICABILIDADE. NORMA MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR. COBERTURA DE PRÓTESE INDISSOCIÁVEL AO TRATAMENTO. DANO MORAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. COMPENSAÇÃO. SÚMULA 306/STJ. SENTENÇA MANTIDA. 1) Ainda que o contrato de seguro de saúde tenha sido celebrado antes do advento da Lei 9.656/98, as previsões nele encerradas devem ser interpretadas à luz e em consonância com as disposições do Código de Defesa do Consumidor. 2) A cláusula excludente de cobertura de implantação de prótese perde seu sentido quando, pela evolução das técnicas médicas, o seu emprego é parte indissociável do tratamento, pois, do contrário, sua aplicação representaria verdadeira negativa do tratamento coberto. 3) A recusa da cobertura do seguro baseada em interpretação de cláusula contratual, não gera danos morais indenizáveis.4) (...). (TJMG - 11ª Câmara Cível - Apelação Cível nº 1.0344.10.001676-7/001 – Rel. Des. MARCOS LINCOLN - Julgamento em 25/06/2013 – DJe do dia 01/07/2013) Diante do exposto, dou parcial provimento ao recurso, para afastar da condenação a obrigação de custeio do tratamento com Acompanhante Terapêutico (ADI) em ambiente escolar, bem como a indenização por danos morais. Em face da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios na proporção de 50% para cada, fixando os honorários em 15% sobre o valor da causa, observado, quanto ao autor, o disposto no art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025

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