Processo nº 1011177-32.2023.8.11.0041
ID: 335722096
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1011177-32.2023.8.11.0041
Data de Disponibilização:
28/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
NELSON FEITOSA JUNIOR
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011177-32.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Usucapião Extraordinária, Usucapião da L 6.969/…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1011177-32.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Usucapião Extraordinária, Usucapião da L 6.969/1981] Relator: Des(a). MARILSEN ANDRADE ADDARIO Turma Julgadora: [DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS] Parte(s): [CARAMORI EQUIPAMENTOS PARA O TRANSPORTE LTDA - CNPJ: 02.782.804/0001-15 (APELANTE), THIAGO DE ABREU FERREIRA - CPF: 828.009.951-49 (ADVOGADO), REINALDO AMERICO ORTIGARA - CPF: 717.564.341-15 (ADVOGADO), BANCO DO BRASIL SA - CNPJ: 00.000.000/0046-93 (APELADO), NELSON FEITOSA JUNIOR - CPF: 903.673.671-49 (ADVOGADO), ADVOCACIA GERAL DA UNIAO - CNPJ: 26.994.558/0016-00 (TERCEIRO INTERESSADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0001-44 (TERCEIRO INTERESSADO), MUNICIPIO DE CUIABÁ - CNPJ: 03.533.064/0001-46 (TERCEIRO INTERESSADO), TOP SERVICOS GERAIS LTDA - CNPJ: 00.164.048/0001-35 (TERCEIRO INTERESSADO), ANA CAROLINA BUSIQUIA COLOMBARI - CPF: 016.590.881-51 (TERCEIRO INTERESSADO), THIAGO RONCHI ADRIEN EUGENIO - CPF: 002.837.181-02 (TERCEIRO INTERESSADO), FERNANDA CRISTINA MAIDANA DE MELLO EUGENIO - CPF: 877.746.311-00 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE, RECURSO DESPROVIDO, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL nº 1011177-32.2023.8.11.0041 e nº 1007190-51.2024.8.11.0041 E M E N T A RECURSOS DE APELAÇÃO CÍVEIS – AÇÃO DE IMISSÃO DE POSSE JULGADA PROCEDENTE E AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA JULGADA IMPROCEDENTE – PRELIMINARES - ILEGITIMIDADE PASSIVA – ARTIGO 109 DO CPC/15 - CERCEAMENTO DE DEFESA – NÃO CONFIGURADO - REJEIÇÕES – MÉRITO – REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS – POSSE PRECÁRIA – COMPROVAÇÃO DE RELAÇÃO LOCATÍCIA – INEXISTÊNCIA DE ANIMUS DOMINI – INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL PELA IMISSÃO DE POSSE DO PROPRIETÁRIO – INEXISTÊNCIA DE DIREITO À USUCAPIÃO – IMISSÃO DE POSSE CABÍVEL - RECURSO DA USUCAPIÃO E DA IMISSÃO DE POSSE DESPROVIDOS. 1. Nos termos do art. 109 do CPC/15, “A alienação da coisa ou do direito litigioso por ato entre vivos, a título particular, não altera a legitimidade das partes”. Assim, não há se falar em ilegitimidade passiva do Banco. 2. Não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando o conjunto probatório documental é suficiente para a formação do convencimento do julgador. 3. A declaração de prescrição aquisitiva por meio da usucapião extraordinária demanda a existência dos seguintes requisitos: a) comprovação da posse ininterrupta por quinze anos; b) posse mansa e pacífica; c) ânimo de dono (animus domini). O prazo pode ser reduzido para 10 anos caso o possuir houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo. 4. No caso dos autos, se comprovado que a posse exercida pela parte autora advém de contrato de locação, tal circunstância afasta a possibilidade do reconhecimento da prescrição aquisitiva por se tratar de posse precária, desprovida de animus domini. 5. A eventual imissão na posse pelo proprietário anterior interrompe o prazo para usucapião, impedindo a contagem do lapso temporal necessário para a prescrição aquisitiva. 6. O proprietário que comprova a aquisição originária do domínio por arrematação em leilão extrajudicial, devidamente registrada em cartório imobiliário, tem o direito à imissão na posse do bem contra quem injustamente o ocupe. 7. Ambos os recursos desprovidos.- R E L A T Ó R I O R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação cível interposto por CARAMORI EQUIPAMENTOS PARA O TRANSPORTE LTDA contra a sentença prolatada na Ação de Imissão de Posse nº 1007190-51.2024.8.11.0041, esta ajuizada por THIAGO ADRIEN EUGÊNIO e FERNANDA CRISTINA MAINDANA DE MELLO, que julgou procedente a ação de imissão de posse para determinar a imissão dos autos na posse do imóvel situado na Rua Pedro Paulo de Farias Junior, nº 1714 (lotes 13 a 17), bairro Distrito Industrial, Cuiabá/MT e, contra a sentença prolatada na Ação de Usucapião Extraordinário nº 1011177-32.2023.8.11.0041, ajuizada em desfavor de BANCO DO BRASIL S/A, que julgou improcedente a ação de usucapião. Na ação de imissão de posse condenou a parte requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 12% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Já na ação de usucapião extraordinária condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Na ação de imissão de posse, a requerida CARAMORI EQUIPAMENTOS PARA TRANSPORTE LTDA interpôs recurso de apelação, defendendo a existência de prejudicialidade externa, em virtude de ação de usucapião pendente, que deveria ensejar a suspensão da presente demanda, conforme previsão do art. 313, V, “a”, do CPC. Sustenta a ocorrência de cerceamento de defesa, uma vez o juízo a quo julgou antecipadamente o mérito, sem oportunizar a devida dilação probatória, especialmente sobre os requisitos da posse para a usucapião. Relata equívoco na conclusão da sentença quanto à caracterização da posse como precária. Ao final, pugna pelo provimento do recurso e a reforma da sentença recorrida. As contrarrazões foram apresentadas por THIAGO ADRIEN EUGÊNIO e FERNANDA CRISTINA MAINDANA DE MELLO no ID nº 271099397, pelo desprovimento do recurso. Já na ação de usucapião, a autora CARAMORI EQUIPAMENTOS PARA O TRANSPORTE LTDA interpôs recurso de apelação, sustentando preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, argumentando que: a) houve violação à decisão proferida por esta Corte no Agravo de Instrumento nº 1010221-08.2024.8.11.0000, que reconheceu a necessidade de dilação probatória; b) há contradição entre o fundamento do julgamento antecipado da lide (suficiência de provas) e o mérito da sentença (improcedência por insuficiência de provas). No mérito, afirma que: a) o contrato de locação mencionado na sentença refere-se à área diversa, tratando-se de área contígua ao bem usucapiendo, vez que o perímetro objeto da usucapião corresponde à matrícula nº 44.366, enquanto o contrato de locação celebrado com a empresa Rodman (atual Top Serviços Gerais) abrange as matrículas nº 53.095, 53.096, 53.097, 53.098 e 53.099; b) exerce posse do imóvel de forma ininterrupta, mansa, pacífica e com animus domini pelo período superior a 15 anos, suficiente para a aquisição por usucapião; c) apresentou documentos como comprovantes de pagamento de IPTU, declaração de confinantes, faturas de energia, certidão de contribuinte, alvará municipal de localização e funcionamento, demonstrando o exercício da posse. Ao final, pugna pelo provimento do recurso e a reforma da sentença recorrida. As contrarrazões foram apresentadas pelo BANCO DO BRASIL S/A, no ID nº 278310950, arguindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva em razão da venda do imóvel a terceiros (THIAGO RONCHI ADRIEN EUGÊNIO e FERNANDA CRISTINA MAIDANA DE MELLO EUGÊNIO) conforme R.21/44.366, de 26/02/2024. No mérito, pelo desprovimento do recurso. É o relatório.- V O T O R E L A T O R VOTO PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA Egrégia Câmara: O BANCO DO BRASIL S/A, em suas contrarrazões, arguiu, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, em razão da venda do imóvel a terceiros (THIAGO RONCHI ADRIEN EUGÊNIO e FERNANDA CRISTINA MAIDANA DE MELLO EUGÊNIO) conforme R.21/44.366, de 26/02/2024. Contudo, tal preliminar não prospera. Isto porque, nos termos do art. 109, §2º, do CPC/15, “A alienação da coisa ou do direito litigioso por ato entre vivos, a título particular, não altera a legitimidade das partes.” Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA - IMÓVEL OBJETO DE COMPRA E VENDA - ADQUIRENTE - ASSISTENTE LITISCONSORCIAL - ADMISSIBILIDADE - ALIENAÇÃO DA COISA LITIGIOSA - ALTERAÇÃO DA LEGITIMIDADE DAS PARTES - INOCORRÊNCIA - SENTENÇA CONFIRMADA. Admite-se como litisconsorte da parte principal o assistente na hipótese de a sentença influir na relação jurídica entre ele e o adversário do assistido. A alienação da coisa ou do direito litigioso, a título particular, por ato entre vivos, não altera a legitimidade das partes, admitindo-se a possiblidade de o adquirente ingressar em juízo substituindo a parte autora, mas mesmo assim desde que exista o consentimento da parte contrária, situação inocorrente no caso posto a julgamento. Constatada a venda do imóvel no curso da lide, e, uma vez configurados os requisitos da prescrição aquisitiva, o domínio do imóvel deve ser declarado em favor da parte autora, cabendo ao assistente promover as medidas futuras para regularizar o imóvel em seu nome . Recurso desprovido.” (TJ-MG - Apelação Cível: 50010523420178130479 1.0000.24 .248951-6/001, Relator.: Des.(a) Gilson Soares Lemes, Data de Julgamento: 10/07/2024, 16ª Câmara Cível Especializada, Data de Publicação: 12/07/2024) destaquei Ademais, o próprio apelado reconhece que os adquirentes tinham plena ciência da existência da ação de usucapião no momento da aquisição, conforme consta da matrícula do imóvel, eximindo o BANCO de qualquer responsabilidade por eventual evicção. Portanto, o BANCO é legítimo para responder à presente ação. Assim, rejeito a preliminar arguida.- VOTO - PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA Eminentes pares Conforme se denota, a apelante alega cerceamento de defesa em razão do julgamento antecipado da lide, sob dois argumentos principais: (i) desrespeito ao acórdão proferido no Agravo de Instrumento nº 1010221-08.2024.8.11.0000, que teria reconhecido a necessidade de dilação probatória; e (ii) contradição na sentença, que fundamentou o julgamento antecipado na suficiência das provas documentais e, ao mesmo tempo, declarou improcedente o pedido por insuficiência probatória. Quanto ao primeiro argumento, verifica-se que o Agravo de Instrumento nº 1010221-08.2024.8.11.0000 foi interposto em face decisão proferida na Ação de Imissão de Posse nº 1007190-51.2024.8.11.0041, sendo que, em momento algum, determinou a dilação probatória, como defende a usucapiente. A bem da verdade, determinou que ambos os processos (imissão de posse e usucapião) fossem analisados em conjunto em uma única sentença, principalmente em razão do instrumento locatício e da conexão de ambas as ações. Confira trecho do v. acórdão proferido no citado agravo de instrumento, onde define a questão: “(...) No mais, a questão relativa ao instrumento locatício deverá ser mais bem analisada no decorrer das demandas, as quais devem ser associadas e decididas em conjunto em uma única sentença, em razão da conexão de ambas. Logo, não há como conceder a liminar de imissão de posse tal como pretendem os agravantes, ante a ausência dos requisitos necessários para a concessão da tutela de urgência (fumus boni iuris e periculum in mora). (...) Outrossim, diante da complexidade da matéria em que envolve decisão em duas ações distintas (usucapião e imissão de posse), mostra-se prudente manter a situação já existente no tocante à posse da agravada, necessitando o feito de análise minuciosa, já que as ações envolvidas guardam relação entre si, motivo pelo qual devem ser apreciadas em conjunto, sem que ocorra pré-julgamento de uma em detrimento de outra, ou qualquer das partes seja prejudicada (...).” Grifei. Portanto, conforme se vê, tal decisão não vinculou o Juízo da ação de usucapião à necessidade de produção de provas, mas, apenas indicou a existência de conexão entre ambas as demandas e a necessidade de julgamento em conjunto, já que as ações envolvidas guardam relação entre si, bem como determinou que fosse mantida a situação fática existente (posse do usucapiente) até o julgamento da usucapião. No que concerne ao segundo argumento, qual seja, a alegação de contradição na sentença, este também não prospera. O julgamento antecipado da lide, previsto no art. 355, inciso I, do CPC/15, é cabível quando não houver necessidade de produção de outras provas além das já constantes dos autos. Ademais, cabe ao julgador, e não à parte, determinar as provas aptas à formação da sua convicção, conforme dispõe o parágrafo único do art. 370 do CPC/15, vejamos: “Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias." Inclusive, o Superior Tribunal de Justiça, em diversas oportunidades, já manifestou esse entendimento, que se encontra expresso de forma clara e concisa em voto redigido pela eminente ministra Nancy Andrighy, do qual podemos colher: " (...). Sendo o juiz o destinatário final da prova, cabe a ele, em sintonia com o sistema de persuasão racional adotado pelo CPC, dirigir a instrução probatória e determinar a produção das provas que considerar necessárias à formação do seu convencimento. Não há ilegalidade nem cerceamento de defesa na hipótese em que o juiz, verificando suficientemente instruído o processo e desnecessária a dilação probatória, desconsidera o pedido de produção de prova testemunhal. (...)" . (STJ - REsp 844778/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/03/2017, DJ 26/03/2017, p. 240) No caso, o magistrado considerou que os documentos juntados eram suficientes para formar seu convencimento, não sendo necessária a produção de outras provas. A conclusão pela improcedência do pedido, baseada na insuficiência de demonstração dos requisitos da usucapião a partir das provas já produzidas, não configura contradição ou cerceamento de defesa. Pelo contrário, evidencia que o magistrado, após análise do conjunto probatório, entendeu que a parte autora não se desincumbiu do ônus de comprovar o fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, inciso I, do CPC/15. Aliás, na hipótese, a prova documental, principalmente o instrumento locatício é mais que suficiente para o julgamento da lide, sendo inócua qualquer outra prova, conforme se verá adiante. Desta forma, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa.- VOTO – MÉRITO Eminentes pares Inicialmente, para melhor compreensão, necessário fazer um resumo sucinto dos acontecimentos em ambos os feitos. Em suma, na Ação de Usucapião Extraordinária nº 1011177-32.2023.8.11.0041, ajuizada pela CARAMORI EQUIPAMENTOS PARA O TRANSPORTE LTDA contra BANCO DO BRASIL S/A, alegou a parte autora/usucapiente que a parte requerida adquiriu o título dominial da área situado na Av. Pedro Paulo de Faria Junior, nº 1714, Bairro Distrito Industrial, Cuiabá/MT, registrado na matrícula nº 44.366, perante o Cartório do 5º Ofício de Cuiabá, por meio de carta de adjudicação expedida na data de 30 de janeiro de 2007. Sustentou a autora que exerce a posse mansa e pacífica no imóvel da parte requerida há mais de 16 (dezesseis) anos, tendo realizado construções e benfeitorias no local, possuindo alvarás de funcionamento devidamente concedidos pelos órgãos competentes. Aduziu que o exercício de posse sempre foi de conhecimento da parte requerida, a qual não realizou qualquer medida para a retomada da posse do imóvel. Informou que o imóvel objeto da usucapião (matrícula 44.366) não se confunde com o imóvel locado de terceira pessoa (matrículas 53.095, 53.096, 53.097, 53.098 e 53.099). Ao final, pugnou pela procedência da ação, para que seja declarado o tempo prescricional da usucapião extraordinária sobre o imóvel em discussão, com a expedição do necessário para a aquisição originária. Citado, o requerido ofertou a contestação no ID nº 278310880, alegando a inexistência do preenchimento dos requisitos da usucapião, uma vez que a parte autora estaria ocupando o imóvel objeto de discussão nos autos na condição de locatária, se tratando, portanto, de posse precária, inexistindo animus domini, sendo a instituição financeira imitida na posse do imóvel na data de 10 de maio de 2016, interrompendo o prazo de prescrição aquisitiva, pugnando pela improcedência dos pedidos iniciais. Informou ainda o banco requerido que o imóvel em questão foi levado a leilão, sendo arrematado por THIAGO RONCHI ANDRIEN EUGENIO e FERNANDA CRISTINA MAIDANA DE MELLO EUGENIO. Impugnação à contestação no ID nº 278310896. O MP apresentou manifestação no ID nº 278310920, informando a ausência de interesse no feito. Ao sentenciar, a i. magistrada singular, em julgamento antecipado da lide, por considerar desnecessária a dilação probatória, julgou improcedente a ação. Por sua vez, o arrematante THIAGO RONCHI ANDRIEN EUGENIO e FERNANDA CRISTINA MAIDANA DE MELLO EUGENIO, ajuizou a Ação de Imissão de Posse nº 1007190-51.2024.8.11.004, em face de CARAMORI EQUIPAMENTOS PARA O TRANSPORTE LTDA sustentando ser proprietária do imóvel, localizado na Rua Pedro Paulo de Farias Júnior, n. 1.714 (lotes 13 a 17), bairro Distrito Industrial, Cuiabá/MT, adquirido por meio de leilão extrajudicial, arrematado pelo valor de R$ 637.000,00 (seiscentos e trinta e sete mil reais). A parte requerida ofertou contestação (ID 166236084), afirmando que exerce a posse no imóvel de forma mansa, pacífica e sem interrupção, sendo a área em discussão nos autos objeto de ação de usucapião, possuindo a requerida o período aquisitivo necessário para a obtenção da sentença da propriedade, pugnando pela improcedência dos pedidos iniciais. A impugnação à contestação fora apresentada no ID nº 169997179. Ao sentenciar, a i. magistrada singular, em julgamento antecipado da lide, por considerar desnecessária a dilação probatória, julgou procedente a ação. Pois bem. Analisando os principais documentos anexados, denota-se que o BANCO DO BRASIL S/A adquiriu o título dominial a área situado na Av. Pedro Paulo de Faria Junior, nº 1714, Bairro Distrito Industrial, Cuiabá/MT, registrado na matrícula nº 44.366, perante o Cartório do 5º Ofício de Cuiabá, por meio de CARTA DE ADJUDICAÇÃO expedida na data de 30 de janeiro de 2007, em face da execução nº 1996/515, tendo como devedora PLACAS CUIABÁ COMPENSADOS LTDA, ARI WOJCIK e SEBASTIÃO EDSON SOARES, sendo devidamente registrado no cartório competente: Diante da adjudicação realizada pelo banco, foi deferido o pedido de imissão na posse em seu favor, cujo mandado foi devolvido sem cumprimento em 08/03/2007, pelo fato de o Sr. Oficial de Justiça ter noticiado que o imóvel estaria ocupado pela empresa CARAMORI, na qualidade de locatária. Posteriormente, em 10/05/2016, certificou o Oficial de Justiça que procedeu a imissão do BANCO DO BRASIL na posse do imóvel adjudicado, não obstante ter ainda o locatário permanecido no bem. Em seguida, na condição de proprietário, o BANCO DO BRASIL levou o bem a leilão, sendo ARREMATADO por THIAGO RONCHI ADRIEN EUGENIO e FERNANDA CRISTINA MAIDANA DE MELLO EUGENIO, em 30/11/2023, oportunidade em que o banco informou a existência de uma AÇÃO DE USUCAPIÃO n° 1011177.32.2023.8.11.0041 e de EXECUÇÃO n° 00025154419968110041, inclusive constando no item 16.6 do Edital do Leilão. Em razão da arrematação, foi lavrada a Escritura Pública de Compra e Venda de ID nº 271098916 e realizado o devido registro no cartório competente. Confira: De igual sorte, transcrevo um fragmento do contrato de locação, uma vez que a autora/usucapiente informou que o imóvel objeto da usucapião (matrícula 44.366) não se confunde com o imóvel locado de terceira pessoa, concernente às matrículas 53.095, 53.096, 53.097, 53.098 e 53.099: (...) Feitas tais ponderações, passo apreciar o mérito da ação. A questão central reside em verificar se a apelante/usucapiente exerceu posse ad usucapionem sobre o imóvel constante da área situada na Av. Pedro Paulo de Faria Junior, nº 1714, Bairro Distrito Industrial, Cuiabá/MT, registrada na matrícula nº 44.366, perante o Cartório do 5º Ofício de Cuiabá e, por consequência, se os apelados fazem jus ou não à imissão de posse. Em princípio, no tocante à usucapião extraordinária, necessário analisar se a usucapiente cumpriu os requisitos legais para a aquisição da propriedade do imóvel objeto do litígio. Não é de se olvidar que os requisitos para usucapião extraordinária se encontram previstos no art. 1.238, parágrafo único, do Código Civil de 2002: “Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis. Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.” Conforme se vê, para configuração da usucapião extraordinária, necessário preencher os seguintes requisitos: (i) posse exercida com animus domini; (ii) posse mansa e pacífica; (iii) posse contínua e ininterrupta; e (iv) decurso do prazo legal de 15 (quinze) anos, ou 10 (dez) anos na hipótese de implemento de moradia ou realização de obras ou serviços produtivos. Nesse sentido, são os ensinamentos de FLAVIO TARTUCE: “Ora, é requisito essencial da usucapião extraordinária a existência, em regra, de uma posse mansa e pacífica, ininterrupta, com animus domini e sem oposição por 15 anos. O prazo cai para 10 anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel sua moradia habitual ou houver realizado obras ou serviços de caráter produtivo, ou seja, se a função social da posse estiver sendo cumprida pela presença da posse-trabalho.” (Tartuce, Flávio Manual de direito civil: volume único / Flávio Tartuce. - 8. ed. rev, atual. e ampl. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018. P 947) Por outro lado, é sabido que o locatário ou comodatário, mesmo com a posse direta, embora titular do jus possessionis, não pode usucapir, justamente por lhes faltar o requisito do animus domini. Sobre o tema: “APELAÇÃO CÍVEL. Usucapião extraordinária. Sentença de improcedência. Insurgência da autora Desacolhimento. Ausência de comprovação do preenchimento dos requisitos necessários para usucapião extraordinária. Posse em razão de contrato de locação é precária. Afastamento do animus domini e do direito à usucapião. Ônus de prova que pertencia à apelante. Sentença mantida por seus próprios fundamentos (RITJSP, art. 252). Recurso improvido.” (TJ-SP - Apelação Cível: 00041188320128260071 Bauru, Relator.: Pastorelo Kfouri, Data de Julgamento: 22/08/2024, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/08/2024). Grifei. No caso em comento, conforme consta da petição inicial, a pretensão da apelante visa a aquisição, por usucapião extraordinária, “... sobre a área de 3.600 metros quadrados localizada na quadra exp. lotes 13 a 17, com testada de 60 (sessenta) metros por 60 (sessenta) metros também de laterais, atualmente denominada Avenida Pedro Paulo de Faria Junior ou marginal da Rodovia BR-364, nº 1.714, Distrito Industrial, Cuiabá/MT, CEP 78.098-270, objeto da matrícula nº 44.366 do 5º Ofício de Cuiabá/MT.” Denota-se que essa área que se pretende usucapir é exatamente a mesma objeto da arrematação, inclusive a rua, os lotes e a matrícula. De igual sorte, verifica-se que o contrato locação acima mencionado descreve com precisão o objeto da locação como o imóvel situado na "Rua Pedro Paulo de Farias Jr. N.º 1.714, Distrito Industrial de Cuiabá, Cuiabá-MT", mesma descrição utilizada pela apelante ao identificar o imóvel usucapiendo na petição inicial, inclusive trazendo a mesma metragem de área. Contudo, o que mais chama atenção foi a alegação da usucapiente de que o imóvel objeto da usucapião de matrícula 44.366 não se confunde com o imóvel locado de terceira pessoa de matrículas 53.095, 53.096, 53.097, 53.098 e 53.099. Ocorre que todas as matrículas foram objeto do contrato de locação, bastando observar CLÁUSULA PRIMEIRA – OBJETO DO CONTRATO – ÁREA DA OFÍCINA: Observa-se que a locação compreende área total de 3.600 m2, o que correspondente aos lotes 13 a17 da Avenida Pedro Paulo de Faria Junior nº 1.714 de matrícula nº 44.366, bem como as demais matrículas, uma vez que resta expresso que ficou incorporado no contrato de locação os imóveis ao lado, que por este instrumento o Locador subloca ao Locatário, os quais têm suas matrículas sob os ns. 53095/53096/53097/53098 e 53099 do R-I do CARTÓRIO DO 5º OFÍCIO, CUIABÁ. Portanto, denota-se que os imóveis das matrículas 53095/53096/53097/53098 e 53099.R-I no CARTÓRIO DO 5º OFÍCIO que não foram objeto da locação principal, e que se encontravam do lado imóvel locado incorporaram à locação principal de matrícula 44.366, qual seja, o mesmo da arrematação e da usucapião. Logo, conforme muito bem salientou o juízo singular, estamos diante de uma posse que teve origem em um contrato de locação, sendo assim, a posse exercida por locatário é classificada de natureza precária, desprovida do elemento animus domini, essencial à usucapião. Como ensina Pontes de Miranda, "quem possui em nome alheio não pode usucapir. Assim, por exemplo, o locatário, o comodatário, o depositário” (Tratado de Direito Privado, Tomo XI, § 1.192, n. 2). Ainda, inclusive desta Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA – POSSE PRECARIA – COMODATO VERBAL – POSTERIOR CELEBRAÇÃO DE CONTRATO DE LOCAÇÃO – AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI – IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA USUCAPIÃO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSOS CONHECIDOS E PROVIDOS. Para o reconhecimento da usucapião extraordinária, é indispensável a comprovação de posse qualificada, exercida com animus domini, de forma contínua, mansa e pacífica. No caso, as provas documentais e testemunhais demonstraram que a posse exercida pela requerida decorreu de cessão gratuita, posteriormente formalizada em contrato de locação firmado pelo espólio do proprietário falecido com o ex-esposo da requerida, descaracterizando, de forma inequívoca, o animus domini. O simples decurso do tempo, desacompanhado da demonstração de atos concretos que evidenciem a intenção de exercer domínio, não é suficiente para legitimar a usucapião extraordinária. Recursos de apelação providos.” (TJMS - Apelação Cível: 08017249420228120011 Coxim, Relator.: Juiz Alexandre Branco Pucci, Data de Julgamento: 31/01/2025, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: 04/02/2025) “APELAÇÃO CÍVEL - USUCAPIÃO URBANA ART. 1.238 CC - CONTRATO DE LOCAÇÃO - AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI - REQUISITO ESSENCIAL - POSSE PRECÁRIA - PRESCRIÇÃO AQUISITIVA NÃO CONFIGURADA - RECURSO DESPROVIDO. A posse do locatário é denominada ad interdicta e, ao contrário do que ocorre na ad usucapionem, gera somente direito de defesa, em especial porque aquele que assina o contrato de locação deixa explícito que pretende ser mero possuidor, mediante pagamento mensal de aluguel, circunstância que impede a configuração da prescrição aquisitiva. Na hipótese, o próprio autor juntou cópia do instrumento contratual, documento que, por si só, afasta sua pretensão.” (TJMT - APL: 00043566620118110003 MT, Relator.: CLARICE CLAUDINO DA SILVA, Data de Julgamento: 29/07/2015, SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Data de Publicação: 06/08/2015) "RECURSO DE APELAÇÃO - USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA - REQUISITOS LEGAIS NÃO COMPROVADOS - ÔNUS DA PROVA - ART. 373, I, CPC - CONJUNTO PROBATÓRIO QUE REVELA A INEXISTÊNCIA DE POSSE MANSA E PACÍFICA DA AUTORA - POSSE ORIUNDA DE CONTRATO DE LOCAÇÃO/CESSÃO DE IMÓVEIS - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS DO ARTIGO 1.238 DO CÓDIGO CIVIL - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. [...] No caso, a posse exercida pela parte autora é precária, porque advinda de contrato de locação/cessão, o que afasta a possibilidade do reconhecimento da prescrição aquisitiva. Posse direta exercida em razão de contrato de locação celebrado com o titular do domínio evidencia que o locatário tem somente posse direta e ad interdicta, com dever de restituição, incompatível com o animus domini exigido no art. 1.238 do Código Civil." (TJMT, N.U 1003789-59.2018.8.11.0007, Rel. Des. GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, julgado em 12/07/2023). Portanto, não se sustenta a alegação da apelante de que o contrato de locação se referia apenas ao imóvel contíguo, correspondente às matrículas nº 53.095, 53.096, 53.097, 53.098 e 53.099, e não ao imóvel objeto da usucapião (matrícula nº 44.366) diante da descrição constante no próprio contrato de locação, que indica expressamente os mesmos lotes, endereço e matrícula do imóvel usucapiendo. Ademais, as certidões de oficiais de justiça juntadas aos autos corroboram a tese de que a apelante ocupava o imóvel na condição de locatária. Em diligência realizada em 08/03/2007, o oficial de justiça certificou: "onde está estabelecida a empresa Caramori, que é locatária de um imóvel com área total construída de aproximadamente 1.800m², construída, em três terrenos de 1.200m cada, totalizando 3.600m², cercado com tela, calçado com pedra brita, onde funciona uma oficina mecânica". Não é de se olvidar que a certidão lavrada por servidor Oficial de Justiça tem fé pública, contando, portanto, com presunção de legitimidade e veracidade, razão pela qual, qualquer alegação em sentido contrário deve apresentar prova robusta, formal e concreta para sua invalidação, o que não ocorreu no caso concreto. Ademais, o atual Código de Processo Civil em seu art. 405 preconiza “o documento público faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o chefe de secretaria, o tabelião ou o servidor declarar que ocorreram em sua presença”. Aliás, a fé pública do oficial de justiça e a validade dos atos processuais que ele pratica enquanto longa manus do Estado encontra-se pacificada jurisprudência do STJ e no TJMT: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA. NULIDADE DA CITAÇÃO. CERTIDÃO DO OFICIAL DE JUSTIÇA. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. FÉ PÚBLICA. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. O oficial de justiça goza de fé pública, apenas podendo ser afastada a presunção de veracidade dos fatos por ele afirmados em certidão na hipótese de prova em contrário. 3. Não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos. Agravo interno não provido.” (STJ - AgInt no AREsp: 2373614 GO 2023/0178772-4, Relator.: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 27/11/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/11/2023) “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE – ÁREA RURAL – AUSÊNCIA DE ASSINATURA DO REQUERIDO NO MANDADO DE CITAÇÃO – ARGUIÇÃO DE NULIDADE – INOCORRÊNCIA – CERTIDÃO DO OFICIAL DE JUSTIÇA – FÉ PÚBLICA – INTELIGÊNCIA DO ART. 405 DO CPC – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O Oficial de Justiça, servidor público, é dotado de fé pública, sendo suficiente a sua certidão expressa da realização do ato processual destinado, nos termos do que dispõe o art. 405 do Código de Processo Civil. Aliás, a presunção de veracidade da tal certidão somente poderá ser elidida por prova em contrário, o que não se verifica no caso concreto.’ (TJMT 10010142120198110077 MT, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 13/07/2022, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 19/07/2022) “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE EXECUÇÃO – CITAÇÃO POR HORA CERTA – CERTIDÃO DO MEIRINHO – DESCRIÇÃO PORMENORIZADA DOS DIAS E HORÁRIOS EM QUE TENTADA A CITAÇÃO – DESNECESSIDADE – AUSÊNCIA DE DISPOSIÇÃO LEGAL PARA TANTO – OFICIAL DE JUSTIÇA – MUNIDO DE FÉ PÚBLICA – PRESUNÇÃO DE VERACIDADE NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES – LEGITIMIDADE PASSIVA – RECONHECIMENTO DE GRUPO ECONÔMICO – DECISÃO MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Não há em nosso ordenamento jurídico a exigência de que o Oficial de Justiça consigne expressamente em sua certidão os dias e horários em que tentada a citação, antes que se proceda a citação por hora certa. O Oficial de Justiça goza de fé pública e presunção de veracidade no exercício de suas funções, de modo que seus atos somente podem ser desconstituídos em caso de comprovada nulidade. Diante da documentação acostada pelo exequente, resta evidenciada a existência de grupo econômico do qual fazem parte as empresas executadas, já que compactuam de idêntico objeto social e endereço.” (TJMT – Nº 10135102220198110000- TJMT, Terceira Câmara de Direito Privado, Rel.: DIRCEU DOS SANTOS, Julgamento: 18/12/2019, Publicação: 22/01/2020) Portanto, a tentativa da apelante de distinguir o imóvel locado daquele objeto da usucapião não encontra respaldo na prova documental, sendo contraditada pela descrição do contrato e pela certidão dos oficiais de justiça. A mera juntada de fotografias e plantas não é suficiente para demonstrar que se trata de áreas distintas, especialmente quando confrontada com documentos mais robustos que indicam o contrário. Por outro lado, ainda que se admitisse, por uma eventualidade, a existência de posse ad usucapionem exercida pela apelante, haveria outro óbice intransponível à sua pretensão, qual seja, a interrupção do prazo prescricional pela imissão na posse efetivada pelo Banco do Brasil. Conforme certificado pelo Oficial de Justiça em 10/05/2016, o Banco do Brasil foi efetivamente imitido na posse do imóvel: Portanto, a partir de então, com a imissão do banco na posse do imóvel, a permanência do apelante constitui posse precária, já que se encontra no bem por mera permissão. Aliás, em se tratando de imissão de posse, desnecessário o proprietário ter exercido ou exercer a posse, bastando ter o domínio, podendo obter a posse no momento que lhe convier. Sobre o tema, inclusive de minha lavra: "... A ação de imissão de posse é própria para aqueles que detêm o título do domínio, mas não exercem a posse. Assim, além da prova do domínio, o seu deferimento pressupõe a delimitação do bem e a posse injusta de um terceiro. Se a parte autora demonstrou consolidação da propriedade em favor do banco credor fiduciário, junto ao Oficial do Registro de Imóveis, com força de fé pública; a arrematação do imóvel em leilão público; bem como o inadimplemento da requerida, há de ser mantida a decisão de imissão de posse..." (TJ/MT – N.U 1027405-11.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/01/2024, Publicado no DJE 30/01/2024) “APELAÇÃO CÍVEL - IMISSÃO NA POSSE - IMÓVEL ARREMATADO EM LEILÃO EXTRAJUDICIAL DA CEF - PROPRIEDADE COMPROVADA - DIREITO À IMISSÃO NA POSSE DO IMÓVEL - EXCEÇÃO DE USUCAPIÃO - POSSE PRECÁRIA - BENFEITORIAS - INDENIZAÇÃO - INEXIGIBILIDADE - TAXA DE OCUPAÇÃO - COBRANÇA DEVIDA. Estando comprovados os requisitos, deve a imissão ser acolhida e reconhecida. Para a aquisição da propriedade por usucapião é indispensável a presença de posse mansa, pacífica, prolongada e com caráter de dono, que, se comprovada, resulta no reconhecimento do domínio. A posse precária não é apta a gerar a usucapião. Em se tratando de imóvel adquirido através de arrematação em leilão extrajudicial, não cabe exigir indenização ou retenção por eventuais benfeitorias ao adquirente, já que elas são incorporadas na avaliação prévia do bem arrematado. Segundo dispõe o artigo 38 do Decreto-lei 70/66 é possível o julgador arbitrar a taxa de ocupação desde o registro da arrematação até a imissão na posse do imóvel pelo arrematante.” (TJ-MG - AC: 10702084461053004 MG, Relator.: José Augusto Lourenço dos Santos, Data de Julgamento: 19/06/2019, Data de Publicação: 27/06/2019) “APELAÇÃO CÍVEL. DIREITOS REAIS. AÇÃO DE IMISSÃO DE POSSE. IMÓVEL ARREMATADO EM LEILÃO EXTRAJUDICIAL PROMOVIDO PELA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. DIPLOMA DE REGÊNCIA QUE CONFERE AOS ARREMATANTES O DIREITO DE IMISSÃO NA POSSE DO BEM. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 30, DA LEI N.º 9.514/97. IMÓVEL QUE OSTENTA NATUREZA DE BEM PÚBLICO. AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI. POSSE PRECÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE PELO INSTITUTO DA USUCAPIÃO. PRECEDENTES. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA QUE DEVE SER REFORMADA. RECURSO QUE SE DÁ PROVIMENTO.” (TJ-RJ - APL: 00114839820148190012 202300158034, Relator.: Des(a) . VALÉRIA DACHEUX NASCIMENTO, Data de Julgamento: 24/08/2023, SEXTA CAMARA DE DIREITO PRIVADO (ANTIGA 13ª CÂMARA, Data de Publicação: 28/08/2023) Ademais, imissão na posse constitui ato judicial formal de transferência da posse direta do imóvel ao seu titular, interrompendo qualquer posse anterior exercida por terceiros. Ao ser imitido na posse em 10/05/2016, o Banco do Brasil interrompeu o suposto prazo prescricional invocado pela apelante, de modo que, entre essa data e o ajuizamento da ação de usucapião (28/03/2023), transcorreram apenas 6 anos e 10 meses, lapso temporal insuficiente para a configuração da usucapião extraordinária, seja na modalidade ordinária (15 anos) ou reduzida (10 anos). No mais, a apelante sustenta que exerce posse sobre o imóvel desde a data da adjudicação pelo Banco do Brasil (30/01/2007), totalizando mais de 16 anos até o ajuizamento da ação de usucapião (28/03/2023). Contudo, não logrou demonstrar documentalmente o exercício da posse durante todo esse período. Os documentos juntados pela apelante para comprovar sua posse são relativamente recentes, como registros fotográficos datados de 20/03/2023 (ID nº 113697909), relação de gastos de 19/12/2022 (ID nº 113697920) e relação de empregados com admissão nos anos de 2019, 2020 e 2021 (ID nº 113697913). Tais documentos não são hábeis a comprovar o exercício da posse pelo período integral alegado, corroborando a conclusão da sentença de que não foi demonstrada a posse ininterrupta pelo prazo necessário à configuração da usucapião. Vale ressaltar também que, conforme se observa das próprias razões recursais, a ação de usucapião foi ajuizada pela apelante apenas em 28/03/2023, após tomar conhecimento da iminente arrematação do imóvel pela apelada, o que confirma a conclusão de que não se trata de exercício de posse ad usucapionem legítima, mas de tentativa de obstar o direito de propriedade legitimamente adquirido pelos apelados. Destaca-se ainda que, no que tange aos comprovantes de pagamento de IPTU, os documentos apresentados pela apelante referem-se apenas aos anos de 2012/2013, conforme consignado pela própria sentença recorrida. Não há comprovação de pagamento contínuo e ininterrupto durante os 15 anos alegados (ou 10 anos, na hipótese do parágrafo único do art. 1.238 do CC). Ademais, o mero pagamento de tributos prediais, por si só, não caracteriza a posse ad usucapionem, especialmente quando há elementos que demonstram a existência de relação locatícia. No tocante às declarações de confinantes apresentadas estas são insuficientes para comprovar o exercício de posse com animus domini pelo prazo legal, sendo documentos unilaterais que não afastam as provas concretas apresentadas pelos apelados, consistentes em contratos de locação e certidões de oficiais de justiça que atestam a qualidade de locatária da apelante. Quanto às faturas de energia elétrica juntadas aos autos, estas são recentes e não comprovam a extensão temporal da posse alegada. A fatura apresentada refere-se ao mês de outubro de 2022 (ID nº 113697898), não servindo para comprovar o exercício de posse durante os 15 anos necessários à usucapião extraordinária. Já a certidão de contribuinte, tal documento não possui o condão de comprovar o exercício de posse mansa, pacífica e ininterrupta com animus domini, tratando-se apenas de registro cadastral que não afasta a condição de locatária da apelante. No que refere ao alvará apresentado, este é do ano de 2022 (ID nº 113697892) e, assim como os demais documentos, não comprova o exercício de posse com animus domini pelo período necessário à usucapião. A existência de alvará de funcionamento apenas demonstra que a empresa opera regularmente no local, o que é plenamente compatível com a condição de locatária. Destarte, não havendo posse ad usucapionem legítima por parte da apelante, e estando devidamente comprovada a propriedade dos apelados, mediante título aquisitivo registrado no Cartório de Registro de Imóveis competente, impõe-se reconhecer o direito dos proprietários titulares do domínio à imissão na posse, nos termos do art. 1.228 do Código Civil. Sobre o tema, inclusive de minha lavra: “APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE IMISSÃO DE POSSE - IMÓVEL ARREMATADO EM LEILÃO - REQUISITOS - PROCEDÊNCIA DA DEMANDA. - A ação de imissão de posse é a ação real de quem possui título legítimo para imitir-se na posse de bem, ou seja, do proprietário que ainda não obteve a posse da coisa. Restando preenchidos os requisitos previstos no Decreto-Lei n. 70, de 1966, deve ser julgada procedente a ação de imissão de posse.” (TJ-MG - AC: 10000160286555002 MG, Relator: Cláudia Maia, Data de Julgamento: 26/08/2021, Câmaras Cíveis / 14ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 26/08/2021) “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE IMISSÃO DE POSSE E COBRANÇA DE ALUGUERES – PROCEDÊNCIA – PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA – REJEIÇÃO – MÉRITO – IMÓVEL ADQUIRIDO EM LEILÃO JUDICIAL – PROVA DA PROPRIEDADE – IMISSÃO DO AUTOR NA POSSE DO IMÓVEL – POSSIBILIDADE – POSSE INJUSTA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (...) A ação de imissão de posse constitui via adequada para que o adquirente do imóvel, proprietário, obtenha a posse do bem. Trata-se de ação de cunho petitório, representando o remédio jurídico posto à disposição do proprietário não possuidor para que desfrute do exercício da posse direta. O adquirente do imóvel arrematado em leilão judicial, após transcrita a Carta de Arrematação no Cartório de Registro de Imóveis, tem direito à imissão na posse do bem, consoante determina o art. 37, § 2º, do Decreto-Lei 70/66. Não há se falar em posse justa da requerida, ora apelante, haja vista que, com a arrematação do imóvel e consequente registro imobiliário, bem como com pedido de desocupação do bem comprovado pela notificação extrajudicial, a posse da requerida, ora apelante, se tornou clandestina e não pode ser utilizada como subterfúgio para sua manutenção no imóvel.-“ (TJ-MT - AC: 10046765820188110002, Relator.: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 19/07/2023, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/07/2023). Desta forma, por qualquer ângulo que se analise a causa, o direito não socorre à apelante, devendo ambas as sentenças serem mantidas. Ante o exposto, nego provimento a ambos os recursos, mantendo a improcedência da usucapião e a procedência da imissão de posse. Em razão da sucumbência recursal, majoro os honorários advocatícios devidos pela apelante em cada demanda em mais 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. E como voto.- Data da sessão: Cuiabá-MT, 23/07/2025
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