Banco Votorantim S.A. x Juliana Goulart Ferraz
ID: 282033181
Tribunal: TJPR
Órgão: 1ª Vara Cível de Francisco Beltrão
Classe: BUSCA E APREENSãO EM ALIENAçãO FIDUCIáRIA
Nº Processo: 0009552-73.2024.8.16.0083
Data de Disponibilização:
28/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MOISES BATISTA DE SOUZA
OAB/PR XXXXXX
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RAFAEL DENIZ DE AMORIM
OAB/PR XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE FRANCISCO BELTRÃO 1ª VARA CÍVEL DE FRANCISCO BELTRÃO - PROJUDI Rua Tenente Camargo, 2112 - Centro - Francisco Beltrão/PR - CEP: 85.601-610 - Fone: (46)…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE FRANCISCO BELTRÃO 1ª VARA CÍVEL DE FRANCISCO BELTRÃO - PROJUDI Rua Tenente Camargo, 2112 - Centro - Francisco Beltrão/PR - CEP: 85.601-610 - Fone: (46) 39056701 - E-mail: fb-1vj-s@tjpr.jus.br Autos nº. 0009552-73.2024.8.16.0083 Processo: 0009552-73.2024.8.16.0083 Classe Processual: Busca e Apreensão em Alienação Fiduciária Assunto Principal: Alienação Fiduciária Valor da Causa: R$47.724,19 Autor(s): Banco Votorantim S.A. Réu(s): JULIANA GOULART FERRAZ S E N T E N Ç A I – RELATÓRIO BANCO VOTORANTIM S.A., por seus procuradores, propôs a presente Ação de Busca e Apreensão com pedido de Medida Liminar contra JULIANA GOULART FERRAZ, alegando, em síntese: a) concedeu à ré um financiamento no valor de R$ 49.848,21 (quarenta e nove mil, oitocentos e quarenta e oito reais e vinte e um centavos), para ser restituído por meio de 55 prestações mensais, no valor de R$ 1.683,41 (mil e seiscentos e oitenta e três reais e quarenta e um centavos), com vencimento final em 24/12/2026, garantido por Alienação Fiduciária, contrato nº 12274000003840 celebrado em 26/05/2022; b) o réu transferiu em alienação fiduciária o bem “CHEVROLET – S10 CD ADVANTAGE 4X2 2.4 8V 4P (AG) Completo – 2008/2009 – PRETA – AZO7979 – 9BG138HU09C429289 – 115873481”; c) a ré tornou-se inadimplente, deixando de efetuar o pagamento das prestações a partir de 24/04/2024. Ao final, requereu a concessão da liminar da busca e apreensão do bem e a condenação da ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios. Atribuiu à causa o valor de R$ 47.724,19. Juntou documentos às seqs. 1.1/16. A inicial foi recebida em 26 de novembro em 2024, em seq. 20.1, sendo acolhida a liminar de busca e apreensão do bem. Expedido mandado de busca e apreensão, o veículo foi apreendido conforme auto de seq. 25.1/25.4. A requerida apresentou contestação (seq. 30.1) alegando, em síntese: a) faz jus ao benefício da justiça gratuita; b) aplicação do CDC e inversão do ônus da prova; c) abusividade da cobrança de juros moratórios em patamar de 6% (seis por cento) ao mês; d) ilegalidade da cobrança de capitalização de juros diária sem indicar a taxa a ser aplicada; e) foram cobrados juros remuneratórios acima da taxa média de mercado; f) faz jus à restituição dos valores cobrados indevidamente; g) afastamento da mora. Ao final, requereu a improcedência dos pedidos aduzidos na inicial. Juntou documentos de seq. 30.1/30.9. O autor apresentou a impugnação à contestação (seq. 35.1). Intimadas para especificação de provas, ambas as partes informaram não possuir novas provas a produzir (seq. 38.1 e 40.1). Vieram-se os autos conclusos para sentença. É o breve relato. Passo a decidir. II – FUNDAMENTAÇÃO Preliminarmente A parte ré requereu a concessão dos benefícios da justiça gratuita. A parte autora, por sua vez, impugnou o pedido, alegando que a parte ré deixou de comprovar documentalmente que não possui condições de arcar com as custas processuais e honorários advocatícios. Em que pesem os argumentos da parte impugnante, entende-se que não merece acolhimento a sua pretensão. Isso porque, nos termos do art. 99, §2º do CPC o juiz somente poderá inferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão da gratuidade. Ademais, a afirmação do requerente do benefício gera a chamada presunção iuris tantum de veracidade, cabendo à parte contrária o ônus da prova em sentido contrário, com o propósito de elidir a presunção de pobreza, o qual não restou comprovado no caso. Vejamos o julgado: Agravo de instrumento. Justiça Gratuita. Pessoa física. Deferimento pela decisão agravada. Impugnação pela parte contrária. No incidente de impugnação ao pedido de justiça gratuita, compete ao impugnante o ônus da prova de que o impugnado tem condições financeiras de arcar com as despesas processuais sem o prejuízo de seu sustento ou de sua família. Não o fazendo, impõe-se o indeferimento da impugnação. Agravo conhecido e não provido. (TJPR - 15ª C.Cível - 0020157-46.2018.8.16.0000 - Londrina - Rel.: Hamilton Mussi Corrêa - J. 01.08.2018) “APELAÇÃO CÍVEL. IMPUGNAÇÃO À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. A presunção de pobreza decorrente da simples alegação de miserabilidade do interessado não pode ser afastada por indício decorrente de sua profissão ou pelo valor dos rendimentos por ele percebidos. É pacifica a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o benefício da assistência judiciária gratuita pode ser concedido mediante simples afirmação do requerente, sem necessidade de comprovação, ressalvando-se que a parte contrária pode pedir a sua revogação se provar a inexistência da alegada hipossuficiência" (acórdão n° 4.942, Décima Sexta Câmara Cível, relator Desembargador SHIROSHI YENDO, DJ 23/02/2007). Portanto, não havendo outras provas a amparar a pretensão do autor, não merecem prosperar suas alegações. Em face das razões expostas, rechaço a impugnação suscitada, e concedo o benefício da justiça gratuita em favor da parte ré. Verifico, ao passo seguinte, que inexistem preliminares para serem analisadas, pelo que reafirmo a presença dos pressupostos processuais de existência (pedido, investidura do juiz, citação válida e capacidade postulatória) e validade (petição inicial regular, competência, legitimidade, interesse e capacidade de estar em juízo), e a inexistência dos pressupostos processuais negativos (litispendência, perempção e coisa julgada). Mérito Cuida-se de ação de busca e apreensão fundada no Decreto-lei nº 911, de 01/10/69, proposta por BANCO VOTORANTIM S.A. contra JULIANA GOULART FERRAZ. Analisando-se os autos, constata-se que o requerido, no dia 10.12.2021, adquiriu, através da Cédula de Crédito Bancário (seq. 1.8), o veículo marca/modelo CHEVROLET – S10 CD ADVANTAGE 4X2 2.4 8V 4P (AG) Completo – 2008/2009 – PRETA – AZO7979 – 9BG138HU09C429289 – 115873481, obtendo financiamento no valor de R$46.434,00, a ser pago em 48 parcelas, posteriormente renegociado através do aditivo de seq. 1.8, fl. 04. Como garantia do fiel cumprimento do contrato, restou o veículo gravado com alienação fiduciária em favor da autora. Assim, devem ser observadas as exigências previstas no Decreto-Lei nº 911/69, por ser norma específica, à comprovação da constituição em mora. Na citada legislação, resta claro que, para o ajuizamento da ação de busca e apreensão, é necessário o inadimplemento da obrigação assumida com a constituição do devedor em mora. No caso em concreto, tem-se que o requerido deixou de cumprir as obrigações assumidas voluntariamente, suspendendo o pagamento das parcelas mensais, sendo constituído em mora através de seu comparecimento espontâneo nos autos. Desta feita, a mora restou caracterizada. Não resta dúvida de que tanto as instituições financeiras quanto as pessoas jurídicas que se utilizem da alienação fiduciária em garantia terão os seus contratos norteados pelo Código Civil, interpretados sistemática e harmoniosamente com as regras previstas no Código de Defesa do Consumidor. Sabe-se, de igual sorte, que a alienação fiduciária é um contrato com peculiaridades próprias, sendo regulada por legislação específica (artigo 1º, §1º, do Decreto-lei nº 911/69), que não foi derrogada, tampouco alterada pelo Diploma Consumerista e pela Constituição Federal e, portanto, vigora e produz seus efeitos legais e jurídicos. Nesse contexto, importante ressaltar que o artigo 3º, §2º do referido Decreto-Lei (com redação conferida pela Lei nº 10.931/2004), que faculta ao devedor fiduciário a quitação da integralidade da dívida pendente, não foi revogado pelo Código de Defesa do Consumidor e é, portanto, aplicável ao presente caso. Dessa forma, haverá preclusão consumativa se o devedor perder a oportunidade que lhe é facultada ou se efetuar o pagamento a menor do que o devido. Dispõe expressamente o artigo 66 da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, que: “A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta da coisa móvel alienada, independentemente da tradição efetiva do bem, tornando-se o alienante ou devedor em possuidor direto e depositário com todas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de acordo com a lei civil e penal”. Verifica-se, portanto, que o alienante do veículo objeto do contrato de alienação fiduciária possui apenas a posse direta do bem, sendo certo que para ceder seus direitos a terceiros, depende de anuência do credor fiduciário. Dessa forma, o bem alienado fiduciariamente não integra o patrimônio do devedor. No caso dos autos, o requerido em momento algum alegou ter efetuado o pagamento das prestações vencidas e descritas na inicial, tampouco se manifesta acerca da aludida existência da dívida atrasada. Reconhece, dessa maneira, a existência do contrato de financiamento com alienação fiduciária e a sua inadimplência. Entretanto, pugna o requerido pela revisão de cláusulas contratuais do presente instrumento particular, a fim de adequá-las à melhor exegese da legislação consumerista. Inicialmente, cumpre observar que se afigura admissível a extensão dos termos da contestação, nas ações de busca e apreensão de que se trata, para efeito de revisão das cláusulas contratuais celebradas em desconformidade com a legislação em vigor, não havendo como se entrever, na dilargação dos temas de defesa, qualquer ofensa ao Decreto-Lei 911/69. De fato, não se pode negar que a discussão contratual contribui para a efetividade processual, na medida em que permite a obtenção de um resultado mais amplo e célere, no mesmo processo e numa mesma decisão, onde ficarão resolvidas as pendências entre as partes acerca daquela relação jurídica, cumprindo-se, com rigor, o princípio da celeridade e economia processual. É nesse sentido o julgado: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO GARANTIDO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. 1. PEDIDO DE REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS FORMULADO EM SEDE DE CONTESTAÇÃO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PEDIDO GENÉRICO. DESNECESSIDADE, NA HIPÓTESE, DE QUE O RÉU IMPUGNASSE ESPECIFICAMENTE O VALOR INDICADO COMO DEVIDO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, APONTANDO O MONTANTE ENTENDIDO COMO DEVIDO. 2. CONSTITUIÇÃO EM MORA DO DEVEDOR. MATÉRIA JÁ APRECIADA ANTERIORMENTE TANTO EM PRIMEIRO QUANTO EM SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. PRECLUSÃO. ART. 471, CAPUT, DO CPC. RECURSO NÃO CONHECIDO NO PONTO. (...) (TJPR - 17ª C.Cível - AC - 1002077-0 - Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Francisco Eduardo Gonzaga de Oliveira - Unânime - - J. 12.06.2013) Nessa contextualidade, não há dúvida, pois, da aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso analisado, posto que configurada a relação de consumo, sendo o requerido considerado adquirente de produto/serviço como destinatário final, de acordo com o art. 2º da aludida lei. Aliás, restou pacificada a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor no âmbito das relações contratuais bancárias, independentemente das características dos sujeitos contratantes, com a edição da Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça (“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”). Todavia, no caso em tela, considerando que há a possibilidade do autor/consumidor em demonstrar a prova do fato que pretende através dos meios ordinários de prova, descaracterizada está a sua hipossuficiência. Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - AUSÊNCIA DE HIPOSSUFICIÊNCIA - IMPOSSIBILIDADE. A inversão do ônus da prova não é, em tese, automática, e deve ocorrer somente se presentes a hipossuficiência ou a verossimilhança das alegações da parte requerente, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, sendo uma faculdade do magistrado o momento de concedê-la. Assim, inexistindo a alegada hipossuficiência e a dificuldade ou impossibilidade do consumidor em demonstrar, pelos meios ordinários, a prova do fato que pretende produzir, não há falar em sua concessão. (TJ-MG - AI: 10701120208460003 MG , Relator: Luciano Pinto, Data de Julgamento: 05/12/2013, Câmaras Cíveis / 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 17/12/2013) Assim, não há que se falar em inversão do ônus da prova. Destarte, como alhures mencionado, com a flexibilização do princípio da pacta sunt servanda, possível se torna a revisão contratual, mormente frente aos princípios da boa-fé objetiva, do dirigismo contratual e da função social dos contratos, a fim de que se restaure o equilíbrio entre os contratantes quando a manutenção contratual representar excessiva onerosidade para qualquer das partes envolvidas. Friso, por fim, que possível é a revisão das cláusulas excessivas e abusivas pelo Poder Judiciário, sempre dentro dos limites estabelecidos pelas normas de ordem pública e pelas diretrizes do Código de Defesa do Consumidor. Insta destacar, igualmente, que a tutela plena do negócio jurídico não foi repassada totalmente ao Judiciário, nem mesmo pelo fato do contrato impugnado classificar-se como de adesão. Apesar da existência de cláusulas pré-determinadas, a autonomia da vontade, elemento essencial aos negócios jurídicos, encontra-se limitada e não completamente eliminada, tendo o contratante a liberdade e a faculdade de aderir ou não às suas cláusulas, porque depende de seu arbítrio a contratação. Reflete essa ideia o que foi compendiado na Súmula 381 do Superior Tribunal de Justiça: "Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas". Portanto, o consumidor não está desobrigado de alegar em juízo toda a matéria de direito e impugnar especificamente as cláusulas que, no seu entendimento, devem ser revisadas. Todavia, deixou a parte ré de impugnar especificamente as tarifas contratadas, motivo pelo qual nos termos da súmula 381 do STJ deixo de analisar eventual abusividade das tarifas contratadas e por consequência, de eventual venda casada. Posto isso, cumpre analisar os argumentos colacionados aos autos, cabendo destacar que a lide se encontra delimitada à possibilidade de cobrança de taxa de juros acima da taxa média de mercado, cobrança de juros capitalizados diariamente, limitação da taxa de juros moratórios. Da Limitação da Taxa de Juros É de se registrar que desde a promulgação da Constituição da República de 1988 vinha se discutindo na doutrina e jurisprudência sobre a auto-aplicabilidade ou não da norma constitucional inserta no artigo 192, § 3º. Por meio do julgamento da ADIN n.º 4/DF determinou tratar-se de norma de eficácia limitada, dependente de regulamentação legislativa para produzir efeitos, sendo tal entendimento adotado pela maioria dos tribunais. Ademais, por força da edição da Emenda Constitucional n.º 40/2003 foram revogados todos os incisos, alíneas e parágrafos do artigo 192 da Constituição Federal, aí incluído o § 3º que estabelecia que “as taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a 12% (doze por cento) ao ano”. Em consonância com o acima exposto, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula de nº 648, sendo que a questão também foi objeto de Súmula Vinculante editada pelo Supremo Tribunal Federal (nº 7), in verbis: “a norma do § 3º do art. 192 da Constituição, revogada pela emenda constitucional 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar”. Cabe ressaltar, também, a inaplicabilidade das limitações constantes na Lei da Usura (Decreto nº 22.626/33) às instituições bancárias, matéria também sumulada pelo STF: “As disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional.” (Súmula nº 596). Assim, admissível a incidência dos juros acima de 12% ao ano. Ainda no que concerne à taxa de juros remuneratórios, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, julgando o REsp 1.061.530-RS, tomado como representativo das questões bancárias, fixou o entendimento de que a alteração dos juros pactuados só se admite quando se mostrem abusivos a ponto de colocar o consumidor em desvantagem exagerada no sentido das disposições do art. 51, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, consoante a Orientação nº 1, adotada pelo STJ, no julgamento do REsp 1.061.530-RS, posta nestes termos: Orientação 1 - Juros Remuneratórios a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada artigo 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do caso concreto. Sublinhe-se, nessa linha, que taxa abusiva não é o mesmo que taxa superior, pois para caracterização da abusividade há necessidade de que, considerando as circunstâncias e natureza do contrato, as taxas estejam muito acima da média do mercado, representado desvantagem exagerada para o consumidor. No caso contrato, observa-se no contrato de seq. 1.8 que a taxa efetiva mensal é de 2,48% e anual de 34,16%, sendo que a taxa média para aquisição de veículo na data do financiamento (12/2021) era de 2% ao mês e 26,79% ao ano (segundo planilha “25471 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Aquisição de veículos e 20749 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Aquisição de veículos” do Banco Central do Brasil”[1]). Igualmente, observa-se no aditivo de seq. 1.8, fl. 04 que a taxa efetiva mensal é de 2,48% e anual de 34,17%, sendo que a taxa média para aquisição de veículo na data do refinanciamento (06/2022) era de 2,04% ao mês e 27,43 % ao ano (segundo planilha “25471 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Aquisição de veículos e 20749 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Aquisição de veículos” do Banco Central do Brasil). Contudo, em que pese a taxa de juros praticada pela instituição financeira tenha excedido a média do mercado, isso, por si só, não induz a conclusão de abusividade, vez que a taxa média de mercado é apenas um referencial e não um limite que deva ser necessariamente observado, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "A circunstância de a taxa de juros remuneratórios praticada pela instituição financeira exceder a taxa média do mercado não induz, por si só, a conclusão de abusividade, consistindo a referida taxa em um referencial a ser considerado, e não em um limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras" (AgRg nos EDcl no Ag 1322378/RN, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe de 1.8.2011). Ademais, considera-se taxas exorbitantes apenas aquelas acima do dobro da média aplicada no mercado. Tal parâmetro é adotado, também, pelo e. Tribunal de Justiça do Paraná. Veja: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – OPERAÇÃO DE CRÉDITO: EMPRÉSTIMO – CAPITAL DE GIRO PARCELADO. SENTENÇA. IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA EMBARGANTE. 1. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. TESE NÃO ACOLHIDA. TAXA APLICADA INFERIOR AO DOBRO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO UTILIZADA PARA A OPERAÇÃO CONTRATADA. ABUSIVIDADE NÃO CONSTATADA (RESP Nº 1.061.530/RS, REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA REPETITIVA). PRECEDENTES. CORREÇÃO PARCIAL DO FUNDAMENTO DA SENTENÇA, DE OFÍCIO, NESSE PARTICULAR. 2. EXCESSO DE EXECUÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE OU ILEGALIDADE NAS COBRANÇAS ATESTADA PELO LAUDO PERICIAL. 3. ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. CORREÇÃO, DE OFÍCIO, DA BASE DE CÁLCULO DA VERBA HONORÁRIA. FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM EMBARGOS À EXECUÇÃO JULGADOS IMPROCEDENTES QUE DEVE OBSERVAR O VALOR ATUALIZADO DADO À CAUSA DOS EMBARGOS (CPC, ART. 85, § 2º). 4. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. INCIDÊNCIA. NÃO PROVIMENTO DO RECURSO QUE ENSEJA A MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA SUCUMBENCIAL (CPC, ART. 85, § 11). APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E NÃO PROVIDA (in TJPR, 14ª CC, AC n. 0018684-56.2017.8.16.0001, Curitiba, Rel. Des. JOÃO ANTÔNIO DE MARCHI, julgado de 22.3.21). APELAÇÃO CÍVEL – [...] REVISIONAL – CONTRATO DE CRÉDITO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – PRELIMINAR DE CONTRARRAZÕES – IMPUGNAÇÃO À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA – NÃO ACOLHIMENTO – ALEGAÇÃO DE ABUSIVIDADE DA TAXA DE JUROS PRATICADA – PATAMAR QUE SUPERA O DOBRO DA MÉDIA DE MERCADO – ENTENDIMENTO FIXADO NO RESP REPETITIVO 1.061.530/RS – ABUSIVIDADE CONFIGURADA – LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS DO CONTRATO À TAXA MÉDIA DE MERCADO NA ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO – REPETIÇÃO DO INDÉBITO DEVIDA – REFORMA DA SENTENÇA, COM INVERSÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. Apelação cível provida (in TJPR, 17ª CC, AC n. 0014686-13.2019.8.16.0130, Paranavaí, Relª. Desª. ELIZABETH M. F. ROCHA, julgado de 22.3.21). APELAÇÃO. REVISIONAL. CONTRATOS DE CONTA CORRENTE E EMPRÉSTIMO. PRETENSÃO DECLARADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. APELO N. 1. G. SCHNEIDER PANIFICADORA LTDA: JUROS REMUNERATÓRIOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO, EM PERCENTUAIS CONTRATADOS. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE EM APENAS UMA DAS CONTRATAÇÕES. JÁ NAS DEMAIS, TAXA DE JUROS COBRADA SUPERARA O DOBRO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN. PARÂMETRO CONSIDERADO NESTA CÂMARA. RESP DE N. 1.061.530 / RS. PRECEDENTES DESTA CORTE. ACOLHIDA A TESE DE DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS PARA ISSO. TARIFA DE ABERTURA DE CRÉDITO (“TAC”) PACTUADA PELAS PARTES. SÚMULA N. 44, DO TJPR. POSSIBILIDADE DE SUA COBRANÇA EM FACE DE PESSOA JURÍDICA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. APELO N. 2. ITAÚ UNIBANCO S/A: CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. COBRANÇA POSSÍVEL, APENAS SE EXPRESSAMENTE PACTUADA. SÚMULAS NS. 539 E 541, DO STJ. EMBORA HAJA CLÁUSULA DE RENOVAÇÃO AUTOMÁTICA, QUE, A PRIORI, É VÁLIDA AO CASO, INEXISTE COMPROVAÇÃO DE QUE OS JUROS REMUNERATÓRIOS FLUTUANTES TERIAM INCIDIDO MÊS A MÊS, NO CONTRATO. EXTRATOS QUE NÃO TRAZEM OS VALORES. DETERMINAÇÃO DE REPETIÇÃO SIMPLES DO INDÉBITO. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC-IGP-DI, DE CADA DESEMBOLSO OU PAGAMENTO INDEVIDO, E ATÉ A CITAÇÃO, A PARTIR DE QUANDO SÓ INCIDIRÁ A SELIC, QUE ENCAMPA AQUELA RUBRICA E TAMBÉM OS JUROS DE MORA. RECURSO CONHECIDO, MAS, NÃO PROVIDO. (TJPR - 13ª Câmara Cível - 0000072-09.2021.8.16.0170 - Toledo - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ CAMACHO SANTOS - J. 24.11.2023) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. CONSTATADA. LIMITAÇÃO A TAXA MÉDIA DO MERCADO. DEVIDA. TAXA QUE ULTRAPASSA O DOBRO DA MÉDIA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO FORMA SIMPLES. HONORÁRIOS RECURSAIS ARBITRADOS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJPR - 13ª C.Cível - 0001223-95.2020.8.16.0153 - Santo Antônio da Platina - Rel.: DESEMBARGADOR FERNANDO FERREIRA DE MORAES - J. 05.08.2022). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. INSURGÊNCIA DA RÉ. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE EVIDENCIADA. TAXA ESTIPULADA NO CONTRATO SUPERIOR AO DOBRO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO À ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO. UMA VEZ VERIFICADA A ABUSIVIDADE, A LIMITAÇÃO DOS JUROS DEVE SE DAR À TAXA MÉDIA DE MERCADO. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO DE VALORES ENTRE OS LITIGANTES, RECIPROCAMENTE CREDOR E DEVEDOR. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 18ª C.Cível - 0000012-46.2018.8.16.0136 - Pitanga - Rel.: Desembargador Espedito Reis do Amaral - J. 16.12.2019) Deste modo, considerando que a taxa praticada é inferior ao dobro da taxa média de mercado, não há que se falar em ilegalidade, devendo ser mantidos os juros estipulados no contrato celebrado pelas partes. Da Capitalização de Juros Existem dois tipos de juros: simples e compostos. Os juros simples correspondem aos acréscimos somados ao capital ao final do período pactuado entre as partes. Os juros compostos, por sua vez, ocorrem quando subsiste a incorporação, a cada período, do montante decorrente dos juros do mês anterior, ou seja, há a incidência dos juros sobre o montante anterior (resultado da parcela a ser paga mais os juros calculados), circunstância denominada também como aplicação de juros sobre juros. De fato, predomina atualmente o entendimento de que não é possível a capitalização de juros em período inferior a um ano (art. 591, do Novo Código Civil, ou art. 1.262, do Código Civil de 1916) mesmo nos contratos firmados com as instituições financeiras, guardando exceção apenas no que se refere aos títulos de crédito industrial, comercial e rural (Súmula nº. 93 do STJ) e ao pactuado após a edição da MP n°. 2.170-36/2001, a qual dispõe em seu art. 5º, caput, que: “Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano”. Portanto, nos contratos firmados após a edição da referida Medida Provisória, é legal a capitalização mensal de juros quando devidamente prevista no contrato firmado entre as partes. Na hipótese dos autos, verifico que o contrato em análise foi firmado em 2021, posteriormente, portanto, à edição da Medida Provisória nº. 2.170-36/2001, sendo permitida a capitalização de juros em período inferior a um ano. Neste sentido, pacífico é o entendimento jurisprudencial: "(...) Somente nos contratos bancários firmados posteriormente à entrada em vigor da MP n. 1.963- 17/2000, reeditada sob o n. 2.170-36/2001, é lícita a capitalização mensal dos juros, desde que expressamente prevista no ajuste (...)"(AgRg no REsp nº 936.357/MS, 4ª T., Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. em 04.02.2010). “APELAÇÃO CÍVEL. DEMANDA REVISIONAL. 1. CAPITALIZAÇÃO. ART. 354 DO CÓDIGO CIVIL. ALEGAÇÃO GENÉRICA. 2. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. CONTRATO BANCÁRIO. MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. INAPLICABILIDADE. 3. SÚMULA 596 DO STF. ÂMBITO DE APLICABILIDADE DIVERSO DAQUELE DO ARTIGO 4º DO DECRETO 22.626/334. 4. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. REDISTRIBUIÇÃO. [...] 2. Conforme precedentes do STJ, com a edição da MP 1963-17, atual MP 2.170-36/2001, é possível a capitalização mensal dos juros em empréstimo bancário, desde que expressamente pactuada em contrato celebrado após 31.03.2000, [...]”.(TJPR – 15º C. C. - AC 0452003-2 - Londrina - Rel.: Des. Hayton Lee Swain Filho - Unânime - J. 12.12.2007). No contrato (seq. 1.8), quanto à capitalização diária de juros, está previsto, verbis: “Promessa de Pagamento: Prometo pagar ao BV, na praça da sua sede, ou à sua ordem, nas respectivas datas de vencimento, a dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível correspondente ao Valor Total do Crédito (item F.6.) acrescidos dos juros remuneratórios (item I) capitalizados diariamente, sendo que os juros já estão incorporados no Valor da Parcela (item F.5).” Apesar da ausência de previsão expressa do percentual da taxa diária aplicada, as parcelas são fixas e calculadas conforme os percentuais de juros mensais e anuais (juros compostos). Dessa forma, estando incorporados os juros mensais na parcela prefixada de R$ 1.759,38 (conforme item F5 do contrato – seq. 1.8), mostra-se irrelevante a previsão da capitalização diária, porque, em caso de inadimplemento, seguirá a remuneração dos juros mensais ajustados. A esse respeito: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. LIMINAR DEFERIDA. (...) ALEGAÇÃO DE DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA EM RAZÃO DE ABUSIVIDADE. CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. PREVISÃO, CONTUDO, APENAS DA TAXA MENSAL. SUFICIÊNCIA, UMA VEZ QUE EVENTUAL NECESSIDADE DE CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA DEVE RESPEITAR A TAXA MENSAL EXPLICITADA NO CONTRATO. PARCELAS, ADEMAIS, DE VALOR FIXO. MORA INCONTROVERSA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. (TJPR, , 0039542- 38.2022.8.16.0000, Rel.: Des. Vitor Roberto Silva, 18ª C.Cível, julg. 27.03.2023). Além disso, alega abstratamente sobre a ocorrência de capitalização diária, mas não se tem de modo ao menos indiciário de que ela tenha ocorrido. Sobre a matéria, julgados deste egrégio Tribunal: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO AVIADO PELA RÉ. ARGUIÇÃO ABUSIVIDADE CONTRATUAL POR AUSÊNCIA INDICAÇÃO DA TAXA DIÁRIA DE CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. INOCORRÊNCIA. PACTUAÇÃO QUE SE DEU DE FORMA EXPRESSA E COM PRESTAÇÕES FIXAS. ENTENDIMENTO DAS SÚMULAS 539 E 541 DO C. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONTRATO QUE ESPECIFICA COM CLAREZA OS ÍNDICES INCIDENTES E A SUA PERIODICIDADE. DESNECESSIDADE DE INFORMAÇÃO ACERCA DA CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. PRECEDENTES DESTE TJPR. ADEMAIS, PARTE RECORRENTE QUE NÃO TRAZ QUALQUER INDICATIVO DE QUE TENHA HAVIDO CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA NA FORMAÇÃO DAS PARCELAS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJPR, 0031903-73.2022.8.16.0030, Rel. Des. Rotoli de Macedo, 19ª C.Cível, julg. 24.03.2025). “JULGAMENTO MONOCRÁTICO APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO. AQUISIÇÃO DE VEÍCULO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RAZÕES RECURSAIS. CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA DE JUROS. LEGALIDADE. PACTUAÇÃO E PERIODICIDADE EXPRESSAS. DESNECESSIDADE DE INFORMAÇÃO DO PERCENTUAL INCIDENTE. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA Nº 973.827/RS.TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM. LEGALIDADE. TARIFA DE REGISTRO DO CONTRATO. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA REALIZAÇÃO DO SERVIÇO. RESP Nº 1.578.553/SP. TARIFA DE CADASTRO. LEGALIDADE. VALOR QUE NÃO SE MOSTRA EXCESSIVO. SEGURO. VENDA CASADA. RESP Nº 1.639.259/SP E RESP Nº 1.639.320/SP (TEMA 972). RESTITUIÇÃO NA TOTALIDADE. IMPOSSIBILIDADE, PORQUANTO A CONSUMIDORA USUFRUIU DOS SERVIÇOS ATÉ O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO VEDADO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO, APÓS 30/03/2021. POSSIBILIDADE, INDEPENDENTE DA COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ DO FORNECEDOR. EARESP 676608 /RS. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.” (TJPR, 5ª C.Cível, 0000927-36.2023.8.16.0099, Rel. Des. Luiz Mateus de Lima, julg. 19.01.2024). Diante do exposto, improcedem as razões apresentadas pela parte ré. Dos encargos moratórios Sustenta a parte ré que os juros de mora devem ser de 1% ao mês. A parte autora, por sua vez, argumenta que não há ilegalidade na sua cobrança. Compulsando os autos, infere-se que o contrato objeto de discussão previu a cobrança de juros de mora de 6% ao mês. Lado outro, o cálculo acostado na seq. 1.2 não trouxe o percentual cobrado a título de juros moratórios. As Cédulas de Crédito Bancário são regidas pela Lei nº 10.931/2004 que, em seu art. 28, §1º, estabelece os elementos do contrato, merecendo destaque o inciso III: Art. 28. A Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial e representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos da conta corrente, elaborados conforme previsto no § 2º. § 1º Na Cédula de Crédito Bancário poderão ser pactuados: I - os juros sobre a dívida, capitalizados ou não, os critérios de sua incidência e, se for o caso, a periodicidade de sua capitalização, bem como as despesas e os demais encargos decorrentes da obrigação; II - os critérios de atualização monetária ou de variação cambial como permitido em lei; III - os casos de ocorrência de mora e de incidência das multas e penalidades contratuais, bem como as hipóteses de vencimento antecipado da dívida; IV - os critérios de apuração e de ressarcimento, pelo emitente ou por terceiro garantidor, das despesas de cobrança da dívida e dos honorários advocatícios, judiciais ou extrajudiciais, sendo que os honorários advocatícios extrajudiciais não poderão superar o limite de dez por cento do valor total devido; V - quando for o caso, a modalidade de garantia da dívida, sua extensão e as hipóteses de substituição de tal garantia; VI - as obrigações a serem cumpridas pelo credor; VII - a obrigação do credor de emitir extratos da conta corrente ou planilhas de cálculo da dívida, ou de seu saldo devedor, de acordo com os critérios estabelecidos na própria Cédula de Crédito Bancário, observado o disposto no § 2º ; e VIII - outras condições de concessão do crédito, suas garantias ou liquidação, obrigações adicionais do emitente ou do terceiro garantidor da obrigação, desde que não contrariem as disposições desta Lei. Da atenta leitura ao inciso III, extrai-se que a lei deixou de estabelecer um limite à pactuação dos juros de mora, não apresentando expressamente a possibilidade de estipulação de juros moratórios superiores a 1% (um por cento) ao mês. Por tal razão, a jurisprudência entende que o art. 28, §1º, da Lei nº 10.931/2004 deve ser interpretada em consonância com a Súmula nº 379, do Superior Tribunal de Justiça, que assim preconiza: Súmula 379 - Nos contratos bancários não regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês. Destarte, conclui-se que deve ser reconhecida a ilegalidade dos juros de mora praticados pela autora (6%), que superam o percentual legal (1% ao mês), a ser aplicado ao contrato em testilha. Por fim, a questão da descaracterização ou não da mora em virtude da cobrança de encargos ilegais foi enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do recurso repetitivo nº. 1.061.530/RS, no qual restou sedimentado que a cobrança de encargos ilegais no período da normalidade contratual desconfigura a mora do devedor. Traz-se à colação a orientação do Superior Tribunal de Justiça: ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora; b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual. No caso dos autos, entretanto, as ilegalidades reconhecidas se refere aos encargos moratórios, que só incidem após o inadimplemento, quando o devedor já se encontra em mora. Logo, sem reconhecimento de abusividade dos encargos exigidos no período da normalidade contratual, a mora não fica descaracterizada. Da Repetição de Indébito No que diz respeito ao pedido de repetição de indébito, alega a parte rée que lhe foram cobrados valores indevidos, razão pela qual deverá ser restituído em dobro do valor cobrado, nos termos do parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor. Em comentário ao artigo 42 do CDC, Cláudia Lima Marques (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 2º edição – São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006) esclarece que, “prevista como uma sanção pedagógica e preventiva, a evitar que o fornecedor se ‘descuidasse’ e cobrasse a mais dos consumidores por ‘engano’, que preferisse a inclusão e aplicação de cláusulas sabidamente abusivas e nulas, cobrando a mais com base nestas cláusulas, ou que o fornecedor usasse de métodos abusivos na cobrança correta do valor, a devolução em dobro acabou sendo vista pela jurisprudência, não como uma punição razoável ao fornecedor negligente ou que abusou de seu ‘poder’ na cobrança, mas como uma fonte de enriquecimento ‘sem causa’ do consumidor”. A jurisprudência é clara ao estabelecer que somente é devida a repetição do indébito em dobro na hipótese em que haja prova de que o credor agiu com má-fé, o que não é o caso dos autos. Sobre o assunto, destaco o seguinte julgado: “REVISIONAL. CONTRATOS BANCÁRIOS. ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-CORRENTE E MÚTUO COM PARCELAS FIXAS. INTERESSE RECURSAL. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS VERIFICADA NO CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA- CORRENTE. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA. [...] 4. É devida a repetição do indébito em dobro, conforme previsão do art. 42, parágrafo único, do CDC, tão-só naquelas hipóteses em que há prova de que o credor agiu de má-fé. [...] Apelação 1 conhecida em parte e, na parte conhecida, provida em parte. Apelação 2 não provida.” (TJPR, Apelação Cível nº. 569.371-8, Relator Des. Hamilton Mussi Corrêa, Curitiba, PR). Importante ressaltar, ainda, que o parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor tem aplicação somente nos casos em que houve a cobrança e o pagamento em valor indevido. Desta forma, não há que se falar em repetição do indébito em dobro. Por outro lado, tendo havido a cobrança de encargo abusivo, reconhecido nesta sentença, impõe-se o recálculo do saldo devedor demonstrado na seq. 1.2. Diante desse contexto, e não havendo abusividade reconhecida nesta sentença que implique onerosidade no período da normalidade, bem como estando caracterizado o inadimplemento contratual, a procedência da ação é impositiva. Destarte, demonstrada a mora, o caso é de se consolidar a propriedade e a posse plena e exclusiva dos bens objeto da garantia nas mãos do proprietário fiduciário, ora requerente, que poderá vendê-los independentemente de hasta pública, avaliação prévia ou qualquer outra medida judicial. Deverá, outrossim, aplicar o produto da venda no pagamento total ou parcial de seu crédito, tudo conforme o disposto no artigo 1º, §§ 4º e 5º, do Decreto-lei nº 911/69. III – DISPOSITIVO Em face do exposto, julgo procedente o pedido formulado por BANCO VOTORANTIM S.A. contra JULIANA GOULART FERRAZ, para o fim de declarar consolidada a propriedade e a posse plena e exclusiva dos bens descritos na inicial, nas mãos do(a) requerente, observando-se as determinações contidas na fundamentação, valendo esta decisão como título hábil para a transferência de eventual certificado de propriedade. Ainda, diante das demais razões expendidas, com relação ao pedido revisional contraposto, julgo-o improcedente. Como consequência lógica da procedência do pedido, confirmo a decisão que deferiu o pedido liminar de busca e apreensão, declarando precluso o direito da parte ré purgar da mora. Assim, julgo extinto o feito, com resolução de mérito, com fulcro no artigo 487, I do Código de Processo Civil. Pela sucumbência, condeno a parte ré ao pagamento das custas/despesas processuais e dos honorários advocatícios do patrono judicial da parte adversa, fixada a verba honorária, na forma do artigo 85, §2o, do Código de Processo Civil, em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa, em virtude da justiça gratuita que ora lhe defiro. Cumpram-se, no que forem pertinentes, as demais determinações do Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça e da Portaria nº 51/2023 desta Vara. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Oportunamente, arquivem-se. Francisco Beltrão, datado e assinado digitalmente. Joseane Catusso Kroll Juíza de Direito [1]https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=getPagina.
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