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Luciana Yancovich x Banco Santander (Brasil) S.A.

ID: 262010017

Tribunal: TJMT Órgão: 7º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1009516-70.2025.8.11.0001

Data de Disponibilização: 29/04/2025

Polo Ativo:

LUCIANA YANCOVICH

Polo Passivo:

BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A.

Sentença

Advogados:

NEY JOSE CAMPOS

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

ANABEL RODRIGUES DE LARA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 7º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo nº: 1009516-70.2025.8.11.0001 Requerente: Luciana Yancovich Requerido: Banco Santander S/A. Vistos etc. Fu… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 7º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo nº: 1009516-70.2025.8.11.0001 Requerente: Luciana Yancovich Requerido: Banco Santander S/A. Vistos etc. Fundamento e decido. Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS proposta por LUCIANA YANCOVICH em desfavor de BANCO SANTANDER S/A. 1 – DA JUSTIÇA GRATUITA Não é na sentença o momento próprio para o juiz se manifestar acerca de eventual pedido de justiça gratuita, pois, no sistema dos Juizados Especiais, a gratuidade no primeiro grau decorre da própria lei de regência – 9.099/95, sendo que, somente na hipótese de interposição de recurso inominado, ter-se-á, se for o caso, o requerimento e deliberação acerca do pedido, pois é a partir dessa fase que a gratuidade deixa de ser generalizada. 2 - PRELIMINARES 2.1 – DA AUSENCIA DE INTERESSE DE AGIR Quanto a preliminar de indeferimento da inicial por falta de interesse processual ante a ausência de pretensão resistida, esta não deve prosperar, uma vez que se trata, no caso, de livre exercício do direito de ação. Ademais, eventual improcedência do pedido (impossibilidade material) não se confunde com a falta de interesse processual, a qual somente se configura nos casos em que o ordenamento jurídico expressamente vedar a pretensão autoral. 3 – MÉRITO No caso, não havendo vício que possa obstar o regular prosseguimento do feito, preparado está o processo para julgamento antecipado, uma vez que o pedido submetido ao crivo judicial permite uma decisão imediata, mormente pela questão suscitada ser de fato e de direito, sem a necessidade de dilação probatória, de modo que o julgamento antecipado se impõe, à luz do que determina o artigo 355, inciso I, do CPC. De início, cumpre mencionar que se aplica ao presente caso o Código de Defesa ao Consumidor, uma vez que necessária a harmonização da relação de consumo, equilibrando economicamente o consumidor e o fornecedor, facilitando àquele o acesso aos instrumentos de defesa, consoante previsão expressa do artigo 6º, VIII. Com efeito, o que se tem de relevante para o deslinde da controvérsia é que a parte autora sustenta que a negativação no valor de R$ 252,60 (duzentos e cinquenta e dois reais e sessenta centavos), contrato nº MP298666000222540066 é indevida, negando qualquer vínculo com a parte Reclamada, pugnando assim pelo recebimento de indenização por danos morais e a declaração de inexistência do débito apontado. Diante da negativa do débito cadastrado bem como da relação jurídica havida entre as partes, ante a evidente hipossuficiência do requerente, cumpria ao requerido trazer aos autos documentos consistentes que pudessem comprovar inequivocamente a mencionada relação jurídica e a legalidade do débito, como, por exemplo, contrato ou proposta assinada, biometria fácil, extratos de débitos, faturas, histórico de pagamentos, nos termos do art. 373, II, do CPC c.c. artigo 6º, VIII, do CDC, entretanto, assim não o fez. A instituição bancária requerida, no entanto, não juntou aos autos qualquer documento que comprovasse minimamente o contrato entre as partes. Há apenas a menção genérica de que os débitos se referem à cartão de crédito com a juntada de faturas que está cadastrada em endereço divergente do da autora, e com um histórico de pagamento decorrente de parcelamento automático. Ou seja, os documentos acostados são frágeis e não demonstram a relação jurídica havida e nem comprovam a origem do débito que gerou a negativação. Se se veicula fato negativo, a incumbência pelo ônus probatório transfere-se ao requerido, ou mesmo pode-se se desincumbir pelo ônus da contraprova. Assim não fez, deixando a questão no campo das meras alegações e, nesse sentido, sabe-se que “alegar e não comprovar é o mesmo que não alegar” (allegatio et non probatio quasi non allegatio). No caso, caracterizado está o defeito do serviço, cuidando-se, portanto, de responsabilidade objetiva pelo fato do serviço, previsto no artigo 14 do CDC, respondendo o fornecedor por esse serviço defeituoso. Como decorrência da responsabilidade objetiva, para que o prestador do serviço possa se desonerar da obrigação de indenizar, deve provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste ou a culpa é exclusiva do consumidor ou de terceiro (§3º, inc. I e II, do art. 14, do CDC). Sendo o ônus da prova relativo a essas hipóteses, do prestador do serviço e se não a produzir, será responsabilizado, como deve ocorrer no presente caso. Portanto, entendo que o requerido encaminhou indevidamente os dados do requerente aos cadastros de proteção ao crédito, o que configura a prática de conduta ilícita. Diante disso, resta comprovada a violação dos direitos daquele, sendo o requerido responsável pelas consequências de sua ação, devendo, assim, indenizar a vítima pelos danos eventualmente sofridos de maneira injusta. Insta ressaltar que a anotação indevida realizada por credor em cadastro de inadimplentes, nos casos em que o indivíduo tiver anterior registro nos órgãos de proteção ao crédito, não gera indenização por danos morais. Nessas situações, é garantido o direito ao pedido de cancelamento da negativação. E, no caso em concreto, em consulta realizada junto aos órgãos de serviço e proteção ao crédito, através de convênio celebrado com o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, cujo extrato oficial segue abaixo colacionado, evidencia anotação anterior ao discutido nos autos, veja-se: ------------------------------------------- C O N S U L T A D E B A L C A O SERVICO DE PROTECAO AO CREDITO Consulta efetuada na: CDL CUIABA/MT ------------------------------------------- NOME: LUCIANA YANCOVICH DATA NASCIMENTO: 11/05/1986 CPF: 034.025.781-40 ------------------------------------------- NADA CONSTA SPC – CDL CUIABA/MT* Obs: *Não constam registros de SPC na Entidade consultante. ------------------------------------------- CONSULTA EM OUTROS BANCOS DE DADOS ------------------------------------------- REGISTRO(S) DE SPC DE OUTRAS BASES ------------------------------------------- * CREDOR: MATEUS SUPERMERCADOS ENT.ORIGEM: CDL - SAO LUIS / MA DATA VENCIMENTO: 13/05/2024 TIPO: COMPRADOR CONTRATO/FATURA: 6312812897212 VALOR: 2.942,09 DATA INCLUSAO: 08/06/2024 ------------------------------------------- ENDEREÇOS DAS ENTIDADES DE ORIGEM ------------------------------------------- * ENT.ORIGEM: CDL - SAO LUIS / MA ENDEREÇO: RUA DA ESTRELA, 508 BAIRRO: CENTRO CIDADE: SAO LUIS / MA ------------------------------------------- RESULTADO ------------------------------------------- >Consta(m) um total de 1 registro(s), sendo detalhado(s) o(s) acima apresentado(s). ------------------------------------------- Verificar o(s) valor(es) atual(is) do(s) debito(s) junto ao(s) credor(es). ------------------------------------------- * Esta consulta apresenta informações de registros efetuados nas bases privadas do SPC Brasil e da Serasa. Demais informações, originadas de outros bancos privados ou públicos, devem ser acessadas junto aos órgãos de origem. ------------------------------------------- Baixe o Aplicativo SPC Consumidor na Loja de aplicativo do seu Smartphone e acompanhe de perto seu documento. ------------------------------------------- NUM.PROTOCOLO: 014.876.331.652-5 25/04/2025 17:55:32-horario de Brasilia-FIM Sao Paulo, 25 de Abril de 2025 Carta No HI0425005245 EMISSOR TJ ESTADO DO MATO GROSSO SOLICITANTE SENHA GERADA PARA OPERADOR AC CPF no 03402578140 Em resposta a vossa solicitacao, informamos que constou(aram) em nome do CPF no 03402578140: Periodo: Ultimos 5 anos SCPC - Registro(s) de Debito(s) Empresa CLUB MAIS ADMNISTRADORA DE CARTO SAO PAULO Contrato no Data Debito Inclusao Exibicao Suspensao Revogacao Exclusao Valor (R$) 0001841776 25/02/2016 02/01/2017 12/01/2017 19/02/2021 X 287,98 Empresa CAIXA ECONOMICA FEDERAL SAO PAULO Contrato no Data Debito Inclusao Exibicao Suspensao Revogacao Exclusao Valor (R$) 213880144567099059 28/07/2022 28/08/2022 28/09/2022 25/09/2022 X 105,10 Empresa CAIXA ECONOMICA FEDERAL SAO PAULO Contrato no Data Debito Inclusao Exibicao Suspensao Revogacao Exclusao Valor (R$) 213880144567099059 28/08/2022 24/09/2022 16/10/2022 24/10/2022 X 211,07 Empresa CAIXA ECONOMICA FEDERAL SAO PAULO Contrato no Data Debito Inclusao Exibicao Suspensao Revogacao Exclusao Valor (R$) 213880144567099059 28/07/2022 30/10/2022 30/07/2028 06/11/2022 X 425,92 Empresa NU FINANCEIRA S/A SAO PAULO Contrato no Data Debito Inclusao Exibicao Suspensao Revogacao Exclusao Valor (R$) B82D12911CB6BCFA 10/10/2022 04/11/2022 29/11/2022 09/02/2023 X 544,61 Empresa CAIXA ECONOMICA FEDERAL SAO PAULO Contrato no Data Debito Inclusao Exibicao Suspensao Revogacao Exclusao Valor (R$) 213880144567099059 28/09/2022 06/11/2022 27/11/2022 14/11/2022 X 529,58 Empresa CAIXA ECONOMICA FEDERAL SAO PAULO Contrato no Data Debito Inclusao Exibicao Suspensao Revogacao Exclusao Valor (R$) 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Periodo: Presente data SCPC - Registro(s) de Debito(s) Empresa NU FINANCEIRA S/A SCPC SAO PAULO Contrato no Data Debito Inclusao Exibicao Suspensao Revogacao Exclusao Valor (R$) B82D12911CB6BCFA 10/10/2022 13/03/2023 07/04/2023 X 61,41 Empresa BANCO SANTANDER S/A SCPC SAO PAULO Contrato no Data Debito Inclusao Exibicao Suspensao Revogacao Exclusao Valor (R$) MP298666000222540066 06/08/2024 15/08/2024 07/09/2024 X 252,60 Empresa CAIXA ECONOMICA FEDERAL SCPC SAO PAULO Contrato no Data Debito Inclusao Exibicao Suspensao Revogacao Exclusao Valor (R$) 0038800209670990590000 28/07/2022 22/01/2025 14/02/2025 X 239,32 X - Houve o envio da carta de comunicacao de debito Conforme regulamento interno do SCPC, o registro de debito e disponibilizado para consulta somente a partir do 10o dia de sua inclusao ou prazo superior, conforme parametro solicitado pela empresa As informacoes aqui constantes sao confidenciais e intransferiveis A INFORMACAO CONTIDA NESTE DOCUMENTO E PARA USO EXCLUSIVO EM PROCESSO JUDICIAL Sem mais para o momento, subscrevemo-nos Respeitosamente SCPC - Servico Central de Protecao ao Credito emitido por meio eletronico em 25/04/2025 as 17:55:02 Assim, constato que o autor possui registro anterior nos cadastros de inadimplentes, não tendo sido comprovado nos autos que tais registros sejam indevidos. Em razão disso, aplico a orientação da Súmula 385 do Colendo Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual: "Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento." Diante disso, não há fundamento para a alegação de danos morais no presente caso. In casu, é ônus do requerente comprovar nos autos que tais dívidas estão sendo discutidas, em quais processos, ou que as mesmas são indevidas, o que não restou comprovado. Nesse sentido, é a jurisprudência da Turma Recursal de Mato Grosso: ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE CUIABÁ Turma Recursal Única Dr. Sebastião de Arruda Almeida – Juiz de Direito/Relator RECURSO CÍVEL INOMINADO nº 1006475-26.2021.811.0037 – Juizado Especial Cível e Crimina da Comarca de Primavera do Leste – MT. RECORRENTE: TELEFÔNICA BRASIL S/A. RECORRIDO: FELIPE MARINHO DA COSTA. RELATOR: Dr. Sebastião de Arruda Almeida. EMENTA AÇÃO DECLARATORIA DE INEXISTENCIA DE DEBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - INSCRIÇÃO INDEVIDA NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO – DÉBITO INEXISTENTE – AUSÊNCIA NA AUDIENCIA DE CONCILIAÇÃO E AUDIENCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO – REVELIA RECONHECIDA – IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO DAS RAZÕES FÁTICO-JURÍDICAS – DANO MORAL – AFASTADO – EXISTÊNCIA DE LEGÍTIMA RESTRIÇÃO ANTERIOR – SÚMULA 385 DO STJ – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. A ausência na audiência de conciliação e audiência de instrução e julgamento pela parte demandada autoriza a imposição dos efeitos da revelia, dentre eles, o não conhecimento da razão fático-jurídico encartada na peça defensiva. A preexistência de legítima negativação em nome do consumidor afasta a ocorrência de dano moral indenizável, nos termos da Súmula 385 do Colendo Superior Tribunal de Justiça. (TJ-MT 10064752620218110037 MT, Relator: SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Data de Julgamento: 21/11/2022, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 22/11/2022). Quanto à alegação de ausência de notificação prévia, a notificação do devedor, antes de levada a efeito a inscrição do seu nome, nos cadastros de inadimplentes, é obrigação do arquivista e não do credor, que apenas informou o inadimplemento, consoante entendimento sumular n. 359 do STJ. Ante o exposto, com fulcro no art. 487, I do CPC c.c. art. 6º da Lei nº. 9.099/95, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos da inicial para, tão somente, DECLARAR a inexistência do débito no valor de R$ 252,60 (duzentos e cinquenta e dois reais e sessenta centavos), contrato nº MP298666000222540066, restando indeferido o pedido de indenização por danos morais. Sem custas processuais e honorários advocatícios, conforme inteligência dos artigos 54 e 55 da Lei nº. 9.099/95. Transitado em julgado e se nada for requerido, remetam-se os autos ao arquivo, com as cautelas e anotações necessárias. Com base no artigo 40 da Lei nº 9.099/95, apresento este processo para a apreciação da Meritíssima Juíza de Direito Karla Arruda Grefe Juíza Leiga Vistos etc. Homologo, para que produza seus jurídicos e legais efeitos, o projeto de sentença elaborado pela Juíza Leiga, na forma do artigo 40 da Lei n. 9.099/1995. Preclusa a via recursal, em nada sendo requerido, arquivem-se os autos com as baixas e anotações de estilo. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no Sistema. Patrícia Ceni Juíza de Direito

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Processo nº 1003917-15.2023.8.11.0004

ID: 256237547

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1003917-15.2023.8.11.0004

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

ALIPIO ARANDO GOMES

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

PAULO HENRIQUE LOPES LOURENCO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1003917-15.2023.8.11.0004 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Ameaça, Contra a Mulher] Relator: Des(a). JORGE LUIZ T… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1003917-15.2023.8.11.0004 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Ameaça, Contra a Mulher] Relator: Des(a). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES Turma Julgadora: [DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [ALIPIO ARANDO GOMES - CPF: 051.965.531-18 (APELANTE), PAULO HENRIQUE LOPES LOURENCO - CPF: 029.162.961-07 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), KETLYN TEODORO CANDIDO - CPF: 053.131.111-24 (VÍTIMA)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL E AMEAÇA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PALAVRA DA VÍTIMA. VALOR PROBANTE DIFERENCIADO. AGRAVANTE DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E CONTRA MULHER GRÁVIDA. DOSIMETRIA. NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame Recurso de apelação criminal interposto por Alípio Arando Gomes contra sentença condenatória proferida pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Barra do Garças/MT, que lhe impôs pena de 02 (dois) anos de reclusão pelo crime de lesão corporal e 03 (três) meses e 25 (vinte e cinco) dias de detenção pelo crime de ameaça, em regime aberto, além do pagamento de indenização por danos morais. II. Questão em discussão 2. O recurso busca a absolvição dos delitos de lesão corporal e ameaça, sob o argumento de ausência de dolo na conduta do réu. Subsidiariamente, requer a redução da pena diante da aplicação indevida de circunstâncias agravantes. III. Razões de decidir 3. A materialidade e a autoria dos crimes foram devidamente comprovadas por laudo pericial, boletim de ocorrência e depoimentos da vítima e testemunhas, evidenciando a prática de violência física e ameaças de morte contra a vítima. 4. Nos crimes de violência doméstica e familiar, a palavra da vítima possui especial relevância para a formação do convencimento do juízo, sobretudo quando corroborada por outros elementos probatórios. 5. Quanto ao crime de ameaça, afasto a valoração negativa da culpabilidade, já que as informações presentes nos autos não são capazes de elucidar em qual medida a conduta do acusado extrapolou o tipo penal. Também afasto a consequências do crime, vez que o fato da vítima estar grávida já foi utilizado como agravante na segunda fase dosimétrica, obedecendo o princípio do non bis in idem, e mantenho a exasperação das circunstâncias do crime, vez que o delito foi cometido na frente do filho da vítima, menor de idade. 6. Quanto ao crime de lesão corporal, afasto a valoração negativa das consequências do crime, utilizando dos seus fundamentos para exasperar a culpabilidade do agente, que deferiu golpe na vítima gestante. Por fim, mantenho a valoração negativa das consequências do crime, que foi praticado na presença do filho da vítima. 7. Necessária a readequação da dosimetria penal, afastando a dupla valoração da condição de gestante da vítima, em observância ao princípio do non bis in idem, resultando na fixação da pena definitiva em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão pelo crime de lesão corporal e 01 (um) mês e 16 (dezesseis) dias de detenção pelo crime de ameaça. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso parcialmente provido para readequação da pena, mantida a condenação. Tese de julgamento: "1. A palavra da vítima em crimes de violência doméstica, quando firme e coerente, possui especial relevância probatória, sobretudo quando corroborada por outros elementos dos autos. 2. O cometimento do crime na presença de filhos menores justifica a valoração negativa das circunstâncias do delito. 3. A agravante da condição de gestante da vítima não pode ser utilizada de forma cumulativa na primeira e na segunda fase da dosimetria da pena, sob pena de violação ao princípio do non bis in idem." Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 129, § 13; 147; 61, II, "f" e "h". Jurisprudências relevantes citadas: STJ, AgRg no AREsp 2146872/SP, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, 6ª Turma, DJe 19/08/2022; STJ, AgRg no AREsp 1982124/SE, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, DJe 21/02/2022 RELATÓRIO EXMO. DES. JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Criminal interposto por ALIPIO ARANDO GOMES, pretendendo a reforma da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Barra do Garças/MT, que o condenou à pena de 02 (dois) anos de reclusão pelo crime de lesão corporal e 03 (três) meses e 25 (vinte e cinco) dias de detenção pelo crime de ameaça, em regime aberto, pela prática dos delitos previstos nos artigos 129, § 13º, e 147 do Código Penal, bem como, o pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por dano moral. Em suas razões recursais, o apelante a pleiteia pela absolvição do delito de lesão corporal, ao argumento de ausência de dolo e do crime de ameaça, por atipicidade da conduta. Subsidiariamente, postulou a aplicação da redução da pena para 1/6 (um sexto), em relação às circunstâncias agravantes em desfavor do apelante, bem como, a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 129, § 4º, do Código Penal. Em contrarrazões, o Ministério Público do Estado de Mato Grosso opinou pelo improvimento do recurso. A Procuradoria-Geral de Justiça, em sede de parecer, manifestou-se pelo desprovimento do recurso, com recomendação de adoção de providência de ofício, para readequação da pena do crime de ameaça para 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de detenção. É o relatório. À douta revisão. VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação criminal. Narra a denúncia que: “(...) No dia 03 de janeiro de 2023, por volta de 18h30min, no interior da residência situada na Rua Japurá, n° 2090, no Bairro BNH, na cidade de Barra do Garças/MT, o denunciado Alipio Arando Gomes, com consciência e vontade, ofendeu a integridade física de sua companheira Ketlyn Teodoro Cândido, por razões da condição do sexo feminino, provocando-lhe a lesão corporal descrita no laudo de exame de corpo de delito e no mapa topográfico para localização de lesões (doc. anexo), bem como a ameaçou, prometendo-lhe causar mal injusto e grave. Segundo apurado, o denunciado e a vítima convivem maritalmente por aproximadamente 02 (dois) anos e 06 (seis) meses, à época dos fatos. Ressai do procedimento encartado que, na data do fato, a vítima, a pedido do denunciado, conduziu os enteados até a residência da avó deles, contudo, demorou para retornar. Ocorre que, quando retornou à residência do casal, encontrou o denunciado extremamente irritado em razão da demora dela. Em seguida, o denunciado agrediu fisicamente a ofendida, desferindo-lhe tapas no rosto, socos na cabeça, bem como a enforcou, fazendo-a cair no chão e, por fim, puxou-lhe pelos cabelos, causando-lhe as lesões descritas no exame de corpo de delito, com presença de equimose em lábio inferior, no antebraço direito e escoriação em couro cabeludo, no braço esquerdo, no antebraço esquerdo, no punho direito. Como se não bastasse, o denunciado proferiu ameaças de morte contra a ofendida, dizendo: “VOU TE MATAR, VOU MATAR SEU FILHO, VOU MATAR SUA MÃE, VOCÊ NÃO VAI EMBORA” – sic. O indiciado, por ocasião de seu interrogatório na seara policial, negou a prática dos crimes que lhes são imputados (págs. 33/35-PDF). (sic) (Id. 230384230)” Após a regular instrução processual, o apelante foi condenado pela prática dos crimes previstos nos artigos 129, § 13, e 147, c/c o artigo 61, inciso II, alínea “h” e “f”, ambos do Código Penal. DO PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO A Defesa pleiteia a absolvição do apelante dos delitos de lesão corporal e ameaça, por ausência de dolo vez que. Da detida análise das razões constantes do presente recurso, conclui-se que o inconformismo do apelante não merece acolhimento. A materialidade delitiva emerge do laudo pericial e imagens fotográficas (ID 202344918); boletim de ocorrência n. 2023.2855 (ID 202344913) e declarações prestadas pela vítima (ID 202344914), em ambas as etapas persecutórias. No que tange à autoria, perante a autoridade policial, o apelante alegou que, em janeiro de 2023, pediu para a vítima buscar roupas dos filhos para uma viagem, mas nega qualquer agressão ou ameaça, que quando a vítima chegou, ele estava dormindo e houve uma discussão à noite, levando à desistência da viagem. Alega ter dito à vítima que ela deveria escolher um lado, mencionando a suposta conduta nefasta da mãe dela. No dia seguinte, ao acordar, percebeu que a vítima havia deixado a residência. Ao ser interrogado em juízo, o apelante ratificou as informações prestadas em sede inquisitorial, mas, ao ser indagado pela defesa, admitiu que a segurou pelos braços no momento da briga, na tentativa de contê-la. Já, a vítima, quando ouvida pela autoridade policial, declarou que estava grávida de quatro meses na data dos fatos que, nesse dia, o apelante pediu para buscar roupas dos enteados na casa da avó, pois iriam viajar. Como uma das crianças chorou para ficar, ela demorou a retornar, o que deixou o apelante nervoso. Ele a agrediu com tapas, socos e enforcamento, além de puxar seu cabelo e tomar seu celular e a chave do carro. Também a ameaçou de morte, dizendo que mataria ela, seu filho e sua mãe. Após as agressões, o apelante a obrigou a subir para o quarto e, no dia seguinte, pegou seu filho e foi para a casa de sua mãe. Quando ouvida em juízo, a vítima confirmou que as agressões, constantes nas imagens colacionadas no relatório policial, foram causadas pelo seu companheiro que também a ameaçou de morte. Peço vênia ao transcrever o depoimento da vítima constante na sentença: ‘(...)Juiz: quem iniciou as agressões físicas foi ele? Foi a senhora? Vítima: Foi ele Juiz: Isso foi feito na frente das crianças? Vítima: Foi Juiz: A senhora ficou com lesão onde? A senhora lembra? Vítima: Na boca e no braço Promotora de Justiça: Nesse dia você mencionou que não houve ameaças, nesse dia ele não chegou a mencionar que ele te mataria ou mataria o filho? Vítima: Na hora da discussão, da briga, ele foi pra onde as crianças estavam, no meu filho, que não é filho dele. Ele falou que se eu não levantasse do chão ele iria matar o meu filho Promotora de Justiça: Quando ele mencionou que a senhora não iria embora, ele chegou ali nessa hora quando a discussão continuou, a mencionar, mesmo que em tom desbravamento, que mataria? Vítima: Foi Promotora de Justiça: Qual foi o contexto? Vítima: Ele sempre falava isso, que ia me matar, tanto é que no outro dia ele me ligou e que me dava cinco minutos pra que voltar pra casa, senão ele ia vir aqui em casa me buscar, por isso eu fui para delegacia. Promotora de Justiça: E antes da senhora sair, durante o curso da discussão, ele repetiu nesse segundo momento que mataria a senhora? Vítima: Sim. Defesa: em algum momento você se sentiu ameaçada e acreditou que ele faria alguma das coisas que ele estava falando? Vítima: não, porque ele sempre fala isso e nunca faz Defesa: você ficou com medo? Vítima: Sim.” (sic) Como se percebe do depoimento da vítima, por mais que ela diga que não se sentiu ameaça, ressalta que sentiu medo pelas atitudes do apelante, estando presente o temor de sofrer mal injusto e grave, já que no depoimento prestado em Juízo a vítima descreve com riqueza de detalhes a prática criminosa. Acresça-se, ainda, que os elementos probatórios retro transcritos comprovam, nos autos, a materialidade e a autoria dos delitos de ameaça e lesão corporal, posto que as imagens juntadas no relatório policial evidenciaram os hematomas resultantes das agressões atribuídas ao apelante são evidentes, concluindo pela existência de: “equimose violácea-arroxeada em lábio inferior, à direita; uma escoriação puntiforme em couro cabeludo, em região parietal direita; duas escoriações circundadas por eritemas em região posterior dos terços médio e distal do braço esquerdo; escoriação linear de cerca de 1 centímetro em terço distal do antebraço esquerdo; escoriação puntiforme em região lateral do punho direito e equimose elíptica, violácea em região posterior e distal do antebraço direito”, o que se alinha com os relatos, reforçando a credibilidade do depoimento da ofendida. Ressalta-se que em crimes praticados no âmbito doméstico, como o presente caso, na maioria das vezes clandestinos, sem testemunhos, a palavra da vítima tem grande valia para a comprovação da autoria do delito de ameaça, notadamente quando tenha sido esclarecedora sobre a conduta criminosa do apelante. Nesse sentido, colaciono jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “PROCESSO PENAL E PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS. ART. 24-A DA LEI N. 11.340/2006. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVA. DESCABIMENTO. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. 1. Prevalece nesta Corte Superior o entendimento de que, nos crimes perpetrados no âmbito da violência doméstica, a palavra da vítima tem valor probante diferenciado ( AgRg no RHC n. 144.174/MG, Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe 19/8/2022). (...) (STJ - AgRg no AREsp: 2146872 SP 2022/0180754-0, Data de Julgamento: 27/09/2022, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/09/2022)” Compartilhando do mesmo entendimento, colaciono entendimento deste e. Tribunal de Justiça: “EMENTA RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL. AMEAÇA EM ÂMBITO DOMÉSTICO E FAMILIAR. CONDENAÇÃO. IRREGINAÇÃO DEFENSIVA. 1. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO DO APELANTE. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PROVAS. DESCABIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DECLARAÇÕES DA VÍTIMA AMPARADAS PELOS DEMAIS ELEMENTOS PROBANTES. VÍTIMA INTIMIDADA COM AS AMEAÇAS PROFERIDAS PELO APELANTE.2. PLEITO DE AFASTAMENTO DA AGRAVANTE PREVISTA NO ART. 61, II, F, DO CÓDIGO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. CRIME PRATICADO EM AMBIENTE DOMÉSTICO. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM. 3. RECURSO DESPROVIDO. 1. É inviável a absolvição do apelante em razão da ausência de provas, uma vez que ficou comprovado nestes autos, pelas palavras firmes e coerentes da vítima, que ele proferiu ameaças de ocasionar na vítima mal injusto e grave, situação que causou nela temor real de concretização do prometido, restando, portanto, presente o elemento do tipo exigido para ensejar o juízo condenatório. 2. É aplicável a circunstância agravante do art. 61, II, f, do Código Penal ao crime de ameaça no ambiente doméstico, diante do recrudescimento de tratamento dado aos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de modo a não configurar bis in idem, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 3. Recurso desprovido. (N.U 1006475-56.2020.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, LUIZ FERREIRA DA SILVA, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 20/03/2024, Publicado no DJE 22/03/2024)” Assim, não há o que se falar em ausência de dolo. Nesse sentido, à luz do princípio do livre convencimento motivado e das declarações firmes e coerentes da vítima, corroboradas pelos demais elementos probatórios produzidos na instrução processual, impõe-se a manutenção da condenação, pois não há fundamentos para a absolvição, muito menos o que se falar que os crimes foram cometidos sob influência de violenta emoção provocada pela vítima. Diante desse quadro, verifica-se que os elementos probatórios retro transcritos comprovam, nos autos, a materialidade e a autoria dos crimes de lesão corporal e ameaça, posto que vítima foi firme e coerente asseverando em toda a persecução criminal que o acusado lhe agrediu e ameaçou, razão pela qual deve ser mantida intacta a condenação. Mantida a condenação, exsurge irresignado o apelante, requerendo a readequação da dosimetria penal, sob ao argumento que constitui fundamentação inidônea a valoração negativa da culpabilidade (pelo deferimento de vários golpes na vítima) e da circunstância do crime (realizado na frente dos filhos menores). Assim fundamentou o Juízo Sentenciante quanto à exasperação da pena-base: “CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS (ART. 59 DO CÓDIGO PENAL). Tenho que nos autos que as circunstâncias do artigo 59 do CPP não são totalmente favoráveis, afinal a motivação foi fútil, apenas pelo motivo da vítima ter demorado; que a circunstância dos crimes terem sido cometidos na frente dos filhos deve ser valorado negativamente; que a culpabilidade do réu foi grave, afinal vários golpes foram deferidos; que as consequências para a vítima foram obviamente graves afinal ela se encontrava grávida; assim fixo a pena em 02 anos de reclusão para o crime de lesão corporal e 03 meses de detenção para o crime de ameaça. Circunstâncias legais (agravantes/atenuantes). Presente duas agravantes do artigo 61, inciso II alínea “F” e “h” em relação ao crime de ameaça, de forma que agravo a pena em 15 dias passando ela a ser de 03 meses e 25 dias de detenção, sendo mantida a pena anteriormente fixada para o crime de lesão corporal. Causas de aumento ou diminuição de pena. Ausentes causas de aumento e de diminuição. Assim a pena definitiva é fixada em 02 anos de reclusão para o crime de lesão corporal e 03 meses e 25 dias de detenção para o crime de ameaça”.(sic) Quanto ao pedido de valoração neutra da culpabilidade no crime de lesão corporal, ainda que a fundamentação do juízo de primeiro grau seja inadequada, pois a aplicação de múltiplos golpes não extrapola os limites do tipo penal, entendo que a prática do delito contra pessoa gestante evidencia maior gravidade da conduta do apelante. Assim, mantenho a valoração negativa dessa circunstancial e, consequentemente, reformo a sentença para atribuir valoração neutra às consequências do crime. Acerca do pedido de valoração neutra da culpabilidade no crime de ameaça, entendo que carece de fundamentação para a exasperação da pena base, de modo a se inferir que assiste razão ao apelante, pois a avaliação desfavorável do mencionado vetor, no caso, evidencia-se inadequada, já que as informações presentes nos autos não são capazes de elucidar em qual medida a conduta do acusado extrapolou o tipo penal, inexistindo justificativa suficiente para maior reprovabilidade que reflita na pena imposta. Sobre o tema, colaciono o julgado sobre o tema: “(...) A pena deve ser revista e consequentemente reduzida, quando sua fixação não observa indicações concretas das provas que fundamentaram sua decisão e baseia-se em circunstâncias inerentes ao tipo penal. Não extrapolando os limites do tipo, a culpabilidade, compreendida como o juízo de reprovabilidade do comportamento do agente, não pode ser valorada negativamente . Considerando que os motivos determinantes à prática do delito não fogem aos comuns à espécie é de rigor a redução da pena-base. Quando a circunstância do delito citada pelo d. sentenciante foi somente o que ocasionou a lesão corporal, não há que se falar em exasperação da pena base, visto que não extrapolou os limites do tipo. Não existindo nos autos comprovação de que a lesão corporal resultou em incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias, as consequências do crime devem ser mantidas neutras . (...) (TJ-MG - APR: 00003577320198130778 Arinos, Relator.: Des.(a) Valéria Rodrigues Queiroz, Data de Julgamento: 28/09/2022, 9ª Câmara Criminal Especializa, Data de Publicação: 30/09/2022)” Desta forma, afastado a circunstancial de culpabilidade para o crime de ameaça, uma vez que a conduta do apelante não ultrapassou aquela ínsita ao tipo penal Quanto à circunstância do crime, em relação aos crimes de lesão corporal e ameaça, entendo que sua valoração negativa se mostra adequada, vez que a agressão e a ameaça foram perpetradas na presença dos filhos conforme depoimento da vítima, circunstância que extrapola os elementos próprios dos tipos penais e revela maior reprovabilidade na conduta do agente, notadamente pelos efeitos deletérios que a exposição à violência doméstica pode causar no desenvolvimento psicossocial dos infantes. Aliás, desse posicionamento não destoa a jurisprudência do colendo STJ, firmada no sentido de que "o cometimento do crime na presença dos filhos da vítima é suficiente para determinar o incremento da pena relativamente ao vetor das circunstâncias do delito" (STJ. AgRg no AREsp 1982124/SE. Relator Min. Reynaldo Soares Da Fonseca, Quinta Turma. Julgado em 15/2/2022, DJe 21/2/2022; destaquei). Portanto, demonstrado que ambos os crimes ocorreram na presença de menor de idade, o pleito para neutralizar a circunstância do crime, não merece acolhimento. De outro Norte, verifico que o juiz sentenciante, em relação ao crime de ameaça, utilizou o fato de o delito ter sido praticado contra vítima grávida tanto para negativar o vetor das consequências do crime quanto como agravante na segunda fase da dosimetria. Assim, de ofício, entendo necessária o reparo para neutralizar a valoração negativa do vetor das consequências do crime, na primeira fase da dosimetria, em observância ao princípio do non bis in idem. Assim passo ao redimensionamento da pena: Delito de lesão corporal qualificado: Pena de reclusão, de 01 (um) ano a 04 (quatro) anos (redação anterior à lei 14.994/24). 1 - Primeira fase: Circunstâncias judiciais (artigo 59 do Código Penal). A culpabilidade do acusado é grave, tendo em vista que a vítima se encontrava gestante à época do fato. O acusado não registra antecedentes criminais. A conduta social pode ser tida como normal. O motivo do crime há de se considerar fútil, vez que a discussão que levou às agressões físicas, teve como início, o atraso da vítima para chegar em casa As consequências do crime julgo como neutras. Quanto às circunstâncias do crime, entendo que devem ser valoradas negativamente, posto que o crime foi cometido na frente de menores. Tudo isso sopesado, à fração de 1/6 (um sexto) do mínimo legal da pena do tipo para cada circunstância judicial valorada negativamente (três), fixo a pena-base em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de detenção. 2 - Segunda fase - Circunstâncias legais: Não existem. 3 - Terceira fase: Circunstâncias Especiais de Aumento e/ou Diminuição da Pena: Não existem. Expostos os fundamentos da dosimetria, fixo a pena final, para este delito, em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão. Delito de ameaça: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. 1 - Primeira fase: Circunstâncias judiciais (artigo 59 do Código Penal). A culpabilidade do acusado, diante do modo pelo qual o delito foi praticado é normal e inerente ao tipo penal infringido. O acusado não registra antecedentes criminais. A conduta social pode ser tida como normal. O motivo do crime há de se considerar fútil, vez que a discussão que levou às agressões físicas, teve como início, o atraso da vítima para chegar em casa. As consequências julgo como neutras. Quanto às circunstâncias do crime, entendo que devem ser valoradas negativamente, posto que o crime foi cometido na frente de menores. Tudo isso sopesado, à fração de 1/6 (um sexto) do mínimo legal da pena do tipo para cada circunstância judicial valorada negativamente (três), fixo a pena-base em 01 (um) mês e 10 (dez) dias de detenção. 2 - Segunda fase - Circunstâncias legais: Estão presentes duas agravantes, ambas descritas no inciso “f” (violência contra a mulher) e “h” (mulher grávida) do artigo 61 do Código Penal. Posto isso, agravo a pena base, à fração de 1/6 (um sexto) da pena base, à pena de 01 (um) mês e 16 (dezesseis) dias de detenção. 3 - Terceira fase: Circunstâncias Especiais de Aumento e/ou Diminuição da Pena: Não existem. Expostos os fundamentos da dosimetria, fixo a pena final, para este delito, em 01 (um) mês e 16 (dezesseis) dias de detenção. Assim, a pena definitiva é de 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão para o crime de lesão corporal, e 01 (um) mês e 16 (dezesseis) dias de detenção para o crime de ameaça. Mantenho o regime aberto para início do cumprimento da pena, conforme disposto no art. 33, §2º, “c”, do Código Penal. Com essas considerações, em dissonância com o parecer ministerial, CONHEÇO do recurso interposto e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para redimensionar a pena para 1 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão e 01 (um) mês e 16 (dezesseis) dias de detenção para o crime de ameaça, mantendo-se incólumes os demais aspectos da sentença. É o voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/04/2025

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Debora Gomes De Araujo e outros x A. M. Oliveira Imobiliária e outros

ID: 326337934

Tribunal: TJMT Órgão: 11ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1013689-56.2021.8.11.0041

Data de Disponibilização: 16/07/2025

Polo Ativo:

DEBORA GOMES DE ARAUJO MANOEL JOAQUIM DA CRUZ JUNIOR

Polo Passivo:

A. M. OLIVEIRA IMOBILIÁRIA GYLLEADE SOUSA DA SILVA LTDA

Sentença

Advogados:

DANIEL ALVES MIRANDA

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RAFAEL QUEIROZ DOURADINHO MENEZES

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ROBERTA DE ARRUDA CHICA DUARTE

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

RAYZA BIANCHINI

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IVAN EURIPEDES DA SILVA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 11ª Vara Cível Comarca da Capital GABINETE Autos nº 1013689-56.2021.8.11.0041 Vistos, etc. Trata-se de ação de resolução contratual c/c pedidos indenizatórios a… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 11ª Vara Cível Comarca da Capital GABINETE Autos nº 1013689-56.2021.8.11.0041 Vistos, etc. Trata-se de ação de resolução contratual c/c pedidos indenizatórios ajuizada por Debora Gomes de Araujo e Manoel Joaquim da Cruz Junior em face de Gylleade Sousa da Silva Ltda. e A. M. Oliveira Imobiliária, todos devidamente qualificados nos autos, por meio da qual buscam a rescisão do contrato de compra e venda de imóvel, a restituição integral dos valores pagos, além da condenação das requeridas à multa contratual invertida e indenização por danos morais. Relatam os autores que, em 25.08.2020, adquiriram das requeridas o Lote nº 152, situado no Condomínio Chácara de Recreio Cristal das Águas, pelo valor total de R$ 34.000,00 (trinta e quatro mil reais), mediante pagamento inicial de R$ 2.800,00 (dois mil e oitocentos reais) e 70 (setenta) parcelas mensais de R$ 442,85 (quatrocentos e quarenta e dois reais e oitenta e cinco centavos), iniciadas em 10.09.2020. Alegam que, até a propositura da ação, haviam adimplido R$ 5.014,25 (cinco mil, quatorze reais e vinte e cinco centavos). Sustentam que, em 08.02.2020, foram surpreendidos com notícia oficial de embargo do empreendimento pelo órgão ambiental SEMA, por ausência de licença para instalação em Área de Preservação Permanente às margens do Rio Coxipó, ocasionando paralisação total das obras. Referem que a documentação comprobatória do embargo foi negada pelas requeridas e pelo órgão competente, destacando que o contrato afirmava inexistir quaisquer ônus sobre o imóvel, o que se demonstrou inverídico. Afirmam que a cláusula contratual de rescisão por inadimplemento os expõe a risco iminente de perda do investimento. Aduzem violação do direito à informação clara e adequada, ressaltam que as requeridas não suspenderam imediatamente as cobranças, imputam responsabilidade objetiva pelo inadimplemento. Requerem, liminarmente, a concessão de tutela provisória de urgência, para que seja determinada a suspensão imediata da obrigação de pagamento das parcelas contratuais e dos efeitos da cláusula 3.6, que prevê a rescisão automática em caso de inadimplência de 03 (três) parcelas. Ao final, postulam pela procedência da demanda, à fim de que seja rescindido o contrato firmado entre as partes, com a restituição integral dos valores pagos, a inversão e majoração da cláusula penal prevista exclusivamente contra os consumidores, e indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para cada autor, além das custas processuais e honorários advocatícios. Atribuiu à causa o valor de R$ 69.014,25 (sessenta e nove mil, quatorze reais e vinte e cinco centavos). Instruiu a inicial com os documentos de id. 53723966 a id. 53724767. Conforme decisão de id. 56559681, fora deferida a justiça gratuita e deferido o pedido de tutela provisória de urgência para determinar que “que a parte requerida: a) suspenda todas as parcelas vincendas do contrato em discussão nos autos; b) se abstenha de incluir o nome da parte autora no cadastro de proteção ao crédito e; c) suspenda a aplicação da cláusula contratual n. 3.6, enquanto perdurar a discussão, sob pena de aplicação das medidas necessárias para a efetivação da tutela, conforme art. art. 297, do Código de Processo Civil”, sendo designada audiência de conciliação e determinada a citação da requerida. Realizada audiência de conciliação, que restou inexitosa, conforme termo de id. 60853713. A parte requerida Gylleade Sousa da Silva Ltda. apresentou contestação c/c reconvenção no id. 62493162, arguindo, preliminarmente, a impugnação da justiça gratuita, ante a não comprovação da hipossuficiência financeira alegada. Também preliminarmente, defende a existência de irregularidade na representação processual do autor Manoel Joaquim da Cruz Junior, pela ausência de procuração específica para transigir na audiência de conciliação. No mérito, alega que os autores agiram com intenção deliberada de causar dano à imagem da empresa, sustentando que possuíam licença prévia de localização e que as demais licenças ambientais já haviam sido protocoladas, não havendo qualquer conduta dolosa ou culposa. Afirma que suspendeu voluntariamente a emissão de boletos após o embargo, negando má-fé. Pugna pela improcedência dos pedidos e, em sede de reconvenção, o deferimento da justiça gratuita e a condenação dos reconvindos por danos morais no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) em razão de suposta difamação perpetrada em grupo de WhatsApp. Com a peça de defesa c/c reconvenção, juntou os documentos id. id. 62333900 a id. 62453878. A requerida A. M. Oliveira Imobiliária apresentou contestação c/c reconvenção no id. 62619334, arguindo, preliminarmente, a inadequação do valor da causa, que reputou desproporcional ao valor do contrato, pleiteando seu redimensionamento para R$ 34.000,00 (trinta e quatro mil reais). Também preliminarmente, apresenta impugnação à justiça gratuita, ante a não comprovação da hipossuficiência financeira alegada. Ainda, preliminarmente, defende a existência de irregularidade na representação processual do autor Manoel Joaquim da Cruz Junior, pela ausência de procuração específica para transigir na audiência de conciliação. Na matéria de fundo, aduz ser apenas prestadora de serviço com autorização para venda, e que antes do embargo já possuía licença prévia de localização e atividade, tendo as demais licenças em andamento e taxas recolhidas, não havendo culpabilidade. Defende que a requerida Gylleade Sousa da Silva Ltda. suspendeu todos os boletos após o embargo e que ambas não mediram esforços para o desembargo, agindo de forma transparente. Sustenta, que não houve motivo para resolução do contrato ou inversão da cláusula penal, pois já protocolou o licenciamento. Assevera que não houve danos morais, pois a situação não causou transtornos que extrapolem o cotidiano, e que a tutela de urgência deve ser revogada. Pugna pela improcedência dos pedidos e, em sede de reconvenção, o deferimento da justiça gratuita e a condenação dos reconvindos por danos morais no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) em razão de suposta difamação perpetrada em grupo de WhatsApp. Com a contestação c/c reconvenção juntou os documentos de id. 62619336 a id. 62620458. A parte autora apresentou impugnação às contestações e defesa as reconvenções no id. 67718448. Na decisão saneadora de id. 160138298, fora indeferida a justiça gratuita pleiteada pelas requeridas e rejeitadas as preliminares invocadas nas peças de defesas, sendo fixado como ponto controvertido “a ilicitude na conduta do requerido, a responsabilidade das partes, a falha na prestação dos serviços, os valores pagos e a possibilidade de restituição, o inadimplemento e a rescisão contratual, a irregularidade do empreendimento, comprovando-se a imprudência, negligencia e imperícia, a existência de dano, a extensão dos danos e o nexo causal”, determinando-se a intimação das partes para especificarem as provas que pretendem produzir. Manifestação das partes no id. 162052721 e id. 175894780, pugnando pelo julgamento antecipado da lide. Vieram os autos conclusos. É o relatório. Fundamento. DECIDO. Trata-se de ação de resolução contratual c/c pedidos indenizatórios ajuizada por Debora Gomes de Araujo e Manoel Joaquim da Cruz Junior em face de Gylleade Sousa da Silva Ltda. e A. M. Oliveira Imobiliária, todos devidamente qualificados nos autos, por meio da qual buscam a rescisão do contrato de compra e venda de imóvel, a restituição integral dos valores pagos, além da condenação das requeridas à multa contratual invertida e indenização por danos morais. Profiro o julgamento antecipado da lide (artigo 355, I, do Código de Processo Civil), porque a matéria prescinde de outras provas, sendo suficientes para o deslinde da causa as provas documentais contidas nos autos, que permitem a formação do convencimento do juiz, conforme regra do artigo 370, do CPC. Além disso, as preliminares arguidas pelas requeridas foram rejeitadas na decisão saneadora de id. 160138298, cujo decisum não adveio qualquer recurso. Passo, então, a decidir a causa. A controvérsia da demanda reside na validade e execução do contrato de compra e venda do Lote nº 152, adquirido pelos autores, diante do embargo administrativo imposto pela SEMA por ausência de licença ambiental, situação que, segundo os autores, caracteriza inadimplemento contratual apto a ensejar a resolução do negócio jurídico, restituição integral dos valores pagos, aplicação invertida da cláusula penal e indenização por dano moral, ao passo que as requeridas sustentam a regularidade das licenças ou seu trâmite administrativo, a ausência de culpa, e a improcedência dos pedidos indenizatórios, além de requererem a condenação dos autores por suposta difamação. Assim, a questão jurídica central da lide consiste em definir se o embargo administrativo do empreendimento por ausência de licença ambiental configura inadimplemento contratual imputável às requeridas, apto a fundamentar a resolução do contrato com restituição integral dos valores pagos, inversão da cláusula penal e indenização por danos morais, à luz do Código Civil, do Código de Defesa do Consumidor e da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça. Pois bem. De pronto, verifica-se que a relação jurídica entre as partes configura relação de consumo, nos termos dos artigos 2º e 3º, ambos do CDC, pois a autora, na condição de consumidor, é destinatário final do bem adquirido. Assim, é cediço que o pacto em questão está submetido a legislação consumerista, consoante entendimento do c. STJ, verbis: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SÚMULA Nº 83/STJ. 1. O Código de Defesa do Consumidor atinge os contratos de compra e venda nos quais a incorporadora se obriga a construir unidades imobiliárias mediante financiamento. Acórdão em harmonia com a jurisprudência deste Superior Tribunal. Precedentes. Incidência da Súmula nº 83/STJ. 2. Agravo regimental não provido.” (AgRg no AREsp nº 120.905/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 06.05.2014 – negritei). À vista disso, o caso em tela deve ser analisado à luz do Código de Defesa do Consumidor, que permite a interpretação das cláusulas contratuais, afastando-as quando se verificarem abusivas. In casu, as partes firmaram Contrato Particular de Compromisso de Compra e Venda de Imóvel, tendo por objeto o Lote nº 152, situado no empreendimento denominado Condomínio Chácara de Recreio Cristal das Águas, localizado na estrada Jurimirim, km 11,600 m, Distrito do Rio Coxipó do Ouro, município de Cuiabá/MT, conforme documento acostado aos autos sob o id. 53723983. Assim, o contrato celebrado pelas partes contém declaração expressa de que o imóvel estava livre e desembaraçado de quaisquer ônus, conforme cláusula 1.3, de modo que incumbia às requeridas demonstrar a regularidade do empreendimento imobiliário que disponibilizou à venda, assim como a licença ambiental e todos os requisitos necessários a construção e legalização do bem adquirido pelos consumidores, o que não ocorreu, uma vez que limitaram-se a alegar em suas defesas que havia licença prévia ou que o protocolo do licenciamento ambiental isentaria de responsabilidade não encontra respaldo legal. Ora, há todo um arcabouço normativo protetivo relacionado ao meio ambiente, constante na Constituição Federal e em leis infraconstitucionais, como a Lei nº 12.651/2012, e nos autos não se demonstrou qualquer legalidade na ocupação, procedimento administrativo regular para alienação da área, ônus que era das requeridas. Na verdade, fica claro que as requeridas não observaram as leis do meio ambiente, ao comercializarem os imóveis sem licenças administrativas e ambientais, tanto é que o empreendimento foi embargado. Nesse contexto, ainda que as requeridas aleguem o contrário, é de conhecimento notório que o empreendimento está embargado pelos órgãos públicos, o que impede a concretização válida do negócio entabulado entre as partes, e torna o prazo de entrega incerto. Ora, a validade do negócio jurídico precede a existência de objeto lícito e não defeso em lei, conforme o art. 104, do Código Civil, que assim dispõe: “Art. 104. A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei.” Nesse contexto, ficou demonstrada a existência de vício no objeto do contrato, fazendo-se imperiosa a sua rescisão com a devolução dos valores já despendidos, com juros de mora e correção monetária. Isso porque, a existência de contrato com irregularidade no objeto, principalmente a ausência de cumprimento das regras ambientais, bem como havendo o embargo pelos órgãos públicos, faz prevalecer a desconstituição do negócio jurídico. Não é demais ressaltar que, conforme consta nos autos, o Ministério Público do Estado de Mato Grosso ingressou com ação civil pública em que requer que os compradores não efetuem mais o pagamento das parcelas do contrato de compra e venda referente ao empreendimento (processo nº 1031290-75.2021.8.11.0041). Nessa trilha, o descumprimento da entrega, além de ferir a boa-fé objetiva e a função social do contrato (arts. 421 e 422, ambos do Código Civil), configura inadimplemento contratual absoluto, pois o objeto do contrato (a entrega da posse do imóvel) foi frustrado de maneira irreparável. Por conseguinte, tal inadimplemento das requeridas precede qualquer outra conduta dos autores e gera a resolução do contrato por descumprimento das vendedoras, nos termos do art. 475, do Código Civil: “A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, com perdas e danos.” Dessa forma, a mora inicial das requeridas rompeu o equilíbrio contratual, frustrando a finalidade do acordo e afastando qualquer exigibilidade do pagamento por parte dos autores, conforme regra do art. 476, do Código Civil que assim dispõe: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.” Com efeito, os contratos, em sua essência, devem ser regidos pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, consagrados nos arts. 421 e 422 do Código Civil. Estes princípios impõem às partes o dever de agir com transparência, cooperação e lealdade no cumprimento das obrigações pactuadas. Nesse passo, acerca da devolução de valores nos contratos de compra e venda, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula nº 543, que prevê, verbis: “Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento” (negritei e grifei). Logo, restando evidente que, no caso específico dos autos, a rescisão do contrato de compra e venda de imóvel firmado entre as partes não se deu por decisão imotivada dos compradores, deve ser reconhecida a inadimplência das requeridas, bem como a possibilidade de rescisão contratual, na forma do art. 475, do C. Civil, com a devolução integral dos valores pagos pelos autores, acrescido dos consectários legais. Outro não é o entendimento do e. TJMT, vejamos, verbis: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL COM RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS COM DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULAS COM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – PRELIMINARES – PEDIDO DE CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA EM SEDE DE CONTRARRAZÕES – PRECLUSÃO – ANÁLISE DO PEDIDO PREJUDICADA – DIALETICIDADE RECURSAL REJEITADA – MÉRITO –CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – RESOLUÇÃO POR CULPA DA PROMITENTE VENDEDORA – VENDA DE LOTEAMENTO COM EMBARAÇO JUDICIAL – VENDEDORA QUE SE COMPROMETEU CONTRATUALMENTE A ENTREGAR UM IMÓVEL LIVRE E DESEMBARAÇADO DE QUAISQUER ÔNUS – MOTIVO JUSTO PARA A RESCISÃO – RESTITUIÇÃO DA INTEGRALIDADE DOS VALORES AO PROMITENTE COMPRADOR – SÚMULA 543 STJ – [...] – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...] Demonstrado que a rescisão do contrato de compra e venda foi motivada por irregularidades no empreendimento, consistente no embaraço judicial, e tendo o promitente vendedor se comprometido a entregar um imóvel livre e desembaraçado de quaisquer ônus, configurado está o descumprimento contratual pelo promitente vendedor. Precedentes. Ocorrendo a resilição contratual por culpa da promitente vendedora, a restituição dos valores pagos deve se dar de forma integral e imediatamente, conforme entendimento insculpido na Súmula 543 do STJ. [...].” (RAC nº 1001637-91.2022.8.11.0041, 3ª Câm. Dir. Priv., Rela. Desa. Antônia Siqueira Gonçalves, j. 14.08.2024 – negritei e grifei). Além disso, o art. 884, do Código Civil veda o enriquecimento sem causa, obrigando a parte inadimplente a restituir o que foi recebido indevidamente, mormente em razão de os autores terem comprovado, documentalmente (id. 53723986 a id. 53724742), que efetuou pagamentos no valor de R$ 4.337,71 (quatro mil, trezentos e trinta e sete reais e setenta e um centavos). Avançando na elucidação da celeuma, sendo a parte requerida quem deu causa à rescisão do contrato, a cláusula penal ajustada na avença firmada entre as partes, deverá ser revertida em favor dos autores, nos termos do entendimento firmado pelo c. STJ ao julgar o REsp nº 1.614.721/DF e REsp nº 1.631.485/DF sob o rito dos recursos repetitivos, senão vejamos, verbis: “RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. ATRASO NA ENTREGA. NOVEL LEI N. 13.786/2018. CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES ANTERIORMENTE À SUA VIGÊNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. CONTRATO DE ADESÃO. OMISSÃO DE MULTA EM BENEFÍCIO DO ADERENTE. INADIMPLEMENTO DA INCORPORADORA. ARBITRAMENTO JUDICIAL DA INDENIZAÇÃO, TOMANDO-SE COMO PARÂMETRO OBJETIVO A MULTA ESTIPULADA EM PROVEITO DE APENAS UMA DAS PARTES, PARA MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL. 1. A tese a ser firmada, para efeito do art. 1.036 do CPC/2015, é a seguinte: No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigações heterogêneas (obrigações de fazer e de dar) serão convertidas em dinheiro, por arbitramento judicial. [...]” (2ª Seção, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 22.05.2019 – negritei). “RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. ATRASO NA ENTREGA. NOVEL LEI N. 13.786/2018. CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES ANTERIORMENTE À SUA VIGÊNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. CONTRATO DE ADESÃO. OMISSÃO DE MULTA EM BENEFÍCIO DO ADERENTE. INADIMPLEMENTO DA INCORPORADORA. ARBITRAMENTO JUDICIAL DA INDENIZAÇÃO, TOMANDO-SE COMO PARÂMETRO OBJETIVO A MULTA ESTIPULADA EM PROVEITO DE APENAS UMA DAS PARTES, PARA MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL. 1. A tese a ser firmada, para efeito do art. 1.036 do CPC/2015, é a seguinte: No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigações heterogêneas (obrigações de fazer e de dar) serão convertidas em dinheiro, por arbitramento judicial. [...]”(2ª Seção, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 22.05.2019 – negritei). Sendo assim, no caso em voga, o contrato (id. 53723983) prevê em favor da parte prejudicada uma multa sobre o valor total da transação, em função do desfazimento do negócio, a título de cláusula penal, que deve ser estendida aos adquirentes. Nesse sentido: “RECURSOS DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL C/C RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PARCIAL PROCEDÊNCIA – ATRASO DE MAIS DE DOIS ANOS NA ENTREGA DO EMPREENDIMENTO – OBRA EMBARGADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO POR AUSÊNCIA DE PRÉVIA LICENÇA AMBIENTAL – RESOLUÇÃO POR DESCUMPRIMENTO DO CONTRATO POR PARTE DA LOTEADORA – RESTITUIÇÃO DOS VALORES DESEMBOLSADOS PELO COMPRADOR ACRESCIDOS DE MULTA – APLICABILIDADE DO RECURSO REPETITIVO TEMA 971 DO STJ – RESCISÃO POR CULPA DA ALIENANTE – JUROS DE MORA DESDE A CITAÇÃO – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO – RECURSO DO ADQUIRENTE PARCIALMENTE PROVIDO E RECURSO DA LOTEADORA RÉ PREJUDICADO. Se quando do ajuizamento da ação já havia transcorrido quase dois anos da data prevista para a entrega da unidade adquirida, plenamente legítimo o pedido de resolução do contrato, com o direito de restituição de todos os valores pagos até então pelos adquirentes, não sendo admissível a retenção de quaisquer valores pela loteadora, a título de cláusula penal porquanto, neste caso, não há se falar em desistência imotivada do negócio. Ao contrário, consoante o Tema 971 do STJ, sendo a causa da rescisão do negócio o descumprimento, pela loteadora, dos prazos previstos para a entrega do imóvel, fará o adquirente jus à percepção, a título de cláusula penal, da multa prevista exclusivamente em favor da alienante. [...] O atraso de quase dois anos sem a devida entrega do imóvel, que retarda a conquista do imóvel próprio, modificando os planos financeiros e pessoais, gera angústia e frustração ao consumidor adquirente, passível de indenização por dano moral.” (TJMT, RAC nº 1006475-36.2018.8.11.0003, 2ª Câm. Dir. Priv., Rela. Desa. Marilsen Andrade Addario, j. 02.09.2020 – negritei e grifei). Assim, as requeridas devem pagar aos autores 25% (vinte e cinco por cento) sobre o valor total do contrato, como penalidade pelo descumprimento. Quanto ao dano moral, a hipótese não se trata de mero descumprimento contratual, mas sim de venda e comercialização de lotes em locais que sequer poderiam ser construídos, por se tratar de uma área embargada pelos órgãos do meio ambiente, cuja conduta extrapola a boa-fé contratual, portanto, cabível a indenização por danos morais. Digo isso, porque embora a jurisprudência do STJ caminhe no sentido de que, em caso de descumprimento contratual, o dano moral não é presumido, entendo que as especificidades do caso concreto evidenciam a configuração do prejuízo, dada a extensão do atraso imputável à parte requerida, que até o momento não comprovou a regularização do empreendimento frente aos órgãos ambientais. Destarte, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade das empresas requeridas pelo dano sofrido. Reafirma-se ainda, que o caso em tela não retrata uma mera frustração do cotidiano, mas, o descumprimento de uma obrigação que proporcionaria aos autores a modificação de todo o seu planejamento financeiro e pessoal, sendo inegável a sua angústia e sofrimento. No mais, o dano moral atinge os atributos da personalidade humana, prejudica a paz espiritual, os sentimentos, a convivência social e, no mais, a saúde psíquica do ofendido, tudo claramente evidente no caso vertente. Nesse sentido caminha a jurisprudência do e. TJMT ao julgar casos semelhantes, vejamos: “AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO C/C DEVOLUÇÃO DE QUANTIA PAGA E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – OBRA EMBARGADA POR IRREGULARIDADES – RESCISÃO POR CULPA DA CONSTRUTORA – DEVOLUÇÃO INTEGRAL DAS QUANTIAS PAGAS – RETENÇÃO INDEVIDA – SÚMULA 543/STJ – CLÁUSULA PENAL DEVIDA – ATO ILÍCITO CONFIGURADO – DEVER DE INDENIZAR – SENTENÇA MANTIDA – RECURSOS DESPROVIDOS. Os contratos de compra e venda, com obrigação da construtora de construir unidades imobiliárias, estão submetidos à legislação consumerista. Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor. Inteligência da súmula 543 do STJ. Na hipótese em voga, a rescisão do contrato de compra e venda de lote firmado entre as partes, não se deu por decisão imotivada da compradora, não havendo que falar-se na aplicabilidade do entendimento firmado pelo c. STJ no REsp n. 1.740.911/DF. No caso, tendo a vendedora dado causa à rescisão contratual, ante a irregularidade na realização da infraestrutura do empreendimento, o comprador faz jus, além da devolução integral dos valores pagos, ao recebimento da multa, a título de cláusula penal, prevista exclusivamente em favor do alienante. Há que se reconhecer a responsabilidade da construtora pelo dano moral sofrido na espécie, em razão do descumprimento do negócio, que ultrapassou os limites do tolerável atingindo de forma exacerbada a personalidade do autor. O arbitramento do valor da indenização decorrente de dano moral deve ser feito de acordo com os aspectos do caso, sempre com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes.” (RAC nº 1027704-93.2022.8.11.0041, 3ª Câm. Dir. Priv., Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 28.06.2023 – negritei e grifei). “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS – COMPRA E VENDA DE LOTE RURAL – EMPREENDIMENTO EMBARGADO – DANO MORAL – CONFIGURAÇÃO – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. A hipótese não se trata de mero descumprimento contratual, mas sim de venda e comercialização de lotes em locais que sequer poderiam ser construídos, por se tratar de uma área embargada pelos órgãos do meio ambiente, cuja conduta extrapola a boa-fé contratual, portanto, cabível a indenização por danos morais.” (RAC nº 1030470-56.2021.8.11.0041, 4ª Câm. Dir. priv., Rela. Desa. Serly Marcondes Alves, j. 06.09.2023 – negritei e grifei). Por conseguinte, há de se concluir pela responsabilidade da parte requerida quanto ao dano sofrido pelos autores em razão do erro cometido. Restando dessa forma caracterizado o dever de indenizar, passo ao arbitramento do quantum indenizatório que deve atender aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, a extensão do dano causado, de modo a atender sua dupla finalidade, qual seja, amenizar a dor da vítima e punir a conduta ilícita do ofensor. Sobre o tema, ensina José Raffaelli Santini: “Na verdade, inexistindo critérios previstos por lei a indenização deve ser entregue ao livre arbítrio do julgador que, evidentemente, ao apreciar o caso concreto submetido a exame fará a entrega da prestação jurisdicional de forma livre e consciente, à luz das provas que forem produzidas. Verificará as condições das partes, o nível social, o grau de escolaridade, o prejuízo sofrido pela vítima, a intensidade da culpa e os demais fatores concorrentes para a fixação do dano, haja vista que costumeiramente a regra do direito pode se revestir de flexibilidade para dar a cada um o que é seu. [...] O que prepondera, tanto na doutrina, como na jurisprudência, é o entendimento de que a fixação do dano moral deve ficar ao prudente arbítrio do juiz.” (Dano moral: doutrina, jurisprudência e prática, Agá Júris, 2000, p.45) Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação, observando os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito a vítima, ao mesmo tempo o valor deve ser significativo para que não passe despercebido coibindo a conduta negligente do agente. Não é demais ressaltar, que o valor indenizatório devido no dano moral tem dupla função: compensatória em relação ao dano sofrido e penalizadora pela conduta negligente do agente causador. Logo, considerando o grau de responsabilidade das empresas requeridas frente ao dano causado e o abalo moral sofrido pelos autores, fixo o valor da indenização em R$ 8.000,00 (oito mil reais) para cada demandante, sendo este justo para reparar o dano moral sofrido. À luz de todo o exposto, conclui-se pela procedência parcial da demanda, nos estritos limites em que se demonstrou a lesão jurídica. Deixo de enfrentar os demais argumentos deduzidos no processo, porque desnecessários para diminuir a autoridade desta sentença, conforme art. 489, §1º, IV do CPC, agindo, este Juízo, em obediência também ao comando Constitucional do art. 5º, LXXVIII. Posto isto, nos termos do art. 487, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na ação de resolução contratual c/c pedidos indenizatórios ajuizada por Debora Gomes de Araujo e Manoel Joaquim da Cruz Junior em face de Gylleade Sousa da Silva Ltda. e A. M. Oliveira Imobiliária, para: a) Confirmar a tutela provisória de urgência deferida no id. 56559681, tornando-a definitiva; b) Declarar rescindido o Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda celebrado em 25.08.2020, firmado entre as partes, referente à unidade no empreendimento denominado “Condomínio Chácara de Recreio Cristal das Águas”, localizado no Distrito do Coxipó do Outro, na cidade de Cuiabá/MT, por culpa exclusiva da parte requerida; c) Condenar as requeridas, de forma solidária, a restituir aos autores a quantia de R$ 4.337,73 (quatro mil, trezentos e trinta e sete reais e setenta e três centavos), acrescido de juros e correção monetária pela Taxa Selic até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e Selic para juros, abatido desta o valor do IPCA, a contar da citação e de cada desembolso, respectivamente; d) Condenar as requeridas, de forma solidária, ao pagamento de multa contratual compensatória em favor dos autores, no valor correspondente a 25% (vinte e cinco por cento) sobre o montante pago, o que importa no valor de R$ 1.084,43 (mil, oitenta e quatro reais e quarenta e três centavos), acrescido de juros e correção monetária pela Taxa Selic até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e Selic para juros, abatido desta o valor do IPCA, a contar da citação e da data da assinatura do contrato (25.08.2020), respectivamente; e) Condenar as requeridas, de forma solidária, ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) para cada autor, acrescido de juros e correção monetária pela Taxa Selic até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e Selic para juros, abatido desta o valor do IPCA, a partir da citação e do arbitramento, respectivamente; f) Condenar a parte requerids ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil. Transitado em julgado, remetam-se os autos imediatamente ao arquivo, mediante as anotações necessárias. P. I. C. Olinda de Quadros Altomare Juíza de Direito

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Processo nº 1008650-78.2024.8.11.0007

ID: 262732052

Tribunal: TJMT Órgão: JUIZADOS ESPECIAIS DE ALTA FLORESTA Classe: Procedimento do Juizado Especial da Fazenda Pública Nº Processo: 1008650-78.2024.8.11.0007

Data de Disponibilização: 30/04/2025

Polo Ativo:

PAULA CRISTINA FEITOSA FAZOLO

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

THIAGO DOS SANTOS SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

. ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE ALTA FLORESTA JUIZADOS ESPECIAIS Número do Processo: 1008650-78.2024.8.11.0007 REQUERENTE: PAULA CRISTINA FEITOSA FAZOLO REQUERIDO: ESTADO DE MATO … . ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE ALTA FLORESTA JUIZADOS ESPECIAIS Número do Processo: 1008650-78.2024.8.11.0007 REQUERENTE: PAULA CRISTINA FEITOSA FAZOLO REQUERIDO: ESTADO DE MATO GROSSO Vistos. Ausente o relatório em razão do permissivo do artigo 38 da Lei 9.099/95. Não havendo necessidade de dilação probatória, passo ao julgamento antecipado do mérito, eis que presente in casu a hipótese do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. I – PRELIMINAR a) Da coisa julgada, litispendência e conexão: Embora exista outra ação ajuizada pela autora (1006475-19.2021.8.11.0007), não estão presentes os requisitos cumulativos previstos no artigo 337, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil, eis que aquela ação versa sobre cumprimento de sentença em relação ao adicional de férias e FGTS referente ao período de 06/11/2016 a 06/11/2021 e a presente ação trata de objeto distinto (verbas relativas ao período entre novembro/2021 a agosto/2024), o que afasta a possibilidade de reconhecimento da coisa julgada, litispendência ou conexão. Rejeito a preliminar. b) Prescrição Quinquenal No caso em testilha, vislumbro a não ocorrência da prescrição, eis que os valores objeto da ação não estão atingidos pela prescrição quinquenal das dívidas da Fazenda Pública, conforme Decreto nº 20.910/32 e nos termos da Súmula n. 85/STJ abaixo transcrita. “Súmula 85. Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação.” Portanto, rejeito a prescrição. Não havendo questões de nulidades, passo à análise do feito. II – DO MÉRITO Trata-se de AÇÃO DE COBRANÇA DE CRÉDITOS TRABALHISTAS interposta em desfavor do ESTADO DE MATO GROSSO, aduzindo a parte autora que foi contratada temporariamente pelo Estado para exercer o cargo de Professor(a) de Educação Básica, na qual pleiteia o pagamento de diferença de férias acrescidas de 1/3 constitucional, FGTS e 13º no período laborado de novembro/2021 a agosto/2024. Por seu turno, após devidamente citado, o requerido se defendeu fundamentando que, no caso dos autos, trata-se de relação jurídico-administrativa de caráter temporário com fundamento no art. 37, IX da CF e na Lei Complementar nº 600/2017 e, portanto, afirma que não é aplicável a legislação trabalhista regida pela CLT no caso da parte autora, aduzindo que o trabalhador faz jus tão somente às verbas expressamente previstas nos instrumentos firmados entre ambos. Nota-se que a reclamação em questão tem por objeto a cobrança de verbas trabalhistas decorrentes de contratos de trabalho por prazo determinado que foram entabulados entre as partes. O cerne da questão cinge-se em definir se houve o contrato temporário e a qual a natureza jurídica do contrato entre as partes, para se aferir se a parte autora tem direito à percepção dos pedidos da exordial. Analisando os documentos que instruíram a petição inicial, tenho que a parte autora conseguiu provar seu labor prestado ao Estado de Mato Grosso como Professora. Diante de tais fatos, resta comprovado que houve a contratação temporária da parte autora pelo requerido somente no período novembro/2021 a julho/2024. Neste escopo, no que concerne ao vínculo jurídico existente entre as partes, registro inicialmente que, nos termos do artigo 37, incisos II e IX, da Constituição Federal, a investidura em cargo efetivo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvada a possibilidade de contratação por tempo determinado para o exercício de função pública, quando destinada a atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos casos expressamente estabelecidos em lei. A esse respeito, discorre Maria Sylvia Di Pietro: “A título de exceção ao regime jurídico único, a Constituição, no artigo 37, IX, previu, em caráter de excepcionalidade, para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público, a possibilidade de contratação por tempo determinado. Esses servidores exercerão funções, porém, não como integrantes de um quadro permanente, paralelo ao dos cargos públicos, mas em caráter transitório e excepcional. (...) Com isso, fica explicada a razão de ter o constituinte, no artigo 37, II, exigido concurso público só para a investidura em cargo ou emprego. Nos casos de função, a exigência não existe porque os que a exercem ou são contratados temporariamente para atender às necessidades emergentes da Administração, ou são ocupantes de função de confiança, para os quais não se exige concurso público.” (in "Direito administrativo". 24ªed. São Paulo: Atlas, 2011, p.536). Com efeito, os contratos celebrados pelos entes públicos se submetem aos requisitos extraídos do artigo 37, IX, da Constituição Federal e, uma vez verificado o não preenchimento simultâneo dos mencionados requisitos constitucionais, o reconhecimento da nulidade da contratação é medida que se impõe, nos moldes do parágrafo 2º do artigo 37 da Carta Magna, in verbis: Artigo 37 – “(...) § 2º - A não observância do disposto nos incisos II e III implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável, nos termos da lei.” Ao julgar o RE nº 658.026 (Tema nº 612 de Repercussão Geral), o STF firmou a tese de que "Nos termos do art. 37, IX, da Constituição Federal, para que se considere válida a contratação temporária de servidores públicos, é preciso que: a) os casos excepcionais estejam previstos em lei; b) o prazo de contratação seja predeterminado; c) a necessidade seja temporária; d) o interesse público seja excepcional; e) a contratação seja indispensável, sendo vedada para os serviços ordinários permanentes do Estado que estejam sob o espectro das contingências normais da Administração". No caso em apreço, verifica-se que a parte requerente foi contratada pelo Estado de Mato Grosso sem a prévia aprovação em concurso público de provas e/ou títulos, por meio de sucessivos contratos temporário, o que nitidamente retira a característica de temporariedade e excepcionalidade. É importante registrar que no âmbito do Estado de Mato Grosso a Lei Complementar nº 600, de 19 de dezembro de 2017, autoriza a contratação para atender à necessidade temporária e excepcional, entretanto, no presente caso as renovações sucessivas dos contratos temporários sem justificativas pertinentes evidenciam que a contratação visou suprir a necessidade de mão de obra habitual e não eventual. Assim, entendo que no caso é patente a nulidade dos contratos celebrados entre as partes, objeto desta demanda, em razão da inobservância dos requisitos constitucionais previstos no artigo 37 da Carta Magna e dos requisitos dispostos na Lei Complementar Estadual nº 600/2017, uma vez que não restou evidenciada a situação temporária de excepcional interesse público na contratação da autora e extrapolou o prazo legal. Passo a analisar se a parte requerente tem direito à percepção das verbas pleiteadas. Neste aspecto, imprescindível mencionar que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 1.066.667 (Tema n. 551), firmou posicionamento de que os servidores contratados para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, na forma do art. 37, IX, da CF, não possuem direito as verbas inerentes ao 13º salário e férias acrescidas do terço constitucional, salvo, quando houver comprovado desvirtuamento da contratação temporária em razão de sucessivas e reiteradas renovações e/ou prorrogações. Vejamos: “O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 551 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário e fixou a seguinte tese: “Servidores temporários não fazem jus a décimo terceiro salário e férias remuneradas acrescidas do terço constitucional, salvo (I) expressa previsão legal e/ou contratual em sentido contrário, ou (II) comprovado desvirtuamento da contratação temporária pela Administração Pública, em razão de sucessivas e reiteradas renovações e/ou prorrogações”, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, Redator para o acórdão, vencidos a Ministra Rosa Weber na fixação da tese, e os Ministros Marco Aurélio (Relator) e Luiz Fux, e os Ministros Cármen Lúcia e Celso de Mello (art. 2º, § 3º, da Resolução nº 642, de 14 de junho de 2019), que proviam o extraordinário fixando tese diversa. Plenário, Sessão Virtual de 15.5.2020 a 21.5.2020.(RE 1.066.677)”. Assim, entendo que no caso concreto a parte autora tem direito ao recebimento das verbas pleiteadas, eis que desvirtuadas as contratações celebradas com o ente demandado. A propósito, seguem os precedentes da Turma Recursal: DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO INOMINADO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. RENOVAÇÕES SUCESSIVAS. DESVIRTUAMENTO DA FINALIDADE EXCEPCIONAL. DECLARAÇÃO DE NULIDADE. DIREITO AO TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS E DEPÓSITOS DE FGTS. PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DA ADMINISTRAÇÃO. TEMA 551/STF. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de recurso inominado interposto contra sentença que julgou improcedente a pretensão de pagamento de FGTS e do terço constitucional de férias, pleiteados pela autora em razão do desvirtuamento das contratações temporárias realizadas pelo Estado de Mato Grosso no período de julho/2020 a 10/2022. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em análise: (i) determinar se as sucessivas renovações dos contratos temporários descaracterizam a excepcionalidade prevista no art. 37, IX, da Constituição Federal; (ii) verificar se, diante da nulidade dos contratos, a parte autora faz jus ao FGTS e ao terço constitucional de férias pelo período trabalhado. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Contratações temporárias celebradas com renovações sucessivas violam o princípio da excepcionalidade e configuram desvirtuamento da finalidade do vínculo, ensejando a nulidade dos contratos, nos moldes do art. 37, § 2º, da Constituição Federal. 4. A nulidade do contrato não afasta o direito ao recebimento do FGTS, conforme art. 19-A da Lei nº 8.036/1990, nem ao terço constitucional de férias, com base no princípio da isonomia e vedação ao enriquecimento ilícito da Administração Pública. 5. O entendimento consolidado no TEMA 551/STF reconhece que servidores temporários têm direito ao terço constitucional e ao FGTS quando comprovado o desvirtuamento das contratações temporárias, seja por renovações sucessivas ou reiteradas prorrogações. 6. No caso em análise, restou comprovada a sucessiva renovação do contrato da autora, descaracterizando sua excepcionalidade, configurando necessidade permanente de serviço público, o que enseja a declaração de nulidade. 7. A autora faz jus ao terço constitucional de férias e ao FGTS pelo período não prescrito (julho/2020 a 10/2022), com base em seus vencimentos, a serem apurados conforme fichas financeiras. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso parcialmente provido para: a) declarar a nulidade do contrato temporário no período de julho/2020 a 10/2022; b) condenar o Estado de Mato Grosso ao pagamento do terço constitucional de férias e dos depósitos do FGTS referentes ao período trabalhado e não prescrito, sem multa de 40%; c) determinar a correção monetária dos valores pelo IPCA-E e aplicação da taxa SELIC a partir da EC nº 113/2021. Tese de julgamento: “1. Sucessivas renovações de contratos temporários descaracterizam sua excepcionalidade, configurando desvirtuamento e ensejando a nulidade dos contratos. 2. Em caso de nulidade contratual, são devidos o FGTS e o terço constitucional de férias, com base no princípio da isonomia e vedação ao enriquecimento ilícito da Administração. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 7º, XVII, e art. 37, IX e § 2º; Lei Complementar Estadual nº 600/2017; Lei nº 8.036/1990, art. 19-A. (N.U 1002057-33.2024.8.11.0007, TURMA RECURSAL CÍVEL, ARISTEU DIAS BATISTA VILELLA, Terceira Turma Recursal, Julgado em 09/12/2024, Publicado no DJE 13/12/2024) RECURSO INOMINADO - FAZENDA PÚBLICA – CONTRATO TEMPORÁRIO - NECESSIDADE EXCEPCIONAL DO INTERESSE PÚBLICO - AUSÊNCIA DE PROVA DO EFETIVO TRABALHO EM SUBSTITUIÇÃO TEMPORÁRIA - RENOVAÇÕES SUCESSIVAS - VIOLAÇÃO DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ARTIGO 37, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - DESCARACTERIZAÇÃO DO CONTRATO TEMPORÁRIO - NULIDADE DA CONTRATAÇÃO - DIREITO AO DEPÓSITO DO FUNDO DE GARANTIA (FGTS) – terço constitucional de férias - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO CONHECIDO IMPROVIDO. (N.U 1031555-95.2024.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, GONCALO ANTUNES DE BARROS NETO, Primeira Turma Recursal, Julgado em 02/12/2024, Publicado no DJE 06/12/2024) Aliás, no âmbito do Estado de Mato Grosso é conferido ao professor contratado em caráter temporário o direito de férias de 45 dias, assim como o adicional de um terço constitucional deve incidir sobre esse período, nos termos dos artigos 54, 55 e 56 da Lei Complementar Estadual n. 50/1998, com a redação alterada pela Lei Complementar Estadual n. 104/2022, e em consonância com as teses firmadas no julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 1002789-40.2021.8.11.0000 do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso (Tema n. 4). Convém registrar que o artigo 56 da referida legislação estendeu expressamente o direito de férias de 45 dias e do adicional de um terço sobre esse período aos professores contratados, de modo que a parte autora faz jus nos moldes pleiteados. Eis os julgados da Turma Recursal do Estado de Mato Grosso: RECURSO INOMINADO – DIREITO ADMINISTRATIVO – PROFESSOR CONTRATADO TEMPORARIAMENTE – GOZO DE FÉRIAS – PERÍODO DE 45 DIAS – TERÇO CONSTITUCIONAL – PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – TEMA 551/STF – IRDR TEMA 4/TJMT – SENTENÇA EXTRA PETITA – PROVIMENTO PARCIAL. Sentença que ultrapassou os limites do pedido inicial ao condenar o Estado ao pagamento de FGTS, caracterizando julgamento extra petita, vedado pelos artigos 141 e 492 do CPC. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 1.066.677 (Tema 551), firmou entendimento de que servidores temporários fazem jus a férias acrescidas de terço constitucional, desde que haja expressa previsão legal ou desvirtuamento da contratação. No caso concreto, é devido o pagamento do terço constitucional sobre 45 dias de férias para os períodos trabalhados comprovados (2018, 2019, 2020, 2022 e 2023), com exclusão das parcelas já pagas e observando a proporcionalidade dos contratos incompletos. Recurso conhecido e parcialmente provido. (N.U 1012567-40.2023.8.11.0040, TURMA RECURSAL CÍVEL, JORGE ALEXANDRE MARTINS FERREIRA, Primeira Turma Recursal, Julgado em 02/12/2024, Publicado no DJE 06/12/2024) RECURSOS INOMINADOS - AÇÃO DE COBRANÇA - SERVIDOR PÚBLICO - PROFESSOR - FÉRIAS DE 45 (QUARENTA E CINCO) DIAS - TERÇO CONSTITUCIONAL CALCULADO SOBRE TODO O PERÍODO - POSSIBILIDADE - LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL Nº 50/1998 - APLICAÇÃO DA TESE JURÍDICA (TEMA Nº 4) - INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - RECURSOS CONHECIDOS E NÃO PROVIDOS. 1. In casu, a Lei Complementar nº 50/98, que regula a Carreira dos Profissionais da Educação Básica de Mato Grosso, é cristalina ao conferir ao Professor o direito a 45 (quarenta e cinco) dias de férias, assim como a garantia de um terço de remuneração sobre esse período, não fazendo distinção entre férias e recesso escolar. 2. Fixadas as seguintes teses jurídicas no julgamento do incidente de resolução de demandas repetitivas (Temanº 4): i) Os professores integrantes da carreira dos Profissionais da Educação Básica do Estado de Mato Grosso, que exercem as suas atividades dentro da sala de aula, e os professores contratados, em caráter temporário, fazem jus a quarenta e cinco (45) dias de férias, nos termos do artigo 54, I e § 1º, da Lei Complementar do Estado de Mato Grosso nº 50, de 1º de outubro de 1998, com a redação dada pela Lei Complementar do Estado de Mato Grosso nº 104, de 22 de janeiro de 2002; e ii) O adicional de um terço deve incidir sobre os quarenta e cinco (45) dias de férias para os professores integrantes da carreira dos Profissionais da Educação Básica do Estado de Mato Grosso, que exercem as suas atividades dentro da sala de aula, bem como para os professores contratados, em caráter temporário. 3. Recursos conhecidos e não providos. (N.U 1019574-45.2019.8.11.0001, TURMA RECURSAL CÍVEL, VALDECI MORAES SIQUEIRA, Turma Recursal Única, Julgado em 09/08/2022, Publicado no DJE 11/08/2022) A respeito da matéria discutida nestes autos, a Seção de Direito de Público do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, relator do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR (TEMA n.04), Des. Luiz Carlos da Costa, suscitado pelo Estado de Mato Grosso, nos autos PJe n. 1002789-40.2021.8.11.0000, em decisão colegiada proferida em 15/04/2021, disponibilizada em 23/04/2021, ADMITIU o processamento do IRDR- Tema 4, sendo fixada a seguinte tese jurídica: “estabelecer se os professores do ensino público fazem jus ao recebimento do adicional de um terço (1/3) sobre quarenta e cinco (45) dias de férias, desde que previsto em lei”. Em 22/10/2021 a Seção de Direito Público do Tribunal de Justiça de Mato Grosso julgou o mérito do IRDR - TEMA n.04, sendo firmada a seguinte tese jurídica: A) OS PROFESSORES INTEGRANTES DA CARREIRA DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA DO ESTADO DE MATO GROSSO, QUE EXERCEM AS SUAS ATIVIDADES DENTRO DA SALA DE AULA, E OS PROFESSORES CONTRATADOS, EM CARÁTER TEMPORÁRIO, FAZEM JUS A QUARENTA E CINCO (45) DIAS DE FÉRIAS, NOS TERMOS DO ARTIGO 54, I E § 1º, DA LEI COMPLEMENTAR DO ESTADO DE MATO GROSSO Nº 50, DE 1º DE OUTUBRO DE 1998, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI COMPLEMENTAR DO ESTADO DE MATO GROSSO Nº 104, DE 22 DE JANEIRO DE 2002; E B) O ADICIONAL DE UM TERÇO DEVE INCIDIR SOBRE OS QUARENTA E CINCO (45) DIAS DE FÉRIAS PARA OS PROFESSORES INTEGRANTES DA CARREIRA DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA DO ESTADO DE MATO GROSSO, QUE EXERCEM AS SUAS ATIVIDADES DENTRO DA SALA DE AULA, BEM COMO PARA OS PROFESSORES CONTRATADOS, EM CARÁTER TEMPORÁRIO. Ademais, o artigo 29 do Decreto Estadual nº 656, de 28 de setembro de 2020, alterado pelo Decreto Estadual n. 1.055, de 18 de setembro de 2024, disciplina o pagamento de férias e do adicional de férias aos professores da educação básica contratados temporariamente pelo Estado de Mato Grosso. Desta forma, a parte requerente faz jus à quarenta e cinco (45) dias de férias, bem como ao adicional de 1/3 constitucional sobre esse período, nos termos do disposto nos artigos 54 da Lei Complementar Estadual nº 50/1998. Com relação ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, é assente na jurisprudência pátria que nestes casos o contratado faz jus à percepção dos depósitos do FGTS, porquanto deve ser aplicada a Súmula 363 do Tribunal Superior do Trabalho e o disposto no artigo 19-A da Lei nº 8.036/90, in verbis: Súmula nº 363 do TST - “A contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS.” Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90: “É devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário.” (Redação da MP 2.164-41/01). Registre-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, no precedente de repercussão geral nº 596.478/RR, acerca do tema de constitucionalidade e aplicabilidade do art. 19-A da Lei nº 8.036/90, firmou a seguinte tese (TEMA 191): “É constitucional o art. 19-A da Lei 8.036/1990, que dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o direito ao salário”. Ademais, o Supremo Tribunal Federal, no precedente de repercussão geral nº 705.140/RS, acerca do tema de contratação de pessoal pela Administração Pública sem concurso e os efeitos jurídicos admissíveis em relação aos empregados, firmou a seguinte tese (Tema 308): “A Constituição de 1988 comina de nulidade as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público (CF, art. 37, § 2º), não gerando, essas contratações, quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos empregados contratados, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS”. Em sede de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal decidiu, nos autos do RE 765.320-MG, julgado em 22.09.2016, sobre o direito ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS aos contratados emergencialmente quando desvirtuada a natureza excepcional e precária da contratação, prevista no art. 37, IX, da CF/88, em decorrência de sucessivas prorrogações: ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO CONTRATADO POR TEMPO DETERMINADO PARA ATENDIMENTO DE NECESSIDADE TEMPORÁRIA DE EXCEPCIONAL INTERESSE PÚBLICO. REQUISITOS DE VALIDADE (RE 658.026, REL. MIN. DIAS TOFFOLI, DJE DE 31/10/2014, TEMA 612). DESCUMPRIMENTO. EFEITOS JURÍDICOS. DIREITO À PERCEPÇÃO DOS SALÁRIOS REFERENTES AO PERÍODO TRABALHADO E, NOS TERMOS DO ART. 19-A DA LEI 8.036/1990, AO LEVANTAMENTO DOS DEPÓSITOS EFETUADOS NO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO – FGTS. 1. Reafirma-se, para fins de repercussão geral, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público realizada em desconformidade com os preceitos do art. 37, IX, da Constituição Federal não gera quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos servidores contratados, com exceção do direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/1990, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. 2. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, com o reconhecimento da repercussão geral do tema e a reafirmação da jurisprudência sobre a matéria. (RE 765320 RG, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, julgado em 15/09/2016, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-203 DIVULG 22-09-2016 PUBLIC 23-09-2016) Sobre o assunto corrobora a jurisprudência: RECURSO INOMINADO. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO C/C PAGAMENTO DAS FÉRIAS E INDENIZAÇÃO (FGTS). CONTRATO TEMPORÁRIO NECESSIDADE EXCEPCIONAL DO INTERESSE PÚBLICO. RENOVAÇÕES SUCESSIVAS. VIOLAÇÃO DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ART. 37, § 2º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DESCARACTERIZAÇÃO DO CONTRATO TEMPORÁRIO. NULIDADE DA CONTRATAÇÃO. DIREITO AO DEPÓSITO DO FUNDO DE GARANTIA (FGTS). ART. 19-A DA LEI Nº 8.036/90. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. INSURGÊNCIA DA RECLAMANTE. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Recurso inominado. Sentença de improcedência que não reconheceu a sucessividade da contratação temporária, reconhecendo ainda a prescrição quinquenal dos pedidos. 2. Pretensão recursal do Promovente, pela reforma para declarar procedentes os pedidos com imediata liberação do FGTS e férias +1/3. 3. É pacífico o entendimento jurisprudencial acerca do reconhecimento do direito do trabalhador aos depósitos do FGTS relativos ao período laborado, nos casos em que há vício na contratação por tempo determinado (STF RE 765.320/MG, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PLENO, DJe de 22/09/2016 e STJ, AgInt no REsp 1.657.345/MG, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 21/06/2017). 4. No caso em comento, a Recorrente laborou como Professora, no período compreendido de 04/2017 a 12/2021, de modo que houveram renovações sucessivas do contrato de trabalho temporário, o que descaracteriza a finalidade estabelecida pela Carta Magna para os contratos por tempo determinado, tornando tais contratos nulos. 5. Diante da violação ao caráter excepcional do aludido contrato, em razão as renovações sucessivas, resta configurado a nulidade da contratação, portanto a parte Autora faz jus ao recebimento do depósito do Fundo de Garantia (FGTS) e férias constitucionais +1/3. 6. A sentença que julgou improcedente a pretensão inicial, merece ser reformada. 7. Recurso conhecido e provido. (N.U 1002118-66.2022.8.11.0037, TURMA RECURSAL CÍVEL, LUIS APARECIDO BORTOLUSSI JUNIOR, Turma Recursal Única/MT, Julgado em 30/03/2023, Publicado no DJE 31/03/2023) No que diz respeito à base de cálculo do FGTS, a incidência é sobre a totalidade da remuneração paga ou devida ao trabalhador, ou seja, a própria remuneração bruta, ficando excluídas da referida base de cálculo as verbas dispostas no art. 28, § 9º da Lei nº 8.212/91, em razão do que preconiza o § 6º do art. 15, da Lei nº 8.036/90. Esse é o entendimento do c. STJ, conforme disposto na Súmula n. 646: É irrelevante a natureza da verba trabalhista para fins de incidência da contribuição ao FGTS, visto que apenas as verbas elencadas em lei (artigo 28, parágrafo 9º, da Lei 8.212/1991), em rol taxativo, estão excluídas da sua base de cálculo, por força do disposto no artigo 15, parágrafo 6º, da Lei 8.036/1990. Neste diapasão, impõe-se a condenação do ente requerido ao pagamento das verbas pleiteadas, respeitada eventual prescrição quinquenal contada da propositura da ação. Por derradeiro, no tocante aos juros de mora e a correção monetária, deve ser observado o entendimento do STF, que no julgamento da questão de ordem da ADI 4.357 decidiu modular os efeitos da decisão, fixando o seguinte entendimento: “Confere-se eficácia prospectiva à declaração de inconstitucionalidade dos seguintes aspectos da ADI, fixando como marco inicial a data de conclusão do julgamento da presente questão de ordem (25.03.2015) e mantendo-se válidos os precatórios expedidos ou pagos até esta data, a saber: (i) fica mantida a aplicação do índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança (TR), nos termos da Emenda Constitucional nº 62/2009, até 25.03.2015, data após a qual (a) os créditos em precatórios deverão ser corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) e (b) os precatórios tributários deverão observar os mesmos critérios pelos quais a Fazenda Pública corrige seus créditos tributários; e (ii) ficam resguardados os precatórios expedidos, no âmbito da administração pública federal, com base nos arts. 27 das Leis nº 12.919/13 e nº 13.080/15, que fixam o IPCA-E como índice de correção monetária.” Todavia, registre-se que a partir da entrada em vigor da Emenda Constitucional n. 113, de 08/12/2021, ambos os consectários (juros de mora e correção monetária) devem observar a taxa Selic, a qual incidirá uma única vez até o efetivo pagamento, conforme disposto no artigo 3º, in verbis: “Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.” Assim tem posicionado os Tribunais: ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE COBRANÇA. MOTORISTA. HORAS EXTRAS. TRABALHO EM REGIME EXTRAORDINÁRIO. ESTATUTO DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO MUNICÍPIO DE JUIZ DE FORA. LIMITE MENSAL DE HORAS EXTRAS. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE PARCIALMENTE PROCEDENTE. CONSECATÁRIOS LEGAIS. SENTENÇA PARCIALMENTE ALTERADA. - Regularmente comprovado o trabalho em horas extras, mantém-se a sentença que julgou procedente o pedido e, corretamente, relegou à fase de liquidação de sentença a apuração do valor exato das horas devidas. - Uma vez que o Órgão Especial não declarou a inconstitucionalidade do dispositivo que prevê a limitação de 50 horas-extras por mês, apurando-se em algum mês que o autor excedeu o limite, a quantia excedente não poderá ser paga. - O Plenário do Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do RE nº 870.947/RG, sem modulação de efeitos, e definiu que o IPCA-E é o índice adequado para a atualização de débitos judiciais da Fazenda Pública e deve ser aplicado a partir da entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009. E a partir de 09.12.2021, ambos os consectários devem ser pela taxa SELIC, nos termos do art. 3º da EC n. 113/2021. (TJMG - Apelação Cível 1.0145.15.003804-3/001, Relator(a): Des.(a) Roberto Apolinário de Castro (JD Convocado) , 1ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 09/08/2022, publicação da súmula em 09/08/2022) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM REMESSA NECESSÁRIA – – AÇÃO DE COBRANÇA DE DIFERENÇAS SALARIAS – ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DE MATO GROSSO – PRESCRIÇÃO DO FUNDO DO DIREITO – PRELIMINARES REJEITADAS - PROFESSORA ESTADUAL APOSENTADA - ALTERAÇÃO DA CARGA HORÁRIA DE 20HS PARA 30HS - PRINCÍPIO DA PARIDADE – PROCESSO ADMINISTRATIVO QUE RECONHECEU O DIREITO – rediscussão das questões decididas - A PARTIR DA ENTRADA EM VIGOR DA EC N. 113, DE 08/12/2021, APLICA-SE APENAS A TAXA SELIC, TANTO PARA FINS DE JUROS MORATÓRIOS, QUANTO PARA ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA, A QUAL INCIDIRÁ UMA ÚNICA VEZ ATÉ O EFETIVO PAGAMENTO - OMISSÃO RECONHECIDA - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS E ACOLHIDOS PARCILAMENTE COM EFEITOS INFRINGENTES. 1. O Mato Grosso Previdência - MTPREV é uma autarquia dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, a entidade não possui a mesma autonomia no tocante a sua atuação jurídica, estando totalmente vinculada ao Estado, conforme dispõe o artigo 51 da Lei Complementar nº 560/2014. O Estado de Mato Grosso possui atuação direta nos processos administrativos de aposentadoria, de modo que é parte legítima para responder em juízo. 2. Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a fazenda pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior a propositura da ação. 3. Deve ser observado o princípio da paridade, com fundamento na Emenda Constitucional Estadual n. 12, tendo em vista que a servidora se aposentou antes da Emenda Constitucional n. 41/2003, consoante previsto no art. 7º desta Emenda e no art. 40, §8º, da Constituição da República, com a redação dada pela EC n. 20/1998 e revogada pela EC n. 41/2003. (TJMT, N.U 1006824-22.2018.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 27/06/2022, Publicado no DJE 05/07/2022) Conclui-se, portanto, que o valor devido será corrigido monetariamente pelo IPCA-E e com incidência de juros de mora consoante a remuneração oficial da caderneta de poupança, nos termos do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/1997 (redação dada pela Lei nº 11.960/2009), até a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 113/2021, quando então incidirá, uma única vez, até o efetivo pagamento, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente (art. 3º, da EC nº 113/2021). III - DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pela autora em face do requerido, com fulcro no art. 487, I, do CPC, para: a) DECLARAR a nulidade dos contratos celebrados entre as partes referentes ao período entre período novembro/2021 e julho/2024; b) CONDENAR o requerido Estado de Mato Grosso a pagar à parte autora as férias de 45 dias, acrescidas de 1/3 constitucional sobre o período compreendido entre novembro/2021 a julho/2024, descontados os valores já recebidos, que deverá ser atualizado com correção monetária com base no IPCA-E a partir da data de constituição de cada crédito (vencimento) até a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 113/2021 (08/12/2021), quando então ambos os consectários (juros de mora e correção monetária) incidirão, uma única vez, até o efetivo pagamento, pelo índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente (art. 3º, da EC nº 113/2021); b) CONDENAR o requerido Estado de Mato Grosso a pagar à parte autora o FGTS relativo ao período laborado de novembro/2021 a julho/2024, respeitada a prescrição quinquenal contada da propositura da ação, que deverá ser atualizado com correção monetária com base no IPCA-E a partir da data de constituição de cada crédito até a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 113/2021 (08/12/2021), quando então ambos os consectários (juros de mora e correção monetária) incidirão, uma única vez, até o efetivo pagamento, pelo índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente (art. 3º, da EC nº 113/2021). c) CONDENAR o requerido Estado de Mato Grosso a pagar à parte autora 13º salário sobre o período compreendido entre novembro/2021 a julho/2024, descontados os valores já recebidos, que deverá ser atualizado com correção monetária com base no IPCA-E a partir da data de constituição de cada crédito (vencimento) até a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 113/2021 (08/12/2021), quando então ambos os consectários (juros de mora e correção monetária) incidirão, uma única vez, até o efetivo pagamento, pelo índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente (art. 3º, da EC nº 113/2021). Por derradeiro, fixo que os valores da condenação devem observar o teto legal do Juizado da Fazenda Pública previsto no artigo 2º da Lei n. 12.153/2009. Sem custas processuais e honorários advocatícios, conforme previsto nos artigos 54 e 55 da Lei nº. 9.099/95. Intimem-se. Transitado em julgado e se nada for requerido, remetam-se os autos ao arquivo, com as cautelas e anotações necessárias. Cumpra-se, expedindo-se o necessário. Alta Floresta/MT, (data lançada no sistema). MILENA RAMOS DE LIMA E S. PARO Juíza de Direito

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Lara Beatriz Cardoso Dos Santos x Echer Empreendimentos Ltda - Epp

ID: 308063918

Tribunal: TJMT Órgão: 11ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1029943-36.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 26/06/2025

Polo Ativo:

LARA BEATRIZ CARDOSO DOS SANTOS

Polo Passivo:

ECHER EMPREENDIMENTOS LTDA - EPP

Sentença

Advogados:

STEPHANY QUINTANILHA DA SILVA

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LUZIA ANGELICA DE ARRUDA GONCALVES REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO LUZIA ANGELICA DE ARRUDA GONCALVES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 11ª Vara Cível Comarca da Capital GABINETE Autos nº 1029943-36.2023.8.11.0041 Vistos, etc. Trata-se de ação de rescisão contratual e de restituição de valores p… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 11ª Vara Cível Comarca da Capital GABINETE Autos nº 1029943-36.2023.8.11.0041 Vistos, etc. Trata-se de ação de rescisão contratual e de restituição de valores pagos c/c danos materiais e morais ajuizada por Lara Beatriz Cardoso dos Santos em face de Echer Empreendimentos Ltda., todos devidamente qualificados nos autos, por meio da qual busca a rescisão do contrato de compra e venda de imóvel, a restituição integral dos valores pagos, a condenação da requerida à multa contratual invertida e indenização por danos morais. A autora alega que é promissária compradora de uma casa no condomínio denominado Viva Esmeralda, mediante contrato de compra e venda celebrado em 29.07.2021, no valor de R$ 194.904,19 (cento e noventa e quatro mil, novecentos e quatro reais e dezenove centavos). Aduz que a preposta da requerida informou que o prazo para a entrega das chaves seria em setembro de 2022, mas que o contrato não possui prazo certo, condicionando a entrega das chaves à assinatura de um segundo contrato, o que considera uma desvantagem excessiva para o consumidor. Sustenta que não foi chamada para assinar a documentação com a Caixa Econômica Federal, e que a obra não está regularizada junto à prefeitura, o que impediu o financiamento para todos os clientes. Pontua que a partir de setembro de 2022, o prazo de entrega foi sucessivamente adiado para 2023, 2024 e, conforme áudios anexos, para 2025, e que a obra se encontra parada. Afirma que, diante de todo o cenário de incertezas, decidiu rescindir o contrato de compra e venda, mas a requerida se negou a devolver os valores pagos integralmente, propondo um distrato com deduções abusivas. Requer, liminarmente, a suspensão das cobranças das parcelas atreladas ao saldo devedor do contrato de compra e venda e que a parte requerida se abstenha de incluir o nome da autora nos órgãos de proteção ao crédito, sob pena de multa diária. Preliminarmente, pleiteia o deferimento da justiça gratuita e o reconhecimento da aplicação da legislação consumerista com a inversão do ônus da prova. Ao final, pugna pelo reconhecimento do atraso na entrega do imóvel, a resolução (rescisão) do contrato com a condenação à restituição de 100% (cem por cento) dos valores adimplidos, a condenação da requerida à multa contratual invertida no valor de R$ 12.829,26 (doze mil, oitocentos e vinte e nove reais e vinte e seis centavos) ou, subsidiariamente, ao pagamento de lucros cessantes a serem liquidados, e a condenação ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), além das custas processuais e honorários advocatícios. Atribuiu à causa o valor de R$ 58.487,78 (cinquenta e oito mil quatrocentos e oitenta e sete reais e setenta e oito centavos). Instruiu a inicial com os documentos de id. 125698395 a id. 125700231. Conforme decisão de id. 129281000, fora deferida a justiça gratuita e deferido o pedido de tutela provisória de urgência para determinar que “a parte requerida se abstenha de realizar qualquer tipo de cobrança, judicial ou extrajudicial, a respeito do contrato em discussão nos autos, bem como para que se abstenha de incluir o nome da parte autora nos cadastros de proteção ao crédito em razão dos fatos aqui discutidos, sob pena de aplicação das medidas necessárias para a efetivação da tutela, conforme art. art. 297, do Código de Processo Civil”, sendo designada audiência de conciliação e determinada a citação da requerida. Realizada audiência de conciliação, que restou inexitosa, conforme termo de id. 136145170. A parte requerida apresentou contestação no id. 139562066, arguindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, sob a alegação de que o contrato de promessa de compra e venda foi firmado com a empresa Pedra 90 Echer Incorporações SPE Ltda., e não com a Echer Empreendimentos Ltda., pleiteando a extinção do processo sem resolução do mérito ou a substituição processual. Também preliminarmente, aduz a não inversão do ônus da prova, sustentando que os fatos alegados pela autora não são verossímeis e que cabe à autora o ônus da prova dos fatos constitutivos de seu direito. No mérito, alega que o prazo para conclusão da obra do Módulo I do empreendimento Viva Esmeralda está previsto para dezembro de 2024, e não para setembro de 2022, como alegado pela autora. Sustenta que a alegação da autora de que a obra estaria irregular junto à prefeitura e impossibilitando o financiamento é fantasiosa e sem fundamento. Informa que a obra não está parada ou em atraso, detalhando o percentual de execução de diversas etapas, como locação topográfica, limpeza do terreno, terraplanagem, redes de drenagem, esgoto e alimentação d'água, pavimentação asfáltica e depósito de lixo. Assevera a irrevogabilidade do contrato firmado entre as partes, conforme a Cláusula 15 do contrato, e que a rescisão pleiteada é imotivada, sem justificativa plausível. Defende a legalidade da cláusula penal e a restituição dos valores conforme disposto na cláusula 8.2 do contrato e na "Lei de Distrato" (Lei 13.786/18), que prevê a multa de 50% do valor pago em caso de empreendimento sob regime de afetação, além da integralidade da comissão de corretagem. Alega ainda, a inaplicabilidade da inversão da cláusula penal em favor da autora, uma vez que não houve descumprimento contratual por parte da requerida, visto que o prazo de conclusão das obras não foi extrapolado. Em caso de eventual condenação, requer que os juros de mora sejam contados a partir do trânsito em julgado da decisão, e não do desembolso, conforme jurisprudência do STJ. Impugna o pedido de danos morais, alegando a ausência dos requisitos para sua configuração e que a autora não comprovou qualquer dano experimentado. Pugna pela improcedência da demanda. Com a peça de defesa, juntou os documentos id. id. 139562076 a id. 139563065. A parte autora apresentou impugnação à contestação no id. 157452856. Na decisão saneadora de id. 177907738, fora rejeitada a preliminar de ilegitimidade passiva invocada na peça de defesa, sendo fixado como ponto controvertido a ilicitude na conduta da parte requerida, a rescisão do negócio jurídico, o inadimplemento contratual, o atraso na entrega do empreendimento, os valores pagos e o direito à retenção dos valores, a falha na prestação dos serviços, comprovando-se a imprudência, negligência e imperícia, a existência de dano, sua extensão e o nexo causal”, determinando-se a intimação das partes para especificarem as provas que pretendem produzir. Manifestação da requerida no id. 178448723, pugnando pelo julgamento antecipado do mérito, enquanto a parte autora quedou-se silente. É o relatório. Fundamento. DECIDO. Trata-se de ação de rescisão contratual e de restituição de valores pagos c/c danos materiais e morais ajuizada por Lara Beatriz Cardoso dos Santos em face de Echer Empreendimentos Ltda., todos devidamente qualificados nos autos, por meio da qual busca a rescisão do contrato de compra e venda de imóvel, a restituição integral dos valores pagos, a condenação da requerida à multa contratual invertida e indenização por danos morais. Profiro o julgamento antecipado da lide (artigo 355, I, do Código de Processo Civil), porque a matéria prescinde de outras provas, sendo suficientes para o deslinde da causa as provas documentais contidas nos autos, que permitem a formação do convencimento do juiz, conforme regra do artigo 370, do CPC. Além disso, a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela requerida na contestação foi rejeitada na decisão saneadora de id. 177907738, cujo decisum não adveio qualquer recurso. Passo, então, a decidir a causa. A controvérsia posta em juízo cinge-se à existência de inadimplemento contratual, supostamente praticado pela requerida, no contexto de promessa de compra e venda de imóvel firmado com a autora em 29.07.2021, no valor de R$ 194.904,19 (cento e noventa e quatro mil novecentos e quatro reais e dezenove centavos), relacionado a unidade no empreendimento denominado “Viva Esmeralda”, cuja entrega foi inicialmente informada, de maneira extracontratual, para o mês de setembro de 2022. Assim, a questão jurídica central da demanda consiste em aferir se houve, de fato, inadimplemento substancial por parte da requerida, a ensejar a resolução do contrato de promessa de compra e venda por culpa exclusiva desta, com consequente dever de restituição integral dos valores pagos pela autora, aplicação de cláusula penal invertida e reparação extrapatrimonial. Pois bem. De pronto, verifica-se que a relação jurídica entre as partes configura relação de consumo, nos termos dos artigos 2º e 3º, ambos do CDC, pois a autora, na condição de consumidor, é destinatário final do bem adquirido. Assim, é cediço que o pacto em questão está submetido a legislação consumerista, consoante entendimento do c. STJ, verbis: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SÚMULA Nº 83/STJ. 1. O Código de Defesa do Consumidor atinge os contratos de compra e venda nos quais a incorporadora se obriga a construir unidades imobiliárias mediante financiamento. Acórdão em harmonia com a jurisprudência deste Superior Tribunal. Precedentes. Incidência da Súmula nº 83/STJ. 2. Agravo regimental não provido.” (AgRg no AREsp nº 120.905/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 06.05.2014 – negritei). À vista disso, o caso em tela deve ser analisado à luz do Código de Defesa do Consumidor, que permite a interpretação das cláusulas contratuais, afastando-as quando se verificarem abusivas. In casu, as partes firmaram Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda de Imóvel para Entrega Futura, tendo por objeto unidade residencial situada no empreendimento denominado Viva Esmeralda, localizado na cidade de Cuiabá/MT, conforme documento de id. 125698431. O pacto foi celebrado em 29.07.2021, com previsão contratual genérica quanto ao prazo de entrega do imóvel, sendo assinalado, na cláusula 9.2 que “Fica ajustado que as obras do imóvel objeto do presente instrumento contratual deverão estar concluídas, e o objeto do presente contrato entregue, até o último dia do 24º (vigésimo quarto) mês após a assinatura do Contrato de Financiamento, junto a Instituição bancária, mesmo que no contrato com a instituição financeira constar prazo diferente do acima pactuado”. Além disso, também consta na cláusula 9.3 do aludido pacto que “A entrega dos documentos comprobatórios da conclusão da obra será efetuada no prazo estabelecido supra, SENDO ADMITIDA PELAS PARTES UMA TOLERÂNCIA DE 180 DIAS CORRIDOS, contados da data em que expiraria o prazo estabelecido, independentemente de justificativa e sem que incida sobre a Vendedora qualquer penalidade, sanção, multa ou dever de indenizar”. Constata-se, portanto, que o contrato se omite quanto à estipulação clara e objetiva de prazo para a conclusão da obra e a entrega do bem, delegando essa definição à assinatura de um segundo contrato com a instituição financeira responsável pelo financiamento, que jamais foi formalizado, pois a autora sequer foi convocada para tanto, em razão da falta de regularização da obra perante o Município, conforme amplamente alegado e não refutado de forma comprovada pela requerida. Na verdade, consta dos autos que houve promessa verbal e/ou informada por prepostos da requerida no sentido de que a entrega das chaves se daria em setembro de 2022 (id. 125700229). Contudo, a entrega foi sucessivamente postergada, como reconhecido pela própria autora, passando por prazos fictícios em 2023, 2024 e, por fim, 2025, sem qualquer concretude ou segurança. Tal conduta representa evidente violação ao princípio da boa-fé objetiva (artigo 422 do Código Civil), que exige condutas leais, cooperativas e transparentes entre as partes, e configura cláusula abusiva a estipulação contratual que deixa a entrega da unidade habitacional a critério unilateral do fornecedor, prática vedada pelo artigo 51, incisos I e IV, do CDC. Não obstante, embora a requerida afirme na contestação que o prazo de entrega da obra seria dezembro de 2024, não comprova a existência dessa previsão no pacto assinado, nem junta cronograma atualizado ou documento técnico que permita verificar o estágio real de execução da obra, limitando-se a apresentar relatório genérico (id. 139563061) que se mostra incompatível com os vídeos e imagens recentes acostados aos autos (id. 157452858 e id. 157452860), os quais retratam a completa paralisação do empreendimento. Com a devida vênia, não há cláusula contratual válida que autorize a requerida a postergar indefinidamente a entrega do imóvel, tampouco se verifica nos autos fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora que justifique a mora ou a suspensão da obrigação principal. Dessa forma, a ausência de estipulação contratual clara e objetiva sobre o prazo de entrega, associada à conduta omissiva e ineficiente da requerida, configura inadimplemento substancial, suficiente para ensejar a resolução do contrato e seus consectários legais. Não é demais registrar, que não se desconhece que a construção civil envolve diversas variáveis, tais como materiais, mão-de-obra, inadimplência, entre outros, sendo razoável a prorrogação do prazo de entrega de 180 (cento e oitenta) dias, tendo em vista a dificuldade na definição exata do término da obra, mormente no caso vertente que envolve inúmeras unidades autônomas. Entretanto, não se pode admitir a prorrogação de 180 (cento e oitenta) dias na espécie, uma vez que não houve a fixação de um prazo certo e determinado, mas sim, de uma verdadeira armadilha ao consumidor, com a finalidade de prorrogação do prazo de entrega de forma indefinida e ao interesse da requerida. Além disso, o art. 374, inc. I, do CPC, é suficientemente claro ao dispor que os fatos notórios independem de prova. Nesta esteira, o atraso na entrega das obras de infraestrutura afigura-se ilícita, uma vez que totalmente desproporcional a eventuais atrasos. A propósito: “CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. CONSTRUTORA. ATRASO NA ENTREGA DE UNIDADE IMOBILIÁRIA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 282/STF. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE. LUCROS CESSANTES. PRESUNÇÃO. CABIMENTO. [...] 6. A inexecução do contrato pelo promitente-vendedor, que não entrega o imóvel na data estipulada, causa, além do dano emergente, figurado nos valores das parcelas pagas pelo promitente-comprador, lucros cessantes a título de alugueres que poderia o imóvel ter rendido se tivesse sido entregue na data contratada. Trata-se de situação que, vinda da experiência comum, não necessita de prova (art. 335 do CPC/73). Precedentes. 7. Recurso especial parcialmente conhecido, e nessa parte, provido.” (STJ, REsp nº 1.633.274/SP, 3ª Turma, Rela. Min. Nancy Andrighi, j. 08.11.2016 – negritei). “RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE ILEGALIDADE DE COBRANÇA C/C IDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO – CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – TAXA DE EVOLUÇÃO DA OBRA – DEVOLUÇÃO DO VALOR PAGO PELOS JUROS DA OBRA APÓS A ENTREGA DAS CHAVES – DESPROVIDO. É devida à reparação pelo dano material, decorrente do pagamento taxa de evolução da obra, atinente ao período posterior a entrega das chaves do imóvel.” (TJMT, RAC nº 1019930-46.2021.8.11.0041, 3ª Câm. Dir. Priv., minha relatoria, j. 09.08.2023 – negritei e grifei). Nesse passo, acerca da devolução de valores nos contratos de compra e venda, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula n. 543, que prevê, verbis: “Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento” (negritei e grifei). Logo, restando evidente que, no caso específico dos autos, a rescisão do contrato de compra e venda de imóvel firmado entre as partes não se deu por decisão imotivada da compradora, deve ser reconhecida a inadimplência da requerida, bem como a possibilidade de rescisão contratual, na forma do art. 475, do Código Civil, com a devolução integral dos valores pagos pela autora, acrescido dos consectários legais, com exceção da taxa de corretagem. Outro não é o entendimento do e. TJMT: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL COM RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS COM DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULAS COM INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – PRELIMINARES – PEDIDO DE CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA EM SEDE DE CONTRARRAZÕES – PRECLUSÃO – ANÁLISE DO PEDIDO PREJUDICADA – DIALETICIDADE RECURSAL REJEITADA – MÉRITO –CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – RESOLUÇÃO POR CULPA DA PROMITENTE VENDEDORA – VENDA DE LOTEAMENTO COM EMBARAÇO JUDICIAL – VENDEDORA QUE SE COMPROMETEU CONTRATUALMENTE A ENTREGAR UM IMÓVEL LIVRE E DESEMBARAÇADO DE QUAISQUER ÔNUS – MOTIVO JUSTO PARA A RESCISÃO – RESTITUIÇÃO DA INTEGRALIDADE DOS VALORES AO PROMITENTE COMPRADOR – SÚMULA 543 STJ – [...] – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...] Demonstrado que a rescisão do contrato de compra e venda foi motivada por irregularidades no empreendimento, consistente no embaraço judicial, e tendo o promitente vendedor se comprometido a entregar um imóvel livre e desembaraçado de quaisquer ônus, configurado está o descumprimento contratual pelo promitente vendedor. Precedentes. Ocorrendo a resilição contratual por culpa da promitente vendedora, a restituição dos valores pagos deve se dar de forma integral e imediatamente, conforme entendimento insculpido na Súmula 543 do STJ. [...].” (RAC nº 1001637-91.2022.8.11.0041, Rela. Desa. Antônia Siqueira Gonçalves, j. 14.08.2024 – negritei e grifei). Todavia, especificamente quanto à devolução do valor pago pela autora a título de comissão corretagem, tenho que a razão não lhe acompanha. Explica-se. Na verdade, destaco que há previsão expressa no pacto firmado entre os litigantes, acerca do pagamento da taxa de corretagem pela compradora. Vale citar as teses firmadas no STJ, no tema 938, relacionado aos precedentes suscitados da reclamação, verbis: “(ii) Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem; (vide REsp n. 1.599.511/SP). (ii, parte final) Abusividade da cobrança pelo promitente-vendedor do serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI), ou atividade congênere, vinculado à celebração de promessa de compra e venda de imóvel. (vide REsp n. 1.599.511/SP)”. (negritei). Assim, para que a comissão seja imputada a compradora-consumidora é imprescindível o ajuste ou a disposição contratual expressa a respeito, com destaque ao valor da comissão de forma clara e incontestável, mencionando que a comissão será imputada mesma, “sob pena de vigorar a regra geral, que reserva ao vendedor a imputação da comissão”. Nota-se também nos precedentes a necessidade de informação do preço total da aquisição com destaque no valor da comissão, o que também ocorreu na espécie, tendo em vista o quanto disposto na cláusula 5.1: “Das parcelas pagas, o montante integralizado em até 5% (cinco por cento) do valor do imóvel serão referentes à comissão de corretagem, a qual será paga em duas parcelas, sendo a primeira após a assinatura deste instrumento, e a segunda após a assinatura do contrato de financiamento, de acordo com a Política de Comissões da Vendedora.” Ora, o contrato de corretagem é disciplinado nos artigos 722 a 729, ambos do Código Civil, sendo a remuneração do corretor objeto dos artigos 724 a 728, e dentre eles, destaco o art. 725: “A remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude de arrependimento das partes”. Comentando esse dispositivo, Gustavo Tepedino ensina que “a doutrina identifica três condições para que o corretor tenha direito à remuneração: (I) relação contratual entre o corretor e uma das partes (ou as duas partes) interessadas, (II) conclusão do negócio mediado, e (III) contribuição do corretor, com sua atividade, para a conclusão do negócio mediado.” (Comentários ao Novo Código Civil. Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2008. Volume X, p. 420) Assim, após a entrada em vigor do Código Civil de 2002, a disposição contida em seu art. 725, segunda parte, dá novos contornos à discussão, visto que, nas hipóteses de arrependimento das partes, a comissão por corretagem permanece devida. Desse modo, a orientação do c. STJ mudou o seu posicionamento e passou a adotar o entendimento de que a obrigação do corretor é de meio (limitando-se ao trabalho de aproximação das partes contratantes) e não de resultado: “DIREITO CIVIL. COMISSÃO DE CORRETAGEM. VENDA DE IMÓVEL. DESISTÊNCIA DA PARTE APÓS A ASSINATURA DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. COMISSÃO DEVIDA. 1. É devida a comissão de corretagem por intermediação imobiliária se os trabalhos de aproximação realizados pelo corretor resultarem, efetivamente, no consenso das partes quanto aos elementos essenciais do negócio.” (AgRg no AREsp nº 465043/SP, 3ª Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 08.05.2014 – negritei). Assim, o c. STJ firmou o entendimento de que o “resultado útil” se concretiza na formalização do contrato entre as partes interessadas (documento válido a corroborar o negócio jurídico), ainda que ocorra eventual rescisão posterior por inadimplemento de uma das partes (não por culpa da corretora), confira: “CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CORRETAGEM. COMISSÃO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. DESISTÊNCIA DO COMPRADOR APÓS ASSINATURA DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA E PAGAMENTO DE SINAL. COMISSÃO DEVIDA. 1. Discute-se se é devida a comissão de corretagem quando, após a assinatura da promessa de compra e venda e o pagamento de sinal, o negócio não se concretiza em razão do inadimplemento do comprador. 2. No regime anterior ao do CC/02, a jurisprudência do STJ se consolidou em reputar de resultado a obrigação assumida pelos corretores, de modo que a não concretização do negócio jurídico iniciado com sua participação não lhe dá direito a remuneração. 3. Após o CC/02, a disposição contida em seu art. 725, segunda parte, dá novos contornos à discussão, visto que, nas hipóteses de arrependimento das partes, a comissão por corretagem permanece devida. 4. Pelo novo regime, deve-se refletir sobre o que pode ser considerado resultado útil, a partir do trabalho de mediação do corretor [...]”. (REsp nº 1.339.642/RJ, 3ª Turma, Rela. Min. Nancy Andrighi, j. 12.03.2013 – negritei). “PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. RECURSO ESPECIAL. COMISSÃO DE CORRETAGEM. NEGÓCIO IMOBILIÁRIO. CELEBRAÇÃO DE CONTRATO DE CESSÃO E TRANSFERÊNCIA DE IMÓVEL. PAGAMENTO DE SINAL. POSTERIOR ARREPENDIMENTO DO COMPRADOR. RESCISÃO DO CONTRATO. AUSÊNCIA DE CULPA DA CORRETORA. COMISSÃO DEVIDA. RECURSO NÃO-PROVIDO [...] 5. No caso em exame, conforme salientado pelas instâncias ordinárias, houve uma fase preliminar de negociações, seguida de uma fase intermediária de celebração do contrato de cessão e transferência dos direitos e obrigações constantes de promessa de compra e venda, com o pagamento do valor de R$ 62.000,00 a título de sinal, sendo certo que essas duas etapas foram intermediadas pela corretora de imóveis. Com a celebração desse contrato encerrou-se o ofício da corretora, a qual deu por concretizada a venda, recebendo, naquela data, o cheque pós-datado referente à comissão de corretagem. A partir daí, o ora recorrente munido do contrato, providenciou, como lhe competia, o financiamento do restante do valor do imóvel junto a uma instituição financeira. Contudo, durante o trâmite do processo de financiamento imobiliário, o contratante discordou do valor das prestações a serem pagas, rescindindo o contrato e sustando o cheque em apreço. 6. Se havia documento válido a corroborar o negócio jurídico - suficiente para a exigência do registro imobiliário -, não obstante seu posterior desfazimento, é salutar reconhecer que a corretora alcançou o "resultado útil" da avença [...]”. (REsp nº 1.228.180/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 17.03.2011 – negritei). Diante desse cenário fático e processual, entendo que a rescisão contratual ocorreu por causa estranha à atividade da empresa corretora, tendo ela agido de boa-fé, já que prestou todas informações de que detinha conhecimento acerca do imóvel, ocorrendo a rescisão do contrato posteriormente, ante o desacerto comercial entre a autora e a empresa construtora, ante o atraso na entrega do empreendimento. Sendo assim, não há que se falar no ressarcimento da taxa de corretagem à autora. Desse modo, ressalta-se que o valor pago pela autora à requerida deverá ser restituído integralmente, após abatimento de 5% (cinco por cento) da taxa de corretagem. Avançando na elucidação da celeuma, o art. 884, do Código Civil veda o enriquecimento sem causa, obrigando a parte inadimplente a restituir o que foi recebido indevidamente, mormente em razão de a autora ter comprovado, documentalmente (id. 125698429), que efetuou pagamentos no valor de R$ 24.375,60 (vinte e cinco mil, trezentos e setenta e cinco reais e sessenta centavos), já descontado a taxa de corretagem de 5% (cinco por cento). Destarte, sendo a requerida quem deu causa à rescisão do contrato, a cláusula penal ajustada na avença firmada entre as partes (cláusula oitava), deverá ser revertida em favor da autora, nos termos do entendimento firmado pelo c. STJ ao julgar o REsp nº 1.614.721/DF e REsp nº 1.631.485/DF sob o rito dos recursos repetitivos, senão vejamos: “RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. ATRASO NA ENTREGA. NOVEL LEI N. 13.786/2018. CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES ANTERIORMENTE À SUA VIGÊNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. CONTRATO DE ADESÃO. OMISSÃO DE MULTA EM BENEFÍCIO DO ADERENTE. INADIMPLEMENTO DA INCORPORADORA. ARBITRAMENTO JUDICIAL DA INDENIZAÇÃO, TOMANDO-SE COMO PARÂMETRO OBJETIVO A MULTA ESTIPULADA EM PROVEITO DE APENAS UMA DAS PARTES, PARA MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL. 1. A tese a ser firmada, para efeito do art. 1.036 do CPC/2015, é a seguinte: No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigações heterogêneas (obrigações de fazer e de dar) serão convertidas em dinheiro, por arbitramento judicial. [...]” (2ª Seção, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 22.05.2019 – negritei). “RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. ATRASO NA ENTREGA. NOVEL LEI N. 13.786/2018. CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES ANTERIORMENTE À SUA VIGÊNCIA. NÃO INCIDÊNCIA. CONTRATO DE ADESÃO. OMISSÃO DE MULTA EM BENEFÍCIO DO ADERENTE. INADIMPLEMENTO DA INCORPORADORA. ARBITRAMENTO JUDICIAL DA INDENIZAÇÃO, TOMANDO-SE COMO PARÂMETRO OBJETIVO A MULTA ESTIPULADA EM PROVEITO DE APENAS UMA DAS PARTES, PARA MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL. 1. A tese a ser firmada, para efeito do art. 1.036 do CPC/2015, é a seguinte: No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigações heterogêneas (obrigações de fazer e de dar) serão convertidas em dinheiro, por arbitramento judicial. [...]” (2ª Seção, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 22.05.2019 – negritei). Sendo assim, no caso em voga, a cláusula 8ª (id. 125698431), prevê em favor da parte prejudicada uma multa de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor pago pelo comprador, em função do desfazimento do negócio, a título de cláusula penal, que deve ser estendida a adquirente. Nesse sentido: “RECURSOS DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL C/C RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PARCIAL PROCEDÊNCIA – ATRASO DE MAIS DE DOIS ANOS NA ENTREGA DO EMPREENDIMENTO – OBRA EMBARGADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO POR AUSÊNCIA DE PRÉVIA LICENÇA AMBIENTAL – RESOLUÇÃO POR DESCUMPRIMENTO DO CONTRATO POR PARTE DA LOTEADORA – RESTITUIÇÃO DOS VALORES DESEMBOLSADOS PELO COMPRADOR ACRESCIDOS DE MULTA – APLICABILIDADE DO RECURSO REPETITIVO TEMA 971 DO STJ – RESCISÃO POR CULPA DA ALIENANTE – JUROS DE MORA DESDE A CITAÇÃO – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO – RECURSO DO ADQUIRENTE PARCIALMENTE PROVIDO E RECURSO DA LOTEADORA RÉ PREJUDICADO. Se quando do ajuizamento da ação já havia transcorrido quase dois anos da data prevista para a entrega da unidade adquirida, plenamente legítimo o pedido de resolução do contrato, com o direito de restituição de todos os valores pagos até então pelos adquirentes, não sendo admissível a retenção de quaisquer valores pela loteadora, a título de cláusula penal porquanto, neste caso, não há se falar em desistência imotivada do negócio. Ao contrário, consoante o Tema 971 do STJ, sendo a causa da rescisão do negócio o descumprimento, pela loteadora, dos prazos previstos para a entrega do imóvel, fará o adquirente jus à percepção, a título de cláusula penal, da multa prevista exclusivamente em favor da alienante. [...] O atraso de quase dois anos sem a devida entrega do imóvel, que retarda a conquista do imóvel próprio, modificando os planos financeiros e pessoais, gera angústia e frustração ao consumidor adquirente, passível de indenização por dano moral.” (TJMT, RAC nº 1006475-36.2018.8.11.0003, 2ª Câm. Dir. Priv., Rela. Desa. Marilsen Andrade Addario, j. 02.09.2020 – negritei e grifei). Assim, a requerida deve pagar a autora 50% (cinquenta por cento) sobre o valor total pago pela mesma, como penalidade pelo descumprimento. Na verdade, trata-se do mesmo percentual cobrado pela requerida quando a autora manifestou o interesse na rescisão contratual. Quanto ao dano moral, a hipótese não se trata de mero descumprimento contratual, porque não se está diante da compra de um objeto útil ao lazer ou da realização de um anseio de consumo, mas, representa o rompimento do sonho da casa própria, alcançado, via de regra, com extremo sacrifício, cuja conduta extrapola a boa-fé contratual, portanto, cabível a indenização por danos morais. Digo isso porque, embora a jurisprudência do STJ caminhe no sentido de que, em caso de descumprimento contratual, o dano moral não é presumido, entendo que as especificidades do caso concreto evidenciam a configuração do prejuízo, dada a extensão do atraso imputável à requerida, que até o momento não comprovou a entrega do empreendimento. Destarte, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade da empresa requerida pelo dano sofrido pela autora. Reafirmo ainda, que o caso em tela não retrata uma mera frustração do cotidiano, mas, o descumprimento de uma obrigação que proporcionaria a autora a modificação de todo o seu planejamento financeiro e pessoal, sendo inegável a sua angústia e sofrimento. No mais, o dano moral atinge os atributos da personalidade humana, prejudica a paz espiritual, os sentimentos, a convivência social e, no mais, a saúde psíquica do ofendido, tudo claramente evidente no caso vertente. Nesse sentido caminha a jurisprudência do e. TJMT ao julgar casos semelhantes, vejamos: “AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO C/C DEVOLUÇÃO DE QUANTIA PAGA E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – OBRA EMBARGADA POR IRREGULARIDADES – RESCISÃO POR CULPA DA CONSTRUTORA – DEVOLUÇÃO INTEGRAL DAS QUANTIAS PAGAS – RETENÇÃO INDEVIDA – SÚMULA 543/STJ – CLÁUSULA PENAL DEVIDA – ATO ILÍCITO CONFIGURADO – DEVER DE INDENIZAR – SENTENÇA MANTIDA – RECURSOS DESPROVIDOS. Os contratos de compra e venda, com obrigação da construtora de construir unidades imobiliárias, estão submetidos à legislação consumerista. Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor. Inteligência da súmula 543 do STJ. Na hipótese em voga, a rescisão do contrato de compra e venda de lote firmado entre as partes, não se deu por decisão imotivada da compradora, não havendo que falar-se na aplicabilidade do entendimento firmado pelo c. STJ no REsp n. 1.740.911/DF. No caso, tendo a vendedora dado causa à rescisão contratual, ante a irregularidade na realização da infraestrutura do empreendimento, o comprador faz jus, além da devolução integral dos valores pagos, ao recebimento da multa, a título de cláusula penal, prevista exclusivamente em favor do alienante. Há que se reconhecer a responsabilidade da construtora pelo dano moral sofrido na espécie, em razão do descumprimento do negócio, que ultrapassou os limites do tolerável atingindo de forma exacerbada a personalidade do autor. O arbitramento do valor da indenização decorrente de dano moral deve ser feito de acordo com os aspectos do caso, sempre com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes.” (RAC nº 1027704-93.2022.8.11.0041, 3ª Câm. Dir. Priv., Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 28.06.2023 – negritei e grifei). “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS – COMPRA E VENDA DE LOTE RURAL – EMPREENDIMENTO EMBARGADO – DANO MORAL – CONFIGURAÇÃO – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. A hipótese não se trata de mero descumprimento contratual, mas sim de venda e comercialização de lotes em locais que sequer poderiam ser construídos, por se tratar de uma área embargada pelos órgãos do meio ambiente, cuja conduta extrapola a boa-fé contratual, portanto, cabível a indenização por danos morais.” (RAC nº 1030470-56.2021.8.11.0041, 4ª Câm. Dir. priv., Rela. Desa. Serly Marcondes Alves, j. 06.09.2023 – negritei e grifei). Por conseguinte, há de se concluir pela responsabilidade da requerida quanto ao dano sofrido pela autora em razão do erro cometido. Restando dessa forma caracterizado o dever de indenizar, passo ao arbitramento do quantum indenizatório que deve atender aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, a extensão do dano causado, de modo a atender sua dupla finalidade, qual seja, amenizar a dor da vítima e punir a conduta ilícita do ofensor. Sobre o tema, ensina José Raffaelli Santini: “Na verdade, inexistindo critérios previstos por lei a indenização deve ser entregue ao livre arbítrio do julgador que, evidentemente, ao apreciar o caso concreto submetido a exame fará a entrega da prestação jurisdicional de forma livre e consciente, à luz das provas que forem produzidas. Verificará as condições das partes, o nível social, o grau de escolaridade, o prejuízo sofrido pela vítima, a intensidade da culpa e os demais fatores concorrentes para a fixação do dano, haja vista que costumeiramente a regra do direito pode se revestir de flexibilidade para dar a cada um o que é seu. [...] O que prepondera, tanto na doutrina, como na jurisprudência, é o entendimento de que a fixação do dano moral deve ficar ao prudente arbítrio do juiz.” (Dano moral: doutrina, jurisprudência e prática, Agá Júris, 2000, p.45). Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação, observando os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito a vítima, ao mesmo tempo o valor deve ser significativo para que não passe despercebido coibindo a conduta negligente do agente. Não é demais ressaltar, que o valor indenizatório devido no dano moral tem dupla função: compensatória em relação ao dano sofrido e penalizadora pela conduta negligente do agente causador. Logo, considerando o grau de responsabilidade da empresa requerida frente ao dano causado e o abalo moral sofrido pela autora, fixo o valor da indenização em R$ 10.000,00 (dez mil reais), sendo este justo para reparar o dano extrapatrimonial sofrido. À luz de todo o exposto, conclui-se pela procedência da demanda, nos estritos limites em que se demonstrou a lesão jurídica. Deixo de enfrentar os demais argumentos deduzidos no processo, porque desnecessários para diminuir a autoridade desta sentença, conforme art. 489, §1º, IV do CPC, agindo, este Juízo, em obediência também ao comando Constitucional do art. 5º, LXXVIII. Posto isto, nos termos do art. 487, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na ação de rescisão contratual e de restituição de valores pagos c/c danos materiais e morais ajuizada por Lara Beatriz Cardoso dos Santos em face de Echer Empreendimentos Ltda., para: a) Confirmar a tutela provisória de urgência deferida no id. 129281000, tornando-a definitiva; b) Declarar rescindido o Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda celebrado em 29.07.2021, firmado entre as partes, referente à unidade no empreendimento denominado “Viva Esmeralda”, localizado na cidade de Cuiabá/MT, por culpa exclusiva da requerida; c) Condenar a requerida a restituir à autora a quantia de R$ 24.375,60 (vinte e quatro mil, trezentos e setenta e cinco reais e sessenta centavos), já descontado o valor correspondente à comissão de corretagem de 5% (cinco por cento), acrescido de juros e correção monetária pela Taxa Selic até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e Selic para juros, abatido desta o valor do IPCA, a contar da citação e de cada desembolso, respectivamente; d) Condenar a requerida ao pagamento de multa contratual compensatória em favor da autora, no valor correspondente a 50% (cinquenta por cento) sobre o montante pago, nos termos da cláusula oitava do contrato, o que importa no valor de R$ 12.187,80 (doze mil, cento e oitenta e sete reais e oitenta centavos), acrescido de juros e correção monetária pela Taxa Selic até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e Selic para juros, abatido desta o valor do IPCA, a contar da citação e da data da assinatura do contrato (29.07.2021), respectivamente; e) Condenar a requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), acrescido de juros e correção monetária pela Taxa Selic até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e Selic para juros, abatido desta o valor do IPCA, a partir da citação e do arbitramento, respectivamente; f) Condenar a requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil. Transitado em julgado, remetam-se os autos imediatamente ao arquivo, mediante as anotações necessárias. P. I. C. Olinda de Quadros Altomare Juíza de Direito

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