Processo nº 1008345-18.2024.8.11.0000
ID: 333915043
Tribunal: TJMT
Órgão: Seção de Direito Privado
Classe: RECLAMAçãO
Nº Processo: 1008345-18.2024.8.11.0000
Data de Disponibilização:
24/07/2025
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008345-18.2024.8.11.0000 Classe: RECLAMAÇÃO (12375) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material]…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008345-18.2024.8.11.0000 Classe: RECLAMAÇÃO (12375) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). JOSE ZUQUIM NOGUEIRA Turma Julgadora: [DES(A). JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). SERLY MARCONDES ALVES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [LEONARDO PIO DA SILVA CAMPOS - CPF: 819.220.271-20 (ADVOGADO), ALBERTO CARVALHO DE ALMEIDA - CPF: 177.267.861-91 (RECLAMANTE), BANCO DO BRASIL SA - CNPJ: 00.000.000/4737-66 (RECLAMADO), TURMA RECURSAL ÚNICA DO ESTADO DE MATO GROSSO (RECLAMADO), 1ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO (RECLAMADO), BANCO DO BRASIL SA - CNPJ: 00.000.000/4737-66 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), LUCIANA POVOAS LEMOS - CPF: 825.596.941-15 (ADVOGADO), TURMA RECURSAL ÚNICA DO ESTADO DE MATO GROSSO (RECLAMADO), EDUARDO JANZON AVALLONE NOGUEIRA - CPF: 135.207.888-02 (ADVOGADO), NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - CPF: 668.018.009-06 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECLAMAÇÃO IMPROCEDENTE, UNÂNIME. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO JUIZ NATURAL, CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. AFRONTA A ENTENDIMENTO CONSOLIDADO EM SÚMULA DO STJ. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. SUCEDÂNEO RECURSAL. IMPROCEDÊNCIA. I. CASO EM EXAME 1. Reclamação ajuizada por Alberto Carvalho de Almeida contra acórdão da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Estado de Mato Grosso, que negou provimento ao recurso inominado interposto contra sentença de improcedência na ação de obrigação de fazer c/c indenização por dano moral movida contra o Banco do Brasil S/A. O reclamante alega violação ao princípio do juiz natural, ao contraditório e à ampla defesa, além de afronta ao entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (Súmula 479 e Tema Repetitivo 466). II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) verificar se houve violação ao princípio do juiz natural na razão da distribuição do recurso inominado à Primeira Turma Recursal e não à Turma Recursal Única; (ii) avaliar se a indisponibilidade temporária do voto do relator no sistema eletrônico configura afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa; (iii) determinar se a reclamação é via processual adequada para questionar a inobservância de precedentes do Superior Tribunal de Justiça sobre responsabilidade bancária em fraudes eletrônicas. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A Lei Complementar n.º 758/2023 criou a 2ª e 3ª Turmas Recursais e transformou a Turma Recursal Única em 1ª Turma Recursal, inexistindo violação ao princípio do juiz natural. 4. A indisponibilidade temporária do voto do relator no sistema eletrônico não configura afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa, aplicando-se ao caso o princípio pas de nullité sans grief, segundo o qual não se decreta a nulidade do ato se dele não resultar prejuízo para as partes. 5. A reclamação não é meio processual adequado para questionar a não aplicação de entendimento firmado pelo STJ em súmulas ou recursos repetitivos, pois sua admissibilidade restringe-se às hipóteses taxativas do art. 988 do CPC. 6. O acórdão da Turma Recursal fundamentou-se na culpa exclusiva da vítima para afastar a responsabilidade objetiva do banco, configurando fortuito externo, sem afronta a precedente obrigatório do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Reclamação improcedente. Tese de julgamento: 1. A transformação da Turma Recursal Única em 1ª Turma Recursal não configura violação ao princípio do juiz natural. 2. A mera indisponibilidade temporária de voto no sistema eletrônico não implica nulidade processual se não houver prejuízo efetivo. 3. A reclamação não é meio adequado para questionar eventual inobservância a súmulas ou jurisprudências ordinárias do STJ, salvo nos casos expressamente previstos no art. 988 do CPC. Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 283 e 988. Lei Complementar n.º 758/2023, art. 3º. Jurisprudência relevante: STJ, AgInt no AREsp 1827906/RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, DJe 04/07/2022; STJ, AgInt na Rcl 36.756/MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe 23/08/2019; TJ-MT, Reclamação 1009988-11.2024.8.11.0000, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 15/08/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. JOSÉ ZUQUIM NOGUEIRA Egrégia Seção: Trata-se de Reclamação aviada por Alberto Carvalho de Almeida, em face do acórdão proferido pela Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Estado de Mato Grosso, que negou provimento ao recurso inominado interposto contra a sentença de improcedência proferida pelo 4º Juizado Especial Cível da Comarca de Cuiabá, na ação de obrigação de fazer c/c indenização por dano moral movida contra o Banco do Brasil S/A. Sustenta o reclamante, preliminarmente, a nulidade do julgamento por violação ao princípio do juiz natural, assim como do contraditório e da ampla defesa e, no mérito, que o acórdão questionado afronta o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, indicado pela Súmula 479 e Tema Repetitivo 466, notadamente no que se refere ao fortuito interno. Pontua que a Turma Recursal Julgadora não aplicou a solução jurídica adequada, adotando entendimento diverso dos precedentes deste Tribunal de Justiça acerca da configuração da responsabilidade objetiva da instituição bancária frente ao conhecido “golpe do motoboy”. Requer, liminarmente, a suspensão da tramitação dos autos n. 1033430-71.2022.8.11.0001, tendo em vista a possibilidade de dano irreparável no prosseguimento do processo ou eventual início de cumprimento provisório e, no mérito, pugna pelo acolhimento da reclamação, culminando com a cassação do acórdão. O pedido liminar foi indeferido, nos termos da decisão monocrática de id. 219548688. Não foram apresentadas as informações (certidão de id. 263964793). O terceiro interessado apresentou resposta à id. 268191777, pugnando pela improcedência da reclamação. Instada a se manifestar, a douta Procuradoria-Geral de Justiça deixou de opinar, ante a ausência de interesse público a justificar a sua intervenção (id. 270133371). É o relatório. V O T O R E L A T O R VOTO (PRELIMINAR – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL) EXMO. SR. DES. JOSÉ ZUQUIM NOGUEIRA (RELATOR) Egrégia Seção: O reclamante sustenta, preliminarmente, a nulidade do julgamento por violação ao princípio do juiz natural, afirmando que o segundo recurso inominado por ele interposto deveria ter sido distribuído à Turma Recursal Única e não à Primeira Turma Recursal do Juizado Especial, em observância aos artigos 930 do Código de Processo Civil e 80, § 1º do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça. No entanto, a alegação não prospera. Isso porque, no intuito de assegurar a prestação de serviços eficientes e céleres à população, este Tribunal de Justiça aprovou a transformação das Turmas Recursais Temporárias do Sistema de Juizados Especiais em Turmas Recursais Permanentes, convertendo a Turma Recursal Única em 1ª Turma Recursal e a criando outras duas turmas recursais. A Lei Complementar n.º 758, de 18 de abril de 2023, em seu artigo 3º, dispôs acerca da criação das 2ª e 3ª Turmas Recursais no Sistema de Juizados Especiais e, no parágrafo único do mencionado artigo, consignou expressamente que “A Turma Recursal Única passa a denominar-se 1ª Turma Recursal.” Por importante, confira-se o dispositivo: “Art. 3º Ficam criadas as 2ª e 3ª Turmas Recursais no Sistema de Juizados Especiais. Parágrafo único. A Turma Recursal Única passa a denominar-se 1ª Turma Recursal.” Dessa forma, s.m.j., a pretensão do reclamante de ver o segundo recurso inominado por ele interposto distribuído e julgado à Turma Recursal Única por suposta prevenção carece de interesse recursal, na medida em que o referido recurso foi julgado justamente pelo órgão para o qual o reclamante pretende a distribuição, o qual, desde a publicação da mencionada lei, passou a denominar-se 1ª Turma Recursal e não mais Turma Recursal Única. Com essas considerações, rejeito a preliminar. É como voto. VOTO (PRELIMINAR – VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA) EXMO. SR. DES. JOSÉ ZUQUIM NOGUEIRA (RELATOR) Egrégia Seção: O reclamante ainda alega violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, argumentando que o voto proferido pelo relator do recurso inominado, disponibilizado no dia subsequente à sessão de julgamento ocorrida em 07/03/2024, ficou indisponível para visualização por vários dias. Mais uma vez sem razão. É que, na hipótese, não se vislumbra o alegado cerceamento do direito de defesa do reclamante e afronta ao disposto no inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal, decorrente da suposta ausência de disponibilidade de visualização do documento no sistema PJE, notadamente porque a legislação processual civil vigente contempla a regra oriunda do direito francês do pas de nullité sans grief (art. 283, CPC), segundo a qual não se decreta a nulidade do ato se dele não resultar prejuízo para as partes. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica acerca da necessidade de demonstração do efetivo prejuízo para que se possa decretar nulidade de julgamento. A propósito: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. CITAÇÃO POR EDITAL. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Se as questões trazidas à discussão foram dirimidas, pelo Tribunal de origem, de forma suficientemente ampla, fundamentada e sem omissões, deve ser afastada a alegada violação aos arts. 489, § 1º, IV e 1 .022, I, II, do Código de Processo Civil de 2015. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta-se no sentido de que a declaração da nulidade do ato processual está condicionada à demonstração de efetivo prejuízo (pas de nullité sans grief). 3. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula n. 7/STJ). 4. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ - AgInt no AREsp: 1827906 RS 2021/0021759-0, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 04/04/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/04/2022) (destaquei) Como se vê dos autos do processo, a indisponibilidade de visualização do voto proferido pela turma por certo período tempo no sistema não impediu o exercício do direito do reclamante e a impetração da presente reclamação, de forma tempestiva, o que afasta a alegação de ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa, pela ausência de demonstração de efetivo prejuízo, conforme exigência da legislação em vigor e jurisprudência consolidada das Cortes Superiores. Ademais, o reclamante sequer declinou qual o prejuízo teria sofrido pela indisponibilidade de visualização do voto objeto de irresignação desta reclamação no sistema PJE por determinado período, limitando-se a informar a indisponibilidade do voto para visualização no sistema regulado pelo Conselho Nacional de Justiça na forma da Resolução do CNJ nº 185/2013 “por vários dias”. Portanto, ainda que tenha havido alguma instabilidade pontual no sistema, não se verifica qualquer prejuízo efetivo à parte reclamante, uma vez que o prazo recursal só tem início com a publicação oficial do acórdão, ou em hipóteses excepcionais, como ciência inequívoca da decisão nos autos ou prática de ato que revele conhecimento prévio da parte, como a interposição de recurso antes da publicação. No presente caso, embora o acórdão tenha sido juntado ao sistema em 08 de março de 2024, o reclamante ajuizou a presente Reclamação em 27 de março de 2024, antes mesmo do trânsito em julgado, que ocorreu em 1º de abril de 2024, conforme certidão de id. 222987165. Tal conduta evidencia que a parte teve ciência inequívoca do teor da decisão, o que reforça a inexistência de prejuízo e afasta a alegação de cerceamento de defesa. Ante o exposto, rejeito também esta preliminar. É como voto. VOTO (MÉRITO) EXMO. SR. DES. JOSÉ ZUQUIM NOGUEIRA (RELATOR) Egrégia Seção: Trata-se de Reclamação aviada por Alberto Carvalho de Almeida, em face do acórdão proferido pela Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Estado de Mato Grosso, que negou provimento ao recurso inominado interposto contra a sentença de improcedência proferida pelo 4º Juizado Especial Cível da Comarca de Cuiabá, na ação de obrigação de fazer c/c indenização por dano moral movida contra o Banco do Brasil S/A. Em seu arrazoado, o reclamante sustenta a ocorrência de suposta afronta a precedentes deste Tribunal de Justiça e a entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, indicado pela Súmula 479 e Tema Repetitivo 466, notadamente no que se refere ao fortuito interno, apta a viabilizar a reforma do acórdão recorrido. O artigo 988 do Código de Processo Civil enumera as hipóteses taxativas de cabimento da reclamação, senão vejamos: “Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: I – preservar a competência do tribunal; II – garantir a autoridade das decisões do tribunal; III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência.” Diante do teor insofismável do artigo acima transcrito, tenho que descabida a reclamação sob análise, vez que a via eleita é inadequada para o fim almejado pelo reclamante, pois o meio utilizado se adequa somente aos casos em que o julgado da Turma Recursal afronta decisão do Superior Tribunal de Justiça quando proferidas nas hipóteses do inciso IV do art. 988 do CPC, ou seja, em incidentes de julgamento de demandas repetitivas ou de assunção de competência. A legislação processual civil não autoriza o manejo da reclamação para dirimir eventual inobservância a entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça em suas súmulas e o entendimento da Corte Superior é no sentido de que não cabe reclamação para a preservação da sua jurisprudência, inclusive em sede de recurso repetitivo. Confira-se: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA RECLAMAÇÃO. APLICAÇÃO DE REPETITIVO. IMPOSSIBILIDADE. RECLAMAÇÃO INDEFERIDA LIMINARMENTE. DECISÃO MANTIDA. 1. A parte requerente sustenta, em sua reclamação, que a decisão impugnada teria contrariado o Tema Repetitivo n. 938 desta Corte Superior (REsp 1.599.511/SP), ante o afastamento indevido, na origem, da cobrança da comissão de corretagem. 2. A Corte Especial do STJ decidiu que a reclamação constitucional não é "instrumento adequado para o controle da aplicação dos entendimentos firmados pelo STJ em recursos especiais repetitivos" (Rcl 36.476/SP, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 5/2/2020, DJe 6/3/2020). 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (AgInt nos EDcl na Rcl 41.437/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 04/05/2021, DJe 11/05/2021). (destaquei) E ainda: “ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. EFICÁCIA RESTRITA ÀS PARTES ENVOLVIDAS NO CASO CONCRETO. IMPOSSIBILIDADE DO AJUIZAMENTO DE RECLAMAÇÃO PARA PRESERVAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. 1. Nos termos do artigo 105, I, f, da Constituição Federal, compete a este Superior Tribunal de Justiça processar e julgar, originariamente, a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões, não podendo ser utilizada como sucedâneo recursal ou como meio de dirimir divergência jurisprudencial. 2. A reclamação não é via adequada para preservar a jurisprudência do STJ, mas sim a autoridade de suas decisões tomadas no próprio caso concreto, envolvendo as partes postas no litígio do qual oriundo a reclamação. Não se pode pretender que, por intermédio do instrumento constitucional, se avalie o acerto ou desacerto de decisão proferida pela instância ordinária. 4. Os precedentes indicados na exordial não possuem efeito vinculante em relação ao processo dentro do qual se pretende ver resguardada a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, porquanto originados de demandas absolutamente distintas, sendo de rigor a negativa do pedido reclamatório. 5. De acordo com a jurisprudência firmada no âmbito desta Corte de Justiça, a decisão proferida nos autos de Conflito de Competência somente se refere ao processo que lhe deu origem, não se estendendo a outros, ainda que análoga a situação fático-jurídica.” 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AgRg na Rcl 26.635/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 13/06/2018, DJe 19/06/2018) (destaquei) Ora, se a legislação processual coíbe o manejo da reclamação para dirimir eventual inobservância a entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça em suas súmulas, por certo que o remédio processual não serve para resguardar o reclamante de decisões incompatíveis com precedentes ordinários da Corte Superior ou de Tribunais Estaduais. No caso dos autos, o reclamante defende que é aplicável ao caso o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, indicado pela Súmula 479 e pelo Tema Repetitivo 466, que tratam da responsabilidade das instituições bancárias por danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias. Todavia, no voto proferido no Recurso Inominado n.º 1033430-71.2022.811.0001, restou consignado que o suposto golpe ocorreu por culpa exclusiva da vítima, ou seja, trata-se de fortuito externo e não interno, como quer fazer quer o reclamante. Com efeito, da análise do contexto fático delineado nos autos, verifica-se que o reclamante é titular de uma conta corrente no banco reclamado e no dia 11/02/2022 (sexta-feira), recebeu uma ligação telefônica, na qual um indivíduo se identificou como funcionário do banco reclamado e, após confirmar informações sigilosas (RG, CPF, número do cartão, informações constantes de faturas anteriores), lhe questionou a respeito de compras realizadas com o referido cartão de crédito, ao que o reclamante contestou, afirmando não reconhecer tais transações. Extrai-se que, na ocasião, o suposto funcionário do banco lhe informou que seu cartão havia sido clonado e que, para resolver o imbróglio, o banco disponibilizaria um serviço de logística em que um preposto buscaria o cartão para que fosse bloqueado, bem como o aparelho celular do reclamante, pois a clonagem teria sido realizada através de “vírus” existente no aparelho telefônico. Consta que o reclamante entregou o cartão de crédito e seu telefone celular ao indivíduo, que se identificou como funcionário do reclamado, portando, inclusive, crachá de identificação da referida instituição financeira. No entanto, em razão da demora no retorno do suposto funcionário do banco, percebeu que havia sido vítima de uma fraude, ocasião em que registrou boletim de ocorrência e compareceu à agência bancária para bloquear o cartão, tendo sido constatadas duas transações no dia 11/02/2022, uma no valor de R$ 4.990,99 (quatro mil e novecentos e noventa e nove reais e noventa e nove centavos) e outra no valor de R$ 17.000,00 (dezessete mil reais), as quais o reclamante tentou cancelar junto à instituição financeira, sem êxito, todavia. O contexto fático revela que o ato ilícito praticado não adveio de uma conduta da casa bancária, como quer fazer crer o reclamante, mas decorreu de ato de terceiro, por culpa exclusiva da vítima, caracterizando-se fortuito externo do serviço bancário, como bem reconheceu o juízo de primeira instância. Por oportuno, confira-se a ementa do julgado proferido pela Primeira Turma Recursal do Estado de Mato Grosso no mencionado recurso inominado: “RECURSO INOMINADO CÍVEL. CONSUMIDOR. BANCÁRIO. FRAUDE PRATICADA POR TERCEIRO. ALEGAÇÃO DE CLONAGEM DE CARTÃO. ENTREGA DE CARTÃO FÍSICO PARA SUPOSTO FUNCIONÁRIO. DEVER DE DILIGÊNCIA DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. ARTIGO 14, § 3º, INCISO II, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1- O fato descrito na petição inicial demonstra que a parte Reclamante foi, aparentemente, vítima de um golpe. Contudo, o suposto golpe ocorreu por culpa exclusiva da vítima (no caso a Recorrente/Autora), que deixou de adotar cautela mínima à realização do negócio jurídico (pagamento de título em modo virtual). 2- Não caracteriza cerceamento do direito de defesa o julgamento antecipado da lide, quando existentes nos autos elementos probatórios suficientes e hábeis a formar a convicção do julgador, especialmente quando a prova testemunhal nada acrescentará ao deslinde da controvérsia. 3- Afastada a responsabilidade objetiva da Instituição Reclamada/Recorrida, por culpa de terceiro/vítima, não há que se falar em responsabilidade civil indenizatória. 4- Sentença mantida por seus próprios fundamentos, nos termos do artigo 46, da Lei n.º 9.099/95 c.c. art. 60, §§1º e 2º do Regimento Interno das Turmas Recursais Cíveis e Criminais dos Juizados Especiais do Estado de Mato Grosso (Resolução TJMT/OE n.º 016/23/TJMT), fazendo parte integrante deste voto.” Ademais, ainda que houvesse algum desacerto no acórdão proferido pela Turma Recursal, a reclamação não é o meio adequado para se questionar a “justiça” do conteúdo de uma decisão qualquer, como defende o reclamante. O que se percebe é que o reclamante pretende a reforma do acórdão para que se reconheça o direito à restituição do valor perdido com o golpe que sofreu por sua culpa exclusiva, assim como da indenização perseguida, o que não se enquadra em nenhuma das hipóteses de cabimento da reclamação, pois o recorrente pretende apenas a rediscussão do julgado, utilizando-se da presente via como sucedâneo recursal. Conforme asseverado, as hipóteses de cabimento da reclamação são restritas e sua utilização como sucedâneo recursal não é admitida, consoante entendimento jurisprudencial sedimentado do STJ e deste Sodalício. A propósito: “PROCESSUAL CIVIL. RECLAMAÇÃO. ALEGAÇÃO DE AFRONTA À JURISPRUDENCIA. SUCEDÂNEO RECURSAL. NÃO CABIMENTO. RECLAMAÇÃO EXTINTA SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. AGRAVO INTERNO. SÚMULA N. 83 DO STJ. 1. Não cabe reclamação como sucedâneo recursal. 2. Não se conhece de reclamação proposta com fundamento no art. 988 do CPC, quando ausentes as condições de procedibilidade, como nos casos em que não se aponta o acórdão proferido em IRDR ou em IAC que teria sido violado por turma recursal. 3. Quando o acórdão recorrido está alinhado à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, aplica-se ao caso a Súmula n. 83 do STJ. 4. Agravo interno desprovido.” (STJ - AgInt no AREsp: 2298875 PR 2023/0048478-6, Relator.: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 26/08/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/08/2024) “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA RECLAMAÇÃO. SUCEDÂNEO DE RECURSO. IMPOSSIBILIDADE. DECISÃO MANTIDA. 1. "A reclamação (art. 105, I, f, da Constituição da República) tem por finalidade tornar efetivas as decisões proferidas, no próprio caso concreto, em que o reclamante tenha figurado como parte, não servindo para a preservação da jurisprudência desta Corte ou, ainda, como sucedâneo recusal" ( AgInt na Rcl 36 .756/MG, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 20/8/2019, DJe 23/8/2019). 2. No caso, a parte alega o descumprimento de acórdão desta Corte Superior exarado em recurso especial do qual não fez parte e que não possui observância obrigatória, sendo incabível a reclamação ajuizada como sucedâneo de recurso. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ - AgInt nos EDcl na Rcl: 42878 SP 2022/0046019-1, Relator.: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 28/03/2023, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 31/03/2023) “RECLAMAÇÃO – DECISÃO DA TURMA RECURSAL DO ESTADO DE MATO GROSSO EM RECURSO INOMINADO - AÇÃO ORDINÁRIA DECLARATÓRIA C/C AÇÃO DE COBRANÇA – PROGRESSÃO DE CARREIRA DE SERVIDOR MUNICIPAL – APLICAÇÃO DE PRESCRIÇÃO DE FUNDO DE DIREITO – OFENSA À SUMULA 85 DO STJ – SUCEDÂNEO RECURSAL – DESCABIMENTO - RECLAMAÇÃO IMPROCEDENTE. 1. O Código de Processo Civil não autoriza o manejo da reclamação para dirimir eventual inobservância ao entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça em suas súmulas, porquanto desprovidas da eficácia vinculante a que se refere o inciso III do art. 988 do CPC. 2. A reclamação não constitui o meio adequado para corrigir eventuais erros de julgamento ou mesmo para questionar a acerto ou desacerto em aresto proferido pela Turma Recursal.” (TJ-MT - RECLAMAÇÃO: 10080882720238110000, Relator.: MARIA APARECIDA RIBEIRO, Data de Julgamento: 21/03/2024, Seção de Direito Público, Data de Publicação: 02/04/2024) “RECLAMAÇÃO CONTRA ATO JUDICIAL – SUPOSTA CONTRARIEDADE A ACÓRDÃOS PROLATADOS PELO TJMT – ART. 988, INCISOS I E II, DO CPC – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – DECISÃO QUE HOMOLOGOU CÁLCULO ELABORADO PELO CONTADOR DO JUÍZO – ANTERIORES DETERMINAÇÕES PROFERIDAS EM RECURSOS - AUSÊNCIA DE AFRONTA ÀS DECISÕES PROFERIDAS PELO COLEGIADO -+ PROCEDIMENTO QUE NÃO PODE SER UTILIZADO COMO SUCEDÂNEO DE RECURSO – RECLAMAÇÃO IMPROCEDENTE. Admite-se a Reclamação para garantir a autoridade das decisões do Tribunal, desde que comprovado tenham sido inobservadas. Caso específico em que as alegações trazidas com a peça inicial apenas reforçam a utilização da presente Reclamação como sucedâneo de recurso, ao manifestar seu inconformismo na tentativa de transformar esta Corte de Justiça em uma nova instância de reanálise das decisões proferidas em anteriores recursos.” (TJ-MT - RECLAMAÇÃO: 1007866-25.2024.8.11 .0000, Relator.: SERLY MARCONDES ALVES, Data de Julgamento: 12/06/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/06/2024) “RECLAMAÇÃO – ACÓRDÃO DA TURMA RECURSAL ÚNICA DO ESTADO DE MATO GROSSO – FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DE DIVERGÊNCIA ENTRE O JULGADO IMPUGNADO E A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL CONSOLIDADA EM SÚMULA VINCULANTE E/OU EM CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE, BEM COMO JULGAMENTO EM INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) OU DE INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA (IAC) – REQUISITOS PRÓPRIOS À ESPÉCIE NÃO DEMONSTRADOS – SUCEDÂNEO DE RECURSO – IMPROCEDÊNCIA. Não procede a Reclamação, com fundamento no artigo 988 do CPC, que não demonstra divergência entre o julgado impugnado e a e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consolidada em súmula vinculante e/ou em controle concentrado de constitucionalidade, bem como julgamento em Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) ou de Incidente de Assunção de Competência (IAC). A falta dos requisitos próprios à espécie obsta o manejo da Reclamação Constitucional, máxime por não se tratar este remédio jurídico de sucedâneo de recurso ou meio de dirimir divergência jurisprudencial.” (TJ-MT - RECLAMAÇÃO: 10099881120248110000, Relator.: GUIOMAR TEODORO BORGES, Data de Julgamento: 15/08/2024, Seção de Direito Privado, Data de Publicação: 18/08/2024) Assim, ausentes as exigências do art. 988 do Código de processo Civil, fica impedido o uso desta via, por não se tratar de sucedâneo recursal. Isso posto, ante a falta dos requisitos autorizadores estabelecidos no artigo 988 do Código de Processo Civil, julgo improcedente a reclamação. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 26/06/2025
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