Processo nº 1002114-38.2025.8.11.0000
ID: 295250426
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: AGRAVO REGIMENTAL CíVEL
Nº Processo: 1002114-38.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
11/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
WALLACE ALVES DOS SANTOS
OAB/GO XXXXXX
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LUIZ FELIPE LELIS COSTA
OAB/MG XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002114-38.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) Assunto: [Liminar, Área de Preservação Permanente…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002114-38.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO REGIMENTAL CÍVEL (206) Assunto: [Liminar, Área de Preservação Permanente] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [LUIS AUGUSTO CUISSI - CPF: 218.912.368-22 (ADVOGADO), CRISTIAN CLODOALDO RODRIGUES - CPF: 047.530.351-23 (AGRAVANTE), TRANSPORTES GRITSCH LTDA - CNPJ: 90.739.624/0001-18 (AGRAVADO), LUIZ FELIPE LELIS COSTA - CPF: 014.374.726-64 (ADVOGADO), WALLACE ALVES DOS SANTOS - CPF: 009.485.616-88 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A AGRAVANTE(S): CRISTIAN CLODOALDO RODRIGUES AGRAVADO(S): COMPANHIA HIDRELÉTRICA TELES PIRES EMENTA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DEMOLITÓRIA COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. PROIBIÇÃO DE FREQUÊNCIA OU DESOCUPAÇÃO DE ÁREA. CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP). PRIMAZIA DO PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Agravo de instrumento interposto contra decisão que, em ação demolitória com pedido de tutela de urgência, determinou a proibição de frequência ou desocupação de área construída às margens do Rio Paranaíta, diante da alegação de construção irregular em Área de Preservação Permanente (APP), sob pena de multa diária. II. Questão em discussão A questão em discussão é saber se é cabível a imposição de medida liminar que proíba a permanência do agravante em imóvel alegadamente situado em APP sem perícia conclusiva quanto à localização da construção. III. Razões de decidir 1) A medida de urgência deferida na origem encontra amparo nos princípios da precaução e da supremacia do interesse público ambiental, ante a verossimilhança dos elementos constantes nos autos, que apontam para construção em APP sem autorização ambiental. 2) A edificação não apresenta características de moradia ribeirinha, tampouco há prova inequívoca de uso habitacional pelo agravante, sendo constatada a presença de galpão metálico e container no local. 3) O direito à moradia não prevalece diante da ocupação irregular de área ambientalmente protegida, vedada pelo art. 3º da Lei nº 12.651/2012 e pela LC estadual nº 38/1995. 4) Os documentos da SEMA/MT gozam de presunção de legitimidade e atestam de forma clara a ilegalidade da construção, sendo suficientes para amparar a medida liminar. 5) A teoria do fato consumado não se aplica em matéria ambiental (Súmula 613/STJ), razão pela qual se revela legítima a determinação de cessação da ocupação irregular, mesmo em fase de cognição sumária. IV. Dispositivo e tese Recurso de agravo de instrumento desprovido. Agravo interno prejudicado. Tese de julgamento: “É legítima a imposição de medida liminar em ação demolitória que determine a proibição de frequência ou desocupação de área ocupada irregularmente em APP, mesmo sem perícia técnica conclusiva, quando há indícios consistentes da ilegalidade ambiental.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 225; L. 12.651/2012, arts. 3º, 4º, 61; LC/MT nº 38/1995, art. 61; CPC/2015, art. 300. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 613, AgInt no AREsp n. 952.182/PI; TJMT, 1018113-36.2022.8.11.0000, 1008158-73.2025.8.11.0000 e 1008213-58.2024.8.11.0000; TJRJ, 01033948120248190000 R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de agravo de instrumento interposto por CRISTIAN CLODOALDO RODRIGUES, com o objetivo de reformar a decisão proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Paranaíta/MT, nos autos da Ação Demolitória com Urgente Pedido de Tutela de Urgência n. 1000289-02.2024.8.11.0095, proposta por COMPANHIA HIDRELÉTRICA TELES PIRES, que deferiu parcialmente o pedido de tutela provisória, nos seguintes termos: “ Vistos... Trata-se de pedido de tutela provisória feito pela autora visando à reanálise do argumento anterior e análise de novos fatos. Afirma que continua havendo atuação na área, juntando fotos para comprovar. Por isso, requer decisão no sentido de autorizar a demolição e, quanto à decisão anterior que já determinou o afastamento, requer a aplicação de multa. Não se verificou citação da requerida, o que implica dizer que não houve intimação acerca da decisão anterior, a qual, como dito, determinou a proibição de frequentar o local da edificação construída, deixando-a caso lá resida. No tocante à autorização para a demolição, remete-se ao já argumentado anteriormente na primeira decisão, bem como aos fundamentos trazidos no Acórdão que não deu provimento ao Agravo. Assim, INDEFERE-SE o pedido. Em relação à aplicação de multa, não obstante a falta de citação e intimação da requerida, compreende-se que há sentido e eficácia em potencial no pedido feito, além de não haver prejuízo à requerida, bastando cumprir a decisão. Portanto, DEFERE-SE parcialmente o pedido feito, isso para: 1. PROIBIR o requerido de frequentar o local da edificação construída. a. Caso lá resida, deve DEIXAR a área e, caso não resida na localidade, deve se ABSTER de frequentá-la. b. Multa: R$5.000,00 por dia em caso de permanência ou por violação de frequência; Assim, à SECRETARIA para: 1. COM URGÊNCIA, Providenciar a CITAÇÃO e INTIMAÇÃO da parte-requerida, nos moldes da Inicial, ACRESCENTANDO-SE a presente decisão (especialmente por conta da multa aplicada).” (grifos e destaques no original) Em suas razões recursais (ID. 264966760) a parte Recorrente invoca os seguintes argumentos fático-jurídicos: 1. Desproporcionalidade da medida de urgência diante da residência do agravante no local e ausência de prova de que a construção está inserida em Área de Preservação Permanente (APP); 2. Inexistência de perícia técnica que determine com exatidão a localização da edificação e necessidade de instrução probatória. Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso para revogar a tutela de urgência deferida, assegurando o direito de permanência no imóvel ou, alternativamente, que a medida liminar seja suspensa até a realização de perícia técnica judicial. Recurso do réu tempestivo (ID. 178892670 – PJE 1º Grau – 1000289-02.2024.8.11.0095) e preparo recolhido (ID. 265031840). A Recorrente pleiteou a retificação do polo ativo para que passe a constar COMPANHIA HIDRELÉTRICA TELES PIRES como Agravada (ID. 265116784). Em sede de tutela recursal, houve o deferimento do efeito suspensivo para sustar os efeitos da decisão agravada (ID. 265562250). A Agravada interpôs Agravo Interno (ID. 270900383) em face da decisão monocrática pela reconsideração da decisão agravada, para que seja indeferido o efeito suspensivo concedido ao agravante. Subsidiariamente, requereu que a decisão fosse submetida ao crivo colegiado, reafirmando o pleito de manutenção das medidas deferidas na origem, em razão do risco de dano irreversível ao meio ambiente Contrarrazões (id. 270924379) pelo desprovimento recursal, sob fundamento que a edificação está situada à margem do reservatório da Usina Hidrelétrica Teles Pires, tratando-se, portanto, de edificação em área de preservação permanente, além de que detém posse legítima da área, obtida por meio de ação de desapropriação com imissão na posse e depósito prévio de indenização, sendo concessionária de serviço público federal vinculado à geração de energia elétrica. Em razão da matéria, houve o encaminhamento do feito para colheita de parecer ministerial, o qual se manifestou pelo desprovimento recursal apontando que a edificação se encontra inequivocamente situada em APP, como demonstrado em mapas e documentos dos autos, inclusive no Relatório Técnico n. 0000007169/2023 da SEMA/MT, bem como que a imposição da multa diária e a desocupação da área constituem medidas proporcionais, adequadas e necessárias para a contenção do risco ambiental (ID. 287125396). É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R AGRAVANTE(S): CRISTIAN CLODOALDO RODRIGUES AGRAVADO(S): COMPANHIA HIDRELÉTRICA TELES PIRES VOTO – PRELIMINAR EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: De saída, considerando o petitório de pedido de emenda ao Agravo de instrumento (ID. 265562250 e 283239353), bem como o comparecimento espontâneo da Agravada com a apresentação de Agravo Interno e Contrarrazões ao Agravo de instrumento, defiro o pedido de retificação do polo passivo. No caso, tal situação não resultará em nenhuma alteração do pedido recursal ou ainda importará em prejuízo à parte Agravada, visto que já houve inclusive a apresentação de defesa. Nesse sentido, é o entendimento já consolidado no Superior Tribunal de Justiça: (...) É firme o entendimento, no âmbito desta Corte, no sentido de que, "em homenagem aos princípios da efetividade do processo, da economia processual e da instrumentalidade das formas, é admissível a emenda à petição inicial para modificação do polo passivo, sem alteração do pedido ou da causa de pedir, mesmo após a contestação do réu" (STJ, REsp 1.667.576/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe de 13/09/2019). Na mesma linha: STJ, AgInt no AREsp 921.282/PR, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, DJe de 27/02/2018; AgInt no AREsp 896.598/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/04/2017; AgInt no AREsp 928.437/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/12/2016; REsp 1.473.280/ES, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, DJe de 14/12/2015. VII. Agravo interno conhecido, em parte, e, nessa extensão, improvido. (AgInt no AREsp n. 952.182/PI, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 31/8/2020, DJe de 16/9/2020.) Para tanto, determino que a r. secretaria proceda com a inclusão da COMPANHIA HIDRELÉTRICA TELES PIRES, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 12.810.896/0001-53, com sede na Praia do Flamengo, nº 154, sala 901, Bairro do Flamengo, CEP 22.210-030, Rio de Janeiro/RJ. É como voto. VOTO – MÉRITO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Reitero que se trata de Recurso de Agravo de instrumento interposto por CRISTIAN CLODOALDO RODRIGUES, com o objetivo de reformar a decisão proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Paranaíta/MT, nos autos da Ação Demolitória com Urgente Pedido de Tutela de Urgência n. 1000289-02.2024.8.11.0095, proposta por COMPANHIA HIDRELÉTRICA TELES PIRES, que deferiu parcialmente o pedido de tutela provisória para proibir o Recorrente de frequentar o local da edificação construída ou, caso lá resida, que deixe a área, sob pena de multa de R$5.000,00 (cinco mil reais), argumentando que tal determinação assegura eficácia em potencial no pedido da exordial sem apresentar prejuízos maiores ao Agravante. O Agravante, em suma, defende que reside no local desde 2023 com sua família, em edificação utilizada como moradia. Aponta que a localização próxima ao rio é fundamental para o exercício da atividade de pesca, sua principal fonte de subsistência. Alega que a edificação não causa dano ambiental e que não há comprovação de que a construção está em Área de preservação permanente, sendo o mapa da agravada (ID 152443470 – PJE 1º Grau – 1000289-02.2024.8.11.0095) impreciso, além de não haver medição técnica da distância até o curso d’água. Sustenta que a decisão é desproporcional, uma vez que não há decisão definitiva quanto à legalidade da construção, tampouco foi realizada perícia técnica para verificar sua localização exata. Aponta que o laudo da SEMA é genérico, sem a devida metragem entre a construção e o curso hídrico, desrespeitando os critérios da Lei 12.651/2012 (Código Florestal) e que a decisão viola os princípios do contraditório e da ampla defesa. Com isso, pleiteia a revogação da tutela de urgência ou, subsidiariamente, que se determine a realização de perícia técnica para delimitação da área e eventual inserção da construção em Área de Preservação Permanente. Lado outro, a Apelada sustenta que a construção objeto da demanda é manifestamente irregular, pois situada em Área de Preservação Permanente, cuja ocupação é vedada pela Lei 12.651/2012, salvo em hipóteses legalmente excepcionadas, o que não se verifica no caso concreto. Argumenta que o direito à moradia não legitima a ocupação de áreas protegidas, e que a jurisprudência consolidada do STJ afasta a incidência da teoria do fato consumado em matéria ambiental, reconhecendo a ocorrência de dano in re ipsa em tais situações. Aduz ainda que os próprios documentos e mapas juntados pelo agravante evidenciam que a edificação está situada à margem do reservatório da Usina Hidrelétrica Teles Pires, o que confirma sua inserção na faixa de Área de Preservação Permanente e que relatórios de fiscalização e fotografias anexadas corroboram a ocupação indevida. A agravada também destaca que detém posse legítima da área, obtida por meio de ação de desapropriação com imissão na posse e depósito prévio de indenização, sendo concessionária de serviço público federal vinculado à geração de energia elétrica e, portanto, exerce atos contínuos de posse e conservação ambiental, incluindo cercamento e programas de recomposição florestal. Por fim, salienta que a manutenção da decisão que restringe o acesso do agravante é essencial para impedir o agravamento dos danos ambientais verificados, inclusive pela identificação de novas construções e embarcações no local e que a permanência na área pode estimular práticas lesivas como garimpo e pesca ilegal, o que representa risco de dano irreversível ao meio ambiente, motivo pelo qual requereu o desprovimento do agravo e a confirmação integral da decisão recorrida. Passo, então, à análise das teses recursais. 1. Desproporcionalidade da medida de urgência diante da residência do agravante no local e ausência de prova de que a construção está inserida em Área de Preservação Permanente (APP). O Recorrente em suas razões argumenta que a determinação de desocupação é desproporcional, visto que o local é residência sua e de sua familia, bem como que não há provas de que a construção por ele realizada se encontra inserida em Área de Preservação Permanente. Aponta, também, ser ribeirinho e que exerce a profissão de pescador, motivo pelo qual depende da sua possibilidade de ser mantido ou que haja permissão de frequentar o local da construção para sua subsistência, bem como que não há qualquer dano ambiental que justifique a sua desocupação. De início, ressalto que, o Agravo de Instrumento por ser um recurso secundum eventum litis, limita-se ao exame do acerto ou não da decisão impugnada, em vista que ao Tribunal incumbe aferir tão somente se o ato judicial vergastado está eivado de ilegalidade e abusividade, sendo defeso o exame de questões estranhas ao que ficou decidido na lide. Igualmente, para o deferimento da tutela antecipada, é imprescindível a presença dos pressupostos autorizadores da medida de urgência, quais sejam, a probabilidade do direito e o fundado receio de dano grave e de difícil reparação, nos termos dos art. 300, do Código de Processo Civil. No caso, o motivo que assenta o pedido deferido deve ser verossímil à luz de elementos inequívocos, e deve ficar claro o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação à parte caso o direito perseguido seja reconhecido somente por ocasião do julgamento de mérito. O cerne do presente recurso cinge-se à análise do acerto ou desacerto da decisão agravada que deferiu o pedido para que o Agravante fosse proibido de frequentar o local no qual este construiu edificação nas proximidades da Rodovia MT 206 e da ponte do Rio Paranaíta ou se lá residisse, que a desocupasse. Pois bem. Por questão de coerência, destaco que matéria similar no mesmo feito já foi julgada por este órgão colegiado, também sob minha relatoria. Na ocasião, foi analisado pedido, da ora Agravada, no Agravo de Instrumento n. 1000289-02.2024.8.11.0095 que buscou a reforma da decisão que indeferiu o pedido demolição das edificações, tão somente proibindo que o réu frequentasse o local ou, caso ali residisse, que deixasse a área. Naquela assentada o recurso, da aqui Agravada, foi desprovido à unanimidade por esta Eg. Câmara, posto que a demolição pleiteada se fundamentava no auto de imissão na posse lavrado no ano de 2013 pela Vara Única de Paranaíta-MT em uma Ação de Desapropriação (ID. 152443469 – PJE 1º Grau), bem como que já havia decorrido mais de 10 (dez) anos do documento apresentado, razão pela qual não havia segurança jurídica suficiente para autorizar a medida por ela demandada. Por sua vez, o presente recurso se refere à insurgência do réu em face da decisão que na origem determinou sua proibição de frequentação ou caso ali tenha fixado moradia que houvesse, então, a desocupação do local. Em que pese os argumentos do Agravante, revisitando acuradamente os autos, entendo que a decisão recorrida deve ser mantida, inclusive por meio da revogação da tutela recursal anteriormente concedida. Preambularmente, verifico que neste juízo de cognição sumária a parte Agravada demonstrou ser ela a possuidora da área do imóvel (ID. 270912875 e 270912876), inclusive devidamente licenciada pelo IBAMA (ID. 270912879). Da mesma maneira, digo que a tutela provisória deferida pelo juízo de origem encontra amparo constitucional e legal, notadamente no princípio da precaução, corolário do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, previsto no caput do art. 225 da Constituição da República, que estabelece, de forma peremptória, que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Nesse cenário, a atuação jurisdicional preventiva se legitima especialmente quando se depara com situações potencialmente danosas ao meio ambiente, sendo cabível o deferimento de medidas acautelatórias para evitar a consolidação ou o agravamento de danos ambientais, que, muitas vezes, apresentam caráter irreversível ou de difícil reparação. Com efeito, em se tratando de ocupação e construção em Área de Preservação Permanente (APP), deve-se aplicar com rigor os ditames da Lei nº 12.651/2012 (Código Florestal), em especial ao artigo 3º, o qual define as APPs como áreas protegidas, cobertas ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar recursos hídricos, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. Some-se a isso o disposto no art. 61 da Lei Complementar Estadual nº 38/1995, que institui a política estadual do meio ambiente, condicionando expressamente qualquer intervenção em áreas ambientalmente protegidas à prévia autorização do órgão competente, sob pena de infração administrativa e responsabilização do infrator. Sobre isso, digo que não houve apresentação por parte do Agravante de licença ou autorização ambiental que legitime a construção por ele executada, motivo pelo qual evidente a urgência no deferimento da medida liminar em primeiro grau, considerando a relevância das questões ambientais, que apenas se agravam com o passar do tempo e exigem tutela imediata. Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1018113-36.2022.8.11.0000 AGRAVANTES: FLAMAR PECUARIA LTDA – ME e BERNARDO MERICO ORTIGARA AGRAVADO: ASSOCIACAO DO QUINTAS DO BRUMADO EMENTA RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA – ABSTENÇÃO DE INTERFERÊNCIA NO LOTE OBJETO DO LITÍGIO – TERRENO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE – DÚVIDA RAZOÁVEL - RISCO DE DANO IRREVERSEVÍVEL AO MEIO AMBIENTE – RECURSO DESPROVIDO. Diante da impossibilidade de se concluir, com segurança, que o lote objeto do litígio encontra-se fora da área de preservação permanente, prudente a manutenção da decisão que determinou que os requeridos se abstenham de efetuar qualquer modificação na vegetação do local. No caso, a suspensão da implantação do empreendimento denota menos risco do que a continuidade dos trabalhos, ainda que se leve em consideração o prazo de validade da Licença de Instalação, pois eventual desmate de vegetação nativa de área de preservação permanente trará prejuízos ambientais irreversíveis, sendo que a licença poderá ter seu prazo renovado.- (N.U 1018113-36.2022.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 16/11/2022, Publicado no DJE 25/11/2022) Do mesmo modo, a alegação de que a medida judicial seria desproporcional por implicar na desocupação do local onde reside o agravante não merece prosperar. Em primeiro lugar, aponto que o direito à moradia, embora fundamental, não é absoluto, e deve ser ponderado à luz do princípio da função socioambiental da propriedade, visto que a ocupação irregular de área ambientalmente protegida não se legitima pelo simples fato da presença do ocupante no local, tampouco pelo transcurso do tempo. Neste sentido, é plenamente aplicável ao caso o enunciado da Súmula 613 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual: “Não se admite a aplicação da teoria do fato consumado em tema de Direito Ambiental.” Tal enunciado cristaliza entendimento jurisprudencial reiterado de que, em matéria ambiental, o decurso do tempo não convalida práticas ilegais, sendo inviável que o Judiciário chancele a perpetuação de danos ambientais sob o pretexto de estabilização fática. Em segundo lugar, aponto que sequer restou demonstrado pelo Agravante que reside no local, na medida em que com suas razões recursais tão somente apresentou o processo na origem na íntegra. A Agravada, por sua vez, demonstrou que em verdade o que consta no local é a edificação de um barracão/galpão com cobertura metálica, além de um container, o que, a meu sentir, não apresenta verossimilhança às alegações do Recorrente (ID. 270924379): Ainda que alegue possuir “uma relação de respeito com a natureza, sem causar danos à área ou ao ecossistema local” (ID. 264966760 – pág. 6), não há nos autos qualquer prova nesse sentido. Do mesmo modo, a edificação de um barracão/galpão na forma de construção metálica com cobertura de zinco e container, não coaduna com as suas alegações ou sequer apresenta características de cidadão ribeirinho. Em terceiro lugar, o que restou deferido foi a proibição de frequentar ou desocupação, situação que não demonstra nenhum grau de irreversibilidade, como seria, por exemplo, em caso de deferimento da demolição nesta fase de cognição sumária. De igual sentido, é o que constou no parecer do Ministério Público o qual rechaçou a alegação de posse prolongada ou de condição de ribeirinho como fundamentos legítimos para a permanência na área. No tocante à prova da localização da construção em APP, também não assiste razão ao agravante. No caso, foram acostados aos autos na origem documentos expedidos pela Secretaria do Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso, cuja presunção de legitimidade e veracidade não foi infirmada por qualquer contraprova idônea. Dentre tais documentos, destaco: I. O Auto de Inspeção nº 0347016423, lavrado por agente ambiental no exercício do poder de polícia, atestando que se trata de construção metálica com cobertura de zinco, localizada em área de preservação permanente, e encontrando-se no momento da vistoria com suas atividades paralisadas, sendo identificado como responsável o senhor Cristian Clodoaldo Rodrigues (ID. 152443473 – pág. 3 – PJE 1º Grau); II. O Auto de Infração nº 0347016523, pelo qual se impôs penalidade ao agravante por descumprimento de notificação administrativa anterior (nº 2241000623), que determinava a desmobilização da estrutura no prazo de 30 (trinta) dias, bem como pela edificação de obra com potencial poluidor sem qualquer autorização ou licença ambiental (ID. 152443473 – pág. 5 – PJE 1º Grau); III. E, por fim, o Termo de Embargo/Interdição nº 0347016623, vinculado ao processo administrativo nº SEMA-PRO2023/23282, que formaliza a interdição da obra por ausência de regularidade ambiental (ID. 152443473 – pág. 7 – PJE 1º Grau). Tais elementos revelam, com clareza, que a construção foi efetivada em área de preservação permanente sem a observância da legislação ambiental vigente e sem qualquer respaldo administrativo regular. Sobre a presunção de veracidade de documentos de órgãos ambientais, a jurisprudência: DIREITO AMBIENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO POPULAR. OBRA EM ORLA MARÍTIMA. PROJEÇÃO DE SOMBRA. DEMOLIÇÃO DE ÁREA IRREGULAR. RECURSO PROVIDO. I . CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que determinou a paralisação de obra em área de orla marítima, alegando impacto ambiental em razão da projeção de sombra sobre a praia. 2. Os agravantes pleiteiam a retomada da obra, sustentando que o projeto original foi devidamente licenciado pelo órgão competente e que não há risco de impacto ambiental significativo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. A questão em discussão consiste em saber se pode ser permitida a retomada das obras licenciadas, com demolição das partes irregulares, considerando a alegada ausência de impacto ambiental significativo. III . RAZÕES DE DECIDIR 4. O estudo de sombras apresentado nos autos comprova que a construção, quando realizada em conformidade com o projeto original, não projeta sombra sobre o calçadão da praia, afastando risco de impacto ambiental. 5. A licença concedida pelo órgão competente foi devidamente fundamentada e amparada em estudo técnico, gerando presunção de legitimidade que só pode ser afastada mediante prova inequívoca em sentido contrário. 6. Inexistindo evidências de danos ambientais, a continuidade da obra é admissível, desde que limitada ao projeto original licenciado. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso provido para autorizar a demolição da área irregularmente edificada e a continuidade das obras, conforme o projeto original licenciado. Tese de julgamento: "1. A demolição de construções irregulares e a retomada das obras, quando previamente licenciadas, são admitidas na ausência de comprovação de impacto ambiental significativo." Legislação e jurisprudência relevantes citadas: CF, art . 225; Lei nº 4717/65, art. 1º. (TJ-RJ - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 01033948120248190000, Relator.: Des(a). MARIA CRISTINA DE BRITO LIMA, Data de Julgamento: 27/05/2025, SÉTIMA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO, Data de Publicação: 30/05/2025) Não se trata, portanto, de mera suposição ou ilação, mas de constatação oficial documentada, a qual possui presunção relativa de veracidade e se mostra suficiente para embasar a medida judicial impugnada. Outrossim, não se incumbiu o Agravante do ônus de demonstrar apresentou defesa-prévia na via administrativa, de modo que não há que se falar em violação do contraditório e ampla defesa no Processo nº SEMAPRO2023/2328. Da mesma sorte, a próprio parquet reafirmou que a edificação se encontra inequivocamente situada em área de preservação permanente, consubstanciado no Relatório Técnico n. 0000007169/2023 da SEMA/MT. Neste diapasão, a presença dos requisitos autorizadores para concessão da tutela de urgência, quais sejam a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo se mostrar evidentes. De igual modo, anoto que não verifico qualquer descompasso entre o conteúdo da decisão agravada e os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, visto que a tutela deferida visa unicamente cessar uma situação de ilegalidade ambiental em curso, sendo que a possibilidade ou não de demolição da edificação será resolvida com o mérito. Em conclusão, a manutenção da decisão recorrida é medida que se impõe, inclusive revogando a tutela recursal anteriormente deferida. 2. Inexistência de perícia técnica que determine com exatidão a localização da edificação e necessidade de instrução probatória. O Agravante aponta que a inexistência de perícia técnica que possa determinar a localização da edificação, justifica a reforma da decisão, bem como diz que tal ponto deve ser apurado quando da ocasião da instrução probatória. Ocorre que pelos argumentos anteriormente já apresentados, repito que a despeito da alegação do Agravante, não é possível concluir, com a segurança necessária, que a edificação por ele realizada está fora da área de preservação permanente. De uma superficial análise dos mapas existentes no processo, inclusive apresentado pelo próprio Recorrente, verifico que a edificação se encontra na área do mapa com vegetação densa, possivelmente nativa (ID. 264966760 – pág. 4): Nesse contexto, a desocupação ou proibição de frequentar o local se mostra adequado, posto que eventual desmate de vegetação nativa de área de preservação permanente trará prejuízos ambientais irreversíveis, ao passo que a exploração da área pode ser, se for o caso, retomada. Sobre isso: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DESMATAMENTO ILEGAL – TUTELA DE URGÊNCIA – SUSPENSÃO DA ATIVIDADE ECONÔMICA NAS ÁREAS DESMATADAS – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA – PRINCÍPIOS DA PREVENÇÃO E PRECAUÇÃO – MEDIDAS PROVISÓRIAS PARA GARANTIR A PRESERVAÇÃO AMBIENTAL – RECURSO DESPROVIDO. Em casos ambientais, os princípios da precaução e prevenção prevalecem, orientandos pela suspensão das atividades potencialmente lesivas ao meio ambiente até que se comprove a ausência de dano, sobretudo quando presentes evidências de degradação. A inversão do ônus da prova é aplicável às ações de degradação ambiental, conforme a súmula 618 do STJ, cabendo ao agravante demonstrar que suas atividades não implicam dano ao meio ambiente. A legalidade das atividades alegadas pelo agravante demanda instrução probatória ampla, o que deverá ser analisado na ação principal, após dilação probatória, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. (N.U 1008213-58.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIA APARECIDA RIBEIRO, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 04/12/2024, Publicado no DJE 11/12/2024) (grifo nosso) Portanto, afigura-se prudente a manutenção da decisão recorrida até a instrução processual, quando as dúvidas sobre a localização ou não em área de preservação permanente poderão ser sanadas, inclusive por meio de perícia judicial. Agravo Interno de COMPANHIA HIDRELETRICA TELES PIRES Anoto que, no caso, a apreciação do agravo interno antes do agravo de instrumento caminha em desencontro aos princípios da efetividade e da razoável duração do processo, já que o agravo interno analisará apenas os efeitos atribuídos ao agravo de instrumento, enquanto, o julgamento do agravo de instrumento conclui a cognição exauriente da questão controvertida na decisão interlocutória proferida em primeira instância, de modo que, engloba o objeto do agravo interno. Nesse sentido: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO. JULGAMENTO DE MÉRITO SUPERVENIENTE. PREJUÍZO DO AGRAVO INTERNO. RECURSO ACOLHIDO SEM ALTERAÇÃO DO JULGADO. I. Caso em exame Embargos de declaração opostos por concessionária de serviços públicos em face de acórdão proferido em agravo de instrumento, com alegação de omissão quanto à ausência de análise de agravo interno interposto contra decisão que indeferiu tutela recursal antecipada. II. Questão em discussão A questão em discussão consiste em verificar se há omissão no acórdão por não apreciação expressa de agravo interno interposto contra decisão monocrática que indeferiu tutela de urgência, diante do julgamento superveniente do mérito do agravo de instrumento. III. Razões de decidir Constatada a interposição de agravo interno contra decisão monocrática que indeferiu tutela antecipada, anteriormente ao julgamento colegiado do agravo de instrumento. Considerando o julgamento definitivo do agravo de instrumento, restou prejudicada a análise do agravo interno, ante a perda superveniente de seu objeto, conforme jurisprudência consolidada. IV. Dispositivo e tese Embargos de declaração acolhidos, exclusivamente para suprir a omissão apontada, julgando prejudicado o agravo interno, sem alteração no conteúdo do acórdão anteriormente proferido. Tese de julgamento: "1. A superveniência do julgamento do mérito do agravo de instrumento prejudica o exame de agravo interno interposto contra decisão monocrática que indeferiu tutela recursal, por perda de objeto." Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 1.021, §1º, e 1.022. Jurisprudência relevante citada: TJMT, AI nº 1008158-73.2025.8.11.0000, Rel. Des. Carlos Alberto A. da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 23.05.2025. (N.U 1008158-73.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/05/2025, Publicado no DJE 26/05/2025) Desse modo, em razão do julgamento do mérito do agravo de instrumento, no qual foi proferida a decisão agravada por este Agravo Interno, é de se julgar prejudicado o recurso, ante a ocorrência da perda superveniente de objeto. Conclusão. Por essas razões, conheço do recurso de Agravo de instrumento e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a r. decisão fustigada e, via de consequência, revogo a decisão monocrática que concedeu a tutela recursal. Por consequência, JULGO PREJUDICADO o recurso de Agravo Interno, ante a perda superveniente de objeto. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025
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