Processo nº 0008492-08.2019.8.11.0042
ID: 310370701
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0008492-08.2019.8.11.0042
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RODRIGO MOREIRA MARINHO
OAB/MT XXXXXX
Desbloquear
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 0008492-08.2019.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). R…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 0008492-08.2019.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). CHRISTIANE DA COSTA MARQUES NEVES] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), GERALDO JOSE DE ARAUJO NETO - CPF: 034.215.761-22 (APELANTE), RODRIGO MOREIRA MARINHO - CPF: 902.341.971-53 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – SENTENÇA CONDENATÓRIA – TRÁFICO DE DROGAS – RECURSO DEFENSIVO – PRELIMINAR – INÉPCIA DA DENÚNCIA – REJEIÇÃO – PEÇA ACUSATÓRIA QUE PREENCHE OS REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP – PRECLUSÃO DA MATÉRIA APÓS PROLAÇÃO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA – PRECEDENTES DO STJ (V. G. HC Nº 732.319/SP) – MÉRITO – ABSOLVIÇÃO – IMPOSSBILIDADE – MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS – APREENSÃO DE 63,70 GRAMAS DE MACONHA, EXPRESSIVA QUANTIA EM DINHEIRO (R$ 8.921,80) SEM COMPROVAÇÃO DE ORIGEM LÍCITA E PETRECHOS UTILIZADOS PARA O FRACIONAMENTO E EMBALAGEM DE ENTORPECENTES – DEPOIMENTOS POLICIAIS COERENTES E CORROBORADOS PELAS DEMAIS PROVAS – VALIDADE – ENUNCIADO ORIENTATIVO Nº 8 DO TJMT – PLEITO ABSOLUTÓRIO REJEITADO – ALEGADA INIMPUTABILIDADE POR DEPENDÊNCIA QUÍMICA – NÃO COMPROVAÇÃO – MERA ALEGAÇÃO DEFENSIVA DESACOMPANHADA DE PERÍCIA – PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O ART. 28 DA LEI Nº 11.343/06 – INVIABILIDADE – CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS QUE EVIDENCIAM A FINALIDADE MERCANTIL DA DROGA – APLICAÇÃO DA MINORANTE DO § 4º DO ART. 33 DA LEI Nº 11.343/06 – AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL – MINORANTE JÁ APLICADA NO PATAMAR MÁXIMO – PLEITO DE RECORRER EM LIBERDADE – FALTA DE INTERESSE – PROVIDÊNCIA ADOTADA NA SENTENÇA – ISENÇÃO DA PENA DE MULTA – IMPOSSIBILIDADE – PREVISÃO CUMULATIVA NO TIPO PENAL – EVENTUAL PARCELAMENTO A SER ANALISADO PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO PENAL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Peça acusatória que preenche os requisitos do art. 41 do CPP, descrevendo de forma clara e objetiva a conduta criminosa imputada ao apelante, não pode ser taxada de inepta. Há preclusão da matéria após prolação da sentença condenatória, conforme jurisprudência pacífica do STJ e STF. O crime de tráfico de drogas que é inafiançável por expressa disposição constitucional (art. 5º, XLIII, CF). Assim, a decisão o juiz que presidiu a audiência de apresentação foi corretamente reformada, uma vez que esse ato possui finalidade específica de analisar a legalidade da prisão. A mera deliberação provisória que não vincula o juízo natural da causa. A materialidade e autoria está comprovada por meio do auto de exibição e apreensão e laudo pericial – Apreensão de 63,70 gramas de maconha, expressiva quantia em dinheiro (R$ 8.921,80) sem origem lícita comprovada e petrechos utilizados para o fracionamento e embalagem de entorpecentes, além dos depoimentos dos policiais militares coerentes, harmônicos e corroborados pelas demais provas. O conjunto probatório é robusto e suficiente para embasar a condenação, não havendo que se fala em absolvição. Não há comprovação nos autos acerca da alegada inimputabilidade. O que se tem é a mera alegação defensiva desacompanhada de perícia. A ausência de prova de que o agente, ao tempo dos fatos, encontrava-se inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de se determinar conforme esse entendimento (art. 45 da Lei nº 11.343/06) é apta para não acolher a tese defensiva. A drogadição voluntária não exime de responsabilidade penal. Inviável a desclassificação do crime do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 para a conduta prevista no artigo 28 da mesma Lei, pois, as circunstâncias concretas evidenciam a finalidade mercantil da droga, tais como considerável quantidade de entorpecente, apreensão de dinheiro em espécie e petrechos para fracionamento. Quanto à aplicação da minorante do artigo 33, § 4º da Lei nº 11.343/2006 e o pleito de recorrer em liberdade, carecem de interesse recursal, uma vez que a minorante já foi aplicada na sentença no patamar máximo de 2/3 (dois terços), bem ainda, foi concedido o direito do apelante de recorrer em liberdade. A isenção da pena de multa não é possível, pois, decorre de previsão cumulativa e obrigatória no tipo penal (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06). Ademais, a condição financeira do réu já foi considerada na fixação do valor unitário do dia-multa no mínimo legal (1/30 do salário mínimo). Eventual parcelamento deve ser analisado pelo juízo da execução penal. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por Geraldo José de Araújo Neto contra sentença proferida pelo Juízo da 9ª Vara Criminal Especializada em Delitos de Tóxicos da Comarca de Cuiabá/MT, nos autos nº 8492-08.2019.8.11.0042, que o condenou como incurso nas penas do artigo 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, à pena de 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 167 (cento e sessenta e sete) dias-multa, fixados no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos (sentença – Id. 195008669). Em suas razões recursais, o apelante sustenta, inicialmente, que deve ser mantida a decisão do juízo de custódia, que determinou a devolução dos valores apreendidos, por entender que o juiz da causa não poderia reformar decisão de juiz de mesma instância. Preliminarmente, alega a inépcia da denúncia, por ausência dos requisitos do artigo 41 do CPP. Quanto ao mérito, pleiteia sua absolvição por "manifesta inocência" e ausência de provas, nos termos do artigo 386, incisos II, V e VII, do CPP, alegando ausência de culpabilidade e dolo. Alega, ainda, ser apenas usuário de drogas e que os apetrechos encontrados na residência eram para uso de sua avó para guardar mantimentos. Sustenta a necessidade de realização de exame de dependência toxicológica, por ser viciado em maconha desde os 14 anos de idade, o que o tornaria incapaz de entender o caráter ilícito da conduta. Subsidiariamente, pugna pela desclassificação da conduta para o crime de porte para consumo próprio (art. 28 da Lei n. 11.343/06) e, caso não seja esse o entendimento, requer a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no §4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06. Por fim, requer a isenção da pena de multa, em razão de sua hipossuficiência (Id. 195757653). Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou-se pelo desprovimento do recurso (Id. 200399197). Nesta instância, a Procuradoria-Geral de Justiça, através do Procurador de Justiça José de Medeiros, manifestou-se pela rejeição da preliminar e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (Id. 203821691), sintetizando seu entendimento com a seguinte ementa: “Sumário: Apelação criminal – Irresignação defensiva – Sentença condenatória – Tráfico de drogas – 1. Preliminar – Inépcia da denúncia – Nulidade ab initio – Rejeição – Preclusão – Prolação de sentença condenatória – Precedentes TJMT, STJ e STF – 2. Mérito – 2.1. Absolvição por falta de provas – Falta de culpabilidade – Alegada inimputabilidade do agente pela dependência química – Subsidiariamente, desclassificação para posse de droga para consumo próprio – Improcedência – Provas de materialidade, autoria e dolo do crime de tráfico de drogas – Dependência voluntária que não exime a responsabilidade penal – 3. Requer a aplicação da causa de diminuição prevista no artigo 33, §4°, LCD – Falta de interesse recursal – Minorante aplicada em patamar máximo em sentença – 4. Requer isenção da pena de multa – Impossibilidade – Preceito secundário do tipo penal que não comporta afastamento – Pela rejeição da preliminar e, no mérito, o desprovimento do recurso.” (Sic.) A douta revisão V O T O R E L A T O R Conforme relatado, trata-se de recurso de apelação criminal interposto por Geraldo José de Araújo Neto contra sentença proferida pelo Juízo da 9ª Vara Criminal Especializada em Delitos de Tóxicos da Comarca de Cuiabá/MT, nos autos nº 8492-08.2019.8.11.0042, que o condenou como incurso nas penas do artigo 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06. Segundo consta da denúncia, no dia 07 de fevereiro de 2019, por volta das 17h40min, na residência situada à Rua Barão de Vila Bela, n° 198, bairro Dom Aquino, nesta cidade de Cuiabá-MT, o denunciado Geraldo José de Araujo Neto foi preso em flagrante delito por trazer consigo e ter em depósito drogas, para consumo de terceiros, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. De acordo com o apurado, a guarnição do Oficial de Área do 1º BPM recebeu denúncia anônima de um transeunte informando que na referida localidade havia um indivíduo realizando tráfico de entorpecentes, o qual trajava bermuda e camiseta vermelha. Diante da informação, os policiais deslocaram-se para o local indicado e, ao avistarem o denunciado com as características descritas, tentaram abordá-lo. No entanto, este, ao perceber a aproximação dos policiais, fugiu adentrando na residência de n° 198. Realizado o acompanhamento, os policiais procederam à abordagem do réu e, em busca pessoal, encontraram em seu poder 01 (uma) porção de substância análoga à maconha e o valor de R$ 60,00 (sessenta reais), dividido em três notas de R$ 20,00 (vinte reais). Ao ser questionado sobre a residência onde se encontrava, o denunciado afirmou residir naquele local, negando a existência de qualquer ilícito no interior da casa. Diante da suspeita de tráfico de drogas, em razão da apreensão da droga em poder do denunciado, bem como pelo teor da denúncia recebida, os policiais procederam à busca domiciliar, ocasião em que localizaram em um dos quartos, escondido entre a parede e uma cama box, uma sacola contendo dinheiro, totalizando o valor de R$ 8.921,80 (oito mil, novecentos e vinte e um reais e oitenta centavos). Em seguida, quando os policiais realizaram uma varredura ao fundo da residência, encontraram um recipiente contendo 01 (um) pedaço médio de substância análoga à maconha, 01 (um) pedaço pequeno de substância análoga à maconha e resquícios da mesma substância dentro do recipiente, o qual se encontrava escondido embaixo de alguns objetos, em cima da mesa. Ainda, foram localizados próximo aos entorpecentes encontrados, 02 (dois) rolos de papel filme e 01 (um) rolo de papel alumínio, materiais utilizados para embalar entorpecentes. O laudo pericial n° 3.14.2019.52123-01 (Id. 195008183, p. 23/25) concluiu que as substâncias apreendidas, pesando ao total 63,70g (sessenta e três gramas e setenta centigramas), apresentaram resultado positivo para maconha. Preliminar de inépcia da denúncia: Inicialmente, antes de adentrar ao mérito do recurso, cumpre-me examinar a preliminar suscitada pela defesa, de inépcia da denúncia. A defesa argumenta que a peça acusatória não preenche os requisitos legais previstos no artigo 41 do Código de Processo Penal, impossibilitando o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa. A preliminar não merece acolhida. Verifica-se que a denúncia atende satisfatoriamente aos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, descrevendo de forma clara e objetiva a conduta criminosa imputada ao apelante, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado, a classificação do crime, bem como o rol de testemunhas. De fato, da leitura da peça acusatória, constata-se que o órgão ministerial narrou de forma pormenorizada os fatos delituosos, indicando data, horário, local, circunstâncias da abordagem policial, apreensão da droga, dinheiro e materiais comumente utilizados para o tráfico, bem como os elementos que evidenciavam a finalidade mercantil da droga. Ademais, conforme bem destacou a Procuradoria-Geral de Justiça em seu parecer, a inépcia da denúncia não pode mais ser arguida após a prolação de sentença condenatória, em razão da preclusão, tendo em vista que o feito tramitou regularmente, oportunizando-se ao réu o exercício da ampla defesa e do contraditório em todas as fases processuais. Nesse sentido, é pacífico o entendimento jurisprudencial de que a superveniência de sentença condenatória torna preclusa a análise de eventual inépcia da denúncia, conforme destacado nos precedentes citados no parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, §4º, DA LEI Nº 11.343/06) – PRELIMINARES – 1) INÉPCIA DA DENÚNCIA E AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA – IMPROCEDÊNCIA – DESCRIÇÃO SATISFATÓRIA – PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP – PRECLUSÃO DA MATÉRIA – NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – ENFRENTAMENTO DAS MATÉRIAS PELO MAGISTRADO – MOTIVAÇÃO NA CONCLUSÃO DE SEU CONVENCIMENTO – ART. 93, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – PRELIMINARES REJEITADAS – MÉRITO – ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS – IMPROCEDÊNCIA – AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – DOSIMETRIA – READEQUAÇÃO DA PENA-BASE – AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL – PENA-BASE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL – PRELIMINARES REJEITADAS E, NO MÉRITO, APELO NÃO PROVIDO EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. "(...) Incabível o acolhimento da preliminar de inépcia da denúncia quando a peça acusatória iniciadora da ação penal preenche todos os requisitos previstos no art. 41 do Código de Processo Penal e, ainda que assim não fosse, também não há como reconhecer tal arguição em virtude da preclusão operada com a superveniência de sentença penal condenatória, consoante precedentes do STF e STJ" (Ap 65691/2017, DES. GILBERTO GIRALDELLI, TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 23/08/2017, Publicado no DJE 04/09/2017). (TJMT, N.U 0011304-18.2018.8.11.0055, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, PAULO DA CUNHA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 18/07/2023, Publicado no DJE 21/07/2023) No mesmo sentido, é o entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça: PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. FURTO QUALIFICADO. INÉPCIA DE DENÚNCIA E AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. PREJUDICIALIDADE EM FACE DA PROLAÇÃPO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. ALEGAÇÃO DE DIVERSAS NULIDADES OCORRIDAS NO DECORRER DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. NÃO VERIFICAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. [...] IV - Lado outro, cumpre ressaltar que, diante da prolação de sentença condenatória após ampla instrução criminal onde foram observados o contraditório e ampla defesa, restam superados os argumentos relativos à suposta inépcia da denúncia e carência de justa causa, conforme entendimento deste Tribunal. Precedentes. [...] Habeas corpus não conhecido. (HC n. 732.319/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 2/8/2022, DJe de 9/8/2022.) (negritou-se) Portanto, rejeito a preliminar de inépcia da denúncia. Mérito. Inicialmente, quanto à alegação de que deve ser mantida a decisão do juízo de custódia que determinou a devolução dos valores apreendidos, não merece acolhimento. Como bem observou a Procuradoria-Geral de Justiça, a decisão proferida pelo Juízo que realizou a audiência de custódia foi corretamente revogada pelo Juízo competente para processamento e julgamento do processo criminal, tão logo oferecida a denúncia. O crime de tráfico de drogas é inafiançável por expressa disposição constitucional e infralegal (Art. 5º, inciso XLIII, CF e art. 323, inciso II, CPP). Portanto, não poderia o Juízo da custódia estabelecer fiança de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), nem determinar que o valor fosse detraído dos valores apreendidos, sobre os quais pesava a presunção de serem proveito do crime. Destaco que o próprio juízo de custódia reconheceu que não ficou comprovada a origem lícita do dinheiro apreendido, ressalvando que caberia ao juiz titular da vara onde o processo fosse distribuído analisar essa questão. A audiência de custódia tem finalidade específica de analisar a legalidade da prisão, não se prestando a analisar as minúcias do caso concreto, nem a destinação de bens e valores apreendidos. Portanto, a revogação da decisão anterior pelo juízo competente foi correta e não há falar em manutenção de decisão já revogada. Em relação ao pleito absolutório, entendo que não merece prosperar. A materialidade do crime de tráfico de drogas está devidamente comprovada pelo auto de prisão em flagrante delito, auto de apreensão, laudo pericial nº 3.14.2019.52123-01 (Id. 195008183), que confirmou que as substâncias apreendidas, pesando ao total 63,70 (sessenta e três gramas e setenta decigramas) gramas, apresentaram resultado positivo para maconha, substância entorpecente elencada pela Portaria n° 344/98 AVS/MS. Quanto à autoria delitiva, as provas produzidas nos autos são suficientes para amparar a condenação do apelante. A versão apresentada pelo Policial Militar Douglas Vicente Norimatsu Sakata, em juízo, é coerente e harmônica, relatando de forma clara os fatos que levaram à prisão do réu. Segundo seu depoimento, a guarnição recebeu denúncia anônima sobre um indivíduo com camiseta vermelha e bermuda que estaria praticando tráfico de entorpecentes. Ao se deslocarem ao local, avistaram o apelante com as mesmas características. Ao tentar abordá-lo, ele fugiu para dentro da residência. Na busca pessoal, encontraram uma porção de maconha e R$ 60,00 em dinheiro. Ao realizarem busca na casa, encontraram expressiva quantia em dinheiro (cerca de R$ 8.000,00) escondida entre a cama e a parede, além de mais porções de entorpecentes e materiais comumente utilizados para o tráfico de drogas, como papel-filme e papel alumínio. O referido depoimento encontra amparo no Auto de Exibição e Apreensão, que atesta a apreensão da quantia de R$ 8.921,80 (oito mil, novecentos e vinte e um reais e oitenta centavos), uma corrente de cor prata com anel, um cesto, um rolo de papel filme, um rolo de papel alumínio, um rolo pequeno de papel filme, duas porções de maconha e um pote com resquícios de substância análoga à maconha. Vale ressaltar que é pacífico o entendimento jurisprudencial de que o depoimento de policiais constitui meio de prova idôneo a embasar a condenação, especialmente quando colhido em juízo, sob o crivo do contraditório, e em harmonia com os demais elementos de prova, como é o caso dos autos. A esse respeito, este egrégio Tribunal de Justiça já se manifestou: [...] Os depoimentos dos policiais foram considerados idôneos e harmônicos com as demais provas constantes dos autos, conforme jurisprudência consolidada, segundo a qual o testemunho de agentes de segurança pública possui valor probatório quando coerente e livre de contradições. Não foram apresentados elementos concretos capazes de descredibilizar as declarações prestadas, tornando inviável a absolvição pretendida. [...] O depoimento de policiais, quando coerente e corroborado por outros elementos de prova, é idôneo para fundamentar condenação criminal. [...] (N.U 1011147-77.2024.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 09/04/2025, Publicado no DJE 11/04/2025) O apelante, por sua vez, nega a prática do crime de tráfico, alegando ser apenas usuário de drogas, bem como afirma que os valores encontrados seriam provenientes de seu trabalho como menor aprendiz e de atividades realizadas com seu tio em uma reciclagem, e que estariam sendo guardados para a realização de um aniversário. Contudo, a versão apresentada pelo réu não convence e não encontra respaldo no conjunto probatório. O valor de R$ 8.921,80 apreendido é desproporcional ao rendimento declarado pelo apelante como menor aprendiz, de R$ 420,00 mensais. O acusado afirmou que também trabalhava com seu tio em uma reciclagem e receberia valores entre R$ 500,00 e R$ 1.000,00 por semana, mas não produziu qualquer prova desta fonte de renda complementar. Sequer arrolou seu tio como testemunha para confirmar tal versão. Além disso, a quantidade de droga apreendida – 63,70 gramas de maconha – é excessiva para consumo pessoal, considerando que essa quantidade seria suficiente para confeccionar cerca de 189 cigarros de maconha, conforme bem destacado pela Procuradoria-Geral de Justiça. Soma-se a isso a existência de petrechos tipicamente utilizados para o fracionamento e embalagem de drogas, como rolos de papel filme e papel alumínio, encontrados próximos ao entorpecente. Quanto à alegação de que o papel filme seria utilizado por sua avó para guardar mantimentos, trata-se de mera alegação defensiva desacompanhada de qualquer elemento probatório. Assim, o conjunto das circunstâncias – apreensão de drogas, elevada quantia em dinheiro sem origem comprovada e materiais utilizados para preparo e embalagem de entorpecentes – é suficiente para comprovar a prática do crime de tráfico de drogas. O apelante alega ser dependente químico e requer seja realizado exame de dependência toxicológica para comprovar sua condição, argumentando que seria inimputável ao tempo dos fatos. Tal alegação não merece prosperar. O artigo 45 da Lei nº 11.343/2006 prevê que é isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. No entanto, para configuração dessa hipótese, é necessária a comprovação, mediante perícia, de que o agente era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se conforme esse entendimento, em razão da dependência química. No caso em análise, não há nos autos qualquer prova de que o apelante, ao tempo dos fatos, encontrava-se incapaz de compreender o caráter ilícito da conduta ou de se determinar de acordo com esse entendimento. Não há laudo pericial atestando a dependência química do réu e sua influência na prática do delito. Como bem destacou a Procuradoria-Geral de Justiça, a simples alegação defensiva de dependência química não é suficiente à absolvição por inimputabilidade, ainda mais em se tratando de drogadição voluntária, que não exime o réu de responsabilidade sobre seus atos. A jurisprudência é pacífica nesse sentido: A condição de consumidor de drogas não conduz necessariamente à exclusão da culpabilidade pela inimputabilidade penal.. Além disso, importante ressaltar que a condição de usuário não é incompatível com a prática de tráfico de drogas. Nesse sentido, é o entendimento pacificado deste Tribunal: "A condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006" (TJMT, ENUNCIADO Nº. 3 - INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA Nº 101532/2015, Disponibilizado no DJE Edição nº 9998, de 11/04/2017, publicado em 12/04/2017) Portanto, não há como acolher a tese defensiva de inimputabilidade por dependência química. A pretensão defensiva de desclassificação da conduta para o crime de porte para consumo pessoal (art. 28 da Lei n. 11.343/06) também não merece acolhimento. Para a caracterização do crime de tráfico ilícito de entorpecentes, não é necessária a comprovação de atos de mercancia, bastando a prática de qualquer das condutas previstas no tipo penal, entre elas, "trazer consigo" ou "ter em depósito" substância entorpecente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. No caso em análise, como já destacado anteriormente, os elementos de prova indicam claramente que a droga apreendida se destinava ao tráfico. A quantidade de entorpecente (63,70g de maconha), os petrechos encontrados (papel filme e papel alumínio) e a expressiva quantia em dinheiro (R$ 8.921,80) sem origem comprovada são indicativos suficientes da finalidade mercantil das drogas. Ademais, o §2º do artigo 28 da Lei n. 11.343/06 estabelece que, para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente. Além disso, eventual condição de usuário em nada impede o reconhecimento da prática da mercancia espúria, pois, muitas vezes, o usuário mantém o seu vício através do tráfico ilegal de drogas. Neste mesmo sentido, trago julgado deste Sodalício: [....] Descabe a desclassificação para o delito de posse de drogas para consumo próprio, previsto no art. 28 da Lei n. 11.343/2006, considerando a quantidade, forma de acondicionamento e contexto da prisão que revelam a destinação mercantil da droga, sendo irrelevante eventual condição de usuário. [...] Descabe a desclassificação para o delito do art. 28 da Lei n. 11.343/2006 quando as circunstâncias fáticas evidenciam a mercancia de entorpecentes. [...] (N.U 1010233-79.2021.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 28/04/2025, Publicado no DJE 30/04/2025) Considerando todos esses fatores, não há como reconhecer que a droga apreendida se destinava exclusivamente ao consumo pessoal do apelante. Portanto, a desclassificação pretendida não merece prosperar. No que tange à aplicação da causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei n. 11.343/06, carece de interesse recursal o apelante, uma vez que a sentença recorrida já aplicou referida minorante, reduzindo a pena em 2/3 (dois terços), fração máxima prevista no dispositivo legal. De fato, verifica-se que a magistrada sentenciante, após fixar a pena-base em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, manteve a reprimenda na segunda fase e, na terceira fase, reconhecendo que o apelante fazia jus ao redutor, por ser primário, de bons antecedentes, não integrar organização criminosa e não se dedicar à atividade criminosa, aplicou a redução no patamar de 2/3 (dois terços), resultando na pena final de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão e 167 (cento e sessenta e sete) dias-multa. Portanto, neste ponto, não há qualquer reforma a ser feita na sentença. Em relação ao direito de recorrer em liberdade, não há interesse recursal, pois, tal providência foi adotada na sentença: “[...] Considerando que o condenado responde o processo em liberdade PERMITO-LHE aguardar também em liberdade o processo e julgamento de eventual recurso. Ainda, considerando a prolação da sentença, REVOGO as medidas cautelares impostas em audiência de custódia. [...]” (Id. 195008669) Por fim, quanto ao pedido de isenção da pena de multa em razão da hipossuficiência do apelante, também não merece acolhimento. A pena de multa é parte integrante da sanção penal prevista no artigo 33 da Lei n. 11.343/06, sendo, portanto, de aplicação obrigatória e cumulativa à pena privativa de liberdade, não havendo previsão legal para sua exclusão ou diminuição em razão das condições financeiras do apenado. O artigo 33, caput, da Lei n. 11.343/06 estabelece a pena de "reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa". Trata-se de preceito secundário da norma penal que não comporta afastamento. A jurisprudência deste Tribunal é firme nesse sentido: [...] A pena pecuniária prevista no preceito secundário da norma é obrigatória e deve guardar proporcionalidade com a pena privativa de liberdade, quando aplicada cumulativamente, devendo, o magistrado, considerar, na sua fixação, além dos critérios estabelecidos nos arts. 49, caput e § 1º e 60, do Código Penal, as circunstâncias do art. 59 do referido diploma legal, respeitando, ademais, o critério trifásico de imposição de pena previsto no art. 68 do citado “Codex”, como também a situação econômico-financeira do condenado, o que foi observado pelo juízo singular. [...] (N.U 1000834-60.2023.8.11.0078, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 13/08/2024, Publicado no DJE 19/08/2024) Vale ressaltar que a condição financeira do réu já foi considerada pela magistrada sentenciante na fixação do valor de cada dia-multa, estabelecido no mínimo legal de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Ademais, eventual impossibilidade de pagamento da pena pecuniária deverá ser analisada pelo Juízo das Execuções Penais, no momento oportuno, que poderá determinar o parcelamento da multa, conforme previsão do artigo 50 do Código Penal. Portanto, não há fundamento para a pretendida isenção da pena de multa. Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, rejeito a preliminar e, no mérito, nego provimento ao recurso de apelação criminal interposto por Geraldo José de Araújo Neto, mantendo integralmente a sentença condenatória pelos seus próprios fundamentos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear