Processo nº 1008739-75.2019.8.11.0040
ID: 298490302
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1008739-75.2019.8.11.0040
Data de Disponibilização:
13/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
WASHINGTON LUIZ DE MIRANDA DOMINGUES TRANM
OAB/MG XXXXXX
Desbloquear
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008739-75.2019.8.11.0040 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008739-75.2019.8.11.0040 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Consórcio] Relator: Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [MULTIMARCAS ADMINISTRADORA DE CONSORCIOS LTDA - CNPJ: 04.124.922/0001-61 (APELANTE), WASHINGTON LUIZ DE MIRANDA DOMINGUES TRANM - CPF: 015.405.476-39 (ADVOGADO), SILVIO BORGES ARAGAO SOBRINHO - CPF: 333.335.368-70 (APELADO), LUCAS FELIPE DO NASCIMENTO MOURA - CPF: 006.999.121-99 (ADVOGADO), MULTIMARCAS ADMINISTRADORA DE CONSORCIOS LTDA - CNPJ: 04.124.922/0001-61 (APELADO), WASHINGTON LUIZ DE MIRANDA DOMINGUES TRANM - CPF: 015.405.476-39 (ADVOGADO), LUCAS FELIPE DO NASCIMENTO MOURA - CPF: 006.999.121-99 (ADVOGADO), SILVIO BORGES ARAGAO SOBRINHO - CPF: 333.335.368-70 (APELANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A direito civil e do consumidor. recurso de apelação cível. contrato de consórcio. alegação de publicidade enganosa. cerceamento de defesa por ausência em audiência virtual. improcedência dos pedidos. recurso desprovido. I. caso em exame 1. Recurso de Apelação Cível interposto em virtude da sentença proferida nos autos de Ação Rescisória de Contrato de Adesão c/c Restituição de Quantia Paga, Anulação de Cláusulas Contratuais e Indenização por Danos Morais, que julgou improcedentes os pedidos iniciais e condenou o Autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. 2. O Apelante sustenta, preliminarmente, nulidade da sentença por cerceamento de defesa decorrente de impedimento técnico que o impossibilitou de participar da audiência virtual. No mérito, alega que o Juiz incorreu em presunção indevida ao considerar que o contrato de consórcio foi previamente apresentado e devidamente explicado pela Apelada. Defende que incumbia à fornecedora o ônus de comprovar a prestação de informações claras e adequadas, conforme determina o Código de Defesa do Consumidor, e que a empresa deve responder pelos efeitos da promessa de contemplação não cumprida, a qual frustrou a legítima expectativa contratual do consumidor. Postula a nulidade do contrato, com restituição dos valores pagos e indenização por danos morais. II. questão em discussão 3. Há duas questões em discussão: (i) determinar se houve cerceamento de defesa em razão da ausência do Apelante à audiência de instrução e julgamento por falhas técnicas; (ii) estabelecer se houve vício de consentimento na contratação por promessa de contemplação imediata não concretizada, a justificar a nulidade do contrato, restituição dos valores pagos e indenização por danos morais. III. razões de decidir 4. O cerceamento de defesa configura-se quando há indevida restrição ao contraditório e à ampla defesa, o que não ocorreu no caso, pois o Termo de Audiência registra o início do ato na hora designada e a ausência do Apelante, sem comprovação idônea de impedimento técnico para acesso à sala virtual. 5. Prints de conversa via WhatsApp apresentados pelo Apelante demonstram tentativa de contato apenas após o término do prazo de tolerância, não sendo suficientes para infirmar a fé pública do Termo de Audiência. 6. O contrato de consórcio firmado entre as partes contém cláusulas claras e expressas afastando qualquer garantia de contemplação imediata, com destaque para a inexistência de promessa extracontratual e a ciência do consorciado sobre as regras de funcionamento. 7. Não houve comprovação de publicidade enganosa ou material de divulgação que induzisse o Apelante a erro razoável, inexistindo demonstração de ato doloso imputável à Apelada. 8. A frustração da expectativa de contemplação não configura, por si só, vício de consentimento ou dano moral indenizável. 9. A restituição imediata dos valores pagos não é cabível, devendo seguir as regras contratuais e a jurisprudência consolidada do STJ, que condiciona a devolução ao encerramento do grupo consorcial, no prazo de até 30 dias. 10. A ausência de prova de ilícito contratual ou falha na prestação do serviço afasta a possibilidade de indenização por danos morais. IV. dispositivo e tese Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A ausência da parte à audiência virtual, sem comprovação técnica idônea do impedimento de acesso, não configura cerceamento de defesa. 2. A existência de cláusulas contratuais claras e expressas sobre a inexistência de garantia de contemplação afasta a alegação de vício de consentimento. 3. A ausência de prova de publicidade enganosa impede a nulidade contratual e o reconhecimento de danos morais. 4. A restituição de valores em consórcio cancelado deve observar o prazo de até 30 dias após o encerramento do grupo. _________________________ Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 138 a 144; CDC, arts. 6º, III, 37, §1º; Lei nº 11.795/2008. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.119.300/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, j. 14.04.2010, DJe 27.08.2010; STJ, AgInt no AREsp 2278972/SP, Rel. Min. Raul Araújo, T4, j. 28.08.2023, DJe 01.09.2023; TJDF, Ap. Cív. 0715017-48.2023.8.07.0005, Rel. Des. Sandra Reves, j. 25.09.2024, 7ª Turma Cível. R E L A T Ó R I O RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL N. 1008739-75.2019.8.11.0040 Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por Silvio Borges Aragão Sobrinho em virtude sentença de improcedência proferida pelo Juiz 1.ª Vara Cível da Comarca de Sorriso que, nos autos da Ação Rescisória de Contrato de Adesão c/c Restituição de Quantia Paga, Anulação de Cláusulas Contratuais e Indenização por Danos Morais ajuizada em desfavor de Multimarcas Administradora De Consórcios Ltda., O Autor foi compelido a arcar com o pagamento dos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa. Em suas razões recursais, o Apelante sustenta, preliminarmente, que houve cerceamento de defesa em razão de problemas técnicos que o impediram de acessar a sala virtual da audiência de instrução e julgamento, a qual foi encerrada sem sua participação, mesmo tendo ele e seu patrono permanecido aguardando a liberação do acesso. Afirma que a penalidade de confissão aplicada pelo Juiz não observou a tolerância mínima prevista nas normas internas do TJMT, tampouco respeitou o contraditório e a ampla defesa. No mérito, sustenta que o Juiz a quo partiu de presunção indevida ao considerar que o contrato de consórcio foi previamente apresentado ao Apelante e que seu conteúdo teria sido devidamente explicado pela Apelada, o que não corresponde à realidade. Assevera que incumbia à Apelada, na qualidade de fornecedora de produtos e serviços, o ônus de demonstrar que prestou informações claras, precisas e adequadas ao consumidor, nos termos do que impõe a legislação consumerista. Alega, ainda, que deve a Apelada arcar com as consequências da promessa de contemplação feita ao Apelante, a qual jamais se concretizou, frustrando a legítima expectativa contratual do consumidor. Firme nesses argumentos, pugna pela nulidade da sentença, com o consequente retorno dos autos à origem para a reabertura da instrução processual, ou, subsidiariamente, pela reforma da sentença para que se reconheça a nulidade do contrato, com a devolução imediata dos valores pagos e a condenação da Apelada ao pagamento de indenização por danos morais. Contrarrazões no ID 276083352. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMA. SR.ª DES.ª CLARICE CLAUDINO DA SILVA (RELATORA) Egrégia Câmara: Silvio Borges Aragão Sobrinho ajuizou Ação Rescisória de Contrato de Adesão c/c Restituição de Quantia Paga, Anulação de Cláusulas Contratuais e Indenização por Danos Morais ajuizada em desfavor de Multimarcas Administradora De Consórcios Ltda., sob a alegação de que, em abril de 2019, tomou conhecimento da existência da empresa Requerida por meio de publicação na rede social Facebook. Aduziu que pretendia utilizar R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais) para aquisição de um carro e, por esse motivo, enviou mensagens via WhatsApp para o número que constava no anúncio do Facebook e, a partir de então, passou a conversar com dois vendedores, Marcos e Agda. Sustentou que ambos, tanto Marcos quanto Agda, lhe informaram que eram oriundos do Município de Lucas do Rio Verde-MT, mas compareceram no Município de Tapurá-MT, onde reside e trabalha, para que assinasse um pré-contrato. Relatou que na ocasião, Agda lhe prometeu que na 1.ª Assembleia “sairia o dinheiro, mas, posteriormente, lhe disseram que seu nome não foi incluído na lista, então, prometeram-lhe que na 2.ª Assembleia sairia o dinheiro.” Argumentou que em nenhum momento os vendedores explicaram que se tratava de um consórcio, ou que existiria abatimento da Taxa de Adesão, no total da Taxa de Administração do Consórcio. Também afirmou que jamais solicitou sua inclusão em seguro no contrato de consórcio; contudo, ainda assim foi incluído, o que caracteriza venda casada. Assegurou que os vendedores lhe disseram que, se porventura recebesse qualquer ligação dos representantes da empresa, deveria confirmar tudo o que lhe disseram, inclusive que ele receberia R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais) e não R$ 30.040,00 (trinta mil e quarenta reais). Afirmou que pagou a entrada no valor de R$ 1.510,00 (um mil, quinhentos e dez reais), por meio de depósito bancário, argumentando que os vendedores foram instruídos pela empresa a angariar clientes, de modo que “cometeu ilícito atrás de ilícito, primeiramente prometendo algo que é impossível, em sequência deixou de prestar informações sobre o abatimento da taxa de adesão (adiantamento da TA) no total da taxa de administração do consórcio e, por fim, deixou de atendê-lo e prestar contas.” De acordo com a petição inicial, “o Requerente, em sua inocência, acreditando na palavra da vendedora da Requerida, firmou o pré-contrato dia 12.04.2019, o contrato oficial dia 18.04.2019, e a partir desse ponto a conduta e discurso da Requerida mudou”. Justificou a argumentação de que ocorreu alteração de conduta e discurso, alegando que “a taxa de adesão é uma antecipação da taxa de administração, ou seja, não é um lance. Portanto, a vendedora também mentiu nessa situação: o Requerente nunca receberia o dinheiro na 1.ª Assembleia – não podendo a vendedora prometer isso -, vez que a taxa de adesão não é lance, ou seja, pagar a taxa de adesão não enseja a contemplação. Outrossim, prometendo a contemplação, mesmo que pudesse, jamais poderia cumprir tal promessa.” Relatou que depois de decorrido o prazo prometido pela vendedora, ele (Autor) não recebeu o dinheiro e que, inconformado, “entrou em contato com os vendedores”, sendo informado que, por um erro por eles cometido, não foi inserido na 1.ª Assembleia, mas Agda lhe afirmou que o dinheiro sairia na 2.ª Assembleia. Alegou que a empresa lhe induziu a erro, que acarretou “inúmeros prejuízos, materiais e morais”. Sustentou que a oferta lhe pareceu uma “oportunidade de ouro”. Afirmou que recebeu ligação dos representantes da empresa e que, na oportunidade, “tirou algumas dúvidas, se realmente o que a vendedora havia falado era verdade, e disseram-lhe que não, que os vendedores não poderiam prometer a contemplação na 1.ª Assembleia”. Aduziu que tais atitudes não podem ser permitidas e requereu, em liminar, a suspensão dos pagamentos, ou o depósito, em Juízo, das parcelas vincendas, e a suspensão do funcionamento da empresa. No mérito, requereu a rescisão do Contrato de Participação em Grupo de Consórcio, por Adesão e Regulamento Geral do Consórcio, sob a tese de que foi induzido a erro mediante falsa promessa da vendedora da empresa (publicidade enganosa e abusiva); bem como pugnou pela decretação de nulidade das cláusulas contratuais que estão em desconformidade com a legislação vigente. O Autor ainda pediu a nulidade da Taxa de Administração e da Cláusula 44, incluindo seus incisos e parágrafos, diante da falta de manifestação de vontade livre; o reconhecimento de venda casada e, por fim, requereu a condenação da empresa à restituição do valor de R$ 1.510,00 (um mil e quinhentos e dez reais) e ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Para comprovar o alegado, o Autor juntou o Contrato de Participação em Grupo de Consórcio, por Adesão e Regulamento Geral de Consórcio; o Contrato de Participação em Grupo de Consórcio, Por Adesão e Regulamento Geral de Consórcio; Boletim de Ocorrência lavrado em 23/08/2019; “Carta de Cancelamento” redigida a mão pelo Autor; comprovante de depósito bancário no valor de R$ 1.510,00 (um mil, quinhentos e dez reais); cópia de pedido de instauração de procedimento ministerial subscrito pelo advogado do consumidor; fotografias de tela de computador noticiando as reclamações de outros consumidores quanto à empresa no Facebook; fotografia do PJE onde constam as ações ajuizadas por terceiros em face da empresa; fotografia do ranking de reclamações de consumidores em websites, inclusive do Banco Central do Brasil. O pedido liminar foi parcialmente deferido, tão-somente para suspender a exigibilidade e cobrança das parcelas vincendas. Apresentada a Contestação e impugnada a peça de defesa, sobreveio a sentença de parcial procedência. O juiz rescindiu o contrato e condenou a empresa Requerida à restituição dos valores efetivamente pagos e comprovados, com correção monetária pelo INPC desde o desembolso e juros legais a partir da citação, bem como ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), atualizados pelo INPC a partir da publicação da sentença e acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês desde a citação. Por fim, a empresa Requerida foi condenada a arcar com as custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação. Inconformadas, ambas as partes interpuseram Recurso de Apelação Cível, o qual foi distribuído à minha Relatoria. Na sessão de julgamento realizada em 31/03/2021, a sentença foi anulada, à unanimidade, nos seguintes termos (Id. 82067456): [...] Diante do exposto, dou parcial provimento Recurso de Apelação, a fim de acolher a tese da empresa Apelante de que não há provas de que tenha vendido cota de consórcio com garantia de data de contemplação, bem como de que a Julgadora sentenciante fundamentou seu entendimento em documentos unilaterais, que não dizem respeito ao caso em concreto, pois o fato de existir inúmeros casos semelhantes, não pode servir de fundamento para a condenação imposta à Apelante. Acolho o pedido subsidiário formulado nas contrarrazões, anulo a sentença e determino o retorno dos autos à instância de origem, a fim de que seja determinada a produção de prova necessária ao esclarecimento dos fatos. Com o retorno dos autos ao Juízo de origem, as partes foram regularmente intimadas a especificar as provas que pretendiam produzir. O Autor requereu a oitiva de duas testemunhas (Id. 276082365). A exceção de suspeição arguida pela empresa Requerida foi rejeitada (Id. 276082366), decisão esta que foi mantida por este Tribunal no julgamento do Incidente n. 1010440-21.2024.8.11.0000 (Id. 276082375). O Juiz designou audiência de instrução e julgamento para 10/12/2024. O Autor pleiteou que a solenidade fosse realizada na modalidade telepresencial, em razão de as testemunhas residirem no Município de Sorriso/MT (Id. 276082379). A Requerida, por sua vez, requereu o depoimento pessoal do Autor e anuiu com a realização da audiência por videoconferência. O Autor foi devidamente intimado, em 03/12/2024, para comparecer à audiência designada, contudo, deixou de participar do ato (Id. 276082390). Dois dias após a solenidade, o Autor justificou sua ausência alegando que não conseguiu acessar o link informado nos autos e que não lhe foi permitido ingressar na sala virtual. Disse que, inicialmente, acreditou que o atraso decorria da realização de outra audiência, situação comum no cotidiano forense. Assim, aguardou-se até as 14h00 e, em seguida, efetuou contato com o Gabinete, ocasião em que foi informado de que a solenidade já havia sido encerrada. Afirmou que uma de suas testemunhas estava na sala virtual, embora com áudio e câmera desligados, e que, em razão da ausência do Autor, não lhe foi facultada a devida oitiva. O patrono do Autor declarou, sob sua responsabilidade profissional, a autenticidade dos documentos anexados (declaração de próprio punho do autor e da testemunha, print de conversa de whatsapp, registros de presença na sala de audiência, com a indicação de que aguardavam autorização de entrada), os quais comprovam que esteve em contato com seu constituinte durante o período em que aguardavam a liberação de acesso à sala virtual, dentro da data e horário designados para a audiência. Diante dos fatos expostos, requereu a decretação da nulidade do ato e a consequente redesignação da audiência de instrução e julgamento. Na sentença, o Juiz rejeitou o pedido de redesignação de audiência, tendo em vista a falta de provas das alegações discorridas pelo Autor. As preliminares arguidas pela Requerida foram rejeitadas. No mérito, os pedidos iniciais foram julgados improcedentes. De conseguinte, o Autor foi compelido a arcar com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa. Neste Apelo, Silvio Borges Aragão Sobrinho pugna pela nulidade da sentença por cerceamento de defesa e, no mérito, pela reforma integral do decisum a fim de julgar procedente os pedidos iniciais. VOTO PRELIMINAR (CERCEAMENTO DE DEFESA) O Recorrente alega que houve cerceamento de defesa em razão de problemas técnicos que o impediram de acessar a sala virtual da audiência de instrução e julgamento, a qual foi encerrada sem sua participação, mesmo tendo ele e seu patrono permanecido aguardando a liberação do acesso. Afirma que a penalidade de confissão aplicada pelo Juiz não observou a tolerância mínima prevista nas normas internas do TJMT, tampouco respeitou o contraditório e a ampla defesa. A tese, no entanto, não merece prosperar. O cerceamento de defesa, enquanto vício processual, caracteriza-se pela limitação indevida ao exercício do contraditório e da ampla defesa, nos moldes do art. 5º, inciso LV, da Constituição da República. Ocorre, por exemplo, quando se nega injustificadamente à parte a possibilidade de produzir prova essencial ao deslinde da controvérsia, afetando o equilíbrio da relação processual e comprometendo a validade do julgamento. No caso, os autos demonstram que não houve qualquer violação ao devido processo legal. O Termo de Audiência lavrado no Id. 276082390 registra, de forma clara e objetiva, que a solenidade teve início às 13h30min do dia 10/12/2024, conforme previamente designado, e que foi aguardado o comparecimento da parte autora por 15 minutos. Findo esse prazo, e constatada sua ausência, o Juiz deu por encerrada a audiência. Embora o Apelante insista na tese de que aguardava liberação de acesso à sala virtual desde as 13h20min, os documentos por ele acostados, em especial os prints da conversa mantida via aplicativo WhatsApp, supostamente com o seu advogado, desautorizam tal alegação. Isso porque, o diálogo que menciona sua tentativa de acesso somente tem início às 14h09min, ou seja, após o decurso do prazo de tolerância de 15 minutos. Ademais, a declaração unilateral firmada de próprio punho pelo Autor/Apelante não possui força probatória suficiente para infirmar o conteúdo do Termo de Audiência, documento revestido de fé pública, firmado por servidor do juízo e dotado de presunção de veracidade. Cumpre registrar, ainda, que o jurisdicionado não pode se beneficiar da própria conduta omissiva ou desidiosa. O dever de diligência impõe à parte litigante a responsabilidade de se organizar adequadamente para comparecer à audiência e garantir o cumprimento dos atos processuais, inclusive aqueles realizados em meio virtual. Por fim, não há nos autos qualquer comprovação técnica idônea, como por exemplo logs de acesso, e-mails automáticos de erro ou manifestações tempestivas durante o período da audiência, que corrobore a versão sustentada pelo Apelante. Dessa forma, ausente qualquer vício capaz de macular o regular desenvolvimento do processo ou de comprometer o direito de defesa da parte, rejeito a preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de defesa. VOTO (MÉRITO) O Apelante argumenta que houve vício de consentimento na celebração do contrato de consórcio, uma vez que a contratação se deu com base em publicidade enganosa, mediante a promessa de contemplação imediata, jamais efetivada. Requer, pois, reforma da sentença para que se reconheça a nulidade do contrato, com a devolução imediata dos valores pagos e a condenação da Apelada ao pagamento de indenização por danos morais. O cerne da controvérsia repousa na alegação de vício de consentimento na celebração de contrato de consórcio, decorrente de suposta publicidade enganosa (contemplação imediata). Todavia, os elementos constantes dos autos não corroboram essa versão. O vício de consentimento, nos termos dos arts. 138 a 144 do Código Civil, caracteriza-se pela presença de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude, capazes de comprometer a liberdade de manifestação de vontade da parte contratante. Com efeito, nos contratos de consórcio o vício de consentimento configura-se quando ficar demonstrado que o consumidor foi induzido a aderir ao contrato com base em falsas premissas, tais como a promessa de contemplação imediata, inexistente nos termos contratuais. De acordo com o “Contrato de Participação em Grupo de Consórcio, por Adesão e Regulamento Geral de Consórcio n. 506501”, encartado no Id 70052967, devidamente assinado por ambas as partes e duas testemunhas (Marcos e Agda), constam cláusulas claras, redigidas de forma objetiva, que descrevem a natureza do contrato, os direitos e deveres das partes, e as condições de participação no grupo de consórcio. Logo na Cláusula Primeira, o instrumento estabelece expressamente que se trata de contrato de adesão ao grupo de consórcio n. 2032, administrado pela Apelada. A Cláusula Quarta estipula a obrigação do consorciado de efetuar as contribuições mensais e detalha os encargos aplicáveis a consorciados admitidos em grupo já em andamento. A Cláusula Sexta prevê a possibilidade de cobrança, no ato da adesão, de parte da taxa de administração, denominada “taxa de adesão”, e da primeira prestação do consórcio. Mais relevante ainda são as disposições contidas na Cláusula Octogésima Terceira, na qual a Apelada esclarece de forma inequívoca que a contemplação ocorrerá por sorteio, lance vencedor ou encerramento do grupo, não havendo qualquer garantia de data para a contemplação. Já a Cláusula Octogésima Quarta reforça essa disposição, afirmando que nenhuma promessa ou condição fora dos limites contratuais foi feita ao consorciado, que declarou ter lido e compreendido todas as regras do contrato, Verbis: CLÁUSULA OCTOGÉSIMA TERCEIRA - Com a finalidade precípua de resguardar interesses recíprocos e cabal observância dos normativos oficiais do sistema de consórcio, bem como em atendimento ao preceituado nos Artigos 46 e 54, da Lei n° 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), a ADMINISTRADORA esclarece e alerta ao CONSORCIADO que, conforme previsto neste regulamento, as contemplações serão realizadas por meio de sorteios gerais, através de lances vencedores e por encerramento do grupo. Em função disso, a ADMINISTRADORA esclarece que não existe presente garantia de data de contemplação, uma vez que, conforme previsto no instrumento, estas poderão ocorrer tanto no início, no transcorrer, ou até ao CONSORCIADO término do grupo. Na oportunidade, a ADMINISTRADORA esclarece também ao quer que, qualquer promessa ou proposta eventualmente feita por quem que seja e que não se enquadre neste instrumento, não terá nenhuma validade. CLÁUSULA OCTOGÉSIMA QUARTA - O CONSORCIADO declara que nenhuma promessa ou extracontratual e extra normativos do sistema de consórcios lhe foi feita. Informa que leu atentamente todas as cláusulas e condições do presente instrumento, obtendo assim, todas as informações necessárias para o perfeito conhecimento das regras de funcionamento do consórcio e que autoriza sua contabilização definitiva na empresa, sem nenhuma restrição. Tais cláusulas afastam, de forma categórica, a tese de promessa de contemplação imediata. A alegação do Apelante revela, ao que parece, apenas um equívoco de interpretação contratual e frustração por não ter sido contemplado, o que não configura induzimento doloso por parte da empresa. Nos termos do art. 37, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, considera-se enganosa a publicidade que induz o consumidor a erro sobre as características, qualidades ou condições de um produto ou serviço. Entretanto, não há nos autos qualquer comprovação de material publicitário apto a induzir em erro razoável o consumidor. Nenhum folheto, anúncio, gravação ou vídeo foi apresentado, tampouco há registro de promessa de contemplação imediata atribuída à Apelada. Aliás, na última página do contrato assinado pelas partes consta a seguinte anotação: “ATENÇÃO: NÃO HÁ GARANTIA DE DATA DE CONTEMPLAÇÃO”. O contrato assinado pelo Apelante é cristalino ao afastar qualquer garantia de contemplação, esclarecendo que a contemplação depende de sorteio, lance ou encerramento do grupo. Há, inclusive, declaração expressa de ciência quanto à inexistência de promessa de contemplação imediata. Logo, os elementos constantes dos autos infirmam a tese recursal, revelando que a contratação ocorreu com observância aos deveres de informação e transparência impostos pelo Código de Defesa do Consumidor. No que se refere a restituição de valores, a jurisprudência pacífica do STJ, em sede de recurso repetitivo (REsp 1.119.300/RS), firmou orientação no sentido de que a restituição das parcelas pagas por consorciado desistente ou excluído deve ocorrer no prazo de até 30 (trinta) dias após o encerramento do grupo. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONSÓRCIO. DESISTÊNCIA. DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PAGAS PELO CONSORCIADO. ENCERRAMENTO DO GRUPO. APLICAÇÃO DA TESE FIXADA EM SEDE DE REPETITIVO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1 . "É devida a restituição de valores vertidos por consorciado desistente ao grupo de consórcio, mas não de imediato, e sim em até trinta dias a contar do prazo previsto contratualmente para o encerramento do plano" (REsp 1.119.300/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Segunda Seção, julgado em 14/4/2010, DJe de 27/8/2010). Precedentes. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 2278972 SP 2023/0009763-2, Relator.: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 28/08/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/09/2023). No caso concreto, não houve falha na prestação do serviço pela administradora, tampouco demonstração de nulidade absoluta do contrato. Ao contrário, a hipótese é de desistência voluntária do consorciado Apelante, que, ao optar pela rescisão, deve se submeter às regras contratuais quanto à devolução de valores. No que se refere a indenização por danos morais, oportuno registrar a indispensabilidade da demonstração do ato ilícito imputável ao fornecedor e da lesão efetiva e relevante à esfera da personalidade do consumidor. Frustração de expectativa contratual, por si só, não configura dano moral indenizável. O conjunto fático probatório não comprova qualquer conduta dolosa ou abusiva da Apelada, tampouco exposição vexatória, humilhação ou abalo significativo à imagem ou honra do Apelante. O que se vislumbra é apenas uma interpretação subjetiva e equivocada das regras contratuais e a natural expectativa de contemplação, inerente a todo contrato de consórcio. Tais fatos não se revestem de ilicitude, tampouco ensejam reparação civil. APELAÇÃO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE CONHECIMENTO. CONTRATO DE CONSÓRCIO. DESISTÊNCIA. RESCISÃO. RESTITUIÇÃO IMEDIATA DOS VALORES PAGOS. NÃO CABIMENTO. CONTRATO ANTERIOR À LEI N. 11.795/08. RECURSO ESPECIAL N. 1.119.300/RS. PRAZO DE ATÉ 30 (TRINTA) DIAS APÓS O ENCERRAMENTO DO GRUPO. APLICABILIDADE. CLÁUSULA PENAL. PREJUÍZO AO GRUPO. NÃO COMPROVADO. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL. DATA DE CADA DESEMBOLSO. DANOS MORAIS. NÃO CONFIGURADOS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA REDISTRIBUÍDOS. [...] 6.Não evidenciada a falha na prestação do serviço ofertado pela pessoa jurídica apelante, tampouco dano moral propriamente dito suportado pelo apelado, inexistem os pressupostos necessários para procedência do pleito indenizatório formulado. Reforma da sentença que se impõe. 7. Recurso conhecido e parcialmente provido. Ônus de sucumbência redistribuídos. (TJ-DF 07150174820238070005 1926836, Relator.: SANDRA REVES, Data de Julgamento: 25/09/2024, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 14/10/2024) Feitas essas considerações, nego provimento ao recurso e majoro os honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) do valor atualizado da causa, cuja exigibilidade mantem-se suspensa por ser beneficiário da justiça gratuita. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear