Processo nº 1005698-16.2025.8.11.0000
ID: 314801353
Tribunal: TJMT
Órgão: Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo
Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL
Nº Processo: 1005698-16.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DERCIO LUPIANO DE ASSIS FILHO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1005698-16.2025.8.11.0000 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Prescrição e Decadên…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1005698-16.2025.8.11.0000 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Prescrição e Decadência, Índice de 11,98%] Relator: Des(a). MARCIO VIDAL Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] Parte(s): [MUNICIPIO DE JACIARA - CNPJ: 03.347.135/0001-16 (EMBARGADO), MARIA MADALENA CAIXETA TAVARES DA SILVA - CPF: 836.081.171-72 (EMBARGANTE), DERCIO LUPIANO DE ASSIS FILHO - CPF: 217.082.898-28 (ADVOGADO), DELCIO BARBOSA SILVA - CPF: 226.123.538-01 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCIO VIDAL, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, ACOLHEU OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, DES. MÁRCIO VIDAL. Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. ACORDO HOMOLOGADO JUDICIALMENTE. TÍTULO ILÍQUIDO. INÉRCIA DO MUNICÍPIO. PRESCRIÇÃO EXECUTÓRIA AFASTADA. EMBARGOS ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. I. CASO EM EXAME 1. Embargos de Declaração opostos por Maria Madalena Caixeta Tavares da Silva contra acórdão que dera provimento a agravo de instrumento interposto pelo Município de Jaciara, reconhecendo a prescrição da pretensão executória de valores decorrentes de acordo judicial que tratava de diferenças salariais oriundas da conversão da moeda URV. Sustenta a embargante a existência de contradição e omissão na decisão, notadamente quanto à exigibilidade do título e ao termo inicial da prescrição. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se o título judicial exequendo se tornou exigível, considerando a omissão da Administração Pública na prática de ato essencial pactuado em acordo judicial; (ii) definir se a prescrição da pretensão executória pode ser reconhecida a partir do trânsito em julgado da sentença homologatória, mesmo diante da ausência de liquidação decorrente de inércia do Município. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Os embargos de declaração constituem instrumento adequado para sanar vícios formais da decisão judicial, como omissão, obscuridade ou contradição, admitindo-se, em caráter excepcional, a atribuição de efeitos infringentes quando a modificação do julgado é consequência necessária da correção do vício apontado. 4. O acordo homologado judicialmente previu que a apuração dos valores retroativos dependeria da elaboração e conferência de Tabela Prática Única por contadores indicados pelas partes, sendo essa conferência condição essencial à liquidação do título e, portanto, à exigibilidade da obrigação. 5. A omissão do Município em cumprir a obrigação de conferir e assinar a Tabela inviabilizou a liquidação do título executivo, impedindo a fluência do prazo prescricional, nos termos do princípio da actio nata e da jurisprudência consolidada do STJ e do próprio TJMT. 6. O reconhecimento da prescrição com base no trânsito em julgado da sentença homologatória ignora que a exigibilidade da obrigação não se aperfeiçoou por culpa exclusiva do devedor, o que afasta a contagem automática do prazo prescricional. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Embargos de Declaração acolhidos com efeitos infringentes. Tese de julgamento: 1. O prazo prescricional da pretensão executória de título judicial ilíquido somente se inicia após a efetiva liquidação, quando aperfeiçoada sua exigibilidade. 2. A omissão da Fazenda Pública na prática de ato pactuado que condiciona a liquidação do título impede a fluência do prazo prescricional. 3. Não se pode imputar à parte exequente a prescrição da pretensão executória quando a mora decorre exclusivamente da inércia do devedor público. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXVI; CPC/2015, arts. 513, § 1º, 924; CC/2002, art. 206, § 5º, I; Decreto 20.910/1932, art. 1º; Súmula 150/STF. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1983153/MA, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 04.05.2022; STJ, AgInt no REsp 2014973/RS, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 29.06.2023; TJMT, N.U 1031073-53.2024.8.11.0000, Rel. Des. Luiz Octavio Ribeiro, j. 05/02/2025; TJMT, N.U 1034908-49.2024.8.11.0000, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 26/05/2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. MÁRCIO VIDAL Egrégia Câmara, Trata-se de Embargos de Declaração opostos por Maria Madalena Caixeta Tavares da Silva, contra o acórdão que deu provimento ao Recurso de Agravo de Instrumento interposto pelo Município de Jaciara. A Embargante alega que o acórdão incorreu em contradição ao afirmar, de um lado, que não houve protocolo de documento hábil para interromper a prescrição e que a apuração do montante devido não estaria condicionada a providência do devedor, e, de outro, reconhecer que o título executivo era ilíquido por depender de condição expressa prevista no acordo para sua exigibilidade. Aduz que o sistema “Supportsicpar” utilizado para preenchimento da denominada "Tabela Prática Única" opera de modo remoto, sendo tal planilha elaborada pela Exequente com posterior conferência e assinatura pelos contadores do Município, conforme pactuado no acordo homologado judicialmente. Argumenta que não havia previsão de protocolo formal de tais documentos, uma vez que o fluxo de validação e tramitação da tabela é interno e eletrônico, restando evidente que a exequente cumpriu sua parte no acordo, enquanto o Município quedou-se inerte quanto à conferência e assinatura. Defende que a validade do título executivo dependia da realização de ato de responsabilidade do Município (conferência e assinatura da tabela), condição expressamente prevista no acordo homologado judicialmente. Por isso, a suposta iliquidez não lhe poderia ser atribuída, mas sim à inércia do Município, que inviabilizou a conclusão da etapa de liquidação da obrigação e, consequentemente, o início da contagem do prazo prescricional. Reforça que o acordo judicial previa duas etapas: a primeira, relativa à incorporação de percentual aos vencimentos; e a segunda, atinente ao pagamento dos valores retroativos, condicionada à elaboração e conferência da Tabela Prática Única. Sustenta que apenas ingressou com o cumprimento de sentença após a tentativa infrutífera de solução administrativa, o que afasta qualquer desídia de sua parte. Ressalta, ainda, que há omissão no acórdão quanto à fixação do termo inicial da prescrição, defendendo que este não poderia ser fixado na data do trânsito em julgado da sentença homologatória (29/10/2018), pois àquela altura não havia ciência inequívoca de descumprimento da obrigação por parte do Município. Acentua que a pretensão somente nasceu (actio nata) quando restou configurada a resistência do ente público ao cumprimento da obrigação, sendo inaplicável, portanto, a tese de fluência automática do prazo prescricional a partir do trânsito em julgado. Por fim, requer o acolhimento dos embargos de declaração, com a atribuição excepcional de efeitos infringentes, para que sejam supridas as omissões e eliminadas as contradições apontadas, reconhecendo-se a ausência de prescrição da pretensão executória. O Recorrido apresentou contrarrazões (id. 290181360). É o relatório. V O T O EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (RELATOR) Egrégia Câmara, Como explicitado no relatório, trata-se de Embargos de Declaração opostos por Maria Madalena Caixeta Tavares da Silva, contra o acórdão que deu provimento ao Recurso de Agravo de Instrumento interposto pelo Município de Jaciara. Ab initio, é importante considerar que cada recurso previsto no ordenamento jurídico pátrio possui objetivo específico, e os Embargos de Declaração se prestam a integrar, ou aclarar, as decisões judiciais em sua totalidade, quando nestas existirem pontos omissos, obscuros ou contraditórios. Caso não existam, na decisão judicial embargada, tais defeitos de forma, não há interpor embargos de declaração, pois estes não devem ser utilizados para reexame e novo julgamento do que já fora decidido, dado que, para tanto, há o recurso próprio previsto na legislação. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já se posicionou, reiteradas vezes, afirmando que os embargos de declaração consubstanciam-se no instrumento processual destinado à eliminação, no decisum embargado, de contradição, obscuridade ou omissão, sobre tema, cujo pronunciamento se impunha ao Tribunal, não se prestando para promover a reapreciação do julgado (Precedente: EDcl no AgInt no AREsp n. 2.330.813/DF, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 18/3/2024, DJe de 2/4/2024). Cumpre consignar que a doutrina e a jurisprudência admitem, em situações excepcionalíssimas, a modificação dos julgados, mediante a simples oposição dos declaratórios, conferindo-lhes efeitos modificativos ou infringentes. Entrementes, tal admissibilidade é restrita aos casos de correção de patente erro material ou quando, suprida uma omissão, ou extirpada uma contradição, a modificação for consequência lógica e inevitável do saneamento dos referidos vícios. No caso em apreço, a Embargante apontou a existência de contradição no acórdão proferido por esta Câmara Julgadora. Razão assiste à Embargante. Depreende-se dos autos de origem que Maria Madalena Caixeta Tavares da Silva ajuizou demanda em face do Município de Jaciara, postulando a incorporação de diferenças remuneratórias decorrentes da conversão da moeda Cruzeiro Real para Unidade Real de Valor – URV. Em 17 de outubro de 2018, foi realizada audiência de conciliação, oportunidade em que as partes celebraram acordo nos seguintes termos: “[...] O Município de Jaciara, representado pelo atual Prefeito Municipal Abduljabar Galvin Mohammad, se obriga a efetiva incorporação salarial da parte autora (servidor público efetivo), no percentual de 7,21% (sete vírgula vinte e um por cento), conforme laudos periciais judiciais homologados dos processos cód. 55107, 55163, 55166, 55167, 55340 e 55066, referente à perda salaria dos servidores municipais quando da conversão da moeda URV, independente de eventual reestruturação de carreira ou outros critérios pessoais. A referida incorporação será realizada da seguinte forma: a) 3% (três por cento) em outubro de 2018 (folha outubro/2018); e b) 4,21% (quatro vírgula vinte e um por cento) em julho de 2019 (folha de julho/2019). O não cumprimento da obrigação no prazo pelo requerido implicará no vencimento antecipado da incorporação de todo o percentual de 7,21%. Em relação aos valores pretéritos, as partes concordam em ser elaborada uma TABELA PRÁTICA ÚNICA para constatação dos valores atrasados, solicitada anteriormente pelas partes autoras e Sindicatos dos Servidores Municipais ao contador Benjamim Cristobal Mardine Acuna, que confeccionará a TABELA PRÁTICA ÚNICA com a participação e aprovação dos Contadores Públicos Municipais Francisca Moreira do Nascimento e Ivan de Almeida Silva, sendo que esta tabela considerará a correção monetária pelo IPCA-E, a partir dos vencimentos salariais e juros moratórios de 6% aa, a partir da citação, considerada a prescrição quinquenal do ajuizamento (período reconhecido na sentença de mérito de piso ou do e. Tribunal de Justiça, se alterado). Estando a Tabela Prática Única devidamente preenchida conforme ficha financeira do servidor, conferida e assinada pelos contadores das partes, dispensa-se a fase da impugnação da Fazenda Pública, prosseguindo-se com a fase da expedição de RPV (requisitório de pequeno valor) ou precatório, observando-se o art. 100 da CF e Lei Municipal n. 1.734/2016 (RPV até 10 salários mínimos), após intimação para eventual compensação. Autoriza-se desde já a complementação do RPV ou precatório dos valores devidos desde a homologação deste acordo até a implementação integral do percentual em julho de 2019, nos mesmos termos da utilização da Tabela Prática Única. [...]”. (1ª Instância, id. 157981392). Em suma, convencionou-se que, reconhecida a existência de diferenças remuneratórias, o Município de Jaciara promoveria a incorporação salarial do percentual de 7,21% (sete inteiros e vinte e um centésimos por cento) à remuneração da autora. Quanto aos valores retroativos relativos aos últimos cinco anos, ficou ajustado que, após a elaboração da Tabela Prática Única com a devida atualização monetária, proceder-se-ia à expedição de Requisitório de Pequeno Valor (RPV) ou de precatório, conforme o montante apurado. Posteriormente, em 29 de outubro de 2018, foi proferida sentença homologatória do acordo celebrado entre as partes, com a consequente extinção do feito, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso III, do Código de Processo Civil (1ª Instância, id. 157981392, p. 169) e, na data de 20 de fevereiro de 2019 certificou-se o trânsito em julgado da decisão (1ª Instância, id. 157981392, p. 172). No dia 12 de junho de 2024, Maria Madalena Caixeta Tavares da Silva, ora Recorrida, requereu o cumprimento de sentença (1ª Instância, id. 158713083), sob o fundamento de descumprimento das obrigações previstas no acordo homologado, consignando, em síntese, que: “[...] em que pese o Executado ter cumprido com a primeira obrigação, efetuando a incorporação do percentual de 7,21% (sete virgula e vinte e um por cento) nos vencimentos dos servidores municipais efetivos e aposentados, deixou de cumprir com a segunda obrigação assumida. Dessa forma, o presente cumprimento de sentença tem por objetivo exigir do Município de Jaciara o cumprimento da sua obrigação de conferir a TABELA PRÁTICA ÚNICA, no intuito de possibilitar o estabelecimento do valor efetivamente devido ao(a) Exequente, bem como o valor dos honorários de sucumbência, para fins de expedição de Requisição de Pequeno Valor – RPV ou Precatório. Aqui cumpre esclarecer que a TABELA PRÁTICA ÚNICA foi confeccionada, preenchida e assinada pelo(a) Exequente e submetida ao Executado APENAS para conferência das informações nela lançadas e para assinatura, porém, em mais de uma ocasião, o Município se manteve inerte e a que tudo indica não possuiu interesse em cumprir com a obrigação assumida ensejando a presente DENÚNCIA POR DESCUMPRIMENTO DE ACORDO. [...]”. (1ª Instância, id. 158713083). O Município de Jaciara apresentou impugnação ao cumprimento de sentença, alegando a ocorrência da prescrição quinquenal da pretensão executória relativa aos valores retroativos da URV. O Juízo de origem, contudo, rejeitou a impugnação apresentada pelo Município, nos seguintes termos: “[...] As dívidas passivas das Fazendas Públicas e todo e qualquer direito ou ação contra elas, independente da natureza, prescrevem em 05 (cinco) anos (artigo 1º do Decreto n. 20.910/1932), prazo também aplicável à pretensão executória do cumprimento de sentença (súmula 150 do STF). O título judicial exequendo, ao homologar acordo celebrado entre as partes, reconheceu a exigibilidade de obrigação de fazer, assim, o caso não se enquadrou dentre aqueles que se exige fase prévia de liquidação de sentença para posterior execução (artigo 509 do CPC), razão pela qual, o termo inicial da pretensão executória é sim do trânsito em julgado da sentença, in casu ocorrido na data da prolação da sentença, pois, no acordo, as partes desistiram do prazo recursal. [...] Por outro lado, observando-se a alegação do executado acerca da ocorrência da prescrição executória, considerando a data que a sentença transitou em julgado e a alegação da parte exequente de que o prazo de prescrição começa a contar somente a partir do cumprimento da obrigação pelo Município, o que não ocorreu neste caso, tenho que esta última possui razão. Explico. Analisando os autos, verifica-se que as partes concordaram que a Tabela Prática Única seria preenchida por cada servidor e, em seguida, a municipalidade a conferiria e assinaria, dispensando a fase de impugnação e avançando para a expedição de RPV/precatório. No entanto, até o presente momento, o Município não cumpriu com a obrigação assumida, o que gerou a necessidade de iniciar a fase do cumprimento da sentença. É importante ressaltar que a parte exequente não é responsável pela inércia do Município, pois cumpriu a sua parte do acordo ao inserir os dados no sistema SICPAR e está aguardando a conferência por parte do Município. Portanto, o Município não pode se beneficiar de sua própria inércia. [...] Ante ao exposto, rejeito a impugnação ao cumprimento de sentença apresentada, pois não há se falar em prescrição. Prosseguindo, inexistindo impugnação ao cálculo apresentado pela credora, procedo a sua homologação e precluso o presente pronunciamento, determino que se proceda a expedição de RPV, observando-se o disposto no Provimento nº. 20/2020-CM. Em seguida, efetuado o levantamento dos valores e certificado nos autos, voltem os autos conclusos para extinção. [...]”. Pois bem. No que se refere à prescrição, cumpre destacar o teor da Súmula 150 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual “prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação”. Ademais, é firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, nas hipóteses em que a sentença exequenda não possui liquidez, a fase de liquidação reveste-se de natureza cognitiva, de modo que o prazo prescricional para a propositura da execução somente tem início após a efetiva conclusão daquela etapa processual, quando aperfeiçoado o título executivo judicial. No caso em apreço, o acordo homologado judicialmente estabeleceu que a apuração dos valores pretéritos seria realizada por meio da elaboração de uma Tabela Prática Única, a ser confeccionada por profissional de contabilidade indicado pelas partes, com a necessária participação e aprovação dos contadores públicos municipais. Contudo, o Município quedou-se inerte quanto ao cumprimento dessa obrigação, obstando o regular prosseguimento da fase subsequente de liquidação e execução do título. Fica evidenciado, ainda, que as partes estipularam que a Tabela Prática Única seria inicialmente preenchida por cada servidor, e, em seguida, a municipalidade realizaria a conferência e assinatura, sem necessidade de impugnação, viabilizando diretamente a expedição de RPV/precatório. O descumprimento dessa obrigação pelo ente público ensejou, assim, a necessidade de instauração da fase de cumprimento de sentença. Desse modo, não se pode imputar à parte Embargante a inércia que, em verdade, decorre exclusivamente do comportamento omissivo do Município, o qual descumpriu os termos do acordo e impediu a efetivação da obrigação. Neste sentido, o entendimento deste Sodalício: AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA. EXIGIBILIDADE CONDICIONADA A ATO DA FAZENDA PÚBLICA. OMISSÃO INJUSTIFICADA. BOA-FÉ OBJETIVA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Agravo interno interposto contra decisão monocrática que negou provimento ao agravo de instrumento, o qual contestava decisão que afastou a prescrição da pretensão executória relativa a diferenças remuneratórias decorrentes da conversão de vencimentos para URV, com base em sentença transitada em julgado no ano de 2018. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se o prazo prescricional para a execução da sentença judicial deve ser contado a partir do trânsito em julgado ou apenas após a prática de ato indispensável da Fazenda Pública — a conferência da Tabela Prática Única, prevista como condição do acordo homologado judicialmente. III. Razões de decidir 3. A fluência do prazo prescricional para a execução de sentença ilíquida, cuja exigibilidade depende da prática de atos adicionais, inicia-se somente com o aperfeiçoamento do título executivo. 4. No caso, a conferência dos cálculos pelo Município de Jaciara constituía condição essencial para a exigibilidade da obrigação, o que não foi realizado, impossibilitando a responsabilização do credor por inércia a que não deu causa. 5. O comportamento omissivo da Fazenda Pública obsta a contagem do prazo prescricional e impede que esta se beneficie de sua própria torpeza, em respeito à boa-fé processual. IV. Dispositivo e tese 6. Agravo interno desprovido. Tese de julgamento: "1. O prazo prescricional da pretensão executória de sentença ilíquida inicia-se apenas com o aperfeiçoamento do título, mediante a prática dos atos indispensáveis à sua liquidação. 2. É incabível alegação de prescrição quando a exigibilidade da obrigação depende de conduta omissiva da Fazenda Pública, que impede o implemento da condição pactuada no título judicial." Dispositivos relevantes citados: CC/2002, art. 206, § 5º, I; CPC/2015, art. 513, § 1º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1983153/MA, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe 04.05.2022; STJ, AgInt no AREsp 1986341/MA, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe 27.05.2022; STF, Súmula nº 150. (N.U 1031144-55.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 18/06/2025, Publicado no DJE 18/06/2025). DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERENÇAS SALARIAIS. CONVERSÃO DA REMUNERAÇÃO EM URV. PRAZO PRESCRICIONAL PARA EXECUÇÃO. TERMO INICIAL. OMISSÃO DA FAZENDA PÚBLICA. INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. AGRAVO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto pelo Município de Jaciara contra decisão interlocutória que rejeitou impugnação ao cumprimento de sentença, afastando a alegação de prescrição da pretensão executória e determinando a expedição de RPV. A ação subjacente trata da cobrança de diferenças salariais decorrentes da conversão da remuneração em URV, reconhecida por sentença transitada em julgado, com determinação de incorporação do percentual de 7,21% aos vencimentos dos servidores municipais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em definir se a pretensão executória da parte exequente está prescrita, considerando a alegação do Município de que transcorrera o prazo quinquenal para o cumprimento da sentença. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O prazo prescricional para a execução da sentença se inicia com a liquidação do título, sendo inaplicável quando a própria Fazenda Pública impede a concretização da fase executória por meio de omissão. 4. O acordo homologado previa a confecção de uma Tabela Prática Única, a ser preenchida pelos servidores e conferida pelo ente municipal, sem necessidade de impugnação, viabilizando a expedição de RPV/precatório. A inércia do Município em cumprir essa obrigação impossibilitou o início da fase seguinte do processo. 5. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso reforça que o prazo prescricional somente se inicia quando a liquidação da sentença está concluída e que não se pode imputar à parte exequente a inércia do executado no cumprimento de suas obrigações processuais. 6. Considerando que a fase de conferência da Tabela Prática Única não foi finalizada por culpa exclusiva do Município, inexiste a prescrição da pretensão executória. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Agravo de instrumento desprovido. Tese de julgamento: 1. O prazo prescricional para a execução de título judicial ilíquido tem início somente após a efetiva conclusão da sua liquidação. 2. Quando a Fazenda Pública impede, por sua própria inércia, a concretização da fase executória, não se pode imputar prescrição à parte exequente. (N.U 1037106-59.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIA EROTIDES KNEIP, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 26/03/2025, Publicado no DJE 31/03/2025). DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. URV. PRESCRIÇÃO DA EXECUÇÃO. INOCORRÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto pelo Município de Jaciara contra decisão interlocutória que rejeitou a alegação de prescrição da execução em cumprimento de sentença, movido por José De Franca Neto, para pagamento de diferenças salariais decorrentes de URV. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em definir se a prescrição da execução pode ser reconhecida quando o prazo prescricional não decorreu devido à inércia do próprio Município em cumprir etapas previstas no acordo homologado judicialmente. III. Razões de decidir 3. O prazo prescricional para execução somente tem início a partir da liquidação do título executivo, conforme entendimento consolidado pelo STJ. 4. Verificou-se que o Município, ao não cumprir com a conferência e assinatura da Tabela Prática Única, causou a necessidade de instauração da fase de cumprimento de sentença, interrompendo o fluxo prescricional. 5. É vedada a penalização da parte exequente pela inércia da administração pública em atos que lhe competem, aplicando-se o princípio da actio nata. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: "O prazo prescricional para execução de título judicial ilíquido somente tem início após a sua liquidação efetiva, não sendo imputável à parte exequente a inércia do executado no cumprimento de suas obrigações processuais pactuadas." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXVI; CPC/2015, art. 924; Súmula 150/STF. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1986341, Rel. Min. Sérgio Kukina, j. 23/05/2022; STJ, AgInt no REsp 2014973, Rel. Min. Sérgio Kukina, j. 26/06/2023. (N.U 1031073-53.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 05/02/2025, Publicado no DJE 10/02/2025). DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. URV. PRAZO PRESCRICIONAL. TÍTULO ILÍQUIDO. INÉRCIA DA FAZENDA PÚBLICA. INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que negou provimento a agravo de instrumento, mantendo decisão do juízo da Segunda Vara da Comarca de Jaciara que rejeitou a impugnação à execução fundada em alegação de prescrição da pretensão executória. A demanda originária versa sobre cumprimento de sentença decorrente de acordo homologado judicialmente, no qual se reconheceu o direito de servidores municipais ao pagamento de diferenças salariais oriundas da conversão da remuneração em URV, com percentual de 7,21% a ser incorporado aos vencimentos. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em definir se a pretensão executória da parte exequente estaria prescrita, à luz da alegação de decurso do prazo quinquenal previsto para a propositura da execução, mesmo diante da omissão do Município em cumprir etapas do acordo judicial que condicionavam o início da fase de execução. III. Razões de decidir 3. O prazo prescricional da pretensão executória tem início somente após a efetiva liquidação do título, quando ilíquido, conforme a Súmula 150 do STF e entendimento consolidado do STJ. 4. No caso concreto, a homologação do acordo previu a confecção de Tabela Prática Única por contador das partes e conferência pela municipalidade, sendo esta etapa indispensável à liquidação. 5. A omissão do Município em cumprir a etapa da conferência e assinatura da tabela inviabilizou a liquidação do título, o que impede o início do prazo prescricional para o cumprimento de sentença. 6. Aplica-se, na espécie, o princípio da actio nata, segundo o qual o prazo prescricional apenas começa a correr quando nasce a pretensão exercitável, o que não ocorreu por fato imputável exclusivamente à Fazenda Pública. 7. A parte exequente não pode ser penalizada pela inércia do devedor no cumprimento das obrigações pactuadas, sob pena de violação à segurança jurídica e ao direito adquirido. IV. Dispositivo e tese Recurso desprovido. Tese de julgamento: O prazo prescricional para a execução de título judicial ilíquido tem início somente após a conclusão da sua liquidação. A inércia da Fazenda Pública em cumprir etapas pactuadas em acordo judicial impede o início do prazo prescricional para a execução. Não se pode imputar à parte exequente a prescrição da pretensão executória quando o atraso decorre exclusivamente da omissão do devedor público. _________________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXVI; CPC/2015, art. 924; Súmula 150/STF. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 2014973, Rel. Min. Sérgio Kukina, j. 26/06/2023; TJMT, N.U 1031073-53.2024.8.11.0000, Rel. Des. Luiz Octavio Ribeiro, j. 05/02/2025. (N.U 1034908-49.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARCIO VIDAL, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 26/05/2025, Publicado no DJE 26/05/2025). Outrossim, destaca-se o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça, cuja orientação coaduna-se com a tese ora adotada: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 1.022, II, DO CPC. INEXIST ÊNCIA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA. OCORRÊNCIA. 1. O Tribunal de origem acolheu a prejudicial de prescrição da pretensão executiva da parte ora agravante a partir dos seguintes fundamentos: (a) o prazo prescricional para o ajuizamento do cumprimento de sentença não se iniciou com o trânsito em julgado do título executivo, pois ficou interrompido em virtude do adimplemento voluntário dos créditos pela parte agravada; (b) somente com o fim do pagamento administrativo, em 27/11/2014, iniciou-se o prazo prescricional para se discutir eventual crédito remanescente ainda devido pela Fazenda Pública; (c) ajuizado o subjacente cumprimento de sentença apenas em 29/11/2019, restou evidenciada a prescrição da pretensão executória. 2. Na hipótese, não procede a tese de afronta ao art. 1.022, II, do CPC, uma vez que o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas e apreciou integralmente a controvérsia posta nos autos, não se podendo, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional (AgInt no AREsp n. 1.678.312/PR, relator Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, DJe de 13/4/2021). 3. É cediço que o princípio da actio nata garante que o prazo prescricional somente possa fluir a partir do momento em que existir uma pretensão exercitável por parte daquele que suportará os efeitos do fenômeno extintivo, não sendo permitido que o titular de um direito seja penitenciado por uma inércia a que não deu ensejo (AgInt no REsp n. 1.870.675/SP, relator Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 16/2/2023). Nesse mesmo sentido: REsp n. 1.494.482/SP, relatora para acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe de 18/12/2020.4. Considerando-se que, como expressamente consignado na petição inicial do subjacente cumprimento de sentença, a pretensão da parte agravante é o recebimento "da diferença da taxa dos juros de 0,5% para 1% ao mês sobre todos os pagamentos efetuados pelo Tribunal de Justiça, haja vista a não implementação e pagamento dos juros nos termos da condenação judicial proferida e transitada em julgado" (fl. 6), tem-se que o termo inicial do prazo prescricional se iniciou no dia 27/11/2014, quando houve o último pagamento administrativo dos valores reconhecidos no título executivo judicial.5. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 2014973 RS 2022/0222626-5, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 26/06/2023, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/06/2023). (sem grifo no original). Diante desse contexto, revendo o meu posicionamento anterior, reconheço que assiste razão à Embargante, porquanto restou evidenciado que a exigibilidade do título executivo judicial dependia, nos termos do acordo homologado, da realização de ato a ser praticado pelo Município – a conferência e validação da Tabela Prática Única –, o que não se concretizou por inércia exclusiva da Administração Pública. Assim, não há que se falar em fluência do prazo prescricional a partir do trânsito em julgado da sentença homologatória, uma vez que a obrigação de fazer pactuada não se tornou exigível por fato atribuível ao próprio devedor. Dessarte, diante da omissão suprida e da contradição sanada, impõe-se o acolhimento dos embargos de declaração com efeitos infringentes, a fim de reformar o acórdão embargado, para afastar o reconhecimento da prescrição da pretensão executória e restabelecer a decisão proferida pelo Juízo de origem que rejeitou a impugnação ao cumprimento de sentença. Diante do exposto, ACOLHO os Embargos de Declaração, com efeitos modificativos, para sanar a contradição verificada no acórdão embargado, afastando a prescrição da pretensão executória e, por conseguinte, restabelecendo a decisão de Primeiro Grau que rejeitou a impugnação ao cumprimento de sentença, nos termos da fundamentação. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025
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