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Aurea Ferreira De Lima x Banco Pan S.A.

ID: 259883420

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA CÍVEL DE TANGARÁ DA SERRA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1012592-71.2024.8.11.0055

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

AUREA FERREIRA DE LIMA

Polo Passivo:

BANCO PAN S.A.

Sentença

Advogados:

OLIMPIERRI MALLMANN

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE TANGARÁ DA SERRA SENTENÇA Processo n. 1012592-71.2024.8.11.0055 AUTOR(A): AUREA FERREIRA DE LIMA REU: BANCO PAN S.A. I – Relatório T… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE TANGARÁ DA SERRA SENTENÇA Processo n. 1012592-71.2024.8.11.0055 AUTOR(A): AUREA FERREIRA DE LIMA REU: BANCO PAN S.A. I – Relatório Trata-se de Ação Declaratória de Nulidade de Ato Jurídico, Devolução de Valores Cobrados Indevidamente em Dobro e Danos Morais proposta por Aurea Ferreira de Lima em face de Banco Pan S.A. Narra que é beneficiária de aposentadoria por invalidez previdenciária e que, ao realizar um empréstimo consignado, passou a sofrer descontos mensais em seu benefício no valor de R$ 52,25, a partir de setembro de 2020, sob a rubrica de Reserva de Margem para Cartão de Crédito (RMC). Afirma que, jamais solicitou, recebeu ou utilizou qualquer cartão de crédito, tendo contratado apenas o empréstimo consignado. Diante da cobrança indevida, ingressou com a presente ação pleiteando o ressarcimento em dobro dos valores descontados, bem como indenização por danos morais (Id. 171799549). A inicial foi recebida, sendo deferidos os benefícios da gratuidade da justiça e a inversão do ônus da prova (Id. 172079577). O Banco réu apresentou contestação, na qual suscitou, em sede preliminar, a ausência de interesse de agir, inexistência de procuração válida, inépcia da petição inicial, impugnação ao pedido de gratuidade da justiça e litispendência. Alegou, ainda, como prejudicial de mérito, a ocorrência da prescrição. No mérito, defendeu a regularidade da contratação, afirmando que esta se deu de forma expressa e legítima, inexistindo qualquer falha na prestação do serviço que justifique a indenização pleiteada pela parte autora (Id. 178427627). Réplica à contestação apresentada no Id. 180619056, onde a parte autora rechaçou as teses defensivas e reiterou os termos da exordial. Intimadas a especificarem as provas que pretendiam produzir, a parte ré requer a designação de audiência de instrução e julgamento (Id. 183588401) e a parte autora o julgamento antecipado da lide (Id. 183746015). O processo veio concluso. II – Fundamentação Da preliminar da ausência do interesse de agir A ré sustenta a multiplicidade de ações com pedido e causa de pedir semelhantes, o que supostamente evidenciaria a ausência de interesse processual, diante de possível desconhecimento da parte autora quanto aos termos da presente lide. Contudo, tal alegação não merece prosperar. A falta de interesse processual caracteriza-se pela inutilidade da medida pleiteada, pela desnecessidade do que se pede e pela inadequação do meio pelo qual se busca a prestação jurisdicional. Para a comprovação do interesse processual, primeiramente, é preciso a demonstração de que sem o exercício da jurisdição, por meio do processo, a pretensão não pode ser satisfeita. No caso, verifica-se a ação é adequada para o fim que se pretende e, presentes necessidade-utilidade-adequação, não há que se falar em extinção sem exame do mérito, de modo que a preliminar deve ser rejeitada. Da preliminar de ausência de procuração válida A parte ré sustenta que a procuração outorgada pela parte autora ao seu patrono é genérica, necessitando haver uma delimitação necessária. A análise dos autos demonstra que a parte autora apresentou instrumento de mandato devidamente assinado, acompanhado de documentos pessoais que comprovam sua regular constituição. O referido instrumento confere poderes gerais para o foro, conforme prevê o art. 105 do Código de Processo Civil, o que é plenamente suficiente para o ajuizamento da presente ação. A alegação de ausência de delimitação específica quanto à parte demandada, prazo de validade do mandato ou justificativa para a outorga de poderes não encontra respaldo legal. O ordenamento jurídico não exige tais elementos como requisitos para validade da procuração, bastando, para os fins do processo, a outorga com poderes para o foro em geral, como no caso em tela. Ademais, não há qualquer indício de que os atos praticados pelo patrono extrapolaram os poderes conferidos ou de que tenham sido realizados em desconformidade com a vontade da parte outorgante. Assim, não se verifica qualquer nulidade ou irregularidade na representação processual, sendo a procuração apresentada válida e eficaz para todos os atos processuais realizados até o momento. Diante disso, rejeita-se a preliminar. Da preliminar de inépcia da petição inicial A parte ré suscitou preliminar de inépcia da petição inicial, sob o argumento de que esta não estaria acompanhada dos documentos necessários à comprovação dos fatos alegados, uma vez que a autora teria alegado de forma genérica o desconhecimento de contratos firmados para com a ré. Contudo, nos termos do art. 319 do CPC, a petição inicial deve conter os requisitos legais, os quais foram devidamente observados no caso concreto. Ainda, o art. 320 do CPC impõe à parte autora o dever de instruir a inicial com os documentos indispensáveis à propositura da ação, o que não se confunde com a exigência de prova plena do direito alegado. A ausência de determinados documentos pode eventualmente influenciar o julgamento do mérito, mas não implica, por si só, a inépcia da petição inicial, especialmente quando a narrativa dos fatos está clara, coerente e acompanhada de elementos mínimos que viabilizam o contraditório e o exercício da ampla defesa pela parte adversa, de modo que a preliminar deve ser rejeitada. Da preliminar de litispendência e de conexão A parte ré alega a existência de outra ação com as mesmas partes, causa de pedir e pedido, qual seja, o processo nº 1006851-50.2024.8.11.0055. Contudo, o referido processo foi extinto sem resolução de mérito, circunstância que afasta tanto a litispendência quanto a possibilidade de reunião por conexão. Nos termos do art. 337, §1º do Código de Processo Civil, a litispendência exige que a ação anteriormente ajuizada esteja em curso, o que não se verifica no presente caso. Da mesma forma, o art. 55 do CPC trata da conexão como a existência de demandas que possuam causa de pedir ou pedido comuns, desde que ambas estejam ativas, o que também não ocorre. Ressalte-se, ainda, que a extinção sem resolução de mérito do processo anterior afasta qualquer risco de decisões conflitantes ou de prejuízo à segurança jurídica, razão pela qual não há fundamento legal para reunião de processos. Por todo o exposto, rejeitam-se as preliminares. Da impugnação à justiça gratuita É certo que a parte adversa pode impugnar o deferimento da justiça gratuita já concedida nos autos. Contudo, uma vez deferido o benefício, o ônus de demonstrar eventual alteração na condição financeira da parte beneficiária recai sobre o impugnante, que deve apresentar documentação idônea a justificar a revogação da gratuidade. No presente caso, a parte ré não trouxe aos autos qualquer elemento probatório capaz de infirmar a declaração de hipossuficiência da autora, limitando-se a alegações genéricas. Diante disso, inexiste fundamento fático ou jurídico apto a ensejar a revogação do benefício, razão pela qual a preliminar deve ser rejeitada. Da prescrição Na presente demanda se discute a validade da contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC). Nesses casos, o que se pretende é a declaração de nulidade do negócio jurídico, o que afasta a incidência do prazo trienal previsto no art. 206, §3º, do Código Civil. Conforme entendimento consolidado nos Tribunais, aplica-se o prazo prescricional quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, por se tratar de pretensão relacionada a defeito na prestação do serviço bancário e falha informacional no momento da contratação, vejamos: APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). VÍCIO DE VONTADE . FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO. CONVERSÃO EM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. PRESCRIÇÃO. DECADÊNCIA .. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. DANO MORAL. 1. Em se cuidando de ação em que a parte autora pede a declaração de nulidade do contrato de cartão de crédito consignado firmado junto à instituição financeira requerente, revela-se aplicável o prazo prescricional quinquenal previsto no art . 27 do Código de Defesa do Consumidor. Assim, no caso em apreço, não se encontram prescritas as pretensões deduzidas na exordial. 2. Não há falar em decadência, uma vez que, em se cuidando de relação de trato sucessivo, os descontos impugnados na presente demanda se renovam mensalmente no benefício previdenciário do autor, de modo que, a cada mês, também se renova o prazo decadencial . 3. Demonstrado, pelo consumidor, que, embora pretendendo a contratação de empréstimo consignado, fora induzido a firmar contrato de cartão de crédito com previsão de margem consignável, em termos extremamente desvantajosos, impõe-se a manutenção da sentença, que converteu o negócio jurídico em empréstimo consignado. 4. Nos termos do entendimento deste Colegiado, revela-se cabível a condenação da instituição financeira requerida a devolver, em dobro, as quantias cobradas indevidamente, com amparo no art . 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, por estar evidenciada a existência de má-fé. 5. A conduta ilícita do banco requerido justifica sua condenação ao pagamento de indenização por danos morais, dados os transtornos experimentados pelo demandante. Verba indenizatória arbitrada no montante de R$ 5 .000,00 (cinco mil reais), na forma dos parâmetros adotados por este Colegiado em casos análogos.APELAÇÃO DA PARTE REQUERIDA DESPROVIDA.APELO DO AUTOR PROVIDO.(Apelação Cível, Nº 50023389020238210163, Vigésima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator.: Umberto Guaspari Sudbrack, Julgado em: 20-08-2024) (TJ-RS - Apelação: 50023389020238210163 OUTRA, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Data de Julgamento: 20/08/2024, Vigésima Terceira Câmara Cível, Data de Publicação: 28/08/2024) Além disso, por se tratar de relação de trato sucessivo, em que os descontos são renovados mês a mês no benefício da parte autora, também se renova a cada mês o prazo para eventual discussão da legalidade desses descontos, afastando qualquer alegação de prescrição das parcelas atuais. Assim, rejeita-se a preliminar. Do julgamento antecipado da lide Considerando que a matéria em questão pode ser perfeitamente elucidada por meio da prova documental já colacionada ao feito, a produção das demais provas requeridas mostra-se impertinente e desnecessária para a resolução do litígio. Nesse espeque, o julgamento antecipado da lide, que é uma espécie do gênero “julgamento conforme o estado do processo” pode ocorrer em três situações diferentes: quando o julgamento for exclusivamente de direito ou quando for de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência ou nas hipóteses de revelia. Haja vista a suficiência probatória dos elementos produzidos e juntados pelas partes, constata-se que o feito está apto para julgamento, logo, cabível a hipótese do art. 355, I, do Código de Processo Civil. Dito isso, registra-se que a interpretação e conclusão das provas do processo não se vinculam à leitura, nem ao benefício da parte que o produziu, conforme ao art. 412, parágrafo único, do CPC/15: Art. 412 (...) Parágrafo único. O documento particular admitido expressa ou tacitamente é indivisível, sendo vedado à parte que pretende utilizar-se dele aceitar os fatos que lhe são favoráveis e recusar os que são contrários ao seu interesse, salvo se provar que estes não ocorreram. Ao passo que a apreciação das provas e os fundamentos da conclusão desta sentença obedecerão ao princípio do livre convencimento motivado, consoante ordem do art. 371, CPC/15, qual seja: “Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento”. Passa-se assim, ao deslinde dos autos quanto ao conjunto fático-probatório. Do mérito Inicialmente, vale fixar a premissa de que, segundo a Súmula n. 381 do STJ: “Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas”. Dessa forma, a análise meritória limitar-se-á aos pontos expressamente suscitados pela parte autora, não sendo objeto de cognição judicial alegações genéricas ou desprovidas de fundamentação específica constante na petição inicial. É ônus da parte autora, portanto, demonstrar de forma concreta a existência de práticas abusivas por parte da instituição financeira, bem como comprovar eventuais descontos indevidos que extrapolem os termos do contrato celebrado. Com efeito, ao magistrado, cuja função não é investigativa, não compete suprir a inércia da parte autora na delimitação clara e objetiva de suas pretensões, tampouco deduzir teses a partir de alegações genéricas ou mal formuladas. O direito invocado deve ser apresentado de forma precisa e fundamentada nos autos. Em razão da inversão do ônus da prova, a comprovação da regularidade da celebração contratual ficou ao encargo da parte ré, conforme regra geral do Código de Defesa do Consumidor. Assim, cabia à parte ré demonstrar a regularidade da contratação, inclusive quanto à ciência e anuência da autora em relação aos termos do contrato que ensejou os descontos impugnados. Pois bem. O presente feito versa sobre um contrato de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC). Nessa modalidade, o consumidor tem o direito de realizar compras e saques utilizando o cartão, com a obrigação de efetuar o pagamento da fatura no mês subsequente. O desconto ocorre diretamente na folha de pagamento, mas se limita ao valor mínimo da fatura, que corresponde especificamente à reserva de margem consignável. Ocorre que, segundo a parte autora, esta alega não ter contratado o cartão de crédito em questão. Contudo, tal alegação encontra óbice de acolhimento diante do contrato devidamente juntado pela parte ré ao Id. 178429208, o qual demonstra de forma clara que a parte autora teve plena ciência de que estava contratando um cartão de crédito consignado. O referido contrato detalha as condições de pagamento e autoriza expressamente o desconto diretamente na folha de pagamento. Assim, verifica-se que a parte requerida desincumbiu de forma satisfatória do ônus que lhe competia, nos termos do artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil. A parte ré comprovou a contratação do cartão de crédito consignado, a regularidade da informação fornecida ao consumidor e o cumprimento das disposições do artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor, conforme pode ser observado no trecho abaixo: Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (...) IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços; V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; (...) XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério. Logo, diante da comprovação, por parte do banco réu, da celebração do contrato de cartão de crédito consignado, deve ser rejeitada a alegação da parte autora de que não teria realizado a contratação do referido cartão. Ademais, o documento anexado no Id. 178427631 evidencia que a parte autora se beneficiou da contratação, uma vez que houve a liberação do crédito em sua conta corrente. Portanto, não se verifica qualquer falha na prestação do serviço por parte da instituição financeira, que efetuou os descontos a título de RMC de forma regular no benefício percebido pela parte autora. Nesse mesmo sentido: SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO RAC. Nº 1010361-55.2020.8.11. 0041 APELANTE: BANCO PAN S/A APELADO: ELZA MEDEIROS E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMPRÉSTIMO ATRAVÉS DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL – RMC – PARCIAL PROCEDÊNCIA – INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO – REJEIÇÃO – ALEGAÇÃO DE PLENO CONHECIMENTO DA CONTRATAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO – CONSTATAÇÃO – CRÉDITO LIBERADO NA CONTA DA AUTORA – CONTRATO COM INFORMAÇÕES CLARAS E PRECISAS QUANTO AOS TERMOS DA CONTRATAÇÃO – ASSINATURA IDÊNTICA ÀS DOS DOCUMENTOS PESSOAIS DO CONTRATANTE – AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO – ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS – NÃO CONSTATAÇÃO – ÍNDICES AQUÉM DA TAXA MÉDIA DE MERCADO – REPETIÇÃO DE INDÉBITO – DESCABIMENTO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Não há falar-se em não conhecimento do recurso face à sua intempestividade, se dos autos restou induvidoso que este foi protocolizado no prazo legal. Se restou evidenciada a contratação de empréstimo através de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC, em virtude de contrato devidamente assinado pelo contratante, com informações claras e precisas sobre as características do negócio jurídico, bem como que a parte autora se beneficiou da referida contratação com a liberação do crédito em sua conta corrente elevando sua margem consignável, há que ser reformada a sentença recorrida com a improcedência da lide. Não há falar-se em ilegalidade dos juros remuneratórios contratados, se estes encontram-se aquém da taxa média para operações da mesma espécie divulgadas pelo Banco Central (RESp. 1.061.530/RS, sob o rito de recurso repetitivo). Se o contrato sob revisão não padece de qualquer abusividade ou ilegalidade nos encargos de normalidade, não há se falar em devolução de valores que não se comprovou ter pagado a maior. (TJ-MT 10103615520208110041 MT, Relator: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 09/11/2022, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/11/2022). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO PRETENSÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C DANOS MORAIS E PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA – INCIDÊNCIA DO CDC – NECESSIDADE DE PROVA MÍNIMA DO DIREITO ALEGADO - CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO COM RESERVA DA MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) - AUSÊNCIA DE ILÍCITO - CONTRATAÇÃO COMPROVADA – CRÉDITO LIBERADO – PROVA SUFICIENTE DAS INFORMAÇÕES QUANTO AOS ÔNUS – JUROS E VALORES – DÉBITO EXISTENTE - DANO MORAL NÃO DEMONSTRADO – SENTENÇA CONFIRMADA – APELO DESPROVIDO - ALEGAÇÃO DE CONTRADIÇÃO – VÍCIO INEXISTENTE – TENTATIVA DE REDISCUSSÃO – EMBARGOS REJEITADOS. Ainda que incida ao caso o Código de Defesa do Consumidor cabe à parte Autora/Apelante/Consumidora a prova mínima do direito alegado, o qual não ficou demonstrado, eis que se constata a regularidade do negócio firmado (Contrato de Cartão de Crédito – utilização de margem de reserva), com as informações necessárias à compreensão do ato, mostrando-se lícita a contratação, com a fixação de juros dentro do patamar de mercado para a operação;, não havendo, portanto, falar em ilegalidade que possa dar ensejo à restituição de valores e dano moral. Comprovado o negócio jurídico que deu causa aos descontos lançados no benefício previdenciário recebido pela parte autora, é inexistente o ato ilícito imputado à parte ré, porque essa cobrança caracteriza exercício regular de seu direito como credor. Se restou e evidenciada a contratação de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC, visto que o requerido acostou aos autos informações claras e precisas sobre as características do negócio jurídico, bem como que a parte autora se beneficiou da referida contratação, há que ser julga improcedente a lide. Ausente qualquer vício na contratação, não há que se falar em devolução de valores e em pagamento de indenização por danos morais. Ainda que com o fito de prequestionamento, os embargos declaratórios devem obedecer aos ditames do art. 535, do CPC/1973 (atual arts. 1.022 e 1.023, CPC/2015. Precedentes do STJ, não se mostrando viável o acolhimento quando se pretende reanálise de julgamento. (TJ-MT - AC: 10128489520208110041, Relator: SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Data de Julgamento: 28/02/2023, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/03/2023) Ademais, tendo em vista a improcedência do pedido, uma vez comprovada a legalidade da contratação, acrescenta-se, apenas a título explicativo, que o pedido de restituição em dobro somente é cabível quando houver desconto indevido, acompanhado de má-fé na cobrança, conforme estabelecido pela Súmula nº 159 do Supremo Tribunal Federal, situação que não se verifica no presente caso. A ausência de comprovação da referida má-fé, afasta a obrigatoriedade de ressarcimento em dobro. Passo seguinte, quanto ao pedido de danos morais, o mesmo não encontra guarida. A parte autora não demonstrou que tenha sofrido qualquer lesão a direito personalíssimo. Dessa forma, a simples celebração do contrato por sua própria vontade não configura, por si só, a ocorrência de dano moral. Ademais, não houve qualquer registro nos cadastros de inadimplentes ou circunstância que tenha prejudicado a imagem da autora no meio comercial, inexistindo elementos suficientes para caracterizar um dano moral passível de indenização. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DECADÊNCIA. INEXISTÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. INCIDÊNCIA DAS NORMAS CONSUMERISTAS. DESCONTO MÍNIMO DA FATURA MENSAL. DÍVIDA INSOLÚVEL. ABUSO E ONEROSIDADE EXCESSIVAS. TAXA DE JUROS - MÉDIA DE MERCADO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO - FORMA SIMPLES. DANO MORAL - INEXISTÊNCIA. 1 - O prazo decadencial de 90 (noventa) dias, previsto pelo artigo 26, II, do Código de Defesa do Consumidor não se aplicada à revisão de contrato bancário, quando a questão não versa sobre responsabilidade por vício do produto ou serviço, atinente a comprometimento de qualidade ou quantidade. 2 - Não implica em cerceamento do direito de defesa o julgamento antecipado da lide, mormente quando o juiz, como destinatário da prova, considerar a dilação probatória desnecessária para a formação de seu livre convencimento, inexistindo afronta ao contraditório quando os elementos constantes dos autos são suficientes para o deslinde da causa. 3. A relação contratual estabelecida entre as partes é típica de consumo, razão pela qual aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, a teor da Súmula 297, do Superior Tribunal de Justiça. 4. A modalidade contratual cartão de crédito consignado mostra-se extremamente onerosa e lesiva ao consumidor, pois, abatidos os encargos de financiamento, o valor principal da dívida é mensalmente refinanciado, acrescido de juros exorbitantes, o que inviabiliza a quitação do débito, razão pela qual deve ser alterada a natureza da avença para empréstimo consignado. 5. Inexistindo informações claras e precisas sobre as taxas de juros, o que coloca o consumidor em desvantagem, deve ser aplicada a taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central do Brasil para a operação de crédito para pessoa física, observada a data da celebração. 4. A repetição de indébito será efetivada somente após a revisão das cláusulas contratuais, quando então será aferido o valor devido, de forma simples, a fim de evitar enriquecimento ilícito. 6. O reconhecimento da abusividade da contratação não caracteriza, por si só, dano moral, porquanto não houve negativação do nome da autora ou exposição fática a situação constrangedora, mas sim mero aborrecimento pela contratação de cartão de crédito oneroso e desvantajoso ao consumidor. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.” (TJGO, Apelação (CPC) 5168519-54.2019.8.09.0002, Rel. JEOVA SARDINHA DE MORAES, 6ª Câmara Cível, julgado em 09/10/2019, DJe de 09/10/2019). Portanto, em razão da fundamentação apresentada e dos documentos constantes nos autos, resta comprovado que a parte autora anuiu com o “Termo de Adesão ao Regulamento para Utilização do Cartão de Crédito Consignado PAN”. Por decorrência lógica, reconhece-se a licitude da contratação do cartão de crédito e, consequentemente, a regularidade dos lançamentos a ele relacionados, mantendo-se hígido o contrato firmado. Dessa forma, tornam-se prejudicados os demais pedidos formulados na exordial. III – Dispositivo Diante do exposto, este Juízo JULGA IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial e, por consequência, extingue o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Condena-se a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários sucumbenciais, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85 do CPC. Contudo, suspensa a exigibilidade em razão do benefício da gratuidade da justiça, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC. Ficam as partes advertidas que a oposição de eventuais embargos de declaração com efeitos de mera reapreciação do quanto decidido serão tidos como protelatórios, podendo ser apenados com as sanções do artigo 1.026, §2º, do Código de Processo Civil. Transitada em julgado, sem manifestação das partes, REMETAM-SE ao arquivo com as anotações e baixas de praxe. INTIMEM-SE. CUMPRA-SE. Tangará da Serra, data registrada no sistema. RAMON FAGUNDES BOTELHO Juiz de Direito

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Processo nº 0000496-02.2016.4.01.3202

ID: 336546206

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO COSTA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000496-02.2016.4.01.3202

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

FRANCISCO COSTA DOS SANTOS

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

LIVIA ROCHA BRITO

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LAIZ ARAUJO RUSSO DE MELO

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CAMILLA TRINDADE BASTOS

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ANY GRESY CARVALHO DA SILVA

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BRUNO VIEIRA DA ROCHA BARBIRATO

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FABIO NUNES BANDEIRA DE MELO

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FERNANDA COUTO DE OLIVEIRA

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JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0000496-02.2016.4.01.3202 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000496-02.2016.4.01.3202 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: FRANCISCO COSTA DOS … JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0000496-02.2016.4.01.3202 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000496-02.2016.4.01.3202 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: FRANCISCO COSTA DOS SANTOS REPRESENTANTES POLO ATIVO: FERNANDA COUTO DE OLIVEIRA - AM11413-A, FABIO NUNES BANDEIRA DE MELO - AM4331-A, BRUNO VIEIRA DA ROCHA BARBIRATO - AM6975-A, ANY GRESY CARVALHO DA SILVA - AM12438, CAMILLA TRINDADE BASTOS - AM13957-A, LAIZ ARAUJO RUSSO DE MELO - AM6897-A e LIVIA ROCHA BRITO - AM6474-A POLO PASSIVO:MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - MPF e outros RELATOR(A):MARIA CANDIDA CARVALHO MONTEIRO DE ALMEIDA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico RELATÓRIO A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL MARIA CÂNDIDA CARVALHO MONTEIRO DE ALMEIDA (RELATORA CONVOCADA): Processo recebido em regime de auxílio de julgamento de que trata a Resolução Presi 4/2025 (PAE/Sei id.22104779). Trata-se de apelação interposta por FRANCISCO COSTA DOS SANTOS contra a r. sentença de fls. 136/139v. dos autos físicos (id. 111936643, pp. 164-171; rolagem única, pp. 601-608), proferida em 15/04/2019, pelo douto Juízo da Subseção Judiciária de Tefé/AM, que acolheu o pedido inicial para aplicar ao réu, ora apelante, “as penas do artigo 12, II e III da lei 8.429/92”. Na origem, o Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública contra FRANCISCO COSTA DOS SANTOS, imputando-lhe “a prática de ato de improbidade administrativa, mediante conduta dolosa (...), com fulcro nos artigos 10, caput e inciso VIII (preferencialmente) e 11, caput (subsidiariamente), ambos da Lei 8.429/92” (id. 111936643, p. 28; rolagem única, p. 465), com base no Inquérito Civil Público (ICP) n. 1.13.002.000007/2012-40. Requereu a aplicação das “sanções previstas no art. 12, incisos II (preferencialmente) e III (subsidiariamente), ambos da Lei 8.429/92” (idem), dando à causa o valor de R$ 232.540,00. A ação foi distribuída em 20/07/2016, perante a Subseção Judiciária de Tefé/AM (id. 111936643, p. 3), e redistribuída à 9ª Vara Federal da Seção Judiciária do Amazonas, em 20/01/2020 (idem, p. 1). Em sua petição inicial, o Órgão Ministerial narrou que: a) o referido ICP foi instaurado por provocação da Controladoria-Geral da União (CGU) para “apurar a execução de despesas sem o devido processo licitatório, dispensa ou inexigibilidade referente ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) no tocante ao exercício de 2009, no município de Carauari/AM” (fl. 3v. dos autos físicos); b) “em 20/03/2009, o prefeito do Município de Carauari/AM, Sr. Francisco Costa dos Santos, declarou a existência de Situação de Emergência no Município, conforme dispõe o art. 1º do Decreto N. 078/2009”, conforme fls. 42/43 do ICP (fl. 4 dos autos físicos), em razão das cheias dos rios da região; c) de acordo com o art. 3º do referido Decreto, “a emergência que se iniciou em 20/03/2009 poderia se prorrogar até o dia 16/09/2009 e estava restrita às consequências da cheia dos rios na área de infra-estrutura e assistência desamparados pela cheia” (fls. 4/4v. dos cadernos físicos); d) “o Município de Carauari/AM se utilizou de tal situação emergencial para escolher quem seriam os fornecedores de produtos destinados a merenda escolar, fazendo compras diretas (contratos verbais) e sem o menor critério ou pesquisa de preços, extrapolando os limites, inclusive, do próprio decreto emergencial” (fl. 4v. dos autos físicos) – situação que perdurou inclusive após o término do período de emergência, “dispensando licitação de forma indevida” (idem); e) o requerido “dispensou licitação de forma indevida, além de ter adquirido produtos para a alimentação escolar com recursos do PNAE e sem o devido processo licitatório até o mês de dez/2009, ou seja, após o período estipulado em Decreto” (fl. 9v. dos cadernos físicos); f) “sobre o dolo do requerido, que conhecia sim do caráter ilícito de seu agir” (fl. 11v. dos autos físicos), destacou a compra de 160 botijões de gás, em 17/04/2009, de Comercial Talita; e de 18.850 mais 15.080 mais 12.507 mais 25.165 pães, entre 09/07/2009 e 10/12/2009, da Panificadora Lima; g) ressaltou “como indicativo do dolo, a prática de fracionar as notas fiscais de compras efetuadas no mesmo dia, como forma de tornar o valor individual de cada uma das notas menores, e consequentemente, dificultar a fiscalização” (fl. 12 dos cadernos físicos), trazendo um rol de itens adquiridos entre 06/07/2009 e 09/11/2009 de acordo com essa sistemática (fls. 12/13 dos autos físicos); h) a conduta do requerido se enquadra ao inciso VIII do art. 10 da LIA, hipótese em que “o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que o dano ao Erário é presumido, sendo certo que a Administração deixou de contratar com a melhor” (fl. 13v. dos autos originais), ou, subsidiariamente, o caput do art. 11 da referida Lei; e que i) “considerando que houve prejuízo ao erário, deve incidir o inciso II do art. 12 da LIA” (fl. 14 dos cadernos físicos) ou, subsidiariamente, o respectivo inciso III; Apresentou uma listagem de produtos (fl. 4v./7, de acordo com as notas fiscais acostadas junto à inicial, comprados “diretamente dos fornecedores (...) escolhido sem critério algum, já que sequer formalizou o processo de dispensa, quem dirá realizou pesquisa de preço ou formalização do necessário contrato administrativo” (fl. 4v. dos cadernos físicos), nos seguintes períodos: abril, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2009; maio e julho de 2016. O FNDE, após ter manifestado interesse em ingressar no polo ativo do feito (fls. 20/21 e 22/27 dos autos originais), foi admitido na condição de assistente simples do autor, nos termos do despacho de fl. 128. Apresentada a defesa prévia às fls. 49/76 dos autos originais, a inicial foi recebida por meio da decisão de fls. 84/86 (dos autos físicos), proferida em 29/01/2018.Interposto agravo de instrumento contra a decisão que recebeu a exordial, protocolado sob o n. 1006851-43.2018.4.01.0000, foi julgado prejudicado por perda de objeto, em 11/12/2020, por meio da decisão de id. 83888574, já transitada em julgado (id. 94679669). O réu apresentou contestação às fls. 91/124 dos cadernos físicos. Intimadas as partes a especificarem provas, o Órgão Ministerial disse não ter outras a produzir (fl. 132), tendo o prazo transcorrido em albis para o requerido e para o FNDE, conforme certidão de fl. 135 dos autos originais. A r. sentença recorrida entendeu que “o requerido incorreu nas condutas tipificadas no artigo 10, caput e inciso VIII e 11, caput, da Lei 8.429/92 e nas penas do art. 12, II e III da mesma lei” (fl. 138v. dos cadernos físicos), determinando: "1) a perda da função pública, se estiver ocupando alguma, inclusive aposentadoria, na forma dos precedentes do STJ: MS 200802755886,Rel. Min. ROGERIOS SCHIETTI CRUZ, STJ — TERCEIRA SEÇÃO,DJE de 4/3/2016 E AGARESP 201503121184, Rel. MM. HERMANBENJAMIN, STJ — SEGUNDA TURMA, DJE de 25/5/2016; 2) suspensão dos seus direitos políticos por 05 (cinco) anos; 3) o pagamento de multa civil equivalente a 20 (vinte vezes)o valor da remuneração percebida pelo agente, valor que reputo compatível coma extensão do dano causado.; 4) a proibição de contratar com o Poder Público ou receber beneficio ou incentivos fiscais ou crediticios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoas jurídicas das quais seja sócio, pelo prazo de05 (cinco) anos." (fl. 139 dos autos físicos). Em seu recurso (fls. 142/169; id. 111936643, pp. 175-202; rolagem única, pp. 612-639), o ex-prefeito pleiteia a concessão de duplo efeito, suspensivo e devolutivo, à apelação, bem como o deferimento da gratuidade da justiça. Sustenta, em sede preliminar, a nulidade da sentença e, no mérito, que: a) a ausência de ato de improbidade administrativa, uma vez que “foram apresentados os devidos comprovantes de pagamento, no caso, notas fiscais, recibos e extratos bancários, atestando que, de fato, os recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar foram utilizados para aquisição de gêneros alimentícios destinados à merenda escolar dos estudantes do Município de Carauari” (fl. 153); b) “o próprio Parquet admite em sua peça inaugural que, em meio à calamidade enfrentada pelo Município em virtude da cheia dos rios do Amazonas em 2009, não houve desvio de finalidade no uso dos recursos federais do PNAE, tendo a presente ação de improbidade se baseado apenas em supostos indícios de ilegalidade, em decorrência de vícios de cunho formal, não existindo qualquer evidência, quem dirá provas concretas, de que houve dano ao erário municipal, eivado de dolo por parte gestor, causado pela aquisição de merenda escolar por dispensa de licitação” (fl. 153); c) “[o] término do período de 180 dias previsto o decreto emergência não possui o condão de exercer qualquer influência no plano fático e fazer com que a situação de emergência de fato cesse, exigindo da Administração atitudes enérgicas, que só poderiam ser tomadas por aquele que detinha o poder de gestão da máquina pública, no caso, o Chefe do Poder Executivo Municipal” (fl. 154); d) “o Recorrente agiu, à época, em observância aos princípios da razoabilidade e moralidade administrativa” (fl. 155); e) “não houve dolo por parte do recorrente” (fl. 158); e que f) “a própria Decisão que recebeu a inicial ressaltou que não há dúvidas sobre a correta destinação dos recursos federais do PNAE para atender ao fim que se destinava, sendo que o questionado foi apenas, a ausência de realização de processos licitatórios para formalizar os contratos com os fornecedores, que atenderam às necessidades da Prefeitura em caráter emergencial à época, em virtude da cheia do rio” (fl. 166); O Ministério Público Federal, em suas contrarrazões (fls. 176/179;id. 111936643, pp. 210-216; rolagem única, pp. 647-653), pugna pelo desprovimento da apelação. A Fundação Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), em contrarrazões (fls. 186/188v.; id. 111936643, pp. 224-229; rolagem única, pp. 661-666), protesta pelo não provimento da apelação. Em seu parecer, lavrado em 26/05/2021, a Procuradoria Regional da República da 1ª Região opina pelo “provimento parcial da apelação, apenas para concessão dos benefícios da justiça gratuita” (id. 120054025; rolagem única, pp. 681-689). Instado a comprovar o preenchimento dos pressupostos legais para o deferimento da gratuidade da justiça, por meio do Despacho id. 436308618, o apelante apresentou os documentos id. 437203867, id. 437204858, id. 437205042, id. 437205099, id. 437205104 e id. 437205105. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico V O T O A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL MARIA CÂNDIDA CARVALHO MONTEIRO DE ALMEIDA (RELATORA CONVOCADA): 1. Das Preliminares 1.1. Do preparo Examina-se, de início, a admissibilidade da apelação, tendo sido constatada a ausência de preparo. Há de se analisar, nesse contexto, se o recorrente faz jus à dispensa de preparo de que gozam os beneficiários da gratuidade da justiça, nos termos do art. 98, §1º, inciso VIII, do Código de Processo Civil (CPC). - Da gratuidade da justiça O apelante pleiteou, no bojo do recurso, a concessão da gratuidade. Contudo, deixou de apresentar declaração de hipossuficiência ou qualquer documento comprobatório da alegada condição econômica. É importante destacar que a presunção de veracidade da alegação de insuficiência deduzida por pessoa natural, prevista no § 3º do art. 99 do Código de Processo Civil, possui natureza relativa e não implica, por si só, que o simples pedido inserido no corpo da petição ou do recurso seja suficiente para o seu deferimento. O caput do referido dispositivo estabelece que o pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição de ingresso de terceiro ou em sede recursal. Todavia, o art. 4º, caput, da revogada Lei nº 1.060/1950, que estipulava que bastava a “simples afirmação, na própria petição inicial”, foi expressamente substituído pelo atual regime processual, que exige maior rigor na aferição da hipossuficiência. Assim, não se mostra suficiente a mera menção à condição de hipossuficiência para a concessão automática do benefício. Contudo, nos termos do § 2º do art. 99 do CPC, antes de indeferir o pedido de gratuidade da justiça, deve o juízo oportunizar à parte a juntada de documentos comprobatórios da alegada incapacidade financeira. Nesse sentido, colacionam-se precedentes do Superior Tribunal de Justiça: "(...) 1.1. Na hipótese em apreço, o acórdão ora embargado concluiu, em sintonia com a jurisprudência da Casa, que o recorrente deve atender, de forma tempestiva, à intimação que determina o recolhimento do preparo na forma devida ou a comprovação da concessão da gratuidade de justiça porquanto o seu descumprimento enseja a inadmissão do recurso especial por deserção. Incidência da Súmula nº 187/STJ. Precedentes. 2. Agravo interno desprovido." (AgInt nos EAREsp n. 2.486.241/SP, relator Ministro Marco Buzzi, Segunda Seção, julgado em 11/6/2025, DJEN de 17/6/2025.) “(...) III - A mera alegação da parte, na petição recursal, de que é beneficiária da assistência judiciária gratuita não é suficiente para o afastamento da deserção, isto é, deve haver a comprovação dessa condição no ato da interposição do recurso, ou na intimação para regularização do vício. Nesse sentido: AgInt no AREsp n. 1.545.172/SP, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe de 5/6/2020.” (STJ, AgInt nos EDcl no REsp n. 2.141.637/CE, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 9/4/2025, DJEN de 14/4/2025.) "(...) 1. De acordo com o §2º do art. 99 do CPC/2015, o juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos (REsp n. 2.055.899/MG, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 20/6/2023, DJe de 27/6/2023). 2. É deserto o recurso na hipótese em que a parte recorrente, mesmo após intimada a regularizar o preparo, não o faz devidamente (art. 1.007, § 7º, do Código de Processo Civil de 2015). Agravo interno improvido." (AgInt no REsp n. 2.030.251/MG, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 16/6/2025, DJEN de 23/6/2025.) Importa ressaltar, ainda, que a controvérsia relativa à adoção de parâmetro objetivo para aferição da hipossuficiência econômica é objeto do Tema Repetitivo 1178, afetado à Corte Especial do STJ, e ainda pendente de julgamento. A propósito, perfilho o entendimento de que, apresentada declaração de hipossuficiência, a gratuidade judiciária deve ser reconhecida, em razão da presunção estabelecida no §3º do art. 99 do CPC. Com efeito, “1. É assente na jurisprudência do STJ que a simples declaração de hipossuficiência da pessoa natural, ainda que dotada de presunção iuris tantum, é suficiente ao deferimento do pedido de gratuidade de justiça quando não ilidida por outros elementos dos autos. (...)” (AgInt no AREsp n. 2.824.642/MS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJEN de 6/5/2025). Não obstante, em respeito ao princípio da colegialidade, ressalvo meu posicionamento pessoal para adotar o entendimento firmado no âmbito desta e. 10ª Turma no sentido de que o reconhecimento do direito à justiça gratuita está condicionado à demonstração de renda inferior a dez salários mínimos. Anote-se: “(...) 7. Pedido de gratuidade de justiça indeferido, porquanto não comprovada renda inferior a dez salários mínimos. Precedentes dessa Corte. (...)” (TRF1, AC 0012563-26.2013.4.01.4100, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCUS VINICIUS REIS BASTOS, DÉCIMA TURMA, PJe 04/04/2025) “(...) 3. Justiça gratuita indeferida. Ausentes informações sobre a renda do requerente. (...)” (TRF1, AC 0004922-20.2013.4.01.3701, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCUS VINICIUS REIS BASTOS, DÉCIMA TURMA, PJe 26/03/2025) No caso dos autos, tendo sido oportunizado à parte apelante demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais para o deferimento da gratuidade da justiça, por meio do Despacho id. 436308618, ela apresentou os seguintes documentos: recibo de entrega da declaração de ajuste anual do imposto sobre a renda da pessoa física, ano-calendário 2024, por meio da qual são declarados rendimentos tributáveis no valor de R$ 23.092,01 (id. 437204858); declaração de hipossuficiência/ pobreza assinada de próprio punho (id. 437205042); e extratos bancários dos meses de março (id. 437205099), abril (id. 437205104) e maio (id. 437205105), em que consta o recebimento de rendimentos provenientes do INSS em valor inferior a R$ 4.000,00 mensais. Diante da comprovação de renda líquida inferior a 10 salários-mínimos, o direito à gratuidade deve ser reconhecido e o presente recurso, admitido, independentemente de preparo. 1.2. Da nulidade da sentença A parte apelante suscitou, em sede preliminar, a nulidade da sentença, por ausência de fundamentação, ao argumento de que, “aparentemente, a aplicação indevida dos recursos públicos repassados ao Município foi PRESUMIDA, e não comprovada” (fl. 152). A alegação de que a condenação teria se baseado em mera presunção de dano ao erário não configura vício de fundamentação, mas matéria de mérito, a ser enfrentada na análise da tipicidade da conduta imputada ao réu. Rejeita-se, pois, a preliminar. 2. Do Mérito Conforme narrado na petição inicial, o réu, ora apelante, no exercício do mandato de prefeito do Município de Carauari/AM, em 2009, teria realizado despesas irregulares, com recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), mediante dispensa indevida de licitação, inclusive fora do período de emergência decretado em razão das cheias dos rios da região. Argumentou o Ministério Público que a administração municipal teria efetuado compras diretas de gêneros alimentícios destinados à merenda escolar, por meio de contratos verbais, sem critério de escolha ou pesquisa de preços, e além dos limites estabelecidos pelo próprio decreto de situação de emergência. O juízo de origem considerou comprovado, em síntese, que o apelante “não formalizou a dispensa das aquisições de merenda escolar do mês de abril a dezembro de 2009, efetuando compras diretas junto a fornecedores sem nada documentar, em ofensa direta ao disposto na lei de licitações, que é expressa ao exigir que se instrua o processo de dispensa com prova da situação emergencial ou calamitosa que a justifique” (fl. 137 dos cadernos físicos). Entendeu que as condutas do recorrente se enquadrariam ao art. 10, caput e inciso VIII, e ao art. 11, caput, da Lei 8.429/1992, impondo-lhe as sanções previstas nos incisos II e III do art. 12 da referida norma. Discutem-se, no presente caso, a materialidade e tipicidade das condutas imputadas ao réu à luz das alterações promovidas pela Lei 14.230/2021 na Lei de Improbidade Administrativa (LIA). A lei que fundamenta as imputações feitas ao apelante sofreu significativas alterações pela Lei 14.230/2021, cuja retroatividade foi definida pelo Supremo Tribunal Federal, ao fixar a seguinte tese da Repercussão Geral para o Tema 1199,nos seguintes termos: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei". À luz desses fundamentos, impõe-se o reconhecimento da retroatividade da novel legislação aos fatos tratados no presente feito. Com efeito, “6. Como resultado da incidência dos princípios do direito administrativo sancionador no sistema de improbidade administrativa disciplinado pela Lei nº 8.429/92, para situações que ainda não foram definitivamente julgadas, as novas disposições que tenham alterado os tipos legais que definem condutas ímprobas devem ser aplicadas de imediato, caso beneficiem o réu.” (TRF1, AC 0004922-20.2013.4.01.3701, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCUS VINICIUS REIS BASTOS, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 26/03/2025) Pois bem. Os arts. 10, caput e inciso VIII, e art. 11, caput, em sua redação anterior, da Lei 8.429/1992 estabeleciam que: Seção II Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente; (Redação dada pela Lei nº 13.019, de 2014) (...) Seção III Dos Atos de Improbidade Administrativa que Atentam Contra os Princípios da Administração Pública Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: (...) Com a edição da Lei 13.230/2021, passaram a vigorar com a seguinte redação: Seção II Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) Seção III Dos Atos de Improbidade Administrativa que Atentam Contra os Princípios da Administração Pública Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) (grifos aditados). Vejamos em que consistiram as alterações promovidas pela Lei 14.230/2021 no regime jurídico dos atos de improbidade administrativa, no que interessa a estes autos: 2.1. Dos atos ímprobos que causam prejuízo ao erário Com a edição da Lei 14.230/2021, a configuração da improbidade administrativa passou a exigira demonstração dos elementos subjetivo, consistente no dolo, e objetivo, referente à perda patrimonial efetiva. No tocante ao elemento objetivo, para que se caracterize o ato de improbidade que causa prejuízo ao erário, deve haver “efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades” pertinentes, e, em se tratando de dispensa indevida de licitação, deve-se demonstrar “perda patrimonial efetiva”, nos termos do caput e do inciso VIII, respectivamente, do aludido art. 10. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento no sentido ora exposto: “1. A conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente, tipificada no art. 10, inciso VIII, da Lei n. 8.429/1992, com a redação alterada pela Lei n. 14.230/2021, além de prever exclusivamente o dolo, passou a exigir a comprovação de perda patrimonial efetiva para caracterização como ato que causa lesão ao erário. 2. A possibilidade de condenação com base em dano presumido (in reipsa) era fruto de entendimento jurisprudencial, que não mais se coaduna com a nova disposição legal da matéria. 3. Apesar de o Tema 1199 do STF não tratar especificamente da retroatividade de tal dispositivo, impõe-se a sua aplicação no caso para reconhecer a atipicidade superveniente da conduta baseada exclusivamente em dano presumido ao erário. Precedentes das duas Turmas de Direito Público do STJ. 4. Julgada extinta a punibilidade do embargante em razão da superveniente atipicidade da conduta a ele imputada; e, por conseguinte, julgado prejudicados os embargos de divergência.” (STJ, EREsp n. 1.288.585/RJ, relator Ministro Teodoro Silva Santos, Primeira Seção, DJEN de 4/12/2024.) (grifos aditados) Anote-se também: EDcl no AgInt no AREsp n. 1.252.262/AL, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 9/12/2024, DJEN de 11/2/2025; AgInt no AREsp n. 1.568.466/RN, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 12/3/2025, DJEN de 18/3/2025. Essa orientação foi reiterada em julgados recentes desta 10ª Turma, a saber: “5. A Lei nº 8.429/92, após a reforma promovida pela Lei nº 14.230/2021, passou a exigir a presença do dolo específico para a configuração dos atos de improbidade administrativa tipificados nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/92. Ainda, a Lei nº 14.230/2021 deixou expresso no texto da Lei de Improbidade Administrativa a necessidade de efetivo prejuízo ou dano ao Erário para configuração de ato de improbidade previsto no art. 10. 6. Como resultado da incidência dos princípios do direito administrativo sancionador no sistema de improbidade administrativa disciplinado pela Lei nº 8.429/92, para situações que ainda não foram definitivamente julgadas, as novas disposições que tenham alterado os tipos legais que definem condutas ímprobas devem ser aplicadas de imediato, caso beneficiem o réu. 7. No caso, não restou comprovado o prejuízo ao Erário, nem o dolo específico na conduta do ex-Prefeito do Município São João da Fronteira/PI e a empresa responsável pela obra. Logo, deve ser reformada a sentença. 8. Conforme o art. 1.005, caput, do CPC, "O recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo se distintos ou opostos os seus interesses". O STJ compreende que a extensão dos efeitos deve ser feita àquelas situações que necessitem de tratamento igualitário. Precedente. 9. À vista do entrelaçamento fático entre os Réus e inexistência de oposição manifesta dos litisconsortes, a eles deve ser estendido o efeito da improcedência da imputação, conquanto não tenha apelado, em respeito ao princípio da isonomia, por força do art. 1.005, caput, do CPC. 10. Recursos dos réus providos. Recurso do Ministério Público a que nega se provimento. Improcedência da ação de improbidade administrativa.” (TRF1, AC 0005409-18.2017.4.01.4002, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCUS VINICIUS REIS BASTOS, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 26/03/2025) (grifos aditados) No caso dos autos, a r. sentença não examinou os prejuízos decorrentes da conduta imputada ao réu; tampouco foram constituídas provas nesse sentido. Diante da ausência de comprovação do elemento objetivo exigido pelo inciso VIII do art. 10, em sua nova redação, impõe-se o reconhecimento da superveniente atipicidade da conduta imputada ao réu e, por conseguinte, a extinção da punibilidade do suposto agente com relação aos atos previstos no art. 10 da LIA. 2.2. Dos atos ímprobos que atentam contra princípios da Administração Pública O art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa, por sua vez, passou a prever um rol taxativo de condutas ímprobas, sendo necessária a subsunção da conduta a um de seus incisos. Não mais se admite a condenação fundada em violação genérica aos princípios administrativos. A propósito, o Supremo Tribunal Federal decidiu que: 1. A Lei 14.231/2021 alterou profundamente o regime jurídico dos atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública (Lei 8.249/1992, art. 11), promovendo, dentre outros, a abolição da hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios discriminados no caput do art. 11 da Lei 8.249/1992 e passando a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, discriminada exaustivamente nos incisos do referido dispositivo legal. 2. No julgamento do ARE 843.989 (tema 1.199), o Supremo Tribunal Federal assentou a irretroatividade das alterações introduzidas pela Lei 14.231/2021 para fins de incidência em face da coisa julgada ou durante o processo de execução das penas e seus incidentes, mas ressalvou exceção de retroatividade para casos como o presente, em que ainda não houve o trânsito em julgado da condenação por ato de improbidade. 3. As alterações promovidas pela Lei 14.231/2021 ao art. 11 da Lei 8.249/1992 aplicam-se aos atos de improbidade administrativa praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado. 4. Tendo em vista que (i) o Tribunal de origem condenou o recorrente por conduta subsumida exclusivamente ao disposto no caput do art. 11 da Lei 8.429/1992 e que (ii) a Lei 14.231/2021 passou a prever a tipificação taxativa dos atos de improbidade administrativa por ofensa aos princípios da administração pública, imperiosa a reforma do acórdão recorrido para considerar improcedente a pretensão autoral no tocante ao recorrente. 5. Impossível, no caso concreto, eventual reenquadramento do ato apontado como ilícito nas previsões contidas no art. 9º ou 10 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.249/1992). Caracterização de reformatio in pejus, tendo em vista a existência de recurso exclusivo da defesa. 6. Embargos de declaração conhecidos e acolhidos para, reformando o acórdão embargado, dar provimento ao agravo regimental e ao recurso extraordinário com agravo, a fim de extinguir a presente ação civil pública por improbidade administrativa no tocante ao recorrente. (STF, ARE 1414607 AgR-ED, Relator(a): LUÍS ROBERTO BARROSO (Presidente), Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 07-05-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 01-07-2024 PUBLIC 02-07-2024) Os julgados do Superior Tribunal de Justiça não destoam desse entendimento. Confira-se: “2. A conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente, tipificada no art. 10, inciso VIII, da Lei n. 8.429/1992, com a redação alterada pela Lei n. 14.230/2021, além de prever exclusivamente o dolo, passou a exigir a comprovação de perda patrimonial efetiva para caracterização como ato que causa lesão ao erário. 3. A possibilidade de condenação com base em dano presumido (in reipsa) era fruto de entendimento jurisprudencial do STJ, que não mais se coaduna com a nova disposição legal da matéria. 4. Apesar do Tema 1.199 do STF não tratar especificamente da retroatividade de tal dispositivo, impõe-se a sua aplicação no caso para reconhecer a atipicidade superveniente da conduta baseada exclusivamente em dano presumido ao erário. 5. A Lei n. 14.230/2021 promoveu diversas alterações na Lei n. 8.429/1992, dentre elas a revogação dos incisos I e II e a redação do caput do art. 11, que passou a exigir a tipicidade das condutas que caracterizam ofensa aos princípios da Administração Pública, e a inclusão do § 2º do art. 1º, que trouxe o requisito do dolo específico. 6. O STF, a partir do Tema n. 1.199 de repercussão geral, formulou o entendimento de que, ausente hipótese de continuidade típico-normativa, a atual redação do art. 11 da Lei n. 8.429/1992 aplica-se aos atos de improbidade administrativa decorrentes da violação aos princípios administrativos praticados na vigência do texto anterior, sem condenação transitada em julgado. O STJ também possui o mesmo entendimento. Precedentes. 7. Agravo conhecido para negar provimento ao recurso especial.” (STJ, AREsp n. 2.739.878/BA, relator Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, julgado em 19/2/2025, DJEN de 25/2/2025.) (grifos aditados) Em sentido idêntico, cito precedente desta e. Turma: “8. A Lei nº 8.429/92, após a reforma promovida pela Lei nº 14.230/2021, passou a exigir a presença do dolo específico para a configuração dos atos de improbidade administrativa tipificados nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992. 9. A Lei nº 14.230/2021 modificou a redação do caput do art. 11 da Lei nº 8.429/92 para tornar o rol de condutas ímprobas taxativo. Sendo assim, para a configuração de ato de improbidade administrativa tipificado no art. 11 da Lei nº 8.429/92, após as inovações legislativas, exige-se a subsunção da conduta em algum dos incisos deste dispositivo. 10. Como resultado da incidência dos princípios do direito administrativo sancionador, para as situações que ainda não foram definitivamente julgadas, as novas disposições que tenham alterado os tipos legais que definem condutas ímprobas devem ser aplicadas de imediato, caso beneficiem o réu, como é o caso desta ação. 11. Os Requeridos agiram com o dolo específico de obter enriquecimento ilícito. A materialidade do ato ímprobo também restou comprovada. 12. As penalidades aplicadas são proporcionais e, por isso, mantidas. 13. Recursos de Henrique Amaral de Oliveira e Daniel Delani parcialmente providos. Recursos dos demais réus, parcialmente providos.” (TRF1, AC 0012563-26.2013.4.01.4100, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCUS VINICIUS REIS BASTOS, TRF1 - DÉCIMA TURMA, PJe 04/04/2025) (grifos aditados) Na hipótese em exame, a sentença reconheceu a prática de ato ímprobo com fundamento exclusivo no caput do art. 11, sem indicação de qualquer das condutas taxativamente previstas nos incisos da redação atual. Assim, não subsiste a tipificação do fato como ato de improbidade administrativa. Reconhecida a atipicidade superveniente dos atos imputados ao apelante, a improcedência dos pedidos iniciais é medida que se impõe, nos termos do art. 17, §11, da LIA. 3. Da Conclusão Ante o exposto, dou provimento à apelação de FRANCISCO COSTA DOS SANTOS para julgar improcedentes os pedidos, nos termos do art. 17, §11, da LIA. Defiro o pedido de gratuidade da justiça. Sem custas nem honorários advocatícios (art. 23-B, §§ 1º e 2º, da Lei 8.429/92).) É como voto. Juíza Federal MARIA CÂNDIDA CARVALHO MONTEIRO DE ALMEIDA Relatora Convocada PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 30 - DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0000496-02.2016.4.01.3202 APELANTE: FRANCISCO COSTA DOS SANTOS Advogados do(a) APELANTE: ANY GRESY CARVALHO DA SILVA - AM12438, BRUNO VIEIRA DA ROCHA BARBIRATO - AM6975-A, CAMILLA TRINDADE BASTOS - AM13957-A, FABIO NUNES BANDEIRA DE MELO - AM4331-A, FERNANDA COUTO DE OLIVEIRA - AM11413-A, LAIZ ARAUJO RUSSO DE MELO - AM6897-A, LIVIA ROCHA BRITO - AM6474-A APELADO: FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (PROCURADORIA) EMENTA APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRELIMINARES. PREPARO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. VÍCIO DE FUNDAMENTAÇÃO AFASTADO. MÉRITO. LEI 8.429/1992. LEI 14.230/2021. APLICAÇÃO RETROATIVA. PREFEITO MUNICIPAL. CONTRATAÇÃO DIRETA. DISPENSA DE LICITAÇÃO. ART. 10, INCISO VIII, DA LIA. PERDA PATRIMONIAL EFETIVA. ART. 11, CAPUT, DA LIA. ATIPICIDADE SUPERVENIENTE DA CONDUTA. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. RECURSO DO RÉU PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta contra sentença que julgou procedente ação civil pública por ato de improbidade administrativa, imputando ao réu condutas previstas nos arts. 10, inciso VIII, e 11, caput, da Lei nº 8.429/1992 (redação original), com aplicação das sanções dos incisos II e III do art. 12. Conforme narrado na petição inicial, o réu, ora apelante, no exercício do mandato de prefeito do Município de Carauari/AM, em 2009, teria realizado despesas irregulares, com recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), mediante dispensa indevida de licitação, inclusive fora do período de emergência decretado em razão das cheias dos rios da região. II. Questão em discussão 2. Discutem-se, no presente caso, a materialidade e tipicidade das condutas previstas nos arts. 10, inciso VIII, e 11, caput, da Lei nº 8.429/1992, imputadas ao réu, à luz das alterações promovidas pela Lei 14.230/2021 na Lei de Improbidade Administrativa (LIA). III. Preliminares 3. Preparo: 3.1. Os beneficiários da justiça gratuita são dispensados do recolhimento do preparo, nos termos do art. 98, §1º, inciso VIII, do CPC. 3.2. Pedido de gratuidade da justiça: 3.2.1. A simples alegação de hipossuficiência na petição recursal não autoriza, de plano, a concessão da gratuidade da justiça. Contudo, nos termos do art. 99, §2º, do CPC, deve-se oportunizar à parte a juntada de documentos que comprovem sua alegada incapacidade financeira antes do indeferimento do benefício. 3.2.2. No caso dos autos, instado a demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais, o apelante comprovou renda líquida inferior a 10 salários-mínimos. Reconhecido o direito à gratuidade, o presente recurso deve ser admitido, independentemente de preparo. 4. Preliminar de nulidade da sentença rejeitada: A alegação de que a condenação teria se baseado em presunção de dano ao erário não configura vício de fundamentação, mas matéria de mérito, a ser enfrentada na análise do enquadramento da conduta imputada ao réu ao tipo legal. IV. Razões de decidir 5. Aplicação retroativa da Lei 14.230/2021 aos processos em curso, à luz dos fundamentos adotados pelo Supremo Tribunal Federal, ao fixar a tese do Tema 1.199 da repercussão geral. 6. Para a configuração de ato de improbidade que causa prejuízo ao erário (art. 10), exige-se, após a edição da Lei 14.230/2021, a demonstração de efetiva perda patrimonial. Ausente prova do dano concreto, a retroatividade da lei que não mais considera o fato como ímprobo impõe a improcedência dos pedidos, nos termos do art. 17, §11, da LIA. Orientação consolidada pelo STJ, ao julgar o EREsp n. 1.288.585/RJ, relator Ministro Teodoro Silva Santos, Primeira Seção, DJEN de 4/12/2024. No caso dos autos, deve ser reconhecida a superveniente atipicidade da conduta imputada ao réu, tendo em vista a ausência de comprovação do elemento objetivo exigido pelo inciso VIII do art. 10, em sua nova redação. 7. O ato que atenta contra princípios da Administração Pública deve corresponder a uma das condutas taxativamente previstas nos incisos do art. 11 da LIA, com a redação dada pela Lei 14.230/2021, não sendo suficiente a mera referência genérica ao respectivo caput. Precedente do STF: ARE 1414607 AgR-ED, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 7/5/2024. Precedentes do STJ e do TRF1. Na hipótese em exame, não subsiste a tipificação da conduta prevista exclusivamente no caput do art. 11 da LIA. 8. Reconhecida a atipicidade superveniente dos atos imputados ao apelante, a improcedência dos pedidos iniciais é medida que se impõe, nos termos do art. 17, §11, da LIA. V. Dispositivo 9. Apelação de FRANCISCO COSTA DOS SANTOS provida para julgar improcedentes os pedidos, nos termos do art. 17, §11, da LIA. 10. Gratuidade da justiça deferida. ACÓRDÃO Decide a Décima Turma, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto da relatora. Juíza Federal MARIA CÂNDIDA CARVALHO MONTEIRO DE ALMEIDA Relatora Convocada

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