Processo nº 1001130-02.2023.8.11.0040
ID: 260791474
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1001130-02.2023.8.11.0040
Data de Disponibilização:
25/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
PRISCILA DE PAULA VIEIRA FREITAS
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001130-02.2023.8.11.0040 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Extorsão mediante seqüestro] Relator: Des(a). MARCOS …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001130-02.2023.8.11.0040 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Extorsão mediante seqüestro] Relator: Des(a). MARCOS MACHADO Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). WESLEY SANCHEZ LACERDA, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI] Parte(s): [POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), EMILLY PEREIRA DA SILVA - CPF: 056.027.401-71 (APELANTE), JEAN OLIVEIRA DA SILVA - CPF: 061.728.261-74 (APELANTE), JOICIMAR DA SILVA NASCIMENTO - CPF: 000.294.171-63 (TERCEIRO INTERESSADO), PAULO CESAR BRAMBILLA COSTA - CPF: 353.934.588-43 (TERCEIRO INTERESSADO), ILSON ZUZA DE OLIVEIRA - CPF: 551.750.741-72 (VÍTIMA), MARIA LEUDIANE FELIX (ASSISTENTE), CLEONICE MARIA DE ARAÚJO (ASSISTENTE), PRISCILA DE PAULA VIEIRA FREITAS - CPF: 045.527.731-19 (ADVOGADO), MICHAELLE PEREIRA DA SILVA - CPF: 082.776.421-99 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). WESLEY SANCHEZ LACERDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A Ementa: Direito penal e processual penal. Apelação criminal. roubo majorado e associação criminosa. Absolvição. envolvimento restrito à extorsão. Provas suficientes para condenação pelos demais crimes. redimensionamento da pena. Recurso conhecido em parte e provido parcialmente. I – Caso em exame Apelação criminal interposta contra sentença que a condenou pelos crimes de roubo majorado, extorsão qualificada e associação criminosa a 16 anos, 9 meses e 10 dias de reclusão e 25 dias-multa, visando a absolvição. Subsidiariamente, a desclassificação para receptação e redução das penas. II. Questões em discussão Há 8 (oito) questões: 1) insuficiência das provas; 2) desclassificação para a receptação; 3) penas-bases exasperadas mediante fundamentação inidônea; 4) incidência da atenuante da menoridade relativa; 5) emprego de arma não caracterizado; 6) afastamento do concurso material e reconhecimento do crime formal; 7) reconhecimento de participação de menor importância; 8) fixação do regime inicial aberto. III. Razões de decidir 1. Os elementos de convicção produzidos, especialmente o depoimento dos agentes policiais responsáveis pela investigação e a quebra do sigilo de dados telefônicos/bancários, são suficientes para demonstrar que a apelante prestou auxílio material [indicação de conta bancária de sua titularidade/terceiro, além de movimentar o dinheiro proveniente do crime] para que a extorsão fosse cometida. 2. “Não obstante a estreita contiguidade que existe entre o roubo e a extorsão, há entre esta e aquele, relativamente ao momento consumativo, em face do nosso Código, sensível diferença: enquanto o roubo é crime material, exigindo para a sua consumação um efetivo dano patrimonial, a extorsão, em qualquer de suas modalidades (arts. 158 e 159), é crime formal ou 'de consumação antecipada', integrando-se com a só ação, tolerância ou omissão imposta coercitivamente à vítima, ou com o sequestro da pessoa para cujo resgate é exigida a vantagem ilícita.” 3. Ausente a demonstração de prévia convergência de vontade/desígnios autônomos para a consumação do roubo, a conduta criminosa da apelante exauriu-se no momento consumativo da extorsão, com a coerção da vítima. Isso porque a “conduta do réu em constranger a vítima, mediante grave ameaça, a realizar transferência via Pix configura crime autônomo de extorsão (artigo 158 , § 1º , do Código Penal ), não se confundindo com o crime de roubo”. 4. A semelhança entre os tipos penais [roubo e extorsão] recomenda “cautela a fim de se evitar os riscos da dupla punição”, visto que “a simples referência legislativa a tipos penais distintos não torna obrigatória a aplicação de ambos, sobretudo quando muito tênue a distinção entre as formulações legislativas.” 5. “Seja pela ausência de elementos a demonstrar que tenha concorrido para a prática do crime; ou do dolo específico; ou fragilidade probatória [...]; a absolvição do apelante pelo delito de roubo qualificado é medida impositiva, a fim de que seja prestigiado o princípio do in dubio pro reo.” 6. O intermédio/fornecimento de conta bancária para o produto da extorsão [praticada em coautoria com outros agentes] não revela, por si só, o vínculo associativo, pois a “associação com o objetivo de cometer um delito específico não é capaz de configurar o tipo penal em análise, mormente porque o crime inscrito no art. 288 do Código Penal exige a prática reiterada de crimes”. 7. O reconhecimento da associação criminosa pressupõe: 1) cometimento de crimes indeterminados por 3 (três) ou mais pessoas; 2) comprovação do liame subjetivo; 3) conjugação de vontades; 4) estabilidade e permanência do agrupamento, com “uma predisposição comum de meios para a prática de uma série indeterminada de delitos”. 8. “Se os elementos de provas apontam tão somente o concurso eventual de pessoas, e não o vínculo associativo permanente e duradouro entre os agentes, que é exigido para a configuração do tipo penal, impõe-se absolvê-los do crime de associação criminosa.” 9. “Inexiste interesse recursal em relação ao reconhecimento da atenuante da menoridade relativa, porquanto a atenuante foi aplicada na sentença.” 10. O emprego de arma de fogo por um dos agentes da extorsão “se comunica aos demais que agiram em prévia convergência de vontades, por se tratar de circunstância objetiva, à luz da teoria monista do concurso de pessoas, adotada pelo art. 29 do Código Penal”. 11. A lei penal prevê que quando o crime for “cometido por duas ou mais pessoas, ou com o emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até a metade” (CP, art. 158, § 1º), ou seja, inexiste previsão legal para a incidência da fração de 2/3 (dois terços). 12. O c. STJ assentou diretriz jurisprudencial no sentido de ser pertinente a aplicação do patamar de aumento de ½ (metade) quando “presentes ambas as hipóteses previstas pelo legislador para a incidência da referida causa de aumento”, sobretudo ao considerar o número de agentes e armas empregados [três indivíduos armados] pelos executores diretos da extorsão. 13. “Inviável o reconhecimento da participação de menor importância quando demonstrada a efetiva contribuição da agente para o êxito da empreitada criminosa. [...] participação no crime de extorsão mediante sequestro resta configurada quando o agente, consciente e voluntariamente, contribui para a consecução do delito, ainda que sua atuação se limite ao recebimento dos valores extorquidos.” 14. A pena imposta - superior a 8 (oito) anos - e o envolvimento em crime de extorsão qualificada pelo emprego de arma de fogo e concurso de agentes autorizam a manutenção fechado. IV. Dispositivo e tese Recurso provido parcialmente para absolver a apelante do roubo majorado e associação criminosa, nos termos do art. 386, V e VII, e readequar as penas da extorsão em 9 (nove) anos de reclusão e 15 (quinze) dias- multa, no regime inicial fechado. Tese de Julgamento: 1. A efetiva atuação da apelante no recebimento e dissimulação dos valores obtidos após a coação da vítima enseja sua responsabilização penal pela extorsão, afastando-se as pretensões absolutória/desclassificatória. 2. A ausência de envolvimento direto da apelante no assalto, somada à inexistência de prova de sua atuação nos atos preparatórios ou de apoio logístico, autoriza a absolvição do roubo majorado. 3. O vínculo associativo, apto a autorizar a condenação pelo crime previsto no art. 288 do CP, pressupõe demonstração de estabilidade, permanência e pluralidade de delitos, o que não se verifica em crimes isolados. 4. Se a atenuante da menoridade relativa foi corretamente reconhecida e compensada, inexiste interesse recursal sobre o ponto. 5. O emprego de arma de fogo por um dos agentes da extorsão se comunica aos demais coautores, à luz da teoria monista do concurso de pessoas. 6. O aumento da pena com base no art. 158, §1º, do CP deve observar os limites legais de 1/3 a 1/2, sendo vedada a aplicação de fração superior. 7. As condutas consistentes na indicação de conta bancária e movimentação de valores, com ciência da origem ilícita, caracterizam coautoria na extorsão, sendo inaplicável a minorante de participação de menor importância. 8. O regime inicial fechado afigura-se compatível com a pena superior a 8 anos e gravidade concreta da conduta. Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 157, §2º, II e V, §2º-A, I; 158, §1º e §3º; 288, caput; 29, §1º; 61, II, "c"; 65, I; 69; CPP, art. 386, V e VII. Jurisprudência relevante citada: STJ, HC 411.765/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 17.10.2017; STJ, HC 403.215/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 22.8.2017; TJMT, Apelação Criminal nº 1009430-05.2023.8.11.0055, Relator: Des. Orlando De Almeida Perri, Primeira Câmara Criminal, julgado em 17.05.2024. TJMT, Apelação Criminal nº 1002095-21.2020.8.11.0028, Relator: Des. Paulo da Cunha, Primeira Câmara Criminal, julgado em 16.12.2021. TJMT, Apelação Criminal nº 0014329-25.2011.8.11.0042, Relator: Des. Paulo da Cunha, Primeira Câmara Criminal, julgado em 09.07.2019, publicado em 09.07.2019. TJMT, Apelação Criminal nº 0001184-15.2017.8.11.0098, Relator: Des. Orlando de Almeida Perri, julgado em 16.07.2019, publicado em 18.07.2019. TJMT, Apelação Criminal nº 1001255-12.2023.8.11.0026, Relator: Des. Lídio Modesto da Silva Filho, Quarta Câmara Criminal, julgado em 05.11.2024, publicado em 08.11.2024. TJMT, AP 1008504-88.2022.8.11.0045 - Relator: Des. Pedro Sakamoto, Segunda Câmara Criminal, j. 4.6.2024, p. 6.6.2024; TJMG, Ap. Crim. 0003596-43.2023.8.13.0003, Rel. Des. Franklin Higino Caldeira Filho, j. 15.5.2024; TJDF, AP 07226374220228070007, Rel. Des. Arnaldo Corrêa Silva, j. 22.6.2023; TJSP, Ap. Crim. 1502560-10.2022.8.26.0537, Rel. Des. Marcos Alexandre Coelho Zilli, j. 27.6.2024; TJMS, Ap. Crim. 0048737-02.2015.8.12.0001, Rel. Des. Jonas Hass Silva Júnior, j. 10.6.2024. TJAM, Apelação Criminal nº 0609651-66 .2017.8.04.0020 - Relator: Des. José Hamilton Saraiva dos Santos – Primeira Câmara Criminal - j. 21.3.2024 – p. 21.3.2024. Doutrina: HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. Vol. VII, p. 63. MIRABETE. Julio Fabrinni. Código Penal Interpretado, Editora Atlas, 4ª edição, p. 1.862. R E L A T Ó R I O PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO Nº 1001130-02.2023.8.11.0040 - COMARCA DE SORRISO APELANTE(S): EMILLY PEREIRA DA SILVA APELADOS(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL R E L A T Ó R I O Apelação criminal interposta por EMILLY PEREIRA DA SILVA contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Criminal de Sorriso, nos autos de ação penal (PJE nº 1001130-02.2023.8.11.0040), que a condenou por roubo majorado, extorsão qualificada e associação criminosa a 16 (dezesseis) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 25 (vinte e cinco) dias-multa, em regime inicial fechado – art. 157, § 2º, II e V, §2º-A, I, art. 158, §1º e §3º, e art. 288, “caput”, c/c art. 69 do CP – (ID 249460386). A apelante sustenta que: 1) “não existem provas que identifiquem a participação da apelante nos crimes”; 2) as penas-bases foram exasperadas mediante fundamentação inidônea; 3) possuía 19 (dezenove) anos de idade à época dos crimes, a justificar o reconhecimento da menoridade relativa; 4) não estava no local da execução do crime, “inexistindo possibilidade desta incidir na majorante do emprego de arma de fogo”; 5) “os crimes ocorreram mediante uma só ação, visto que foi uma única abordagem, praticaram o roubo e compeliram a vítima a realizar transação bancária via PIX (extorsão), o que configura concurso formal”. Pede o provimento para que seja absolvida. Subsidiariamente, desclassificada a conduta para “receptação de valores” ou reduzidas as penas, “considerando a mínima participação [...] nos fatos”, bem como “seja fixado o regime inicial aberto” (ID 249460397). A 1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL DE SORRISO pugna pelo desprovimento do recurso (fls. 930/957-ID 249460406). A i. 5ª Procuradoria de Justiça Criminal opina pelo desprovimento do recurso (Silvana Correa Vianna, procuradora de Justiça – fls. 978/998- ID 262140774) É o relatório. V O T O R E L A T O R V O T O (MÉRITO) EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR) Egrégia Câmara: O recurso é cabível (CPP, art. 593, I), manejado por quem tem interesse (CPP, art. 577) e não se verifica hipótese de extinção de punibilidade (CP, art. 107). Consta da denúncia que: “[...] Fato 01 [...]em data e horário ainda não precisados, mas nos meses de dezembro de 2022 e janeiro de 2023, a denunciada, EMILLY PEREIRA DA SILVA, associou-se com as pessoas de MICHAELLE PEREIRA DA SILVA e “JEAN OLIVEIRA DA SILVA”, além de terceiros ainda não identificados, de forma ordenada entre si, cada qual exercendo uma função específica (divisão de tarefas), com o objetivo de angariar vantagem patrimonial, mediante práticas de crimes de roubo majorado e extorsão, nesta cidade e Comarca de Sorriso/MT. Fato 02 No dia 18 de janeiro de 2023, por volta das 20h30min, no estacionamento da “Loja Havan”, nesta Comarca, a denunciada, EMILLY PEREIRA DA SILVA, de forma livre e consciente, em comunhão de ações e desígnios entre si e as pessoas identificadas como MICHAELE PEREIRA DA SILVA e “JEAN OLIVEIRA DA SILVA”, além de terceiros ainda não identificados, mediante violência e grave ameaça consubstanciada em palavras de ordem e pelo emprego de arma de fogo, subtraiu para si, um aparelho celular marca Samsung, modelo J2 e o veículo Sandero, de placa OAY3C23, em prejuízo da vítima ILSON ZUZA DE OLIVEIRA, além de restringir a liberdade da vítima por período superior ao necessário para consumação do crime. FATO 03 Infere-se dos autos que, momentos após, a denunciada, de forma livre e consciente, em comunhão de ações e desígnios entre si e os indivíduos já mencionados, mediante violência e grave ameaça consubstanciada em palavras de ordem e pelo emprego de arma de fogo, restringindo a liberdade da vítima como condição para obtenção da vantagem econômica visada, constrangeram o lesado ILSON ZUZA DE OLIVEIRA a realizar várias transações no PIX para determinados números de contas bancárias, sendo duas em favor da denunciada, nos valores de R$2.000,00 (dois mil reais) e R$10.000,00 (dez mil reais). [...] Ante o exposto, em aditamento à denúncia, DENUNCIO EMILLY PEREIRA DA SILVA, como incursa artigo 157, § 2º, incisos II e V, c/c § 2º-A, inciso I, c/c art. 61, inciso II, alínea “c”, art. 288, parágrafo único e art. 158, § 1º e 3º, c/c art. 29, todos do Código Penal, na forma do art. 69 do CP, requer, após o recebimento do presente aditamento à denúncia, seja a denunciada citada, processada pelo rito pertinente e, confirmada esta, condenada” (Fernanda Pawelec Vasconcelos, promotora de Justiça – ID 249460272 – fls. 414/418). O Juízo singular reconheceu a responsabilidade penal e dosou as penas nos seguintes termos: “A materialidade do delito resta sobejamente demonstrada pelos boletins de ocorrência n. 2023.23852 e n. 2023.23472(Ids. 109108000 e 109108001), termo de declaração vítima e testemunhas policiais e, também, depoimentos judiciais. A autoria delitiva também restou comprovada. Vejamos: [...]. E, quanto aos Réus João Henrique, Michaelle e Emilly, exerciam, a priori, o papel de camuflar os valores obtidos como lucro das empreitadas criminosas, disponibilizando suas contas bancárias para receber e, em seguida, disseminá-los em contas diversas, com o fim de dificultar o seu rastreamento. Nesse interim, contrário as declarações dos réus, o arcabouço probatório, como prints indicam que estes possuíam conhecimento da origem ilícita dos valores, porquanto se tratava de atividade previamente ajustada, a propósito, com data e hora marcada para ficar aguardando o comando de execução das atividades desempenhadas por cada um dos integrantes da associação. Com efeito, nesse diapasão, não tem espaço a alegação do réu João Henrique de que não tinha conhecimento do uso de sua conta bancária por Emilly, mormente porque se não possuíam conta conjunta conforme declarado, embora conviventes, não havia porque haver uma transação em sua conta realizada por Emilly, a não ser o ajuste prévio. Não bastasse, a alegação de Michaelle e Emilly, de que só se conheciam por rede social, e que não sabiam de quem vinham ou para onde iam os valores recebidos, não tem espaço no presente feito. Ora, analisando os fatos verifica-se que não está dentro dos padrões de normalidade, uma pessoa adulta e consciente disponibilizar sua conta bancária para transações à pessoas que conhece somente por rede social, ou, ainda, por desconhecidos, que pediu sem qualquer conhecimento, sem, ao menos, indagar ou suspeitar quais seriam o motivos ou até mesmo de onde seriam “os valores”. Ou seja, sabiam de toda a empreitada criminosa, como ela era desenvolvida, e se associaram com os demais objetivando obter lucro fácil, acreditando que não poderiam ser responsabilizadas. [...] Ainda, Michaelle e Emilly, ao que se verifica de suas declarações, em verdade tentam se eximir de sua conduta, tentando levar o juízo a crer que teriam tão somente “pelo acaso e de forma aleatória” disponibilizado suas contas bancárias para transações desconhecidas, quando na verdade, ao que consta dos autos, na empreitada criminosa estavam ajustadas com conhecimento de toda a empreitada criminosa, porém, in casu, de rigor a aplicação do disposto no art. 29, §1º, do CP, no que toca ao crime de roubo, eis que em tal hipótese suas participações foram de menor importância conforme será explicado em tópico a seguir. [...] Nesse sentido, tenho que restou suficientemente comprovada a comunhão de ação e desígnios entre os acusadas MICHAELLE PEREIRA DA SILVA e EMILLY PEREIRA DA SILVA; e os acusados ALEX RAVEL DE SOUZA RAMOS, EDSON GERSON MACHADO DE MOURA, JOÃO HENRIQUE RODRIGUES DOS SANTOS, LEONARDO DA SILVA ARAÚJO, RAUL ARRUDA DE SOUZA COSTA (estes processados em apartado nos autos sob n. 1003950-91.2023.8.11.0040) na prática do roubo qualificado em lume e, também, extorsão e associação criminosa, merecendo, portanto acolhimento o pleito condenatório formulado pelo órgão ministerial. [...] Ante o exposto, e por tudo que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE o pedido contida na exordial acusatória, para CONDENAR as acusadas MICHAELLE PEREIRA DA SILVA e EMILLY PEREIRA DA SILVA, como incurso nas sanções do artigo 157, § 2º, incisos II e V, c/c § 2º-A, inciso I, c/c art. 61, inciso II, alínea “c”, c/c art. 29, caput, §1º, art. 288, parágrafo único e art. 158, § 1º e 3º, todos do Código Penal. [...] 8.2.1. DO CRIME DE ROUBO MAJORADO (art. 157, § 2º, incisos II e V, c/c § 2º-A, inciso I, c/c art. 61, inciso II, alínea “c”, c/c art. 29, caput, §1º, todos do Código Penal) 1ª Fase. No que se refere à culpabilidade, verifica-se que a mesma não extrapola o tipo. Seus antecedentes são imaculados. Não há nos autos fato que desabone a conduta social da acusada. Não consta nos autos elementos e provas para analisar a personalidade do agente. As circunstâncias no caso são desfavoráveis, tendo em vista que o réu praticou o fato em concurso de agentes e restrição da liberdade, com os demais réus, o que considero grave, portanto, utilizo essas causas de aumento de pena para majorar a pena base e a majorante da utilização de arma de fogo, será considerada na terceira fase da dosimetria. O E. TJMT já se pronunciou sobre a questão em tela, consoante se infere do Enunciado da Turma de Câmaras Criminais Reunidas n. 32: “A incidência de duas ou mais causas especiais de aumento de pena no crime de roubo autoriza a utilização de uma delas na terceira fase da dosimetria e as demais na primeira, como circunstâncias judiciais desfavoráveis”. Os motivos são inerentes ao tipo penal. O fato praticado não originou consequências para a vítima que desbordem do tipo penal. No que se refere ao comportamento da vítima, tenho que esta não contribuiu para a realização da conduta em apreço. Assim, considerando as modulares expostas, tenho como suficiente à prevenção e reprovação do delito a pena-base de 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de reclusão, que corresponde à pena mínima acrescida de 1/8 (um oitavo) sobre a diferença entre as penas máxima e mínima cominadas para o tipo, em razão do reconhecimento de uma circunstâncias judicial negativa (circunstâncias do crime: concurso de agentes e restrição da liberdade). 2ª FASE Na segunda fase da dosagem, vislumbra-se a presença da circunstância atenuante da menoridade relativa, prevista no artigo 65, inciso I, do Código Penal e agravante do crime cometido mediante dissimulação, prevista no artigo 61, inciso II, alínea “c” do Código Penal. No entanto, conforme entendimento do E. TJMT, devem ser compensadas (N.U 0014329-25.2011.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, PAULO DA CUNHA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 09/07/2019, Publicado no DJE 09/07/2019), razão pela qual mantenho a pena intermediária em 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de reclusão. 3ª Fase. Na terceira fase, presente a causa de diminuição de pena prevista no §1º do art. 29, do CP (participação de menor importância), razão pela qual tendo em vista reduzida eficiência causal, diminuo a pena da acusada na razão de 1/3 (um terço), de maneira que a reduzo para 03 (três) anos e 02 (dois) meses de reclusão. Também, verifica-se presente a causa de aumento prevista no artigo 157, § 2º-A, inciso I, do Código Penal (crime foi praticado mediante a utilização de arma de fogo). Desse modo, aumento em 2/3 a pena aplicada, ficando ela em 05 (cinco) anos, 03 (três) meses e 10 (dez) dias de reclusão, pena que torno definitiva por não mais vislumbrar demais causas capazes de influir em seu cômputo. DA PENA DE MULTA. Diante da dosimetria alhures, conforme regra dos artigos 49 e 60, ambos do CP, dada a renda declarada em seu interrogatório, fixo a pena de multa em 10 (dez) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente à época dos fatos. 8.2.2. DO CRIME DE EXTORSÃO (art. 158, § 1º e 3º, do Código Penal) 1ª Fase. No que se refere à culpabilidade, verifica-se que a mesma não extrapola o tipo. Seus antecedentes são imaculados. Não há nos autos fato que desabone a conduta social do acusado. Não consta nos autos elementos e provas para analisar a personalidade do agente. As circunstâncias e os motivos são inerentes ao tipo penal. O fato praticado não originou consequências para a vítima que desbordem do tipo penal. No que se refere ao comportamento da vítima, tenho que esta não contribuiu para a realização da conduta em apreço. Assim, considerando as modulares expostas, tenho como suficiente à prevenção e reprovação do delito a pena-base de 6 (seis) anos de reclusão, mormente porque neste caso as circunstâncias judiciais são favoráveis ao réu. 2ª FASE Na segunda fase da dosagem, vislumbra-se a presença da circunstância atenuante da menoridade relativa, prevista no artigo 65, inciso I, do Código Penal e agravante do crime cometido mediante dissimulação, prevista no artigo 61, inciso II, alínea “c” do Código Penal. No entanto, conforme entendimento do E. TJMT, devem ser compensadas (N.U 0014329-25.2011.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, PAULO DA CUNHA, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 09/07/2019, Publicado no DJE 09/07/2019), razão pela qual mantenho a pena intermediária em 6 (seis) anos de reclusão 3ª Fase. Finalmente, na terceira etapa da dosimetria da pena, inexistem causas de diminuição de pena, contudo, verifica-se que o crime foi praticado mediante concurso de duas ou mais pessoas e utilização de arma de fogo, nos termos do artigo 158, §1º, do Código Penal. Desse modo, diante da pluralidade de figuras nesta majorante, aumento em 2/3 a pena aplicada, ficando ela em 10 (dez) anos de reclusão, pena que torno definitiva por não mais vislumbrar demais causas capazes de influir em seu cômputo. DA PENA DE MULTA. Diante da dosimetria alhures, conforme regra dos artigos 49 e 60, ambos do CP, dada a renda declarada em seu interrogatório, fixo a pena de multa em 15 (quinze) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente à época dos fatos. 8.2.3. DO CRIME DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA (art. 288, parágrafo único, do Código Penal) 1ª Fase. No que se refere à culpabilidade, verifica-se que a mesma não extrapola o tipo. Seus antecedentes são imaculados. Não há nos autos fato que desabone a conduta social do acusado. Não consta nos autos elementos e provas para analisar a personalidade do agente. As circunstâncias e os motivos são inerentes ao tipo penal. O fato praticado não originou consequências para a vítima que desbordem do tipo penal. No que se refere ao comportamento da vítima, tenho que esta não contribuiu para a realização da conduta em apreço. Assim, considerando as modulares expostas, tenho como suficiente à prevenção e reprovação do delito a pena-base de 1 (um) ano de reclusão, mormente porque neste caso as circunstâncias judiciais são favoráveis ao réu. 2ª FASE Na segunda fase da dosagem, não concorrem circunstâncias agravantes. Presente, entretanto, a circunstância atenuante da menoridade relativa, prevista no artigo 65, inciso I, do Código Penal, que redundaria na redução da pena base em 1/6 (UM SEXTO). Todavia, em consonância com o teor da súmula n. 231 do STJ deixo de minorar a pena-base, uma vez que esta já se encontra fixada no mínimo patamar legal. Logo, a pena intermediária resta mantida em 1 (um) ano de reclusão. 3ª Fase. Finalmente, na terceira etapa da dosimetria da pena, inexistem causas de diminuição de pena, contudo, verifica-se que o crime foi praticado na forma “associação armada”, nos termos do artigo 288, parágrafo único, do Código Penal. Desse modo, aumento até ½ (metade) a pena aplicada, ficando ela em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão, pena que torno definitiva por não mais vislumbrar demais causas capazes de influir em seu cômputo. CONCURSO MATERIAL A teor do que dispõe o art. 69 do Código Penal, somando–se as penas acima aplicadas, encontra-se a pena de 16 (dezesseis) anos, 09 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, a razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época dos fatos. DA PENA DEFINITIVA Diante do arrazoado, fixo a pena definitiva da ré EMILLY PEREIRA DA SILVA em de 16 (dezesseis) anos, 09 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão, e 25 (vinte e cinco) dias-multa, a razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época dos fatos” (Giselda Regina Sobreira de Oliveira Andrade, juiz de Direito – ID 249460386) Pois bem. A materialidade do roubo majorado está demonstrada pelo Termo de Exibição e Apreensão nº 2023.16.33558 (ID. 249460204 – fls. 27) e Relatório Nº 2023.7.11321, os quais não sofreram quaisquer impugnações. Na fase policial, foram ouvidos Paulo Cesar Brambilla Costa, delegado de Polícia (fls. 29/30), Joicimar da Silva Nascimento, investigador de Polícia (fls. 31/32), Michaelle Pereira Da Silva, corré (fls. 33/35), e EMILLY PEREIRA DA SILVA, apelante (fls. 410/411). Em Juízo, colheram-se as declarações de Ilson Zuza de Oliveira, Sarah Cristina Amaral Sobrinho, Joicimar da Silva Nascimento, Maria Leudiane Felix, Cleonice Maria de Araújo, Marcos Renner da Rosa Silva, Carla Cristina Bezerra Almeida de Figueiredo, Pedro Paulo de Almeida, Suellen Karolay Lopes Figueiredo, Janelson Santos da Silva, Antônio da Silva, Bruno França Ferreira e Paulo César Brambilla Costa, bem como procedeu-se os interrogatórios de João Henrique Rodrigues dos Santos, Edson Gerson Machado de Moura, Alex Ravel de Souza Ramos, Michaelle Pereira da Silva, Gustavo Castro da Silva, Leonardo da Silva Araújo e da apelante EMILLY PEREIRA DA SILVA (Relatório de Mídias – ID 249460325/ 249460345/ 249460357). Dito isso, vejamos. Pela denúncia, no dia 18.1.2023, por volta das 20h30, na Loja Havan, em Sorriso/MT, a vítima Ilson Zuza de Oliveira teria feito “contato com uma pessoa não identificada” que havia anunciado a venda de um Caminhão e, ao chegar no local informado [pátio da Loja Havan], foi abordado por 3 (três) indivíduos não identificados, sendo-lhe subtraído um aparelho celular J2 e o veículo Sandero, branco, placa OAY 3C23. Na mesma oportunidade, os agentes [não identificados] transitaram com a vítima na cidade, constrangendo-o a efetuar “pix’s” para contas da corré Michaelle Pereira da Silva e da apelante EMILLY PEREIRA DA SILVA, totalizando o valor de R$15.000,00 (quinze mil reais) (ID 249460272 – fls. 414/418). Realizadas as transferências bancárias, os executores do roubo passaram a exigir que a vítima ligasse para seus familiares com a finalidade de obter mais dinheiro. Diante do medo e das ameaças sofridas, a vítima saltou do veículo em movimento e acionou os agentes policiais. Em ato contínuo, os investigadores de Polícia se deslocaram até o endereço da titular da conta bancária [Michaelle Pereira da Silva], a qual admitiu ter sido procurada pela apelante EMILLY PEREIRA DA SILVA para fornecer sua conta bancária para destinar depósito de "uma fita" que o pessoal iria fazer em Sorriso”. Em continuidade às investigações, concluiu-se que EMILLY PEREIRA DA SILVA teria se associado com Michaelle Pereira da Silva e outros agentes posteriormente identificados [Raul Arruda de Souza Costa, Edson Gerson Machado de Moura, João Henrique Rodrigues dos Santos, Leonardo da Silva Araújo e Alex Ravel de Souza Ramos] com o objetivo de angariar vantagem patrimonial, mediante práticas de crimes de roubo majorado e extorsão, na Comarca de Sorriso/MT. Verificam-se dos depoimentos dos delegados de Polícia [Bruno França Ferreira e Paulo César Brambilla Costa], em ambas as fases da persecução penal que: 1) a corré Michaelle Pereira da Silva foi presa, em flagrante, após receber o dinheiro “do resgate e dissimulado em outra conta”; 2) a corré [Michaelle] informou que foi “cooptada” pela apelante EMILLY PEREIRA DA SILVA para que recebesse dinheiro, “não só de extorsões mediante sequestro, mas também de diversos golpes como estelionato, olx”; 3) a equipe de investigadores constatou que a apelante EMILLY estava envolvida de forma permanente neste tipo de atividade, inclusive pela confissão em sede policial; 4) “a Emily e Michaelle não participaram da privação dessa Liberdade”, mas “estavam esperando terminar o crime para indicar a conta para receber o dinheiro”. Note-se que a corré Michaelle Pereira da Silva admitiu, à autoridade Policial, que recebeu em sua conta R$ 12.000,00 (doze mil reais) e transferiu R$ 10.000,00 (dez mil reais), sendo dois pix’s de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para a apelante EMILLY PEREIRA DA SILVA. A transferência de valores também foi admitido, pela apelante, na fase policial, na qual informou que na sua conta “caiu R$ 10.000,00 e ficou apenas com 500,00 (quinhentos reais) e distribuiu o restante” (fls. 412). Observa-se que, pela extração de imagens do aparelho da corré Michaelle Pereira da Silva, que a apelante possuía conhecimento dos valores ilícitos, visto que a atividade ilícita era previamente ajustada, inclusive com “data e hora” marcada para aguardar as transferências bancárias. Os elementos de convicção produzidos, especialmente o depoimento dos agentes policiais responsáveis pela investigação e a quebra do sigilo de dados telefônicos/bancários, são suficientes para demonstrar que a apelante prestou auxílio material [indicação de conta bancária de sua titularidade/terceiro, além de movimentar o dinheiro proveniente do crime] para que a extorsão fosse cometida. Nessa linha, anotem-se julgados desta e. Câmara e do TJMG: “Comprovado, pelas provas amealhadas, que a apelante é a titular da conta bancária utilizada para receber a transferência via PIX objeto da extorsão praticada contra a vítima, deve ser mantida a sua responsabilização penal. Inviável o reconhecimento de participação de menor importância quando ela foi essencial para o sucesso da empreitada criminosa.” (AP 1009430-05.2023.8.11.0055, Relator: Des. Orlando De Almeida Perri, Primeira Câmara Criminal – 17.5.2024). “Demonstrado nos autos que a intenção do réu era a de obter vantagem indevida, mediante a coação da vítima [...], descabido o pedido de subsunção dos fatos ao delito de receptação.” (TJMG, Apelação Criminal: 0003596-43.2023.8.13 .0003 - Relator: Des. Franklin Higino Caldeira Filho, j. 15.5.2024, p. 16.5.2024) Logo, impõe-se conservar a responsabilização penal da apelante pelo FATO 2, sendo incabível as pretensões absolutória/desclassificatória. Todavia, a ação delituosa se desdobrou em 2 (dois) momentos distintos. Inicialmente, os executores anunciaram roubo e subtraíram o veículo Sandero, placa OAY 3C23, e o aparelho celular J2 mediante emprego de arma de fogo. Na sequência, extorquiram a vítima exigindo, mediante grave ameaça, a transferência de valores para contas bancárias da apelante EMILLY PEREIRA DA SILVA e corré Michaelle Pereira da Silva. No caso, não há qualquer indicativo de que a apelante tenha envolvimento direto/indireto no roubo do automóvel/aparelho celular, visto que não cometeu atos preparatórios/executórios do assalto, tampouco prestou apoio logístico de qualquer natureza, tal como escolha da vítima, fornecimento/ocultação da arma de fogo e auxílio à fuga. Da mesma forma, inexistem provas de que os produtos do roubo [veículo e aparelho celular] seriam entregues ou rateados entre os executores e apelante. Frise-se que a vítima revelou, na fase judicial, que “durante o assalto só tinha homens, que eram três, que não tinha mulher nesse momento. Na essência, a conduta da apelante, descrita na denúncia e reconhecida pelo Juízo singular, envolve o fornecimento de conta bancária destinada ao recebimento de pix’s após a extorsão da vítima. Ocorre que esse papel era fundamental para assegurar a execução e o êxito da extorsão e não do roubo. Nas mensagens trocadas entre a apelante e os demais coautores, existem referências somente a transferências dos valores obtidos a partir da extorsão e sobre golpes de “OLX”, os quais não foram descortinados no curso da investigação policial e da instrução processual. As tipificações dos crimes de roubo e extorsão são próximas, mas os momentos consumativos são distintos. No roubo, a consumação ocorre com efetivo dano patrimonial, por se tratar de crime material. Na extorsão, a conduta se exaure com o próprio constrangimento à vítima e exigência de vantagem ilícita. Sobre o tema, colaciona-se lição do Prof. Nelson Hungria: “Não obstante a estreita contiguidade que existe entre o roubo e a extorsão, há entre esta e aquele, relativamente ao momento consumativo, em face do nosso Código, sensível diferença: enquanto o roubo é crime material, exigindo para a sua consumação um efetivo dano patrimonial, a extorsão, em qualquer de suas modalidades (arts. 158 e 159), é crime formal ou 'de consumação antecipada', integrando-se com a só ação, tolerância ou omissão imposta coercitivamente à vítima, ou com o sequestro da pessoa para cujo resgate é exigida a vantagem ilícita.” (Comentários ao Código Penal. Vol. VII, p. 63) Ausente a demonstração de prévia convergência de vontade/desígnios autônomos para a consumação do roubo, a conduta criminosa da apelante exauriu-se no momento consumativo da extorsão, com a coerção da vítima. Isso porque a “conduta do réu em constranger a vítima, mediante grave ameaça, a realizar transferência via Pix configura crime autônomo de extorsão (artigo 158 , § 1º , do Código Penal ), não se confundindo com o crime de roubo” (TJDF – AP 07226374220228070007 - Relator: Des. Arnaldo Corrêa Silva – j. 22.6.2023, p. 5.7.2023). Atente-se que a semelhança entre os tipos penais [roubo e extorsão] recomenda “cautela a fim de se evitar os riscos da dupla punição”, visto que “a simples referência legislativa a tipos penais distintos não torna obrigatória a aplicação de ambos, sobretudo quando muito tênue a distinção entre as formulações legislativas” (TJSP, Apelação Criminal nº 1502560-10.2022.8.26.0537 – Relator: Des. Marcos Alexandre Coelho Zilli – 27.6.2024). Individualizada a conduta atribuída à apelante EMILLY PEREIRA DA SILVA, os elementos de convicção produzidos não se revelam suficientes para comprovar que ela tenha concorrido para a prática do roubo. Em situação semelhante, o e. TJMS assim decidiu: “Seja pela ausência de elementos a demonstrar que tenha concorrido para a prática do crime; ou do dolo específico; ou fragilidade probatória [...]; a absolvição do apelante pelo delito de roubo qualificado é medida impositiva, a fim de que seja prestigiado o princípio do in dubio pro reo.” (Apelação Criminal 0048737-02.2015.8.12.0001 - Relator: Des. Jonas Hass Silva Júnior – j. 10.6.2024 - p. 11.6.2024) Nesse quadro, a apelante EMILLY PEREIRA DA SILVA deve ser absolvida do roubo, nos termos do art. 386, V do CPP, mantida sua responsabilização penal pela extorsão. No tocante à associação criminosa, verifica-se que, na denúncia, consta vaga referência ao período das atividades ilícitas desempenhada pelo grupo, compreendido entre dezembro/2022 e janeiro/2023 (fls. 358), o qual corresponde a ação criminosa executada em 25.1.2023. Vale dizer, não há qualquer indicação do grau de hierarquia e de outras atividades ilícitas cometidas pela apelante de forma estável e permanente com outros agentes criminosos. Tratando-se de associação criminosa, “a denúncia deve, necessariamente, descrever quais as condutas, em que circunstâncias, quando, onde e como foram praticadas, e, principalmente, quem delas efetivamente participou e qual a conduta que realizou” (https://www.cezarbitencourt.adv.br/index.php/artigos/46-associacao-criminosa-e responsabilidade-pelos-crimes-por-ela-praticados). Ademais, as declarações dos delegados de Polícia [Bruno França Ferreira e Paulo César Brambilla Costa] não confirmam o efetivo envolvimento da apelante em outras práticas delitivas, exceto a extorsão cometida em 25.1.2023, em coautoria com Michaelle Pereira da Silva, Raul Arruda de Souza Costa, Edson Gerson Machado de Moura, João Henrique Rodrigues dos Santos, Leonardo da Silva Araújo e Alex Ravel de Souza Ramos. Consigne-se que as imagens/dados telefônicos da apelante e da corré Michaelle Pereira da Silva confirmam somente os atos executórios da extorsão, consubstanciados na transferência dos valores provenientes do crime. Nem mesmo a conclusão de que a apelante utilizava-se de suas redes sociais para divulgar anúncios falsos e atrair vítimas não está embasada em qualquer elemento investigativo, tais como extração dos acessos e conversas provenientes de aplicativos virtuais. Nos limites desta ação penal, o período de estabilidade e permanência entre a apelante e os demais envolvidos nos crimes também não resultou esclarecido, visto que os fatos criminosos [roubo e extorsão] foram cometidos no dia 25.1.2023 e as transferências bancárias efetivadas no dia seguinte [26.1.2023], inexistindo uma ordem cronológica entre as mensagens trocadas ou indicação de outros delitos, os quais, repita-se, sequer foram investigados. O envolvimento da apelante em única ação delitiva, desprovido de outras condutas indicativas de alinhamento objetivo e subjetivo com os crimes desempenhados pelo grupo criminoso, não se revela suficiente para afirmar a condição de membro ou de integrante. Isso porque a estabilidade pressupõe demonstração do comprometimento do agente com os objetivos e finalidades da associação criminosa. O intermédio/fornecimento de conta bancária para o produto da extorsão [praticada em coautoria com outros agentes] não revela, por si só, o vínculo associativo, pois a “associação com o objetivo de cometer um delito específico não é capaz de configurar o tipo penal em análise, mormente porque o crime inscrito no art. 288 do Código Penal exige a prática reiterada de crimes” (TJMT, AP NU 1002095-21.2020.8.11.0028 - Relator: Des. Paulo da Cunha - Primeira Câmara Criminal - 16.12.2021). Com efeito, o reconhecimento da associação criminosa pressupõe: 1) cometimento de crimes indeterminados por 3 (três) ou mais pessoas; 2) comprovação do liame subjetivo; 3) conjugação de vontades; 4) estabilidade e permanência do agrupamento, com “uma predisposição comum de meios para a prática de uma série indeterminada de delitos” (MIRABETE. Julio Fabrinni. Código Penal Interpretado, Editora Atlas, 4ª edição, p. 1.862). Adota-se aresto desta e. Câmara: “Se os elementos de provas apontam tão somente o concurso eventual de pessoas, e não o vínculo associativo permanente e duradouro entre os agentes, que é exigido para a configuração do tipo penal, impõe-se absolvê-los do crime de associação criminosa.” (APL nº 00011841520178110098 - Relator: Des. Orlando de Almeida Perri – j. 16.7.2019 – p. 18/07/2019) Assim sendo, impõe-se a absolvição do apelante da associação criminosa (CP, art. 288, parágrafo único), por insuficiência de provas (CPP, art. 386, VII). Passa-se à revisão da dosimetria da extorsão qualificada pelo emprego de arma de fogo e restrição de liberdade da vítima (CP, art. 158, §1º e § 3º): Na primeira fase, a pena-base foi fixada em 6 (seis) anos de reclusão, ou seja, no mínimo legal. Na segunda fase, o Juízo singular reconheceu a atenuante da menoridade relativa, visto que a apelante possuía 19 (dezenove) anos de idade à época do fato, a elidir o interesse recursal neste ponto (TJMT, AP 1008504-88.2022.8.11.0045 – Relator: Des. Pedro Sakamoto - Segunda Câmara Criminal - j. 4.6.2024, p. 6.6.2024). Ressalta-se, ainda, que o Juízo singular compensou a atenuante da menoridade relativa (CP, art. 65, I) como a agravante da dissimulação (CP, art. 61, II, “c”), de modo que a pena-base foi convertida em provisória - 6 (seis) anos de reclusão –, sobretudo porque “a incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal” (STJ, Súmula 231). Na terceira fase, o juiz da causa aumentou a pena em 2/3 (dois terços) diante do emprego de arma de fogo e concurso de agentes. Não obstante, a lei penal prevê que quando o crime for “cometido por duas ou mais pessoas, ou com o emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até a metade” (CP, art. 158, § 1º), ou seja, inexiste previsão legal para a incidência da fração de 2/3 (dois terços). O c. STJ assentou diretriz jurisprudencial no sentido de ser pertinente a aplicação do patamar de aumento de ½ (metade) quando “presentes ambas as hipóteses previstas pelo legislador para a incidência da referida causa de aumento” (STJ, HC nº 411.765/SP – Relator: Min. Ribeiro Dantas – 17.10.2017), sobretudo ao considerar o número de agentes e armas empregadas [três indivíduos armados] pelos executores diretos da extorsão. Por sua vez, o emprego de arma de fogo por um dos agentes da extorsão “se comunica aos demais que agiram em prévia convergência de vontades, por se tratar de circunstância objetiva, à luz da teoria monista do concurso de pessoas, adotada pelo art. 29 do Código Penal” (TJAM, Apelação Criminal nº 0609651-66.2017.8.04.0020 - Relator: Des. José Hamilton Saraiva dos Santos – Primeira Câmara Criminal - j. 21.3.2024 – p. 21.3.2024). Dessa forma, redimensiona-se as penas da extorsão para 9 (nove) anos de reclusão e 15 (quinze) dias- multa. Em relação à minorante de menor importância, reconhece-se que a apelante “contribuiu de forma eficaz para a empreitada criminosa, sendo sua contribuição determinante para o êxito do delito”, notadamente pelo recebimento, dissimulação e rateio da extorsão, como bem pontuado pela i. PGJ (Silvana Correa Vianna – fls. 989). Colhe-se julgado deste e. Tribunal: “Inviável o reconhecimento da participação de menor importância quando demonstrada a efetiva contribuição da agente para o êxito da empreitada criminosa. [...] participação no crime de extorsão mediante sequestro resta configurada quando o agente, consciente e voluntariamente, contribui para a consecução do delito, ainda que sua atuação se limite ao recebimento dos valores extorquidos.” (AP 10012551220238110026 - Relator: Des. Lidio Modesto da Silva Filho – Quarta Câmara Criminal - j. 5.11.2024 - p. 8.11.2024) Por conseguinte, totaliza-se a pena da extorsão qualificada em 9 (nove) anos de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo. Quanto ao regime inicial, a pena imposta - superior a 8 (oito) anos - e o envolvimento em crime de extorsão qualificada pelo emprego de arma de fogo e concurso de agentes autorizam a manutenção do fechado (STJ, HC n. 403.215/SP – Relatora: Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, j. 22.8.2017,p. 31.8.2017). Com essas considerações, recurso conhecido em parte e PROVIDO PARCIALMENTE para absolver EMILLY PEREIRA DA SILVA do roubo majorado e associação criminosa e readequar as penas da extorsão em 9 (nove) anos de reclusão e 15 (quinze) dias- multa, em regime inicial fechado. Outrossim, COMUNIQUE-SE ao Juízo da Execução Penal para adequação do cálculo de pena (SEEU 2000343-19.2024.8.11.0040). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025
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