Processo nº 1034106-59.2023.8.11.0041
ID: 283051024
Tribunal: TJMT
Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1034106-59.2023.8.11.0041
Data de Disponibilização:
29/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FERNANDO LACERDA ROCHA
OAB/MG XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1034106-59.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Prestação de Serviços, Indenização por Dano Mor…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1034106-59.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Prestação de Serviços, Indenização por Dano Moral, Obrigação de Fazer / Não Fazer] Relator: Des(a). MARILSEN ANDRADE ADDARIO Turma Julgadora: [DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [LAURA GUIMARAES DE OLIVEIRA - CPF: 104.711.846-75 (APELADO), FERNANDO LACERDA ROCHA - CPF: 063.222.616-14 (ADVOGADO), EDITORA E DISTRIBUIDORA EDUCACIONAL S/A - CNPJ: 38.733.648/0104-55 (APELANTE), RHAICA DORILEO PEREIRA LEITE - CPF: 035.197.391-51 (ADVOGADO), DANIELA CABETTE DE ANDRADE FERNANDES - CPF: 830.667.216-04 (ADVOGADO), PITAGORAS SISTEMA DE EDUCACAO SUPERIOR SOCIEDADE S.A. - CNPJ: 03.239.470/0098-23 (APELANTE), EDITORA E DISTRIBUIDORA EDUCACIONAL S/A - CNPJ: 38.733.648/0104-55 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECURSO PROVIDO. UNANIME. E M E N T A EMENTA RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS –PROCEDÊNCIA – LEGALIDADE DA COBRANÇA DOS SERVIÇOS EDUCACIONAIS PRESTADOS PELA IES E NÃO COBERTOS PELO FIES – ALUNA BENEFICIÁRIA DO FINANCIAMENTO ESTUDANTIL NO PERCENTUAL DE 87,43% – CUSTEIO PARCIAL DOS ENCARGOS EDUCACIONAIS – PREVISÃO EXPRESSA DO PERCENTUAL FINANCIADO – SEMESTRALIDADE INTEGRAL PREVISTA NO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS E NOS TERMOS DE ADITAMENTO DO FIES – REAJUSTE EM CONFORMIDADE COM A LEI Nº 9.870/99 – LEGALIDADE DA COBRANÇA DO SALDO RESIDUAL NÃO COBERTO PELO FIES – AUSÊNCIA DE CARACTERIZAÇÃO DO DANO MORAL – RECURSO PROVIDO. 1. Não sendo o limite de crédito global concedido pelo FIES suficiente para o custeio do curso de medicina a diferença poderá ser cobrada diretamente da acadêmica, o qual deverá efetuar o pagamento do saldo não coberto com recursos próprios, por força do que dispõe o contrato firmado pela apelada com o FNDE e com a IES. 2. Sendo os débitos existentes e válidos, pois resultantes de serviços educacionais devidamente prestados à acadêmica e em conformidade com o que dispõe as cláusulas contratuais do contrato do FIES e do contrato de Prestação de Serviços Educacionais, bem como dos termos de aditamento do financiamento estudantil, cumpre ao aluno efetuar o pagamento do débito, inexistindo qualquer ilicitude na conduta da IES. 3. Recurso provido.- R E L A T Ó R I O R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. DESA. MARILSEN ANDRADE ADDARIO Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por PITAGORAS SISTEMA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR SOCIEDADE S/A contra a sentença proferida na Ação de Obrigação de Fazer c/c Danos Morais, ajuizada por LAURA GUIMARÃES DE OLIVEIRA, que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial para (ID 244862784): a) Determinar que a IES promova a rematrícula da autora com todos os acessos, bem como o aditamento de 2023/2 e subsequentes a fim de que seja aluna regular; b) Declarar a inexistência do débito cobrado da autora; c) Condenar a IES ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais, acrescido de juros de 1% ao mês, desde o arbitramento (Súmula 362 STJ), corrigido monetariamente pelo INPC desde a citação; d) Condenar a IES ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como ao pagamento dos honorários advocatícios no percentual de 20% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC. Irresignada, a parte autora interpôs o presente recurso (ID 244862786) alegando que a sentença deve ser reformada ao argumento de que os valores cobrados da autora são aqueles não cobertos pelo FIES em razão do limite do financiamento estudantil fornecido pelo Governo Federal. Aduz que o programa de financiamento estudantil é limitado ao teto máximo de R$ 42.983,70 (quarenta e dois mil novecentos e oitenta e três reais e setenta centavos), conforme Resolução nº 15 de 30 de janeiro de 2018. Esclarece que o limite do financiamento disponibilizado pelo FIES não cobre a integralidade dos custos do curso de medicina, em que as semestralidades frequentemente ultrapassam o teto estipulado pelo programa. Afirma que a autora, ora apelada, possui financiamento limitado ao teto de R$ 42.983,70 (quarenta e dois mil novecentos e oitenta e três reais e setenta centavos), devendo arcar com a diferença entre o valor total do curso e o montante suportado pelo financiamento, não podendo a cobrança do saldo remanescente ser considerada abusiva ou indevida, já que corresponde ao resultado direto da limitação imposta pelo próprio programa de financiamento estudantil. Pontua que a Resolução nº 22/18 do MEC modificou o teto acima referido para o valor de R$ 52.805,66 (cinquenta e dois mil oitocentos e cinco reais e sessenta e seis centavos) para o curso de Medicina a partir dos contratos referentes ao semestre letivo 2022/2. Alega que o contrato de prestação de serviços educacionais firmado pelas partes estabelece de forma clara e inequívoca a responsabilidade do estudante pelo pagamento dos valores que excedem o teto do financiamento oferecido pelo FIES, somado ao fato de que foi elaborado em conformidade com as normas regulamentadoras aplicáveis, sendo instrumento legítimo que vincula as partes, não cabendo ao Poder Judiciário desconsiderar as obrigações pactuadas sob pena de violação ao princípio da autonomia da vontade e o princípio pacta sun servanda. Cita que a Portaria n. 638, de 7 de agosto de 2017, do FNDE, reforça a legitimidade das cobranças, ao prever expressamente que a diferença entre o valor da semestralidade e o valor financiado pelo FIES deve ser arcada pelo estudante. Menciona que a sentença recorrida ao declarar a inexigibilidade dos débitos decorrentes dessa diferença não coberta pelo FIES desconsiderou completamente as cláusulas contratuais livremente pactuadas entre as partes, ignorando a previsão legal que determina que os estudantes são responsáveis por quaisquer valores que excedam o montante financiado. Sustenta ainda que a sentença recorrida ao reconhecer a cobrança como abusiva e declarar os débitos inexistentes viola princípios fundamentais consagrados na Constituição Federal como a livre iniciativa e a liberdade contratual, ambos essenciais ao desenvolvimento de uma economia de mercado pautada na autonomia de vontade das partes. Assevera que interferir na relação contratual de maneira desproporcional a sentença recorrida também desrespeita os critérios de reajuste de mensalidade estabelecidos pela Lei Federal nº 9.870/99, que regula as mensalidades escolares, permitindo que as instituições de ensino ajustem os valores de acordo com a variação de seus custos. Sob tais argumentos, pugna pelo provimento do presente recurso para reformar a sentença e julgar improcedente os pedidos formulados na inicial, com a inversão do ônus sucumbencial. Alternativamente, requer a reforma da sentença para que seja excluída da condenação a obrigação ao pagamento de indenização por danos morais, tendo em vista a inexistência de ato ilícito praticado pelo IES. Defende, ainda, ter agido no exercício regular do direito já que sua atuação se deu dentro dos limites estabelecidos pela Lei nº 9.870/199, além de ter respeitado todas as cláusulas do contrato de prestação de serviços educacionais. Caso seja mantido o pagamento da indenização arbitrada a título de danos morais, requer a redução do quantum indenizatório em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Argumenta ainda ser necessária a reforma da sentença com relação à fixação dos honorários sucumbenciais, pois havendo condenação, estes devem ser fixados com base no valor da condenação e não no valor atribuído à causa como constou na sentença, por força do que dispõe a regra do § 2º do artigo 85 do CPC. Contrarrazões pelo desprovimento do recurso com a majoração dos honorários advocatícios nos termos do que dispõe o § 11 do artigo 85 do CPC (ID 244862790). É o relatório.- V O T O R E L A T O R VOTO EXMA. SRA. DESA. MARILSEN ANDRADE ADDARIO Egrégia Câmara: Extrai-se dos autos que a parte autora LAURA GUIMARAES DE OLIVEIRA ajuizou a presente ação em face de PITAGORAS SISTEMA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR SOCIEDADE S/A, aduzindo, em síntese, ser beneficiária do FIES para a realização do curso de medicina junto à instituição de ensino requerida, com financiamento concedido no percentual de 87,43% do valor de cada semestralidade, conforme contrato de nº 30.0534.187.0000287-46 (ID 244861299). Em sua inicial, sustentou que desde o início do curso vem sofrendo pela falta de controle da instituição de ensino em não efetuar a liberação do aditamento do FIES, passando a ser cobrada pelas mensalidades e impedida de efetuar as rematrículas (ID 244861299). Aduziu que em 2022, moveu uma ação contra a instituição, distribuída sob o nº 1030143- 77.2022.8.11.0041 à 3ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, a fim de solucionar a situação referente a liberação do aditamento das semestralidades do FIES, as cobranças indevidas e a rematrícula, tendo as partes firmado acordo, no qual a instituição de ensino se comprometeu a efetuar os aditamentos necessários para que a autora pudesse dar continuidade aos estudos no curso de Medicina (ID 244861299). Relatou que ao chegar no 11º semestre do curso no período letivo 2023/1, a instituição de ensino não liberou os aditamentos referente aos semestres letivos 2022/2; 2023/1 e; 2023/2, descumprindo o acordo formulado nos autos do processo nº 1030143- 77.2022.8.11.0041, que tramitou perante a 3ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, passando a cobrar da aluna as mensalidades referentes ao ano de 2023, além de impedir sua rematrícula no semestre 2023/2, mesmo tendo ocorrido a quitação das mensalidades pelo repasse do FIES, sendo os débitos cobrados indevidos (ID 244861299). Mencionou que ter procurado o PROCON informando que a instituição de ensino não teria efetuado a liberação do aditamento após o acordo, além de estar impedindo sua rematrícula no semestre letivo 2023/2, sem sucesso sua reclamação (ID 244861299). Narrou que ao procurar a instituição de ensino pessoalmente, foi comunicada pela secretária Luciana que não seria possível realizar sua rematrícula antes da quitação das mensalidades em aberto, referentes aos meses fevereiro até junho de 2023 (ID 244861299). Assim, diante da impossibilidade solução amigável do imbróglio, requereu o cumprimento de sentença nos autos do processo nº 1030143- 77.2022.8.11.0041, que tramitou perante a 3ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, já que a sentença havia determinado que a IES realizasse a rematrícula da autora, parasse com as cobranças e efetuasse os aditamentos, todavia, o magistrado singular entendeu não ser o caso de cumprimento de sentença, mas sim nova ação de conhecimento já que os pedidos solicitados não se encontravam abarcados pelo título judicial (ID 244861299). Diante desta situação, a autora ingressou com a presente demanda requerendo a declaração de inexistência dos débitos referente as mensalidades correspondentes ao ano de 2023, a liberação do aditamento extemporâneo dos semestres letivos 2022/2 e 2023/1, bem como a rematrícula para o semestre letivo 2023/2 (ID 244861299). A instituição de ensino, em sua contestação, defendeu a legalidade da cobrança e a regularidade do débito decorrente da diferença entre o valor da mensalidade e o montante coberto pelo FIES, afirmando que referida diferença era decorrente da trava sistêmica imposta pelo FNDE (id 244862730). Após o prosseguimento normal do feito sobreveio a sentença de procedência, nos termos do relato. Inconformada, recorre a instituição de ensino, ora apelante. Pois bem. A controvérsia tem como objetivo verificar a suposta legalidade da cobrança, ao argumento de que a semestralidade do curso de medicina encontra-se financiada pelo FIES no percentual de 87,43%, sendo a diferença remanescente suportada integralmente pelo aluno, observando a existência de limitação ao valor máximo a ser suportado pelo FIES. Inicialmente, mister esclarecer que na hipótese dos autos, resta caracterizada relação de consumo, pois o contrato de prestação de serviços educacionais submete-se às regras do Código de Defesa do Consumidor, motivo pelo qual o julgamento deve se dar em observância às regras processuais e consumeristas. 1. POSSIBILIDADE DE COBRANÇA DE DIFERENÇA EVENTUALMENTE NÃO COBERTA PELO FIES Inicialmente, sobre o FUNDO DE FINANCIAMENTO –FIES, mister ressaltar trecho constante na decisão proferida no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.385.939 - MS (2018/0277985-0), tendo como Relatora a Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, in verbis: “[...] ‘Como é cediço, oFIESfoi instituído por meio da Lei n.º 10.260/2001 trazendo previsão de cobertura integral do custo de ensino dos acadêmicos beneficiados. A partir de 2014, o MEC passou a promover algumas modificações noFIES.O artigo 4.º, da Lei n.º 10.260/2001, com a redação dada pela Lei n.º 12.202/2010 dispunha o seguinte: 'Art. 4º São passíveis de financiamento peloFiesaté 100% (cem por cento) dos encargos educacionais cobrados dos estudantes por parte das instituições de ensino devidamente cadastradas para esse fim pelo Ministério da Educação, em contraprestação aos cursos referidos no art. 1º em que estejam regularmente matriculados'. Já em dezembro de 2016, por meio da Lei n.º 13.366/2016, o artigo 4.º da Lei n.º 10.260/2001 passou a vigorar com a seguinte redação 'Art. 4º São passíveis de financiamento peloFiesaté 100% (cem por cento) dos encargos educacionais cobrados dos estudantes no âmbito do Fundo pelas instituições de ensino devidamente cadastradas para esse fim pelo Ministério da Educação, em contraprestação aos cursos referidos no art. 1º em que estejam regularmente matriculados, vedada a cobrança de qualquer valor ou taxa adicional e observado o disposto no art. 4º-B' destacado. Por sua vez, o artigo 4.º-B da mesma norma estabelecia que: 'Art. 4º-B. O agente operador poderá estabelecer valores máximos e mínimos de financiamento, nos termos de regulamento do Ministério da Educação' (incluído pela Lei n.º 13.366/2016). Com isso, transferiu-se ao Ministério da Educação a atribuição de regulamentar as questões relacionadas aos valores máximos e mínimos a serem financiados. E com o objetivo de frear os gastos com o programa, o MEC adotou em 2015 o sistema detravasde reajuste, também limitando o número de bolsas ofertadas. Nesse trilhar e conforme amplamente noticiado nos meios de comunicação, o MEC e o FNDE fixaram o reajuste das semestralidades a um teto de 4,5%, taxa esta posteriormente ampliada para 6,41%. Logo, mesmo para aqueles cursos cujo valor da semestralidade era maior como é o caso do curso de medicina oFIESpassou a financiar somente o teto máximo de R$ 39.000,00 no 1.º semestre de 2016 e de R$ 42.983,70 no 2.º semestre de 2016.” (g.n.). Consoante relatado, a discussão se restringe à cobrança das mensalidades referente aos meses de março a junho de 2023, conforme documento de ID 244862658, pois as mensalidades anteriores foram objeto dos autos do processo de nº 1030143- 77.2022.8.11.0041, que tramitou perante a 3ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT (244862677 e ID 244862679). Importante ainda mencionar que a parte apelada já concluiu o curso de Medicina no semestre letivo 2024/1, conforme afirma em suas contrarrazões (ID 244862790). Desta forma, há que se analisar se a cobrança das semestralidades a partir do semestre letivo 2023/1 são legítimas e legais, haja vista ser a apelada beneficiária do FIES no percentual de 87,43% da integralidade da semestralidade do curso de Medicina, conforme contrato do FIES aportado pela própria autora no ID 244862662. Consta do contrato de financiamento estudantil – FIES, firmado em 23/10/2018 que o limite de crédito global para financiamento integral do curso era de R$ 77.972,32 (setenta e sete mil novecentos e setenta e dois mil trinta e dois centavos), já acrescido do percentual de 25% para atender possíveis elevações no valor dos encargos educacionais no decorrer do curso, conforme CLÁUSULA TERCEIRA – DO LIMITE DE CRÉDITO GLOBAL (ID 244862662). O contrato do FIES ainda prevê expressamente no PARÁGRAFO ÚNICO DA CLÁUSULA QUINTA – DO VALOR SEMESTRAL DO FINANCIAMENTO que eventual diferença decorrente do valor de financiamento estabelecido e o valor total do encargo educacional praticado pela IES deverá ser suportado pelo aluno financiado com recursos próprios, conforme imagem a seguir (ID 244862662). Já a CLÁUSULA NONA – DO ADITAMENTO DE RENOVAÇÃO estabelece que referido contrato deverá renovado semestralmente, ficando condicionado à efetiva renovação da matrícula junto a IES e a obtenção de aproveitamento acadêmico não inferior a 75% das disciplinas cursadas no último semestre letivo financiado (ID 244862662). O aditamento ao contrato do FIES datado de 14/09/2023 também traz a informação de que percentual de financiamento concedido a apelada para o curso de Medicina é de 87,43%, com crédito global para os 12 semestres do curso no valor de R$ 77.792,32 (setenta e sete mil novecentos e setenta e dois reais e trinta e dois centavos), vejamos o trecho abaixo colacionado (ID 244862745). Os aditamentos do FIES aportados aos autos pela IES nos movimentos de ID 244862746; 244862747; 244862748; 244862749; 244862750 e; 244862751 comprovam que o percentual do financiamento corresponde a 87,43% da semestralidade, observado o limite de crédito suportado pelo FIES a título de semestralidade no importe de R$ 42.983,70 (quarenta e dois mil novecentos e oitenta e três reais e setenta centavos). Há que se esclarecer ainda que conta expressamente nos aditamentos o valor integral da semestralidade cobrada pela IES e o limite do crédito suportado pelo FIES, bem como a integralidade do valor a ser custeado pela aluna financiada com recursos próprios, conforme imagem abaixo (ID 244862751). Da simples leitura do aditamento acima colacionado, conclui-se que a semestralidade cobrada pela IES e declarada ao FIES foi de R$ 80.617,20 (oitenta mil seiscentos e dezessete reais e vinte centavos), com cobertura de apenas R$ 42.983,70 (quarenta e dois mil novecentos e oitenta e três reais e setenta centavos), devendo ser pago pela aluna financiada a quantia de R$ 37.633,50 (trinta e sete mil seiscentos e trinta e três reais e cinquenta centavos) no semestre letivo 2022/1. Assim, não há dúvidas acerca da existência de saldo residual remanescente a ser pago pela apelada à instituição de ensino com recursos próprios. Por sua vez, o contrato de prestação de serviços educacionais de ID 244862676, aportado aos autos pela parte autora, comprova que houve o aceite da autora quanto às condições de renovação da matrícula com semestralidade para o semestre letivo de 2023/1, referente ao 11º semestre, no valor total de R$ 99.238,50 (noventa e nove mil duzentos e trinta e oito reais e cinquenta centavos), dividido em 06 parcelas de R$ 15.211,60, conforme termo de aceito de ID 244862674 e contrato de prestação de serviços educacionais de ID 244862735. O ITEM 12.1.1 da CLÁUSULA 12ª – CONTRATAÇÃO DE FINANCIAMENTO ESTUDANTIL/PROUNI esclarece que o valor da semestralidade do curso não se confunde com o valor do financiamento FIES, assim como o ITEM 12.1.2 é claro ao informar que na hipótese em que o aluno firmar contrato de financiamento estudantil – FIES, os valores não cobertos em razão de limitações normativas e sistêmicas do FNDE serão cobrados diretamente do aluno financiado, o qual deverá efetuar o pagamento diretamente a IES (ID 244862676 e ID 244862735). Há ainda previsão expressa no contrato de prestação de serviços educacionais que o reajuste das semestralidades observará a Lei nº 9.870/1999 denominada Lei das Mensalidades, legislação está que regula o valor das semestralidades e a possibilidade de negativa de rematrícula em caso de inadimplência. Para melhor esclarecer a questão, segue abaixo colacionada imagem do referido contrato, vejamos (ID 244862676 e ID 244862735). Assim, fica evidente que o problema se deu em razão da interpretação das cláusulas contratuais do FIES e do contrato de prestação de serviços educacionais, pois apesar de o percentual de financiamento ser de 87,43% da semestralidade, a semestralidade não corresponde ao valor integral cobrado pela IES haja vista a existência de limitação ao quantum liberado pelo FNDE, assim evidente que esse valor que a autora entende como devido corresponde ao percentual equivalente ao montante coberto pelo FIES sem os reajustes e demais encargos já que o valor informado ao quando do aditamento mostra-se muito superior aquele suportado pelo FIES. Com efeito, inexistindo ilicitude na conduta da instituição de ensino, há que se reconhecer a existência e legalidade das cobranças. Em caso semelhante, extrai-se do RAC 1015974-27.2018.8.11.0041, o entendimento de que: “[...] Destarte, a despeito de o contrato de financiamento abranger 100% dos encargos educacionais, há previsão expressa no sentido de que eventual diferença residual nos custos das mensalidades deverá ser suportada pela financiada. Neste particular, insta salientar que o agente financeiro concedeu um limite de crédito global e acréscimos pré-definidos para cobrir os encargos educacionais e suas possíveis elevações, conforme se observa da CLÁUSULA TERCEIRA: [...] Assim, se o limite de crédito global concedido pelo FIES, juntamente com os acréscimos, não foram suficientes para o custeio do curso de medicina da embargada, mostra-se devida a cobrança do valor residual das mensalidades. [...]” (TJMT, SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, N.U. 1015974-27.2018.8.11.0041, Relatora Desa. Marilsen Andrade Addario). No mesmo sentido é entendimento deste Tribunal de Justiça, verbis: “APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – ALUNO BENEFICIÁRIO DO FIES – CUSTEIO PARCIAL DOS ENCARGOS EDUCACIONAIS – VALOR DA SEMESTRALIDADE PREVISTO CLARAMENTE NO CONTRATO – DIFERENÇAS A SEREM PAGAS PELO ACADÊMICO – TERMOS DE CIÊNCIA E CONCORDÂNCIA EXPRESSAS – INDICAÇÃO DE MONTANTE INFERIOR FOI INFORMADO – ARGUIÇÃO NÃO COMPROVADA – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – NÃO CONFIGURAÇÃO – HONORÁRIOS RECURSAIS – MAJORAÇÃO – ART. 85, §11, DO CPC – SENTENÇA INALTERADA – RECURSO NÃO PROVIDO. Estando claramente estabelecido no Contrato o valor da semestralidade e que o custeio pelo FIES é apenas parcial, a diferença deve ser quitada pelo aluno, sobretudo quando há essa previsão na avença e a concordância expressa dele com essa cobrança. A condenação em litigância de má-fé exige a comprovação de alguma das situações descritas no artigo 80 do CPC. Ao julgar o Recurso, o Tribunal deverá majorar a verba honorária anteriormente definida, levando em conta o trabalho adicional realizado nessa fase (art. 85, §§2º e 11, do CPC).” (RAC 1004469-93.2017.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, publicado no DJE 05/04/2019). (g.n.). “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS – IMPROCEDÊNCIA – CURSO DE GRADUAÇÃO (MEDICINA) – BENEFICIÁRIA DO FIES – COBERTURA DE 96,34% – COBRANÇA MAIOR NO VALOR DA MENSALIDADE – PREVISÃO DE CUSTEIO PARCIAL DOS ENCARGOS EDUCACIONAIS – DIFERENÇAS A SEREM PAGAS PELA ACADÊMICA – POSSIBILIDADE – CIÊNCIA EXPRESSA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Encontrando-se claramente estabelecido no contrato de financiamento estudantil firmado entre a autora e o FNDE – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, que foi disponibilizado o crédito correspondente ao valor global, cabendo à própria aluna o pagamento das diferenças entre tal valor e aquele alcançado pelo valor total das mensalidades, há que ser mantida a improcedência da “Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Obrigação de Fazer e Reparação por Danos Morais”.- Se o limite de crédito global concedido pelo FIES, juntamente com os acréscimos, não foram suficientes para o custeio do curso de medicina da parte autora, mostra-se devida a cobrança do valor residual das mensalidades.-” (RAC 1021935-12.2019.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/02/2021, Publicado no DJE 24/03/2021). (g.n.). Ainda, nesse sentido os seguintes julgados: “AÇÃO DE RESSARCIMENTO. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS. FINANCIAMENTO ESTUDANTIL. FIES. COBRANÇA DE VALOR RESIDUAL. POSSIBILIDADE. ENCARGO DO ALUNO FINANCIADO. EXPRESSA PREVISÃO NO CONTRATO DE FINANCIAMENTO. AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO POR PARTE DA INSTITUIÇÃO DE ENSINO. DANO MORAL INEXISTENTE. SENTENÇA MANTIDA. 1. Havendo previsão expressa no contrato de abertura de crédito para financiamento de encargos educacionais que eventual diferença entre o valor da semestralidade cobrada pela instituição de ensino superior e aquele financiado pelo FIES será coberta mediante utilização de recursos próprios do financiado, é encargo do aluno o pagamento de qualquer valor residual. 2. Não se mostra cabível a condenação por danos morais ante a ausência de abusividade da cobrança do valor residual e da ilicitude da conduta da ré, o que afasta qualquer responsabilização pelos danos imateriais alegadamente sofridos pelo apelante. 3. Recurso desprovido. Sentença mantida.” (TJ/DF, 5ª Turma Cível, Acórdão nº 942980, 20150610099518APC, Relatora JOSAPHA FRANCISCO DOS SANTOS, j. em 18/05/2016, DJE: 25/05/2016) (g.n.). “[...] 2. A fim de garantir a integridade e a conservação do Fundo de Financiamento Estudantil - FIES, mister se faz a instituição de limites mínimos e máximos contratáveis, que assegurem, inclusive, a repartição do montante disponibilizado em prol de todos os beneficiados 3. O financiado - aluno - deve arcar com os custos da diferença, se o valor da semestralidade cobrada pela IES for maior que aquele financiado pelo FIES. Isso está previsto expressamente no contrato de financiamento estudantil firmado pelo aluno e pela instituição de ensino réu. [...]” (TRF4, Quarta Turma, AG 5042348-03.2017.4.04.0000, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 08/11/2017) (g.n.). “[...] II- Conforme as novas regras, a partir do ano de 2015, o FNDE passou a realizar os aditamentos contratuais de forma limitada, razão pela qual o valor máximo para o financiamento passou a ser de R$ 39.000,00 no 1º semestre de 2016 e de R$ 42.983,70 para o 2º semestre de 2016 e o MEC comprometeu-se a financiar integralmente as mensalidades que tiveram um reajuste de até 6,41% em relação ao valor cobrado no ano de 2015. III- Diante desse cenário, o valor da semestralidade que ultrapassou o limite de crédito financiado pelo FIES passou a ser suportado pelo acadêmico, conforme expressamente previsto no parágrafo único da cláusula quinta do contrato de financiamento estudantil acostado aos autos. IV- Inexistindo ilicitude na conduta da Instituição de Ensino Superior, não há justificativa para a declaração de inexistência das cobranças, tampouco para a imposição do dever de indenizar.” (TJMS, 2ª Câmara Cível, APL: 08191904420168120001 MS 0819190-44.2016.8.12.0001, Relator: Des. Marco André Nogueira Hanson, j. em 24/04/2019) (g.n.). Além disso, a Lei n.º 13.366/2016 alterou o artigo 4.º da Lei n.º 10.260/2001, o qual passou a vigorar com a seguinte redação: “Art. 4º. São passíveis de financiamento pelo Fies até 100% (cem por cento) dos encargos educacionais cobrados dos estudantes no âmbito do Fundo pelas instituições de ensino devidamente cadastradas para esse fim pelo Ministério da Educação, em contraprestação aos cursos referidos no art. 1º em que estejam regularmente matriculados, vedada a cobrança de qualquer valor ou taxa adicional e observado o disposto no art. 4º -B.” Por sua vez, o artigo 4.º-B da mesma norma estabelecia que: “Art. 4º -B. O agente operador poderá estabelecer valores máximos e mínimos de financiamento, nos termos de regulamento do Ministério da Educação.” Essa alteração legislativa transferiu ao Ministério da Educação a atribuição de regulamentar as questões relacionadas aos valores máximos e mínimos a serem financiados, levando o MEC a adotar o sistema de travas de reajustes em 2015, como amplamente noticiado nos meios de comunicação. Da mesma forma a Portaria nº 04/2017, editada pelo MEC, autorizou que a parte não coberta pelo FIES, em razão da limitação do valor máximo do financiamento, fosse cobrada diretamente do aluno pela instituição de ensino. Assim, legítima a cobrança do saldo residual quando o contrato de financiamento estudantil apresentar previsão expressa de que a responsabilidade pelo pagamento de eventual diferença entre a semestralidade cobrada pela IES e o valor coberto pelo FIES será do financiado, especialmente nas hipóteses em que o montante financiado for parcial como é o caso dos autos. Com relação aos aditamentos do FIES também assiste razão à apelante, pois os aditamentos simplificados do contrato de financiamento estudantil demonstram a renovação semestral do FIES ainda que de forma extemporânea até o semestre letivo 2024/1, semestre este em que a apelada concluiu o curso de medicina, bem como a existência de aditamentos pendentes (ID 244862757; 244862760; 244862746; 244862747; 244862748; 244862749; 244862750; 244862751 e; 244862709). Portanto, diante do conjunto fático probatório dos autos, há que ser reformada a sentença recorrida para reconhecer a existência do débito e a legalidade da cobrança residual do FIES em virtude da existência de trava sistêmica imposta pelo FNDE. Pelo exposto, dou provimento ao recurso para reconhecer a existência do débito e a legalidade da cobrança residual do FIES em virtude da existência de trava sistêmica imposta pelo FNDE e reformar a sentença para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial. Ainda, condenar a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como ao pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência que fixo em 10% do valor atribuído à causa. No caso dos autos, deixo de majorar os honorários advocatícios nos termos do §11 do artigo 85 do CPC/2015, tendo em vista que os requisitos ensejadores da majoração não se encontram presentes. É como voto.- Data da sessão: Cuiabá-MT, 21/05/2025
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