1. Italo Mateus De Souza Lopes (Impetrante) x 2. Tribunal De Justiça Do Estado De Pernambuco (Impetrado)
ID: 338993661
Tribunal: STJ
Órgão: SPF COORDENADORIA DE PROCESSAMENTO DE FEITOS DE DIREITO PENAL
Classe: HABEAS CORPUS
Nº Processo: 0228180-14.2025.3.00.0000
Data de Disponibilização:
31/07/2025
Polo Ativo:
Advogados:
ÍTALO MATEUS DE SOUZA LOPES
OAB/PE XXXXXX
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MÁRIO FORTUNATO DE SOUSA AMARAL
OAB/PE XXXXXX
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GERVÁSIO XAVIER DE LIMA LACERDA
OAB/PE XXXXXX
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HC 1013702/PE (2025/0228180-3)
RELATOR
:
MINISTRO RIBEIRO DANTAS
IMPETRANTE
:
ITALO MATEUS DE SOUZA LOPES
ADVOGADOS
:
GERVÁSIO XAVIER DE LIMA LACERDA - PE021074
MÁRIO FORTUNATO DE SOUSA AMARAL - PE03…
HC 1013702/PE (2025/0228180-3)
RELATOR
:
MINISTRO RIBEIRO DANTAS
IMPETRANTE
:
ITALO MATEUS DE SOUZA LOPES
ADVOGADOS
:
GERVÁSIO XAVIER DE LIMA LACERDA - PE021074
MÁRIO FORTUNATO DE SOUSA AMARAL - PE031234
ÍTALO MATEUS DE SOUZA LOPES - PE058967
IMPETRADO
:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE PERNAMBUCO
PACIENTE
:
ROSTAND CAVALCANTI BELEM
PACIENTE
:
ROSTAND CAVALCANTI BELEM JUNIOR
CORRÉU
:
ROBSON QUINTINO DOS SANTOS
CORRÉU
:
JORGE LOPES DE FREITAS
CORRÉU
:
GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA
CORRÉU
:
APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO
CORRÉU
:
EDMILSON SILVA DE LIMA
CORRÉU
:
PAULO DITACIO DE OLIVEIRA
CORRÉU
:
PERICLES NUNES PEREIRA
INTERESSADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de ROSTAND CAVALCANTI BELEM e ROSTAND CAVALCANTI BELEM JUNIOR, no qual se indica como autoridade coatora o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE PERNAMBUCO, prolator de acórdão assim ementado (fls. 87-88):
"EMENTA: DIREITO PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PEDIDO DE PRISÃO PREVENTIVA. REQUISITOS DOS ARTS. 312 E 313 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRESENÇA DE FUMUS COMISSI DELICTI E PERICULUM LIBERTATIS. ORGANIZAÇÃO DE MILÍCIA PRIVADA. RISCO À ORDEM PÚBLICA, À INSTRUÇÃO CRIMINAL E À APLICAÇÃO DA LEI PENAL. DECRETAÇÃO DAS PRISÕES PREVENTIVAS. DECISÃO UNÂNIME.
1. O artigo 312 do Código de Processo Penal autoriza a prisão preventiva quando presentes indícios suficientes de autoria e materialidade, aliados à necessidade de garantia da ordem pública, da ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal.
2. A existência de milícia privada estruturada, com divisão hierárquica de funções, domínio territorial armado, atuação por meio de coação e violência, e prática reiterada de crimes como extorsão, constitui fundamento idôneo para justificar a prisão preventiva, dada a sua gravidade concreta.
3. A permanência da atividade delitiva mesmo após a prisão temporária de líderes do grupo e a atuação contínua por demais membros revela risco atual e concreto à ordem pública, além de indicar a insuficiência das medidas cautelares alternativas.
4. A colheita de provas robustas, como depoimentos de vítimas sob temor, apreensão de arsenal bélico, interceptações telemáticas e registros documentais, reforça os indícios de autoria e a necessidade de segregação cautelar.
5. A prisão preventiva mostra-se imprescindível para garantir a higidez da instrução processual, diante da possibilidade concreta de intimidação de testemunhas e manipulação de provas por parte de agentes com influência política e institucional.
6. A reiteração delitiva e antecedentes criminais relevantes dos recorridos, especialmente por crimes armados e graves, agravam a necessidade de segregação para resguardar a efetividade da aplicação penal.
7. A contemporaneidade da medida cautelar não se mede apenas pela data dos fatos, mas pela permanência dos riscos que a prisão visa mitigar, conforme jurisprudência pacífica dos Tribunais Superiores.
8. Recurso conhecido e provido. Decretação das prisões preventivas dos recorridos."
Em suas razões, a parte impetrante alega, em resumo: a) necessidade de extensão de efeitos da decisão que reconheceu nulidade parcial do julgamento, por ausência de intimação dos advogados constituídos por corréus, mostrando-se teratológica a decisão que manteve a validade do julgamento apenas em relação aos pacientes do presente writ; b) acórdão que decretou a prisão preventiva não estaria amparado em fundamentação idônea; c) ausência de contemporaneidade em relação aos fatos sob investigação, inexistindo fatos novos, posteriores à aplicação de medidas cautelares alternativas, capazes de justificar a decretação da prisão; d) indevida inovação por parte do Tribunal de Justiça quanto aos fundamentos que justificariam a prisão cautelar; e) descompasso entre o acórdão e os limites objetivos da denúncia; f) condições pessoais favoráveis revelariam a adequação de medidas cautelares alternativas.
Requer, em caráter liminar, a extensão dos efeitos da decisão proferida em 19/6/2025, que reconheceu a nulidade parcial do julgamento, por ausência de intimação de advogados constituídos por correús; no mérito, requer a concessão da ordem de habeas corpus, a fim de serem restabelecidas as medidas cautelares aplicadas pelo Juízo de 1º grau, ou aplicação de outras que se revelem adequadas ao caso.
Liminar indeferida às fls. 158-159 e informações prestadas às fls. 166-174 e fls. 175-179.
Ouvido, o MPF manifestou-se pela denegação da ordem (fls. 181-186).
É o relatório.
Decido.
Esta Corte - HC 535.063, Terceira Seção, Rel. Ministro Sebastião Reis Junior, julgado em 10/6/2020 - e o Supremo Tribunal Federal - AgRg no HC 180.365, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 27/3/2020; AgRg no HC 147.210, Segunda Turma, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 30/10/2018 - pacificaram orientação de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado.
No caso, inexiste ilegalidade flagrante a ser reconhecida de ofício.
A prisão preventiva dos pacientes foi decretada pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco, ao dar provimento a recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Estadual, diante das seguintes razões (fls. 65-113):
"[...]
As investigações foram instauradas formalmente por meio do Inquérito Policial nº 2023.0267.000051-32, conduzido pelo Grupo de Operações Especiais (GOE) da Polícia Civil de Pernambuco, com a finalidade de apurar a atuação de um grupo organizado de natureza paramilitar, formado por ex-agentes públicos, policiais militares e indivíduos com significativa influência política local, notadamente no bairro de Caetés I, município de Abreu e Lima/PE.
A partir de diligências investigativas, colheita de depoimentos, análise de dados telemáticos e cumprimento de mandados de busca e apreensão, foram reunidos elementos que indicam a existência de uma milícia privada destinada à cobrança de valores extorsivos sob a justificativa de prestação de “proteção” aos comerciantes da região, mediante o uso de coação, intimidação e, em alguns casos, violência direta. A estrutura da organização apontava para uma divisão hierárquica de funções, destacando-se, como líderes do núcleo, os investigados ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR, com papel de comando e arrecadação, contando com apoio operacional de diversos policiais e ex-agentes.
Diante dos indícios colhidos, a autoridade policial, com o ratificação do Ministério Público, representou pelo decreto da prisão temporária dos investigados. O juízo da Vara Criminal da Comarca de Abreu e Lima deferiu a medida, tendo sido cumpridas as ordens de prisão em 12 de julho de 2024, com o recolhimento dos acusados por prazo inicial de dez dias.
Durante a custódia temporária, novas provas foram agregadas ao inquérito, culminando com a extração de dados relevantes dos aparelhos apreendidos e novos depoimentos que corroboraram a narrativa acusatória.
Encerrada a fase policial, o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor dos investigados, imputando-lhes o crime previsto no art. 288-A do Código Penal (constituição de milícia privada), além de outros delitos correlatos. O juízo de origem recebeu a denúncia e, ato contínuo, indeferiu o pleito de conversão da prisão temporária em preventiva, optando por aplicação de medidas cautelares diversas.
[...]
Ao exame dos presentes autos, porém não entendo demonstrados elementos suficientes para decretação da prisão preventiva.
Prevalece na doutrina e jurisprudência pátria que a prisão preventiva, de natureza indubitavelmente cautelar, é medida excepcional, podendo ser decretada pelo magistrado em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, desde que haja real necessidade, a qual é aferida pela presença dos pressupostos previstos nos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal, bem como do fummus comissi delicti e periculum libertatis, estes últimos fundamentais para a aplicação de qualquer medida cautelar penal.
Do parecer ministerial (item 1 da denúncia) e do requerimento da autoridade policial (ID 176068419), percebe-se que o principal motivo para a decretação desse prisão seria a suposta intimidação dos investigados quanto à testemunhas dos fatos, ou seja, por conveniência da instrução criminal
Todavia, apesar de reconhecer a gravidade do delito apurados nos autos, tem-se que o feito ainda se encontra no estágio inicial, com 9 (nove) réus, o que demandará tempo razoável para finalização da instrução criminal.
Assim, não se mostra razoável deixar os investigados custodiados até o término da aludida instrução, pois há outras medidas cautelares menos gravosas aptas a esse fim.
Ressalte-se que havendo a notícia de fato contemporâneo de eventual descumprimento dessas cautelares, o MP ou a autoridade policial poderão requerer a prisão preventiva dos denunciados, o que será analisado por este Juízo, com base no descumprimento concreto pelos réus.
Assim, tendo em vista a não comprovação de fato contemporâneo de eventual conduta dos denunciados no sentido de obstaculizar a instrução criminal, tenho que a prisão preventiva é medida que foge à razoabilidade ao presente caso.
Lembre-se, ainda, que prisão preventiva é a ultima ratio, isto é, deve ser utilizada, quando ineficiente as outras medidas .
Ademais, não há comprovação de que o denunciado possa vir a ameaçar a ordem pública ou econômica e, ainda, não há sequer indícios de que ele esteja embaraçando a apuração dos fatos ou que pretenda se esquivar da aplicação da lei penal, razão pela qual não vislumbro a existência dos requisitos autorizadores da sua custódia preventiva.
Pelo o exposto, INDEFIRO o requerimento de prisão preventiva.
Inconformado com tal decisão, o Parquet interpôs o presente recurso em sentido estrito, sustentando que os requisitos legais para decretação da prisão preventiva encontram-se plenamente satisfeitos, tendo em vista a gravidade concreta da conduta, o risco à ordem pública, à instrução criminal e à aplicação da lei penal.
O recurso merece ser provido. Isto porque, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva poderá ser decretada para garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, desde que presentes prova da existência do crime, indícios suficientes de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.
A materialidade e indícios das autorias encontram-se evidenciados por diversos meios de prova reunidos no curso do inquérito policial 2023.0267.000051-32, especialmente as declarações das testemunhas, nos autos de busca e apreensão expedidos nos autos de n° 0000738-42.2023.8.17.2100, nos registros de chamadas e mensagens extraídas de aparelhos celulares apreendidos, bem como os documentos e objetos encontrados durante as buscas domiciliares realizadas no âmbito da "Operação Derrama".
Dentre os elementos colhidos, destacam-se os depoimentos de comerciantes que confirmaram a atuação sistemática do grupo, relatando, sob temor manifesto, a cobrança de valores mensais como “taxa de segurança”, a presença de indivíduos armados vinculados aos denunciados e os episódios de represálias em casos de inadimplemento.
[...]
A corroborar, os mandados de busca e apreensão cumpridos nas residências dos principais recorrido ROSTAND CAVALCANTI BELÉM resultaram na apreensão de armas de fogo e munições de variados calibres, cofre, R$ 20.300,00 (vinte mil e trezentos reais) em espécie, talonário de recibos, 06 (seis) currículos, 14 (quatorze) cartões bancários de titularidade de terceiros e 06 (seis) vales alimentação também emitidos em nome de ex-assessores de ROSTAND.
Os indícios de autorias se reforçam pela vinculação direta dos acusados com os objetos apreendidos, pelas mensagens interceptadas que revelam comunicação entre os membros do grupo e planejamento das ações extorsivas, bem como pelas funções estratégicas que cada um desempenhava na organização. ROSTAND e ROSTAND JÚNIOR exerciam comando direto das atividades criminosas, inclusive sendo mencionados como responsáveis pela “arrecadação” e definição de alvos, enquanto os demais integravam a logística armada e operacional, garantindo o domínio territorial da atuação ilícita. Os demais recorridos eram executores das ordem e participavam da arrecadação dos valores.
Constata-se assim, o fumus comissi delicti diante dos elementos concretos e objetivos, apresentados pela Autoridade Policial que permitem uma avaliação positiva quanto a prova da materialidade e indícios de autoria. Ressalte-se que, neste momento, não há necessidade de certeza da autoria, contentando-se a lei apenas a existência de "indícios suficientes" (CPP. art. 312), o que dispensa, por ora, a existência de prova inequívoca quanto à autoria do delito.
Seguindo, periculum libertatis os recorridos encontram-se consubstanciado no modus operandi, na periculosidade dos agentes, na estruturação da organização, na reiteração de condutas criminosas e na necessidade de resguardar a instrução e lei penal. Explico.
A decretação da prisão preventiva mostra-se, no presente caso, imprescindível à garantia da ordem pública, frente à gravidade concreta dos fatos apurados e à periculosidade manifesta dos recorridos.
As condutas atribuídas aos investigados revelam a existência de uma organização criminosa que se vale do aparato armado e do terror psicológico para impor domínio territorial em uma região densamente povoada do município de Abreu e Lima.
O depoimento prestado pela Testemunha Sigilosa 03 é absolutamente revelador da periculosidade real e concreta que os investigados representam à sociedade e da imperiosa necessidade de segregação cautelar para proteção da ordem pública. Relatando o contexto de atuação de ROSTAND CAVALCANTI BELÉM na localidade de Caetés I, a testemunha confirmou que o mesmo atua com o auxílio de homens armados, responsáveis por patrulhamento ostensivo e intimidador na região, utilizando-se, inclusive, do mesmo veículo já citado por outras fontes — um Voyage prata —, o que comprova a convergência de informações e a consistência dos dados colhidos. A testemunha reforça que, mesmo após a prisão de ROSTAND, a cobrança da “taxa de proteção” não cessou, sendo assumida por seu filho, ROSTAND JÚNIOR, o que comprova a resiliência e continuidade da organização criminosa, independente da presença física de seus líderes.
Mais alarmante, entretanto, é a descrição feita da figura de ROSTAND como uma pessoa temida na região, cuja atuação envolve desaparecimentos e mortes não esclarecidas de pessoas que, segundo a testemunha, seriam autores de delitos na comunidade. A testemunha afirma de maneira categórica: “os responsáveis por promoverem assaltos na região são encontrados mortos ou simplesmente desaparecem”. Tal informação, ainda que careça de investigação conclusiva, já se revela suficiente para demonstrar o clima de pavor instaurado na comunidade, onde o controle da criminalidade é exercido de forma privada e à margem do Estado, mediante métodos de execução sumária e justiça paralela.
Ademais, a testemunha relatou com clareza que ROSTAND exerce forte influência política, inclusive sobre setores da Prefeitura de Abreu e Lima, sendo conhecido por práticas de compra de votos e doações simuladas como forma de angariar apoio popular e consolidar seu poder.
A citada testemunhas mencionou também uma suposta aliança com o tráfico de drogas local, especialmente com o traficante conhecido como “VITOR BOX”, que seria servidor da própria Prefeitura.
Os relatos de Antonio Rodrigues Vieira Neto, também escancaram a coerção velada, mas contínua, imposta aos comerciantes locais para que paguem valores semanais sob o pretexto de uma “segurança” que não é solicitada, mas que, quando recusada, pode acarretar represálias. Ponderou que ROSTAND age como um miliciano, como ocorre no Rio de Janeiro e que, embora não conheça YURI, já ouviu comentários dando conta de que o mesmo havia sido assaltado em decorrência de retaliação após ter se recusado a pagar a taxa de proteção.
Adeildo Bezerra Vidal relatou que o recibo encontrado na residência de Rostand Cavalcanti, durante o cumprimento de mandado de busca domiciliar, refere-se ao pagamento de uma “taxa de proteção” no valor de R$ 50,00, feito em 18/03/2017. Afirmou que tal taxa é cobrada semanalmente de comerciantes locais, sendo o recolhimento realizado por Rostand Júnior, filho de Rostand Cavalcanti, acompanhado por quatro seguranças. Sugeriu que esses indivíduos estariam armados, dada a natureza de suas funções. Embora tenha declarado não se sentir constrangido ao pagar, ressaltou que a forma de cobrança da taxa não oferece alternativas aos comerciantes, tornando o pagamento uma imposição tácita. Informou ainda que o valor da taxa sofreu sucessivos aumentos ao longo de mais de cinco anos, com reajuste superior a 100%.
Por sua vez, a testemunha Joaquim Estevão De Araújo disse ser representante legal da JS Bombons desde 2011, estabelecimento este situado no Bairro Caetés I em Abreu e Lima/PE, confirmou o esquema de milicia privada instaurado pelo recorrido ROSTAND, bem como nomeou as pessoas responsáveis pelo patrulhamento da região, sendo eles: LOPES; GEORGE; ROBSON; NETO; EDMILSON; DITÁCIO e PÉRICLES.
A testemunha SIGILOSA nº 01, outrossim, listou os nomes de dos “soldados” de ROSTAND. Alegou haver uma listagem nominal dos “soldados” de ROSTAND com o nome dos integrantes de cada equipe e os respectivos telefones, sendo eles: LOPES; GEORGE; ROBSON; NETO; EDMILSON; DITÁCIO; PÉRICLES.
Assim, além de ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e seu filho, os demais recorridos — JORGE LOPES DE FREITAS, GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS, APRIGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, EDMILSON SILVA DE LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA e PÉRICLES NUNES PEREIRA — em sua maioria policiais militares, também atuavam armados como executores das ordens de ROSTAND, participando diretamente do patrulhamento ostensivo e da cobrança coercitiva de taxas de proteção de comerciantes em Caetés I.
Além disso, as investigações dão conta de que não se trata de delitos isolados ou praticados de forma esporádica. Há indícios veementes de que os investigados fazem da prática ilícita um verdadeiro modo de vida, com divisão de tarefas, hierarquia e infiltração em espaços de poder político e institucional, vez que ROSTAND CAVALCANTI BELÉM foi vereador de Abreu e Lima no período de 01/01/2013 a 31/12/2020. Essa circunstância agrava sobremaneira o risco à ordem pública, pois o poder de intimidação do grupo transcende o uso de armas: ele está enraizado na impunidade percebida por quem o teme.
Outra dimensão essencial que justifica a decretação das prisões preventivas dos recorridos diz respeito à conveniência da instrução criminal. Trata-se de fundamento cautelar destinado a preservar a higidez da colheita probatória, protegendo testemunhas, vítimas e a própria estrutura processual contra pressões, retaliações ou interferências indevidas por parte dos acusados.
No contexto desta investigação, os elementos colhidos demonstram de forma clara e objetiva que os investigados, especialmente ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e seus colaboradores diretos, possuem capacidade concreta de interferir na produção da prova, não apenas por sua posição de comando na organização criminosa, mas também pela influência social, política e institucional que exercem localmente, inclusive no meio policial.
A esse respeito, o depoimento da testemunha SIGILOSA 02 é particularmente revelador. Essa testemunha relatou que ROSTAND comanda o serviço de "segurança" privada em Abreu e Lima, contando com cerca de quatro homens no patrulhamento ostensivo da região, inclusive identificando o veículo usado nas rondas: um Voyage prata. Mencionou, ainda, que os patrulhamentos são realizados por pessoas armadas, muitas das quais são policiais militares da ativa, como GEORGE AMILTON, JORGE LOPES, PÉRICLES NUNES e APRIGIO NETO — todos também investigados no presente feito.
Essa mesma testemunha alertou sobre a atmosfera de medo generalizado entre os moradores e comerciantes, ressaltando que, mesmo sem presenciar retaliações diretas, “as pessoas pagam por medo”. Informou também que ROSTAND JUNIOR participa ativamente do recolhimento das taxas extorsivas.
Mas o dado mais grave, sob a ótica da instrução, é a menção à influência de ROSTAND no meio policial e sua suposta prática de outros crimes, como agiotagem e homicídio, os quais não teriam sido devidamente apurados ou punidos, reforçando a percepção de que o grupo goza de impunidade institucionalizada e atua com respaldo de vínculos que vão além do campo da criminalidade comum.
Essa percepção de impunidade, aliada à estrutura militarizada da organização, confere risco real à eficácia da persecução penal. O medo relatado por testemunhas, o silêncio de alguns depoentes, e a atuação armada dos envolvidos criam um ambiente hostil à livre manifestação da prova, especialmente em um cenário em que os agentes do Estado (policiais militares) são parte do esquema criminoso.
Nesse contexto, a liberdade dos recorridos representa uma ameaça direta à colheita da prova oral, ao regular cumprimento de diligências e à integridade dos testemunhos que ainda serão colhidos. Os decretos de prisões preventivas, portanto, não apenas são recomendáveis, mas imprescindível para evitar o perecimento da instrução criminal, já fragilizada pelo temor instalado nas vítimas e pela força de intimidação da organização.
A prisão preventiva também se justifica, de modo contundente, para assegurar a aplicação da lei penal, diante da clara demonstração de que os investigados, notadamente ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR, possuem poder de articulação suficiente para frustrar eventual aplicação da sanção penal, inclusive após a deflagração da operação policial e mesmo após já terem sido temporariamente custodiados.
Essa constatação decorre, com clareza, dos depoimentos prestados por Antonio Rodrigues Vieira Neto e pela Testemunha Sigilosa 01, os quais atestam que, mesmo após a prisão de ROSTAND, a organização criminosa permaneceu ativa e em pleno funcionamento, com o recolhimento da “taxa de segurança” sendo assumido por seu filho, ROSTAND JÚNIOR. As testemunhas declararam que inclusive houve incremento na taxa depois da prisão de ROSTAND.
Essa substituição direta, longe de representar uma simples continuidade pontual, revela a existência de uma estrutura hierarquizada, funcional e estável, cuja lógica de comando opera de forma autônoma e resistente às medidas repressivas do Estado.
A manutenção do esquema extorsivo mesmo após a prisão de seu principal líder demonstra que a liberdade dos demais integrantes permite o prosseguimento das atividades criminosas e, mais grave, assegura que, mesmo em caso de eventual condenação, a pena possa ser esvaziada em sua eficácia prática, seja por fugas organizadas, seja por coações e manipulações que comprometam a execução penal.
É notório, também, que o grupo possui forte base territorial, domínio de logística, capacidade de evasão e até supostos vínculos com agentes públicos, o que reforça o risco de frustração futura do cumprimento da lei penal, inclusive no tocante à própria localização dos investigados, à ocultação de bens, ou à manipulação de dados e testemunhas.
Nessa perspectiva, a prisão preventiva não é antecipação de pena, mas instrumento indispensável à garantia de que a jurisdição penal poderá produzir seus efeitos concretos no tempo certo e com segurança, sem que o aparato estatal seja continuamente burlado ou neutralizado por estruturas criminosas que operam de forma resiliente e deliberadamente organizada.
De mais a mais, em consulta ao P Je, verifiquei que grande parte dos recorridos já foram condenados ou respondem ações penais, ratificando a periculosidade. ROSTAND CAVALCANTI BELÉM responde ação penal nº 0002645-18.2024.8.17.2100, pela prática dos crimes previstos nos arts. 147 e 150, §1º, ambos do Código Penal, além de ter sido condenado nos autos nº 0002724-98.2023.8.17.5990, referente ao art. 16, caput, da Lei 10.826/03, à pena de 3 anos e 4 meses de reclusão, pendente de julgamento de apelação. Há ainda registro de absolvição em ação penal anterior por homicídio (processo nº 0001088- 12.2006.8.17.0100), o que não afasta o indicativo de envolvimento com práticas delituosas de alta gravidade.
[...]
Tais elementos, considerados em seu conjunto, somam-se de forma eloquente à demonstração da periculosidade dos agentes individualmente e da organização criminosa como um todo. A existência de condenações, ações penais em curso, apreensão de armamento em poder dos denunciados e o modo sistemático de atuação delitiva revelam não apenas o risco concreto à ordem pública, mas a manutenção de uma estrutura miliciana organizada, violenta e intimidatória. Trata-se de um grupo que atua com divisão de tarefas, poder bélico e domínio territorial, impondo-se à comunidade por meio da coerção. A segregação cautelar, portanto, não se justifica apenas pelos delitos imputados, mas pela necessidade de desarticulação de um aparato criminoso que representa verdadeiro poder paralelo ao Estado.
Por fim, com relação às alegações trazidas nas contrarrazoes dos recursos de ausência de contemporaneidade dos fundamentos do pedido preventiva o pleito, tais arrazoados não merecem acolhimento.
[...]
Aplicando-se tais fundamentos ao caso concreto, resta evidente que a contemporaneidade da prisão preventiva dos recorridos não se encontra prejudicada. Os fatos investigados decorrem de atuação miliciana organizada e sistemática, na qual os réus — incluindo agentes públicos armados — impunham, mediante intimidação, a cobrança de “taxas de proteção” a comerciantes locais, conforme fartamente demonstrado por documentos, depoimentos e apreensões constantes nos autos.
A atuação da organização criminosa não se limita a um episódio pretérito e isolado, mas revela padrão de comportamento reiterado e estruturado ao longo do tempo, com divisão de tarefas, uso de armas de fogo e domínio territorial. O caso em tela revela, portanto, não apenas crimes de natureza grave, mas a persistência de uma dinâmica criminosa que continua a ameaçar diretamente a ordem pública.
Além disso, os recorridos, conforme consulta ao PJe, respondem a outras ações penais ou já foram condenados por crimes igualmente graves, como porte ilegal de arma de fogo, tentativa de homicídio, abuso de autoridade e infrações militares, corroborando o grau de periculosidade do grupo e a probabilidade concreta de reiteração delitiva." (grifei)
Como se vê, a prisão preventiva dos pacientes foi decretada na instância recursal, tendo a Corte de origem acolhido pretensão formulada pelo Ministério Público Estadual, por considerar satisfatoriamente demonstrada a necessidade da custódia cautelar como forma de preservar a ordem pública, evitando reiteração delitiva, assegurar a conveniência da instrução processual, bem como garantir futura aplicação da lei penal.
A parte impetrante sustenta, de início, que seria teratológica a decisão do Desembargador Relator do recurso em sentido estrito que, em sede de embargos de declaração, declarou a nulidade apenas parcial do julgamento que decretou a prisão preventiva dos pacientes e corréus, diante da ausência de intimação dos advogados destes últimos.
Segundo defende, ao assim proceder, o Desembargador Relator violou os princípios do contraditório, ampla defesa, paridade de armas e devido processo legal, mostrando-se necessária a extensão da decisão também em favor dos pacientes, de modo que o novo julgamento a ser realizado promova o exame dos fatos em única oportunidade.
A decisão questionada reconheceu a nulidade parcial do julgamento nos seguintes termos (fls. 114-117):
"[...]
Contudo, em consulta ao Diário de Justiça Eletrônico, edição n.º 160/2025, publicado em 16 de junho de 2025, observo que foram intimados apenas os advogados GERVÁSIO XAVIER DE LIMA LACERDA – OAB/PE 21.074- A, e THULIO MENDES DE SOUZA – OAB/PE 37.699-A.
ROSTAND CAVALCANTI BELÉM e ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR são assistidos por GERVÁSIO XAVIER DE LIMA LACERDA – OAB/PE 21.074 e ÍTALO MATEUS DE SOUZA LOPES – OAB/PE 58.967, enquanto PÉRICLES NUNES PEREIRA é assistido por THULIO MENDES DE SOUZA – OAB/PE 37.699-A. Estes, de fato, foram regularmente intimados.
Nesta senda, revela-se inequívoca a ausência de intimação dos demais advogados regularmente constituídos nos autos para a sessão de julgamento do recurso em sentido estrito, tampouco publicação em nome destes no órgão oficial, o que impediu o exercício da sustentação oral e a ciência do julgamento, violando de forma frontal os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, nos termos do art. 564, inciso III, alínea “l”, do Código de Processo Penal e no art. 370, §1º, do CPP.
[...]
Diante de todo o exposto, acolho os embargos de declaração, com efeitos infringentes, para declarar a nulidade do julgamento ocorrido em 18 de junho de 2025, quanto aos recorridos GEORGE AMILTON PEREIRA LIMA, PAULO DITÁCIO DE OLIVEIRA, APRÍGIO JUVENAL DE ARRUDA NETO, JORGE LOPES DE FREITAS, ROBSON QUINTINO DOS SANTOS E EDMILSON SILVA DE LIMA cujos patronos não foram devidamente intimados, determinando a designação de nova sessão de julgamento, com a devida e regular intimação de todos os advogados constituídos nos autos, em atenção ao disposto no art. 370, §1º, do Código de Processo Penal.
[...]
Ressalto, por fim, que a decisão proferida na sessão de julgamento de 18 de junho de 2025 permanece hígida e plenamente válida quanto aos recorridos ROSTAND CAVALCANTI BELÉM, ROSTAND CAVALCANTI BELÉM JÚNIOR e PÉRICLES NUNES PEREIRA, cujos respectivos patronos foram regularmente intimados da sessão, conforme consta da publicação no Diário de Justiça Eletrônico (edição n.º 160/2025). Assim sendo, determino a imediata expedição dos competentes mandados de prisão preventiva em desfavor desses três recorridos, nos termos do acórdão unânime que deu provimento ao recurso ministerial." (grifei)
Sem razão a parte impetrante.
Por um lado, não se vislumbra qualquer prejuízo aos pacientes diante da decisão que anulou, apenas parcialmente, o julgamento, a fim de assegurar o pleno exercício do contraditório e ampla defesa por parte dos corréus, cujos advogados não foram regularmente intimados da inclusão do processo em pauta de julgamento.
Isso porque os advogados constituídos pelos pacientes foram regularmente intimados da sessão de julgamento, tendo, inclusive, conforme noticiado pela Corte local (fls. 166-174), ofertado sustentação oral, de forma que, quanto a eles, concretamente resguardados os princípios do contraditório e ampla defesa, que não podem ser tidos por violados diante da mera ausência de análise de teses sustentadas pelos demais recorridos.
Sem prejuízo, não há que ser declarada nulidade, conforme, aliás, dispõe o art. 563 do CPP, segundo o qual: "Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa."
Não fosse isso bastante, em consulta ao sítio eletrônico do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, observa-se que, após a necessária intimação dos respectivos advogados, o recurso em sentido estrito n. 0002857-39.2024.8.17.2100 já foi novamente levado a julgamento, ocasião em que decretadas as prisões preventivas dos demais corréus.
Tal circunstância, para além de tornar prejudicada a pretensão de que a situação processual dos pacientes seja avaliada em conjunto com a dos demais recorridos, confirma a ausência de prejuízo decorrente da declaração da nulidade parcial do primeiro julgamento, uma vez que, avaliadas as teses de defesa de todos os investigados, foi mantida decisão originária pela prisão de todos os recorridos.
Não há que se falar, ademais, em ausência de fundamentação idônea para justificar a prisão preventiva, decretada diante de elementos concretos, que indicariam que os pacientes não apenas integram, mas efetivamente lideram grupo organizado na forma de milícia privada, integrada por ex-agentes públicos, policiais militares e pessoas com influência política local, destinada à "cobrança de valores extorsivos sob a justificativa de prestação de “proteção” aos comerciantes da região, mediante o uso de coação, intimidação e, em alguns casos, violência direta." (fl. 68)
Os elementos probatórios colhidos na fase investigativa, e considerados pelo Juízo de 1º grau como insuficientes para justificar a prisão preventiva dos denunciados (pois o estágio inicial do processo revelaria a inadequação da medida extrema, requerida em nome da conveniência da instrução), demonstram, muito claramente, que a prisão cautelar encontra fundamento na necessidade de proteção da ordem pública, de modo a desarticular grupo criminoso que, de acordo com comerciantes locais, promovem "temor manifesto" na comunidade local, mediante cobrança mensal a título de "taxa de segurança", promovida por indivíduos armados vinculados aos pacientes, havendo notícias de represálias em casos de inadimplemento.
Consoante destacado pela Corte local, a investigação conta com informações extraídas de mensagens interceptadas, revelando a comunicação existentes entre os investigados, planejamento de ações extorsivas, e exercício de comando dos pacientes, que seriam responsáveis pela "arrecadação" e definição dos alvos do grupo criminoso.
Consignado, também, que o paciente ROSTAND seria uma pessoa temida na região, havendo relatos que seria responsável por desaparecimentos e mortes não esclarecidas de pessoas que, em tese, seriam identificadas como autores de delitos na comunidade; ele exerceria, ainda, forte influência política, inclusive sobre setores da Prefeitura de Abreu e Lima; acrescentou a Corte local que o paciente responderia a outra ação penal pela prática dos crimes previstos nos arts. 147 e 150, § 1º, ambos do Código Penal, já tendo sido condenado em primeira instância, pelo crime previsto no art, 16, caput, da Lei 10.826/03.
ROSTAND JUNIOR, por sua vez, realizaria, segundo testemunhas, o recolhimento semanal da "taxa de segurança" cobrada dos comerciantes locais, acompanhado de quatro seguranças armados; após prisão de ROSTAND, teria assumido a função de coordenar a arrecadação da taxa, havendo relatos que, inclusive, promoveu o incremento do valor cobrado.
Essas circunstâncias justificam a prisão cautelar dos pacientes, consoante pacífico entendimento desta Corte, no sentido de que não há constrangimento ilegal quando a segregação preventiva é decretada em razão do modus operandi com que o delito fora praticado.
A propósito:
"HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. PRISÃO PREVENTIVA. DECRETO DE OFÍCIO. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 312 DO CPP. PERICULUM LIBERTATIS. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. CONTEMPORANEIDADE. ORDEM DENEGADA.
1. Segundo orientação jurisprudencial desta Corte Superior, "[a] manifestação posterior do Ministério Público pela segregação cautelar do agravante supre o vício de não observância da formalidade do prévio requerimento, afastando-se a alegação de conversão da prisão de ofício e de violação do art. 311 do CPP (AgRg no RHC 152.473/BA, Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, DJe 25/10/2021)" (AgRg no HC n. 674.164/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, DJe 15/3/2022).
2. Esta Corte de Justiça é firme em assinalar a idoneidade da decretação da custódia preventiva de membros de organização criminosa, como forma de desarticular e interromper as atividades do grupo. Precedentes.
3. São bastantes os motivos invocados pelo Juízo singular para embasar a prisão, pois destacado que o acusado seria integrante, em tese, de organização criminosa direcionada ao tráfico de cocaína na rota Rondônia-Minas. As instâncias de origem pontuaram que o acusado pertenceria ao núcleo da organização responsável pela ocultação de renda e o patrimônio do grupo através de negócios de fachada, transações comerciais de veículos e operações bancárias.
4. A gravidade concreta das condutas perpetradas evidencia a presença de motivação idônea para a decretação da custódia preventiva do insurgente, pois é efetiva a gravidade das condutas a ele imputadas dado o modus operandi da empreitada criminosa, revelado por meio da estrutura usada para o branqueamento dos valores oriundos do tráfico de cocaína.
5. As particularidades do envolvimento do paciente, que atuou em posição essencial para lograr êxito na lavagem do dinheiro ilícito, denotam o risco de reiteração delitiva e ensejam a necessidade de manutenção da segregação cautelar.
6. Não há que se falar em ausência de contemporaneidade da medida, uma vez que ela diz respeito à existência de fatos que indiquem a necessidade da cautela ao tempo de sua decretação, o que ocorreu na hipótese.
7. Ordem denegada."
(HC n. 890.683/MG, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 23/4/2024, DJe de 30/4/2024, grifou-se)
"PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO ATIVO OCULTO. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. LAVAGEM DE DINHEIRO. PRISÃO PREVENTIVA. NEGATIVA DE AUTORIA. REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PERICULOSIDADE DO AGENTE. CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO. INTERRUPÇÃO DE ATUAÇÃO DE GRUPO CRIMINOSO. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Relativamente aos pressupostos da prisão preventiva, depreende-se do feito que as instâncias ordinárias, com apoio nas investigações preliminares, entenderam pela existência de indícios suficientes de autoria e materialidade com relação à recorrente. Com efeito, "[c]onstatada pelas instâncias ordinárias a existência de prova suficiente para instaurar a ação penal, reconhecer que os indícios de materialidade e autoria do crime são insuficientes para justificar a custódia cautelar implicaria afastar o substrato fático em que se ampara a acusação, o que, como é sabido, não é possível na estreita e célere via do habeas corpus" (AgRg no HC n. 816.779/SP, relatora MINISTRA LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 29/5/2023, DJe de 5/6/2023).
2. Presentes elementos concretos para justificar a manutenção da prisão preventiva para a garantia da ordem pública. As instâncias ordinárias afirmaram a necessidade da segregação cautelar, tendo sido demonstradas, com base em elementos concretos, a gravidade da conduta e a periculosidade da recorrente que seria integrante de articulada organização criminosa e inclusive auxiliava na lavagem de dinheiro, sendo responsável por pagamentos de despesas de líder do Comando Vermelho - CV.
3 . A prisão processual está devidamente fundamentada na garantia da ordem pública, tendo em vista o modus operandi da conduta e a necessidade de desarticulação do grupo, não havendo falar em flagrante ilegalidade ensejadora de sua revogação, valendo ressaltar que o Juízo de Primeiro Grau substituiu a prisão preventiva pela domiciliar.
4. Agravo regimental desprovido."
(AgRg no RHC n. 182.627/MT, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 18/3/2024, DJe de 20/3/2024, grifou-se)
Vale lembrar, ainda, que, segundo jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal, seguida por esse Superior Tribunal de Justiça, entende-se que “a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa enquadra-se no conceito de garantia da ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva” (STF, Primeira Turma, HC n. 95.024/SP, Rel. Ministra CÁRMEN LÚCIA, DJe 20/2/2009, citado no RHC 126.774/DF, Rel. Ministro ANTÔNIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 20/10/2020, DJe 27/10/2020).
Tampouco há suficiente indicativo de afronta à contemporaneidade.
Segundo entende o Supremo Tribunal Federal: "A contemporaneidade diz respeito aos motivos ensejadores da prisão preventiva e não ao momento da prática supostamente criminosa em si, ou seja, é desimportante que o fato ilícito tenha sido praticado há lapso temporal longínquo, sendo necessária, no entanto, a efetiva demonstração de que, mesmo com o transcurso de tal período, continuam presentes os requisitos (i) do risco à ordem pública ou (ii) à ordem econômica, (iii) da conveniência da instrução ou, ainda, (iv) da necessidade de assegurar a aplicação da lei penal." (AgR no HC n. 190.028, Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, DJe11/2/2021).
No caso, para além do acórdão do Tribunal de Justiça destacar a necessidade das prisões preventivas para desarticular o grupo criminoso que estaria em atuação no momento em que encerrada a fase investigativa e ofertada a denúncia (em 19/7/2024 - fls. 143-155), verifica-se que a custódia foi fundamentada, ainda, no risco que a liberdade dos pacientes gera à instrução processual, em especial diante dos relatos acerca do temor que o grupo, liderado pelos pacientes, gera na comunidade local.
Além disso, entende esta Corte que "não se verifica a ausência de contemporaneidade na hipótese de revogação da decisão concessiva de liberdade provisória por recurso em sentido estrito interposto pela acusação, julgado em lapso de tempo razoável" (HC n. 441.150/PR, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 19/6/2018, DJe de 29/6/2018) [...]" (AgRg no HC n. 925.007/RS, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 2/9/2024, DJe de 4/9/2024.)
É o caso dos autos, em que a prisão preventiva foi decretada pelo Tribunal de Justiça, ao julgar recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público Estadual contra decisão do Juízo de 1º grau que havia indeferido o pedido, não havendo qualquer indicativo de que o tempo decorrido entre oferecimento da denúncia (pouco depois do fim das investigações) e o julgamento do recurso (18/6/2025) tenha arrefecido os riscos que o grupo criminoso gera à ordem pública e à instrução processual.
A parte impetrante aduz, ainda, que o acórdão impugnado teria inovado, indevidamente, quantos aos fundamentos que justificaram a prisão preventiva, além de encontrar-se em descompasso com os limites objetivos da denúncia, que imputa aos pacientes apenas o crime tipificado no art. 288-A do CPP, não fazendo menção a crimes de ameaça, extorsões e organização criminosa.
A tese, mais uma vez, não se sustenta.
Por um lado, nada há de irregular, em sede de julgamento de recurso em sentido estrito, fundamentar o decreto prisional em elemento não considerado pelo Juízo de 1º grau; em verdade, é da própria essência desse tipo de julgamento, em que a instância recursal discorda da decisão proferida pela instância inferior, que haja a indicação de novos elementos capazes de justificar o acolhimento da pretensão formulada pelo recorrente.
Por outro lado, constata-se que a Corte de origem não se distancia dos elementos fáticos constantes da denúncia, que aponta "[...] que os denunciados, agindo de forma livre, voluntária e consciente, de maneira estável e permanente, constituíram e integraram milícia particular, com objetivo de praticar crimes, com destaque para a extorsão de comerciantes locais, no bairro de Caetés I, nesta cidade de Abreu e Lima, desde de, pelo menos, 21 de janeiro de 2019 (data do homicídio apurado no IP nº 09908.9040.00012/2019-1.3, que dá suporte à ação penal nº 0001761-86.2024.8.17.2100." (fl. 145)
Acrescenta a denúncia: "[...] sob o comando do primeiro denunciado ROSTAND (1), montou-se uma verdadeira milícia particular sob o pretexto de reduzir os índices de criminalidade de Abreu e Lima, a qual atuava como um poder paralelo no bairro de Caetés I, extorquindo comerciantes para o pagamento de “taxa de proteção” e praticando crimes contra suspeitos de furtos e roubos na localidade." (fl. 145)
É exatamente este o contexto fático avaliado pela Corte de origem, que, como visto, decretou a prisão preventiva diante das evidências de que os pacientes exerceriam liderança em milícia privada destinada à prática de extorsões de comerciantes locais, levando temor à comunidade afetada; o simples fato de fazer referência a crimes específicos potencialmente praticados pelo grupo criminoso não revela qualquer descompasso com a peça acusatória, servindo apenas para contextualizar os fatos que demonstrariam a atuação da milícia privada, esta sim objeto da denúncia.
Por fim, mostra-se inviável, no caso, a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, pois a periculosidade dos pacientes indica que a ordem pública não estaria acautelada com a pretendida soltura. Sobre o tema: RHC 81.745/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 01/06/2017, DJe 09/06/2017; RHC 82.978/MT, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 01/06/2017, DJe 09/06/2017; HC 394.432/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 01/06/2017, DJe 09/06/2017.
Ante o exposto, com fundamento no art. 34, XX, do RISTJ, não conheço do habeas corpus.
Publique-se. Intimem-se.
Relator
RIBEIRO DANTAS
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