Processo nº 5036288-19.2024.4.04.7000
ID: 311693475
Tribunal: TRF4
Órgão: 11ª Vara Federal de Curitiba
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5036288-19.2024.4.04.7000
Data de Disponibilização:
30/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LUANA DOS SANTOS KURPIEL
OAB/PR XXXXXX
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SABRINA PAULA CIQUEIRA DOS SANTOS
OAB/PR XXXXXX
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LEONARDO KURPIEL JUNIOR
OAB/PR XXXXXX
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WILLIAN AGAPE VIEIRA
OAB/PR XXXXXX
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PROCEDIMENTO COMUM Nº 5036288-19.2024.4.04.7000/PR
AUTOR
: RONI STRAPASSON
ADVOGADO(A)
: WILLIAN AGAPE VIEIRA (OAB PR074768)
ADVOGADO(A)
: LEONARDO KURPIEL JUNIOR (OAB PR045008)
ADVOGADO(A)
: SABRI…
PROCEDIMENTO COMUM Nº 5036288-19.2024.4.04.7000/PR
AUTOR
: RONI STRAPASSON
ADVOGADO(A)
: WILLIAN AGAPE VIEIRA (OAB PR074768)
ADVOGADO(A)
: LEONARDO KURPIEL JUNIOR (OAB PR045008)
ADVOGADO(A)
: SABRINA PAULA CIQUEIRA DOS SANTOS (OAB PR082994)
ADVOGADO(A)
: LUANA DOS SANTOS KURPIEL (OAB PR109911)
DESPACHO/DECISÃO
I - RELATÓRIO
1.1. Petição inicial:
Em 13 de agosto de 2024,
RONI STRAPASSON
, deflagrou a presente demanda, sob o rito de tutela antecipada antecedente, em face da UNIÃO FEDERAL, pretendendo que seja anulado o débito fiscal referente ao lançamento tributário do ITR, referente ao exercício de 2020.
O autor alegou ter sido notificado de lançamento de revisão, na forma do art. 150, §3, Código Tributário Nacional, no tocante ao imposto territorial rural - ano base de 2020. Sustentou que, para tanto, o Município de Cerro Azul, por força de convênio com a União, teria desconsiderado os desbastes promovidos, na base de cálculo de tributário, das poligonais alusivas às áreas de preservação permanente e reserva legal presentes no terreno. Tampouco teria levado em devida conta cuidar-se de imóvel coberto por vegetação nativa e insuscetível de exploração.
Ele argumentou ter promovido a impugnação no âmbito administrativo do mencionado lançamento. Sustentou que teria juntado o CAR e o ADA de 2020, comprovando todas as áreas isentas. Juntou parecer técnico por ele contratado. O demandante atribuiu à causa o valor de R$ 147.766,77 e postulou a antecipação de tutela em prol da suspensão da exigibilidade do crédito tributário suplementar de ITR, lançado pelo Município de Cerro Azul, referente ao exercício de 2020.
1.2. Prelibação da peça inicial:
Mediante sorteio, o processo restou distribuído perante o r. juízo da 4ª Vara Federal, ao que se seguiu a declinação da competência para esta Vara, por conta da sua especialização no processo e julgamento de conflitos versando sobre tributos com escopo ambiental.
Na decisão de evento 13, reconheci a competência para o processamento do feito e sua submissão ao rito comum. Deferi o pedido de antecipação da tutela, e determinei a citação da demandada.
1.3. Resposta da União Federal:
Na contestação apresentada no evento 19, a União impugnou os argumentos da inicial, alegando que, da análise dos documentação apresentadas pela parte autora, restaria confirmado o não cumprimento da exigência de apresentação de ADA, em que fosse declarado o interesse ecológico de áreas do imóvel, além de registro no Cadastro Ambiental Rural - CAR. para tais poligonais, quanto ao exercício de 2020. Aduziu que também não haveria sido averbada junto à matrícula do imóvel a área de reserva legal, com identificação de perímetro e localização.
A requerida alegou que a lei n. 12.651/2012, teria preconizado a identificação da área de preservação permanente e da reserva legal na inscrição no CAR (art. 29, § 1º, III, da Lei nº 12.651, de 2012), restando evidente que essa exigência seria condição à concessão de isenção do ITR. O entendimento do STF, anterior à edição da referida lei e na vigência da lei 10.165/2000, seria extensível apenas à servidão ambiental, pois a alínea "d", que trataria da servidão ambiental teria sido mencionada no §7º junto com a alínea "a", que trata das áreas de preservação permanente e reserva legal.
Segundo a União Federal,
"a apresentação do ADA deixou de ser exigível para as hipóteses área de preservação permanente e de reserva legal para a concessão de isenção de ITR e apenas naquelas hipóteses, em razão da jurisprudência firmada no STJ, de que se trata de tributo sujeito a lançamento por homologação, sendo que em relação à área de reserva legal o STJ entendeu que a lei traz a obrigatoriedade de averbação na matrícula do imóvel para comprovar a parte do imóvel que deve receber proteção do Código Florestal."
1.4. Réplica do autor:
O autor apresentou réplica no movimento 22, reiterando os argumentos esgrimidos na inicial. Enfatizou que a sua pretensão estaria em conformidade com o sistema jurídico.
1.5. Pedidos de diligências probatórias:
Ele postulou no movimento 27 a promoção de diligênica pericial, com o fim de comprovar a presença, no imóvel, de poligonais de especial interesse ambiental. A União postulou o julgamento antecipado do processo no movimento 28.
Os autos vieram conclusos.
II - FUNDAMENTAÇÃO
Promovo o saneamento desta demanda
. Para tanto, retomo o exame de questões processuais, equaciono alguns vetores a respeito do tema discutido nos autos, menciono os elementos de convicção veiculados nos autos e aprecio a distribuição de ônus probatórios.
2.1. Competência da Justiça Federal:
A presente demanda se submete à alçada da Justiça Federal, conforme
art. 109, I, Constituição Federal e art. 10 da lei n. 5.010/66
, eis que o autor endereçou sua pretensão em face da União Federal.
2.2. Competência desta subseção judiciária:
Em princípio, pode-se cogitar da competência do Juízo do local em que a obrigação deva ser adimplida, caso a pretensão do autor venha a ser julgada procedente - art. 53, III, "d", Código de Processo Civil/15.
No caso, o imóvel encontra-se situado em Guaraqueçaba, e a empresa autora possui sede em Curitiba, conforme instrumento de contrato social, anexado no movimento1. Isso suscita a competência da Subseção de Curitiba é definido na
Resolução n. 08, de 09 de junho de 1993
, TRF4. Nesse mesmo sentido, a Resolução 40, de 30.09.1998; Res. 75, de 09.12.1998; Res. 64, de 07.06.2005 e Res. 68, de 09.06.2005, todas do TRF4.
De toda sorte, as pretensões deduzidas em face da União Federal submetem-se ao
art. 109, §2, Constituição
:
"As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal."
Eventual incompetência relativa não pode ser declarada de ofício, conforme
art. 65, CPC/15
e
súmula 33, Superior Tribunal de Justiç
a. No caso, as partes não suscitaram exceção de incompetência.
2.3. Competência desta 11.VF:
Acrescento que a presente 11ª VF da Subseção de Curitiba foi especializada na temática ambiental e nos direitos das nações nativas, por meio da
Resolução 39, de 05 de abril de 2005
(Vara Ambiental de Curitiba), sendo renomeada por meio da Resolução 99, de 11 de junho de 2013, também do TRF4. A competência foi modificada por meio da Resolução 23, de 13 de abril de 2016, com regionalização promovida pela Resolução 63, de 25, de julho de 2018, e pela Resolução 43, de 26 de abril de 2019, TRF4.
Por força da
resolução nº 23, de 13 de abril de 2016
, do TRF4, a presente unidade passou a deter competência para apreciar questões pertinentes ao meio ambiente, natural ou urbano, conflitos minerários, desapropriação, questões concerentes às comunidades remanescentes de quilombolas, terrenos de marinha,
situados no litoral paranaense
, dentre outros temas.
A
redistribuição
da demanda perante esta 11.VF encontra-se em conformidade com a regulação do tema.
2.4. Alçada do presente Juízo Substituto:
O processo foi distribuído perante a 4.VF desta Subseção, com subsequente declinação de competência a favor desta unidade jurisdicional, por conta da especialização antes aludida. Dentre os dois Juízos desta VF - Titular e Substituto - a causa foi distribuída para o presente Juízo Substituto, mediante sorteio, o que atendeu à garantia do Juízo Natural, na forma do
art. 5, LIII, Constituição.
2.5. Cogitada submissão do caso ao rito dos Juizados:
Eventual pretensão à anulação de lançamentos fiscais deve ser proceda sob o rito e competência dos Juizados, sempre que o conteúdo econômico da pretensão se revelar inferior a 60 salários mínimos, vigentes ao tempo da deflagração da demanda. No caso, isso não se deu, considernado a atribuição de valor à demanda (R$ 147.766,77), superior ao referido limite, considerando a definição do salário mínimo, então vigente - decreto nº 11.864, de 27 de dezembro de 2023.
2.6. Eventual conexão processual:
O processualista Bruno Silveira Dantas enfatiza que
"com o início de vigência do CPC/2015, será considerado
prevento o juízo perante o qual houver ocorrido o registro ou a distribuição (conforme o caso) da primeira de uma série de demandas conexas, ainda que tal registro ou distribuição tenha ocorrido durante a vigência do CPC/1973
. Desde que a prevenção, ela própria, não se tenha consumado sob a égide do CPC/1973 (por um dos alternativos critérios previstos nos seus arts. 106 e 2019), incidirá de plano o disposto no art. 59 da codificação de 2015 definindo-se o juízo prevento para um conjunto de demandas conexas pela anterioridade dos registros ou das distribuições (conforme o caso) das mesmas. Os arts. 60 e 61 do CPC/2015, por sua vez, praticamente repetem os arts. 107 e 108 do CPC/1973, dispensando, por tal razão, maiores comentários a respeito nesta oportunidade."
(DANTAS, B. S.
in
WAMBIER, Teresa A. Alvim et al.
Breves comentários ao novo código de processo civil.
SP: RT, 2015, p. 229).
Convém term em conta a lição de Araken de Assis, sobre o tema:
"(...)
O art. 55, caput, definiu a conexão como a identidade de pedido ou de causa inspirado no propósito de erradicar as tergiversações constatadas na vigência do CPC de 1939. A proposição legislativa, excepcional no direito estrangeiro, porque prepondera a tendência de encarregar o órgão judicial de indicar os casos do fenômeno, consonante controvérsia haurida do direito comum, e feita em sentido oposto à do CPC de 1939, em todo caso revela-se incompleta e insuficiente. Não abrange a totalidade das hipóteses de conexão
. O art. 55, § 3.º (“… mesmo sem conexão entre eles”) alude à conexão em sentido estrito do art. 55, caput. Ao nosso ver, os vínculos que geram o risco da prolação de “decisões conflitantes ou contraditórias”, a teor do art. 55, § 3.º, inserem-se na rubrica da conexão em sentido amplo. Não há outro sítio adequado para situar o liame entre os objetos litigiosos
O art. 113 do NCPC, arrolando os casos em que se admite a demanda conjunta, ou litisconsórcio, demonstra que existem outros laços, mais tênues e distantes, que autorizam o processo cumulativo. E a outro juízo não se chega ao avaliar o nexo exigido pelo art. 343 na reconvenção, como ocorria no direito anterior. Retira-se, daí, segura conclusão
. As duas hipóteses descritas no art. 55, caput – identidade de causa ou identidade de pedido – constituem “uma, entre as várias em que ocorre a conexão”. Por isso, antes do CPC de 1939, descreveu-se a conexão como “laço envolvente, que se insinua por entre as relações jurídicas, ora prendendo-as de um modo indissolúvel, por forma a exigir uma única decisão; ora criando entre elas pontos de contato mais ou menos íntimo, que aconselham a reunião em um só processo, ainda quando possam ser decididas separadamente, sem maior dano, a não ser a lentidão e o gravame de maiores despesas”.
Exemplos de causas conexas, segundo a literalidade do art. 55, caput: (a) A reivindica o imóvel x perante B, e, paralelamente, C também reivindica o imóvel x, do mesmo réu, hipótese em que a identidade recai sobre o pedido (objeto) mediato; (b) o locatário A propõe consignatória dos aluguéis perante o locador B, o qual, de seu turno, propõe ação de despejo, fundada no inadimplemento dos aluguéis, perante o inquilino.
Para os efeitos da modificação da competência, as hipóteses contempladas no art. 55, caput – identidade de causa de pedir ou identidade de pedido –, então, ainda consideram-se exemplificativas. Um laço menos intenso já serve para reunir os processos. O objetivo da regra reside em evitar decisões conflitantes, “por isso a indagação sobre o objeto ou a causa de pedir, que o artigo por primeiro quer que seja comum, deve ser entendida em termos, não se exigindo a perfeita identidade, senão que haja um liame que os faça passíveis de decisão unificada”. Em outra oportunidade, reiterou-se que “não é necessário que se cuide de causas idênticas (quanto aos fundamentos e ao objeto {rectius: pedido})”, bastando “que as ações sejam análogas, semelhantes”, insistiu no “escopo da junção das demandas para um único julgamento é a mera possibilidade da superveniência de julgamentos discrepantes
”.
Por conseguinte, a jurisprudência, atendendo às finalidades da modificação da competência, em que a derrogação das regras gerais se justifica pela economia de atividade e pela erradicação do risco de julgamentos conflitantes, rejeita a exigência de identidade absoluta de causa ou de pedido, aceitando simples analogia entre as ações
. Porém, preocupa-se com o risco de julgamentos contraditórios, evento apurado caso a caso, mas verificado em todas as hipóteses do art. 113, inclusive na afinidade de ponto comum de direito ou de fato (inc. III). Ora, parece difícil visualizar semelhante risco no cúmulo simples de pedidos, em que há total autonomia das pretensões deduzidas, no mesmo processo, contra o réu. Por isso, o intuito de erradicar pronunciamentos conflitantes não oferece a única e constante justificativa para o processo cumulativo e, muito menos, a prorrogação da competência. Ao menos na conexão subjetiva, no caso da cumulação simples de pedidos, impera o princípio da economia processual. E, de toda sorte, as finalidades visadas no processo cumulativo, e na reunião de causas inicialmente autônomas, mostram-se estranhas à verdadeira causa desses fenômenos, que residiria no vínculo entre partes, causa e pedido." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume I. São Paulo: RT, 2015, tópico 302)
Deve-se aferir, ademais, a eventual aplicação do art. 55, §1º, parte final, CPC/15:
"Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta,
salvo se um deles já houver sido sentenciado
."
Semelhante é o conteúdo da mencionada súmula 235, STJ:
"
A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado
."
No caso em análise,
com cognição precária
não diviso conexão desta demanda com algum outro processo versando sobre o imposto territorial rural ou sobre a situação ambiental do imóvel em questão. Ressalvo nova análise adiante, caso acorram aos autos elementos que infirmem tal premissa.
2.7. Garantia do Juízo natural:
Nos termos do art. 5, LIII, Constituição/88, é assegurada a todas as pessoas a garantia do Juízo Natural
. Essa garantia é fundamental para que os processos sejam resolvidos com atenção à racionalidade pública, desenvolvida ao longo de gerações, e plasmada na legislação, ao invés de serem solucionados com lastro em pulsões privadas.
A garantia do Juízo natural se traduz, em síntese, na vedação de que as partes escolham o Juízo do caso e na vedação de que o Juízo escolha o caso. Logo, em regra, não é dado ao Juízo de 1. instância interferir em processos submetidos ao julgamento de outros magistrados.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CONEXÃO DE AÇÕES. AÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL E AÇÃO ANULATÓRIA. 1.
Existindo conexão entre a ação anulatória de débito fiscal e a execução fiscal, deve haver a reunião dos processos para julgamento conjunto dos feitos no juízo da execução, em face da competência funcional absoluta deste órgão especializado
. 2. Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo Suscitante.(TRF4 5014510-61.2012.404.0000, Primeira Seção, Relator p/ Acórdão Otávio Roberto Pamplona, D.E. 30/10/2012)
TRIBUTÁRIO. PROCESSO CIVIL. AJG. EXECUÇÃO FICAL. AÇÃO ANULATÓRIA. CONEXÃO. 1. Na inicial do agravo a parte recorrente diz-se "requerida de AJG", de forma que, mesmo não tendo havido manifestação anterior, entendo que a questão deve ser revista. Concedo, então, a AJG, dispensando a parte do ônus de recolher o porte de remessa e retorno. 2.
A jurisprudência reconhece a conexão entre a ação anulatória do débito e a execução fiscal, mas, em se tratando de competência funcional e, portanto, absoluta, devem os autos da anulatória ser remetidos no juízo da Vara de Execuções Fiscais, e não o contrário, como quer a agravante
. Causa espécie, e põe em dúvida a real intenção da executada, o fato de ter ajuizado a ação anulatória em Juízo diverso daquele em que tramitavam a execução fiscal e os respectivos embargos, se a própria autora reconhece a conexão entre os feitos e a necessidade de julgamento conjunto. (AG 00148359220104040000, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, D.E. 08/09/2010.)
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido que, conquanto se cogite de eventual conexão entre demanda anulatória e execução fiscal, versando sobre o mesmo suposto débito fiscal, isso não ensejaria a reunião dos processos
. Havendo justa causa, a anulatória poderia vaticinar a suspensão da execução fiscal porventura em curso.
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. PRETENSÃO DE SUSPENSÃO DO PROCESSO EXECUTIVO . CONEXÃO ENTRE EXECUÇÃO FISCAL E AÇÃO ANULATÓRIA. NÃO OCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE CAUSA SUSPENSIVA DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. ACÓRDÃO CONSONANTE COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ . PROVIMENTO NEGADO. 1. Trata-se de pretensão de suspensão da execução fiscal afastada pela Corte de origem, ante a ausência de conexão entre execução e ação ordinária (ação anulatória) e inexistência de causa suspensiva da exigibilidade do crédito. 2 .
O acórdão recorrido está em consonância com o entendimento das turmas da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmado no sentido da impossibilidade de serem reunidas execução fiscal e ação anulatória de débito precedentemente ajuizada, quando o juízo em que tramita esta última não é Vara Especializada em Execução Fiscal, nos termos consignados nas normas de organização judiciária
. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no REsp: 1883576 SP 2020/0169831-7, Relator.: Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, Data de Julgamento: 09/09/2024, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/09/2024)
No caso em exame, dever-se-ia apurar se o cogitado débito teria sido inscrito em dívida ativa - CDA, instrumento hábil a ensejar a deflagração de execuções fiscais em desfavor da demandante.
De todo modo, não há maiores indicativos de que tal cobrança já tenha sido promovida pela União. Ressalvo, também aqui, nova apreciação do tema adiante
.
2.8. Respeito à coisa julgada:
No que toca à delimitação do crédito do requerente,
convém ter em conta que a coisa julgada é uma garantia constitucional, nos termos do art. 5º, XXXVI, Constituição Federal/88:
"a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada."
"A sentença de mérito transitada em julgado só pode ser desconstituída mediante ajuizamento de específica ação autônoma de impugnação (ação rescisória) que
haja sido proposta na fluência do prazo decadencial previsto em lei
, pois, com o exaurimento de referido lapso temporal,
estar-se-á diante da coisa soberanamente julgada, insuscetível de ulterior modificação, ainda que o ato sentencial encontre fundamento em legislação que, em momento posterior, tenha sido declarada inconstitucional pelo STF, quer em sede de controle abstrato, quer no âmbito de fiscalização incidental de constitucionalidade
. A superveniência de decisão do STF, declaratória de inconstitucionalidade de diploma normativo utilizado como fundamento do título judicial questionado, ainda que impregnada de eficácia ex tunc - como sucede, ordinariamente, com os julgamentos proferidos em sede de fiscalização concentrada (RTJ 87/758 - RTJ 164/506-509 - RTJ 201/765) -, não se revela apta, só por si, a desconstituir a autoridade da coisa julgada, que traduz, em nosso sistema jurídico, limite insuperável à força retroativa resultante dos pronunciamentos que emanam, in abstracto, da Suprema Corte." (RE 592.912-AgR, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 3-4-2012, Segunda Turma, DJE de 22-11-2012.)
Atente-se também para a lição de Humberto Theodoro Jr.:
"A coisa julgada é fenômeno próprio do processo de conhecimento, cuja sentença tende a fazer extinguir a incerteza provocada pela lide instalada entre as partes. Mas fazer cessar a incerteza jurídica não significa apenas fazer conhecer a solução cabível, mas impô-la, tornando-a obrigatória para todos os sujeitos do processo, inclusive o próprio juiz. Às vezes, o comando sentencial tem de ser executado por meio de realização coativa da prestação devida pelo vencido. Outras vezes, a declaração apenas é suficiente para eliminar o foco da desavença. Nem sempre, portanto, o processo civil está predisposto a providências executivas. Há acertamentos condenatórios, mas há também os não condenatórios, que se desenvolvem em torno de pretensões constitutivas ou apenas declaratórias.
Uma vez, porém, concluído o acertamento da controvérsia, seja por sentença de imposição de sanção, seja por sentença puramente declaratória, a coisa julgada se estabelece com a mesma função, ou seja, a certeza jurídica em torno da relação controvertida se implanta com plenitude, vinculando as partes e o juiz.
Essa situação jurídica cristalizada pela coisa julgada caracteriza-se por dois aspectos fundamentais: de um lado, vincula definitivamente as partes; de outro, impede, partes e juiz, de restabelecer a mesma controvérsia não só no processo encerrado, como em qualquer outro.
Admite-se, dessa maneira, uma
função negativa
e uma
função positiva
para a coisa julgada. Pela função negativa exaure ela a
ação exercida
, excluindo a possibilidade de sua
reproposição
. Pela função positiva, “impõe às partes obediência ao julgado como norma
indiscutível
de disciplina das relações extrajudiciais entre elas e obriga a autoridade judiciária a ajustar-se a ela, nos pronunciamento que a pressuponham e que a ela se devem coordenar
” (
apud
NEVES, Celso.
Coisa Julgada Civil.
São Paulo: RT, 1971, p. 383-383).
A coisa julgada, por sua força vinculativa e impeditiva, não permite que partes e juiz escapem da definitiva sujeição aos efeitos do acertamento consumado no processo de conhecimento. O resultado prático é caber a qualquer dos litigantes “a
exceptio rei iudicatae,
para excluir novo debate sobre a relação jurídica decidida” (
apud
NEVES, Celso. Op. Cit, p. 489), e ao juiz o poder de, até mesmo de ofício, extinguir o processo sem julgamento do mérito, sempre que encontrar configurada a ofensa à coisa julgada (ar. 267, V e § 3º).
Portanto, quando o art. 467 fala em
indiscutibilidade
e
imutabilidade
da sentença transitada em julgado refere-se a duas coisas distintas: a) pela
imutabilidade
, as partes estão proibidas de propor ação idêntica àquela em que se estabeleceu a coisa julgada; b) pela
indiscutibilidade
, o juiz é que em novo processo, no qual se tenha de tomar a situação jurídica definida anteriormente pela coisa julgada como razão de decidir, não poderá reexaminá-la ou rejulgá-la; terá de tomá-la simplesmente como
premissa
indiscutível. No primeiro caso atua a força
proibitiva
(ou negativa) da coisa julgada, e, no segundo, sua força
normativa
(ou positiva)
." (THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Curso de Direito Processual Civil:
Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 587-588).
Nesse mesmo sentido, leiam-se também os seguintes julgados: RE 444.816, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 29-5-2012, Primeira Turma, DJE de 27-8-2012; RE 594.350, rel. min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 25-5-2010, DJE de 11-6-2010.
Segundo o conhecido art. 502, CPC/15,
"
Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso
.
" O art. 503, do mesmo código, preconiza que
"A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida."
Merece ênfase, ademais, o art. 508, CPC:
"Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido."
Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero são precisos quando enfatizam que
"A coisa julgada pressuposto do discurso jurídico - constitui uma regra sobre o discurso. Não admite, nesse sentido, ponderação. Representa evidente agressão ao Estado Constitucional e ao próprio discurso jurídico a tentativa de relativizar a coisa julgada."
(MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel.
Código de processo cvil.
6. ed. rev. atual. São Paulo: RT, 2014, p. 449).
Desse modo, a sentença transitada em julgado não pode ser alterada ou desconsiderada pelo Juízo, conforme lógica do art. 508, CPC/15. Tal alteração apenas seria admissível em casos de negócio processual, avençado entre as partes, versando sobre pretensões disponíveis, conforme art. 190, CPC/15. Também seria cabível em hipótese de ação rescisória, interposta perante o Tribunal competente e com atenção ao prazo do art. 975, CPC/15; em caso de
querela nullitatis insanabilis
ou de declaração, pela Suprema Corte, da inconstitucionalidade de norma tomada como fundamento para prolação da sentença (art. 535, §4º, CPC).
Aludidas exceções não se aplicam ao caso vertente. De toda sorte, não diviso sinais de que esta demanda seja reiteração de alguma outra porventura já julgada, com sentença transitada em julgado
.
2.9. Eventual litispendência:
De alguma forma, o tema do
ne bis in idem
tem origem no âmbito do direito sancionador, dado que ninguém pode ser sancionado duplamente por uma mesma infração administrativa ou penal
. Essa vedação decorre da própria cláusula do devido processo, tanto na vertente substantiva quanto procedimental. Daí que ninguém pode responder a simultâneos processos administrativos versando sobre a mesma suspeita/imputação, tampouco podendo responder a distintos processo penais com lastro na mesma arguição.
Esse é o conteúdo da cláusula do
double jeopardy,
assegurada pela 5ª e pela 14ª Emendas da Constituição dos EUA (aplicadas aos Estados-membros a partir do caso
Benton v. Maryland - 1969,
Suprema Corte). No âmbito da
Civil Law
isso se traduz na cláusula do
ne bis in idem,
assegurado expressamente pelo art. 8º do Pacto de San José da Costa Rica e em inúmeros outros tratados internacionais. No caso alemão, essa vedação está expressa no art. 103 da Lei Fundamental (
Doppelverwertungsverbot -
proibição de dupla valoração do mesmo fato:
"
Ninguém pode ser punido mais de uma vez pelo mesmo fato, com base no direito penal comum
",
em tradução livre).
Apesar de se tratar de garantia antiga - há quem alegue que o
ne bis in idem
teria origem sob o governo de Henrique II, na Inglaterra (por volta de 1100 D.C, conforme RUDSTEIN, David S.
Double
jeopardy:
a reference guide to the United States Constitution. Westport: Praeger, 2004, p. 4-8), há várias discussões a respeito do seu alcance. Anote-se, por exemplo, que García de Enterría sustentava que o
ne bis in idem
impediria a cumulação de sanções penais e administrativas diante de uma mesma imputação, por força da redação do art. 25 da Constituição da Espanha (veja-se AISA, Estrella Escuchuri.
Teoría del concurso de leyes y de delitos:
bases para una revisión crítica. Granada: Comares, 2004, p. 123). Mas, essa opinião não ganhou maiores adeptos.
O fato é que o
bis in idem
ocorre quando alguém é sancionado mais de uma vez pela mesma imputação. Daí que deve se tratar da mesma conduta e também da punição ao mesmo título, dado que é cabível - no território nacional - que alguém responda a uma sanção pela infração tributária e também responda por eventual crime previsto na lei 8.137/1990. Em outras palavras, um determinado comportamento pode configurar, a um só tempo, infração a cláusulas contratuais - dando ensejo à aplicação de cláusulas penais -; ilícito administrativo; ilícito tributário e ilícito penal, contanto que haja efetiva diferença entre os escopos sancionatórios de cada uma dessas imputações.
No caso, nesse primeiro e precário exame, não diviso sinais de litispendência, o que pressupõe - conforme
art. 337, §2, CPC/15
- identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. No presente processo, a aludida exceção não foi suscitada pelas partes e não constato o cogitado
bis in idem
, no que tange ao exame de ofício.
Aludido requisito de identidade de partes nas demandas é esmaecido, e fato, quando em causa processos coletivos, na medida em que o(a) autor(a) pode então deduzir pretensão em nome de coletividades.
Quando em causa ações coletivas
, o que não é a hipótese em exame, é salutar ter em conta
"que a aferição da litispendência na tutela coletiva deve ser regida não pela análise de quem formalmente se apresenta como autor das diversas demandas, mas, sim, pela qualificação jurídica de tal legitimação. Vale dizer, indagando-se a que título estão as diferentes entidades autoras em juízo, deduzindo idênticas pretensões de tutela de direitos meta-individuais (mesmos pedidos e causas de pedir), quando, então, será possível afirmar serem idênticas as demandas coletivas.
Deste modo, em virtude da especialidade do modelo processual coletivo, e, notadamete da qualificação da legitimação ativa empregaada, revela-se equivocada a afirmação de inexistência de litispendência entre ações coletivas através das quais sejam deduzidas idênticas pretensões, pelo tão-só fato de terem sido propostas por entidades diferentes
."
(VENTURI, Elton.
Processo civil coletivo:
a tutela jurisdicional dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos no Brasil. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 331).
No caso em exame, não há sinais de litispendência.
2.10. Eventual suspensão do processo:
Não diviso a presença dos requisitos que ensejariam eventual suspensão do processo, nesta etapa da causa, por conta de alguma questão prejudicial - art. 313, Código de Processo Civil/15: "
Suspende-se o processo: (...) V -
quando a sentença de mérito: a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente
; b) tiver de ser proferida somente após a verificação de determinado fato ou a produção de certa prova, requisitada a outro juízo. (...) § 4 O prazo de suspensão do processo nunca poderá exceder 1 (um) ano nas hipóteses do inciso V e 6 (seis) meses naquela prevista no inciso II. §5 O juiz determinará o prosseguimento do processo assim que esgotados os prazos previstos no §4."
A respeito dos aludidos preceitos, convém registrar aqui a análise detida promovida por Araken de Assis:
"Prejudicial externa civil – A hipótese mais frisante de suspensão do processo em razão de prejudicialidade externa homogênea é a prevista no art. 313, V, a, do NCPC.
Toda vez que o julgamento do mérito “depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente”, o juiz suspenderá o processo
. Derivações dessa regra avultam na possibilidade de o relator suspender os processos que dependam do julgamento da ação declaratória de constitucionalidade (art. 21 da Lei 9.868/1999) e da arguição de descumprimento de preceito fundamental (art. 5.º, § 3.º, da Lei 9.882/1999) – não, porém, a suspensão em decorrência do incidente de resolução das demandas repetitivas ou do julgamento do recurso extraordinário e do recurso especial repetitivos: a questão aí julgada é principal. O art. 313, V, a, trata da suspensão por causa prejudicial, que é a aptidão da prejudicial em tornar-se objeto litigioso em outro processo.
Fica evidente da redação da norma que a prejudicial é externa, porque há de consistir em “objeto principal de outro processo”. Não importa a circunstância de a questão prejudicial consistir no objeto originário do outro processo (v.g., A postula a invalidade do contrato firmado com B, mas B pleiteia o cumprimento da prestação devida por A) ou decorrer do alargamento desse objeto, por força de declaração incidente (v.g. B pleiteou de A, no primeiro processo, o principal da dívida, mas A reagiu pleiteando a declaração incidente da validade do contrato; no segundo processo, B pleiteia de A os juros da dívida). Importa a resolução da questão comum no outro processo, com autoridade de coisa julgada. E, nesse caso, o vínculo produzido na causa subordinante estender-se-á à causa subordinada ou, vencido o prazo máximo de suspensão – hipótese mais do que provável, vez que o interregno de um ano (art. 313, § 4.º) é muito curto, pressupondo-se elastério mais dilatado para o julgamento, por forçada ordem cronológica do art. 12, e o trânsito em julgado –, sobre a deliberação incidental na causa subordinada não recairá a coisa julgada (art. 503, § 1.º, III, in fine). Realmente, a questão comum não constitui o objeto principal da causa condicionada. Do contrário, configurar-se-ia um dos efeitos da litispendência, a proibição de renovação de causa idêntica. Cumprirá ao juiz julgá-la vencido o prazo hábil de espera, incidentalmente, apesar dos esforços de concatenação empreendidos pelo expediente da suspensão.
O exemplo ministrado, em que uma das partes pleiteia a decretação da invalidade do contrato e a outra reclama a prestação, releva que tampouco importa a diversidade da força da ação (declarativa, constitutiva, condenatória, executiva e mandamental) e a espécie de procedimento. A pretensão de A contra B para decretar a invalidade do contrato tem força constitutiva negativa, a de B contra A para realizar a prestação tem força condenatória. Nada obstante, o primeiro processo funciona como causa prejudicial relativamente à pretensão deduzida no segundo: decretada a invalidade do contrato naquele, fica predeterminado o desfecho deste (improcedência). Evidentemente, havendo a possibilidade de reunir os processos no mesmo juízo (retro, 305), para julgamento simultâneo, por força da conexão (retro, 303), inexiste a necessidade de suspender a causa condicionada, porque os processos conexos serão julgados simultaneamente (art. 55, § 1.º).
O objetivo da suspensão prevista no art. 313, V, a, consiste em evitar a emissão de provimentos conflitantes, logicamente incompatíveis, a respeito da questão prejudicial. Por esse motivo, causa prejudicial envolvendo partes distintas raramente constitui razão bastante para suspender outro processo, por mais relevante que seja a questão comum controvertida em ambos, ressalva feita às hipóteses de o julgamento da causa subordinante produzir efeitos erga omnes, como acontece na ação declaratória de constitucionalidade (art. 102, § 2.º, da CF/1988). Aliás, essa é uma característica – a falta de identidade de partes – da prejudicial de constitucionalidade, objeto do controle concentrado, todavia alheio à incidência do art. 313, V, a. Em outras palavras, o juiz da causa condicionada não suspenderá o processo em que se controverta norma objeto de controle concentrado de constitucionalidade
. Em tal hipótese, ou o STF concedeu liminar, suspendendo a vigência da norma, e o juiz não poderá aplicá-la; ou não concedeu, e o juiz haverá de aplicá-la no julgamento do mérito, ou não, exercendo o controle difuso. A superveniência do julgamento do STF, pronunciando a inconstitucionalidade, será recepcionado no julgamento do mérito ou, havendo ocorrido o trânsito em julgado, a sentença se tornará inexequível, nas condições do art. 525, § 1.º, III, c/c § 12.
No tocante ao estágio do processo subordinado, a suspensão poderá ocorrer no primeiro e no segundo graus; em particular, “o fato de já ter sido proferida sentença no processo prejudicado não afasta, portanto, a possibilidade de sua suspensão”. Conforme deflui da cláusula final do art. 313, V, a, que alude a “outro processo pendente”, tampouco o estágio do processo subordinante se mostra relevante à suspensão, bastando que subsistam os efeitos da litispendência. Encontrando-se a causa prejudicial no tribunal, por força de apelação, admite-se a suspensão, hipótese em que, presumivelmente, o desfecho ocorrerá dentro do prazo de suspensão
.
Era particularmente difícil a interpretação da regra particular do direito anterior, declarando haver suspensão do processo que “tiver por pressuposto o julgamento de questão de estado, requerido como declaração incidente” (art. 265, IV, c, do CPC de 1973). A esse propósito, havia dois termos de alternativa: ou se cuidava de prejudicial externa, caracterizada pelo fato se tratar de questão de estado (v.g., na ação de divórcio, a validade do casamento), hipótese em que incorreria a lei em indesejável redundância; ou se tratava de prejudicial interna, caso em que ocorreria colisão com o sistema da declaração incidente, e, pior, nenhuma justificativa plausível para suspender o processo, pois o juiz da causa resolverá conjuntamente a questão prejudicial, e, conforme o teor da resolução, passando ou não à análise da questão prejudicada. Essa situação constitui simples subespécie da regra geral do art. 313, V, a, do NCPC. É digno de nota a possibilidade de o juízo não exibir competência em razão da matéria para julgar questões de estado em caráter principalmente, hipótese em que a resolução incidental porventura tomada não se revestirá de auctoritas rei iudicate, nos termos do art. 503, § 1.º, III." (ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro:
volume II. Tomo II. Parte geral: institutos fundamentais. São Paulo: RT. 2015. p. 809 e ss.)
No caso em apreço, não diviso a presença de causas ensejadoras da suspensão desta demanda, a exemplo de cogitada necessidade de se aguardar a evolução de algum outro processo
. Tampouco foi determinada a suspensão em alguma demandada suscetível de produzir tal efeito, a exemplo do disposto no art. 982, do Código de Processo Civil/2015. Ressalvo eventual novo exame do tema, caso a tanto instado.
2.11. Pertinência subjetiva - considerações gerais:
É sabido que, em alguma medida, as questões alusivas à pertinência subjetiva tangenciam o próprio mérito da causa. Nosso sistema ainda se vincula à concepção eclética de Túlio Liebmann - quem distinguia entre pressupostos processuais, condições para o válido exercício do direito de ação e, por fim, as questões de mérito.
O problema é que, no mais das vezes, os temas próprios ao mérito (procedência/improcedência da pretensão) e os temas próprios às condições da ação (legitimidade/ilegitimidade, possibilidade do pedido) não podem ser distinguidos de uma forma absolutamente clara. Como se infere do seu 'Tratado das ações', Pontes de Miranda promovia uma distinção entre (a) ação em sentido material - como uma espécie de projeção do direito subjetivo - ainda vinculada à concepção imanentista do direito civil antigo e (b) ação em sentido processual.
Com base nessa diferenciação pontiana, é que o desembargador gaúcho Adroaldo Furtado Fabrício tem criticado a teoria eclética, ao enfatizar que as 'condições da ação' também tratam, no geral, do mérito da causa (saber se a parte é legítima é, de certa forma, um exame conexo ao mérito: saber se ela poderia ser demandada, se teria a obrigação de indenizar etc).
Confira-se com Adroaldo Furtado Fabrício. Extinção do Processo e Mérito da Causa, in OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de (org).
Saneamento do processo:
Estudos em homenagem ao Prof. Galeno Lacerda. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 1990, p. 33.
De todo modo, em sentido pontualmente distinto, e por conta dos dispositivos do Código de Processo Civil em vigor, atente-se para a lição de Araken de Assis:
"
A legitimidade não condiciona a ação, como quer a opinião há pouco exposta, haja vista um motivo trivial: a sua falta jamais impedirá a formação do processo
. A pessoa que toma a iniciativa de provocar o órgão judiciário, seja quem for, cria a relação processual, embora fadada a perecer através de juízo de admissibilidade negativo – item que constitui pressuposto lógico e cronológico do exame do mérito.
Legitimidade é, descansando no direito material, problema distinto do juízo acerca do caráter fundado ou infundado da pretensão deduzida contra o réu
. A demanda movida por alguém sem legitimidade é inadmissível, e, não, infundada. Sentença terminativa desse teor limita-se a repelir, a partir dos dados ministrados pelo direito material, sempre
in status assertionis,
a habilitação da parte para conduzir o processo, relativamente ao objeto litigioso alegado. Aos esquemas abstratos, traçados na lei, gerando tal capacidade, chamam-se de situações legitimadoras. Portanto, a dissociação entre o sujeito da lide e o do processo evidencia a verdadeira natureza da legitimidade e a situa no lugar próprio no conjunto das questões submetidas à apreciação do órgão judicial. É um pressuposto processual preenchido mediante a simples enunciação do autor. Ninguém se atreverá a reputar respeitante ao mérito eventual juízo quanto à inexistência, em determinado caso concreto, do título legal para alguém pleitear em juízo direito alheio. Descontada a errônea concepção que ilegitimidade do autor obsta à formação do processo, o art. 485, VI, houve-se com acerto ao situar o problema fora do mérito."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
Volume II. Tomo I. Parte geral. SP: RT. 2015. p. 178).
Em outras palavras, deve-se aferir a pertinência subjetiva dos requeridos, tendo-se em conta a causa de pedir detalhada na peça inicial.
Destaque-se
"
legitimidade para causa (ou legitimatio ad causam), que não se confunde com a legitimidade para o processo (ou legitimatio ad processum , conhecida ainda como capacidade para estar em juízo), concerne à pertinência subjetiva da ação, atine à titularidade (ativa e passiva) da ação. Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade. Aferição da existência de interesse e de legitimidade
. O interesse e a legitimidade para causa representam requisitos para o julgamento do pedido e devem ser aferidos in status assertionis , isto é, à vista das afirmações do demandante, sem tomar em conta as provas produzidas no processo.
Havendo manifesta ilegitimidade para causa ou quando o autor carecer de interesse processual, pode ocorrer o indeferimento da petição inicial (art. 330, II e III, CPC), com extinção do processo sem resolução de mérito (art. 485, VI, CPC)
. Todavia, se o órgão jurisdicional, levando em consideração as provas produzidas no processo, convence-se da ilegitimidade da parte ou da ausência de interesse do autor, há resolução de mérito (art. 487, I, CPC). No primeiro caso, não há que se pensar na formação de coisa julgada (art. 502, CPC). Nada obstante, mesmo inexistindo sentença de mérito e coisa julgada, porque o pronunciamento judicial é capaz de obstar nova propositura da demanda, caberá ação rescisória (art. 966, § 2.º, I, CPC). No segundo, há resolução de mérito e formação de coisa julgada, seguindo-se a regra geral da possibilidade de propositura de ação rescisória (STJ, 3.ª Turma, REsp 21.544/MG , rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 19.05.1992, DJ 08.06.1992, p. 8.619)."
(MARINONI, Luiz; ARENHART, Sérgio; MITIDIERO, Daniel.
Código de Processo Civil Comentado - Ed. 2024
. São Paulo: RT. 2024. comentários ao art 17).
2.12. Legitimidade das partes - caso em exame:
A demandante está legitimada para esta demanda, eis que deduziu pretensão própria, em nome próprio, não esbarrando no
art. 18, CPC/15
. Ela sustentou ter sido alvo de lançamento de revisão, na forma do
art. 150, §4, CTN
, com glosa dos abatimentos de área, promovidos para fins de cálculo do ITR - imposto territorial rural, o que disse ter sido empreendido de modo inválido.
A União Federal guarda pertinência subjetiva com a demanda, por força do
art. 153, VI, da Constituição/88 e art. 29 do Código Tributário Nacional/66
, enquanto ente tributante do referido imposto territorial rural - ITR. Restou atendido o art. 17, CPC/15.
2.13.
Litisconsórcio
necessário - considerações
gerais:
O litisconsórcio previsto inicialmente no art. 47, CPC/1973 e atualmente no
art. 114, CPC/2015
, decorre da lógica do
inauditus damnare potest,
imposto pelo art. 5º, LIV e LV, CF. A sentença apenas faz coisa julgada entre as partes, conforme art. 506, CPC/15, exceção feita à regra do art. 109. Código de Processo Civil/2015.
Ora, justamente por força da necessidade de que as decisões judiciais sejam consistentes, é que o Código de Processo civil obriga o demandante, em determinados casos, a orientar a sua pretensão contra todas as pessoas intimamente vinculadas a determinado evento (causa de pedir). Busca-se, com isso, inibir soluções judiciais contraditórias, ao mesmo tempo em que também se otimiza a prestação jurisdicional e se assegura o postulado
nemo inauditus damnare potest.
Reporto-me à lição de Luís Marinoni e Sérgio Arenhart:
"Em princípio, a determinação da formação do litisconsórcio necessário vem estipulada no caput do art. 47, CPC, que afirma que há litisconsórcio necessário quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. Portanto, da leitura desse artigo tem-se que duas causas podem gerar o litisconsórcio necessário; a lei ou a natureza da relação jurídica.
E, somando-se a isso, para a caracterização da necessidade da formação do litisconsórcio, será necessário que essas causas exijam que o juiz julgue o litígio de maneira uniforme para todas as partes (rectius, litisconsortes). Note-se, porém, que a redação do dispositivo é bastante defeituosa, podendo levar à conclusão de que as figuras do litisconsórcio necessário e unitário identificam-se, ou melhor, que o litisconsórcio unitário deve ser necessário e que o litisconsórcio necessário deve ser unitário
.
Nem sempre, porém, assim será. Imagine-se a hipótese em que a lei obriga, por qualquer causa, a formação de determinado litisconsórcio, ainda que a questão não precise, necessariamente, ser resolvida de maneira idêntica para todos os litisconsortes. Pense-se na hipótese da ação popular, em que a lei determina que devam ser citados para a ação todos aqueles que direta ou indiretamente tenham contribuído, por ação ou omissão, para a edição do ato inquinado como ilegal (art. 6º da lei 4.717/1965 - lei de ação popular), bem como seus beneficiários diretos. Ninguém duvida que esse é um litisconsórcio simples, não exigindo solução idêntica perante todos os litisconsortes. Não obstante isso, a lei impõe a formação de litisconsórcio. Seria, por acaso, indevida essa exigência do litisconsórcio? Poderia alguém questionar a exigibilidade desse litisconsórcio? Não parece que a resposta possa ser positiva. Em verdade, a exigência da formação do litisconsórcio, no caso, em que a lei o exija, independe do caráter unitário ou não da figura. Impõe simplesmente porque a lei o quer.
Somente na outra hipótese, em que a formação do litisconsórcio decorre da natureza da relação jurídica, é que efetivamente tem algum interesse a questão da unitariedade ou não da figura
. Aqui, sim, é possível que, diante da necessidade de que a solução da causa seja idêntica para várias pessoas, imponha-se o litisconsórcio ainda que a lei não o determine. E, como já visto, a unitariedade do litisconsórcio decorre não apenas do fato de que a sentença deve decidir a questão de forma uniforme para todos os litisconsortes, mas, sobretudo, da ideia de que essa imposição decorra da unitariedade da relação jurídica material deduzida em juízo. Vale dizer: no litisconsórcio unitário, exige uma relação jurídica material (cuja afirmação é o objeto da demanda) que possui vários sujeitos em um dos pólos. Pense-se no caso de um imóvel que possua vários coproprietários. Ou no negócio jurídico celebrado por marido e mulher com terceiro. Ou ainda em um ato administrativo (por exemplo, uma portaria) complexo, que é emitido por mais de uma entidade. Nesses casos, a relação jurídica material realizada possui, em pelo menos um dos seus pólos, mais de um sujeito. E é precisamente essa pluralidade subjetiva em um dos pólos da relação jurídica material deduzida em juízo que determina, na forma do que prevê o art. 47, CPC (natureza da relação jurídica), o litisconsórcio necessário." (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz.
Processo
de conhecimento.
7. ed. São Paulo: RT, 2008, p. 173-174)
Atente-se também para a análise de Marcelo Abelha Rodrigues:
"A necessidade deste tipo de litisconsórcio, prevista no art. 47, CPC, decorre ou por força de lei, ou por natureza da relação jurídica. Será por força de lei no caso, por exemplo, do art. 6º da LAP, ou ainda no caso do art. 942, II, CPC.
Estaremos diante da segunda hipótese quando se cuidar de ação anulatória proposta contra todos os contratantes. Não se pode ser contra apenas um deles, pois a natureza da relação jurídica requer que possuam a mesma decisão. Outro exemplo, por força da lei, é o previsto no art. 10, §2º, CPC
."
(RODRIGUES, Marcelo Abelha.
Elementos de direito processual civil.
vol. 1. 2. ed. São Paulo: RT, 2000, p. 296)
O litisconsórcio pode ser necessário ou facultativo, no que toca à obrigatoriedade da sua formação. Também pode ser unitário ou simples, quanto à solução a ser dispensada às partes. O litisconsórcio é facultativo quando determinadas pessoas aquiescem em litigar juntas contra um mesmo demandado; ou quando o autor endereça, a um só tempo, pretensões contra várias pessoas, desde sejam todas legítimas a figurar na causa (art. 17, CPC/15). A respeito do litisconsórcio necessário, atente-se para o seguinte:
"
A obrigatoriedade da formação do litisconsórcio pode ser dada pela lei ou pela relação jurídica. São exemplos de litisconsórcio necessário por disposição de lei: a) CPC 246 §3º, que manda citar os confinantes nas ações de usucapião de imóvel; b) LAP 6º, que manda citar o funcionário que autorizou a prática do ato impugnado, bem como a pessoa jurídica de direito público ou privado a que ele pertence
; c) CPC, art. 76 §1º II, que manda citar ambos os cônjuges em ação na qual se discutam fatos que digam respeito a ambos os cônjuges ou atos praticados por eles (v.g., fiança - CC 1647 III) São exemplos de litisconsórcio necessário por força da relação jurídica: a) todos os partícipes de um contrato, para a ação anulatória do mesmo contrato, porque a sentença que decidir a lide não poderá anular o contrato para um dos contratantes e declará-lo válido para os demais que eventualmente não estivessem no processo como partes. Não sendo obrigatória a formação do litisconsórcio, este se caracteriza como facultativo, cujos casos mais comuns estão enumerados no CPC 113." (NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade.
Comentários ao código de
processo
civil.
1ª. ed. SP: RT, 2015)
2.14. ITR e cogitado litisconsórcio do município:
Em determinados casos, o imposto territorial rural é alvo de
lançamento pelos Municípios
, por força de convênios avençados com a União Federal, com força na
Emenda Constitucional 42/2003
, regulamentados pela Lei nº 11.250/2005.
No mais das vezes, não se opera aludido litisconsórcio eis que, conquanto o Município possa promover lançamento do ITR, conforme art. 1 da referida lei n. 11.250/2005,
isso se dá em nome da União
, de modo que apenas ela está legitimada a figurar como demandada nessa causa.
2.15. Cogitado litisconsórcio com outros contribuintes:
No caso, ao que consta o lançamento de revisão, impugnado na peça inicial, foi promovido apenas em desfavor do demandante. Assim, seu debate em juízo não tem aptidão para atingir terceiros, para os fins dos arts. 114, 115 e 506, CPC/15.
Não há indicativos de que eventual acolhimento da pretensão deduzida na inicial, em sentença transitada em julgado, venha a atingir diretamente terceiros, para fins de aplicação do art. 506, Código de Processo Civil/15. Ressalvo eventual novo exame do tema, caso a tanto instado, conforme lógica do art. 485, §3, Código de Processo Civil.
2.16.
Possibilidade
jurídica do pedido:
A respeito da impossibilidade jurídica, convém atentar para a lição de Marcelo Abelha Rodrigues:
"Presente no nosso ordenamento jurídico explicitamente no art. 295, III, e implicitamente quando este adotou o conceito abstrato de ação, a possibilidade jurídica do pedido diz respeito à previsão
in abstracto
daquilo que se pede, dentro do ordenamento jurídico.
A possibilidade jurídica do pedido é instituto processual, e significa que ninguém pode ajuizar uma ação sem que peça uma providência que esteja, em tese (abstratamente) prevista no ordenamento jurídico material (no direito alemão é usado o termo viabilidade, donde se abstrai o mesmo significado). Veja o exemplo: 'A' pede o despejo de 'B' por falta de pagamento
.
Basta ao juiz a análise superficial e ver se tal situação é prevista (despejo por falta de pagamento) no nosso ordenamento jurídico, sem adentrar contudo em considerações fático-jurídicas do problema. Veja que ele não vai dizer, naquele momento, se 'B' vai ser despejado, mas apenas se existe no nosso ordenamento jurídico a hipótese invocada.
Por isso mesmo é que esta condição é prejudicial das demais, ou seja, deve ser a primeira a ser analisada, à luz da logicidade e do princípio da economia processual.
Dizer que um pedido é juridicamente possível significa que o ordenamento não o proíbe expressamente
. Destarte, o vocábulo 'pedido', que faz parte da referida condição da ação, está disposto na sua acepção mais ampla, ou seja, não somente em seu sentido estrito de mérito, mas também conjugado com a causa de pedir.
Afinal, é lapidar a conceituação de Arruda Alvim: 'Verificação se o pedido é, abstrata ou idealmente, contemplado pelo ordenamento, senão vedado pelo mesmo.' Também é essencial a colocação feita por Nery, quando lembra que o termo 'pedido' (que integra a expressão 'possibilidade jurídica do...'), tem de ser entendido na sua acepção mais lata, ou seja, conjugado com a causa de pedir. Assim, embora o pedido de cobrança, estritamente considerado, seja admissível pela lei brasileira, não o será se tiver como causa petendi dívida de jogo (art. 1.477, caput, Código Civil)." (RODRIGUES, Marcelo Abelha.
Elementos de direito processual civil.
vol. 1. 2. ed. São Paulo: RT, 2000, p. 183-184)
Na espécie, a pretensão da requerente não esbarra na mencionada condição para válido exercício do direito de ação. Não há norma juridicamente válida que a impeça de deduzir em juízo a pretensão em juízo, de modo que aludida categoria foi atendida.
2.17. Interesse processual - considerações gerais:
Por conta do monopólio do uso válido da força - expressão de Max Weber -, exceção feita aos casos de legítima defesa, estado de necessidade, desforço incontinenti etc., as partes não podem resolver validamente seus conflitos mediante o emprego da força (art. 345, Código Penal). Logo, sempre que as controvérsias não sejam solucionadas com base no consenso, na prevalência do melhor argumento, os sujeitos devem deduzir suas pretensões perante o Estado, na espera de que haja aplicação isenta, racional e célere da lei (
law enforcement
).
Por imposição constitucional, o Poder Judiciário está obrigado a apreciar a alegação de que haja lesão ou ameaça de lesão a direito (art. 5º, XXXV, Constituição Federal/88), mecanismo indispensável para que haja
efetivo império da lei
, ao invés da prevalência dos poderes hegemônicos de ocasião. A prestação jurisdicional não se destina, todavia, a emitir meros pareceres ou cartas de intenções.
O ingresso em juízo deve estar fundado, tanto por isso, em uma situação de efetiva necessidade, de modo que a pretensão - caso venha a ser acolhida - se traduza em uma utilidade para o demandante. O meio processual eleito deve ser adequado para tanto. Daí que os processualistas tratem do interesse processual em uma
troika
:
a necessidade, a utilidade e a adequação do meio processual escolhido pela parte. Em acréscimo, o interesse processual deve persistir no curso da demanda, nos termos do art. 17 e art. 85, §10, CPC/15.
Ora,
"Mediante a força declaratória, a aspiração do autor consiste na
extirpação da incerteza
. Deseja tornar indiscutível, no presente e no futuro, graças à autoridade da coisa julgada, a existência ou a inexistência de relação jurídica, a autenticidade ou a falsidade de documento. É o que dispõe, fortemente inspirado no direito germânico e reproduzindo a regra anterior, o art. 19 do CPC/15. Também comporta declaração a exegese de cláusula contratual (Súmula do STJ, n.º 181), ou seja, o modo de ser de uma relação jurídica. Na ação declarativa, ignora-se outra eficácia relevante que a de coisa julgada material.
Neste sentido, a pretensão à declaração representa fonte autônoma de um bem valiosíssimo na vida social: a certeza
. O autor que só pleiteia declaração ao juiz, e obtém êxito, dar-se-á por satisfeito, e cabalmente, desde o curso em julgado da sentença. Então apropria-se do que pedira ao órgão judicial – certeza –, carecendo a regra jurídica emitida de qualquer atividade complementar em juízo. Focalizando o ponto com preciosa exatidão, diz-se que a sentença declaratória é instrumento autossuficiente de tutela jurisdicional, pois assegura, de maneira plena e completa, a efetividade da situação jurídica substancial deduzida em juízo."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro:
volume I. Parte geral: fundamentos e distribuição de conflitos. São Paulo: RT. 2015. p. 675).
Ainda segundo Araken de Assis,
"O provimento declaratório tem nítido caráter prescritivo. A parte adquire o direito incontestável de comportar-se em consonância ao comando sentencial, e, principalmente, não é dado àqueles que se vincularam à declaração impedi-la.
A finalidade da ação declaratória da inteligência e do alcance de cláusula contratual é a de prescrever aos parceiros do negócio, sucessivamente, determinada pauta de conduta, independentemente de execução alguma, de que não se cogita e de que não se pode cogitar
."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 676).
Acrescento
"que a certeza implicará a vinculação futura das partes. O provimento exibirá caráter prescritivo para o futuro.
O ato judicial legitima a prática (ou a abstenção) de atos jurídicos ao abrigo e em conformidade com o conteúdo da sentença
. Em geral, a antevisão desse problema provoca o nascimento do interesse. Por assim dizer, o provimento declarativo tem os pés no passado, mas olhar no futuro. É preciso aceitar com reservas, portanto, o julgado da 4.ª Turma do STJ, que assentou: Não é detentor de interesse processual justificador da pretensão declarativa quem não está exposto à possibilidade de dano imediato e concreto. Ora, imediato é o interesse, pois o dano, em sentido amplíssimo, pode ser futuro. Por exemplo, não cabe declarar a inteligência da cláusula contratual em tese; o autor necessitará expor a dificuldade na interpretação da cláusula, os reflexos que este ou aquele entendimento provocará no programa contratual."
(
Obra citada.
p. 661).
2.18. Interesse processual - caso em exame:
Diante da narrativa veiculada na peça inicial, é manifesto o interesse processual da requerente. Afinal de contas, a pretensão dela não seria satisfeita no âmbito extrajudicial, segundo se infere dos autos do processo administrativo. O prévio exaurimento do debate antes da deflagração da causa não é requisito para o ingresso em Juízo, não se aplicando ao caso o tema 350, STF, eis que a causa não versa sobre prestações previdenciárias. A legislação não obriga os sujeitos a buscarem algum caminho de composição ou alguma arbitragem, antes de ajuizarem o processo (art. 5, XXXV, Constituição).
Caso a pretensão dos requerentes venha a ser julgada procedente, a medida processual lhes será útil.
O procedimento eleito se revela adequado, como destaquei acima. Assim, o trinônimo necessidade, utilidade e adequação foi atendido nesse caso, na forma do art. 17, Código de Processo Civil/15
.
2.19. Aptidão da peça inicial:
A peça inicial foi apresentada de modo apto, tendo atendido aos ditames do art. 319 do Código de Processo Civil/15. Ela permitirá o exercício do contraditório, na forma do
art. 5, LIV e LV, Constituição, art. 7, parte final, CPC/15
. Foram apresentados documentos na forma do art. 320, CPC.
2.20. Valor atribuído à demanda e custas:
Como sabido, a toda causa deve ser atribuído algum valor econômico, por força do art. 291, CPC/2015 - projeção do art. 258, CPC/73 -, pois se cuida da base de cálculo da taxa judiciária. Referido valor pode influenciar, em muitos casos, a determinação da competência das unidades judiciais ou o procedimento aplicável, também surtindo reflexos sobre a definição de encargos sucumbenciais.
Trata-se, tanto por isso, de requisito para que a petição inicial seja válida - art. 319, CPC. Como explicita Araken de Assis,
"às vezes, na oportunidade da respectiva fixação (infra, 1.290), o conteúdo econômico real e imediato da pretensão mostra-se inestimável, ou seja, não pode ser quantificado precisamente. Tal circunstância não constitui motivo bastante para eliminar o ônus atribuído ao autor nos arts. 319, V, e 292, caput.
É apenas causa de estimação voluntária do autor, pois o art. 291 dispõe expressamente que a toda causa será atribuído valor certo. Nada obstante, a indicação aproximar-se-á, tanto quanto possível, do conteúdo econômico mediato da pretensão. Não há incompatibilidade daquelas regras com a do art. 85, § 8.º. aludindo a causas de valor inestimável
. Entende-se por tal as causas desprovidas de conteúdo econômico imediato, como é o caso da ação declaratória, e, por esse motivo, sujeitas à estimação do autor."
(ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo I: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 1695)
Convém atentar, tanto por isso, para o
art. 292, CPC/15
:
"O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: I - na ação de cobrança de dívida, a soma monetariamente corrigida do principal, dos juros de mora vencidos e de outras penalidades, se houver, até a data de propositura da ação; II - na ação que tiver por objeto a existência, a validade, o cumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor do ato ou o de sua parte controvertida; III - na ação de alimentos, a soma de 12 (doze) prestações mensais pedidas pelo autor; IV - na ação de divisão, de demarcação e de reivindicação, o valor de avaliação da área ou do bem objeto do pedido; V - na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido; VI - na ação em que há cumulação de pedidos, a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles; VII - na ação em que os pedidos são alternativos, o de maior valor; VIII - na ação em que houver pedido subsidiário, o valor do pedido principal. § 1º Quando se pedirem prestações vencidas e vincendas, considerar-se-á o valor de umas e outras. § 2º O valor das prestações vincendas será igual a uma prestação anual, se a obrigação for por tempo indeterminado ou por tempo superior a 1 (um) ano, e, se por tempo inferior, será igual à soma das prestações. § 3º O juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes."
Atente-se novamente para a análise de Araken de Assis:
"
É exemplificativa a enumeração dos acessórios. Os juros compensatórios, por exemplo, dificilmente se quadram na figura de penalidade. A correção monetária integra o valor originário do crédito e, nesse aspecto, sua menção no art. 292, corrige o direito anterior
. Ressalva feita aos juros moratórios e à correção monetária, verbas implicitamente incluídas no pedido respeitante ao principal (art. 322, § 1.º), e, nada obstante, integrantes do valor da causa, quaisquer outras verbas devem ser objeto de pedido. É o caso, expressis verbis, da cláusula penal moratória ou compensatória e dos juros compensatórios. Omisso que seja o pedido, a respeito da cláusula penal (v.g., o autor quer evitar a controvérsia em torno da interpretação do contrato), tampouco conta-se o respectivo valor. Por óbvio, deixando o autor de pedir os juros moratórios, explicitamente, dificilmente realizará seu cômputo no valor da causa, ensejando a intervenção do órgão judiciário. E os juros vencidos posteriormente ao ajuizamento, automaticamente incluídos na condenação (art. 323), não entram na estimativa da causa.
O custo financeiro do processo (despesas processuais e honorários advocatícios), suportado pelo réu no caso de êxito do autor, não precisa ser computado para apurar o valor da causa. Tais verbas têm caráter eventual e decorrem da lei.
Em face do caráter imperativo do art. 292, I, mostra-se irrelevante a estimativa lançada pelo autor na petição inicial em desacordo com a regra. Prevalecerá o valorda importância reclamada no pedido.
O art. 292, I, aplica-se, por analogia, à pretensão a executar fundada em título judicial ou extrajudicial (infra, 1.292.2.2). O valor da causa é o total do crédito: o principal corrigido, os juros e os demais consectários legais ou contratuais, conforme, aliás, dispõe o art. 6.º, § 4.º, da Lei 6.830/1980. Esse valor constará na planilha aludida no art. 798, I, b, e parágrafo único
.
Também se poderia cogitar do enquadramento da pretensão a executar no art. 292, II, por que pretensão visando ao cumprimento do negócio jurídico, eventualmente consubstanciado em documento dotado de força executiva. O resultado final é idêntico, mas o art. 292, I, avantaja-se ao inciso precedente em ponto decisivo, ao impor um critério simples, direto e analítico ao valor da causa." (ARAKEN, Assis.
Obra citada.
p. 1698 e ss.)
Ora, não se pode perder de vista que o valor atribuído à causa deve corresponder, tanto quanto possível, ao conteúdo econômico da pretensão deduzida na peça inicial, como bem equaciona o art. 292, §3º, CPC/15:
"O juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou
ao proveito econômico perseguido pelo autor
, caso em que se procederá ao recolhimento das custas correspondentes."
Quando em causa o pedido de reintegração na posse, o valor da demanda deve corresponde à precificação do imóvel. Note-se
"
A jurisprudência do Colendo STJ e deste Tribunal é pacífica no sentido de que em se tratando de ação de reintegração de posse o valor da causa deve corresponder ao valor do imóvel
."
(REsp 1230839/MG , Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/03/2013, DJe 26/03/2013; TRF2R-Quinta Turma Especializada, Rel. Des. Fed. GUILHERME DIEFENTHAELER, E-DJF2R 10/07/2013).
2.21. Valor da causa - situação em exame:
No valor, o valor da causa há de corresponder ao conteúdo econômico da pretensão da parte autora
. Importa dizer: o montante da redução do alegado crédito tributário, invocado pelo Fisco, em decorrência de eventual acolhimento da pretensão em causa. Reputo, por conta disso, que a autora atribui à demanda valor escorreito -
R$ 147.766,77
.
2.22.
Intimação mediante
consulta periódica
aos autos:
Por outro lado, desde que haja procurador(a) constituído nos autos, cabe-lhe acessar periodicamente o eproc, na forma do art. 5 da lei n. 11.419/2006, sob pena de que tal intimação seja tida como efetivada, por decurso de prazo.
Art. 5º As intimações serão feitas por meio eletrônico em portal próprio aos que se cadastrarem na forma do art. 2º desta Lei, dispensando-se a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico. § 1º Considerar-se-á realizada a intimação no dia em que o intimando efetivar a consulta eletrônica ao teor da intimação, certificando-se nos autos a sua realização. § 2º Na hipótese do § 1º deste artigo, nos casos em que a consulta se dê em dia não útil, a intimação será considerada como realizada no primeiro dia útil seguinte. § 3º
A consulta referida nos §§ 1º e 2º deste artigo deverá ser feita em até 10 (dez) dias corridos contados da data do envio da intimação, sob pena de considerar-se a intimação automaticamente realizada na data do término desse prazo
. § 4º Em caráter informativo, poderá ser efetivada remessa de correspondência eletrônica, comunicando o envio da intimação e a abertura automática do prazo processual nos termos do § 3º deste artigo, aos que manifestarem interesse por esse serviço. § 5º Nos casos urgentes em que a intimação feita na forma deste artigo possa causar prejuízo a quaisquer das partes ou nos casos em que for evidenciada qualquer tentativa de burla ao sistema, o ato processual deverá ser realizado por outro meio que atinja a sua finalidade, conforme determinado pelo juiz. § 6º As intimações feitas na forma deste artigo, inclusive da Fazenda Pública, serão consideradas pessoais para todos os efeitos legais.
Atente-se para os seguintes acórdãos:
AGRAVO INTERNO IN REVISÃO CRIMINAL. LEGITIMIDADE ATIVA. ADVOGADO. INSTRUMENTO DE PROCURAÇÃO. AUSÊNCIA. INTIMAÇÃO ELETRÔNICA. E-PROC. LEI Nº 11.419/16. JUNTADA. INTEMPESTIVIDADE. JUÍZO PERFUNCTÓRIO. INEXISTÊNCIA DE CONDIÇÕES EXIGIDAS. INADMISSIBILIDADE DA VIA REVISIONAL. 1. Embora a Revisão Criminal também possa ser requerida por advogado legalmente habilitado, nos termos do art. 553 do CPPM, este deve apresentar o instrumento de procuração assinada pelo condenado. 2.
A partir da implementação do processo eletrônico, a intimação para o cumprimento de atos dar-se-á por meio de publicação de eventos no sistema informatizado, cabendo ao advogado, nos termos da Lei nº 11.419/16, o acesso periódico para inteirar-se da movimentação do feito. Para tanto, a citada lei confere um prazo de graça, o qual, vencido, materializa a intimação e, por conseguinte, consigna a abertura de contagem do prazo para a prática de ato processual subsequente, sobretudo o eventual recurso
. 3. Da análise perfunctória da Inicial verifica-se a inexistência dos requisitos necessários e exigidos no art. 551 do CPPM para a admissão da via revisional. 4. Agravo Interno rejeitado. Decisão unânime. (STM - AGT: 70001154520197000000, Relator: MARCO ANTÔNIO DE FARIAS, Data de Julgamento: 25/04/2019, Data de Publicação: 13/05/2019)
AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA CUMULADA COM REPARAÇÃO DE DANOS. PROTESTO. CANCELAMENTO. DANO MORAL. SÚMULA 385/STJ. RECURSO ESPECIAL. INTEMPESTIVIDADE. 1.
Conforme o § 3º do artigo 5º da Lei n. 11.419/2006, "a consulta referida nos §§ 1º e 2º deste artigo deverá ser feita em até 10 (dez) dias corridos contados", portanto, conforme consignado no Tribunal de origem, intempestivo o recurso
. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 2025050 MG 2021/0362748-6, Data de Julgamento: 12/09/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/09/2022)
Ademais,
"Segundo a norma, portanto, caberá aos atores processuais cadastrados a realização de consultas periódicas de acompanhamento, em até
10 (dez) dias
, aos portais de acesso às ações eletrônicas como é o caso do Sistema Eproc, sob pena de se considerar perfectibilizada a intimação."
(TRF-4 - AC: 50019035420204047107, Relator: RODRIGO BECKER PINTO, 23/09/2022, SEGUNDA TURMA)
Convém ter em conta, de toda sorte, as regras ditadas pelo CNJ -
resolução nº 569, de 13 de agosto de 2024, responsável pela alteração da Resolução CNJ nº 455/2022
, conquanto parecem destoar, em alguns tópicos, do que preconiza a lei em sentido estrito (lei 11.419/2006).
2.23. Prescrição da pretensão à impugnação do lançamento:
Como explicita Nelson Nery Jr.,
"
O prazo previsto expressamente em lei para o exercício das pretensões que se ajuízam mediante ação constitutiva, positiva ou negativa, é de decadência, pois a pretensão constitutiva se caracteriza como direito potestativo
. As pretensões que se exercem mediante ação declaratória são perpétuas (imprescritíveis). Isto significa que podem ser ajuizadas mesmo se já estiver prescrita a pretensão condenatória do direito cuja existência ou inexistência se quer ver declarada."
(NERY JR.
Novo Código Civil anotado.
SP: RT, 2002).
Convém atentar, ademais, para a lição de José Hable:
"
O termo prescrição advém do vocábulo latino praescriptio e é na história do direito romano que se pode esclarecer o conceito etimológico de sua expressão jurídica, como descrito por Câmara Leal, e que, por ' por uma evolução conceitual, passou o termo a significar, extensivamente, a matéria contida na parte preliminar da fórmula, e daí sua acepção de extinção da ação pela expiração do prazo de sua duração
.'
Segundo o mesmo autor, prescrição é a extinção de uma ação ajuizável, em virtude da inércia de seu titular durante um certo lapso de tempo, na ausência de causas preclusivas do seu curso. .
Sob a nova tese disciplinada no art. 189, Código Civil de 2002, Pablo Siolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho conceituam a prescrição como sendo a perda da pretensão de reparação do direito violado, em virtude da inércia do seu titular, no prazo previsto em lei.
Já sob a ótica tributária, nos temos do que disciplina o Código Tributário Nacional, de 1966, em seu art. 174, Zelmo Denari define prescrição como sendo a extinção da ação que protege o direto subjetivo de crédito, pela inércia continuada do ente público, que deixa de exercitá-la no prazo legal
.
O objeto da prescrição, nas palavras de Eurico Marcos Diniz Santi, é a relação jurídica linear que se estabelece entre o Fisco e o Estado-Juiz, ou seja, a prescrição extingue o direito de ação que se estabelece entre o sujeito-credot e o Estado-juiz." (HABLE, José.
A extinção do crédito tributário por decurso de prazo: Decadência e prescrição tributárias.
4. ed. São Paulo: Método, 2014, p. 116-117)
Ora, é sabido que a prescrição da pretensão do contribuinte à restituição de indébito está regulada pelo art. 168, CTN, cujo conteúdo segue:
"O direito de pleitear a
restituição
extingue-se com o decurso do prazo de
5 (cinco) anos
, contados: I - nas hipótese dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário; II -
na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória
."
Segue o
art. 165, CTN
, que complementa aquele preceito:
"O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos: I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; II - erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento; III - reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória."
Ao que releva, o adimplemento pelo contribuinte é uma das modalidades pelas quais o crédito tributário é extinto (art. 156, I, CTN/66). Por conseguinte, a leitura conjunta desses dispositivos enseja a conclusão de que o contribuinte possui o prazo de 05 anos, contados da data do alegado pagamento indevido (ou maior que o devido), para que postular em juízo a sua restituição.
Vigorou durante muito tempo, porém, a tese de que aludido prazo, quanto aos tributos submetidos ao lançamento por homologação (art. 150, CTN), deveria ser computado a partir do término dos 05 anos, previstos em lei para que a Fazenda Pública promovesse eventual lançamento de revisão. A lei complementar 118, de de 9 de fevereiro de 2005, buscou alterar referido entendimento, de modo a reduzir o prazo para 05 anos, mesmo no âmbito dos tributos submetidos ao pagamento sem prévia liquidação estatal do
quantum debeatur.
Não se tratou de lei interpretativa, mas sim de evidente texto elaborado com pretensões retroativas, incompatível com o postulado da segurança jurídica (art. 5, XXXVI, CF).
Daí que, como sabido, ao apreciar o
RE n. 566.621/RS
, a Suprema Corte tenha limitado a aplicação desse prazo de 05 anos às demandas deflagradas depois de vencido o período de
vacatio
dessa
lei complementar 118
. A
vacatio
daquela lei complementar esgotou-se em 08 de junho de 2005 (conforme art. 4º, LC 118). Por conseguinte, as demandas iniciadas na data de 09 de junho de 2005 e no período subsequente já estão submetidas ao prazo prescricional quinquenal, mesmo que se cuide da pretensão à restituição de tributos submetidos ao lançamento por homologação.
TRIBUTÁRIO. CONSTITUCIONAL. COFINS. REVOGAÇÃO DE ISENÇÃO OUTORGADA ÀS SOCIEDADES CIVIS PRESTADORAS DE SERVIÇOS PROFISSIONAIS. LC N.º 70/91. LEI N.º 9.430/96. PARECER NORMATIVO COSIT N.º 03/94. prescrição. LC N.º 118/05. 1. Segundo orientação do e. STJ e também desta Corte, tratando-se de ação ajuizada após o término da vacatio legis da LC n.º 118/05, objetivando a restituição ou compensação de tributos sujeitos a lançamento por homologação recolhidos indevidamente, o prazo prescricional é de cinco anos a contar da data do pagamento antecipado do tributo (art. 150, § 1º e 168, inciso I, ambos do CTN, c/c art. 3º da LC n.º 118/05). 2. Inexiste interesse de agir relativamente aos valores pagos indevidamente a título de COFINS por força da restrição imposta pelo Parecer Normativo COSIT n.º 03/94 em período anterior ao da vigência da lei n.º 9.430/96, porquanto, de acordo com seus atos constitutivos, a empresa somente começou as suas atividade em ago/98. 3. lei ordinária pode revogar isenção concedida por lei complementar, visto que dita matéria não se inclui dentre aquelas reservadas à competência da lei complementar. 4. É legítima a revogação operada pelo art. 56 da lei n.º 9.430/96 da isenção da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS, prevista no art. 6º, inciso II, da lei Complementar n.º 70/91, relativamente às sociedades civis prestadoras de serviços profissionais de profissão regulamentada. 5. Sentença parcialmente reformada. (AMS 200571000298064, MARIA HELENA RAU DE SOUZA, TRF4 - SEGUNDA TURMA, D.E. 18/04/2007.)
Deve-se ter em conta, todavia, que a prescrição apenas atinge a pretensão à restituição de valores recolhidos antes de 05 anos da data do ingresso em juízo (art. 240, CPC/15 c/ art. 206, CC/02). Sempre que a relação tributária implicar a obrigação de recolhimento, pelo contribuinte, de valores de modo periódico, será aplicada a lógica da súmula 85, STJ, ao preconizar que
"
Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação
.
"
2.24.
Diferença entre suspensão
e
interrupção da prescrição:
Quanto à distinção entre suspensão e interrupção da prescrição, reporto-me à lição de Elody Nassar:
"
Chama-se suspensão a circunstância especial, em vista da qual a lei paralisa a fluência do prazo prescricional. As causas suspensivas da prescrição são as que, temporariamente, paralisam o seu curso; superado o fato suspensivo, a prescrição continua a correr, computado o tempo decorrido antes dele
.
Denomina-se interrupção a ocorrência de um fato hábil a destruir o efeito do tempo já decorrido, com a anulação da prescrição já iniciada. As causas interruptivas da prescrição são as que inutilizam a prescrição iniciada, de modo que o seu prazo recomeça a correr da data do fato que a interrompeu ou do último ato do processo que a interromper (CC, art. 202, parágrafo único)." (NASSAR, Elody.
Obra citada.
p. 156-157)
Dado que o instituto tem por fundamento que o Direito não tutela quem permanece inerente na defesa dos seus interesses (
Dormientibus non sucurrit jus
), a prescrição apenas pode ser oposta a quem podia efetivamente agir. E isso pressupõe, por certo, que o atingido tenha conhecimento da agressão às suas pretensões, na forma do art. 189, Código Civil.
Em regra, no curso do processo administrativo o cômputo da prescrição resta suspenso, por força do art. 4º do decreto 20.910/32:
"Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la."
O cômputo da prescrição também resta suspenso nas hipóteses do art. 200, Código Civil/2002:
"Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva."
2.25. Eventual prescrição - situação em exame:
Como registrei acima, a prescrição da pretensão à impugnação de lançamento tributário opera-se com o esgotamento do prazo de 5 anos, contados da data da notificação do contribuinte, conforme lógica do art. 168, CTN.
Aludidas normas afastam, por sua especialidade, a aplicação do art. 206, §3º, IV, Código Civil/2002
, conforme lógica do art. 2º do decreto-lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Atente-se para o julgado abaixo transcrito:
"ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PRESCRIÇÃO. SÚMULAS 150 E 383 DO STF. I.
É firme na jurisprudência a orientação no sentido de que a prescrição da ação de conhecimento e a da execução são distintas, exceto no tocante ao período de cinco anos. Assim, a partir do trânsito em julgado da sentença oriunda da ação coletiva, iniciou-se novo prazo quinquenal para a execução, e não o reinício do prazo anterior (único) pela metade. Nesse sentido, o enunciado da Súmula 150 do STF: "Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação". II. A Súmula n.º 383 do STF estabelece que "A prescrição em favor da Fazenda Pública recomeça a correr, por dois anos e meio, a partir do ato interruptivo, mas não fica reduzida aquém de cinco anos, embora o titular do direito a interrompa durante a primeira metade do prazo
". III. O trânsito em julgado parcial da ação coletiva em comento se deu em 26/08/2009, e a parte exequente ajuizou Medida Cautelar de Protesto em 31/07/2014. Assim, como o ajuizamento do cumprimento de sentença ocorreu em 30/01/2017, antes dos dois anos e meio da data do protesto, não há prescrição. Com relação ao primeiro protesto, como bem referido pelo juízo a quo, não teve eficácia, visto que foi ajuizado antes do início da fluência do prazo prescricional." (TRF-4 - AG: 50184291420194040000 5018429-14.2019.4.04.0000, Relator: VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Data de Julgamento: 03/07/2019, QUARTA TURMA)
Reitero que, no curso do processo administrativo tributário, o cômputo da prescrição permanece suspenso -
art. 4. do decreto 20.910/32
. A parte autora postulou o cancelamento do lançamento do ITR e não se esgotaram mais de 5 anos, contados do esgotamento do processo administrativo, definido no
art. 42 do decreto 70.235, de 6 de março de 1972
.
A pretensão não foi atingida pela prescrição.
2.26. Eventual decadência:
O instituto da decadência é aplicável quando em causa cogitados direitos potestativos (direitos formativos geradores, na expressão de Pontes de Miranda)
. Ou seja, direitos que podem ser exercidos sem prévia aquiescência da contraparte, a exemplo do direito do Fisco promover o lançamento fiscal de revisão (art. 150, §4, CTN), direito à anulação de casamento, direito à demissão de empregados sem justa causa, direito à desistência de compra promovida pela internet etc. Em todos esses casos, sempre que a legislação houver fixado prazo para seu exercício, tratar-se-á de lapso decadencial.
No caso em exame, conquanto o exercício do direito de ação seja potestativo, o direito invocado na peça inicial - anulação ou revisão do lançamento - não está submetido a prazos decadenciais.
Algo distinto ocorre com eventual prazo para que o Fisco promova o lançamento de revisão, diante do lapso imposto pelo art. 155, §4, CTN/66
.
Assim, o instituto da decadência não se aplica ao caso, no que toca ao direito invocado pelo autor na peça inicial. Destaco que esse exame não se confunde com a apreciação de eventual decadência do direito do Fisco de contribuir o crédito, mediante lançamento tributário, questão que apreio adiante.
2.27.
Imposto territorial rural - considerações precárias:
COM COGNIÇÃO NÃO EXAUSTIVA
, registro que Constituição Republicana dispõe, no seu art. 153, VI, que compete à União instituir impostos sobre a propriedade territorial rural. A respeito desse tributo, colhe-se a lição de Ricardo Lobo Torres:
"A CF não fornece a definição do fato gerador, porém, o suporte fático do tributo pode ser encontrado no art. 1º da lei 9393/1996, que assim determina: 'O imposto sobre a propriedade territorial rural - ITR, de apuração anual, tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, localizado fora da zona urbana do município, em 1º de janeiro de cada ano.
Por propriedade há que se entender não só o que é tecnicamente, nos termos do Código Civil, ou seja, o domínio suscetível de transcrição no registro de imóveis, mas também a posse. A tradição constitucional brasileira firmou-se nesse sentido, pelo entendimento da doutrina e jurisprudência, justificando-se, ademais, pela própria estrutura da propriedade da terra no Brasil, que se reduz constantemente à mera posse de áreas devolutas e ainda não discriminadas. O Código Tributário Nacional e a lei 9393/1996 confirmam essa interpretação.
Sendo apenas territorial, o imposto incidirá sobre a terra, excluídas as benfeitorias, os prédios e a renda produzida por sua exploração. (O IPTU, da competência municipal, é que incide sobre os prédios, desde que situados na área urbana; sobre a renda produzida incide o IR federal). O fato gerador do ITR se restringe, portanto, ao imóvel por natureza, inclusive as florestas, e não abrange os imóveis por acessão como definidos no Código Civil (prédios e benfeitorias).
É necessário, ainda, que a propriedade seja rural para que fique no campo de incidência do imposto. À lei complementar incumbe definir o conceito de propriedade rural. Mas inexiste liberdade total para o legislador, pois a CEF já coloca alguns limites, especialmente pela relação de complementariedade entre o ITR e o IPTU
.
Assim é que se frustrou a tentativa de se estremar o rural do urbano com base na finalidade agrícola ou na destinação do imóvel à industrialização primária de bens agrícolas ou pecuários. Razão tinha Pontes de Miranda ao anotar que o conceito constitucional já traz em si a determinação de que o tributo incide sobre o que está fora do perímetro da cidade.
O código tributário nacional voltou ao critério geográfico, atribuindo aos municípios a competência para fixar a respectiva zona urbana, mas estabelecendo-lhes alguns parâmetros (art. 32, §1º). Posteriormente, a lei 5688/1972 pretendeu modificar o conceito geográfico do CTN, retomando o critério da destinação, mas o STF deu pela inconstitucionalidade do dispositivo, sob o argumento de que a lei ordinária não pode modificar o CTN, que é lei complementar, confirmando o ponto de vista da doutrina." (TORRES, Ricardo Lobo.
Tratado de direito constitucional, financeiro e tributário.
Volume IV. Os tributos na Constituição. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 201-202)
Ademais,
"
O ITR é imposto, de competência da União, que tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, como definido na lei civil, localizado fora da zona urbana do Município
( CTN, art. 29). O ITR incide também sobre propriedade rural declarada de utilidade ou necessidade pública, inclusive para fins de reforma agrária, até a data da perda da posse pela imissão prévia do Poder Público na posse ou até a data da perda da propriedade pela transferência ou incorporação do imóvel ao patrimônio do Poder Público; além disso, a desapropriação não exclui a incidência do ITR sobre o imóvel expropriado (L 9393/96 art. 1.º e D 4382/02 art. 2.º). A definição de imóvel rural levada em consideração para o cálculo do imposto não é a do ET 4.º, mas sim a dada pelo L 9393/96 art. 1.º e pelo D 4382/02 art. 9.º (v. coment. a seguir). Base de cálculo. O valor fundiário ( CTN, art. 30). Para sua determinação, considera-se imóvel rural a área contínua, formada de uma ou mais parcelas de terras, localizada na zona rural do Município, ainda que, em relação a alguma parte do imóvel, o sujeito passivo detenha apenas a posse; área contínua, por sua vez, é a área total do prédio rústico, mesmo que fisicamente dividida por ruas, estradas, rodovias, ferrovias, canais ou cursos de água (L 9393/96 art. 1.º § 2.º e D 4382/02 art. 9.º). Caso o imóvel pertença a mais de um Município, deverá ser enquadrado no Município em que fique a sede do imóvel, ou, se esta não existir, será enquadrado no Município onde se localize a maior parte do imóvel (L 9393/96 1.º § 3.º)."
(JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa.
Leis Civis Comentadas e Anotadas.
São Paulo: RT. 2019)
Acrescente-se que
"São isentos de ITR os compradores e promitentes compra- dores de parcelas resultantes de colonização oficial ou particular, por cinco anos, a contar da data da compra ou do compromisso ( ET 66); também ficam isentas de ITR as áreas de preservação permanente em que existam florestas formadas ou em formação, bem como as áreas reflorestadas com essências nativas (L 5868/72 5.o; v. D 4382/02 11). A isenção também se aplica caso o imóvel, compreendido em programa oficial de reforma agrá- ria, caracterizado como assentamento, possua os seguintes requisitos: (i) seja explorado por associação ou cooperativa de produção; (ii) a fração ideal por família assentada não ultrapasse os limites da pequena gleba rural (v. coments. ET 48 VI); (iii) o assentado não possua outro imóvel (L 9393/96 3.o I e D 4382/02 4.o I). Também é isento o conjunto de imóveis rurais de um mesmo proprietário, cuja área total em cada região observe o limite da pequena gleba rural, desde que: (i) o explore só ou com sua família, admitida eventual ajuda de terceiros; e (ii) não possua imóvel urbano (L 9393/96 3.o II e D 4382/02 4.0 II). Por fim, também são isentos de ITR os imóveis rurais oficialmente reconhecidos como áreas ocupadas por remanescentes de quilombos que estejam sob ocupação direta e sejam explorados, individual ou coletivamente, pelos membros dessas comunidades (L 9393/96 3.0-A, acrescido pela L 13043/14)."
(JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa.
Obra citada.
2019)
A Lei Maior preconiza, além do mais, o caráter progressivo das alíquotas, de modo a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas (art. 153, §4º, CF com a redação veiculada pela EC 42/2003). O CTN/66 trata desse tributo nos arts. 29 a 31, estabelecendo que a base de cálculo seria o valor fundiário do imóvel.
Por seu turno, a lei 8847/1994 estipulava, no seu art. 5º, um método de apuração do ITR, relacionado ao percentual de utilização efetiva da área aproveitável economicamente do imóvel. As alíquotas situavam-se, então, entre 0,02 a 4,5%, como regra. Já a lei 9393/1996 majorou essas frações, passando a exigir tributos na ordem de 0,03% a 20% (aplicados sobre o valor da terra nua tributável, na forma do art. 10, III, da mencionada lei 9393).
A propriedade de pequenas glebas rurais é imune ao referido tributo (art. 153, §4º, CF/88)
. De outro tanto, a tributação em causa competia, inicialmente, ao INCRA (até a publicação da lei n. 8022/1990), ocasião em que tal incumbência foi transferida em favor da Receita Federal (art. 1º).
No caso de falta de entrega do
Documento de Informação e Atualização Cadastral do ITR
(DIAC) ou do
Documento de Informação e Apuração do ITR
(DIAT), bem como nas hipóteses de sub-avaliação ou prestação de informações inexatas, incorretas ou fraudulentas, a Receita Federal deve promover a aferição e o lançamento de ofício do imposto, considerando informações sobre o preço das terras, constante de sistema a ser por ela instituído, e os dados de área total, área tributável e grau de utilização do imóvel, apurados em procedimentos de fiscalização (
art. 14, Lei 9.393/1996
).
2.28. Responsabilidade pelas informações prestadas:
Com exame não exaustivo, anoto que a responsabilidade pelas informações prestadas fica a cargo do contribuinte que passa a ter o ônus de comprová-las, bem como as ulteriores modificações, caso a declaração não seja homologada de plano. Caso não o faça, em princípio é cabível o lançamento de ofício por parte da Receita, órgão que deve examinar os documentos ao seu alcance, conforme disposto no art. 150, §4º, CTN.
MANDADO DE SEGURANÇA. AUTO DE INFRAÇÃO. ITR. § 1º do art. 14 da lei nº 9.393/96. 1. No presente caso, a impetrante prestou a declaração de imposto territorial rural (DIRT), a qual não foi homologada pela impetrada, tendo a SRF observado o critério disposto no § 1º do art. 14 da lei nº 9.393/96.
Esta Lei, em especial o art. 14, atribui à SRF a possibilidade de realização do lançamento de oficio, o qual será apurado em 'procedimento de fiscalização'. Com efeito, em momento algum a lei menciona que esta fiscalização deve ocorrer in loco
. 2. Hipótese, ainda, em que o Impetrante deixou de apresentar os documentos exigidos pela fiscalização a fim de avaliar a veracidade das declarações de ITR 2001 (ano-base 2000), sendo mesmo apurado que alguns documentos encaminhados revelaram que a DITR continha informações incorretas. 3. Sendo o auto de infração lavrado com base na Lei nº 9.393/96, não há falar em aplicação retroativa do Decreto nº 4.383/02 nem da Portaria nº447/2002. 4. O Sistema de Preços de Terra é feito com base em parâmetros legais para verificação e mensuração dos valores da terra para fins de calculo de ITR. O SIPT é composto de informações prestadas pelas Secretarias de Agricultura, conforme critérios estabelecidos na legislação de regência, não havendo qualquer alteração unilateral por parte da SRF, que utiliza critérios legais. 5. Apelo desprovido. (AMS 200638030026589, JUIZ FEDERAL SAULO JOSÉ CASALI BAHIA, TRF1 - 7ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 DATA:01/06/2012 PAGINA:593.)
Sustenta-se, não raro, que, mesmo em tais casos, seria indispensável que o Fisco promovesse o exame de elementos de convicção à sua disposição, por força do art. 14 da aludida lei 9.393, de 19 de dezembro de 1996:
Art. 14.
No caso de falta de entrega do DIAC ou do DIAT, bem como de subavaliação ou prestação de informações inexatas, incorretas ou fraudulentas, a Secretaria da Receita Federal procederá à determinação e ao lançamento de ofício do imposto, considerando informações sobrepreços de terras, constantes de sistema a ser por ela instituído, e os dados de área total, área tributável e grau de utilização do imóvel, apurados em procedimentos de fiscalização
.
§ 1º As informações sobre preços de terra observarão os critérios estabelecidos no art. 12,§ 1º, inciso II da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, e considerarão levantamentos realizados pelas Secretarias de Agricultura das Unidades Federadas ou dos Municípios.
§ 2º As multas cobradas em virtude do disposto neste artigo serão aquelas aplicáveis aos demais tributos federais.
Ao que releva, transcrevo também o art. 47 a 51 do Decreto 4382/2002:
"Art. 47. A DITR está sujeita a revisão pela Secretaria da Receita Federal, que, se for o caso, pode exigir do sujeito passivo a apresentação dos comprovantes necessários à verificação da autenticidade das informações prestadas. § 1
º
A revisão é feita com elementos de que dispuser a Secretaria da Receita Federal, esclarecimentos verbais ou escritos solicitados ao contribuinte ou por outros meios previstos na legislação. § 2
º
O contribuinte que deixar de atender ao pedido de esclarecimentos ficará sujeito ao lançamento de ofício de que tratam os arts. 50 e 51 (Lei n
º
5.172, de 1966, art. 149, inciso III)."
Segundo o art. 50 daquele mesmo diploma normativo,
"
Caso o sujeito passivo deixe de tomar as iniciativas necessárias ao lançamento por homologação pela Fazenda Pública, esta deve proceder à determinação e ao lançamento de ofício do crédito tributário
(Lei n
º
5.172, de 1966, art. 149, inciso V; Lei n
º
9.393, de 1996, art. 14)."
Por fim, segundo o art. 51
, "O lançamento será efetuado de ofício quando o sujeito passivo: I - não apresentar a DITR; II - deixar de atender aos pedidos de esclarecimentos que lhe forem dirigidos, recusar-se a prestá-los ou não os prestar satisfatoriamente no tempo aprazado; III - apresentar declaração inexata, considerando-se como tal a que contiver ou omitir qualquer elemento que implique redução do imposto a pagar; IV - não efetuar ou efetuar com inexatidão o pagamento do imposto devido; V - estiver sujeito, por ação ou omissão, à aplicação de penalidade pecuniária. Parágrafo único. O crédito tributário também deve ser lançado de ofício nos casos em que o sujeito passivo tenha informado o enquadramento em hipóteses de imunidade, isenção ou redução do imposto, mas não tenha cumprido ou tenha deixado de cumprir, na data de ocorrência do fato gerador, os requisitos necessários."
2.29. Devido processo legal - considerações precárias:
A garantia do devido processo legal - assegurada pelo art. 5, LIV e LV, da Constituição/1988 - preconiza que ninguém pode ser privado de algum bem ou direito sem que lhe seja facultada a defesa efetiva. Essa garantia compreende duas perspectivas, tanto a material quanto a procedimental, como explicita Romeu Felipe Bacellar Filho: "
A teoria do devido processo legal, construída na jurisprudência da Suprema Corte dos Estados Unidos, compreende duas perspectivas:
substantive
e
procedural due process.
A primeira é projeção do princípio no campo do direito material, enquanto a segunda funciona como garantia na esfera processual. O espectro da proteção é o trinômio vida, liberdade, propriedade."
(BACELLAR FILHO, Romeu Felipe.
Processo administrativo disciplinar.
SP: Max Limonad. p. 223).
Desse modo,
"Quanto ao
procedural du process,
os dois interesses centrais podem ser identificados no caso Marschall versus Jerrico, inc. 446 US 238 (1980): o governo não deve privar uma pessoa de um interesse importante a menos que a correta compreensão dos fatos e a lei permita; mesmo se o governo puder legalmente privar alguém de um interesse importante, o indivíduo tem o direito de ser ouvido perante uma Corte neutra antes da privação. Enquanto a primeira regra prende-se à realidade da Justiça
('actuality of justice'),
a segunda envolve a aparência de justiça
('appearance of justice')" (
Obra citada.
p. 224).
Semelhante é a opinião de Joaquim Canotilho, quando argumenta
"
Processo devido em direito significa a obrigatoriedade da observância de um tipo de processo legalmente previsto antes de alguém ser privado da vida, da liberdade e da propriedade. Nestes termos, o processo devido é o processo previsto na lei para a aplicação de penas privativas da vida, da liberdade e da propriedade. Dito por outras palavras: due process equivalente ao processo justo definido por lei para se dizer o direito no momento jurisdicional de aplicação de sanções criminais particularmente graves
(...) o
due process of law
pressupõe que o processo legalmente previsto para a aplicação de penas seja ele próprio um processo devido, obedecendo aos trâmites procedimentais formalmente estabelecidos na Constituição ou plasmados em regras regimentais das assembléias legislativas."
(CANOTILHO, José Joaquim Gomes.
Direito constitucional e teoria da Constituição.
7. ed. Almedina. p. 493)
Tanto por isso, o Estado deve assegurar ao administrado o exercício efetivo da ampla defesa e do contraditório. Deve comunicar-lhe, ademais, as decisões administrativas ou judiciais, de modo a documentar a sua efetiva ciência. É o que se infere, por sinal, do Decreto 70.235 (art. 10, V c/ art. 23), e também lei 9784/1999
(arts. 26-28).
2.30. Notificações e eventual aplicação da teoria aparência:
Os Tribunais têm reputado válida a notificação por meio de missiva, com aviso de recebimento, mesmo quando não recebida diretamente pelo contribuinte (teoria da aparência):
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO. DECADÊNCIA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. 1. O art. 173, I, do CTN estabelece que o direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 anos contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. 2. O art. 23, II, do Decreto-Lei nº 70.235/72 não exige que o aviso de recebimento seja assinado pelo próprio devedor, mas sim que seja encaminhado para o domicílio tributário eleito pelo sujeito passivo. 3. Consoante disposto no caput do art. 174 do CTN, 'a ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco) anos, contados da data da sua constituição definitiva.' 4. Decorridos mais de cinco anos após a suspensão da execução fiscal, sem qualquer manifestação do credor, ocorre a prescrição intercorrente. 5. O artigo 40 da Lei 6.830/80 deve ser interpretado em harmonia com o sistema jurídico, que não admite que a ação para a cobrança do crédito tributário tenha prazo perpétuo. Logo, não localizado o devedor e havendo inércia do Fisco por período superior a cinco anos, é de ser declarada a prescrição intercorrente. 6. Apelação improvida. (TRF4, AC 5004419-44.2011.404.7113, Primeira Turma, Relator p/ Acórdão Joel Ilan Paciornik, juntado aos autos em 10/04/2014)
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CÓPIA DA CDA NÃO ACOSTADA AOS AUTOS DOS EMBARGOS À EXECUÇÃO FUSCAL. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME DA VALIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. NOTIFICAÇÃO DO LANÇAMENTO POR MEIO POSTAL. VALIDADE. TAXA SELIC. APLICABILIDADE. MATÉRIA NÃO VENTILADA EM PRIMEIRA INST NCIA. INADMISSIBILIDADE. 1. Não acostada cópia das CDAs pela embargante, ônus processual que lhe competia, resta inviabilizado o exame quanto à alegação de nulidade do título executivo por suposta ausência de seus requisitos legais. 2. É válida a notificação postal encaminhada ao domicílio tributário do contribuinte, ainda que recebida por terceiro. 3. Transcorridos menos de cinco anos entre o lançamento suplementar que constituiu o crédito tributário e o ajuizamento da respectiva ação de execução, afasta-se a alegação de prescrição. 4. É legítima a correção monetária do débito e cobrança de juros pela Taxa SELIC. 5. É defeso à parte inovar em sede de apelação, formulando pedido a respeito de matéria não ventilada em primeira instância. (TRF4, AC 5000722-35.2013.404.7116, Segunda Turma, Relator p/ Acórdão Rômulo Pizzolatti, juntado aos autos em 08/04/2014)
Por sinal, o Código de Processo Civil/15 preconizou, no art. 248, §4, que
"Nos condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso, será válida a entrega do mandado a funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência, que, entretanto, poderá recusar o recebimento, se declarar, por escrito, sob as penas da lei, que o destinatário da correspondência está ausente."
Tem-se sustentado, ademais, que os contribuintes estariam obrigados a manterem atualizados seus dados cadastrais junto ao Fisco. Segundo os Tribunais, seria válida a remessa de missivas para o endereço indicado pelo próprio contribuinte junto ao Erário, não sendo exigível da Fazenda Pública uma prévia diligência para aferir se tais dados ainda seriam adequados
.
2.31. Eventual ausência de prestação de serviço postal:
A prestação de serviço público de entrega domiciliar de correspondências é atribuição da ECT - Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, conforme art. 21, X da Constituição Federal e o art. 2º da Lei 6.538/78. Note-se ainda que a Portaria nº 2.729, de 28 de maio de 2021, do Ministério das Comunicações, por sua vez, prevê o seguinte:
Art. 11. O serviço de distribuição postal básico será prestado das seguintes formas: I - em domicílio, quando a entrega do objeto postal ocorrer no endereço indicado pelo remetente; II - em Caixa Postal Comunitária, quando o objeto postal for depositado em um dos receptáculos do Módulo de Caixas Postais Comunitárias - MCPC; ou III - por outra forma de entrega externa que venha a ser implantada pela ECT; e IV - por retirada dos objetos, pelo destinatário ou preposto, em unidade da ECT, própria ou terceirizada, fixa ou móvel.
Art. 12.
A ECT realizará a entrega em domicílio, sempre que atendidas as seguintes condições:
I - houver indicação correta do endereço para a entrega do objeto postal, com o correspondente Código de Endereçamento Postal - CEP; II - o distrito possuir quinhentos ou mais habitantes, conforme Censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE; III - as vias e os logradouros: a) oferecerem condições de acesso e de segurança ao empregado postal; b) dispuserem de placas identificadoras do logradouro, instaladas pelo órgão municipal ou distrital responsável; e IV - os imóveis: a) apresentarem numeração única, de forma ordenada e individualizada; e b) dispuserem de caixa receptora de correspondência, localizada na entrada, ou houver a presença de algum responsável pelo recebimento do objeto postal no endereço de entrega. §1º A entrega em domicílio, ainda que não atendida a condição prevista na alínea "b" do inciso IV deste artigo, poderá ser efetuada por outras formas, a critério da ECT. §2º Nos distritos com população igual ou superior a 500 habitantes e onde a distribuição domiciliar não estiver implantada em 31 de dezembro de 2020, a entrega dos objetos postais poderá ser realizada por meio de distribuição domiciliar, Caixas Postais Comunitárias ou pela retirada em unidade da ECT na localidade.
Art. 13.
O serviço de distribuição postal básico em Caixas Postais Comunitárias ocorrerá quando
: I - as condições previstas nos incisos I, III e IV do art. 12 desta Portaria não forem integralmente satisfeitas, inviabilizando a operacionalização da entrega em domicílio; e II - houver na localidade pessoa jurídica que atenda aos requisitos e às condições previstas na Portaria/MC nº 141, de 28 de abril de 1998, específica do Serviço de Caixa Postal Comunitária.
Art. 14.
A retirada do objeto postal em unidade da ECT somente será realizada quando: I - as condições definidas no art. 12 desta Portaria não forem integralmente satisfeitas; II - o objeto, por suas características, tais como peso e dimensões, não possibilitar a distribuição postal; ou III - as características do respectivo serviço ou o endereçamento do objeto assim o determinarem. Parágrafo único. No caso de distritos com menos de 500 (quinhentos) habitantes, o objeto postal ficará disponível na unidade da ECT mais próxima do endereço indicado
.
Art. 15. A entrega de objeto postal destinado a endereço situado em coletividade será feita: I - por meio de caixa receptora única de correspondências, instalada no pavimento térreo do acesso à referida coletividade; ou II - ao porteiro, administrador, zelador ou à pessoa designada para esse fim. §1º A ECT, mediante solicitação da coletividade, poderá efetuar a entrega postal em caixas receptoras individuais, instaladas na entrada do imóvel, desde que disponível o acesso do empregado postal para efetuar o depósito dos respectivos objetos. §2º Para efeito deste artigo, considera-se coletividade: I - condomínios residenciais e comerciais; II - edifícios com mais de um pavimento; e III - repartições públicas, edifícios, centros e estabelecimentos comerciais e comunitários, tais como instituições de ensino e religiosas, hotéis, bancos, pensões, quartéis, hospitais, asilos, prisões, escritórios, embaixadas, legações, consulados e associações.
Em princípio, o serviço de retirada postal em unidades comunitárias deveria ser comunicado aos sujeitos. Do contrário, a remessa de missivas para seus endereços se tornará uma atividade ritualista, destinada a nunca atingir sua finalidade. Afinal de contas, não há como os sujeitos adivinharem que há correspondência do seu interesse em alguma agência dos Correios e Telégrafos.
Por meio do art. 12 da Portaria nº 6.206/2015, o Ministério das Comunicações preconizou o seguinte:
"
No caso de impossibilidade de entrega ao destinatário ou a quem de direito, por qualquer motivo, o objeto será devolvido ao remetente, exceto no caso de impressos sem devolução garantida ou automática, os quais serão destinados a refugo
.".
Assim, quanto ao serviço público essencial, conferido à ECT com exclusividade, consoante o art. 21, X, da Constituição Federal e o art. 2º da Lei nº 6.538/1978, a jurisprudência tem firmado o entendimento de que cumpre à ECT promover a entrega do objeto postal no endereço do destinatário, desde que informado corretamente, independentemente da importância ou desenvolvimento regional do local do destino.
ECT. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MULTA. NÃO COMPARECIMENTO À AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. SERVIÇO POSTAL. PRINCÍPIO DA UNIVERSALIDADE. 1. Impõe-se o afastamento da multa aplicada, uma vez que não há falar em não comparecimento injustificado à audiência de conciliação. 2. O STF já teve a oportunidade de destacar que o serviço postal deve ser contínuo, universal e observar preços módicos, bem como se manifestou no sentido de que a ECT deve cumprir o encargo de alcançar todos os lugares do Brasil, não importa o quão pequenos ou subdesenvolvidos. 3.
A empresa pública não trouxe qualquer fato concreto que impeça a prestação dos serviços nas áreas destacadas, tendo, ao revés, informado que seriam incluídas no próximo estudo técnico de expansão da distribuição domiciliária de correspondências
. 4. Cabe à ECT, na condição de responsável pelo serviço postal, estruturar suas operações de modo a observar o princípio da universalidade. (TRF4, AC 5015829-44.2016.4.04.7107, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 30/01/2019).
ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. GARANTIA DE SERVIÇO POSTAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO VERIFICADO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. VIABILIDADE DA PRETENSÃO. SERVIÇO PÚBLICO. DILATAÇÃO DO PRAZO PARA CUMPRIMENTO DA DETERMINAÇÃO JUDICIAL. ASTREINTE. 1. No caso dos autos, a solução da demanda prescinde de prova testemunhal e de qualquer outra prova senão aquelas já constantes dos autos, sobretudo por se tratar, em verdade, de questão de direito (acessibilidade à prestação de serviço público). Possibilidade, portanto, do julgamento antecipado da lide. 2. Inexistente qualquer prejuízo à parte, não há que se falar em acolhimento da alegação de nulidade processual (sequer verificada de fato). Aplicação da máxima pas de nulitté sans grief. 3. O objeto da demanda originária é a efetiva prestação do serviço postal na região do Município de Jaraguá do Sul/SC, a despeito da ausência de identificação precisa de algumas vias públicas. Ou seja, não pretende o autor a implementação de política urbana ou a impugnação abstrata de Portaria Interministerial, mas, sim, a efetivação do serviço de entrega postal a todos os usuários do serviço público residentes na área delimitada na proemial. Adequado, portanto, o reconhecimento da ilegitimidade passiva ad causam dos entes políticos inicialmente demandados. 4. É atribuição da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos a prestação de serviço público de entrega domiciliar de correspondência, consoante o artigo 21, X, da Constituição Federal, e o artigo 2º da Lei n. 6.538/78. 5. Não se pode admitir que a empresa pública, detentora de exclusividade dos serviços postais, esquive-se de suas funções alegando dificuldades de acesso e ausência de adequada identificação das residências dos destinatários de correspondência. 6. Em se tratando de serviço público essencial e que somente pode ser executado pela ré, criada especificamente para tal finalidade, inviável chancelar-se a negativa de prestação, em particular quando se trata de comunidade carente e pouco assistida. 7. A existência de condições mínimas para a prestação adequada da entrega domiciliar de correspondência na localidade, já que não se trata de local de difícil acesso e as residências estão suficientemente identificadas, impõe a obrigação de fazer à empresa pública ré. 8. As dificuldades operacionais aventadas pela ECT para cumprimento da determinação judicial restaram afastadas (pela suspensão da antecipação de tutela), uma vez que, ao fim e ao cabo, o prazo fixado pelo juízo a quo somente começará a correr a partir do trânsito em julgado da decisão final de mérito proferida na demanda principal - oportunidade em que será descabida qualquer alegação de surpresa do provimento jurisdicional exauriente. 9. Embora possível e legítima a fixação da cominatória contra a apelante, entende-se apenas que o valor arbitrado pelo magistrado a quo excede os limites da razoabilidade, afastando-se de sua função principal (qual seja, compelir a parte devedora ao cumprimento da obrigação) e exteriorizando-se como efetiva punição. 10. Multa diária reduzida para R$ 100,00 (cem reais). 11. Apelação parcialmente provida. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001099-23.2010.404.7209, 3ª TURMA, Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 29/11/2012)
Em princípio, não há embaraços para que a ECT crie mecanismos próprios para atendimento de comunidades de acesso mais difícil, como já ocorre quando há necessidade de que carteiros(as) atravessem rios, adentrem até mesmo na mata densa para poder cumprir com o dever - louvável e importante dever - de levar correspondências para onde o destinatário se encontre. Nada impede, tanto por isso, que a ECT realmente crie mecanismos de caixa postal comunitária, a fim de otimizar recursos públicos e facilitar também a prestação do serviço.
Mas, para que algo assim seja válido, deve primeiro ser confrontado com o postulado da isonomia e da universalidade da prestação de serviços públicos. Logo, deve-se aferir se o critério de distinção entre os sujeitos, adotado para a implementação dessa prática, realmente atende ao art. 5,
caput,
CF. Por que nessa comunidade, e não na outra? Ademais, também deve ser criado MECANISMO EFETIVO de conhecimento, dado que não se pode simplesmente exigir que o sujeito acorra todo dia a uma agência dos Correios perguntando se há alguma postagem do seu interesse. A agência não pode ser imaginada como se fosse a portaria de um prédio, em que o condômino questiona se chegou carta.
Como já decidiu o TRF2,
"
Inegável que a ausência da entrega de correspondências gera prejuízos ao cidadão, que na sociedade atual ainda recebe a maior parte de suas contas e até algumas compras via correios
."
(TRF2, autos 0000479-19.2010.4.02.5054, 1ª VARA FEDERAL DE COLATINA-ES, omiti restante da sentença).
2.32. Boa-fé objetiva:
Deve-se ter em conta, ademais, o postulado da boa-fé objetiva, enquanto preceito que deve regular a relação entre os sujeitos, entre estes e o Poder Público, mesmo entre distintas unidades da Administração Pública.
Com efeito, "
ao impor sobre todos um dever de não se comportar de forma lesiva aos interesses e expectativas legítimas despertadas no outro, a tutela da confiança revela-se, em um plano axiológico-normativo, não apenas como principal integrante do conteúdo da boa-fé objetiva,
mas também como forte expressão da solidariedade social, e importante instrumento de reação ao voluntarismo e ao liberalismo ainda amalgamados no direito privado como um todo
."
(SCHREIBER, Anderson.
A proibição de comportamento contraditório:
tutela da confiança e
venire contra factum proprium.
Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 91).
Ademais,
"
Os princípios da segurança jurídica e da boa-fé objetiva, bem como a vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium), impedem que a parte, após praticar ato em determinado sentido, venha a adotar comportamento posterior e contraditório
."
(AGRESP 200802418505, ARNALDO ESTEVES LIMA, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:29/03/2010).
Acrescento que
"
O Poder Público não é um poder irresponsável e arbitrário, ele se vincula e se limita pelos seus próprios atos
. Não se pode reservar o privilégio, que se resume na mais cínica das prerrogativas que se arrogava o poder absoluto, de surpreender a boa-fé dos que confiam na sua palavra ou nas suas promessas, violando aquela ou anulando essas, depois de haver conseguido, por causa de uma ou de outras, as prestações cuja execução havia sido feita na boa-fé, fundamental não só ao seu comércio jurídico, como à convivência moral, de que a ninguém é dado retirar a palavra empenhada ou desfazer a promessa mediante a qual obteve vantagem de outrem ou lhe causou ou infligiu sacrifício."
(CAMPOS, Francisco.
Direito administrativo.
vol. I. Livraria Freitas Bastos, 1958, p. 70-71)
O respeito à boa-fé objetiva corresponde a "
uma norma de conduta que impõe aos participantes de uma relação obrigacional um agir pautado pela lealdade, pela consideração dos interesses da contraparte. Indica, outrossim, um critério de interpretação dos negócios jurídicos e uma norma balizamento ao exercício de direitos subjetivos e poderes formativos."
(MARTINS-COSTA, Judith.
Comentários ao novo Código Civil.
RJ: Forense, 2005, p. 42).
Com as devidas adequações, essas regras também são oponíveis ao Estado. Nâo se pode reconhecer à Administração Pública a prerrogativa de surpreender os sujeitos, cobrando valores sem que lhes tenha comunicado anteriormente a causa dessa obrigaçã, ou modificando de inopino cláusulas contratuais.
"
Este Tribunal já decidiu que a frustração de expectativas legítimas criadas pelo poder público configura verdadeira afronta ao princípio da boa-fé objetiva, em seu postulado da proibição ao `venire contra factum proprium, que também deve ser respeitada pela Administração Pública
. Através da referida cláusula, vedam-se os comportamentos contraditórios que aviltam direitos e deveres previamente fixados entre as partes e quebram a relação de confiança que deveria prevalecer"
(TRF-1 - REOMS: 10056493420184013200, Relator: Desembargador Federal João Batista Moreira, Data de Julgamento: 06/07/2020, Sexta Turma, Data de Publicação: 07/07/2020).
A legislação processual civil trata do respeito à boa-fé objetiva no curso da demanda, conforme seus
arts. 7, 322, §2 e 489, §3, CPC/15
.
2.33. Lançamento tributário - considerações gerais:
Em regra, o lançamento deve ser promovido pelo ente tributante. Importa dizer: o lançamento é projeção das atribuições legislativas para constituir o tributo - com atenção aos vetores constitucionais. Também é projeção das atribuições administrativas, em sentido estrito, concernentes à apuração do valor devido, diante de um determinado suporte demonstrativo.
Atente-se para o art. 142, do Código Tributário Nacional:
Art. 142.
Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível
.
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.
No âmbito tributário, costuma-se promover uma distinção entre obrigação e crédito
. Sustenta-se que a obrigação de pagar valores ao Estado, a título de tributo, surgiria com a
prática de determinados comportamentos ou com a ocorrência de determinados fatos, vinculados ao contribuinte
, previstos em lei como ensejadores dessa imposição. Quanto a determinados tributos, a obrigação seria revestida da natureza de crédito, desde logo, mediante lançamento promovido pela autoridade tributária. O sujeito seria notificado, então, do aludido lançamento de ofício, com prazo para recolhimento da exação. É o que se dá com o IPVA, IPTU, taxas, contribuições de melhoria etc.
Nesse caso - lançamento de ofício -, caberia ao Estado o encargo de examinar o contexto probatório, identificar a legislação aplicável, aferir a base de cálculo e a alíquota devidas, prazo para pagamento etc. Assim, o contribuinte ficaria encarregado de promover o pagamento do tributo, no prazo legalmente previsto para tanto, a ser informado pela Fazenda Pública, podendo também impugnar a cobrança, mediante devido processo administrativo, conforme decreto 70.235, de 06 de março de 1972.
Em outras situações, a legislação atribui ao contribuinte o dever de examinar o contexto probatório, identificar a legislação aplicável, aferir qual a base de cálculo e quais as alíquotas incidentes, calcular o tributo e recolhê-no prazo legalmente previsto, a ser por ele apurado
. Ou seja, trata-se de pagamento a ser promovido pelo contribuinte, antes que o Fisco promova o exame da questão. Trata-se do chamado "lançamento por homologação", que parte da crença de que o Fisco promoveria efetiva homologação dos atos dos contribuintes, o que raramente se dá. O Erário dispõe, então, do prazo de até 05 anos, como regra, para promover aludida revisão, na forma do art. 150,§4, CTN/66, lançando diferenças que repute devidas. Quando constata indícios de fraudes, aludido prazo é alargado na forma do art. 173, CTN.
TRIBUTÁRIO. ICMS. CREDITAMENTO INDEVIDO. LANÇAMENTO. DECADÊNCIA. CONTAGEM. TERMO INICIAL. PAGAMENTO PARCIAL DE BOA-FÉ: FATO GERADOR. MÁ-FÉ. RECONHECIMENTO. AUSÊNCIA. 1.
A decadência para a realização de lançamento de ICMS pago a menor, inclusive quando fundado em creditamento indevido, deve ser contada de acordo com a regra contida no art. 150, § 4º, do CTN, exceto nos casos de dolo ou má-fé, em que deverá ser observado o disposto no art. 173, I, do CTN
. 2. Hipótese em que, diversamente do assentado pelo ente público agravante, as instâncias ordinárias não afirmaram que a contribuinte agiu de má-fé ao realizar o creditamento glosado, mas, apenas, que não logrou comprovar a realização da operação estampada na nota fiscal posteriormente declarada inidônea. 3. A comprovação da operação comercial é condição para o adquirente de boa-fé proceder ao creditamento do ICMS destacado na correspondente nota fiscal posteriormente declarada inidônea (Súmula 509 do STJ). 4. A falta da referida comprovação não é suficiente para a caracterização de má-fé na conduta do contribuinte, cujo reconhecimento pressupõe juízo de valor fundado em prova específica, sendo inadmissível a presunção desse elemento subjetivo. 5. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1978830 SP 2021/0401495-0, Data de Julgamento: 25/04/2022, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/04/2022)
Note-se, portanto, que, no âmbito do lançamento por homologação - pagamento sem que haja prévia delimitação pelo Fisco do valor devido -, há maior contingência na situação do contribuinte.
"De início, destaque-se que, nos termos da premissa acima fixada, o crédito tributário e, assim, a relação jurídica tributária, pode ser constituída tanto pela administração quanto pelo sujeito passivo. Ambos possuem competência, segundo a legislação tributária vigente, para produzir normas individuais e concretas com o objetivo de declarar a ocorrência do fato jurídico tributário e constituir relações jurídicas de mesmo cunho. A despeito disso, este item se concentrará especificamente na figura do lançamento tributário. A constituição da relação jurídica tributária pelo sujeito passivo será objeto de análise quando do detalhamento do lançamento por homologação.
Voltando-se os olhos para a figura do lançamento tributário, devemos compreendê-lo como norma individual e concreta produzida pela administração com o objetivo de declarar o fato jurídico tributário e constituir a relação jurídica tributária respectiva
. Não se confunde com a cobrança do tributo; ao contrário, é pressuposto desta, na medida em que apenas faz sentido a exigência, judicial ou administrativa, do objeto da relação jurídica após sua constituição. Uma vez formalizado o fato em linguagem competente e trazida à lume a relação jurídica tributária, a administração poderá adotar medidas visando à cobrança e à exigência concreta do tributo.
Diante disso, cumpre analisar, separadamente, a disciplina do Código Tributário Nacional quanto à definição e aos aspectos gerais do lançamento, de um lado, e as suas modalidades, de outro." (PISCITELLI, Tathiane.
Curso de Direito Tributário.
SP: RT. 2024. tópico 2.2.).
Transcrevo ainda o seguinte:
"Para melhor compreender o dispositivo, devemos dividi-lo em três partes.
A primeira
refere-se à
sentença que enuncia a competência privativa da autoridade administrativa para constituir o crédito tributário pelo lançamento. Uma leitura apressada poderia sugerir que apenas a autoridade administrativa seria competente para declarar a ocorrência do fato jurídico tributário em linguagem competente e constituir a respectiva relação jurídica. O equívoco não poderia ser maior.
Como já repisado diversas vezes, tanto a administração quanto o particular têm competência para tanto e, em verdade, a redação do artigo 142 do Código reforça essa afirmação. Isso porque não afasta a possibilidade de o particular produzir tal norma individual e concreta, mas estabelece que, caso o sujeito emissor da norma seja a administração, o instrumento adequado para tanto será o lançamento tributário, este sim privativo da autoridade administrativa.
A
segunda parte
do dispositivo refere-se à definição em si do lançamento: seria “procedimento administrativo” levado adiante para verificar a ocorrência do fato jurídico tributário e identificar todos os elementos da relação jurídica tributária: sujeitos, passivo e ativo, e objeto, com a delimitação do montante a pagar pela indicação da base de cálculo e alíquota.
Havendo penalidade a ser exigida, o lançamento a contemplará também.
Nota-se, contudo, que o lançamento não se confunde com o documento que o suporta. É possível que um mesmo documento (o auto de infração e imposição de multa, por exemplo) formalize a norma individual e concreta relativa ao dever de o sujeito passivo pagar o tributo e, também, aquela relacionada com a exigência da penalidade. Nesse caso, haverá claramente duas normas individuais e concretas formalizadas em um mesmo documento: uma, a norma de conduta, e outra, a norma sancionatória.
Ainda nesse sentido, a despeito da redação final do caput do artigo 142, o lançamento tributário é ato administrativo e não procedimento administrativo.
É possível, porém, que seja antecedido por procedimento administrativo de fiscalização, com o objetivo de produzir linguagem (provas) que demonstrem a ocorrência do fato jurídico tributário. Um exemplo claro nesse sentido seria a requisição de acesso à movimentação financeira do contribuinte em relação ao período que está sendo objeto de fiscalização: de posse de tais informações a administração tributária teria elementos para indicar a ocorrência ou não de fato cujos elementos teriam sido eventualmente sonegados pelo sujeito passivo.
Esses atos de fiscalização, no entanto, não se confundem com o resultado do procedimento em si. O lançamento, pois, é produto, enquanto o procedimento de fiscalização é o processo do qual resulta a produção de norma individual e concreta, que declara a ocorrência do fato jurídico tributário e constitui a relação jurídica respectiva
.
Quanto ao teor do
parágrafo único, reforça-se a ressalva feita acima: uma vez verificada formalmente a ocorrência do fato, é dever da administração, sob pena de responsabilidade funcional, realizar o lançamento, ato administrativo vinculado e obrigatório. Não se trata, portanto, de mero direito subjetivo, mas de dever jurídico. Isso se dá pelo fato de que a receita tributária é fundamental para o cumprimento das necessidades públicas e não pode ser, sem lei que a autorize, objeto de renúncia ou disposição
.
Por fim, destaque-se que a qualificação do lançamento como ato administrativo vinculado reforça a parte final da redação do artigo 3º do Código Tributário Nacional, que impõe a cobrança do tributo “[...] mediante atividade administrativa plenamente vinculada." (PISCITELLI, Tathiane.
Obra citada.
tópico 2.2.).
Na forma do art. 144, CTN/66:
"
O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada
."
2.34. Eventual lançamento do
ITR
mediante convênio:
Como registrei acima, o lançamento deve ser promovido pelo ente tributante. Importa dizer: o lançamento é projeção das atribuições legislativas para constituir o tributo - com atenção aos vetores constitucionais. Também é projeção das atribuições administrativas, em sentido estrito, concernentes à apuração do valor devido, diante de um determinado suporte demonstrativo.
Em determinados casos, porém, admitem-se que o lançamento de determinados tributos seja promovido por entidade federativa distinta daquela destinatária dos recursos, desde que tenham celebrado convênios administrativos para essa finalidade.
O art. 16 da lei n. 9.393/1996 tratou da celebração de tais convênios administrativos, com segue:
"Art. 16.
A Secretaria da Receita Federal poderá celebrar convênio com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, com a finalidade de delegar as atividades de fiscalização das informações sobre os imóveis rurais, contidas no DIAC e no DIAT.
§ 1º No exercício da delegação a que se refere este artigo, o INCRA poderá celebrar convênios de cooperação com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, Fundação Nacional do Índio - FUNAI e Secretarias Estaduais de Agricultura.
§ 2º No uso de suas atribuições, os agentes do INCRA terão acesso ao imóvel de propriedade particular, para levantamento de dados e informações.
§ 3
o
A Secretaria da Receita Federal, com o apoio do INCRA, administrará o CAFIR e colocará as informações nele contidas à disposição daquela Autarquia, para fins de levantamento e pesquisa de dados e de proposição de ações administrativas e judiciais. (Redação dada pela Lei nº 10.267, de 28.8.2001)
§ 4
o
Às informações a que se refere o § 3
o
aplica-se o disposto no art. 198 da Lei n
o
5.172, de 25 de outubro de 1966. (Redação dada pela Lei nº 10.267, de 2001)
Art. 17. A Secretaria da Receita Federal poderá, também, celebrar convênios com: I -
órgãos da administração tributária das unidades federadas, visando delegar competência para a cobrança e o lançamento do ITR
; II - a Confederação Nacional da Agricultura - CNA e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura - CONTAG, com a finalidade de fornecer dados cadastrais de imóveis rurais que possibilitem a cobrança das contribuições sindicais devidas àquelas entidades.
Note-se que
"
A Secretaria da Receita Federal poderá, também, celebrar convênios com órgãos da administração tributária das unidades federadas, visando delegar competência para a cobrança e o lançamento do ITR e com a Confederação Nacional da Agricultura – CNA e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG, com a finalidade de fornecer dados cadastrais de imóveis rurais que possibilitem a cobrança das contribuições sindicais devidas àquelas entidades (art. 17)
. Por meio do DIAC o contribuinte ou o seu sucessor deverá entregar à SRF as informações cadastrais correspondentes a cada imóvel, bem como qualquer alteração ocorrida, na forma estabelecida pela própria SRF (art. 6º). O DIAT é o documento de apuração do ITR elaborado pelo contribuinte e que deverá ser entregue, obrigatoriamente, em cada ano, para cada imóvel, observadas data e condições fixadas pela Secretaria da Receita Federal (art. 8º). Com a entrega do DIAT, deverá o contribuinte antecipar o pagamento do imposto apurado, posto se cuidar de lançamento por homologação (art. 10). Os convênios a que alude a Lei 9.393/96 são exclusivamente para a fiscalização das informações sobre os imóveis rurais, contidas no DIAC e no DIAT, reservando-se à Delegacia da Receita Federal os demais atos de administração do imposto. Ineficaz, portanto, a previsão do § 3º do art. 85 do CTN, cuja inconstitucionalidade foi declarada pelo STF, com sua execução suspensa pela Resolução 337, de 27.09.1983, do Senado Federal."
(ALVES, Eliana Calmon et al.
Código Tributário Nacional comentado.
São Paulo: RT. 2020. comentários ao art. 20 do CTN).
Ademais,
"Convênios de cobrança do ITR.
A L 11250, de 27.12.2005 (DOU 28.12.2005), faculta à União a celebração de convênios para delegação de atribuições de fiscalização, incluindo o lançamento de créditos tributários, e de cobrança administrativa e judicial do ITR, relativamente ao Distrito Federal e aos Municípios que fizerem a opção do CF 153 § 4.º III, sem prejuízo da competência da Secretaria da Receita Federal do Brasil para tanto.
Já ao L 9393/96 16 e 17 preveem que a SRF pode celebrar convênio com o Incra, de forma que possa delegar as atividades de fiscalização dos imóveis rurais, contidas no Documento de Informação e Atualização Cadastral do ITR – DIAC e no Documento de Informação e Apuração do ITR – DIAT. Poderá também celebrar convênios com órgãos da administração tributária das unidades federadas (para delegar competência de cobrança e lançamento de ITR), com a Confederação Nacional da Agricultura – CNA e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG (para fornecimento de dados cadastrais de imóveis rurais). O Incra, por sua vez, poderá, para o exercício da delegação, firmar convênios com o Ibama, a Funai e secretarias estaduais de agricultura."
(JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa.
Leis Civis Comentadas e Anotadas
. São Paulo: RT. 2019. Seção II - ITR. art. 48).
A rigor, aludida delegação se revela válida, na medida em que se limita à efetivação de medidas administrativas em prol da apuração do tributo porventura devido. Na medida em que o Estado costuma delebar aludidas atribuições ao próprio contribuinte - mediante o chamado lançamento por homologação -, aparentemente não há maiores objeções à celebração de convênios administrativos, a fim de uma unidade federativa auxilie alguma outra, desde que isso seja promovido de modo claro, evitando-se que o contribuinte seja alvo de cobranças múltiplas, violando-se o
ne bis in idem,
enquanto projeção da garantia do devido processo legal substantivo.
Ademais, o art. 153, §4, da Constituição, com a redação veiculada pela Emenda Constitucional 42/2003, preconizou que o ITR
"
será fiscalizado e cobrado pelos Municípios que assim optarem, na forma da lei, desde que não implique redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal
."
Fiando-se no aludido dispositivo constitucional, a Receita Federal publicou a
instrução normativa
RFB
1640, de 11 de maio de 2016
, versando sobre o tema. Transcrevo o seu art. 2:
Art. 2º
A RFB, em nome da União, poderá celebrar convênio com o Distrito Federal e os municípios que assim optarem, para delegar as atribuições de fiscalização, inclusive a de lançamento de créditos tributários, e de cobrança relativas ao ITR
. § 1º A celebração do convênio não prejudicará as competências supletivas da RFB de fiscalização, inclusive a de lançamento de créditos tributários, e de cobrança relativas ao ITR. § 2º A opção de que trata o caput não poderá implicar redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal. § 3º O disposto no caput não abrange: I - a competência da RFB para lançamento de multa por atraso na entrega da Declaração do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (DITR); e II - o contencioso administrativo decorrente do exercício das atribuições delegadas. § 4º As atribuições delegadas nos termos do caput serão exercidas de acordo com o disposto no art. 54 do Decreto nº 4.382, de 19 de setembro de 2002, sem prejuízo dos efeitos dos atos já praticados pela RFB para fins de contagem dos prazos de que trata o referido artigo -, inclusive os de fiscalização e de lançamento de ofício.
Por seu turno, o art. 7 da IN 1640 preconizou que
"
Previamente à celebração do convênio de que trata esta Instrução Normativa, o ente federativo interessado deve ter: (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1954, de 21 de maio de 2020) I - estrutura de tecnologia da informação suficiente para acessar os sistemas da RFB, que contemple equipamentos e redes de comunicação
; II - lei vigente instituidora de cargo com atribuição de lançamento de créditos tributários; (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1954, de 21 de maio de 2020), III -
servidor aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos para o cargo de que trata o inciso II, em efetivo exercício
; e (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1954, de 21 de maio de 2020) IV - optado pelo Domicílio Tributário Eletrônico (DTE). (Incluído(a) pelo(a) IN RFB nº 1954, de 21 de maio de 2020)"
Logo, em princípio, a realização de lançamento de revisão (art. 150, §4, CTN) por Municípios se revela válido, contanto que sejam observados os requisitos previstos no art. 142, CTN/66, e tenha decorrido de convênio celebrado de modo escorreito com a União Federal.
2.35. Lançamentos - cargos em comissão:
Por outro lado, os Tribunais têm decidido que, no âmbito do cumprimento de tais convênios, o lançamento deveria ser promovido por servidores do povo efetivos, selecionados mediante concursos. Assim, seria inválido o lançamento promovido por autoridades demissíveis
ad nutum.
Além do art. 7 da Instrução Normativa 1640/2016 - RFB, menciono também o art. 5 da IN/RFB Nº 844/2008:
"Para a celebração do convênio de que trata esta Instrução Normativa, o Distrito Federal ou o
Município optante deverá cumprir os seguintes requisitos e condições: (...) III - possuir quadro de carreira de servidores com atribuição de lançamento de créditos tributários
."
Como sabido, os textos normativos não devem ser interpretados como se veiculassem palavras inúteis (
verba cum efecto sunt accipienda
). Assim, a menção que as instruções normagivas da Secretaria Receita Federal fizeram à necessidade de treinamento de servidores de carreira decorre justamente da imprescindibilidade de que o lançamento pelos Municípios seja empreendido por servidores do provo, selecionados mediante concursos. Atente-se para os seguintes julgados:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ITR CONVÊNIO. SISTEMA DA RECEITA FEDERAL. LIMINAR DE CARÁTER SATISFATIVO. 1. O provimento recorrido encontra-se devidamente fundamentado, tendo dado à lide a solução mais consentânea possível, à vista dos elementos contidos nos autos, sendo certo, ainda, que o recurso apresentado pela agravante não trouxe nada de novo que pudesse infirmar o quanto decidido 2. Decisão agravada mantida por seus próprios fundamentos. 3. Registre-se, por oportuno, que a adoção, pelo presente julgado, dos fundamentos externados na sentença recorrida - técnica de julgamento "per relationem" -, encontra amparo em remansosa jurisprudência das Cortes Superiores, mesmo porque não configura ofensa ao artigo 93, IX, da CF/88, que preceitua que "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)". Precedentes do E. STF e do C. STJ. 4.
O pedido liminar tem caráter satisfativo. 5. A IN nº 1.640/2016 (art. 7º, III) estipula que o município deve possuir quadro de carreira dos servidores com atribuição de lançamento de crédito tributários, fato que não restou demonstrado nos autos. 6. Agravo de instrumento a que se nega provimento
. (TRF-3 - AI: 50175483020204030000 MS, Relator: Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, Data de Julgamento: 12/04/2021, 4ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 19/04/2021)
"PROCESSUAL CIVIL. DIREITO TRIBUTÁRIO. ITR. TRANSFERÊNCIA AOS MUNICÍPIOS DE COMPETÊNCIA ADMINISTRATIVA. CONDICIONANTES. PENDÊNCIA DE CUMPRIMENTO. NECESSIDADE DE VERIFICAÇÃO ESPECÍFICA PELA RFB. TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO ADEQUADA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.
I. A pretensão recursal não procede.
II.
A celebração de convênio entre a União e o Município não é suficiente para que se implemente imediatamente toda a estrutura necessária à transmissão da administração, fiscalização e arrecadação de ITR. O treinamento de servidores especializados no lançamento de créditos públicos constitui etapa condicionante da operacionalidade da delegação
.
III. Segundo a Instrução Normativa RFB n. 1.640 de 2016, após a assinatura do convênio, os servidores municipais já indicados devem se submeter a um programa de habilitação técnica da RFB, sob pena de denúncia do instrumento.
IV.
O Município de Novo Horizonte do Sul não comprovou que o pessoal já contratado para o lançamento e cobrança de ITR obteve o certificado de capacitação, a ponto de se permitir a operação imediata do convênio, especificamente a transferência da administração, fiscalização e arrecadação do imposto
.
V. A União, inclusive, após ser intimada sobre a petição superveniente da prefeitura, informou que o treinamento dos servidores está pendente, conforme ressalva do próprio despacho da RFB juntado pela parte.
VI. Mesmo os ajustes celebrados anteriormente – como ocorre com a Prefeitura de Novo Horizonte do Sul - estão sujeitos às novas exigências da IN RFB n. 1.640 de 2016 (artigo 24).
VII.
Ademais, seria temerário que o Poder Judiciário ordenasse provisoriamente uma delegação que exige requisitos técnicos de verificação periódica, sob pena de denúncia automática. A disposição de tecnologia de informação, com equipamentos e redes de comunicação específicas, representa um exemplo (artigo 17, I, da IN n. 1.640 de 2016): não se sabe se o modelo do Município de Novo Horizonte do Sul está de acordo com os requisitos da RFB.
VIII. Existe a possibilidade de que a declaração de disponibilidade de tecnologia feita na opção não alcance maior projeção fática, a ser fiscalizada pela RFB no exercício de competência discricionária, conforme se pode extrair da própria natureza do ajuste – delegação administrativa e convênio, passível de denúncia unilateral.
IX. Também não se pode negligenciar o fato de que a decisão sobre tutela provisória tem potencial para produzir efeitos irreversíveis (artigo 300, parágrafo terceiro, do CPC). Com a assunção da atividade de lançamento e cobrança, o Município terá acesso a todo trabalho de administração, fiscalização e arrecadação do ITR da RFB, inclusive dados fiscais dos contribuintes, sem que a improcedência do pedido consiga desfazer essas medidas.
X. A tutela de urgência esgotaria o próprio objeto da ação, desequilibrando a relação processual e impedindo a composição da lide no momento mais adequado e seguro – sentença.
XI. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
(TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5028766-26.2018.4.03.0000 , Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 18/10/2019, Intimação via sistema DATA: 23/10/2019)
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO TERRITORIAL RURAL ITR. CONVÊNIO REALIZADO ENTRE A UNIÃO E O MUNICÍPIO. LANÇAMENTO DO ITR REALIZADO POR SERVIDOR EM CARGO COMISSIONADO. INCOMPETÊNCIA. NULIDADE. 1. A Lei nº 11.250/2005 regulamentou o inciso III do § 4º do art. 153 da Constituição Federal, estabelecendo a possibilidade de delegação, aos municípios que assim optarem, das atividades de fiscalização e cobrança do ITR incidente sobre a propriedade de imóveis rurais situadas no seu território. 2. Editada a IN/RFB Nº 844/2008, em obediência à Lei nº 11.250/2005, ficou estabelecido dentre os requisitos para a celebração do convênio, que o Município ou o Distrito Federal deve possuir quadro de carreira de servidores com atribuição para lançamento de créditos tributários. 3.
No caso, a autoridade administrativa era incompetente para a realização do ato, sendo certo que os lançamentos impugnados não foram realizados por servidor de carreira com atribuição de lançamento tributário
. 4. Apelação a que se nega provimento. (TRF-1 - AC: 10025216720184013600, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MOREIRA ALVES, Data de Julgamento: 27/06/2022, 8ª Turma, Data de Publicação: PJe 06/07/2022 PAG PJe 06/07/2022 PAG)
O TRF1 já deliberou que
"
No caso, como consignado na sentença, a autoridade administrativa era incompetente para a realização do ato, uma vez que os lançamentos impugnados não foram realizados por servidor de carreira com atribuição de lançamento tributário, como exigido pela norma de regência acima citada
. Com efeito, dentre os requisitos para a validade do ato administrativo, a competência tem especial destaque, como bem frisado na sentença, de forma que a inobservância gera como consequência a nulidade do ato, sendo dispensável a demonstração de prejuízo."
(TRF-1 - AC: 10025216720184013600, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MOREIRA ALVES, Data de Julgamento: 27/06/2022, 8ª Turma, Data de Publicação: PJe 06/07/2022 PAG PJe 06/07/2022 PAG).
2.36. Lançamento promovido por Secretário Municipal:
Por conta dessa premissa - aventada nulidade de lançamentos promovidos, no âmbito de convênios, por servidores comissionados -, os Tribunais têm declarado a invalidade de lançamentos empreendidos por Secretários Municipais. Cuida-se de simples derivação daquele ponto de partida.
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ITR. CONVÊNIO COM MUNICÍPIO. LANÇAMENTO REALIZADO POR SECRETÁRIO MUNICIPAL DA FAZENDA. CARGO EM COMISSÃO. NULIDADE EM RAZÃO DA INCOMPETÊNCIA.
As atividades atinentes à administração tributária, dentre as quais está a constituição dos créditos de natureza fiscal, devem ser exercidas por servidores de carreiras específicas, nos termos do artigo 37, XXII, da Constituição Federal, razão pela qual é nulo o lançamento realizado por ocupante de cargo em comissão
. (TRF-4 - AC: 50084426820174047001 PR 5008442-68.2017.4.04.7001, Relator: RÔMULO PIZZOLATTI, Data de Julgamento: 02/07/2019, SEGUNDA TURMA)
Transcrevo a fundamentação do aludido acórdão:
"(...) A Lei nº 11.250, de 2005, regulamentando o inciso IIIdo § 4o do art. 153 da Constituição Federal, que trata da possibilidade de delegação, aos Municípios que assim optarem, das atividades de fiscalização e cobrança do ITR incidente sobre a propriedade de imóveis rurais situados no seu território, estabelece o seguinte:
Art. 2. A Secretaria da Receita Federal baixará ato estabelecendo os requisitos e as condições necessárias à celebração dos convênios de que trata o art. 1o desta Lei.
Com base nesse dispositivo, foi editada a IN/RFB nº 844, de 2008, prevendo:
Art. 5º Para a celebração do convênio de que trata esta Instrução Normativa, o Distrito Federal ou o Município optante deverá cumprir os seguintes requisitos e condições: (...) III - possuir quadro de carreira de servidores com atribuição de lançamento de créditos tributários.
Na hipótese dos autos, presume-se que o Município cumpra o requisito acima elencado, uma vez que o convênio foi efetivamente firmado. A questão posta, no entanto, não diz respeito propriamente ao descumprimento das condições do convênio, mas sim à autoridade que promoveu o lançamento, Marcelo Ferreira da Silva, ocupante do cargo comissionado de Secretário Adjunto de Fazenda.
Trata-se, a toda evidência, de pessoa a que não pode ser validamente atribuída a competência para realizar a constituição de créditos tributários, uma vez que o artigo 37, XXII, da Constituição Federal, é explícito no sentido de que tal atividade, que se enquadra no conceito de"
administração tributária
", deve ser cometida a servidor de carreira específica. Considerando, aliás, que os cargos em comissão"
destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento
", nem sequer faz sentido que o Secretário Municipal da Fazenda realize o lançamento de tributos
.
Registro, em atenção às razões de apelação, que as notificações de lançamento (evento 1 - procadm7, págs. 3-7, e procad8, págs. 3-7) estão assinadas unicamente pelo Secretário Adjunto da Fazenda, tendo sido ele, portanto, quem praticou tal ato administrativo. A posterior intervenção de servidores ocupantes de cargos efetivos (Josiane Maciel e Cezar Souza dos Santos), cujas participações limitaram-se, respectivamente, à propositura do"
envio do processo à unidade da Secretaria da Receita Federal do Brasil de jurisdição deste município, para providências cabíveis
"(evento 1 - procadm7, pág. 28) e à propositura do"
encaminhamento à Procuradoria da Fazenda Nacional em Arapongas/PR, para inscrição em dívida ativa, e CADIN/FN e imediata cobrança judicial, nos termos do Art. 21, § 3º do Decreto nº 70.235/72
"(evento 1 - procadm7, pág. 46) não têm o condão de convalidar o ato írrito. Ao revés, caberia a tais agentes exercer o poder-dever de autotutela e, à vista da invalidade que inquina o lançamento, propor a sua anulação, sendo igualmente ilegal o encaminhamento por eles dado ao expediente administrativo.
Impõe-se, pois, manter a sentença nos termos em que lançada. O valor dos honorários, depois de apurado conforme determinado em primeiro grau, deverá ser acrescido em 10%, atendendo assim o disposto no artigo 85, § 11, do CPC. Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação." (TRF-4 - AC: 50084426820174047001 PR 5008442-68.2017.4.04.7001, Relator: RÔMULO PIZZOLATTI, Data de Julgamento: 02/07/2019, SEGUNDA TURMA)
Sem dúvida que, sob determinados prismas, a medida pode parecer extravagante. É como se a chefia não pudesse promover os atos confiados apenas a servidores submetidos às suas ordens. Convém ter em conta, porém, que na estrutura brasileira, Juízes tampouco podem promover lançamento tributário, eis que incumbe ao Judiciário, quando muito, sua desconstituição, anulando-se o ato para que outro seja promovido, sendo o caso, por servidores de carreira, lotados no Poder Executivo.
O tema pode suscitar reflexões mais densas do que aquelas viabilizadas pelo presente processo, em que a parte busca uma antecipação de tutela, ao argumento de que complementará a demanda adiante (arts. 303 e ss. CPC). Cuida-se, portanto, de
exame com cognição não exaustiva, a ser confrontada também com o postulado da substanciação
(art. 141, CPC).
2.37. Notas sobre a tutela ambiental:
Há distintas percepções de mundo, como sabido.
Determinados povos sentem-se em verdadeiro amálgama com a natureza (os
Amondawa
, por exemplo). Melhor dizendo, algumas comunidades
não
promovem essa
separação sujeito/mundo
,
não
distinguem a
cultura
e a
natureza
. Algumas nações possuem, pois, a concepção do tempo como um círculo, uma espécie de 'eterno retorno' nietzscheano. Elas miram o tempo da colheita, da pesca, o tempo das chuvas. O tempo não é compreendido como algo escasso, prestes a acabar, mas, como o modo como as coisas se dão, tendendo a retornar (o
Karma
).
A tradição judaicocristã projeta, porém, uma ideia unidirecional do tempo. O
passado jamais se repete
; a vida caminha para o progresso, na medida em que o futuro jamais será mera cópia do passado. O tempo se dá mediante uma espécie de espera, seja a espera pelo Messias (tradição Judaica), seja a espera pelo retorno do Cristo (tradição Cristã), ou simples espera por arrebatamento. Leia-se, a respeito, CAPELLA, Juan Ramón.
Os cidadãos servos.
Tradução de Lédio Rosa de Andrade e Têmis Correia Soares. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1998.
Para esse ideário,
viver é gastar tempo
. Ou, ainda,
time is money,
como se diz comumente hoje em dia. Isso se traduz no conhecido antropocentrismo: o homem imagina-se o
centro da criação
, como se todos os demais entes apenas houvessem sido criados e concebidos para a sua fruição e utilidade.
"Pergunte a qualquer um na massa de gente obscura: qual o propósito da existência das coisas? A resposta geral é que todas as coisas foram criadas para nosso auxílio e uso prático! (...)
Em resumo, todo o cenário magnífico das coisas é diária e confiantemente visto como destinado, em última instância, à conveniência peculiar do gênero humano. Dessa forma, o grosso da espécie humana arrogantemente se eleva acima das inúmeras existências que o cercam
."
(TOULMIN, G.H. apud THOMAS, Keith.
O homem e o mundo natural:
mudanças de atitudes em relação às plantas e aos animais. Tradução de João Roberto Martins Filho. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p. 21)
Cuida-se, por certo, da
fábula do 'leão de Esopo'
. Dado que é o homem quem conta a história, não é de estranhar que se coloque justamente no centro do mundo, imaginando-se a criatura mais perfeita, concebida à imagem de Deus.
Questões metafísicas à parte
, o fato é que
essa concepção antropocêntrica ainda está impregnada nas nossas práticas cotidianas
. O homem usa e abusa do meio circundante, queima florestas, extingue espécies animais, lança bombas, tortura humanos e não humanos, degrada as condições indispensáveis para a preservação da vida - e a vida é uma verdadeira singularidade no que conhecemos do universo.
Isso tem sido alvo de importantes e instigantes reflexões filosóficas, como bem revelam as obras de Peter Sloterdijk (
Esferas:
bolhas. Tradução de José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade. 2016), de Umberto Galimbertti (
Psiche
e technè:
o homem na idade da técnica. São Paulo: Paulus. 2006), dentre outras. Afinal de contas, desde que Prometeu subtraiu aos deuses a técnica -
o domínio do fogo
-, e a entregou aos humanos, segundo a mitologia grega, a história da humanidade tem sido imaginada como uma pretensa superação da natureza em prol da civilização. E isso não sem pouca violência.
A técnica tem sido imaginada, desse modo, como uma projeção da
razão estratégica
, pela qual se escolhem
meios adequados a fins dados
; fins esses que rotineiramente não são colocados em questão - não são alvo de debates -, por conta da
alienação
. Ao mesmo tempo em que a tecnologia ensejou considerável complexidade na relação do homem consigo e com os outros, ela também aumentou significativamente a
capacidade de degradação
. Basta o apertar de botões - Bomba atômica
BDS 220
-, e alguns poucos humanos podem tonar inviável a vida na terra, para as presentes e futuras gerações. Há muito, os filósofos têm denunciado essa progressiva
conversão da técnica
- até então compreendida como um meio - em uma espécie de fim em si. Um dos exemplos mais conhecidos é da conversão do dinheiro (um meio para a obtenção de produtos e serviços), em um fim em si, como se alguém pudesse ter a meta de acumular, por meramente acumular, muito dinheiro.
Isso se traduziu na
reificação do homem
- denunciada por Karl Marx ao tratar do fetiche da mercadoria -, tema retomado por Adorno, Althusser, Horkheimer e tantos outros (Escola de Frankfurt). Isso também se dá na corriqueira degradação da quantidade em qualidade, dialética já denunciada por Friedrich Hegel na sua Ciência da Lógica, como se o simples fato de algo ser volumoso fosse necessariamente bom. Que o diga a sacralização das estatísticas, com seus conhecidos problemas (HUFF, Darrel.
How to lie with statistics.
Nova Iorque: WW Norton and Company. 1954).
No final das contas, esse alerta foi promovido por Max Weber, ao tratar do desencantamento do mundo; e encontra-se também muito bem verbalizado no livro de fantasia
the mists of Avalon
(Marion Bradley), ao se confrontar com a racionalização do sagrado. No essencial, porém, o fato é que a tradição ocidental acabou por imaginar uma dissociação entre a humanidade e a natureza, como se a quintessência do humano fosse dada pela tentativa de superar sua condição inicial, por meio da cultura, da civilização.
Com isso, não raro, há o imaginário de que natureza deva ser concebida como simples matéria-prima, como meio de produção para as fábricas
. Ou, então, supõe-se - o que não deixa de ser retrato da mesma ideia de domínio e controle - que a natureza deva ser concebida como um museu intocável, guarnecida a sete chaves, impedindo-se o contato dos próprios humanos, geralmente das pessoas mais pobres, alijadas da fruição de parques etc.
Esse dilema está presente, sabe-se bem, no âmago do direito ambiental, no que toca ao alcance do desenvolvimento sustentável
. No final das contas, a questão acaba sendo:
"qual o grau de poluição tolerável?" "quem o define?
" O problema é que questões de tal ordem são altamente
complexas
, sobremodo por tocarem de perto os interesses de pessoas que ainda não nasceram e que talvez nem tenham a chance de nascer, se continuar a haver a degradação do mundo, no ritmo atual e tendencialmente mais acelerada.
Os povos advindos da invasão portuguesa e demais imigrantes promoveram
pesado extrativismo
no solo brasileiro, desde o
ciclo do pau-brasil
, passando pelo plantio da
cana-de-açúcar
,
exploração da borracha
, do
café
, chegando aos grandes pastos para criação de
gado
e campos de plantação de
soja
.
Houve corte irresponsável e vergonhoso de parcela significativa da Mata Atlântica e da Floresta Amazônica
, para falar em apenas alguns dos mais conhecidos danos ambientais. Por mais que não se possa idealizar a atividade das nações nativas - imaginando o chamado 'indígena' como se fosse o
Peri
,
índio Goitacá
descrito por José de Alencar ou o
Papa-capim
de Maurício de Souza -, é fato sabido que, no geral, o extrativismo das nações nativas sempre foi promovido com grau
menor de degradação
, se confrontado com aquele realizado pelos povos descendentes dos europeus, na gradual formação da noção de brasilidade, a abranger também os povos aborígenes. Esse é um fato bem documentado. Claro que, na atualidade, não se pode partir de premissas não demonstradas; havendo também casos em que membros de nações nativas parecem contribuir para a degradação ambiental, como revelam os noticiários sobre corte de madeira em certas localidades da Amazônia.
No geral, porém, pode-se muito mais conceber o contrário, dada a íntima relação entre
nações nativas e a terra
- concebida como causa e como forma de vida -, dado o cuidado de determinadas nações com as florestas, animais e rios. A tutela ambiental não pode estar fundada na ideia de controle absoluto, imaginando que a forma correta de se preservar a natureza seja a eliminação do homem, mantendo a natureza em uma redoma.
Somos também parte da natureza; a tutela ambiental demanda necessariamente a proteção da própria humanidade. Proteger a natureza é proteger-nos
. E não podemos nos proteger sem proteger o ambiente. Claro que carecemos de uma nova racionalidade, mais empatia com as distintas formas de vida. Precisamos superar a arrogância do bicho homem, de modo a que possamos nos reconhecer no meio do problema, ao invés de nos imaginarmos observando o mundo à distância, como se estivéssemos protegidos do cataclismo que se avizinha. Se a Terra é a arca de Noé,
não há Monte de Ararate
que permita alguma salvação (gênesis 8). Se a Terra é a arca, ainda não se descobriu algum porto seguro, que não esse no qual nos encontramos. Ou seja, não há nenhum ponto arquimediano, algum ponto em que possamos nos escorar e nos colocar a salvo, se a Terra/Gaia houver sido destruída.
Enfim, a temática ambiental coloca em causa os nossos deveres para com as pessoas ainda não nascidas e compromissos para com os animais não-humanos, seres que conosco compartilham, repito, a dádiva de se viver, a tanto convergindo o art. 225 da Constituição Republicana.
2.38.
Desenvolvimento sustentável:
Ao final do século XVIII, o
clérigo anglicano e economista Thomas Malthus
fez a sua conhecida profecia de que a população mundial haveria de crescer em progressão geométrica, enquanto que o crescimento dos alimentos se daria em progressão aritmética. Isso implicaria que, passadas algumas décadas, a humanidade não mais teria o que comer, ensejando colapso da sociedade.
Sem dúvida que
ele não contou com o desenvolvimento tecnológico, incrementado nos anos que lhe seguiram
. De todo modo, o prognóstico de Malthus revela-se importante por destacar a
tomada de consciência
da questão ambiental, a impactar não apenas os membros de uma dada civilização, mas, também, seus descendentes. Como já disse alguém, não deixamos a Terra em herança para os que virão; nós a
tomamos
em
empréstimo
, dado que pertence à gerações futuras.
O fato é que, ao tempo em que o
desenvolvimento tecnológico aprimorou a capacidade de se produzir alimentos, transpor fronteiras e se comunicar quase que instantaneamente, também ensejou um aumento significativo na poluição urbana e rural
. Para além disso, novos riscos foram descortinados, a exemplo do conhecido caso
Contergan
(
Talidomida
), e dos rompimentos de barragens de mineradoras, como ocorrido em solo brasileiro (casos
Mariana
e
Brumadinho
). Deve-se conjugar, enfim, a sociedade de consumo, de um lado, com a necessidade de zelo para com a questão ambiental, de outro.
Isso se traduziu na formação,
em 1968
, do chamado
Clube de Roma
, constituído por líderes políticos, empresariais, financeiros e intelectuais, com o fim de discutir a temática ambiental.
Em 1971, aludido grupo divulgou seu relatório "limites para o crescimento", destacando ser premente a limitação do consumo. A isso seguiu-se, em 1972, a Conferência da ONU para o ambiente, congregando 113 países, dentre os quais o Brasil
. Com isso, ganhava desenvolvimento a ideia de "
desenvolvimento sustentável
", termo cunhado por Maurício Strong, denotando a necessidade de se conjugar crescimento econômico com a tutela ambiental.
Essa concepção busca a conjugação da
busca por crescimento econômico
,
desenvolvimento de novas tecnologias
,
incremento do nível de empregos
etc. - de um lado -, com a
imposição de limites à atividade econômica
, exigindo-se
prévia franquia estatal para atividades de risco e constante fiscalização a respeito dos impactos ambientais disso decorrentes
. Durante a Conferência de Estocolmo, de 1972, sustentou-se que, ao contrário do que supunha o Clube de Roma, a solução não seria produzir menos; antes, seria produzir mais, só que com com mais cautela. O problema estaria na racionalização das etapas produtivas.
Em
1983
, as Nações Unidas criaram a
Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento
, orientada ao exame das questões mais urgentes da temática ambiental. Isso eclodiu, 09 anos depois, na conhecida
Conferência da ONU para o meio ambiente, realizada no Rio de Janeiro (Rio - 92)
. Ao final daquele ato, os países subscreverem uma declaração com 27 princípios, dentre os quais se encontrava o reconhecimento da importância do desenvolvimento sustentável.
Em 2012, a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, a Rio +20
, reafirmou esses compromissos internacionais. No que toca à legislação nacional, convém ter em conta que as Ordenações Filipinas, de 1603, já cominavam penas para quem cortasse árvores frutíferas, como se vê do Livro 5, Título 75. Conquanto tenham havido outras normas, indicando alguma preocupação ambiental, é fato que isso não se traduziu, infelizmente, em uma consciência coletiva sobre a importância da questão ambiental.
O sistema de proteção ambiental ganhou maior fôlego, no solo brasileiro, com a publicação da
lei n. 6.938, de 1981
, responsável pela instituição do sistema nacional do meio ambiente. Conforme dispôs o seu
art. 2º
, seu objetivo seria
"a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana."
Vale a pena tomar em conta o seu
art. 9º da lei n. 6.938/81
, com a redação veiculada pela lei n. 7.804, de 1989:
Art 9º - São instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente: I -
o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental
; II - o zoneamento ambiental; III -
a avaliação de impactos ambientais
; IV -
o licenciamento
e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras; V - os incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou absorção de tecnologia, voltados para a melhoria da qualidade ambiental; VI -
a criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público federal, estadual e municipal, tais como áreas de proteção ambiental, de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas
;VII - o sistema nacional de informações sobre o meio ambiente; VIII - o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental; IX - as penalidades disciplinares ou compensatórias ao não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção da degradação ambiental. X - a instituição do Relatório de Qualidade do Meio Ambiente, a ser divulgado anualmente pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA; XI - a garantia da prestação de informações relativas ao Meio Ambiente, obrigando-se o Poder Público a produzí-las, quando inexistentes; XII - o Cadastro Técnico Federal de atividades potencialmente poluidoras e/ou utilizadoras dos recursos ambientais. XIII - instrumentos econômicos, como concessão florestal, servidão ambiental, seguro ambiental e outros.
A isso seguiu-se, no que releva, a Constituição de 1988, cujo art. 225 estipulou as principais diretrizes para a temática, alvo de considerações adiante.
2.39. Vedação do retrocesso sócio-ambiental:
Sabe-se que a Lei Maior veda, de modo implícito, o retrocesso social. Uma vez instituído um determinado Estado Constitucional, ele não poderia regredir em termos de direitos fundamentais. Segundo Gomes Canotilho, qualquer ação que vise revogar direitos fundamentais já regulamentados, sem a criação de meios compensatórios, é inconstitucional. (CANOTILHO, J.J Gomes.
Direito constitucional e teoria da Constituição.
5. ed. Coimbra: Almedina, 2002. p. 336)
Ainda segundo Canotilho,
“os direitos sociais e económicos (ex.: direito dos trabalhadores, direito à assistência, direito à educação), uma vez obtido determinado grau de realização, passam a constituir, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjectivo. A “proibição de retrocesso social” nada pode fazer contra as recessões e crises econômicas (reversibilidade fáctica), mas o princípio em análise limita a reversibilidade dos direitos adquiridos (ex.: segurança social, subsídio de desemprego, prestação de saúde), em clara violação do princípio da proteção e da segurança dos cidadãos no âmbito econômico, social e cultural, e do núcleo essencial da existência mínima inerente ao respeito pela dignidade da pessoa humana.
O reconhecimento desta proteção de direitos prestacionais de propriedade, subjectivamente adquiridos, constitui um limite jurídico do legislador e, ao mesmo tempo, uma obrigação de prossecução de uma política congruente com os direitos concretos e as expectativas subjectivamente alicerçadas. A violação do núcleo essencial efectivado justificará a sanção de inconstitucionalidade relativamente a normas manifestamente aniquiladoras da chamada justiça social
.”
(CANOTILHO, J. J. Gomes.
Direito Constitucional e Teoria da Constituição.
7 Ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 338-339).
Atente-se ainda para a avaliação de Ingo Sarlet:
"
verifica-se que a proibição de retrocesso, mesmo na acepção mais estrita aqui enfocada, também resulta diretamente do princípio da maximização da eficácia de (todas) as normas de direitos fundamentais. Por via de consequência, o artigo 5º, § 1º, da nossa Constituição, impõe a proteção efetiva dos direitos fundamentais não apenas contra a atuação do poder de reforma constitucional
(em combinação com o artigo 60, que dispõe a respeito dos limites formais e materiais às emendas constitucionais), mas também contra o legislador ordinário e os demais órgãos estatais (já jurídica e a proteção da confiança), que, portanto, além de estarem incumbidos de um dever permanente de desenvolvimento e concretização eficiente dos direitos fundamentais (inclusive e, no âmbito da temática versada, de modo particular os direitos sociais) não pode – em qualquer hipótese – suprimir pura e simplesmente ou restringir de modo a invadir o núcleo essencial do direito fundamental ou atentar, de outro modo, contra as exigências da proporcionalidade."
(SARLET, Ingo Wolfgang.
A eficácia dos direitos fundamentais:
uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11 ed. PA: Livraria do Advogado, 2012. p. 405).
Ainda segundo Ingo Wolfgang Sarlet, segue:
“(...) cada vez mais constata-se a existência de medidas inequivocamente retrocessivas que não chegam a ter caráter propriamente retroativo, pelo fato de não alcançarem posições jurídicas já consolidadas no patrimônio de seu titular, ou que, de modo geral, não atingem situações anteriores. Assim, por paradoxal que possa parecer à primeira vista, retrocesso também pode ocorrer mediante atos com efeitos prospectivos. Basta lembrar aqui da hipótese – talvez a mais comum em se considerando as referências feitas na doutrina e jurisprudência – da concretização pelo legislador infraconstitucional do conteúdo e da proteção dos direitos sociais, especialmente (mas não exclusivamente) na sua dimensão positiva, o que nos remete diretamente à noção de que o conteúdo essencial dos direitos sociais deverá ser interpretado (também!) no sentido dos elementos nucleares do nível prestacional legislativamente definido, o que, por sua vez, desemboca inevitavelmente no já anunciado problema da proibição de um retrocesso social. (...)
Nesse contexto, poder-se-ia indagar a respeito da possibilidade de desmontar-se, parcial ou totalmente (ainda com efeitos prospectivos), (...) a flexibilização dos direitos e garantias dos trabalhadores, entre tantas outras hipóteses que aqui poderiam ser referidas a título ilustrativo e que bem demonstra o quanto tal problemática nos é próxima e está constantemente na ordem do dia
. Desde logo, à vista do que foi colocado, nos parece dispensar maiores considerações o quanto medidas tomadas com efeitos prospectivos podem representar um grave retrocesso, não apenas (embora também) sob a a ótica dos direitos de cada pessoa considerada em sua individualidade, quanto para a ordem jurídica como um todo.” (SARLET, Ingo Wolfgang.
Obra citada.
p. 398)
Destaco, de partida, não ser dado a magistrados não eleitos pelo povo promover uma análise fundada em critérios de conveniência e oportunidade, substituindo-se aos legisladores. Isso seria agressivo ao postulado da maioria, consagrado pelo art. 1º, parágrafo único, Constituição e ao postulado da Separação de Poderes. A análise deve ser promovida com lastro em argumentos analítico-conceituais, confrontando a EC 103 com normas verbalizadas pela própria Lei Fundamental, e hauridas por meio de hermenêutica fundamentada do seu texto.
Tanto por isso, aludidas opções políticas devem ser debatidas na arena própria - o Congresso Nacional -, exceto quando sejam manifestamente inconstitucionais, por violação a cláusulas pétreas ou por vícios procedimentais, quando se cuida de emenda constitucional, como é o caso discutido neste processo. Convém repisar que não há direito adquirido a regime jurídico, razão pela qual o Congresso Nacional pode modificar as regras para a aposentação por invalidez, atingindo quem já figura como servidor e também aqueles que venham a ser contratados dali por diante.
Sem dúvida que, conforme o grau de alterações envolvidas, há necessidade de regras de transitação, enquanto projeção do próprio princípio da proporcionalidade, inerente à restrição de direitos fundamentais. Todavia, aludidas regras de transição - fundadas em juízos de eficiência, relevância, utilidade - devem ser deliberadas pelo próprio Congresso Nacional, não sendo dado ao Poder Judiciário elaborar leis substitutivas, salvo eventual reconhecimento de inconstitucionalidade.
Tenho em devida conta, é fato, o alcance do art. 26 do Pacto de San Jose da Costa Rica:
"Os Estados-partes comprometem-se a adotar as providências, tanto no âmbito interno, como mediante cooperação internacional, especialmente econômica e técnica, a fim de
conseguir progressivamente
a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura,constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires,
na medida dos recursos disponíveis
, por via legislativa ou por outros meios apropriados."
Aludida norma impõe que o Estado avance na tutela de direitos fundamentais do seu povo e das demais pessoas que se encontrem em seu território. A vedação de retrocesso social não pode ser confundida com retrocesso individual. Isso significa que o Estado deve assegurar direitos fundamentais a todos, no limite dos recursos existentes, mas sem prejuízo da sua aptidão para modificar regras de aposentadorias, adequando despesas a receitas, como é exigido de qualquer administrador precavido.
"
Em verdade, como já sinalizado, o que está em causa são intervenções restritivas de direitos fundamentais sociais e dos trabalhadores, que devem ser submetidas a rigoroso controle de sua legitimidade constitucional mediante recurso aos diversos instrumentos que o sistema jurídico-constitucional disponibiliza, desde a necessidade de criteriosa justificação de sua necessidade e finalidade, a observância das reservas de lei incidentes na espécie, das exigências da proporcionalidade e da segurança jurídica, incluindo a proteção da confiança legítima (esta, por sua vez, também aplicada com a devida proporcionalidade), bem como, por derradeiro, da salvaguarda do núcleo essencial, o que, por sua vez, igualmente há de ser aferido em cada caso, com particular atenção, na esfera dos direitos sociais dos trabalhadores, para a preservação de todas as exigências de um direito fundamental ao trabalho digno , que, sendo um direito fundamental em sentido amplo, decodifica-se em um conjunto de direitos defensivos e prestacionais dos trabalhadores
.” (SARLET, Ingo Wolfgang. Os direitos dos trabalhadores como direitos fundamentais e a sua proteção na constituição federal brasileira de 1988. In: VIANA, Márcio Túlio; ROCHA, Cláudio Jannoti da.
Como aplicar a CLT à luz da constituição:
alternativas para os que militam no foro trabalhista. São Paulo: LTr, 2016, p. 35)
Note que a
"
a Nichtumkehrbarkeitstheorie ou teoria da irreversibilidade, desenvolvida por Konrad partiria da afirmação de que não se pode induzir o conteúdo substantivo da vinculação social do Estado diretamente da Constituição
, mas uma vez produzidas as regulações, uma vez realizada a conformação legal ou regulamentar deste princípio, as medidas regressivas afetadoras destas regulações seriam inconstitucionais, ou seja, haveria uma irreversibilidade das conquiestas sociais alcançadas."
(
NETTO, Luísa Cristina Pinto.
O princípio de proibição de retrocesso social.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 101-102).
Isso significa que nem toda redução de proventos de aposentadoria - respeitados os direitos adquiridos - poderá ser tomada de uma expressão de retrocesso social. Isso depende da demonstração de que, de fato, com a medida o mínimo existencial estaria sendo agredido. Tenha-se em conta que quase toda alocação de recursos enseja direitos para alguns, deveres para outros. A vedação do retrocesso social não é uma espécie de "Ótimo de Pareto", pela qual o Estado apenas poderia promover reformas sem alterar as vantagens já conquistadas por alguns. A questão parece gravitar mais em torno do postulado do "Kaldor–Hicks improvement" (um mecanismo que trata de compensações possíveis), impondo-se um exame a respeito da garantia de direitos fundamentais da comunidade política como um todo.
Deve-se apurar se a reforma sacrifica parcela da população, a ponto de suprimir-lhes condições mínimas de efetivação dos seus direitos fundamentais:
"Além disso, nunca é demais recordar que a proporcionalidade haverá de incidir na sua dupla dimensão como proibição do excesso e de insuficiência, além de, nesta dupla acepção, atuar sempre como parâmetro necessário de controle dos atos do poder público, inclusive dos órgãos jurisdicionais, igualmente vinculados pelo dever de proteção e efetivação dos direitos fundamentais. Isto significa, em apertadíssima síntese, que os responsáveis pela efetivação de direitos fundamentais, inclusive e especialmente no caso dos direitos sociais, onde a insuficiência de proteção e promoção (em virtude da omissão plena ou parcial do legislador e administrador) causa impacto mais direto e expressivo, deverão observar os critérios parciais da adequação (aptidão do meio no que diz com a consecução da finalidade almejada), necessidade (menor sacrifício do direito restringido) e da proporcionalidade em sentido estrito (avaliação da equação custo-benefício – para alguns, da razoabilidade no que diz com a relação entre os meios e os fins), respeitando sempre o núcleo essencial do (s) direito (s) restringido (s), mas também não poderão, a pretexto de promover algum direito, desguarnecer a proteção de outro (s) no sentido de ficar aquém de um patamar minimamente eficiente de realização e de garantia do direito.” (SARLET, Ingo Wolfgang.
Os direitos sociais como direitos fundamentais:
contributos para um balanço aos vinte anos de Constituição Federal de 1988. Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica, 20 Anos de Constitucionalismo Democrático – E Agora? Porto Alegre-Belo Horizonte, 2008)
O ponto é que a vedação do retrocesso social não interdita reformas, dado que - não raro - são necessárias justamente para que a implementação dos direitos fundamentais se dê de modo mais efetiva. A questão está sempre em saber se, com a medida, o conjunto de direitos fundamentais teria se ganhado maior concretude, no contexto dos fatos. O STF tem enfatizado que a vedação de retrocesso social não interditaria moderações no sistema normativo:
ADICIONAL DE PERICULOSIDADE – BASE DE CÁLCULO – ALTERAÇÃO. Ausente parâmetro de controle a estabelecer patamar mínimo alusivo ao adicional de periculosidade, surge constitucional ato normativo mediante o qual alterada base de cálculo. NORMA INFRACONSTITUCIONAL – PAR METRO DE CONTROLE ESTRITO – VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL – IMPROPRIEDADE.
Tendo em conta avanço na tutela de direitos mediante norma infraconstitucional, é impróprio, considerado tratamento estrito dado à matéria pela Constituição Federal, potencializar o princípio da vedação ao retrocesso social, a ponto de, invertendo a ordem natural, transformar em cláusula pétrea legislação ordinária ou complementar
. (STF - ADI: 5013 DF, Relator: EDSON FACHIN, Data de Julgamento: 24/08/2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 16/11/2020)
Com efeito, segundo enfatizou o STF, o postulado da vedação do retrocesso não teria o condão de converter em cláusulas pétreas normas veiculadas em legislação infraconstitucional, sob pena de se sacrificar o próprio processo legislativo, com a indispensável necessidade de adequação da estrutura às crises de conjuntura, para além da modificação da percepção dos fatos ou mesmo modificação dos valores coletivos. Enfim, a vedação do retrocesso social - conquanto seja relevante - não pode se degradar em uma espécie de mantra retórico que assegure ao Poder Judiciário simplesmente desconsiderar opções promovidas pelo Congresso.
2.40.
Mudanças climáticas
e desmatamento:
Como notório, o clima é composto por inúmeros e complexos fatores, a exemplo da temperatura, pressão, umidade, imbricados entre si, havendo também uma estreita relação entre meteorologia e climatologia. Logo, em princípio, a alteração do clima depende de eventos de significativa dimensão, a exemplo de erupções vulcânicas, lançamento de chumbo na atmosfera, decorente da octanagem da gasolina, bastante comum décadas atrás, alvo do alerta do geofísico Clair Patterson
, ao buscar calcular a idade da Terra. Cumpre não perder de vista, porém, que o clima pode ser afetado por eventos acumulativos, que vão se agregando a ponto de modificar a relação entre os fatores componentes do sistema-gaia.
O clima deve ser modelado através de
sistemas dinâmicos não lineares
, com o uso de
equações diferenciais parciais (EDPs)
, comumente empregadas para se avaliar o caos e a imprevisibilidade, condicionados, em parte, pelos eventos pretéritos.
Sabe-se que matemático e físico Pierre Simon Laplace chegou a acreditar que o futuro seria previsível, podendo ser antevisto, contanto que lhe fossem informadas as posições e velocidades de todas as partículas
. Isso não resistiu, porém, ao conhecido problema dos três corpos, enfrentado por Euler, Lagrange, Poincarè etc. Nesse âmbito, a complexidade surge da mútua afetação de vários elementos (
complexus:
emaranhado, tecido junto
). A isso se soma a conhecida ausência de causalidade linear no âmbito da física moderna, notadamente da mecânica quântica.
O exame do clima envolve essa mesma complexidade, por conta dos muitos elementos que se afetam reciprocamente
. Daí que, a despeito dos computadores de alta performance, ainda hoje os meteorologistas indicam variações meramente aproximadas de temperatura e mesmo presságios a respeito da variação do tempo, em curto período de dias. Sem dúvida que a possível utilização de computadores quânticos, com suficiente poder de cálculo para a solução de sistemas de equações complexas, pode tornar essa avaliação mais acurada.
O fato é que
"
Nos últimos anos temos assistido os impactos do aquecimento global gerado pelo uso irracional dos recursos naturais somados ao desmatamento da cobertura vegetal. Vários estudos apontam que o aquecimento global é uma realidade e precisa ser combatido. Assim durante a Conferência de Kyoto, em 1997, pesquisadores de todo o mundo, desenvolveram o que se chama o Mercado de Carbono, o que se chamou de Protocolo de Kyoto, porém somente no encontro de Montreal, em 2005, foram iniciadas as discussões para um segundo período de compromisso dos países membros da convenção. Ressalta-se que a proposta ganhou apoio oficial de diversos países somente nos últimos 5 anos, passando a ser conhecida como REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal)
. O propósito final desses mecanismos para o mercado de carbono obviamente é criar um mundo onde o balanço entre derrubadas e plantio/regeneração de floresta seja algo igual a zero. De acordo com estudo comissionado pelo governo britânico em 2008 a um time liderado pelo empresário Johan Eliasch, uma quantia de 27 bilhões de dólares poderia ser investida anualmente até 2020 em esquemas de redução de emissões por desmatamento. Um terço do valor seria obtido no mercado de carbono, com capacidade de cortar pela metade o desmatamento de florestas tropicais ao redor do globo ao incentivar proprietários rurais, assentados de reforma agrária e povos tradicionais a conservar a floresta. Há um longo caminho a percorrer. Os benefícios do REDD dependem do fortalecimento da governança e fiscalização ambiental do governo contra atividades ilegais. O cenário é positivo. Em 2008, foi criado o Fundo Amazônia para captar doações destinadas a financiar a prevenção e combate ao desmatamento. No ano seguinte, durante a 15ª Conferência da ONU sobre Mudança no Clima, em Copenhague, na Dinamarca, o Brasil assumiu que irá diminuir o desmatamento na Amazônia brasileira em 80% até 2020 em comparação aos índices de 2005. O compromisso está atrelado às metas voluntárias para a redução das emissões de carbono anunciadas naquela ocasião e deverá influenciar a atividade madeireira. Novas regras, métodos de controle, incentivos e exigências do mercado nacional e internacional estão por vir, com reflexos nas práticas produtivas ao longo de toda a cadeia até o consumo final da madeira."
(CRUZ, Gilson Araújo da.
O
desmatamento
da Floresta Amazônica e a Lei dos Crimes Ambientais brasileira:
aspectos do desmatamento e da ineficiência na execução das penas estabelecidas na lei 9.605/98. São Paulo: Dialética. 2022. p. 37).
Há certo consenso de que a degradação das floretas podem impactar severamente o clima, por conta do lançamento de significativo volume de CO
2
na atmosfera, seja por conta do comprometimento da sua função de regulador térmico. Sem mencionar o fato de que ela serve de habitat e fonte de vida para milhares - talvez, milhões - de espécies, no contato com o rio Amazonas
. Assim, o interesse na preservação da Mata Atlântica transcende as predileções ou vantagens almejadas pelo povo brasileiro. É do interesse de todos os povos que ela seja preservada. Transcende também o tempo presente, dado cuidar-se de dever dos nascidos em assegurar a sua manutenção e preservação em prol dos não nascidos. Como disse antes, tomamos a Terra em empréstimo dos que virão. Se é fato que não podemos falar de direito subjetivo por parte de quem ainda não existe, estamos inexoravelmente obrigados a manter as condições que tornam a vida possível na terra, em prol da Humanidade como um todo, o que compreende as gerações futuras, contanto que haja futuro, o que depende, enfim, também do tempo presente.
Atente-se para a seguinte notícia:
"
Desmatamento de florestas vai provocar um aquecimento do clima global muito mais intenso do que o estimado originalmente, devido às alterações nas emissões de compostos orgânicos voláteis e as co-emissões de dióxido de carbono com gases reativos e gases de efeito estufa de meia-vida curta. Um time internacional de pesquisadores, com a participação do Instituto de Física da USP e na UNIFESP-Campus Diadema, calculou a forçante radiativa do desmatamento, levando em conta não somente o CO2 emitido, mas também o metano, o black carbon, a alteração no albedo de superfície e todos os efeitos radiativos conhecidos. O resultado final aponta que a temperatura vai subir mais do que o previsto anteriormente
.
A pesquisa foi publicada recentemente na revista Nature Communications, e utilizou detalhados modelos climáticos globais acoplados à química de gases e partículas em alta resolução. Descobriu-se que as emissões de florestas que resfriam o clima (compostos orgânicos voláteis biogênicos, os BVOCs) ficarão menores, implicando que o desflorestamento pode levar a temperaturas mais altas do que o considerado em estudos anteriores. O físico Paulo Artaxo, do IFUSP, um dos autores do estudo, afirma que a maior parte dos estudos dos impactos climáticos do desmatamento publicados anteriormente focou somente nas emissões de CO2. “Neste novo estudo, levamos em conta a redução das emissões de BVOCs, a emissão de black carbon, metano e os demais gases de efeito estufa de vida curta”, explica. Esses BVOCs, segundo Artaxo, produzem partículas nanométricas que crescem, refletem radiação solar de volta ao espaço e esfriam o clima.
Os BVOCs participam de complexas reações químicas e podem produzir ozônio e metano, ambos gases de efeito estufa de meia vida curta (SLCF) que aquecem o planeta. O estudo levou em conta todos estes fatores conjuntamente, além das mudanças no albedo de superfície, quando derrubamos uma floresta e a trocamos para pastagem ou plantações”, acrescenta. Levando em conta todos estes fatores, observou-se que as emissões das florestas que esfriam o clima têm um papel enorme na regulação da temperatura do planeta. “Derrubando as florestas, acabamos com este efeito esfriador, e aumentamos o aquecimento global”. Artaxo coloca que o efeito global é de um aquecimento adicional de 0.8oC, em um cenário de desmatamento total. “Isso é um valor alto, comparável ao atual aquecimento médio global (cerca de 1.2oC) ocorrido com todas as emissões antropogênicas desde 1850”, diz o físico. A figura abaixo mostra que esse aquecimento é desigual, sendo maior nos trópicos, onde foi previsto um aquecimento de cerca de 2 graus na Amazônia. Luciana Rizzo, professora da Universidade Federal de São Paulo, campus de Diadema, outra coautora do estudo, salienta que, nos trópicos, o efeito atual das emissões de VOCs resfriando o clima é mais forte do que em florestas temperadas. “Portanto, o desmatamento nos trópicos tem um efeito mais importante no clima global”, conclui." (https://www.icict.fiocruz.br/sites/www.icict.fiocruz.br/files/Desmatamento%20e%20efeitos%20no%20clima%20global%20Artigo%20Nature%20Comm.pdf)
Leia-se:
https://www.nature.com/articles/s41467-017-02412-4.
Conquanto o estudo normalmente tome em conta a Floresta Amazônica, sua análise aplica-se também à Mata Atlântica.
2.41. Exoneração - APP e RL:
Por outro lado,
AINDA COM COGNIÇÃO PRECÁRIA
, registro que, na sua redação original, o anterior Código Florestal (lei 4771/1965) dispunha que as áreas com florestas sob regime de preservação permanente e também as áreas com florestas plantadas para fins de exploração madeireira ficariam isentas da incidência do ITR (art. 39). Aquela lei ressalvava, de todo modo, que
"Se a floresta for nativa, a isenção não ultrapassará de 50% (cinquenta por cento) do valor do imposto, que incidir sobre a área tributável
."
Esse preceito foi revogado, tempos depois, pela lei 5868/1972. Já a lei 8171/1991 dispôs, porém, o que segue: Art. 104.
"São isentas de tributação e do pagamento do Imposto Territorial Rural as áreas dos imóveis rurais consideradas de preservação permanente e de reserva legal, previstas na Lei n° 4.771, de 1965, com a nova redação dada pela Lei n° 7.803, de 1989. Parágrafo único. A isenção do Imposto Territorial Rural (ITR) estende-se às áreas da propriedade rural de interesse ecológico para a proteção dos ecossistemas, assim declarados por ato do órgão competente federal ou estadual e que ampliam as restrições de uso previstas no caput deste artigo."
Atente-se ainda para a lei 9393/1996, art. 10:
Art. 10. A apuração e o pagamento do ITR serão efetuados pelo contribuinte, independentemente de prévio procedimento da administração tributária, nos prazos e condições estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal, sujeitando-se a homologação posterior. § 1º Para os efeitos de apuração do ITR, considerar-se-á: II - área tributável, a área total do imóvel, menos as áreas: a)
de preservação permanente e de reserva legal
, previstas na Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, com a redação dada pela Lei nº 7.803, de 18 de julho de 1989; b)
de interesse ecológico para a proteção dos ecossistemas, assim declaradas mediante ato do órgão competente, federal ou estadual, e que ampliem as restrições de uso previstas na alínea anterior;
c) comprovadamente imprestáveis para qualquer exploração agrícola, pecuária, granjeira, aqüícola ou florestal, declaradas de interesse ecológico mediante ato do órgão competente, federal ou estadual
;
Essa redação foi pontualmente alterada com a publicação do novo Código Florestal (lei 12.651/2012), passando a veicular a atual redação:
Art. 10, §1º, II da lei 9393 -
Área tributável
, a área total do imóvel,
MENOS
as áreas: a)
de preservação permanente e de reserva legal
, previstas na Lei no 12.651, de 25 de maio de 2012; (Redação dada pela Lei nº 12.844, de 2013) (Vide art. 25 da Lei nº 12.844, de 2013) b) de
interesse ecológico
para a proteção dos ecossistemas, assim declaradas mediante ato do órgão competente, federal ou estadual, e que ampliem as restrições de uso previstas na alínea anterior; c)
comprovadamente imprestáveis
para qualquer exploração agrícola, pecuária, granjeira, aqüícola ou florestal, declaradas de interesse ecológico mediante ato do órgão competente, federal ou estadual; d) sob regime de servidão ambiental; (Redação dada pela Lei nº 12.651, de 2012). e) cobertas por florestas nativas, primárias ou secundárias em estágio médio ou avançado de regeneração; (Incluído pela Lei nº 11.428, de 2006) f) alagadas para fins de constituição de reservatório de usinas hidrelétricas autorizada pelo poder público. (Incluído pela Lei nº 11.727, de 2008)
Percebe-se, portanto, que a legislação preconizou uma isenção para a propriedade de área de preservação permanente (APP) e também para a propriedade de área de reserva legal (ARL). Ao mesmo tempo, determinou o abatimento, no cálculo pertinente, das áreas de interesse ecológico, áreas imprestáveis, servidão ambiental, áreas cobertas por florestas nativas, primárias e secundárias e, por fim, áreas alagadas para constituição de reservatório de hidrelétricas.
2.42. Conceito de APP e RL:
Com apreciação CONTINGENTE, suscetível de nova avaliação em sentença, anoto que, no momento, deve-se atentar para alguns desses conceitos (área de preservação permanente, reserva legal etc., conforme art. 110, Código Tributário Nacional/66).
O art. 1º, §2º, II, lei 4771/1965, com a redação veiculada pela MP 2.166-67/2001 preconizou o seguinte:
"Para os efeitos deste Código, entende-se por (...) II - área de preservação permanente: área protegida nos termos dos artigos 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.
"
De outro tanto, o art. 3º do atual Código Florestal (lei 12.651/2012) acolheu conceito semelhante: "
Para os efeitos desta Lei, entende-se por: (...) II - Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas."
Edson Ferreira de Carvalho sustenta que
"As áreas de preservação permanente - APP's são essenciais ao bom funcionamento dos sistemas ecológicos e ao bem-estar humano. Atuam no controle da erosão nos topos dos morros, nas áreas inclinadas e nas margens dos cursos hídricos, evitando o assoreamento das calhas por onde escoam as águas. Diminuem a ocorrência de deslizamento de terras e pedras, e minimizam os efeitos de enchentes. Mantêm a quantidade e a qualidade das águas. Reduzem o fluxo hídrico superficial. Filtram resíduos de produtos químicos, como agrotóxicos e fertilizantes, e servem de abrigo e fonte de alimento para a fauna
." (CARVALHO, Edson Ferreira.
Curso de direito florestal brasileiro:
sistematizado e esquematizado. Curitiba: Juruá, 2013, p. 275).
Importante, ademais, atentar para o que segue:
"Em primeiro lugar,
deflui do conceito legal de APP que a proteção dessas áreas independe da existência de cobertura vegetal
. Em segundo plano, se nela existir vegetação, natural ou plantada, ela deve ser preservada. Em terceiro lugar, não importa se a vegetação é nativa ou exótica (originária de outro país). Em quarto lugar, é errônea a ideia de que a vegetação de APP deve ser arbórea, embora esta seja desejável. Uma sapezal (Imperata brasiliensis) ou um gramado, desde que localizado nas áreas mencionadas, pela letra da lei, é considerado vegetação de preservação permanente, principalmente quando exercem o papel de pioneiras no processo de sucessão vegetacional. Na hipótese de existência de APP sem vegetação, esta deverá ser recomposta e conduzida ao estado arbóreo para que exerça plenamente suas funções ecológicas
." (CARVALHO, Edson Ferreira.
Obra cit.,
p. 281).
EM PRIMEIRA ANÁLISE, aludidas áreas - mesmo quando submetidas ao domínio privado -
exercem elevada função pública
. Tanto por isso, a legislação exonera o proprietário da incidência do ITR, como uma espécie de reconhecimento das dificuldades para a exploração econômica respectiva.
Por sinal, com a redação veiculada pela
lei 12.727/2012
, o art. 41 do novo Código Florestal estipula o seguinte:
Art. 41. É o Poder Executivo federal autorizado a instituir, sem prejuízo do cumprimento da legislação ambiental, programa de apoio e incentivo à conservação do meio ambiente, bem como para adoção de tecnologias e boas práticas que conciliem a produtividade agropecuária e florestal, com redução dos impactos ambientais, como forma de promoção do desenvolvimento ecologicamente sustentável, observados sempre os critérios de progressividade, abrangendo as seguintes categorias e linhas de ação:
II -
compensação
pelas
medidas
de
conservação ambiental
necessárias para o cumprimento dos objetivos desta Lei, utilizando-se dos seguintes instrumentos, dentre outros: (...)
c) dedução das Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso restrito da base de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR, gerando créditos tributários.
As áreas de uso restrito estão definidas nos arts. 10 e 11 da mencionada lei 12.651/2012. A lei 8171/1991 também reportou-se, como visto, à área de reserva legal. Trata-se de conceito inicialmente verbalizado pela lei 7803/1989 (art. 1º, II e V), e posteriormente modificado pela MP 2.166-67/2001.
Art. 1º, §2º - lei 4.771/65 - Para os efeitos deste Código, entende-se por: (...) III - Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.
O atual Código Florestal preconiza que a reserva legal é a
"área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa
." (art. 3º, III).
Cuida-se, aparentemente, de uma espécie de obrigação
propter rem
(STJ, REsp 343741/PR, rel. Min. Franciulli Neto, DJU de 07.10.2002, p. 225). O art. 12 do novo Código Florestal estipula que todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de reserva legal, sem prejuízo das normas atinentes às APPs. O art. 17 da mencionada lei dispõe que
"
a Reserva Legal deve ser conservada com cobertura de vegetação nativa pelo proprietário do imóvel rural, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado
."
2.43. Apresentação do ADA - exame não exaustivo:
Desse modo, APARENTEMENTE, para se determinar a área tributável quando do preenchimento da DITR, as áreas indicadas podem ser excluídas e desconsideradas pelo contribuinte. É sabido que o art. 10 do decreto 4.382/2002 condicionou aludido abatimento/isenção à prévia apresentação, perante o IBAMA, de ato declaratório ambiental - ADA:
Art. 10, §3º Para fins de exclusão da área tributável, as áreas do imóvel rural a que se refere o caput deverão: I - ser obrigatoriamente informadas em Ato Declaratório Ambiental - ADA, protocolado pelo sujeito passivo no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, nos prazos e condições fixados em ato normativo (Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, art. 17-O, § 5º, com a redação dada pelo art. 1º da Lei nº 10.165, de 27 de dezembro de 2000); e II - estar enquadradas nas hipóteses previstas nos incisos I a VI em 1º de janeiro do ano de ocorrência do fato gerador do ITR.
Deve-se considerar, contudo, que o art. 10, §7º, lei 9393 (redação veiculada pela MP 2.166-67) dispõe o seguinte:
"A declaração para fim de isenção do ITR relativa às áreas de que tratam as alíneas 'a' e 'd' do inciso II, § 1o, deste artigo,
não está sujeita à prévia comprovação por parte do declarante
, ficando o mesmo responsável pelo pagamento do imposto correspondente, com juros e multa previstos nesta Lei, caso fique comprovado que a sua declaração não é verdadeira, sem prejuízo de outras sanções aplicáveis
."
Em primeiro exame, os Tribunais têm reputado que a mencionada isenção à prévia apresentação da ADA (ato declaratório ambiental). Aquilo que a lei dispensa, o decreto regulamentar não pode exigir (art. 150, CF).
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. ITR. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. EXCLUSÃO. DESNECESSIDADE DE ATO DECLARATÓRIO DO IBAMA. MP. 2.166-67/2001. APLICAÇÃO DO ART. 106, DO CTN. RETRO-OPERÂNCIA DA LEX MITIOR 1. Autuação fiscal calcada no fato objetivo da exclusão da base de cálculo do ITR de área de preservação permanente, sem prévio ato declaratório do IBAMA, consoante autorização da norma interpretativa de eficácia ex tunc consistente na Lei 9.393/96. 2. A MP 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, ao inserir § 7º ao art. 10, da lei 9.393/96, dispensando a apresentação, pelo contribuinte, de ato declaratório do IBAMA, com a finalidade de excluir da base de cálculo do ITR as áreas de preservação permanente e de reserva legal, é de cunho interpretativo, podendo, de acordo com o permissivo do art. 106, I, do CTN,
aplicar-se a fatos pretéritos
, pelo que indevido o lançamento complementar,
ressalvada a possibilidade da Administração demonstrar a falta de veracidade da declaração contribuinte
. 3. Consectariamente, forçoso concluir que a MP 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, que dispôs sobre a exclusão do ITR incidente sobre as áreas de preservação permanente e de reserva legal, consoante § 7º, do art. 10, da Lei 9.393/96, veicula regra mais benéfica ao contribuinte, devendo retroagir, a teor disposto nos incisos do art. 106, do CTN, porquanto referido diploma autoriza a retro-operância da lex mitior. 4. Estabelece o parágrafo 4º do artigo 39 da Lei nº 9.250/95 que: 'A partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada.' 5. A taxa SELIC representa a taxa de juros reais e a taxa de inflação no período considerado e não pode ser aplicada, cumulativamente, com outros índices de reajustamento. 6. Destarte, assentando o Tribunal que ''verifica-se, entretanto, que na data da lavratura do auto de infração 15/04/2001, já vigia a Medida Provisória de n. 2.080-60 de 22 de fevereiro de 2001, que acrescentou o parágrafo sétimo do art. 10 da Lei 9.393/96, onde o contribuinte não está sujeito à comprovação de declaração para fins de isenção do ITR. Ademais, há nos autos às fls. 37, 45, 46, 66, 69, documentos hábeis a comprovar que na área do imóvel está incluída áreas de preservação permanente (208,0ha) e de reserva legal (100 ha) que são isentas à cobrança do ITR, consoante o art. 10 da Lei 9393/96''. Invadir esse campo de cognição, significa ultrapassar o óbice da Súmula 7/STJ. 7.Recurso especial parcialmente conhecido improvido. ..EMEN: (RESP 200400998650, LUIZ FUX, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJ DATA:13/02/2006 PG:00674 RSTJ VOL.:00205 PG:00096 ..DTPB:.)
Nesse mesmo sentido, menciono os seguintes julgados:
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ITR. ISENÇÃO. ATO DECLARATÓRIO AMBIENTAL (ADA). PRESCINDIBILIDADE. PRECEDENTES. ÁREA DE RESERVA LEGAL. AVERBAÇÃO NA MATRÍCULA DO IMÓVEL. INOVAÇÃO RECURSAL. VEDAÇÃO. 1.
A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que 'é desnecessário apresentar o Ato Declaratório Ambiental - ADA para que se reconheça o direito à isenção do ITR, mormente quando essa exigência estava prevista apenas em instrução normativa da Receita Federal (IN SRF 67/97)'
(AgRg no REsp 1310972/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 5.6.2012, DJe 15.6.2012). 2. A alegação da agravante, de que é imprescindível a averbação na matrícula do imóvel para o gozo da isenção de ITR relativamente à área de reserva legal, reveste-se de inovação recursal, visto que as razões do recurso especial limitaram-se a aduzir que o Ato Declaratório Ambiental (ADA) era o requisito necessário para a concessão do benefício fiscal. 3. Conforme a pacífica jurisprudência, é vedada a inovação recursal, seja em agravo regimental seja em embargos de declaração. Agravo regimental improvido. ..EMEN: (AGARESP 201201088001, HUMBERTO MARTINS, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:14/09/2012 ..DTPB:.)
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO TERRITORIAL RURAL. RESERVA LEGAL. ISENÇÃO. ATO DECLARATÓRIO AMBIENTAL. INEXIGIBILIDADE. PRECEDENTES. 1.
É prescindível a apresentação do Ato Declaratório Ambiental-ADA para que se reconheça o direito à isenção do ITR, mormente quando essa exigência estava prevista apenas em instrução normativa da Receita Federal
(IN SRF n.º 67/97). Precedentes de ambas as Turmas de Direito Público. 2. Agravo regimental não provido. ..EMEN: (AGRESP 200901864920, CASTRO MEIRA, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:04/05/2012 ..DTPB:.)
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ITR. ISENÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVAS. MULTA. ALEGAÇÃO DE CARÁTER CONFISCATÓRIO. INCIDÊNCIA DE JUROS. 1. No que diz respeito às isenções para fins de ITR, a legislação ambiental (artigo 104, § único, da Lei de Política Agrícola - Lei 8.171/91) prevê que são isentas da tributação as áreas (i) de preservação permanente, (ii) de reserva legal e (iii) de interesse ecológico para a proteção dos ecossistemas (assim reconhecidas pelo órgão ambiental responsável), nestas últimas incluídas as RPPNs - Reservas Particulares do Patrimônio Nacional, as Áreas de Proteção Ambiental e as Áreas de Relevante Interesse Ecológico. 2.
Não é necessária a apresentação do ADA para a configuração de áreas de reserva legal e/ou preservação permanente e conseqüente exclusão do itr incidente sobre tais áreas
. 3.
A isenção decorrente do reconhecimento da área não tributável pelo ITR não fica condicionada à averbação, a qual possui tão-somente o condão de declarar uma situação jurídica já existente, não possuindo caráter constitutivo
. 4. No caso dos autos, cabível o reconhecimento do direito tão-somente em relação às áreas averbadas junto ao Registro de Imóveis, tendo em vista que, no tocante as demais, não foi produzida prova de que se tratem de áreas cujas características permitam a isenção pretendida. 5. O Supremo Tribunal Federal tem admitido a redução de multa moratória imposta com base em lei, quando assume ela, pelo seu montante desproporcionado, feição confiscatória. No caso, a multa fixada não tem caráter confiscatório, atendendo às suas finalidades educativas e de repressão da conduta infratora. 6. Insubsistente a alegação de aplicação de juros de mora sobre o valor da multa, tendo em vista ter restado demonstrado que não ocorreu tal incidência. (APELREEX 200872050043966, LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, TRF4 - SEGUNDA TURMA, D.E. 27/01/2010.)
A tanto igualmente converge a Súmula 86 do TRF 4: "
É desnecessária a apresentação de Ato Declaratório Ambiental - ADA para o reconhecimento do direito à isenção de Imposto Territorial Rural - ITR.
Todavia, para o gozo da isenção do ITR no caso de área de "reserva legal", é imprescindível a averbação da referida área na matrícula do imóvel
."
2.44. Averbação de área de
reserva
legal:
No que toca à averbação da área de reserva legal, cumpre ter em conta que o
art. 16 da lei 4771/1965
(c/ lei 7803) exigia que a área de reserva ambiental fosse anotada à margem da inscrição da matrícula do imóvel, no registro imobiliário pertinente. Em que pese isso, também foram prolatadas decisões reputando desnecessária aludida averbação, para fins de fruição da exoneração fiscal:
TRIBUTÁRIO. ITR. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E DE RESERVA LEGAL. ISENÇÃO. EXIGÊNCIA DE ATO DECLARATÓRIO AMBIENTAL (ADA) E DE AVERBAÇÃO COMO REQUISITO PARA O BENEFÍCIO. DESCABIMENTO. EXTENSÃO DA RESERVA LEGAL. LIMITE MÍNIMO. PROVA. 1.
As exigências estabelecidas pelo Decreto nº 4.382/2002 não estão em conformidade com a Lei nº 9.393/1996, no que se refere às áreas de preservação permanente e de reserva legal
. 2. A Lei nº 9.393/1996 não institui outro dever ao contribuinte além da obrigação de prestar declaração para o fim de isenção do ITR, nos instrumentos apropriados para tal objetivo (Documento de Informação e Atualização Cadastral do ITR - DIAC e Documento de Informação e Apuração do ITR - DIAT), por meio dos quais são prestadas anualmente as informações solicitadas no interesse da fiscalização. 3. A Medida Provisória n.º 2.166-67/2001, ao incluir o § 7º no art. 10 da Lei nº 9.393, dirimiu a questão, esclarecendo que não mais cabe erigir a apresentação do ADA como requisito necessário para demonstrar a destinação das áreas de preservação permanente e de reserva legal, bastando a entrega da declaração de isenção de ITR. 4.
O § 7º do art. 10 da Lei nº 9.393/1996 possui cunho interpretativo, visto que a redação original do art. 10 já previa, no inciso II do § 1º, a exclusão das áreas de preservação permanente e de reserva legal da área tributável, e como tal, retroage para beneficiar o contribuinte, a teor do art. 106, inciso I, do CTN
. 5.
Há de ser afastada, também, a exigência de averbação das áreas de reserva legal no registro de imóveis, para o fim de isenção do ITR, pois esse requisito não possui previsão no art. 10 da Lei nº 9.393/1996
. Aliás, se for investigado o caráter teleológico da norma inserta no dispositivo invocado pelo fisco para amparar a autuação - art. 16, § 2º, da Lei nº 4.771/1965 (Código Florestal), incluído pela Lei nº 7.803/1989 -,
percebe-se que a finalidade da averbação é possibilitar a publicidade a terceiros, com o intuito de manter a restrição de uso sobre a reserva legal, já que esse dispositivo veda expressamente a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão da propriedade, a qualquer título, ou de desmembramento da área
. 6. Por outro lado, mostra-se irrazoável entender que a averbação da reserva legal no registro de imóveis é condição para usufruir da isenção. Na verdade, a isenção de ITR é apenas uma contrapartida do Estado à restrição ao direito de propriedade, estabelecida em benefício dos interesses e direitos difusos identificados com a proteção ambiental. Porém, as despesas de averbação são suportadas unicamente pelo proprietário rural, salvo se for pequena propriedade ou posse rural familiar. Nessa senda, exigir uma despesa para gozar de uma compensação legal contraria o próprio desiderato da Lei nº 9.393/1996. 7. Pode o contribuinte se valer de outros meios pelos quais exsurge a natureza das áreas rurais de sua propriedade, para justificar o aproveitamento do benefício a elas estendido. Descabe alegar, nessa senda, que a extensão das áreas objeto da isenção está restrita ao limite mínimo estabelecido pela Lei nº 4.771/1965 para a reserva legal, desde que haja comprovação nos autos de que as áreas com essa destinação abrangem percentual maior do que o definido pela legislação. Caso o contribuinte não produza a prova, aí sim, deve valer o limite mínimo de 20%. (AC 200670010039800, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, D.E. 23/03/2011)
APARENTEMENTE, tem prevalecido junto aos Tribunais, porém, solução distinta, como evidenciam os julgados abaixo transcritos:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ÁREA DE RESERVA LEGAL. IMPRESCINDIBILIDADE DA AVERBAÇÃO JUNTO AO REGISTRO DE IMÓVEIS PARA FRUIÇÃO DA ISENÇÃO DO IMPOSTO TERRITORIAL RURAL - ITR. OMISSÃO VERIFICADA. POSSIBILIDADE DE ATRIBUIR EFEITO INFRINGENTE AO JULGADO. 1. Registra-se que "os recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2, aprovado pelo Plenário do Superior Tribunal de Justiça em 9/3/2016). 2. Os embargos de declaração são cabíveis quando o provimento jurisdicional padece de omissão, contradição ou obscuridade, consoante o que dispõe o art. 535, I e II, do CPC/1973, bem como para sanar a ocorrência de erro material. 3. O acórdão embargado apenas tratou da área de preservação permanente, a despeito de constar, no arrazoado do apelo nobre, impugnação respeitante à isenção de ITR relativamente à área de reserva legal não averbada junto ao registro de imóveis. Logo, ressoa evidente a ocorrência de omissão, a qual legitima imprimir efeito infringente ao julgado. 4. A
pretensão da União, ora embargante, merece acolhida quanto ao ponto não apreciado no anterior julgamento. Isso porque a jurisprudência do STJ assenta ser "[...] imprescindível a averbação da área de reserva legal à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, para que o contribuinte obtenha a isenção do imposto territorial rural prevista no art. 10, II, a, da Lei n. 9.393/1996
" ( REsp 1.638.210/MG, Relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 5/12/2017). Outro precedente: AgRg no REsp 1.429.841/SC, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 25/2/2019. 5. Embargos de declaração acolhidos, com excepcional atribuição de efeito infringente ao julgado. (STJ - EDcl no AgRg no REsp: 1395393 MG 2013/0242484-4, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 09/09/2019, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/09/2019)
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ÁREA DE RESERVA LEGAL. IMPRESCINDIBILIDADE DA AVERBAÇÃO JUNTO AO REGISTRO DE IMÓVEIS PARA FRUIÇÃO DA ISENÇÃO DO IMPOSTO TERRITORIAL RURAL - ITR. OMISSÃO VERIFICADA. POSSIBILIDADE DE ATRIBUIR EFEITO INFRINGENTE AO JULGADO. 1. Registra-se que "os recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2, aprovado pelo Plenário do Superior Tribunal de Justiça em 9/3/2016). 2. Os embargos de declaração são cabíveis quando o provimento jurisdicional padece de omissão, contradição ou obscuridade, consoante o que dispõe o art. 535, I e II, do CPC/1973, bem como para sanar a ocorrência de erro material. 3. O acórdão embargado apenas tratou da área de preservação permanente, a despeito de constar, no arrazoado do apelo nobre, impugnação respeitante à isenção de ITR relativamente à área de reserva legal não averbada junto ao registro de imóveis. Logo, ressoa evidente a ocorrência de omissão, a qual legitima imprimir efeito infringente ao julgado. 4. A pretensão da União, ora embargante, merece acolhida quanto ao ponto não apreciado no anterior julgamento.
Isso porque a jurisprudência do STJ assenta ser "[...] imprescindível a averbação da área de reserva legal à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, para que o contribuinte obtenha a isenção do imposto territorial rural prevista no art. 10, II, a, da Lei n. 9.393/1996" ( REsp 1.638.210/MG, Relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 5/12/2017). Outro precedente: AgRg no REsp 1.429.841/SC, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 25/2/2019. 5. Embargos de declaração acolhidos, com excepcional atribuição de efeito infringente ao julgado
. (STJ - EDcl no AgRg no REsp: 1395393 MG 2013/0242484-4, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 09/09/2019, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/09/2019)
TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. INCLUSÃO DA ÁREA DE RESERVA LEGAL NA BASE DE CÁLCULO DO ITR. CABIMENTO. AVERBAÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. NECESSIDADE. PRECEDENTES DA PRIMEIRA SEÇÃO. 1.
A Primeira Seção desta Corte, ao julgar o EREsp n.º 1.027.051/SC, firmou compreensão no sentido de que a fruição da isenção fiscal prevista no art. 10, § 1º, II, a, da Lei nº 9.393/96, relativa ao imposto territorial rural, está condicionada à prévia averbação da área de reserva legal no respectivo registro imobiliário. No mesmo sentido: EREsp n.º 1.310.871/PR, Rel. Ministro Ari Pargendler, Primeira Seção, DJe 04/11/2013
. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ - AgRg no AREsp: 227318 PR 2012/0186565-8, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 26/11/2013, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/12/2013)
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO TERRITORIAL RURAL. ÁREA DE RESERVA LEGAL. AVERBAÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. NECESSIDADE. 1. Esta Turma, na esteira da jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, afastou a necessidade de apresentação do Ato Declaratório Ambiental - ADA e de averbação no registro imobiliário para que o contribuinte pudesse usufruir da isenção do Imposto Territorial Rural - ITR incidente sobre as áreas de preservação permanente e de reserva legal. 2. "
Contudo, a partir do julgamento dos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 1028051/SC (julgado em 28/08/2013, DJe 21/10/2013), o STJ firmou o entendimento de que para fins de isenção do ITR, prevista no art. 10, § 1º, II, a, da Lei n. 9.393/96, necessária averbação da área de reserva legal no registro de imóveis". Precedentes desta Corte e do egrégio Superior Tribunal de Justiça. 3. Assim, esta colenda Turma, em sintonia com o entendimento do egrégio Superior Tribunal de Justiça, adota idêntico posicionamento quanto à área de reserva legal
. 4. Apelação e remessa oficial providas. (TRF-1 - AC: 00017364420134014103, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL HERCULES FAJOSES, Data de Julgamento: 17/12/2019, SÉTIMA TURMA, Data de Publicação: 24/01/2020)
AMBIENTAL E TRIBUTÁRIO. LANÇAMENTO SUPLEMENTAR. ITR. COMPLEMENTAÇÃO DA INTEGRALIDADE DA ÁREA DE RESERVA LEGAL. AVERBAÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO DEPOIS DO FATO GERADOR. LEGITIMIDADE DA AUTUAÇÃO. MULTA DE 75% DO VALOR NÃO DECLARADO PELO CONTRIBUINTE. CARÁTER CONFISCATÓRIO. REDUÇÃO. TAXA SELIC. LEGALIDADE. 1. Esta Turma, na esteira da jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça, vinha afastando a necessidade de apresentação do Ato Declaratório Ambiental - ADA e de averbação no registro imobiliário para que o contribuinte pudesse usufruir da isenção do ITR incidente sobre as áreas de preservação permanente e de reserva legal. 2. "
Contudo, a partir do julgamento dos Embargos de Divergência no Recurso Especial n. 1027051/SC (julgado em 28/08/2013, DJe 21/10/2013), o STJ firmou o entendimento de que para fins de isenção do ITR, prevista no art. 10, § 1º, II, a, da Lei n. 9.393/96, necessária averbação da área de reserva legal no registro de imóveis". Precedentes da Oitava Turma desta Corte e do STJ
. 3. Assim, necessária é a adequação da jurisprudência desta Turma à nova orientação do colendo Superior Tribunal de Justiça em relação à área de reserva legal. 4. Auto de infração mantido em relação à área de reserva legal pela falta de averbação do respectivo cômputo total no cartório de registro de imóveis, antes do fato gerador do ITR (1º/1/1999). 5. Devida a redução da multa de 75% (setenta e cinco por cento) aplicada pelo Fisco sobre o valor não declarado pelo contribuinte, em razão do caráter confiscatório. A Sanção pecuniária deve ser cominada em 20% (vinte por cento) que representa patamar razoável e apto a cumprir a função de prevenir e reprimir a mora do contribuinte; ressaltando-se que tal redução da multa exigida pela Fazenda Nacional não significa a ocorrência de Controle de Constitucionalidade, em face de não haver pronunciamento da impossibilidade de aplicação ou inconstitucionalidade do texto legal contido no art. 44, I da Lei nº 9.430/96. Precedentes. 6. "A constitucionalidade/legalidade da incidência da taxa SELIC aos débitos tributários, não merece mais questionamentos, impondo-se a partir de 01/01/1996, art. 39, § 4º, da Lei nº 9.250/95, não devendo ser cumulada com outros índices de correção monetária e juros, não representando anatocismo." (REsp 1111175/SP, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/06/2009, DJe 01/07/2009). 7. Apelação e remessa oficial parcialmente providas, a fim de reconhecer a legitimidade da autuação, mantendo-se na base de cálculo do ITR de 1999 a área total de reserva legal não averbada até 1º/1/1999, reduzida a multa pecuniária para 20% do valor do tributo. Pedido julgado procedente em parte. (AC 2006.38.12.005705-8/MG, Relator Desembargador Federal Reynaldo Fonseca, Sétima Turma, e-DJF1 de 28/11/2014)
COM COGNIÇÃO PRECÁRIA
, destaco também os seguintes precedentes, enfatizando o caráter constitutivo da averbação da ARL, para fins tributários:
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ITR. ISENÇÃO. ÁREA DE RESERVA LEGAL. AVERBAÇÃO NA MATRÍCULA DO IMÓVEL. NECESSIDADE. 1. A jurisprudência do STJ tem entendido que, quando se trata da "área de reserva legal", é imprescindível a averbação da referida área na matrícula do imóvel para o gozo do benefício isencional vinculado ao ITR 2. "
É de afastar, ainda, argumento no sentido de que a averbação é ato meramente declaratório, e não constitutivo, da reserva legal. Sem dúvida, é assim: a existência da reserva legal não depende da averbação para os fins do Código Florestal e da legislação ambiental. Mas isto nada tem a ver com o sistema tributário nacional. Para fins tributários, a averbação deve ser condicionante da isenção, tendo eficácia constitutiva
." ( REsp 1027051/SC, Rel. p/ Acórdão Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 7/4/2011, DJe 17/5/2011). Agravo regimental improvido. ( AgRg no AREsp nº 555893/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, DJe 13-10-2014)
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ITR. ÁREA DE RESERVA LEGAL. ISENÇÃO. NECESSIDADE DE AVERBAÇÃO NO REGISTRO DE IMÓVEIS. EMBARGOS ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. 1.
É pacífico nesta Corte o entendimento segundo o qual é inexigível, para as áreas de preservação permanente, a apresentação do Ato Declaratório Ambiental com vistas à isenção do ITR. Por outro lado, quando de trata de área de reserva legal, é imprescindível a sua averbação no respectivo registro imobiliário
. 2. Embargos de declaração acolhidos, com atribuição de efeitos modificativos, para dar parcial provimento ao recurso especial. ( EDcl no AgRg no REsp 1315220/MG, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/04/2014, DJe 08/05/2014)
Não raro, a questão está em saber se a apresentação tardia de ADA ou se a eventual averbação subsequente teriam efeito retroativo, de modo a infirmar o lançamento promovido pelo Fisco. Note-se, quanto ao tópico, que os Tribunais têm enfatizado que a averbação surtiria efeitos prospectivos, sem eficácia retroativa. Promovida depois do lançamento, ela não teria o condão de elidir pagamentos já efetuados ou autuações administrativas empreendidas:
"
A averbação da reserva legal, como ato de cunho constitutivo que é, projeta-se apenas para o futuro, não emitindo efeitos retroativos, de maneira que, para fazer jus à isenção, tal providência já deve estar efetivada quando da ocorrência do fato gerador da exação, hipótese que não se verifica no caso concreto
."
(TRF-4 - APELREEX: 50059147020134047205 SC 5005914-70.2013.404.7205, Relator: MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, 17/06/2015, PRIMEIRA TURMA).
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE TERRITORIAL RURAL - ITR. LEI Nº 4.771/65. ÁREA DE RESERVA LEGAL. NECESSIDADE DE AVERBAÇÃO NO REGISTRO DE IMÓVEIS. NATUREZA CONSTITUTIVA DO REGISTRO PARA FINS TRIBUTÁRIOS. PRECEDENTES DO STJ. VALIDADE DA ADOÇÃO DE LAUDO TÉCNICO PARTICULAR PARA A AFERIÇÃO DA MEDIDA TOTAL DA PROPRIEDADE. 1. Inicialmente, rejeito a alegação de nulidade do auto de infração, já que as cópias do processo administrativo juntadas aos autos demonstram que foi oportunizado ao contribuinte o contraditório, estando a cobrança fundamentada em lei. Houve, in casu, mera rejeição da tese de defesa, o que não significa ter havido nulidade. 2. As questões controvertidas nos autos referem-se à natureza da averbação da área de reserva legal no registro do imóvel para fins de isenção de ITR (se constitutiva ou declaratória) e à possibilidade de se atribuir validade ao laudo técnico apresentado pelo contribuinte, adequando a medida total do imóvel para a apuração do tributo. 3. Em relação à área de reserva legal, reconhece-se a obrigatoriedade da averbação da área no Registro de Imóveis, em face das disposições contidas no art. 16 da Lei 4.771/65. Portanto, nos termos do § 8º, se faz necessária a averbação da dita área, destinada à reserva legal, no registro de matrícula de imóveis, sendo vedada a alteração de sua destinação nos casos de transmissão, desmembramento ou retificação da área total. 4.
Por outro lado, tal registro possui natureza constitutiva para fins tributários, não retroagindo os efeitos da averbação efetuada em 2005 para a autuação referente a fato gerador de 2001. Precedentes do STJ
. 5. A adoção do laudo às fls. 33/34 pelo Fisco se dá apenas para efeitos do novo cálculo do quantum debeatur, com base nas novas medidas obtidas para a propriedade, e não para a caracterização da área como de reserva legal, como entendeu a União. 6. Fundamentou-se o magistrado no fato de que a embargante logrou êxito em demonstrar que a declaração que deu ensejo ao lançamento suplementar teve por base dados de medições incorretos, em virtude das limitações tecnológicas da época. Ademais, o laudo técnico apresentado foi elaborado por profissional da área, devidamente registrado no órgão profissional competente. 7. Apelações desprovidas. (TRF2R – AC 0013051-55.2013.4.02.5101 – Des. Fed. Rel. Luiz Antonio Soares, 4º Turma Especializada, DJU 19/06/2015).
TRIBUTÁRIO. ITR. ISENÇÃO ÁREA DE RESERVA LEGAL. NECESSIDADE DE AVERBAÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Não cumprida a exigência da averbação tempestiva da área de reserva legal à margem da matrícula do imóvel, não cabe a isenção do ITR sobre tal área. 2. É pacifico no STJ, em ambas as turmas de direito público, que a averbação da área de reserva legal junto ao RGI é requisito para fruição da isenção tributária. 3. Dado provimento ao recurso da União. (TRF2R – AC 0000005-42.2012.4.02.5001 – Juiz Federal Convocado Adriano Saldanha Gomes de Oliveira, 4º Turma Especializada, DJU 08/11/2018).
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IMPOSTO TERRITORIAL RURAL - ITR. HONORÁRIOS RECURSAIS. 1. A jurisprudência deste Tribunal, em consonância com a do Superior Tribunal de Justiça, sumulou o entendimento de que, para fins da isenção do ITR, há necessidade de averbação, no registro de imóveis, apenas da área de Reserva Legal. 2. Não se exige a averbação, no registro de imóveis, em relação às demais áreas ambientais (área de preservação permanente - APP, área de proteção ambiental - APA, etc.). 3. A Súmula 86 deste Tribunal estabeleceu que "É desnecessária a apresentação de Ato Declaratório Ambiental - ADA para o reconhecimento do direito à isenção de Imposto Territorial Rural - ITR". Isto porque o enquadramento do imóvel rural nas categorias eleitas pela legislação como isentas do ITR pode ser comprovado por outros meios de prova, notadamente a prova pericial. 4. Tendo em vista que restou vencida na fase recursal, a apelante deverá arcar com o pagamento dos honorários recursais, conforme § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil. (TRF4 5000773-92.2012.4.04.7015, SEGUNDA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 19/12/2018)
O TRF2 já decidiu que
"Noutro passo, no tocante à exigência de averbação no registro de imóveis, em relação à área de reserva legal, merece prosperar a irresignação da União Federal, porquanto o entendimento firmado na jurisprudência é de que, na hipótese de área de reserva legal, faz-se necessária a averbação, em face das disposições contidas no artigo 16, da Lei 4.771/1665.
Sendo certo que o respectivo registro possui natureza constitutiva para fins tributários, não retroagindo os efeitos da averbação efetuada após a ocorrência do fato gerador
."
(TRF-2 - APELREEX: 00068661520104025001 ES 0006866-15.2010.4.02.5001, Relator: MARCUS ABRAHAM, Data de Julgamento: 28/03/2019, 3ª TURMA ESPECIALIZADA).
O STJ deliberou que
"
É imprescindível a averbação da área de reserva legal no registro do imóvel para gozo do benefício fiscal do ITR
"
(STJ, 1.ª T., EDcl no AgRg no AREsp 386653-PR , rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 6.5.2014, DJE 19.5.2014)." Atente-se ainda para a
súmula 86 do TRF4
:
"É desnecessária a apresentação de Ato Declaratório Ambiental - ADA para o reconhecimento do direito à isenção de Imposto Territorial Rural - ITR.
Todavia, para o gozo da isenção do ITR no caso de área de reserva legal, é imprescindível a averbação da referida área na matrícula do imóvel
."
2.45. Inibição da utilização econômica do imóvel:
Acrecento, ainda com cognição
NÃO
exaustiva
, que, em princípio,
"
Se o proprietário não detém o direito de usar, gozar e dispor do imóvel, em decorrência de seu alagamento pelo fechamento das comportas da Usina de Itaipu, e o direito de reavê-lo não é assegurado pelo Estado, a propriedade se mantém na mera formalidade e não configura fato gerador do ITR
."
(TRF-4 - APELREEX: 50024845820144047017 PR 5002484-58.2014.404.7017, Relator: CLÁUDIA MARIA DADICO, 21/06/2016, SEGUNDA TURMA)
Como constou na fundamentação do acórdão,
"A União fundamenta a exigência do tributo, no caso ora posto, na propriedade, ainda que não observada a posse ou o domínio útil. No caso concreto, diante do alagamento das terras do autor em razão do represamento do Rio Paraná, estando situado o imóvel dentro do Parque de Ilha Grande, o direito de propriedade do demandante está desprovido de praticamente todos os elementos a ele inerentes, pois não há mais posse, nem a possibilidade de uso ou fruição do bem. Deveras, a planta apresentada pelo autor e elaborada por engenheiro agrônomo (OUT7 - evento 1), demonstrou que todas as coordenadas do lote possuído pelo autor se encontram dentro da extensão do Parque Nacional de Ilha Grande."
Menciono também os seguintes julgados:
TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ITR. TERRAS ALAGADAS. PERDA DO DIREITO DE PROPRIEDADE. INEXIGIBILIDADE DO IMPOSTO TERRITORIAL RURAL.
Se o proprietário não detém o direito de usar, gozar e dispor do imóvel, em decorrência de seu alagamento pelo fechamento das comportas da Usina de Itaipu, e o direito de reavê-lo não é assegurado pelo Estado, a propriedade se mantém na mera formalidade e não configura fato gerador do ITR. Orientação firmada no âmbito deste Tribunal
. (TRF-4 - AC: 004161 PR 2007.70.99.004161-7, Relator: EDUARDO VANDRÉ OLIVEIRA LEMA GARCIA, Data de Julgamento: 13/10/2010, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: D.E. 20/10/2010)
ITR. TERRAS INVADIDAS. PERDA DO DIREITO DE PROPRIEDADE. INEXIGIBILIDADE DO IMPOSTO TERRITORIAL RURAL.
Se o proprietário não detém o direito de usar, gozar e dispor do imóvel, em decorrência de sua invasão, e o direito de reavê-lo não é assegurado pelo Estado, a propriedade se mantém na mera formalidade e não configura fato gerador do ITR
. (TRF-4 - AC: 50040545720154047207 SC 5004054-57.2015.4.04.7207, Relator: ROGER RAUPP RIOS, Data de Julgamento: 08/02/2018, PRIMEIRA TURMA)
TRIBUTÁRIO - FAZENDA INVADIDA POR INTEGRANTES DO MOVIMENTO"SEM TERRA"- PERDA DO DIREITO DE PROPRIEDADE - INEXIGIBILIDADE DO IMPOSTO TERRITORIAL RURAL. 1 - Fato gerador do ITR é a propriedade, o domínio útil ou a posse do imóvel. 2 - A propriedade é o direito que a pessoa física ou jurídica tem, dentro dos limites normativos, de usar (jus utendi), gozar (jus fruendi) e dispor (jus abutendi) de um bem, corpóreo ou incorpóreo, bem como de reivindicar de quem injustamente o detenha (rei vindicatio). 3 - Se, desde 1995, o proprietário não detém o direito de usar, gozar e dispor do imóvel, em decorrência de sua invasão por integrantes do movimento" sem terra ", e o direito de reavê-lo não é asseguado pelo Estado, a propriedade se mantém na mera formalidade e não configura fato gerador do ITR. 4 - A exigência não tem fundamento legal e viola os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 2005.70.01.004636-7, 2ª Turma, Des. Federal ANTONIO ALBINO RAMOS DE OLIVEIRA, POR UNANIMIDADE, D.J.U. 29/11/2006)
Com cognição precária, esses são alguns aspectos do imposto territorial rural, notadamente no que diz respeito às exoneração orientadas à proteção do ambiente (finalidades extrafiscais)
.
2.46. Questões alusivas à valoração do imóvel:
Não raro, há algumas dificuldades no que toca à atribuição de conteúdo econômico para determinados objetos, na exata medida em que as coisas não possuem valores ínsitos ou ontológicos
. A precificação depende, por óbvio, de uma conhecida distinção entre
valor de uso e valor de troca
. Por vezes, algo pode ser muito apreciado pelo proprietário, mas sem correspondente apelo econômico junto ao mercado. Alguém pode guardar um conjunto de fotos ou estátuas, atribuindo-lhes expressivo valor por lhe recordar momentos da infância ou entes queridos; mas, dificilmente conseguiria comercializá-las no mercado pelo montante almejado. Por outro lado, o preço depende sempre de inúmeras variáveis, com destaque para a conhecida lei da oferta e da procura. Quanto maior a demanda e maior a escassez, maior o preço. Havendo excesso de oferta, ao contrário, o preço é reduzido.
Daí que a atribuição de conteúdo econômico para bens depende sempre do exame do contexto de mercado, diante da interação entre compradores e vendedores - depende, enfim, das
expectativas sociais envolvidas
. No âmbito das demandas judiciais ou das licitações, ademais, há questões burocráticas que acabam por condicionar a precificação, seja por força de uma limitação do mercado, seja por conta das peculiaridades com que as negociações se dão (arrematação, adjudicação, leilão).
Atente-se para a lição de Kiyoshi Harada:
"Vários são os métodos de avaliação. Na avaliação de terrenos loteados, normalmente, o método empregado é o comparativo, levando-se em conta os três fatores básicos: a área, a profundidade e a testada. .Basicamente, consiste na pesquisa de valores de preços com menos de dois anos em relação à data de avaliação, referentes a imóveis da mesma região geoeconômica, da idêntica zona e uso e ocupação de solo e do mesmo setor fiscal. Preço proveniente de oferta deverá sofrer redução de 10% para atender à natural elasticidade do mercado, ao passo que os preços a prazo devem ser transformados em preços à vista, mediante descontos com o auxílio da tabela Price. A somatória dos diferentes preços levantados e sua divisão pelo número de elementos pesquisados resultarão em um valor médio. Descartam-se os elementos que se situarem 30% abaixo ou acima dessa média. Extrair-se-á nova média com os elementos remanescentes, resultando na chamada média aritmética saneada, ou seja, o valor unitário médio que servirá de paradigma para a avaliação.
Na avaliação de glebas loteáveis, quando o emprego direto do método comparativo fica inviabilizado, por ausência de paradigmas, a avaliação é feita através do chamado método involutivo. Consiste na projeção de um loteamento imaginário com a divisão da área em quadras e em lotes-padrão, com exclusão das áreas destinadas a espaços livres, institucionais e áreas verdes. Levam-se em conta inúmeros fatores como despesas do loteamento, abarcando a implantação de infraestrutura, propaganda e corretagem, bem como o tempo de duração para o esgotamento das vendas, a valorização dos lotes no decorrer de vendas etc
. Enfim, é um método cuja avaliação é baseada em projeções que podem ocorrer ou não concretamente. Ultimamente, esse método vem ganhando elasticidade, comportando a avaliação em separado da chamada 'faixa frontal do loteamento', situada de frente para as vias públicas existentes, que seria diretamente desmembrável, destacando-se do miolo do loteamento imaginário."
(HARADA, Kiyoshi.
Desapropriação.
10. ed. São Paulo: AtlaS. P. 135-136).
Quando se cuide de pedido de indenização, por exemplo, deve-se atentar para o valor de mercado dos bens perdidos ou destruídos, conforme art. 1.431 do Código Civil:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA ISENTA DE ERROS IN PROCEDENDO. FURTO DE JOIAS ACAUTELADAS À RÉ, POR FORÇA DE CONTRATO DE PENHOR. RESPONSABILIDADE INDENIZATÓRIA. VALOR REAL DAS JOIAS. LAUDO PERICIAL. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Não é nula a sentença que julga a demanda a salvo de erros in procedendo. 2. Responde a Caixa Econômica Federal - CEF pelos danos causados a cliente cujas joias, dadas como garantia em contrato de empréstimo e penhor, foram furtadas ao tempo em que estavam em poder da mutuante. 3.
Firmou-se a jurisprudência no sentido de que a indenização, em casos que tais, deve ser feita de acordo com o valor real das joias e não pelo quantum ajustado contratualmente
. 4. Na impossibilidade de realizar-se avaliação direta das joias, revela-se razoável e seguro o critério de estimativa do perito, que, apresentando-se como cliente interessado em celebrar contrato de penhor de joias, aferiu a desproporção entre a avaliação feita pela Caixa Econômica Federal - CEF e o valor real dos bens. 5. Apelação desprovida. (TRF-3 - Ap: 00220953820004036100 SP, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS, Data de Julgamento: 10/11/2009, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/07/2012)
CIVIL. PENHOR. joias . ASSALTO À AGÊNCIA BANCÁRIA. PERDA DO BEM. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. RESSARCIMENTO DO PROPRIETÁRIO DO BEM. PAGAMENTO DO CREDOR. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. EXCEÇÃO DE CONTRATO NÃO CUMPRIDO. ART. 1.092 DO CÓDIGO CIVIL/1916 E ART. 476, DO CÓDIGO CIVIL/2002. - O perecimento por completo da coisa empenhada não induz à extinção da obrigação principal, pois o penhor é apenas acessório desta, perdurando, por conseguinte, a obrigação do devedor, embora com caráter pessoal e não mais real. - Segundo o disposto no inciso IV do art. 774, do Código Civil/1916, o credor pignoratício é obrigado, como depositário, a ressarcir ao dono a perda ou deterioração, de que for culpado. - Havendo furto ou roubo do bem empenhado, o contrato de penhor fica resolvido, devolvendo-se ao devedor o valor do bem empenhado, cabendo ao credor pignoratício o recebimento do valor do mútuo, com a possibilidade de compensação entre ambos, de acordo com o art. 775, do Código Civil/1916. -
Na hipótese de roubo ou furto de joias que se encontravam depositadas em agência bancária, por força de contrato de penhor, o credor pignoratício, vale dizer, o banco, deve pagar ao proprietário das joias subtraídas a quantia equivalente ao valor de mercado das mesmas, descontando-se os valores dos mútuos referentes ao contrato de penhor
. Trata-se de aplicação, por via reflexa, do art. 1.092 do Código Civil/1916 (art. 476, do Código Civil atual). Recurso especial não conhecido. (STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL - 730925 Processo: 200500366722 UF: RJ Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA REL. NANCY ANDRIGHI DJ DATA:15/05/2006 PÁGINA:207).
Enfim, essas balizas devem ser tomadas em conta para fins de debate a respeito do valor de mercado do imóvel em questão.
2.47. Bioma da Mata Atlântica:
Ao que releva, anoto que o
art. 225, §4º, Constituição/88
recepcionou a lei 4.771/1965 (antigo Código Florestal) e a lei 6.938/1981 (lei da Política Nacional do Meio Ambiente), cujos dispositivos relevantes para o caso seguem:
Art. 14 - lei 4.771/65.
Além dos preceitos gerais a que está sujeita a utilização das florestas, o Poder Público Federal ou Estadual poderá
: a)
prescrever outras normas
que atendam às peculiaridades locais; b)
proibir ou limitar o corte das espécies vegetais
consideradas em
via de extinção
, delimitando as áreas compreendidas no ato, fazendo depender, nessas áreas, de licença prévia o corte de outras espécies.
Art 9º - lei 6938/1981 - São instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente: (....) VI -
a criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público federal, estadual e municipal, tais como áreas de proteção ambiental, de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas
.
Em atenção a tais preceitos, recepcionados pela Constituição Federal, o Poder Executivo editou inicialmente, em
25/09/1990
, o
Decreto 99.547
, proibindo o corte e a exploração da vegetação nativa da Mata Atlântica (art. 1º). Tempos depois, foi publicado o Decreto n. 750/1993, versando sobre a preservação da área de Mata Atlântica. Desse Decreto destaco os seguintes dispositivos:
Art. 3º
Para os efeitos deste Decreto, considera-se Mata Atlântica as formações florestais e ecossistemas associados inseridos no domínio Mata Atlântica, com as respectivas delimitações estabelecidas pelo Mapa de Vegetação do Brasil, IBGE1988: Floresta Ombrófila Densa atlântica, Floresta Ombrófila mista, Floresta Ombrófila Aberta, Floresta Estacional Semidecidual, Floresta Estacional Decidual, manguezais restingas campos de altitude, brejos interioranos e encraves florestais do Nordeste
.
Art. 1°
Ficam proibidos o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração da mata Atlântica
.
Parágrafo único. Excepcionalmente, a supressão da vegetação primária ou em estágio avançado e médio de regeneração da mata Atlântica poderá ser autorizada, mediante decisão motivada do órgão estadual competente, com anuência prévia do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBAMA, informando-se ao Conselho Nacional do Meio Ambiente CONAMA, quando necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social, mediante aprovação de estudo e relatório de impacto ambiental.
Art. 6° A definição de vegetação primária e secundária nos estágios avançado, médio e inicial de regeneração da mata Atlântica será de iniciativa do IBAMA, ouvido o órgão competente, aprovado pelo CONAMA.
Parágrafo único. Qualquer intervenção na mata Atlântica primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração só poderá ocorrer após o atendimento do disposto no caput deste artigo.
Art. 7º
Fica proibida a exploração de vegetação que tenha a função de proteger espécies da flora e fauna silvestres ameaçadas de extinção
, formar corredores entre remanescentes de vegetação primária ou em estágio avançado e médio de regeneração, ou ainda de proteger o entorno de unidades de conservação, bem como a utilização das áreas de preservação permanente, de que tratam os arts. 2º e 3º da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965.
Ora,
"
A mata Atlântica, considerada patrimônio nacional pela Constituição Federal, estendia-se, originalmente, por cerca de 1.300.000Km² do território brasileiro. Hoje, os remanescentes primários e em estágio médio/avançado de regeneração estão reduzidos a apenas 7,84% da cobertura florestal original, o que compreende aproximadamente 100.000km². Isso faz com que o Bioma mata Atlântico seja considerado o segundo mais ameaçado de extinção do mundo
."
(MACHADO, Paulo Affonso Leme.
Direito
ambiental
brasileiro.
21. ed. SP: Malheiros, 2013, p. 924).
Ainda segundo Leme Machado,
"
Apesar da devastação, a mata Atlântica é um dos biomas com uma das mais altas taxas de biodiversidade do mundo: cerca de 20.000 espécies de plantas angiospermas (6,7% de todas as espécies do mundo), sendo 8.000 endêmicas, e grande riqueza de vertebrados (264 espécies de mamíferos, 849 espécies de aves, 197 espécies de répteis e 340 espécies de anfíbios)
."
(MACHADO, Paulo A. Leme.
Obra citada,
p. 924).
Há, como cediço, uma latente dificuldade em se delimitar com exatidão os
contornos da Mata Atlântica
: afinal de contas, ao contrário dos livros, a natureza não se dá em capítulos. A transição entres os biomas é gradual, o que basta para que sobrevenham dúvidas sobre o seu início e término. O
Decreto 750/1993
esposou como critério a fisionomia florestal (decorrente do sistema classificatório de
Ellemberg e Muller-Dombois
, 1965), empregando termos como 'Floresta Ombrófila Densa Atlântica', 'Floresta Estacional Decidual' etc. Vinculou-se, ademais, ao 'Mapa de Vegetação do Brasil', divulgado pelo IBGE em 1988 (art. 3º do decreto 750).
A respeito da definição das várias espécies de florestas, segue:
"2.1. FLORESTA OMBRÓFILA DENSA
Representam as formações florestais da mata Atlântica 'sensu lato' situadas na vertente oceânica das serranias ao longo da cordilheira atlântica, ou que estejam em áreas próximas ao oceano sob influência das massas de ar úmidas que adentram o continente vindas do mar
.
Este tipo de vegetação é caracterizado por fanerófitos, justamente pelas subformas de vida macro e mesofanerófitos, além de lianas lenhosas e epífitas em abundância, que o diferenciam das outras classes de formações. Porém, a característica ecológica principal reside nos ambientes ombrófilos (elevada precipitação bem distribuída ao longo do ano) que marcam muito bem a "região florística florestal".
Assim, a característica ombrotérmica da Floresta Ombrófila Densa está presa a fatores climáticos tropicais de elevadas temperaturas (médias de 25º) e de alta precipitação, bem distribuídas durante o ano (de 0 a 60 dias secos), o que determina uma situação bioecológica praticamente sem período biologicamente seco.
2.2. FLORESTA OMBRÓFILA MISTA (FLORESTA COM ARAUCÁRIA)
Esta floresta, também conhecida como mata-de-araucária ou pinheiral, é um tipo de vegetação do planalto meridional, onde ocorria com maior freqüência. A composição florística desta vegetação, dominada por gêneros primitivos como Drymis, Araucaria e Podocarpus, sugere, pela altitude e latitude do planalto meridional, uma ocupação recente a partir de refúgios alto-montanos
.
2.3. FLORESTA ESTACIONAL SEMIDECIDUAL
A Floresta Estacional Semidecidual ou Floresta Tropical Subcaducifólia VELOSO et al. (1991), também denominada por RIZZINI (1963) de Floresta Estacional Mesófila Semidecídua, ou ainda por Floresta Latifoliada Tropical por AZEVEDO (1959), é uma fitofisionomia intrínseca ao bioma Floresta atlântica, constituindo uma formação transicional entre as florestas de encosta litorâneas e as formações não florestais de interior.
O termo estacional refere-se a uma condição temporal, em que o caráter ecológico está envolvido por uma alternância de um período chuvoso com um outro de repouso, induzido por uma estação seca. Prende-se fundamentalmente ao comportamento fenológico dos vegetais, tendo coincidentemente correspondência com a estacionalidade.
É uma formação florestal caracterizada pela presença de indivíduos arbóreos que perdem as folhas (caducifólios) durante o inverno, ou estação seca. A porcentagem de indivíduos caducifólios varia de 20 a 50% do conjunto florestal e não das espécies caducifólias (IBGE, 1992) e de acordo com RIZZINI et al. (1988) esta porcentagem varia de 50 a 80%. Às vezes apresenta-se como uma mata densa, com altura das árvores entre 25 e 30 metros, apresentando no sub-bosque espécies de bromélias, samambaias e diversas espécies de lianas.
Esse fenômeno de queda foliar tem sido atribuído a fatores como disponibilidade de água, baixa temperatura e disponibilidade de nutrientes (OLIVEIRA,1997; POGGIANI & MONTEIRO - JUNIOR, 1990; MORELLATO, 1992, etc). Quando a vegetação apresenta alguma deciduidade, nos limites de 10 a 60% da cobertura foliar, podem ser reconhecidos dois tipos de vegetação: mesomórfico e escleromórfico, considerada a natureza do hábito vegetal e, em particular, a consistência da folhagem, FERNADES (1998).
2.4. FLORESTA ESTACIONAL DECIDUAL
A Floresta Estacional Decidual é caracterizada como produto de duas estações climáticas bem demarcadas, uma chuvosa seguida de longo período biologicamente seco.
Ocorre na forma de disjunções florestais, apresentando o estrato dominante macro ou mesofanerofítico predominantemente caducifólio, com mais de 50% dos indivíduos e espécies despidos de folhagem no período desfavorável (VELOSO et. al. 1991) e para Rizzini et al. (1988) esta porcentagem é maior que 80%.
A designação de Floresta Seca é aplicada para as formações florestais caracterizadas por diversos níveis de caducifólia durante a estação seca, dependente das condições químicas, físicas e principalmente, da profundidade do solo (NASCIMENTO et al. 2004).
A Floresta Estacional Decidual apresenta estrato arbóreo que varia de 15 a 25 m. A grande maioria das árvores são eretas, com alguns indivíduos emergentes. Na época chuvosa, fornecem uma cobertura arbórea de 50 a 70%. Na época de seca a cobertura pode ser inferior a 50 % (SANO & ALMEIDA, 1998).
A bacia do rio Paraná (13°20' - 15°40'S, 46°35' - 47°30'W) com 5.940.382ha, nos estados de Goiás e Tocantins, é um dos mais expressivos encraves de Floresta Estacional Decidual do Brasil. (SILVA & SCARIOT, 2003), embora no norte de Minas é comum a existência de extensas áreas dessa formação em contato físico com formações florestais da Caatinga, que tem no estado de Minas Gerais sua projeção mais meridional.
Elas ocorrem em todos os continentes sob as faixas tropicais, nos pontos em que as chuvas são copiosas durante a época dita pluviosa e seguidas de um período seco de uns 4-6 meses. No Brasil isso se sucede no planalto central, na área peculiar ao cerrado; deve, portanto, haver uma condição edáfica que separe as duas formações (RIZZINI, 1997). No Brasil, matas secas (ou mesófilas) acham-se disseminadas abundantemente através da área central do cerrado, sob o mesmo regime climático, em forma de manchas, em Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Bahia RIZZINI (1997).
(...)
No entanto, esta afirmativa necessita de confirmação, uma vez que a falta de água disponível do solo pode-se ser devida a fatores do solo e não propriamente à estacionalidade fisiológica. A grande pressão antrópica sobre as áreas de afloramento calcário, particularmente, devido à extração para a produção de cimento e corretivo de solo para a agricultura, torna urgente a produção de inventários florísticos subsidiando a proposição de áreas de preservação permanente
(MELO & LOMBARDI, 2004).
Nos últimos dois séculos, essas florestas foram seriamente reduzidas a pequenos fragmentos e severamente perturbadas pela retirada indiscriminada de madeira, pela pecuária extensiva e pelo fogo. Essas perturbações antrópicas constantes representam uma importante ameaça à biodiversidade, principalmente nas regiões onde o processo de fragmentação iniciou-se há várias décadas (TURNER, 1996)."
Fonte: www
.
ufv
.
br
/
def
/
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BIOMAS
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MATA%20ATL%C2NTICA
.
pdf
De outro tanto, da conjugação dos arts. 1º,
caput
com o
art. 4º do Decreto 750/1993
, percebe-se uma diferenciação na tutela da vegetação de Mata Atlântica. Quando em causa a
vegetação
primária
, o seu corte, exploração e supressão foram terminantemente
proibidos
(art. 1º).
Tratando-se da
vegetação
secundária
, a proibição apenas vigoraria, em princípio, quando em causa uma regeneração média ou avançada. Cuidando-se de regeneração em fase inicial (art. 4º), a exploração da área poderia ser franqueada pelo IBAMA, observados requisitos por ele estabelecidos (observada ainda a ressalva do art. 4º, parágrafo único c/ Resolução 3, de 18.04.96, CONAMA).
Segundo sustenta o promotor Alexandre Gaio, na obra "Lei da Mata Atlântica comentada",
"
No caso de vegetação primária de Mata Atlântica, apenas poderá ser autorizado o corte ou supressão se a finalidade é de pesquisa científica, prática preservacionista ou de atendimento a obra ou atividade de utilidade pública, devendo nesta última hipótese ser precedida da realização e da aprovação de Estudo Prévio de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EPIA/RIMA)
. Por óbvio que, na medida em que esse Estudo Prévio de Impacto Ambiental deve contemplar alternativas locacionais, seja pela exigência do artigo 5º, inciso I, da Resolução do CONAMA nº 01/86, seja pela exigência do artigo 14 da Lei nº 11.428/2006, o proponente da obra ou atividade de utilidade pública deve demonstrar que não existe outra alternativa locacional menos impactante e, portanto, que não há outro local que não abrigue remanescente de vegetação primária de Mata Atlântica. Ademais, na medida em que a autorização para o corte e a supressão da vegetação primária do Bioma Mata Atlântica apenas pode ocorrer excepcionalmente, o proponente da obra ou atividade deve conseguir demonstrar cabalmente a existência de utilidade pública no bojo do Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EPIA). Deve-se atentar, ainda, que não há diferença de tratamento jurídico se o remanescente de vegetação primária de Mata Atlântica se localizar em zona urbana ou zona rural."
(GAIO, Alexandre.
Lei da mata atlântica comentada.
edição kindle. Almedina. 2014. posição 2197).
Em atenção ao dispositivo, o CONAMA editou a Resolução n. 29, de 07/12/1994, cujo art. 5. segue: "
Com relação ao corte, exploração e supressão da vegetação secundária no estágio inicial de regeneração da mata Atlântica, fica somente permitida a supressão ou exploração sustentada nas propriedades rurais que apresentarem áreas excedentes às áreas de reserva legal, ressalvadas as de preservação permanente."
Daí o relevo da distinção entre vegetação primária/secundária.
Ora, em atenção ao art. 6º do
Decreto 750
, foi publicada a
Resolução/CONAMA 28
, de 07 de dezembro de 1994, discorrendo sobre a definição de vegetação primária e secundária, como segue:
Art. 1º
Vegetação primária
: vegetação caracterizada como de máxima expressão local, com grande diversidade biológica, sendo os efeitos das ações antrópicas mínimos, a ponto de não afetar significativamente suas características originais de estrutura e de espécies.
Art. 2º
Vegetação secundária
ou em
regeneração
: vegetação resultante de processos naturais de sucessão, após supressão total ou parcial de vegetação primária por ações antrópicas ou causas naturais, podendo ocorrer árvores remanescentes de vegetação primária.
Melhor dizendo,
"
No sistema secundário delimitado no Mapa estão as comunidades vegetais que sucederam naturalmente após o abandono do solo, pelo homem, depois de práticas agropecuárias ou mineradoras que descaracterizaram por completo os parâmetros ecológicos da mata primária no que diz respeito às condições químicas, físicas e orgânicas do solo
. Assim, a sucessão florestal natural que se desenvolveu nesses solos são de características diferentes daquela que ali existia antes da intervenção do homem."
(SATO, Jorge.
Mata Atlântica:
direito ambiental e a legislação. São Paulo: Hemus, 1995, p. 42).
Affonso Leme Machado argumenta, por seu turno, o que segue:
"
Cumpre conceituar vegetação nativa
: é a entendida como composta de espécies nativas que, supostamente, são originárias das áreas geográficas onde atualmente ocorrem. Às vezes, as espécies nativas são assimiladas às espécies endêmicas e que seriam inatas numa área específica. A espécie exótica é aquela que é introduzida numa área da qual não é originária; portanto, o contrário do que acontece com uma espécie nativa.
Vegetação primária
é aquela de máxima expressão local, com grande diversidade biológica, sendo os efeitos das ações antrópicas mínimos, a ponto de não afetar significativamente suas características originais de estrutura e espécies (Resolução 10 CONAMA, de 1.10.93).
Vegetação secundária
é a resultante de processos naturais de sucessão, após supressão total ou parcial da vegetação primária, por ações antrópicas ou causas naturais, podendo ocorrer árvores remanescentes de vegetação primária. Também é chamada de vegetação em regeneração (Resolução Conama citada).
A
resolução 388, de 23.2.2007
, convalidou as resoluções anteriores que definem as vegetações primária e secundária nos estágios inicial, médio e avançado de regeneração, para os fins do disposto no art. 4, §1º, lei 11.428/2006.
A
vegetação primária ou a vegetação secundária
em qualquer estágio de regeneração no Bioma mata Atlântica não perderão essa classificação nos casos de incêndio, desmatamento ou qualquer outro tipo de intervenção não autorizada ou não licenciada. (art. 5º da lei 11.428/2006).
Note-se na lei comentada que a locução
'vegetação primária
' é apresentada
sem outra qualificação
, diferentemente do que será encontrado em relação 'á vegetação secundária', onde estará sempre inserido o estágio da sua regeneração. Pelos conceitos expostos na Resolução 10/1992 CONAMA, pode-se concluir que a vegetação primária ou a floresta de vegetação primária é aquela que não sofreu degradação e que, portanto, não necessita de regeneração." (MACHADO, Paulo Affonso Leme.
Direito
ambiental
brasileiro.
21. ed. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 927-928).
Aplicando essa diferenciação, o TRF da 3ª Rg. já deliberou:
"Processo civil e direito ambiental. mata Atlântica. Vegetação primária ou secundária em estado avançado ou médio de regeneração. Desmatamento. Proibição legal. Exceções. Medida liminar cautelar. Requisitos presença.
-
É proibido o corte, a exploração e a supressão de áreas de vegetação primária ou secundária em estágio avançado ou médio de regeneração da mata atlântica (art. 1º,
caput
, do Decreto nº 750/93), ressalvados os casos expressamente previstos na legislação regulamentar (art. 1º, parágrafo único,art. 2º, caput)
.
-
Sendo plausível a caracterização técnica da área de desmatamento como vegetação secundária de mata Atlântica em avançado estado de regeneração e não incidindo uma das exceções legais à vedação de supressão desse tipo de cobertura vegetal, encontram-se presentes os requisitos da fumaça do bom direito e do perigo na demora com relação ao pleito de impedimento da continuidade da atuação lesiva ao meio ambiente necessários ao deferimento de medida liminar cautelar
."(AG 9805505049, Desembargador Federal Manoel Erhardt, TRF5 - Terceira Turma, DJ - Data::31/03/2000 - Página::2128.)
Ademais, em 22 de setembro de 2006, foi publicada a
lei 11.428
que, inspirada no referido
Decreto 750
, definiu o Bioma Mata Atlântica (art. 1º), estabelecendo um regime jurídico bastante peculiar para a sua tutela (arts. 6º e ss.). Ela foi regulamentada pelo
Decreto 6.660/2008
, cujo art. 51 expressamente dispôs sobre a revogação do Dec. 750/93.
2.48.
Unidades de conservação:
Conquanto já existissem áreas protegidas desde 1937 - ano da criação do Parque Nacional de Itatiaia -, foi com a publicação da lei n. 6.938/1981 que se revelou possível sistematizar diferentes unidades de conservação em solo nacional, ainda que persistissem, mesmo sob a nova legislação, a falta de recursos e ausência de tratamento prioritário do tema.
De 1937 em diante, coube à Constituição de 1988 o papel de verdadeiro divisor de águas, já que, ao lançar o desafio de uma regulamentação para o que chamou espaços territoriais especialmente protegidos, ela deu ensejo à publicação, em 18.07.2000, da Lei 9.985, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza- SNUC.
Com a publicação da lei n. 9.985, de 2000, foram ofertados os contornos do sistema de unidades de conservação, em atenção ao §1º, I, II, III e VII do art. 225, Constituição. Explicita Edis Milarè,
"Fruto de um longo processo de gestação, a Lei 9.985/2000 nasceu depois de incertezas, fluxos e refluxos, expectativas e ansiedades. Pairavam muitas dúvidas sobre como instituir e, depois, como gerir esses espaços especialmente protegidos em virtude do oportuno mandato constitucional. Como toda legislação ambiental num país que vê seu patrimônio natural e seu meio ambiente assolados por tantos males e expostos à sanha dos predadores, a Lei do SNUC aparece com marcas messiânicas, destinada a redimir, ao menos em parte, o que estava perdido, e a desenvolver o que se encontrava sadio."
(MILARÈ, Edis.
Direito do ambiente.
São Paulo: RT. 2021. RB 49.1).
O tema foi regulamentado pelo decreto nº 4.340, de 22 de agosto de 2002. A unidade de conservação é
"espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção."
(lei 9.985/2000, art. 2, I). Para a configuração jurídico-ecológica de uma unidade de conservação deve haver: a relevância natural; o caráter oficial; a delimitação territorial; o objetivo conservacionista; e o regime especial de proteção e administração.
Os objetivos do SNUC foram detalhados no art. 4 da lei n. 9.985, destacando-se o escopo de contribuir para a manutenção da diversidade biológica e dos recursos genéticos no território nacional e nas águas jurisdicionais. Também lhe cabe proteger as espécies ameaçadas de extinção no âmbito regional e nacional. Contribuir para a preservação e a restauração da diversidade de ecossistemas naturais; promover o desenvolvimento sustentável a partir dos recursos naturais. Ademais, incumbe ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação promover a utilização dos princípios e práticas de conservação da natureza no processo de desenvolvimento. Proteger paisagens naturais e pouco alteradas de notável beleza cênica; proteger as características relevantes de natureza geológica, geomorfológica, espeleológica, arqueológica, paleontológica e cultural. Proteger e recuperar recursos hídricos e edáficos; recuperar ou restaurar ecossistemas degradados. Cabe-lhe ainda proporcionar meios e incentivos para atividades de pesquisa científica, estudos e monitoramento ambiental; valorizar econômica e socialmente a diversidade biológica. Além disso, destaca-se a missão de favorecer condições e promover a educação e interpretação ambiental, a recreação em contato com a natureza e o turismo ecológico; e proteger os recursos naturais necessários à subsistência de populações tradicionais, respeitando e valorizando seu conhecimento e sua cultura e promovendo-as social e economicamente.
Ainda segundo Milarè,
"
Esses objetivos, no seu conjunto, transcendem os aspectos mais superficiais constantes do conceito corrente de unidades de conservação
. Duas considerações parecem pertinentes ao elenco dos objetivos: uma, o seu rico conteúdo ecológico, que ultrapassa a visão da cobertura vegetal e da biodiversidade inerentes a uma área, para ressaltar, igualmente em primeiro plano, elementos da hidrosfera e da litosfera; outra, o enfoque do desenvolvimento sustentável, de caráter econômico-social, processo esse em que se vislumbra a possibilidade de conjugar os interesses das populações locais com a integridade do patrimônio ambiental natural."
(MILARÈ, Edis.
Direito do ambiente.
SP: RT. 2021. RB 49.2).
As diretrizes do sistema de unidades de conservação estão detalhadas no art. 5 da lei n. 9.985/2000, com seus 13 incisos. Esses vetores se voltam, primariamente, para assegurar a identidade dos ecossistemas brasileiros mais significativos. Evidentemente, trata-se de uma identidade ecossistêmica característica dos respectivos ambientes terrestres e aquáticos, como se encontram no momento. Resta saber da possibilidade de se procurar, ademais, a recuperação possível do seu estado anterior ou original, quando for o caso. Já a estrutura do SNUC está delimitada no art. 6 da lei.
Dentre as unidades de proteção, há aquelas de proteção integral e há as de uso sustentável. Dentro desses dois grupos, encontram-s 12 categorias de unidades de conservação, sendo que cada modalidade de área protegida realça, em maior ou menor escala, um ou vários dos objetivos preconizados pela lei, respeitada a primazia da finalidade conservacionista, consoante explícito na própria definição de unidade de conservação dada pelo art. 2º, I, antes referido. Por exemplo, a pesquisa científica está na base de diversos tipos de unidades de conservação, como na Estação Ecológica e na Reserva de Fauna. Os usos econômicos sustentáveis são bem salientados na Floresta Nacional, na Reserva Extrativista, na Área de Proteção Ambiental e na Reserva de Desenvolvimento Sustentável etc.
No que releva ao caso em exame,
os Parques Nacionais constituem a mais antiga e popular modalidade de unidade de conservação. O primeiro Parque Nacional do mundo foi o de Yellowstone, nos Estados Unidos, criado em 1872. No Brasil, a primeira iniciativa para a criação de uma área protegida ocorreu em 1876, inspirada em Yellowstone, quando o Engenheiro André Rebouças propôs a criação de dois parques nacionais: um em Sete Quedas e outro na Ilha do Bananal. No entanto, o primeiro Parque Nacional foi o de Itatiaia, criado em 1937, por meio do Decreto 1.713, de 14.06.1937, com fundamento no Código Florestal de 1934, visando a incentivar a pesquisa científica e a oferecer lazer às populações urbanas. Posteriormente, os Parques Nacionais encontraram seu fundamento legal no art. 5º do Código Florestal de 1965, que previu sua criação nos três níveis de governo, em terras de domínio público, e sua regulamentação se deu pelo Decreto 84.017, de 21.09.1979. De acordo com a Lei do SNUC, o Parque Nacional tem como objetivo básico “a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico” (art. 11). Assim, seu manejo deve ter em vista quatro objetivos principais: a preservação de ecossistemas naturais, a pesquisa científica, a educação e recreação e o turismo."
(MILARÈ, Edis.
Obra citada.
RB 49.5).
O Parque Nacional é de posse e domínio públicos, devendo as áreas particulares incluídas em seus limites serem desapropriadas. O regime de visitação pública e de pesquisa científica é idêntico ao das Estações Ecológicas. As unidades dessa categoria, quando criadas por Estado ou Município, serão denominadas, respectivamente, Parque Estadual e Parque Natural Municipal.
D'outro tanto, na forma do art. 2, XVIII, da lei 9.985/2000, a zona de amortecimento consiste no entorno de uma unidade de conservação, onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade. Note-se, por exemplo, que, excepcionando a regra do caput do art. 36, da lei 9.985, determina o seu § 3º que, na hipótese de o empreendimento afetar uma unidade de conservação específica ou sua zona de amortecimento, a unidade afetada deverá ser beneficiada pela compensação ambiental, mesmo que não pertencente ao Grupo de Proteção Integral.
Ainda quanto à zona de amortecimento, Edis Milarè explicita:
"(...) As unidades de conservação, exceto Áreas de Proteção Ambiental e Reservas Particulares do Patrimônio Natural, devem possuir uma zona de amortecimento, a ser estabelecida quando da elaboração do respectivo Plano de Manejo e, quando conveniente, corredores ecológicos.
A lei define zona de amortecimento como “o entorno de uma unidade de conservação, onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade”.
Não pode, a bem ver, ser considerada parte integrante da unidade de conservação, mas, por força da Lei, fica sujeita a uma espécie de zoneamento obrigatório, pelo qual certas atividades econômicas são permitidas e regradas.
Daí por que, por se tratar de propriedade privada, não cabe, como regra geral, indenização, posto que o imóvel afetado não vê sua dominialidade alterada e continua a aceitar usos econômicos, apenas sofrendo certas restrições e uma regulamentação da atividade, e, por óbvio, de forma não tão restritiva como ocorre no interior das unidades de conservação. Contudo, as limitações não podem inviabilizar o direito de propriedade e seu exercício, sob pena de acarretar apossamento administrativo, com o consequente dever de indenizar por parte do Poder Público.
A zona de amortecimento é, portanto, uma faixa de terreno que margeia as unidades de conservação, exceto Áreas de Proteção Ambiental e Reservas Particulares do Patrimônio Natural, com a finalidade, como o próprio nome está a indicar, de amortecer ou mitigar os impactos produzidos pelas atividades externas que sejam incompatíveis com o manejo da unidade
.
No ponto, importa registrar a revogação expressa da Resolução CONAMA 13/1990 pela congênere 428/2010, a qual vinha reiteradamente sendo aplicada pelos órgãos ambientais, não obstante já se encontrar revogada pelo art. 25 da lei n. 9.985/2000 conforme vimos sustentando nas edições anteriores desta obra.
Tal revogação, vale dizer, mostra-se benéfica à sociedade e ao meio ambiente, uma vez que “o entorno único com raio de dez quilômetros não satisfaz as peculiaridades de cada modalidade de unidade de conservação” porquanto essa metragem pode, no caso concreto, ser ora excessiva, ora insuficiente." (MILARÈ, Edis.
Obra citada.
RB 49.9).
A construção de empreendimentos na zona de amortecimento de parques nacionais demanda prévia aquiescência por parte do ICMBIO, autarquia federal criada com base na lei nº 11.516, de 28 de agosto de 2007.
DIREITO AMBIENTAL. LICENCIAMENTO AMBIENTAL. EMPREENDIMENTO A SER CONSTRUÍDO EM ZONA DE AMORTECIMENTO DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO FEDERAL. USINA HIDRELÉTRICA DE BAIXO IGUAÇU. PARQUE NACIONAL DO IGUAÇU. NECESSIDADE DE ANUÊNCIA DO ICMBIO. 1.
O licenciamento ambiental de empreendimento que produza impacto ambiental sobre unidade de conservação e/ou a respectiva zona de amortecimento, além do atendimento às normas protetivas do ambiente natural em geral, depende da anuência do órgão responsável pela administração da unidade conservacionista, conforme previsto no art. 36- § 3º da Lei 9.985/2000
. 2. A anuência do órgão gestor tem de ser obtida em relação ao empreendimento como um todo, de forma que se tenha certeza quanto à sua viabilidade ambiental, dada sua influência sobre área especialmente protegida, e quanto a terem sido realizados todos os estudos necessários e tomadas todas as medidas possíveis para a minimização do impacto sobre a unidade de conservação. 3. A anuência do órgão gestor à concessão de licença prévia para o empreendimento, mas com o estabelecimento de condicionantes consistentes na realização de estudos e em medidas complementares necessárias à proteção da unidade de conservação, obriga o empreendedor a demonstrar àquele órgão os resultados obtidos com as providências indicadas na licença prévia, de forma a obter a anuência para a expedição da licença de instalação da obra. Somente o órgão gestor da unidade conservacionista, que é quem por ela "fala", pode avaliar se os resultados são satisfatórios para a preservação da unidade. 4. Por isso, por infringência à regra do art. 36- § 3º da Lei 9.985/2000, é ilegal a expedição de licença de instalação do empreendimento impactante pelo órgão ambiental estadual competente, sem a prévia manifestação favorável do órgão gestor da unidade de conservação atingida, ainda que este tenha anteriormente prestado sua anuência, sob condição, à expedição de licença prévia. 5. Agravo de instrumento parcialmente provido para suspender os efeitos da licença de instalação da usina hidrelétrica de Baixo Iguaçu/PR emitida pelo Instituto Ambiental do Paraná - IAP, em decorrência da ausência de prévia manifestação expressa do ICMBio, órgão administrador do Parque Nacional do Iguaçu, sobre o atendimento das exigências contidas nas condicionantes previstas na licença prévia do empreendimento, tendentes à preservação do parque nacional. (TRF-4 - AG: 50033645220144040000 5003364-52.2014.4.04.0000, Relator: CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, Data de Julgamento: 16/06/2014, QUARTA TURMA)
ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. ARACRUZ CELULOSE. PLANTAÇÃO DE EUCALIPTO EM ZONA DE AMORTECIMENTO DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO. PARQUE NACIONAL DO DESCOBRIMENTO. INEXISTÊNCIA DE LICENCIAMENTO E DE AUTORIZAÇÃO DO CHEFE DA UNIDADE. AUTUAÇÃO DO INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS (IBAMA). LEGALIDADE. NORMA LEGAL POSTERIOR QUE ALTERA A ZONA DE AMORTECIMENTO. LEX MITIOR. APLICAÇÃO RETROATIVA. 1.
O desenvolvimento de atividades potencialmente causadoras de impacto ambiental nos limites da zona de amortecimento de unidade de conservação depende de autorização do chefe da unidade, de acordo com o disposto no art. 36, § 3º, da Lei n. 9.985/2000, e no art. 2º da Resolução Conama n. 13/1990. 2. A competência para a fiscalização dos órgãos ambientais, segundo o disposto no art. 23 da Constituição Federal, é comum, não havendo, portanto, qualquer ilegalidade na fiscalização realizada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
. 3. Autuação e imposição de penalidades com base no art. 2º da Resolução Conama n. 13/1990, que estabelecia a zona de amortecimento do Parque Nacional do Descobrimento em dez quilômetros, dispositivo posteriormente revogado e substituído por outro (art. 1º, § 2º, da Resolução n. 428/2010), que fixou em três quilômetros esse limite. Aplicação da lei posterior mais benigna. 4. Recurso de apelação a que se dá provimento. (TRF-1 - AC: 00024778220064013310, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO, Data de Julgamento: 10/11/2014, SEXTA TURMA, Data de Publicação: 21/11/2014)
2.49.
Prazos de decadência - constituição do crédito:
O direito invocado pelo autor na peça inicial não se submete a prazos decadenciais. Já o cogitado direito do Fisco à constituição do crédito tributário está submetido a lapsos de caducidade.
O CTN/66 estipula marcos peremptórios para a efetivação do lançamento, sobremodo quando em causa tributos submetidos ao pagamento antecipado à conferência estatal, impropriamente chamado de lançamento por homologação. Com efeito, o art. 150, §4º, CTN, dispõe que "
Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação
."
Daí o relevo da análise de José Souto Maior Borges, quando sustenta o que segue:
"
Abstraída, para simplificação expositiva, a ocorrência de dolo, fraude ou simulação, podem ser discriminadas basicamente as seguintes situações jurídicas relacionadas com a atividade do sujeito passivo prévia à homologação
:
a) o sujeito passivo paga integralmente o tributo devido;
b) o sujeito passivo paga tributo totalmente indevido;
c) o sujeito passivo paga o tributo com insuficiência;
d)
o sujeito passivo paga tributo maior que o devido
;
e) o sujeito passivo não paga tributo devido.
Para se evitar equívocos nessa matéria, tão eriçada de dificuldades, deve-se salientar que, consoante demonstrado, a homologação pelo Fisco é da atividade do sujeito passivo, não necessariamente do pagamento. Assim sendo, nos impostos não cumulativos, tais como o ICMS e o IPI, pode perfeitamente ser homologada atividade da qual não resulte pagamento de tributo
.
Ora, em qualquer uma dessas hipóteses, o Código tributário Nacional atribui a eficácia de algo acontecido a algo que concretamente não ocorreu - o lançamento. A chamada homologação tácita nada mais significa senão uma deformação da realidade fática - a situação jurídica subjacente a essa disciplina normativa.
Trata-se, pois, seja qual for, dentre aquelas, a situação-origem, de uma ficção do Direito tributário. É irrelevante que tenha havido ou não o pagamento, porque relevante é apenas o transcurso do prazo sem pronunciamento - di-lo o CTN - do Fisco.
São pressupostos de fato diferentes a efetiva e concreta realização da homologação e a omissão desse ato, dentro do quinquênio. Mas o Código tributário Nacional lhes atribui, sob esse prisma, os mesmos efeitos jurídicos. Logo, a hipótese é, desenganadamente, de ficção de Direito tributário
.
Transcorrido o prazo de cinco anos, previsto no art. 150, §4º, não mais poderá o fisco lançar o tributo." (BORGES, José Souto Maior.
Lançamento tributário.
2. ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 399-400)
Por conseguinte, como bem enfatiza Souto Maior Borges, o efeito decadencial previsto no art. 150, §4º, CTN/66, impõe-se mesmo quando o contribuinte deixa de recolher tributo devido, nos 05 anos anteriores. Já o tributarista Eurico Marcos Diniz de Santi advoga tese pontualmente distinta:
"Regra da decadência do direito de lançar sem pagamento antecipado:
Essa regra apresenta na sua hipótese a seguinte combinação dos quatro primeiros critérios: não previsão de pagamento antecipado e, portanto, não ocorrência do pagamento antecipado; ou então previsão de pagamento antecipado, mas não ocorrência do pagamento antecipado. Não havendo pagamento antecipado, não ocorrência de dolo, fraude ou simulação, e não ocorrência da notificação por parte do Fisco
.
Nessa configuração, o prazo decadencial é de cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que tenha ocorrido o evento tributário (art. 173, I, CTN).
Anote-se que a determinação do dies a quo desse prazo tem como pressuposto a constituição jurídica do fato tributário, no qual se identificará juridicamente o tempo no fato, que é, nesse caso, o marco temporal da ocorrência do mencionado evento.
O consequente normativo dessa regra ataca a competência administrativa de o Fisco produzir o ato-norma administrativo de lançamento tributário ou, o que é o mesmo, extingue o direito de a Fazenda Pública constituir o crédito, na precisa dicção do caput do art. 173, CTN." (SANTI, Eurico Marcos Diniz de.
Decadência e prescrição no Direito tributário.
4. ed. São Paulo: Saraiva, p. 2011, p. 120)
Por mais que o tema seja polêmico na doutrina tributária brasileira, esse entendimento de Eurico de Santi tem encontrado ressonância junto ao Superior Tribunal de Justiça, como bem ilustram os seguintes julgados REsp. 512840/SP, 2ª Turma, DJ 23.05.2005; EDcl no REsp. 947988, DJe 19.12.2008; Ag Rg no REsp. 790875, DJe 11.02.2009 e REsp. 989421, DJe 10.12.2008.
Menciono a seguinte ementa:
PROCESSUAL CIVIL - RECURSO ESPECIAL - TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO - CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA - INEXISTÊNCIA DE PAGAMENTO ANTECIPADO - DECADÊNCIA DO DIREITO DE O FISCO CONSTITUIR O CRÉDITO TRIBUTÁRIO - TERMO INICIAL - ARTIGO 173, I, DO CTN - APLICAÇÃO CUMULATIVA DOS PRAZOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 150, § 4º, e 173, do CTN - IMPOSSIBILIDADE - REEXAME DE PROVAS: SÚMULA 7/STJ. PRECEDENTE: REsp 973.733/SC. 1.
O prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário (lançamento de ofício) conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, o mesmo inocorre, sem a constatação de dolo, fraude ou simulação do contribuinte, inexistindo declaração prévia do débito
. 2. É inadmissível o recurso especial se a análise da pretensão da recorrente demanda o reexame de provas. 3. Recursos especiais conhecidos e não providos. (RESP 200702134298, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:01/09/2010 ..DTPB:.)
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. ART. 535, DO CPC. INOCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO. TAXA DE CONTROLE E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL - TCFA. LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRAZO DECADENCIAL PARA A CONSTITUIÇÃO E PRAZO PRESCRICIONAL PARA A COBRANÇA DA EXAÇÃO.1. Não há que se falar em violação do art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem se manifesta suficientemente sobre o tema, muito embora não tenha adotado as teses e os artigos de lei invocados pelas partes.2. O STJ já assentou que a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental - TCFA, prevista na Lei n. 6.938/81, sujeita-se a lançamento por homologação. Nessa sistemática, "[...] a legislação atribui ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa [...]" (art. 150, caput, do CTN). Precedente: REsp 1241735/SC, Segunda Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 26/04/2011, DJe 04/05/2011.3. Sendo assim, o pagamento do referido tributo deverá ocorrer antes da própria constituição do crédito tributário, isto é, a legislação (art. 17-G, da Lei n. 6.938/81) estabelece uma data de vencimento que antecede o ato de fiscalização da administração tributária.
4. Essa fiscalização posterior somente ensejará o lançamento do crédito tributário se o pagamento foi parcial (incompleto) ou se não houver pagamento em absoluto. Na primeira hipótese (pagamento parcial), a notificação ao contribuinte deverá se dar dentro do prazo decadencial de 5 (cinco) anos a contar da ocorrência do fato gerador (art. 150, §4º, do CTN).
Já na segunda hipótese (ausência completa de pagamento), a notificação ao contribuinte deverá ocorrer dentro do prazo decadencial de 5 (cinco) anos a contar do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado
(art. 173, I, do CTN). Precedentes: REsp 1241735/SC, Segunda Turma, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 26/04/2011, DJe 04/05/2011; REsp. Nº 973.733 - SC, Primeira Seção, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12.8.2009.
5. Notificado o contribuinte para pagar os valores faltantes ou se defender, dá-se a constituição definitiva do crédito tributário, o que inaugura o prazo prescricional para a sua cobrança (art. 174, do CTN), salvo em ocorrendo quaisquer das hipóteses de suspensão da exigibilidade do crédito tributário (art. 151, do CTN) ou interrupção do lustro prescricional (art. 174, parágrafo único, do CTN).6. No caso concreto, o débito de TCFA vencido em 30.12.2003 e não pago em absoluto foi notificado ao sujeito passivo em 04.08.2008, sendo que o prazo decadencial se findaria, na pior das hipóteses, em 01.01.2009 (cinco anos após o primeiro dia do exercício seguinte ao exercício de 2003 - art. 173, I, do CTN), não tendo, pois, ocorrido a decadência.7. Constituído o crédito tributário em 04.08.2008, na pior das hipóteses, a Administração Fazendária tinha até o dia 04.08.2013 para ajuizar a execução (cinco anos a contar da constituição definitiva). Sem deixar de observar que o despacho que ordena a citação interrompe a prescrição de forma retroativa à data da propositura da ação (itens "14" e "15" do citado recurso representativo da controvérsia REsp. Nº 1.120.295 - SP, Primeira Seção, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12.5.2010). Portanto, não ocorreu também a prescrição.8. Recurso especial parcialmente provido." (STJ, REsp 1259634 / SC, rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, T2 - SEGUNDA TURMA, DJe 19/09/2011)
Note-se que o prazo para constituição do crédito tributário, mediante o lançamento, é reconhecido como um caso de decadência.
2.50. Prescrição da pretensão de cobrança:
Atente-se para a lição de Nelson Nery Jr.:
"O prazo previsto expressamente em lei para o exercício das pretensões que se ajuízam mediante ação constitutiva, positiva ou negativa, é de decadência, pois a pretensão constitutiva se caracteriza como direito potestativo.
As pretensões que se exercem mediante ação declaratória são perpétuas (imprescritíveis). Isto significa que podem ser ajuizadas mesmo se já estiver prescrita a pretensão condenatória do direito cuja existência ou inexistência se quer ver declarada.
"
(NERY JÚNIOR, N.
Novo Código Civil anotado.
SP: RT, 2002).
Ao contrário do que ocorre com a decadência, a prescrição tributária diz respeito à pretensão decorrente do lançamento. O prazo de 05 anos, previsto no CTN - art. 174 - deve ser computado a partir do esgotamento do processo administrativo. Segue:
"A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. Parágrafo único. A prescrição se interrompe: I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005) II - pelo protesto judicial; III - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor; IV - por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor."
A título de exemplo, atente-se para o que transcrevo abaixo:
"TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PARCELAMENTO. INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ENTENDIMENTO FIXADO NA ORIGEM COM BASE NO CONTEXTO FÁTICO DOS AUTOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1.
Nos termos da jurisprudência do STJ, a confissão espontânea de dívida seguida do pedido de parcelamento representa ato inequívoco de reconhecimento do débito, interrompendo, assim, o curso da prescrição tributária, nos termos do art. 174, parágrafo único, inciso IV, do CTN
. 2. O acórdão recorrido delineou a controvérsia dentro do universo fático-comprobatório, ao afirmar que não ocorreu a interrupção do lapso prescricional, haja vista que não ficou provada a ocorrência de parcelamento. Caso em que não há como aferir eventual violação dos dispositivos infraconstitucionais alegados sem que as provas sejam abertas ao reexame. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no AREsp: 553001 PR 2014/0181566-0, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 16/09/2014, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/09/2014)"
2.51.
Suspensão da exigibilidade do tributo:
Sabe-se que há uma graduação da efetividade da obrigação jurídico-tributária. A prática de comportamentos ou a consumação de fatos jurídico-tributários dá origem à obrigação de pagar determinados tributos em um dado prazo, com uma determinada alíquota e base de cálculo. Com isso, surge a dívida. Vencido o prazo de pagamento, a dívida torna-se vencida. Para que o Fisco possa cobrar aludido crédito, impõe-se que promova o lançamento de revisão, previsto no art. 150, §4, CTN - quanto aos tributos submetidos ao lançamento por homologação -, e art. 142, CTN. A execução depende da inscrição em dívida ativa etc
Com efeito,
"Exigibilidade. Surgimento. O crédito tributário, uma vez constituído pelo lançamento, é - por definição - líquido e certo. A exigibilidade surgirá com o inadimplemento no prazo legal."
(PAULSEN, Leandro.
Direito tributário:
constituição e código tributário à luz da doutrina e da jurisprudência, 6ª ed., Livraria do advogado, p. 1013.
"
O crédito tributário passa por diferentes momentos de eficácia: crédito simplesmente constituído (pela ocorrência do fato gerador) torna-se crédito exigível (pelo lançamento notificado ou pela decisão administrativa definitiva) e finalmente, crédito exeqüível (pela inscrição nos livros da dívida ativa), dotado de liquidez e certeza
."
(TORRES, Ricardo Lobo.
Curso de direito financeiro e tributário.
14. ed., Rio de Janeiro: Renovar. p. 273)
Ademais,
"
a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nas palavras do Código, ou da relação jurídica tributária e, mais especificamente, do objeto dessa relação, tal como adotaremos neste capítulo, tem por efeito impossibilitar que a administração tributária proceda a quaisquer atos de cobrança em face do sujeito passivo
. Trata-se, nesse sentido, de suspensão da eficácia técnica da norma de tributação que, devidamente constituída, não poderá incidir enquanto tiver vigência a hipótese de suspensão. Explica-se melhor. Tome-se como exemplo a apresentação de defesa administrativa em face de lançamento de ofício. Nos termos do artigo 151, inciso III do Código Tributário Nacional, trata-se de causa de suspensão da exigibilidade. Um olhar mais atento aponta para o fato de que a apresentação de tal defesa resulta na introdução de norma individual e concreta no ordenamento jurídico, em cujo antecedente constará o fato de o sujeito passivo ter apresentado defesa administrativa ao lançamento. Como consequência inexorável deste fato, tem-se a constituição de relação jurídica que proíbe o ente tributante (agora, no papel de sujeito passivo) de exigir o crédito tributário, dada a suspensão de sua exigibilidade."
(PISCITELLI, Tathiane.
Curso de Direito Tributário.
São Paulo: RT. 2022, tópico 11).
Acrescente-se, de todo modo, que o Juízo pode e deve suspender a exigibilidade dos tributos, mediante antecipação de tutela, sempre que restarem preenchidos os requisitos previstos no
art. 300, CPC e art. 151, CTN
. Note-se que a
antecipação de tutela é causa autônoma da suspensão
, conquanto o Juízo possa condicioná-la à apresentação de cauções, conforme art. 300, §1, CPC/15.
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. CRÉDITO TRIBUTÁRIO. SUSPENSÃO. TUTELA ANTECIPADA. CAUSA AUTÔNOMA. GARANTIA DO JUÍZO. DESNECESSIDADE. 1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma nele prevista (Enunciado Administrativo n. 3). 2.
A concessão de medida liminar ou de tutela antecipada em demanda judicial é causa autônoma para a suspensão da exigibilidade do crédito, na forma do art. 151, V, do CTN
. 3. A legislação tributária não impõe nenhuma outra condição ao deferimento da referida suspensão da exigibilidade, senão o próprio atendimento dos pressupostos da tutela de urgência, não sendo possível restringir o alcance da norma complementar ao cumprimento de exigência estabelecida em lei ordinária para a atribuição de efeito suspensivo aos embargos à execução. 4. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no AREsp: 1288110 PR 2018/0103865-1, Relator: Ministro GURGEL DE FARIA, Data de Julgamento: 21/09/2020, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/10/2020)
2.52. Eventual efetivação de depósito:
Como sabido, é direito do contribuinte promover depósito suspensivo da exigibilidade do tributo, na forma do art. 151, CTN.
“O depósito do montante integral com o fim de suspender a exigibilidade é direito do contribuinte (REsp 962.838/BA, Primeira Seção). É, portanto, facultativo e prescinde de autorização judicial, podendo ser realizado em qualquer ação antiexacional AgRg no REsp 835.067/SP Segunda Turma). Para que tenha efeito, bastam a comprovação nos autos judiciais e a comunicação desse ato à Fazenda pelo Estado Juiz ou mesmo pelo próprio Contribuinte."
(SEEFELDER, Claudio; CAMPOS, Rogério.
Constituição e Código Tributário Comentados.
São Paulo: RT. 2020).
Segundo o STJ,
"
A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que o depósito de que trata o art. 151 , II , do CTN constitui direito subjetivo do contribuinte, que pode efetuá-lo tanto nos autos da ação principal quanto em Ação Cautelar, sendo desnecessária a autorização do Juízo
. É facultado ao sujeito passivo da relação tributária efetivar o depósito do montante integral do valor da dívida, a fim de suspender a cobrança do tributo e evitar os efeitos decorrentes da mora, enquanto se discute na esfera administrativa ou judicial a exigibilidade da exação ( AgRg no REsp 517937/PE , Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 28/4/2009, DJe 17/6/2009)"
(STJ - REsp: 1691774 SP 2017/0202085-2, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 10/10/2017, T2 - 2. TURMA, Data de Publicação: DJe 16/10/2017)
Para surtir o efeito de suspender a exigibilidade do tributo, aludido depósito deve ser promovido com atenção à
súmula 112, STJ
. Os valores deverão permanecer, então, retidos em conta vinculada ao processo, corrigidos conforme variação da taxa SELIC, conforme
art. 1, da lei n. 9.703/1998
, regra especial se confrontada com o art. 14 da lei n. 9.289/1996, que impõe a adoção da taxa referencial como fator de correção dos depósitos promovidos em juízo.
Em tal hipótese, caso, ao final, a pretensão do contribuinte venha a ser julgada improcedente, os valores devem ser convertidos em renda da demandada, com imputação em pagamento nas obrigações tributárias controvertidas, conforme lógica do art. 354, Código Civil e art. 156, VI, CTN.
Atente-se para os seguintes julgados:
"RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL.
TRIBUTÁRIO. DEPÓSITO DO MONTANTE INTEGRAL. ART. 151,
II, DO CTN. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. CONVERSÃO EM RENDA. DECADÊNCIA.
1.
Com o depósito do montante integral, tem-se verdadeiro
lançamento por homologação. O contribuinte calcula o valor do
tributo e substitui o pagamento antecipado pelo depósito, por
entender indevida a cobrança. Se a Fazenda aceita como integral o
depósito, para fins de suspensão da exigibilidade do crédito,
aquiesceu expressa ou tacitamente com o valor indicado pelo
contribuinte, o que equivale à homologação fiscal prevista no art.
150, § 4º, do CTN.
2. Uma vez ocorrido o lançamento tácito, encontra-se
constituído o crédito tributário, razão pela qual não há mais falar no transcurso do prazo decadencial nem na necessidade de lançamento de ofício das importâncias depositadas. Precedentes da Primeira
Seção.
3. A extinção do processo sem resolução de mérito, salvo o
caso de ilegitimidade passiva ad causam, impõe a conversão do
depósito em renda da Fazenda Pública respectiva. Precedentes:
AgRg nos EREsp 1.106.765⁄SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves,
Primeira Seção, DJe 30.11.2009, AgRg nos EDcl no Ag 1378036⁄CE,
Rel. Ministro Cesar Asfor Rocha, DJe 29⁄06⁄2011; REsp 901.052⁄SP,
Rel. Min. Castro Meira, Primeira Seção, DJe 03.03.2008.
4. Os fundamentos de fato trazidos pela agravante são premissas não contempladas no acórdão recorrido, de modo que não
podem aqui ser discutidas ou modificadas sob pena de inaceitável
incursão em matéria de prova, o que é vedado na instância especial,
nos termos da Súmula 7⁄STJ.
5. Agravo regimental não provido."
(AgRg no REsp 1.213.319⁄SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 17⁄05⁄2012, DJe 28⁄05⁄2012)
TRIBUTÁRIO. PROCESSO JUDICIAL. DEPÓSITO COM A FINALIDADE DE SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DEPÓSITO EQUIVALENTE AO PAGAMENTO. DESNECESSIDADE DE LANÇAMENTO. 1. O depósito judicial do montante integral do débito é causa suspensiva de exigibilidade do crédito tributário, ex vi do artigo 151, II do CTN e, por força do seu desígnio, implica lançamento por homologação tácito, no montante exato do quantum depositado, conjurando eventual alegação de decadência do direito de constituir o crédito tributário. Precedentes: EREsp 898.992/PR, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08.08.2007, DJ 27.08.2007; REsp 895.604/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01.04.2008, DJ 11.04.2008; AgRg no REsp 971.054/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06.12.2007, DJ 24.03.2008. .
Julgado improcedente o pedido da empresa e, em havendo depósito, torna-se desnecessária a constituição do crédito tributário no qüinqüênio legal, não restando consumada a decadência. Conseqüentemente, revela-se escorreita a conversão em renda dos depósitos judiciais efetuados no âmbito da ação ordinária, uma vez não configurada a decadência do direito de o Fisco constituir o crédito tributário e tendo em vista a improcedência do pedido do contribuinte
. 3. Indevidamente realizado o levantamento do depósito judicial pelo contribuinte, afasta-se a razão da suspensão do crédito tributário, forçando ao FISCO FEDERAL a realização do lançamento tributário, inscrevendo o contribuinte em CDA, não existindo decadência ou prescrição do crédito tributário. 4. Apelação do autor improvida e apelação da UNIÃO FEDERAL e Remessa Oficial providas. (APELREEX 200171000285040, MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, D.E. 13/10/2009.)
Caso, do contrário, a pretensão do demandante venha a ser julgada procedente, com subsequente trânsito em julgado da decisão judicial, os valores hão de ser restituídos ao contribuinte, devidamente corrigidos na forma dos
arts 35 e ss. da
lei nº 14.973, de 16 de setembro de 2024
, pela qual restou revogada a lei n. 9.703/1998, norma especial em face do art. 11 da lei n. 9.289/1996.
2.53.
Eventual oferecimento de contracautelas:
Outra questão diz respeito ao oferecimento de bens em garantia, por parte do contribuinte, a fim de se suspender a exigibilidade do tributo e, com isso, obter a certidão positiva com efeitos de negativa. Anote-se que o Código Tributário Nacional dispõe sobre as causas de suspensão da exigibilidade dos tributos no seu art. 151:
Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: I - moratória; II - o depósito do seu montante integral; III - as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo; IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança. V - a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial; VI - o parcelamento. Parágrafo único.
O disposto neste artigo não dispensa o cumprimento das obrigações assessórios dependentes da obrigação principal cujo crédito seja suspenso, ou dela conseqüentes
.
Percebe-se, pois, que, no mais das vezes, a garantia a ser constituída pelo contribuinte - por sua iniciativa - a fim de se suspender a exigibilidade do tributo é o depósito do montante integral do valor discutido. Nesse sentido, atente-se para a conhecida súmula 112 do Superior Tribunal de Justiça:
"O depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro."
Acrescente-se que, como regra, os valores depositados em juízo devem ser convertidos em renda da demandada, caso a pretensão seja julgada improcedente:
TRIBUTÁRIO. PROCESSO JUDICIAL. DEPÓSITO COM A FINALIDADE DE SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. DEPÓSITO EQUIVALENTE AO PAGAMENTO. DESNECESSIDADE DE LANÇAMENTO. 1. O depósito judicial do montante integral do débito é causa suspensiva de exigibilidade do crédito tributário, ex vi do artigo 151, II do CTN e, por força do seu desígnio, implica lançamento por homologação tácito, no montante exato do quantum depositado, conjurando eventual alegação de decadência do direito de constituir o crédito tributário. Precedentes: EREsp 898.992/PR, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08.08.2007, DJ 27.08.2007; REsp 895.604/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01.04.2008, DJ 11.04.2008; AgRg no REsp 971.054/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06.12.2007, DJ 24.03.2008. 2.
Julgado improcedente o pedido da empresa e, em havendo depósito, torna-se desnecessária a constituição do crédito tributário no qüinqüênio legal, não restando consumada a decadência. Conseqüentemente, revela-se escorreita a conversão em renda dos depósitos judiciais efetuados no âmbito da ação ordinária, uma vez não configurada a decadência do direito de o Fisco constituir o crédito tributário e tendo em vista a improcedência do pedido do contribuinte
. 3. Indevidamente realizado o levantamento do depósito judicial pelo contribuinte, afasta-se a razão da suspensão do crédito tributário, forçando ao FISCO FEDERAL a realização do lançamento tributário, inscrevendo o contribuinte em CDA, não existindo decadência ou prescrição do crédito tributário. 4. Apelação do autor improvida e apelação da UNIÃO FEDERAL e Remessa Oficial providas. (APELREEX 200171000285040, MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, D.E. 13/10/2009.)
Situação pontualmente distinta trata do oferecimento de caução no período compreendido entre a constituição definitiva do crédito (lançamento já consolidado) e a deflagração da execução fiscal respectiva.
Nesse âmbito, vigora certo limbo, eis que o lançamento já se esgotou, mas o contribuinte ainda não foi citado/notificado para garantir o juízo. A respeito do tema, reporto-me ao precedente do STJ, submetido ao ritual dos recursos repetitivos
(art. 1º, lei 11.672).
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. AÇÃO CAUTELAR PARA ASSEGURAR A EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS DE NEGATIVA. POSSIBILIDADE. INSUFICIÊNCIA DA CAUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1.
O contribuinte pode, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter certidão positiva com efeito de negativa
. (Precedentes: EDcl no AgRg no REsp 1057365/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/08/2009, DJe 02/09/2009; EDcl nos EREsp 710.153/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/09/2009, DJe 01/10/2009; REsp 1075360/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/06/2009, DJe 23/06/2009; AgRg no REsp 898.412/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 13/02/2009; REsp 870.566/RS, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 11/02/2009; REsp 746.789/BA, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/11/2008, DJe 24/11/2008; EREsp 574107/PR, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA DJ 07.05.2007). 2. Dispõe o artigo 206 do CTN que: 'tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa.' A caução oferecida pelo contribuinte, antes da propositura da execução fiscal é equiparável à penhora antecipada e viabiliza a certidão pretendida, desde que prestada em valor suficiente à garantia do juízo. 3.
É viável a antecipação dos efeitos que seriam obtidos com a penhora no executivo fiscal, através de caução de eficácia semelhante. A percorrer-se entendimento diverso, o contribuinte que contra si tenha ajuizada ação de execução fiscal ostenta condição mais favorável do que aquele contra o qual o Fisco não se voltou judicialmente ainda
. 4. Deveras, não pode ser imputado ao contribuinte solvente, isto é, aquele em condições de oferecer bens suficientes à garantia da dívida, prejuízo pela demora do Fisco em ajuizar a execução fiscal para a cobrança do débito tributário. Raciocínio inverso implicaria em que o contribuinte que contra si tenha ajuizada ação de execução fiscal ostenta condição mais favorável do que aquele contra o qual o Fisco ainda não se voltou judicialmente. 5.
Mutatis mutandis
o mecanismo assemelha-se ao previsto no revogado art. 570 do CPC, por força do qual era lícito ao devedor iniciar a execução. Isso porque as obrigações, como vínculos pessoais, nasceram para serem extintas pelo cumprimento, diferentemente dos direitos reais que visam à perpetuação da situação jurídica nele edificadas. 6.
Outrossim, instigada a Fazenda pela caução oferecida, pode ela iniciar a execução, convertendo-se a garantia prestada por iniciativa do contribuinte na famigerada penhora que autoriza a expedição da certidão
. 7. In casu, verifica-se que a cautelar restou extinta sem resolução de mérito, impedindo a expedição do documento de regularidade fiscal, não por haver controvérsia relativa à possibilidade de garantia do juízo de forma antecipada, mas em virtude da insuficiência dos bens oferecidos em caução, consoante desume-se da seguinte passagem do voto condutor do aresto recorrido, in verbis: 'No caso dos autos, por intermédio da análise dos documentos acostados, depreende-se que os débitos a impedir a certidão de regularidade fiscal perfazem um montante de R$ 51.802,64, sendo ofertados em garantia pela autora chapas de MDF adquiridas para revenda, às quais atribuiu o valor de R$ 72.893,00. Todavia, muito embora as alegações da parte autora sejam no sentido de que o valor do bem oferecido é superior ao crédito tributário, entendo que o bem oferecido como caução carece da idoneidade necessária para aceitação como garantia, uma vez que se trata de bem de difícil alienação. 8. Destarte, para infirmar os fundamentos do aresto recorrido, é imprescindível o revolvimento de matéria fático-probatória, o que resta defeso a esta Corte Superior, em face do óbice erigido pela Súmula 07 do STJ. 9. Por idêntico fundamento, resta interditada, a este Tribunal Superior, a análise da questão de ordem suscitada pela recorrente, consoante infere-se do voto condutor do acórdão recorrido, litteris: 'Prefacialmente, não merece prosperar a alegação da apelante de que é nula a sentença, porquanto não foi observada a relação de dependência com o processo de nº 2007.71.00.007754-8. Sem razão a autora. Os objetos da ação cautelar e da ação ordinária em questão são diferentes. Na ação cautelar a demanda limita-se à possibilidade ou não de oferecer bens em caução de dívida tributária para fins de obtenção de CND, não se adentrando a discussão do débito em si, já que tal desbordaria dos limites do procedimento cautelar. Ademais, há que se observar que a sentença corretamente julgou extinto o presente feito, sem julgamento de mérito, em relação ao pedido que ultrapassou os limites objetivos de conhecimento da causa próprios do procedimento cautelar.' 10. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008. ..EMEN: (RESP 200900279896, LUIZ FUX, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJE DATA:01/02/2010 ..DTPB:.)
Em sentido semelhante, reporto-me também ao seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:
TRIBUTÁRIO. MEDIDA CAUTELAR. CAUÇÃO. CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITO DE NEGATIVA. VIABILIDADE. 1.
É lícito ao contribuinte, antes do ajuizamento da execução fiscal, oferecer caução no valor do débito inscrito em dívida ativa com o objetivo de, antecipando a penhora que garantiria o processo de execução, obter certidão positiva com efeitos de negativa. Precedentes
. 2. Embargos de divergência não providos. ..EMEN: (ERESP 200502031098, TEORI ALBINO ZAVASCKI, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJ DATA:06/08/2007 PG:00452 ..DTPB:.)
Frente ao exposto, desde que se trate dessa situação pontual - período entre a constituição definitiva do crédito, mediante lançamento, e a deflagração da execução fiscal -, reputo, com cognição precária, que o contribuinte pode ofertar bens em caução, nos termos da jurisprudência do STJ. Para tanto, contudo, a garantia há de ser idônea e suficiente, deve respeitar a ordem legal (art. 11, lei 6.830). Não pode ofertar bens segundo apenas as suas conveniências, repiso.
TRIBUTÁRIO. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. CAUÇÃO. EQUIPARAÇÃO À PENHORA. CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITOS DE NEGATIVA. CADIN.
Havendo débito definitivamente constituído contra o contribuinte e ainda não ajuizado
, é-lhe assegurado o direito de oferecer caução, antecipando a futura penhora, de forma a obter certidão positiva de débitos com efeito de negativa. O oferecimento de caução em medida cautelar equipara-se à penhora consolidada em execução fiscal. (TRF4, AC 2009.72.06.000784-7, Segunda Turma, Relatora Luciane Amaral Corrêa Münch, D.E. 24/02/2010)
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CAUTELAR. CAUÇÃO. ART. 206 DO CTN. CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITO DE NEGATIVA. POSSIBILIDADE.1. É lícito ao contribuinte oferecer, antes do ajuizamento da execução fiscal, caução no valor do débito inscrito em dívida ativa com o objetivo de, antecipando a penhora que garantiria o processo de execução, obter certidão positiva com efeitos de negativa. Precedentes. 2.
Entendimento diverso do perfilhado pelo Tribunal de origem levaria à distorção inaceitável: o contribuinte que contra si já tivesse ajuizada execução fiscal, garantida por penhora, teria direito à certidão positiva com efeitos de negativa; já quanto àquele que, embora igualmente solvente, o Fisco ainda não houvesse proposto a execução, o direito à indigitada certidão seria negado
. 3. Embargos de divergência providos. (EREsp 779121/SC, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/03/2007, DJ 07/05/2007 p. 271)
Cuidando-se de seguro-garantia de débitos já inscritos em dívida ativa, deve-se atentar ainda para a Portaria 1.153/2009, da Fazenda Nacional (art. 2º). Ademais, a referida antecipação da penhora não surte todos os efeitos do art. 151, CTN, conforme os Tribunais têm deliberado:
"(...)
Consolidada a jurisprudência no sentido de que fiança bancária não suspende a exigibilidade fiscal, não se confundindo com o depósito integral do crédito tributário, nos termos do artigo 151, III, CTN, e Súmula 112/STJ, embora possa servir como garantia, em antecipação de penhora, para a emissão de certidão de regularidade fiscal, conforme artigo 206, CTN, e Súmula 38/TFR
." (AI 00106474420144030000, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MUTA, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/12/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
"(...) Quanto ao pleito de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, cujas hipóteses estão previstas no art. 151 do CTN, cabe destacar que a prestação de caução com o oferecimento de fiança bancária não se afigura apta para justificar o pedido,
já que somente garante o débito em execução, em equiparação ou prévia da efetiva penhora, para o fim específico da viabilização da expedição de certidão de regularidade fiscal, conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n.º 1.156.668
, representativo da controvérsia. Ademais, como assinala a própria agravante, o sistema da RFB não considerou os alegados pagamentos efetuados e a manifestação de desconformidade apresentada na seara administrativa não foi aceita por intempestividade.- Agravo de instrumento a que se dá provimento." (AI 00262465720134030000, DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE, TRF3 - QUARTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/11/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
"(...) 2.
Não há necessidade, para os fins de expedição de certidão positiva de débito com efeito de negativa que a caução seja em dinheiro, porque não se trata de suspensão da exigibilidade do débito, mas de antecipação de penhora para garantia do débito, nos termos do artigo 206 do CTN - Código Tributário Nacional
. 3. No caso concreto, a execução já teve início, mas o trâmite processual necessário para a formalização da penhora é o motivo para o ajuizamento da medida cautelar no Juízo a quo, a fim de obter desde logo a certidão positiva de débito com efeito de negativa. (...)" (AI 00254299020134030000, JUIZ CONVOCADO MÁRCIO MESQUITA, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/02/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
Note-se ainda que o Código de Processo Civil dispôs sobre a antecipação de tutela - art. 300, CPC -, facultando que a medida seja condicionada à apresentação de contracautelas pelo interessado, sempre que isso se apresente como medida necessária (art. 300, §1º, CPC), até por conta da responsabilização prevista no art. 302, CPC/15 e lógica da súmula 405, CPC. A antecipação de efeitos irreversíveis se revela vedada, como regra, por conta do art. 300, §3º, CPC.
2.54. Seguro-garantia e a súmula 112, STJ:
Anoto que os Tribunais têm enfatizado que, conquanto o seguro fiança possa ser ofertado como medida de inibição de protesto judicial ou mesmo para obtenção de certidões de regularidade fiscal, não teria o condão de ensejar efetiva suspensão da exigibilidade dos alegados tributos.
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR. SUBSTITUIÇÃO DE GARANTIA APRESENTADA EM MANDADO DE SEGURANÇA PARA SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DO QUESTIONADO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. INVIABILIDADE DA SUBSTITUIÇÃO DO DEPÓSITO EM DINHEIRO POR SEGURO GARANTIA. SÚMULA 112/STJ. FUMAÇA DO BOM DIREITO NÃO EVIDENCIADA. 1. É possível a formulação de medida cautelar atípica diretamente no STJ, considerando o permissivo contido no art. 800, parágrafo único, do CPC/73 (art. 299, parágrafo único, do novo CPC/2015). 2. Ausente, na espécie, o fumus boni iuris, pois, a teor da Súmula 112/STJ,
"O depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro", não sendo possível, em contexto de mandado de segurança, fundar a pretendida substituição nos arts. 9º, II e § 3º e 15, I, da Lei nº 6.830/80, sem que sucumba a própria suspensão da exigibilidade do crédito, de que cuida o art. 151, II, do CTN. 4. Agravo regimental a que se nega provimento
. (STJ - AgRg na MC: 25104 SP 2015/0276509-0, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Julgamento: 17/05/2016, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/05/2016)
"ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM EXECUÇÃO FISCAL. CRÉDITO NÃO TRIBUTÁRIO. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. INSCRIÇÃO NO CADIN. POSSIBILIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NÃO PROVIDOS. I. Nos termos do relatado, trata-se de julgar embargos de declaração opostos pela SUL AMERICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, alegando supostas omissões no Acórdão embargado, no que se refere à possibilidade de apresentação de seguro garantia para suspensão da exigibilidade do crédito de natureza não tributária; inscrição no CADIN; e emissão de certidão positiva com efeitos de negativa. II. A Lei nº 13.043/2014 alterou os Artigos 7º, 15 e 16, todos da Lei nº 6.830/1980, equiparando o seguro garantia judicial à fiança bancária para fins de garantia da execução, além do depósito em dinheiro. E tal orientação foi também adotada no atual CPC/2015, em seu Artigo 835, § 2º que determina que," Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento ". III.
Ocorre, no entanto, que a Primeira Seção do Eg. STJ, em regime de Recurso Repetitivo, decidiu, ao julgar o REsp nº 1.156.668/DF (Tema nº 378, Relator: Min. LUIZ FUX, DJe 10.12.2010), que a fiança bancária não é equiparável ao depósito integral do débito exequendo para fins de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, ante a taxatividade do Artigo 151, CTN e o teor da Súmula nº 112/STJ ("O depósito somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em dinheiro"). no julgado em questão, adotou-se entendimento no sentido de que"a suspensão da exigibilidade do crédito tributário (que implica óbice à prática de quaisquer atos executivos) encontra-se taxativamente prevista no art. 151 do CTN
, sendo certo que a prestação de caução, mediante o oferecimento de fiança bancária, ainda que no montante integral do valor devido, não ostenta o efeito de suspender a exigibilidade do crédito tributário, mas apenas de garantir o débito exequendo, em equiparação ou antecipação à penhora, com o escopo precípuo de viabilizar a expedição de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa e a oposição de embargos". IV. Assim, embora não seja cabível a suspensão da exigibilidade pretendida, ressalta-se que, estando garantido o débito por seguro fiança, deve-se obstar a inscrição no CADIN, viabilizando a expedição de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa, conforme decidido no REsp nº 1.156.668/DF. V. Embargos de declaração parcialmente providos." (acórdão mencionado no julgado (STJ - REsp: 1926938 RJ 2021/0072498-6, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Publicação: DJ 26/03/2021)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. tributário. TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE. caução. suspensão da exigibilidade do crédito tributário. artigo 151 do ctn. fiança bancária. impossibilidade. cadin. certidão positiva com efeitos de negativa. possibilidade de renovação. 1. A prestação de caução, para garantir dívida tributária constituída em caráter definitivo, assegura ao contribuinte em favor de quem ela é prestada o direito de obter certidão positiva de débitos fiscais, com efeitos de negativa, mas não acarreta a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, a qual somente ocorre nas hipóteses taxativamente previstas no Código Tributário Nacional (artigo 151). 2.
A jurisprudência firmou-se no sentido de acolher a prestação de caução para evitar que, após a constituição definitiva do crédito tributário, a eventual demora no ajuizamento do processo de execução fiscal coloque o devedor em situação mais desfavorável que a do executado cuja dívida tiver sido garantida pela penhora, o qual tem direito à certidão positiva de débitos fiscais, com efeitos de negativa
. 3. A Fazenda Nacional não pode ser impedida de dar andamento à cobrança de créditos tributários definitivamente constituídos, nem podem os órgãos incumbidos do contencioso administrativo-tributário ser impedidos de processar e julgar reclamações, manifestações de inconformidade e recursos que poderão, eventualmente, acarretar a constituição definitiva de créditos tributários de grande valor. 4. Agravo de instrumento provido. (TRF-4 - AG: 50002004020184040000 5000200-40.2018.4.04.0000, Relator: SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Data de Julgamento: 26/03/2018, SEGUNDA TURMA)
Isso significa que o seguro-garantia, contanto que apresentado de modo adequado, como registro na sequência - podendo com isso impedir o protesto de certidão de inscrição em dívida ativa -, não teria aptidão para suspender a exigibilidde dos gravames, não se confundindo com a medida prevista no art. 151, CTN. Assim, os tributos poderiam ser cobrados pelo Fisco, com executivo fiscal, e outras medidas porventura legalmente previstas.
2.55. Requisitiso do seguro-garantia:
Os requisitos do seguro-garantia estão detalhados na portaria PGFN/MF n. 2.044, de 30 de dezembro de 2024, cujo art. 1. segue:
Art. 1º
O seguro garantia, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, visa garantir o pagamento de débitos inscritos e débitos em vias de serem inscritos em dívida ativa da União ou do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, em execução fiscal ou em negociação administrativa, na forma e nas condições estabelecidas nesta Portaria
. § 1º Esta Portaria se aplica aos casos de
oferta antecipada de seguro garantia
à execução fiscal para a garantia de: I - débitos inscritos em dívida ativa da União e do FGTS; e II -
débitos não inscritos em dívida ativa da União e do FGTS quando houver intenção de discussão judicial pelo tomador do seguro garantia, após o encerramento do contencioso administrativo por julgamento definitivo, ou por renúncia às discussões na esfera administrativa nos termos do art. 38, parágrafo único, da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, observado o disposto no art. 3º, § 2º. § 2º A oferta e a renovação do seguro garantia para execução fiscal devem ser realizada
s: I - na execução fiscal, se os débitos inscritos em dívida ativa estiverem ajuizados; ou II - no REGULARIZE da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, na forma prevista no art. 11 da Portaria PGFN nº 33, de 8 de fevereiro de 2018, no caso de débitos em vias de serem inscritos em dívida ativa ou, quando já inscritos, se ainda não estiverem ajuizados. § 3º Após a aceitação da garantia no âmbito da execução fiscal, o tomador poderá solicitar, no REGULARIZE, a averbação nos sistemas da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, caso não tenha sido realizada após a intimação judicial. § 4º A oferta e a renovação do seguro garantia para negociação administrativa devem ser realizadas pelo REGULARIZE, conforme disposições do ato que regulamentar a negociação, observado o disposto no art. 3º, inciso XI, e art. 11.
Atente-se ainda para o seu art. 3, como transcrevo abaixo:
Art. 3º
A aceitação do seguro garantia de que trata o art. 1º fica condicionada à observância dos seguintes requisitos, que devem estar expressos nas cláusulas da respectiva apólice
: I - a definição do objeto do seguro; II -
o valor da garantia, observado que: a) no seguro garantia para execução fiscal deverá corresponder: 1. ao total do débito a ser garantido, com os encargos e acréscimos legais, devidamente atualizado até a data da emissão da apólice; ou 2. ao total do débito a ser garantido, com os encargos e acréscimos legais, acrescido dos honorários advocatícios, devidamente atualizado até a data da emissão da apólice, no caso dos créditos previdenciários inscritos antes da Lei nº 11.457, de 16 de março de 2007, e dos créditos rurais, sobre os quais não incide o encargo legal do art. 1º do Decreto Lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969
; b) no seguro garantia para negociação administrativa, deverá corresponder ao total do débito consolidado a ser garantido, com os encargos e acréscimos legais, devidamente atualizado até a data da emissão da apólice, sem considerar para esse fim eventuais descontos legais previstos na negociação. III -
a previsão de atualização automática do valor da garantia pelos índices legais aplicáveis aos débitos inscritos em dívida ativa da União ou do FGTS, sem exigência de manifestação expressa do segurado ou do tomador
; IV -
a manutenção da vigência do seguro, mesmo quando o tomador não houver pago o prêmio nas datas convencionadas, com base no art. 16, § 1º, da Circular Susep nº 662, de 11 de abril de 2022, e em renúncia aos termos do art. 763 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, do art. 12 do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, e do art. 20 da Lei nº 15.040, de 9 de dezembro de 2024
; V -
a referência ao número da inscrição em dívida ativa da União ou do FGTS, ou do processo judicial, ou do processo administrativo fiscal ou de negociação administrativa, que identifique de forma inequívoca o objeto de garantia
; VI -
o prazo de vigência da apólice, que será: a) de no mínimo cinco anos no seguro garantia para execução fiscal, devendo a seguradora garantir a manutenção da cobertura enquanto houver risco a ser coberto, independentemente de solicitação do tomador, mediante renovações sucessivas da apólice que devem manter todas as cláusulas originais, com alterações limitadas à atualização do valor da garantia e ao prazo de vigência, sem prejuízo de eventuais alterações nas condições comerciais restritas à relação entre a seguradora e o tomador; ou b) igual ao prazo de duração da negociação no seguro garantia para negociação administrativa, podendo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional aceitar apólices com prazo de vigência inferior, desde que observado o disposto na alínea "a"
. VII - o estabelecimento das hipóteses caracterizadoras do sinistro, nos termos do art. 12; VIII - o endereço da seguradora; IX - a eleição do foro da Seção Judiciária ou da Subseção Judiciária da Justiça Federal com jurisdição sobre a unidade da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional competente para a cobrança do débito inscrito em dívida ativa, para dirimir questões entre o segurado e a seguradora, sendo inaplicável a cláusula compromissória de arbitragem; X - no caso de cosseguro, a previsão sobre: a) a seguradora líder e suas atribuições; b) a inexistência de responsabilidade solidária entre as seguradoras, salvo previsão em sentido diverso no contrato de cosseguro; e c) o nome e o Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ de todas as sociedades seguradoras participantes, e os respectivos limites de responsabilidade máxima assumida, no frontispício da apólice e por extenso. XI - a previsão de que permanecerá vigente a apólice do seguro garantia para execução fiscal, ainda que o tomador solicite negociação administrativa dos débitos ajuizados, enquanto não apresentada e aceita pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a nova garantia em substituição à anterior; XII - em relação aos débitos inscritos em dívida ativa do FGTS: a) o seguro garantia para execução fiscal poderá englobar as contribuições sociais instituídas pela Lei Complementar nº 110, de 29 de junho de 2001, e as contribuições previstas nos arts. 15 e 18 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990; b) o seguro garantia para negociação administrativa poderá englobar apenas as contribuições sociais instituídas pela Lei Complementar nº 110, de 29 de junho de 2001, não se aplicando às contribuições previstas nos arts. 15 e 18 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990; c) aplica-se o índice de juros e a atualização monetária previstos no art. 22 da Lei nº 8.036, de 11 de maio 1990; d) aplica-se o encargo legal previsto no art. 2º, § 4º, da Lei nº 8.844, de 20 de janeiro de 1994, para as contribuições previstas nos arts. 15 e 18 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, e o encargo legal previsto no Decreto-Lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, para as contribuições sociais instituídas pela Lei Complementar nº 110, de 29 de junho de 2001; e e) as apólices de seguro garantia deverão prever como segurado o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, representado no ato pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. XIII - a vedação de cláusula que estabeleça franquias, participações obrigatórias do segurado e prazo de carência. § 1º O seguro garantia deverá ser prestado por seguradora idônea e autorizada a funcionar no Brasil, nos termos da legislação. § 2º No caso de apólice ofertada antecipadamente à execução fiscal, o valor do seguro garantia deverá corresponder ao total do débito a ser garantido, com os acréscimos previstos no art. 3º, inciso II, alínea "a", inclusive o encargo legal exigível quando do ajuizamento da execução fiscal, previsto no art. 1º do Decreto-Lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, devidamente atualizado na data da emissão da apólice. § 3º Não se aplica o acréscimo de 30% (trinta por cento) ao valor garantido, constante dos arts. 835, § 2º, e 848, parágrafo único, da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 - Código de Processo Civil. § 4º Atos exclusivos do tomador, da seguradora ou de ambos não poderão gerar perdas ou prejuízo ao segurado. § 5º A apólice somente poderá ser alterada mediante pedido do segurado ou com sua expressa concordância. § 6º A seguradora deverá garantir que os procedimentos e a efetivação da manutenção da cobertura e da renovação da apólice ocorram antes do término do prazo de vigência da apólice. § 7º A seguradora somente poderá se manifestar pela não renovação do seguro garantia se não houver mais risco a ser coberto pela apólice ou se houver a substituição da apólice por nova garantia aceita pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. § 8º O tomador não poderá se opor à manutenção da cobertura, exceto se ocorrer a substituição da apólice por nova garantia aceita pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. § 9º Antes do término do prazo de vigência da apólice, e sob pena de caracterização de sinistro, deverá ser apresentada à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional: I - a renovação da apólice de seguro garantia, respeitados os termos do art. 3º, inciso VI e art. 6º, § 1º, pelo tomador ou pela seguradora; ou II - nova garantia, pelo tomador, considerada suficiente e idônea pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
O art. 4. da Portaria preconizou que
"Poderão ser objeto de cosseguro tanto as apólices de seguro garantia para execução fiscal quanto para negociação administrativa. Parágrafo único. Não é permitida operação de cosseguro com participação de seguradora sem assunção de responsabilidade."
Segundo o seu art. 5,
"As apólices de seguro garantia deverão seguir os modelos de apólice padrão definidos nos Anexos I e II.§ 1º As condições contratuais restritas à relação entre a seguradora e o tomador, cujo teor não poderá prejudicar os direitos do segurado, nem modificar as cláusulas dos Anexos I e II, deverão estar previstas em contrato apartado e dispensam a aceitação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.§ 2º Prevalecerá o disposto nesta Portaria e nos modelos dos Anexos I e II em caso de conflito com as condições contratuais descritas no § 1º.§ 3º O disposto nesta Portaria e nos modelos dos Anexos I e II não exclui a obrigatoriedade de observância de outros atos normativos editados pelos órgãos reguladores e fiscalizadores de seguros privados."
Nos termos do art. 6. da Portaria,
"
O tomador deverá apresentar os seguintes documentos no oferecimento e na renovação da garantia: I - apólice do seguro garantia; II - comprovação de registro da apólice junto à Superintendência de Seguros Privados - Susep; e III - certidões emitidas pela Susep que atestem a situação da seguradora
. § 1º A idoneidade e a autorização a que se referem o art. 3º, § 1º, serão aferidas pela apresentação de certidões emitidas pela Susep, que atestem a capacidade da seguradora e eventuais cosseguradoras para ofertarem o seguro garantia, ressalvada a situação prevista no art. 14, § 5º. § 2º O registro da apólice e a validade das certidões que atestem a situação da seguradora deverão ser conferidos no sítio eletrônico da Susep. § 3º A ocorrência dos apontamentos previstos no art. 5º, incisos I, II, XI, XII e XIII, da Circular Susep nº 691, de 24 de julho de 2023, impedem a aceitação e a renovação do seguro garantia, enquanto não regularizadas as situações identificadas, sem prejuízo da avaliação das demais circunstâncias constantes das certidões que atestem a situação da seguradora. § 4º A ocorrência dos apontamentos previstos no art. 5º, incisos I e II, da Circular Susep nº 691, de 24 de julho de 2023, não impedem a renovação do seguro garantia quando existente Plano de Regularização de Solvência - PRS ou Plano de Regularização de Suficiência de Cobertura - PRC em andamento, respectivamente. § 5º Caso verificada a ocorrência dos apontamentos descritos no § 3º após a aceitação do seguro, o tomador deverá providenciar perante a seguradora a regularização das situações que impedem a renovação do seguro garantia, ou apresentar nova garantia, suficiente e idônea. § 6º A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional poderá notificar a seguradora e o tomador para regularizar as situações que impedem a renovação do seguro garantia ou para apresentar nova garantia, na hipótese do § 5º. § 7º A Procuradoria-Geral Adjunta da Dívida Ativa da União e do FGTS da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional poderá expedir orientações sobre a avaliação das circunstâncias constantes das certidões emitidas pela Susep que atestem a situação da seguradora. § 8º A regularização das situações que impedem a renovação do seguro garantia, ou a apresentação de nova garantia, suficiente e idônea, devem ocorrer antes do término do prazo de vigência da apólice do seguro garantia, sob pena de caracterização do sinistro - art. 12, inciso III."
A Portaria também versou sobre as hipóteses caracterizadoras do sinistro (art. 12), dentre outros tópicos.
2.56. CADIN - considerações gerais:
D'outro tanto, segundo a jurisprudência predominante, a inibição do lançamento, no CADIN, do nome do interessado, pressupõe a realização do aludido depósito, por força do disposto no art. 7º, I, da lei n. 10.522, de 19 de julho de 2002:
"
Será suspenso o registro no Cadin quando o devedor comprove que: I - tenha ajuizado ação, com o objetivo de discutir a natureza da obrigação ou o seu valor, com o oferecimento de garantia idônea e suficiente ao Juízo, na forma da lei
."
Referido diploma deve ser aferido com cautelas, sabe-se bem. Afinal de contas, o poder geral de tutela, na temática civil, é projeção do art. 5º, XXXV, CF. Importa dizer: a Constituição exige um processo efetivo e, tanto por isso, a lei infraconstitucional não pode restringir demasiadamente a concessão de provimentos de urgência. Tanto por isso, em princípio, a lei infraconstitucional não poderia instituir uma espécie de
solve et repet,
de modo que a inibição de condutas lesivas fique na dependência do depósito em juízo.
De toda sorte, convém ter em conta que essa obrigatoriedade de contracautelas também se encontra prevista no art. 50, §1º, da lei n. 10.931/2001 (quanto à pretensão à revisão de contratos imobiliários), enquanto que a lei n. 13.105/2015 facultou ao Poder Judiciário condicionar a concessão do provimento de urgência à oferta de caução (art. 300, §1º, CPC). Acrescento que, ao apreciar o REsp 1137497/CE, com caráter repetitivo, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que a mera discussão judicial da dívida não autorizaria a suspensão do registro no CADIN, sendo necessária a garantia idônea e suficiente do Juízo ou que a exigibilidade do crédito esteja suspensa por algum outro motivo.
Reporto-me também aos seguintes julgados:
TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA. RECUSA. BEM SITUADO EM OUTRO ESTADO. CADIN. EXCLUSÃO DO NOME DO CADASTRO. 1. Mostra-se justificada a recusa do devedor considerando-se que o bem oferecido não representa efetiva garantia dos créditos exeqüendos, uma vez que o imóvel situa-se em outro Estado da federação. 2. Nos casos em que os contribuintes pleiteiam a exclusão de seu nome dos registros do CADIN, devem ser observados os requisitos de suspensão previstos no art. 7º da Lei nº 10.522/02, como o oferecimento de caução idônea ao juízo ou o depósito judicial dos valores contestados.
(AG 00088123320104040000, VÂNIA HACK DE ALMEIDA, TRF4 - SEGUNDA TURMA, D.E. 26/05/2010.)
PROCESSUAL CIVIL. CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. CADIN. AFASTAMENTO. AJUIZAMENTO DE AÇÃO FUNDADA NA APARÊNCIA DO BOM DIREITO. DEPÓSITO DE CAUÇÃO IDÔNEA. RESP. Nº 1.063.530/RS. . O simples ajuizamento de ação ou a mera existência de demanda judicial não autoriza o afastamento da parte requerente dos cadastros restritivos de crédito. . A liberação da inscrição nos cadastros restritivos de crédito respeita os seguintes requisitos, cumulativamente: (a) que a ação ajuizada pelo interessado seja fundada em questionamento integral ou parcial do débito; (b) que haja demonstração de que o questionamento à cobrança supostamente indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; e, (c) existência de depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz. . Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir.
(AC 200770060024893, NICOLAU KONKEL JÚNIOR, TRF4 - TERCEIRA TURMA, D.E. 10/03/2010.)
PROCESSUAL CIVIL. CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. CADIN. AFASTAMENTO. RESSARCIMENTO AO SUS. AJUIZAMENTO DE AÇÃO. DEPÓSITO DE CAUÇÃO IDÔNEA. GARANTIA AO JUÍZO. . O simples ajuizamento de ação ou a mera existência de demanda judicial não autoriza o afastamento da parte requerente dos cadastros restritivos de crédito. . A liberação da inscrição nos cadastros restritivos de crédito condiciona-se ao depósito de caução idônea ou garantia ao juízo pela parte requerente. . Inteligência do art. 7º, I, da Lei nº 10.522 /2002. . Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir. . Agravo de instrumento improvido.
(AG 200904000133210, NICOLAU KONKEL JÚNIOR, TRF4 - TERCEIRA TURMA, D.E. 23/09/2009.)
Referido entendimento deve ser aplicado ao presente caso, por conta também do que dispõem os arts. 927 e 489, §1º, VI, CPC. Tanto por isso, a exclusão do nome do autor do CADIN e de eventual cobrança de dívida ativa pressupõe o depósito do valor impugnado.
2.57. Protesto de CDA:
Com a redação veiculada pela lei 12.767/2012, o art. 1º da lei 9.492/1997 dispõe que
"
Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida
. Parágrafo único. Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas."
Prima facie,
aludida medida poderia se revelar desnecessária, diante das prerrogativas reconhecidas à Administração Pública, quando em causa o lançamento e cobrança de tributos. De toda sorte, ao apreciar a
ADIN n. 5135
, a Suprema Corte concluiu, em 09 de novembro de 2016, que
"
O protesto das Certidões de Dívida Ativa constitui mecanismo constitucional e legítimo, por não restringir de forma desproporcional quaisquer direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e, assim, não constituir sanção política
."
Atente-se, ademais, para os seguintes julgados:
RECURSO DE APELAÇÃO. DÍVIDA ATIVA. PROTESTO DE CDA. 1.
O protesto não está limitado aos títulos de crédito, desvinculando-se dos títulos estritamente cambiais para abranger todos e quaisquer "títulos ou documentos de dívida"
. 2. Não é dado ao Poder Judiciário substituir-se à Administração para eleger, sob o enfoque da necessidade (utilidade ou conveniência), as políticas públicas para recuperação, no âmbito extrajudicial, da dívida ativa da Fazenda Pública. 3. A Lei das Execuções Fiscais não desautoriza a instituição ou utilização de mecanismos de cobrança extrajudicial. 4. Recurso de apelação não provido. (Ap 00266714920154036100, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. ART. 1.021, CPC. AÇÃO DECLARATÓRIA. PROTESTO DE CDA. LEGITIMIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A decisão ora agravada, prolatada em consonância com o permissivo legal, encontra-se supedanea da em jurisprudência consolidada do C. Supremo Tribunal Federal, inclusive quanto aos pontos impugnados no presente recurso. 2.
O E. Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária de 09.11.2016, julgou improcedente a ADIN nº 5135, para, por maioria, fixar a tese de que "o protesto das Certidões de Dívida Ativa constitui mecanismo constitucional e legítimo, por não restringir de forma desproporcional quaisquer direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e, assim, não constituir sanção política
". 3. As razões recursais não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o desacerto do decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele contida. 4. Agravo interno improvido. (AC 00197021820154036100, DESEMBARGADORA FEDERAL DIVA MALERBI, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/09/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
Em princípio, por conseguinte, no rastro dos precedentes do STF e outros tribunais, o protesto de dívidas fiscais não se revela, em si, inválido. Deve-se apurar, em cada caso, se tais requisitos teriam sido cumpridos.
2.58. Eventual antecipação da garantia - caução imobiliária:
Repiso que, segundo o entendimento dos tribunais, é dado ao devedor o caucionamento de bem, enquanto não promovida a execução fiscal, com o ajuizamento de ação para antecipar a prestação da garantia em juízo, objetivando a expedição de certidão positiva com efeito de negativa. Cumpre referir que o STJ uniformizou tal intelecção por ocasião do julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n.º 815629/RS, Rel. p/o acórdão Min. Eliana Calmon, 1ª Seção, DJ 06/11/2006, cuja ementa transcrevo:
PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO - GARANTIA REAL - DÉBITO VENCIDO MAS NÃO EXECUTADO - PRETENSÃO DE OBTER CERTIDÃO POSITIVA COM EFEITO DE NEGATIVA (ART. 206 DO CTN).
1. É possível ao contribuinte, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter certidão com efeito negativo (art. 206 CTN).
2. O depósito pode ser obtido por medida cautelar e serve como espécie de antecipação de oferta de garantia, visando futura execução.
3. Depósito que não suspende a exigibilidade do crédito.
4. Embargos de divergência conhecido mas improvido.
D'outro tanto, deve-se assegurar à parte requerida impugnar o oferecimento de bem como caução:
TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE GARANTIA. CERTIDÃO POSITIVA DE DÉBITO COM EFEITO DE NEGATIVA. MANIFESTAÇÃO DA CREDORA. CAUCIONAMENTO. RECUSA JUSTIFICADA. 1. A idoneidade de bem oferecido em caução é requisito essencial para a expedição da certidão de regularidade fiscal, em analogia aos termos do art. 206 do CTN, já que o caucionamento de bens em antecipação à penhora na futura execução fiscal é uma medida excepcional, a qual não pode ampliar demasiadamente as garantias de pagamento do crédito tributário. 2. A jurisprudência deste Regional é no sentido de que uma vez oferecido bem móvel ou imóvel em garantia, abre-se a possibilidade de recusa da União quanto ao bem oferecido, desde que fundamentadamente. 3. Ausentes novos elementos a alterar o entendimento adotado, resta mantida a decisão que analisou o pedido de efeito suspensivo. 4. Agravo de instrumento desprovido. (TRF4, AG 5002608-28.2023.4.04.0000, SEGUNDA TURMA, Relatora MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, juntado aos autos em 16/05/2023)
2.59. Certidões de regularidade fiscal:
A Constituição da República preconiza, no seu art. 5º. XXXIV, que
"
são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: (...) b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal
."
No que toca à obtenção de certidões de regularidade fiscal, deve-se atentar, ademais, para o art. 205, CTN:
Art. 205.
A lei poderá exigir que a prova da quitação de determinado tributo, quando exigível, seja feita por certidão negativa, expedida à vista de requerimento do interessado, que contenha todas as informações necessárias à identificação de sua pessoa, domicílio fiscal e ramo de negócio ou atividade e indique o período a que se refere o pedido
.
Parágrafo único. A certidão negativa será sempre expedida nos termos em que tenha sido requerida e será fornecida dentro de 10 (dez) dias da data da entrada do requerimento na repartição.
Cumpre ter em conta, de partida, que, no âmbito federal, as certidões mais destacadas são a (a) certidão negativa de débitos - INSS; (b) certidão negativa de débitos expedida pela Receita Federal e (c) certidão negativa de inscrição em dívida ativa. Desde a publicação da portaria conjunta PGFN/SRF n º 3, de 22 de novembro de 2005 - emitida pela Procuradoria da Fazenda e pela Receita Federal -, tem sido emitida uma certidão única, na forma do seu art. 2º:
Art. 2º A Certidão Conjunta Negativa de Débitos relativos a Tributos Federais e à Dívida Ativa da União será emitida quando não existirem pendências em nome do sujeito passivo:
I - perante a SRF, relativas a débitos, a dados cadastrais e à apresentação de declarações; e
II - perante a PGFN, relativas a inscrições em cobrança.
Referidos atestados são exigidos para a contratação com o Poder Público e para obtenção de benefícios e incentivos fiscais (art. 195, §3º, CF/88; art. 27, V e art. 29, III, lei 8666/93 etc). O fato é que, como regra, aludidas certidões de regularidade fiscal apenas podem ser negadas quando promovido o pertinente lançamento fiscal:
"
Só o crédito constituído pelo lançamento permite certificar a existência de débito. Falha de contribuições. Contribuições em aberto. Insuficiência. Não basta eventual presunção do Fisco de que o contribuinte não tenha cumprido suas obrigações tributárias. Não é suficiente, e.g., que deixe de constar do sistema de controle de arrecadação ingressos a título de determinada contribuição mensal. É preciso que o Fisco constitua o crédito pelo lançamento (art. 142), estabelecendo, com isso, sua certeza e liquidez
." (PAULSEN, Leandro.
Direito tributário:
Constituição e Código Tributário à luza da doutrina e da jurisprudência. 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 1274).
Por conseguinte, nos casos de tributos submetidos a lançamento por homologação - ou seja, tributos a cujo respeito o próprio contribuinte deve calcular o
quantum debeatur
e adimpli-los sem uma prévia conferência do Fisco -, como regra, as certidões de regularidade apenas podem ser recusadas pelo Estado depois de promovido o lançamento de revisão, previsto no art. 150, §4º, CTN.
RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INSS. CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
O contribuinte tem direito à certidão negativa de débito quando a recusa de seu fornecimento está fundada na ausência do procedimento administrativo concernente à homologação do tributo. Se é por meio do lançamento que o crédito tributário é constituído, sem ele não há cogitar de débito, afigurando-se, por isso mesmo, ilegal e abusiva a recusa da autoridade administrativa em expedir a certidão negativa de débito, uma vez que, antes do lançamento, existe tão-somente uma obrigação fiscal, despida de exigibilidade
. Precedentes da Primeira e Segunda Turmas e da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça. Não houve o necessário prequestionamento no que pertine aos dispositivos legais tidos como contrariados, que não foram enfrentados pelo v. acórdão guerreado, pelo que se impõe, igualmente, o não conhecimento do recurso especial pela ausência do prequestionamento explícito dos dispositivos de lei federal tidos por objurgados (Súmula n. 282 do Supremo Tribunal Federal), entendido como o necessário e indispensável exame da questão pela decisão atacada. Recurso especial não conhecido. Decisão por unanimidade. ..EMEN: (RESP 199900466560, FRANCIULLI NETTO, STJ - SEGUNDA TURMA, DJ DATA:22/04/2002 PG:00185 ..DTPB:.)
Anote-se, todavia, que - nas situações em que o contribuinte apresenta DCTF (declaração de compensação de tributos federais)-, há julgados enfatizando que o requisito do lançamento seria suprido. Esse também é o entendimento de Leandro Pauls
en, quando diz que "
suprem o lançamento, entretanto, a apresentação de DCTF ou outra qualquer confissão de dívida
."
(PAULSEN, Leandro.
Direito tributário,
p. 1274).
Compartilho, todavia, do entendimento de que, mesmo nesses casos - ou seja, de apresentação de DCTF -, a certidão negativa apenas poderá ser negada pelo Fisco caso tenha havido o pertinente lançamento de revisão, evidenciando falha/incorreção na declaração de compensação promovida pelo próprio contribuinte.
TRIBUTÁRIO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. COMPENSAÇÃO DECLARADA EM DCTF. NECESSIDADE DE LANÇAMENTO. 1. Nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, o pagamento feito pelo contribuinte extingue a obrigação, sob condição resolutória da ulterior verificação pela autoridade administrativa (art. 150, § 1º, do CTN). 2.
O fato de a compensação ter sido declarada em DCTF não exime o Fisco da instauração de prévio procedimento administrativo a fim de verificar a existência de irregularidades e lançar a obrigação, constituindo o crédito tributário. Não se trata, in casu, de tributo confessado e impago - fato que autorizaria a inscrição em dívida pelo valor declarado, dispensando o lançamento -, mas de declaração de quitação dos débitos mediante compensação, que se presume válida
. (TRF 4ª Região, AMS nº 2003.70.00.010127-0/PR, 1ª Turma, Rel. Maria Lúcia Luz Leiria, dec. unânime em 31.03.2004, Publ. DJU em 12.05.2004, p. 415)
A certidão poderá ser recusada, todavia, quando o próprio contribuinte tenha promovido declaração de valores (por exemplo, em GFIP - guia de recolhimento do FGTS e informações à Previdência Social), sem que os tenha recolhido integralmente. Nesse caso, não se tratará de impugnar declarações do administrado (o que demandaria o lançamento de revisão - art. 150, §4º, CTN), mas da simples constatação de que o contribuinte não teria recolhido sequer os valores que ele próprio reconhecera dever.
TRIBUTÁRIO. CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITOS. DIVERGÊNCIAS ENTRE O VALOR DECLARADO E O RECOLHIDO. 1. A constituição definitiva do crédito tributário se dá pelo lançamento, nos moldes do art. 142 do CTN, podendo este ser substituído, nos casos de tributos sujeitos ao lançamento por homologação, pela entrega de DCTF, GFIP, ou outro documento de confissão de dívida. 2.
Havendo divergências entre os valores declarados e aqueles efetivamente recolhidos pelo sujeito passivo, é incabível a expedição de certidão negativa de débitos, porquanto se trata de circunstância distinta daquela em que o contribuinte paga o montante declarado e o Fisco apura diferenças, hipótese em que é imprescindível o lançamento de ofício
. (AMS 200571000458286, DIRCEU DE ALMEIDA SOARES, TRF4 - SEGUNDA TURMA, D.E. 08/02/2007.)
Outro tema diz respeito à graduação da efetividade da obrigação juridicotributária, a cujo respeito destaco o que segue:
"
Exigibilidade. Surgimento. O crédito tributário, uma vez constituído pelo lançamento, é - por definição - líquido e certo. A exigibilidade surgirá com o inadimplemento no prazo legal
."
(PAULSEN, Leandro.
Direito tributário:
constituição e código tributário. 6ª ed. Livraria do advogado, p. 1013.)
Ademais,
"O crédito tributário passa por
diferentes momentos de eficácia
: crédito simplesmente constituído (pela ocorrência do fato gerador) torna-se crédito exigível (pelo lançamento notificado ou pela decisão administrativa definitiva) e finalmente, crédito exeqüível (pela inscrição nos livros da dívida ativa), dotado de liquidez e certeza."
(TORRES, Ricardo Lobo.
Curso de direito financeiro e tributário.
14. ed., Renovar, p. 273)
Em princípio, a existência de lançamento, desde que definitivo,
já
basta para que a certidão negativa de débitos fiscais seja recusada (exceção feita ao disposto no art. 3º, §1º, I, da mencionada Portaria Conjunta 03/2005). Como destaquei acima, contanto que haja lançamento de revisão (art. 150, §4º, CTN/66) - e lançamento definitivo -, a certidão de regularidade poderá ser recusada, exceto no curso do prazo do art. 15 do decreto 70.235:
"
A impugnação, formalizada por escrito e instruída com os documentos em que se fundamentar, será apresentada ao órgão preparador no prazo de trinta dias, contados da data em que for feita a intimação da exigência.
"
Art. 3º A Certidão Conjunta Positiva com Efeitos de Negativa de Débitos relativos a Tributos Federais e à Dívida Ativa da União será emitida quando, em relação ao sujeito passivo, constar débito relativo a tributo federal ou a inscrição em Dívida Ativa da União, cuja exigibilidade esteja suspensa na forma do art. 151 da Lei n o 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional (CTN).
§1º A certidão de que trata o caput também será emitida quando, em relação ao sujeito passivo, existir débito:
I - relativo a tributo federal cujo lançamento se encontre no prazo legal de impugnação, conforme art. 15 do Decreto n o 70.235, de 6 de março de 1972;
II - inscrito em Dívida Ativa da União, garantido mediante penhora de bens cuja avaliação seja igual ou superior ao montante do débito atualizado.
O fato de eventualmente não haver inscrição em dívida ativa não enseja, por si, que a certidão de regularidade em causa seja emitida. Em princípio, basta que haja lançamento, nos termos da legislação em vigor
(art. 205, CTN). Cumpre não confundir a exigibilidade do tributo, de um lado, com a exequibilidade do débito respectivo, de outro. Em princípio, todo tributo lançado já é
exigível
; por sinal, os consectários moratórios retroagem à data do vencimento original.
Exequível
é apenas o débito inscrito em dívida ativa.
"1. A inscrição em dívida ativa não é requisito para recusa à emissão de certidão negativa de débito, bastando, para tanto, a constituição definitiva do crédito tributário, regra que não se excepciona aos tributos sujeitos ao chamado lançamento por homologação, tal qual se dá na espécie." (RESP 200900581493, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:19/10/2009 ..DTPB:., omiti parte da ementa)
Registre-se, todavia, enquanto estiver sob discussão administrativa o referido lançamento, o contribuinte tem o direito à emissão da certidão positiva com efeitos de negativa (art. 206, CTN), como explicita Hugo de Brito Machado
:
"Outra divergência profunda diz respeito ao momento em se deve considerar exercido o direito de construir o crédito tributário. Segundo as diversas correntes doutrinárias, esse momento seria:
(a) aquele em que o Fisco determinasse o montante a ser pago e intimasse o sujeito passivo para fazê-lo; (b) a decisão, pela procedência da ação fiscal, em primeira instância administrativa; (c) a decisão definitiva em esfera administrativa; (d) a inscrição do crédito tributário como dívida ativa.
Para quem se situa na posição 'a', um simples auto de infração seria o lançamento. Com a sua lavratura estaria exercido o direito de constituir o crédito tributário e, portanto, não se poderia mais cogitar de decadência.
Tal posição nos parece insustentável. O lançamento, como vimos ao estudar a constituição do crédito tributário, é procedimento administrativo integrado em duas fases. A lavratura do auto de infração é o encerramento apenas na primeira fase. Com a impugnação formulada pelo sujeito passivo tem início a fase litigiosa que é a segunda do procedimento administrativo de lançamento.
O Tribunal Federal de Recursos orientou suas decisões no sentido de que o auto de infração é lançamento tributário, e não apenas início do procedimento administrativo de lançamento. Essa posição, todavia, não se concilia com a tese, também adotada por aquele Colendo Tribunal, de que a Administração, quando tiver de fazer um lançamento tributário, há
de assegurar o direito de defesa ao contribuinte. A oportunidade de defesa é obviamente posterior à lavratura do auto de infração. Assim, ou o lançamento não se completa com o auto de infração, ou se se completa, a oportunidade de defesa não é essencial no lançamento.
Para os que se colocam na posição 'b' o auto de infração ainda não seria um lançamento por lhe faltar o pronunciamento de autoridade administrativa com poder decisório, não tendo sido assegurado ao sujeito passivo o direito de defender-se. Assim, com o julgamento da impugnação em primeira instância estaria suprida essa falta, completando-se o lançamento.
Também não nos parece que seja assim. Se a própria administração fazendária ainda admite discutir a exigência, é porque esta não está ainda perfeita, assentada em bases definitivas, o que na verdade só vem a ocorrer com o julgamento último, ou com a não interposição do recurso no prazo legal. A fragilidade da posição 'b' se revela sobretudo nos casos em que a decisão em primeira instância seja contrária à Fazenda Pública e venha a ser reformada, prevalecendo afinal a exigência.
Com efeito, acertada nos parece a posição 'c', pois somente quando a Administração, que é parte no procedimento e é quem efetua o lançamento, não mais admite discuti-lo, pode-se considerar consumado o lançamento.
Consuma-se, pois, o lançamento:
1º) não havendo impugnação, com a homologação do auto de infração;
2º) havendo impugnação e sendo a decisão primeira favorável à Fazenda, se o sujeito passivo não recorrer;
3º) havendo recurso, com a decisão definitiva, favorável à Fazenda.
Em resumo: o lançamento está consumado, e não se pode mais cogitar de decadência, quando a determinação do crédito tributário não possa mais ser discutida na esfera administrativa." (MACHADO, Hugo de Brito.
Curso de Direito Tributário.
5. ed., p. 135/137)
Também nesse sentido, menciono o seguinte julgado do STJ:
"1. Esta Corte, na ocasião do julgamento do REsp 128.524/RS, pacificou entendimento no sentido da impossibilidade de recusa de expedição de Certidão Negativa de Débitos (CND), enquanto não-constituído definitivamente o crédito tributário. 2. Considera-se definitivamente constituído o crédito tributário com o lançamento definitivo. Tratando-se de tributo sujeito a lançamento por homologação, nos termos do art. 150 do CTN, a constituição do crédito tributário dá-se com a declaração do débito pelo contribuinte, por meio de DCTF ou GIA (Precedentes). Por sua vez, em havendo lançamento de ofício, a constituição do crédito tributário ocorre quando o contribuinte é regularmente notificado do lançamento (Precedentes). 3.
Para que o crédito tributário seja definitivamente constituído, em se tratando de tributos lançados diretamente pela autoridade administrativa, o contribuinte deve ser notificado; após, lhe é aberto um prazo para impugnação; havendo a apresentação de recurso administrativo, o lançamento fica sujeito a futuras alterações, cujas ocorrências somente serão verificadas após decisão administrativa, momento em que o lançamento torna-se definitivo e, portanto, em que se constitui o crédito tributário
. 4.
A jurisprudência desta Corte tem consignado que somente quando exaurida a instância administrativa é que se configura a constituição definitiva do crédito fiscal
(REsp 239.106/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ de 24.4.2000, p. 48; REsp 32.843/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Adhemar Maciel, DJ de 26.10.1998, p. 99; REsp 649.684/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 28.3.2005, p. 211; REsp 173.284/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 31.3.2003, p. 183; REsp 620.283/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 19.9.2005, p. 270; REsp 264.041/AL, 1ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 4.6.2001, p. 63; REsp 195.667/SC, 1ª Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 26.4.1999, p. 60; AgRg no REsp 641.448/RS, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de 1º.2.2005, p. 436). 5. Seguindo essa linha de raciocínio, no sentido de que a constituição definitiva do crédito tributário somente se implementa com a resolução na esfera administrativa das pendências existentes em relação ao lançamento do débito fiscal, e associando essa orientação ao entendimento de que, enquanto não estiver definitivamente constituído o crédito, deve ser deferida a expedição de Certidão Negativa de Débito (CND), infere-se que, no caso dos autos, foi acertada a conclusão do acórdão recorrido, que entendeu devido o fornecimento de certidão negativa de débitos fiscais, porquanto ainda não-constituído definitivamente o crédito tributário, na medida em que não houve encerramento das discussões acerca do lançamento na esfera administrativa. 6. Recurso especial desprovido. ..EMEN:" (RESP 200301682227, DENISE ARRUDA, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJ DATA:13/03/2006 PG:00192 ..DTPB:.)
Por conseguinte, quando o contribuinte está discutindo, no âmbito administrativo, a validade do lançamento, a certidão positiva com efeitos de negativa não lhe pode ser recusada (art. 206, CTN).
2.60. Distribuição do ônus da prova:
No presente caso, há uma natural assimetria entre a parte autora e a União Federal, dado o poderio burocrático da demandada. Isso não implica, porém, por si, a inversão do ônus da prova, prevista no art. 373, §1º, CPC/15. Ao menos, não para fins de antecipação de tutela.
Conquanto a teoria da distribuição dinâmica da prova, acolhida pelo art. 373, CPC/15, tenha seu relevo, cumprindo papel importante no processo, deve ser empregada como circunspeção, como anota Araken de Assis:
"(....)
Essa teoria tem cunho autoritário, porque concentra poderes no órgão judiciário, e, desse modo, traz consigo alto risco de subjetivismo
. Duas objeções principais, relevando o risco de prevaricação e o dever de fidelidade do juiz ao direito, opõem-se à doutrina: (a)
o já mencionado risco de subjetividade e, ademais, de relatividade: o que é fácil para certo juiz pode não o ser para outro
; e (b) a violação positiva ao direito fundamental processual do contraditório. Contra o risco de subjetividade, inexiste remédio; para a violação do contraditório, a medida cabível é a exigência de que haja motivo concreto, prévio e delimitado para a distribuição ope judicis. A distribuição do ônus da prova na decisão de saneamento e de organização do processo (art. 357, III) contrabalança os riscos, norteando a atividade das partes na instrução das causas. Seja como for, as objeções evidenciam que, entre nós, inexiste ainda densidade do direito fundamental à prova. O contraditório argumentantivo (dizer e contradizer) não mais satisfaz.
As repercussões positivas ou negativas da repartição casuística podem ser aquilatadas e medidas nas relações de consumo. Em tal matriz, considerando o disposto no art. 6.º, VIII, da Lei 8.078/1990, passa-se à análise do tema, sublinhando que não se limita a tais espécies de litígio, em tese, a distribuição dinâmica." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo II: Institutos fundamentais. SP: RT. 2015. p. 203-209)
Em primeiro exame, incumbe à parte autora o ônus de comprovar a veracidade da narrativa dos fatos, veiculada na peça inicial, o que tomo em conta para fins de avaliação do pedido de antecipação de tutela. Caso a demandada venha a alegar a ocorrência de algum fato obstativo do acolhimento da pretensão da autora, lhe caberá então fazer prova disso (art. 373, II, CPC/15).
2.61.
Eventual empréstimo de meios probatórios:
No mais das vezes, eventuais elementos de convicção, obtidos em outras demandas, podem ser opostos às partes, contando que haja consenso entre os contendores a respeito do tema, na forma do art. 190, CPC. Ou seja, desde que haja acordo entre os litigantes, no âmbito de processos versando sobre pretensões que admitam autocomposição.
Nos demais casos, os elementos probatórios, porventura obtidos em outros processos, poderão ser opostos aos litigantes desde que elas tenham participado da relação processual em que eles tenham sido obtidos, sob contraditório (TALAMINI, Eduardo. Prova Emprestada no Processo Civil e Penal.
In
Revista de Informação Legislativa,
v. 140, p. 157-158).
É o que se infere do art. 372, CPC/15:
"O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório."
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PROVA EMPRESTADA REALIZADA EM AÇÃO ANULATÓRIA, PERÍCIA CONTÁBIL. POSSIBILIDADE. IDENTIDADE DE PARTES E CAUSA DE PEDIR.A
jurisprudência assentada no C. STJ reconhece a validade da prova emprestada, desde que produzida em processo envolvendo as mesmas partes, com identidade na causa de pedir, sendo inadmissível que a parte suporte os efeitos das provas produzidas sem a sua participação, em observância aos princípios da instrumentalidade das formas, celeridade, economia e efetividade do processo.In casu, ambas as ações têm as mesmas partes e causas com identidade de pedir, visto que discutem os mesmo débitos
. Aberto prazo para a União Federal se manifestar sobre o laudo pericial,ausente qualquer violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa.Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AI 00178372420154030000, DESEMBARGADORA FEDERAL MARLI FERREIRA, TRF3 - QUARTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/04/2016.. FONTE_REPUBLICACAO:.)
"
As provas emprestadas para estes autos, requeridas tanto pelo autor, quanto pelo réu, foram produzidas em ação penal com as mesmas partes, sem, pois, qualquer prejuízo ao contraditório
, renovado quando da respectiva juntada na presente ação, não se revelando pertinente, na espécie, logicamente e nos termos da jurisprudência, a repetição da prova neste processo, sob pena de inutilidade do empréstimo realizado dos outros autos." (Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2242219 0006167-38.2010.4.03.6119, JUIZA CONVOCADA DENISE AVELAR, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/01/2018)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INSPETOR DE SEGURANÇA DOS CORREIOS. DEVASSA E SUBTRAÇÃO DAS MERCADORIAS. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA PELOS MESMOS FATOS. PROVA EMPRESTADA NO JUÍZO CÍVEL. POSSIBILIDADE. 1. Apelação cível interposta pelo demandado, em face de sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Federal da Seção Judiciária de Pernambuco que o condenou às sanções insertas no art. 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92, pela prática de ato improbidade administrativa. 2. Preliminares de cerceamento de defesa e de violação ao devido processo legal que se rejeitam. Primeiramente, não há qualquer mácula ao direito de ampla defesa e contraditório da parte, pelo fato de não ter havido interrogatório do investigado, eis que, diferentemente do que ocorre no processo criminal, no rito das ações civis pública por ato de improbidade administrativa, não há previsão legal da realização desse ato. Também não restaram comprovadas as alegações de violação da mobília funcional do apelante, bem como fraude das imagens colacionadas pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, em que se revela de forma induvidosa o modus operandi da prática ilícita perpetrada pelo recorrente. 3. O Ministério Público Federal ingressou com ação civil pública por ato de improbidade administrativa em desfavor do apelante, imputando-lhe a prática de atos de improbidade, os quais também foram objeto de persecução penal, deflagrada a partir de sua prisão em flagrante, seguida de denúncia e condenação pelo crime de peculato (art. 312, parágrafo 1º, c/c o art. 71 do Código Penal). 4.
O juízo cível utilizou-se de prova emprestada colhida na seara penal, hipótese essa amplamente autorizada pelas Cortes Pátrias, uma vez respeitados os princípios da ampla defesa e do contraditório. Precedentes.
5. Diante do vasto acervo probatório constante dos autos - provas documentais, testemunhais e depoimentos -, é indiscutível a autoria e materialidade dos fatos ímprobos imputados, havendo perfeita subsunção das condutas praticadas pelo apelante à capitulação descrita no art. 11, I, da Lei de Improbidade Administrativa, eis que o demandado, na condição de funcionário público dos Correios, prevalecendo-se da sua condição de Inspetor Regional dos Correios, subtraiu - de forma consciente e reiterada - para si, encomendas destinadas aos clientes da aludida empresa pública. 6. Apelação improvida. (AC - Apelação Civel - 590937 0007186-73.2013.4.05.8300, Desembargador Federal Edílson Nobre, TRF5 - Quarta Turma, DJE - Data::14/12/2017 - Página::62)
O tema é especialmente sensível quando se cuida de transposição de termos de testemunhos ou laudos periciais elaborados em outros processos. O mesmo não se dá, em princípio, quanto a documentos anexados em outros feitos, na medida em que a prova documental está submetida, em regra, apenas ao contraditório diferido. Tanto por isso, em princípio, o traslado de cópia de documentos jungidos em outros autos de processo - mesmo que deles não figurem os litigantes - não chega a comprometer a garantia do contraditório.
Deve-se ter em conta, porém, que
"O artigo 372 do CPC/15 previu o uso de prova emprestada, desde que assegurado o contraditório. Na hipótese, não se admite a utilização do conteúdo dos laudos indicados, eis que a prova emprestada só tem valor probante quando tenha sido produzida em processo envolvendo as mesmas partes, face à necessidade de observância estrita da garantia constitucional do contraditório,
o que não se verificou, já que o laudo anexado pelo Autor foi produzido em favor de empregados celetistas da EBSERH, não tendo a UFPE participado da ação que produziu a prova pericial
."
(TRF-5 - Ap: 08245069320194058300, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO DE MENESES FIALHO MOREIRA, Data de Julgamento: 28/10/2021, 3ª TURMA)
Por outro lado, convém ter em conta o seguinte julgado do TRF4:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. prova emprestada. admissibilidade. nulidade não configurada. prazo prescricional. suspensão. requerimento administrativo de revisão. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. MÉDICO. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. GRAU MÁXIMO. CONFIGURAÇÃO. 1. Desnecessária a reabertura da instrução, quando o próprio juiz, destinatário da prova, entende que as questões suscitadas pelas partes já se encontram devidamente esclarecidas. 2. A utilização da prova emprestada atualmente tem amparo no art. 372 do CPC/15: "O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.".
O STJ já afastou a necessidade de identidade de partes para a utilização de prova emprestada, desde que assegurado o contraditório como requisito primordial
. 3. O requerimento administrativo de revisão do benefício suspende o curso do prazo prescricional, que é retomado a partir da decisão definitiva por parte da Administração, conforme art. 4º do Decreto n. 20.910/32. 4. Faz jus a parte autora, médica anestesiologista do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, à percepção do adicional de insalubridade em grau máximo, tendo em vista que o laudo médico pericial concluiu pela exposição habitual a agentes nocivos biológicos, sendo contundente quanto à existência da insalubridade em nível máximo. (TRF-4 - AC: 50556034820154047000 PR 5055603-48.2015.4.04.7000, Relator: VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 19/05/2020, TERCEIRA TURMA)
Atente-se para a fundamentação do mencionado acórdão do TRF4:
"
A utilização da prova emprestada atualmente tem amparo no art. 372 do CPC/15: "O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório
. Com efeito, sendo o juiz o destinatário da prova, a ele compete ponderar sobre a necessidade ou não da sua realização. A produção probatória deve possibilitar ao magistrado a formação do seu convencimento acerca da questão posta, cabendo-lhe indeferir as diligências que reputar desnecessárias ou protelatórias ao julgamento da lide."
Neste sentido o seguinte julgado do E. STJ: "
1. Se as questões trazidas à discussão foram dirimidas, pelo Tribunal de origem, de forma suficientemente ampla, fundamentada e sem omissões, deve ser afastada a alegada ofensa ao artigo 535 do Código de Processo Civil de 1973. 2.
Como destinatário final da prova, cabe ao magistrado, respeitando os limites adotados pelo Código de Processo Civil, a interpretação da produção probatória, necessária à formação do seu convencimento. 3. Inviável o recurso especial cuja análise impõe reexame do contexto fático-probatório da lide (Súmula 7 do STJ). 4. Agravo interno a que se nega provimento
.' (
AgInt no AREsp 829.231/MG, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 13/09/2016, DJe 21/09/2016)
A Corte Especial do STJ já afastou a alegada necessidade de identidade de partes para a utilização de prova emprestada, desde que assegurado o contraditório como requisito primordial. Eis excerto da ementa:
(...) 9. Em vista das reconhecidas vantagens da prova emprestada no processo civil, é recomendável que essa seja utilizada sempre que possível, desde que se mantenha hígida a garantia do contraditório. No entanto, a prova emprestada não pode se restringir a processos em que figurem partes idênticas, sob pena de se reduzir excessivamente sua aplicabilidade, sem justificativa razoável para tanto. 10. Independentemente de haver identidade de partes, o contraditório é o requisito primordial para o aproveitamento da prova emprestada, de maneira que, assegurado às partes o contraditório sobre a prova, isto é, o direito de se insurgir contra a prova e de refutá-la adequadamente, afigura-se válido o empréstimo. 11. Embargos de divergência interpostos por WILSON RONDÓ JÚNIOR E OUTROS E PONTE BRANCA AGROPECUÁRIA S/A E OUTRO não providos. Julgados prejudicados os embargos de divergência interpostos por DESTILARIA ALCÍDIA S/A. (EREsp 617.428/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/06/2014, DJe 17/06/2014)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JULGAMENTO POR DECISÃO MONOCRÁTICA. POSSIBILIDADE. APRECIAÇÃO DE TODAS AS QUESTÕES RELEVANTES DA LIDE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. PROVA EMPRESTADA. OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO. (...) 2.
Esta Corte entende que "independentemente de haver identidade de partes, o contraditório é o requisito primordial para o aproveitamento da prova emprestada, de maneira que, assegurado às partes o contraditório sobre a prova, isto é, o direito de se insurgir contra a prova e de refutá-la adequadamente, afigura-se válido o empréstimo" (EREsp n. 617.428/SP, rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 4/6/2014, DJe 17/6/2014
). 3. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, a teor do que dispõe a Súmula n. 7/STJ. 4. Somente em hipóteses excepcionais, quando irrisório ou exorbitante o valor da indenização por danos morais arbitrado na origem, a jurisprudência desta Corte permite o afastamento do referido óbice, para possibilitar a revisão. No caso, o valor estabelecido pelo Tribunal de origem não se mostra excessivo, a justificar sua reavaliação em recurso especial. 5. O recurso especial que não impugna fundamento do acórdão recorrido suficiente para mantê-lo não deve ser admitido, a teor da Súmula n. 283/STF. 6. Agravo interno a que se nega provimento. ( AgInt no AREsp 972.929/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 27/05/2019, DJe 30/05/2019) - destacou-se.
Atente-se ainda para o seguinte:
"(...) Não há dúvida de que a questão jurídica e o contexto fático é idêntico ao dos autos nº 5038374-17.2011.404.7000, eis que em ambos os servidores, médicos anestesiologistas que trabalham no Hospital das Clínicas, requerem o recebimento de adicional de insalubridade no grau máximo, em virtude de permanente exposição a agentes nocivos biológicos.
Outrossim, o fato do laudo pericial produzido nos autos nº 5038374-17.2011.404.7000 ter sido produzido em dezembro de 2012, também não altera tais conclusões, uma vez que competia à ré comprovar qualquer alteração no ambiente laboral da autora
.
O laudo pericial produzido nos autos nº 5038374-17.2011.404.7000/PR trata do mesmo local de trabalho da autora e aborda a mesma atividade da autora, não tendo sido apresentadas razões, pela ora ré, que desabonassem a prova produzida ou esclarecida a suposta divergência da situação fática ora estudada.
Conforme exposto na decisão do evento 22, o laudo que embasou a classificação do risco a que submetida a autora, produzido pela UFPR, não tratou individualmente cada profissional, mas ateve-se à categoria e ao ambiente de trabalho. Não verifico, portanto, razão para que a UFPR utilize parâmetros distintos em sua análise administrativa, daqueles a serem aplicados na análise dos presentes autos.
Também não vejo como a utilização da prova emprestada, no caso, violaria os incisos LIII, LIV e LV do art. 5.º da Constituição Federal, eis que houve a efetiva observância dos princípios do contraditório, ampla defesa e devido processo legal. (...) Assim, não há qualquer razão contundente para que o laudo não seja utilizado como prova emprestada à situação fática da parte autora.
Dessa forma, rejeita-se a alegação de nulidade, negando-se provimento à apelação da parte ré no ponto
." (TRF-4 - AC: 50556034820154047000 PR 5055603-48.2015.4.04.7000, Relator: VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 19/05/2020, TERCEIRA TURMA)
Atente-se ainda para o seguinte julgado do STJ:
CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DISCRIMINATÓRIA. TERRAS DEVOLUTAS. COMPETÊNCIA INTERNA. 1ª SEÇÃO. NATUREZA DEVOLUTA DAS TERRAS. CRITÉRIO DE EXCLUSÃO. ÔNUS DA PROVA. PROVA EMPRESTADA. IDENTIDADE DE PARTES. AUSÊNCIA. CONTRADITÓRIO. REQUISITO ESSENCIAL. ADMISSIBILIDADE DA PROVA. (...) 9. Em vista das reconhecidas vantagens da prova emprestada no processo civil, é recomendável que essa seja utilizada sempre que possível, desde que se mantenha hígida a garantia do contraditório.
No entanto, a prova emprestada não pode se restringir a processos em que figurem partes idênticas, sob pena de se reduzir excessivamente sua aplicabilidade, sem justificativa razoável para tanto. 10. Independentemente de haver identidade de partes, o contraditório é o requisito primordial para o aproveitamento da prova emprestada, de maneira que, assegurado às partes o contraditório sobre a prova, isto é, o direito de se insurgir contra a prova e de refutá-la adequadamente, afigura-se válido o empréstimo
. (...) (ERESP - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL - 617428 2011.02.88293-9, NANCY ANDRIGHI, STJ - CORTE ESPECIAL, DJE DATA:17/06/2014 ..DTPB:.)
Desse modo, em princípio, revela-se cabível eventual empréstimo probatório, contanto que os critérios acima sejam atendidos.
2.62. Juízos de abdução:
A distribuição do ônus da prova cuida de um critério de solução da causa, diante da eventual insuficiência da comprovação da veracidade de determinadas asserções. Na forma do art. 373, I, CPC/15, caso a parte autora tenha promovido a narrativa de um fato, apontado como causa da sua pretensão, e a veracidade dessa narrativa não tenha sido comprovada, a pretensão há de ser julgada improcedente. De modo semelhante, caso a parte requerida tenha alegado a ocorrência de um fato obstativo do acolhimento da pretensão da parte autora - por exemplo, causação do dano por um terceiro, desvinculado da sua atividade econômica -, e isso não seja provado, então sua impugnação não poderá ser acolhida.
Algo diferente ocorre com os critérios de interpretação dos meios de prova. Nesse âmbito, tem-se em conta a forma como o Juízo deve apreciar os elementos probatórios veiculados nos autos, para fins de reconstrução histórica dos fatos narrados pelas partes
.
Como sabido, indício
"
é todo rastro, vestígio, sinal e, em geral, todo fato conhecido, devidamente provado, suscetível de conduzir ao conhecimento de um fato desconhecido, a ele relacionado, por meio de um raciocínio indutivo-dedutivo
"
(MOURA, Maria Thereza.
A prova por
indícios
no processo penal.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 109). Tais sinais, fundamentando juízos de abdução, podem amparar um decreto condenatório; desde que sejam coerentes, harmônicos entre si, e não refutados por contraindícios.
"
Indício não é uma prova menor, mas uma prova que deve ser verificada. O indício é idôneo para apurar a existência de um fato histórico delituoso somente quando presentes outras provas que excluam uma diversa reconstrução do acontecimento. O princípio é formulado no art. 192, inc. 2, do CPP [italiano]: a existência de um fato não pode ser deduzida por meio de indícios, a menos que estes sejam graves, precisos e consonantes
. Desta regra emerge, em primeiro lugar, que um único indício nunca é suficiente." (TONINI,
Paolo.
A prova no processo penal italiano.
SP:RT, p. 58)
"Valor probatório dos indícios: como já afirmamos em nota anterior, os indícios são perfeitos tanto para sustentara a condenação, quanto para a absolvição. Há autorização legal para a sua utilização e não se pode descurar que há muito preconceito contra essa espécie de prova, embora seja absolutamente imprescindível ao juiz utilizá-la. Nem tudo se prova diretamente, pois há crimes camuflados - a grande maioria - que exigem a captação de indícios para a busca da verdade real. Lucchini, mencionado por Espínola Filho, explica que a eficácia do indício não é menor que a data prova direta, tal como não é inferior a certeza racional à histórica e física. O indício é somente subordinado à prova, porque não pode subsistir sem uma premissa, que é a circunstância indiciante, ou seja, uma circunstância provada; e o valor crítico do indício está em relação direta com o valor intrínseco da circunstância indiciante. Quando esteja bem estabelecida, pode o indício adquirir uma importância predominante e decisiva no juízo (...) Assim também Bento de Faria, apoiado em Malatesta.
Realmente, o indício apóia-se e sustenta-se numa outra prova. No exemplo citado na nota anterior, quando se afirma que a coisa objeto do furto foi encontrada em poder do réu não se está provando o fato principal, que consiste na subtração, mas tem-se efetiva demonstração de que a circunstância ocorreu, através do auto de apreensão e de testemunhas. Em síntese, o indício é um fato provado e secundário (circunstância) que somente se torna útil para a construção do conjunto probatório ao ser usado o processo lógico da indução." (NUCCI, Guilherme de Souza.
Código de processo penal comentado.
8ª ed., SP: RT, p. 514)
"
Inicialmente, é de ser recordar que todos os meios de prova no processo penal são relativos, não existindo hierarquia entre eles. Fixada essa premissa, é óbvio que os indícios podem servir para sustentar uma condenação, a depender evidentemente da sua qualidade
. (...) [Nota de rodapé:] Em passagem pitoresca Denílson Pacheco afirma: É possível se condenar com base em indícios? Desde que sejam veementes e insofismáveis, a resposta é positiva. Para ilustrar, vamos contar uma estória muito difundida no meio forense. Um gato e um passarinho foram colocados no interior de uma sala hermeticamente fechada e completamente vazia. Várias testemunhas idôneas foram colocadas do lado de fora da sala durante todo o evento. A única saída foi fechada e, rapidamente, foi aberta novamente, com todas as testemunhas observando a única saída. No interior da sala, o passarinho tinha sumido. Havia somente penas pelo chão. O gato encontrava-se num canto da sala, lambendo os beiços, com sangue pelos bigodes e, ainda, umas penas pelos dentes. Alguém viu o gato comendo o passarinho? Alguém viu o assassinato do passarinho? Todas as provas são indiciárias: a sala hermeticamente fechada, o gato e passarinho sozinhos na sala, as testemunhas idôneas que observaram todo o evento etc. Mas, de todos esses indícios veementes, podemos tirar nossa firme conclusão: alguém tem dúvida de que foi o gato que comeu o passarinho? (Direito processual penal, Teoria, crítica e práxis, p. 896)." (BEDÊ JÚNIOR, Américo; SENNA, Gustavo.
Princípios do processo penal:
entre o garantismo e a efetividade da sanção. RT, p. 113.
"
A prova indiciária, ou prova por indícios, terá a sua eficiência probatória condicionada à natureza do fato ou da circunstância que por meio dela (prova indiciária) se pretender comprovar
. Por exemplo, tratando-se de prova do dolo ou da culpa, ou dos demais elementos subjetivos do tipo, que se situam no mundo das idéias e das intenções, a prova por indícios será de grande valia." (Pacelli de Oliveira,
Curso de processo penal,
6ª ed. Del Rey, p. 367).
"Se é verdade que na investigação da subjetividade do agente, o fato externo é que indica o elemento interno, isto não quer dizer que o dolo possa ser presumido. O juiz deverá se convencer da ocorrência do dolo, ainda que - para tanto - deva se basear em elementos objetivos. Estes dados objetivos devem estar provados e convencer o julgador, sem margem de dúvida, sobre qual era a intenção do acusado. A inferência do elemento subjetivo a partir de dados objetivos não significa que o dolo seja presumido." (BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy.
Ônus da prova no processo penal.
SP: RT, 2.003, p. 307, grifei.
Transcrevo também alguns julgados a respeito desse tema:
"
Uma sucessão de indícios e circunstâncias, coerentes e concatenadas, podem ensejar a certeza fundada que e exigida para a condenação
."
(STJ, 5ª turma, REsp n. 130.570, rel. Min. Felix Fischer, DJU de 06.10.97, p. 50.035, omiti o restante da ementa). Ademais,
"
Indícios e circunstâncias quando múltiplos, sucessivos, coerentes concatenados e veementes, como no caso dos autos, têm o mesmo valor das provas diretas e são suficientes para embasar uma decisão condenatória, ainda mais quando excluem quaisquer outras hipóteses favoráveis ao condenado
."
(TRF da 4ª Rg., 7ª Turma, Apelação criminal de autos 200104010635742/PR, rel. Des. Fed. José Luiz Borges Germano da Silva, DJU 01.09.2004, p. 802, omiti parte da ementa).
Ainda nesse sentido,
"
Pressuposta a impenetrabilidade de consciência, se o réu não confessa, a prova do elemento subjetivo do delito só pode ser fornecida por meios indiretos, por indícios, vale dizer
."
(TRF 3ª Rg., ACR 17.877, DJU de 05.08.2005, p. 383, rel. Juiz Peixoto Júnior).
Em princípio, cabe a quem alega o ônus da demonstração segura, ou seja, crível e filtrada racionalmente, tanto quanto possível, de que os argüidos teriam praticado, ao tempo reportado pela petição inicial, a conduta imputada, ainda que isso possa ser promovido por meio da conjugação de significativos e consistentes indícios da prática infracional. Sendo isso aplicável na temática processual penal, solução semelhante impõe-se também no âmbito da ação civil pública, com os contornos próprios ao processo civil.
2.63. Elementos de convicção - exame não exaustivo:
Com a peça inicial, o autor apresentou instrumento de procuração, documento pessoal, matrícula do imóvel, cópia do processo administrativo, laudo ambiental. Apresentou a DITR do exercício de 2020, em que declarou (evento 1, outros-4):
A Secretaria da Receita Federal promoveu lançamento de revisão, na forma do art. 150, §4, CTN, desconsiderando os descontos de áreas, promovidos pelo requerente, a título de área de preservação permanente - APP e áreas de reservação legal - RL. Com isso, o contribuinte restou notificado - notificação n. 7501/00031/2024, no tocante ao ITR de 2020:
O Erário desconsiderou as poligonais que haviam sido declaradas como áreas isentas quanto ao imposto territorial rural. O autor anexou o protocolo de preenchimento para inscrição no CAR, declarando:
Juntou ADA de 2020, indicando também:
Juntou um parecer técnico, por ele contratado, no tocante ao imóvel em questão. Segundo aludido parecer.
No evento 19, a União comunicou ter suspenso a exigibilidade do tributo e consectários moratórios, em razão da antecipação de tutela. Ao que releva, esses são os principais elementos de convicção veiculados nos autos.
2.64. Delimitação das narrativas controvertidas:
No essencial, nesse processo, as partes discutem se o imóvel da parte autora realmente contaria com áreas de preservação permanente - APP e de reserva legal, no montante indicado por época das suas declarações concernentes ao ITR, períodos indicados na peça inicial. Discute-se também se aludida fazenda seria composta por florestas cuja proteção impediria o exercício de atividades econômicas sobre o bem.
Em primeiro exame
, não parece haver debates a respeito da valoração da terra nua da fazenda.
2.65. Questões valorativas controvertidas:
Discute-se, ademais - caso comprovada a existências as áreas de especial afetação ambiental, para fins de exoneração do ITR -, se haveria necessidade de apresentação do ADA e de averbação de reserva legal, o que tagencia o exame da súmula 86, TRF4.
Deve-se apurar se o imóvel em questão é suscetível de exploração econômica, quanto às áreas aludidas na inicial e, em caso negativo, as consequências disso. Equacionei alguns tópicos acima a respeito de tais temas, com cognição precária, de modo a viabilizar o debate entre as partes e reexame em sentença, na forma do art. 357, CPC.
2.66. Diligências probatórias:
Em regra, o Poder Judiciário deve facultar a ambas as partes, observados os prazos de lei, a realização da mais ampla dilação probatória, desde que se revele conexa com o pedido e a causa de pedir deduzidos nos autos. Isso não significa, porém, que todo e qualquer pedido, lançado pelos contendores, deva ser automaticamente deferido.
Ao contrário, as diligências destinadas a esclarecer fatos totalmente impertinentes com o
thema decidendum
não hão de ser realizadas, sob pena de converter o processo em um verdadeiro trabalho de Sísifo. Como sabido,
frusta probatur quod probantum non relevat.
Importa dizer: não se defere a realização de diligências destinadas a demonstrar fatos insuscetíveis de influenciar o resultado da demanda.
Esse é, por exemplo, o conteúdo do art. 464, §1º, CPC/15 ou do art. 420, parágrafo único, do CPC/73. Reporto-me ao art. 38, §2, da lei 9.784/99, que versa sobre o processo administrativo:
"Somente poderão ser recusadas, mediante decisão fundamentada, as provas propostas pelos interessados quando sejam ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias."
2.67. Promoção de diligência pericial - caso em exame:
No caso, impõe-se a realização de diligência pericial, tanto por isso, a fim de que seja apurada a situação do imóvelem questão. O ônus demonstrativo incumbe à autora, cabendo-lhe também a antecipação das custas periciais pertinente. Detalho, abaixo, a sequência do procedimento em questão.
Caso sua pretensão venha a ser julgada total ou parcialmente procedente, a parte requerida ficará encarregada do reembolso das custas, ou de fração delas, na forma do art. 4, parágrafo único, lei n. 9.289/1996, com a correção monetária pertinente - variação da taxa SELIC.
2.68. Eventuais outras medidas demonstrativas:
No caso, em princípio, contanto que venha a ser promovida diligênica pericial, se revelará desnecessária a inquirição de testemunhas e a tomada de depoimento pessoa da parte autora - art. 385, CPC.
III - EM CONCLUSÃO
------------------- saneamento da demanda -------------------
3.1. DECLARO a competência desta unidade jurisdicional para o processo e julgamento desta demanda e a sua submissão ao rito comum.
3.2. DESTACO que, no presente caso, não vislumbro um contexto de conexão processual, para fins de reunião e julgamento conjunto das demandas, conforme art. 55, §1, CPC/15 e leitura
a contrario sensu
235, Superior Tribunal de Justiça.
3.3. REGISTRO que não diviso sinais de desrespeito à garantia da coisa julgada (art. 5, XXXVI, Constituição, art. 508, CPC), indicativos de eventual litispendência (art 337, §2, CPC), tampouco sendo caso de suspensão da tramitação da demanda - art. 313, CPC.
3.4. REPUTO que a partes estão legitimadas para a causa; que a peça inicial é apta e o(a) autor(a) possui interesse processual - art. 17, CPC.
3.5. ACRESCENTO que não diviso situação de litisconsórcio necessário na situação em exame, de modo a exigir a convocação de terceiros para comporem a relação processual - arts. 114, 115, 506, CPC/15.
3.6. SUBLINHO que o valor atribuído à causa se revela escorreito, em primeira análise eis que parece corresponder ao conteúdo econômico da pretensão da autora.
3.7. DESTACO ainda que a pretensão à anulação/revisão de lançamento tributário não foi atingida pela prescrição, no caso em exame, conforme art. 168, CTN/66. O instituto da decadência não se aplica no que toca ao alegado direito à anulação de lançamento e repetição de indébito, invocados na petição inicial, o que não se confunde com eventual decadência da oportunidade para que o Fisco promova o lançamento.
3.8. DISCORRI acima, com cognição precária, sobre a compleição do ITR, lançamento tributário e outros vetores pertinentes à solução da causa, para os fins de saneamento, de modo a permitir debate entre os contendores.
3.9. REPUTO saneado o processo, quanto aos temas acima equacionados. Faculto manifestação às partes, para os fins do art. 357, §1, CPC, nos prazos abaixo detalhados, e quanto à indicação de eventuais diligências probatórias, como menciono tópicos abaixo.
3.10. INTIMEM-SE as partes, portanto, para, querendo, manifestarem-se a respeito da eventual necessidade de complementação ou correção deste despacho - art. 357, §1, CPC/15. Prazo de 05 dias úteis, parte autora, e de 10 dias úteis, requerida, contados da intimação, conforme arts. 183, 219, 224, CPC e art. 357, §1, CPC.
3.11. ANOTO que não haverá estabilização quanto ao alcance das categorias jurídicas e equacionamento dos elementos de convicção, detalhads acima, eis que poderão ser revistas em sentença, não havendo preclusão
pro iudicato
quanto ao tema.
------------------- diligência pericial -------------------
3.12. INTIMEM-SE as partes para que apresentem seus quesitos, para a realização do exame pericial. Prazo de 15 dias úteis - parte autora - e de 30 dias úteis, parte requerida, contados da intimação, conforme arts. 183, 219, 224, CPC e art. 5 da lei n. 11.419/2006.
3.13.NOMEIE-SE perito(a), conforme lista disponível junto à Direção do Foro, com atuação na área da agrimensura, engenharia civil, engenharia florestal ou engenharia cartográfica.
3.14. INTIMEM-SE as partes a respeito, tão logo a designação seja promovida.
3.15. REGISTRO que o laudo pericial deverá ser apresentado no prazo de
60 dias corridos
, contados da intimação para tanto, sem prejuízo de eventual e excepcional prorrogação do prazo, caso isso seja devidamente justificado nos autos.
Caso se façam necessárias complementações, o prazo para tanto será fixado em 30 dias corridos
.
3.16. INTIME-SE, ademais, o(a) perito(a) designado(a) para que, tomando conhecimento desta causa, diga se aceita o encargo, apresentando, em caso positivo, cópia do
curriculum,
devidamente instruído, e também orçamento detalhado abrangendo seus honorários periciais, prováveis horas demandadas para a realização da diligência pericial, e também os custos de deslocamento e outros tópicos porventura necessários para elaboração do referido exame.
3.17. REGISTRO que o(a) perito(a) também deve ser comunicado de que, no valor dos honorários, estará incluída a eventual necessidade de responder quesitos complementares, depois da apresentação do laudo pertinente. Também deverá tomar em conta as despesas com o deslocamento até o local da perícia e demais elementos indispensáveis para a diligência pericial. Deverá tomar em conta também o prazo assinalado para que o laudo seja apresentado.
3.18. INTIME-SE o(a) perito(a) ainda de que, na forma do art. 465, §4, CPC/15, o(a) expert poderá levantar até 50% dos honorários periciais ao início do trabalho, sendo o remanescente pago ao final, depois de respondidos eventuais quesitos complementares. Prazo para manifestação do perito, apresentando tais elementos - 15 dias úteis, a contar da intimação, conforme art. 219 e art. 224, CPC/15.
3.19. INTIMEM-SE as partes - tão logo sejam apresentados tais elementos - para eventual manifestação em 5 dias úteis (autor) e 10 dias úteis (requerida) - (art. 183 e art. 465, §3, CPC). INTIMEM-NAS também para que, no mesmo prazo, querendo, indiquem assistentes periciais, a fim de que sejam devidamente qualificados nos autos, podendo tecer considerações na forma do art. 465, §1, CPC/15.
3.20. DESIGNE-SE outro(a) perito(a), em substituição, caso o(a) expert designado indique não ter interesse ou disponibilidade na agenda na realização da diligência probatória.
3.21. ANOTO que, havendo concordância com os honorários, a parte demandada deverá promover, no mesmo prazo de 10(dez) dias úteis, o depósito do valor pertinente, em conta vinculada aos autos, dado que se cuida de diligência probatória por ela requerida (art. 82 e art. 373, I, CPC/15), sem prejuízo de eventual reembolso por parte autora, caso a pretensão deduzida na peça inicial venha a ser julgada improcedente, em sentença transitada em julgado. Caso haja impugnação ao orçamento do(a) perito(a), INTIMEM-NO(A) para que diga sobre a possibilidade de reduzir os honorários indicados. Prazo de 05 dias úteis, contados da intimação. Não havendo consenso entre partes e perito, a respeito dos honorários, VOLTEM-ME conclusos.
3.22. DESTACO ainda que aludido depósito, tão logo promovido, fica submetido à correção monetária aplicável às cadernetas de poupança (taxa referencial básica - TRB), por força do art. 11, da lei n. 9.289, de 1996 e art. 12 da lei n. 8.177, de 1991. Não há incidência de juros moratórios ou remuneratórios sobre aludidos depósitos. A questão submeter-se-á ainda aos arts. 35 e ss. da lei nº 14.973, de 16 de setembro de 2024.
3.23. ACRESCENTO que, tão logo seja promovido o depósito da integralidade dos honorários periciais indicados pelo(a) expert, deverá ser expedido o necessário para o pagamento ao(à) perito(a), de modo a assegurar referido levantamento de 50% (cinquenta) por cento dos honorários.
3.24, INTIME-SE o(a) perito(a) a respeito do arbitramento do prazo de 60 dias CORRIDOS para apresentação do laudo ao presente Juízo, com sua juntada no
eproc
, prazo a contar da intimação para início dos trabalhos. O perito deverá COMUNICAR as partes e assistentes periciais porventura indicados nos autos a respeito do início da diligência e também a respeito da data de inspeção no local do imóvel, mencionado na peça inicial. - antecedência de 05 dias úteis (art. 466, CPC/15).
3.25. REGISTRO que é ônus da parte autora apresentar a via do cartão por ela utilizada ao tempo das alegadas fraudes, dado se cuidar de objeto indispensável para a realização do exame pericial.
2.26. ANOTO ainda que as diligências periciais poderão ser acompanhadas pelas partes e pelos assistentes periciais, no local do imóvel. A diligência pericial deverá ser promovida durante o dia, em prol da inviolabilidade do domicílio - art. 5, XI, Constituição -, salvo eventual franquia expressa por parte do proprietário/possuidor do bem para aludido acesso no período noturno. Eventuais óbices opostos pela parte autora quanto ao acesso ao imóvel - parte relevante para a discussão - poderá ensejar preclusão lógica quanto à oportunidade de promoção da perícia.
3.27. INTIMEM-SE as partes - tão logo seja apresentado o laudo pericial - para manifestação e eventual apresentação de parecer técnico dos seus assistentes periciais. Prazo comum de 15 dias úteis para ambas as partes, contados na forma dos arts. 183, 219, 224, CPC/15 e art. 5, da lei n. 11.419/2006.
3.28. INTIME-SE o(a) perito(a) para manifestação e apresentação do exame pertinente, no prazo de 30 dias corridos, contados na forma dos arts. 219, 224, CPC/15 e art. 5, da lei n. 11.419/2006, caso sobrevenham pedidos de complementação do laudo.
3.29. VOLTEM-ME conclusos para determinar o pagamento do perito judicial quanto ao valor remanescentes dos seus honorários, caso não tenham sido formulados quesitos complementares, ou caso, tendo sido apresentados pelas partes e respondido pelo(a) perito(a).
------------------- alegações finais -------------------
3.30. INTIME-SE a parte autora, na sequência, para apresentar, querendo, suas razões finais no prazo de 15 dias úteis, contados conforme art. 219, 224 e 364, §2º, CPC/15 e art. 5, da lei n. 11.419/2006.
3.31. INTIME-SE a rqeuerida para, querendo, apresentar suas razões finais em 30 dias úteis, contados conforme arts. 183, 219, 224 e 364, §2º, CPC/15 e art. 5, da lei n. 11.419/2006, tão logo sejam apresentadas as alegações finais do autor ou decorra
in albis
o prazo para tanto fixado,
3.32. VOLTEM-ME conclusos para prolação de sentença, tudo cumprido, com a apresentação das razões finais da União ou com o esgotamento do prazo para tanto fixado.
3.33. INTIMEM-SE as partes a respeito desta decisão.
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