Processo nº 0804038-61.2024.8.20.5300
ID: 319258140
Tribunal: TJRN
Órgão: Gab. Desª. Lourdes de Azevedo na Câmara Cível
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0804038-61.2024.8.20.5300
Data de Disponibilização:
08/07/2025
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0804038-61.2024.8.20.5300 Polo ativo FRANCISCO SOARES FILHO Advogado(s): MARIA DE…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0804038-61.2024.8.20.5300 Polo ativo FRANCISCO SOARES FILHO Advogado(s): MARIA DE FATIMA DA SILVA NASCIMENTO OLIVEIRA Polo passivo RIO GRANDE DO NORTE SECRETARIA DA SAUDE PUBLICA Advogado(s): EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (INTERNAÇÃO EM UTI). PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. NÃO CONHECIMENTO PARCIAL QUANTO AO PEDIDO DE OBSERVÂNCIA AO TEMA 1033 DO STF. AUSÊNCIA DE INTERESSE. ADMISSIBILIDADE QUANTO AOS DEMAIS FUNDAMENTOS. TESE DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM REJEITADA. NECESSIDADE DE ALTERAÇÃO, TODAVIA, DO PARÂMETRO DE FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS. BEM JURÍDICO TUTELADO (SAÚDE) DE VALOR INESTIMÁVEL. ARBITRAMENTO POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação contra sentença que julgou procedente ação de obrigação de fazer, determinando ao Estado a disponibilização de leito de UTI à paciente em estado grave, com condenação em honorários sucumbenciais fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, a qual foi atribuída a quantia de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais). II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A controvérsia consiste em examinar: (i) a legitimidade passiva do Estado do Rio Grande do Norte nas demandas de saúde; (ii) a eventual quebra da isonomia na admissão em UTI mediante decisão judicial; (iii) a necessidade de ressarcimento pelo Município; e (iv) a adequação do critério adotado para a fixação dos honorários sucumbenciais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal, no Tema 793 e a Súmula 34 do TJRN reconhecem a responsabilidade solidária dos entes federativos quanto à prestação de serviços de saúde, sendo legítima a presença do Estado no polo passivo da demanda. 4. Ausente prova de que tenha havido quebra da isonomia ou burla à fila regulatória do SUS na internação do autor, paciente idoso e hipossuficiente, admitido inconsciente em unidade hospitalar, em estado grave e com risco de vida, e com ordem judicial precária de internação, respeitando-se a fila de espera estabelecida pela Central de Regulação de Leitos da Secretaria Estadual de Saúde e, consequentemente, a ordem cronológica de quem já está na espera de um leito, independentemente de ordem judicial. 5. O pedido subsidiário de ressarcimento, é entendimento da Corte Superior, seguido pelo Tribunal de Justiça Potiguar, que sua análise é própria da fase de cumprimento de sentença, consoante interpretação do STJ acerca da ressalva constante no Tema 793. 6. No tocante à fixação dos honorários sucumbenciais, incabível sua fixação, no caso concreto, sobre o valor da causa, por se tratar de direito à saúde, bem jurídico tutelado de valor inestimável, sendo de rigor o arbitramento por apreciação equitativa, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais). IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Conhecido em parte o recurso e, no mérito, provido parcialmente apenas para modificar os honorários sucumbenciais, estabelecendo-os em R$ 1.000,00 (mil reais), por apreciação equitativa. Tese de julgamento: "1. A responsabilidade pela prestação de serviços de saúde é solidária entre os entes federativos, sendo lícito ao jurisdicionado acionar qualquer deles isoladamente (Tema 793/STF)." "2. A fila de regulação de leitos hospitalares não é violada quando há cumprimento de decisão judicial sem prova de quebra da ordem cronológica estabelecida pela Central de Regulação." "3. A fixação de honorários sucumbenciais por equidade é admissível nas ações cujo bem jurídico tutelado – como a saúde – possui valor inestimável." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 6º; CPC, arts. 85, §§ 2º e 8º; CPC, art. 373, I; Lei nº 8.080/1990. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 855178 (Tema 793); STJ, AgInt no AREsp 2.193.951/RS; STJ, AgInt no REsp 1.891.214/MT; TJRN, AC 0801932-29.2024.8.20.5300; TJRN, RN 0801510-66.2024.8.20.5102, Relatora: Juíza convocada Erika de Paiva Duarte, 3ª Câmara Cível, julgado em 22/05/2025, publicado em 23/05/2025. ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade de votos, em acolher a preliminar de não conhecimento parcial do recurso, arguida de ofício, quanto ao pedido de observância à tese firmada pela Suprema Corte no julgamento do Tema 1033, por ausência de interesse. A seguir, em dissonância parcial com o parecer da 5ª Promotora de Justiça de Natal, em substituição legal na 10ª Procuradoria de Justiça, decidem rejeitar a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam suscitada pelo recorrente e, no mérito, dar provimento parcial à apelação (na parte conhecida) somente para fixar os honorários sucumbenciais por apreciação equitativa, nos termos do voto da relatora. RELATÓRIO Francisco Soares Filho ingressou com ação de obrigação de fazer com pedido de tutela antecipada nº 0804038-61.2024.8.20.5300 contra o Estado do Rio Grande do Norte. Ao decidir a causa, o Juízo da 5ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal/RN julgou-a procedente, condenando o ente público a providenciar a internação do autor em leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) em hospital da rede pública ou privada. Por conseguinte, fixou honorários sucumbenciais contra o vencido, à razão de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado (Id 29558749, págs. 01/21). Inconformado, o réu interpôs apelação cível com os seguintes argumentos (Id 29558752, págs. 01/03): a) “o fornecimento do procedimento requerido não cabe ao Estado, uma vez que o mesmo está inserido dentre os procedimentos de “Média e alta complexidade”, portanto, devendo ser o feito direcionado ao ente Municipal”, único legítimo para figurar no polo passivo da demanda; b) a ordem de custeio da internação, importa ao Estado, “gera irreparáveis transtornos operacionais e financeiros, visto que a verba pública de saúde do Ente Estadual é limitada e confeccionada visando atender os procedimentos médicos padronizados ao Sistema Único de Saúde”; c) o autor pretende burlar a fila regulatória de espera para a realização do procedimento disponibilizado pelo SUS, em evidente quebra de isonomia, sendo incabível seu custeio na rede privada. Com esses fundamentos, pugnou pela improcedência da demanda. Caso mantida a condenação ao Estado, requereu, subsidiariamente, a determinação de ressarcimento, pelo município, dos valores gastos pelo apelante para o cumprimento da obrigação de fazer, conforme estabelecido no Tema 793. Além disso, havendo bloqueio e liberação de valores para o custeio da internação, que seja observada a tese firmada no julgamento do Tema 1033, pela Suprema Corte. Por fim, disse esperar a fixação dos honorários por apreciação equitativa, por se tratar de bem jurídico de valor inestimável e, ainda, por não ter havido nenhum ônus excessivo quanto a diligências a serem realizadas pelo causídico que justifiquem o quantum requerido pelo apelante. Intimado, o agravado não apresentou contrarrazões (certidão de Id 29558755). A Dra. Mariana Rebello Cunha Melo de Sá, 5ª Promotora de Justiça de Natal, em substituição legal na 10ª Procuradoria de Justiça, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (Id 30298931). É o relatório. VOTO No exercício do juízo de prelibação, observa-se que uma das teses recursais é a de que, em caso de bloqueio e liberação de valores para o custeio da internação na rede privada, que seja observada a tese firmada no julgamento do Tema 1033, pela Suprema Corte, no sentido de que “o ressarcimento de serviços de saúde prestados por unidade privada em favor de paciente do Sistema Único de Saúde, em cumprimento de ordem judicial, deve utilizar como critério o mesmo que é adotado para o ressarcimento do Sistema Único de Saúde por serviços prestados a beneficiários de planos de saúde”. Ocorre que, pelo que consta no documento de Id 29558739, "o paciente FRANCISCO SOARES FILHO foi regulado para a UTI do HOSPITAL GISELDA TRIGUEIRO, tendo sido admitido naquela unidade em 29/07/2024 às 07:53 (UTI - UTI GERAL - LEITO 06)”. Desse modo, considerando que a unidade de terapia intensiva foi disponibilizada em hospital público da rede estadual, ausente o interesse do Estado quanto ao pedido de observância ao disposto no referido Tema 1033. Assim, deixo de conhecer o recurso quanto ao referido tópico. Fica consignado, em obediência ao princípio da confiança, que segundo a orientação do Superior Tribunal de Justiça, é desnecessária a intimação da parte para se manifestar previamente no caso de inadmissão do recurso ou de seu conhecimento parcial, pois o órgão julgador, nessa hipótese, apenas realiza a averiguação dos pressupostos de admissibilidade previstos em lei, cujo exame já é esperado pelos litigantes e inerente ao julgamento do inconformismo. Logo, a análise dos requisitos de admissibilidade, sem anterior manifestação dos envolvidos na contenda, não viola o art. 9º e 10 do CPC (nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 2.211.831/SP, Relator: Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 27/3/2023, DJe de 31/3/2023, AgInt no AREsp 1.929.690/GO, Relator: Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 6/12/2021, DJe de 9/12/2021 e AgInt no AREsp 1527405/SP, Relator: Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 22/03/2021, DJe 26/03/2021). Quanto aos demais fundamentos, conheço do recurso, eis que satisfeitos os requisitos de admissibilidade. MÉRITO A primeira questão a ser examinada é a tese do recorrente quanto à sua ilegitimidade passiva ad causam, sob o argumento de que o Município de Natal detém a “gestão plena” da saúde, daí ser o único responsável pelo cumprimento da obrigação de fazer vindicada na inicial. Não obstante, a Suprema Corte, por ocasião do julgamento do Tema 793, em sede de repercussão geral, firmou o entendimento de que os entes federativos (União, Estados, Municípios) são solidariamente responsáveis pela garantia do direito à saúde, assegurando-se ao jurisdicionado a faculdade de ajuizar a demanda contra qualquer deles, isolada ou conjuntamente. Nesse mesmo sentido, esta Corte de Justiça Potiguar editou a Súmula 34, cujo enunciado dispõe que “a ação que almeja a obtenção de medicamentos e tratamentos de saúde pode ser proposta, indistintamente, em face de qualquer dos entes federativos”. Desse modo, perfeitamente possível o protocolo da demanda contra o Estado do RN. Outro ponto arguido pelo recorrente é o de que a intenção do autor é burlar a fila regulatória de espera para a realização do procedimento disponibilizado pelo SUS, em evidente quebra de isonomia, sendo incabível seu custeio na rede privada. Sem razão, todavia. A uma, porque a ação foi proposta por paciente idoso, admitido em estado grave no Hospital da Liga, em 25.07.24, inconsciente, com relato de engasgo ocorrido momentos antes, além de quadro de insuficiência respiratória aguda que culminou na necessidade de ventilação mecânica e seguimento em serviço especializado. O relatório médico destacou ainda a necessidade urgente de vaga em leito de UTI em face do risco de vida diante do seu estado clínico (Id 29558723). A duas, a decisão que deferiu o pedido de tutela antecipada, confirmada na sentença, deixou consignado “que por força desta decisão, deve ser respeitada a fila de espera estabelecida pela Central de Regulação de Leitos da Secretaria Estadual de Saúde, obedecendo-se a ordem cronológica de quem já está na espera de um leito, independentemente de ordem judicial”. Assim, não há elementos a demonstrar a inobservância à fila do SUS, haja vista que a ordem judicial foi proferida em 26.07.24, mesma data em que a Central de Regulação da Secretaria Estadual de Saúde Pública do Estado do Rio Grande do Norte acusou o recebimento do mandado judicial (Id 29558728). Por sua vez, o documento de Id 29558739 noticia que "o paciente FRANCISCO SOARES FILHO foi regulado para a UTI do HOSPITAL GISELDA TRIGUEIRO, tendo sido admitido naquela unidade em 29/07/2024 às 07:53 (UTI - UTI GERAL - LEITO 06)”, daí porque se conclui que a internação somente foi realizada 02 (dois) dias após a determinação judicial precária em observância, exatamente, à fila de regulação. Nesse cenário, não há prova da alegada quebra da isonomia, inclusive, em caso semelhante, segue julgado desta Corte de Justiça: Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REMESSA NECESSÁRIA. DIREITO À SAÚDE. TRANSFERÊNCIA HOSPITALAR URGENTE. DEVER DO ESTADO. MANUTENÇÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA. DESPROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Remessa necessária contra sentença que, em ação judicial ajuizada por paciente diagnosticada com sequela de AVC isquêmico, traqueostomia, incontinência urinária, diabetes mellitus insulinodependente e hipertensão arterial sistêmica, confirmou a tutela de urgência concedida para determinar a transferência imediata da autora para leito clínico hospitalar especializado, em razão da gravidade de seu quadro de saúde e da inércia administrativa na disponibilização de vaga, estando a demandante na 50ª posição na fila de regulação. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em definir se é legítima a manutenção da tutela de urgência que determinou a transferência imediata da paciente para leito hospitalar especializado, diante da omissão administrativa no cumprimento do dever constitucional de assegurar o direito à saúde. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A Constituição da República, em seus arts. 6º, 23, II, e 196, consagra o direito à saúde como direito de todos e dever do Estado, impondo à Administração Pública, em todas as suas esferas, a obrigação de assegurar acesso universal e igualitário às ações e serviços de saúde. 4. A Constituição Estadual, em seu art. 128, reforça o dever de atuação integrada e regionalizada do SUS para atendimento integral à população, especialmente em casos que demandam atenção urgente e especializada. 5. A Lei nº 8.080/90 disciplina a organização e funcionamento dos serviços de saúde, atribuindo ao Poder Público a responsabilidade de promover as condições necessárias para o exercício pleno do direito à saúde. 6. A efetivação do direito à saúde não pode ser condicionada a entraves burocráticos ou à espera em filas de regulação que comprometam a vida e a saúde do cidadão, sendo legítima a intervenção judicial para garantir tratamento imediato em casos de urgência. 7. Diante da comprovação da necessidade urgente de internação da paciente e da ausência de resposta administrativa eficaz, a manutenção da tutela deferida é medida que se impõe para assegurar a dignidade da pessoa humana e o direito fundamental à saúde. IV. DISPOSITIVO. 8. Remessa necessária desprovida. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 6º, 23, II, e 196; Constituição do Estado do Rio Grande do Norte, art. 128; Lei nº 8.080/1990.Jurisprudência relevante citada: Não mencionada expressamente no caso fornecido. (TJRN, RN 0801510-66.2024.8.20.5102, Relatora: Juíza convocada Erika de Paiva Duarte, 3ª Câmara Cível, julgado em 22/05/2025, publicado em 23/05/2025) Subsidiariamente, o apelante pede que seja determinado o ressarcimento, pelo município, dos valores gastos pelo apelante para o cumprimento da obrigação de fazer, conforme estabelecido no Tema 793, ante a co-obrigação na execução as políticas públicas de saúde. Ocorre que o Superior Tribunal de Justiça “já se manifestou reiteradas vezes sobre a quaestio iuris, estando pacificado o entendimento de que a ressalva contida na tese firmada no julgamento do Tema 793 pelo Supremo Tribunal Federal, quando estabelece a necessidade de se identificar o ente responsável a partir dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização do SUS, relaciona-se ao cumprimento de sentença e às regras de ressarcimento aplicáveis ao ente público que suportou o ônus financeiro decorrente do provimento jurisdicional que assegurou o direito à saúde” (nesse sentido: AgInt no REsp 2.033.901/PE, Relator: Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 17/4/2023, DJe de 17/5/2023). No mesmo sentido, segue precedente mais recente: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO REGISTRADO NA ANVISA E NÃO INCORPORADO AO SUS. LEGITIMIDADE DO ESTADO-MEMBRO. TEMA 793/STF. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. O entendimento segundo o qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios possuem responsabilidade solidária nas demandas prestacionais na área de saúde, o que autoriza que sejam demandados isolada ou conjuntamente pela parte interessada, está pacificado pela jurisprudência. 2. A ressalva contida na tese firmada no julgamento do Tema 793/STF, quando estabelece a necessidade de se identificar o ente responsável a partir dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização do Sistema Único de Saúde - SUS, relaciona-se ao cumprimento de sentença e às regras de ressarcimento aplicáveis ao ente público que suportou o ônus financeiro decorrente do provimento jurisdicional que assegurou o direito à saúde. Entender de maneira diversa é afastar o caráter solidário da obrigação, o qual foi ratificado no precedente qualificado exarado pelo STF. (...) 4. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt no AREsp 2.193.951/RS, Relator: Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, julgado em 10/6/2024, DJe de 13/6/2024) O mesmo entendimento vem sendo adotado por esta Corte de Justiça: EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE LIMINAR (FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS). (...) OBRIGAÇÃO MANTIDA EM RESPEITO À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITOS CONSTITUCIONAIS À VIDA E À SAÚDE QUE DEVEM SER RESGUARDADOS PELO DEMANDADO. PRECEDENTES. PEDIDO SUBSIDIÁRIO. GARANTIA AO DIREITO DE RESSARCIMENTO DA COTA QUE CABE AOS DEMAIS ENTES DA FEDERAÇÃO, ANTE A CO-OBRIGAÇÃO NA EXECUÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE. IDENTIFICAÇÃO DO RESPONSÁVEL PELO FORNECIMENTO A PARTIR DE CRITÉRIOS CONSTITUCIONAIS DE DESCENTRALIZAÇÃO E HIERARQUIZAÇÃO DO SUS. QUAESTIO IURIS A SER DISCUTIDA NO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PROVIMENTO JUDICIAL MANTIDO. APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME CONHECIDOS, MAS DESPROVIDOS. (TJRN, AC 0002156-27.2008.8.20.0105, Relatora: Des. Maria Zeneide Bezerra, 2a Câmara Cível, julgado em 05.05.23, publicado em 12.05.23) Resta avaliar o pedido de fixação dos honorários por apreciação equitativa, e não sobre o valor da causa (conforme determinado na sentença) que, no caso concreto, é de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais). Com efeito, o Ente Público tem razão em seu pleito, eis que, na realidade dos autos, a demanda foi ajuizada para fins de internação do autor em unidade de terapia intensiva a fim de tratar sua saúde, bem jurídico tutelado de valor inestimável. A propósito, o próprio demandante alegou, na inicial, atribuir “à causa o valor de R$ 2000.000,00, pois esta causídica não sabe como valorar uma vida” (destaque à parte). Nesse cenário, é de se observar as teses firmadas pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 1076, no seguinte sentido: i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo. Em caso análogo, a Corte Superior decidiu: PROCESSUAL CIVIL. VAGA EM UTI. UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. ÓBITO DA PARTE AUTORA. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA AO ADVOGADO DA PARTE AUTORA. CRITÉRIO EQUITATIVO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA N. 7/STJ. ANÁLISE DA DIVERGÊNCIA PREJUDICADA. I - Na origem, trata-se de ação objetivando disponibilização de vaga em Unidade de Terapia Intensiva - UTI, pois apresentava quadro grave, com risco de vida, em razão de acidente de trânsito. II - O Tribunal de Justiça Estadual deu provimento à apelação, alterando a sentença que julgou o processo extinto sem resolução do mérito, em razão da perda superveniente do objeto da ação, dado o óbito do autor (fls. 40-41), somente para arbitrar honorários advocatícios. III - Esta Corte consolidou entendimento no sentido de que a incidência do juízo equitativo, para fins de fixação da verba sucumbencial, justifica-se tanto na hipótese do valor inestimável ou irrisório, como em casos excepcionais. (...) V - Aplica-se o entendimento desta Corte no sentido de que, na apreciação equitativa, o magistrado não está restrito aos limites percentuais estabelecidos no art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil/2015, e que a sua revisão implica incursão ao suporte fático-probatório carreado aos autos, o que é vedado pela Súmula n. 7/STJ. VI - Outrossim, quanto à alegada divergência jurisprudencial, verifica-se que a incidência do Óbice Sumular n. 7/STJ impede o exame do dissídio, na medida em que falta identidade entre os paradigmas apresentados. VII - Agravo interno não provido. (AgInt no REsp 1.891.214/MT, Relator: Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 22/3/2021, DJe de 26/3/2021) Idêntica posição foi adotada em precedente deste Tribunal de Justiça Potiguar: Ementa: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO POR EQUIDADE. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME. 1. Apelação interposta contra sentença que estabeleceu que o percentual de honorários advocatícios deveria incidir sobre o valor da causa, fixado em R$ 84.000,00. O pedido principal da ação é a imposição de obrigação de fazer, consistente em fornecer ou custear a internação da requerente em leito de UTI, bem como todo o tratamento médico necessário ao restabelecimento da saúde da paciente. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se os honorários advocatícios devem ser fixados com base no valor da causa ou por apreciação equitativa, conforme o disposto no art. 85, § 8º do Código de Processo Civil. III. Razões de decidir 3. O valor da causa foi fixado de forma exemplificativa, sendo o bem protegido de valor inestimável (direito à saúde). Portanto, aplica-se o § 8º do art. 85 do CPC, que permite a fixação dos honorários por apreciação equitativa. 4. Considerando os parâmetros estabelecidos pelo art. 85, § 2º do CPC, a elaboração da peça inicial, a quantidade de peças produzidas e a ausência de audiências no feito, os honorários advocatícios são fixados em R$ 2.000,00, respeitando o critério da equidade. IV. Dispositivo e tese 5. Recurso provido. Tese de julgamento: "Os honorários advocatícios devem ser fixados por apreciação equitativa, conforme o art. 85, § 8º do CPC, quando a pretensão inicial for de imposição de obrigação de fazer para garantia do direito à saúde, uma vez que este é valor de bem inestimável." Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 85. Jurisprudência relevante citada: TJRN – APELAÇÃO CÍVEL 0839500-40.2023.8.20.5001; APELAÇÃO CÍVEL 0801225-14.2023.8.20.5133; APELAÇÃO CÍVEL 0802567-78.2022.8.20.5106. (TJRN, AC 0801932-29.2024.8.20.5300, Relator: Juiz convocado Luiz Alberto Dantas Filho, 1a CCív, julgado em 09/05/2025, publicado em 12/05/2025) Desse modo, passo a fixação dos honorários por apreciação equitativa, considerando o disposto no art. 85, § 2º, incs. I, II, III e IV do CPC. Sobre a matéria, Pontes de Miranda leciona: "O que na decisão tem o Juiz de atender é àquilo que se passou na lide e foi por ele verificado: a falta de zelo do profissional, ou o pouco zelo que revelou, ou o alto zelo com que atuou; o ser difícil ou fácil o lugar em que atuou o advogado; a natureza e a importância da causa, o trabalho que tem o advogado e o tempo que gastou (não o tempo que durou a causa, mas sim, o tempo que foi exigido para o seu serviço)" (in Comentários ao Código de Processo Civil, 4ª ed., 1995, p. 396). Ora, no caso concreto, observa-se que o processo tramita virtualmente e a tese autoral trazida na peça inicial versa sobre matéria corriqueira no âmbito judicial e que dispensa a elaboração de tese jurídica complexa. Além disso, verifica-se que, afora a inicial e a petição de Id 29558729, noticiando o descumprimento da tutela, um dia após o seu deferimento, nenhuma outra peça foi protocolada pela causídica constituída pelo demandante que, intimado para apresentar réplica a contestação e contrarrazões ao recurso, ficou silente nas duas ocasiões conforme certidões de Id´s 29558744 e Id 29558756, respectivamente. E mais: o feito não contou com audiência (de conciliação e/ou instrução) e a ação ordinária, proposta em 26.07.24, foi sentenciada em 04.11.24 (menos de 4 meses), prazo bastante exíguo. Por todas essas particularidades, estabeleço os honorários sucumbenciais, por apreciação equitativa, em R$ 1.000,00 (mil reais). Pelos argumentos expostos, dou provimento parcial ao recurso somente alterar a base de cálculos honorários, nos moldes decididos anteriormente. Considerando o provimento parcial do apelo, incabível falar em aplicação de honorários na fase recursal. É como voto. Desembargadora Maria de Lourdes Azevedo Relatora Natal/RN, 23 de Junho de 2025.
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