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Processo nº 1007832-82.2025.8.26.0037

ID: 291548295

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Araraquara - 4ª Vara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1007832-82.2025.8.26.0037

Data de Disponibilização: 06/06/2025

Polo Ativo:

GORAZIL LOPES FILHO

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

VANESSA LADEIRA BORSATTO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

Processo 1007832-82.2025.8.26.0037 - Procedimento Comum Cível - Tratamento médico-hospitalar - Gorazil Lopes Filho - Vistos. Trata-se de ação de Procedimento Comum Cível - Tratamento médico-hospitala… Processo 1007832-82.2025.8.26.0037 - Procedimento Comum Cível - Tratamento médico-hospitalar - Gorazil Lopes Filho - Vistos. Trata-se de ação de Procedimento Comum Cível - Tratamento médico-hospitalar ajuizada por Gorazil Lopes Filho em face de Unimed Belo Horizonte Cooperativa de Trabalho Médico Ltda. alegando, em suma, que é portador de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), uma doença neurodegenerativa progressiva, incurável e com evolução rápida, caracterizada por perda da força muscular, mobilidade, função respiratória e capacidade de deglutição. Essa condição compromete drasticamente a autonomia e a qualidade de vida do paciente, podendo levá-lo à morte. Relata, ainda, que os primeiros sintomas surgiram em fevereiro de 2023, com uma queda e limitação de movimento no braço. A partir de abril, iniciou acompanhamento ortopédico e, com o aumento da frequência das quedas e o agravamento dos sintomas, foram realizados exames que confirmaram, em julho de 2023, o diagnóstico de ELA na forma conhecida como flail arm. Desde agosto de 2024, o paciente recebe fisioterapia especializada, evidenciando-se deterioração contínua por meio de escalas clínicas específicas. Atualmente, está no estágio 2 da escala de estadiamento do King's College, com severo comprometimento motor e necessidade de constante supervisão para locomoção. A condição clínica do autor exige tratamento contínuo e multidisciplinar para mitigar os sintomas e preservar funções essenciais, com o apoio de fisioterapia motora e respiratória, fonoaudiologia para monitoramento da disfagia, acompanhamento neurológico periódico, espirometria trimestral e ventilação não invasiva (BiPAP ou CPAP) quando indicado pela queda da Capacidade Vital Forçada (CVF). No caso específico, o uso de CPAP com umidificador já foi prescrito, e a equipe multiprofissional é considerada imprescindível para manter a condição clínica e evitar o agravamento. Contudo, apesar da gravidade do quadro, a requerida tem se negado, sistematicamente, o fornecimento do tratamento domiciliar (home care) e o suporte interdisciplinar necessário, limitando-se a custear parcialmente apenas algumas sessões de fisioterapia. O contrato firmado não prevê, nem exclui explicitamente, a cobertura para doenças neurodegenerativas como a ELA. Dada a rápida evolução da doença, o ambiente ambulatorial ou hospitalar é inadequado, colocando o paciente em risco. Requer a tutela de urgência a fim de que seja a requerida compelida a fornecer, de forma imediata, o tratamento domiciliar com equipe multiprofissional, sob pena de multa diária. É o relatório. DECIDO. A negativa de cobertura por parte da operadora de saúde, fundada unicamente na ausência de previsão contratual expressa (fl. 68), revela-se manifestamente abusiva, sobretudo diante da inequívoca prescrição médica para a adoção de tratamento em regime de home care, conforme se extrai do relatório médico de fl. 70. Nesse documento, o médico recomenda de forma categórica o atendimento domiciliar por equipe multidisciplinar, composta por fisioterapeuta motor e respiratório, fonoaudiólogo, nutricionista e psicólogo, evidenciando a complexidade da terapêutica indicada e a imprescindibilidade do acompanhamento contínuo em ambiente domiciliar. A recusa da ré desconsidera o estado de saúde debilitado da parte autora, cuja condição clínica, conforme relatado às fls. 47/48, evidencia progressiva perda das funções motoras, com diagnóstico de tetraparesia, exigindo assistência permanente inclusive para atividades básicas da vida diária. Tal situação inviabiliza o acompanhamento ambulatorial e torna inadequada a internação hospitalar prolongada, o que reforça a necessidade do tratamento indicado. Ressalte-se que a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça é firme ao estabelecer que, embora o plano de saúde possa delimitar as doenças cobertas, não lhe compete restringir a forma de tratamento prescrita pelo médico responsável, salvo em casos teratológicos, o que não se verifica na hipótese. A prescrição médica, portanto, deve prevalecer. Esse entendimento foi consolidado na Súmula 102 do STJ, que dispõe:"Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS." No mesmo sentido, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, de forma reiterada, pacificou a matéria por meio da Súmula 90, que estabelece: "Havendo expressa indicação médica para a utilização dos serviços de home care, revela-se abusiva a cláusula de exclusão inserida na avença, que não pode prevalecer." Importa destacar que não há risco de irreversibilidade na concessão da medida. Em caso de eventual improcedência da demanda, a ré poderá exigir o ressarcimento das despesas relacionadas ao tratamento. Aliás, em casos análogos, a E. Corte Bandeirante já se manifestou pela viabilidade da medida: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE. HOME CARE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. TUTELA DE URGÊNCIA. RECURSO PROVIDO. 1.- Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu a tutela de urgência para determinar à agravada a cobertura de internação domiciliar (home care) para o agravante, portador de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). 2.- A questão em discussão consiste em verificar se estão presentes os requisitos para a concessão da tutela de urgência. 3- A documentação médica apresentada demonstra a necessidade e urgência dos cuidados domiciliares prescritos, justificando a concessão da tutela de urgência. 4.- Inteligência da Súmula nº 90 desta Corte, que, ao menos nesta etapa processual, se sobrepõe às disposições administrativas da ANS, que não tem taxatividade absoluta. Recurso provido.(TJSP; Agravo de Instrumento 2036132-51.2025.8.26.0000; Relator (a):Alexandre Marcondes; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Foro de Valinhos -3ª Vara; Data do Julgamento: 28/05/2025; Data de Registro: 28/05/2025 PLANO DE SAÚDE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu liminar para que a requerida custeie atendimento domiciliar ao autor, portador de esclerose lateral amiotrófica, incluindo profissionais de saúde e equipamentos específicos, conforme prescrição médica. II. Questão em discussão A questão em discussão consiste na presença dos pressupostos do art. 300 do CPC para concessão da liminar. III. Razões de decidir A inexistência de previsão específica do atendimento no rol da ANS não obsta, por si só, a cobertura do tratamento. A jurisprudência do TJSP reconhece a obrigação de cobertura de atendimento domiciliar, nos termos da Súmula 90. Na obrigação de prestar home care se incluem equipamentos e insumos, conforme jurisprudência do STJ. IV. Dispositivo Recurso desprovido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2104563-40.2025.8.26.0000; Relator (a):Enéas Costa Garcia; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional IV - Lapa -3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/05/2025; Data de Registro: 28/05/2025) Assim por qualquer ângulo que se examine o caso concreto, deve-se conceder a tutela de urgência. Diga-se, ainda, que que "a cobertura deverá se estender a todos os medicamentos e materiais utilizados no tratamento domiciliar do apelante, que lhe seriam ministrados caso permanecesse internado em hospital credenciado da apelante - Sentença mantida - Recurso improvido (Apelação n. 0151889-75.2012.8.26.0100, 1ª Câmara de Direito Privado, rel. Paulo Eduardo Razuk, julgada em 5/3/2013). Diante do exposto, CONCEDO a tutela provisória, consistente no custeio dos tratamentos/medicamentos indicados pelo Autor, na modalidade de tratamento domiciliar (home care), com equipe multiprofissional especializada, incluindo, no mínimo, fisioterapia motora e respiratória, fonoaudiologia, nutricionista e psicólogo, bem como o fornecimento dos equipamentos e insumos necessários, especialmente o aparelho CPAP como umidificador, TUDCA 500 mg, VENLIFT OD 37,5 mg, PREGABALINA 75 mg, BADOFENO 10mg e RILUZOL 50mg, sob pena de multa diária que fixo em R$1.000,00, limitada a R$500.000,00. Concedo 20 dias para o implemento da decisão judicial, quando então passará a correr a multa diária. Por celeridade, servirá a presente como OFÍCIO, cumprindo o autor o devido encaminhamento e devida comprovação de protocolo nos autos. Diante das especificidades da causa, adequando o procedimento às necessidades do conflito, deixo paramomento oportuno a análise da conveniência da audiência de conciliação (CPC, art. 139, VI e Enunciado n. 35 da ENFAM). Tendo em vista que a empresa requerida será citada via portal eletrônico, conforme lista divulgada pelo E. TJSP, https://www.tjsp.jus.br/Download/SPI/Downloads/Lista_CNPJS_IntimacaoEletronica.Pdf, promova a parte autora, no prazo de 15 (quinze) dias, o recolhimento das custas iniciais devidas, quais sejam, despesas de diligência (R$32,75 - guia FEDTJ - código 121-0). Cumprido o item supra, cite-se a parte ré, via portal, para contestação no prazo de 15 dias úteis. A ausência de contestação implicará revelia e presunção de veracidade da matéria fática apresentada na petiçãoinicial. A presente citação é acompanhada de senha para acesso ao processo digital, que contém a íntegra da petiçãoinicial e dos documentos. Após, aguarde-se a devolução do AR por trinta dias. Desde já, defiro a realização de todas as pesquisas eletrônicas, bem com a expedição de alvarás para localização da parte passiva, mediante o pagamento das custas, se o caso. Defiro, desde já, a apresentação de áudio e vídeo por meio de link (salvamento em nuvem). Apresentado, providencie a Serventia o download do arquivo e a juntada aos autos, lançando-se anotação a respeito. Observo que a correta classificação do documento quando do peticionamento eletrônico confere maior agilidade na sua identificação no fluxo de trabalho, cabendo ao advogado cadastrar a petição com o tipo apropriado. Intime-se. - ADV: VANESSA LADEIRA BORSATTO (OAB 229713/SP)

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Processo nº 0800292-90.2022.8.18.0102

ID: 281093259

Tribunal: TJPI Órgão: Vara Única da Comarca de Marcos Parente Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0800292-90.2022.8.18.0102

Data de Disponibilização: 27/05/2025

Polo Ativo:

BENJANUTO PEREIRA BATISTA

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

DANILO BAIAO DE AZEVEDO RIBEIRO

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ Vara Única da Comarca de Marcos Parente DA COMARCA DE MARCOS PARENTE Praça Dirno Pires Ferreira, s/n, Centro, MARCOS PARENTE - PI - CEP: 64845-000 PROCESSO Nº: 080… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ Vara Única da Comarca de Marcos Parente DA COMARCA DE MARCOS PARENTE Praça Dirno Pires Ferreira, s/n, Centro, MARCOS PARENTE - PI - CEP: 64845-000 PROCESSO Nº: 0800292-90.2022.8.18.0102 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO(S): [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Indenização por Dano Material, Práticas Abusivas] AUTOR: BENJANUTO PEREIRA BATISTA REU: BANCO OLE BONSUCESSO CONSIGNADO S.A. SENTENÇA 1. RELATÓRIO Trata-se de ação cognitiva movida por BENJANUTO PEREIRA BATISTA em face de BANCO OLE BONSUCESSO CONSIGNADO, na qual o autor requer a declaração de inexistência de negócio jurídico que alega não ter contratado, repetição de indébito e indenização por danos morais. Concedida a gratuidade judiciária à parte autora (ID 25356566). Citado, o réu apresentou contestação com o suposto contrato avençado entre as partes e o extrato simples (ID 27039283). Em réplica, a parte autora alegou que não foi anexado comprovante de transferência bancária em que demonstre a reversibilidade do valor em seu favor (ID 30030440). Intimados para se manifestarem sobre as provas a produzir, a parte ré requereu a expedição de ofício ao banco BCM S.A. para esclarecimentos sobre portabilidade (ID 31242701) e o autor informou não ter provas a produzir (ID 31310030). Saneado e organizado o feito, o ônus foi distribuído para determinar ao banco réu apresentar o comprovante de depósito da quantia contratada e ao autor acostar os extratos com a movimentação da conta bancária de sua titularidade, correspondentes aos dois meses que antecederam o início dos descontos em seu benefício e ao mês do desconto da primeira parcela (ID 38298915). A parte ré esclareceu que o contrato se trata de portabilidade e, por isso, não há comprovante de transferência bancária (ID 39647771). O autor interpôs agravo de instrumento da decisão saneadora (ID 40293750), que foi conhecido e provido para inverter o ônus probatório e dispensar a juntada de extratos bancários, impondo-se ao juízo de piso a observância das orientações consagradas nos enunciados nº 18 e 26 da súmula do TJPI (art. 927, V, do CPC) (ID 63607125). É o relatório, de modo sucinto. 2. FUNDAMENTAÇÃO Não havendo questões preliminares, passa-se à análise do mérito (art. 355, I, do CPC). O objeto do presente feito visa aferir a regularidade da contratação operada entre as partes e consequente reparação por danos morais, caso esta venha a ser declarada irregular. A tese autoral está lastreada em eventual ausência de instrumento de pactuação da avença, bem como de documento que comprove o mútuo atacado. O réu, por outro lado, alegou que o contrato foi portado para o banco BCM S.A. e, por isso, não há comprovante de transferência bancária. Ocorre que o contrato de nº 121637119 foi incluído em 16/02/2017 e excluído em 22/02/2017, com previsão de início para o mês de março de 2017. Percebe-se que o objeto da presente demanda é, na realidade, um caso de contrato excluído antes do primeiro desconto. Consoante a Instrução Normativa INSS no 28/2008, tem-se que previamente à efetivação da contratação, promove a instituição financeira consulta à margem consignável do beneficiário, com o fito de certificar a existência dessa, bem como de disponibilidade para averbação de nova contratação. Por tal razão, embora o instrumento apareça averbado no extrato de empréstimos, por não ter sido efetivado, não operou qualquer desconto no benefício recebido pelo autor. Assim, não havendo qualquer prova da existência de ato ilícito, merece rejeição o pleito autoral. Na espécie, entende o E. TJPI que o cancelamento do contrato antes do desconto da primeira parcela, sem que a avença crie qualquer direito ou obrigação entre as partes, obsta a pretensão de ressarcimento como a postulada nos presentes autos, veja-se: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE/ C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. ANALFABETO/ANALFABETO FUNCIONAL. PROCURAÇÃO PÚBLICA. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE DESCONTOS. CONTRATO CANCELADO E EXCLUÍDO ANTES DO DESCONTO DA PRIMEIRA PARCELA. AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. a pessoa analfabeta é plenamente capaz para os atos da vida civil e pode exarar sua manifestação de vontade por quaisquer meios admitidos em direito, não sendo necessária a utilização de procuração pública ou escritura pública para a contratação de empréstimo consignado, de sorte que, eventual vício existente na contratação do empréstimo deve ser discutido à luz das hipóteses legais que autorizam a anulação por defeito do negócio jurídico. 2. Demonstrada a inexistência de descontos do benefício previdenciário da parte autora, referente a empréstimo consignado, não há falar em danos morais ou materiais diante da ausência de ato ilícito praticado pelo banco requerido. 3. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.” (TJ-PI - AC: 08004743420188180032, Relator: Manoel de Sousa Dourado, Data de Julgamento: 08/07/2022, 2ª CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL). Grifo nosso. Cumpre destacar que o referido entendimento é seguido por outros tribunais pátrios, como se vê: “PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO BANCÁRIO CONSIGNADO. CONTRATO CANCELADO E EXCLUÍDO ANTES DO DESCONTO DA PRIMEIRA PARCELA. INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO PASSÍVEL DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. MERO ABORRECIMENTO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. I- Trata-se de recurso de apelação cível interposto por MARIA DO CARMO INÁCIO DA SILVA em face da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Canindé que julgou improcedente Ação Declaratória de Inexistência de Relação Contratual c/c Indenização por Danos Morais, ajuizada pela apelante em desfavor do Banco Pan S/A. II- O cerne da controvérsia recursal posta em lide reside, unicamente, na existência/validade, ou não, da formalização, entre as partes litigantes, do contrato de empréstimo consignado de nº 340564860-5. III- O Código de Defesa do Consumidor - CDC, em seu art. 14, caput, estabelece a responsabilidade civil objetiva dos fornecedores de serviço pelos danos causados aos consumidores, por defeitos relativos à prestação dos serviços. IV- Analisando-se os autos, conforme documento acostado às fls.16 verifica-se que os descontos referentes ao contrato contestado, teriam início apenas em fevereiro de 2021, Contudo, o contrato foi excluído na data de 30 de outubro de 2020, ou seja, cerca de 4 meses antes do primeiro desconto. V- Desta feita, não há comprovação que a parcela foi efetivamente descontada, prova que incumbia à parte autora demonstrar, não restando, portanto, comprovado, o fato constitutivo de seu direito. Com base no art. 373, I do Código de Processo Civil, caberia à apelante o ônus da comprovação da existência do débito, fato que não ocorreu satisfatoriamente, não se desincumbindo a autora do ônus que lhe cabia. VI- De acordo com a documentação colacionada aos autos, conclui-se que o contrato, foi cancelado pela instituição financeira apelada antes que houvesse qualquer desconto, não havendo que se falar em restituição de valores, bem como não se vislumbra a caracterização de danos morais. Os fatos relatados no presente caso, embora desagradáveis, não excederam o limite do mero aborrecimento, incapazes de gerar maiores repercussões na esfera extrapatrimonial, não sendo cabível qualquer indenização por dano moral. VII- Majoro o percentual dos honorários advocatícios arbitrado em desfavor do autor apelante vencido para 15%(quinze por cento), incidente sobre o valor atualizado da causa, sem prejuízo da manutenção de suspensão da sua exigibilidade, por se tratar de beneficiário da justiça gratuita, o que faço com arrimo nos arts. 85, § 11, c/c o art. 98, § 3º, ambos do CPCB. VIII- Recurso de Apelação Cível conhecido e improvido. Sentença judicial mantida.” (TJ-CE - AC: 00502327120218060055 Canindé, Relator: IRANDES BASTOS SALES PORT. Nº 1748/2022, Data de Julgamento: 21/09/2022, 2ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 21/09/2022). “APELAÇÃO. Ação declaratória e indenizatória por danos morais proposta em razão de fraude na celebração de contrato de empréstimo consignado. Aduz a autora que houve a averbação de um contrato de empréstimo consignado junto ao seu benefício previdenciário, por iniciativa do banco réu, mas que não foi por ela contratado. Demandado afirma que a contratação não chegou a ser efetivada, e que por isso, antes mesmo do início dos descontos e da propositura da demanda, o contrato foi cancelado, não ocasionando nenhum dano, seja material ou moral, à requerente. Sentença que reconheceu a ausência de interesse de agir da demandante com relação ao pedido declaratório e julgou improcedente o pleito indenizatório. Apelo da autora requerendo a reforma da r. decisão. Sem razão. Banco réu que inclui um contrato de empréstimo consignado supostamente firmado pela autora no sistema do INSS, mas que, antes mesmo da propositura da demanda, determinou a exclusão. Não houve a ocorrência de descontos indevidos no benefício previdenciário da requerente. Falta de interesse de agir com relação ao pedido declaratório configurada. Situação que não acarretou danos materiais. O fato também não poderia acarretar prejuízo moral à demandante, pois sequer suportou descontos indevidos em seu benefício previdenciário ou qualquer cobrança vexatória ou humilhante, razão pela qual não se reconhece dano moral indenizável na presente situação. Sentença mantida na íntegra. Honorários recursais fixados. Apelo desprovido.” (TJ-SP - AC: 10078322020208260664 SP 1007832-20.2020.8.26.0664, Relator: Roberto Maia, Data de Julgamento: 08/03/2022, 20ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/03/2022). “RECURSO DE APELAÇÃO – DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS – CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO – CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - PRELIMINAR DE INOVAÇÃO RECURSAL ACOLHIDA - NÃO CONHECIMENTO - INEXISTÊNCIA DE DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO – CONTRATO EXCLUÍDO ANTES DO BANCO REALIZAR O PRIMEIRO DESCONTO – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO.” (TJ-MS - AC: 08135510320208120002 MS 0813551-03.2020.8.12.0002, Relator: Des. Vilson Bertelli, Data de Julgamento: 28/07/2021, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: 30/07/2021). Grifos nossos. Portanto, seguindo os entendimentos esposados, os quais são perfeitamente aplicáveis ao caso em tela, não há falar em acolhimento da tese autoral unicamente pela ausência de instrumento contratual ou documento que comprove a transação. Logo, o feito merece a improcedência. 3. DISPOSITIVO Ante o acima exposto, julgo improcedentes os pedidos formulados na inicial, declarando, assim, resolvida a lide (art. 487, I, do CPC). Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 2º, do CPC). Todavia, concedida a gratuidade judiciária à autora, a cobrança fica sujeita à observância do art. 98, § 3º, do CPC. Ressalte-se que a gratuidade judiciária não exime o pagamento de multas processuais, na forma do art. 98, § 4º, do CPC. Havendo interposição de apelação, adotem-se as providências contidas nos arts. 1.009 e 1.010 do CPC. Interpostos embargos de declaração com pretensão modificativa, intime-se a parte embargada para, querendo, oferecer contrarrazões. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. MARCOS PARENTE-PI, data conforme sistema. SARA ALMEIDA CEDRAZ Juiz(a) de Direito da Vara Única da Comarca de Marcos Parente

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Processo nº 0800292-90.2022.8.18.0102

ID: 281093263

Tribunal: TJPI Órgão: Vara Única da Comarca de Marcos Parente Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0800292-90.2022.8.18.0102

Data de Disponibilização: 27/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BANCO OLE BONSUCESSO CONSIGNADO S.A.

Sentença

Advogados:

EUGENIO COSTA FERREIRA DE MELO

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ Vara Única da Comarca de Marcos Parente DA COMARCA DE MARCOS PARENTE Praça Dirno Pires Ferreira, s/n, Centro, MARCOS PARENTE - PI - CEP: 64845-000 PROCESSO Nº: 080… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ Vara Única da Comarca de Marcos Parente DA COMARCA DE MARCOS PARENTE Praça Dirno Pires Ferreira, s/n, Centro, MARCOS PARENTE - PI - CEP: 64845-000 PROCESSO Nº: 0800292-90.2022.8.18.0102 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO(S): [Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Indenização por Dano Material, Práticas Abusivas] AUTOR: BENJANUTO PEREIRA BATISTA REU: BANCO OLE BONSUCESSO CONSIGNADO S.A. SENTENÇA 1. RELATÓRIO Trata-se de ação cognitiva movida por BENJANUTO PEREIRA BATISTA em face de BANCO OLE BONSUCESSO CONSIGNADO, na qual o autor requer a declaração de inexistência de negócio jurídico que alega não ter contratado, repetição de indébito e indenização por danos morais. Concedida a gratuidade judiciária à parte autora (ID 25356566). Citado, o réu apresentou contestação com o suposto contrato avençado entre as partes e o extrato simples (ID 27039283). Em réplica, a parte autora alegou que não foi anexado comprovante de transferência bancária em que demonstre a reversibilidade do valor em seu favor (ID 30030440). Intimados para se manifestarem sobre as provas a produzir, a parte ré requereu a expedição de ofício ao banco BCM S.A. para esclarecimentos sobre portabilidade (ID 31242701) e o autor informou não ter provas a produzir (ID 31310030). Saneado e organizado o feito, o ônus foi distribuído para determinar ao banco réu apresentar o comprovante de depósito da quantia contratada e ao autor acostar os extratos com a movimentação da conta bancária de sua titularidade, correspondentes aos dois meses que antecederam o início dos descontos em seu benefício e ao mês do desconto da primeira parcela (ID 38298915). A parte ré esclareceu que o contrato se trata de portabilidade e, por isso, não há comprovante de transferência bancária (ID 39647771). O autor interpôs agravo de instrumento da decisão saneadora (ID 40293750), que foi conhecido e provido para inverter o ônus probatório e dispensar a juntada de extratos bancários, impondo-se ao juízo de piso a observância das orientações consagradas nos enunciados nº 18 e 26 da súmula do TJPI (art. 927, V, do CPC) (ID 63607125). É o relatório, de modo sucinto. 2. FUNDAMENTAÇÃO Não havendo questões preliminares, passa-se à análise do mérito (art. 355, I, do CPC). O objeto do presente feito visa aferir a regularidade da contratação operada entre as partes e consequente reparação por danos morais, caso esta venha a ser declarada irregular. A tese autoral está lastreada em eventual ausência de instrumento de pactuação da avença, bem como de documento que comprove o mútuo atacado. O réu, por outro lado, alegou que o contrato foi portado para o banco BCM S.A. e, por isso, não há comprovante de transferência bancária. Ocorre que o contrato de nº 121637119 foi incluído em 16/02/2017 e excluído em 22/02/2017, com previsão de início para o mês de março de 2017. Percebe-se que o objeto da presente demanda é, na realidade, um caso de contrato excluído antes do primeiro desconto. Consoante a Instrução Normativa INSS no 28/2008, tem-se que previamente à efetivação da contratação, promove a instituição financeira consulta à margem consignável do beneficiário, com o fito de certificar a existência dessa, bem como de disponibilidade para averbação de nova contratação. Por tal razão, embora o instrumento apareça averbado no extrato de empréstimos, por não ter sido efetivado, não operou qualquer desconto no benefício recebido pelo autor. Assim, não havendo qualquer prova da existência de ato ilícito, merece rejeição o pleito autoral. Na espécie, entende o E. TJPI que o cancelamento do contrato antes do desconto da primeira parcela, sem que a avença crie qualquer direito ou obrigação entre as partes, obsta a pretensão de ressarcimento como a postulada nos presentes autos, veja-se: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE/ C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. ANALFABETO/ANALFABETO FUNCIONAL. PROCURAÇÃO PÚBLICA. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE DESCONTOS. CONTRATO CANCELADO E EXCLUÍDO ANTES DO DESCONTO DA PRIMEIRA PARCELA. AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. a pessoa analfabeta é plenamente capaz para os atos da vida civil e pode exarar sua manifestação de vontade por quaisquer meios admitidos em direito, não sendo necessária a utilização de procuração pública ou escritura pública para a contratação de empréstimo consignado, de sorte que, eventual vício existente na contratação do empréstimo deve ser discutido à luz das hipóteses legais que autorizam a anulação por defeito do negócio jurídico. 2. Demonstrada a inexistência de descontos do benefício previdenciário da parte autora, referente a empréstimo consignado, não há falar em danos morais ou materiais diante da ausência de ato ilícito praticado pelo banco requerido. 3. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.” (TJ-PI - AC: 08004743420188180032, Relator: Manoel de Sousa Dourado, Data de Julgamento: 08/07/2022, 2ª CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL). Grifo nosso. Cumpre destacar que o referido entendimento é seguido por outros tribunais pátrios, como se vê: “PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO BANCÁRIO CONSIGNADO. CONTRATO CANCELADO E EXCLUÍDO ANTES DO DESCONTO DA PRIMEIRA PARCELA. INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO PASSÍVEL DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. MERO ABORRECIMENTO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. I- Trata-se de recurso de apelação cível interposto por MARIA DO CARMO INÁCIO DA SILVA em face da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Canindé que julgou improcedente Ação Declaratória de Inexistência de Relação Contratual c/c Indenização por Danos Morais, ajuizada pela apelante em desfavor do Banco Pan S/A. II- O cerne da controvérsia recursal posta em lide reside, unicamente, na existência/validade, ou não, da formalização, entre as partes litigantes, do contrato de empréstimo consignado de nº 340564860-5. III- O Código de Defesa do Consumidor - CDC, em seu art. 14, caput, estabelece a responsabilidade civil objetiva dos fornecedores de serviço pelos danos causados aos consumidores, por defeitos relativos à prestação dos serviços. IV- Analisando-se os autos, conforme documento acostado às fls.16 verifica-se que os descontos referentes ao contrato contestado, teriam início apenas em fevereiro de 2021, Contudo, o contrato foi excluído na data de 30 de outubro de 2020, ou seja, cerca de 4 meses antes do primeiro desconto. V- Desta feita, não há comprovação que a parcela foi efetivamente descontada, prova que incumbia à parte autora demonstrar, não restando, portanto, comprovado, o fato constitutivo de seu direito. Com base no art. 373, I do Código de Processo Civil, caberia à apelante o ônus da comprovação da existência do débito, fato que não ocorreu satisfatoriamente, não se desincumbindo a autora do ônus que lhe cabia. VI- De acordo com a documentação colacionada aos autos, conclui-se que o contrato, foi cancelado pela instituição financeira apelada antes que houvesse qualquer desconto, não havendo que se falar em restituição de valores, bem como não se vislumbra a caracterização de danos morais. Os fatos relatados no presente caso, embora desagradáveis, não excederam o limite do mero aborrecimento, incapazes de gerar maiores repercussões na esfera extrapatrimonial, não sendo cabível qualquer indenização por dano moral. VII- Majoro o percentual dos honorários advocatícios arbitrado em desfavor do autor apelante vencido para 15%(quinze por cento), incidente sobre o valor atualizado da causa, sem prejuízo da manutenção de suspensão da sua exigibilidade, por se tratar de beneficiário da justiça gratuita, o que faço com arrimo nos arts. 85, § 11, c/c o art. 98, § 3º, ambos do CPCB. VIII- Recurso de Apelação Cível conhecido e improvido. Sentença judicial mantida.” (TJ-CE - AC: 00502327120218060055 Canindé, Relator: IRANDES BASTOS SALES PORT. Nº 1748/2022, Data de Julgamento: 21/09/2022, 2ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 21/09/2022). “APELAÇÃO. Ação declaratória e indenizatória por danos morais proposta em razão de fraude na celebração de contrato de empréstimo consignado. Aduz a autora que houve a averbação de um contrato de empréstimo consignado junto ao seu benefício previdenciário, por iniciativa do banco réu, mas que não foi por ela contratado. Demandado afirma que a contratação não chegou a ser efetivada, e que por isso, antes mesmo do início dos descontos e da propositura da demanda, o contrato foi cancelado, não ocasionando nenhum dano, seja material ou moral, à requerente. Sentença que reconheceu a ausência de interesse de agir da demandante com relação ao pedido declaratório e julgou improcedente o pleito indenizatório. Apelo da autora requerendo a reforma da r. decisão. Sem razão. Banco réu que inclui um contrato de empréstimo consignado supostamente firmado pela autora no sistema do INSS, mas que, antes mesmo da propositura da demanda, determinou a exclusão. Não houve a ocorrência de descontos indevidos no benefício previdenciário da requerente. Falta de interesse de agir com relação ao pedido declaratório configurada. Situação que não acarretou danos materiais. O fato também não poderia acarretar prejuízo moral à demandante, pois sequer suportou descontos indevidos em seu benefício previdenciário ou qualquer cobrança vexatória ou humilhante, razão pela qual não se reconhece dano moral indenizável na presente situação. Sentença mantida na íntegra. Honorários recursais fixados. Apelo desprovido.” (TJ-SP - AC: 10078322020208260664 SP 1007832-20.2020.8.26.0664, Relator: Roberto Maia, Data de Julgamento: 08/03/2022, 20ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/03/2022). “RECURSO DE APELAÇÃO – DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS – CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO – CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - PRELIMINAR DE INOVAÇÃO RECURSAL ACOLHIDA - NÃO CONHECIMENTO - INEXISTÊNCIA DE DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO – CONTRATO EXCLUÍDO ANTES DO BANCO REALIZAR O PRIMEIRO DESCONTO – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO.” (TJ-MS - AC: 08135510320208120002 MS 0813551-03.2020.8.12.0002, Relator: Des. Vilson Bertelli, Data de Julgamento: 28/07/2021, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: 30/07/2021). Grifos nossos. Portanto, seguindo os entendimentos esposados, os quais são perfeitamente aplicáveis ao caso em tela, não há falar em acolhimento da tese autoral unicamente pela ausência de instrumento contratual ou documento que comprove a transação. Logo, o feito merece a improcedência. 3. DISPOSITIVO Ante o acima exposto, julgo improcedentes os pedidos formulados na inicial, declarando, assim, resolvida a lide (art. 487, I, do CPC). Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 2º, do CPC). Todavia, concedida a gratuidade judiciária à autora, a cobrança fica sujeita à observância do art. 98, § 3º, do CPC. Ressalte-se que a gratuidade judiciária não exime o pagamento de multas processuais, na forma do art. 98, § 4º, do CPC. Havendo interposição de apelação, adotem-se as providências contidas nos arts. 1.009 e 1.010 do CPC. Interpostos embargos de declaração com pretensão modificativa, intime-se a parte embargada para, querendo, oferecer contrarrazões. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. MARCOS PARENTE-PI, data conforme sistema. SARA ALMEIDA CEDRAZ Juiz(a) de Direito da Vara Única da Comarca de Marcos Parente

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Processo nº 1007832-16.2025.8.11.0000

ID: 301030739

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1007832-16.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CIRLENE DE SOUZA BARREIRA

Decisão

Advogados:

KEVIN MICHEL SOUZA TONDORF

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KRISTHIAN BRUNO SOUZA TONDORF

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Gabinete 2 - Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Gabinete 2 - Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo AGRAVO DE INSTRUMENTO (2… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Gabinete 2 - Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Gabinete 2 - Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) 1007832-16.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS AGRAVADO: CIRLENE DE SOUZA BARREIRA DECISÃO MONOCRÁTICA Vistos, etc. Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, contra a decisão, proferida nos autos do cumprimento de sentença de origem, que rejeitou a exceção de pré-executividade apresentada pela autarquia, sob o fundamento de que a alegação de excesso de execução não constitui matéria de ordem pública e, portanto, não pode ser suscitada por meio do referido instrumento, mormente diante da ocorrência de preclusão consumativa. O agravante defende, em síntese, que a alegação de excesso de execução diz respeito a matéria de ordem pública, sendo passível de conhecimento a qualquer tempo e grau de jurisdição. Aduz, ainda, que o cálculo apresentado pelo exequente contém erros na apuração da renda mensal inicial do benefício, na incidência de juros de mora e correção monetária, além de defender a necessidade de compensação de valores recebidos indevidamente a título de seguro-desemprego. Requer o provimento do recurso, “para anular/reformar decisão do juízo a quo, determinando o conhecimento da exceção de pre-executividade, por ser matéria de ordem pública, cujo o magistrado pode conhecer de ofício, nos termos da fundamentação, ou, prover o presente recurso, para homologar a conta apresentada pelo executado, uma vez que todos os parâmetros estão corretos e de acordo com a legislação”. A parte agravada, embora intimada, não apresentou contrarrazões. A douta Procuradoria-Geral de Justiça deixou de opinar acerca do mérito, por entender inexistir interesse público, ou social relevante, que justificasse a sua intervenção. É o relatório. Decido. A controvérsia recursal consiste em definir se é possível, mesmo após o prazo legal e sem ter apresentado impugnação aos cálculos, suscitar exceção de pré-executividade para alegar excesso de execução em cumprimento de sentença previdenciária. A insurgência não merece prosperar. Com efeito, a impugnação ao cumprimento de sentença é o instrumento processual próprio para a veiculação de matérias como excesso de execução, nos termos do art. 535 do Código de Processo Civil, in verbis: Art. 535. A Fazenda Pública será intimada na pessoa de seu representante judicial, por carga, remessa ou meio eletrônico, para, querendo, no prazo de 30 (trinta) dias e nos próprios autos, impugnar a execução, podendo arguir: I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia; II - ilegitimidade de parte; III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; IV - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções; V - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução; VI - qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes ao trânsito em julgado da sentença. O argumento da parte agravante, no sentido de que o excesso de execução constitui matéria de ordem pública e, por isso, poderia ser conhecido por meio de exceção de pré-executividade a qualquer tempo, não se sustenta. De fato, necessário reafirmar que a exceção de pré-executividade, criação pretoriana de uso excepcionalíssimo, não pode ser manejada como sucedâneo recursal ou substitutivo de impugnação ao cumprimento de sentença, sob pena de manifesta subversão das garantias processuais e da ordem procedimental estabelecida no Código de Processo Civil. Por construção doutrinária e jurisprudencial consolidada, admite-se o manejo da exceção de pré-executividade apenas nas hipóteses em que se discuta matéria cognoscível de ofício pelo juiz, relacionada a nulidade manifesta do título executivo ou à própria inexigibilidade da obrigação, e desde que não demande dilação probatória. Todavia, o excesso de execução, por sua própria natureza, exige análise comparativa entre os cálculos apresentados e os parâmetros do título judicial, o que pressupõe atividade técnica e, eventualmente, perícia contábil, afastando-se, portanto, da lógica de cognição sumária e de plano que justifica o cabimento da exceção. Não bastasse, o Superior Tribunal de Justiça reconhece que o excesso de execução não se equipara a nulidade manifesta, de modo que não constitui matéria de ordem pública a ensejar apreciação por exceção de pré-executividade, devendo ser arguido mediante impugnação ao cumprimento de sentença, sob pena de preclusão. Confira-se: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA EXECUÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. ANISTIA POLÍTICA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO RETROATIVA. DECURSO DO PRAZO A QUE ALUDE O ART. 535 DO CPC SEM OPOSIÇÃO DE IMPUGNAÇÃO À EXECUÇÃO. POSTERIOR MANEJO DA EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE COM ALEGAÇÃO DE EXCESSO. DESCABIMENTO DO INCIDENTE PROCESSUAL POR NÃO SE TRATAR DE MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. PRECLUSÃO TEMPORAL. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Decorrido o prazo a que alude o art. 535 do CPC, sem que a UNIÃO tenha impugnado a execução de valores retroativos previstos na portaria de anistia, mostra-se descabido o posterior manejo de exceção de pré-executividade. A alegação de excesso de execução, veiculada nesse incidente processual, não constitui matéria de ordem pública passível de ser conhecida de ofício pelo juiz. Ocorrente, portanto, a preclusão temporal. 2. Agravo interno improvido. (STJ - AgInt na ExeMS n. 17.600/DF, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Seção, julgado em 14/9/2022, DJe de 10/10/2022). A orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça revela-se absolutamente precisa e aplicável ao caso concreto, já que a pretensão do INSS, travestida de arguição de matéria de ordem pública, não ultrapassa os limites de uma clara insurgência contra os parâmetros adotados nos cálculos de liquidação, matéria que, sabidamente, deve ser veiculada por meio de impugnação ao cumprimento de sentença, conforme expressamente previsto no art. 535, inciso IV, do CPC. No mesmo sentido, aliás, é o entendimento desta Corte Estadual, como cito: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CÁLCULOS APRESENTADOS. TRANSCURSO DO PRAZO SEM MANIFESTAÇÃO. HOMOLOGAÇÃO. IRRESIGNAÇÃO DO EXECUTADO. MANEJO DE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO. RECURSO NÃO PROVIDO. I. Caso em exame: 1. Agravo de instrumento interposto contra a decisão que rejeitou a exceção de pré-executividade apresentada pela autarquia federal, mantendo a homologação dos cálculos do exequente. II. Questão em discussão: 2. A questão em discussão consiste em verificar se a alegação de excesso de execução pode ser analisada por meio de exceção de pré-executividade, considerando que essa matéria deveria ter sido arguida em sede de impugnação ao cumprimento de sentença. Além disso, deve-se avaliar se o não uso oportuno desse meio processual resultou na preclusão, tornando a exceção de pré-executividade inadequada para rediscutir questões já decididas. III. Razões de decidir: 3. A preclusão, conforme estabelecido no art. 507 do Código de Processo Civil, impede a rediscussão de questões já decididas, quando não arguida no momento processual adequado. No presente caso, a alegação de excesso de execução deveria ter sido apresentada por meio de impugnação ao cumprimento de sentença, conforme previsto no art. 535, IV, do CPC. A utilização da exceção de pré-executividade como substituto processual é inadequada, especialmente após o trânsito em julgado da decisão que homologou os cálculos, o que torna a matéria definitivamente preclusa. IV. Dispositivo e tese: 4. Recurso não provido. Tese de julgamento: 1. A preclusão, nos termos do art. 507 do CPC, impede a rediscussão de matérias que não foram arguidas no momento processual oportuno. 2. É vedado conhecer de exceção de pré-executividade para discutir excesso de execução ou qualquer outra matéria preclusa, que deveria ser arguida em impugnação ao cumprimento de sentença. ________________________________ Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 507, 535, IV. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1424168/RJ, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, j. 13.06.2017; TJMT, N.U 1002535-96.2023.8.11.0000, Rel. Desa. Maria Aparecida Ribeiro, j. 21.08.2023; TJMT, N.U 1011924-42.2022.8.11.0000, Rel. Desa. Maria Erotides Kneip, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, j. 19.09.2022, publicado no DJE 27.09.2022. (TJMT – Agravo de Instrumento nº 1001877-04.2025.8.11.0000, relator Desembargador Rodrigo Roberto Curvo, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 26/03/2025, Publicado no DJE 31/03/2025). Logo, a tentativa do agravante de instrumentalizar a exceção de pré-executividade para rediscutir cálculo já estabilizado processualmente encontra vedação legal expressa, além de ofender frontalmente os princípios da segurança jurídica, da estabilização das fases processuais e do devido processo legal. Ademais, é inegável que o juízo a quo atuou em plena e rigorosa observância ao devido processo legal, conferindo ao INSS prazo regular e legal para impugnar os cálculos apresentados pela parte exequente. Conforme claramente delineado na decisão recorrida, e como se observa do andamento do Processo Judicial da Primeira Instância, a autarquia foi devidamente intimada, na forma da lei, para se manifestar acerca dos cálculos de liquidação, da memória de cálculo e, inclusive, sobre a expedição de requisição de pagamento (RPV), oportunidade em que poderia ter, tempestivamente, deduzido suas razões de inconformismo mediante impugnação formal, na via própria. Contudo, permaneceu absolutamente inerte, deixando transcorrer in albis o prazo processual que lhe era assegurado. A sua inércia gerou, de forma inequívoca, a preclusão sobre a matéria, nos termos do artigo 507 do CPC, ao estabelecer que “é vedado à parte discutir no curso do processo questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão”. Portanto, não se está diante de hipótese de nulidade processual, de ofensa ao contraditório ou à ampla defesa. Ao revés, é precisamente o respeito às garantias do devido processo legal — com a preclusão como fenômeno indispensável à estabilização dos atos processuais — que justifica a rejeição da exceção de pré-executividade e, por conseguinte, o não provimento do presente agravo. Admitir-se a tese defendida pela autarquia recorrente, de que lhe seria dado rediscutir cálculos após o trânsito em julgado da decisão que os homologou, e fora da via processual adequada, seria o mesmo que instaurar um regime de permanente instabilidade processual, em afronta à segurança jurídica e à própria autoridade da coisa julgada. Assim, a exceção de pré-executividade não se presta a funcionar como atalho processual para sanar a negligência processual da parte, especialmente da Fazenda Pública, que, não obstante seus privilégios processuais específicos — como prazos diferenciados e intimações pessoais —, não pode se furtar ao ônus processual da diligência e da tempestividade. Por fim, cumpre ressaltar que a cláusula da indisponibilidade do interesse público, que naturalmente informa a atuação da Fazenda Pública no processo, não pode ser interpretada como licença para subverter a ordem processual, tampouco como salvo-conduto para negligências, omissões e atos processuais praticados fora do momento processual adequado. O processo, enquanto instrumento constitucional de realização da jurisdição, é regido por uma ordem pública procedimental, que impõe a todos — particulares e entes públicos — o dever de atuar segundo os princípios da boa-fé objetiva, cooperação processual, lealdade, eficiência e, sobretudo, observância dos limites temporais e estruturais do devido processo legal. Logo, a doutrina do devido processo legal, da segurança jurídica e da estabilização das fases processuais se aplica indistintamente à Fazenda Pública e aos particulares, sob pena de instaurar-se odioso privilégio processual incompatível com o Estado Democrático de Direito. Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. Com o trânsito em julgado, arquive-se. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Desembargador DEOSDETE CRUZ JUNIOR Relator

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Juliana Oscar De Oliveira Fernandes x Município Do Rio De Janeiro

ID: 326689300

Tribunal: TJRJ Órgão: CAPITAL CONSELHO RECURSAL DOS JECs E JECRIMs Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 0001034-97.2025.8.19.9000

Data de Disponibilização: 16/07/2025

Polo Ativo:

JULIANA OSCAR DE OLIVEIRA FERNANDES

Polo Passivo:

MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO

Agravo de Instrumento

Advogados:

JOSÉ DIMAS MARCONDES FILHO

OAB/RJ XXXXXX Desbloquear

*** CAPITAL CONSELHO RECURSAL DOS JECS E JECRIMS *** ------------------------- SÚMULA DE JULGAMENTO ------------------------- Segunda Turma Recursal Fazendária Av. Erasmo Braga, 115 - sala 216, … *** CAPITAL CONSELHO RECURSAL DOS JECS E JECRIMS *** ------------------------- SÚMULA DE JULGAMENTO ------------------------- Segunda Turma Recursal Fazendária Av. Erasmo Braga, 115 - sala 216, Lamina I, D Castelo - Rio de Janeiro - AGRAVO DE INSTRUMENTO 0001034-97.2025.8.19.9000 Assunto: Convênio médico com o SUS / Sistema Único de Saúde (SUS) / Pública / DIREITO DA SAÚDE Origem: CAPITAL I JUI ESP FAZENDA PUBLICA Ação: 0832110-40.2025.8.19.0001 Protocolo: 8818/2025.00043408 AGTE: JULIANA OSCAR DE OLIVEIRA FERNANDES ADVOGADO: JOSÉ DIMAS MARCONDES FILHO OAB/RJ-217075 AGDO: MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO ADVOGADO: PROCURADOR DO MUNICÍPIO OAB/TJ-000009 Relator: ANTONIO CARLOS MAISONNETTE PEREIRA TEXTO: Acordam os Juízes que integram a Segunda Turma Recursal Fazendária, por unanimidade, em conhecer do recurso e NEGAR-LHE provimento para manter a DECISÃO AGRAVADA por seus próprios fundamentos, por entender que ( i ) os atos administrativos praticados pelo Município réu encontram amparo na legislação federal vigente, uma vez que a Resolução RDC 56/2009 da ANVISA permanece válida e eficaz, sendo reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 4874 a legitimidade da ANVISA para editar atos normativos visando à organização e à fiscalização das atividades reguladas insere-se no poder geral de polícia da Administração sanitária. Qualifica-se, a competência normativa da ANVISA, pela edição, no exercício da regulação setorial sanitária, de atos: (i) gerais e abstratos, (ii) de caráter técnico, (iii) necessários à implementação da política nacional de vigilância sanitária e (iv) subordinados à observância dos parâmetros fixados na ordem constitucional e na legislação setorial. In verbis: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PEDIDO DE INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. ART. 7º, III E XV, IN FINE, DA LEI Nº 9.782/1999. RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA (RDC) DA ANVISA Nº 14/2002. PROIBIÇÃO DA IMPORTAÇÃO E DA COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS FUMÍGENOS DERIVADOS DO TABACO CONTENDO ADITIVOS. AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. REGULAÇÃO SETORIAL. FUNÇÃO NORMATIVA DAS AGÊNCIA REGULADORAS. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. CLÁUSULAS CONSTITUCIONAIS DA LIBERDADE DE INICIATIVA E DO DIREITO À SAÚDE. PRODUTOS QUE ENVOLVEM RISCO À SAÚDE. COMPETÊNCIA ESPECÍFICA E QUALIFICADA DA ANVISA. ART. 8º, § 1º, X, DA Lei nº 9.782/1999. JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL. DEFERÊNCIA ADMINISTRATIVA. RAZOABILIDADE. CONVENÇÃO-QUADRO SOBRE CONTROLE DO USO DO TABACO ¿ CQCT. IMPROCEDÊNCIA. 1. Ao instituir o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, a Lei nº 9.782/1999 delineia o regime jurídico e dimensiona as competências da Agência Nacional de Vigilância Sanitária ¿ ANVISA, autarquia especial. 2. A função normativa das agências reguladoras não se confunde com a a função regulamentadora da Administração (art. 84, IV, da Lei Maior), tampouco com a figura do regulamento autônomo (arts. 84, VI,103-B, § 4º, I, e 237 da CF). 3. A competência para editar atos normativos visando à organização e à fiscalização das atividades reguladas insere-se no poder geral de polícia da Administração sanitária. Qualifica-se, a competência normativa da ANVISA, pela edição, no exercício da regulação setorial sanitária, de atos: (i) gerais e abstratos, (ii) de caráter técnico, (iii) necessários à implementação da política nacional de vigilância sanitária e (iv) subordinados à observância dos parâmetros fixados na ordem constitucional e na legislação setorial. Precedentes: ADI 1668/DF-MC, Relator Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJ 16.4.2004; RMS 28487/DF, Relator Ministro Dias Toffoli, 1ª Turma, DJe 14.3.2013; ADI 4954/AC, Relator Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJe 30.10.2014; ADI 4949/RJ, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, DJe 03.10.2014; ADI 4951/PI, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 26.11.2014; ADI 4.093/SP, Relatora Ministra Rosa Weber, Tribunal Pleno, DJe 4. Improcedência do pedido de interpretação conforme a Constituição do art. 7º, XV, parte final, da Lei nº 9.782/1999, cujo texto unívoco em absoluto atribui competência normativa para a proibição de produtos ou insumos em caráter geral e primário. Improcedência também do pedido alternativo de interpretação conforme a Constituição do art. 7º, III, da Lei nº 9.782/1999, que confere à ANVISA competência normativa condicionada à observância da legislação vigente. 5. Credencia-se à tutela de constitucionalidade in abstracto o ato normativo qualificado por abstração, generalidade, autonomia e imperatividade. Cognoscibilidade do pedido sucessivo de declaração de inconstitucionalidade da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 14/2012 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária ¿ ANVISA. 6. Proibição da fabricação, importação e comercialização, no país, de produtos fumígenos derivados do tabaco que contenham as substâncias ou compostos que define como aditivos: compostos e substâncias que aumentam a sua atratividade e a capacidade de causar dependência química. Conformação aos limites fixados na lei e na Constituição da República para o exercício legítimo pela ANVISA da sua competência normativa. 7. A liberdade de iniciativa (arts. 1º, IV, e 170, caput, da Lei Maior) não impede a imposição, pelo Estado, de condições e limites para a exploração de atividades privadas tendo em vista sua compatibilização com os demais princípios, garantias, direitos fundamentais e proteções constitucionais, individuais ou sociais, destacando-se, no caso do controle do tabaco, a proteção da saúde e o direito à informação. O risco associado ao consumo do tabaco justifica a sujeição do seu mercado a intensa regulação sanitária, tendo em vista o interesse público na proteção e na promoção da saúde. 8. O art. 8º, caput e § 1º, X, da Lei nº 9.782/1999 submete os produtos fumígenos, derivados ou não do tabaco, a regime diferenciado específico de regulamentação, controle e fiscalização pela ANVISA, por se tratar de produtos que envolvem risco à saúde pública. A competência específica da ANVISA para regulamentar os produtos que envolvam risco à saúde (art. 8º, § 1º, X, da Lei nº 9.782/1999) necessariamente inclui a competência para definir, por meio de critérios técnicos e de segurança, os ingredientes que podem e não podem ser usados na fabricação de tais produtos. Daí o suporte legal à RDC nº 14/2012, no que proíbe a adição, nos produtos fumígenos derivados do tabaco, de compostos ou substâncias destinados a aumentar a sua atratividade. De matiz eminentemente técnica, a disciplina da forma de apresentação (composição, características etc.) de produto destinado ao consumo, não traduz restrição sobre a sua natureza. 9. Definidos na legislação de regência as políticas a serem perseguidas, os objetivos a serem implementados e os objetos de tutela, ainda que ausente pronunciamento direto, preciso e não ambíguo do legislador sobre as medidas específicas a adotar, não cabe ao Poder Judiciário, no exercício do controle jurisdicional da exegese conferida por uma Agência ao seu próprio estatuto legal, simplesmente substituí-la pela sua própria interpretação da lei. Deferência da jurisdição constitucional à interpretação empreendida pelo ente administrativo acerca do diploma definidor das suas próprias competências e atribuições, desde que a solução a que chegou a agência seja devidamente fundamentada e tenha lastro em uma interpretação da lei razoável e compatível com a Constituição. Aplicação da doutrina da deferência administrativa (Chevron U.S.A. v. Natural Res. Def. Council). 10. A incorporação da CQCT ao direito interno, embora não vinculante, fornece um standard de razoabilidade para aferição dos parâmetros adotados na RDC nº 14/2012 pela ANVISA, com base na competência atribuída pelos arts. 7º, III, e 8º, § 1º, X, da Lei nº 9.782/1999. 11. Ao editar a Resolução da Diretoria Colegiada ¿ RDC nº 14/2012, definindo normas e padrões técnicos sobre limites máximos de alcatrão, nicotina e monóxido de carbono nos cigarros e restringindo o uso dos denominados aditivos nos produtos fumígenos derivados do tabaco, sem alterar a sua natureza ou redefinir características elementares da sua identidade, a ANVISA atuou em conformidade com os lindes constitucionais e legais das suas prerrogativas, observados a cláusula constitucional do direito à saúde, o marco legal vigente e a estrita competência normativa que lhe outorgam os arts. 7º, III, e 8º, § 1º, X, da Lei nº 9.782/1999. Improcedência do pedido sucessivo. 12. Quórum de julgamento constituído por dez Ministros, considerado um impedimento. Nove votos pela improcedência do pedido principal de interpretação conforme a Constituição, sem redução de texto, do art. 7º, III e XV, in fine, da Lei nº 9.782/1999. Cinco votos pela improcedência e cinco pela procedência do pedido sucessivo, não atingido o quórum de seis votos (art. 23 da Lei nº 9.868/1999) ¿ maioria absoluta (art. 97 da Constituição da República) ¿ para declaração da inconstitucionalidade da RDC nº 14/2012 da ANVISA, a destituir de eficácia vinculante o julgado, no ponto. 13. Ação direta de inconstitucionalidade conhecida, e, no mérito julgados improcedentes os pedidos principais e o pedido sucessivo. Julgamento destituído de efeito vinculante apenas quanto ao pedido sucessivo, porquanto não atingido o quórum para a declaração da constitucionalidade da Resolução da Diretoria Colegiada nº 14/2012 da ANVISA. Ademais, ao contrário do que a agravante alega, a referida resolução não foi declarada ilegal ou inconstitucional pela Justiça Federal, pelo contrário, afirmou-se a legalidade da Resolução RDC 56/2009. Neste sentido: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. ANVISA . PODER DE POLÍCIA SANITÁRIO. DEVER DE NORMATIZAR, DISCIPLINAR, CONTROLAR, FISCALIZAR E PUNIR SERVIÇOS QUE ENVOLVAM RISCOS À VIDA E À SAÚDE. EQUIPAMENTOS PARA BRONZEAMENTO ARTIFICIAL. PROIBIÇÃO . ILICITUDE DA NORMA REGULAMENTADORA NÃO CONFIGURADA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1 . Considerando o propósito institucional da ANVISA, que visa promover e proteger a saúde da população conforme estabelecido pela Lei n.º 9.782/99, e diante das evidências que associam a exposição aos raios ultravioletas ao desenvolvimento do câncer de pele, é pertinente reconhecer a legalidade da Resolução RDC 56/2009. Tal resolução proíbe o uso de equipamentos para bronzeamento artificial com finalidade estética, devido aos riscos que apresentam para a saúde pública .Parte superior do formulário 2. Faz jus à gratuidade de justiça a pessoa com insuficiência de recursos para pagar as custas, despesas processuais e honorários advocatícios, presumindo-se verdadeira a alegação nesse sentido deduzida por pessoa natural (Art. 98, caput, c/c Art. 99, § 3º, ambos do CPC/2015) . 3. A ANVISA, no exercício regular de suas atribuições legais (poder de polícia regulamentar), ao constatar que a utilização de câmaras de bronzeamento artificial, para fins meramente estéticos, oferece efetivo risco à saúde de seus usuários, não contrabalançado por qualquer vantagem significativa a justificar apenas a mera limitação do seu uso, editou a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 56, de 09/11/2009. 4. A vedação imposta na RDC ANVISA nº 56/09 não emana de meras hipóteses ou informações infundadas, mas, sim, embasadas em estudos realizados pela IARC - International Agency for Research on Cancer, órgão ligado à Organização Mundial de Saúde - OMS e especializado em pesquisas sobre o câncer . 5. Discute-se a nulidade da Resolução nº 56/09, editada pela ANVISA, que determina a proibição do uso de equipamentos para bronzeamento artificial, com finalidade estética. A ANVISA, no exercício regular de suas atribuições legais (poder de polícia regulamentar), ao constatar que a utilização de câmaras de bronzeamento artificial, para fins meramente estéticos, oferece efetivo risco à saúde de seus usuários, não contrabalançado por qualquer vantagem significativa a justificar apenas a mera limitação do seu uso, editou a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 56, de 09/11/2009. A vedação imposta na RDC ANVISA nº 56/09 não emana de meras hipóteses ou informações infundadas, mas, sim, embasadas em estudos realizados pela IARC - International Agency for Research on Cancer, órgão ligado à Organização Mundial de Saúde - OMS e especializado em pesquisas sobre o câncer . Os estudos e pesquisas efetivados pela IARC foram conclusivos no sentido da relação direta da exposição aos raios ultravioletas (UV) e a ocorrência do câncer de pele, classificado o uso de equipamentos com emissão de tais raios (UV) como "carcinogênico para humanos", o que inclui as câmaras de bronzeamento artificial. A questão foi ampla e devidamente debatida com a sociedade, por meio de audiência e consultas públicas, antes da edição do ato normativo. (AC 1007832-36.2023 .4.01.3900, JUIZ FEDERAL ALYSSON MAIA FONTENELE (CONV.), TRF1 - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, PJe 12/09/2023 .) 6. O ato normativo encontra fundamento no poder regulatório da Agência, nos termos dos artigos 6º, 7º e 8º da Lei nº 9.782/99. Não se deve descurar que a questão envolve a saúde pública, restando, dessa forma, prejudicadas quaisquer alegações de restrição ao livre exercício da atividade econômica, assim como da livre iniciativa e da propriedade privada . O interesse econômico não há de prevalecer sobre o direito fundamental à saúde (Art. 196, da CF), inexistindo, assim, vulneração aos princípios constitucionais da isonomia, razoabilidade e tampouco à liberdade individual. 7. Em matéria de vigilância sanitária, ANVISA possui a atribuição, legalmente conferida, de proteger a saúde da população, mediante normatização, controle e fiscalização de produtos, substâncias e serviços de interesse para a saúde, podendo, assim, restringir ou mesmo proibir o uso de determinados equipamentos que coloquem em risco o bem que objetiva proteger . 8. Apelação parcialmente provida para conceder o benefício da gratuidade de justiça. (TRF-1 - APELAÇÃO CIVEL: 10030745920234013400, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE LARANJEIRA, Data de Julgamento: 01/04/2024, DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: PJe 01/04/2024 PAG PJe 01/04/2024 PAG) . Dessa forma, não há indícios de irregularidade na conduta administrativa municipal, tampouco abuso de poder que justifique a concessão da tutela antecipada. Tendo sido todas as questões aduzidas no recurso apreciadas, sendo dispensada a transcrição das conclusões em homenagem aos princípios informativos previstos no artigo 2º da Lei 9099/95, e na forma do artigo 46, segunda parte, da mesma Lei, frisando-se, outrossim, que a motivação concisa atende à exigência do artigo 93 da Constituição Federal, e está em conformidade com o disposto no Regimento Interno das Turmas. Condenado o recorrente nas custas, observado o art. 98, §3º do Novo Código de Processo Civil, valendo esta súmula como acórdão, conforme o disposto no art. 46 da Lei 9099/95 e art. 27 da Lei nº 12.153/2009.

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Juliana Oscar De Oliveira Fernandes x Município Do Rio De Janeiro

ID: 278482714

Tribunal: TJRJ Órgão: CAPITAL CONSELHO RECURSAL DOS JECs E JECRIMs Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 0001034-97.2025.8.19.9000

Data de Disponibilização: 26/05/2025

Polo Ativo:

JULIANA OSCAR DE OLIVEIRA FERNANDES

Polo Passivo:

MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO

Agravo de Instrumento

Advogados:

JOSÉ DIMAS MARCONDES FILHO

OAB/RJ XXXXXX Desbloquear

*** CAPITAL CONSELHO RECURSAL DOS JECS E JECRIMS *** ------------------------- DECISÃO ------------------------- Segunda Turma Recursal Fazendária Av. Erasmo Braga, 115 - sala 216, Lamina I, D … *** CAPITAL CONSELHO RECURSAL DOS JECS E JECRIMS *** ------------------------- DECISÃO ------------------------- Segunda Turma Recursal Fazendária Av. Erasmo Braga, 115 - sala 216, Lamina I, D Castelo - Rio de Janeiro - AGRAVO DE INSTRUMENTO 0001034-97.2025.8.19.9000 Assunto: Convênio médico com o SUS / Sistema Único de Saúde (SUS) / Pública / DIREITO DA SAÚDE Origem: CAPITAL I JUI ESP FAZENDA PUBLICA Ação: 0832110-40.2025.8.19.0001 Protocolo: 8818/2025.00043408 AGTE: JULIANA OSCAR DE OLIVEIRA FERNANDES ADVOGADO: JOSÉ DIMAS MARCONDES FILHO OAB/RJ-217075 AGDO: MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO ADVOGADO: PROCURADOR DO MUNICÍPIO OAB/TJ-000009 Relator: ANTONIO CARLOS MAISONNETTE PEREIRA DECISÃO: Agravo de Instrumento: 001034-97.2025.8.19.9000 - CÂMARA DE BRONZEAMENTO - INDE TUTELA REC Processo: 0832110-40.2025.8.19.0001 Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA (14695) AUTOR: JULIANA OSCAR DE OLIVEIRA FERNANDES RÉU: MUNICIPIO DE RIO DE JANEIRO DECISÃO TRATA-SE DE AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto contra decisão que indeferiu a tutela de urgência para a agravante no sentido de reabrir seu estabelecimento comercial fechado pela Prefeitura Municipal com base, em tese, em resolução nula da ANVISA. Pede a concessão do efeito suspensivo ao recurso, nos termos do artigo 1.019, I, do CPC, a fim de que seja suspensa a decisão recorrida até o julgamento final do presente agravo, alegando que em 18 de fevereiro de 2025, a autora teve seu estabelecimento comercial interditado pela Secretaria Municipal de Saúde da ré, conforme documentado no Termo de Visita Sanitária nº 2399383 e Termo de Intimação nº 588419; que a interdição foi fundamentada na Resolução nº 56 de 2009 da ANVISA; sustenta que no Estado do Rio de Janeiro, o bronzeamento artificial não somente é permitido como se encontra devidamente regulamentado pela Lei Estadual nº 4.879/06; que esta legislação específica estabelece diretrizes técnicas rigorosas a serem observadas pelos estabelecimentos que oferecem tal serviço, impondo limitações e parâmetros técnicos precisos com o objetivo de garantir a segurança e o bem-estar dos consumidores e que tais atos administrativos foram expedidos sem a devida observância dos princípios constitucionais da legalidade, do contraditório e da ampla defesa, elementos basilares do Estado Democrático de Direito e expressamente consagrados no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal e que, portanto, a interdição do estabelecimento da Agravante revela-se manifestamente abusiva, destituída de fundamento legal adequado e suficiente, culminando na imposição de penalidade indevida e desproporcional, o que evidencia flagrante ilegalidade no procedimento. A tutela recursal, assim como a de primeiro grau, não merece ser deferida. Os atos administrativos praticados pelo Município réu encontram amparo na legislação federal vigente, uma vez que a Resolução RDC 56/2009 da ANVISA permanece válida e eficaz, sendo reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 4874 a legitimidade da ANVISA para editar atos normativos visando à organização e à fiscalização das atividades reguladas insere-se no poder geral de polícia da Administração sanitária. Qualifica-se, a competência normativa da ANVISA, pela edição, no exercício da regulação setorial sanitária, de atos: (i) gerais e abstratos, (ii) de caráter técnico, (iii) necessários à implementação da política nacional de vigilância sanitária e (iv) subordinados à observância dos parâmetros fixados na ordem constitucional e na legislação setorial. In verbis: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PEDIDO DE INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. ART. 7º, III E XV, IN FINE, DA LEI Nº 9.782/1999. RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA (RDC) DA ANVISA Nº 14/2002. PROIBIÇÃO DA IMPORTAÇÃO E DA COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS FUMÍGENOS DERIVADOS DO TABACO CONTENDO ADITIVOS. AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. REGULAÇÃO SETORIAL. FUNÇÃO NORMATIVA DAS AGÊNCIA REGULADORAS. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. CLÁUSULAS CONSTITUCIONAIS DA LIBERDADE DE INICIATIVA E DO DIREITO À SAÚDE. PRODUTOS QUE ENVOLVEM RISCO À SAÚDE. COMPETÊNCIA ESPECÍFICA E QUALIFICADA DA ANVISA. ART. 8º, § 1º, X, DA Lei nº 9.782/1999. JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL. DEFERÊNCIA ADMINISTRATIVA. RAZOABILIDADE. CONVENÇÃO-QUADRO SOBRE CONTROLE DO USO DO TABACO - CQCT. IMPROCEDÊNCIA. 1. Ao instituir o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, a Lei nº 9.782/1999 delineia o regime jurídico e dimensiona as competências da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA, autarquia especial. 2. A função normativa das agências reguladoras não se confunde com a a função regulamentadora da Administração (art. 84, IV, da Lei Maior), tampouco com a figura do regulamento autônomo (arts. 84, VI,103-B, § 4º, I, e 237 da CF). 3. A competência para editar atos normativos visando à organização e à fiscalização das atividades reguladas insere-se no poder geral de polícia da Administração sanitária. Qualifica-se, a competência normativa da ANVISA, pela edição, no exercício da regulação setorial sanitária, de atos: (i) gerais e abstratos, (ii) de caráter técnico, (iii) necessários à implementação da política nacional de vigilância sanitária e (iv) subordinados à observância dos parâmetros fixados na ordem constitucional e na legislação setorial. Precedentes: ADI 1668/DF-MC, Relator Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJ 16.4.2004; RMS 28487/DF, Relator Ministro Dias Toffoli, 1ª Turma, DJe 14.3.2013; ADI 4954/AC, Relator Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, DJe 30.10.2014; ADI 4949/RJ, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, DJe 03.10.2014; ADI 4951/PI, Relator Ministro Teori Zavascki, DJe 26.11.2014; ADI 4.093/SP, Relatora Ministra Rosa Weber, Tribunal Pleno, DJe 4. Improcedência do pedido de interpretação conforme a Constituição do art. 7º, XV, parte final, da Lei nº 9.782/1999, cujo texto unívoco em absoluto atribui competência normativa para a proibição de produtos ou insumos em caráter geral e primário. Improcedência também do pedido alternativo de interpretação conforme a Constituição do art. 7º, III, da Lei nº 9.782/1999, que confere à ANVISA competência normativa condicionada à observância da legislação vigente. 5. Credencia-se à tutela de constitucionalidade in abstracto o ato normativo qualificado por abstração, generalidade, autonomia e imperatividade. Cognoscibilidade do pedido sucessivo de declaração de inconstitucionalidade da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 14/2012 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA. 6. Proibição da fabricação, importação e comercialização, no país, de produtos fumígenos derivados do tabaco que contenham as substâncias ou compostos que define como aditivos: compostos e substâncias que aumentam a sua atratividade e a capacidade de causar dependência química. Conformação aos limites fixados na lei e na Constituição da República para o exercício legítimo pela ANVISA da sua competência normativa. 7. A liberdade de iniciativa (arts. 1º, IV, e 170, caput, da Lei Maior) não impede a imposição, pelo Estado, de condições e limites para a exploração de atividades privadas tendo em vista sua compatibilização com os demais princípios, garantias, direitos fundamentais e proteções constitucionais, individuais ou sociais, destacando-se, no caso do controle do tabaco, a proteção da saúde e o direito à informação. O risco associado ao consumo do tabaco justifica a sujeição do seu mercado a intensa regulação sanitária, tendo em vista o interesse público na proteção e na promoção da saúde. 8. O art. 8º, caput e § 1º, X, da Lei nº 9.782/1999 submete os produtos fumígenos, derivados ou não do tabaco, a regime diferenciado específico de regulamentação, controle e fiscalização pela ANVISA, por se tratar de produtos que envolvem risco à saúde pública. A competência específica da ANVISA para regulamentar os produtos que envolvam risco à saúde (art. 8º, § 1º, X, da Lei nº 9.782/1999) necessariamente inclui a competência para definir, por meio de critérios técnicos e de segurança, os ingredientes que podem e não podem ser usados na fabricação de tais produtos. Daí o suporte legal à RDC nº 14/2012, no que proíbe a adição, nos produtos fumígenos derivados do tabaco, de compostos ou substâncias destinados a aumentar a sua atratividade. De matiz eminentemente técnica, a disciplina da forma de apresentação (composição, características etc.) de produto destinado ao consumo, não traduz restrição sobre a sua natureza. 9. Definidos na legislação de regência as políticas a serem perseguidas, os objetivos a serem implementados e os objetos de tutela, ainda que ausente pronunciamento direto, preciso e não ambíguo do legislador sobre as medidas específicas a adotar, não cabe ao Poder Judiciário, no exercício do controle jurisdicional da exegese conferida por uma Agência ao seu próprio estatuto legal, simplesmente substituí-la pela sua própria interpretação da lei. Deferência da jurisdição constitucional à interpretação empreendida pelo ente administrativo acerca do diploma definidor das suas próprias competências e atribuições, desde que a solução a que chegou a agência seja devidamente fundamentada e tenha lastro em uma interpretação da lei razoável e compatível com a Constituição. Aplicação da doutrina da deferência administrativa (Chevron U.S.A. v. Natural Res. Def. Council). 10. A incorporação da CQCT ao direito interno, embora não vinculante, fornece um standard de razoabilidade para aferição dos parâmetros adotados na RDC nº 14/2012 pela ANVISA, com base na competência atribuída pelos arts. 7º, III, e 8º, § 1º, X, da Lei nº 9.782/1999. 11. Ao editar a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 14/2012, definindo normas e padrões técnicos sobre limites máximos de alcatrão, nicotina e monóxido de carbono nos cigarros e restringindo o uso dos denominados aditivos nos produtos fumígenos derivados do tabaco, sem alterar a sua natureza ou redefinir características elementares da sua identidade, a ANVISA atuou em conformidade com os lindes constitucionais e legais das suas prerrogativas, observados a cláusula constitucional do direito à saúde, o marco legal vigente e a estrita competência normativa que lhe outorgam os arts. 7º, III, e 8º, § 1º, X, da Lei nº 9.782/1999. Improcedência do pedido sucessivo. 12. Quórum de julgamento constituído por dez Ministros, considerado um impedimento. Nove votos pela improcedência do pedido principal de interpretação conforme a Constituição, sem redução de texto, do art. 7º, III e XV, in fine, da Lei nº 9.782/1999. Cinco votos pela improcedência e cinco pela procedência do pedido sucessivo, não atingido o quórum de seis votos (art. 23 da Lei nº 9.868/1999) - maioria absoluta (art. 97 da Constituição da República) - para declaração da inconstitucionalidade da RDC nº 14/2012 da ANVISA, a destituir de eficácia vinculante o julgado, no ponto. 13. Ação direta de inconstitucionalidade conhecida, e, no mérito julgados improcedentes os pedidos principais e o pedido sucessivo. Julgamento destituído de efeito vinculante apenas quanto ao pedido sucessivo, porquanto não atingido o quórum para a declaração da constitucionalidade da Resolução da Diretoria Colegiada nº 14/2012 da ANVISA. Ademais, ao contrário do que a agravante alega, a referida resolução não foi declarada ilegal ou inconstitucional pela Justiça Federal, pelo contrário, afirmou-se a legalidade da Resolução RDC 56/2009. Neste sentido: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. ANVISA . PODER DE POLÍCIA SANITÁRIO. DEVER DE NORMATIZAR, DISCIPLINAR, CONTROLAR, FISCALIZAR E PUNIR SERVIÇOS QUE ENVOLVAM RISCOS À VIDA E À SAÚDE. EQUIPAMENTOS PARA BRONZEAMENTO ARTIFICIAL. PROIBIÇÃO . ILICITUDE DA NORMA REGULAMENTADORA NÃO CONFIGURADA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1 . Considerando o propósito institucional da ANVISA, que visa promover e proteger a saúde da população conforme estabelecido pela Lei n.º 9.782/99, e diante das evidências que associam a exposição aos raios ultravioletas ao desenvolvimento do câncer de pele, é pertinente reconhecer a legalidade da Resolução RDC 56/2009. Tal resolução proíbe o uso de equipamentos para bronzeamento artificial com finalidade estética, devido aos riscos que apresentam para a saúde pública .Parte superior do formulário 2. Faz jus à gratuidade de justiça a pessoa com insuficiência de recursos para pagar as custas, despesas processuais e honorários advocatícios, presumindo-se verdadeira a alegação nesse sentido deduzida por pessoa natural (Art. 98, caput, c/c Art. 99, § 3º, ambos do CPC/2015) . 3. A ANVISA, no exercício regular de suas atribuições legais (poder de polícia regulamentar), ao constatar que a utilização de câmaras de bronzeamento artificial, para fins meramente estéticos, oferece efetivo risco à saúde de seus usuários, não contrabalançado por qualquer vantagem significativa a justificar apenas a mera limitação do seu uso, editou a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 56, de 09/11/2009. 4. A vedação imposta na RDC ANVISA nº 56/09 não emana de meras hipóteses ou informações infundadas, mas, sim, embasadas em estudos realizados pela IARC - International Agency for Research on Cancer, órgão ligado à Organização Mundial de Saúde - OMS e especializado em pesquisas sobre o câncer . 5. Discute-se a nulidade da Resolução nº 56/09, editada pela ANVISA, que determina a proibição do uso de equipamentos para bronzeamento artificial, com finalidade estética. A ANVISA, no exercício regular de suas atribuições legais (poder de polícia regulamentar), ao constatar que a utilização de câmaras de bronzeamento artificial, para fins meramente estéticos, oferece efetivo risco à saúde de seus usuários, não contrabalançado por qualquer vantagem significativa a justificar apenas a mera limitação do seu uso, editou a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 56, de 09/11/2009. A vedação imposta na RDC ANVISA nº 56/09 não emana de meras hipóteses ou informações infundadas, mas, sim, embasadas em estudos realizados pela IARC - International Agency for Research on Cancer, órgão ligado à Organização Mundial de Saúde - OMS e especializado em pesquisas sobre o câncer . Os estudos e pesquisas efetivados pela IARC foram conclusivos no sentido da relação direta da exposição aos raios ultravioletas (UV) e a ocorrência do câncer de pele, classificado o uso de equipamentos com emissão de tais raios (UV) como "carcinogênico para humanos", o que inclui as câmaras de bronzeamento artificial. A questão foi ampla e devidamente debatida com a sociedade, por meio de audiência e consultas públicas, antes da edição do ato normativo. (AC 1007832-36.2023 .4.01.3900, JUIZ FEDERAL ALYSSON MAIA FONTENELE (CONV.), TRF1 - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, PJe 12/09/2023 .) 6. O ato normativo encontra fundamento no poder regulatório da Agência, nos termos dos artigos 6º, 7º e 8º da Lei nº 9.782/99. Não se deve descurar que a questão envolve a saúde pública, restando, dessa forma, prejudicadas quaisquer alegações de restrição ao livre exercício da atividade econômica, assim como da livre iniciativa e da propriedade privada . O interesse econômico não há de prevalecer sobre o direito fundamental à saúde (Art. 196, da CF), inexistindo, assim, vulneração aos princípios constitucionais da isonomia, razoabilidade e tampouco à liberdade individual. 7. Em matéria de vigilância sanitária, ANVISA possui a atribuição, legalmente conferida, de proteger a saúde da população, mediante normatização, controle e fiscalização de produtos, substâncias e serviços de interesse para a saúde, podendo, assim, restringir ou mesmo proibir o uso de determinados equipamentos que coloquem em risco o bem que objetiva proteger . 8. Apelação parcialmente provida para conceder o benefício da gratuidade de justiça. (TRF-1 - APELAÇÃO CIVEL: 10030745920234013400, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE LARANJEIRA, Data de Julgamento: 01/04/2024, DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: PJe 01/04/2024 PAG PJe 01/04/2024 PAG) Dessa forma, não há indícios de irregularidade na conduta administrativa municipal, tampouco abuso de poder que justifique a concessão da tutela antecipada. Ante o exposto INDEFIRO A TUTELA RECURSAL. Ao MP e ao agravado. Defiro a JG ao agravante. PIC Antonio Carlos Maisonnette Relator

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Processo nº 1001971-28.2025.4.01.3600

ID: 308400701

Tribunal: TRF1 Órgão: 8ª Vara Federal Cível da SJMT Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 1001971-28.2025.4.01.3600

Data de Disponibilização: 26/06/2025

Polo Ativo:

29.960.496 CRISTIANE DOS SANTOS

Polo Passivo:

Sentença Tipo A

Advogados:

VALMIR ALEXANDRE ROSA

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL SEÇÃO JUDICIÁRIA DE MATO GROSSO 8ª VARA FEDERAL CÍVEL DA SJMT PROCESSO: 1001971-28.2025.4.01.3600 G8 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: 29.960.496 C… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL SEÇÃO JUDICIÁRIA DE MATO GROSSO 8ª VARA FEDERAL CÍVEL DA SJMT PROCESSO: 1001971-28.2025.4.01.3600 G8 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: 29.960.496 CRISTIANE DOS SANTOS IMPETRADO: DIRETOR-PRESIDENTE DA AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA - ANVISA_, AGENCIA NACIONAL DE VIGILANCIA SANITARIA - ANVISA SENTENÇA Tipo A 1. RELATÓRIO Trata-se de mandado de segurança impetrado por CRISTIANE DOS SANTOS contra ato atribuído ao DIRETOR-PRESIDENTE DA AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA - ANVISA, em que pretende afastar a incidência da Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 56/2009, que proíbe em todo território nacional a utilização de equipamentos para bronzeamento artificial com finalidade estética. Alega a impetrante, em síntese, que: a) é profissional atuante na área de beleza e estética corporal, desenvolvendo serviços de bronzeamento natural e tendo interesse em iniciar atividades com bronzeamento artificial; b) a RDC 56/2009 impede em todo território nacional a utilização desses equipamentos; c) existe decisão judicial proferida pela 24ª Vara Federal de São Paulo (processo nº 0001067-62.2010.4.03.6100) que declarou nula a referida resolução, com efeitos erga omnes; d) a ANVISA não poderia, por meio de resolução, proibir atividade econômica, o que só seria possível por lei em sentido estrito; e) faz comparação com outros produtos sabidamente nocivos à saúde como cigarro e bebidas alcoólicas, que não são proibidos pela agência. Juntou a procuração, os documentos de identificação e os constitutivos da pretensão. O juízo indeferiu a liminar, Id.2172415608. A ANVISA manifestou interesse no feito, Id. 2173731222. Informações prestadas em Id. 2175975453. Manifestação do Ministério Público Federal, Id.2172929136. 2. FUNDAMENTAÇÃO Adoto a decisão liminar como razão de decidir, em virtude da não alteração dos seus fundamentos: (...) Cinge-se a questão quanto à possibilidade de afastar a fiscalização sanitária baseada na Resolução – RDC n. 56/2009, expedida pela ANVISA, que proíbe em todo território nacional o uso dos equipamentos para bronzeamento artificial. A Lei 9.782/99, em seus artigos 7º e 8º, assim dispõe: Art. 7º Compete à Agência proceder à implementação e à execução do disposto nos incisos II a VII do art. 2º desta Lei, devendo: [...] III - normatizar, controlar e fiscalizar produtos, substâncias e serviços de interesse para a saúde; IV - exercer a vigilância sanitária de portos, aeroportos e fronteiras, podendo essa atribuição ser supletivamente exercida pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios; [...] VIII - anuir com a importação e exportação dos produtos mencionados no art. 8º desta Lei; [...] XIV - interditar, como medida de vigilância sanitária, os locais de fabricação, controle, importação, armazenamento, distribuição e venda de produtos e de prestação de serviços relativos à saúde, em caso de violação da legislação pertinente ou de risco iminente à saúde; XV - proibir a fabricação, a importação, o armazenamento, a distribuição e a comercialização de produtos e insumos, em caso de violação da legislação pertinente ou de risco iminente à saúde; [...] Art. 8º Incumbe à Agência, respeitada a legislação em vigor, regulamentar, controlar e fiscalizar os produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública. § 1º Consideram-se bens e produtos submetidos ao controle e fiscalização sanitária pela Agência: [...] III - cosméticos, produtos de higiene pessoal e perfumes; [...] V - conjuntos, reagentes e insumos destinados a diagnóstico; VI - equipamentos e materiais médico-hospitalares, odontológicos e hemoterápicos e de diagnóstico laboratorial e por imagem; [...] IX - radioisótopos para uso diagnóstico in vivo e radiofármacos e produtos radioativos utilizados em diagnóstico e terapia; [...] XI - quaisquer produtos que envolvam a possibilidade de risco à saúde, obtidos por engenharia genética, por outro procedimento ou ainda submetidos a fontes de radiação. § 2º Consideram-se serviços submetidos ao controle e fiscalização sanitária pela Agência, aqueles voltados para a atenção ambulatorial, seja de rotina ou de emergência, os realizados em regime de internação, os serviços de apoio diagnóstico e terapêutico, bem como aqueles que impliquem a incorporação de novas tecnologias. [...] § 4º A Agência poderá regulamentar outros produtos e serviços de interesse para o controle de riscos à saúde da população, alcançados pelo Sistema Nacional de Vigilância Sanitária. § 5º A Agência poderá dispensar de registro os imunobiológicos, inseticidas, medicamentos e outros insumos estratégicos quando adquiridos por intermédio de organismos multilaterais internacionais, para uso em programas de saúde pública pelo Ministério da Saúde e suas entidades vinculadas. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.190-34, de 2001) A seu turno, a Resolução em debate prescreve, em seu art. 1º, que: Art.1º Fica proibido em todo o território nacional a importação, recebimento em doação, aluguel, comercialização e o uso dos equipamentos para bronzeamento artificial, com finalidade estética, baseados na emissão de radiação ultravioleta. § 1º Os equipamentos para bronzeamento artificial considerados nesta resolução são os aparelhos emissores de radiação ultravioleta (UV) destinados ao bronzeamento artificial estético. § 2º A proibição não se aplica aos equipamentos com emissão de radiação ultravioleta, registrado ou cadastrado na ANVISA conforme regulamento sanitário aplicável, destinados a tratamento médico ou odontológico supervisionado. Da leitura dos dispositivos e esclarecimentos acima transcritos, diversamente do que defendido pela impetrante, tenho que os atos impugnados, em verdade, revelam o cumprimento do papel regulamentar da ANVISA, com o intuito de proteger e promover a saúde da população, conforme a norma instituidora da autarquia (art. 7º, III e XV da Lei nº 9.782/99). Assim, além dos produtos especificados na lei, poderá a Agência regulamentar, controlar e fiscalizar quaisquer produtos que envolvam a possibilidade de risco à saúde, submetidos a fontes de radiação, bem como “regulamentar outros produtos e serviços de interesse para o controle de riscos à saúde da população, alcançados pelo Sistema Nacional de Vigilância Sanitária” (art. 8º, § 1º, XI; e, art. 8º, § 4º). Nesse panorama, conclui-se que a ANVISA, no exercício das atribuições que lhe são conferidas por lei, pode impedir, em todo o território nacional, em caso de risco iminente à saúde, a importação, recebimento em doação, aluguel, comercialização e uso dos equipamentos para bronzeamento artificial, com finalidade estética, baseados em emissão de radiação ultravioleta. A corroborar o ora afirmado, os seguintes precedentes acerca da legalidade da Resolução RDC n. 56/2009: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. ANVISA. PODER DE POLÍCIA SANITÁRIO. DEVER DE NORMATIZAR, DISCIPLINAR, CONTROLAR, FISCALIZAR E PUNIR SERVIÇOS QUE ENVOLVAM RISCOS À VIDA E À SAÚDE. EQUIPAMENTOS PARA BRONZEAMENTO ARTIFICIAL. PROIBIÇÃO. ILICITUDE DA NORMA REGULAMENTADORA NÃO CONFIGURADA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Discute-se a nulidade da Resolução nº 56/09, editada pela ANVISA, que determina a proibição do uso de equipamentos para bronzeamento artificial, com finalidade estética. 2. A ANVISA, no exercício regular de suas atribuições legais (poder de polícia regulamentar), ao constatar que a utilização de câmaras de bronzeamento artificial, para fins meramente estéticos, oferece efetivo risco à saúde de seus usuários, não contrabalançado por qualquer vantagem significativa a justificar apenas a mera limitação do seu uso, editou a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 56, de 09/11/2009. 3. A vedação imposta na RDC ANVISA nº 56/09 não emana de meras hipóteses ou informações infundadas, mas, sim, embasadas em estudos realizados pela IARC - International Agency for Research on Cancer, órgão ligado à Organização Mundial de Saúde - OMS e especializado em pesquisas sobre o câncer. 4. Os estudos e pesquisas efetivados pela IARC foram conclusivos no sentido da relação direta da exposição aos raios ultravioletas (UV) e a ocorrência do câncer de pele, classificado o uso de equipamentos com emissão de tais raios (UV) como "carcinogênico para humanos", o que inclui as câmaras de bronzeamento artificial. A questão foi ampla e devidamente debatida com a sociedade, por meio de audiência e consultas públicas, antes da edição do ato normativo. 5. O ato normativo encontra fundamento no poder regulatório da Agência, nos termos dos artigos 6º, 7º e 8º da Lei nº 9.782/99. 6. Não se deve descurar que a questão envolve a saúde pública, restando, dessa forma, prejudicadas quaisquer alegações de restrição ao livre exercício da atividade econômica, assim como da livre iniciativa e da propriedade privada. O interesse econômico não há de prevalecer sobre o direito fundamental à saúde (Art. 196, da CF), inexistindo, assim, vulneração aos princípios constitucionais da isonomia, razoabilidade e tampouco à liberdade individual. 7. Em matéria de vigilância sanitária ANVISA possui a atribuição, legalmente conferida, de proteger a saúde da população, mediante normatização, controle e fiscalização de produtos, substâncias e serviços de interesse para a saúde, podendo, assim, restringir ou mesmo proibir o uso de determinados equipamentos que coloquem em risco o bem que objetiva proteger. 8. Apelação desprovida. (AC 1007832-36.2023.4.01.3900 - JUIZ FEDERAL ALYSSON MAIA FONTENELE (CONV.) - DÉCIMA-SEGUNDA TURMA - PJe 12/09/2023 PAG) CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. BRONZEAMENTO ARTIFICIAL. PROIBIÇÃO DE IMPORTAÇÃO, RECEBIMENTO EM DOAÇÃO, ALUGUEL, COMERCIALIZAÇÃO E USO DE EQUIPAMENTOS PARA BRONZEAMENTO ARTIFICIAL COM FINALIDADE ESTÉTICA. DISCIPLINA POR MEIO DE RESOLUÇÃO. POSSIBILIDADE. ART. 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ARTS. 6º E 7º DA LEI Nº 9.782/99. SENTENÇA MANTIDA. I - Nos termos do art. 196 da Constituição Federal, "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" II - Dispõe o art. 6º da Lei nº 9.782/99, por seu turno, que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA tem por finalidade institucional promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionadas, bem como o controle de portos, aeroportos e de fronteiras. Disciplina o inciso XV do art. 7º da mesma lei, ainda, competir àquela agência reguladora proibir a fabricação, a importação, o armazenamento, a distribuição e a comercialização de produtos e insumos, em caso de violação da legislação pertinente ou de risco iminente à saúde. III - A ANVISA, amparada em relatório da IARC - International Agency for Research on Cancer, instituição vinculada à Organização Mundial da Saúde - OMS e que considerou que a exposição aos raios ultravioletas possui evidências suficientes para considerá-la carcinogênica para humanos, além dos fundamentos de que não existem benefícios que contraponham os riscos decorrentes do uso dos equipamentos para bronzeamento artificial estético e de que não é possível determinar um nível de exposição seguro ao uso de tais equipamentos, editou, no desempenho de suas obrigações legais, a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 56/2009, proibindo em todo o território o território nacional a importação, o recebimento em doação, o aluguel, a comercialização e o uso de tais equipamentos. IV - Em sede mandamental, a concessão da segurança está vinculada à existência de prova pré-constituída do direito líquido e certo que alega o impetrante possuir, requisito não satisfeito na hipótese dos autos na medida em que os relatórios médicos que acompanham a exordial foram produzidos unilateralmente em seu exclusivo interesse, não sendo suficientes para infirmar os fundamentos técnicos que ensejaram a edição da Resolução RDC nº 56/2009 da ANVISA. V - Precedentes jurisprudenciais, sobretudo de Tribunais diversos, em sentido contrário ao entendimento firmado no sentido da legalidade da Resolução RDC nº 56/2009 não vinculam esta Corte, sendo irrelevante ao acolhimento da pretensão recursal a só alegação de que a tese recursal encontra amparo em decisões judiciais proferidas em feitos diversos. Além disso, há decisões judiciais "lato sensu" no sentido ora firmado, não havendo que se falar, também sob essa ótica, em reforma da sentença. VI - O fato de nota divulgada no sítio da Organização Mundial da Saúde - OMS sobre as camas de bronzeamento e os efeitos da exposição aos raios UV artificiais não recomendar a imediata suspensão de seu uso não impede a ANVISA, órgão competente no Brasil, de assim proceder diante de estudos técnicos que evidenciam os malefícios do bronzeamento artificial. Além disso, a ausência de recomendação expressa da suspensão do uso de camas de bronzeamento artificial para fins estéticos não gera a presunção de que são benéficas à saúde, constando expressamente daquela nota os malefícios causados pelo uso dos citados equipamentos. VII - A pretensão de reforma do ato jurisdicional questionado deve dizer respeito aos fundamentos nele lançados, não sendo relevante para a solução do caso concreto sentença proferida pela mesma magistrada, supostamente em sentido contrário, em feito que sequer é idêntico à presente demanda. VIII - Sentença mantida. Recurso de apelação interposto pela impetrante a que se nega provimento.(AC 0038129-79.2009.4.01.3400 - DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN- SEXTA TURMA, e-DJF1 03/03/2015 PAG 1711.) CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. BRONZEAMENTO ARTIFICIAL. PROIBIÇÃO DE IMPORTAÇÃO, RECEBIMENTO EM DOAÇÃO, ALUGUEL, COMERCIALIZAÇÃO E USO DE EQUIPAMENTOS PARA BRONZEAMENTO ARTIFICIAL COM FINALIDADE ESTÉTICA. DISCIPLINA POR MEIO DE RESOLUÇÃO. POSSIBILIDADE. ART. 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ARTS. 6º E 7º DA LEI Nº 9.782/99. SENTENÇA MANTIDA. I - Nos termos do art. 196 da Constituição Federal, "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" II - Dispõe o art. 6º da Lei nº 9.782/99, por seu turno, que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA tem por finalidade institucional promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionadas, bem como o controle de portos, aeroportos e de fronteiras. Disciplina o inciso XV do art. 7º da mesma lei, ainda, competir àquela agência reguladora proibir a fabricação, a importação, o armazenamento, a distribuição e a comercialização de produtos e insumos, em caso de violação da legislação pertinente ou de risco iminente à saúde. III - A ANVISA, amparada em relatório da IARC - International Agency for Research on Cancer, instituição vinculada à Organização Mundial da Saúde - OMS e que considerou que a exposição aos raios ultravioletas possui evidências suficientes para considerá-la carcinogênica para humanos, além dos fundamentos de que não existem benefícios que contraponham os riscos decorrentes do uso dos equipamentos para bronzeamento artificial estético e de que não é possível determinar um nível de exposição seguro ao uso de tais equipamentos, editou, no desempenho de suas obrigações legais, a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 56/2009, proibindo em todo o território o território nacional a importação, o recebimento em doação, o aluguel, a comercialização e o uso de tais equipamentos. IV - Em sede mandamental, a concessão da segurança está vinculada à existência de prova pré-constituída do direito líquido e certo que alega o impetrante possuir, requisito não satisfeito na hipótese dos autos na medida em que os relatórios médicos que acompanham a exordial foram produzidos unilateralmente em seu exclusivo interesse, não sendo suficientes para infirmar os fundamentos técnicos que ensejaram a edição da Resolução RDC nº 56/2009 da ANVISA. V - Precedentes jurisprudenciais, sobretudo de Tribunais diversos, em sentido contrário ao entendimento firmado no sentido da legalidade da Resolução RDC nº 56/2009 não vinculam esta Corte, sendo irrelevante ao acolhimento da pretensão recursal a só alegação de que a tese recursal encontra amparo em decisões judiciais proferidas em feitos diversos. Além disso, há decisões judiciais "lato sensu" no sentido ora firmado, não havendo que se falar, também sob essa ótica, em reforma da sentença. VI - O fato de nota divulgada no sítio da Organização Mundial da Saúde - OMS sobre as camas de bronzeamento e os efeitos da exposição aos raios UV artificiais não recomendar a imediata suspensão de seu uso não impede a ANVISA, órgão competente no Brasil, de assim proceder diante de estudos técnicos que evidenciam os malefícios do bronzeamento artificial. Além disso, a ausência de recomendação expressa da suspensão do uso de camas de bronzeamento artificial para fins estéticos não gera a presunção de que são benéficas à saúde, constando expressamente daquela nota os malefícios causados pelo uso dos citados equipamentos. VII - A pretensão de reforma do ato jurisdicional questionado deve dizer respeito aos fundamentos nele lançados, não sendo relevante para a solução do caso concreto sentença proferida pela mesma magistrada, supostamente em sentido contrário, em feito que sequer é idêntico à presente demanda. VIII - Sentença mantida. Recurso de apelação interposto pela impetrante a que se nega provimento. (AMS 0038129-79.2009.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, TRF1 - SEXTA TURMA, e-DJF1 03/03/2015 PAG 1711.) De efeito, não há dúvidas de que as exigências descritas na Resolução impugnada foram formuladas na esteira das atribuições outorgadas à ANVISA pela legislação de regência. Observo, ainda, que o princípio constitucional da livre iniciativa não inviabiliza a intervenção do Estado na atividade econômica, na medida em que o artigo 174, da Carta Magna, é expresso ao afirmar que o Estado exercerá as funções de fiscalização da atividade econômica, dada a sua condição de agente normativo e regulador da ordem econômica. Ademais, insta consignar que a questão envolve a saúde pública. Nessa perspectiva, conclui-se que o interesse econômico não há de prevalecer sobre o direito fundamental à saúde (art. 196, da CF), não havendo que se falar em vulneração aos princípios constitucionais da isonomia, razoabilidade e tampouco à liberdade individual, Não vislumbro, pois, ilegalidade na conduta adotada pela autoridade impetrada. (...) Portanto, o direito líquido e certo pretendido pela parte impetrante não merece guarida nesta via mandamental, nos termos da fundamentação supramencionada. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, DENEGO A SEGURANÇA, com fundamento no art. 487, I, do CPC. Custas pelo impetrante. Sem condenação em honorários advocatícios (artigo 25 da Lei nº 12.016/2009 e Súmulas nº 105 do STJ e nº 512 do STF). Dispensada vista dos autos ao Ministério Público Federal, ante os termos da petição em id. 2172929136. Acolho o ingresso da ANVISA. Sentença não sujeita a reexame necessário (artigo 14, § 1º, da Lei nº 12.016/2009); havendo recurso voluntário, intime-se para as contrarrazões e encaminhem-se os autos para a respectiva instância. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos. Intimem-se. Cuiabá, data da assinatura eletrônica. (assinado digitalmente) DIOGO NEGRISOLI OLIVEIRA Juiz Federal Substituto

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Processo nº 1007832-84.2025.8.13.0024

ID: 278895820

Tribunal: TJMG Órgão: 3ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública Municipal da Comarca de Belo Horizonte Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 1007832-84.2025.8.13.0024

Data de Disponibilização: 26/05/2025

Polo Ativo:

ANA PAULA FERREIRA COIMBRA RAFAEL COIMBRA E SILVA

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

SAMANTHA CAROLINE FERREIRA MOREIRA

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MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL Nº 1007832-84.2025.8.13.0024/MG IMPETRANTE : ANA PAULA FERREIRA COIMBRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) ADVOGADO(A) : SAMANTHA CAROLINE FERREIRA MOREIRA (OAB MG125578… MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL Nº 1007832-84.2025.8.13.0024/MG IMPETRANTE : ANA PAULA FERREIRA COIMBRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) ADVOGADO(A) : SAMANTHA CAROLINE FERREIRA MOREIRA (OAB MG125578) IMPETRANTE : RAFAEL COIMBRA E SILVA (Pais) ADVOGADO(A) : SAMANTHA CAROLINE FERREIRA MOREIRA (OAB MG125578) DECISÃO Vistos etc. Trata-se de MANDADO DE SEGURANÇA impetrado por RAFAEL COIMBRA E SILVA , menor impúbere, representado por sua genitora ANA PAULA FERREIRA COIMBRA , contra ato do DIRETOR DO EMEI PLANALTO, vinculado à BENEFICÊNCIA DA PREFEITURA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE/MG, todos qualificados, e com fundamento consubstanciado na exclusão do impetrante da turma de período integral para o ano letivo de 2025, em razão da adoção do critério de “sorte” para a definição das vagas, o que resultou na sua transferência de turma e professores, com a consequente ruptura do vínculo educacional e afetivo estabelecido desde 2022. O impetrante narra que, com apenas 5 (cinco) anos de idade, encontra-se regularmente matriculado na EMEI Planalto desde 2022, tendo sempre integrado a mesma turma e mantido vínculo contínuo com colegas e professoras, o que considera fundamental para seu desenvolvimento. Contudo, para o ano de 2025, a unidade escolar implementou o período integral e adotou o critério da “sorte” como única forma de seleção dos alunos contemplados com a vaga, sem considerar critérios objetivos como vulnerabilidade social, necessidade familiar ou histórico de vínculo com a turma. Em decorrência desse critério, o impetrante foi o único aluno de sua turma a não ser sorteado, o que implicará sua mudança de sala e professores, gerando forte abalo emocional, manifestado em questionamentos que revelam sentimento de exclusão e prejuízo à sua saúde emocional e autoestima. Narra o impetrante que seus pais, que se declaram atuantes na rotina escolar, expressaram estar estarrecidos com a ausência de critério objetivo na seleção e com o alegado descumprimento das diretrizes da legislação municipal, que, segundo afirmam, estabelece critérios sociais, educacionais e de vulnerabilidade para a oferta de vagas em tempo integral. Diante da situação, a representante legal do impetrante solicitou administrativamente a regularização da vaga integral, conforme protocolo nº 31.00324834/2025-71, mas o prazo para resposta, previsto para 24 de maio de 2025, é posterior ao início das aulas integrais, programado para 12 de maio de 2025. Aduz a parte impetrante que a negativa da vaga integral configura violação de direito líquido e certo ao acesso às aulas em período integral, garantido pela Constituição Federal (art. 6º e art. 208, IV e VII) e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (art. 4º, §1º), que impõem ao Estado o dever de assegurar atendimento em creche e pré-escola e a atuação prioritária na oferta de educação infantil em tempo integral quando necessário. Argumenta que a exclusão baseada unicamente na “sorte”, sem considerar os requisitos legais e a situação particular do aluno, viola os princípios da legalidade, moralidade, isonomia e dignidade da pessoa humana, especialmente por se tratar de uma criança em fase de formação. Requer a parte impetrante a concessão de tutela provisória de urgência, em caráter liminar, para que seja determinado à autoridade coatora que providencie imediatamente a vaga em período integral na EMEI Planalto, na turma originária, sob pena de multa diária, alegando a presença dos requisitos de probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. É o breve relatório. Decido. O mandado de segurança é o remédio constitucional apto a proteger direito líquido e certo, exigindo a constatação de plano do direito alegado, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando tal direito for lesado ou sofrer ameaça de lesão por ato arbitrário de autoridade. Cássio Scarpinella Bueno diz, com razão, ser o direito líquido e certo condição específica da ação de mandado de segurança. Vejamos: É o direito líquido e certo, ao lado das tradicionais condições da ação: interesse de agir, legitimidade para a causa e possibilidade jurídica do pedido, uma condição específica para que possa o mandado de segurança ser julgado em seu mérito, atendendo ou rejeitando o pedido do impetrante. Desta mesma opinião, Celso Bastos, que afirma: “direito líquido e certo é conditio sine qua non do conhecimento do mandado de segurança. 1 O exame da legalidade dos atos administrativos ou jurisdicionais em mandado de segurança é, induvidosamente, de mérito, pois não há direito líquido e certo se não houver a decretação judicial da invalidade do ato impugnado 2 . A concessão de medida liminar, que tem caráter de urgência, só se justifica quando verificados fundamentos jurídicos aceitáveis e, concomitantemente, quando a demora da decisão puder causar prejuízos ao requerente. Logo, para a apreciação do pedido liminar é imprescindível restarem demonstrados o fumus boni iuris e o periculum in mora . Por ser a ilegalidade do ato impugnado pressuposto essencial para a concessão da segurança, especialmente em sede de provimento liminar, deve ficar evidenciada de plano o direito líquido e certo que sustenta o pedido e o justo receio de irreparabilidade. É sabido que conforme disposto no art. 7º, inciso III, da Lei n.º 12.016/2009, a concessão de liminar em mandado de segurança exige a demonstração concomitante de dois requisitos: (i) a probabilidade do direito ( fumus boni juris ) e (ii) o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação ( periculum in mora ). No tocante à via eleita, o mandado de segurança revela-se cabível, nos termos do art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal e da Lei nº 12.016/2009, diante da alegação de ato administrativo ilegal que afeta direito líquido e certo da impetrante. O pedido está instruído com prova documental pré-constituída, requisito essencial à ação mandamental. No caso concreto sob exame, a análise dos elementos apresentados na petição inicial e nos documentos que a instruem revela a presença dos requisitos autorizadores para a concessão da medida de urgência pleiteada. Quanto à probabilidade do direito (fumus boni iuris), verifica-se que o direito à educação, especialmente na educação infantil, é garantia fundamental assegurada pela Constituição Federal. O art. 208, inciso IV, da Constituição Federal, estabelece como dever do Estado a garantia de atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos de idade. Complementarmente, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), em seu art. 4º, § 1º, prevê a atuação prioritária da administração pública na oferta de educação infantil em tempo integral, quando necessário. Tais dispositivos consagram o direito da criança à educação em sua plenitude, incluindo a modalidade de tempo integral, que se mostra essencial para o desenvolvimento integral do educando e para o suporte às famílias, especialmente aquelas em que os pais trabalham. Reside a controvérsia no critério adotado pela EMEI Planalto para a distribuição das vagas em período integral para o ano de 2025. A petição inicial é clara ao afirmar que a seleção se deu unicamente por meio de “sorte”, sem a observância de critérios objetivos que considerassem a situação particular das crianças e de suas famílias, como vulnerabilidade social, necessidade familiar ou o histórico de vínculo com a unidade escolar e a turma. Nesse caso, a exclusão do impetrante, que frequenta a escola desde 2022 e mantém vínculos afetivos e pedagógicos consolidados com colegas e professoras, baseada exclusivamente em um fator aleatório como a sorte, parece, em uma análise preliminar, desprovida de razoabilidade e proporcionalidade. O perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora) também se mostra evidente. A petição inicial descreve o abalo emocional sofrido pelo impetrante, que, com apenas cinco anos, manifesta sentimentos de exclusão e questiona o motivo de sua separação dos colegas e professoras com quem convive há anos. A ruptura abrupta de vínculos afetivos e pedagógicos em uma fase crucial do desenvolvimento infantil pode acarretar prejuízos significativos à sua saúde emocional, autoestima e desempenho escolar. A espera pelo julgamento final do Mandado de Segurança, que pode levar tempo considerável, agravaria a situação, consolidando a separação da turma e dos professores e tornando inócua uma eventual decisão favorável ao final do processo. Não bastasse isso, o início das aulas em período integral estava previsto para 12 de maio de 2025, data anterior ao prazo final para a resposta administrativa à solicitação da representante legal do impetrante (24 de maio de 2025). Esta defasagem temporal demonstra a urgência da medida judicial, pois a via administrativa não seria capaz de garantir o acesso do impetrante ao período integral no momento em que ele se inicia, perpetuando a situação de exclusão e os danos emocionais dela decorrentes. A necessidade de garantir a continuidade do desenvolvimento educacional e social do impetrante em um ambiente familiar e estável, sem a interrupção causada pela mudança de turma e professores, configura um perigo de dano irreparável ou de difícil reparação que justifica a intervenção judicial imediata. Além disso, a jurisprudência dos Tribunais Estaduais, especialmente deste Tribunal de Justiça de Minas Gerais, reconhece de forma reiterada o caráter subjetivo e exigível do direito à educação infantil em creche pública, independentemente da existência de disponibilidade orçamentária imediata. Vejamos: REMESSA NECESSÁRIA - MANDADO DE SEGURANÇA -MATRÍCULA EM CRECHE DA REDE PÚBLICA - DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO -- DIREITO AMPARADO PELO ORDENAMENTO JURÍDICO VIGENTE - DIREITO SUBJETIVO DA CRIANÇA - TEMA N° 548 DA REPERCUSSÃO GERAL - DEVER DO ESTADO. - A matrícula de criança de seis anos de idade em creche da rede pública é direito amparado pelo ordenamento jurídico vigente, sendo dever do Estado propiciar o acesso ao atendimento público educacional e a frequência. - É possível e adequada a intervenção do Poder Judiciário visando à efetivação do direito constitucional à educação, mormente diante a necessidade de implementação de política pública decorrente de princípio constitucional circunscrito no âmbito do denominado “mínimo existencial”, não se constituindo, pois, a manifestação jurisdicional nesse campo, em ofensa à separação de poderes, muito menos à discricionariedade da Administração Públic a. (TJMG - Remessa Necessária-Cv 1.0000.24.522884-6/001, Relator(a): Des.(a) Marcus Vinícius Mendes do Valle (JD Convocado), 19ª Câmara Cível, julgamento em 13/03/2025, publicação da súmula em 18/03/2025) Diante do exposto, em sede de juízo de cognição sumária, considerando a relevância dos fundamentos apresentados, que apontam para uma possível violação do direito fundamental à educação em tempo integral e aos princípios da legalidade, isonomia e dignidade da pessoa humana, bem como o perigo de dano iminente à saúde emocional e ao desenvolvimento educacional do impetrante, a concessão da tutela provisória de urgência é medida que se impõe. Pelo exposto, DEFIRO o pedido de assistência judiciária à parte impetrante e DEFIRO a tutela provisória de urgência pleiteada para determinar à autoridade coatora, DIRETOR DO EMEI PLANALTO, que adote as providências necessárias para garantir a matrícula e o acesso de RAFAEL COIMBRA E SILVA à turma de período integral na EMEI Planalto, mantendo-o, se possível, na turma originária com seus colegas e professores, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, a contar da intimação desta decisão, sob pena de vir a responder por improbidade administrativa dolosa e multa. Fixo multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) em caso de descumprimento da presente decisão, limitada, por ora, a 30 (trinta) dias. Intime-se, pessoalmente, a parte requerida, em atenção ao disposto na Súmula 410 do Superior Tribunal de Justiça 3 . Notifique-se a autoridade impetrada, nos termos do art. 7º, inciso I, da Lei nº 12.016/2009, para que prestem informações no prazo de 10 (dez) dias. Dê-se ciência ao órgão de representação judicial do Município de Belo Horizonte/MG, por meio da Procuradoria-Geral do Município, para que, querendo, se manifestar no feito (art. 7º, II, da Lei nº 12.016/2009). Decorrido o prazo acima, com ou sem manifestação, remetam-se os autos ao Ministério Público para que se manifeste no prazo de 10 (dez) dias, em cumprimento à regra disposta no art. 12 da Lei nº 12.016/2009. Findo este último prazo, remetam-se os autos conclusos para julgamento. Finalmente, dispenso a audiência de conciliação prevista no art. 334 do CPC, tendo em vista a natureza da lide, o rito do mandado de segurança, a indisponibilidade do direito fundamental tutelado e a necessidade de tramitação célere do feito. Intime(m)-se. Cumpra-se. Belo Horizonte/MG, data da assinatura eletrônica. 1 ALVIM, Eduardo Arruda. Mandado de Segurança no Direito Tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 103. 2 REMÉDIO, José Antônio. O Mandado de Segurança na Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 561. 3 SÚMULA N. 410-STJ – A prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.

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Processo nº 5728587-81.2024.8.09.0051

ID: 291031377

Tribunal: TJGO Órgão: 2ª Câmara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5728587-81.2024.8.09.0051

Data de Disponibilização: 06/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ALTAS HORAS 44 EMPREENDIMENTOS LTDA

Ementa

Advogados:

DIULLYANE ARRUDA DA SILVA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

EMENTA: Direito civil e do consumidor. Apelação cível. Cessão de direitos de fruição de imóvel comercial. Atraso na entrega do empreendimento. Aplicação do código de defesa do consumidor. Rescisão co… EMENTA: Direito civil e do consumidor. Apelação cível. Cessão de direitos de fruição de imóvel comercial. Atraso na entrega do empreendimento. Aplicação do código de defesa do consumidor. Rescisão contratual por culpa do fornecedor. Devolução integral dos valores pagos. Impossibilidade de retenção e de cobrança da res sperata. Recurso desprovido.I. Caso em exame1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou procedentes os pedidos iniciais formulados em ação de rescisão contratual c/c restituição de quantias pagas. O contrato em questão previa cessão de direitos de fruição de loja comercial em empreendimento cuja entrega foi prometida para 2020, mas somente ocorreu em 2021. A sentença determinou a restituição integral dos valores pagos e aplicação de multa contratual, além da condenação ao pagamento de honorários. O recorrente sustenta ausência de culpa, inaplicabilidade do CDC e requer retenção de 25% dos valores pagos ou reconhecimento da validade da cláusula de perda total, bem como a legalidade da cobrança de res sperata.II. Questão em discussão2. Há três questões em discussão: (i) saber se a relação contratual firmada entre as partes está submetida ao Código de Defesa do Consumidor; (ii) saber se houve descumprimento contratual por parte do fornecedor e se a rescisão contratual se deu por sua culpa; (iii) saber se é legítima a cláusula contratual que impõe a perda total ou parcial das quantias pagas, bem como a cobrança da denominada “res sperata”.III. Razões de decidir3. A relação jurídica entre as partes configura relação de consumo, diante da vulnerabilidade do adquirente e da ausência de habitualidade na atuação comercial, aplicando-se a teoria finalista mitigada conforme jurisprudência do STJ.4. A ausência de cláusula expressa quanto ao prazo de entrega do empreendimento constitui prática abusiva, conforme entendimento pacificado, autorizando a rescisão contratual por culpa do fornecedor.5.A cláusula que prevê retenção total ou parcial dos valores pagos pelo comprador é abusiva, pois impõe desvantagem excessiva à parte hipossuficiente.6. A cobrança da “res sperata” é ilegítima no caso concreto, uma vez que o empreendimento não possui as características legais e jurisprudenciais típicas de shopping center, conforme previsto no art. 54 da Lei nº 8.245/1991.IV. Dispositivo e tese8. Recurso conhecido e desprovido.Tese de julgamento:“1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às relações firmadas entre adquirente não profissional e fornecedor de unidade comercial, nos termos da teoria finalista mitigada.”“2. A ausência de cláusula expressa prevendo prazo certo para entrega do imóvel configura prática abusiva e impõe a rescisão contratual por culpa do fornecedor.”“3. A restituição das quantias pagas deve ser integral, imediata e em parcela única, vedada a cláusula de retenção ou perda total.”“4. A cobrança da denominada res sperata é ilegítima quando ausentes as características próprias de shopping center.”Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 2º, 3º, 39, II e V; CC, arts. 122 e 475.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.970.669/RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 4ª Turma, j. 25/4/2022; STJ, REsp 1.785.802/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 19/2/2019; STJ, AgInt no REsp 1.999.207/MT, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª Turma, j. 29/8/2022; TJGO, Apelação Cível 5529183-54.2021.8.09.0051, Rel. Des. Wilson Safatle Faiad, 3ª Câmara Cível, j. 28/6/2023. PODER JUDICIÁRIOTribunal de Justiça do Estado de GoiásGabinete do Desembargador Vicente Lopes2° Câmara Cívelgab.vicentelopes@tjgo.jus.br / 3216-2075APELAÇÃO CÍVEL Nº 5728587-81.2024.8.09.0051 2º CÂMARA CÍVELCOMARCA DE GOIÂNIAAPELANTE: ALTAS HORAS 44 EMPREENDIMENTOS LTDAAPELADA: MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA FERNANDESRELATOR: DESEMBARGADOR VICENTE LOPES EMENTA: Direito civil e do consumidor. Apelação cível. Cessão de direitos de fruição de imóvel comercial. Atraso na entrega do empreendimento. Aplicação do código de defesa do consumidor. Rescisão contratual por culpa do fornecedor. Devolução integral dos valores pagos. Impossibilidade de retenção e de cobrança da res sperata. Recurso desprovido.I. Caso em exame1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou procedentes os pedidos iniciais formulados em ação de rescisão contratual c/c restituição de quantias pagas. O contrato em questão previa cessão de direitos de fruição de loja comercial em empreendimento cuja entrega foi prometida para 2020, mas somente ocorreu em 2021. A sentença determinou a restituição integral dos valores pagos e aplicação de multa contratual, além da condenação ao pagamento de honorários. O recorrente sustenta ausência de culpa, inaplicabilidade do CDC e requer retenção de 25% dos valores pagos ou reconhecimento da validade da cláusula de perda total, bem como a legalidade da cobrança de res sperata.II. Questão em discussão2. Há três questões em discussão: (i) saber se a relação contratual firmada entre as partes está submetida ao Código de Defesa do Consumidor; (ii) saber se houve descumprimento contratual por parte do fornecedor e se a rescisão contratual se deu por sua culpa; (iii) saber se é legítima a cláusula contratual que impõe a perda total ou parcial das quantias pagas, bem como a cobrança da denominada “res sperata”.III. Razões de decidir3. A relação jurídica entre as partes configura relação de consumo, diante da vulnerabilidade do adquirente e da ausência de habitualidade na atuação comercial, aplicando-se a teoria finalista mitigada conforme jurisprudência do STJ.4. A ausência de cláusula expressa quanto ao prazo de entrega do empreendimento constitui prática abusiva, conforme entendimento pacificado, autorizando a rescisão contratual por culpa do fornecedor.5.A cláusula que prevê retenção total ou parcial dos valores pagos pelo comprador é abusiva, pois impõe desvantagem excessiva à parte hipossuficiente.6. A cobrança da “res sperata” é ilegítima no caso concreto, uma vez que o empreendimento não possui as características legais e jurisprudenciais típicas de shopping center, conforme previsto no art. 54 da Lei nº 8.245/1991.IV. Dispositivo e tese8. Recurso conhecido e desprovido.Tese de julgamento:“1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às relações firmadas entre adquirente não profissional e fornecedor de unidade comercial, nos termos da teoria finalista mitigada.”“2. A ausência de cláusula expressa prevendo prazo certo para entrega do imóvel configura prática abusiva e impõe a rescisão contratual por culpa do fornecedor.”“3. A restituição das quantias pagas deve ser integral, imediata e em parcela única, vedada a cláusula de retenção ou perda total.”“4. A cobrança da denominada res sperata é ilegítima quando ausentes as características próprias de shopping center.”Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 2º, 3º, 39, II e V; CC, arts. 122 e 475.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.970.669/RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 4ª Turma, j. 25/4/2022; STJ, REsp 1.785.802/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 19/2/2019; STJ, AgInt no REsp 1.999.207/MT, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª Turma, j. 29/8/2022; TJGO, Apelação Cível 5529183-54.2021.8.09.0051, Rel. Des. Wilson Safatle Faiad, 3ª Câmara Cível, j. 28/6/2023. ACÓRDÃO VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos do APELAÇÃO CÍVEL Nº 5728587-81.2024.8.09.0051, comarca de Goiânia, sendo apelante ALTAS HORAS 44 EMPREENDIMENTOS LTDA e apelada MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA FERNANDES. ACORDAM, os componentes da terceira Turma Julgadora da 2ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade, em conhecer e desprover o presente recurso, nos termos do voto do Relator. VOTARAM, com o Relator, os membros participantes da terceira Turma Julgadora da 2ª Câmara Cível, relacionados no Extrato de ata. PRESIDIU o julgamento o Desembargador Carlos Alberto França. PRESENTE a Procuradoria-Geral de Justiça presentada nos termos da lei e registrado no extrato da ata. Goiânia, datado e assinado eletronicamente. Desembargador Vicente LopesRelatorAPELAÇÃO CÍVEL Nº 5728587-81.2024.8.09.0051 2º CÂMARA CÍVELCOMARCA DE GOIÂNIAAPELANTE: ALTAS HORAS 44 EMPREENDIMENTOS LTDAAPELADA: MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA FERNANDESRELATOR: DESEMBARGADOR VICENTE LOPES VOTO O requerido ALTAS HORAS 44 EMPREENDIMENTOS LTDA interpõe recurso de apelação (mov. 63) contra a sentença proferida pelo Juízo 5ª UPJ das Varas Cíveis da Comarca de Goiânia, nos autos da ação de resolução contratual c/c devolução de quantias pagas e pedido de tutela de urgência ajuizada por MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA FERNANDES. I. Caso em exame Na petição inicial, a autora narrou que firmou com a ré contrato de cessão de direitos de fruição e locação comercial, com previsão de entrega do empreendimento em 2020, o que só ocorreu no final de 2021, caracterizando descumprimento contratual. Alegou tratar-se, na prática, de mútuo com venda casada de locação, pois os lojistas teriam financiado a obra em troca apenas do direito de alugar as lojas, bem como a ausência de previsão contratual quanto aos prazos da obra e a prática de propaganda enganosa em relação à data de entrega. Reclamou ainda da cobrança indevida da “res sperata” e da ausência dos benefícios típicos de um shopping center, como tenant mix adequado, o que vem gerando prejuízos e culminou na iminente venda do empreendimento em leilão. Nesse contexto, requereu, em tutela de urgência, a suspensão das cobranças e no mérito, a rescisão contratual, a restituição integral dos valores pagos, a aplicação de multa penal de 10% e, o pagamento das custas e honorários. Na sentença recorrida (mov. 60), os pedidos iniciais foram julgados procedentes, sendo declarada a rescisão contratual e o requerido condenado a restituir, em parcela única, os valores comprovadamente pagos, inclusive eventual entrada, bem como ao pagamento de multa contratual correspondente a 10% dos valores pagos, além de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. No presente recurso (mov. 63), Irresignado, o recorrente, após breve relato dos fatos, sustenta a necessidade de reforma da sentença recorrida, sob o argumento de que não ficou comprovada sua culpa exclusiva, uma vez que a rescisão contratual ocorreu por iniciativa da apelada, sendo, portanto, incabível a restituição dos valores pagos. Defende que o valor pago a título de luvas não é passível de devolução por ocasião do rompimento do vínculo, salvo se comprovado que a frustração da res sperata decorreu de culpa do empreendedor do shopping. Pondera que a retenção dos valores do caso em tela revela-se medida indispensável para a própria continuidade operacional do Shopping, cuja estrutura exige manutenção constante para garantir o funcionamento adequado do Empreendimento. Destaca a necessidade de retenção de 25% dos valores pagos, considerando que a rescisão ocorreu por culpa da apelada. Proclama a inexistência de relação de consumo, uma vez que o objeto contratual encontra disciplina específica na Lei nº 8.245/1991, e o contrato celebrado entre as partes revela que a autora adquiriu o direito de uso e fruição de loja para o desenvolvimento de atividade comercial, configurando, assim, uma relação de natureza empresarial, e não consumerista. Ao final, requer o conhecimento e provimento do presente recurso, para que seja reformada a sentença objurgada, afastando a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e reconhecendo que a rescisão contratual se deu por culpa da apelada, afastando-se, assim, a devolução dos valores pagos ou, subsidiariamente, reconhecendo o direito de retenção de 25% sobre o montante pago. II. Questão em discussão Há três questões em discussão: (i) saber se a relação contratual firmada entre as partes está submetida ao Código de Defesa do Consumidor; (ii) saber se houve descumprimento contratual por parte do fornecedor e se a rescisão contratual se deu por sua culpa (iii) saber se é legítima a cláusula contratual que impõe a perda total ou parcial das quantias pagas, bem como a cobrança da denominada “res sperata”. III. Razões de decidirIII.1 Da preliminar arguida de ofensa ao princípio da dialeticidade No que diz respeito a alegação de violação ao princípio da dialeticidade, arguido pela apelada, não o vislumbro. Pois, conforme entendimento desta corte de Justiça, afasta-se a alegação de violação ao princípio da dialeticidade quando é possível extrair das razões recursais os motivos que levaram o recorrente a buscar a reforma, como é o caso dos autos. No caso dos autos, não se verifica violação ao princípio da dialeticidade, uma vez que a recorrente impugnou de forma clara e específica os pontos abordados na decisão recorrida. Diante disso, a preliminar de irregularidade formal deve ser rejeitada. III.2 Da Admissibilidade recursal Presentes os pressupostos, conheço do apelo e passo à sua análise. III.3 Do mérito propriamente dito Em síntese, o apelante busca a reforma da sentença recorrida para que não se aplique o Código de Defesa do Consumidor e seja reconhecido que a rescisão contratual ocorreu por culpa exclusiva da apelada, afastando-se, assim, a obrigação de restituição dos valores pagos ou, alternativamente, autorizando-se a retenção de 25% sobre tais valores. Neste passo, antes de adentrarmos ao mérito propriamente dito, importa tecer alguns comentários. III.3.1 Do objeto da presente demanda Na movimentação 01, arquivo 08, verifica a juntada de contrato paritário de cessão de direitos de fruição e outras avenças, celebrado entre Altas Horas 44 SPE LTDA (cedente) e Maria Aparecida de Oliveira Fernandes (cessionária), da loja nº 473 no empreendimento Centro-Oeste Outlet, datado de 6 de dezembro de 2018, pelo valor de R$90.000,00 (noventa mil reais). Sendo acordado o pagamento com entrada de R$ 9.000,00 (nove mil reais), dividida em 4 parcelas, seguida de 18 parcelas de R$ 500,00 (quinhentos reais) e mais 48 parcelas de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais). Destaca-se que, originalmente, a loja estava identificada como nº 473; contudo, após a celebração de termo aditivo, houve a necessidade de renumeração, passando a ser identificada como loja nº 410. Nota-se que embora o contrato não contenha cláusula prevendo a entrega da obra, foi apresentado informe publicitário e print da página do instagram do empreendimento, com promessa de conclusão no ano de 2020 (mov. 01, arquivos 12 e 13). Ainda, na movimentação 01, arquivos 14 a 16, foram anexadas notícias dando conta de que o empreendimento seria levado a leilão em razão de uma dívida existente entre Altas Horas e a empresa Remo Incorporadora e Empreendimentos. Feitos tais esclarecimentos passo ao julgamento do mérito propriamente dito. III.3.2 Da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor O recorrente alega ser inaplicável o Código de Defesa do Consumidor ao caso, sustentando que não há relação de consumo, pois o contrato firmado trata do uso de loja para atividade comercial, regido pela Lei nº 8.245/1991, caracterizando relação empresarial, contudo, razão não lhe assiste. Explico. Cumpre esclarecer que o fato de o contrato discutido nos autos ter por objeto imóvel destinado à instalação de estabelecimento comercial ou para fins de investimento, por si só, não afasta a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Deste modo, a exclusão da norma protetiva apenas se justificaria se restasse comprovado que o adquirente atua de forma habitual e profissional na atividade de investimento, o que não ocorreu no caso em exame. Conforme jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça, o adquirente de unidade imobiliária, ainda que não seja o destinatário final do bem como nos casos em que visa investir ou obter lucro, pode ser amparado pelo Código de Defesa do Consumidor, com base na teoria finalista mitigada. Isso se aplica quando atua de boa-fé e não possui conhecimento técnico ou experiência no mercado imobiliário, tampouco em incorporação, construção ou comercialização de imóveis, revelando situação de vulnerabilidade. Assim, a legislação consumerista também alcança o investidor eventual (consumidor investidor). No mesmo sentido, atentemos: (...)2. É incontroversa a existência de relação de consumo entre as partes, já que presentes tanto a figura do fornecedor, representado pela empreendedora imobiliária, como do consumidor, que contratou a entrega de produto (imóvel) na condição de destinatário final, a teor das disposições do CDC. 3. Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o adquirente de unidade imobiliária, sendo ou não o destinatário final do bem, ou seja, ainda que possua o intuito de investir ou auferir lucro, poderá encontrar abrigo da legislação consumerista com base na teoria finalista mitigada, se tiver agido de boa-fé e não detiver conhecimentos de mercado imobiliário nem expertise em incorporação, construção e venda de imóveis, tendo em vista que evidente a sua vulnerabilidade. (...). APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - Apelação Cível: 55953251020208090137 Rel. Des(a).Kisleu Dias Maciel Filho, Data de Publicação:DJ de 29/01/2024). No caso dos autos, de plano, verifico evidente a existência de relação de consumo entre as partes, já que presentes a figura do fornecedor, representado pelo apelante, e do consumidor o qual contratou a entrega de produto (imóvel), a teor das disposições do Código de Defesa do Consumidor. Vejamos: “Art. 2º – Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. (…) “Art. 3º – Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção e transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.” Sobre o tema, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça e esta Corte de Justiça: “PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. CDC. AFASTAMENTO. NECESSIDADE DE VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS DE RELAÇÃO CONSUMERISTA. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. MORA DA VENDEDORA. DESCARACTERIZAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 7/STJ. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA N. 83/STJ. CLÁUSULA PENAL. INVERSÃO. POSSIBILIDADE. SÚMULA N. 83/STJ. DECISÃO MANTIDA. (…) 4. Segundo a jurisprudência do STJ, o adquirente de unidade imobiliária, mesmo não sendo o destinatário final do bem e apenas possuindo o intuito de investir ou auferir lucro, poderá encontrar abrigo da legislação consumerista com base na teoria finalista mitigada se tiver agido de boa fé e não detiver conhecimentos de mercado imobiliário nem expertise em incorporação, construção e venda de imóveis, sendo evidente a sua vulnerabilidade. Em outras palavras, o CDC poderá ser utilizado para amparar concretamente o investidor ocasional (figura do consumidor investidor) (REsp n. 1.785.802/SP, Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/2/2019, DJe 6/3/2019), o quefoi observado pela Corte local. (…) 7. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ, AgInt no AREsp n. 1.970.669/RJ, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 25/4/2022, DJe de 28/4/2022). Nesse passo, é incontestável a incidência das normas consumeristas no caso em análise, não sendo cabível a reforma da sentença nesse ponto. III.3.3 Da causa a rescisão contratual e a impossibilidade de retenção dos 25% Sustenta o apelante que a rescisão contratual no caso dos autos se deu por vontade da apelada, o que novamente não se sustenta. Em sua peça de ingresso, a autora/recorrida diz ter celebrado com a construtora apelante, em 06/12/2018 “Contrato Paritário de Cessão de Direitos de Fruição e Outras Avenças” para que pudesse usufruir de uma loja no empreendimento Centro-Oeste Outlet. A recorrida pretendeu a rescisão do contrato em razão do atraso na entrega do empreendimento, pois, malgrado a avença não previsse data para a sua conclusão, foi-lhe indicada a data provável em 2020, conforme propagandas acostadas (mov.01). No entanto, a construtora recorrente assevera em sua contestação (mov. 48) que a “requerente alega atraso na entrega da loja, porém o empreendimento foi inaugurado em outubro/2021, e desde então a requerente se encontra na posse da loja. “ Ressalta-se que ainda que a Cláusula Primeira, parágrafo primeiro do contrato (mov. 1, arquivo 7) não estipula a data do início das obras ou de entrega do empreendimento Centro-Oeste Outlet, pois se limita a prever que “O(a) cessionário(a) declara estar ciente que o empreendimento será construído progressivamente por etapas, com datas de entregas diferentes para cada fase, bem como, o projeto arquitetônico poderá sofrer adequações, alterações e modificações em razão de exigências legais, de autorizações, alvarás e concessões do Município de Goiânia/GO, bem como, em razão da viabilidade econômica e mercadológica do Empreendimento, sem que isso lhe represente qualquer dano passível de qualquer reparação ou indenização”. Imperativa, nesse caso, a aplicação analógica do entendimento sedimentado do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que, na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deve prever, de modo expresso, claro e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel. Confira-se: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃODECLARATÓRIA C/C CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE RÉ. 1. O entendimento do Tribunal de piso destoa da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, consolidada em sede de julgamento recurso repetitivo representativo de controvérsia (Tema 996), ‘1.1. Na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deverá estabelecer, de forma clara, expressa e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel, o qual não poderá estar vinculado à concessão do financiamento, ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância’. (REsp 1729593/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 25/09/2019, DJe 27/09/2019) 2. Agravo interno desprovido.” (STJ, AgInt no REsp n. 1.999.207/MT, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 29/8/2022, DJe de 1/9/2022.) Nesse contexto, a ausência de estipulação contratual sobre o prazo de entrega do imóvel configura a prática abusiva vedada expressamente pelo inciso II do art. 39 do CDC: “Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério.” Em outro vértice, não merece préstimo a alegação da insurgente de que se trata de cessão de direito de fruição sob condição, vinculado a evento futuro e incerto ou “consoante viabilidade econômica e mercadológica”, porque, mesmo nesses casos, é vedada a estipulação de condição que se sujeita ao puro arbítrio de uma das partes ou que privar de todo efeito o negócio jurídico, nos termos do art. 122 do Código Civil: “Art. 122. São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes”. Sobre o dispositivo, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery lecionam: “5. Condição puramente potestativa. Mero arbitrium, vedado. Ilicitude. Diz-se puramente potestativa a condição se, para seu implemento, bastar a volição exclusiva e arbitrária de uma das partes, que pode obstá-lo ou ensejá-lo. Caracteriza-se quando houver a cláusula si volam (‘se eu quiser’). As condições potestativas ilícitas são aquelas que subordinam a eficácia a mero capricho de uma das partes, retirando-lhe, por consequência, a seriedade (v. Maluf. Condições², p. 37). É puramente potestativa a condição que faz a eficácia do contrato depender de uma simples e arbitrária declaração de vontade de uma das partes contratantes, seja para produzir (condição suspensiva), seja para conservar (condição resolutiva) os efeitos por elas previstos. Neste sentido: Campos. Dir.Civ., p. 16. Na condição puramente potestativa desaparece qualquer vínculo volitivo entre as partes e, por conseguinte, desaparece a vinculação de um sujeito a outro, reduzindo-se uma das partes à mera sujeição do domínio da vontade alheia. [...]” (in Código Civil Comentado, 14ª ed., São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022, p. 417). Dessarte, a construtora recorrente não poderia vender ou ceder o objeto do contrato sem data estipulada para a sua entrega, porquanto impõe restrição abusiva e desproporcional ao comprador, que sequer é informado acerca de quando a obra seria efetivamente entregue. Na hipótese em disceptação, a entrega do empreendimento é relegada ao exclusivo arbítrio e querer da construtora recorrente. Em síntese, ainda que se alegue atraso em razão da pandemia de Covid-19, tal justificativa não se sustenta, pois a construção civil foi considerada atividade essencial pelo Decreto Estadual nº 9.653/2020, não tendo sofrido paralisação ou restrições que justificassem o descumprimento do prazo contratual. “CONTRATO. Ação de rescisão contratual. Sentença de procedência. Interposição de apelação pela ré. […]. Alegação de que o atraso na entrega da unidade imobiliária teria sido ocasionado pelos impactos da pandemia de Covid-19 não se mostra verossímil, uma vez que a aludida pandemia não impediu o prosseguimento das atividades de construção civil no âmbito do Estado de São Paulo, pois estas não foram suspensas ou limitadas, tendo apenas que observar as exigências sanitárias de prevenção previstas no artigo 2º, § 2º, do Decreto Estadual nº 64.881/2020, e no artigo 3º do Decreto Estadual nº 64.864/20, bem como na Deliberação nº 2 do Comitê Administrativo Extraordinário Covid-19, criado pelo Governo do Estado de São Paulo. […]. Apelação não provida.” (TJSP, AC 10059890520218260302 SP 1005989-05.2021.8.26.0302, Relator: Carlos Dias Motta, Data de Julgamento: 05/05/2022, 26ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/05/2022).” Do que se conclui ser clarividente a violação ao princípio da boa-fé objetiva, restando configurado o descumprimento contratual por culpa da vendedora recorrente. Inaplicável, portanto, a Cláusula Terceira, Parágrafo Sétimo, do contrato, que prevê a rescisão contratual por culpa do cessionário (autora/apelada) e a perda de todas as importâncias pagas. Nesse sentido, notemos: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE RESCISÃO CONTRATUAL c/c DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS. CONTRATO DE CESSÃO DE DIREITOS DE FRUIÇÃO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL DE ENTREGA DA OBRA. ABUSIVIDADE. RESCISÃO POR CULPA DO CONTRATADO. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DAS PARCELAS PAGAS PELO CONTRATANTE. 1. Em que pese o instrumento contratual indique que o empreendimento seria construído progressivamente por etapas, com datas diferentes de entrega em casa fase consoante viabilidade econômica e mercadológica, a ausência de datas previstas para entrega das obras é considerada abusiva. 2. Tal conduta representa clara violação ao princípio da boa-fé objetiva, restando configurado o descumprimento contratual por culpa da vendedora, e impondo-se a rescisão do contrato, com a devolução das importâncias pagas pelo comprador, nos termos do art. 475, CC. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA.” (TJGO, Apelação Cível 5498473-51.2021.8.09.0051, Rel. Desembargador JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA, 2ª Câmara Cível, julgado em 25/01/2023, DJe de 25/01/2023).” EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE FRUIÇÃO ESPAÇO COMERCIAL. APLICAÇÃO DO CDC . AUSÊNCIA DE PRAZO CERTO PARA ENTREGA DO EMPREENDIMENTO. ABUSIVIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR . PANDEMIA DA COVID-19. INOCORRÊNCIA. RESCISÃO CONTRATUAL. CULPA DA PROMITENTE VENDEDORA . RESTITUIÇÃO INTEGRAL E IMEDIATA DOS VALORES PAGOS. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. O Superior Tribunal de Justiça perfilha o posicionamento de que se admite a utilização do Código de Defesa do Consumidor para amparar, concretamente, o investidor ocasional (figura do consumidor investidor), pois ele não desenvolve a atividade de investimento de maneira reiterada e profissional . (STJ, REsp n. 2.021.711/RS, DJe de 23/3/2023) . 2. Conforme entendimento do STJ, na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deve prever, de modo expresso, claro e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel. 3. Durante a quarentena decretada pelo Estado de Goiás, a construção civil foi considerada serviço essencial pelo art . 2º, § 1º, XXIII, do Decreto Estadual n. 9.653, de 19/04/2020, de forma que, por não sofrer paralisação ou limitação, não pode ser usada de justificativa para o atraso na entrega do imóvel. 4 . A ausência de estipulação contratual sobre o prazo de entrega do imóvel configura nítida prática abusiva e ofensa aos termos do art. 39, XII, CDC, e art. 122 do Código Civil. Tal conduta representa clara violação ao princípio da boa-fé objetiva, restando configurado o descumprimento contratual por culpa da vendedora e impondo-se a rescisão do contrato, com a devolução das importâncias pagas pelo comprador . APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA.(TJ-GO 5529183-54.2021.8 .09.0051, Relator.: DESEMBARGADOR WILSON SAFATLE FAIAD, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: 28/06/2023) Ressalta-se, ainda, as propagandas juntadas aos autos, bem como as postagens publicadas na própria página do Instagram do empreendimento, nas quais consta previsão de entrega para o ano de 2020 (mov. 01). Contudo, conforme reconhecido pelo próprio recorrente em sua contestação (mov. 48, arquivo 01, fl. 03), o empreendimento somente foi inaugurado em outubro de 2021. Diante de todo o exposto, resta claro que a rescisão do contrato se deu por culpa exclusiva da construtora apelante. A ausência de estipulação contratual quanto ao prazo de entrega evidencia conduta abusiva e contrária à boa-fé objetiva, impondo ônus excessivo à parte adquirente. Ademais, o fato de a loja atualmente estar em funcionamento não afasta o direito da autora à rescisão, pois não sana o vício original da contratação nem convalida o atraso injustificado na entrega do empreendimento. Assim, impõe-se a restituição integral, imediata e em parcela única de todos os valores pagos pela autora/recorrida, sem qualquer retenção. III.3.4 Da cobrança res sperata O recorrente sustenta a necessidade de reforma da sentença para que seja determinada a retenção dos valores referentes à res sperata; contudo, não lhe assiste razão. Preliminarmente, importa destacar, como bem pontuado pelo juízo singular, que “a cobrança da "res sperata", não se justifica no presente caso. A "res sperata" é admitida apenas em shopping centers, que possuem características específicas, como a existência de lojas âncoras, tenant mix e administração única. O empreendimento da Ré, contudo, não se enquadra no conceito de shopping center, funcionando como um estabelecimento comercial com características de feira. Assim, a cobrança da "res sperata" é indevida, configurando vantagem manifestamente excessiva, nos termos do artigo 39, V, do CDC.” Nesse contexto, o art. 54 da Lei nº 8.245/91, que regula as relações entre lojistas e empreendedores de shopping centers, dispõe que nelas prevalecerão as condições livremente pactuadas nos contratos de locação respectivos, além das disposições procedimentais previstas na própria lei. Os contratos típicos de shopping center contêm cláusulas especiais, relacionadas ao interesse do empreendedor no êxito do comércio exercido pelo lojista, à imposição do ramo a ser explorado, à responsabilidade por despesas diversas (inclusive de publicidade), à fixação de retribuição sobre o faturamento e à fiscalização da contabilidade do inquilino. Dentre essas obrigações, destaca-se o pagamento da denominada res sperata (coisa esperada), destinada a remunerar as vantagens de se estabelecer em um complexo comercial com clientela já formada. Trata-se de contraprestação legítima apenas quando o locador integra um empreendimento qualificado como shopping center. Entretanto, conforme comprovado nos autos, o Apelante não está vinculado à Associação Brasileira de Shopping Centers (ABRASCE) — conforme consulta ao guia oficial disponível em: https://abrasce.com.br/guia-de-shoppings/?state=GO&city=Goi%C3%A2nia&letter= — o que reforça a inexistência de requisitos para a cobrança da res sperata. A jurisprudência do TJGO é firme nesse sentido: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULAS DE CONTRATO C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES. RES SPERATA. COBRANÇA RESTRITA A SHOPPING CENTER. EMPREENDIMENTO COM CARACTERÍSTICA DE FEIRA. ALTERAÇÃO CONTRATUAL ULTERIOR À PACTUAÇÃO LOCATÍCIA. RESTITUIÇÃO DEVIDA. CLÁUSULA DE RENÚNCIA AO DIREITO DE AÇÃO. NULIDADE. 1. A exigência da res sperata é admitida, tão somente, em se tratando de locações de shopping center, assim, o não enquadramento da apelante nesta condição, à época do contrato firmado entre as partes, impõe a nulidade da cláusula que a estipulou. 2. O empreendimento, inicialmente conhecido como Feira da Estação, só foi inserido na categoria de Shopping Center, recebendo o selo da ABRASCE (Associação Brasileira de Shopping Centers), em dezembro de 2014. 3. Constatada que tanto a filiação quanto a mudança do estatuto são ulteriores à assinatura do contrato locatício firmado entre os litigantes (2013), não há que se falar em validade da res sperata, por não poder retroagir para legitimar uma cláusula nula ao tempo da pactuação. 5. Declarada a ilegalidade da cláusula que prevê o pagamento da res sperata, faz jus a apelada à restituição da importância paga a esse título. (...) APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. Acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pela Quinta Turma Julgadora de sua Quarta Câmara Cível, à unanimidade de votos, em CONHECER DA APELAÇÃO CÍVEL E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. (TJGO, Apelação Cível 5383591-13.2020.8.09.0051, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR DELINTRO BELO DE ALMEIDA FILHO, 4ª Câmara Cível, julgado em 16/04/2024, DJe de 16/04/2024).” Diante do exposto, mantém-se a sentença quanto à vedação da cobrança da res sperata, por ausência dos requisitos legais que a autorizem. IV. Dispositivo Isso posto, CONHEÇO DA APELAÇÃO CÍVEL e NEGO-LHE provimento. Por conseguido, desprovido o recurso, majoro os honorários advocatícios de sucumbência para 13% (treze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. É o voto. Goiânia, datado e assinado digitalmente. Desembargador Vicente LopesRelator

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Processo nº 5728587-81.2024.8.09.0051

ID: 291031425

Tribunal: TJGO Órgão: 2ª Câmara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5728587-81.2024.8.09.0051

Data de Disponibilização: 06/06/2025

Polo Ativo:

MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA FERNANDES

Polo Passivo:

Ementa

Advogados:

BRUNO WINICIUS QUEIROZ DE MORAIS

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

EMENTA: Direito civil e do consumidor. Apelação cível. Cessão de direitos de fruição de imóvel comercial. Atraso na entrega do empreendimento. Aplicação do código de defesa do consumidor. Rescisão co… EMENTA: Direito civil e do consumidor. Apelação cível. Cessão de direitos de fruição de imóvel comercial. Atraso na entrega do empreendimento. Aplicação do código de defesa do consumidor. Rescisão contratual por culpa do fornecedor. Devolução integral dos valores pagos. Impossibilidade de retenção e de cobrança da res sperata. Recurso desprovido.I. Caso em exame1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou procedentes os pedidos iniciais formulados em ação de rescisão contratual c/c restituição de quantias pagas. O contrato em questão previa cessão de direitos de fruição de loja comercial em empreendimento cuja entrega foi prometida para 2020, mas somente ocorreu em 2021. A sentença determinou a restituição integral dos valores pagos e aplicação de multa contratual, além da condenação ao pagamento de honorários. O recorrente sustenta ausência de culpa, inaplicabilidade do CDC e requer retenção de 25% dos valores pagos ou reconhecimento da validade da cláusula de perda total, bem como a legalidade da cobrança de res sperata.II. Questão em discussão2. Há três questões em discussão: (i) saber se a relação contratual firmada entre as partes está submetida ao Código de Defesa do Consumidor; (ii) saber se houve descumprimento contratual por parte do fornecedor e se a rescisão contratual se deu por sua culpa; (iii) saber se é legítima a cláusula contratual que impõe a perda total ou parcial das quantias pagas, bem como a cobrança da denominada “res sperata”.III. Razões de decidir3. A relação jurídica entre as partes configura relação de consumo, diante da vulnerabilidade do adquirente e da ausência de habitualidade na atuação comercial, aplicando-se a teoria finalista mitigada conforme jurisprudência do STJ.4. A ausência de cláusula expressa quanto ao prazo de entrega do empreendimento constitui prática abusiva, conforme entendimento pacificado, autorizando a rescisão contratual por culpa do fornecedor.5.A cláusula que prevê retenção total ou parcial dos valores pagos pelo comprador é abusiva, pois impõe desvantagem excessiva à parte hipossuficiente.6. A cobrança da “res sperata” é ilegítima no caso concreto, uma vez que o empreendimento não possui as características legais e jurisprudenciais típicas de shopping center, conforme previsto no art. 54 da Lei nº 8.245/1991.IV. Dispositivo e tese8. Recurso conhecido e desprovido.Tese de julgamento:“1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às relações firmadas entre adquirente não profissional e fornecedor de unidade comercial, nos termos da teoria finalista mitigada.”“2. A ausência de cláusula expressa prevendo prazo certo para entrega do imóvel configura prática abusiva e impõe a rescisão contratual por culpa do fornecedor.”“3. A restituição das quantias pagas deve ser integral, imediata e em parcela única, vedada a cláusula de retenção ou perda total.”“4. A cobrança da denominada res sperata é ilegítima quando ausentes as características próprias de shopping center.”Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 2º, 3º, 39, II e V; CC, arts. 122 e 475.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.970.669/RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 4ª Turma, j. 25/4/2022; STJ, REsp 1.785.802/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 19/2/2019; STJ, AgInt no REsp 1.999.207/MT, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª Turma, j. 29/8/2022; TJGO, Apelação Cível 5529183-54.2021.8.09.0051, Rel. Des. Wilson Safatle Faiad, 3ª Câmara Cível, j. 28/6/2023. PODER JUDICIÁRIOTribunal de Justiça do Estado de GoiásGabinete do Desembargador Vicente Lopes2° Câmara Cívelgab.vicentelopes@tjgo.jus.br / 3216-2075APELAÇÃO CÍVEL Nº 5728587-81.2024.8.09.0051 2º CÂMARA CÍVELCOMARCA DE GOIÂNIAAPELANTE: ALTAS HORAS 44 EMPREENDIMENTOS LTDAAPELADA: MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA FERNANDESRELATOR: DESEMBARGADOR VICENTE LOPES EMENTA: Direito civil e do consumidor. Apelação cível. Cessão de direitos de fruição de imóvel comercial. Atraso na entrega do empreendimento. Aplicação do código de defesa do consumidor. Rescisão contratual por culpa do fornecedor. Devolução integral dos valores pagos. Impossibilidade de retenção e de cobrança da res sperata. Recurso desprovido.I. Caso em exame1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou procedentes os pedidos iniciais formulados em ação de rescisão contratual c/c restituição de quantias pagas. O contrato em questão previa cessão de direitos de fruição de loja comercial em empreendimento cuja entrega foi prometida para 2020, mas somente ocorreu em 2021. A sentença determinou a restituição integral dos valores pagos e aplicação de multa contratual, além da condenação ao pagamento de honorários. O recorrente sustenta ausência de culpa, inaplicabilidade do CDC e requer retenção de 25% dos valores pagos ou reconhecimento da validade da cláusula de perda total, bem como a legalidade da cobrança de res sperata.II. Questão em discussão2. Há três questões em discussão: (i) saber se a relação contratual firmada entre as partes está submetida ao Código de Defesa do Consumidor; (ii) saber se houve descumprimento contratual por parte do fornecedor e se a rescisão contratual se deu por sua culpa; (iii) saber se é legítima a cláusula contratual que impõe a perda total ou parcial das quantias pagas, bem como a cobrança da denominada “res sperata”.III. Razões de decidir3. A relação jurídica entre as partes configura relação de consumo, diante da vulnerabilidade do adquirente e da ausência de habitualidade na atuação comercial, aplicando-se a teoria finalista mitigada conforme jurisprudência do STJ.4. A ausência de cláusula expressa quanto ao prazo de entrega do empreendimento constitui prática abusiva, conforme entendimento pacificado, autorizando a rescisão contratual por culpa do fornecedor.5.A cláusula que prevê retenção total ou parcial dos valores pagos pelo comprador é abusiva, pois impõe desvantagem excessiva à parte hipossuficiente.6. A cobrança da “res sperata” é ilegítima no caso concreto, uma vez que o empreendimento não possui as características legais e jurisprudenciais típicas de shopping center, conforme previsto no art. 54 da Lei nº 8.245/1991.IV. Dispositivo e tese8. Recurso conhecido e desprovido.Tese de julgamento:“1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às relações firmadas entre adquirente não profissional e fornecedor de unidade comercial, nos termos da teoria finalista mitigada.”“2. A ausência de cláusula expressa prevendo prazo certo para entrega do imóvel configura prática abusiva e impõe a rescisão contratual por culpa do fornecedor.”“3. A restituição das quantias pagas deve ser integral, imediata e em parcela única, vedada a cláusula de retenção ou perda total.”“4. A cobrança da denominada res sperata é ilegítima quando ausentes as características próprias de shopping center.”Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 2º, 3º, 39, II e V; CC, arts. 122 e 475.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.970.669/RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 4ª Turma, j. 25/4/2022; STJ, REsp 1.785.802/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 19/2/2019; STJ, AgInt no REsp 1.999.207/MT, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª Turma, j. 29/8/2022; TJGO, Apelação Cível 5529183-54.2021.8.09.0051, Rel. Des. Wilson Safatle Faiad, 3ª Câmara Cível, j. 28/6/2023. ACÓRDÃO VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos do APELAÇÃO CÍVEL Nº 5728587-81.2024.8.09.0051, comarca de Goiânia, sendo apelante ALTAS HORAS 44 EMPREENDIMENTOS LTDA e apelada MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA FERNANDES. ACORDAM, os componentes da terceira Turma Julgadora da 2ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade, em conhecer e desprover o presente recurso, nos termos do voto do Relator. VOTARAM, com o Relator, os membros participantes da terceira Turma Julgadora da 2ª Câmara Cível, relacionados no Extrato de ata. PRESIDIU o julgamento o Desembargador Carlos Alberto França. PRESENTE a Procuradoria-Geral de Justiça presentada nos termos da lei e registrado no extrato da ata. Goiânia, datado e assinado eletronicamente. Desembargador Vicente LopesRelatorAPELAÇÃO CÍVEL Nº 5728587-81.2024.8.09.0051 2º CÂMARA CÍVELCOMARCA DE GOIÂNIAAPELANTE: ALTAS HORAS 44 EMPREENDIMENTOS LTDAAPELADA: MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA FERNANDESRELATOR: DESEMBARGADOR VICENTE LOPES VOTO O requerido ALTAS HORAS 44 EMPREENDIMENTOS LTDA interpõe recurso de apelação (mov. 63) contra a sentença proferida pelo Juízo 5ª UPJ das Varas Cíveis da Comarca de Goiânia, nos autos da ação de resolução contratual c/c devolução de quantias pagas e pedido de tutela de urgência ajuizada por MARIA APARECIDA DE OLIVEIRA FERNANDES. I. Caso em exame Na petição inicial, a autora narrou que firmou com a ré contrato de cessão de direitos de fruição e locação comercial, com previsão de entrega do empreendimento em 2020, o que só ocorreu no final de 2021, caracterizando descumprimento contratual. Alegou tratar-se, na prática, de mútuo com venda casada de locação, pois os lojistas teriam financiado a obra em troca apenas do direito de alugar as lojas, bem como a ausência de previsão contratual quanto aos prazos da obra e a prática de propaganda enganosa em relação à data de entrega. Reclamou ainda da cobrança indevida da “res sperata” e da ausência dos benefícios típicos de um shopping center, como tenant mix adequado, o que vem gerando prejuízos e culminou na iminente venda do empreendimento em leilão. Nesse contexto, requereu, em tutela de urgência, a suspensão das cobranças e no mérito, a rescisão contratual, a restituição integral dos valores pagos, a aplicação de multa penal de 10% e, o pagamento das custas e honorários. Na sentença recorrida (mov. 60), os pedidos iniciais foram julgados procedentes, sendo declarada a rescisão contratual e o requerido condenado a restituir, em parcela única, os valores comprovadamente pagos, inclusive eventual entrada, bem como ao pagamento de multa contratual correspondente a 10% dos valores pagos, além de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. No presente recurso (mov. 63), Irresignado, o recorrente, após breve relato dos fatos, sustenta a necessidade de reforma da sentença recorrida, sob o argumento de que não ficou comprovada sua culpa exclusiva, uma vez que a rescisão contratual ocorreu por iniciativa da apelada, sendo, portanto, incabível a restituição dos valores pagos. Defende que o valor pago a título de luvas não é passível de devolução por ocasião do rompimento do vínculo, salvo se comprovado que a frustração da res sperata decorreu de culpa do empreendedor do shopping. Pondera que a retenção dos valores do caso em tela revela-se medida indispensável para a própria continuidade operacional do Shopping, cuja estrutura exige manutenção constante para garantir o funcionamento adequado do Empreendimento. Destaca a necessidade de retenção de 25% dos valores pagos, considerando que a rescisão ocorreu por culpa da apelada. Proclama a inexistência de relação de consumo, uma vez que o objeto contratual encontra disciplina específica na Lei nº 8.245/1991, e o contrato celebrado entre as partes revela que a autora adquiriu o direito de uso e fruição de loja para o desenvolvimento de atividade comercial, configurando, assim, uma relação de natureza empresarial, e não consumerista. Ao final, requer o conhecimento e provimento do presente recurso, para que seja reformada a sentença objurgada, afastando a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e reconhecendo que a rescisão contratual se deu por culpa da apelada, afastando-se, assim, a devolução dos valores pagos ou, subsidiariamente, reconhecendo o direito de retenção de 25% sobre o montante pago. II. Questão em discussão Há três questões em discussão: (i) saber se a relação contratual firmada entre as partes está submetida ao Código de Defesa do Consumidor; (ii) saber se houve descumprimento contratual por parte do fornecedor e se a rescisão contratual se deu por sua culpa (iii) saber se é legítima a cláusula contratual que impõe a perda total ou parcial das quantias pagas, bem como a cobrança da denominada “res sperata”. III. Razões de decidirIII.1 Da preliminar arguida de ofensa ao princípio da dialeticidade No que diz respeito a alegação de violação ao princípio da dialeticidade, arguido pela apelada, não o vislumbro. Pois, conforme entendimento desta corte de Justiça, afasta-se a alegação de violação ao princípio da dialeticidade quando é possível extrair das razões recursais os motivos que levaram o recorrente a buscar a reforma, como é o caso dos autos. No caso dos autos, não se verifica violação ao princípio da dialeticidade, uma vez que a recorrente impugnou de forma clara e específica os pontos abordados na decisão recorrida. Diante disso, a preliminar de irregularidade formal deve ser rejeitada. III.2 Da Admissibilidade recursal Presentes os pressupostos, conheço do apelo e passo à sua análise. III.3 Do mérito propriamente dito Em síntese, o apelante busca a reforma da sentença recorrida para que não se aplique o Código de Defesa do Consumidor e seja reconhecido que a rescisão contratual ocorreu por culpa exclusiva da apelada, afastando-se, assim, a obrigação de restituição dos valores pagos ou, alternativamente, autorizando-se a retenção de 25% sobre tais valores. Neste passo, antes de adentrarmos ao mérito propriamente dito, importa tecer alguns comentários. III.3.1 Do objeto da presente demanda Na movimentação 01, arquivo 08, verifica a juntada de contrato paritário de cessão de direitos de fruição e outras avenças, celebrado entre Altas Horas 44 SPE LTDA (cedente) e Maria Aparecida de Oliveira Fernandes (cessionária), da loja nº 473 no empreendimento Centro-Oeste Outlet, datado de 6 de dezembro de 2018, pelo valor de R$90.000,00 (noventa mil reais). Sendo acordado o pagamento com entrada de R$ 9.000,00 (nove mil reais), dividida em 4 parcelas, seguida de 18 parcelas de R$ 500,00 (quinhentos reais) e mais 48 parcelas de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais). Destaca-se que, originalmente, a loja estava identificada como nº 473; contudo, após a celebração de termo aditivo, houve a necessidade de renumeração, passando a ser identificada como loja nº 410. Nota-se que embora o contrato não contenha cláusula prevendo a entrega da obra, foi apresentado informe publicitário e print da página do instagram do empreendimento, com promessa de conclusão no ano de 2020 (mov. 01, arquivos 12 e 13). Ainda, na movimentação 01, arquivos 14 a 16, foram anexadas notícias dando conta de que o empreendimento seria levado a leilão em razão de uma dívida existente entre Altas Horas e a empresa Remo Incorporadora e Empreendimentos. Feitos tais esclarecimentos passo ao julgamento do mérito propriamente dito. III.3.2 Da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor O recorrente alega ser inaplicável o Código de Defesa do Consumidor ao caso, sustentando que não há relação de consumo, pois o contrato firmado trata do uso de loja para atividade comercial, regido pela Lei nº 8.245/1991, caracterizando relação empresarial, contudo, razão não lhe assiste. Explico. Cumpre esclarecer que o fato de o contrato discutido nos autos ter por objeto imóvel destinado à instalação de estabelecimento comercial ou para fins de investimento, por si só, não afasta a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Deste modo, a exclusão da norma protetiva apenas se justificaria se restasse comprovado que o adquirente atua de forma habitual e profissional na atividade de investimento, o que não ocorreu no caso em exame. Conforme jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça, o adquirente de unidade imobiliária, ainda que não seja o destinatário final do bem como nos casos em que visa investir ou obter lucro, pode ser amparado pelo Código de Defesa do Consumidor, com base na teoria finalista mitigada. Isso se aplica quando atua de boa-fé e não possui conhecimento técnico ou experiência no mercado imobiliário, tampouco em incorporação, construção ou comercialização de imóveis, revelando situação de vulnerabilidade. Assim, a legislação consumerista também alcança o investidor eventual (consumidor investidor). No mesmo sentido, atentemos: (...)2. É incontroversa a existência de relação de consumo entre as partes, já que presentes tanto a figura do fornecedor, representado pela empreendedora imobiliária, como do consumidor, que contratou a entrega de produto (imóvel) na condição de destinatário final, a teor das disposições do CDC. 3. Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o adquirente de unidade imobiliária, sendo ou não o destinatário final do bem, ou seja, ainda que possua o intuito de investir ou auferir lucro, poderá encontrar abrigo da legislação consumerista com base na teoria finalista mitigada, se tiver agido de boa-fé e não detiver conhecimentos de mercado imobiliário nem expertise em incorporação, construção e venda de imóveis, tendo em vista que evidente a sua vulnerabilidade. (...). APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - Apelação Cível: 55953251020208090137 Rel. Des(a).Kisleu Dias Maciel Filho, Data de Publicação:DJ de 29/01/2024). No caso dos autos, de plano, verifico evidente a existência de relação de consumo entre as partes, já que presentes a figura do fornecedor, representado pelo apelante, e do consumidor o qual contratou a entrega de produto (imóvel), a teor das disposições do Código de Defesa do Consumidor. Vejamos: “Art. 2º – Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. (…) “Art. 3º – Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção e transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.” Sobre o tema, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça e esta Corte de Justiça: “PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. CDC. AFASTAMENTO. NECESSIDADE DE VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS DE RELAÇÃO CONSUMERISTA. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. MORA DA VENDEDORA. DESCARACTERIZAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 7/STJ. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA N. 83/STJ. CLÁUSULA PENAL. INVERSÃO. POSSIBILIDADE. SÚMULA N. 83/STJ. DECISÃO MANTIDA. (…) 4. Segundo a jurisprudência do STJ, o adquirente de unidade imobiliária, mesmo não sendo o destinatário final do bem e apenas possuindo o intuito de investir ou auferir lucro, poderá encontrar abrigo da legislação consumerista com base na teoria finalista mitigada se tiver agido de boa fé e não detiver conhecimentos de mercado imobiliário nem expertise em incorporação, construção e venda de imóveis, sendo evidente a sua vulnerabilidade. Em outras palavras, o CDC poderá ser utilizado para amparar concretamente o investidor ocasional (figura do consumidor investidor) (REsp n. 1.785.802/SP, Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/2/2019, DJe 6/3/2019), o quefoi observado pela Corte local. (…) 7. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ, AgInt no AREsp n. 1.970.669/RJ, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 25/4/2022, DJe de 28/4/2022). Nesse passo, é incontestável a incidência das normas consumeristas no caso em análise, não sendo cabível a reforma da sentença nesse ponto. III.3.3 Da causa a rescisão contratual e a impossibilidade de retenção dos 25% Sustenta o apelante que a rescisão contratual no caso dos autos se deu por vontade da apelada, o que novamente não se sustenta. Em sua peça de ingresso, a autora/recorrida diz ter celebrado com a construtora apelante, em 06/12/2018 “Contrato Paritário de Cessão de Direitos de Fruição e Outras Avenças” para que pudesse usufruir de uma loja no empreendimento Centro-Oeste Outlet. A recorrida pretendeu a rescisão do contrato em razão do atraso na entrega do empreendimento, pois, malgrado a avença não previsse data para a sua conclusão, foi-lhe indicada a data provável em 2020, conforme propagandas acostadas (mov.01). No entanto, a construtora recorrente assevera em sua contestação (mov. 48) que a “requerente alega atraso na entrega da loja, porém o empreendimento foi inaugurado em outubro/2021, e desde então a requerente se encontra na posse da loja. “ Ressalta-se que ainda que a Cláusula Primeira, parágrafo primeiro do contrato (mov. 1, arquivo 7) não estipula a data do início das obras ou de entrega do empreendimento Centro-Oeste Outlet, pois se limita a prever que “O(a) cessionário(a) declara estar ciente que o empreendimento será construído progressivamente por etapas, com datas de entregas diferentes para cada fase, bem como, o projeto arquitetônico poderá sofrer adequações, alterações e modificações em razão de exigências legais, de autorizações, alvarás e concessões do Município de Goiânia/GO, bem como, em razão da viabilidade econômica e mercadológica do Empreendimento, sem que isso lhe represente qualquer dano passível de qualquer reparação ou indenização”. Imperativa, nesse caso, a aplicação analógica do entendimento sedimentado do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que, na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deve prever, de modo expresso, claro e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel. Confira-se: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃODECLARATÓRIA C/C CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE RÉ. 1. O entendimento do Tribunal de piso destoa da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, consolidada em sede de julgamento recurso repetitivo representativo de controvérsia (Tema 996), ‘1.1. Na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deverá estabelecer, de forma clara, expressa e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel, o qual não poderá estar vinculado à concessão do financiamento, ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância’. (REsp 1729593/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 25/09/2019, DJe 27/09/2019) 2. Agravo interno desprovido.” (STJ, AgInt no REsp n. 1.999.207/MT, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 29/8/2022, DJe de 1/9/2022.) Nesse contexto, a ausência de estipulação contratual sobre o prazo de entrega do imóvel configura a prática abusiva vedada expressamente pelo inciso II do art. 39 do CDC: “Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério.” Em outro vértice, não merece préstimo a alegação da insurgente de que se trata de cessão de direito de fruição sob condição, vinculado a evento futuro e incerto ou “consoante viabilidade econômica e mercadológica”, porque, mesmo nesses casos, é vedada a estipulação de condição que se sujeita ao puro arbítrio de uma das partes ou que privar de todo efeito o negócio jurídico, nos termos do art. 122 do Código Civil: “Art. 122. São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes”. Sobre o dispositivo, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery lecionam: “5. Condição puramente potestativa. Mero arbitrium, vedado. Ilicitude. Diz-se puramente potestativa a condição se, para seu implemento, bastar a volição exclusiva e arbitrária de uma das partes, que pode obstá-lo ou ensejá-lo. Caracteriza-se quando houver a cláusula si volam (‘se eu quiser’). As condições potestativas ilícitas são aquelas que subordinam a eficácia a mero capricho de uma das partes, retirando-lhe, por consequência, a seriedade (v. Maluf. Condições², p. 37). É puramente potestativa a condição que faz a eficácia do contrato depender de uma simples e arbitrária declaração de vontade de uma das partes contratantes, seja para produzir (condição suspensiva), seja para conservar (condição resolutiva) os efeitos por elas previstos. Neste sentido: Campos. Dir.Civ., p. 16. Na condição puramente potestativa desaparece qualquer vínculo volitivo entre as partes e, por conseguinte, desaparece a vinculação de um sujeito a outro, reduzindo-se uma das partes à mera sujeição do domínio da vontade alheia. [...]” (in Código Civil Comentado, 14ª ed., São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022, p. 417). Dessarte, a construtora recorrente não poderia vender ou ceder o objeto do contrato sem data estipulada para a sua entrega, porquanto impõe restrição abusiva e desproporcional ao comprador, que sequer é informado acerca de quando a obra seria efetivamente entregue. Na hipótese em disceptação, a entrega do empreendimento é relegada ao exclusivo arbítrio e querer da construtora recorrente. Em síntese, ainda que se alegue atraso em razão da pandemia de Covid-19, tal justificativa não se sustenta, pois a construção civil foi considerada atividade essencial pelo Decreto Estadual nº 9.653/2020, não tendo sofrido paralisação ou restrições que justificassem o descumprimento do prazo contratual. “CONTRATO. Ação de rescisão contratual. Sentença de procedência. Interposição de apelação pela ré. […]. Alegação de que o atraso na entrega da unidade imobiliária teria sido ocasionado pelos impactos da pandemia de Covid-19 não se mostra verossímil, uma vez que a aludida pandemia não impediu o prosseguimento das atividades de construção civil no âmbito do Estado de São Paulo, pois estas não foram suspensas ou limitadas, tendo apenas que observar as exigências sanitárias de prevenção previstas no artigo 2º, § 2º, do Decreto Estadual nº 64.881/2020, e no artigo 3º do Decreto Estadual nº 64.864/20, bem como na Deliberação nº 2 do Comitê Administrativo Extraordinário Covid-19, criado pelo Governo do Estado de São Paulo. […]. Apelação não provida.” (TJSP, AC 10059890520218260302 SP 1005989-05.2021.8.26.0302, Relator: Carlos Dias Motta, Data de Julgamento: 05/05/2022, 26ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/05/2022).” Do que se conclui ser clarividente a violação ao princípio da boa-fé objetiva, restando configurado o descumprimento contratual por culpa da vendedora recorrente. Inaplicável, portanto, a Cláusula Terceira, Parágrafo Sétimo, do contrato, que prevê a rescisão contratual por culpa do cessionário (autora/apelada) e a perda de todas as importâncias pagas. Nesse sentido, notemos: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE RESCISÃO CONTRATUAL c/c DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGAS. CONTRATO DE CESSÃO DE DIREITOS DE FRUIÇÃO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL DE ENTREGA DA OBRA. ABUSIVIDADE. RESCISÃO POR CULPA DO CONTRATADO. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DAS PARCELAS PAGAS PELO CONTRATANTE. 1. Em que pese o instrumento contratual indique que o empreendimento seria construído progressivamente por etapas, com datas diferentes de entrega em casa fase consoante viabilidade econômica e mercadológica, a ausência de datas previstas para entrega das obras é considerada abusiva. 2. Tal conduta representa clara violação ao princípio da boa-fé objetiva, restando configurado o descumprimento contratual por culpa da vendedora, e impondo-se a rescisão do contrato, com a devolução das importâncias pagas pelo comprador, nos termos do art. 475, CC. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA.” (TJGO, Apelação Cível 5498473-51.2021.8.09.0051, Rel. Desembargador JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA, 2ª Câmara Cível, julgado em 25/01/2023, DJe de 25/01/2023).” EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE FRUIÇÃO ESPAÇO COMERCIAL. APLICAÇÃO DO CDC . AUSÊNCIA DE PRAZO CERTO PARA ENTREGA DO EMPREENDIMENTO. ABUSIVIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR . PANDEMIA DA COVID-19. INOCORRÊNCIA. RESCISÃO CONTRATUAL. CULPA DA PROMITENTE VENDEDORA . RESTITUIÇÃO INTEGRAL E IMEDIATA DOS VALORES PAGOS. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. O Superior Tribunal de Justiça perfilha o posicionamento de que se admite a utilização do Código de Defesa do Consumidor para amparar, concretamente, o investidor ocasional (figura do consumidor investidor), pois ele não desenvolve a atividade de investimento de maneira reiterada e profissional . (STJ, REsp n. 2.021.711/RS, DJe de 23/3/2023) . 2. Conforme entendimento do STJ, na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deve prever, de modo expresso, claro e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel. 3. Durante a quarentena decretada pelo Estado de Goiás, a construção civil foi considerada serviço essencial pelo art . 2º, § 1º, XXIII, do Decreto Estadual n. 9.653, de 19/04/2020, de forma que, por não sofrer paralisação ou limitação, não pode ser usada de justificativa para o atraso na entrega do imóvel. 4 . A ausência de estipulação contratual sobre o prazo de entrega do imóvel configura nítida prática abusiva e ofensa aos termos do art. 39, XII, CDC, e art. 122 do Código Civil. Tal conduta representa clara violação ao princípio da boa-fé objetiva, restando configurado o descumprimento contratual por culpa da vendedora e impondo-se a rescisão do contrato, com a devolução das importâncias pagas pelo comprador . APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA.(TJ-GO 5529183-54.2021.8 .09.0051, Relator.: DESEMBARGADOR WILSON SAFATLE FAIAD, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: 28/06/2023) Ressalta-se, ainda, as propagandas juntadas aos autos, bem como as postagens publicadas na própria página do Instagram do empreendimento, nas quais consta previsão de entrega para o ano de 2020 (mov. 01). Contudo, conforme reconhecido pelo próprio recorrente em sua contestação (mov. 48, arquivo 01, fl. 03), o empreendimento somente foi inaugurado em outubro de 2021. Diante de todo o exposto, resta claro que a rescisão do contrato se deu por culpa exclusiva da construtora apelante. A ausência de estipulação contratual quanto ao prazo de entrega evidencia conduta abusiva e contrária à boa-fé objetiva, impondo ônus excessivo à parte adquirente. Ademais, o fato de a loja atualmente estar em funcionamento não afasta o direito da autora à rescisão, pois não sana o vício original da contratação nem convalida o atraso injustificado na entrega do empreendimento. Assim, impõe-se a restituição integral, imediata e em parcela única de todos os valores pagos pela autora/recorrida, sem qualquer retenção. III.3.4 Da cobrança res sperata O recorrente sustenta a necessidade de reforma da sentença para que seja determinada a retenção dos valores referentes à res sperata; contudo, não lhe assiste razão. Preliminarmente, importa destacar, como bem pontuado pelo juízo singular, que “a cobrança da "res sperata", não se justifica no presente caso. A "res sperata" é admitida apenas em shopping centers, que possuem características específicas, como a existência de lojas âncoras, tenant mix e administração única. O empreendimento da Ré, contudo, não se enquadra no conceito de shopping center, funcionando como um estabelecimento comercial com características de feira. Assim, a cobrança da "res sperata" é indevida, configurando vantagem manifestamente excessiva, nos termos do artigo 39, V, do CDC.” Nesse contexto, o art. 54 da Lei nº 8.245/91, que regula as relações entre lojistas e empreendedores de shopping centers, dispõe que nelas prevalecerão as condições livremente pactuadas nos contratos de locação respectivos, além das disposições procedimentais previstas na própria lei. Os contratos típicos de shopping center contêm cláusulas especiais, relacionadas ao interesse do empreendedor no êxito do comércio exercido pelo lojista, à imposição do ramo a ser explorado, à responsabilidade por despesas diversas (inclusive de publicidade), à fixação de retribuição sobre o faturamento e à fiscalização da contabilidade do inquilino. Dentre essas obrigações, destaca-se o pagamento da denominada res sperata (coisa esperada), destinada a remunerar as vantagens de se estabelecer em um complexo comercial com clientela já formada. Trata-se de contraprestação legítima apenas quando o locador integra um empreendimento qualificado como shopping center. Entretanto, conforme comprovado nos autos, o Apelante não está vinculado à Associação Brasileira de Shopping Centers (ABRASCE) — conforme consulta ao guia oficial disponível em: https://abrasce.com.br/guia-de-shoppings/?state=GO&city=Goi%C3%A2nia&letter= — o que reforça a inexistência de requisitos para a cobrança da res sperata. A jurisprudência do TJGO é firme nesse sentido: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULAS DE CONTRATO C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES. RES SPERATA. COBRANÇA RESTRITA A SHOPPING CENTER. EMPREENDIMENTO COM CARACTERÍSTICA DE FEIRA. ALTERAÇÃO CONTRATUAL ULTERIOR À PACTUAÇÃO LOCATÍCIA. RESTITUIÇÃO DEVIDA. CLÁUSULA DE RENÚNCIA AO DIREITO DE AÇÃO. NULIDADE. 1. A exigência da res sperata é admitida, tão somente, em se tratando de locações de shopping center, assim, o não enquadramento da apelante nesta condição, à época do contrato firmado entre as partes, impõe a nulidade da cláusula que a estipulou. 2. O empreendimento, inicialmente conhecido como Feira da Estação, só foi inserido na categoria de Shopping Center, recebendo o selo da ABRASCE (Associação Brasileira de Shopping Centers), em dezembro de 2014. 3. Constatada que tanto a filiação quanto a mudança do estatuto são ulteriores à assinatura do contrato locatício firmado entre os litigantes (2013), não há que se falar em validade da res sperata, por não poder retroagir para legitimar uma cláusula nula ao tempo da pactuação. 5. Declarada a ilegalidade da cláusula que prevê o pagamento da res sperata, faz jus a apelada à restituição da importância paga a esse título. (...) APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. Acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pela Quinta Turma Julgadora de sua Quarta Câmara Cível, à unanimidade de votos, em CONHECER DA APELAÇÃO CÍVEL E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. (TJGO, Apelação Cível 5383591-13.2020.8.09.0051, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR DELINTRO BELO DE ALMEIDA FILHO, 4ª Câmara Cível, julgado em 16/04/2024, DJe de 16/04/2024).” Diante do exposto, mantém-se a sentença quanto à vedação da cobrança da res sperata, por ausência dos requisitos legais que a autorizem. IV. Dispositivo Isso posto, CONHEÇO DA APELAÇÃO CÍVEL e NEGO-LHE provimento. Por conseguido, desprovido o recurso, majoro os honorários advocatícios de sucumbência para 13% (treze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. É o voto. Goiânia, datado e assinado digitalmente. Desembargador Vicente LopesRelator

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