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Processo nº 1010642-72.2024.8.11.0040

ID: 332138678

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL Nº Processo: 1010642-72.2024.8.11.0040

Data de Disponibilização: 23/07/2025

Polo Ativo:

BANCO VOLKSWAGEN S.A.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ANA LUIZA LEMES CRUZ

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WELLINGTON CASTELLO DE SOUSA

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DIEGO BRUNO TAVARES

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PATRICIA DA CRUZ MENDONCA

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AMANDIO FERREIRA TERESO JUNIOR

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1010642-72.2024.8.11.0040 CLASSE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) ASSUNTO: [BUSCA E APREENSÃO, LIMINAR] RELAT… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1010642-72.2024.8.11.0040 CLASSE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) ASSUNTO: [BUSCA E APREENSÃO, LIMINAR] RELATORA: EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Turma Julgadora: [EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES] Parte(s): [JOAO CARLOS GONCALVES - CPF: 011.241.411-70 (EMBARGADO), LUCAS FELIPE DO NASCIMENTO MOURA - CPF: 006.999.121-99 (ADVOGADO), BANCO VOLKSWAGEN S.A. - CNPJ: 59.109.165/0001-49 (EMBARGANTE), AMANDIO FERREIRA TERESO JUNIOR - CPF: 063.868.708-08 (ADVOGADO), WELLINGTON CASTELLO DE SOUSA - CPF: 362.777.808-16 (ADVOGADO), DIEGO BRUNO TAVARES - CPF: 012.332.641-92 (ADVOGADO), PATRICIA DA CRUZ MENDONCA - CPF: 982.071.051-00 (ADVOGADO), ANA LUIZA LEMES CRUZ - CPF: 014.853.231-42 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do Exmo. Sr. Des. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: “EMBARGOS ACOLHIDOS. APELAÇÃO PROVIDO. UNÂNIME.” EMENTA DIREITO CIVIL E PROCESSUAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO. EMBARGOS DE TERCEIRO. REVELIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INOVAÇÃO RECURSAL AFASTADA. MATÉRIA DE DIREITO. OMISSÃO CONFIGURADA. ALIENAÇÃO DE BEM FIDUCIADO SEM ANUÊNCIA DO CREDOR. TERCEIRO ADQUIRENTE COM CIÊNCIA PRÉVIA DO GRAVAME. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. INEFICÁCIA DA NEGOCIAÇÃO PERANTE O CREDOR FIDUCIÁRIO. REFORMA DA SENTENÇA. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO. I. Caso em exame 1. Embargos de Declaração contra acórdão que não conheceu de Recurso de Apelação, por inovação recursal, em que a instituição financeira buscava a reforma da sentença que julgou procedentes os Embargos de Terceiro. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber: (i) se o acórdão embargado incorreu em omissão ao não conhecer o recurso de apelação sob o fundamento de inovação recursal; e (ii) se a aquisição de veículo por terceiro, com ciência prévia e inequívoca da existência de alienação fiduciária em garantia, caracteriza posse de boa-fé oponível ao credor fiduciário. III. Razões de decidir 3. A presunção de veracidade decorrente da revelia é relativa, podendo ser afastada diante de provas nos autos que evidenciem fatos incontroversos e admitidos pela parte adversa. 4. A controvérsia refere-se à validade da aquisição de veículo gravado com alienação fiduciária, com ciência do adquirente acerca da restrição, o que constitui matéria eminentemente de direito, passível de análise ainda que haja revelia. 5. A alienação de bem com cláusula de alienação fiduciária, sem anuência do credor fiduciário, é ineficaz perante este. O terceiro que, ciente do gravame, adquire o bem, não pode alegar boa-fé nem opor sua posse para impedir a constrição. 6. O contrato de compra e venda anexado pelo próprio embargado deixa evidente sua ciência sobre o gravame, afastando a boa-fé objetiva exigida para a proteção possessória de terceiros. IV. Dispositivo e tese 7. Embargos de Declaração acolhidos, com efeitos infringentes, para conhecer e dar provimento ao Recurso de Apelação, reformando a sentença e julgando improcedentes os Embargos de Terceiro. Tese de julgamento: “1. A presunção de veracidade dos fatos, decorrente da revelia, não impede a apreciação de matéria de direito em grau recursal. 2. A aquisição de veículo por terceiro que tem ciência da alienação fiduciária afasta a boa-fé e torna a posse ineficaz perante o credor fiduciário.” Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 85, § 2º, 98, § 3º, 344, 345, 346 e 373, I; Decreto-Lei nº 911/69; CP, art. 171, § 2º, I. Jurisprudência relevante citada: TJMT, N.U 1018033-80.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Vice-Presidência, Julgado em 11/11/2021, Publicado no DJE 11/11/2021. R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Egrégia Câmara: Trata-se de Embargos de Declaração opostos pelo Banco Volkswagen S.A. contra acórdão que, por unanimidade, não conheceu do seu Recurso de Apelação, sob o fundamento de inovação recursal. O embargado ajuizou Embargos de Terceiro para cancelar a constrição do veículo VW Gol 1.0, placa RAW2G91, adquirido da Padrão Transportes LTDA em 13/06/2024, com contrato registrado em cartório. A constrição foi determinada em 05/08/2024, na Ação de Busca e Apreensão movida pelo Banco Volkswagen S.A. contra a vendedora. O Banco Volkswagen S.A., citado, não apresentou contestação. A sentença reconheceu a revelia, julgou procedentes os Embargos de Terceiro, cancelou a constrição e condenou o Banco ao pagamento de custas e honorários de 10%. Destacou que a venda registrada em cartório ocorreu antes da busca e apreensão, comprovando a tradição e a posse. O Banco interpôs Apelação, requerendo, preliminarmente, o efeito suspensivo e a mitigação dos efeitos da revelia. No mérito, alegou ausência de prova da aquisição lícita do veículo, falta de anuência para a alienação e impossibilidade de o devedor fiduciante transferir o bem sem autorização do credor. Subsidiariamente, questionou o valor dos honorários advocatícios. O acórdão, por unanimidade, não conheceu do recurso, com fundamento na revelia, que atrai a presunção de veracidade dos fatos, e na inovação recursal, por trazer argumentos não enfrentados na origem. Os honorários foram majorados para 15% sobre o valor da causa. O embargante alega, contudo, que, embora tenha sido revel, a presunção de veracidade dos fatos é relativa e que seu recurso versava sobre matéria de direito, a qual poderia ser apreciada em qualquer fase do processo. Aponta, ainda, omissão quanto à repartição do ônus da prova e à fixação dos honorários advocatícios. Pugna pelo acolhimento dos embargos para que sejam sanados os vícios apontados. Contrarrazões pela rejeição dos embargos. É o relatório. V O T O EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Egrégia Câmara: Nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil, os Embargos de Declaração têm função corretiva, destinando-se a esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material no julgado. No entanto, não se prestam ao reexame do mérito da decisão, tampouco à rediscussão de teses já enfrentadas e afastadas pelo órgão julgador. O prequestionamento, embora admitido pela Súmula 98 do STJ, não pode desvirtuar a natureza integrativa do recurso, transformando-o em via para rediscussão do mérito. Os argumentos do embargante centram-se na alegação de que o acórdão incorreu em equívoco ao desconsiderar a natureza de direito da matéria discutida, a presunção relativa da revelia e a existência de uma sentença transitada em julgado em outro processo, o que configuraria cerceamento de defesa e violação a diversos dispositivos legais. Em que pesem os argumentos do embargante, não se verifica a ocorrência de omissão, contradição, obscuridade ou erro material no acórdão, mas sim o claro intento de rediscutir o mérito da apelação, o que é inviável por esta via recursal. O embargante insiste que a matéria discutida na apelação, por ser de direito, deveria ter sido conhecida, mesmo diante da revelia. Contudo, o acórdão foi explícito ao fundamentar o não conhecimento do recurso na inovação recursal. A ementa consigna expressamente que "1. A revelia impede a rediscussão de fatos não contestados, operando a presunção relativa de veracidade. 2. A inovação recursal, consistente na introdução de matérias não suscitadas na instância de origem, é vedada pelo ordenamento jurídico.". O voto detalha que "os argumentos trazidos pelo apelante nesta fase recursal não foram oportunamente apresentados na instância de origem. Trata-se, portanto, de inovação recursal, circunstância vedada pelo ordenamento jurídico.". Do mesmo modo, ressaltou que "o apelante não apresentou qualquer justificativa plausível para sua inércia processual, tendo permanecido silente mesmo após regularmente citado.". Desse modo, as alegações trazidas pela primeira vez no presente recurso, especialmente aquelas referentes a fatos impeditivos ou modificativos do direito da autora, não podem ser conhecidas nesta fase processual. Isso porque, nos termos do princípio da eventualidade, todas as matérias de defesa devem ser oportunamente suscitadas na contestação, sendo evidente, portanto, a inovação recursal. Nesse sentido: “[...] Nos termos do art. 344 do CPC, à revelia implica a presunção de veracidade dos fatos narrados pelo autor, salvo se contrários à ordem pública ou direitos indisponíveis. O princípio da eventualidade impõe que as matérias de defesa sejam arguidas na contestação, sob pena de preclusão consumativa. Ao réu revel não é permitido utilizar o recurso de apelação como substituto da peça de defesa, sob pena de inovação. Contudo, poderá apresentar apenas questões de ordem pública, que podem ser conhecidas de ofício pelo juiz, o que não restou caracterizado no caso. [...] (N.U 1020836-31.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/02/2025, Publicado no DJE 11/02/2025).” Em relação à suposta existência de sentença transitada em julgado na ação de busca e apreensão (processo 1005253-09.2024.8.11.0040) em favor do Banco Volkswagen S.A., verifico que foi proferida em 14/02/2025, ocasião em que se consolidou a propriedade do veículo em nome do Banco. Contudo, tal sentença é posterior àquela proferida nos Embargos de Terceiro, em 31/01/2025, que julgou procedente o pedido de João Carlos Gonçalves para cancelar a constrição sobre o bem (cuja condição de boa-fé foi presumida pela revelia do banco). Diante disso, considerando que a restituição do veículo ao Banco Volkswagen S.A. tornou-se juridicamente inviável, caberá à instituição, no âmbito da própria Ação de Busca e Apreensão movida contra a devedora original, pleitear a conversão da obrigação em perdas e danos, visando a satisfação do crédito remanescente. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DE TERCEIROS. CONSTRIÇÃO JUDICIAL. PROPRIEDADE DO VEÍCULO. BOA-FÉ DO TERCEIRO ADQUIRENTE. COMPROVADA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Os embargos de terceiros constituem meio de defesa de quem não sendo parte no processo venha a sofrer turbação ou esbulho na posse de seus bens, por ato de apreensão judicial, a teor do artigo 674 do Código de Processo Civil. 2. A aquisição de veículo automotor em data anterior ao bloqueio/penhora, por meio de compromisso de compra e venda, ainda que não tenha sido formalizada perante o Detran, é suficiente para justificar a liberação do bem por meio dos embargos de terceiro, ante a comprovação de boa-fé do adquirente. 3. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - Apelação Cível: 05872954420198090032 CERES, Relator: Des(a). EUDÉLCIO MACHADO FAGUNDES, Data de Julgamento: 25/01/2021, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 25/01/2021).” “[...] Compete ao autor dos Embargos de Terceiro demonstrar a posse ou a propriedade do bem objeto da constrição judicial, o que restou demonstrado nos autos. II Em se tratando de bem móvel, a transferência do veículo se dá pela tradição e não pelo registro junto aos órgãos competentes. III. Havendo prova da transmissão da propriedade do veículo em momento anterior à efetivação da respectiva restrição judicial, é de se presumir a boa-fé do adquirente/embargante, inclusive por inexistir elementos que apontem o contrário. [...] (TJ-GO - AC: 52563391720238090085 ITAPURANGA, Relator.: Des(a). DESEMBARGADORA AMÉLIA MARTINS DE ARAÚJO, 9ª Câmara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ).” O embargante argumenta que a presunção de veracidade decorrente da revelia é relativa e que o acórdão deveria ter considerado a matéria de direito e o ônus da prova. Entretanto, o acórdão enfrentou este ponto, ao afirmar que "A revelia operada por ausência de contestação atrai a presunção relativa de veracidade dos fatos alegados na inicial, nos termos do art. 344 do CPC.". A presunção relativa, embora admita prova em contrário, demanda que a parte interessada a produza no momento oportuno, o que não ocorreu nos autos. Igualmente, a alegação de omissão quanto a estes artigos também não prospera. O acórdão, ao aplicar o Art. 344 do CPC, implicitamente abordou a questão do ônus da prova na revelia. Não há exigência de que o julgador especifique cada artigo de lei que se relaciona com o tema principal. No que tange o questionamento sobre a majoração dos honorários advocatícios, foi expressamente consignado a majoração "nos termos do §11, do art. 85, do CPC". Portanto, trata-se de uma consequência legal do não conhecimento do recurso de apelação, e o percentual fixado está dentro dos parâmetros estabelecidos pela legislação processual civil. O inconformismo com o valor fixado não se enquadra nas hipóteses de cabimento dos Embargos de Declaração. Vale ressaltar, assim, que a via escolhida não se presta ao fim único e exclusivo de prequestionar ou reapreciar matéria já devidamente analisada e aclarada na decisão, sob o pretexto de admissibilidade para futura interposição dos recursos excepcionais. Sabe-se que o julgador não precisa se manifestar expressamente sobre todas as teses ou dispositivos de lei suscitados pelas partes, pois a exigência de prequestionamento para a interposição de recurso especial e extraordinário deve ser cumprida pela parte e não pelo julgador. Acerca da matéria: “[...] 1. O recurso de embargos de declaração não é instrumento apropriado para alterar decisão quando não encontrada omissão, contradição e/ou obscuridade. 2. Nos termos de jurisprudência pacífica do STJ, “o magistrado não é obrigado a responder todas as alegações das partes se já tiver encontrado motivo suficiente para fundamentar a decisão, nem é obrigado a ater-se aos fundamentos por elas indicados” (REsp 684.311/RS, Rel. Min. Castro Meira, DJ 18.4.2006). 3. Ainda, o julgador não precisa apontar expressamente se houve ou não violação a dispositivos legais ou constitucionais apresentados, pois a exigência de prequestionamento para a interposição de recurso especial ou extraordinário deve ser cumprida pela parte e não pelo julgador (N.U 0037381-48.2014.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/03/2020, Publicado no DJE 16/03/2020).” Diante do exposto, REJEITO os presentes embargos de declaração. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (1º VOGAL): Eminentes pares, Peço vista dos autos para melhor análise dos autos. V O T O EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES (2ª VOGAL): Eminentes pares, Aguardo o pedido de vista. SESSÃO DE 09 DE JULHO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O (VISTA) EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (1º VOGAL): Egrégia Câmara: Embargos de Declaração opostos contra acórdão que, por unanimidade, não conheceu da Apelação interposta pelo ora embargante, sob o fundamento de que os argumentos recursais constituiriam inovação, por não terem sido oportunamente suscitados em primeiro grau. O embargante sustenta que, embora tenha sido revel, tal condição implica apenas presunção relativa aos fatos alegados pelo autor. Alega omissão do acórdão quanto à possibilidade de apreciação, em grau recursal, de matéria de direito, bem como sobre a repartição do ônus da prova, a presunção legal de veracidade e a fixação dos honorários advocatícios. O embargado manifestou-se no id 288769862 pelo não provimento. É o relatório. O embargado opôs Embargos de Terceiro visando o cancelamento da constrição sobre veículo Volkswagen Gol 1.0L MC4, Placa RAW2G91, Ano 2022, Cor Branca, objeto de alienação fiduciária em garantia, julgada procedente. Ao recorrer, o Banco sustentou que, apesar da revelia, os fatos alegados não poderiam ser presumidos verdadeiros em razão da presunção ser apenas relativa. Defendeu a improcedência dos Embargos de Terceiro ante a existência de alienação fiduciária vinculada ao bem, frisando que a cessão de direitos não produz efeitos perante a instituição financeira, por ausência de anuência expressa. Entretanto, a Apelação foi inadmitida por suposta inovação recursal, sob o argumento de que as questões levantadas não teriam sido ventiladas na fase de contestação. De acordo com os artigos 344 e 345, inciso IV, do CPC, a falta de contestação pelo réu implica sua revelia, permitindo que os fatos apresentados pelo autor sejam considerados verdadeiros. Essa regra, entretanto, não se aplica quando tais afirmações forem inverossímeis ou estiverem em desacordo com as provas dos autos. Já o artigo 346 estabelece que o revel pode ingressar no processo a qualquer momento, assumindo-o no estado em que se encontrar. Na inicial, o autor reconheceu a existência da alienação fiduciária sobre o bem, declarando conhecimento acerca da restrição, conforme trecho que ora se transcreve: É sabido que no contrato de alienação fiduciária em garantia, com base no Decreto-Lei 911/69, o adquirente do bem se torna o possuidor direto e depositário da coisa, ao ponto em que o credor se mantém na sua posse indireta e domínio resolúvel, resolvendo-se o contrato, com a consolidação da propriedade ao credor, caso o devedor não efetue o pagamento devido. Diante da situação jurídica criada pelo contrato de alienação fiduciária, o bem contratado fica gravado com cláusula de inalienabilidade, que será afastada após quitação do montante financiado. Em que pese o bem estar gravado com cláusula de inalienabilidade em decorrência de contrato de alienação fiduciária em garantia, a jurisprudência tem se posicionado no sentido de reconhecer a validade da negociação entre o alienante e o adquirente que se compromete ao pagamento das parcelas vincendas, muito embora a avença não produza efeitos perante a instituição financeira, conforme se extrai dos julgados que se seguem (sic id 279354879 - Pág. 5 e 6). No próprio contrato de compra e venda do veículo, juntado pelo autor sob o ID nº 279354881, há expressa menção à aquisição do ágio, o que reforça o prévio conhecimento de que o bem não se encontrava livre para negociação. Confira-se: Portanto, a análise da boa-fé do adquirente constitui matéria de direito, uma vez que se limita à interpretação das normas que disciplinam a alienação fiduciária e seus efeitos. Trata-se, assim, de questão passível de apreciação em sede recursal, ainda que em contexto de revelia, razão pela qual reconheço a omissão do acórdão quanto a esse ponto. Passo, pois, ao julgamento do mérito da Apelação. Como já exposto, o embargado tinha ciência de que o bem encontrava-se gravado com alienação fiduciária em favor da instituição financeira. Em contratos dessa natureza, conforme o Decreto-Lei nº 911/69, o credor fiduciário detém a posse indireta e o domínio resolúvel do bem, consolidando a propriedade em seu favor com o inadimplemento do devedor (art. 1º). Ademais, o § 8º do referido artigo dispõe que o devedor que alienar o bem gravado com cláusula fiduciária incorre nas sanções do art. 171, § 2º, I, do Código Penal. Portanto, a aquisição do veículo com ciência de tal gravame afasta a alegação de boa-fé, recaindo sobre o adquirente os riscos e ônus decorrentes da negociação irregular, sem a anuência expressa do credor fiduciário para a validade da transferência perante terceiros. A propósito: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE EMBARGOS DE TERCEIRO – IMPROCEDÊNCIA – DOCUMENTOS QUE NÃO COMPROVAM A ANUÊNCIA DA ADMNISTRADORA DO CONSÓRCIO NA TRANSFERÊNCIA DO CONTRATO – AQUISIÇÃO DO VÉICULO – BOA-FÉ – INDEMONSTRADA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Embora não se conforme com o resultado da sentença recorrida, da análise dos fatos e dos documentos carreados aos autos, notadamente através do Certificado de Registro de Veículo (id. 105611471), restou demonstrado que, no momento da transferência do registro do veículo realizado com a segunda embargada, a embargante, ora apelante, tinha plena ciência à época acerca da alienação fiduciária em favor da primeira embargante. 2. Ou seja, ciente que a propriedade do veículo pertencia à primeira embargada, competia à embargante, ora apelante, a fim de demonstrar a alegada boa-fé na aquisição do veículo, ter exigido da segunda embargada que providenciasse a transferência do contrato do consórcio, o que, no caso, não foi demonstrado. (...)4. Nesse contexto, como a embargante, ora apelante, a teor do disposto no artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, não comprovou o fato constitutivo do direito perseguido, a improcedência da ação é medida que se impõe. (N.U 1018033-80.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Vice-Presidência, Julgado em 11/11/2021, Publicado no DJE 11/11/2021). Diante do exposto, acolho os Embargos de Declaração para sanar a omissão quanto à possibilidade de análise da matéria de direito, conheço da Apelação e, no mérito, dou-lhe provimento para julgar improcedentes os Embargos de Terceiro, invertendo os ônus da sucumbência em favor da instituição financeira, obrigação suspensa ante o deferimento da justiça gratuita ao ora embargado (§3º do art. 98 do CPC). V O T O EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES (2ª VOGAL): Eminentes pares, Peço vênia à relatora e acompanho o voto divergente do Exmo. Sr. Des. Rubens de Oliveira Santos filho, 1º vogal. EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Senhor Presidente, Peço para revisitar os autos. SESSÃO DE 16 DE JULHO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O (RETIFICADO) EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Egrégia Câmara: A controvérsia recursal cinge-se em saber se o acórdão embargado foi omisso ao não conhecer o recurso de apelação do banco sob o fundamento de inovação recursal. A revelia, conforme os artigos 344 e 345 do CPC gera a presunção relativa de veracidade dos fatos narrados pelo autor, que pode ser afastada quando as alegações forem inverossímeis ou estiverem em contradição com as provas já constantes nos autos. Ademais, o artigo 346 do mesmo diploma legal faculta ao réu revel intervir no processo no estado em que este se encontrar. Na inicial, o autor admitiu ter conhecimento da alienação fiduciária, conforme trechos abaixo transcritos, que demonstram seu conhecimento de que a propriedade do bem só se consolidaria após a quitação do financiamento. In verbis: “Em que pese o bem estar gravado com cláusula de inalienabilidade em decorrência de contrato de alienação fiduciária em garantia, a jurisprudência tem se posicionado no sentido de reconhecer a validade da negociação [...], muito embora a avença não produza efeitos perante a instituição financeira [...]" Ademais, o contrato de compra e venda apresentado pelo autor menciona expressamente a aquisição “referente ao ágio do financiamento”, evidenciando, de forma clara, seu prévio conhecimento de que o bem não estava quitado, nem livre para alienação. Dessa forma, a discussão sobre a existência ou não de boa-fé por parte do embargado transcende a matéria fática e se consolida como uma questão eminentemente de direito. A análise consiste em aplicar o ordenamento jurídico a um fato incontroverso e admitido pelo próprio autor: a ciência prévia do gravame. Por ser matéria de direito, a sua análise em sede de apelação não configura inovação recursal, ainda que haja revelia. Posto isso, reconheço a omissão do acórdão e passo à análise do mérito do Recurso de Apelação. Nos termos do Decreto-Lei nº 911/69, o credor fiduciário detém o domínio resolúvel e a posse indireta do bem, sendo irregular sua alienação a terceiros sem a expressa anuência do credor, o que pode, inclusive, ensejar responsabilização nos termos do art. 171, § 2º, I, do Código Penal. No presente caso, verificou-se que o embargado possuía pleno conhecimento da alienação fiduciária sobre o veículo em favor da instituição financeira. A aquisição do bem ciente dessa restrição afasta a alegação de boa-fé. Assim, o comprador assume, de forma consciente, os riscos e ônus de uma negociação irregular, não podendo opor sua posse ao credor fiduciário, legítimo proprietário do bem. Nesse sentido: “[...] restou demonstrado que, no momento da transferência do registro do veículo realizado com a segunda embargada, a embargante, ora apelante, tinha plena ciência à época acerca da alienação fiduciária em favor da primeira embargante. 2. Ou seja, ciente que a propriedade do veículo pertencia à primeira embargada, competia à embargante, ora apelante, a fim de demonstrar a alegada boa-fé na aquisição do veículo, ter exigido da segunda embargada que providenciasse a transferência do contrato do consórcio, o que, no caso, não foi demonstrado. [...] 4. Nesse contexto, como a embargante, ora apelante, a teor do disposto no artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, não comprovou o fato constitutivo do direito perseguido, a improcedência da ação é medida que se impõe. (N.U 1018033-80.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Vice-Presidência, Julgado em 11/11/2021, Publicado no DJE 11/11/2021).” Diante do exposto, ACOLHO os Embargos de Declaração com efeitos infringentes para sanar a omissão apontada, e CONHEÇO do Recurso de Apelação interposto pelo Banco Volkswagen S.A. No mérito, DOU PROVIMENTO ao recurso de apelação para reformar a sentença e JULGAR IMPROCEDENTES os Embargos de Terceiro. Inverto os ônus da sucumbência para condenar o embargado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, conforme art. 85, § 2º, do CPC. Contudo, suspensa a exigibilidade dessas verbas em razão da concessão da justiça gratuita, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

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Processo nº 1010642-72.2024.8.11.0040

ID: 332138689

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL Nº Processo: 1010642-72.2024.8.11.0040

Data de Disponibilização: 23/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JOAO CARLOS GONCALVES

Acórdão

Advogados:

LUCAS FELIPE DO NASCIMENTO MOURA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1010642-72.2024.8.11.0040 CLASSE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) ASSUNTO: [BUSCA E APREENSÃO, LIMINAR] RELAT… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO NÚMERO ÚNICO: 1010642-72.2024.8.11.0040 CLASSE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) ASSUNTO: [BUSCA E APREENSÃO, LIMINAR] RELATORA: EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Turma Julgadora: [EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES] Parte(s): [JOAO CARLOS GONCALVES - CPF: 011.241.411-70 (EMBARGADO), LUCAS FELIPE DO NASCIMENTO MOURA - CPF: 006.999.121-99 (ADVOGADO), BANCO VOLKSWAGEN S.A. - CNPJ: 59.109.165/0001-49 (EMBARGANTE), AMANDIO FERREIRA TERESO JUNIOR - CPF: 063.868.708-08 (ADVOGADO), WELLINGTON CASTELLO DE SOUSA - CPF: 362.777.808-16 (ADVOGADO), DIEGO BRUNO TAVARES - CPF: 012.332.641-92 (ADVOGADO), PATRICIA DA CRUZ MENDONCA - CPF: 982.071.051-00 (ADVOGADO), ANA LUIZA LEMES CRUZ - CPF: 014.853.231-42 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do Exmo. Sr. Des. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: “EMBARGOS ACOLHIDOS. APELAÇÃO PROVIDO. UNÂNIME.” EMENTA DIREITO CIVIL E PROCESSUAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO. EMBARGOS DE TERCEIRO. REVELIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INOVAÇÃO RECURSAL AFASTADA. MATÉRIA DE DIREITO. OMISSÃO CONFIGURADA. ALIENAÇÃO DE BEM FIDUCIADO SEM ANUÊNCIA DO CREDOR. TERCEIRO ADQUIRENTE COM CIÊNCIA PRÉVIA DO GRAVAME. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. INEFICÁCIA DA NEGOCIAÇÃO PERANTE O CREDOR FIDUCIÁRIO. REFORMA DA SENTENÇA. INVERSÃO DA SUCUMBÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO. I. Caso em exame 1. Embargos de Declaração contra acórdão que não conheceu de Recurso de Apelação, por inovação recursal, em que a instituição financeira buscava a reforma da sentença que julgou procedentes os Embargos de Terceiro. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber: (i) se o acórdão embargado incorreu em omissão ao não conhecer o recurso de apelação sob o fundamento de inovação recursal; e (ii) se a aquisição de veículo por terceiro, com ciência prévia e inequívoca da existência de alienação fiduciária em garantia, caracteriza posse de boa-fé oponível ao credor fiduciário. III. Razões de decidir 3. A presunção de veracidade decorrente da revelia é relativa, podendo ser afastada diante de provas nos autos que evidenciem fatos incontroversos e admitidos pela parte adversa. 4. A controvérsia refere-se à validade da aquisição de veículo gravado com alienação fiduciária, com ciência do adquirente acerca da restrição, o que constitui matéria eminentemente de direito, passível de análise ainda que haja revelia. 5. A alienação de bem com cláusula de alienação fiduciária, sem anuência do credor fiduciário, é ineficaz perante este. O terceiro que, ciente do gravame, adquire o bem, não pode alegar boa-fé nem opor sua posse para impedir a constrição. 6. O contrato de compra e venda anexado pelo próprio embargado deixa evidente sua ciência sobre o gravame, afastando a boa-fé objetiva exigida para a proteção possessória de terceiros. IV. Dispositivo e tese 7. Embargos de Declaração acolhidos, com efeitos infringentes, para conhecer e dar provimento ao Recurso de Apelação, reformando a sentença e julgando improcedentes os Embargos de Terceiro. Tese de julgamento: “1. A presunção de veracidade dos fatos, decorrente da revelia, não impede a apreciação de matéria de direito em grau recursal. 2. A aquisição de veículo por terceiro que tem ciência da alienação fiduciária afasta a boa-fé e torna a posse ineficaz perante o credor fiduciário.” Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 85, § 2º, 98, § 3º, 344, 345, 346 e 373, I; Decreto-Lei nº 911/69; CP, art. 171, § 2º, I. Jurisprudência relevante citada: TJMT, N.U 1018033-80.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Vice-Presidência, Julgado em 11/11/2021, Publicado no DJE 11/11/2021. R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Egrégia Câmara: Trata-se de Embargos de Declaração opostos pelo Banco Volkswagen S.A. contra acórdão que, por unanimidade, não conheceu do seu Recurso de Apelação, sob o fundamento de inovação recursal. O embargado ajuizou Embargos de Terceiro para cancelar a constrição do veículo VW Gol 1.0, placa RAW2G91, adquirido da Padrão Transportes LTDA em 13/06/2024, com contrato registrado em cartório. A constrição foi determinada em 05/08/2024, na Ação de Busca e Apreensão movida pelo Banco Volkswagen S.A. contra a vendedora. O Banco Volkswagen S.A., citado, não apresentou contestação. A sentença reconheceu a revelia, julgou procedentes os Embargos de Terceiro, cancelou a constrição e condenou o Banco ao pagamento de custas e honorários de 10%. Destacou que a venda registrada em cartório ocorreu antes da busca e apreensão, comprovando a tradição e a posse. O Banco interpôs Apelação, requerendo, preliminarmente, o efeito suspensivo e a mitigação dos efeitos da revelia. No mérito, alegou ausência de prova da aquisição lícita do veículo, falta de anuência para a alienação e impossibilidade de o devedor fiduciante transferir o bem sem autorização do credor. Subsidiariamente, questionou o valor dos honorários advocatícios. O acórdão, por unanimidade, não conheceu do recurso, com fundamento na revelia, que atrai a presunção de veracidade dos fatos, e na inovação recursal, por trazer argumentos não enfrentados na origem. Os honorários foram majorados para 15% sobre o valor da causa. O embargante alega, contudo, que, embora tenha sido revel, a presunção de veracidade dos fatos é relativa e que seu recurso versava sobre matéria de direito, a qual poderia ser apreciada em qualquer fase do processo. Aponta, ainda, omissão quanto à repartição do ônus da prova e à fixação dos honorários advocatícios. Pugna pelo acolhimento dos embargos para que sejam sanados os vícios apontados. Contrarrazões pela rejeição dos embargos. É o relatório. V O T O EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Egrégia Câmara: Nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil, os Embargos de Declaração têm função corretiva, destinando-se a esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material no julgado. No entanto, não se prestam ao reexame do mérito da decisão, tampouco à rediscussão de teses já enfrentadas e afastadas pelo órgão julgador. O prequestionamento, embora admitido pela Súmula 98 do STJ, não pode desvirtuar a natureza integrativa do recurso, transformando-o em via para rediscussão do mérito. Os argumentos do embargante centram-se na alegação de que o acórdão incorreu em equívoco ao desconsiderar a natureza de direito da matéria discutida, a presunção relativa da revelia e a existência de uma sentença transitada em julgado em outro processo, o que configuraria cerceamento de defesa e violação a diversos dispositivos legais. Em que pesem os argumentos do embargante, não se verifica a ocorrência de omissão, contradição, obscuridade ou erro material no acórdão, mas sim o claro intento de rediscutir o mérito da apelação, o que é inviável por esta via recursal. O embargante insiste que a matéria discutida na apelação, por ser de direito, deveria ter sido conhecida, mesmo diante da revelia. Contudo, o acórdão foi explícito ao fundamentar o não conhecimento do recurso na inovação recursal. A ementa consigna expressamente que "1. A revelia impede a rediscussão de fatos não contestados, operando a presunção relativa de veracidade. 2. A inovação recursal, consistente na introdução de matérias não suscitadas na instância de origem, é vedada pelo ordenamento jurídico.". O voto detalha que "os argumentos trazidos pelo apelante nesta fase recursal não foram oportunamente apresentados na instância de origem. Trata-se, portanto, de inovação recursal, circunstância vedada pelo ordenamento jurídico.". Do mesmo modo, ressaltou que "o apelante não apresentou qualquer justificativa plausível para sua inércia processual, tendo permanecido silente mesmo após regularmente citado.". Desse modo, as alegações trazidas pela primeira vez no presente recurso, especialmente aquelas referentes a fatos impeditivos ou modificativos do direito da autora, não podem ser conhecidas nesta fase processual. Isso porque, nos termos do princípio da eventualidade, todas as matérias de defesa devem ser oportunamente suscitadas na contestação, sendo evidente, portanto, a inovação recursal. Nesse sentido: “[...] Nos termos do art. 344 do CPC, à revelia implica a presunção de veracidade dos fatos narrados pelo autor, salvo se contrários à ordem pública ou direitos indisponíveis. O princípio da eventualidade impõe que as matérias de defesa sejam arguidas na contestação, sob pena de preclusão consumativa. Ao réu revel não é permitido utilizar o recurso de apelação como substituto da peça de defesa, sob pena de inovação. Contudo, poderá apresentar apenas questões de ordem pública, que podem ser conhecidas de ofício pelo juiz, o que não restou caracterizado no caso. [...] (N.U 1020836-31.2024.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/02/2025, Publicado no DJE 11/02/2025).” Em relação à suposta existência de sentença transitada em julgado na ação de busca e apreensão (processo 1005253-09.2024.8.11.0040) em favor do Banco Volkswagen S.A., verifico que foi proferida em 14/02/2025, ocasião em que se consolidou a propriedade do veículo em nome do Banco. Contudo, tal sentença é posterior àquela proferida nos Embargos de Terceiro, em 31/01/2025, que julgou procedente o pedido de João Carlos Gonçalves para cancelar a constrição sobre o bem (cuja condição de boa-fé foi presumida pela revelia do banco). Diante disso, considerando que a restituição do veículo ao Banco Volkswagen S.A. tornou-se juridicamente inviável, caberá à instituição, no âmbito da própria Ação de Busca e Apreensão movida contra a devedora original, pleitear a conversão da obrigação em perdas e danos, visando a satisfação do crédito remanescente. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DE TERCEIROS. CONSTRIÇÃO JUDICIAL. PROPRIEDADE DO VEÍCULO. BOA-FÉ DO TERCEIRO ADQUIRENTE. COMPROVADA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Os embargos de terceiros constituem meio de defesa de quem não sendo parte no processo venha a sofrer turbação ou esbulho na posse de seus bens, por ato de apreensão judicial, a teor do artigo 674 do Código de Processo Civil. 2. A aquisição de veículo automotor em data anterior ao bloqueio/penhora, por meio de compromisso de compra e venda, ainda que não tenha sido formalizada perante o Detran, é suficiente para justificar a liberação do bem por meio dos embargos de terceiro, ante a comprovação de boa-fé do adquirente. 3. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - Apelação Cível: 05872954420198090032 CERES, Relator: Des(a). EUDÉLCIO MACHADO FAGUNDES, Data de Julgamento: 25/01/2021, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 25/01/2021).” “[...] Compete ao autor dos Embargos de Terceiro demonstrar a posse ou a propriedade do bem objeto da constrição judicial, o que restou demonstrado nos autos. II Em se tratando de bem móvel, a transferência do veículo se dá pela tradição e não pelo registro junto aos órgãos competentes. III. Havendo prova da transmissão da propriedade do veículo em momento anterior à efetivação da respectiva restrição judicial, é de se presumir a boa-fé do adquirente/embargante, inclusive por inexistir elementos que apontem o contrário. [...] (TJ-GO - AC: 52563391720238090085 ITAPURANGA, Relator.: Des(a). DESEMBARGADORA AMÉLIA MARTINS DE ARAÚJO, 9ª Câmara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ).” O embargante argumenta que a presunção de veracidade decorrente da revelia é relativa e que o acórdão deveria ter considerado a matéria de direito e o ônus da prova. Entretanto, o acórdão enfrentou este ponto, ao afirmar que "A revelia operada por ausência de contestação atrai a presunção relativa de veracidade dos fatos alegados na inicial, nos termos do art. 344 do CPC.". A presunção relativa, embora admita prova em contrário, demanda que a parte interessada a produza no momento oportuno, o que não ocorreu nos autos. Igualmente, a alegação de omissão quanto a estes artigos também não prospera. O acórdão, ao aplicar o Art. 344 do CPC, implicitamente abordou a questão do ônus da prova na revelia. Não há exigência de que o julgador especifique cada artigo de lei que se relaciona com o tema principal. No que tange o questionamento sobre a majoração dos honorários advocatícios, foi expressamente consignado a majoração "nos termos do §11, do art. 85, do CPC". Portanto, trata-se de uma consequência legal do não conhecimento do recurso de apelação, e o percentual fixado está dentro dos parâmetros estabelecidos pela legislação processual civil. O inconformismo com o valor fixado não se enquadra nas hipóteses de cabimento dos Embargos de Declaração. Vale ressaltar, assim, que a via escolhida não se presta ao fim único e exclusivo de prequestionar ou reapreciar matéria já devidamente analisada e aclarada na decisão, sob o pretexto de admissibilidade para futura interposição dos recursos excepcionais. Sabe-se que o julgador não precisa se manifestar expressamente sobre todas as teses ou dispositivos de lei suscitados pelas partes, pois a exigência de prequestionamento para a interposição de recurso especial e extraordinário deve ser cumprida pela parte e não pelo julgador. Acerca da matéria: “[...] 1. O recurso de embargos de declaração não é instrumento apropriado para alterar decisão quando não encontrada omissão, contradição e/ou obscuridade. 2. Nos termos de jurisprudência pacífica do STJ, “o magistrado não é obrigado a responder todas as alegações das partes se já tiver encontrado motivo suficiente para fundamentar a decisão, nem é obrigado a ater-se aos fundamentos por elas indicados” (REsp 684.311/RS, Rel. Min. Castro Meira, DJ 18.4.2006). 3. Ainda, o julgador não precisa apontar expressamente se houve ou não violação a dispositivos legais ou constitucionais apresentados, pois a exigência de prequestionamento para a interposição de recurso especial ou extraordinário deve ser cumprida pela parte e não pelo julgador (N.U 0037381-48.2014.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/03/2020, Publicado no DJE 16/03/2020).” Diante do exposto, REJEITO os presentes embargos de declaração. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (1º VOGAL): Eminentes pares, Peço vista dos autos para melhor análise dos autos. V O T O EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES (2ª VOGAL): Eminentes pares, Aguardo o pedido de vista. SESSÃO DE 09 DE JULHO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O (VISTA) EXMO. SR. DES. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO (1º VOGAL): Egrégia Câmara: Embargos de Declaração opostos contra acórdão que, por unanimidade, não conheceu da Apelação interposta pelo ora embargante, sob o fundamento de que os argumentos recursais constituiriam inovação, por não terem sido oportunamente suscitados em primeiro grau. O embargante sustenta que, embora tenha sido revel, tal condição implica apenas presunção relativa aos fatos alegados pelo autor. Alega omissão do acórdão quanto à possibilidade de apreciação, em grau recursal, de matéria de direito, bem como sobre a repartição do ônus da prova, a presunção legal de veracidade e a fixação dos honorários advocatícios. O embargado manifestou-se no id 288769862 pelo não provimento. É o relatório. O embargado opôs Embargos de Terceiro visando o cancelamento da constrição sobre veículo Volkswagen Gol 1.0L MC4, Placa RAW2G91, Ano 2022, Cor Branca, objeto de alienação fiduciária em garantia, julgada procedente. Ao recorrer, o Banco sustentou que, apesar da revelia, os fatos alegados não poderiam ser presumidos verdadeiros em razão da presunção ser apenas relativa. Defendeu a improcedência dos Embargos de Terceiro ante a existência de alienação fiduciária vinculada ao bem, frisando que a cessão de direitos não produz efeitos perante a instituição financeira, por ausência de anuência expressa. Entretanto, a Apelação foi inadmitida por suposta inovação recursal, sob o argumento de que as questões levantadas não teriam sido ventiladas na fase de contestação. De acordo com os artigos 344 e 345, inciso IV, do CPC, a falta de contestação pelo réu implica sua revelia, permitindo que os fatos apresentados pelo autor sejam considerados verdadeiros. Essa regra, entretanto, não se aplica quando tais afirmações forem inverossímeis ou estiverem em desacordo com as provas dos autos. Já o artigo 346 estabelece que o revel pode ingressar no processo a qualquer momento, assumindo-o no estado em que se encontrar. Na inicial, o autor reconheceu a existência da alienação fiduciária sobre o bem, declarando conhecimento acerca da restrição, conforme trecho que ora se transcreve: É sabido que no contrato de alienação fiduciária em garantia, com base no Decreto-Lei 911/69, o adquirente do bem se torna o possuidor direto e depositário da coisa, ao ponto em que o credor se mantém na sua posse indireta e domínio resolúvel, resolvendo-se o contrato, com a consolidação da propriedade ao credor, caso o devedor não efetue o pagamento devido. Diante da situação jurídica criada pelo contrato de alienação fiduciária, o bem contratado fica gravado com cláusula de inalienabilidade, que será afastada após quitação do montante financiado. Em que pese o bem estar gravado com cláusula de inalienabilidade em decorrência de contrato de alienação fiduciária em garantia, a jurisprudência tem se posicionado no sentido de reconhecer a validade da negociação entre o alienante e o adquirente que se compromete ao pagamento das parcelas vincendas, muito embora a avença não produza efeitos perante a instituição financeira, conforme se extrai dos julgados que se seguem (sic id 279354879 - Pág. 5 e 6). No próprio contrato de compra e venda do veículo, juntado pelo autor sob o ID nº 279354881, há expressa menção à aquisição do ágio, o que reforça o prévio conhecimento de que o bem não se encontrava livre para negociação. Confira-se: Portanto, a análise da boa-fé do adquirente constitui matéria de direito, uma vez que se limita à interpretação das normas que disciplinam a alienação fiduciária e seus efeitos. Trata-se, assim, de questão passível de apreciação em sede recursal, ainda que em contexto de revelia, razão pela qual reconheço a omissão do acórdão quanto a esse ponto. Passo, pois, ao julgamento do mérito da Apelação. Como já exposto, o embargado tinha ciência de que o bem encontrava-se gravado com alienação fiduciária em favor da instituição financeira. Em contratos dessa natureza, conforme o Decreto-Lei nº 911/69, o credor fiduciário detém a posse indireta e o domínio resolúvel do bem, consolidando a propriedade em seu favor com o inadimplemento do devedor (art. 1º). Ademais, o § 8º do referido artigo dispõe que o devedor que alienar o bem gravado com cláusula fiduciária incorre nas sanções do art. 171, § 2º, I, do Código Penal. Portanto, a aquisição do veículo com ciência de tal gravame afasta a alegação de boa-fé, recaindo sobre o adquirente os riscos e ônus decorrentes da negociação irregular, sem a anuência expressa do credor fiduciário para a validade da transferência perante terceiros. A propósito: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE EMBARGOS DE TERCEIRO – IMPROCEDÊNCIA – DOCUMENTOS QUE NÃO COMPROVAM A ANUÊNCIA DA ADMNISTRADORA DO CONSÓRCIO NA TRANSFERÊNCIA DO CONTRATO – AQUISIÇÃO DO VÉICULO – BOA-FÉ – INDEMONSTRADA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Embora não se conforme com o resultado da sentença recorrida, da análise dos fatos e dos documentos carreados aos autos, notadamente através do Certificado de Registro de Veículo (id. 105611471), restou demonstrado que, no momento da transferência do registro do veículo realizado com a segunda embargada, a embargante, ora apelante, tinha plena ciência à época acerca da alienação fiduciária em favor da primeira embargante. 2. Ou seja, ciente que a propriedade do veículo pertencia à primeira embargada, competia à embargante, ora apelante, a fim de demonstrar a alegada boa-fé na aquisição do veículo, ter exigido da segunda embargada que providenciasse a transferência do contrato do consórcio, o que, no caso, não foi demonstrado. (...)4. Nesse contexto, como a embargante, ora apelante, a teor do disposto no artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, não comprovou o fato constitutivo do direito perseguido, a improcedência da ação é medida que se impõe. (N.U 1018033-80.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Vice-Presidência, Julgado em 11/11/2021, Publicado no DJE 11/11/2021). Diante do exposto, acolho os Embargos de Declaração para sanar a omissão quanto à possibilidade de análise da matéria de direito, conheço da Apelação e, no mérito, dou-lhe provimento para julgar improcedentes os Embargos de Terceiro, invertendo os ônus da sucumbência em favor da instituição financeira, obrigação suspensa ante o deferimento da justiça gratuita ao ora embargado (§3º do art. 98 do CPC). V O T O EXMA. SRA. DESA. SERLY MARCONDES ALVES (2ª VOGAL): Eminentes pares, Peço vênia à relatora e acompanho o voto divergente do Exmo. Sr. Des. Rubens de Oliveira Santos filho, 1º vogal. EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Senhor Presidente, Peço para revisitar os autos. SESSÃO DE 16 DE JULHO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O (RETIFICADO) EXMA. SRA. DESA. ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA (RELATORA): Egrégia Câmara: A controvérsia recursal cinge-se em saber se o acórdão embargado foi omisso ao não conhecer o recurso de apelação do banco sob o fundamento de inovação recursal. A revelia, conforme os artigos 344 e 345 do CPC gera a presunção relativa de veracidade dos fatos narrados pelo autor, que pode ser afastada quando as alegações forem inverossímeis ou estiverem em contradição com as provas já constantes nos autos. Ademais, o artigo 346 do mesmo diploma legal faculta ao réu revel intervir no processo no estado em que este se encontrar. Na inicial, o autor admitiu ter conhecimento da alienação fiduciária, conforme trechos abaixo transcritos, que demonstram seu conhecimento de que a propriedade do bem só se consolidaria após a quitação do financiamento. In verbis: “Em que pese o bem estar gravado com cláusula de inalienabilidade em decorrência de contrato de alienação fiduciária em garantia, a jurisprudência tem se posicionado no sentido de reconhecer a validade da negociação [...], muito embora a avença não produza efeitos perante a instituição financeira [...]" Ademais, o contrato de compra e venda apresentado pelo autor menciona expressamente a aquisição “referente ao ágio do financiamento”, evidenciando, de forma clara, seu prévio conhecimento de que o bem não estava quitado, nem livre para alienação. Dessa forma, a discussão sobre a existência ou não de boa-fé por parte do embargado transcende a matéria fática e se consolida como uma questão eminentemente de direito. A análise consiste em aplicar o ordenamento jurídico a um fato incontroverso e admitido pelo próprio autor: a ciência prévia do gravame. Por ser matéria de direito, a sua análise em sede de apelação não configura inovação recursal, ainda que haja revelia. Posto isso, reconheço a omissão do acórdão e passo à análise do mérito do Recurso de Apelação. Nos termos do Decreto-Lei nº 911/69, o credor fiduciário detém o domínio resolúvel e a posse indireta do bem, sendo irregular sua alienação a terceiros sem a expressa anuência do credor, o que pode, inclusive, ensejar responsabilização nos termos do art. 171, § 2º, I, do Código Penal. No presente caso, verificou-se que o embargado possuía pleno conhecimento da alienação fiduciária sobre o veículo em favor da instituição financeira. A aquisição do bem ciente dessa restrição afasta a alegação de boa-fé. Assim, o comprador assume, de forma consciente, os riscos e ônus de uma negociação irregular, não podendo opor sua posse ao credor fiduciário, legítimo proprietário do bem. Nesse sentido: “[...] restou demonstrado que, no momento da transferência do registro do veículo realizado com a segunda embargada, a embargante, ora apelante, tinha plena ciência à época acerca da alienação fiduciária em favor da primeira embargante. 2. Ou seja, ciente que a propriedade do veículo pertencia à primeira embargada, competia à embargante, ora apelante, a fim de demonstrar a alegada boa-fé na aquisição do veículo, ter exigido da segunda embargada que providenciasse a transferência do contrato do consórcio, o que, no caso, não foi demonstrado. [...] 4. Nesse contexto, como a embargante, ora apelante, a teor do disposto no artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, não comprovou o fato constitutivo do direito perseguido, a improcedência da ação é medida que se impõe. (N.U 1018033-80.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Vice-Presidência, Julgado em 11/11/2021, Publicado no DJE 11/11/2021).” Diante do exposto, ACOLHO os Embargos de Declaração com efeitos infringentes para sanar a omissão apontada, e CONHEÇO do Recurso de Apelação interposto pelo Banco Volkswagen S.A. No mérito, DOU PROVIMENTO ao recurso de apelação para reformar a sentença e JULGAR IMPROCEDENTES os Embargos de Terceiro. Inverto os ônus da sucumbência para condenar o embargado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, conforme art. 85, § 2º, do CPC. Contudo, suspensa a exigibilidade dessas verbas em razão da concessão da justiça gratuita, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

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