Processo nº 5110552-29.2023.8.24.0023
ID: 314546745
Tribunal: TJSC
Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5110552-29.2023.8.24.0023
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ELLEN CRISTINA GONCALVES PIRES
OAB/SC XXXXXX
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JULIO MANUEL URQUETA GOMEZ JUNIOR
OAB/SC XXXXXX
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Apelação Nº 5110552-29.2023.8.24.0023/SC
APELANTE
: EDI ISOLDI WENGRAT GRUBERT (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: JULIO MANUEL URQUETA GOMEZ JUNIOR (OAB SC052867)
APELANTE
: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU)
ADVOGADO(A)…
Apelação Nº 5110552-29.2023.8.24.0023/SC
APELANTE
: EDI ISOLDI WENGRAT GRUBERT (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: JULIO MANUEL URQUETA GOMEZ JUNIOR (OAB SC052867)
APELANTE
: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU)
ADVOGADO(A)
: ELLEN CRISTINA GONCALVES PIRES (OAB SC038691)
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de apelações interpostas por
EDI ISOLDI WENGRAT GRUBERT
e BANCO BRADESCO S.A. em face da sentença de procedência parcial proferida em
"ação declaratória de nulidade de contrato bancário, repetição do indébito e indenização por danos morais"
.
Adota-se o relatório elaborado pelo juízo
a quo
por representar fielmente a realidade dos autos (
evento 85, SENT1
):
EDI ISOLDI WENGRAT GRUBERT
ajuizou a
presente demanda contra BANCO BRADESCO S.A., todos qualificados na inicial, objetivando declarar a inexistência de contrato que de azo a descontos em seu benefício previdenciário.
Defendeu que não anuiu com tal contratação, requereu a condenação da ré ao ressarcimento em dobro dos valores indevidamente descontados.
Pugnou ainda pela condenação da ré no pagamento de indenização por danos morais em R$ 10.000,00.
Ao final, valorou a causa e juntou documentos (n. 03/10).
Despacho inicial lançado no
evento 4, DESPADEC1
, onde a autora foi intimada para juntada de documentos acerca da hipossuficiência alegada.
Após a juntada de documentos no
evento 7, EMENDAINIC1
, a gratuidade da Justiça foi indeferida por meio da decisão do
evento 9, DESPADEC1
.
Da referida decisão, foi interposto recurso de Agravo de Instrumento n. 5002128-25.2024.8.24.0000/TJSC, onde foi concedida a benesse.
Citada (
evento 50, AR1
), a ré apresentou defesa em forma de contestação (
evento 52, CONT1
). De forma preliminar, arguiu a ausência de condição da ação e impugnou a concessão da gratuidade judiciária.
No mérito, refutou a argumentação deduzida na petição inicial, defendendo a higidez da contratação.
Houve réplica (
evento 55, RÉPLICA1
).
No
evento 57, DESPADEC1
, determinou-se a intimação das partes acerca do interesse na dilação probatória. Somente a autora apresentou manifestação (
evento 61, PET1
).
Saneamento e organização do processo no
evento 66, DESPADEC1
, sendo determinada a produção de prova pericial, com o fito de elucidar a falsidade da assinatura contratual.
No
evento 77, DESPADEC1
, constatou-se a ausência nos autos de cópia do contrato em discussão, intimando-se as partes para manifestação sobre a possibilidade de julgamento antecipado do feito.
Manifestação da autora ao
evento 82, PET1
; a ré, por sua vez, renunciou ao prazo concedido (eventos 78 e 81).
Vieram os autos conclusos.
Concluídos os trâmites, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo (
evento 85, SENT1
):
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos aduzidos na petição inicial por
EDI ISOLDI WENGRAT GRUBERT
contra BANCO BRADESCO S.A., com resolução do mérito, consoante o art. 487, I do CPC, para:
i)
determinar a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente dos contracheques da parte autora, em razão da ausência de contratação, atualizados monetariamente pelo INPC desde a data de cada desconto indevido e acrescidas de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês desde a citação.
ii)
indeferir a condenação da ré no pagamento de danos morais, nos termos da fundamentação.
Desde já, a fim de evitar enriquecimento ilícito, autorizo, mediante juntada do respectivo comprovante, que o valor eventualmente depositado pelo banco em favor da parte autora em decorrência do empréstimo aqui discutido seja revertido em seu favor, sendo deduzido do montante da condenação.
Cientifique-se a perita nomeada no
evento 66, DESPADEC1
, acerca da presente decisão.
Condeno a ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como aos honorários advocatícios do procurador da parte adversa, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, com base no art. 85, § 2º, do CPC, considerando a singeleza da demanda.
A exigibilidade das despesas processuais e dos honorários advocatícios está suspensa com relação à(s) parte(s) ativa, durante o prazo extintivo de 5 (cinco) anos, pois beneficiária da Gratuidade da Justiça, nos termos dos arts. 98 a 102 do CPC e da Lei 1.060/1950.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Se interposto recurso pelas partes, uma vez certificada sua tempestividade e preparo (se for o caso), intime-se a parte contrária para contrarrazões (CPC, art. 346) e, independentemente de nova conclusão, remeta-se o feito ao Tribunal de Justiça, com as homenagens de estilo (acaso haja qualquer situação diversa, façam os autos conclusos).
Do contrário, observadas as formalidades legais, arquivem-se com as respectivas baixas na estatística.
Inconformadas com o ato decisório, as partes interpuseram recursos de apelação.
Nas razões recursais (
evento 93, APELAÇÃO1
), a parte autora alegou, em síntese, que: a) os descontos indevidos em seu benefício previdenciário causaram-lhe abalo anímico; b) o termo inicial dos juros de mora incidentes sobre a repetição do indébito, fixado na sentença, viola a Súmula n. 54 do STJ; c) a compensação resultará no enriquecimento ilícito da instituição financeira ré.
Com tais argumentos, formulou os seguintes requerimentos:
Ante o exposto e pelas razões que o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC) saberá apreciar, requer-se que a presente apelação seja recebida e processada para:
1. CONDENAR a ré ao pagamento de danos morais em razão de sua postura desleal, falta de transparência, má-fé, abusividade e disparidade econômica das partes, no patamar requerido na peça inicial;
2. DETERMINAR a data de cada desconto indevido como termo inicial dos juros moratórios devidos sobre a repetição do indébito, conforme a Súmula 54 do STJ;
3. MAJORAR os honorários advocatícios sucumbenciais em 20% sobre o valor atualizado da causa, em virtude do trabalho adicional realizado pelo causídico da parte recorrente, observando os limites e parâmetros legais;
4. DECLARAR a inexistência do dever de compensação, tendo em vista que a autora somente recebeu os valores devido a fraudes que as instituições financeiras aplicam.
Por sua vez, nas razões recursais (
evento 99, APELAÇÃO1
), a parte ré alegou, em síntese, que: a) o contrato existe, é válido e, portanto, os descontos são legítimos; b) a repetição de indébito deve ser afastada; c) a compensação dos créditos deve ser autorizada.
Com tais argumentos, formulou os seguintes requerimentos:
EX POSITIS, espera e confia o Apelante que este Egrégio Tribunal, em conhecendo do recurso, dar-lhe-á provimento, reformando a r. decisão atacada nos pontos recorridos.
Intimadas, as partes exerceram o contraditório (
evento 107, CONTRAZAP1
e
evento 108, CONTRAZAP1
).
O envio dos autos à Procuradoria-Geral de Justiça foi dispensado, por ausência de hipótese de intervenção (arts. 129 da CF e 178 do CPC).
Por fim, vieram os autos para análise.
É o relatório.
Decido.
I. RECURSO DA PARTE RÉ
1. Preliminares
Não há preliminares em contrarrazões para análise.
2. Admissibilidade
Destaca-se, inicialmente, que a demandada busca a compensação entre os valores que foi condenada a pagar e a quantia que a parte autora recebeu indevidamente em sua conta bancária.
A medida, contudo, já foi determinada na sentença.
Veja-se (
evento 85, SENT1
):
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos aduzidos na petição inicial por
EDI ISOLDI WENGRAT GRUBERT
contra BANCO BRADESCO S.A., com resolução do mérito, consoante o art. 487, I do CPC, para:
i)
determinar a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente dos contracheques da parte autora, em razão da ausência de contratação, atualizados monetariamente pelo INPC desde a data de cada desconto indevido e acrescidas de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês desde a citação.
ii)
indeferir a condenação da ré no pagamento de danos morais, nos termos da fundamentação.
Desde já, a fim de evitar enriquecimento ilícito, autorizo, mediante juntada do respectivo comprovante, que o valor eventualmente depositado pelo banco em favor da parte autora em decorrência do empréstimo aqui discutido seja revertido em seu favor, sendo deduzido do montante da condenação
.
Cientifique-se a perita nomeada no
evento 66, DESPADEC1
, acerca da presente decisão.
Condeno a ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como aos honorários advocatícios do procurador da parte adversa, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, com base no art. 85, § 2º, do CPC, considerando a singeleza da demanda.
A exigibilidade das despesas processuais e dos honorários advocatícios está suspensa com relação à(s) parte(s) ativa, durante o prazo extintivo de 5 (cinco) anos, pois beneficiária da Gratuidade da Justiça, nos termos dos arts. 98 a 102 do CPC e da Lei 1.060/1950.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Se interposto recurso pelas partes, uma vez certificada sua tempestividade e preparo (se for o caso), intime-se a parte contrária para contrarrazões (CPC, art. 346) e, independentemente de nova conclusão, remeta-se o feito ao Tribunal de Justiça, com as homenagens de estilo (acaso haja qualquer situação diversa, façam os autos conclusos).
Do contrário, observadas as formalidades legais, arquivem-se com as respectivas baixas na estatística.
Logo, não há interesse recursal nesse ponto.
A propósito:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DECORRENTES DE CONTRATO ALEGADAMENTE NÃO FIRMADO PELA PARTE AUTORA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA CASA BANCÁRIA RÉ. DISCUSSÃO A RESPEITO DA LEGALIDADE DOS DESCONTOS. LAUDO PERICIAL QUE ATESTOU A DIVERGÊNCIA ENTRE A ASSINATURA APOSTA NO CONTRATO TRAZIDO PELA RÉ E AQUELA UTILIZADA PELA PARTE AUTORA. RELAÇÃO CONSUMERISTA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. COMPROVAÇÃO DA LEGITIMIDADE DOS DESCONTO QUE CABIA À RÉ, ÔNUS DO QUAL NÃO SE DESINCUMBIU. DESCONTOS INDEVIDOS. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DA RELAÇÃO JURÍDICA QUE DEVE SER MANTIDA. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO À DEVOLUÇÃO DO VALOR COBRADO. TESE PARCIALMENTE ACOLHIDA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ENGANO JUSTIFICÁVEL PELA PARTE DEMANDADA. EXEGESE DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. OBRIGAÇÃO DE DEVOLUÇÃO EM DOBRO MANIFESTA. NECESSIDADE DE ADOÇÃO DA DECISÃO TOMADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO ÂMBITO DOS AUTOS DO EARESP N. 600.663/RS, NA QUAL HÁ CONVERGÊNCIA COM A SUPRACITADA TESE, MAS COM MODULAÇÃO DOS EFEITOS. DEVOLUÇÃO DO VALOR DOS DESCONTOS ANTERIORES À DATA DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO PROFERIDO PELO STJ QUE DEVE OCORRER NA FORMA SIMPLES. PLEITO PARCIALMENTE PROVIDO. PRETENDIDO O AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ACOLHIMENTO. ABALO ANÍMICO NÃO PRESUMIDO NO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DANO PELO ACIONANTE. SENTENÇA REFORMADA.
DEMANDADA APELANTE QUE PLEITEIA A COMPENSAÇÃO COM OS VALORES CONTRATUAIS DEPOSITADOS NA CONTA DA AUTORA. DETERMINAÇÃO NESSE SENTIDO CONTIDA NA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL VERIFICADA. RECURSO NÃO CONHECIDO NO PONTO
. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. REDISTRIBUIÇÃO IMPOSITIVA. HONORÁRIOS RECURSAIS. IMPOSSIBILIDADE DE MAJORAÇÃO DAVERBA NA HIPÓTESE. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, PARCIALMENTE PROVIDO (TJSC, Apelação n. 5003691-34.2020.8.24.0052, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Nunes Júnior, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 19-10-2023).
Daí o não conhecimento da pretensão nesse tópico.
No mais, presentes os pressupostos legais, admite-se o recurso.
3. Mérito
Passa-se ao julgamento monocrático, com fundamento no art. 932 do CPC e no art. 132 do Regimento Interno do TJSC, que permitem ao Relator dar ou negar provimento ao recurso, sem necessidade de submissão ao órgão colegiado, destacando-se que a medida visa imprimir celeridade à entrega da prestação jurisdicional, em prestígio ao postulado da razoável duração do processo (arts. 5º, LXXVIII, da CF, 8.1 da CADH e 4º do CPC). Afinal,
"se o relator conhece orientação de seu órgão colegiado, desnecessário submeter-lhe, sempre e reiteradamente, a mesma controvérsia"
(STJ, AgInt no REsp 1.574.054/PR, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, j. 02/06/2016).
Cumpre observar que, além de agilizar a solução do conflito, o julgamento monocrático não acarreta prejuízos às partes, às quais é facultada a interposição posterior de agravo interno, nos termos do art. 1.021 do CPC, para controle do ato decisório unipessoal pelo órgão fracionário competente.
Sobre o tema, convém citar o entendimento do STJ, na condição de órgão constitucionalmente competente para dar a última palavra em matéria de interpretação da lei federal/processual (art. 105, III, da CF e AgRg na MC n. 7.328/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Turma, j. 02/12/2003):
PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESOLUÇÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA. FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. ALUGUEL MENSAL. CONSIDERAÇÃO DE BENFEITORIAS. VERBA DE SUCUMBÊNCIA. OMISSÃO E NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. CONFIGURAÇÃO. NECESSIDADE DE RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA SUPRIMENTO DOS VÍCIOS APONTADOS. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1.
Não há que se falar em usurpação de competência dos órgãos colegiados diante do julgamento monocrático do recurso, tampouco em risco ao princípio da colegialidade, tendo em vista que pode a parte interpor agravo interno, como de fato interpôs, contra a decisão agravada, devolvendo a discussão ao órgão competente
, como de fato ocorreu, ratificando ou reformando a decisão. [...] (AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.809.600/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 13/5/2024, DJe de 15/5/2024).
"Consoante a jurisprudência deste STJ, a legislação processual (art. 557 do CPC/73, equivalente ao art. 932 do CPC/15, combinados com a Súmula 568 do STJ)
permite ao relator julgar monocraticamente recurso inadmissível ou, ainda, aplicar a jurisprudência consolidada deste Tribunal. Ademais, a possibilidade de interposição de recurso ao órgão colegiado afasta qualquer alegação de ofensa ao princípio da colegialidade
. Precedentes (AgInt no REsp n. 1.255.169/RJ, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 20/6/2022).
"A jurisprudência deste STJ, a legislação processual (932 do CPC/15, c/c a Súmula 568 do STJ)
permite ao relator julgar monocraticamente recurso inadmissível ou, ainda, aplica a jurisprudência consolidada deste Tribunal
. Ademais, a possibilidade de interposição de recurso ao órgão colegiado afasta qualquer alegação de ofensa ao princípio da colegialidade" (AgInt no AREsp 1.389.200/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, julgado em 26/03/2019, DJe de 29/03/2019). [...] 5. Agravo interno improvido (AgInt no AREsp n. 2.025.993/PE, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, j. 20/6/2022).
Assim, ausente perspectiva de que a solução a ser dada seria outra em caso de julgamento colegiado, torna-se cabível o exame monocrático.
Dito isso, antecipa-se que o caso é de provimento parcial.
3.1. Existência do contrato
A parte ré afirma que o juízo
a quo
errou ao acolher a pretensão da parte autora e declarar a inexistência do contrato.
Alega que a celebração do negócio jurídico está suficientemente evidenciada em razão das circunstâncias concretas, especialmente do crédito do valor mutuado em favor da parte autora.
Com isso, busca a declaração de existência do negócio, a fim de legitimar os descontos realizados no benefício previdenciário da parte autora e de afastar as imposições de repetição de indébito e/ou de reparação de danos.
Tais teses, com a devida vênia, não se sustentam.
Em ações declaratórias pautadas na negativa absoluta de relação jurídica, é da parte demandada, como regra geral, o ônus da comprovar a existência do vínculo questionado na petição inicial (art. 373, II, do CPC), tendo em vista a impossibilidade de se exigir da parte demandante a produção de prova sobre fato negativo (art. 373, § 1º, do CPC). Referida lógica, ademais, reforça-se na hipótese em que a parte demandada é fornecedora de bens e serviços, diretamente responsável pela emissão e guarda do instrumento comprobatório da relação impugnada (art. 6º, VIII, do CDC e arts. 396 e 399 do CPC).
Nesse sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TUTELA DE URGÊNCIA PARA EXCLUSÃO DO NOME DO AUTOR DOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. INDEFERIMENTO NA ORIGEM. INSURGÊNCIA. DEMANDANTE QUE AFIRMA NA PETIÇÃO INICIAL NÃO TER CELEBRADO O CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO QUE ENSEJOU A SUPOSTA DÍVIDA E A NEGATIVAÇÃO. DEVER DO BANCO DEMANDADO DE PROVAR A EXISTÊNCIA DO AJUSTE E, POR CONSEGUINTE, DO DÉBITO QUE ENSEJOU A ANOTAÇÃO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CAPAZES DE INFIRMAR, POR ORA, A ALEGADA AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO. PRESENTES OS REQUISITOS TIMBRADOS NO ART. 300 DO CPC. DECISÃO REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
Nas ações declaratórias negativas, a dinâmica da produção probatória guarda estreita ligação com a extensão das circunstâncias que fundamentam a causa de pedir, de tal maneira que, se o autor nega peremptoriamente a realização do negócio subjacente, inverte-se o ônus probatório, devendo o réu demonstrar a efetiva realização da avença que gerou o crédito por ele almejado, não se podendo impor a alguém a obrigação de demonstrar o que jamais aconteceu
; diferentemente, se o demandante esteia a sua pretensão, não na negativa absoluta do negócio causal, mas em fatos que extinguem, impedem ou modificam o direito de crédito do demandado, compete a ele, autor, fazer a respectiva prova (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4027656-07.2018.8.24.0900, de Navegantes, rel. Jorge Luis Costa Beber, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 11-04-2019).
No caso, a parte ré não apresentou o instrumento contratual no prazo preclusivo de resposta (arts. 223, 335 e 434 do CPC), deixando de observar o ônus probatório (arts. 373 e 6º, VIII, do CDC) e fazendo prevalecer a versão fática descrita na petição inicial, que afirma a inexistência da relação jurídica (contrato) que deu causa às obrigações impugnadas nos autos.
Sobre as consequências da inobservância ao ônus probatório na definição da tese fática prevalente, convém citar a lição da doutrina:
Ônus é o encargo cuja inobservância pode colocar o sujeito numa situação de desvantagem. Não é um dever e, por isso mesmo, não se pode exigir o seu cumprimento. Normalmente, o sujeito a quem se impõe o ônus tem interesse em observá-lo, justamente para evitar essa situação de desvantagem que pode advir da sua inobservância.
Ônus da prova é, pois, o encargo que se atribui a um sujeito para demonstração de determinadas alegações de fato
. Esse encargo pode ser atribuído (i) pelo legislador; (ii) pelo juiz ou (iii) por convenção das partes.
A atribuição feita pelo legislador é prévia e estática (invariável de acordo com as peculiaridades da causa); a distribuição feita pelo juiz ou pelas partes é considerada dinâmica, porque feita à luz de uma situação concreta.
O legislador, conforme será visto adiante, estabelece abstratamente quem arca com a falta de provas; são as chamadas regras sobre ônus da prova. Mas essas regras podem ser alteradas, em determinadas circunstâncias, pelo juiz ou, atendidos certos requisitos, por convenção das partes.
As regras de ônus da prova devem ser analisadas a partir de duas perspectivas (dimensões ou funções).
Numa primeira perspectiva, elas são regras dirigidas aos sujeitos parciais, orientando, como um farol, a sua atividade probatória. Tais regras predeterminam os encargos probatórios, estabelecendo prévia e abstratamente a quem cabe o ônus de provar determinadas alegações de fato. Fala-se aí em ônus subjetivo (ônus formal, segundo Barbosa Moreira) ou função subjetiva das regras do ônus da prova, que permite "dar conhecimento a cada parte da sua parcela de responsabilidade na formação do material probatório destinado à construção do juízo de fato".
"O desejo de obter a vitória cria para a litigante a necessidade, antes de mais nada, de pesar os meios de que se poderá valer no trabalho de persuasão, e de esforçar-se, depois, para que tais meios sejam efetivamente utilizados na instrução da causa. Fala-se, ao propósito, de ônus da prova, num primeiro sentido (ônus subjetivo ou formal)".
Sucede que é possível que as provas produzidas sejam insuficientes para revelar a verdade dos fatos. Mesmo sem prova, porém, impõe-se ao juiz o dever de julgar - afinal, é vedado é o non liquet. É aí que entra a segunda perspectiva pela qual se podem enxergar as regras sobre ônus da prova: trata-se de regramento dirigido ao juiz (uma regra de julgamento), que indica qual das partes deverá suportar as consequências negativas eventualmente advindas da ausência, ao cabo da atividade instrutória, de um determinado elemento de prova. Sob esse ângulo, fala-se em ônus objetivo (ou material, segundo Barbosa Moreira).
"A circunstância de que, ainda assim, o litígio deva ser decidido torna imperioso que alguma das partes suporte o risco inerente ao mau êxito da prova. Cuida então a lei,em geral, de proceder a uma distribuição de riscos: traça critérios destinados a indicar, conforme o caso, qual dos litigantes terá de suportá-los, arcando com as conseqüências desfavoráveis de não se haver provado o fato que lhe aproveitava. Aqui também se alude ao ônus da prova, mas num segundo sentido (ônus objetivo ou material)"
[...]
Em síntese, as regras processuais que disciplinam a distribuição do ônus da prova tanto são regras dirigidas às partes, na medida em que as orientam sobre o que precisam provar (ônus subjetivo), como também são regras de julgamento dirigidas ao órgão jurisdicional, tendo em vista que o orientam como decidir em caso de insuficiência das provas produzidas (ônus subjetivo) - o último refúgio para evitar o non liquet.
"
O valor normativo das disposições pertinentes à distribuição do onus probandi assume real importância na ausência de prova: em semelhante hipótese é que o juiz há de indagar a qual dos litigantes competia o ônus, para imputar-lhe as consequências desfavoráveis da lacuna existente no material probatório
" (DIDIER JR., Fredie
et al
.
Curso de direito processual civil
: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedente, processo estrutural e tutela provisória. 18ª Ed. São Paulo: Juspodivm, 2023, p. 136-138)
Portanto, mostra-se correta a sentença na parte em que declara a inexistência de relação jurídica contratual entre as partes.
Acerca do tema:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA DO NOME DA AUTORA PERANTE CADASTRO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO RÉU. ALEGADA AUSÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. NÃO ACOLHIMENTO.
RÉU QUE NÃO COMPROVOU A REGULARIDADE DA DÍVIDA QUE DEU ENSEJO AO CADASTRO NEGATIVO. AUSÊNCIA DE JUNTADA DO CONTRATO BANCÁRIO CAPAZ DE EVIDENCIAR A RELAÇÃO JURÍDICA COM A AUTORA. ÔNUS DE DEMONSTRAR OS FATOS EXTINTIVOS DO DIREITO PLEITEADO NA INICIAL QUE INCUMBIA À INSTITUIÇÃO BANCÁRIA, EM CONFORMIDADE COM O ART. 373, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
. [...] (TJSC, Apelação n. 5016012-93.2021.8.24.0011, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Volnei Celso Tomazini, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 18-05-2023).
Daí o desprovimento do recurso.
3.2. Repetição do indébito
A parte ré também postula a reforma da sentença para que a repetição de indébito seja afastada.
No caso, a providência postulada é cabível, mas apenas em parte.
No julgamento do EAREsp n. 676.608/RS, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça definiu que
“A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC)
independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida
, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva”.
Consta da ementa do julgado:
3. Quanto ao citado parágrafo único do art. 42 do CDC, abstrai-se que
a cobrança indevida será devolvida em dobro, "salvo hipótese de engano justificável". Em outras palavras, se não houver justificativa para a cobrança indevida, a repetição do indébito será em dobro
. A divergência aqui constatada diz respeito ao caráter volitivo, a saber: se a ação que acarretou cobrança indevida deve ser voluntária (dolo/má-fé) e/ou involuntária (por culpa).
4. O próprio dispositivo legal caracteriza a conduta como engano e somente exclui a devolução em dobro se ele for justificável. Ou seja, a conduta base para a repetição de indébito é a ocorrência de engano, e
a lei, rígida na imposição da boa-fé objetiva do fornecedor do produto ou do serviço, somente exclui a devolução dobrada se a conduta (engano) for justificável (não decorrente de culpa ou dolo do fornecedor)
.
5.
Exigir a má-fé do fornecedor de produto ou de serviço equivale a impor a ocorrência de ação dolosa de prejudicar o consumidor como requisito da devolução em dobro, o que não se coaduna com o preceito legal
. Nesse ponto, a construção realizada pela Segunda Seção em seus precedentes, ao invocar a má-fé do fornecedor como fundamento para a afastar a duplicação da repetição do indébito, não me convence, pois atribui requisito não previsto em lei.
6. A tese da exclusividade do dolo inviabiliza, por exemplo, a devolução em dobro de pacotes de serviços, no caso de telefonia, jamais solicitados pelo consumidor e sobre o qual o fornecedor do serviço invoque qualquer "justificativa do seu engano". Isso porque o requisito subjetivo da má-fé é prova substancialmente difícil de produzir. Exigir que o consumidor prove dolo ou má-fé do fornecedor é imputar-lhe prova diabólica, padrão probatório que vai de encontro às próprias filosofia e ratio do CDC.
Contudo, mesma ocasião a Corte Especial determinou a modulação dos efeitos da decisão, a fim de determinar que o novo entendimento se aplique apenas a situações ocorridas após a data da publicação do acórdão, em 30/03/2021.
Veja-se:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. TELEFONIA FIXA. COBRANÇA INDEVIDA. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS. 1)
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO (PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 42 DO CDC). DESINFLUÊNCIA DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE REALIZOU A COBRANÇA INDEVIDA. DOBRA CABÍVEL QUANDO A REFERIDA COBRANÇA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA
. 2) APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL DO CÓDIGO CIVIL (ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL). APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 412/STJ. 3)
MODULAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA DECISÃO
. CONHECIMENTO E PROVIMENTO INTEGRAL DO RECURSO. 1. Trata-se de embargos de divergência interpostos contra acórdão em que se discute o lapso prescricional cabível aos casos de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia. Discute-se, ainda, acerca da necessidade de comprovação da má-fé pelo consumidor para aplicação do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. (...)
Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão
. A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão (STJ - EAREsp n. 676.608/RS, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021).
No caso, verifica-se que a parte ré não apresentou justa causa para a realização dos descontos, tendo em vista que decorreram de relação contratual declarada inexistente. Verifica-se, ainda, que uma parte dos descontos indevidos ocorreu antes de 30/03/2021, enquanto outra parte ocorreu após (
evento 1, EXTR4
e
evento 1, HISCRE5
).
Por tal motivo, mostra-se cabível a repetição em dobro (art. 42, parágrafo único, do CDC), mas apenas de parte dos valores desembolsados pela parte autora após 30/03/2021, conforme orientação sedimentada no âmbito desta Câmara (AC n. 5007661-17.2020.8.24.0125, Rel. Des. Joao Marcos Buch, j. 10-10-2023; AC n. 5009901-32.2022.8.24.0020, Rel. Des. Alex Heleno Santore, j. 03-10-2023; AC n. 5004173-58.2022.8.24.0004, Rel. Des. Alexandre Morais da Rosa, j. 26-09-2023), apurando-se o total devido em sede de liquidação (arts. 491, § 1º, e 509 do CPC) ou diretamente no cumprimento de sentença (art. 524, § 2º, do CPC), com correção monetária e juros de mora nos termos da sentença (ressalvada a reanálise do termo inicial dos juros de mora no recurso da parte autora).
A título ilustrativo, cita-se:
CONSUMIDOR. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. NEGATIVA DE CONTRATAÇÃO. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. [...]
REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. COMPROVAÇÃO DE MÁ-FÉ. DESNECESSIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 42 DO CDC. POSSIBILIDADE, PORÉM, SOMENTE QUANTO AOS DESCONTOS EFETIVADOS A PARTIR DE 30.03.2021, CONFORME MODULAÇÃO DOS EFEITOS DETERMINADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO JULGAMENTO DO EARESP 676.608
. [...] (TJSC, Apelação n. 5001289-81.2023.8.24.0049, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Alexandre Morais da Rosa, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 28-11-2023).
Assim, provê-se parcialmente o recurso, reformando-se a sentença no tocante à repetição de indébito, que passa em parte simples e em parte dobrada.
Daí o provimento parcial do recurso.
II. RECURSO DA PARTE AUTORA
1. Preliminares
Não há preliminares em contrarrazões para análise.
2. Admissibilidade
Presentes os pressupostos legais, admite-se o recurso.
3. Mérito
Passa-se ao exame do mérito.
O caso, antecipa-se, é de provimento parcial.
3.1. Danos morais e dever de indenizar
A parte autora busca a reforma da sentença proferida na origem, a fim de que a parte ré seja condenada ao pagamento de indenização por danos morais.
A pretensão, todavia, não merece acolhimento.
A responsabilidade civil objetiva (art. 927, parágrafo único, do CC), incidente nas demandas de consumo (arts. 12 e 14 do CDC), pressupõe o ato ilícito (arts. 186 e 187 do CC), o dano (extra)patrimonial (arts. 12 e 402 do CC) e o nexo de causalidade direta, imediata e adequada entre o ilícito e o dano (art. 403 do CC).
Na hipótese, tais requisitos não estão integralmente evidenciados.
Ainda que esteja caracterizado ato ilícito da parte ré, consistente em desconto em benefício previdenciário sem fundamento contratual legítimo (arts. 186 e 187 do CC), não se verifica, no caso dos autos, o dano moral, assim considerado como lesão séria e juridicamente relevante a atributos da personalidade (arts. 5º, V e X, da CF e 12 do CC) e/ou à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), conforme entendimento adotado no âmbito desta Câmara, a saber:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INCONFORMISMO DA PARTE AUTORA. MÉRITO.
DANO MORAL CONFIGURADO. TESE INSUBSISTENTE. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO CIVIL NO SENTIDO DE QUE DEVE HAVER PROVA DA AFETAÇÃO CONCRETA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA OU DE UM DOS ELEMENTOS DA PERSONALIDADE
(IRDR N. 5011469-46.2022.8.24.0000). [...] (TJSC, Apelação n. 5007112-87.2022.8.24.0011, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Eliza Maria Strapazzon, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 26-09-2023).
Isso porque a jurisprudência dominante deste Tribunal de Justiça (TJSC, IRDR n. 5011469-46.2022.8.24.0000, Grupo de Câmaras de Direito Civil, Rel. Des. Marcos Fey Probst, j. 09/08/2023), a ser seguida por este órgão fracionário por razões de isonomia (arts. 5º,
caput
, e 19, III, da CF) e de segurança jurídica (arts. 30 da LINDB e 926 e 927 do CPC), firmou-se no sentido de que a realização de descontos em benefício previdenciário ou verba salarial não é suficiente, por si só, para caracterizar dano moral presumido (arts. 374, I a IV, e 375 do CPC), exigindo-se comprovação efetiva (art. 373, I, do CPC) da lesão extrapatrimonial alegada.
A respeito do tema:
APELAÇÕES CÍVEIS.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO
C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES
E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. RECURSO DA AUTORA.
PLEITO DE CONDENAÇÃO DA PARTE ADVERSÁRIA AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO À TÍTULO DE DANOS MORAIS. NÃO ACOLHIMENTO. TESE QUE AFASTA O DANO IN RE IPSA PACIFICADA NO COLEGIADO DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO CIVIL (IRDR N. 5011469-46.2022.8.24.0000). NECESSIDADE DE PROVAS DO ABALO ANÍMICO NA ESPÉCIE
. NÃO COMPROVAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO NO PONTO.
Segundo consolidado pelo Grupo de Câmaras de Direito Civil deste Tribunal, "não é presumido o dano moral quanto o desconto indevido em benefício previdenciário decorrer de contrato de empréstimo consignado declarado inexistente pelo poder judiciário" (Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 5011469-46.2022.8.24.0000
, rel. Marcos Fey Probst, j. 9-8-2023).
Na espécie, ainda que reconhecida a ilicitude da contratação na modalidade indigitada, não restou demonstrada situação ensejadora de violação dos direitos da personalidade da parte autora, tampouco comprovação de abalo anímico resultante dos abatimentos realizados
. [...] (TJSC, Apelação n. 5007661-17.2020.8.24.0125, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Joao Marcos Buch, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 10-10-2023).
Na situação concreta, os descontos efetuados pela parte ré, no valor de aproximadamente de R$ 52,25 (cinquenta e dois reais e vinte e cinco centavos) ao mês, resultam no comprometimento de cerca de 3,95% (três inteiros e noventa e cinco centésimos por cento) do benefício previdenciário mensal da parte autora, que era de R$ 1.320,00 (mil trezentos e vinte reais), conforme documentação constante dos autos (
evento 1, EXTR4
).
Portanto, é evidente que os descontos não comprometeram a subsistência da parte autora, ao menos não a ponto de lesar atributos da personalidade, direitos existenciais ou a própria dignidade pessoal, de modo que não há dano moral a ser reparado, havendo apenas prejuízos de ordem patrimonial.
Nessa linha:
APELAÇÃO CÍVEL.
DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO
. INDICADA ABUSIVIDADE DAS COBRANÇAS POR VÍNCULO ASSOCIATIVO NÃO CELEBRADO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR.
PRETENDIDA CONDENAÇÃO DA RÉ AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSUBSISTÊNCIA. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO QUE NÃO CONFIGURA DANO MORAL PRESUMIDO. DESCONTOS QUE NÃO SUPERAM 10% DA APOSENTADORIA DO AUTOR. INEXISTÊNCIA DE PROAS ADICIONAIS, A COMPROVAR O ALEGADO ABALO ANÍMICO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA
. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO (TJSC, Apelação n. 5013550-68.2023.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Marcos Fey Probst, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 28-11-2023).
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS
MATERIAIS E
MORAIS. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA PARTE AUTORA
. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. [...] (III)
DANO MORAL. ABALO ANÍMICO NÃO CONFIGURADO. DESCONTOS QUE CONSUMIAM MENOS DE 9% DA RENDA AUFERIDA PELA AUTORA. MONTANTE INCAPAZ DE COMPROMETER A ESFERA PATRIMONIAL DA DEMANDANTE. PREJUÍZO QUE SE RESOLVE NA ÓRBITA MATERIAL
. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. ÔNUS SUCUMBENCIAIS REDISTRIBUÍDOS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5013329-02.2021.8.24.0038, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Saul Steil, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 11-07-2023).
AGRAVO INTERNO (ART. 1.021, CPC) EM APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO COM DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. CONTRATAÇÃO REFUTADA
. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
DECISÃO MONOCRÁTICA QUE CONHECEU E PROVEU PARCIALMENTE APELO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA PARA AFASTAR A CONDENAÇÃO A INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSURGÊNCIA DA AUTORA. DEFENDIDA CARACTERIZAÇÃO DO DANO MORAL INDENIZÁVEL POR SE TRATAR DE DANO IN RE IPSA. TESE REJEITADA. DANO QUE NÃO SE PRESUME. DESCONTOS ILEGAIS QUE NÃO ULTRAPASSARAM 5% (CINCO POR CENTO) DO VALOR DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE PROVA DE QUE A SITUAÇÃO ACARRETOU RESTRIÇÃO CREDITÍCIA, SITUAÇÃO VEXATÓRIA OU COMPROMETIMENTO DE SUBSISTÊNCIA. ÔNUS DA PROVA QUE COMPETIA À AGRAVANTE E DO QUAL NÃO SE DESINCUMBIU. INTELIGÊNCIA DO ART. 373, I, DO CPC. SITUAÇÃO QUE NÃO ULTRAPASSOU O MERO DISSABOR. ABALO ANÍMICO NÃO EVIDENCIADO
. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (TJSC, Apelação n. 0308628-78.2019.8.24.0038, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Haidée Denise Grin, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 19-10-2023).
Assim, ausente o dano moral (arts. 5º, V e X, da CF e 12 do CC), afasta-se a configuração da responsabilidade civil indenizatória (art. 927 do CC).
Tal percepção se reforça pelo fato de a ação só ter sido proposta pouco mais de 5 (cinco) anos depois que os descontos indevidos iniciaram.
Afinal, se os valores descontados fossem efetivamente imprescindíveis para garantir o sustento e para a existência digna da parte autora, o ajuizamento da ação se daria com certa agilidade e não com demora considerável, como no caso.
O tempo decorrido até que o juízo fosse acionado indica (art. 375 do CPC) que os descontos não foram notados ou que foram simplesmente tolerados pela parte autora, sugerindo que, em qualquer dos cenários, não houve o aviltamento de bens jurídicos extrapatrimoniais, a ponto de legitimar uma compensação pecuniária.
Sobre o assunto, convém citar a jurisprudência desta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS COM DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PRETENDIDA A INDENIZAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS NA FORMA DOBRADA. PARCIAL ACOLHIMENTO. CONSECTÁRIO LÓGICO DA INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO COBRADO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO PROFERIDA PELO STJ NO EARESP N. 600.663/RS. RESTITUIÇÃO DEVIDA EM DOBRO APÓS 30-3-2021. PARCELAS DEBITADAS ATÉ A RESPECTIVA DATA QUE DEVEM SER RESTITUÍDAS NA FORMA SIMPLES. DESCONTOS NO CASO DOS AUTOS OCORRIDOS ANTERIORMENTE E POSTERIORMENTE AO REFERIDO MARCO. POSTULADA A INCIDÊNCIA DE JUROS DE MORA QUANTO AOS DANOS MATERIAIS A CONTAR DO EVENTO DANOSO. ACOLHIMENTO. JUROS QUE DEVEM SER CONTADOS A PARTIR DE CADA DESCONTO INDEVIDO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 54 DO STJ. REQUERIDO O AFASTAMENTO DA COMPENSAÇÃO DE VALORES. PARCIAL ACOLHIMENTO. DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS QUE É CONSECTÁRIO LÓGICO DA INEXISTÊNCIA DOS CONTRATOS, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DA PARTE AUTORA. CONTUDO, PARTES QUE NÃO PODEM RECUPERAR VALORES NÃO DISPONIBILIZADOS DIRETAMENTE ENTRE SI. COMPENSAÇÃO QUE DEVE SER LIMITADA ÀS QUANTIAS EFETIVAMENTE DEPOSITADAS NA CONTA BANCÁRIA DA DEMANDANTE.
ALMEJADA A CONDENAÇÃO DO RÉU AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSUBSISTÊNCIA. HIPÓTESE DE DANO NÃO PRESUMIDO. INTERSTÍCIO TEMPORAL CONSIDERÁVEL ENTRE O INÍCIO DOS DESCONTOS E O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS MÍNIMOS DA OCORRÊNCIA DE FATOS CONCRETOS CAUSADORES DE DOR PSÍQUICA E DESASSOSSEGO À RECORRENTE. PROVA DOCUMENTAL QUE SE REVELA INSUFICIENTE PARA DEMONSTRAR O FATO CONSTITUTIVO DO ALEGADO ABALO ANÍMICO
. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA DOS LITIGANTES. RESPONSABILIDADE DAS PARTES NA PROPORÇÃO DO RESPECTIVO ÊXITO ALCANÇADO NA DEMANDA. EXIGIBILIDADE SUSPENSA EM RELAÇÃO À PARTE AUTORA. PARTE BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 98, § 3º, DO CPC. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO (TJSC, Apelação n. 5001653-35.2022.8.24.0034, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Carlos Roberto da Silva, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 05-10-2023).
Com isso, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se a sentença que julgou improcedente o pedido de condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais.
3.2. Juros de mora incidentes sobre a repetição do indébito
A parte autora pretende, ademais, por meio do recurso, a reforma da sentença impugnada, a fim de alterar o termo inicial dos juros de mora incidentes sobre a repetição do indébito para a data do evento danoso.
Para tanto, alega, resumidamente, que o termo inicial dos juros de mora incidentes sobre a repetição do indébito, fixado na sentença, viola a Súmula n. 54 do STJ.
A pretensão, adianta-se, merece acolhimento.
O juízo
a quo
fixou os consectários legais incidentes sobre a repetição do indébito nos seguintes termos (
evento 85, SENT1
):
i)
determinar a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente dos contracheques da parte autora, em razão da ausência de contratação, atualizados monetariamente pelo INPC desde a data de cada desconto indevido e acrescidas de
juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês
desde a citação
.
Sobre o tema, o entendimento sumulado do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que
"
Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual
"
(Súmula n. 54 do STJ). Afinal, conforme a legislação vigente,
"
Nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o praticou
"
(art. 398 do CC).
Na hipótese, trata-se de caso de responsabilidade extracontratual (contrato inexistente) proveniente de ato ilícito (descontos indevidos). Consequentemente, o termo inicial dos juros de mora é a data de cada desconto indevido (evento danoso) (art. 398 do CC c/c Súmula n. 54 do STJ), não a data da citação.
Daí o provimento do recurso, a fim de determinar a fluência dos juros de mora incidentes sobre a repetição do indébito a contar da data de cada desconto indevido.
3.3. Compensação de créditos
A parte autora pretende afastar a compensação entre o crédito reconhecido nos presentes autos e o montante disponibilizado em sua conta bancária pela parte ré em razão do contrato declarado inexistente.
Cuida-se, como se verá, de medida inviável.
O contrato foi declarado inexistente depois que a parte ré já havia creditado (emprestado) valores na conta bancária da parte autora. Dessa forma, os efeitos indevidamente produzidos pelo contrato inexistente devem ser desfeitos, restabelecendo-se o
status quo ante
(arts. 182 do CC e 4º da LINDB).
Significa, em outras palavras, que a parte autora deve restituir à parte ré os valores que foram creditados em sua conta bancária a título de empréstimo, sob pena de enriquecimento sem causa, em prejuízo da parte contrária (art. 884 do CC).
Acerca do tema:
APELAÇÃO CÍVEL. "
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA"- RMC
. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DOS REQUERIMENTOS DEDUZIDOS NA PEÇA PORTAL. INCONFORMISMO DO BANCO. PRETENDIDA REFORMA DA SENTENÇA PARA RECONHECER A REGULARIDADE DA PACTUAÇÃO. INACOLHIMENTO. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). PACTO NÃO EXIBIDO. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 6º, III E 52, AMBOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INEXISTÊNCIA DA CONTRATAÇÃO PROCLAMADA, COM DETERMINAÇÃO DE RETORNO DAS PARTES AO STATUS QUO ANTE. SENTENÇA MANTIDO NO VIÉS. [...]
NECESSIDADE, POR OUTRO LADO, DO AUTOR RESTITUIR AO RÉU, DE FORMA SIMPLES, O VALOR QUE RECEBEU A TÍTULO DE EMPRÉSTIMO, CORRIGIDO MONETARIAMENTE DESDE A DATA DO DEPÓSITO. IMPOSSIBILIDADE DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA.
POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 368, DO CÓDIGO CIVIL. SENTENÇA MODIFICADA NO PONTO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. BANCO QUE PUGNA PELO AFASTAMENTO. CHANCELA. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. PRECEDENTES DESTE COLEGIADO. DECISUM ALTERADO NESTE ASPECTO.
ÔNUS SUCUMBENCIAIS. RECALIBRAGEM IMPERATIVA FACE A MODIFICAÇÃO DO DECISÓRIO. PARTES RECIPROCAMENTE VENCEDORAS E VENCIDAS. RESPONSABILIDADE DISTRIBUÍDA PROPORCIONALMENTE.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO (TJSC, Apelação n. 5018254-90.2022.8.24.0075, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. José Carlos Carstens Kohler, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 31-10-2023).
Vale destacar, no ponto, que a quantia creditada indevidamente na conta bancária da parte autora (por força do contrato inexistente) não se qualifica como amostra grátis, nos termos do art. 39, parágrafo único, do CDC, de maneira que não pode o consumidor, pura e simplesmente, apropriar-se dos valores, sob pena de enriquecimento ilícito em prejuízo do fornecedor demandado.
Essa é a orientação jurisprudência desta Câmara:
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA COM DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA QUE RECONHECEU A INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA E NEGOU PLEITO INDENIZATÓRIO. RECLAMO DA AUTORA
. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. BENESSE JÁ CONCEDIDA EM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO. AUSÊNCIA DE RELEVANTE MODIFICAÇÃO NA CONDIÇÃO FINANCEIRA. BENEFÍCIO MANTIDO EM FAVOR DA AUTORA. PLEITO DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA MODALIDADE DOBRADA. PARCIAL ACOLHIMENTO. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STJ NO EARESP 676.608/RS EM RAZÃO DA MODULAÇÃO DOS EFEITOS. ORIENTAÇÃO A INCIDIR SOBRE AS COBRANÇAS INDEVIDAS REALIZADAS SOMENTE A PARTIR DA DATA DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO, 30/03/2021. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA PARA DETERMINAR A DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS DESCONTOS POSTERIORES A MARÇO/2021. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUANTO À DEVOLUÇÃO SIMPLES DOS DESCONTOS REALIZADOS ANTERIORMENTE A 30/03/2021. APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, NO PONTO. PLEITO DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES DESTINADOS À QUITAÇÃO EM RAZÃO DO REFINANCIAMENTO. NÃO ACOLHIMENTO. A DEVOLUÇÃO DEVE ABRANGER TÃO SOMENTE AS OPERAÇÕES QUE TIVERAM IMPACTO NA ESFERA PATRIMONIAL DA AUTORA. TENDO EM VISTA QUE O REFINANCIAMENTO FOI OPERADO UNICAMENTE ENTRE AS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS, NADA A ESSE TÍTULO FOI INDEVIDAMENTE TOMADO DA AUTORA DE MODO QUE NADA HÁ A RESTITUIR. RECLAMO CONHECIDO E DESPROVIDO, NO PONTO.
PRETENDIDO AFASTAMENTO DA COMPENSAÇÃO DE VALORES. INSUBSISTÊNCIA. INAPLICÁVEL, À ESPÉCIE, O ART. 39, III, DO CDC, UMA VEZ QUE NÃO SE PODE EQUIPARAR DEPÓSITO REALIZADO PELA ENTIDADE BANCÁRIA, ENQUANTO ENTENDIA VÁLIDO O CONTRATO ORA INVALIDADO, COM "AMOSTRA GRÁTIS" QUE, POR SUA VEZ, PRESSUPÕE A VOLUNTARIEDADE DA CONDUTA DO FORNECEDOR EM PRESTAR SERVIÇO SABIDAMENTE NÃO SOLICITADO. NULIFICAÇÃO DO CONTRATO, ADEMAIS, QUE IMPÕE O RETORNO DAS PARTES AO STATUS QUO ANTE. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA POR AMBAS AS PARTES (ART. 884, CC). ADMITIDA A COMPENSAÇÃO DE VALORES INDEVIDAMENTE DESLOCADOS DA ESFERA PATRIMONIAL DE AMBAS AS PARTES (ART. 368, CC)
. [...] RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. ÔNUS SUCUMBENCIAIS REDISTRIBUÍDOS EM DESFAVOR INTEGRAL DA RÉ. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS (TJSC, Apelação n. 5000305-45.2023.8.24.0034, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Joao Marcos Buch, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 28-11-2023).
As quantias a ser restituídas pela parte autora, ademais, sujeitam-se à incidência de correção monetária desde a data do crédito e juros de mora desde a data do trânsito em julgado da sentença.
Para fins de correção monetária e de juros de mora, aplicam-se os índices legais correspondentes (arts. 389 e 406 do CC, antes e depois da Lei 14.905/2024),
1
observadas as regras de Direito Intertemporal (arts. 5º, XXXVI, da CF e 6º da LINDB), na ausência de disposição legal ou convencional em contrário.
Nesse sentido:
CONSUMIDOR.
DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS NÃO CONTRATADOS
. PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECURSO DO AUTOR. PRELIMINAR DE INOVAÇÃO RECURSAL SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES. INOCORRÊNCIA. DEVIDA CONTRAPOSIÇÃO À TESE APRESENTADA NA RÉPLICA. PREFACIAL REJEITADA. MÉRITO. REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. POSSIBILIDADE SOMENTE QUANTO AOS DESCONTOS EFETIVADOS A PARTIR DE 30.03.2021, CONFORME MODULAÇÃO DOS EFEITOS DETERMINADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO JULGAMENTO DO EARESP 676.608. ACOLHIMENTO PARCIAL. JUROS DE MORA DA CONDENAÇÃO. ALTERAÇÃO DEVIDA. INCIDÊNCIA A PARTIR DE CADA DESCONTO ILEGAL, POR SE TRATAR DE RELAÇÃO EXTRACONTRATUAL [ENUNCIADO 54 DA SÚMULA DO STJ].
PLEITO DE MANUTENÇÃO DO VALOR TRANSFERIDO PELA CASA BANCÁRIA COMO ESPÉCIE DE "AMOSTRA GRÁTIS". [CDC, ART. 39, INCISO III]. NECESSÁRIA RESTITUIÇÃO
POR MEIO DE COMPENSAÇÃO COM O VALOR DA CONDENAÇÃO,
SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA [CC, ART. 876]. NÃO ACOLHIMENTO. JUROS DE MORA, POR OUTRO LADO, DEVIDOS DESDE O TRÂNSITO EM JULGADO DESTES AUTOS, E NÃO DA INTIMAÇÃO DA SENTENÇA. ACATAMENTO NO PONTO.
DANO MORAL. AUSÊNCIA DE PRESUNÇÃO, CONFORME DIRETRIZES FIXADAS POR ESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA [IRDR, TEMA 25]. CASO CONCRETO. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA AUTORAL SEM LASTRO EM FATOS PARA ALÉM DOS PRÓPRIOS DESCONTOS. DESCABIMENTO. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. REDISTRIBUIÇÃO NECESSÁRIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO (TJSC, Apelação n. 5001655-05.2022.8.24.0034, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Alexandre Morais da Rosa, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 19-09-2023).
Para promover o pagamento das quantias mencionadas, de todo modo, a parte autora não precisa desembolsar recursos ou efetuar eventual depósito judicial, bastando que proceda à compensação de créditos (arts. 368 e 369 do CC). Com isso, o total a ser restituído à parte ré (valor mutuado mais consectários) fica automaticamente deduzido do total que esta (parte ré) deve pagar à parte autora, possibilitando-se a execução de eventual saldo remanescente (art. 523 do CPC).
A propósito:
CONSUMIDOR.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. NEGATIVA DE CONTRATAÇÃO. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS
. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECURSO DA AUTORA. PRELIMINARES CONTRARRECURSAIS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INOCORRÊNCIA. DIÁLOGO CLARO E DIRETO ENTRE AS RAZÕES RECURSAIS E O CONTEÚDO DA SENTENÇA. INOVAÇÃO RECURSAL. INEXISTÊNCIA. TESE APRESENTADA NA RÉPLICA. PRELIMINARES REJEITADAS. MÉRITO. PEDIDO DE MANUTENÇÃO DO VALOR TRANSFERIDO PELA CASA BANCÁRIA COMO ESPÉCIE DE "AMOSTRA GRÁTIS" [CDC, ART. 39, INCISO III]. NÃO ACOLHIMENTO.
NECESSÁRIA RESTITUIÇÃO POR MEIO DE COMPENSAÇÃO COM O VALOR DA CONDENAÇÃO
, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA [CC, ART. 876]. RECURSO DESPROVIDO (TJSC, Apelação n. 5024529-26.2022.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Alexandre Morais da Rosa, Oitava Câmara de Direito Civil, j. 24-10-2023).
Assim, rejeita-se o recurso da parte autora no tocante à compensação.
III. SUCUMBÊNCIA
Provido em parte os recursos, altera-se o resultado do julgamento (art. 1.008 do CPC), mantendo-se, contudo, a procedência parcial dos pedidos formulados na petição inicial.
Diante da sucumbência recíproca (art. 86,
caput
, do CPC), tanto do ponto de vista quantitativo quanto qualitativo (TJSC, AC n. 5006404-95.2020.8.24.0079, Rel. Des. Rubens Schulz, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 23-09-2021), cabe:
a) à parte autora o pagamento proporcional de 50% (cinquenta por cento) das despesas processuais (art. 82, § 2º, do CPC) e, ainda, de honorários fixados em 10% (dez por cento) do proveito econômico obtido pela parte ré (aquilo que a parte autora deixou de ganhar) (art. 85, § 2º, do CPC);
b) à parte ré o pagamento proporcional de 50% (cinquenta por cento) das despesas processuais (art. 82, § 2º, do CPC) e, ainda, de honorários fixados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (art. 85, § 2º, do CPC c/c Tema n. 1.076 do STJ).
Destaca-se, no ponto, que
"
A redistribuição dos ônus sucumbenciais, com a alteração dos honorários advocatícios sucumbenciais fixados na origem, é mera consequência lógica do julgamento do recurso
"
(STJ, AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.212.029/DF, Rel. Min. Humberto Martins, Terceira Turma, j. 28/8/2023), que deve ser implementada pelo órgão julgador (arts. 85,
caput
, e 1.008 do CPC) independentemente de pedido expresso (art. 322, § 1º, do CPC), não caracterizando decisão
ultra
ou
extra petita
(arts. 142, 490, 492 e 1.013, § 1º, do CPC).
Observa-se, ainda, que
"
O redimensionamento da sucumbência afasta a aplicação do art. 85, § 11, do CPC/15, referente a honorários recursais
"
(STJ, AgInt no AREsp n. 2.107.043/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 09/11/2022).
Caso decorram de vitória da parte assistida pela Defensoria Pública, os honorários são devidos ao Fundo de Reaparelhamento da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina – FADEP/SC, nos termos dos arts. 4º, XXI, da LC n. 80/1994, 4º, XIX, da LC Estadual n. 575/2012, 2º da Lei Estadual n. 17.870/2019 e 1º da Resolução CSDPESC n. 119/2022, e do Tema de Repercussão Geral n. 1.002 do STF.
Por fim, ressalva-se a suspensão de exigibilidade das verbas sucumbenciais, na forma e pelo prazo prescritos no art. 98, § 3º, do CPC, caso a parte condenada ao pagamento seja beneficiária da gratuidade da justiça.
IV. ADVERTÊNCIA
A fim de evitar a prática de atos protelatórios ou infundados, capazes de retardar a entrega da prestação jurisdicional em prazo razoável (arts. 5º, LXXVIII, da CF e 139, II, do CPC), adverte-se, na mesma linha dos Tribunais Superiores (STF, ARE n. 1.497.385, Rel. Min. Cristiano Zanin, j. 19/06/2024, e STJ, AREsp n. 2.689.732, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 19/11/2024), que a interposição de novos recursos contra a presente decisão poderá ensejar a aplicação de multa, de ofício (arts. 77, II, 80, I, IV, VI e VII, 81, 139, I e II, 1.021, § 4º, e 1.026, § 2º, do CPC). Esclarece-se, ainda, que eventual deferimento da gratuidade da justiça não impede a imposição da multa e a exigência do respectivo pagamento (art. 98, § 4º, do CPC).
DISPOSITIVO
Ante o exposto: a) conheço em parte do recurso da parte ré e dou-lhe provimento parcial, a fim de determinar a repetição do indébito simples para os descontos realizados até 30/03/2021 e em dobro para os posteriores, com correção monetária e juros de mora; b) conheço do recurso da parte autora e dou-lhe provimento parcial, a fim de determinar a fluência dos juros de mora incidentes sobre a repetição do indébito a contar da data de cada desconto indevido; c) redistribuo as verbas de sucumbência fixadas na sentença.
Intimem-se.
Arquivem-se os autos após o trânsito em julgado.
1. - ÍNDICES LEGAIS DE CORREÇÃO MONETÁRIA: INPC até 29/08/2024 (art. 1º do Provimentos CGJ/SC 13/1995 e 24/2024); IPCA a partir de 30/08/2024 (art. 389, parágrafo único, do CPC, com redação dada pela Lei 14/905/2024); - ÍNDICES LEGAIS DE JUROS DE MORA: 6% (seis por cento) ao ano, ou 0,5% (meio por cento) ao mês, até 10/01/2023 (arts. 1.062 e 1.063 do CC/1916, Enunciado 164 da III Jornada de Direito Civil do CJF e STJ, Corte Especial, REsp Repetitivo 1.111.119/PR); SELIC a partir de 11/01/2003 (art. 406 do CC, inclusive antes da redação dada pela Lei 14.905/2024, conforme STJ, Corte Especial, REsp Repetitivo 1.111.119/PR e REsp 1.795.982/SP); - CUMULAÇÃO DE ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA E DE JUROS DE MORA: os índices legais de correção monetária aplicam-se nas obrigações positivas e líquidas reconhecidas em juízo (art. 1º da Lei 6.899/1981) apenas enquanto não houver mora (arts. 397 do CC e 240 do CPC; STJ, AgInt no REsp n. 1.757.675/PR). Constituída a mora, passa a incidir apenas a taxa legal de juros moratórios (SELIC), que já atua, a um só tempo, para fins de correção monetária e de juros de mora, vedando-se a cumulação com outros índices (STJ, REsp 2.161.067/SC e Resp Repetitivo REsp 1.003.955/RS).
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