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Bradesco Saude S/A x Andre Barbosa Barretto

ID: 300389277

Tribunal: TJRS Órgão: Secretaria da 6ª Câmara Cível Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 5379858-72.2024.8.21.7000

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

BRADESCO SAUDE S/A

Polo Passivo:

ANDRE BARBOSA BARRETTO

DECISÃO MONOCRÁTICA

Advogados:

SAMIR SQUEFF NETO

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

GERALDO NOGUEIRA DA GAMA

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

Agravo de Instrumento Nº 5379858-72.2024.8.21.7000/RS TIPO DE AÇÃO: Tratamento médico-hospitalar RELATORA : Desembargadora FABIANA AZEVEDO DA CUNHA BARTH AGRAVANTE : BRADESCO SAUDE S/A ADVOGADO(A) :… Agravo de Instrumento Nº 5379858-72.2024.8.21.7000/RS TIPO DE AÇÃO: Tratamento médico-hospitalar RELATORA : Desembargadora FABIANA AZEVEDO DA CUNHA BARTH AGRAVANTE : BRADESCO SAUDE S/A ADVOGADO(A) : GERALDO NOGUEIRA DA GAMA (OAB RS005951) AGRAVADO : ANDRE BARBOSA BARRETTO ADVOGADO(A) : SAMIR SQUEFF NETO (OAB RS062245) EMENTA DIREITO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO DE HEMODIÁLISE. NEGATIVA DE COBERTURA. TUTELA DE URGÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu tutela de urgência para custeio de tratamento de hemodiálise. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão consiste na análise da probabilidade do direito e do perigo de dano para a concessão da tutela de urgência. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. A probabilidade do direito está evidenciada pela ausência de cláusula contratual que exclua expressamente o custeio do tratamento de hemodiálise, conforme análise sumária dos termos contratuais. 4. O perigo de dano é evidente, considerando o risco iminente de agravamento da saúde do autor, conforme prova que acompanhou a petição inicial. 5. Por ora, restou comprovado que a negativa de cobertura não se encontra amparada em exclusão contratual expressa, configurando prática abusiva, o que justifica a manutenção da tutela de urgência. IV. DISPOSITIVO E TESE: 6. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. A negativa de cobertura de tratamento de hemodiálise por plano de saúde, sem exclusão contratual expressa, configura prática abusiva, justificando a concessão de tutela de urgência para garantir o custeio do tratamento. ___________ Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 300; CDC, art. 47. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 948634, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 20.10.2020; STJ, Súmula 608. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de agravo de instrumento interposto por BRADESCO SAUDE S/A em face da decisão que, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer ajuizada por ANDRE BARBOSA BARRETTO , deferiu o pedido de tutela de urgência, cujo teor ora transcrevo ( evento 14, DESPADEC1 ): Cuida-se de ação de obrigação de fazer, em que o autor narra ter sido diagnosticado com insuficiência renal grave, necessitando tratamento de hemodiálise de forma ambulatorial. Esclareceu que houve a negativa de cobertura do plano de saúde, sob alegação de que não haveria cobertura para despesas da emergência ou de tratamento ambulatorial, mas apenas aqueles realizados em situação de internação. Postulou, em sede de tutela de urgência, a determinação para a ré custear o tratamento de hemodiálise, sob pena de aplicação de multa diária. É o breve relatório. Decido. O pedido de tutela provisória de urgência tem previsã no art. 300, do Código de Processo Civil, desde que haja elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. No caso, tenho que restaram suficientemente preenchidos, em sede de cognição sumária, os pressupostos legais exigidos para autorizar a concessão da medida antecipatória. Pretende o autor que a parte ré preste assistência através da cobertura a tratamento de hemodiálise necessário, conforme requisição médica, evento 1, ATESTMED8 ; no entanto, houve negativa ( evento 12, CERTNEG2 ). A urgência e o risco estão evidenciados na própria gravidade da doença descrita no atestado médico, o qual indica a necessidade do tratamento de forma urgente, sofrendo o autor risco de morte. Nessa linha, os planos de saúde apenas podem estabelecer para quais moléstias oferecerão cobertura, não lhes cabendo limitar o tipo de tratamento que será prescrito, incumbência essa que pertence ao profissional da medicina que assiste o paciente. Ademais, a alegação da ré de que está obrigada a fornecer hemodiálise, apenas em sede de interação hospitalar não deve prosperar, uma vez que o entendimento atual do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e do STJ (Súmula 608) é de que os contratos anteriores à lei dos planos de saúde se submetem ao Código de Defesa do Consumidor, com interpretação mais benéfica aos contratantes. A propósito, destaco: APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. PLANO DE SAÚDE. AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE CONTRATO DE COBERTURA DE PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA. HEMODIÁLISE . CONTRATO NÃO REGULAMENTADO. INAPLICABILIDADE DA LEI 9.656/98 . INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. COBERTURA DEVIDA. 1. AINDA QUE INAPLICÁVEL A LEI 9.656/98 AOS CONTRATOS DE PLANO DE SAÚDE FIRMADOS EM DATA ANTERIOR , A QUESTÃO DEVE SER APRECIADA À LUZ DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (SÚMULA 608 DO STJ), COM INTERPRETAÇÃO MAIS BENÉFICA AOS ADERENTES CONFORME (ART. 47 DO CDC). 2. O PLANO DE SAÚDE NÃO PODE SE RECUSAR A CUSTEAR TRATAMENTO PRESCRITO PELO MÉDICO, POIS CABE A ESTE DEFINIR QUAL É O MAIS INDICADO PARA O SEGURADO. ALÉM DISSO, O QUE IMPORTA É A EXISTÊNCIA DE COBERTURA DO CONTRATO PARA A DOENÇA APRESENTADA PELA PARTE AUTORA, NÃO IMPORTANDO A FORMA COMO O TRATAMENTO SERÁ MINISTRADO. 3. NOS TERMOS DO ART. 51, IV, DO CDC, MOSTRA-SE ABUSIVA A CLÁUSULA CONTRATUAL QUE EXCLUI DO TRATAMENTO O FÁRMACO PLEITEADO, UMA VEZ QUE COLOCA O CONSUMIDOR EM DESVANTAGEM EXAGERADA FRENTE À OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE. RECURSO DESPROVIDO.(Apelação Cível, Nº n.º244015220198210001, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Julgado em: 25-08-2021) Nesse sentido, DEFIRO o pedido de tutela antecipada, para determinar que as rés custeiem o tratamento de hemodiálise, nos termos do evento 1, ATESTMED8 , no prazo de 72 horas. Fixo multa diária no valor de R$ 850,00, na hipótese de descumprimento do decisum , limitada inicialmente a quinze dias. Cite-se o réu para, querendo, apresentar contestação, no prazo de quinze dias, sob pena de revelia. Cumpra-se com urgência. Intimem-se. Diligências Legais. Em suas razões recursais ( evento 1, INIC1 ), a parte agravante sustentou que o contrato de plano de saúde firmado entre as partes, celebrado em 1976 e não adaptado à Lei 9.656/98, não prevê cobertura para procedimentos ambulatoriais relacionados a casos crônicos, como o tratamento de hemodiálise indicado ao agravado. Alegou que o contrato é regido exclusivamente pelas condições gerais contratadas, sem subordinação ao Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS. Defendeu a ausência de prova inequívoca e de perigo de dano que justificassem a concessão da medida liminar, afirmando que a decisão é irreversível e pode causar desequilíbrio nas relações contratuais, uma vez que o prêmio pago pelo segurado reflete as coberturas contratadas. Requereu, ao final, o recebimento do agravo no efeito suspensivo e, no mérito, pleiteou o provimento do recurso para revogar a decisão que concedeu a tutela de urgência. Subsidiariamente, caso mantida a decisão, solicitou a exigência de caução idônea pelo agravado como condição para o cumprimento da medida. O recurso foi recebido apenas no efeito legal ( evento 6, DESPADEC1 ). A parte agravada deixou transcorrer in albis o prazo para contrarrazões. Vieram conclusos para julgamento. É o relatório. I. ADMISSIBILIDADE Os requisitos de admissibilidade já foram analisados quando do recebimento do recurso ( evento 6, DESPADEC1 ). Ainda, conforme sumulado pelo E. Superior Tribunal de Justiça e com base no Regimento Interno deste E. Tribunal de Justiça, havendo entendimento dominante acerca do tema, é possível ao relator, por decisão monocrática, dar ou negar provimento a recurso manejado. Nesse sentido, dispõe a Súmula 568 do STJ: Súmula 568. O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema. Na mesma linha, o artigo 206 do Regimento Interno deste Tribunal: Art. 206. Compete ao Relator: XXXVI – negar ou dar provimento ao recurso quando houver jurisprudência dominante acerca do tema no Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça com relação, respectivamente, às matérias constitucional e infraconstitucional e deste Tribunal; Nesses termos, o presente recurso comporta pronunciamento monocrático, tendo em vista que outro não seria o resultado alcançado em julgamento colegiado nesta 6ª Câmara Cível. II. MÉRITO Passo, então, à análise do mérito da inconformidade, adiantando que estou por negar provimento ao recurso. A agravante pretende a reforma da decisão do juízo de origem que deferiu o pedido de custeio do tratamento de hemodiálise pleiteado pelo autor. A tutela de urgência será concedida quando presentes os dois elementos preconizados pelo art. 300 do Código de Processo Civil (CPC) 1 , quais sejam, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Conforme explicam Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira, para caracterização da probabilidade do direito necessária a verossimilhança fática e a plausabilidade jurídica. 2 Inicialmente, é necessária a verossimilhança fática, com a constatação de que há um considerável grau de plausabilidade em torno da narrativa dos fatos trazidas pelo autor. É preciso que se visualize, nessa narrativa, uma verdade provável sobre os fatos, independentemente da produção de prova. Junto a isso, deve haver uma plausabilidade jurídica, com a verificação de que é provável a subsunção dos fatos à norma invocada, conduzindo aos efeitos pretendidos. Sobre o tema, ressalto que o Supremo Tribunal Federal (STF), em sede de Repercussão Geral (Tema 123), consolidou o entendimento de que os contratos de plano de saúde firmados antes da vigência da Lei nº 9.656/1998, e que não foram objeto de adaptação às disposições dessa legislação, devem ser considerados como atos jurídicos perfeitos, preservando a autonomia de vontade das partes, que optaram por manter inalterados seus planos antigos. Isto é, tais contratos mantêm plena validade e eficácia de suas cláusulas, conforme as condições pactuadas originalmente. Vejamos: RECURSO EXTRAORDINÁRIO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 123 DA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO CIVIL. APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO. PLANOS DE SAÚDE. LEI 9.656/1998. DISCUSSÃO SOBRE A SUA APLICAÇÃO EM RELAÇÃO A CONTRATOS FIRMADOS ANTERIORMENTE À RESPECTIVA VIGÊNCIA. I - A blindagem constitucional ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e à coisa julgada configura cláusula pétrea, bem assim um dos pilares de sustentação do Estado Democrático de Direito, consubstanciando garantias individuais de todos os cidadãos. II - Os efeitos decorrentes da entrada em vigor da Lei 9.656/1998 em relação a fatos passados, presentes, futuros e pendentes pode variar, de acordo com os diferentes graus da retroatividade das leis, admitida pela doutrina e jurisprudência em casos particulares. III - Dentro do campo da aplicação da lei civil no tempo é que surge a regulamentação do setor de prestação de assistência suplementar à saúde, como forma de intervenção estatal no domínio econômico, implementada pela Lei 9.656/1998, a gerar reflexos no campo da aplicação da lei civil no tempo. IV - A expansão da assistência privada à saúde, paralelamente à sua universalização, para além de estar calcada no direito constitucional de acesso à saúde, também atende aos ditames da livre iniciativa e da proteção ao consumidor, ambos princípios norteadores da ordem econômica nacional. V - Como em qualquer contrato de adesão com o viés de aleatoriedade tão acentuado, a contraprestação paga pelo segurado é atrelada aos riscos assumidos pela prestadora, sendo um dos critérios para o seu dimensionamento o exame das normas aplicáveis à época de sua celebração. VI - Sob a perspectiva das partes, é preciso determinar, previamente, quais as regras legais que as vinculam e que servirão para a interpretação das cláusulas contratuais, observado, ainda, o vetusto princípio pacta sunt servanda. VII - A dimensão temporal é inerente à natureza dos contratos de planos de saúde, pois as operadoras e os segurados levaram em conta em seus cálculos, à época de sua celebração, a probabilidade da ocorrência de riscos futuros e as coberturas correspondentes. VIII - As relações jurídicas decorrentes de tais contratos, livremente pactuadas, observada a autonomia da vontade das partes, devem ser compreendidas à luz da segurança jurídica, de maneira a conferir estabilidade aos direitos de todos os envolvidos, presumindo-se o conhecimento que as partes tinham das regras às quais se vincularam. IX - A vedação à retroatividade plena dos dispositivos inaugurados pela Lei 9.656/1998, como aqueles que dizem respeito à cobertura de determinadas moléstias, além de obedecer ao preceito pétreo estampado no art. 5°, XXXVI, da CF, também guarda submissão àqueles relativos à ordem econômica e à livre iniciativa, sem que se descuide da defesa do consumidor, pois todos encontram-se expressamente previstos no art. 170 da CF. X - Os contratos de planos de saúde firmados antes do advento da Lei 9.656/1998 constituem atos jurídicos perfeitos, e, como regra geral, estão blindados contra mudanças supervenientes, ressalvada a proteção de outros direitos fundamentais ou de indivíduos em situação de vulnerabilidade. XI - Nos termos do art. 35 da Lei 9.656/1998, assegurou-se aos beneficiários dos contratos celebrados anteriormente a 10 de janeiro de 1999 a possibilidade de opção pelas novas regras, tendo o § 4° do mencionado dispositivo proibido que a migração fosse feita unilateralmente pela operadora. XII - Em suma: As disposições da Lei 9.656/1998, à luz do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, somente incidem sobre os contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como nos contratos que, firmados anteriormente, foram adaptados ao seu regime, sendo as respectivas disposições inaplicáveis aos beneficiários que, exercendo sua autonomia de vontade, optaram por manter os planos antigos inalterados. XIII - Recurso extraordinário a que se dá provimento (RE 948634, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 20/10/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-274 DIVULG 17-11-2020 PUBLIC 18-11-2020). Ocorre que, no caso dos autos, a parte demandada afirma, em suas razões recursais, que o contrato foi firmado em maio de 1976, ou seja, de fato, antes da Lei nº 9.656/1998. Portanto, de acordo com o julgamento do STF, a referida legislação não retroage para incidir sobre tais contratos firmados antes do início da vigência lei em comento, razão pela qual a cobertura deve seguir o constante no contrato firmado entre as partes, observando suas disposições sobre coberturas e exclusões. Conforme referido, a ré negou a cobertura do tratamento requerido alegando que não havia previsão no contrato do custeio de "casos crônicos e suas consequências". Entretanto, analisando, em juízo de cognição sumária, os termos contratuais ( evento 24, ANEXO2 ), verifica-se a inexistência de cláusula que expressamente exclua o custeio do tratamento de hemodiálise (Cláusula 8ª). Nota-se que a cláusula descreve alguns procedimentos excluídos da cobertura, no entanto, não há menção específica à hemodiálise. Dessa forma, a recusa ao custeio do tratamento prescrito pelo médico que assiste o paciente, em análise sumária dos fatos, não está amparada em exclusão expressamente prevista nos termos do contrato celebrado entre as partes, razão pela qual está configurado o requisito da probabilidade do direito posto em causa pela parte autora, a justificar o deferimento da tutela antecipatória de urgência pelo juízo de origem. O perigo de dano, por sua vez, está evidenciado também em favor da parte autora e não à agravante, pelo risco iminente de agravamento da saúde do demandante, conforme o atestado médico juntado aos autos ( evento 1, ATESTMED8 ), caso o tratamento seja interrompido. A ausência do procedimento poderia ocasionar danos graves e irreversíveis, comprometendo a integridade física do autor, o que justifica a manutenção da medida de urgência. Nesse sentido, alguns julgados desta C. 6ª Câmara Cível: APELAÇÕES CÍVEIS. SEGURO. PLANO DE SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. NEGATIVA DE CUSTEIO. COPARTICIPAÇÃO. CONTRATO NÃO REGULAMENTADO . AUSENTE EXCLUSÃO EXPRESSA DO TRATAMENTO NO CONTRATO. COPARTICIPAÇÃO NÃO PREVISTA NO PACTO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. PRELIMINAR DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE AFASTADA. RECURSO QUE SE CONTRAPÕE À SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA COM FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE PARA O CONHECIMENTO DA INCONFORMIDADE. O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL (TEMA 123), CONSOLIDOU O ENTENDIMENTO DE QUE OS CONTRATOS DE PLANO DE SAÚDE FIRMADOS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.656/1998, E QUE NÃO FORAM OBJETO DE ADAPTAÇÃO ÀS DISPOSIÇÕES DESSA LEGISLAÇÃO, DEVEM SER CONSIDERADOS COMO ATOS JURÍDICOS PERFEITOS, PRESERVANDO A AUTONOMIA DE VONTADE DAS PARTES, QUE OPTARAM POR MANTER INALTERADOS SEUS PLANOS ANTIGOS. ASSIM, MANTÊM PLENA VALIDADE E EFICÁCIA DE SUAS CLÁUSULAS, CONFORME AS CONDIÇÕES PACTUADAS ORIGINALMENTE. EMBORA NÃO SE TRATE DE CONTRATO REGULAMENTADO PELA LEI DOS PLANOS DE SAÚDE, POSSÍVEL ANALISAR SUA JURIDICIDADE E, PORTANTO, EVENTUAL ABUSIVIDADE DE SUAS CLÁUSULAS, COM FUNDAMENTO NO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ CONTRATUAL E NA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS (ARTIGOS 421 E 422 DO CÓDIGO CIVIL), SENDO APLICÁVEL À ESPÉCIE, AINDA, O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, CONFORME ASSENTADO NA SÚMULA 608 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AUSENTE CLÁUSULA DE EXCLUSÃO EXPRESSA DO TRATAMENTO PLEITEADO, A RECUSA AO CUSTEIO NÃO ESTÁ AMPARADA PELOS TERMOS DO CONTRATO, CONFIGURANDO-SE, PORTANTO, EM PRÁTICA ABUSIVA. ASSIM, RECONHECIDO O DEVER DE FORNECIMENTO DO TRATAMENTO PRESCRITO, NOS LIMITES DA SENTENÇA. INEXISTINDO NO CONTRATO PREVISÃO CLARA SOBRE A COBRANÇA DE COPARTICIPAÇÃO PARA O TRATAMENTO REQUERIDO, INDEVIDA A EXIGÊNCIA PELO PLANO DE SAÚDE. SENTENÇA REFORMADA NESSE PONTO. REDIMENSIONAMENTO DA SUCUMBÊNCIA, HAJA VISTA O DECAIMENTO MÍNIMO DA PARTE AUTORA. APELAÇÃO DO RÉU DESPROVIDA E RECURSO DA PARTE AUTORA PROVIDO.(Apelação Cível, Nº 50041521820198215001, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabiana Azevedo da Cunha Barth, Julgado em: 27-03-2025); APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE . CONTRATO NÃO REGULAMENTADO PELA LEI Nº 9.656/98. ENTIDADE DE AUTOGESTÃO. INAPLICABILIDADE DO CDC. CLÁUSULA CONTRATUAL DE EXCLUSÃO DE COBERTURA. CONTRADIÇÃO E AUSÊNCIA DE CLAREZA SOBRE SEUS LIMITES. SITUAÇÃO DE URGÊNCIA. CARACTERIZADA. SENTENÇA MANTIDA. - No caso dos autos se está diante de contrato de autogestão, que também é não regulamentado / não adaptado, de modo que inaplicáveis as disposições da Lei dos Planos de Saúde aos contratos firmados anteriormente à sua vigência e não adaptados aos seus termos, bem como, no caso, também não é aplicável o Código de Defesa do Consumidor. - Assim, eventual abusividade nas cláusulas do documento poderá ser aferida à luz do Código Civil. Não há como rechaçar o reconhecimento da boa-fé e da função social dos contratos, à inteligência dos artigos 421 e 422 do Código Civil, bem como interpretação mais favorável das cláusulas contratuais, nos termos do art. 423 CC. - O contrato firmado entre as partes não é claro a respeito dos limites da cobertura para tratamento psiquiátrica, havendo contradições entre seus termos, como bem delineado pelo juízo a quo. Ademais, demonstrada pela parte autora a situação de urgência, conforme atestado firmado pelo médico assistente, sendo ilícita, portanto, a negativa da operadora. - Sentença mantida. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 51281837020228210001, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gelson Rolim Stocker, Julgado em: 25-07-2024); APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. PLANO DE SAÚDE. ESTUDO ELETROFISIOLÓGICO PARA MAPEAMENTO COM ABLAÇÃO DE ARRITMIA VENTRICULAR. NEGATIVA DE COBERTURA. CONTRATO NÃO REGULAMENTADO E ANTERIOR AO ANO DE 1998. INAPLICABILIDADE DA LEI 9.656/98 AOS PLANOS NÃO REGULAMENTADOS QUE IMPEDE A EXTENSÃO DA COBERTURA PREVISTA PARA O PLANO DE REFERÊNCIA, INSTITUÍDO PELA REFERIDA NORMA, AOS PLANOS ANTERIORES. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 10 § 2º E 35-E DA LEI 9.656/98 QUE ESTENDIAM SUA APLICAÇÃO AOS PLANOS ANTIGOS. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADI) 1931. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 123. AUSÊNCIA DE EXCLUSÃO EXPRESSA , NO CONTRATO, DO PROCEDIMENTO SOLICITADO. DEVER DE CUSTEIO CONFIGURADO. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 4º DA RESOLUÇÃO NORMATIVA N° 259 DA ANS. EM CASO DE INDISPONIBILIDADE DE PROVEDOR INTEGRANTE DA REDE ASSISTENCIAL QUE OFEREÇA O SERVIÇO OU PROCEDIMENTO DEMANDADO, NO MUNICÍPIO PERTENCENTE À ÁREA GEOGRÁFICA DE ABRANGÊNCIA E À ÁREA DE ATUAÇÃO DO PRODUTO, A OPERADORA DEVE GARANTIR O ATENDIMENTO EM PROVEDOR NÃO INTEGRANTE DA REDE ASSISTENCIAL NO MESMO MUNICÍPIO; OU PROVEDOR INTEGRANTE OU NÃO DA REDE ASSISTENCIAL NOS MUNICÍPIOS VIZINHOS. APELO NÃO PROVIDO.(Apelação Cível, Nº 50085629520228210028, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ney Wiedemann Neto, Julgado em: 25-07-2024); AGRAVO DE INSTRUMENTO. SEGUROS. AÇÃO COMINATÓRIA E CONDENATÓRIA. PLANO DE SAÚDE NÃO REGULAMENTADO . MENOR PORTADORA DO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. TERAPIAS MULTIDISCIPLINARES. AUSENTE CLÁUSULA CONTRATUAL QUE AFASTE O DEVER DE COBERTURA DAS TERAPIAS REALIZADAS COM PROFISSIONAIS DA ÁREA DA SAÚDE . 1) Tratando-se de plano não regulamentado , vez que o contrato foi firmado anteriormente à vigência da Lei nº 9.656/1998, se aplicam apenas as disposições nele pactuadas e as normas do CDC, conforme o verbete nº 608 da súmula de jurisprudência: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde , salvo os administrados por entidades de autogestão”. 2) O artigo 35 da Lei nº 9.656/98 prevê que suas disposições serão aplicáveis apenas a contratos celebrados a partir de sua vigência, não atingindo, assim, o fato jurídico posto em exame. 3) A Resolução Normativa nº 465/21 da ANS, por conseguinte, somente é aplicável a planos privados de assistência à saúde contratados a partir do ano de 1999 ou adaptados conforme Lei nº 9.656/98, o que não é o caso da parte autora. 4) Caso dos autos em que a negativa da operadora está fundada no fato de que o contrato do qual a autora é beneficiária não prevê a cobertura de terapias multidisciplinares, as quais somente passaram a ser de cobertura obrigatória a partir de abril/2008 com a vigência da Resolução Normativa nº 167/2007 estabelecendo o Rol de Procedimentos da ANS naquele período. 5) Contudo, inexiste qualquer vedação ou exclusão expressa no contrato a respeito das terapias multidisciplinares, de forma que não se vislumbra, nesse momento processual, qualquer cláusula capaz de afastar o dever de cobertura das terapias prescritas pelo médico assistente. 6) No caso telado, na parte em que a controvérsia relaciona-se às terapias de fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia, todas com metodologia ABA, as quais são desempenhadas por profissionais da área da saúde , entendo estar configurada a probabilidade do direito da parte, devendo ser mantida a decisão de origem. 7) Relativamente ao método ABA, o qual a requerida sustenta não possuir eficácia, destaco o recente julgamento do STJ, que definiu a controvérsia relativa ao Rol da ANS, no qual a terapia ABA foi considerada exceção à regra da taxatividade, justamente diante de sua eficácia comprovada no tratamento do Transtorno do Espectro Autista. 8) Por outro lado, na parte em que a controvérsia se relaciona à terapia com psicopedagogo, em razão de não ser desempenhada por profissional da área da saúde , não estando, destarte, enquadrada no objeto do contrato firmado entre as partes, inexiste probabilidade do direito a justificar a concessão da tutela de urgência, merecendo ser revogada a decisão de origem neste tocante. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.(Agravo de Instrumento, Nº 51630833420228217000, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eliziana da Silveira Perez, Julgado em: 15-12-2022). Dessa forma, deve ser merece provimento o presente recurso, sendo o caso de manutenção da r. decisão agravada. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento. 1 . Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. 2 . DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; e OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito Processual Civil, vol. 2. 15 ed. Salvador: Editora Jus Podium, 2020. p. 729.

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Financeira Alfa S.A. Credito, Financiamento E Investimentos x Luciana Andrea Guedes Silva e outros

ID: 333976291

Tribunal: TJRS Órgão: Secretaria da 17ª Câmara Cível Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 5193533-52.2025.8.21.7000

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

FINANCEIRA ALFA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS

Polo Passivo:

LUCIANA ANDREA GUEDES SILVA

DECISÃO MONOCRÁTICA

Advogados:

ORLI CARLOS MARMITT

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JÚLIO CESAR GOULART LANES

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ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO

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PAULO EDUARDO SILVA RAMOS

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FELIPE ANDRE DE CARVALHO LIMA

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NAYANNE VINNIE NOVAIS BRITTO

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NATHALIA SATZKE BARRETO

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JOSE GUILHERME CARNEIRO QUEIROZ

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ROBERTO ALVES FEITOSA

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Agravo de Instrumento Nº 5193533-52.2025.8.21.7000/RS TIPO DE AÇÃO: Superendividamento RELATORA : Desembargadora ALESSANDRA ABRAO BERTOLUCI AGRAVANTE : FINANCEIRA ALFA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E … Agravo de Instrumento Nº 5193533-52.2025.8.21.7000/RS TIPO DE AÇÃO: Superendividamento RELATORA : Desembargadora ALESSANDRA ABRAO BERTOLUCI AGRAVANTE : FINANCEIRA ALFA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS ADVOGADO(A) : JOSE GUILHERME CARNEIRO QUEIROZ (OAB RS105914A) AGRAVADO : LUCIANA ANDREA GUEDES SILVA ADVOGADO(A) : ROBERTO ALVES FEITOSA (OAB SP328643) INTERESSADO : BANCO MASTER S/A ADVOGADO(A) : NATHALIA SATZKE BARRETO ADVOGADO(A) : NAYANNE VINNIE NOVAIS BRITTO INTERESSADO : CREFAZ SOCIEDADE DE CREDITO AO MICROEMPREENDEDOR E A EMPRESA DE PEQUENO PORTE S.A. ADVOGADO(A) : FELIPE ANDRE DE CARVALHO LIMA INTERESSADO : FACTA FINANCEIRA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO ADVOGADO(A) : PAULO EDUARDO SILVA RAMOS INTERESSADO : JEITTO MEIOS DE PAGAMENTO LTDA. ADVOGADO(A) : ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO INTERESSADO : QUERO-QUERO VERDECARD INSTITUICAO DE PAGAMENTO S.A. ADVOGADO(A) : JÚLIO CESAR GOULART LANES INTERESSADO : VIA CERTA FINANCIADORA S/A - CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO ADVOGADO(A) : ORLI CARLOS MARMITT EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA. CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE. DECRETOS Nº 11.150/2022 E 11.567/2023. DESPROVIMENTO DO RECURSO. I. CASO EM EXAME: 1. Agravo de instrumento interposto pela instituição financeira contra decisão que, em ação de superendividamento, indeferiu a tutela de urgência, mas afastou a aplicação dos Decretos nº 11.150/2022 e 11.567/2023 em controle difuso de constitucionalidade. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 1. Há duas questões em discussão: (i) a possibilidade de concessão de tutela de urgência na ação de repactuação de dívidas por superendividamento antes da fase conciliatória; (ii) a viabilidade do controle difuso de constitucionalidade sobre os Decretos nº 11.150/2022 e 11.567/2023. III. RAZÕES DE DECIDIR: 1. A concessão de tutela de urgência em ações de superendividamento é possível antes da fase conciliatória, pois o procedimento de repactuação de dívidas admite a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, conforme o art. 318, parágrafo único. 2. A tutela provisória de urgência, prevista no art. 300 do CPC, configura instrumento essencial à efetividade da jurisdição, especialmente para preservar o mínimo existencial do consumidor superendividado. 3. O afastamento do Decreto nº 11.150/2022 é necessário, pois a exclusão dos contratos de empréstimo consignado do processo de repactuação esvaziaria a proteção legal, considerando que esta modalidade representa parcela substancial do endividamento excessivo dos consumidores. 4. O controle difuso de constitucionalidade sobre o Decreto nº 11.567/2023 é cabível, pois a fixação genérica de R$ 600,00 como mínimo existencial, sem considerar a situação socioeconômica individual, confronta o princípio da dignidade da pessoa humana. 5. A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul tem afastado a aplicação dos referidos decretos por representarem retrocesso aos direitos assegurados pela Lei nº 14.181/2021, que visa proteger o consumidor em situação de superendividamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 1. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. É cabível o controle difuso de constitucionalidade para afastar a aplicação dos Decretos nº 11.150/2022 e 11.567/2023 em ações de superendividamento, quando estes limitam a efetividade da proteção ao consumidor prevista na Lei nº 14.181/2021. ___________ Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 6º, incs. XI e XII; art. 54-A, § 1º; art. 104-A; CPC, art. 300; art. 318, parágrafo único; CF/1988, art. 5º, § 1º. Jurisprudência relevante citada: TJRS, Agravo de Instrumento, Nº 50725947720248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Rel. Roberto José Ludwig, j. 18-03-2024; TJRS, Agravo de Instrumento, Nº 51727697920248217000, Vigésima Terceira Câmara Cível, Rel. Pedro Luiz Pozza, j. 17-09-2024; TJRS, Agravo de Instrumento, Nº 51976228920238217000, Vigésima Quarta Câmara Cível, Rel. Altair de Lemos Junior, j. 25-10-2023. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de agravo de instrumento interposto por FINANCEIRA ALFA S.A. CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS , nos autos da ação de superendividamento ajuizada por LUCIANA ANDREA GUEDES SILVA , diante da decisão proferida pelo Juízo do Projeto de Gestão de Superendividamento que indeferiu a tutela de urgência. Eis os termos da decisão agravada, no que pertine à análise do presente recurso ( evento 15, DESPADEC1 ): DA TUTELA DE URGÊNCIA Consoante determina a Lei 14.181/21, a audiência de conciliação é fase obrigatória, nos termos do artigo 104-A, tratando-se do primeiro ato a ser realizado. Nada impede , todavia, que o pedido de tutela de urgência possa ser apreciado tão logo distribuída a ação, até porque, a fase consensual é requisito para a fase de mérito, e não para a fase de cognição sumária. Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU A LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EM TUTELA DE URGÊNCIA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO POR VIOLAÇÃO AO ART. 489, §1º, III, DO CPC: A decisão agravada apresenta fundamentos que são coerentes e se conectam diretamente com o caso concreto, observando suas particularidades, de modo que não há nulidade a ser reconhecida. POSSIBILIDADE DO DEFERIMENTO DA TUTELA ANTES DA AUDIÊNCIA CONCILIATÓRIA: Uma vez instaurado o processo, não há obstáculo legal ao deferimento da tutelas antecipatória que, no caso concreto, se deu como meio de assegurar a perfeita eficácia da função jurisdicional e a proteção do consumidor em situação de superendividamento (...). AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 50725947720248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto José Ludwig, Julgado em: 18-03-2024) Na lição de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero: "(...) Toda e qualquer providência capaz de alcançar um resultado prático à parte pode ser antecipada. Vale dizer: o pedido de tutela de urgência - satisfativa ou cautelar - não está limitado à proteção de apenas determinadas situações substanciais. A atipicidade da tutela de urgência, como da tutela jurisdicional geral, está ligada à necessidade de se oferecer uma cobertura o mais completa possível às situações substanciais carentes de proteção (...)". 11 Outrossim, incidente o artigo 318 do Código de Processo Civil a autorizar a prestação jurisdicional de cognição sumária no procedimento especial instaurado para tratamento do superendividamento, como forma de assegurar o resultado útil do processo e a preservação do mínimo existencial : Art.318: Aplica-se a todas as causas o procedimento comum, salvo disposição em contrário deste Código ou de lei. Parágrafo único. O procedimento comum aplica-se subsidiariamente aos demais procedimentos especiais e ao processo de execução. Assim, entendo pela possibilidade de análise do pedido de tutela antes da realização da audiência de conciliação , o que passo a fazer, conforme fundamentação supra: DO CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE - DECRETO 11.567/2023 A leitura do Decreto n. 11.567, de 19 de junho de 2023, confrontou o superprincípio da dignidade da pessoa, cuja função precípua era conferir-lhe unidade material. 12 Nessa senda, o princípio da dignidade atua como fundamento à proteção do consumidor superendividado e criador do direito ao mínimo existencial, cuja previsão infraconstitucional foi sedimentada pelo Poder Legislativo na Lei n.14.181/21, que atualizou o Código de Defesa do Consumidor, instalando um microssistema de crédito ao consumo. Para além da redação do regulamento determinado no Código do Consumidor atualizado, artigo 6 o , XI, a eficácia horizontal direta dos direitos fundamentais nas relações privadas para a preservação da dignidade da pessoa era avanço doutrinário e jurisprudencial pátrios já reconhecidos, a partir da previsão do art. 5 o , parágrafo 1 o da CF/88. 13 A respeito da vigência do Decreto em apreço, duas demandas pendem de julgamento no STF, respectivamente, a ADPF 1.005 e a ADPF 1.006, sob o fundamento da inconstitucionalidade do conteúdo, cuja fundamentação encontra coro na doutrina brasileira e Notas Técnicas elaboradas pelo Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor(Brasilcon), firmada pelo seu diretor-presidente (membro do Ministério Público e professor) Fernando Rodrigues Martins, e do Instituto de Defesa Coletiva, de Belo Horizonte, respectivamente publicadas em 27/7/2022 e 29/7/2022. Afinal, a garantia de R$ 600,00 (seiscentos reais) a qualquer família brasileira, sem considerar a situação sócio-econômica e individualizar as necessidades que comportam as despesas básicas de sobrevivência não representa interpretação harmônica com os valores constitucionais. Além disso, a lei n. 14. 181/2021 padece de conceito de mínimo existencial, que é um termo indeterminado e amplo, sem regulamentação. Portanto, passo à análise do caso concreto, sem incidência do Decreto n.11.567/2023, em controle difuso de constitucionalidade. CASO CONCRETO: Observados os documentos apresentados pela parte demandante, por ora, INDEFIRO o requerimento de tutela de urgência, pelas razões que passo a expor: O tratamento contemplado na Lei n. 14.181/21 destina a tutela legal para preservação precípua do mínimo existencial sem a concessão, como regra, do perdão de dívidas ou do prazo de suspensão da exigibilidade do pagamento. Ainda que intimada a parte demandante para emendar a inicial, esta não atendeu a determinação judicial em sua integralidade , pois os documentos requisitados não foram apresentados, sendo que, os contidos nos autos estão desatualizados e não permitem certeza sobre a existência dos descontos no percentual informado. A demonstração das despesas mencionadas não está comprovada de forma satisfatória , sendo que, ainda serão objeto de análise quando da segunda fase do procedimento Os documentos que integram os autos não são suficientes para evidenciar a situação alegada, não estando preenchidos, em sede de cognição sumária, os requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil. Assim, porque não demonstrada a probabilidade do direito reclamado e/ou perigo de dano ou disco ao resultado útil do processo, indefiro o pedido de tutela de urgência. Em caso de apresentação dos requisitos faltantes, a tutela de urgência SERÁ REAPRECIADA NA OPORTUNIDADE DO SANEAMENTO, TÃO SOMENTE , se formalizado pedido . Em suas razões recursais ( evento 1, INIC1 ), a parte agravante sustenta ser incabível a concessão de tutela de urgência na ação de repactuação de dívidas por superendividamento, alegando que tal medida prejudicaria a fase conciliatória, que é obrigatória e prioritária segundo o rito especial estabelecido pelo Código de Defesa do Consumidor. Aduz, ainda, a impossibilidade do controle difuso de constitucionalidade sobre os Decretos nº 11.150/2022 e 11.567/2023, por se tratarem de atos normativos secundários, cuja análise deveria se restringir ao plano da legalidade. Defende a plena aplicabilidade dos referidos decretos, os quais regulamentam o conceito de mínimo existencial e excluem expressamente as operações de crédito consignado do processo de repactuação. Requer, assim, a concessão de antecipação da tutela recursal para suspender os efeitos da decisão no ponto em que afastou a aplicação dos decretos e, ao final, a reforma integral da decisão para que seja reconhecida a aplicabilidade da normativa regulamentar e a impossibilidade de deferimento de tutela antecipada antes da audiência de conciliação. As custas foram recolhidas ( evento 4, GUIADEP2 ). Vieram os autos conclusos. É o breve relatório. Passo a decidir. Atendidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso. Conforme se verifica no art. 932, VIII, do CPC, incumbe ao relator o exercício das atribuições indicadas pelo Regimento Interno. Já a Súmula 568 do STJ estabelece que pode o relator, em decisão monocrática, dar ou negar provimento ao recurso, quando já houver entendimento consolidado sobre o tema no tribunal, senão vejamos: Súmula 568. O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema. No mesmo sentido, é o que refere o art. 206 do Regimento Interno deste Tribunal: Art. 206. Compete ao Relator: (...) XXXVI - negar ou dar provimento ao recurso quando houver jurisprudência dominante acerca do tema no Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça com relação, respectivamente, às matérias constitucional e infraconstitucional e deste Tribunal; Havendo entendimento sedimentado nesta 17ª Câmara Cível acerca da questão objeto do presente recurso, cabível o julgamento monocrático pelo relator, uma vez que o resultado não seria diferente em julgamento colegiado. Assim, passa-se à análise do mérito de forma monocrática. Da Tutela de Urgência É consabido que as demandas de repactuação de dívidas devem privilegiar o estabelecimento da conciliação, por meio dos métodos autocompositivos, sendo a fase judicial subsidiária. No entanto, diante de superendividamento é possível, em situações específicas, a concessão imediata de tutela de urgência. A adoção de medidas urgentes decorre da necessidade da preservação do mínimo existencial do consumidor, conforme previsto no art. 6º, incs. XI e XII, CDC. Embora o procedimento de repactuação de dívidas tenha regramento próprio, sua condução admite a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, conforme o art. 318, parágrafo único. A tutela provisória de urgência, prevista no art. 300 do CPC, configura instrumento essencial à efetividade da jurisdição, ao evitar o perecimento de direitos. No contexto do superendividamento, o perigo de dano ( periculum in mora ) é inerente à própria situação fática, na medida em que os descontos excessivos sobre a remuneração do consumidor violam, mês a mês, seu mínimo existencial, comprometendo sua própria subsistência e a de sua família. Sendo assim, desde que preenchidos os requisitos legais, é plenamente possível a concessão da tutela de urgência na ação de repactuação de dívidas. Do Controle de Constitucionalidade Não há reparos a serem feitos na decisão de primeiro grau. A pretensão da inicial trata de repactuação de dívidas, sob o regramento da Lei nº 14.181/2021, que alterou a legislação consumerista dispondo sobre a prevenção e tratamento do superendividamento. Conforme destaca a doutrina de Cláudia Lima Marques 1 , a nova legislação "revalorizou o microssistema do CDC, sistematizando no Código as normas sobre os novos paradigmas de informação e de concessão responsável de crédito, que preserve o mínimo existencial (...), reconhecendo o superendividamento (individual) do consumidor como um fator de exclusão social e um problema coletivo de política econômica e jurídica, que deve ser tratado como qualquer outro mal da sociedade de consumo". O conceito de superendividamento, nos termos da referida legislação, tem como elementos centrais a situação de insolvência e o comprometimento do mínimo existencial, entendido como o mínimo de recursos indispensáveis à manutenção da dignidade da pessoa humana e à sua sobrevivência enquanto consumidor pessoa natural. A Lei nº 14.181/2021 disciplina o procedimento em favor do consumidor em situação de superendividamento, que em razão da existência de débitos tenha comprometimento de seu mínimo existencial, nos termos do artigo 54-A, § 1º, do CDC. Dessa forma, o consumidor superendividado poderá obter a "recuperação judicial de pessoa física", apresentando plano de pagamento aos credores. Na hipótese, a instituição financeira agravante sustenta que os Decretos nº 11.150/2022 e nº 11.567/2023, por se tratarem de atos normativos secundários, não poderiam ser objeto de controle de constitucionalidade, devendo a análise limitar-se ao plano da legalidade. Tal argumento contudo não prospera. Vejamos: A invocação do Decreto nº 11.150/2022 com o propósito de afastar a inaplicabilidade da Lei nº 14.181/21 nos contratos de empréstimo consignado é inviável, dado que grande parte da remuneração da agravada está comprometida com esta categoria. Nesse sentido, precedentes deste Tribunal de Justiça: AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. SUPERENDIVIDAMENTO. PROCEDIMENTO CONCILIATÓRIO PRÉVIO. DESNECESSIDADE. PRELIMINAR DE NULIDADE REJEITADA. TUTELA ANTECIPADA. REQUISITOS DO ART. 300, DO CPC, PREENCHIDOS. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE. POSSIBILIDADE, DIANTE DAS PARTICULARIDADES DO CASO. CARACTERIZAÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. AFASTAMENTO DA INCIDÊNCIA DO DECRETO Nº 11.150/2022 . DIVISÃO DO PERCENTUAL DE FORMA PARITÁRIA ENTRE OS CREDORES. ASTREINTE. REDUÇÃO DO VALOR. DESCABIMENTO. Não merece acolhimento a alegada nulidade da decisão por supressão do procedimento conciliatório prévio, tendo em vista que o art. 104-A, do CDC, não a acondiciona ao exame da tutela de urgência. Preliminar rejeitada. Logrando a parte devedora, em cognição sumária, demonstrar a situação de superendividamento, admite-se a limitação dos descontos em folha de pagamento e conta corrente, no percentual de 35%, a fim de garantir-lhe o mínimo existencial. Afastamento da aplicabilidade do Decreto nº 11.150/2022 na caracterização do mínimo existencial, por contrariar a principiologia protetiva do sistema consumerista e retirar sobremaneira a aplicabilidade da ação de repactuação de dívidas por superendividamento , violando a hierarquia normativa do ordenamento jurídico brasileiro . Em se tratando de repactuação de dívidas com base no superendividamento, a divisão do percentual estabelecido para limitação dos descontos, em sede de antecipação de tutela, deve ser paritária entre os credores, nos termos da decisão agravada, já que necessário assegurar o direito de todos os demandados até a apresentação do plano de pagamento. A astreinte deve guardar uma relação de razoabilidade e proporcionalidade ao caso concreto, como na hipótese dos autos, não comportando, portanto, a sua redução, uma vez que em conformidade com os valores praticados por esta Câmara. PRELIMINAR REJEITADA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 51727697920248217000, Vigésima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Luiz Pozza, Julgado em: 17-09-2024) (grifei) AGRAVOS DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO, REVISÃO E INTEGRAÇÃO DE DÍVIDAS (SUPERENDIVIDAMENTO) PONTOS COMUNS: DA LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. CASO CONCRETO. Em relação ao desconto em folha de pagamento, a cláusula que o autoriza é lícita, pois é da própria essência dos contratos celebrados entre as partes. Na verdade, o desconto em folha de pagamento representa uma garantia do credor, o que, por sua vez, favorece o próprio financiado na medida em que permite redução na taxa de juros, melhores prazos e dispensa de outras garantias. Por outro lado, inobstante a licitude da cláusula, é necessária a sua limitação ao percentual permitido em lei como margem de consignação. Esta Câmara, em linha com o STJ (AgInt no REsp 1500846/DF, AgInt no AREsp 1427803/SP), passou a adotar o entendimento de que a limitação de desconto de 30% sobre os proventos de verba salarial somente se aplica à folha de pagamento ou conta salário, não se confundindo com a autorização de desconto em conta corrente. Ademais, em se tratando de servidor público, o STJ pacificou o seu entendimento acerca do limite de comprometimento dos descontos decorrentes dos empréstimos em folha de pagamento ao patamar de 30% sobre a remuneração bruta do servidor. No caso, a parte autora, ora agravada, é servidora pública e possui diversos descontos em seus contracheques a título de empréstimos consignados. Da análise do contracheque de matrícula 217491, verifica-se que os descontos (referente aos empréstimos consignados) totalizam a quantia de R$ 2.742,65, o que representa 41,49% da sua renda bruta (R$ 6.609,47). Ato sequente, da análise do contracheque de matrícula 222731, verifica-se que os descontos (refente aos empréstimos consignados) totalizam a quantia de R$ 1.282,00, o que representa 31,37% da sua renda bruta (R$ 4.086,18). Nesse cenário, considerando que os descontos na folha de pagamento da parte agravada ultrapassam o percentual de 30% de seus rendimentos brutos, deve ser mantida a decisão recorrida que os limitou em 35%, fins de evitar reformatio in pejus . (...). AGRAVOS DE INSTRUMENTO DO BANRISUL CONHECIDO EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, PARCIALMENTE PROVIDO. AGRAVO DE INSTRUMENTO DO SANTANDER CONHECIDO EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO. POR UNANIMIDADE.(Agravo de Instrumento, Nº 51976228920238217000, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Altair de Lemos Junior, Julgado em: 25-10-2023) (grifei) A exclusão de tal modalidade de crédito, que representa uma parcela substancial do endividamento excessivo dos consumidores brasileiros, especialmente servidores públicos e aposentados, resultaria no esvaziamento prático da proteção legal. A finalidade da lei é oferecer uma solução efetiva para a situação de insolvência do consumidor, e a exclusão dessa fonte de endividamento violaria o princípio da dignidade da pessoa humana e da proteção ao consumidor. Portanto, escorreita a decisão do juízo a quo que afastou a aplicação do referido Decreto. No que concerne ao controle difuso de constitucionalidade sobre o Decreto 11.567/2023, o juízo a quo assim decidiu: A leitura do Decreto n.11.567, de 19 de junho de 2023, confrontou o superprincípio da dignidade da pessoa, cuja função precípua era conferir-lhe unidade material. Nessa senda, o princípio da dignidade atua como fundamento à proteção do consumidor superendividado e criador do direito ao mínimo existencial, cuja previsão infraconstitucional foi sedimentada pelo Poder Legislativo na Lei n.14.181/21, que atualizou o Código de Defesa do Consumidor, instalando um microssistema de crédito ao consumo. Para além da redação do regulamento determinado no Código do Consumidor atualizado, artigo 6 o , XI, a eficácia horizontal direta dos direitos fundamentais nas relações privadas para a preservação da dignidade da pessoa era avanço doutrinário e jurisprudencial pátrios já reconhecidos, a partir da previsão do art. 5 o , parágrafo 1 o da CF/88. A respeito da vigência do Decreto em apreço, duas demandas pendem de julgamento no STF, respectivamente, a ADPF 1.005 e a ADPF 1.006, sob o fundamento da inconstitucionalidade do conteúdo, cuja fundamentação encontra coro na doutrina brasileira e Notas Técnicas elaboradas pelo Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), firmada pelo seu diretor-presidente (membro do Ministério Público e professor) Fernando Rodrigues Martins, e do Instituto de Defesa Coletiva, de Belo Horizonte, respectivamente publicadas em 27/7/2022 e 29/7/2022. Afinal, a garantia de R$ 600,00 (seiscentos reais) a qualquer família brasileira, sem considerar a situação sócio-econômica e individualizar as necessidades que comportam as despesas básicas de sobrevivência não representa interpretação harmônica com os valores constitucionais. Nesse sentido, inclusive, já decidiu este Tribunal de Justiça: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. SUPERENDIVIDAMENTO . TUTELA DE URGÊNCIA. INDEFERIMENTO NA ORIGEM. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu tutela de urgência para limitar descontos e cobranças mensais em conta bancária nos autos de ação de superendividamento . II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. O julgamento versa sobre: (i) possibilidade de concessão de tutela de urgência em ação de superendividamento antes da realização da audiência de conciliação; (ii) presença dos requisitos do art. 300 do CPC; (iii) aplicação da Lei n.º 14.181/2021 e afastamento do Tema 1085 do STJ; (iv) controle difuso de constitucionalidade do Decreto n.º 11.567/2023 . III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Artigo 300 do CPC. São requisitos para a concessão da tutela de urgência, a probabilidade do direito alegado pela parte e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. 4. Os descontos referentes aos contratos firmados após a edição da lei n.º 14.131/21 não devem superar o percentual de 35% dos proventos auferidos pelo consumidor, acrescidos de mais 5% se existirem descontos oriundos de cartão de crédito. 5. Caso no qual a parte autora refere a existência de dívidas, que comprometem aproximadamente 52% dos seus vencimentos mensais. Evidenciada suficientemente a probabilidade do direito. 6. Possível a limitação dos descontos também em conta-corrente, com base nos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da dignidade da pessoa humana. 7. Descontos diretamente em contracheque e conta-corrente que poderão implicar em prejuízo a subsistência da parte autora. Perigo de dano demonstrado. 8. Afastamento do Decreto 11.567/2023 , em controle difuso de constitucionalidade , que vem sendo aceito pela presente Corte. Ademais, a presente Câmara vem adotando entendimento de que se mostra inaplicável ao caso o disposto no Decreto n° 11.150/2022 e atualizações, o qual restringe a aplicação da Lei do Superendividamento , representando um retrocesso aos direitos assegurados pela Lei n° 14.181/2021. 9. Ausência de risco de irreversibilidade da medida, a qual pode ser facilmente revertida em caso de improcedência dos pedidos postos na petição inicial. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Recurso provido. 12. Teses de julgamento: 1. São requisitos para a concessão da tutela de urgência, a probabilidade do direito alegado pela parte (fumus boni iuris) e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (periculum in mora); 2. Os descontos referentes aos contratos firmados após a edição da lei n.º 14.131/21 não devem superar o percentual de 35% dos proventos auferidos pelo consumidor, acrescidos de mais 5% se existirem descontos oriundos de cartão de crédito; 3. Possível a limitação dos descontos em conta-corrente, com base nos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da dignidade da pessoa humana; 4. Possibilidade de afastamento do Decreto 11.567/2023 , em controle difuso de constitucionalidade . Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabiana Zilles, Julgado em: 24-06-2025) (grifou-se) AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUPERENDIVIDAMENTO . NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. SUPERENDIVIDAMENTO . LIMITAÇÃO DE DESCONTOS. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME: AGRAVO DE INSTRUMENTO INTERPOSTO POR INSTITUIÇÃO FINANCEIRA CONTRA DECISÃO QUE DEFERIU TUTELA DE URGÊNCIA PARA LIMITAR OS DESCONTOS INCIDENTES SOBRE A REMUNERAÇÃO DE CONSUMIDORA SUPERENDIVIDADA , COM FUNDAMENTO NA LEI Nº 14.181/2021. A DECISÃO AGRAVADA IMPÔS TETO DE 35% SOBRE OS PROVENTOS LÍQUIDOS DA AUTORA, PARA ABRANGER TODOS OS DESCONTOS AUTOMÁTICOS, INCLUSIVE CONSIGNAÇÕES EM FOLHA E DÉBITOS DIRETOS EM CONTA. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: I. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA DECISÃO POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO INDIVIDUALIZADA; II. VALIDADE DA LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS DIANTE DA ALEGADA APLICAÇÃO GENÉRICA DE PRECEDENTES; III. CONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO Nº 11.567/2023 ; IV. POSSÍVEL OCULTAÇÃO DE RENDA; V. APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.181/2021 PARA TUTELA DO MÍNIMO EXISTENCIAL. III. RAZÕES DE DECIDIR: REJEITA-SE A ALEGADA NULIDADE DA DECISÃO AGRAVADA, POIS A MAGISTRADA DE ORIGEM FUNDAMENTOU ADEQUADAMENTE A CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA COM BASE NOS ELEMENTOS CONSTANTES DOS AUTOS, EVIDENCIANDO A SITUAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO E A NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL, NOS TERMOS DO ART. 489, § 1º, IV, DO CPC. A PROLAÇÃO DE DECISÕES SEMELHANTES EM OUTROS FEITOS NÃO COMPROMETE A ANÁLISE DO CASO CONCRETO, ESPECIALMENTE DIANTE DA IDENTIDADE TEMÁTICA. A RECUSA À APLICAÇÃO DO DECRETO Nº 11.567/2023 , COM BASE EM CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE E NAS AÇÕES DE CONTROLE EM TRÂMITE NO STF (ADPFS 1.005 E 1.006), ESTÁ JURIDICAMENTE RESPALDADA E VISA RESGUARDAR OS PRINCÍPIOS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR HIPERVULNERÁVEL. A ALEGAÇÃO DE OCULTAÇÃO DE RENDA DEMANDA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA, SENDO INCABÍVEL SUA APRECIAÇÃO EM SEDE DE COGNIÇÃO SUMÁRIA. COMPROVADA A CONTRATAÇÃO DE MÚLTIPLOS EMPRÉSTIMOS, INCLUSIVE COM DÉBITO EM CONTA, CUJO VALOR COMPROMETE SIGNIFICATIVAMENTE A RENDA DA AUTORA, É LEGÍTIMA A IMPOSIÇÃO DE LIMITE PROPORCIONAL, GARANTINDO MARGEM DE SUBSISTÊNCIA. A JURISPRUDÊNCIA É PACÍFICA NO SENTIDO DE QUE NÃO HÁ PREJUÍZO IRREPARÁVEL À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DIANTE DA LIMITAÇÃO PARCIAL DOS DESCONTOS, ASSEGURANDO-SE FUTURA REPACTUAÇÃO CONFORME PREVISTO NA LEI Nº 14.181/2021. POR FIM, RESTA ULTRAPASSADA A DISCUSSÃO ACERCA DA LEGISLAÇÃO INCIDENTE PARA REGULAR A MARGEM CONSIGNÁVEL NO JUDICIÁRIO, EM ESPECIAL DIANTE DA NECESSIDADE DA PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE, PRINCÍPIOS DA RACIONALIDADE E PROPORCIONALIDADE, NÃO DIFERENCIAM O CONSUMIDOR SUPERENDIVIDADO SER SERVIDOR PÚBLICO OU NÃO. IV. DISPOSITIVO E TESE: AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO. MANTIDA A DECISÃO QUE LIMITOU OS DESCONTOS INCIDENTES SOBRE OS PROVENTOS DA PARTE AGRAVADA AO PERCENTUAL DE 35%, COM ACRÉSCIMO DE 5% EM CASO DE DÍVIDA ORIUNDA DE CARTÃO DE CRÉDITO COM PAGAMENTO AUTOMÁTICO, VISANDO ASSEGURAR A SUBSISTÊNCIA DIGNA DA CONSUMIDORA. TESE DE JULGAMENTO: “1. É VÁLIDA A DECISÃO QUE IMPÕE LIMITE DE ATÉ 35% DOS RENDIMENTOS LÍQUIDOS PARA DESCONTOS BANCÁRIOS EM FAVOR DE CONSUMIDOR SUPERENDIVIDADO , COM BASE NA LEI Nº 14.181/2021, VISANDO À PRESERVAÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. 2. A FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA E REPLICADA NÃO AFASTA, POR SI SÓ, A ANÁLISE DO CASO CONCRETO QUANDO DEMONSTRADOS OS ELEMENTOS INDIVIDUALIZADOS DA DEMANDA". DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CPC, ARTS. 489, § 1º, III E IV; CDC, ARTS. 6º, XII; 54-A; 104-A A 104-C; LEI Nº 14.181/2021. JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: TJRS, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5067518-72.2024.8.21.7000, 17ª CÂMARA CÍVEL, REL. DES.ª MARA LÚCIA COCCARO MARTINS, J. 11.04.2024.(Agravo de Instrumento, Nº 50904866220258217000, Vigésima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Kothe Werlang, Julgado em: 24-06-2025) (grifou-se) Nesse contexto, o controle de constitucionalidade realizado sobre o Decreto nº 11.567/2023 tem como objetivo assegurar a proteção do mínimo existencial do consumidor, em respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana, além de materializar o mandamento constitucional de garantia de uma existência digna a todos. Assim, mantenho o afastamento da aplicação dos Decretos nº 11.150/2022 e 11.567/2023 para análise da tutela de urgência. Dispositivo Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao Agravo de Instrumento, em decisão monocrática, nos termos da fundamentação supra . 1. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor [livro eletrônico] / Claudia Lima Marques, Antonio Herman V. Benjamin, Bruno Miragem. -- 7. ed. - São Paulo : Thomson Reuters Brasil, 2022.

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