Processo nº 1001508-54.2020.8.11.0042
ID: 261281547
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1001508-54.2020.8.11.0042
Data de Disponibilização:
28/04/2025
Advogados:
EGLENIO BARROS SOARES
OAB/MT XXXXXX
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THAYANE PINHEIRO DO NASCIMENTO
OAB/MT XXXXXX
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ARY DA COSTA CAMPOS
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001508-54.2020.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Seqüestro e cárcere privado, Crimes de Tortura, Promo…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001508-54.2020.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Seqüestro e cárcere privado, Crimes de Tortura, Promoção, constituição, financiamento ou integração de Organização Criminosa] Relator: Des(a). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI Turma Julgadora: [DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), GIOVANI FERREIRA DA SILVA - CPF: 057.060.201-75 (APELANTE), EGLENIO BARROS SOARES - CPF: 732.968.992-00 (ADVOGADO), LILIANY ZEBALOS FERREIRA - CPF: 770.645.932-20 (ADVOGADO), LILIAN STEFANI HUZYK - CPF: 019.770.222-86 (ADVOGADO), GEISLAN NEVES DE OLIVEIRA - CPF: 051.779.611-25 (APELANTE), ARY DA COSTA CAMPOS - CPF: 019.704.311-99 (ADVOGADO), VINICIUS DE OLIVEIRA SOUZA - CPF: 015.399.311-10 (APELANTE), JENNYFER FERREIRA BATHEMARQUE - CPF: 024.734.681-09 (ADVOGADO), JACQUELINE DA COSTA MACHADO - CPF: 047.640.621-86 (APELANTE), DOUGLAS COSTA DE OLIVEIRA (APELANTE), VITOR GABRIEL FERREIRA DA SILVA - CPF: 060.820.111-12 (APELANTE), ALISSON BRAGA (APELANTE), ROSILENE MARINHO PARIZ - CPF: 046.168.701-10 (APELANTE), Lucas Cezar dos Santos (APELANTE), ELLYAN WILLIAN DA FONSECA OLIVEIRA FREIRE - CPF: 077.757.351-20 (APELANTE), THAYANE PINHEIRO DO NASCIMENTO - CPF: 030.159.461-96 (ADVOGADO), FABIO CELESTINO DA SILVA - CPF: 667.192.591-72 (ADVOGADO), JONATAN ALVES DE MOURA (APELANTE), DALMO FERREIRA NERI JUNIOR - CPF: 627.824.361-04 (APELANTE), JOSENI BARBOSA DOS SANTOS - CPF: 503.888.511-04 (APELANTE), SHIRLEY KAROLAINE ASSIS ALVES - CPF: 064.145.851-73 (APELANTE), JOAO BATISTA CAMARGO DA SILVA - CPF: 809.581.171-87 (ADVOGADO), ALISSON BRAGA - CPF: 063.789.291-73 (APELANTE), FLAVIL SOUSA LIRA - CPF: 329.192.041-49 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), DOUGLAS COSTA DE OLIVEIRA - CPF: 048.695.971-60 (APELANTE), LUCAS CEZAR DOS SANTOS - CPF: 042.249.801-77 (APELANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). WESLEY SANCHEZ LACERDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 1001508-54.2020.8.11.0042 APELANTE: GIOVANI FERREIRA DA SILVA, GEISLAN NEVES DE OLIVEIRA, JACQUELINE DA COSTA MACHADO, ROSILENE MARINHO PARIZ, ELLYAN WILLIAN DA FONSECA OLIVEIRA FREIRE, ALISSON BRAGA, DOUGLAS COSTA DE OLIVEIRA, LUCAS CEZAR DOS SANTOS APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. SEQUESTRO. TRÁFICO DE DROGAS. INCONSTITUCIONALIDADE DA RESOLUÇÃO Nº 11/2017 DO TJMT AFASTADA. AUSÊNCIA DE AFRONTA ÀS REGRAS DE COMPETÊNCIA. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. NULIDADE DOS RECONHECIMENTOS REJEITADA. ABSOLVIÇÃO DESCABIDA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelações interpostas contra sentença que condenou os réus pela prática dos crimes de organização criminosa (Lei n. 12.850/2013), tráfico de drogas (Lei n. 11.343/2006) e sequestro qualificado (art. 148, § 2º, do CP), em virtude de atuação vinculada à facção Comando Vermelho, com aplicação de "salve" à vítima. II. Questão em discussão As questões em discussão consistem em saber: (i) se a Resolução nº 11/2017 do TJMT é inconstitucional por ampliar a competência da 7ª Vara Criminal da Capital; (ii) se houve violação às regras de competência e prevenção do juízo originário; (iii) se houve cerceamento de defesa por ausência de acesso às mídias de interceptação telefônica ou sua juntada na ação penal; (iv) se o reconhecimento fotográfico é nulo, por não observar o disposto no art. 226 do CPP; (v) se os elementos probatórios são suficientes para a manutenção das condenações. III. Razões de decidir A Resolução nº 11/2017 é válida e não viola o princípio do juiz natural, pois decorre de competência administrativa dos tribunais para a especialização de varas com base na matéria. A alegação de competência da Comarca de Poxoréu/MT foi corretamente afastada, pois a especialização do juízo prevalece, nos termos do art. 96, I, “a”, da CF. A defesa teve acesso às mídias da interceptação telefônica, oportunizando-se o contraditório; eventual ausência de juntada nos autos, por incompatibilidade técnica, não causou prejuízo processual. O reconhecimento fotográfico, ainda que realizado na fase policial, foi corroborado por provas testemunhais, laudos periciais e elementos informativos válidos. A materialidade e a autoria dos delitos restaram suficientemente comprovadas por meio de interceptações, confissões – por parte de alguns agentes – em relação ao tráfico, laudos e testemunhos, evidenciando a atuação estruturada e permanente dos réus em organização criminosa voltada ao tráfico e à execução de atos violentos. IV. Dispositivo e tese Recursos desprovidos. Tese de julgamento: "1. É válida a Resolução n. 11/2017 do TJMT, que confere competência estadual à 7ª Vara Criminal da Capital para julgar crimes de organização criminosa. 2. O acesso ao conteúdo da interceptação refuta a alegação de cerceamento do direito de defesa. 3. O reconhecimento fotográfico realizado na fase inquisitorial é válido quando corroborado por outras provas colhidas sob contraditório. 4. A absolvição é descabida quando as provas produzidas demonstram a atuação dos réus em grupo estável e estruturado, com divisão de tarefas e objetivo de domínio territorial por meio do tráfico e da violência, que caracteriza organização criminosa. A existência de provas de que os réus sequestraram e agrediram a vítima por causa de dívida de drogas e que atuavam no comercio de entorpecentes também impede a absolvição por esses delitos". Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, LIII; 96, I, “a”; CP, art. 148, § 2º; CPP, arts. 74 e 226; Lei nº 12.850/2013, art. 2º; Lei nº 11.343/2006, art. 33. Jurisprudência relevante citada: STJ, HC 698.947/SP; STF, HC 113.018/RS; TJMT, Ap. Crim. 1012309-13.2020.8.11.0015; STJ, AgRg no HC 812.840/SC; STJ, RHC 47.069/SP. ESTADO DE MATO GROSSO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 1001508-54.2020.8.11.0042 APELANTE: GIOVANI FERREIRA DA SILVA, GEISLAN NEVES DE OLIVEIRA, JACQUELINE DA COSTA MACHADO, ROSILENE MARINHO PARIZ, ELLYAN WILLIAN DA FONSECA OLIVEIRA FREIRE, ALISSON BRAGA, DOUGLAS COSTA DE OLIVEIRA, LUCAS CEZAR DOS SANTOS APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO RELATÓRIO EXMO. SR. DES. ORLANDO DE ALMEIRA PERRI Egrégia Câmara: Trata-se de apelações criminais contra sentença que condenou Rosilene Marinho Pariz, vulgo “Bruxinha ou Malévola”, à pena de 17 (dezessete) anos e 5 (cinco) meses de reclusão, em regime fechado, e 671 (seiscentos e setenta e um) dias-multa, e Giovani Ferreira da Silva à pena de 11 (onze) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime fechado, e 511 (quinhentos e onze) dias-multa, por infração ao art. 2º, §§ 2º e 4º, inciso I, da Lei n. 12.850/2013, ao art. 33 da Lei n. 11.343/2006 e ao art. 148, §2º, do Código Penal; Lucas Cezar dos Santos à pena de 12 (doze) anos, 11 (onze) meses e 5 (cinco) dias de reclusão, em regime fechado, e 671 (seiscentos e setenta e um) dias-multa, e Ellyan Willian da Fonseca Freire, à pena de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime fechado, e 511 (quinhentos e onze) dias-multa, por infração ao do art. 2º, 2º, §§ 2º e 4º, inciso I, da Lei n. 12.850/2013 e ao art. 33 da Lei n. 11.343/2006; Jacqueline da Costa Machado, vulgo “Marrenta ou Nairóbi”, à pena de 9 (nove) anos e 5 (cinco) dias de reclusão, em regime fechado, e 14 (quatorze) dias-multa, Geislan Neves de Oliveira, vulgo “Gegê ou “Glock”, à pena de 6 (seis) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime fechado, e 11 (onze) dias multa, Alisson Braga, vulgo “Pity”, à pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime fechado, e 11 (onze) dias-multa, e Douglas Costa de Oliveira, vulgo “Douguinho”, à pena de 6 (seis) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime fechado, e 11 (onze) dias-multa, por infração ao art. 2º, §§ 2º e 4º, inciso I, da Lei n. 12.850/2013 e ao art. 148, §2º, do Código Penal (organização criminosa, sequestro e tráfico de drogas). Em suas razões, Lucas Cezar dos Santos, Douglas Costa de Oliveira e Jaqueline da Costa Machado arguem: a) “a inconstitucionalidade incidental [...], da Resolução nº 11/2017 do Tribunal Pleno” e b) a violação dos critérios de competência e prevenção. No mérito, asseveram que devem ser integralmente absolvidos, por ausência de provas ou insuficiência probatória. Especificamente em relação ao tráfico afirmam que “sequer há laudo definitivo de drogas” (Id. 235272638 - pág. 1-27). Ellyan Willian da Fonseca Oliveira Freire sustenta que: 1) não há provas de que participou dos crimes; 2) a materialidade do tráfico não restou provada, porque “nada foi apreendido com acusado” (Id. 235272808 - pág. 1- 16). Rosilene Marinho Pariz e Geislan Neves de Oliveira alegam que é caso de absolvê-los “de todas as acusações contidas na exordial acusatória e, injustamente, acolhidas pelo juízo de piso, por ausência de provas de que os mesmos tenham praticado referidos crimes” (Id. 235272824 - pág. 1-16). Giovani Ferreira da Silva argumenta que; 1) a condenação é nula, “em função da não apresentação das provas apreendidas nas diligências de interceptações realizadas e gravações – disponíveis ao Ministério Público, mas omitidas da defesa –, seja em razão dos vícios que decorrem da ausência de gravações juntadas aos autos”; 2) há “manifesta nulidade decorrente do procedimento de reconhecimento [...], eis que realizado em desacordo com a lei”; 3) deve ser absolvido por falta de provas, porque a condenação “baseou-se tão somente no reconhecimento fotográfico [...] não corroborado por outras provas produzidas sob contraditório” (Id. 235272826 - pág. 1-13). Alisson Braga aduz que: 1) a condenação é nula “pela falta de oportunização à defesa do acesso ao conteúdo integral das interceptações”; 2) “o reconhecimento efetuado pela vítima através de fotografia e de forma autônoma foi realizado em completa inobservância aos preceitos propostos pelo artigo 226 do Código de Processo Penal”; 3) “a utilização exclusivamente de elementos informativos para sustentar uma condenação contraria o dispositivo de Lei Federal e a Constituição Federal”, de modo que deve ser absolvido por falta de provas (Id. 243502194 - pág. 1-27). Contrarrazões no Id. 235272830 - pág. 1-24, 235272831 - pág. 1-19, 235272832 - pág. 1-19, 235272833 - pág. 1-33 e 247970196 - pág. 1-21. A Procuradoria-Geral de Justiça opina “pelo não acolhimento das preliminares e, no mérito pelo desprovimento dos apelos interpostos, mantendo-se incólume a sentença hostilizada” (Id. 256302179 - pág. 1-52). É o relatório. PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 1001508-54.2020.8.11.0042 VOTO EXMO. SR. DES. ORLANDO DE ALMEIDA PERRI (RELATOR) Egrégia Câmara: PRELIMINAR: INCONSTITUCIONALIDADE DA RESOLUÇÃO N. 11/2017 DO TRIBUNAL PLENO. VIOLAÇÃO DO JUIZO NATURAL E DAS REGRAS DE COMPETÊNCIA A Defensoria Pública Estadual, no interesse de Lucas Cezar dos Santos, Douglas Costa de Oliveira e Jaqueline da Costa Machado, sustenta que “há inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa devendo ser suprimido parcialmente o texto “com jurisdição em todo o Estado”, da Resolução nº. 11/2017 do Tribunal Pleno por afronta o disposto no art. 22, I, c.c art. 5º, inciso LIII, ambos da Constituição Federal”. Consigna que “Não se pode contrariar ou negar a vigência da lei federal, a pretexto de aplicar lei de organização judiciária, imiscuindo em matéria constitucionalmente eleita para legislação federal, violando a Constituição Federal, e consequentemente eivando de nulidade por vício de iniciativa da matéria”. Argumenta ainda que a “lei federal determinou como Juízo natural a regra do local do fato, não pode ato infralegal (COJE e resoluções), dispor contrariamente, e negar vigência da lei federal, sob pena de violação do inciso LIII, artigo 5º c.c inciso I, artigo 22, ambos da Constituição Federal”. Sem razão a defesa. A questão posta em análise já foi discutida e rediscutida reiteradas vezes neste Sodalício, sendo firme e pacífico o entendimento quanto a competência absoluta da 7ª Vara Criminal da Capital para processar e julgar o crime de organização criminosa. Nesse sentido: [...] É válida a Resolução n. 11/2017 do Tribunal Pleno que confere ao Juízo da 7ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT competência especializada para processar e julgar delitos cometidos por organização criminosa em todo o território estadual, pois os Tribunais locais possuem autorização para procederem à especialização de Varas para o processamento de feitos restritos por matéria. Em que pese os crimes tenham sido praticados na Comarca de Água Boa/MT, não há nenhuma ilegalidade na tramitação da ação perante a 7ª Vara Criminal de Cuiabá/MT, já que este juízo, por ser especializado quanto à matéria, prevalece sobre os demais. [...] A criação de varas especializadas por ato administrativo não infringe o princípio do juiz natural quando fundada em competência territorial relativa à matéria. [...] (TJ/MT, N.U 1002175-06.2020.8.11.0021, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 14/03/2025). [...] A Resolução n. 11/2017 do Tribunal Pleno, ao atribuir jurisdição estadual à 7ª Vara Criminal de Cuiabá para o julgamento de crimes de organização criminosa, fundamenta-se no art. 96, I, "a", da Constituição Federal e no art. 74 do Código de Processo Penal, não havendo inconstitucionalidade ou ilegalidade. A especialização de varas para processamento de crimes de organizações criminosas atende à Recomendação n. 03/2006 do Conselho Nacional de Justiça, sendo válida a fixação de competência territorial por deliberação dos tribunais. A alegada incompetência territorial do juízo sentenciante não enseja nulidade absoluta, pois a inobservância da regra de especialização das varas configura nulidade relativa, somente reconhecível mediante demonstração de prejuízo, o que não restou evidenciado. [...] (TJ/MT, N.U 1000621-82.2024.8.11.0025, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, LUIZ FERREIRA DA SILVA, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 19/02/2025, Publicado no DJE 24/02/2025). Conquanto o feito tenha iniciado sua tramitação na Comarca de Poxoréu/MT, não há qualquer nulidade a ser reconhecida, uma vez que a competência foi declinada ao Juízo da 7ª Vara Criminal da Capital, por força do contido na Resolução n. 11/2017-TP. A propósito, enfrentando situação idêntica na Apelação Criminal n. 1001057-08.2022.8.11.0091, a Primeira Câmara Criminal concluiu que “O reconhecimento da incompetência territorial é afastado com base na Resolução nº 11/2017 do Tribunal Pleno do TJMT, que atribui competência à 7ª Vara Criminal de Cuiabá para julgar crimes de organização criminosa, ainda que os fatos tenham ocorrido em outra comarca, conforme entendimento do STF e STJ”. Para melhor ilustrar o posicionamento, trago à baila excertos do voto-condutor proferido pelo eminente relator, Des. Marcos Machado, cujos fundamentos também adoto como razões de decidir, verbis: “A competência do Juízo da 7ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá Especializada Contra o Crime Organizado, Crimes Contra a Ordem Tributária e Econômica, Crimes Contra a Administração Pública e Crimes de Lavagem de Dinheiro para processar e julgar a ação penal (PJe n. 1001057-08.2022.8.11.0091) está fundamentada na Resolução n. 11/2017/TP, visto que os apelantes foram denunciados por integrar organização criminosa (Lei 12.850/2013, art. 2º). O c. STF e c. STJ firmaram entendimento de que os Tribunais podem definir competência jurisdicional em varas especializadas em razão da matéria, a despeito do lugar do fato criminoso (STF, HC n. 113018 - Relator: Min. Ricardo Lewandowski - 14.11.2013; STJ, AgRg no REsp nº 1611615/MT - Relator: Min. Felix Fischer - 16.4.2018; STJ, AgRg no REsp n. 1.402.325/MT - Relator: Min. Ribeiro Dantas - 25.8.2020). No mesmo sentido, esta e. Câmara decidiu: ‘É competente a 7ª Vara Criminal de Cuiabá para processar e julgar a ação penal em que se apurar crime de organização criminosa, supostamente cometido na Comarca de Alto Garças, por força do que dispõe a Resolução nº 11/2017, do Tribunal Pleno. Precedentes desta Corte e do STJ.’(AP nº 1014759-71.2020.8.11.0000 - Relator: Des. Orlando de Almeida Perri - 12.8.2020) ‘Não há qualquer ilegalidade na tramitação, quer do procedimento investigatório, quer da ação penal deflagrados contra os pacientes, perante a Vara Especializada contra o Crime Organizado, Crimes contra a Ordem Econômica e Crimes contra a Administração Pública da comarca de Cuiabá, pois embora os ilícitos a eles assestados tenham supostamente ocorrido em Paranatinga/MT e Campo Novo/MT, o referido Juízo, por ser especializado quanto à matéria, prevalece sobre os demais’(HC n. 1018081-65.2021.8.11.0000 - Relator: Des. Paulo da Cunha - Primeira Câmara Criminal - 18.2.2022) Noutro giro, a Súmula 206 do STJ‘dispõe que ‘a existência de vara privativa, instituída por lei estadual, não altera a competência territorial resultante das leis de processo’, visando à remessa do feito ao Juízo de onde as infrações penais foram consumadas, também não prospera, porquanto o verbete em questão concerne à matéria de Direito Processual Civil, afastando-se a sua aplicação no Direito Processual Penal. De mais a mais, mesmo levando-se em consideração que a competência em razão da natureza da infração penal seja relativa, as normas norteadoras do Processo Penal permitem ao Juiz, de ofício, reconheça a sua incompetência, conforme se depreende do artigo 109 do CPP’, como bem destacado pelo Juízo singular (Jean Garcia de Freitas Bezerra, juiz de Direito - ID. 215810084 – fls. 747)”. A propósito, em caso semelhante assim me posicionei: “É competente a 7ª Vara Criminal de Cuiabá/MT para processar e julgar a ação penal em que se apurar crime de organização criminosa, cometido em Ponte Branca/MT – município abrangido pela jurisdição de Alto Araguaia/MT –, por força do que dispõe a Resolução n. 11/2017, do Tribunal Pleno. A especialização de varas consiste em alteração de competência territorial em razão da matéria, e não alteração de competência material, regida pelo art. 22 da Constituição Federal” [STF, HC nº 113.018/RS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2ª Turma, julgado em 29.10.2012]. [...] não há ilegalidade na tramitação de ação penal deflagrada inicialmente no interior e, depois, remetida para o Juízo da 7ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá-MT, já que este é especializado quanto à matéria, e prevalece sobre os demais juízos, conforme regulamentação administrativa do tribunal” (TJMT, N.U 1018752-88.2021.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RONDON BASSIL DOWER FILHO, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 17/11/2021, publicado no DJE 19/11/2021). [...] (TJMT, N.U 1000795-14.2021.8.11.0020, minha relatoria, Primeira Câmara Criminal, julgado em 5/3/2024). Com essas considerações, em consonância com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, rejeito a preliminar. É como voto. PRELIMINAR: COMPETÊNCIA E PREVENÇÃO DO JUÍZO DE ORIGEM A Defensoria Pública, no interesse de Lucas Cezar dos Santos, Douglas Costa de Oliveira e Jaqueline da Costa Machado, aduz que “todos os delitos, se consumaram no município de Poxoréu/MT, que inclusive fora o referido Juízo que deferiu interceptação telefônica, busca e apreensão, decretou a prisão preventiva, bem como autorizou degravação do aparelho celular apreendido” [...] “e, por consequência, praticou os primeiros atos decisórios, se antecedendo nos atos processuais, devendo ser reconhecida a sua competência, nos termos do art. 83, do CPP”. A alegação não prospera. Sobre o tema, este é o entendimento que prevalece: “[...] A Resolução nº 11/2017 foi editada em conformidade com o art. 96, I, ‘a’, da Constituição Federal, que confere aos tribunais competência para organizar sua estrutura jurisdicional, inclusive criando varas especializadas. 4. A supressão do termo ‘com jurisdição em todo o estado’ não gera vício formal ou inconstitucionalidade, sendo um ajuste redacional que não altera a competência essencialmente atribuída às varas criminais. 5. A Resolução n. 11/2017, ao estabelecer a competência ampliada da 7ª Vara Criminal, não viola o CPP, mas adequa a distribuição de processos de acordo com as necessidades locais, em conformidade com os parâmetros constitucionais e legais. 6. O termo ‘com jurisdição em todo o estado’ é uma medida administrativa para garantir a eficiência na tramitação de processos de grande complexidade, especialmente em matéria de organização criminosa. O CPP permite ajustes na competência territorial (art. 74), visando à eficiência da justiça, o que legitima a Resolução. 7. As regras de conexão e continência previstas nos artigos 69, 76 e 78 do CPP não são absolutas e podem ser flexibilizadas em casos que envolvem varas especializadas. 8. A competência por prevenção, prevista no art. 75, parágrafo único, do CPP, é critério subsidiário para a fixação da competência territorial, sendo utilizada quando há mais de um juízo igualmente competente. No caso em questão, a especialização da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, criada para julgar crimes de organização criminosa, prevalece sobre a regra de prevenção, dada a competência em razão da matéria. 9. Conforme já decidido pelos tribunais superiores, a designação de competência territorial em razão da matéria é válida, nos termos do art. 96, I, ‘a’, da Constituição Federal, sendo plenamente legítima a especialização da 7ª Vara Criminal para julgar crimes de organização criminosa, independentemente do local da prática delitiva. O art. 70 do CPP, que regula a competência pelo local da consumação da infração, não se aplica quando há competência especializada. 10. A prevenção, embora prevista no art. 83 do CPP como critério subsidiário para fixação de competência, não é absoluta. Ela pode ser afastada em face de normas de organização judiciária que estabeleçam competências especializadas. 11. A jurisprudência dos tribunais superiores, incluindo o STJ e o STF, reconhece que a especialização de varas para o julgamento de determinadas matérias, como crimes de organização criminosa, é legítima e prevalece sobre a competência por prevenção, conforme disposto no art. 96, I, ‘a’, da Constituição Federal. 12. A competência por prevenção, sendo relativa, não prevalece sobre a competência absoluta em razão da matéria, especialmente em situações que envolvem varas especializadas, como a 7ª Vara Criminal de Cuiabá. 13. A teoria do juízo aparente, amplamente aceita pela jurisprudência pátria, preserva a validade dos atos processuais praticados por autoridade que, à época da decisão, se apresentava como aparentemente competente. A mera menção ao envolvimento em organização criminosa, por si só, não afasta a competência do juízo de origem até que haja elementos concretos suficientes para a redistribuição” [...] (TJMT, N.U 1009401-45.2022.8.11.0004, Des. RONDON BASSIL DOWER FILHO, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 02/10/2024). Destarte, se os demais crimes foram perpetrados no contexto de organização criminosa, não se pode falar que o Juízo de Poxoréu é competente, nem que se tornou prevento em relação à 7ª Vara Criminal da Capital. Ainda que tenha praticado atos processuais na fase de investigação policial, a competência foi declinada, nos termos da Resolução n. 11/2017-TP e do artigo 74, do Código de Processo Penal. Posto isto, em consonância com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, rejeito a preliminar. É como voto. PRELIMINAR: NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE ACESSO E/OU JUNTADA DAS MÍDIAS DA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NA AÇÃO PENAL Em suas razões, Giovani Ferreira da Silva sustenta que a condenação é nula, “ante a ausência de juntada das mídias das interceptações realizadas nas investigações”. Alisson Braga assevera que não foi “oportunizado à defesa o acesso ao conteúdo integral das interceptações”. A preliminar é descabida. Conforme esclarecido na sentença, “esta ação penal encontra-se apensada à cautelar de n. 0000587- 02.2020.8.11.0014, na qual foi deferida a interceptação telefônica, desde 19/05/2022”. Além disso, destacou que “consta dos referidos autos que, nas datas de 27/07/2022 e 11/08/2022, foi devidamente certificado que, em razão da incompatibilidade técnica, os arquivos de áudio contendo a monitoração da interceptação telefônica foram armazenados fisicamente na Secretaria desta Vara (Ids 91031370 e 92328582)”. No contexto, fica claro que as partes tiveram acesso integral à prova, de modo que não há falar em cerceamento do direito de defesa. Confira-se: [...] Hipótese em que a defesa apresentou resposta preliminar (art. 514 do CPP) e resposta à acusação (arts. 396 e 396-A do CPP) sem acesso integral ao conteúdo das interceptações telefônicas, assim como das decisões as quais autorizaram e prorrogaram essa medida cautelar. Apesar disso, conforme consignado no acórdão recorrido, o acesso a esse conteúdo ocorreu antes da abertura de prazo para as alegações finais. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a juntada aos autos do conteúdo integral da interceptação telefônica antes da abertura de prazo para as alegações finais, por permitir à defesa refutá-las antes da sentença, garante o exercício do contraditório e da ampla defesa, o que afasta o alegado prejuízo. [...] (STJ, RHC n. 47.069/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 27/2/2018, DJe de 5/3/2018). [...] A Defesa deve ter acesso aos elementos de prova que podem ter relação com o paciente, sob pena de vulneração aos princípios do contraditório e da ampla defesa (STF, Rcl nº 48008/SP). O acesso às mídias [com os áudios interceptados] deve ser garantido às partes antes da apresentação de alegações finais (STJ, RHC nº 73.263/SP; HC nº 242.252/MG; HC nº 167.503/MG). “Acerca do acesso da Defesa às provas obtidas por meio de quebra do sigilo telefônico, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está fixada no sentido de que, conquanto seja dispensável a transcrição integral dos diálogos interceptados, deve ser assegurado à Defesa o acesso à mídia que contém a gravação da integralidade daqueles.” (STJ, AgRg no RHC nº 163.557/CE) Oportunizado o acesso aos áudios, caberá à Defesa demonstrar perante o Juízo singular eventual prejuízo na realização do ato processual (STJ, HC nº 356.780/RJ), assegurando-se a análise do pleito ao juiz da causa, sob pena de indevida usurpação de competência, por supressão de instância (TJDFT, HC nº 07216705220218070000). (TJ/MT, N.U 1012497-46.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 01/08/2023, Publicado no DJE 08/08/2023). De toda sorte, eventual prejuízo decorrentes da não inclusão das mídias na ação penal – por incompatibilidade técnica – não restou demonstrado, o que inviabiliza o reconhecimento da nulidade: [...] A demonstração de prejuízo é necessária para o reconhecimento de nulidade no processo penal, conforme o princípio pas de nullité sans grief. [...] (STJ, AgRg no HC n. 930.556/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 12/3/2025, DJEN de 20/3/2025). [...] A ausência de demonstração de prejuízo concreto pela defesa inviabiliza a alegação de nulidade processual, conforme o princípio pas de nulité sans grief e o art. 563 do Código de Processo Penal. [...] (STJ, AgRg no HC n. 812.840/SC, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 11/3/2025, DJEN de 18/3/2025). Assim sendo, em consonância com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, rejeito a preliminar. É como voto. PRELIMINAR: NULIDADE DO RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO. INOBSERVÂNCIA DAS FORMALIDADES DISPOSTAS NO 226 DO CPP Giovani e Alison sustentam que o reconhecimento, por fotografia, ocorrido na fase inquisitorial, é nulo, pois em desacordo com as determinações legais. A preliminar não comporta acolhimento. Consta que, em 30-4-2020, Fernanda Graciele Rodrigues Alves procurou a delegacia de polícia e informou que vinha sendo ameaçada pelo Comando Vermelho, por dívida de drogas, há aproximadamente 5 (cinco) meses. Segundo ela, no dia 28-4-2020, Giovani, José Carlos, Gegê, Vinicius, Marrenta e Pity, dentre outros, foram à sua casa; contudo, conseguiu se esconder e sua mãe lhes disse que não estava no local. Por medo, sua genitora levou as crianças para outro lugar. Pouco mais tarde, tais pessoas retornaram, invadiram a residência, a encontraram e a arrastaram pelo fundo do quintal até o rio, onde sofreu diversas agressões. Disse ainda que, na sequência, foi levada para a pista de pouso, onde o salve – dado a mando de Rosilene – foi gravado. Aduziu que foi abandonada agonizando, mas conseguiu pedir ajuda em uma residência próxima, de modo que foi socorrida e posteriormente procurou a polícia. Como se vê, a vítima conhecia seus agressores, tanto que os individualizou para a polícia utilizando o primeiro nome e/ou apelido. As fotografias lhe foram mostradas apenas para confirmar a identidade deles. Conquanto a vítima não tenha sido ouvida em juízo, porque faleceu, o depoimento de Maria Luiza Alves Santos corrobora a conclusão de que ela conhecia seus agressores. No ponto, a testemunha explicou que sua filha nasceu em Poxoréu, conhecia todas as pessoas que ‘bateram nela’, sendo que lhe confidenciou que ‘só não morreu naquele dia, porque Bruxinha ordenou apenas dar o salve’. De qualquer modo, o reconhecimento fotográfico não se trata da única prova em que se baseou a condenação. Os policiais inquiridos detalharam, pormenorizadamente, a participação dos réus no sequestro de Fernanda. Além disso, a interceptação telefônica confirmou que se tratava de faccionados, que aplicaram o castigo no interesse do grupo criminoso. No contexto, não há nulidade a ser reconhecida: [...] A jurisprudência desta Corte estabelece que o reconhecimento fotográfico realizado sem observância das formalidades do art. 226 do CPP pode ser considerado válido quando corroborado por outras provas, desde que essas provas sejam colhidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. No caso concreto, além do reconhecimento fotográfico, a condenação do paciente foi embasada em diversos outros elementos probatórios, como depoimentos de policiais, apreensão de bens roubados na posse do paciente, e convergência entre relatos de testemunhas. [...] Tese de julgamento: "1. O reconhecimento fotográfico realizado sem observância das formalidades do art. 226 do CPP é válido quando corroborado por outras provas colhidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. [...] (STJ, AgRg no HC n. 789.753/SC, relatora Ministra Daniela Teixeira, relator para acórdão Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 26/2/2025, DJEN de 24/3/2025). [...] Assevera o agravante que o reconhecimento de pessoas foi realizado de forma irregular, sem observância das formalidades legais, o que teria contaminado o conjunto probatório. Extrai-se da decisão agravada que, diante da carência de fundamentação adequada, a qual não permite a compreensão de como os dispositivos infraconstitucionais citados (6°, VI, 226, caput e incisos I, II, III, IV, Parágrafo Único, 228 e 400, do Código de Processo Penal, fl. 842) foram violados, deve incidir o óbice da Súmula 284/STF, que impede o conhecimento do recurso especial (fl. 929). A recorrida decisão destacou, às fls. 929/930, que a condenação não se baseou exclusivamente no reconhecimento, mas também em outras provas, como depoimentos de policiais e confissões dos acusados, não havendo, portanto, nulidade. Precedente. [...] (STJ, AgRg no REsp n. 1.990.726/RS, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 12/3/2025, DJEN de 20/3/2025). Posto isto, em consonância com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, rejeito a preliminar. É como voto. MÉRITO A denúncia imputou aos recorrentes os crimes sequestro majorado, organização criminosa e tráfico de drogas e encontra-se vazada nos seguintes termos: [...] FATO 01 – DO CRIME SEQUESTRO QUE RESULTA EM GRAVE SOFRIMENTO FÍSICO E MORAL: No dia 28 de abril de 2020, por volta das 21 horas, na residência situada na Rua Curitiba, Bairro Centro, em Poxoréu/MT, os denunciados GIOVANI FERREIRA DA SILVA – vulgo “Barrigudo”, JACQUELINE DA COSTA MACHADO, ROSILENE MARINHO PARIZ, vulgo “Bruxinha”, GEISLAN NEVES DE OLIVEIRA, vulgo “Geisa/Gegê”, VINICIUS DE OLIVEIRA SOUZA, DOUGLAS COSTA DE OLIVEIRA, vulgo “Douguinha”, VITOR GABRIEL FERREIRA DA SILVA e ALISSON BRAGA privaram a vítima Fernanda Graciele Rodrigues Alves de sua liberdade, mediante sequestro que resultou em grave sofrimento físico e moral. FATO 02 – DO CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA COM PARTICIPAÇÃO DE ADOLESCENTE E USO DE ARMA DE FOGO: Em data não exata, todavia anterior a abril de 2020, na urbe e Comarca de Poxoréu/MT, os denunciados GIOVANI FERREIRA DA SILVA – vulgo “Barrigudo”, JACQUELINE DA COSTA MACHADO, ROSILENE MARINHO PARIZ, vulgo “Bruxinha”, GEISLAN NEVES DE OLIVEIRA, vulgo “Geisa/Gegê”, VINICIUS DE OLIVEIRA SOUZA, DOUGLAS COSTA DE OLIVEIRA, vulgo “Douguinha”, VITOR GABRIEL FERREIRA DA SILVA, ALISSON BRAGA, JONATAN ALVES DE MOURA – vulgo “Natan”, DALMO FERREIRA NERI JÚNIOR, vulgo “Dalminho”, JOSENIR BARBOSA DOS SANTOS, JOSEMAR DIAS DOS SANTOS, SHIRLEY KAROLAINE ASSIS ALVES, ELLYAN WILLIAN DA FONSECA OLIVEIRA FREIRE e LUCAS CEZAR DOS SANTOS integraram e ajudaram a financiar, pessoalmente ou por interpostas pessoas, de forma estável, com os adolescentes José Carlos Henrique Mundim, vulgo Zé Nunes (17 anos) e Flávio Alves Moura (17 anos), e mediante uso de arma de fogo, conscientes do desenvolvimento das atividades ilícitas, com objetivo de obter vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais em prol da conhecida organização criminosa autodenominada “Comando Vermelho de Mato Grosso – CV/MT”. FATO 03 – DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS: Entre os meses de abril a julho de 2020, na Comarca de Poxoréu/MT, os denunciados GIOVANI, SHIRLEY, ROSILENE, LUCAS CEZAR, ELLYAN, em liame subjetivo, divisão de tarefas e estruturalmente ordenados, reiteradamente, adquiriram, venderam, tiveram em depósito, transportaram, entregaram a consumo ou forneceram substâncias entorpecentes (drogas), sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. [...] (Id. 235272188 - pág. 1-17). Josenir e Josemar foram citados por edital e, decorrido o prazo sem manifestação, o feito foi suspenso e desmembrado em relação a eles (Id. 235272636 - pág. 3). Jonatan Alves de Moura, Dalmo Ferreira Neri Junior e Shirley Karolaine Assis Alves foram absolvidos (Id. 235272636 - pág. 1-159). Vinicius de Oliveira Souza e Vitor Gabriel Ferreira não recorreram da condenação (Id. 235272695 - pág. 3 e 235272698 - pág. 3). Os pedidos de absolvição não prosperam. A responsabilidade de Rosilene (Bruxinha), Giovani, Jaqueline (Marrenta), Geislan (Gegê), Alisson (Pity) e Douglas (Douguinho) quanto ao crime tipificado no art. 148, §2º, do Código Penal exsurge no caso em exame. O conjunto probatório demonstra que os réus, agindo em prol de organização criminosa, e motivados por dívidas de drogas, a mando de Rosilene, sequestraram e agrediram Fernanda Graciele Rodrigues Alves. Na fase inquisitorial, a vítima detalhou o ocorrido e a responsabilidade deles, nos seguintes termos: Que há aproximadamente 05 meses a declarante vem sofrendo ameaças por parte da facção criminosa ‘Comando Vermelho’, que tem como gerente/disciplina’ a pessoa conhecida como Gegê. Que por diversas vezes já tentaram sequestrá-la para realizarem a agressão conhecida como ‘salve’. Segundo a declarante, tudo começou quando ela acabou comprando, usando e não pagando a droga de um traficante conhecido como ‘Véio’, por nome de Ademir do carro preto. Que por ser usuária, a declarante acabava trocando droga por sexo. Que por ter usado muita droga e não ter pago, a declarante foi ‘colocada no prazo’ por 03 (três) dias e como a declarante não conseguiu efetuar o pagamento, começou a perseguição [...]. Que na data de 28/04/2020 achou que morreria, pois enquanto estava em sua casa com sua mãe e seus filhos, por volta das 21h, pararam na frente de sua casa e foram até a sua mãe e perguntaram pela declarante, mas sua mãe, para protegê-la, acabou mentido dizendo que ela não estava. Que após isso foram embora, porém, com medo daquelas pessoas, sua mãe, juntamente com seus filhos, foi para uma outra casa, enquanto a declarante ficou sozinha, pois pensou que não voltariam. Que ficou em sua casa mexendo no celular, quando ouviu uma voz, se aproximou da porta e ao olhar por uma fresta, conseguiu ver Giovani e, que ao correr para o quarto, Giovani arrombou a porta e a agarrou juntamente com José Carlos, Gegê e Vinicius; Que Gegê puxou seus cabelos dizendo ‘te peguei, te peguei’. Que taparam a sua boca, e a arrastaram pelo fundo do quintal até chegar em um rio. Chegando lá começaram a afogar a vítima por diversas vezes, afundando sua cabeça na água enquanto diziam ‘vai morrer sua vagabunda’, e após isso a declarante ouviu que Gegê estava conversando com Rosilene e que perguntou a ela se ela seria somente o salve ou decreto, ou seja, se ela viveria ou morreria; Que Rosilene respondeu que não era Deus para decidir quem viveria e quem morreria, que seria apenas um salve. Que os integrantes da facção questionaram Rosilene, alegando que se deixasse a declarante viva seriam ‘caguetados’; Que Rosilene respondeu: ‘hem manos, quem é a disciplina daí’, ‘os manos’ responderam: ‘é a senhora mana’, foi quando Rosilene afirmou que seria só um ‘salve’. Que após conversa com Rosilene continuaram a bater na vítima, dando coronhadas com um revólver na sua cabeça, e em determinado momento esfregaram seu rosto em fezes de gado, pisando em seu pescoço. [...] Que após entrar no carro, os suspeitos diziam ‘você vai morrer agora, vai cavar sua própria cova’. Que então chegaram na pista de pouso de avião da cidade, que é um local remoto e isolado, e chegando lá verificou que já estava presente outros suspeitos. Que desceram-na do carro puxando seu cabelo, inclusive, arrancando algumas mechas, em seguida foi obrigada a ficar de joelhos e repetir algumas frases que ‘Gegê’ iria dizer. Que a suspeita ‘Gegê’ alegou que se errasse qualquer frase seria morta naquele momento. A frase era a seguinte: “hoje eu tô levando um salve do Comando Vermelho, porque roubei traficante, tirei comida da casa dos meus filhos e deixei eles passando fome, porque chamei polícia para comandeiro, e quem tiver salve, não faça igual eu, leve seu salve e não fuja’. Que enquanto ela repetida a frase, ‘Gegê’, ‘Pity’ e outros gravavam com aparelhos celulares -e debochavam da mesma. Que de posse de dois cabos de aço os suspeitos iniciaram uma sessão de ‘chibatadas’, enquanto a vítima estava ajoelhada. Que as agressões com cabo de aço acertavam suas pernas, sua cabeça, seus braços e suas costas, e quando não aguentava mais de dor e tentava se levantar, os infratores a seguraram para que permanecesse na posição de joelhos. Que havia um revezamento de agressões com chutes e socos, enquanto ‘Marrenta’ e ‘Gegê’ davam chibatadas, e todos ali estavam, revezavam nas agressões, inclusive a queimando com bitucas acessas de cigarros. Que a vítima a todo momento clamava por piedade e gritava de dor, mas não era atendida, pelo contrário, era mais agredida ainda. Que depois do espancamento, a vítima estava meio inconsciente com sangramentos em todo corpo e vomitando sangue, quando ouviu os suspeitos dizerem: ‘agora você vaza senão vai levar mais chicotadas’. Que a vítima tentou andar, mas caiu por falta de forças. Que os suspeitos foram embora deixando a vítima jogada no chão, e quando retomou um pouco de consciência tentou ir embora, mas errou o caminho, tendo que voltar. Que quando consegui achar o caminho correto, foi até a terceira casa, pedir ajuda [...] (Id. 235272166 - pág. 11-14). O laudo pericial n. 210.1.02.2020.009358-01 registrou que ela apresentava múltiplas lesões que, de acordo com o perito, foram provocadas com emprego de meio cruel e tortura: IV – DESCRIÇÃO - hematoma de cor arroxeada, escura, de forte intensidade, associada a importante edema traumático, em região orbitária, supra e infraorbitária, esquerda – escoriação grosseira, associada à equimose avermelhada ao redor, e crosta hemática aderida, em região lateral da face à direita; - duas escoriações lineares em regia carotidiana esquerda - escoriação grosseira, associada à equimose avermelhada ao redor, em região externa superior; - escoriações de diversos tamanhos e formas, algumas puntiformes, algumas em placas, outras lineares, em região torácica bilateral lateralmente, várias em hipocôndrio direito na lateral do hipocôndrio esquerdo, flanco esquerdo; e duas escoriações lineares grandes, verticais, paralelas, no abdome à esquerda. Áreas de equimose arroxeada ao redor dessas escoriações, principalmente em região torácica direita inferior e hipocôndrio direito - escoriações lineares associadas à equimoses avermelhadas lineares em regiões: terço superior da coxa anterior bilateral, terço médio da coxa esquerda anterior, terço inferior da coxa direita anterior, terço superior da coxa posterior bilateral. Obs. a escoriação do terço superior da coxa esquerda posterior é grosseira, extensa, e além de equimose, também tem edema associado; - duas queimaduras puntiformes, de segundo grau, em região hipotenar esquerda e primeira falange do segundo quirodáctilo da mão esquerda anterior - equimose de cor arroxeada em região parietal e temporal direita, e outra em região auricular direita posterior; - equimose de cor arroxeada associada a edema traumático em região cervical posterior - várias, inúmeras, faixas equimóticas, de cor avermelhada à arroxeada, de diversos tamanhos e sentidos, que se cruzam entre si, a maioria com edema traumático associado, popularmente conhecidos como ‘vergões’, em toda as costas da paciente (ou seja, regiões supraescapular, escapular, dorsal, lombar, espondiliana, ilíaca, bilateralmente), e também em face posterior dos braços bilateralmente, e terço superior do antebraço direito posterior. Algumas dessas equimoses também possuem escoriações em placa e lineares associadas, principalmente nas regiões dorsal e lombar bilateral. V – COMENTÁRIOS Há vestígios objetivos de lesões corporais recentes, produzidas por ação de instrumento contundente. Há também duas pequenas queimaduras puntiformes em mão esquerda, causadas por meio físico – energia térmica, compatível com histórico da pericianda. A ofensa foi produzida por meio cruel/tortura compatível com o histórico da pericianda, pois a vítima possui inúmeras lesões, distribuídas por todo seu corpo, de diversos tamanhos, formas e sentidos, e apresentando um grande número de lesões nas costas, indicativo de que foi agredida principalmente ‘por trás’, e por mais de um agressor, de forma intensa/exagerada [...] (Id. 235272166 - pág. 17-24). Os termos de reconhecimentos encartados no Id. 235272166 - pág. 28 a 235272166 - pág. 54, confirmam que os agressores se tratavam de Geislan (Gegê), Jaqueline (Marrenta), Vitor, Alisson (Pity), Rosilene (Bruxinha), Vinicius, Douglas, Giovani e os adolescentes José Carlos Mundim e Flávio Moura. A vítima não foi ouvida na instrução processual, pois faleceu (Id. 235272593 - pág. 2); contudo, o depoimento de Maria Luiza Alves dos Santos corrobora a ocorrência do crime, assim como a informação de que ela conhecia seus agressores: MP: A senhora é mão da Fernanda? T: Sim. MP: Houve uma situação no ano de 2020 envolvendo sua filha, vou fazer algumas perguntas sobre isso para a senhora; atualmente onde ela se encontra? T: A Fernanda? MP: É. T: Está morta. MP: Ela faleceu quando? T: Dia 21 de agosto. MP: Do ano passado? T: Sim senhor. MP: De que forma ela faleceu? T: Três tiros na cabeça na porta de um bar. MP: Em Poxoréu mesmo? T: Poxoréu. MP: Quando ela faleceu estava com quantos anos, vinte e seis? T: Vinte e seis, ia fazer vinte e sete. MP: E era usuária de drogas desde quando? T: Começou usar drogas com dezesseis anos, por aí. MP: Ela já chegou a ficar internada? T: Ficou várias vezes [...]. MP: Nesse processo aqui consta que o pessoal da organização criminosa Comando Vermelho tentou raptar ela por algumas vezes, algumas vezes conseguindo e outras não, a senhora sabe alguma coisa sobre isso? T: É verdade, eles pegaram ela, deram um salve nela muito grande, mas não sei porque foi, hoje eu não sei. MP: A razão pela qual ela tomou esse salve a senhora desconhece? T: Ela nunca falou para mim. MP: Consta aqui no processo que um desses fatos aí aconteceu no dia 28 de abril de 2020, a senhora pode dizer para nós se alguém foi na porta da tua casa procurar a Fernanda, o que aconteceu? T: Foi. MP: Conta para nós como que aconteceu então, por favor? T: Chegaram lá no portão, perguntaram se ela estava lá, eu falei que não estava. MP: Quantas pessoas mais ou menos? T: Era uns sete, mais ou menos. MP: A senhora conhecia alguma dessas pessoas? T: Não, não conheço ninguém. MP: Teve um depoimento da senhora aqui [...], consta que a senhora cita o nome da Gegê, da Jaqueleine, que elas estavam segurando pedaços de madeira, a senhora não confirma isso? T: Não. MP: Tinha mulheres segurando pedaços de madeira? T: Tinha, mas não sei quem eram as mulheres, não conheço elas. MP: Tá certo, tinha algumas pessoas de moto também? T: Tinha, mais para trás tinha. MP: Tinha pessoas a pé e pessoas de moto, é isso? T: Tinha. MP: E nesse dia eles localizaram a Fernanda lá na sua casa ou não, eles foram embora? T: Eu saí, falei para ela: “vou sair que estou com medo, vou embora para a casa de mãe”, para a casa da avó dela, não quis ir, ficou lá, aí entrou e pegou ela, eu peguei as crianças e saí e ela ficou lá dentro e pegaram ela. MP: Foi esse dia que pegaram ela então? T: [a testemunha faz sinal positivo com a cabeça], aí passou um pouco e chegou a turma lá do hospital avisando que ela estava no hospital muito machucada. MP: Certo, e a senhora então se dirigiu ao hospital? T: [a testemunha faz sinal positivo com a cabeça]. [...] MP: Eles bateram nela como o que [...], pedaço de pau? T: Ela falou para mim que foi com corrente. MP: Corrente? T: De bicicleta, dizendo ela, né?, o olho dela fechou tudo assim, quebrou ela toda. MP: Corrente de bicicleta? T: É, segundo ela falou para mim, mas eu não conhecia essas ‘mulher’, não sei quem é. MP: Eles chegaram a arrombar a porta dos fundos da sua casa para poder pegar ela lá dentro? T: Pegaram sim, isso é verdade, não tem como mentir, é verdade, a porta do fundo foi arrombada. MP: A Fernanda chegou a comentar para a senhora para onde que levaram ela? T: Falou. MP: E como é que foi essa sessão de espancamento? T: Falou tudinho para mim. MP: Conta para nós então? T: Eles entraram no fundo, pegaram ela, arrastou para o rio, que eu moro, minha casa fica no fundo do rio, assim fica no fundo, arrastaram ela, levaram lá para cima, arrastaram a cara dela na bosta de vaca, afogaram muito no rio, tudo lá e levou para o campo de avião, largou ela sozinha lá MP: Certo. T: Levaram ela para o campo de avião e deixaram ela lá, aí não sei, teve um lá que ajudou ela, chamou a ambulância e levou ela para o hospital, deixou ela no mato jogada. MP: A senhora cita aqui que ela teria dito para a senhora que o salve foi feito com fios de cabo de aço de bicicleta? T: Foi. MP: Agora hoje a senhora citou, usou a expressão corrente de bicicleta, a senhora se recorda se foi corrente ou se foi fio de cabo de aço, aqueles de breque de bicicleta? T: Ela falou que foi as correntona, ela ficou muito machucada, o olho dela fechou tudo, pegaram muito pesado demais, não precisava fazer aquilo tudo. MP: Ela chegou a cometar alguma coisa com a senhora de que a ordem para o esse salve teria partido de alguma pessoa, que era chefe do Comando Vermelho de Rondonópolis, que estava presa em Rondonópolis? T: Não, ela nunca falou isso para mim, tinha coisa que ela não me falava, ela falou que ela só não morreu por causa de uma menina, que tem o apelido de Bruxinha. MP: A Bruxinha que impediu de matar ela. T: Falou assim, ela falou assim: “não quero, tenho filho para criar, você não pode me matar, eu quero conversar com a chefe”. MP: Quer dizer que esse pessoal que estava então agredindo ela, eles mantinham contato com a chefe na hora da agressão? T: Foi, aí soltaram ela, mas era para matar ela lá. MP: Então essa Bruxinha falou que não era para matar, que era só para machucar, só para dar um salve, é isso ? T: Não era para matar ela, só para dar um salve. MP: Ela relatou se tinha só mulher ou se tinha homens junto? T: Falou que tinha duas mulheres. MP: Tá. T: Um tal de ‘De menor’, ela falou que o que mais... que bateu muito, foi esse ‘De menor’. MP: A pessoa que tinha apelido de ‘De menor’, é isso? T: É, apelido de ‘De menor’, ela falou que o único que não triscou a mão nela foi o menino, como é o apelido dele... Arnaldinho. MP: Arnaldinho não triscou a mão nela? T: A mão nela não, foi o único. MP: Depois que aconteceu esse fato com a Fernanda [...], ela se afastou um pouco das drogas ou ela continuou naquele mesmo ritmo? T: Ela ficou uns dias quieta, depois... mandei ela embora para a casa do pai dela, ficou uns dias lá, passou [...], saiu de novo, foi para a casa do pai dela e voltou de novo, não teve jeito. MP: E acabou sendo assassinada aí em Poxoréu? T: Foi, uma semana antes de acontecer isso com ela, bateram na porta lá de casa e perguntou da Fernanda, mas só que eu fiquei com medo de abrir a porta, “olha Fernanda, vamos matar você [...], vou te enterrar”, mas eu fiquei com medo de ir lá fora ver quem era, uma semana antes de acontecer isso. [...] Defesa: [...] estou falando em relação a esse fato, quando a senhora disse que ela apanhou com o cabo. T: Ah sim, sei. Defesa: Antes da morte dela, quando eles buscaram ela em casa para levar para o rio, a senhora estava em casa? T: Estava mais não, eu corri por causa das crianças, ela teimou, quis ficar lá, ‘não vão vir aqui, “não, mãe, não vão mexer comigo não”. Defesa: E a senhora estava onde nesse momento? T: Estava na casa da minha mãe, que já é falecida. [...] Juiz: A Fernanda residia há quanto tempo lá em Poxoréu, nasceu em Poxoréu? T: Nasceu aqui mesmo. Juiz: Ela conhecia então o pessoal das redondezas, do bairro, os traficantes [...]? T: Conhecia sim. Juiz: Ela comprova droga com eles? T: Comprava. Juiz: As pessoas que teriam agredido sua filha, ela chegou a relatar para a senhora os nomes ou ela não relatou? T: Ela flou só desse guri, ‘De menor’, que bateu muito nela, do outro menino que eu falei aí ... Juiz: Mas ela conhecia as pessoas que bateram nela [...]? T: Ela conhecia, mas eu não. Juiz: Conhecia todos então? T: Conhecia. [...] (Id. 235272598 - pág. 1-2 – relatório de mídias) Os demais depoimentos colhidos na instrução processual confirmam o envolvimento de Rosilene, Giovani, Jaqueline, Geislan, Alisson e Douglas no sequestro cometido contra Fernanda. O IPC Flávio Bispo explicou que acompanhou Fernanda no exame de corpo de delito, sendo que, na oportunidade, “ela indicou com precisão quem seriam as pessoas que teriam feito isso”, porque “todos eram conhecidos dela, ela sabia que todos eles eram faccionados, eram membros do CV” (Id. 235272598 - pág. 1-2 – relatório de mídias). Tatiane Sclithidt Gonçalves – investigadora responsável pelas interceptações – asseverou que, em uma das conversas, Rosilene e Lucas discutem abertamente os salves aplicados, inclusive ela “menciona para Lucas que foram três salve, ela fala assim: “foram três salves, amor, o da vagabunda da Fernanda”, perdão pela palavra, foram as expressões que ela usou na fala, a desgraçada da Fernanda, uma coisa assim, aquele caso de Primavera e o outro, eu não sei qual é”. O material produzido na ação cautelar n. 0000587-02.2020.8.11.0014 se agrega aos elementos de convicção angariados. O relatório final n. 007/2020- NI/PVA/PJC constatou que, “no dia em que foi deflagrada a presente operação Bateia no município de Poxoréu/MT, o alvo Rosilene conversa com Lucas e diz que ‘todos os irmãos da quebrada’ foram presos, referindo-se ao termos utilizado para descrever os integrantes da fação criminosa Comando Vermelho, da qual Rosilene e Lucas desemprenham o cargo de gerente [...]”. Nas conversas interceptadas, “Rosilene ainda lamenta o fato de ter chegado mais um mandado de prisão para ela, quando Lucas pergunta o motivo do mandado de prisão, Rosilene diz que foi por causa “daquele salve da desgraçada da Fernanda”. Na sequência ela informa Lucas que os executores foram pegos e cita o nome de “Giovani, Pity, Ellyan, Nairob, Ligeirinho, todos os irmãos, só ficou o MK e o Neguinho Felipe, o Zé Pequeno”. No dia seguinte, eles voltam a conversar e Rosilene confirma a prisão dos réus, dizendo que foi por causa “daquele salve daquela desgraçada... daquela guria 16, da Fernanda, do salve [...]” (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 135- 231). No contexto, resta claro que as provas amealhadas demonstram de maneira inconteste o envolvimento de Rosilene (Bruxinha), Giovani, Jaqueline (Marrenta), Geislan (Gegê), Alisson (Pity) e Douglas (Doguinho), no crime cometido contra Fernanda, de modo que o pedido de absolvição é descabido. Nesse sentido: [...] Os depoimentos dos agentes policiais, em harmonia com as demais provas [apreensão de porções individuais de drogas preparadas para venda e balança de precisão durante investigações relativas a “salve” aplicado por integrantes de facção criminosa], afiguram-se “idôneos para sustentar a condenação criminal” por tráfico de drogas, que se consuma com a prática de qualquer das condutas descritas no art. 33 da Lei nº 11.343/2006, dentre as quais transportar e/ou trazer consigo drogas em desacordo com determinação legal. [...] (TJ/MT, N.U 1000236-37.2024.8.11.0025, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 11/03/2025, Publicado no DJE 17/03/2025). [...] A materialidade e a autoria do crime de tortura mediante sequestro estão comprovadas por vídeos, laudos periciais e depoimentos testemunhais. Os réus agiram em comunhão de esforços para constranger as vítimas com violência e grave ameaça, configurando o delito. [...] (TJ/MT, N.U 1004408-20.2023.8.11.0037, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 10/12/2024, Publicado no DJE 16/12/2024) O envolvimento de todos os recorrentes em organização criminosa (art. 2º, § § 2ª, 3º e 4º, da Lei n. 12.850/2023), também restou caracterizado. Depois que Fernanda denunciou seu sequestro e agressão, a polícia identificou os envolvidos e constatou que integravam o Comando Vermelho. Na instrução processual, o IPC Flávio Bispo assim expôs o trabalho investigativo: MP: [...] é aquela Operação Bateia ocorrida em Poxoréu, você está lotado em Poxoréu ainda? T: Perfeitamente Excelência. MP: Na ocasião foram presas várias pessoas sob acusação de integrarem o Comando Vermelho e de estarem traficando drogas aí na cidade, também aplicando salves, essas correções, punições que aplicam em relação a pessoas que não pagam dívidas, enfim, os mais variados motivos, o senhor trabalhou na investigação, ajudou no cumprimento dos mandados, pode fazer um resumo para nós? T: Trabalhei sim Excelência, eu participei da investigação desde o início, a gente começou catalogando eles, os alvos, depois fizemos algumas prisões em flagrante durante o decorrer da operação, logramos êxito aí em conseguir a expedição dos mandados de todos eles, todos faccionados, nenhum deles não era membro da facção; no ato das investigações quem estava de chefia era a Gegê, que era conhecida nossa, inclusive era até amasia de um outro rapaz, que chama Flávio Moura, que ainda está aqui na região atuando. MP: Esse Flávio Moura na época era adolescente ainda? T: Isso, ele era menor, perfeitamente, era menor; a atuação deles é essa, é tocar o terror na cabeça das pessoas, os usuários de drogas que não pagava ,eles aplicavam esses salves; essa menina aí, a Fernanda Graciele, foi vítima de uma salve deles, acho que uns sete ou oito membros da facção, com autorização do gerente, que eles chamam de gerente, e com a participação do disciplina, sequestrou a menina e deram um corretivo nela, deram um salve, como eles falam vulgarmente. MP: Como que vocês ficaram sabendo do salve, se o senhor puder lembrar o nome de alguns dos participantes ou apelido, o papel deles na execução do salve? T: Lembro de alguns, Pity, Alison Braga, acho que o Flavinho estava no dia também, só que ele era menor na época dos fatos. MP: Flavio Moura? T: É, a gente ficou sabendo o seguinte, a notícia correu, a cidade é pequena, é uma cidadezinha de interior, aí a notícia corre, a gente teve ciência desse salve que eles deram nela, aí a gente deu início nas investigações, foi o que desencadeou a operação. MP: [...]Giovani e Vitor Gabriel? T: O Vitor é o seguinte, ele tinha uma relação de namoro, era amásio da Jaqueline, a gente conhecia ela no meio criminal por Marrenta, Nairobi, ela tinha vários codinomes, esse Vitor era amásio dela, e o Giovani era irmão dele, cunhado dela; há uns quatro, cinco anos atrás ela foi gerente daqui, do Comando Vermelho daqui em Poxoréu quando a facção estava começando, ela era gerente aqui, a gente conseguiu fazer a prisão dela e aí veio essa menina, essa Gegê para assumir o lugar de gerencia, sempre eles faziam as ações aqui na rua com apoio, com aval da Rosilene Pariz Marinho, a gente pode constatar que ela dava o aval final para as ações que eles iam executar na rua, tanto em relação ao tráfico, quanto em relação a alguns homicídios que teve, e com relação a esse salve da Fernanda também, ela que deu o aval final [...] MP: [...] nós estávamos naquele ponto que eu pedi para você dar uma contextualizada nos salves na região, com base naquele relatório que foi elabora pelo Luiz Otavio e pelo Fabio, pode continuar, por favor. T: [...] é comum eles aplicarem esse tipo de correção nos usuários, nas pessoas que são desafetos da organização; aqui a gente teve conhecimento de vários, teve conhecimento do Cuiabano, teve conhecimento desse da Fernanda, teve uns dois ou três que não quiseram dar andamento na investigação, aí infelizmente a gente fica de mãos atadas, não tem o que fazer. MP: Correto, quando o senhor entrevistou, conversou com a Fernanda sobre isso, ela declinou nomes, apelidos de pessoas, que efetivamente participaram do sequestro e da agressão a ela? T: Ela relatou sim Excelência, mas agora não me recordo, creio que consta no relatório do Fábio mais o Luiz Otavio, foram os que mais participaram, os que eu recordo, que posso afirmar para o senhor, é o Pity, que é o Alisson Braga, o Flavio Moura, que à época dos fatos era menor, esses eu posso confirmar para o senhor, os outros nomes creio que consta no relatório que eles colocaram nos autos. [...] MP: O senhor sabe se a Rosilene, que tem o apelido de Bruxinha, exercia um papel de liderança nisso aí, com poder de determinar esses salves, se seria decretada a morte da pessoa, se seria para aplicar só algum castigo, tem condição de detalhar a posição dela para nós? [a defesa questiona o modo que a pergunta foi feita; contudo o reclamo é indeferido] T: Ela era a pessoa que dava o aval final para qualquer ação deles nesse sentido; tinha a Gegê, que era a gerente lá, que estava na região solta, ela era a líder que estava presa, que a gente havia efetuado a prisão dela em uma outra situação antes, mas ela atuava ativamente, com relação a droga, com relação a homicídios, com relação a salves, era ela quem dava o aval final. MP: E o Lucas era companheiro dela, namorado, tem conhecimento de alguma coisa nesse sentido? T: Lucas Cezar [...], esse rapaz ele é membro do CV em Rondonópolis, inclusive teve uma investigação de homicídio aqui na região que a gente estava investigando o envolvimento dele, ele era amasio dela, namorado dela esse Lucas, mas ele é faccionado de Rondonópolis [...], de onde é a madrinha da Rosilene, a Bruxinha. [...] MP: Agora vou pedir que a pessoa da assessoria do juiz fixe na tela os acusados para que o senhor possa dizer quem é quem e o papel dessa pessoa por ocasião da operação Bateia. [...] T: Essa é a Rosilene Paris Marinho, conhecida no meio policial como Bruxinha. Juiz: [...], essa de blusa branca? T: Essa de blusa branca é a Gegê, só conheço o nome de facionada dela. Juiz: A de blusa cinza? T: De blusa cinza é a Jaqueline, ela tinha dois codinomes, era Marrenta e Nairobi no decorrer da operação. Juiz: Destaca Mata Grande. T: Da esquerda para a direita, o que está de barba, de camisa branca, é o Ellyan, o segundo é Lucas, o terceiro é o amásio da Marrenta, da Jaqueline. Juiz: O que está com tatuagem no braço? T: Isso, exatamente, tem tatuagem no braço. Juiz: Próximo. T: Ao lado dele é o Giovani, que é irmão dele, ao lado do Giovani se puder tirar a máscara, por gentiliza [...], esse do lado do Giovani creio ser o Lucas, [...], o do lado do Lucas é o irmão da Marrenta, o Douglas, Douguinho. Juiz: Tem mais algum [...]? T: Tem o último, o Jonathan, que é o Natan; esse aí é o Pity, o Alison Braga, o último aí. Juiz: O que está com uma tatuagem no braço? T: É o que está de camisa gola polo, o último da direita Excelência [...] ele levantou o braço, deu para ver a tatuagem, ele mesmo, Alisson Braga, vulgo Pity. [...] Defesa: O senhor sabe precisar para a gente quem seria a pessoa de Geislan Neves de Oliveira? T: Geislan é a Gegê. Defesa: O senhor pode nos dizer com base nas investigações quais provas vocês têm, quais documentos que deixa a Rosilene como líder desse grupo? T: Olha doutor, creio que nos autos aí, no que foi passado para a 7ª Vara.... Defesa: Só com base no conhecimento técnico do senhor? T: Com relação a Rosilene, é o seguinte, ela é muito contumaz na rua, ela é muito ativa na rua quando ela estava solta, a gente já sabia à época que ela estava solta da atividade dela, quando ela continuou, quando ela foi presa ela continuou usando telefone dentro da cadeia, aí uma hora ou outra fala demais [...]. Defesa: Mas não chegou a ter isso nos autos do processo? T:Creio que tem sim, o relatório doutor é muito extenso, muita coisa, muito extenso, mas creio que tem sim. [...] Defesa: Os envolvidos você já conhece de algum outro lugar, sim ou não? T: Conheço do meio policial, é o meio que eu vivo, né?, do meio policial. Defesa: Quanto ao Alison Braga [...]? T: Alison Braga... Defesa: Fez alguma abordagem dele em outros momentos ou não? T: Várias vezes. Defesa: [...]? T: Tráfico de drogas, uma vez ele foi flagranteado por tráfico [...], aplicando salve, tentando se graduar na facção a todo custo. [...] Defesa: Você sabe qual era a função dele? T: Ele atuou muito com o disciplina na época dessa operação, disciplina creio que na época que era o Flavinho, [...]. [...] Defesa: [...] gostaria de saber do policial [...], que descrevesse qual é a participação do Ellyan nesse processo? T: O Ellyan, o que aconteceu, ele foi vítima de uma tentativa de homicídio antes de fazer parte da facção e aí, para ter segurança contra essa pessoa que tentou matar ele, ele entrou para a facção, abriu uma boca de fumo e começou a vender droga ele o Natan, Jonathan, que é cunhado da Gegê, irmão do Flavinho; no dia que a gente efetuou a prisão em flagrante do mototáxi [...], estava transportando para ele uma quantidade de droga, inclusive pegou lá na casa dele, casa do Ellyan, que é um bairro da periferia aqui de Poxoréu, aí a gente conseguiu efetuar a prisão do mototáxi, e o mototáxi foi contundente na fala: “eu peguei essa sacola”, tinha uma sacola com uma camisa dentro, me recordo bem dessa situação, que participei da vigilância no dia, tinha uma sacola com uma camisa, e o mototáxi foi em enfático em dizer que tinha pego a sacola com a camisa na casa do Ellyan, a gente constou isso no relatório e disponibilizou para ser juntado aos autos. Defesa: Essa situação que o policial acabou de narrar foi o que culminou na prisão do Ellyan, confirma? T: Essa situação doutor foi a que colocou ele na operação e eu creio que foi a que constituiu... Defesa: [...] a prisão dele? T: Exatamente. Defesa: O policial sabe afirmar para mim se o Ellyan estava junto dessas pessoas que estão sendo denunciadas por tortura, sequestro no dia? T: Doutor, não me recordo, não posso afirmar se ele estava ou não porque não me recordo. [...] Juiz: O senhor chegou a conversar com a Fernanda, que teria recebido o salve? T: Conversei, conversei com ela. Juiz: Ela indicou com precisão quem seriam as pessoas que teriam feito isso? T: No dia eu acompanhei o encaminhamento dela para fazer exame de corpo de delito, os colegas que acompanharam mais a investigação desse salve foi Luiz Otávio e o Fabio, só acompanhei ela no dia, me recordo de ela falar do Alison, do Pity, e do Flavinho, amásio da Gegê, esses dois eu me recordo dela falar que estavam no dia. Juiz: Ela conhecia as pessoas que teriam aplicado o salve, era da convivência dela? T: Todos eles, a cidade é pequena, município pequeno, geralmente os usuários de droga quando está na fissura para poder usar droga vai em um biqueira, vai em outra, acaba conhecendo esse pessoal todo, todos eram conhecidos dela, ela sabia que todos eles eram faccionados, eram membros do CV. [...] (Id. 235272598 - pág. 1-2 – relatório de mídias) O IPC Eugênio Gambino Alves asseverou: “eu trabalho em Poxoréu desde 2011, esse pessoal sempre está envolvido nesses casos do Comando Vermelho, de mandante, de disciplina, sempre está envolvido em tráfico de drogas” (Id. 235272598 - pág. 1-2 – relatório de mídias) O relato da IPC Tatiane Sclithidt Gonçalves corrobora a condição de faccionado dos réus: MP: Então, você está no núcleo de inteligência ainda? T: Sim. [...] MP: Então, tem um relatório nesses autos, que é da Operação Bateia, que você fez a análise das interceptações telefônicas, aos acusados, são imputados os crimes de organização criminosa, tráfico de drogas e sequestro com agressão com relação à vítima Fernanda, você se recorda de ter apurado alguns desses crimes durante as interceptações telefônicas, pelos relatórios que você produziu? T: Sim, a respeito do tráfico de drogas são vários áudios que ficaram bem caracterizados a questão do tráfico de drogas; em relação à associação criminosa também; em relação às agressões contra a vítima Fernanda, o que apareceu foi um áudio em que a Rosilene menciona que um dos mandados de prisão que ela havia recebido para assinar, digamos assim, seria por causa do salve que ela havia mandado dar na Fernanda, então, a respeito desse fato específico da Fernanda, a minha participação nas investigações, digamos assim, foi a análise dessa menção da Rosilene em uma conversa com o seu namorado Lucas. MP: Nessa conversa, então, pelo que você disse, ela assume expressamente que ela já havia recebido um mandado de prisão por ter ordenado esse salve contra a Fernanda? T: Exatamente, inclusive, em uma conversa em que ela cita esse fato, ela até menciona para Lucas que foram três salves, ela fala assim: “foram três salves, amor, o da vagabunda da Fernanda”, perdão pela palavra, foram as expressões que ela usou na fala, a desgraçada da Fernanda, uma coisa assim, a daquele caso de Primavera e o outro, eu não sei qual é, então, ela menciona que foram três salves que ela havia ordenado, porque segundo a fala dela, ela que seria a responsável por ordenar os salves, a gente entende, fica muito claro nas investigações, que o salve é uma forma de descrever punição por meio de agressão que é ordenada pela facção criminosa Comando Vermelho. MP: Entendi, só para confirmar com você, nesse caso específico, vocês receberam após a deflagração da operação as mídias com os dados extraídos da Politec para que vocês fizessem o relatório de análise, ou você não trabalhou nessa parte? T: Não, a questão que nós... essa análise que nós temos foi interceptação telefônica mesmo, então, conforme ia acontecendo os fatos, a gente já ia acompanhando os áudios, era como se fosse em tempo real, não foi analisado posteriormente, entendeu? [...] (Id. 235272598 - pág. 1-2 – relatório de mídias) Os dados da interceptação telefônica se agregam aos elementos amealhados. Referido monitoramento ocorreu no período de 24-4-2020 a 11-7-2020 e demonstrou, de maneira contundente, que todos eram filiados ao Comando Vermelho e que agiam sob a liderança de Rosilene e de seu namorado/companheiro Lucas Cezar dos Santos. O Relatório Final n. 0072022-NI/PVA/PJC – Operação Bateia – consignou: No dia 06/07/2020 LUCAS CEZAR DOS SANTOS, namorado de ROSILENE, conversa com ela por meio do numeral (66) 99610-1170 de dentro da cadeia narrando que foi preso por assalto, que tinha por objetivo pegar um malote. No diálogo fica claro ainda a participação tanto de Lucas quanto de Rosilene na Organização Criminosa Comando Vermelho, Lucas diz que no momento da prisão bloqueou o celular porque estava chegando mensagem do grupo do Comando. Lucas ainda dá orientações a Rosilene para receber dívidas, provavelmente de venda de drogas. ROSILENE demonstra ainda pleno controle das contas oriundas de práticas criminosas em um momento ela diz que pegou dinheiro com FRANCO, informa ainda que tem uma quantidade de drogas, que chama de CHÁ, termo usado para se referir a maconha, na casa de FRANCO. Em outro momento LUCAS orienta ROSILENE qual o procedimento para pegar a arma, que chama de ferramenta. Fica claro no áudio a participação dos alvos GIOVANI e vulgo "GEGE" na organização criminosa, pois LUCAS diz que tem mais de um mil e oitocentos reais para pegar com GIOVANI e ROSILENE diz que LUCAS é padrinho de GEGE. ROSILENE afirma ainda que GIOVANI e ISABELA é quem está "dando uma força" para eles (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 135- 231). Apesar de Lucas se encontrar recluso na Penitenciária Major Eldo Sá Correia, por causa de um roubo, contactava Rosilene, por telefone, constantemente e juntos administravam a organização criminosa. O diálogo transcrito evidencia a função de mando executada por eles, assim como a atuação dos demais no grupo criminoso: Data da chamada: 06/07/2020 Hora: 22:30:00 Transcrição: Rosilene - Que qui cê foi fazê? Lucas – HÁ? Rosilene - Que qui cê foi fazê? Lucas - Ah, tava fazendo assalto, amb, num falei pucê que num tinha (áudio ruim) [...] Lucas - I'd bom, óia aqui, veja bem, presta atenção no que eu vo ti falá pra você. Rosilene - Ha? Lucas - Amanhã você liga pra minha mãe. Rosilene - Hã? Lucas - E fala pra ela, presta atenção no que eu ta te falando, fala pra ela i lá no filtro. Rosilene - Naonde? Lucas - No filtro, no filtro de água Rosilene – Tá Lucas - Intendeu? Rosilene - Ahã Lucas - No filtro d'água vai tê uma folhinha. Rosilene – Sim. Lucas - Cê intendeu? Lá vai te uma folhinha. Ai que qui acontece, lá td o número da menina do corre, intendeu? Rosilene - Sim, sim, intendi. Lucas - Porque meu telefone eu peguei e bloqueei porque a polícia me deu foi um tropelo logo pra mim desbloquea o telefone, intendeu? Porque grupo de mensagem do Comando chega nele (áudio ruim) E o siguinte, eles tiraro meu chip, não fala pra ninguém liga no meu chip. Rosilene - Hã? Lucas - Intendeu? Não liga no meu chip, amô. O chip meu, não liga. Rosilene - Não, td bloqueado, td tudo bloqueado, O. todo mundo ciente, já. [...] Rosilene - Olha aqui amô, tem algum dinhero na conta do Franco? Lucas - Tem. Tem, tem um poco lá. Rosilene - Pois é porque... Lucas – Hã? Rosilene - Porque ele fala qui não tem dinhero lá na conta dele, não, tá? Lucas - Ah, tdá não tem uma mixaria sim, oxe, como qui não tem se ele tá até me devendo, como qui num tem Rosilene - Ele falo que só tinha só trezentos real, qui foi o que eu peguei onti e eu mandei depositá mais trezentos real Lucas – Hã? Rosilene - Ai eu peguei Lucas - Não é isso ai memo é trezentos e poco, trezentos e poco. É o seguinte. Rosilene - Hum? Lucas - É, veja bem, o Luquinha vai peg a ferramenta amanhã. Ai se, se... num sei se... não... Rosilene - Naonde qui td a ferramenta? Lucas - A ferramenta não adianta qui num, num va ti fald pra você qui td na casa de Zé povinho intendeu? Malandro nenhum pega lá, só ele pd pega, qui é amigo nosso, intendeu? Veja bem, vo ti manda o número do meu irmão. Você chega no meu irmão. Rosilene – Hâã Lucas - Anota o número do meu irmão, rápido, anota o número do meu irmão. Rosilene - Eu tenho o número do seu irmão aqui já. Lucas - Do Silvano? Intão é u siguinti, Rosilene - Hum? Lucas - Cê chega cê pega o número do Luquinha, intendeu? Ai Luquinha vai tá buscando a ferramenta amanhã, tendeu e vai tá, vai resgata. [...], o siguinti. Rosilene - Hum. Lucas - Tem mil e mil e oitocentos e poco pa pega na mão do GEO, tem mais o dinhero do, do... Rosilene - Não, do GEO eu peguei, do GEO eu peguei hoje, eu peguei, eu depositei mil e quinhentos real po Advogado, mandei mais trezentos real pra você, peguei mais trezentos do Frank. Eu mandei, eu comprei os trem pra você, ficou quatrocentos e pouco quase quinhentos e poco, depois dei mais trezentos real pro advogado levd pra você. Lucas - Ah, e beja bem. 0 Luquinha ta me devendo, a mãe do Luquinha td me devendo, intendeu? Fala pro Luquinha corrê atrás do... Rosilene - Luquinha é muito vagabundo, Luquinha é vagabundo, sem vergonha, porque eu pedi pra ele, pa ele i lá leva comida pra você, sabe o que ele falo: "Ah, agora não tem como, não". É seus amigo. Lucas - Intão, veja bem, fala pra ele qui eu quero meu dinhero, intendeu, qui ele e a mãe dele ta me devendo. Só cobra isso aí. Num, num, intendeu só fala pra ele resgata a ferramenta, se manda alguém i la busca, cê intendeu e tem mais um dinheiro do chá tamém pucê do corre lá pucê pegd, iscutô? Rosilene - Sim, sim, eu escutei e la no Franco, lá no Franco tem uma situação lá né? Lucas - Que situação? Rosilene - 0 Franco falô que tem um chá lá. Lucas - o cara do corre num pego ainda, não? Rosilene - Não. Num pego, não. [...] Lucas – Hein amô, o Giovani mandô dinhero pra GEGE tamém? Rosilene - Não, mandei, nada pd GEGE de nada e nem vô mandd, não. Lucas - Não, purque, inhantes de eu roda, poco antes de eu roda tinha mandado uma conta qui eu tinha imprestado trezentos reais pra ela fazê o curso. Rosilene - Não, não, não cê sabe purque, purque na hora qui pricisa, cê intendeu? Ela sabe qui cê ta preso, ela nem chego pa fala que eu falei, vô passa aqui só pa avisa qui seu padrinho tá preso, a cara dela era o que? Não, vó dá uma força, fortalecê meu padrinho. Nada, nem isso, nem pergunto se cê tava bem, como qui cê tava. Se tinha advogado se cê num tinha, nem pergunto tamém num faço nem questão não. E igual eu falei pucê, (áudio ruim) eu por você, você por mim, o resto... o Geovani qui tá cum nois, e a Isabela, né. Que a Isabela qui compro os trem, a Isabela qui corre fazendo tudo. Lucas - O Giovani... Rosilene - E essa mulher que tava nessa cena, hein Lucas Cezar? Lucas - Uai, meu bem, é o povo lá de Poxoréu, cê intendeu? Rosilene - Ah é o povo lá de Poxoréu? Mas você me falo alguma coisa? Lucas - Ah meu bem, veja bem, nois foi pra pega é papel, é malote de carro, foi um monte de gente. Rosilene - Eu num quero sabe, o amô, fala uma coisa pra você, eu tô muito magoada com você, eu tô muito magoada, você num podia tê feito isso comigo não, intendeu? Tinha que tê agido na transparência comigo. Lucas - Amô, eu num amô, presta atenção eu fui fazê progresso. Rosilene - Eu num vô brigá cum você, eu num vô brigá cum você, intendeu? A vigilância também revelou que, depois que foi presa, Rosilene continuou a gerir as atividades da facção junto com Lucas: Data da chamada: 06/07/2020 Hora: 22:45:00 Transcrição: Rosilene - Aham, eu pedi pro Natiel leva um porronco, manda um chá pucê, ele vai manda, amanhã Lucas - Vai mandd amanhã? Rosilene - Vai, aham. Lucas - Tão ta bom, fala qui eu ta no barraco vinte e um. Em outra conversa monitorada, “Rosilene ainda menciona que Giovani exerce cargo de liderança e que está à frente dos trabalhos, menciona ainda que Giovani é seu ‘afilhado’ dentro da organização criminosa, já que afirma que Giovani a chama de ‘madrinha’”. Nesse momento, “Lucas encerra a conversa dizendo que não via mandar os disciplinas, os irmão, fazer nada de errado para que eles não percam a quebrada, deixando claro que Lucas e Rosilene são os gerentes da organização criminosa no município de Poxoréu/MT”. Em dado momento da interceptação, “Rosilene entra em contato com o alvo Ellyan e pergunta se ele já começou a receber [...], Ellyan então menciona os valores que recebeu e Rosilene falar para levar na casa de mãe de Giovani”. Os analistas constataram que, “em áudio do dia 21/05/2020, às 10:49, em uma conversa com Jaqueline, vulgo Marrenta, fica claro que mesmo não estando na cidade, Geislan, vulgo Gegê ou Glock, tem ciência do que aconteceu na cidade e participa de um grupo de WhatsApp chamado de GP a fim de tomar conhecimento dos fatos que ocorrem no município de Poxoréu”. No dia “02/07/2020, às 14:46 Geislan entra em contato com a interlocutora Marrenta [...] e diz pra ela dar uma olhada no GP, termo utilizado para grupo no aplicativo Whatsapp”. Em outra conversa, Geislan “informa a Deia que saiu de Pocoxeu por receio de uma operação policial”. No período de monitoramento, as conversas indicaram ainda que Geislan era extremamente cuidadosa na utilização do telefone e que alertava: “nun vira fala na linha”. Nas conversas interceptadas, “Rosilene ainda lamenta o fato de ter chegado mais um mandado de prisão para ela, quando Lucas pergunta o motivo do mandado de prisão, Rosilene diz que foi por causa “daquele salve da desgraçada da Fernanda”. Na sequência ela informa Lucas que também foram pegos “o Giovani, o Pity, o Ellyan, Nairob, Ligeirinho, todos os irmãos, só ficou o MK e o Neguinho Felipe, o Zé Pequeno” (Id. 50834093 - pág. 130-231 Conforme reiteradamente decidido, as provas obtidas na interceptação telefônica, cujas informações constam nos relatórios elaborados no período de investigação, inserem-se dentre aquelas irrepetíveis, sujeitas ao contraditório diferido, e mostram-se aptas para respaldar a condenação. Nesse sentido: [...] Não há se falar, pois, em violação do art. 155 do CPP, uma vez que questiona-se a utilização de provas irrepetíveis, sujeitas ao contraditório diferido, como interceptação de dados telefônicos provenientes de SMS e WhatsApp, busca e apreensão na residência de corréu e interceptações telefônicas constadas em relatórios de inteligência da polícia, sendo todas válidas para a condenação do agravante por ambos os crimes. Tal conclusão, por óbvio, afasta o pedido de absolvição por insuficiência de provas para a configuração dos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico postulada pela defesa, uma vez que clara e suficientemente demonstrada a vinculação com a traficância e a associação com diversos corréus para a prática de tráfico de drogas. [...] (STJ, AgRg no AgRg no HC n. 885.042/MG, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 2/9/2024, DJe de 6/9/2024). [...] É possível a condenação criminal, com fundamento em provas de natureza cautelar e não repetível, como diligências judicialmente autorizadas de busca e apreensão e de interceptação de dados telefônicos provenientes de SMS e WhatsApp, cujos resultados são posteriormente reduzidos a termo em relatórios de inteligência da polícia, visto que tais elementos são sujeitos a contraditório diferido e se inserem na ressalva prevista na parte final do art. 155, caput, CPP, bastando assim para a formação do convencimento condenatório. As provas cautelares e não repetíveis, corroboradas que estão pelos depoimentos colhidos em juízo, são capazes de implicar na empreitada delitiva não só os réus já condenados na sentença, mas também alguns dos réus absolvidos, o que impõe tanto a manutenção da condenação daqueles quanto a reforma da absolvição destes, mediante o provimento parcial do recurso interposto pelo Ministério Público. (TJ/MT, N.U 0028131-12.2019.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, GILBERTO GIRALDELLI, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 12/02/2025, Publicado no DJE 15/02/2025) Ademais, o relato dos policiais que participaram da investigação “merecem a credibilidade e a fé pública inerente ao depoimento de qualquer funcionário estatal no exercício de suas funções, principalmente, quando corroborados pelos demais elementos de provas nos autos [...] e ausentes indícios de que houvesse motivos pessoais para a incriminação injustificada dos investigados” (STJ, HC 698.947/SP, Rel. Ministro JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT), QUINTA TURMA, julgado em 23/11/2021, DJe 26/11/2021). Além disso, “os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal” (Enunciado n. 8 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas TJ/MT). Invoco ainda os seguintes julgados: [...] entende este Tribunal da Cidadania que "os depoimentos prestados por policiais têm valor probante, na medida em que seus atos são revestidos de fé pública, sobretudo quando se mostram coerentes e compatíveis com os demais elementos de prova dos autos, e ausentes quaisquer indícios de motivos pessoais para a incriminação injustificada do investigado, como na espécie" (AgRg no AREsp n. 1.997.048/ES, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 15/2/2022, DJe de 21/2/2022). [...] (STJ, AgRg no HC n. 810.819/PB, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 17/6/2024, DJe de 19/6/2024). [...] A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que "o depoimento dos policiais prestado em Juízo constitui meio de prova idôneo a resultar na condenação do réu, notadamente quando ausente qualquer dúvida sobre a imparcialidade dos agentes, cabendo à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova" (AgRg no HC n. 672.359/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 22/6/2021, DJe 28/6/2021)". [...] (STJ, AgRg no REsp n. 2.123.639/MG, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 27/5/2024, DJe de 3/6/2024). Conquanto não se verifique na interceptação referência direta a Douglas, não se pode olvidar que existem provas contundentes de que foi um dos responsáveis pelo salve aplicado em Fernanda, por ordem da facção. A circunstância, por si só, demonstra que se encontrava filiado ao grupo. De mais a mais, nada ampara a negativa de autoria sustentada por ele, Giovani, Alisson, Ellyan, Lucas e Jaqueline. As testemunhas de defesa ouvidas se limitaram a abonar a conduta dos réus por quem foram arroladas. No contexto, a escusa não é suficiente para desconstituir as provas que demonstram a condição de faccionados ostentada pelos recorrentes. Confira-se: [...] Os depoimentos dos policiais, respaldados por outras provas materiais, oferecem suporte robusto à comprovação da autoria e da materialidade delitiva, evidenciando que a negativa de autoria apresentada se revela isolada e desprovida de amparo nos elementos probatórios colhidos durante a instrução processual. [...] (TJ/MT, N.U 1005770-53.2023.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 17/12/2024, Publicado no DJE 19/12/2024). [...] A defesa não produziu provas capazes de desconstituir o conjunto probatório, limitando-se à negativa de autoria, insuficiente diante das evidências reunidas. [...] (TJ/MT, N.U 0001817-14.2014.8.11.0039, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 16/12/2024, Publicado no DJE 18/12/2024). No contexto, a absolvição quanto ao crime de organização criminosa é inviável: [...] O laudo pericial da análise dos dados encontrados no celular apreendido com o apelante constitui prova suficiente da prática do crime de integrar organização criminosa, pois evidencia que ele realizava a venda de drogas e participava de grupo criado no aplicativo WhatsApp pela facção criminosa [...] (TJ/MT, N.U 1012309-13.2020.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, HELIO NISHIYAMA, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 11/02/2025, Publicado no DJE 14/02/2025). [...] Crime de organização criminosa: As provas constantes nos autos, incluindo interceptações telefônicas e dados extraídos de dispositivos eletrônicos demonstraram a estrutura ordenada, divisão de tarefas, estabilidade e permanência necessárias à configuração do crime de Organização criminosa, nos termos do art. 2º da Lei nº 12.850/2013. [...] (TJ/MT, N.U 0000505-77.2019.8.11.0087, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RONDON BASSIL DOWER FILHO, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 29/01/2025, Publicado no DJE 04/02/2025). A qualificadora do uso de arma de fogo (art. 2º, § 2º, da Lei n. 12.850/2023) encontra-se configurada. Como destacado na sentença, “restou suficientemente demonstrado através do material acostados aos autos que os integrantes da facção criminosa em comento possuíam armas de fogo disponíveis para uso em suas atividades ilícitas, havendo diversos diálogos interceptados em que os denunciados ROSILENE, LUCAS CEZAR, JONATAN e GIOVANI comentam acerca do armamento, solicitando que sejam entregues a outros indivíduos ou informando sua localização (IDs 43136136 - Pág. 1/4, 43136136 - Pág. 7/9 e 38991530 - Pág. 4). Demais disso, conforme relatado pela vítima Fernanda Graciele, o grupo criminoso empregou arma de fogo em seu sequestro, a qual foi utilizada para ameaçá-la de morte e agredi-la com coronhadas (ID 38991087 - Pág. 11/14).”. De se consignar que “A causa de aumento de pena pelo emprego de arma de fogo é circunstância objetiva que se comunica a todos os coautores do crime [...]” (STJ, AgRg no AREsp n. 2.552.030/RS, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 12/11/2024, DJe de 18/11/2024). Além disso, a apreensão e perícia do artefato bélico torna-se desnecessária quando sua utilização está evidenciada por outras provas: [...] No que diz respeito à alegada impossibilidade de incidir a causa de aumento pelo uso da arma de fogo, em virtude da sua não apreensão e perícia, tem-se que é assente o "entendimento firmado por esta Corte no julgamento do EREsp n. 961.863/RS, segundo qual a apreensão e perícia da arma é desnecessária para evidenciar essa causa de aumento de pena se há outros elementos de prova que evidenciem o emprego do artefato". (AgRg no HC 664.344/TO, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 25/05/2021, DJe 02/06/2021) [...] (STJ, HC n. 672.594/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 21/9/2021, DJe de 27/9/2021). [...] Causa de aumento do emprego de arma de fogo. Notoriedade da utilização de armamento pela organização criminosa autodenominada "PCC" (Primeiro Comando da Capital). Facção dedicada ao tráfico de droga e outros delitos praticados no âmbito do seu modus operandi (roubos, homicídios, entre outros). Majorante evidenciada, inclusive, por diálogos captados em que os alvos da interceptação telefônica aludem à negociação para aquisição de armas e ao seu efetivo emprego . Prescindibilidade da apreensão e análise técnica para aferição da potencialidade lesiva. Precedentes desta Corte e do STJ. [...] (TJ-SP - Revisão Criminal: 2350131-66.2023.8 .26.0000 Ribeirão Preto, Relator.: Marcos Alexandre Coelho Zilli, Data de Julgamento: 10/06/2024, 8º Grupo de Direito Criminal, Data de Publicação: 10/06/2024) A participação de adolescente na organização criminosa (art. 2º, § 4º, I da Lei n. 12.850/2023) também é certa. Fernanda Graciele Rodrigues Alves assegurou que os adolescentes Flavio Moura e José Carlos Mundim participaram do salve que lhe foi aplicado a mando da facção. Maria Luiza Alves dos Santos contou que ouviu de sua filha que “um tal de ‘De menor’, ela falou que o que mais... que bateu muito, foi esse ‘De menor’”. O depoimento O IPC Flávio Bispo, corrobora a informação no ponto em que sustentou: “o Flavinho estava no dia também, só que ele era menor na época dos fatos”. Assim sendo, “A majorante prevista no art. 2º, §4º, inciso I, da Lei nº 12.850/2013, foi corretamente aplicada, considerando-se a participação de adolescentes na organização criminosa, evidenciada por vídeos, mensagens e outras provas”. [...] (TJ/MT, N.U 1007458-44.2020.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Vice-Presidência, Julgado em 04/02/2025, Publicado no DJE 05/02/2025). No que tange ao de tráfico de drogas imputado a Ellyan, Giovani, Rosilene e Lucas, as provas são irrefutáveis. A falta de materialidade, por ausência do laudo definitivo, não se sustenta. A ação penal encontra-se instruída com o exame preliminar de entorpecentes – laudo pericial criminal n. 210.2.04.2020.007654-01 (Id. 235272634 - pág. 1-2), e com o laudo pericial n. 3.14.2020.69147-01 (Id. 235272633 - pág. 1-4), ambos elaborados pela POLITEC. Ainda que o laudo definitivo não constasse nos autos, vigora entendimento no sentido de que o laudo preliminar, desde que elaborado por peritos, em procedimento similar – como ocorreu no caso –, é suficiente para comprovar a materialidade do ilícito: [...] Para a condenação pelo crime de tráfico de drogas, a regra é a exigência de laudo toxicológico definitivo para a comprovação da materialidade delitiva, admitindo-se, em caráter excepcional, o uso de laudo preliminar que possua grau de certeza idêntico ao definitivo, desde que elaborado por perito oficial e em procedimento equivalente, hipótese não configurada nos autos, o que justifica, em princípio, a absolvição. [...] (STJ, AgRg no AREsp n. 2.532.281/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 4/2/2025, DJEN de 13/2/2025). [...] No caso dos autos, além do laudo preliminar, foi realizado exame laboratorial definitivo, assinado por perito oficial, em que constatou o peso líquido e a natureza do entorpecente apreendido (cocaína). Assim, verifica-se que há provas suficientes acerca da materialidade do delito de tráfico de drogas. [...] (STJ, AgRg no AREsp n. 2.742.438/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 3/12/2024, DJEN de 9/12/2024). A autoria exsurge nas provas angariadas. Os policiais ouvidos na instrução processual garantiram que a investigação demonstrou que os réus atuavam intensamente no comércio de drogas. A interceptação telefônica comprovou que no dia 24-4-2020, às 23h27min, ocorreu a seguinte conversa de Ellyan com o interlocutor Adilson: Adilson: “Hãn, num tem como cê trazê aqueles cinquenta aqui?” Ellyan: “ah, pega cem logo moço, eu levo aí pucê aí na sua casa uai”. Adilson: Beleza então Ellyan Ellyan: Pode sê intão? Adilson: Pode. Ellyan: Você vai pagá que dia Adilson. Adilson: Vô pagá na terça. Ellyan: Terça? Adilson: É. Ellyan: Mas pega mais cem irmão, moço, duzentos conto uai. Adilson: Falo, pode trazê. Ellyan: Pode sê intão. Adilson: Pode. Ellyan: Aí cê ta me devendo mais cinquenta, fica duzentos e cinquenta. Adilson: Beleza intão. [...] (Cautelar Id. 50834093 - Pág. 136). No dia 24-4-2020, eles conversam novamente e Adilson informou que um amigo iria procurar Ellyan para “pegar duzentão” (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 137). Os telefonemas monitorados revelaram que Ellyan mantinha parceria com a pessoa conhecida pelo apelido de Binga no comércio de drogas, e que no dia 1-5-2020 eles discutiram a divisão de uma “pedra de quinhentos real” (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 139 No dia seguinte, Ellyan avisou Binga que “Denis quer passar a 25 a dele” e que “está com o dinheiro, mas não sabe se vai passar o valor para Bruxinha, ‘para segurar as pontas’”. Na sequência, eles voltam a conversar sobre as quantidades negociadas (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 141). No relatório de análise constaram ainda várias outras conversas a respeito do comércio de substância ilícitas entre eles. A prisão em flagrante de Dalmo, transportando o entorpecente, que buscou na residência de Ellyan, corrobora a atividade ilícita. Embora Dalmo – que trabalhava como mototáxi – tenha sido absolvido, porque ficou provado que desconhecia a existência da droga na encomenda que foi contratado para buscar, a responsabilidade de Ellyan é inquestionável. No ponto, Rafael Sippel Fossari – delegado de polícia – asseverou: O senhor Dalmo, que é um mototaxista [...], foi contratado pelo Jonathan, pelo alvo Jonathan, para pegar uma encomenda na casa do alvo Ellyan e levar para um outro endereço, eu não lembro se era para levar de volta para o Jonathan ou para uma outra terceira pessoa, eu acho que era para o próprio Jonathan, nesse interim ele foi abordado pela Polícia Militar e foi localizado dentro de uma sacola plástica enrolada em uma roupa, não lembro direito se é uma camiseta, acho que é uma camiseta, algumas porções de drogas”. Jonathan Alves de Moura – que também foi absolvido – acrescentou: “é o seguinte, tive um relacionamento com a irmã do Ellyan, ai ele pediu para mim dar uma força para ele, que estava mexendo com isso aí, tipo assim, ele pegou, falou que se aparecesse algum usuário querendo alguma coisa, era para mim ligar que ele mandava, eu peguei e liguei, mandei esse mototáxi lá, pegou a camiseta com ele lá, para mim entregar para o usuário” (Id. 235272598 - pág. 1-2 – relatório de mídias). A tudo isso, soma-se a confissão de Ellyan para o tráfico, conforme transcrito: [...] Juiz: Você não teria fornecido drogas para o Josenir? R: O Josenir tipo assim seu juiz, a gente ali é tudo meio que tudo próximo, o Josenir vendia a dele lá, entendeu, eu vendia a minha. Juiz: Não, não entendi, repete de novo? R: Assim, o Josenir, entendeu?, que tipo assim [...], tem muita gente que conhece nós ali [...], minha mãe é casada com o Josenir [...]. Juiz: Tá, mas o senhor forneceu droga para o Josenir? R: Não forneci droga para ele não. Juiz: Consta também que o Dalmo teria buscado um pacote com o senhor? R: Sim, correto. Juiz: [...] com droga? R: Sim, correto, ele pegou mesmo comigo. Juiz: Era para que esse pacote, por causa de que? R: Ah, tipo assim seu juiz, o bairro que eu morava lá [...], era um bairro afastado da cidade, eu estava precisando de dinheiro na época, o que acontece, como o Binga era casado com minha mãe, o Josenir é casado com minha mãe, morava lá [...], em cima ali da cidade [...], o Jonathan também morava, morava meio afastado, então surgiu um corre ali, entendeu?, sempre ligava eu ali, ai peguei, era para o Natan, Natan que ia ficar com essa situação aí [...], aí pegaram ele. Juiz: O senhor então fornecia essa droga para o Dalmo? R: Sim, ele pegou em casa comigo. Juiz: Por quanto? R: Ah, era sete pedrinhas, deu ‘setenta real’ o valor, era “dez real’ cada. Juiz: O senhor vendeu por setenta reais? R: Isso. [...] Defesa: Quando pedi para conversar com você em particular, você me disse que queria confessar [...], é a sua culpa nesse processo, você foi preso em razão de uma investigação, uma escuta telefônica que teve e chegaram em você, você na época estava de fato vendendo droga? R: Cara, o período que eu vendi droga ali foi bem pouco, foi só um momento de distração ali, um descuido meu [...]. Defesa: Por que você buscou essa alternativa ao invés de um emprego? R: Na época estava difícil [...], igual eu falei, chegou o Covid, entendeu? [...], tudo fechou naquela época em 2020. [...] (Id. 235272598 - pág. 1-2 – relatório de mídias). A interceptação também averiguou que Giovane comercializava entorpecentes, além de auxiliar a facção em outras atividades relacionadas ao tráfico. No dia 21-5-2020, Giovani conversou com um interlocutor não identificado que lhe pediu “para fechar uma batida” e, em seguida, o orientou a continuar a conversa no WhatsApp. No dia seguinte, o interlocutor entrou em contato novamente, questionou se Giovane ‘estava na ativa’ e avisou que ‘estava indo’ (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 180). Logo depois, Giovani o informou “que Rona vai sair (para fazer a entrega) e dá as características de Rona” (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 181). No dia 22-5-2020 Lucas falou com Giovani e cobrou o ‘relatório de dinheiro’, de ‘quanto já recebeu’ (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 181). No dia 29-5-2020 Giovani conversou com um desconhecido e tratou de uma entrega. Ele também recebeu a ligação da interlocutora Vania, que pediu “50 de bagulho” (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 185). No dia 3-6-2020 Giovani telefonou para um interlocutor não identificado e perguntou: Giovani, E aí, tá naonde? HNI: Tô no açougue. Giovani: Vai saí daí que horas? V: Vou subir já. Giovani: Cadê meus dez quilos de carne? HNI: Uai, aí tá me tirando irmão? Giovani: Hein, chega na sua casa cê me lilga que eu quero tê um papo com você. HNI: Heis, eu previso que me salve nun corre hoje. Giovani: eu preciso te um papo sério cocê, tá acontecendo umas coisas aí qui eu fiquei sabendo sua aí. [...] Giovani: Ah, e tu pici... tu qué quantos? HNI: Não, não é dinheiro não. Giovani: Não, não é, mais é droga mesmo, nun tô oferecendo dinheiro, isso eu não tenho não [...] (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 187). A confissão de Giovani quanto ao tráfico, em ambas as fases, sedimenta a responsabilidade dele no ilícito, verbis: Juiz: [...] o senhor traficou drogas em Poxoréu durante esse período? R: Quando fui preso, fui pego com drogas, aí eu peguei e assumi, porque foi a primeira vez que peguei droga para venda, porque meu filho estava precisando, eu estava desempregado... Juiz: Quando que o senhor foi preso com droga? T: A primeira vez agora, quando eu vim agora. Juiz: Essa droga o senhor estava com ela para vender? R: Ham? Juiz: Essa droga o senhor estava com ela para que? R: Eu estava com ela para mim vender, porque foi a primeira vez que eu peguei. [...] (Id. 235272598 - pág. 1-2 – relatório de mídias). A interceptação revelou ainda que Rosilene e Lucas mantinham rígida fiscalização da traficância realizada pelo grupo criminoso, que ocorria a mando deles. No dia 6- 7-2020, Lucas instruiu Rosilene a controlar o dinheiro, inclusive diz a ela que na casa de sua mãe “no filtro de água vai tê uma folhinha [com] o número da menina do corre”. Na mesma conversa, eles comentam sobre o dinheiro que Rosilene pegou com Geo – se referindo a Giovani – e do “chá que está com Franco”. Na oportunidade, ela ainda diz a Lucas: “eu pedi pro Natiel um porronco, manda um chá pucê, ele vai mandar amanhã”. No dia seguinte eles conversam novamente e “Rosilene diz que está tudo resolvido, Lucas ainda diz a Rosilene que é para avisar Neto para mandar Kamikaze buscar a droga” (Cautelar – 50834093 - pág. 197). Em outro ponto da interceptação “Lucas pergunta se Mandrake caiu com alguém fragrante, Rosilene então afirma que mandado cinco quilos de maconha, que chama de chá e que ele caiu com um quilo e meio e mais cem gramas de óleo. Lucas então pergunta “se o resto dos trem tá guardado” (Cautelar – Id. 50834093 - pág. 207). Importante esclarecer que, no contexto, a falta de apreensão de drogas diretamente na posse de Ellyan, Rosilene e Lucas não descaracteriza a traficância imputada a eles. A jurisprudência é pacífica no sentido de que a “ausência de apreensão de drogas na posse direta do agente não afasta a materialidade do delito de tráfico quando estiver delineada a sua ligação com outros integrantes da mesma organização criminosa que mantinham a guarda dos estupefacientes destinados ao comércio proscrito” (STJ, HC n. 536.222/SC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 23/6/2020, DJe de 4/8/2020). Colaciono ainda os seguintes julgados: [...] Outrossim, nos termos da jurisprudência desta Corte, a "caracterização do crime de tráfico de drogas prescinde de apreensão de droga em poder de cada um dos acusados; basta que, evidenciado o liame subjetivo entre os agentes, haja a apreensão de drogas com apenas um deles para que esteja evidenciada, ao menos em tese, a prática do delito em questão. Assim, a mera ausência de apreensão de drogas na posse direta do agente "não afasta a materialidade do delito de tráfico quando estiver delineada a sua ligação com outros integrantes da mesma organização criminosa que mantinham a guarda dos estupefacientes destinados ao comércio proscrito", conforme decidido por ocasião do julgamento do HC n. 536.222/SC, de relatoria do Ministro Jorge Mussi (5ª T., DJe de 4/8/2020)" (HC n. 686.312/MS, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, relator para acórdão Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 12/4/2023, DJe de 19/4/2023). [...] (STJ, EDcl no HC n. 757.182/PE, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 6/6/2023, DJe de 12/6/2023). [...] Esta Corte possui entendimento de que para a caracterização do crime de tráfico de drogas é prescindível a apreensão de droga em poder de cada um dos acusados, desde que seja evidenciado o liame subjetivo entre os agentes e haja a apreensão de drogas com apenas um deles. Assim, "a mera ausência de apreensão de drogas na posse direta do agente "não afasta a materialidade do delito de tráfico quando estiver delineada a sua ligação com outros integrantes da mesma organização criminosa que mantinham a guarda dos estupefacientes destinados ao comércio proscrito", conforme decidido por ocasião do julgamento do HC n. 536.222/SC, de relatoria do Ministro Jorge Mussi (5ª T., DJe de 4/8/2020)" HC n. 686.312/MS, Terceira Seção, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe de 19/4/2023) [...] (STJ, AgRg no AREsp n. 2.256.875/MG, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 6/6/2023, DJe de 12/6/2023). Assim, diante de fartas provas demonstrando a responsabilidade dos réus no delito contemplado no art. 33 da Lei n. 11.343/200, a condenação é impositiva: [...] Inviável a absolvição dos acusados pelo crime de tráfico de drogas, assim como a desclassificação da conduta para aquela prevista no art. 28 da Lei n.º 11.343/06, uma vez que a materialidade e as autorias delitivas, bem como a destinação mercantil dos entorpecentes apreendidos, restaram sobejamente demonstradas nas provas produzidas durante a persecução penal, em especial nos relatórios de análise, relativos às interceptações telefônicas, devidamente corroborados pelos depoimentos judiciais dos investigadores e da delegada de polícia que atuaram no caso. [...] (TJ/MT, N.U 0001891-39.2015.8.11.0005, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, GILBERTO GIRALDELLI, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 29/01/2025, Publicado no DJE 31/01/2025). [...] A apreensão da droga, o relatório de interceptação telefônica [diálogos sobre a comercialização de drogas] e as provas testemunhas produzidas afiguram-se suficientes para manter a condenação por tráfico de drogas. [...] (TJ/MT, N.U 0037981-27.2018.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 12/11/2024, Publicado no DJE 14/11/2024). Com essas considerações, em consonância com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, desprovejo os recursos, mantendo na íntegra a sentença condenatória. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/04/2025
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