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Eliana Bispo Almeida x Bhp Billiton Brasil Ltda. e outros

ID: 336997994

Tribunal: TJES Órgão: Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5006197-25.2022.8.08.0030

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

ELIANA BISPO ALMEIDA

Polo Passivo:

BHP BILLITON BRASIL LTDA. FUNDACAO RENOVA SAMARCO MINERACAO S.A.

Sentença

Advogados:

CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO

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RICARDO LOPES GODOY

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IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO

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EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU

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IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO

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WALTER TOME BRAGA

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ROBERTO CARLOS DE FREITAS

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DEBORA ALVES FERNANDES

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ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110… ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Linhares - 2ª Vara Cível e Comercial Rua Alair Garcia Duarte, S/N, Fórum Desembargador Mendes Wanderley, Três Barras, LINHARES - ES - CEP: 29907-110 Telefone:(27) 32640743 PROCESSO Nº 5006197-25.2022.8.08.0030 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) REQUERENTE: ELIANA BISPO ALMEIDA REQUERIDO: FUNDACAO RENOVA, SAMARCO MINERACAO S.A., BHP BILLITON BRASIL LTDA. Advogados do(a) REQUERENTE: DEBORA ALVES FERNANDES - ES31396, ROBERTO CARLOS DE FREITAS - ES28678, WALTER TOME BRAGA - ES35604 Advogados do(a) REQUERIDO: EDUARDO PAOLIELLO NICOLAU - MG80702, IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogado do(a) REQUERIDO: IVAN JUNQUEIRA RIBEIRO - MG69461 Advogados do(a) REQUERIDO: CARLOS FERNANDO SIQUEIRA CASTRO - ES12288, RICARDO LOPES GODOY - MG77167 SENTENÇA I - RELATÓRIO ELIANA BISPO ALMEIDA propôs a presente ação de indenização por danos materiais contra FUNDAÇÃO RENOVA, SAMARCO MINERAÇÃO S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA., sob o rito do procedimento comum cível, alegando que exercia atividade de pesca artesanal no Rio Doce e que, em razão do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em 05/11/2015, teria sofrido severas restrições no exercício da atividade pesqueira, com prejuízos econômicos que entende passíveis de indenização. A petição inicial foi protocolada em 13/06/2022 e cadastrada sob ID 15103127, acompanhada de documentos pessoais (ID 15103130 – CNH; ID 15103131 – comprovante de residência; ID 15103132 – comprovante de residência de 2015), declarações de atividade pesqueira (ID 15103133), declaração de hipossuficiência (ID 15103139), CTPS (ID 15103140) e contracheques (ID 15103141), além de declarações de imposto de renda (ID 15103144). Foi concedida gratuidade de justiça, conforme registrado no sistema. Citadas regularmente, as rés FUNDAÇÃO RENOVA, SAMARCO MINERAÇÃO S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA. apresentaram contestação. A BHP BILLITON BRASIL LTDA. apresentou sua contestação sob ID 26666837, acompanhada de documentos comprobatórios e instrumentos de mandato (IDs 26666838 a 26666851), argumentando, em síntese, que não há comprovação documental do exercício da pesca pela autora, tampouco de dano efetivo, além de invocar ausência de nexo causal e prescrição. A FUNDAÇÃO RENOVA apresentou sua contestação sob ID 31174533, também acompanhada de procuração (ID 31174534), sustentando preliminar de ilegitimidade e, no mérito, defendendo a inexistência de responsabilidade, bem como ausência de comprovação de dano. Alega, ainda, que a autora não aderiu a nenhum dos programas extrajudiciais e que não há demonstração de vínculo com a atividade de pesca à época do desastre. Posteriormente, SAMARCO MINERAÇÃO S.A., em nome próprio e na condição de sucessora da FUNDAÇÃO RENOVA, requereu sua habilitação e substituição processual, nos termos do Acordo Judicial para Reparação Integral e Definitiva homologado pelo Supremo Tribunal Federal (PET 13157/DF). Tal manifestação foi protocolada sob ID 71168158, onde expôs que, conforme cláusulas 104 e 109 do Acordo de Repactuação, a SAMARCO assumiu todas as obrigações e ações judiciais da extinta Fundação Renova. Anexou cópia do acordo homologado pelo STF (ID 71357253) e documentos comprobatórios da averbação da decisão do Conselho Curador sobre a extinção da Fundação (ID 71357254). A habilitação foi acompanhada de substabelecimento (ID 71357255) e demais documentos de representação e atos constitutivos da Fundação Renova (IDs 61825605 a 61825608, além de substabelecimento do patrono Dr. Lauro Bracarense, ID 67288785). A habilitação da SAMARCO decorre do processo de liquidação da FUNDAÇÃO RENOVA deliberado no âmbito do Acordo de Repactuação, com previsão expressa de sucessão integral de direitos e obrigações. O juízo proferiu despacho em 16/01/2025, sob ID 61338977, determinando a intimação da parte autora para manifestação no prazo legal sobre as contestações apresentadas e o pedido de habilitação da SAMARCO como sucessora da Fundação Renova. Entretanto, transcorreu o prazo legal sem qualquer manifestação da parte autora, conforme certificado em 30/06/2025, por meio de certidão lançada sob ID 71956794, assinada eletronicamente pelo Diretor de Secretaria. É o que havia a relatar. Passo a decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO II.1 – PRELIMINARES E PREJUDICIAIS II.1.1. Inépcia da Petição Inicial Rejeito. A narrativa apresentada pela parte autora permite a identificação da causa de pedir e do pedido indenizatório. Ainda que não acompanhada de documentos formais robustos, a inicial delimita os prejuízos alegados e estabelece nexo com os fatos. O STJ tem reiteradamente decidido que o pedido inicial, como manifestação de vontade, deve ser interpretado à luz do princípio da efetividade e economia processual, que visam conferir à parte um máximo de resultado com um mínimo de esforço processual. II.1.2. Ilegitimidade Passiva Rejeito. A legitimidade passiva se verifica em juízo de asserção. A alegação da parte autora de que sofreu danos em razão do desastre ambiental, cuja responsabilidade seria atribuída às rés, é suficiente para sua inclusão no polo passivo. Conforme reiterado pelo TJES: […] Preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela Vale S/A. Conforme a teoria da asserção, já explicada acima, a existência ou não de prova do nexo causal para fins de responsabilização civil é questão a ser examinada no mérito da demanda, uma vez que a legitimidade passiva deve ser aferida segundo as alegações, comprovadas ou não, deduzidas pela parte autora. Preliminar rejeitada. […] (TJES; Apl 0015590-20.2016.8.08.0014; Segunda Câmara Cível; Rel. Desig. Des. José Paulo Calmon Nogueira da Gama; Julg. 09/10/2018; DJES 14/11/2018) II.1.3. Ilegitimidade Ativa Rejeito a preliminar. Aplica-se ao caso a teoria da asserção, segundo a qual a legitimidade deve ser aferida à luz das alegações contidas na petição inicial: “As condições da ação devem ser aferidas com base na teoria da asserção, isto é, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial, dispensando-se qualquer atividade instrutória.” (STJ, REsp 1662847/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi) II.1.4. Impugnação à gratuidade de justiça A impugnação apresentada alega que a autora apresentou apenas autodeclaração e contratou advogado particular, o que indicaria ausência de hipossuficiência. Rejeito. Nos termos do art. 99, §3º, do CPC, a parte contrária deve comprovar a capacidade econômica da parte beneficiária, o que não ocorreu nos autos. A contratação de advogado particular não é, por si só, indicativa de capacidade para arcar com as despesas processuais, conforme já consolidado pelo STJ. II.1.4. Sucessão Processual A sucessão processual da FUNDAÇÃO RENOVA pela SAMARCO MINERAÇÃO S.A. decorre de previsão expressa no “Acordo Judicial para Reparação Integral e Definitiva Relativa ao Rompimento da Barragem de Fundão”, celebrado em 25/10/2024 e homologado pelo Supremo Tribunal Federal em 06/11/2024, no âmbito da PET 13157/DF. O referido acordo foi resultado de repactuação conduzida inicialmente pelo Conselho Nacional de Justiça e, posteriormente, sob a supervisão do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, visando à reestruturação dos mecanismos de reparação dos danos causados pelo desastre de Mariana/MG. Nos autos, a SAMARCO apresentou petição (ID 71168158) requerendo sua habilitação e substituição processual, fundamentando o pedido na Cláusula 104 do Acordo de Repactuação, a qual determinou a extinção da Fundação Renova, e na Cláusula 109, § 3º, que estabeleceu que a Samarco assumiria todos os direitos e obrigações da Fundação, inclusive em ações judiciais em curso. Conforme disposto no acordo: Cláusula 104: “Com a extinção dos instrumentos fundantes, os signatários reconhecem a necessidade de imediata extinção da FUNDAÇÃO RENOVA, nos termos do art. 69 do Código Civil.” Parágrafo único da Cláusula 104: “Fica estabelecido um período de liquidação, o qual se inicia com a homologação judicial do acordo e a transferência de direitos, obrigações, ações e bens da FUNDAÇÃO RENOVA para a COMPROMISSÁRIA (Samarco), e finaliza com o término da liquidação e sua respectiva averbação.” Cláusula 109, § 3º: “A COMPROMISSÁRIA (Samarco) sucederá a FUNDAÇÃO RENOVA em todos os direitos e obrigações, assumindo, em caráter definitivo, eventuais ações judiciais e processos administrativos remanescentes.” A documentação juntada comprova que a extinção da Fundação Renova foi deliberada pelo Conselho Curador (ID 71357254) e que a Samarco detém legitimidade processual para substituí-la nos presentes autos. O STF, ao homologar o acordo, reconheceu expressamente a juridicidade e eficácia dessas cláusulas (ID 71357253), conferindo-lhes força executiva nacional. Portanto, à luz do artigo 110 do Código de Processo Civil, que permite a substituição da parte no curso do processo em virtude de sucessão legal ou contratual, e considerando que a substituição está formalizada, documentada e homologada judicialmente, impõe-se o reconhecimento da sucessão processual da Fundação Renova pela Samarco Mineração S.A., que passa a figurar no polo passivo na qualidade de legítima sucessora. Tal substituição tem natureza objetiva e automática, independente de manifestação da parte autora, por se tratar de sucessão decorrente de ato homologado pelo Supremo Tribunal Federal e vinculante quanto aos seus efeitos institucionais e obrigacionais. II.2 – JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO (CPC, ART. 355, I) Nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, é cabível o julgamento antecipado do mérito quando a matéria for exclusivamente de direito ou, sendo de fato e de direito, os autos contiverem elementos suficientes para a formação do convencimento do juízo.Tal dispositivo prestigia os princípios da celeridade, da economia processual e da efetividade da tutela jurisdicional, sem prejuízo ao contraditório. Ressalte-se que o magistrado, como destinatário final das provas, detém o poder-dever de indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, mediante decisão fundamentada, conforme preconiza o art. 370, parágrafo único, do CPC. Nesse sentido, o STJ firmou posição de que "cabe ao juiz verificar a necessidade de dilação probatória, considerando que é o destinatário final da prova, cujo objetivo é a formação de seu convencimento", conforme se verifica no precedente: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. INCÊNDIO . DANOS MORAIS DECORRENTES DA FUMAÇA. MAGISTRADO COMO DESTINATÁRIO DAS PROVAS. NEXO CAUSAL. DANO EXTRAPATRIMONIAL NÃO VERIFICADO . PROVAS. REEXAME. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ . (...) O destinatário final da prova é o juiz, a quem cabe avaliar quanto sua efetiva conveniência e necessidade, advindo daí a possibilidade de indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias, em consonância com o disposto na parte final do art. 370 do CPC/2015. 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que compete às instâncias ordinárias exercer juízo acerca da necessidade ou não de dilação probatória, haja vista sua proximidade com as circunstâncias fáticas da causa, cujo reexame é vedado em recurso especial, a teor da Súmula nº 7/STJ. (...) (STJ - AgInt no AREsp: 1504747 SP 2019/0139522-4, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 18/05/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2021) O Tribunal de Justiça do Espírito Santo adota a mesma diretriz. Em precedente da 4ª Câmara Cível, firmou-se que “não configura cerceamento de defesa o julgamento da lide sem a produção das provas tidas por desnecessárias pelo juízo, uma vez que cabe ao magistrado dirigir a instrução e indeferir a produção probatória que considerar desnecessária à formação do seu convencimento” (TJES, Apelação Cível 0020606-22.2020.8.08.0011, Rel. Des. Luiz Guilherme Risso, j. 20/09/2024). Ainda, em caso análogo, decidiu-se que o indeferimento da prova oral é legítimo diante da “existência de documentação coligida aos autos, e dado o fato de que o magistrado é o destinatário das provas” (TJES, Apelação Cível 5001008-22.2021.8.08.0056, Rel. Des. Carlos Magno Moulin Lima, j. 23/09/2024). A jurisprudência dos tribunais estaduais é pacífica quanto à possibilidade de julgamento antecipado em ações indenizatórias relacionadas ao desastre ambiental de Mariana, especialmente quando a parte autora não apresenta elementos probatórios mínimos sobre os danos alegados. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em caso semelhante envolvendo o rompimento da barragem de Brumadinho, decidiu que, “estando a matéria suficientemente esclarecida e não sendo possível que a prova, pelas circunstâncias do caso concreto, interfira no julgamento, tem-se como desnecessária a dilação probatória” (TJMG, Apelação Cível 5000391-19.2021.8.13.0090, Rel. Des. Narciso Alvarenga Monteiro de Castro, j. 20/05/2024). No presente caso, é cabível o julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, por se tratar de matéria exclusivamente de direito e de fato comprovado documentalmente, não havendo necessidade de produção de outras provas. A autora foi regularmente intimada para manifestar-se sobre as contestações apresentadas e sobre os documentos juntados pelas rés (ID 61338977), mas permaneceu inerte, conforme certificado no ID 71956794. Não houve requerimento de dilação probatória, nem indicação de outras provas a serem produzidas. Além disso, a controvérsia restringe-se à ausência de comprovação documental do alegado exercício da atividade de pesca e da existência de dano material concreto, questão que pode ser decidida com base na prova documental já constante dos autos. Dessa forma, estando o feito suficientemente instruído, mostra-se adequada e proporcional a resolução antecipada da lide, com fundamento na economia e celeridade processuais. II.3 – DO REGIME DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA AMBIENTAL A responsabilidade civil por danos ambientais, no ordenamento jurídico brasileiro, é de natureza objetiva, estando fundamentada na teoria do risco integral, conforme dispõe o §3º do art. 225 da Constituição Federal e o art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81. Dispõe o referido dispositivo legal: “Art. 14 – [...] § 1º – Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente.” Esse regime implica que, havendo comprovação do dano e do nexo causal com a atividade lesiva, é dispensável a demonstração de culpa, bastando a constatação da ocorrência do evento danoso e sua imputabilidade ao agente causador. Assim, qualquer pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, que direta ou indiretamente contribua para a degradação ambiental, responde objetivamente pelos prejuízos resultantes de sua conduta. Por sua própria lógica protetiva e reparatória, a responsabilidade civil ambiental é também solidária e integral, recaindo sobre todos os que concorrem para o dano, independentemente do grau de participação. Ademais, a obrigação de reparar o meio ambiente é imprescritível no tocante à tutela difusa ambiental, conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Todavia, cumpre ressaltar que, mesmo sob o regime da responsabilidade objetiva, não se dispensa a comprovação do dano efetivamente suportado e do nexo causal com o evento ambiental, nos termos do art. 373, I, do CPC. A aplicação da teoria do risco integral não implica presunção automática de dano moral individual em decorrência de um desastre ambiental, ainda que de grande extensão e notoriedade. Em outras palavras, ainda que se reconheça o ilícito ambiental e a responsabilização objetiva das rés no plano abstrato, a parte autora permanece incumbida de demonstrar concretamente como o evento impactou sua esfera individual, seja na dimensão patrimonial, seja na existencial, como condição para o deferimento de indenização. Esse entendimento é reforçado pela jurisprudência consolidada dos tribunais e pela doutrina especializada, sobretudo em relação às ações ajuizadas fora do sistema extrajudicial de reparação operado pela Fundação Renova ou dos programas simplificados instituídos por acordos coletivos e decisões proferidas em ações civis públicas. Nesses casos, exige-se do autor prova idônea e individualizada dos prejuízos alegados, sob pena de improcedência da demanda. II.4 – DA ANÁLISE DO CASO CONCRETO O objeto da presente demanda consiste em aferir a existência de responsabilidade civil das requeridas, FUNDAÇÃO RENOVA, SAMARCO MINERAÇÃO S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA., pelos danos materiais alegadamente sofridos pela autora, ELIANA BISPO ALMEIDA, em razão do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em Mariana/MG, no dia 05 de novembro de 2015. A controvérsia, portanto, concentra-se na verificação dos requisitos para a responsabilização civil objetiva das requeridas, quais sejam: a existência de um dano efetivo, o nexo de causalidade entre esse dano e o desastre ambiental, e a qualificação da autora como pessoa efetivamente atingida pelos efeitos do rompimento. Nos termos do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, a responsabilidade por dano ambiental independe de culpa, bastando a comprovação do dano e de seu nexo com a atividade exercida pelo agente causador. No entanto, a jurisprudência é uniforme ao exigir comprovação específica do dano, mesmo nos casos de responsabilidade objetiva, não sendo suficiente a mera presunção ou a alegação genérica de prejuízo para que se configure o dever de indenizar. No caso dos autos, a autora afirma que exercia atividade de pesca artesanal no Rio Doce e que sua subsistência foi comprometida em decorrência da poluição causada pelo desastre. Para embasar sua pretensão, juntou declarações unilaterais de hipossuficiência e de atividade pesqueira (ID 15103133), cópias de documentos pessoais e comprovantes de residência (IDs 15103130 a 15103132), além de CTPS (ID 15103140) e contracheques (ID 15103141). Contudo, não há nos autos qualquer elemento documental idôneo que comprove o exercício regular, formal ou informal, da atividade de pesca, especialmente no período imediatamente anterior ao rompimento da barragem. Não foram apresentados registros oficiais como licenças de pesca, inscrição em colônias ou associações de pescadores, documentos de comercialização de pescado, extratos bancários relativos à atividade econômica ou outro documento contemporâneo que caracterize início de prova material. A CTPS acostada não apresenta registro compatível com a atividade alegada e os contracheques não guardam relação com a pesca artesanal. A alegação de que a autora teria sido atingida enquanto pescadora no município de Linhares/ES carece também de comprovação técnica ou probatória de impacto direto e mensurável em sua atividade, o que compromete o elemento fático essencial à configuração do dano. Vale destacar que as requeridas, em suas contestações (IDs 26666837 e 31174533), impugnaram especificamente a ausência de provas mínimas da condição de pescadora da autora, asseverando, inclusive, que não houve registro de sua participação nos programas extrajudiciais de reparação implementados pela Fundação Renova, como o Programa de Indenização Mediada (PIM) ou o Sistema Indenizatório Simplificado (Novel). Esse dado é relevante, pois tais sistemas foram concebidos como forma acessível de reconhecimento de danos sofridos por atingidos, inclusive com critérios facilitadores para categorias como pescadores informais. A ausência de qualquer tentativa de adesão aos referidos programas reforça a fragilidade da tese autoral quanto à condição de atingida. Importa observar, ainda, que não foi produzida qualquer prova oral, nem houve requerimento nesse sentido, tampouco se verificou nos autos a formulação de pedido de prova pericial ou de inspeção técnica. Também não foi apresentada réplica às contestações das rés, embora regularmente intimada por despacho ID 61338977, circunstância certificada sob ID 71956794. A inércia da parte autora em se manifestar sobre os elementos trazidos pelas rés prejudicou sobremaneira a instrução probatória do feito, limitando o convencimento do juízo à análise dos documentos constantes da petição inicial. Sob o aspecto do nexo de causalidade, cumpre esclarecer que não há nos autos qualquer elemento técnico, pericial ou documental que aponte de forma objetiva que a autora teve sua atividade econômica interrompida ou restringida por conta da lama oriunda do rompimento da barragem. A jurisprudência, ainda que reconheça o impacto generalizado do desastre na Bacia do Rio Doce, não admite a concessão de indenização sem a devida demonstração do prejuízo específico. A responsabilização objetiva não exonera o autor do dever de provar o dano concreto e sua vinculação ao evento danoso. Além disso, conforme sustentado pelas requeridas e conforme documentação pública juntada ao processo (IDs 26666848, 26666850 e 26666851), não houve desabastecimento de água potável no município de Linhares após o desastre, e as estações de tratamento de água garantiram a potabilidade dos recursos hídricos da região. Assim, a alegação de prejuízos decorrentes da contaminação da água ou de consumo de pescado impróprio, sem comprovação técnica ou médica, não pode ser acolhida. A jurisprudência majoritária dos tribunais estaduais e federais reforça a necessidade de apresentação de prontuário médico, laudos laboratoriais ou relatórios oficiais para a configuração de dano à saúde. Ademais, no que se refere à sucessão processual, há nos autos documentos que atestam a extinção da Fundação Renova e sua substituição pela Samarco Mineração S.A., conforme os termos do Acordo Judicial para Reparação Integral e Definitiva, celebrado em 25/10/2024 e homologado pelo Supremo Tribunal Federal em 06/11/2024 (ID 71357253). A cláusula 104 do referido acordo determina a extinção da Fundação, com transferência integral de direitos, ações e obrigações à Samarco, fato que confere legitimidade processual à requerida SAMARCO na presente demanda. Portanto, à luz dos elementos constantes nos autos, conclui-se que não há suporte probatório suficiente para reconhecer a ocorrência de dano indenizável, tampouco se comprovou o exercício da atividade de pesca pela autora à época dos fatos, circunstâncias que inviabilizam a procedência do pedido. O conjunto probatório limita-se a declarações unilaterais e documentos pessoais, incapazes de fundamentar o reconhecimento judicial de danos materiais. Conforme entendimento consolidado, a prova exclusivamente testemunhal (inexistente no caso) não supre a ausência de prova documental mínima, inclusive por analogia ao entendimento fixado em ações previdenciárias sobre atividade rural informal. A ausência de lastro probatório objetivo afasta a plausibilidade jurídica do pedido, não sendo possível presumir a condição de atingida da autora apenas com base em sua autodeclaração. A ausência de elementos probatórios mínimos que confirmem a afetação da atividade econômica da parte autora impede o reconhecimento do direito à indenização, como bem decidiu o Tribunal de Justiça do Espírito Santo: APELAÇÃO CÍVEL. DESASTRE AMBIENTAL. BARRAGEM DE MARIANA/MG. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INDENIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DANO. RECURSO DESPROVIDO. 1) Em razão do dano ambiental, subsiste a aplicação da responsabilidade civil objetiva, de maneira que não se debate a culpa da requerida/apelada ou a presença de alguma excludente de responsabilidade, eis que norteada pela teoria do risco integral, nos termos do previsto no art. 225, § 3º, da Constituição Federal, no art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81, e no art. 927, parágrafo único, do Código Civil. 2) Apesar de ser incontestável o dano ambiental e os prejuízos causados aos pescadores e comerciantes que dependiam economicamente do exercício de sua atividade nas áreas afetadas, o ressarcimento pretendido pela apelante demanda escorreita comprovação de que exercia a atividade pesqueira à época do desastre ambiental e que teve a sua subsistência prejudicada por ele, a fim de justificar o recebimento de indenização a ser paga pela responsável pelo evento danoso. 3) O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.374.284/MG, sob a sistemática dos recursos repetitivos, firmou entendimento de que a responsabilidade por dano ambiental exige a demonstração concreta do dano e do nexo causal, ainda que presumível o impacto ambiental. 4) A autora não apresentou provas suficientes para demonstrar o exercício da pesca comercial, tais como registros de embarcação, carteira de pescador profissional, recibos de comercialização ou declaração de associação de pescadores. Apenas relatos orais foram coligidos, sendo insuficientes para comprovar as alegações. 5) O depoimento pessoal da autora e a narrativa do informante revelam que sua pesca era predominantemente realizada em lagoas, e não em áreas diretamente impactadas pelo desastre de Mariana, afastando a presunção de prejuízo decorrente do evento. 6) A ausência de elementos probatórios mínimos que confirmem a afetação da atividade econômica da autora impede o reconhecimento do direito à indenização. 7) Apelação cível conhecida e desprovida. (TJ-ES, Data: 18/Dec/2024, Órgão julgador: 4ª Câmara Cível, Número: 5003559-31.2023.8.08.0047, Magistrado: ELIANA JUNQUEIRA MUNHOS FERREIRA, Classe: APELAÇÃO CÍVEL, Assunto: Indenização por Dano Moral) Assim, em respeito ao princípio do devido processo legal e ao ônus probatório estabelecido no art. 373, inciso I, do CPC, impõe-se a improcedência da ação. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 355, inciso I, e art. 487, inciso I, ambos do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por ELIANA BISPO ALMEIDA em face de SAMARCO MINERAÇÃO S.A. e BHP BILLITON BRASIL LTDA., diante da ausência de comprovação dos fatos constitutivos do direito alegado, notadamente a inexistência de prova documental mínima do exercício da atividade de pesca à época dos fatos e da ocorrência de dano material concreto passível de reparação. Nos termos do pedido formulado, e com fundamento nas Cláusulas 104 e 109, §3º, do Acordo de Repactuação homologado pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da PET 13157/DF, DEFIRO o requerimento da empresa SAMARCO MINERAÇÃO S.A. para que passe a figurar no polo passivo da demanda em substituição à FUNDAÇÃO RENOVA, a qual se encontra formalmente extinta por força da mencionada repactuação. Proceda-se à atualização do cadastro processual. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º do CPC. Contudo, considerando a concessão da gratuidade de justiça, a exigibilidade das verbas de sucumbência ficará suspensa, nos termos do art. 98, § 3º, do mesmo diploma legal. Ficam as partes advertidas, desde logo, de que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará à imposição da multa prevista pelo art. 1.026, § 2º do CPC. Preclusa a via impugnativa, certifique-se o trânsito em julgado e arquive-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se. Linhares/ES, data registrada no sistema. Emília Coutinho Lourenço Juíza de Direito

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Processo nº 5003948-54.2020.4.03.6106

ID: 291315641

Tribunal: TRF3 Órgão: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 5003948-54.2020.4.03.6106

Data de Disponibilização: 06/06/2025

Polo Ativo:

MARIA RITA BRAGA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JULIANA MAIARA DIAS FERES

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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 7ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003948-54.2020.4.03.6106 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: MARIA RITA BRAGA, INSTITUTO NAC… PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 7ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003948-54.2020.4.03.6106 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: MARIA RITA BRAGA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: JULIANA MAIARA DIAS FERES - SP294428-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA RITA BRAGA Advogado do(a) APELADO: JULIANA MAIARA DIAS FERES - SP294428-A OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 7ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003948-54.2020.4.03.6106 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: MARIA RITA BRAGA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: JULIANA MAIARA DIAS FERES - SP294428-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA RITA BRAGA Advogado do(a) APELADO: JULIANA MAIARA DIAS FERES - SP294428-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LUCIANA ORTIZ (RELATORA): Trata-se de apelações interpostas pelo INSS e pela Autora em face da r. sentença que julgou o pedido deduzido na inicial nos seguintes termos: “A parte autora alega que exerceu atividade profissional exposta a agentes nocivos à saúde de forma a caracterizar a especialidade laboral, nos períodos de 06/03/1997 a 19/09/2003, 27/02/1996 a 26/02/1998, 02/02/1999 a 06/08/2015 e 01/02/2019 a 10/10/2019 (DER). Consigno que o § 3º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 dispõe que a concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado. Em relação ao período de 06/03/1997 a 19/09/2003, em que a autora laborou na instituição de saúde Unimed de Catanduva Coop de Trab Médico (Hospital São Domingos), na função de “enfermeira”, no setor de enfermagem, segundo o Perfil Profissiográfico Previdenciário-PPP juntado aos autos (id 39084370 - Pág. 145), houve sua exposição habitual e permanente a agentes nocivos à saúde, tipo biológico, vírus, bactérias, sangue, secreções e materiais contagiantes. A descrição das atividades deixa claro que a parte autora, no desempenho de suas funções nos setores hospitalares, ficava exposta de modo habitual e permanente a agentes agressivos biológicos, propagados pelos pacientes atendidos. A interpretação a ser extraída da norma em evidência não é outra senão a exigência de que o segurado tenha exercido, de forma permanente e contínua, um trabalho que o expunha a condições especiais, não sendo necessária a sua exposição contínua, durante toda a jornada de trabalho, a algum agente nocivo à sua saúde ou integridade física. Ainda que, durante sua jornada diária, o trabalhador fique exposto ao agente nocivo de forma intermitente, a continuidade e permanência no desempenho da atividade já é suficiente a caracterizar sua natureza especial. Este raciocínio já foi proclamado pelo Col. STJ, conforme o precedente abaixo transcrito: "O tempo de trabalho permanente a que se refere o parágrafo 3º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91 é aquele continuado, não o eventual ou intermitente, não implicando, por óbvio, obrigatoriamente, que o trabalho, na sua jornada, seja ininterrupto sob o risco" (REsp 200400659030, Hamilton Carvalhido, STJ - Sexta Turma, DJ:21/11/2005, pg 318). Ademais, dada a natureza dos agentes aos quais a autora esteve exposta (análise de exposição qualitativa), embora os EPI’s por ela utilizados pudessem atenuar seus efeitos agressivos, não há elementos que permitam atestar que fossem suficientes a eliminar ou neutralizar a exposição aos agentes nocivos. Desse modo, reconheço como atividade especial os períodos acima anotados, com o enquadramento no código 3.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 3.0.1 do Decreto nº 3.048/99 (materiais infecto-contagiantes). De outro lado, com relação aos períodos de 27/02/1996 a 26/02/1998, 02/02/1999 a 06/08/2015 e 01/02/2019 a 10/10/2019, em que a autora laborou em diversas instituições de ensino, na função de professora de enfermagem, tenho que inexistiu contato habitual e permanente com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas ou com material contaminado. Segundo a descrição das atividades constantes dos respectivos PPP’s (id 39084370 - Págs. 41 e 146), reputo não configurada a aludida exposição de forma habitual e permanente, quando muito de forma intermitente e/ou eventual, à medida que a parte autora desempenhava tarefas ora de cunho acadêmico, ora de supervisão de estudantes em estágios e aulas práticas. As atividades desenvolvidas não estavam direta e permanentemente ligadas ao atendimento de pacientes portadores de doenças infectocontagiosas ou manuseio de material contaminado. O fato de trabalhar em ambientes inseridos no mesmo edifício em que realizada a atividade-fim não caracteriza, por si só, exposição habitual e permanente aos agentes nocivos, pois não estava a parte autora em contato direto e permanente com as atividades-fim acima descritas, tendo desenvolvido atividades de cunho eminentemente acadêmico, não havendo risco à sua saúde suficiente a ensejar a redução do tempo de serviço nos termos da legislação reguladora da matéria. Outrossim, de acordo com o extrato de vínculos empregatícios constante do CNIS (id 39084370 - Pág. 69), a parte autora trabalhou para diversos tomadores de serviços distintos, concomitantemente aos vínculos empregatícios que ora se almeja reconhecer como especial, circunstância ordinariamente observada na rotina laborativa dos profissionais de saúde, o que reforça a conclusão de que a autora, enquanto professora, esteve exposta, de forma intermitente e/ou eventual, aos agentes de riscos biológicos indicados nos respectivos PPP’s, já que não exercia, perante seus empregadores fixos, uma jornada regular e integral de trabalho. Tal circunstância impede o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas nos períodos de 27/02/1996 a 26/02/1998, 02/02/1999 a 06/08/2015 e 01/02/2019 a 10/10/2019. Assim, no tocante aos requisitos do benefício de aposentadoria especial, observo que a autora não implementou o tempo mínimo de 25 anos de tempo especial, necessários à obtenção do benefício. Entretanto, no tocante aos requisitos do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, observo que o acréscimo de tempo decorrente da conversão do tempo especial em comum, em relação ao período ora reconhecido de 06/03/1997 a 19/09/2003, quando somado aos períodos já considerados administrativamente (id 39084370 - Pág. 116/118 e 190/192), permite à autora o cômputo de tempo contributivo superior a 30 anos na data do requerimento administrativo em 10/10/2019, sendo desnecessária a elaboração de planilha de cálculos para se atingir tal conclusão. Assim, faz jus a autora ao acolhimento do pedido subsidiário de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER em 10/10/2019. DISPOSITIVO Pelo exposto, resolvo o mérito e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido deduzido por MARIA RITA BRAGA, nos termos do artigo 487, incisos I, do CPC, para condenar o INSS a averbar, inclusive no CNIS, o período urbano de 06/03/1997 a 19/09/2003, como laborado em condições especiais, para fins de aposentação, e conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição NB 192.003.176-3, desde a DER, em 10/10/2019, cujas prestações em atraso serão corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal vigente à data do cálculo de liquidação. Considerando que a parte autora decaiu de parte mínima do pedido (art. 86, par. único do CPC), condeno a parte ré ao reembolso de eventuais despesas processuais e ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo no percentual mínimo do § 3º do art. 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação/proveito econômico obtido pela parte autora, de modo a possibilitar sua eventual majoração, nos termos do § 11 do mesmo dispositivo, e observado, ainda, seu § 5º, por ocasião da apuração do montante a ser pago. O valor da condenação fica limitado ao valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula nº 111 do STJ). Sentença não sujeita ao reexame necessário (art. 496, §3º, I, do NCPC).” Nas razões recursais o INSS argui, preliminarmente, o sobrestamento do processo com base no Tema 998/STJ e que a decisão seja submetida ao reexame necessário. No mérito, pugna pela reforma da sentença para excluir a especialidade do período de 06/03/1997 a 19/09/2003, pois a parte não comprova que laborou exposta a agente nocivo, uma vez que o profissional indicado pelo PPP como sendo o responsável técnico pelos registros ambientais não possui registro no CRM ou no CREA / não é médico do trabalho nem engenheiro de segurança do trabalho, mas sim técnico de segurança do trabalho, bem como não é possível computar como especial período em que a parte esteve afastada do trabalho, em gozo de benefício por incapacidade e, por isso, a parte não tem direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Se mantida a sentença, pleiteia a observância da prescrição quinquenal; seja a parte intimada a firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450, de 03/04/2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no artigo 24, §§ 1º e 2º da EC 103/2019; a fixação dos índices de correção monetária conforme Tema 905/STJ, até 08/12/2021; a fixação dos juros moratórios nos termos do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, alterado pela Lei nº 11.960/09, até 08/12/2021; a incidência da taxa SELIC a partir 09/12/2021, em substituição às taxas de juros e correção monetária, nos termos determinados pelo artigo 3º da EC 113/2021; a redução do percentual de honorários advocatícios para o patamar mínimo, com a limitação da verba honorária ao comando do Súmula 111/STJ; a declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias. Prequestiona a matéria para fins recursais. Por outro lado, no seu recurso de apelação a parte autora pleiteia que os períodos em que laborou como professor de 27/02/1996 a 26/02/1998, 02/02/1999 a 06/08/2015 e de 01/02/2019 a 10/10/2019 também sejam reconhecidos como de atividade especial e, por conseguinte, a concessão do benefício de aposentadoria especial desde a DER (10/10/2019). Após intimação das partes para apresentarem as contrarrazões aos recursos os autos foram remetidos a esta E. Corte. Foi deferida a justiça gratuita (id 261879384). É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 7ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003948-54.2020.4.03.6106 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: MARIA RITA BRAGA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: JULIANA MAIARA DIAS FERES - SP294428-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, MARIA RITA BRAGA Advogado do(a) APELADO: JULIANA MAIARA DIAS FERES - SP294428-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LUCIANA ORTIZ (RELATORA): Recebo as apelações interpostas sob a égide do Código de Processo Civil/2015 e, em razão de suas regularidades formais, possível suas apreciações, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual. DO SOBRESTAMENTO DO FEITO – TEMA 998 DO STJ Nada a prover quanto ao pedido do INSS, uma vez que a tese firmada no Tema 998 do STJ transitou em julgado em 15/02/2022. DO REEXAME NECESSÁRIO A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Novo Código de Processo Civil, o qual afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos (artigo 496, I c.c. § 3º, I, do CPC/2015). In casu, considerando os elementos dos autos - o INSS foi condenado a averbar período considerado como atividade especial e conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição em favor da parte autora desde a DER (10/10/2019), bem como ao pagamento das prestações atrasadas, acrescidas de correção monetária e juros de mora, o montante da condenação não excederá a 1.000 (mil) salários-mínimos, ainda que o valor da aposentadoria seja igual ao teto previdenciário. Logo, a r. sentença não está sujeita ao reexame necessário. Cumpre esclarecer que o sobrestamento determinado pelo E. Superior Tribunal de Justiça, ao afetar os Recursos Especiais nºs. 1.882.236/RS, 1.893.709/RS e 1.894.666/SC, que tratam do tema, ao rito previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015 (Tema 1.081/STJ), se restringe apenas aos recursos especiais e agravos em recurso especial. DO ENQUADRAMENTO DAS ATIVIDADES ESPECIAIS O artigo 201, §1°, da CF/88, prevê um tratamento diferenciado aos segurados que exerçam atividades com exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes. O trabalho em condições especiais é objeto, ainda, dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 e dos artigos 64 a 70 do Decreto nº 3.048/99 (RPS – Regulamento da Previdência Social). A especialidade fica caracterizada quando constatada a exposição do segurado a agentes nocivos acima dos limites de tolerância (critério quantitativo), podendo tal avaliação ser também qualitativa. O Anexo IV do RPS traz um rol dos agentes nocivos, bem assim o respectivo tempo de exposição (15, 20 ou 25 anos) após o qual os segurados passam a fazer jus à aposentadoria especial. Desde 29/04/1995, data da publicação da Lei nº 9.032/95, exige-se a efetiva exposição do segurado a agentes nocivos. Até então, reconhecia-se a especialidade do labor de acordo com a categoria profissional, presumindo-se que os trabalhadores de determinadas categorias se expunham a ambiente nocivo. Nos termos da legislação de regência, a exposição do segurado a agentes nocivos há de ser permanente, não ocasional nem intermitente, o que, entretanto, não significa que o segurado tenha que se expor durante toda a sua jornada à nocividade, mas sim que a exposição aos agentes seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço (Decreto nº 8.213/2013). Constando do PPP que o segurado ficava exposto a agente nocivo, deve-se concluir que tal exposição era suficiente à configuração da especialidade, nos termos do artigo 65do RPS, não se exigindo menção expressa, no formulário, nesse sentido, já que no modelo de PPP concebido pelo INSS não existe campo específico para tanto. Logo, não prospera a alegação de impossibilidade de se reconhecer a especialidade do labor pelo fato de o PPP não consignar expressamente que a exposição era habitual, consoante jurisprudência desta C. Turma: APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1773938 - 0008160-27.2011.4.03.6105, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, julgado em 12/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/03/2018. As condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP, SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT), sem prejuízos de outros meios de prova, sendo de se frisar que apenas a partir da edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, tornou-se exigível a apresentação de laudo técnico a corroborar as informações constantes nos formulários, salvo para o agente ruído e calor, que sempre exigiu laudo técnico. A partir de 01/01/2004, é obrigatório o fornecimento aos segurados expostos a agentes nocivos do PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que retrata o histórico laboral do segurado, evidenciando os riscos do respectivo ambiente de trabalho. Infere-se do artigo 58 da Lei nº 8.213/91 que (i) a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita por meio do PPP; (ii) o PPP deve ser emitido pela empresa, na forma estabelecida pelo INSS, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho; (iii) o empregador deve manter atualizado o PPP abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a cópia desse documento; (iv) a empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista em lei. Considerando que a empresa empregadora deve garantir a veracidade das declarações prestadas nos formulários de informações e laudos periciais (artigo 133 da Lei nº 8.213/91 e artigo 299 do Código Penal) e que cabe ao Poder Público fiscalizar o empregador no que tange à elaboração, manutenção e atualização do PPP, presume-se que as informações constantes do PPP são verdadeiras, não sendo razoável nem proporcional prejudicar o trabalhador por eventual irregularidade formal de referido formulário, seja porque ele não é responsável pela elaboração do documento, seja porque cabe ao Poder Público fiscalizar a elaboração do PPP pelas empresas. O Egrégio STJ fixou tese repetitiva no sentido acima expendido no julgamento da Petição nº 10.262/RS, de 08/02/2017. A apresentação do PPP dispensa a apresentação do laudo que o subsidia. E o fato de esse laudo não ser contemporâneo ao labor não invalida as informações constantes do PPP a respeito do tempo de trabalho dedicado em atividade de natureza especial, primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços. (Precedentes desta Corte: AC 0012334- 39.2011.4.03.6183, 8ª Turma, Desembargador Federal Luiz Stefanini, DE 19/03/2018; AC/ReO 0027585-63.2013.4.03.6301, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento e AC/ReO 0012008- 74.2014.4.03.6183, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Fausto de Sanctis, DE 17/10/2017) e Súmula nº 68, da Turma de Uniformização de Jurisprudência. O E. STF, no julgamento do ARE 664335, assentou o entendimento de que o fornecimento de EPI ao trabalhador afasta a especialidade do labor desde que tal equipamento se mostre efetivamente capaz de neutralizar ou eliminar a nocividade do ambiente laborativo. Assim, o simples fato de o PPP atestar a eficácia do EPI não é suficiente para afastar a especialidade do labor, pois, conforme se infere do Anexo XV, da Instrução Normativa 11/2006, do INSS - o campo 15.7 do PPP deve ser preenchido com “S - Sim; N - Não, considerando se houve ou não a atenuação, com base no informado nos itens 15.2 a 15.5, observado o disposto na NR-06 do MET, observada a observância: [...]”, a eficácia atestada no PPP diz respeito à aptidão do EPI para atenuar - e não neutralizar – a nocividade do agente. Logo, não se pode, com base nisso, afastar a especialidade do labor, até porque, nos termos do artigo 264, § 5º, do RPS; “sempre que julgar necessário, o INSS poderá solicitar documentos para confirmar ou complementar as informações contidas no PPP, de acordo com § 7º do artigo 68 e inciso III do artigo 225, ambos do RPS” (Precedente: TRF 3ª Região, NONA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2228745 - 0001993-28.2015.4.03.6113, Rel. JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, julgado em 07/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/03/2018) Não nos escapa a análise, em complemento às observações aqui lançadas, que a experiência vivida mundialmente a partir de 2020, com a pandemia por COVID-19, com a adoção de medidas preventivas, sanitárias e pessoais, corrobora e lança luzes sobre a natureza meramente atenuadora dos EPI’s na prevenção de doenças, inclusive as ocupacionais. Diante das inúmeras alterações dos quadros de agentes nocivos, a jurisprudência consolidou o entendimento no sentido de que deve se aplicar, no particular, o princípio tempus regit actum, reconhecendo-se como especiais os tempos de trabalho se na época respectiva a legislação de regência os reputava como tal. Já quanto à conversão do tempo de trabalho, a lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço (Tese Repetitiva 546, REsp 1310034/PR). O artigo 57, §5°, da Lei nº 8.213/91, admitia a conversão de tempo de atividade especial para comum, nos termos da tabela do artigo 70 do Decreto nº 3.048/99. Todavia, a conversão do tempo especial em comum só é possível até 13/11/2019, pois a EC 103/2019 (artigos 10, §3° e 25, §2°) vedou a conversão para períodos posteriores a tal data. Comprovada a exposição do segurado a agentes nocivos, há que se reconhecer a respectiva especialidade, ainda que não tenham sido recolhidas as contribuições previdenciárias devidas em decorrência de tal fato gerador, não havendo que se falar, nesse caso, em ausência de prévia fonte de custeio (artigo 195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§ 6° e 7°, da Lei nº 8.213/91) nem em ausência de registro do código da GFIP no formulário, até porque o não recolhimento da respectiva contribuição não pode ser atribuído ao trabalhador, mas sim à inércia estatal no exercício do seu poder de polícia. No Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, em sede de Repercussão Geral, assentou-se que a ausência de prévia fonte de custeio não prejudica o direito dos segurados à aposentadoria especial, em razão de não haver ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, eis que o artigo 195, § 5º, da Constituição Federal (que veda a criação, majoração ou a extensão de benefícios previdenciários sem a correspondente fonte de custeio), contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se trata de benefício criado diretamente pela própria constituição, como é o caso da aposentadoria especial. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS BIOLÓGICOS (VÍRUS E BACTÉRIAS) Como visto, até 28/04/1995, o enquadramento do labor especial poderia ser feito com base na categoria profissional. Após essa data, o segurado passou a ter que provar, por meio de formulário específico, a exposição a agente nocivo, no caso biológico, previsto no item 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos nºs. 2.172/97 e 3.048/99. As alíneas do item 3.0.1, do Anexo IV dos Decretos nºs. 2.172/97 e 3.048/99 preveem a especialidade pela exposição (de 25 anos para a concessão da aposentadoria especial) dos “microorganismos e parasitas infecciosos vivos e suas toxinas”, nas seguintes atividades: “a) trabalhos em estabelecimentos de saúde em contato com pacientes portadores de doenças infecto-contagiosas ou com manuseio de materiais contaminados; b) trabalhos com animais infectados para tratamento ou para o preparo de soro, vacinas e outros produtos; c) trabalhos em laboratórios de autópsia, de anatomia e anátomo-histologia; d) trabalho de exumação de corpos e manipulação de resíduos de animais deteriorados; e) trabalhos em galerias, fossas e tanques de esgoto; f) esvaziamento de biodigestores; g) coleta e industrialização do lixo”. NO CASO CONCRETO Trata-se de apelações interpostas pelo INSS e pelo Autor em face da r. sentença que reconheceu como especial o período de 06/03/1997 a 19/09/2003 e concedeu o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER (10/10/2019). Enquanto o INSS pleiteia a total improcedência do pedido, o Autor visa que os períodos de 27/02/1996 a 26/02/1998, 02/02/1999 a 06/08/2015 e de 01/02/2019 a 10/10/2019 também sejam reconhecidos como de atividade especial e, por conseguinte, a concessão de aposentadoria especial desde a DER. Consta nos autos que os períodos de 04/03/1991 a 07/04/1994, de 20/03/1995 a 28/04/1995, 29/04/1995 a 10/03/1996, 02/05/1994 a 28/04/1995 e 29/04/1995 a 05/03/1997 já foram computados como especiais na via administrativa (id 261879027 – págs. 190/182). Passamos à análise dos períodos controversos à luz da documentação dos autos. - Período de 06/03/1997 a 19/09/2003 – função de enfermeira junto ao Hospital São Domingos Para comprovar as condições de trabalho no referido período a autora juntou no procedimento administrativo e nestes autos o PPP em id 261879027 (pág. 182), devidamente assinado e com indicação dos responsáveis técnicos pelas medições. Declara o documento que no desempenho de suas funções como enfermeira a segurada esteve exposta a agentes biológicos. Entretanto, diferentemente do que determina o artigo 58, §1°, da Lei nº 8.213/91, o responsável pelos registros ambientais que consta no referido PPP para comprovar as condições de trabalho da autora não é médico ou engenheiro do trabalho, mas sim Técnico de Segurança do Trabalho. Outrossim, o responsável técnico pela monitoração biológica, Jaime João Jorge, inscrito no CRM/SP sob o nº 35593, atua na área de anestesiologia e não é médico do trabalho. Nessa linha também já decidiu este Colenda Tribunal: AGRAVO INTERNO - EPI EFICAZ NÃO AFASTA A ESPECIALIDADE DO TRABALHO - A AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE RESPONSÁVEL TÉCNICO NO PPP TORNA ESSE DOCUMENTO INCAPAZ DE PROVAR AS CONDIÇÕES DE TRABALHO - APLICAÇÃO DO TEMA 1083 DO STJ - PERÍODOS ESPECIAIS COMPROVADOS - AGRAVO INTERNO IMPROVIDO (...) 3 – (...) Impõe o artigo 58, parágrafo primeiro, da Lei 8.213/91 que tal documento deve ser elaborado com base em Laudo Técnico expedido por médico do trabalho ou por engenheiro de segurança do trabalho, não sendo aceito o PPP que tenha por base LTCAT assinado por Técnico em Segurança do Trabalho, por ausência de qualificação técnica legalmente exigida. (...) (TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5007636-36.2020.4.03.6102, Rel. Desembargador Federal LOUISE VILELA LEITE FILGUEIRAS, julgado em 20/02/2024, Intimação via sistema DATA: 21/02/2024) PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. NÃO CABIMENTO. ATIVIDADE ESPECIAL PARCIALMENTE COMPROVADA. RUÍDO. COISA JULGADA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA IMPROVIDA. (...) 2. Da análise dos documentos juntados aos autos, verifica-se que os períodos de 05/11/1998 a 25/07/2000, de 03/12/2001 a 08/08/2003, e de 03/01/2008 a 07/05/2008 não podem ser reconhecidos como especiais, haja vista que os PPPs juntados aos autos não possuem responsável pelos registros ambientais que ateste a efetiva exposição a agentes insalubres. Por outro lado, o PPP referente ao período de 02/05/2013 a 03/06/2016 foi preenchido com base em Laudo Técnico Individual elaborado por Técnico em Segurança do Trabalho, e não Engenheiro de Segurança do Trabalho, de forma que os períodos pleiteados pela parte autora em sede de apelação não poderão ser conhecidos como especiais. (...) (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5006197-43.2017.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 20/12/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/01/2020). Dessa forma, como o PPP apresentado não é idôneo para comprovar as condições de trabalho da autora, não é possível reconhecer a natureza especial do período de 06/03/1997 a 19/09/2003. - Períodos de 27/02/1996 a 26/02/1998 e de 02/02/1999 a 06/08/2015 – cargo de professor junto à ETEC Elias Nechar - Período de 01/02/2019 a 10/10/2019 – cargo de docente nível II junto à Fundação Pe. Albino -FIPA-Enfermagem Concernente a estes intervalos a segurada apresentou no procedimento administrativo e nestes autos os seguintes documentos para comprovar as condições de trabalho: - PPP emitido em 27/08/2019, devidamente assinado e com indicação dos responsáveis técnicos pelas medições (id 261879027 - pág. 41) – consta que a segurada laborou como docente de 01/02/2019 a 27/08/2019 exposta aos agentes biológicos vírus e bactérias no desempenho das suas funções que consistiam em: , De acordo com a descrição das atividades, resta comprovado que nos períodos de 27/02/1996 a 26/02/1998 e de 02/02/1999 a 06/08/2015, durante a ministração de aulas práticas junto aos alunos, a segurada se submeteu a agentes biológicos consistentes em vírus e bactérias, em virtude de contato permanente com pacientes ou materiais infectocontagiante em ambientes como laboratórios, hospitais, postos de saúde e asilos. No que diz respeito ao período de 01/02/2019 a 10/10/2019 a parte autora não logrou reunir elementos comprobatórios a patentear a especialidade perseguida no ofício de docente, de modo que esse intervalo não pode ser reconhecido como especial. HABITUALIDADE E EPI INEFICAZ Constando do PPP que o segurado ficava exposto a agente nocivo, seja pela simples presença do agente no ambiente, ou porque estava acima do limite de tolerância, deve-se concluir que tal exposição era, nos termos do artigo 65 do RPS - Regulamento da Previdência Social, habitual, não ocasional nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, não se exigindo, portanto, que o trabalhador se exponha durante todo o período da sua jornada ao agente nocivo. O fornecimento de EPI não é suficiente a afastar o malefício do ambiente de trabalho quando se tratar de agente nocivo aferido de forma exclusivamente qualitativa, tendo em vista a própria natureza deste, cuja ofensividade decorre da sua simples presença no ambiente de trabalho, não havendo limites de tolerância ou doses como parâmetro configurador da insalubridade, tampouco como se divisar que o EPI ou EPC possa neutralizá-la. Isso, no mais das vezes, é reconhecido pelo próprio INSS. No caso dos autos, embora o PPP consigne que fora fornecido EPI eficaz a atenuar o efeito nocivo do agente, não há provas de que tal EPI era capaz de neutralizar a insalubridade a que o segurado estava exposto. Ademais, na hipótese, a segurada estava exposta a agente biológico, que por ser qualitativo, não tem a sua nocividade neutralizada pelo uso de EPI. PERÍODOS EM AUXÍLIO-DOENÇA Enfatizo, ademais, que os períodos nos quais a segurada esteve em gozo de benefício por incapacidade, devem ser enquadrados como especiais, eis que a Primeira Seção do C. STJ fixou a tese de que o segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença – seja acidentário ou previdenciário –, faz jus ao cômputo desse período como especial (Tema nº 998). Diante do conjunto probatório carreado aos autos pela autora, o reconhecimento das atividades nos períodos de 27/02/1996 a 26/02/1998 e de 02/02/1999 a 06/08/2015 é de rigor. APOSENTADORIA ESPECIAL Nesse cenário, em 10/10/2019 (DER), a segurada não tem direito à aposentadoria especial porque não cumpre o tempo mínimo especial de 25 anos (faltava 1 ano, 6 meses e 26 dias), conforme planilha abaixo. QUADRO CONTRIBUTIVO Data de Nascimento 16/07/1968 Sexo Feminino DER 10/10/2019 Tempo especial Nº Nome / Anotações Início Fim Fator Tempo Carência 1 - 04/03/1991 07/04/1994 Especial 25 anos 3 anos, 1 meses e 4 dias 38 2 - 02/05/1994 28/04/1995 Especial 25 anos 0 anos, 11 meses e 27 dias 12 3 - 20/03/1995 28/04/1995 Especial 25 anos 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) 0 4 - 29/04/1995 10/03/1996 Especial 25 anos 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) 0 5 - 29/04/1995 05/03/1997 Especial 25 anos 1 anos, 10 meses e 7 dias 23 6 - 27/02/1996 26/02/1998 Especial 25 anos 0 anos, 11 meses e 21 dias (Ajustada concomitância) 11 8 - 02/02/1999 06/08/2015 Especial 25 anos 16 anos, 6 meses e 5 dias 199 Tempo comum Nº Nome / Anotações Início Fim Fator Tempo Carência 7 - 06/03/1997 19/09/2003 1.00 0 anos, 11 meses e 5 dias (Ajustada concomitância) 11 9 - 04/08/2013 12/06/2017 1.00 1 anos, 10 meses e 6 dias (Ajustada concomitância) 22 10 - 01/02/2019 10/10/2019 1.00 0 anos, 8 meses e 10 dias 9 Marco Temporal Tempo especial Tempo total (especial + comum s/ conversão) para fins de pontos Carência Idade Pontos (art. 21 da EC nº 103/19) Até a DER (10/10/2019) 23 anos, 5 meses e 4 dias Inaplicável 325 51 anos, 2 meses e 24 dias Inaplicável APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO Analisando o pedido subsidiário, verifica-se que somados os períodos urbanos comuns anotados na CTPS e no CNIS aos reconhecidos como especiais na via administrativa e nesta demanda, resulta até 10/10/2019 (DER) num total de tempo de serviço de 31 anos e 7 meses, conforme planilha abaixo e, nessas condições, a segurada tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição, como decidido na sentença recorrida. CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO TEMPO DE SERVIÇO COMUM (com conversões) Data de Nascimento 16/07/1968 Sexo Feminino DER 10/10/2019 Nº Nome / Anotações Início Fim Fator Tempo Carência 1 - 04/03/1991 07/04/1994 1.20 Especial 3 anos, 1 meses e 4 dias + 0 anos, 7 meses e 12 dias = 3 anos, 8 meses e 16 dias 38 2 - 02/05/1994 28/04/1995 1.20 Especial 0 anos, 11 meses e 27 dias + 0 anos, 2 meses e 11 dias = 1 anos, 2 meses e 8 dias 12 3 - 20/03/1995 28/04/1995 1.20 Especial 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) 0 4 - 29/04/1995 10/03/1996 1.20 Especial 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) 0 5 - 29/04/1995 05/03/1997 1.20 Especial 1 anos, 10 meses e 7 dias + 0 anos, 4 meses e 13 dias = 2 anos, 2 meses e 20 dias 23 6 - 27/02/1996 26/02/1998 1.20 Especial 0 anos, 11 meses e 21 dias + 0 anos, 2 meses e 10 dias = 1 anos, 2 meses e 1 dias (Ajustada concomitância) 11 7 - 06/03/1997 19/09/2003 1.00 0 anos, 11 meses e 5 dias (Ajustada concomitância) 11 8 - 02/02/1999 06/08/2015 1.20 Especial 16 anos, 6 meses e 5 dias + 3 anos, 3 meses e 19 dias = 19 anos, 9 meses e 24 dias 199 9 - 04/08/2013 12/06/2017 1.00 1 anos, 10 meses e 6 dias (Ajustada concomitância) 22 10 - 01/02/2019 10/10/2019 1.00 0 anos, 8 meses e 10 dias 9 Marco Temporal Tempo de contribuição Carência Idade Pontos (Lei 13.183/2015) Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998) 9 anos, 1 mês e 5 dias 94 30 anos, 5 meses e 0 dias inaplicável Pedágio (EC 20/98) 6 anos, 4 meses e 10 dias Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999) 10 anos, 2 meses e 16 dias 105 31 anos, 4 meses e 12 dias inaplicável Até a DER (10/10/2019) 31 anos, 7 meses e 0 dias 325 51 anos, 2 meses e 24 dias 82.8167 Não há que se falar na ocorrência de prescrição, pois a demanda foi ajuizada dentro do prazo quinquenal do artigo 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91. O requerimento para que a parte firme autodeclaração para os pedidos de aposentadorias deve ser rejeitado, seja porque tal exigência, prevista apenas em norma administrativa (Portaria INSS n° 450/2020), não se aplica na esfera judicial, mas apenas no âmbito administrativo; seja porque os requisitos para a concessão do benefício sub judice foram preenchidos antes do advento da EC, de sorte que as disposições desta não se lhes aplica. Deverão ser descontados do valor da condenação outros benefícios inacumuláveis ou pagos administrativamente. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, revendo posicionamento adotado anteriormente, devem ser aplicados os índices e critérios adotados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução. Vale ressaltar que o referido manual foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual. Considerando que a sentença determinou a aplicação dos referidos critérios de juros de mora e correção monetária, deve ser mantida nesta parte. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Vencido o INSS em maior parte, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos no percentual mínimo incidente sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do E. STJ, mesmo porque moderadamente arbitrados pela decisão apelada. HONORÁRIOS RECURSAIS Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, § 11, como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os limites estabelecidos na lei. Assim, provido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente, descabida, no caso, a sua condenação em honorários recursais, CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS No que se refere às custas processuais, no âmbito da Justiça Federal, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto no artigo 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96. Tal isenção, decorrente de lei, não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso, tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora. Entretanto, cabe ao INSS o reembolso das despesas processuais comprovadas, incluídos os honorários periciais. PREQUESTIONAMENTO Relativamente ao prequestionamento de matéria ofensiva a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais, tendo sido o recurso apreciado em todos os seus termos, nada há que ser discutido ou acrescentado aos autos, CONCLUSÃO Ante o exposto, REJEITO a matéria preliminar e, no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação do INSS para excluir a especialidade do período de 06/03/1997 a 19/09/2003 e DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação da Autora para reconhecer como especiais os períodos de 27/02/1996 a 26/02/1998 e de 02/02/1999 a 06/08/2015, nos termos expendidos no voto. É como voto. VOTO RETIFICADOR - COMPLEMENTAR A EXCELENTÍSSIMA SENHORA JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LUCIANA ORTIZ (RELATORA): Em 14 de maio de 2024, ao apreciar as apelações interpostas pelo autor e pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra respeitável sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos, no sentido de reconhecer a averbação de atividade especial no período de 06/03/1997 a 19/09/2003 e concedeu a aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER, proferi voto com a seguinte conclusão: "Ante o exposto, REJEITO a matéria preliminar e, no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação do INSS para excluir a especialidade do período de 06/03/1997 a 19/09/2003 e DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação da Autora para reconhecer como especiais os períodos de 27/02/1996 a 26/02/1998 e de 02/02/1999 a 06/08/2015, nos termos expendidos no voto. É como voto." Na ocasião, o eminente Desembargador Federal Marcelo Vieira apresentou judiciosa declaração de voto, divergindo parcialmente no tocante ao parcial provimento da apelação do INSS, no que pertine ao reconhecimento da atividade especial do período de 06/03/1997 a 19/09/2003. Em seu brilhante voto, o eminente Desembargador entende que restou demonstrada a regularidade da comprovação da atividade especial, de acordo com a legislação previdenciária, encontrando-se o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) assinado e datado, bem como preenchido com descrição das funções exercidas e indicação do responsável pelos registros ambientais e biológicos. Considerando os bem-lançados fundamentos do eminente Desembargador, aliados à peculiaridade do caso posto em discussão, adiro à divergência lançada. Nesse passo, considero que se trata de caso que guarda peculiaridade na casuística, que merece ser sopesada à luz da profissiografia apresentada. Trata-se de hipótese de autora, ocupando o cargo de enfermeira, sujeita a condições agressivas à saúde, consistente em exposição a agentes de natureza biológica, cuja monitoração biológica restou respaldada por médico, devidamente inscrito no CRM. Está-se diante de caso de enfermeira que laborava em hospital - Unimed de Catanduva Cooperativa de Trabalho Médico (Hospital São Domingos) -, hipótese que, desde que guardadas as atividades esperadas e normais da função, este Colegiado reiterada e unissonamente reconhece a nocividade do labor. Em outras palavras, não se trata de hipótese de função limiar, cuja descrição da atividade deixa margem de dúvida a ponto de suscitar no julgador incerteza. Ao reverso, a leitura da atividade no PPP descreve com clareza o cotidiano laboral com atendimento direto a pacientes e exposição a risco biológico de maneira habitual e permanente, o que confere a certeza do labor nocente. Por conseguinte, afigura-se adequada a manutenção do reconhecimento do trabalho especial atinente ao lapso temporal de 06/03/1997 a 19/09/2003. APOSENTADORIA ESPECIAL Computados os períodos de atividade especial, em 10/10/2019, a autora não tem direito ao benefício de aposentadoria especial de que trata a Lei nº 8.213, art. 57, pois não cumpriu o requisito tempo especial (somou 23 anos, 5 meses e 7 dias, quando o mínimo é 25 anos), conforme planilha abaixo: APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO Computados os intervalos incontroversos de labor comum e especial, além daqueles judicialmente reconhecidos, em 10/10/2019, a autora tem direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, com fundamento na EC 20, art. 9º, pois (i) cumpriu o requisito tempo comum, com 33 anos, 2 meses e 17 dias, para o mínimo de 30 anos; (ii) cumpriu o requisito carência, com 344 meses, para o mínimo de 180 meses, conforme planilha que segue: DO TERMO INICIAL Mantido o termo inicial dos efeitos financeiros do benefício na DER, tendo em vista que a documentação necessária ao reconhecimento do direito ao benefício foi oportunamente apresentada no âmbito administrativo, de modo que a situação dos autos não se amolda à questão debatida no C. STJ no tema 1.124. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, revendo posicionamento adotado anteriormente, devem ser aplicados os índices e critérios adotados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução. Vale ressaltar que o referido manual foi instituído pelo Conselho da Justiça Federal com o objetivo de unificar os critérios de cálculo a serem aplicados a todos os processos sob sua jurisdição, na fase de execução, e seus parâmetros são estabelecidos com base na legislação vigente e na jurisprudência dominante, por meio de Resolução, devendo ser observado, sem ofensa à coisa julgada, a versão mais atualizada do manual. Considerando que a sentença determinou a aplicação dos referidos critérios de juros de mora e correção monetária, deve ser mantida nesta parte. HONORÁRIOS RECURSAIS Desprovido o apelo do INSS interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados para 12%, nos termos do artigo 85, parágrafo 11, do CPC/2015. CONCLUSÃO Ante o exposto, apresento VOTO COMPLEMENTAR RETIFICADOR, a fim de, aderindo aos termos da bem lançada divergência parcial, constante da declaração de voto do e. Desembargador Federal MARCELO VIEIRA negar provimento à apelação do INSS, mantida a rejeição da preliminar arguida e o parcial provimento da apelação do autor, nos termos ora expendidos. É O VOTO. DECLARAÇÃO DE VOTO O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA: Trata-se de apelações interpostas pelas partes em face de sentença que julgou parcialmente procedente os pedidos no sentido de reconhecer a averbação de atividade especial no período de 06/03/97 a 19/09/03 e conceder a aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER. Levadas a julgamento na presente sessão de 14/05/2024, a E. Relatora rejeitou a matéria preliminar e, no mérito, deu parcial provimento à apelação do INSS para excluir a especialidade do período de 06/03/97 a 19/09/03 e deu parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer como especiais os períodos de 27/02/96 a 26/02/98 e de 02/02/99 a 06/08/15. De início, acompanho a relatora quanto a rejeição da matéria preliminar e quanto ao parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer como especiais os períodos de 27/02/96 a 26/02/98 e de 02/02/99 a 06/08/15. No entanto, com a devida vênia, divirjo parcialmente da E. Relatora para negar provimento à apelação do INSS no pertinente ao reconhecimento da atividade especial co período de 06/03/97 a 19/09/03. A e. Relatora houve por bem afastar a especialidade nos seguintes termos: “Passamos à análise dos períodos controversos à luz da documentação dos autos. - Período de 06/03/1997 a 19/09/2003 – função de enfermeira junto ao Hospital São Domingos Para comprovar as condições de trabalho no referido período a autora juntou no procedimento administrativo e nestes autos o PPP em id 261879027 (pág. 182), devidamente assinado e com indicação dos responsáveis técnicos pelas medições. Declara o documento que no desempenho de suas funções como enfermeira a segurada esteve exposta a agentes biológicos. Entretanto, diferentemente do que determina o artigo 58, §1°, da Lei nº 8.213/91, o responsável pelos registros ambientais que consta no referido PPP para comprovar as condições de trabalho da autora não é médico ou engenheiro do trabalho, mas sim Técnico de Segurança do Trabalho. Outrossim, o responsável técnico pela monitoração biológica, Jaime João Jorge, inscrito no CRM/SP sob o nº 35593, atua na área de anestesiologia e não é médico do trabalho;”. Em que pesem os argumentos do INSS, verifica-se que o documento (PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário - ID 261879027 p. 182/183),) comprobatório da alegada especialidade das atividades exercidas, demonstra regularidade com a legislação previdenciária, encontrando-se assinado e datado, bem como preenchido com descrição das funções exercidas e indicação do responsável pelos registros ambientais e biológicos. O Técnico de Segurança no Trabalho é um dos profissionais habilitados ao preenchimento das informações de registro ambiental, nos termos do art. 264, §4º, da Instrução Normativa nº 77/2015. Nesse sentido, deve ser mantida a r. sentença. Ante o exposto, acompanho a E. Relatora quanto a rejeição da matéria preliminar e quanto ao parcial provimento à apelação da parte autora mas, com a devida vênia, divirjo quanto ao afastamento do período de 06/03/097 a 19/09/03, para manter a sentença quanto ao ponto, negando provimento à apelação do INSS. É como voto E M E N T A DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. DOCÊNCIA EM AMBIENTES INSALUBRES. EPI INEFICAZ. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL DE AMBAS AS APELAÇÕES. I. CASO EM EXAME Apelações cíveis interpostas pelo INSS e pela segurada contra sentença que reconheceu como especial o período de 06/03/1997 a 19/09/2003 e concedeu o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a DER (10/10/2019). O INSS pleiteia a improcedência do pedido, ao passo que a autora busca o reconhecimento de outros períodos como de atividade especial, com a concessão de aposentadoria especial desde a mesma data. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há cinco questões em discussão: (i) definir se o período de 06/03/1997 a 19/09/2003 pode ser reconhecido como especial diante da qualificação do responsável técnico no PPP; (ii) verificar a especialidade dos períodos em que a segurada atuou como docente com exposição a agentes biológicos; (iii) analisar se o uso de EPI afasta a especialidade das atividades exercidas; (iv) determinar se os períodos de auxílio-doença podem ser computados como tempo especial; e (v) definir o direito ao benefício de aposentadoria especial ou, alternativamente, à aposentadoria por tempo de contribuição. III. RAZÕES DE DECIDIR O período de 06/03/1997 a 19/09/2003 não pode ser reconhecido como especial, pois o PPP apresentado indica como responsável técnico pelos registros ambientais profissional não habilitado legalmente para tanto (Técnico de Segurança do Trabalho), em desacordo com o art. 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91. Os períodos de 27/02/1996 a 26/02/1998 e de 02/02/1999 a 06/08/2015 devem ser reconhecidos como especiais, tendo em vista a exposição habitual e permanente da segurada a agentes biológicos durante a ministração de aulas práticas em ambientes como laboratórios e instituições de saúde. A exposição a agentes biológicos, por ser qualitativa, não é neutralizada pelo uso de EPI, não havendo comprovação de sua efetiva eficácia no caso concreto. O período em gozo de auxílio-doença é computável como tempo especial, conforme tese fixada no Tema 998 do STJ. A segurada não preenche os requisitos para a aposentadoria especial na DER, mas faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição, computados os períodos comuns e especiais reconhecidos. A sentença está isenta de reexame necessário por força do art. 496, § 3º, I, do CPC/2015, diante do valor da condenação inferior a 1.000 salários-mínimos. Os juros de mora e a correção monetária devem seguir os critérios do Manual de Cálculos da Justiça Federal, conforme estabelecido na sentença. São devidos honorários advocatícios, nos termos da Súmula 111 do STJ, sem majoração recursal para o INSS, uma vez que seu apelo foi parcialmente provido. A autarquia é isenta de custas processuais, mas deve reembolsar as despesas processuais eventualmente comprovadas. IV. DISPOSITIVO E TESE Apelações parcialmente providas. Tese de julgamento: A ausência de médico ou engenheiro do trabalho como responsável técnico pelo PPP inviabiliza o reconhecimento da atividade especial. É especial a atividade de docência exercida em ambientes com exposição habitual e permanente a agentes biológicos. A exposição qualitativa a agentes nocivos não é neutralizada pelo uso de EPI, salvo prova inequívoca de sua eficácia. O tempo em gozo de auxílio-doença conta como tempo de serviço especial, desde que intercalado com atividade especial. A aposentadoria por tempo de contribuição é devida quando não atingido o tempo mínimo para aposentadoria especial, mas comprovado o tempo total exigido por lei. Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, arts. 1.011 e 496, § 3º, I; Lei nº 8.213/91, arts. 57, 58, § 1º, e 103, parágrafo único; RPS, art. 65; Lei nº 9.289/96, art. 4º, I e parágrafo único. Jurisprudência relevante citada: STJ, Tema 998, REsp 1.831.371/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 23.11.2021; TRF-3ª Região, ApelRemNec 5008396-32.2018.4.03.6109, Rel. Des. Fed. Inês Virginia, j. 06.06.2023; TRF-3ª Região, ApCiv 5002962-34.2018.4.03.6183, Rel. Des. Fed. Carlos Eduardo Delgado, j. 09.05.2023. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, APÓS A DIVERGÊNCIA PARCIAL APRESENTADA PELO DES. FEDERAL MARCELO VIEIRA, A RELATORA RETIFICOU O SEU VOTO A FIM DE ADERIR AOS TERMOS DA DIVERGÊNCIA. A SÉTIMA TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU REJEITAR A MATÉRIA PRELIMINAR E, NO MÉRITO, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA. VOTARAM O DES. FEDERAL MARCELO VIEIRA E O DES. FEDERAL ERIK GRAMSTRUP. LAVRARÁ O ACÓRDÃO A RELATORA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. LUCIANA ORTIZ TAVARES COSTA ZANONI Juíza Federal

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