Processo nº 0008082-56.2020.8.27.2729
ID: 326983141
Tribunal: TJTO
Órgão: CENTRAL DE PROCESSAMENTO ELETRÔNICO - CPE CENTRAL CRIMINAL
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0008082-56.2020.8.27.2729
Data de Disponibilização:
16/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
WAGNER BRAGA DAVID
OAB/TO XXXXXX
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Ação Penal - Procedimento Ordinário Nº 0008082-56.2020.8.27.2729/TO
RÉU
: CESAR ROBERTO ZAFANI
ADVOGADO(A)
: WAGNER BRAGA DAVID (OAB TO008093)
SENTENÇA
Trata-se de ação Penal Pública na qual o Minis…
Ação Penal - Procedimento Ordinário Nº 0008082-56.2020.8.27.2729/TO
RÉU
: CESAR ROBERTO ZAFANI
ADVOGADO(A)
: WAGNER BRAGA DAVID (OAB TO008093)
SENTENÇA
Trata-se de ação Penal Pública na qual o Ministério Público denunciou
CESAR ROBERTO ZAFANI
, devidamente qualificado nos autos, com fundamento no art. 180, § 1º do Código Penal, requerendo, ainda, a fixação de indenização mínima por danos materiais ou morais causados à vítima, na forma do art. 387, inc. IV, do Código de Processo Penal, com arrimo nos fatos que se seguem:
Consta dos autos de inquérito policial que, no dia 13 de fevereiro de 2019, por volta das 09 horas, no “Ferro Velho do Cesar” situado na Quadra 812 sul, Alameda 07, Lote 14, nesta capital, o denunciado
CESAR ROBERTO ZAFANI
, adquiriu ou recebeu, manteve em depósito, em proveito próprio, no exercício de atividade comercial, várias toneladas de aço, sendo diversas peças metálicas usadas para construção de Torres de Transmissão de Energia, a saber: peças de encaixe, eixos centrais, cantoneiras, chapas, parafusos e porcas e etc., devidamente catalogadas no laudo de avaliação nº. 1002/2019, que montam o valor total de R$ 181.900,00 (cento e oitenta e um mil, e novecentos reais), que sabia serem produtos de crimes, todos de propriedade da empresa vítima ATE XVI Transmissora de Energia S.A, localizada na cidade de Marabá-PA.
Segundo restou apurado, no dia dos fatos policiais civis foram informados pela inteligência da Secretaria de Segurança Pública de que várias armações de aço galvanizadas furtadas estariam sendo comercializadas no Ferro Velho do César, ora denunciado, razão pela qual se deslocaram até o lugar apontado e constataram a veracidade das informações, sendo encontradas diversas peças metálicas usadas para construção de Torres de Transmissão de Energia, citadas acima.
As peças metálicas foram furtadas no dia 07/02/2019, da empresa ATE XVI Transmissora de energia S.A., na Rodovia BR-230, (rodovia transamazônica, nº. 34186, folha 30, próximo ao Shopping Pátio Marabá, no Bairro Nova Marabá, no município de Marabá/PA, conforme Boletim de Ocorrência nº. 000184/2019.1000981-9 acostado aos autos.
Diante da gravidade dos fatos, os policiais deram voz de prisão conduzindo o denunciado à Central de Fragrante.
Ao ser interrogado o denunciado confessou ter adquirido as peças em vários estabelecimento dos Estado de São Paulo, mas declarou não saber que as mesmas eram produto de crime e referiu ter notas fiscais dos anos de 2016 e 2018, as quais contudo não foram juntadas aos autos, tampouco indicou prova testemunhal capaz de demonstrar sua boa fé.
Registre-se que o material da empresa/vítima, foi furtado em 07/02/2019, então as notas fiscais dos anos de 2016 e 2018 referidas pelo denunciado, não compravam aquisição das mesmas de maneira lícita.
evento 1, DENUNCIA1
.
O Ministério Público ofereceu a denúncia em 17/02/2020 (
evento 1, DENUNCIA1
), sendo esta recebida em 18/02/2020, conforme decisão constante no
evento 4, DECDESPA1
.
Notificado, o réu apresentou resposta a acusação em 23/07/2020 (
evento 27, PET1
).
Na audiência de instrução e julgamento realizada em 08/03/2024,
evento 84, TERMOAUD1
, foram ouvidas as testemunhas arroladas e houve o interrogatório do réu.
O Ministério Público em suas alegações finais por memorias
evento 94, MEMORIAIS1
, ratificou integralmente os termos da denúncia e pugnou pela condenação do réu nas penas do artigo 180, § 1º, do Código Penal.
Por seu turno, a Defesa em sede de alegações finais por memorias,
evento 97, MEMORIAIS1
, requereu a improcedência da denúncia absolvição do acusado, com fundamento no princípio do
in dubio pro reo
, com a consequente absolvição do acusado nos moldes do artigo 386 do Código de Processo Penal, e, subsidiariamente, em caso de condenação, a substituição da pena restritiva de liberdade por multa e o direito de recorrer em liberdade.
É o relatório necessário. Decido.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 MÉRITO
Em atenção ao comando inserto no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, passo à fundamentação, pois presentes as condições da ação e os pressupostos de desenvolvimento regular do processo, tanto é que sequer foram suscitadas preliminares.
Incumbe verificar se os autos fornecem elementos necessários e suficientes à comprovação da autoria e da materialidade dos delitos descritos na denúncia imputado ao réu. Para tanto, resta imprescindível o exame dos elementos probatórios colhidos nos autos, tanto na fase inquisitorial quanto em Juízo (art. 155 do CPP).
2.1.1
DO CRIME DE RECEPTAÇÃO QUALIFICADA (ARTIGO 180, § 1º, DO CÓDIGO PENAL)
A receptação qualificada, prevista no artigo 180, § 1º, do Código Penal, constitui delito de natureza patrimonial, cuja finalidade é coibir a circulação e o aproveitamento de bens provenientes de infração penal, protegendo não apenas a integridade do patrimônio alheio, mas também a própria efetividade da persecução penal, ao impedir que os frutos do crime sejam reinseridos no comércio formal ou utilizados para proveito próprio ou de terceiros.
§ 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime:
Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa.
Trata-se de tipo penal alternativo, com seis núcleos verbais, sendo que a prática de qualquer uma dessas condutas é suficiente para a consumação do crime. Ademais, não se exige, para sua configuração, o dolo direto e específico de receptar produtos oriundos de determinado crime, bastando que o agente tenha ciência da origem ilícita da coisa, ou, em casos excepcionais, deva presumir tal origem, nos termos das modalidades culposas.
Em reforço a essa análise, o Superior Tribunal de Justiça - STJ, em recente julgado, consolidou entendimento segundo o qual:
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO. CONDENAÇÃO.
CABE AO AGENTE COMPROVAR O SEU DESCONHECIMENTO QUANTO À ORIGEM ILÍCITA DO BEM
. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Sabe-se que, nos casos de receptação, cabe ao agente provar o seu desconhecimento quanto à origem ilícita do bem. No presente caso, contudo, a defesa não se desincumbiu de demonstrar a ocorrência de tal circunstância. Ao contrário, pelo que se extrai dos autos, o agravante afirmou que adquiriu o objeto de um vendedor de bananas, sem nota fiscal e por valor bem abaixo do valor de mercado, elementos que inviabilizam a tese de desconhecimento da ilicitude.
2 . A jurisprudência consolidada deste Superior Tribunal considera que, no crime de receptação, se o bem houver sido apreendido em poder do paciente, caberia à defesa apresentar prova acerca da origem lícita do bem ou de sua conduta culposa, nos termos do disposto no art. 156 do Código de Processo Penal, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova (AgRg no HC n. 331.384/SC, Quinta Turma, rel . Min. Ribeiro Dantas, DJe de 30/8/2017) (AgRg no HC n. 691.775/SP, Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), Quinta Turma, DJe de 14/3/2022).
3.Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no HC: 866699 GO 2023/0400161-6, Relator.: Ministro JESUÍNO RISSATO DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT, Data de Julgamento: 16/04/2024, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/04/2024)
(Grifo nosso)
Portanto, à luz do artigo 156 do Código Processo Penal e da jurisprudência dominante, incumbe ao acusado demonstrar a licitude da posse ou a sua boa-fé, sobretudo quando as circunstâncias revelam forte presunção de origem ilícita.
Ademais, a qualificadora, delineada no § 1º do artigo 180 do Código Penal, incide de maneira particular e expressa quando o agente adquire, recebe, transporta, conduz ou oculta, em proveito próprio ou alheio, a coisa que deve saber ser produto de crime, e o faz no exercício de atividade comercial ou industrial. Tal qualificadora visa apenar com maior rigor a conduta daquele que se vale de uma atividade lícita, como o comércio, para dar vazão a bens de origem espúria, fomentando, assim, a criminalidade patrimonial.
A
MATERIALIDADE
do crime está comprovada no bojo do Inquérito Policial nº 00065897820198272729, pelo Auto de Prisão em Flagrante (
evento 1, P_FLAGRANTE1
) e Boletim de Ocorrência nº 00184/2019.100981-9, que atestaram a apreensão dos bens na posse do réu.
Adicionalmente, o Laudo Pericial de Avaliação n° 1002/2019, acostado no referido IP (
evento 35, LAU1
), reveste-se de particular relevância ao proceder à minuciosa descrição e valoração das diversas toneladas de aço apreendidas, confirmando sua natureza (peças de torres de transmissão de energia) e o elevado valor econômico de R$ 181.900,00 (cento e oitenta e um mil e novecentos reais). Este documento pericial, ao identificar e quantificar os bens, correlacionou-os de forma inequívoca com aqueles descritos no boletim de ocorrência do furto.
Por fim, a prova oral produzida ao longo da instrução processual,
evento 84, TERMOAUD1
, materializada nos depoimentos colhidos em juízo, harmoniza-se perfeitamente com os elementos documentais e periciais, fornecendo um arcabouço probatório sólido que confirma a apreensão dos materiais de origem criminosa em poder do acusado.
Dessarte, resta inquestionável que os bens apreendidos na posse do acusado eram, inequivocamente, produto de furto antecedente, conforme detalhadamente registrado e comprovado no BO nº 00184/2019.100981-9, datado de 07/02/2019, em Marabá-PA, e corroborado pelos demais elementos de convicção.
Ademais, ilustra este entendimento o julgado do TJ/TO:
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO. CONDENAÇÃO.
CABE AO AGENTE COMPROVAR O SEU DESCONHECIMENTO QUANTO À ORIGEM ILÍCITA DO BEM
. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO. 1 . Sabe-se que, nos casos de receptação, cabe ao agente provar o seu desconhecimento quanto à origem ilícita do bem. No presente caso, contudo, a defesa não se desincumbiu de demonstrar a ocorrência de tal circunstância. Ao contrário, pelo que se extrai dos autos, o agravante afirmou que adquiriu o objeto de um vendedor de bananas, sem nota fiscal e por valor bem abaixo do valor de mercado, elementos que inviabilizam a tese de desconhecimento da ilicitude.
2 . A jurisprudência consolidada deste Superior Tribunal considera que, no crime de receptação, se o bem houver sido apreendido em poder do paciente, caberia à defesa apresentar prova acerca da origem lícita do bem ou de sua conduta culposa, nos termos do disposto no art. 156 do Código de Processo Penal, sem que se possa falar em inversão do ônus da prova (AgRg no HC n. 331.384/SC, Quinta Turma, rel . Min. Ribeiro Dantas, DJe de 30/8/2017) (AgRg no HC n. 691.775/SP, Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT), Quinta Turma, DJe de 14/3/2022).
3.Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no HC: 866699 GO 2023/0400161-6, Relator.: Ministro JESUÍNO RISSATO DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT, Data de Julgamento: 16/04/2024, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/04/2024)
(Grifo nosso)
Diante do exposto, a integralidade do arcabouço probatório, composto por elementos documentais, periciais e testemunhais detidamente analisados, solidifica, de forma inequívoca e indubitável, a materialidade delitiva do crime de receptação qualificada. A apreensão dos bens em poder do acusado, aliada à sua comprovada origem ilícita e à perfeita subsunção dos fatos aos ditames do artigo 180, § 1º, do Código Penal. Assim, a existência do delito, em todos os seus contornos objetivos, é medida de certeza inafastável.
A AUTORIA,
imputada ao réu
CESAR ROBERTO ZAFANI
, emerge de forma clara e insofismável dos elementos informativos e probatórios que instruem o feito. O Auto de Prisão em Flagrante (
evento 1, P_FLAGRANTE1
) formalizou a situação em que o acusado foi encontrado na posse das diversas toneladas de peças metálicas de torres de transmissão de energia, pertencentes à ATE XVI Transmissora de Energia S.A. e avaliadas em R$ 181.900,00 (cento e oitenta e um mil e novecentos reais), conforme Laudo Pericial
evento 35, LAU1
. Tais bens, como já exaustivamente demonstrado, eram produto de furto antecedente, conforme Boletim de Ocorrência nº 00184/2019.100981-9 (ID 17616603, fls. 11-13); fotos constante no Inquérito Policial nº 00065897820198272729, especificamente no Relatório Final (
evento 36, REL_FINAL_IPL1
), e no Laudo (
evento 31, LAU1
) que relatou que as peças apreendidas ostentavam etiquetas identificadoras e numeração de série, o que permitiu a correlação inequívoca com o patrimônio da empresa vítima, fato que, por si só, desqualifica a tese defensiva de ausência de origem ilícita do material. No intuito de dirimir quaisquer dúvidas, vejamos alguns dos identificadores citados:
Foto retirada Relatório Final – Evento 36 do IP – Pág. 02
Foto retirada do Laudo Pericial - Evento 36 do IP – Pág. 07
Ademais, em sede de interrogatório judicial, o réu
CÉSAR ROBERTO ZAFANI
, registrado no
evento 84, TERMOAUD1
, afirmou exercer a atividade de comerciante de ferro-velho há mais de 30 (trinta) anos, profissão na qual seu genitor igualmente laborava. E não menos importante, conforme certidão criminal acostado
evento 86, CERTANTCRIM1
o réu possui condenação por crime semelhante, circunstância que procurou omitir durante a audiência.
Outrossim, a prova oral produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, durante a audiência de instrução e julgamento (
evento 84, TERMOAUD1
), consubstanciada nos depoimentos dos policiais que participaram da diligência, merece ser analisada com a devida acuidade. Os agentes públicos, em suas declarações em Juízo, narraram de maneira uníssona, detalhada e coerente a apreensão dos materiais no estabelecimento conhecido como "Ferro Velho do Cesar", de propriedade do réu.
O policial civil
ELIZOMAR FLORENTINO FERNANDES
prestou depoimento de relevância crucial. Informou que a diligência foi desencadeada a partir de informações da Diretoria de Inteligência do Estado do Tocantins sobre ferragens furtadas da ATE Transmissora de Energia Elétrica, que estariam armazenadas no Ferro Velho de propriedade do acusado. Relatou ainda, a vistoria no local onde foi encontrada uma grande quantidade de peças metálicas (estimadas em 18 a 20 toneladas de aço galvanizado), algumas das quais apresentavam numeração de série condizente com o boletim de ocorrência do furto. O policial destacou que, ao ser questionado, César afirmou ter adquirido o material de outros ferros-velhos em Goiás ou São Paulo, mas não apresentou, no momento da diligência, qualquer documentação que comprovasse a origem lícita das mercadorias. A ausência de comprovação documental da origem dos bens, aliada à sua identificação inequívoca como produto de furto, é elemento preponderante para a configuração do dolo na receptação.
O policial
LINCOLN RAFAEL ANTÔNIO DE FREITAS
, por sua vez, embora não tenha participado diretamente das diligências externas, acompanhou a formalização do flagrante por receptação de
CESAR ROBERTO ZAFANI
na delegacia. Confirmou ter conhecimento geral do caso envolvendo as toneladas de aço galvanizado furtadas e a localização no estabelecimento do réu, bem como a alegação de César sobre a aquisição de outros ferros-velhos. Sua oitiva ratifica os procedimentos formais e a natureza do material apreendido.
Os testemunhos supramencionados, por se mostrarem coerentes entre si e amplamente harmônicos com as provas materiais coligidas, formam um conjunto probatório robusto e idôneo, apto a sustentar a responsabilização penal do acusado. É fundamental reiterar que, à luz dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, consagrados no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, o depoimento prestado pelos policiais, na qualidade de agentes públicos no exercício regular de suas funções, assume elevado valor probatório. Tal entendimento encontra respaldo na doutrina e na jurisprudência pátria, que conferem especial credibilidade aos testemunhos de agentes do Estado, mormente quando não evidenciada qualquer má-fé, contradição substancial ou desqualificação que os descredite. O Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm reiteradamente afirmado que os depoimentos de agentes públicos possuem presunção de veracidade, a menos que existam provas robustas em sentido contrário capazes de abalar sua credibilidade.
A doutrina jurisprudencial abaixo citada alinha-se ao posicionamento deste Juízo:
Ementa: PENAL. PROCESSO PENAL.
RECEPTAÇÃO DOLOSA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS
. PALAVRA DOS POLICIAIS. BUSCA E APREENSÃO. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DA ORIGEM ILÍCITA DO BEM. SENTENÇA MANTIDA. 1. Inviável o acolhimento de pleito absolutório por insuficiência de provas ou atipicidade da conduta, quando a condenação vem lastreada em elementos firmes, corroborada pelas declarações dos policiais em Juízo, que apontam a acusada como sendo a autora do crime de receptação. 2.
No concernente a validade e credibilidade de testemunhos prestados por agentes policiais, quando em harmonia entre si e com as provas dos autos, não contraditados ou desqualificados, restam merecedores de fé na medida em que provêm de agentes públicos no exercício de suas funções e não destoam do conjunto probatório
. 3. Na hipótese do crime de receptação,
cabe à ré o ônus de demonstrar que não tinha conhecimento da origem ilícita do aparelho celular,
mormente quando as circunstâncias apontam em sentido contrário. 4. Recurso conhecido e desprovido. (TJ-DF 0714550-75.2023.8.07.0003 1867988, Relator.: JANSEN FIALHO DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 23/05/2024, 3ª Turma Criminal, Data de Publicação: 06/06/2024).
(Grifo nosso)
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO 1ª Câmara Criminal GABINETE DO DESEMBARGADOR FERNANDO ZARDINI ANTONIO Rua Desembargador Homero Mafra, 60, Enseada do Suá, Vitória - ES - CEP: 29050-906 APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0001450-91.2021.8.08 .0050 - 1ª Câmara Criminal APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPIRITO SANTO APELADO: ZADOQUE GAVA THEOFILO RELATOR: Des. FERNANDO ZARDINI ANTONIO ACÓRDÃO Ementa: DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. RECEPTAÇÃO. ARTIGO 180, CP. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. PROVAS SUFICIENTES DE MATERIALIDADE E AUTORIA. DEPOIMENTOS DE POLICIAIS. VALIDADE. BEM APREENDIDO COM O RÉU. AUSÊNCIA DE PROVA DA LEGITIMIDADE DA POSSE. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação criminal interposta contra sentença da 1ª Vara Criminal de Viana, que o condenou pela prática do crime de receptação (art. 180 do Código Penal), à pena de 1 ano de reclusão. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO Verificar se as provas apresentadas nos autos são suficientes para sustentar a condenação. III. RAZÕES DE DECIDIR A materialidade e a autoria do crime de receptação estão devidamente comprovadas, sendo inviável a absolvição. A autoria do crime é confirmada pelos depoimentos dos policiais, que relataram que o réu vinha conduzindo a motocicleta e, ao visualizar a aproximação da guarnição, empreendeu fuga saltando quintais de residências próximas, sendo preso na sequência.
A jurisprudência consolidada reconhece a idoneidade dos depoimentos de policiais como meio de prova válido, principalmente quando corroborados por outros elementos probatórios. Sendo o bem apreendido em poder do agente, cabe à defesa, na forma do art. 156 do CPP, provar a origem lícita ou de ter o réu agido culposamente. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Teses de julgamento: O depoimento de policiais, quando corroborado por outros elementos probatórios e não desacreditado por prova em contrário, constitui meio de prova idôneo para condenação. No crime de receptação, cabe à defesa provar a origem lícita do bem encontrado na posse do réu, conforme o art. 156 do CPP.
Dispositivos relevantes citados: CP, art. 180,; CPP, art. 156, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC nº 815.812/SP, 5ª Turma, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 22/5/2023; STJ, AgRg no AREsp nº 1874263/TO, 6ª Turma, rel. Min. Olindo Menezes, 22/10/2021; TJES, Apelação nº 014150126259, rel. Des. Willian Silva, 1ª Câmara Criminal, 01/04/2022; TJES, Apelação nº 030190123171, rel . Des. Pedro Valls Feu Rosa, 1ª Câmara Criminal, 21/03/2022. (TJ-ES - APELAÇÃO CRIMINAL: 00014509120218080050, Relator.: FERNANDO ZARDINI ANTONIO, 1ª Câmara Criminal)
(Grifo nosso)
Ademais, testemunha
LUCAS LOUREIRO PEREIRA DOS REIS
, advogado, embora tenha atuado apenas como acompanhante da diligência a convite da empresa vítima, confirmou a prévia comunicação sobre a operação, a presença policial e a realização de fotografias do material localizado no ferro velho do acusado. Sua narrativa, embora periférica à ação policial em si, atesta a concretude da diligência no local e a identificação do material pela parte lesada.
Assim, diante da irrefutável conjunção probatória, que abrange desde a posse injustificada de bens de origem comprovadamente ilícita com identificação da vítima, passando pela vasta experiência do réu no comércio de ferro velho e sua condenação anterior por delito similar, e culminando na coerência e credibilidade dos depoimentos policiais, a autoria de
CESAR ROBERTO ZAFANI
no crime de receptação qualificada encontra-se solidamente demonstrada. As circunstâncias fáticas, intrinsecamente ligadas à conduta do acusado, revelam seu dolo na aquisição e manutenção dos bens, desvirtuando qualquer alegação de boa-fé, até mesmo porque não foi apresentado documento da origem lícita dos toneladas de ferros, firmando desta forma a sua responsabilidade penal no presente feito.
2.1.2 DO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO MÍNIMA PELOS DANOS CAUSADOS À VÍTIMA (ARTIGO 387, INCISO IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL)
Acerca dos
danos materiais,
referem-se aos prejuízos de ordem patrimonial, ou seja, àqueles que afetam diretamente o patrimônio da vítima, podendo ser quantificados economicamente. Subdividem-se, classicamente, em danos emergentes (aquilo que a vítima efetivamente perdeu, como o valor dos bens subtraídos ou danificados) e lucros cessantes (aquilo que a vítima razoavelmente deixou de lucrar em decorrência do ilícito). Sua caracterização e quantificação exigem a prova do efetivo decréscimo patrimonial.
Já os
danos morais
, por sua vez, são de natureza extrapatrimonial e consistem na lesão a bens jurídicos inerentes à pessoa, tais como a honra, a imagem, a intimidade, a vida privada, a boa fama, a dignidade, a integridade psíquica, ou qualquer outro direito da personalidade. Caracterizam-se por um sofrimento psíquico, uma dor moral, angústia, vexame ou humilhação que, embora não se traduza em perda econômica direta, afeta profundamente o bem-estar e a esfera íntima do indivíduo. A indenização por danos morais não visa recompor o
status quo ante
, mas sim compensar a vítima pelo abalo sofrido e, indiretamente, servir como fator de desestímulo à reiteração da conduta ilícita pelo ofensor.
A possibilidade de fixação de valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido, encontra amparo legal no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal. Esta inovação legislativa, introduzida pela Lei nº 11.719/2008, possui um caráter instrumental e busca conferir maior efetividade à tutela dos direitos da vítima, permitindo que a sentença penal condenatória, além de impor a sanção criminal, estabeleça desde logo um valor indenizatório mínimo que poderá ser executado na esfera cível sem a necessidade de uma nova fase de liquidação quanto à sua existência e à sua extensão.
Todavia, para que se opere a fixação de tal indenização na esfera criminal, alguns requisitos são imperativos e sua observância é crucial para a garantia do devido processo legal e do contraditório:
1.
Pedido Expresso:
É indispensável que haja um pedido formal e expresso da acusação (Ministério Público ou querelante) ou do ofendido habilitado, formulado na denúncia ou queixa, ou em momento oportuno que garanta o contraditório, possibilitando à defesa manifestar-se e produzir provas em relação a essa pretensão indenizatória.
2.
Contraditório e Ampla Defesa:
A inclusão da discussão sobre o
quantum
indenizatório na ação penal exige que o réu tenha tido a oportunidade de se defender especificamente sobre este ponto, produzindo provas e argumentando contra a existência ou extensão do dano. A ausência de tal oportunidade pode macular a condenação civil contida na sentença penal.
3.
Provas Mínimas:
A fixação de um valor mínimo de indenização requer a existência de provas inequívocas e suficientes nos autos do processo criminal que demonstrem a
existência
do dano e, ao menos, um
valor mínimo
de sua extensão. Não se exige uma liquidação complexa ou profunda como a que seria realizada em sede de ação cível própria, mas é fundamental que o prejuízo seja certo e determinado, ou facilmente determinável com base nos elementos já presentes no processo penal.
No caso vertente, o Ministério Público na inicial formulou requerimento expresso para a fixação de indenização mínima por danos materiais ou morais causados à vítima, nos moldes do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal.
No entanto, a pretensão de fixação de indenização mínima por danos morais na esfera penal, conforme pugnado pelo órgão ministerial, não merece prosperar neste momento processual. Conquanto o valor material dos bens subtraídos e posteriormente apreendidos em poder do acusado, qual seja, R$ 181.900,00 (cento e oitenta e um mil e novecentos reais), tenha sido devidamente e inquestionavelmente quantificado por meio do Laudo Pericial de Avaliação nº 1002/2019, o que se observa é que os elementos apresentados nos autos não guardam nexo direto, concreto e inequívoco com a demonstração de um prejuízo
adicional
a ser indenizado a título de danos materiais, visto que as peças foram apreendidas em poder do réu, implicando sua recuperação pela vítima, minimizando a necessidade de uma nova fixação material. Especificamente quanto aos alegados
danos morais
, o conjunto probatório existente no bojo deste processo criminal não comprova, com a necessária certeza e liquidez, a sua efetiva ocorrência e mensuração, que demandariam uma dilação probatória mais aprofundada, não compatível com o rito e a finalidade da ação penal. Importa salientar, que a mera requisição de fixação de indenização civil na sentença penal, desacompanhada de qualquer documentação comprobatória da efetiva extensão da lesão material
remanescente
(se houver, além da recuperação do bem) ou do vínculo concreto e pormenorizado entre a conduta delituosa e a
alegada lesão moral
, não é suficiente para justificar o deferimento do pedido de indenização mínima civil na esfera criminal. A jurisprudência pátria tem reiteradamente ressaltado a necessidade de dilação probatória específica para a apuração de danos complexos.
Nesse sentido, a jurisprudência do egrégio Tribunal de Justiça do Tocantins - TJTO orienta-se no seguinte sentido:
EMENTA: DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. RECEPTAÇÃO QUALIFICADA. CIÊNCIA DA ORIGEM ILÍCITA DO BEM. DOLO DEMONSTRADO. RECURSO IMPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de apelação interposta contra sentença que condenou o recorrente pelo crime de receptação qualificada (artigo 180, §§ 1º e 2º, do Código Penal) à pena de três anos de reclusão, substituída por restritiva de direitos, e reparação de danos no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais). O recorrente alega insuficiência de provas para a configuração do dolo, postulando absolvição, desclassificação para receptação culposa, perdão judicial ou redução da pena. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) definir se há elementos probatórios suficientes para a condenação pela modalidade dolosa do crime de receptação; (ii) estabelecer se é cabível a desclassificação para receptação culposa ou concessão do perdão judicial; e (iii) verificar a adequação da fixação da pena, especialmente quanto à multa e à reparação de danos. III. RAZÕES DE DECIDIR
3.
O dolo do recorrente foi evidenciado pela aquisição do bem por valor irrisório, sem documentação de origem, em um contexto de atividade comercial, conforme depoimentos e circunstâncias fáticas colhidas nos autos, que indicam a ciência inequívoca da origem ilícita do objeto. 4. A desclassificação para receptação culposa foi afastada, pois não se verificou negligência, mas sim conduta dolosa do apelante. A concessão do perdão judicial é incompatível com a modalidade dolosa da receptação. 5. A pena foi fixada no mínimo legal, com substituição da reclusão por pena restritiva de direitos, sendo observadas a proporcionalidade e razoabilidade na multa e reparação de danos, conforme fundamentação na sentença. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Apelação conhecida e desprovida. Sentença mantida em sua integralidade. Tese de julgamento: 1. No crime de receptação qualificada, a ciência da origem ilícita do bem pode ser inferida a partir das circunstâncias fáticas, especialmente quando o bem é adquirido por valor muito inferior ao de mercado e sem comprovação documental. 2. A desclassificação para receptação culposa pressupõe a ausência de dolo, não se aplicando nos casos em que o agente tem ciência da origem criminosa do bem.
3.A reparação integral do dano é compatível com a extensão do prejuízo causado à vítima, especialmente quando o bem devolvido encontra-se em condições inadequadas para uso
. Dispositivos relevantes citados: Código Penal, art. 180, §§ 1º, 2º e 3º; Código de Processo Penal, art. 156. Jurisprudência relevante citada no voto: 1. TJMG, Embargos Infringentes 1.0027.16.015661-1/002, Rel. Des. Doorgal Borges de Andrada, julgado em 08.02.2023. 2. STJ, AgRg no AREsp 2.552.194/DF, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, julgado em 06.08.2024. (TJTO , Apelação Criminal (PROCESSO ORIGINÁRIO EM MEIO ELETRÔNICO), 0000892-86.2021.8.27.2703, Rel. JOAO RIGO GUIMARAES , julgado em 28/01/2025, juntado aos autos em 03/02/2025 13:58:06)
(Grifo nosso)
PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ROUBO MAJORADO. ART. 387, INCISO IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INDENIZAÇÃO.
REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. PEDIDO EXPRESSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INEXISTÊNCIA DE INSTRUÇÃO NO CURSO DO PROCESSO. INOBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA.
I - In casu, verifica-se que o acórdão recorrido manteve a sentença que deixou de fixar o valor mínimo da indenização prevista no artigo 387, IV do CPP, uma vez que, apesar de existente pedido expresso do Ministério Público, este "se mostrou extremamente genérico, sem apontar os valores e a espécie de dano", bem como não houve apuração do dano submetido ao crivo do contraditório.
II - O entendimento adotado pelo Tribunal a quo está de acordo com a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, estabelecida no sentido de que "A reparação de danos, além de pedido expresso, pressupõe a indicação de valor e de prova suficiente a sustentá-lo, possibilitando ao réu o direito de defesa com indicação de quantum diverso ou mesmo a comprovação de inexistência de prejuízo material ou moral a ser reparado. Necessário, portanto, instrução específica para apurar o valor da indenização"( AgRg no AREsp n. 1.361 .693/GO, Qui nta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 23/04/2019, grifei). III - Ademais, cumpre registrar que a tese fixada no julgamento do Recurso Especial n. 1.675.874/MS quanto a prescindibilidade de instrução para fixação de indenização por dano moral se restringiu aos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, o que não é o caso dos autos. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no REsp: 2068456 MG 2023/0137405-6, Relator.: Ministro MESSOD AZULAY NETO, Data de Julgamento: 08/08/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/08/2023)
(Grifo nosso)
APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE FURTO QUALIFICADO PELO ABUSO DE CONFIANÇA ( CP, ART. 155, § 4º, II) E DESACATO ( CP, ART. 331). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO ACUSADO. ADMISSIBILIDADE. CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA. NÃO CONHECIMENTO. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU. PRECEDENTES. PEDIDO REFERENTE À MINORAÇÃO DA REPRIMENDA EM RAZÃO DA SUA ARBITRAÇÃO EXCESSIVA. PLEITO GENÉRICO E DESACOMPANHADO DE FUNDAMENTAÇÃO. MANIFESTA OFENSA À DIALETICIDADE RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO. MÉRITO. POSTULADA A ABSOLVIÇÃO QUANTO AO DELITO DE FURTO, DIANTE DA FRAGILIDADE PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. VÍTIMA QUE TEVE O SEU AUTOMÓVEL SUBTRAÍDO E NARROU QUE O RESPONSÁVEL PELA PRÁTICA CRIMINOSA FOI O RÉU, SEU SOBRINHO, UMA VEZ QUE SUA FILHA VISUALIZOU ELE DEIXANDO O LOCAL DOS FATOS NA POSSE DO VEÍCULO. RES FURTIVA QUE FOI ENCONTRADA ABANDONADA APÓS ABALROAMENTO EM UM MURO. AGENTES PÚBLICOS E A OFENDIDA QUE, AO CHEGAREM NO LOCAL DO ACIDENTE, CONSTATARAM QUE O APARELHO TELEFÔNICO DO ACUSADO ESTAVA NO ASSOALHO DO AUTOMOTOR SURRUPIADO. POSTERIORMENTE, O DENUNCIADO FOI ATÉ O LOCAL DO ACIDENTE PARA REIVINDICAR O CELULAR E CONFIRMOU A UM DOS AGENTES PÚBLICOS QUE CONDUZIA O AUTOMÓVEL. RÉU QUE APRESENTA VERSÕES DIVERGENTES NO QUE DIZ RESPEITO AO MOTIVO PELO QUAL O SEU CELULAR ESTAVA NO VEÍCULO SUBTRAÍDO DA VÍTIMA. CONDENAÇÃO MANTIDA. PLEITO DE AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DO ABUSO DE CONFIANÇA. INVIABILIDADE. ACUSADO QUE É SOBRINHO DA VÍTIMA. CONDIÇÃO QUE FEZ COM QUE TIVESSE ACESSO LIVRE À RESIDÊNCIA, OCASIÃO NA QUAL PRATICOU O DELITO. MANUTENÇÃO DA QUALIFICADORA QUE SE IMPÕE. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA INDENIZAÇÃO FIXADA A TÍTULO DE DANOS MATERIAIS (ART. 387, IV, DO CPP).
CABIMENTO. EXISTÊNCIA DE PEDIDO EXPRESSO NA DENÚNCIA, PORÉM, SEM QUANTIFICAÇÃO DE VALOR. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO ESPECÍFICA A RESPEITO DO DANO SOFRIDO. ACUSADO QUE NÃO TEVE OPORTUNIDADE DE REALIZAR CONTRAPROVA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CÂMARA. VALOR MÍNIMO ARBITRADO PARA REPARAÇÃO DO DANO MATERIAL QUE DEVE SER AFASTADO. SENTENÇA REFORMADA NO PONTO.
FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ACOLHIMENTO. APRESENTAÇÃO DAS RAZÕES RECURSAIS. REMUNERAÇÃO QUE DEVE OBSERVAR OS TERMOS DO ART. 8º DA RESOLUÇÃO CM N. 5/2019 E RESOLUÇÃO CM. N. 5/2023. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal n. 5004148-82.2022.8.24.0024, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Antônio Zoldan da Veiga, Quinta Câmara Criminal, j. 04-07-2024). (TJ-SC - Apelação Criminal: 50041488220228240024, Relator.: Antônio Zoldan da Veiga, Data de Julgamento: 04/07/2024, Quinta Câmara Criminal)
(Grifo nosso)
Diante de todo o exposto, e em estrita observância aos contornos delineados pelo artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, a vítima ATE XVI Transmissora de Energia S.A. não faz jus, no âmbito deste processo penal, à fixação de indenização mínima por danos morais, por ausência de elementos probatórios suficientes à sua quantificação no presente feito, nem a qualquer indenização material adicional além da própria recuperação dos bens subtraídos, que ocorreu por meio da apreensão na posse do réu. Permanece, contudo, ressalvado o direito da parte ofendida de buscar a integral reparação de quaisquer outros prejuízos, inclusive os morais, na esfera cível própria, mediante a propositura de ação autônoma e dilação probatória adequada.
3. DISPOSITIVO
Ante o exposto
JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE
a pretensão estatal constante da denúncia
evento 1, DENUNCIA1
, pela qual condeno
CESAR ROBERTO ZAFANI
pelo
incurso do crime descrito no artigo art. 180, § 1º do Código Penal:
Art. 180.
Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte:
Pena:
reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 1º -
Se o sujeito é comerciante ou industrial, e a receptação é praticada no exercício de atividade comercial ou industrial, ou para facilitá-la:
Pena:
reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.
Atento às diretrizes traçadas nos artigos 59 e 68 do mesmo diploma legal, passo à dosimetria da pena.
Primeiramente, destaco que a dosimetria da pena deve ser realizada em observância aos princípios da proporcionalidade e da individualização da pena.
O Princípio da Proporcionalidade impõe que a sanção penal seja adequada e necessária à gravidade do delito e à reprovabilidade da conduta, de modo a evitar penas excessivas ou desproporcionais. Em complemento, o Princípio da Individualização da Pena, consagrado no artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal, estabelece que a reprimenda deve ser imposta de forma personalizada, considerando as circunstâncias do crime e as particularidades do agente, o que se concretiza por meio do critério trifásico previsto no artigo 68 do Código Penal.
4.
DOSIMETRIA DA PENA
1º FASE - DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS
A
culpabilidade
- Analisadas as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, verifico que a acusada agiu com culpabilidade normal à espécie normativa.
No que tange aos
antecedentes
, a posição majoritária da jurisprudência segue o posicionamento do STJ, no sentido de que apenas devem ser tidos como maus antecedentes aqueles processos criminais com sentença penal condenatória transitada em julgado, desde que não sirva como reincidência, em homenagem ao princípio da presunção de inocência. Conforme certidão de antecedentes juntada no
evento 183, CERT2
, verifica-se a existência de uma condenação penal nos autos nº 0030593-48.2020.8.27.2729,
com trânsito em julgado ocorrido em momento posterior à prática do delito ora em julgamento (23/01/2024), circunstância que impede sua consideração como reincidência, nos termos do art. 63 do Código Penal, o qual exige, para caracterização da agravante, que o novo crime seja praticado após o trânsito em julgado da condenação anterior. Todavia, referida condenação pode e deve ser valorada como maus antecedentes. Logo, prejudica o acusado.
Conduta social
. Aqui, devem ser examinados os elementos indicativos da inadaptação ou do bom relacionamento do agente perante a sociedade em que está integrado. A conduta social do acusado é o estilo de vida por ele seguido, no que tange ao seu comportamento com relação à sua família, aos vizinhos, em seu trabalho, bem assim com relação à sociedade como um todo. No caso em estudo, a conduta social do acusado não deve ser considerada como desabonadora, vez que não há qualquer prova nesse sentido.
A
personalidade
. Neste aspecto, ensina Guilherme de Souza Nucci (Código Penal Comentado, pg. 335) que analisa-se o conjunto de caracteres exclusivos de uma pessoa, como por exemplo a agressividade, preguiça, frieza emocional, sensibilidade acentuada, emotividade, passionalidade, bondade, maldade. A personalidade é normal, não tendente a majorar a pena.
Os
motivos do crime
são os fatores psíquicos que levam a pessoa a praticar o fato delituoso. No contexto do art. 59 do CP, os motivos podem indicar tanto a causa que promoveu a atuação criminosa, como a finalidade pretendida com a prática delitiva, “o motivo é o fator qualificativo da vontade humana, fornecendo o colorido indispensável à compreensão de qualquer conduta: existiu por quê? Para quê?”. Deve ser apontado também que todo crime possui algum motivo, pois ninguém age por agir, a não ser em casos de atos reflexos. Se alguém agiu motivando-se em aspectos negativos deve ter sua pena exasperada e, ao contrário, terá sua pena diminuída se atuou criminosamente por motivos nobres. No presente caso não há qualquer prova dos motivos que ensejaram a prática delitiva, não podendo a pena ser majorada por tal circunstância.
As circunstâncias
, diferentemente dos demais elementos, se referem ao fato criminoso e não ao seu autor e, portanto, são objetivas. As circunstâncias do crime não integram a estrutura do tipo penal, são elementos acidentais ou secundários, “como o modo de execução do crime, os instrumentos empregados em sua prática, as condições de tempo e local em que ocorreu o ilícito penal, o relacionamento entre o agente e o ofendido etc.”, devendo ser levadas em consideração quando da fixação da pena. No caso, a pena não deve ser majorada.
As consequências
resumem-se nos efeitos decorrentes do crime, como exaurimento deste, em prejuízo da vítima, de seus familiares ou da sociedade, de natureza pessoal, moral, afetiva, patrimonial, social ou política, como “o sofrimento material e moral da vítima ou de seus dependentes em crimes violentos,”. Não devem ser confundidas com as consequências naturais do delito, que não devem ser utilizadas como fator de exasperação da pena, pois resultaria em bis in idem. No caso, as consequências foram as normais para o delito em análise.
Comportamento da vítima
. Trata-se de circunstância que determina que o magistrado, na dosagem da pena-base, analise se a vítima concorreu para a prática delitiva de algum modo. E, se ficar constatado que houve tal contribuição, deverá ser diminuída a pena. O Estado é o sujeito passivo primário. Secundariamente, as pessoas que recebem a droga para consumir. Logo, não a prejudica.
Fixo a pena-base, em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.
2ª FASE - DAS AGRAVANTES E ATENUANTES
Não há agravantes e atenuantes a serem consideradas.
Fixo a pena intermediária em 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias-multa.
3ª FASE - DAS CAUSAS DE AUMENTO E DIMINUIÇÃO DA PENA
Não há causas de aumento o diminuição a serem consideradas.
DESTE MODO, FIXO A PENA DEFINITIVA
03 (TRÊS) ANOS, 06 (SEIS) MESES DE RECLUSÃO E 12 (DOZE) DIAS-MULTA.
DO REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA
Fixo o regime aberto para início do cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, § 2º, “c”, do Código Penal.
DO RECURSO
Com fundamento no art. 387, §1º, do CPP, considerando o regime de pena inicialmente fixado, que condenado respondeu a toda a instrução criminal em liberdade, assim como, pela a inexistência de elementos concretos hábeis a autorizar o decreto da custódia preventiva,
CONCEDO
ao sentenciado o direito de recorrer em liberdade.
PENA DE MULTA
Verificando as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal já analisados acima, bem como a situação financeira da acusada, fixo a pena de multa
12 (DOZE)
DIAS-MULTA
, atribuo o valor mínimo possível ao dia multa, ou seja, um trigésimo do salário mínimo em vigor na época do fato (art. 49, § 1ª do CP), a ser atualizada quando da execução.
DA INAPLICABILIDADE DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENA RESTRITIVA DE DIREITO OU MULTA.
A defesa requereu a substituição da pena por multa. Consoante ao disposto no Art. 60, § 2º, do Código Penal,
"pena privativa de liberdade aplicada, não superior a 6 (seis) meses, pode ser substituída pela de multa, observados os critérios dos incisos II e III do art. 44 deste Código".
Vejamos o que dispõe o art. 44, II e III:
Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:
I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;
II - o réu não for reincidente em crime doloso;
III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.
Diante disso, torna-se inaplicável a substituição da pena restritiva de liberdade por multa.
5. DISPOSIÇÕES FINAIS
CONDENO
o acusado ao pagamento das custas processuais, tendo em vista não ser beneficiário da assistência judiciária gratuita.
Com o trânsito em julgado para ambas as partes, façam-se as comunicações de praxe, inclusive à Justiça Eleitoral (artigo 15, III, CRFB/88), bem como formem-se autos de execução penal. Preencha os sistemas determinados pelo CNJ e CGJ.
Intimem-se. Cumpra-se.
Palmas-TO, data certificada eletronicamente.
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