Processo nº 5162507-21.2024.8.09.0011
ID: 256221771
Tribunal: TJGO
Órgão: 4ª Câmara Criminal
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5162507-21.2024.8.09.0011
Data de Disponibilização:
14/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FLAVIO LIVIO RESENDE DOS SANTOS
OAB/GO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
4ª Câmara Criminal
Gabinete do Desembargador Adegmar José Ferreira
gab.ajferreira@tjgo.jus.br
APELAÇ…
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
4ª Câmara Criminal
Gabinete do Desembargador Adegmar José Ferreira
gab.ajferreira@tjgo.jus.br
APELAÇÃO CRIMINAL
Número: 5162507-21.2024.8.09.0011
Comarca: Porangatu
Apelante: Eduardo Eterno da Costa (preso)
Apelado: Ministério Publico
Relator: Des. Adegmar José Ferreira
RELATÓRIO
O representante do Ministério Público em atuação junto ao Juízo da Vara Criminal da Comarca de Porangatu-GO, ofereceu denúncia em desfavor de Eduardo Eterno da Costa, qualificado e nascido em 27/02/1995, imputando-lhe a conduta típica prevista no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, e art. 244-B da Lei nº 8.069/1990, na forma do art. 69 do Código Penal, bem como em relação a Divino dos Reis Gomes Neto, qualificado e nascido em 24/10/2004, imputando-lhe a prática do crime tipificado no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006.
Extrai-se da exordial acusatória que (mov. 85):
“(…) PRIMEIRA IMPUTAÇÃO
Depreende-se do incluso caderno inquisitorial que, no dia 08/03/2024, por volta das 16h30, na GO 151, neste município, DIVINO DOS REIS GOMES NETO, agindo de forma livre e voluntária, transportou, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, 1 (uma) porção de material vegetal dessecado conhecido vulgarmente como maconha (Cannabis Sativa L), com massa bruta de 1 kg (um quilograma).
SEGUNDA IMPUTAÇÃO
No dia 08/03/2024, por volta das 16h30min, na residência localizada a Avenida Federal, próximo ao Supermercado Pacheco, setor Morada do Sol, neste município, EDUARDO ETERNO DA COSTA, agindo de forma livre e consciente, vendeu, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, 1 (uma) porção de material vegetal dessecado conhecido vulgarmente como maconha (Cannabis Sativa L), com massa bruta de 1 kg (um quilograma).
TERCEIRA IMPUTAÇÃO
Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, EDUARDO ETERNO DA COSTA, agindo de forma livre e voluntária, tinha em depósito, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, 01 (uma) porção de material petrificado de cor branca, com massa de 330g (trezentos e trinta gramas), 06 (seis) porções de material pulverizado de cor branca, com massa igual a 416g (quatrocentos e dezesseis gramas) e 1 (uma) porção de material pulverizado de cor branca, acondicionados em embalagem plástica de cor preta, com massa igual a 22 g (vinte e dois gramas), todos testados positivamente para cocaína, vide Laudo de Perícia Criminal – Constatação de Drogas.
QUARTA IMPUTAÇÃO
Insurge dos autos que, nas mesmas condições de hora e lugar, EDUARDO ETERNO DA COSTA, agindo de forma livre e voluntária, corrompeu menor de 18 (dezoito) anos, in casu, Luiz Fernando da Silva (DN: 12/03/2007, 16 anos à época dos fatos), com ele praticando o tráfico de drogas, consoante Registro de Atendimento Integrado nº 34683436 e BOC nº 07/2024.
NARRATIVA FÁTICA
Segundo consta, policiais do Grupo de Patrulhamento Tático (GPT) estavam em patrulhamento de rotina na GO 151, neste município, quando deram ordem de parada a DIVINO DOS REIS GOMES NETO, que conduzia uma motoneta, Placa OMY6726, tendo como passageiro o adolescente Luiz Fernando da Silva.
Na sequência, ao realizarem a busca pessoal dos indivíduos, encontraram com Luiz Fernando 01 (um) tablete de maconha, com massa bruta de 01 kg (um quilograma).
Ao ser questionado sobre a origem das drogas, o adolescente informou que teria adquirido as substâncias ilícitas com EDUARDO ETERNO DA COSTA, conhecido da guarnição, pelo valor de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais).
Ato contínuo, os agentes deram início a diligências no sentido de localizar o distribuidor dos entorpecentes, logrando êxito em encontrá-lo posteriormente.
Ao ser abordado, EDUARDO ETERNO informou que fez a venda para o adolescente e que, em sua residência, havia mais drogas, razão pela qual os policiais foram até o local, ocasião em que lá encontraram uma balança de precisão, um pedaço grande petrificado de cocaína, além de porções distribuídas de cocaína.
Diante da situação, foi realizada a prisão em flagrante do denunciado, o qual foi encaminhado à presença da autoridade policial para as providências de praxe.. (…).”
Recebida a denúncia no dia 28/05/2024 (mov. 100), o processo seguiu os seus trâmites regulares, culminado com a sentença prolatada no dia 02/09/2024, pelo Magistrado Vinícius de Castro Borges, que julgou parcialmente procedente o pedido contido na inicial acusatória, absolveu Divino dos Reis Gomes Neto, da prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006 e condenou EDUARDO ETERNO DA COSTA nas sanções do art. 33, caput, c/c art. 40, inciso VI, ambos da Lei nº 11.343/2006, à pena de 09 (nove) anos, 04 (quatro) meses e 08 (oito) dias de reclusão, mais 1.070 (mil e setenta) dias-multa, em regime fechado, incabível a substituição da pena e o Sursis processual, negado o direito de recorrer em liberdade, mantida a prisão preventiva do sentenciado, deixando de fixar valor mínimo indenizatório (mov. 179).
Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação (mov. 185) e, em suas razões pugnou, preliminarmente, a) invalidade absoluta e desentranhamento da prova por inobservância dos requisitos dos arts. 157, 226 e 564, inciso IV, todos do Código de Processo Penal; b) nulidade das provas obtidas a partir da abordagem domiciliar sem mandado judicial, com entrada forçada, sem autorização ou situação de flagrante delito. No mérito, requereu c) a absolvição do apelante por ausência ou insuficiência probatória com base no art. 386, incisos V e VII, do Código de Processo Penal; d) a readequação das circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do Código Penal, nos termos do art. 42, da Lei nº 11.343/2006; e) a revisão da pena imposta com a devida individualização das condutas e f) concessão da justiça gratuita (mov. 211).
Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (mov. 216).
A Procuradoria-Geral de Justiça, representada pelo Dr. Umberto Machado de Oliveira opinou pelo conhecimento e parcial provimento do apelo (mov. 222).
É o relatório.
Goiânia, hora e data da assinatura eletrônica.
Des. Adegmar José Ferreira
Relator
APELAÇÃO CRIMINAL
Número: 5162507-21.2024.8.09.0011
Comarca: Porangatu
Apelante: Eduardo Eterno da Costa (preso)
Apelado: Ministério Publico
Relator: Des. Adegmar José Ferreira
VOTO
Trata-se de apelação criminal interposta por EDUARDO ETERNO DA COSTA, em desprestígio da sentença que o condenou nas sanções do art. 33, caput,, c/c art. 40, inciso VI, ambos da Lei nº 11.343/2006, à pena de 09 (nove) anos, 04 (quatro) meses e 08 (oito) dias de reclusão, mais 1.070 (mil e setenta) dias-multa, em regime fechado, incabível a substituição da pena e o Sursis processual, negado o direito de recorrer em liberdade, mantida a prisão preventiva do sentenciado, deixando de fixar valor mínimo indenizatório (mov. 179).
Em suas razões, o defensor do acusado pugna, preliminarmente: a) invalidade absoluta e desentranhamento da prova por inobservância dos requisitos dos arts. 157, 226 e 564, inciso IV, todos do CPP; b) nulidade das provas obtidas a partir da abordagem domiciliar sem mandado judicial, com entrada forçada, sem autorização ou situação de flagrante delito. No mérito, requereu c) a absolvição do apelante por ausência ou insuficiência probatória com base no art. 386, incisos V e VII, do CPP; d) a readequação das circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do CP, nos termos do art. 42, da Lei 11.343/2006; e) a revisão da pena imposta com a devida individualização das condutas e f) concessão da justiça gratuita (mov. 211).
ADMISSIBILIDADE: Presentes os pressupostos recursais objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso.
PRELIMINARES:
1) Nulidade das provas decorrentes da abordagem pessoal e domiciliar por ausência de justa causa:
Ab initio, cumpre analisar a alegada nulidade da busca pessoal e domiciliar por ausência de justa causa, matéria que, se acolhida, prejudica o exame das demais questões suscitadas no recurso.
No ordenamento jurídico brasileiro, a busca pessoal possui supedâneo nos arts. 240, § 2º e 244 do Código de Processo Penal, que permite sua realização, sem necessidade de mandado judicial, apenas em situações específicas, a saber: quando há prisão em flagrante; diante de fundada suspeita de que o indivíduo esteja portando arma proibida ou objetos que constituam corpo de delito; ou, ainda, quando a busca for determinada no curso de busca domiciliar.
A “fundada suspeita”, elemento nuclear autorizador da medida, exige a presença de dados objetivos e concretos que justifiquem a invasão na privacidade ou da intimidade do indivíduo, direitos fundamentais constitucionalmente assegurados (artigo 5º, X, CF). Por essa razão, “não satisfazem a exigência legal meras conjecturas ou impressões subjetivas (intuição policial, por exemplo), mas elementos e circunstâncias concretas, objetivas, capazes e suficientes para motivar a conduta policial”1.
Ademais, nota-se que o art. 244 do Código de Processo Penal, não autoriza buscas pessoais praticadas como "rotina" ou "praxe" do policiamento ostensivo, com finalidade preventiva e motivação exploratória, mas apenas buscas pessoais com finalidade probatória e motivação correlata.
Nesse sentido, haverá justa causa quando está presente a causa provável, que se constitui pelo “suporte fático probatório externo independente da subjetividade do agente público, capaz de autorizar a inferência válida e robusta sobre a probabilidade de ocorrência de uma conduta criminalizada, justificadora da restrição de Direitos Fundamentais […] por isso, a ação de agentes da lei em flagrante delito e/ou de apuração de situações potencialmente criminosas (revista, abordagens busca e apreensão pessoal etc.) depende da existência e da comprovação posterior (à cargo dos agentes da Lei) de indicadores objetivos à priori, vedada, a aposta meramente subjetiva (intuição, tipo policial etc.), sob pena de ilegalidade e, assim, de ilicitude dos meios adquiridos”2.
No caso em apreço, não se identificam elementos probatórios objetivos e suficientes para fundamentar a justa causa da busca pessoal e domiciliar realizadas.
Com efeito, verifica-se, a partir dos depoimentos inquisitoriais e judiciais dos próprios agentes policiais responsáveis pela diligência (mov. 146), que a busca pessoal e o ingresso na residência foi efetuado com base em critérios manifestamente inadequados à configuração das fundadas razões exigidas pelo ordenamento jurídico. Entre tais critérios utilizados pelos policiais militares, destaca-se o tirocínio dos policiais ao afirmarem que “Acharam estranho, pois eram dois jovens, um deles estava até de short, naquele horário e resolveram abordá-los”.
Para início de tudo, é pertinente rememorar os termos do cenário fático acolhido dos autos, do qual consta da denúncia que “consta, policiais do Grupo de Patrulhamento Tático (GPT) estavam em patrulhamento de rotina na GO 151, neste município, quando deram ordem de parada a DIVINO DOS REIS GOMES NETO, que conduzia uma motoneta, Placa OMY6726, tendo como passageiro o adolescente Luiz Fernando da Silva. Na sequência, ao realizarem a busca pessoal dos indivíduos, encontraram com Luiz Fernando 01 (um) tablete de maconha, com massa bruta de 01kg (um quilograma). Ao ser questionado sobre a origem das drogas, o adolescente informou que teria adquirido as substâncias ilícitas com EDUARDO ETERNO DA COSTA, conhecido da guarnição, pelo valor de R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais)”.
Os agentes, quando do patrulhamento de rotina, avistaram o condutor Divino dos Reis conduzindo uma motoneta, placa: OMY-6726, com o menor na garupa. Consta que, os policiais ao visualizarem que a motocicleta estava sendo conduzida por dois jovens resolveram abordá-los, motivando a atuação policial.
Em seguida, os agentes iniciaram buscas no sentido de localizar o distribuidor dos entorpecentes, após o que o encontraram e, ao ser abordado “EDUARDO ETERNO informou que fez a venda para o adolescente e que, em sua residência, havia mais drogas, razão pela qual os policiais foram até o local, ocasião em que lá encontraram uma balança de precisão, um pedaço grande petrificado de cocaína, além de porções distribuídas de cocaína.”
Dessarte, conclui-se que a legitimidade da busca domiciliar restou comprometida pela ausência de causa provável lastreada em elementos objetivos, não podendo ser sustentada quando baseada exclusivamente em critérios de ordem subjetiva — como no caso dos autos — ao fundamentar a abordagem inicial por achar estranho dois jovens em uma motocicleta e o ingresso domiciliar sem mandado e sem prévia investigação.
A despeito da questão preliminar de ilicitude de provas ocorrida fora das hipóteses legais, requerida pelo apelante, merece guarida pelas razões expostas a seguir.
Conforme se extrai do caderno processual, o Policial Militar condutor Adailton de Souza Lima, quando inquirido em juízo (mídia de mov. 146, assim relatou a dinâmica dos fatos:
“(...) A equipe policial realizava um bloqueio na rodovia GO – 151, Rodovia Estadual que fica entre a cidade de Porangatu e Mutunópolis, estávamos fazendo esse bloqueio lá, oportunidade em que abordaram o acusado Divino e o menor L.F.S. Realizaram buscas pessoais nos abordados e localizaram na cintura de L.F.S. um tablete de maconha, com aproximadamente 01kg (um) quilo de maconha. Questionado onde adquiriu o entorpecente, o menor L.F.S. disse ter adquirido de 'Ponim' (Eterno). Pagou R$ 3.500,00 pela maconha. Foi L.F.S. quem disse ter adquirido a droga. Divino disse aos policiais que não sabia que L.F.S. trazia droga consigo. Foram atrás do 'Ponim', sujeito já conhecido da polícia em Porangatu como traficante de drogas. O encontraram por acaso em numa oficina de carros. O questionaram se os fatos narrados por L.F.S. eram verdadeiros e ele confirmou que sim. O questionaram se haviam mais drogas em sua casa e ele confirmou que sim. Foram até a casa dele e lá encontraram uma balança de precisão e cinco porções de cocaína. Diante disso, o acusado foi conduzido ao hospital e à delegacia de polícia. (...) A abordagem ocorreu por volta das 15h, aproximadamente. O bloqueio que faziam é atividade policial corriqueira, não havia motivo específico. Depois de prenderem Divino e o menor, realizaram patrulhamentos em busca do 'Ponim'. Bateram na casa dele num primeiro momento, mas não havia ninguém no local. Receberam informações que ele havia saído para ir a uma oficina para mexer em seu carro. Isso aconteceu cerca de 30 a 40 minutos após a abordagem na rodovia. Estavam empenhados na ocorrência 04 policiais. Divino estava na viatura, mas o menor não. Este foi entregue ao CPU. Quem conduziu Eduardo à delegacia foi sua equipe e não Tenente Beltrão. Sabe que existe GPS nas viaturas, mas não tem acesso. Não sabe se os GPS das viaturas estão desativados. Não sabe quem acessa e mexe no GPS da viatura. Nem sabe onde fica localizado o dispositivo.” (mídia digital de mov. 146 – dep._1_adailton_de_lima.mp4). Negritei.
Na sequência, o Policial Militar Adiel Carvalho da Silva, também inquirido em juízo (mídia de mov. 146), afirmou:
"(...) Estavam fazendo um bloqueio na rodovia GO-151, Rodovia Estadual que fica entre a cidade de Porangatu e Mutunópolis, aí quando avisamos essa motocicleta vindo no sentido Porangatu-Mutunópolis com dois indivíduos. Acharam estranho, pois eram dois jovens, um deles estava até de short, naquele horário e resolveram abordá-los. Realizaram buscas pessoais nos dois e encontraram em posse do passageiro menor L.F.S. um tablete de maconha na cintura. Questionado, L.F.S. os informou que havia adquirido de 'Ponim', Eduardo, vulgo ‘Ponin’, indivíduo conhecido no meio policial por ser traficante de drogas. Diante disso, foram até a casa de 'Ponim', mas não havia ninguém. Foram informados que ele havia saído para trocar os pneus do carro. Realizaram patrulhamentos e o encontraram e o abordaram. Questionado, ele admitiu ter vendido a maconha ao menor L.F.S. Questionado, informou que havia mais drogas mantidas em depósito na sua casa. Não havia mais maconha lá, apenas cocaína. Voltaram até a residência dele e realizaram buscas no local. Encontraram dentro de um sofá cocaína e uma balança de precisão. Noutro cômodo encontraram outras porções de cocaína petrificadas. Com ele foi encontrada certa quantia em dinheiro. O menor os informou que pagou R$ 3.500,00 pela maconha. Divino afirmou que havia pegado o menor em Mutunópolis. Ele disse que viu o menor entrar na casa de ‘Ponim’, mas não o viu trazendo nada de volta. A droga não transparecia volume no corpo do menor. Ele é magrinho e dissimulou bem. Os bloqueios em rodovias são rotineiros na atividade policial e objetivam localizar e apreender drogas e armas. Não recorda do horário em que ocorreu a abordagem na rodovia. Foi no período da tarde. Provavelmente após as 14h. Abordaram o Eduardo logo após. Não sabe o horário certo. Não se recorda quanto tempo depois abordaram o Eduardo, mas levou algum tempo, pois tiveram que realizar patrulhamentos na cidade até localizá-lo. Não consegue quantificar quanto tempo levou. Na viatura policial estavam os quatro integrantes policiais. Não se recorda se foi informado aos presos o direito ao silêncio. Pessoalmente não disse nada e não sabe se o comandante da guarnição o fez. É o terceiro homem na viatura. Eduardo autorizou a entrada na sua residência. Quem conduziu Eduardo à delegacia foi sua guarnição, não foi o Tenente Beltrão". (mídia digital de mov. 146 – dep._2_adiel_carvalho.mp4). Negritei.
A testemunha Daniel Rodrigues Simão, policial militar, alegou em audiência de instrução e julgamento que (mov. 146):
“(…) Nós estávamos fazendo um bloqueio na GO - 151. A gente deparou com essa motocicleta com dois rapazes, um menor e um maior de idade. O menor estava com essa droga na cintura. Indagamos ele de quem tinha comprado. Ele nos relatou. Fomos até as proximidades da residência do ‘Ponim’, que já é um conhecido da equipe, pela prática de tráfico na cidade. Inclusive, já tem até passagem. Chegamos lá, não tinha ninguém. Até não me recordo bem exatamente quem foi. Falou que não estava lá e que ele tinha ido arrumar algo no carro, se não me engano pneu, alinhamento, balançamento, algo o tipo. Aí a equipe de pronto deslocou, no sentido de localizar ele, porque aqui na cidade não tem muito loja desse seguimento. Conseguimos localizá-lo logo em seguida. Indagamos o mesmo sobre a situação. Ele confirmou, nos levou até a casa dele. Lá foi encontrado mais droga, cocaína, se não me engano. Uma balança de precisão. E uma certa quantia de dinheiro em posse dele. Certo.
Esse um quilo de maconha que estava na cintura do menor, era visível? Se passasse pela gente na moto, se não tivesse parado, não dava para ver eu creio. Mas como ele estava fazendo bloqueio, já havia parado alguns veículos, aí faz a busca pessoal. Quando ele desceu da garupa, ficou bem sobressalente. Ele é bem magro, o rapaz. Quem a gente abordou, bem magro mesmo. Qualquer coisa que você colocasse na cintura, ia dar um volume bem alto. (…) O senhor sabe me dizer qual o horário dessa abordagem ocorrida na GO? Ah, doutor. Foi no período de vespertino, mas o horário é exatamente... Não, mais ou menos. Não. De cabeça aqui, se eu falar, vou estar sendo leviano. Falar mais ou menos, eu não sei falar para você, não. Dezesseis e trinta, mais ou menos, não, né? Pode ser que sim.
Porque eu sei que foi no período de vespertino. Mas o horário precisamente, eu não sei precisar para o senhor, não. Certo.
O senhor é o qual da viatura, da guarnição? Sou o motorista. Sou o motorista. O segurança da viatura.
O senhor é o motorista. Certo. No momento da bordagem do Eduardo, na oficina, quem estava junto com o senhor? A equipe toda.
Equipe toda? Certo. No momento da bordagem, foi dado o direito, tanto do Eduardo, como do Divino, como do Luiz, de permanecer em silêncio? Sim, senhor. Hã? Sim, senhor, de direito. Todos eles têm, só que a gente faz a nossa entrevista durante a bordagem. Aí, sabe, ao infrator, o autor, falar, confirmar ou não. No caso, ele confirmou.
Certo, mas... Mas com quem a gente pegou a droga, foi com ele, né? Certo. O senhor Eduardo autorizou vocês a entrarem na residência dele? Positivo, ele estava junto com a gente. Não, sim.
Ele autorizou vocês a entrarem na residência dele? Positivo. Vocês filmaram, gravaram ou pegaram algum termo de depoimento de autorização? Eu creio que não. Certo.
Além de vocês, alguém participou dessa bordagem? Ou das viaturas? Hã? Da bordagem, não. (…).” (mídia digital de mov. 146 – dep._3_daniel_rodrigues.mp4). Negritei.
Em interrogatório judicial, o processado Eduardo Eterno da Costa negou a acusação, afirmando que não possui conhecimento dessa droga apreendida e que foi abordado dentro de uma oficina e que sofreu agressões dentro da viatura e que não autorizou a entrada dos policiais em sua casa, pelo que retiraram as chaves de seu bolso e quando chegou em sua residência já haviam 02 (dois) policiais em sua residência, o Sr. Gerson e o Sr. Adiel, aduzindo que não fez busca alguma de drogas em sua moradia e que sofreu ameaças com armas na cabeça, choques na cabeça, nos órgãos genitais, tudo para fazer confessar que a droga seria dele (mídia de mov. 148).
De logo, registro que, diante do contexto probatório produzido nos autos, evidencia-se a ocorrência de ilegalidade na abordagem do condutor da motocicleta e do passageiro (menor de idade), bem assim na efetivação da busca pessoal e adentramento domiciliar do processado, porquanto, não havia elementos preliminares, indicativos da ocorrência de situação de flagrante ou de prática criminosa aptos a caracterizar fundadas razões (justa causa) para a adoção de tal medida extrema.
Segundo o disposto no art. 244 do Código de Processo Penal, “A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar.”
Neste diapasão, é necessário, pois, que a suspeita seja fundada em algum dado concreto, que justifique, objetivamente, a invasão na privacidade ou na intimidade do indivíduo (art. 5º, X, da Constituição Federal), razão pela qual “não satisfazem a exigência legal meras conjecturas ou impressões subjetivas (intuição policial, por exemplo), mas elementos e circunstâncias concretas, objetivas, capazes e suficientes para motivar a conduta policial” (OLIVEIRA, Alessandro José Fernandes de. Estudos avançados de direito aplicado à atividade policial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014, p.55).
Nesse cenário, nota-se que o art. 244 do Código de Processo Penal, não autoriza buscas pessoais praticadas como “rotina” ou “praxe” do policiamento ostensivo, com finalidade preventiva e motivação exploratória, mas apenas buscas pessoais com finalidade probatória e motivação correlata.
Depreende-se, portanto, que a abordagem inicial do condutor da motocicleta e do carona e a posterior revista pessoal foram justificadas com base em alegação genérica de que o condutor e o passageiro menor que estaria de bermuda no horário da abordagem, por volta das 16:00h, seriam bastante jovens, o que por si só, não configura fundada suspeita apta a validar a busca pessoal.
Destarte, sem embargo da inequívoca boa-fé dos agentes públicos no cumprimento de seu dever funcional, é forçoso reconhecer que a atuação policial, no caso em tela, não reuniu os requisitos legais autorizadores. A referência a elementos subjetivos, quando desacompanhada de circunstâncias concretas que a qualifiquem, não se mostra suficiente para legitimar a excepcional restrição a direitos fundamentais, impondo-se o reconhecimento da nulidade da prova obtida e, por consectário lógico, de todas aquelas dela derivadas.
No ponto, o colendo Superior Tribunal de Justiça, há algum tempo, exige, em termos de standard probatório para a busca pessoal e/ou veicular sem mandado judicial a existência de fundada suspeita (a sedimentar indiscutível justa causa) – lastreada em juízo de probabilidade, descrita, portanto, com a maior precisão possível e aferível de modo objetivo e devidamente justificada pelos indícios e circunstâncias do caso concreto para assim, satisfazer a exigência normativo-constitucional, à mingua de intuições e impressões subjetivas, intangíveis e não demonstráveis de maneira hialina e concreta, assim como seria a hipótese de mero tirocínio policial (RHC n. 158.580/BA, Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 25/04/2022).
Por consectário lógico e em decorrência da Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, também estão maculadas as provas colhidas no domicílio do acusado e aquelas derivadas do inquérito policial, que embasaram o oferecimento da denúncia, fato que "enseja sua absolvição do crime de tráfico de drogas, por ausência de materialidade delitiva" (AgRg no HC 749950/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 02/08/2022, Dje 08/08/2022).
Registre-se que a instrução processual não convalida as demais provas, pois ilícitas na origem, vicia-se o restante dela decorrente, nos termos do art. 157, § 1º, do Código de Processo Penal. Assim, considerando que as provas coletadas por meio da busca pessoal e domiciliar são ilícitas, forçosa a absolvição do apelante Eduardo Eterno da Costa do crime previsto no art. 33, caput, c/c art. 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06, nos termos do art. 386, inciso II, do Código de Processo Penal.
O Supremo Tribunal Federal possui idêntica compreensão sobre a matéria:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. MATÉRIA CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. BUSCA PESSOAL E DOMICILIAR. ATITUDE SUSPEITA DOS ACUSADOS AO AVISTAR A VIATURA. ORDEM CONCEDIDA, DE OFÍCIO, PARA ABSOLVER O PACIENTE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. No julgamento do RE 603.616/RO (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 10.05.2016, Tema 280 da Repercussão Geral), o Plenário do STF fixou a seguinte tese: “[a] entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados.” 2. No presente caso, o acórdão de origem diverge da tese fixada no Tema 280, uma vez que não há fundadas razões a indicar a ocorrência de situação de flagrante. Precedentes. 3. A inexistência de argumentação apta a infirmar o julgamento monocrático conduz à manutenção da decisão recorrida. 4. Agravo regimental desprovido”. (RHC 225459 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 20-05-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 13-08-2024 PUBLIC 14-08-2024).
No mesmo sentido, é pacífico o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:
“PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. DECISÃO MANTIDA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. BUSCA PESSOAL. IRREGULARIDADE NA ATUAÇÃO DOS AGENTES ESTATAIS. RECONHECIMENTO DE NULIDADE. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS PRÉVIOS DA SITUAÇÃO DE FLAGRÂNCIA. AGRAVADO APENAS PORTAVA UMA BOLSA EM LOCAL CONHECIDO COMO PONTO DE TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. AGRAVO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL DESPROVIDO. 1. No exame de casos análogos, esta Corte Superior tem adotado entendimento no sentido de que a busca pessoal e veicular são disciplinadas pela norma constante nos arts. 240, § 2º, e 244, ambos do Código de Processo Penal – CPP. Para ambas, exige-se fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito. No caso em apreço, verifica-se que não foram observados os pressupostos exigidos para que a busca pessoal seja reputada legal, sendo evidente a irregularidade na atuação dos agentes estatais. Isso porque, consoante consta dos autos, os policiais militares estavam em patrulhamento no local que o agravado se encontrava, pois era um local conhecido para utilização de tráfico de drogas na região, e, devido estar portando uma bolsa, os policiais acharam suspeito e fizeram a busca pessoal no acusado, sendo encontrados 3 buchas de maconha, 31 pinos de cocaína e 26 pedras de crack, totalizando aproximadamente 98 g de substâncias entorpecentes. 2. Nesse sentido, não há informação nos autos de que haviam indícios de traficância ou mesmo investigação prévia, além do fato do agravado portar uma bolsa em local conhecido como ponto de tráfico de drogas, sendo certo que a recente jurisprudência deste STJ é no sentido de que: 'Não satisfazem a exigência legal, por si sós, meras informações de fonte não identificada (e. g. denúncias anônimas) ou intuições e impressões subjetivas, intangíveis e não demonstráveis de maneira clara e concreta, apoiadas, por exemplo, exclusivamente, no tirocínio policial. Ante a ausência de descrição concreta e precisa, pautada em elementos objetivos, a classificação subjetiva de determinada atitude ou aparência como suspeita, ou de certa reação ou expressão corporal como nervosa, não preenche o standard probatório de 'fundada suspeita' exigido pelo art. 244 do CPP' (RHC n. 158.580/BA, Relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 25/4/2022). Nesse contexto, não restou evidenciada a justificativa para a abordagem, a qual culminou na apreensão de entorpecentes (estado de flagrância), vislumbrando-se ilegalidade na atuação dos agentes, uma vez que não estava amparada em circunstâncias concretas. 3. Presente a existência de flagrante constrangimento ilegal que autoriza a concessão da ordem para reconhecer a nulidade da busca pessoal realizada e de todas as provas dela decorrente. Assim, reconhecida a ilegalidade da busca pessoal promovida pelos policiais militares, devem ser reconhecidas como ilícitas as provas do crime de tráfico de drogas colhidas no bojo do Processo n. 5082267-29.2023.8.13.0024/MG. 4. Concedida a ordem de habeas corpus para fosse reconhecida a nulidade do flagrante, e, por conseguinte, das provas obtidas em decorrência do ato, expedindo-se alvará de soltura em favor do ora agravado. 5. Agravo regimental do Ministério Público de Minas Gerais desprovido.” (STJ, AgRg no HC n. 827.106/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 9/10/2023, DJe de 11/10/2023).
A propósito, julgados desta Corte:
“HABEAS CORPUS. POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO. TRANCAMENTO DO PROCESSO CRIME. POSSIBILIDADE. I – BUSCA PESSOAL. No caso, não foi adequadamente demonstrado, além de qualquer dúvida mínima, que os elementos relacionados à prática de infração penal obtiveram-se de maneira lícita. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) há algum tempo exige a existência de fundada suspeita, lastreada em juízo de probabilidade, para a busca pessoal sem mandado judicial, com base em indícios e circunstâncias concretas. Portanto, a revista pessoal e domiciliar realizada pelos policiais militares, baseada apenas em atitude suspeita, sem sequer definir-se o que a configuraria, é de ser considerada, de modo incontrovertível, ilegal, pois não havia justa causa evidente para tais diligências. Além disso, a situação fática do paciente não indicava envolvimento em tráfico de drogas, tornando a abordagem injustificada à luz da lei. (Omissis). ORDEM CONHECIDA E CONCEDIDA, PARA TRANCAR O PROCESSO-CRIME.” (TJGO, Habeas Corpus Criminal 5594513-33.2023.8.09.0049, Rel. Des. Adriano Roberto Linhares Camargo, 4ª Câmara Criminal, julgado em 09/10/2023, DJe de 09/10/2023).
Diante do caso fático, não ficou sequer justificada a busca pessoal, já que caso considerada a versão dada pelos militares, deve ser realçado que o simples fato de o condutor Divino ser jovem, e trafegar em horário vespertino, e o menor que o acompanhava na garupa estar de bermuda, não são fatores suficientes para se proceder à devassa pessoal, ausente o apontamento de qualquer outro elemento objetivo relativo à existência de fundadas suspeitas quanto à prática de crime.
Consabidamente, as circunstâncias que antecederem a busca pessoal deve evidenciar, de modo satisfatório e objetivo, as fundadas razões que justifiquem tal diligência e a eventual prisão em flagrante do suspeito, as quais, portanto, não podem derivar de impressões subjetivas dos agentes policiais, apenas relacionadas ao fato de o abordado ser jovem ou seu passageiro estar de bermuda, porque causou ao agente uma impressão subjetiva.
Sendo assim, patente a ocorrência de nulidade das provas, tendo em vista que o material probatório amealhado, sob o crivo do contraditório, não exprime a lisura do procedimento policial, permanecendo incerteza sobre as fundadas razões que levaram a busca pessoal e domiciliar.
Desta feita, sem dúvidas, inexistindo investigações prévias nem dados ou elementos concretos indicativos de crime praticado pelo acusado, tem-se por ilícita a prova obtida, de forma que a ilicitude implica a nulidade absoluta do ato e contamina as demais provas produzidas, tornando-se impositiva a aplicação do art. 386, VII, Código de Processo Penal.
ANTE O EXPOSTO, desacolho o parecer Ministerial de Cúpula, conheço do recurso e dou-lhe provimento para declarar a nulidade das provas obtidas, bem como as delas derivadas, por ausência de situação flagrancial evidente, e, de consequência, absolvo o apelante EDUARDO ETERNO DA COSTA, nos termos do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Prejudicadas as demais teses.
Expeça-se alvará de soltura em favor do apelante, se por outro motivo não estiver preso.
É como voto.
Goiânia, hora e data da assinatura eletrônica.
Des. Adegmar José Ferreira
Relator
APELAÇÃO CRIMINAL
Número: 5162507-21.2024.8.09.0011
Comarca: Porangatu
Apelante: Eduardo Eterno da Costa (preso)
Apelado: Ministério Publico
Relator: Des. Adegmar José Ferreira
EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. BUSCA PESSOAL E DOMICILIAR SEM FUNDADA SUSPEITA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. PROVAS ILÍCITAS. ABSOLVIÇÃO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação penal interposta contra sentença que condenou o réu pela prática do crime previsto no art. 33, caput, c/c art. 40, VI, ambos da Lei nº 11.343/2006, fixando pena de nove anos, quatro meses e oito dias de reclusão, mais 1.070 dias-multa, em regime inicial fechado, sem possibilidade de substituição ou sursis processual. A defesa alegou a nulidade das provas obtidas a partir da abordagem domiciliar sem mandado judicial e sem justa causa, além da ausência de elementos suficientes para corroborar.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há duas questões em discussão: (i) saber se a busca pessoal e domiciliar realizada por agentes policiais foi lícita; e (ii) saber se as provas derivadas da busca deverão ser declaradas ilícitas, acarretando a absolvição do acusado.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A busca pessoal e domiciliar ocorreu sem justa causa, pois foi realizada com base em critérios subjetivos e sem elementos concretos que indicassem situação flagrancial ou suspeita fundada, tornando ilícitas as provas obtidas.
4. A inexistência de investigação prévia ou outros objetivos que justifiquem a abordagem evidencia a ilegalidade da medida policial, tornando ilícitas as provas obtidas e as derivadas, conforme a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada.
5. A nulidade das provas exclui a materialidade delitiva e impõe a absolvição do réu, nos termos do art. 386, VII, do Código de Processo Penal.
IV. DISPOSITIVO E TESE
6. Recurso conhecido e provido.
Tese de julgamento: “1. A busca pessoal e domiciliar sem justa causa e sem elementos objetivos que indiquem situação flagrancial configura nulidade da prova. 2. A ilicitude da prova obtida de forma irregular contamina as demais produções produzidas (Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada), ensejando a absolvição do réu por ausência de materialidade delitiva.”
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CPP, arts. 157 e 244 e 386, VII; Lei 11.343/2006, arts. 33 e 40, VI.
Jurisprudência relevante: STJ, RHC n. 158.580/BA, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, j. 25/04/2022; STJ, AgRg no HC n. 827.106/MG, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, j. 10/09/2023; STF, RHC 225459 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, Segunda Turma, j. 20/05/2024.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os integrantes da Segunda Turma Julgadora de sua Quarta Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, na sessão presencial, à unanimidade de votos, desacolher o parecer ministerial de cúpula, conhecer dar provimento para absolver o apelante, determinando a expedição do alvará de soltura em favor deste, para que seja colocado em liberdade, se por outro motivo não deva permanecer preso, nos termos do voto do relator, proferido no extrato da ata de julgamento.
Votaram com o relator o Desembargador Sival Guerra Pires e o Desembargador Linhares Camargo.
Presidiu a sessão de julgamento o Desembargador Linhares Camargo.
Procuradoria-Geral de Justiça representada conforme extrato da ata.
Assinado e datado digitalmente.
Des. Adegmar José Ferreira
Relator
1OLIVEIRA, Alessandro José Fernandes de. Estudos avançados de direito aplicado à atividade policial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014, p.55
2MORAIS DA ROSA, Alexandre et. al. Fishing Expedition e encontro fortuito de proves na busca e apreensão 2ª ed. Florianópolis, Ed. Emais, 2022, p. 12-13.
EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. BUSCA PESSOAL E DOMICILIAR SEM FUNDADA SUSPEITA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. PROVAS ILÍCITAS. ABSOLVIÇÃO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação penal interposta contra sentença que condenou o réu pela prática do crime previsto no art. 33, caput, c/c art. 40, VI, ambos da Lei nº 11.343/2006, fixando pena de nove anos, quatro meses e oito dias de reclusão, mais 1.070 dias-multa, em regime inicial fechado, sem possibilidade de substituição ou sursis processual. A defesa alegou a nulidade das provas obtidas a partir da abordagem domiciliar sem mandado judicial e sem justa causa, além da ausência de elementos suficientes para corroborar.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há duas questões em discussão: (i) saber se a busca pessoal e domiciliar realizada por agentes policiais foi lícita; e (ii) saber se as provas derivadas da busca deverão ser declaradas ilícitas, acarretando a absolvição do acusado.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A busca pessoal e domiciliar ocorreu sem justa causa, pois foi realizada com base em critérios subjetivos e sem elementos concretos que indicassem situação flagrancial ou suspeita fundada, tornando ilícitas as provas obtidas.
4. A inexistência de investigação prévia ou outros objetivos que justifiquem a abordagem evidencia a ilegalidade da medida policial, tornando ilícitas as provas obtidas e as derivadas, conforme a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada.
5. A nulidade das provas exclui a materialidade delitiva e impõe a absolvição do réu, nos termos do art. 386, VII, do Código de Processo Penal.
IV. DISPOSITIVO E TESE
6. Recurso conhecido e provido.
Tese de julgamento: “1. A busca pessoal e domiciliar sem justa causa e sem elementos objetivos que indiquem situação flagrancial configura nulidade da prova. 2. A ilicitude da prova obtida de forma irregular contamina as demais produções produzidas (Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada), ensejando a absolvição do réu por ausência de materialidade delitiva.”
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CPP, arts. 157 e 244 e 386, VII; Lei 11.343/2006, arts. 33 e 40, VI.
Jurisprudência relevante: STJ, RHC n. 158.580/BA, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, j. 25/04/2022; STJ, AgRg no HC n. 827.106/MG, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, j. 10/09/2023; STF, RHC 225459 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, Segunda Turma, j. 20/05/2024.
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