Ministério Público Do Estado Do Paraná x Cleisson De Souza Dias Dos Santos e outros
ID: 257845596
Tribunal: TJPR
Órgão: 7ª Vara Criminal de Curitiba
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0009201-19.2024.8.16.0013
Data de Disponibilização:
16/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JONAS JESUS BELMONTE
OAB/SC XXXXXX
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Vistos e examinados Autos de n. 0009201-19.2024.8.16.0013 Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Réus: RONI MARCIO MACHADO, brasileiro, autônomo, portador da cédula de identidade R.G. n. 2.425…
Vistos e examinados Autos de n. 0009201-19.2024.8.16.0013 Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Réus: RONI MARCIO MACHADO, brasileiro, autônomo, portador da cédula de identidade R.G. n. 2.425.072-5/PR, nascido em Rio Negro/PR, filho de Carmen Jordina dos Santos Machado e de José Celso Machado, residente e domiciliado na Rua Gustavo Arthur Cantelle, n. 228, Bairro Tindiquera, Araucária/PR; CLEISSON DE SOUZA DIAS DOS SANTOS, brasileiro, barbeiro, portador da cédula de identidade R.G. n. 12.436.876-6/PR, nascido em Corumbataí do Sul/PR, filho de Clarice de Souza Dias e de José Agnaldo dos Santos, residente e domiciliado na Rua José Felipe Meira, n. 57, Bairro Cidade Industrial de Curitiba, Curitiba/PR RONI MÁRCIO MACHADO e CLEISSON DE SOUZA DIAS DOS SANTOS foram denunciados pela prática, em tese, dos crimes previstos pelo artigo 171, parágrafo 4º (1º, 2º, 3º e 4º fatos), e pelo artigo 158, parágrafo 1º (5º fato), na forma do artigo 69, todos do Código Penal, de acordo com os fatos narrados na denúncia de mov. 15.1. O inquérito policial se iniciou mediante portaria, lavrada em 24 de maio de 2024 (cf. mov. 1.1). A denúncia foi recebida no dia 7 de agosto de 2024 (cf. mov. 27.1). Devidamente citados (cf. movs. 63.1 e 64.1), os réus apresentaram resposta à acusação (cf. mov.76.1). Ratificado o recebimento da denúncia (cf. mov. 78.1), foi designada audiência de instrução e julgamento, naqual foram ouvidas cinco vítimas. Em seguida, foram os réus interrogados (cf. movs. 118 e 172). A pedido da defesa (cf. movs. 118.1 e 128.1), foi determinado que o Posto Dois Irmãos e a Autoviação Sanjotur apresentassem as imagens das câmeras de segurança do dia 24 de maio de 2024 (cf. movs. 120.1 e 133.1); porém, responderam as empresas que não as tinham mais (cf. movs. 146.1 e 147.1). A pedido do Ministério Público (cf. mov. 136.1), foi determinada a remessa de imagens das câmeras de segurança no momento dos saques e de informações de compras, além da juntada dos antecedentes criminais dos acusados no Estado de Santa Catarina (cf. mov. 143.1). As respostas foram juntadas nos movs. 159.1-159.2, 164.1, 170.1, 181.1, 182.1- 182.2, 195.1-195.2 e 199.1 e os antecedentes criminais foram juntados ao feito nos movs. 145.1-145.4. O Ministério Público apresentou informações no mov. 202.1 e desistiu de outras diligências requeridas (cf. mov. 202.1). Em alegações finais (cf. mov. 244.1-244.3), o Ministério Público requereu a condenação dos acusados, tendo em vista existir nos autos provas da autoria e da materialidade dos delitos. Na mesma oportunidade, retificou a denúncia (cf. mov. 244.4). A defesa de Roni (cf. mov. 257.1) requereu a desclassificação do delito de extorsão para o crime de estelionato, o reconhecimento da participação de menor importância, a fixação da pena no mínimo, desconsiderando-se o aumento pela premeditação requerido pelo Ministério Público, e aplicando-se a regra do crime continuado. Pugnou, ademais, pela concessão da justiça gratuita. A defesa de Cleisson (cf. mov. 257.2) pediu a absolvição da imputação do delito narrado no 4º fato da denúncia, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, e a desclassificação do delito de extorsão para o crime de estelionato. Sucessivamente, requereu o reconhecimento da participação de menor importância e do crime continuado, a fixação da pena no mínimo, desconsiderando-se o aumento pela premeditação requerido pelo Ministério Público, e a concessão da justiça gratuita.Vieram-me os autos conclusos. Relatado o feito, decido. 1. FUNDAMENTAÇÃO Primeiramente, cumpre ressaltar que os réus se defendem dos fatos explicitados na exordial e houve mera retificação da denúncia quanto à data do 2º fato, que não importou em alteração da capitulação jurídica ou em qualquer nulidade (cf. mov. 244.4). No mais, a pretensão punitiva merece parcial acolhida. 1.1. DAS PROVAS PRODUZIDAS NOS AUTOS N. 0011878- 22.2024.8.16.0013 A investigação criminal foi iniciada a partir do boletim de ocorrência n. 130613/2024, o qual deu origem aos autos de inquérito policial n. 0009201-19.2024.8.1.0013. No dia 31 de janeiro 2024, o ofendido Inácio Fidelis Gomes, de 75 anos de idade, nas proximidades de sua residência, na Rua Ricardo Padovani Filho, foi abordado por dois homens que, a pretexto de dividir o valor de um suposto prêmio, solicitaram que a vítima efetuasse o saque de quantias em espécie para comprovar sua boa-fé. O ofendido realizou dois saques em estabelecimentos bancários distintos no montante de R$ 8.000,00 (oito mil reais) e entregou a quantia aos criminosos, que o distraíram e fugiram em posse do dinheiro. A vítima realizou reconhecimento fotográfico e indicou como autores do delito Cleisson de Souza Dias dos Santos e Roni Márcio Machado. A Autoridade Policial juntou relatório de investigação n. 3/2024, indicando outros crimes recentemente praticados pelas mesmas pessoas, utilizando-se de idêntico modus operandi, consistente em abordar vítimas idosas e desacompanhadas, que transitavam em via pública, próximos de suas residências ou agências bancárias. Um dos golpistas se aproximou e alegou dificuldades para receber o valor do prêmio – não possuía conta bancária ou ela estava bloqueada, em razãode alguma dívida vultosa. Em seguida, surgia um comparsa, simulando ser pessoa com conhecimento e recursos, a qual fingia desconfiar do bilhete e fazia contatos para confirmar se ele era legítimo. Após conquistar a confiança da vítima, o golpista em posse do bilhete oferecia uma parte do prêmio aos demais em troca da ajuda no saque, exigindo a retirada de valores previamente como garantia da boa-fé. Com o dinheiro em mãos, os golpistas despistavam a vítima e fugiam. Após diligências, os investigadores identificaram outros três fatos possivelmente cometidos pelos investigados. Conforme se verifica no boletim de ocorrência n. 2024/635257, o ofendido Nelson José da Silva, de 60 anos de idade, no dia 21/5/2024, foi abordado em condições similares às acima descritas, mas, diante do comportamento da vítima, passaram a ameaçá-la com uma arma de fogo para obter acesso ao seu aplicativo bancário; em seguida, realizaram transferências via PIX a outros comparsas, sendo duas delas direcionadas à empresa MELL APARECIDA RISSARDO LTDA., CNPJ 43.944.758/0001- 90, nos valores de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) e de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). O ofendido reconheceu Cleisson de Souza Dias dos Santos e Roni Márcio Machado como autores dos delitos (cf. mov. 1.8). A empresa Mell Aparecida Rissardo LTDA., CNPJ n. 43.944.758/0001-90, era uma panificadora de propriedade de Mell Aparecida Rissardo. No local, os investigadores qualificaram o companheiro da proprietária, José Luís Rissardo, RG n. 3973897-0, cuja identidade fornecida encontrava-se bloqueada por duplicidade, pois, segundo a perícia papiloscópica n. 187/2012, José Luís emitiu outro documento se passando por Luiz de Souza Barbosa, RG n. 12.832.994-3, mediante apresentação de certidão de nascimento. No dia 7/5/2024, o ofendido Agostinho Damratt, de 63 anos de idade, registrou boletim de ocorrência n. 2024/574286, em que fora vítima de um golpe do bilhete premiado. Depois de ser ludibriado, entregou aos golpistas R$ 10.000,00 (dez mil reais), sacados em três pontos diferentes, e um aparelho celular. O primeiro saque, de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), foi realizado em uma agência da Caixa Econômica Federal. Os investigadores obtiveram imagens das câmeras de segurança da referida agência e identificaram Roni Márcio Machado acompanhando a vítima. O ofendido reconheceu Cleisson de Souza Dias dos Santos e Roni Márcio Machado como autores dos delitos (cf. movs. 1.9, 1.11 a 1.14).Em 10/7/2024, o ofendido Antônio Alves Feitosa, de 72 anos de idade, registrou boletim de ocorrência n. 2024/852126, noticiando a prática do delito de estelionato, ocorrido em 9/7/2024, na Rua Des. Cid Campelo, n. 5.855, Bairro CIC, Curitiba/PR. O ofendido foi abordado por dois homens, a pretexto de participar de um bilhete premiado, e entregou quantias aos suspeitos – R$ 1.000,00 (mil reais) em espécie em sua residência, o cartão e a senha bancária aos criminosos, os quais efetuaram três saques na Caixa Econômica Federal de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais, R$ 800,00 e R$ 5.000,00), além de uma compra no estabelecimento registrado em nome de Camila de Souza Rissardo. O ofendido reconheceu Roni Márcio Machado como um dos autores do delito. Os investigadores apuraram que Camila de Souza Rissardo era filha de José Luís Rissardo e residia na Rua Reynaldo Bonat, n. 160, Bairro CIC, Curitiba/PR. A pedido da Autoridade Policial foi decretada a prisão temporária dos investigados e determinada a expedição de mandado de busca e apreensão em seus endereços, a quebra de sigilo de dados de aparelhos eletrônicos porventura apreendidos – celulares e computadores - e a quebra do sigilo bancário em todas as contas de depósitos, contas de poupança, contas de investimento e outros bens, direitos e valores mantidos em instituições financeiras pelas pessoas físicas e jurídicas abaixo relacionadas, no período de 31/1/2024 até 10/7/2024 (cf. mov. 14.1). Por fim, foi a prisão temporária convertida em preventiva (cf. mov. 116.1). 1.2. DO ARTIGO 171, PARÁGRAFO 4º, DO CÓDIGO PENAL (1º FATO) A materialidade do delito foi demonstrada pelo boletim de ocorrência (cf. mov. 12.14, p. 3-5), pelos autos de reconhecimento fotográfico de Roni e de Cleisson (cf. mov. 12.14, p. 23-30), pelo auto de avaliação (cf. mov. 69.1), pelo extrato bancário que comprova o saque realizado (cf. mov. 202, item III) e pela prova oral colhida nos autos. Cumpre ressaltar que as provas produzidas na fase policial possuem pleno valor probatório e são aptas a embasar uma condenação, desde que confirmadas em juízo,observando-se o contraditório e a ampla defesa. Foi o que se constatou no caso em tela, em que a robusta prova obtida na fase policial, ainda no calor dos fatos, foi corroborada pelo conjunto probatório produzido em juízo. A jurisprudência nacional confirma o afirmado supra: “A prova policial só deve ser desprezada, afastada, como elemento válido e aceitável de convicção, quando totalmente ausente prova judicial confirmatória ou quando desmentida, contrariada ou nulificada pelos elementos probantes colhidos em juízo através de regular instrução. Havendo, porém, prova produzida no contraditório, ainda que menos consistente, pode e deve aquela ser considerada e chamada para, em conjunto com esta, compor quadro probante suficientemente nítido e preciso” (TJRS, RJTJERGS 150/143- 4). [grifo nosso] A autoria, por sua vez, também foi devidamente comprovada pelos documentos já referidos e pela prova oral produzida em juízo. O ofendido Hermínio de Barros relatou que foi abordado por dois homens enquanto caminhava em via pública. Um deles pediu informações, mencionando querer comprar arreios de cavalo. A conversa então tomou outro rumo, passando a se referir a um suposto bilhete premiado. Em seguida, surgiu um segundo homem, que chegou em um veículo escuro e fez uma ligação telefônica, na qual a pessoa do outro lado confirmou a existência de um prêmio. Os dois indivíduos alegaram não poder resgatar o valor por conta própria e prometeram dividir o montante caso ele ajudasse. Então, eles o levaram a uma casa, onde o homem mais velho pegou um maço de dinheiro, e depois à sua residência, onde ele apanhou seu cartão e senha e os de sua esposa. Logo após, dirigiram-se à agência da Caixa Econômica Federal no Bairro Pinheirinho. Lá o homem mais velho entrou sozinho e realizou saques com os cartões, enquanto aguardava no carro. Posteriormente, a pedido do homem, foi comprar uma garrafa de água, mas, ao retornar, os homens já haviam desaparecido, levando também seu telefone celular. Foram sacados R$ 4.000,00 (quatro mil reais) da conta de sua esposa e R$ 495,00 (quatrocentos e noventa e cinco reais) da sua. Sobre as características dos suspeitos, descreveu que o mais jovem era moreno e mais robusto que o mais velho. Este, por sua vez, era magro, mais alto, de cabelo branco, sem barba. Em delegacia, foram apresentadas fotografias de seispessoas, tendo reconhecido duas delas com absoluta certeza (cf. mov. 118.2). Destarte, deve-se conferir especial destaque ao valor probatório da palavra da vítima em casos como o em tela, a qual vem sendo reconhecida pela jurisprudência nacional como prova apta a embasar a condenação: APELAÇÃO CRIMINAL - ESTELIONATO (ART. 171, CAPUT, C/C ART. 71, AMBOS DO CP) - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELA DEFESA DO RÉU - PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO, NA MODALIDADE RETROATIVA - RECONHECIMENTO, DE OFÍCIO, DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO ACUSADO, EM RELAÇÃO A OITO DOS NOVE FATOS DELITIVOS - INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 107, INCISO IV; 109, INCISO V; E 110, §1º, TODOS DO CP - PLEITO PELA ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO - AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – PALAVRA DA VÍTIMA QUE TEM ELEVADO VALOR PROBANTE E ESTÁ EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS - PRECEDENTES DESTA CORTE - CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE A ENSEJAR NA CONDENAÇÃO DO RÉU - READEQUAÇÃO DA PENA FINAL - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 5ª C. Criminal - AC - 1710156-5 - Guarapuava - Rel.: Luiz Osorio Moraes Panza - Unânime - J. 14.12.2017) [griso nosso] APELAÇÃO CRIMINAL – ESTELIONATO (ART. 171, DO CP) – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELA DEFESA DO RÉU – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO, NA MODALIDADE RETROATIVA – REJEIÇÃO – LAPSO TEMPORAL DA PRETENSÃO PUNITIVA QUE NÃO FORA EXTRAPOLADO – PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO – AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – OFENDIDO QUE RECONHECEU, SEM SOMBRA DE DÚVIDA, O ACUSADO COMO AUTOR DO ESTELIONATO – PALAVRA DA VÍTIMA QUE TEM ELEVADO VALOR PROBANTE E ESTÁ EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS – PRECEDENTES DESTA CORTE – RÉU QUE FORNECEU CHEQUE PRODUTO DE FURTO COMO FORMA DE PAGAMENTO DO CAMINHÃO DA VÍTIMA – PREJUÍZO EVIDENCIADO – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE A ENSEJAR A CONDENAÇÃO DO RÉU – PLEITO PELA REDUÇÃO DO VALOR FIXADO PARA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA – POSSIBILIDADE – JUÍZO QUE ARBITROUA QUO VALOR SUPERIOR AO MÍNIMO LEGAL SEM APRESENTAR FUNDAMENTAÇÃO PARA TANTO – NECESSIDADE DE READEQUAÇÃO DO PARA O MÍNIMO LEGAL, QUALQUANTUM SEJA, 01 (UM) SALÁRIO MÍNIMO – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 5ª C. Criminal - 0000368-16.2015.8.16.0146 - Rio Negro - Rel.: Luiz Osório Moraes Panza - J. 14.02.2019) [griso nosso]O acusado Roni Márcio Machado confessou a prática dos crimes de estelionato contra idosos. Segundo ele, o golpe do bilhete premiado era praticado por duas pessoas. Uma assumia o papel de colono, fingia estar perdida e pedia ajuda com um bilhete de loteria nas mãos. A outra assumia o papel de executivo e simulava uma ligação à Caixa Econômica Federal, confirmando um valor alto de prêmio. A vítima era convencida a fazer transferências de dinheiro (via Pix, por exemplo) em troca de uma parte do prêmio. Foi ele que fez o papel do executivo e não havia necessidade de violência, apenas da ganância da vítima (cf. mov. 172.5). O acusado Cleisson de Souza Guil dos Santos afirmou em seu interrogatório que todas as acusações de estelionato eram verdadeiras. De acordo com ele, no golpe do bilhete premiado ele se passava por “caipira do mato”, uma pessoa sem instrução, que ganhara na loteria, e Roni simulava uma ligação à Caixa Econômica Federal para confirmar o valor do prêmio e oferecia uma gratificação para a vítima ajudar a receber o dinheiro. Nunca precisou forçar ninguém; os ofendidos sempre acreditavam na vantagem prometida. Também disse o réu que conheceu Roni no bairro onde morava e aceitou participar dos golpes, devido à necessidade financeira e à falta de instrução. Admitiu ter praticado outros golpes no passado e contou que somente recebia uma pequena parte do dinheiro obtido com as vítimas (cf. mov. 172.6). Com efeito, pela análise conjunta das provas produzidas nos autos é possível vislumbrar com absoluta certeza o modus operandi dos acusados, os quais aplicaram na vítima, que tinha 68 anos de idade na época dos fatos, o chamado golpe do bilhete premiado, no dia 10/11/2023. Cleisson abordou o ofendido em via pública, solicitando informações. Em seguida, Roni surgiu na condução de um veículo, como um estranho querendo ajudar, e, ao saber que Cleisson tinha um bilhete de loteria, mas enfrentava dificuldades para resgatar o prêmio, visando convencer a vítima da narrativa, fingiu que confirmava a história. Depois ele e seu comparsa pediram que a vítima entregasse dinheiro em troca de parte do valor a ser recebido por Cleisson. No entanto, logo após a entrega do valor que o próprio Roni ajudou a sacar, foi solicitado à vítima comprar uma garrava de água, enquanto os golpistas se evadiram, levando também o celular.O depoimento da vítima foi coeso e ela reconheceu os acusados. Tem-se, ainda, que tanto Cleisson quanto Roni confessaram a prática do delito ao serem interrogados em juízo. O extrato bancário juntado no mov. 202.1, item III, demonstra, ainda, que os fatos ocorreram conforme a narrativa da vítima, muito embora o saque na conta de Hermínio tenha sido de R$ 400,00 (quatrocentos reais) e não de R$ 495,00 (quatrocentos e noventa e cinco reais) como ele informou em seu depoimento. Veja-se: Não foi comprovado, por outro lado, o saque de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) da conta da esposa do ofendido, mencionado apenas em juízo; por isso, manifestou-se o Ministério Público pelo não aditamento à denúncia. O celular obtido pelos réus, conforme auto de avaliação de mov. 69.1, foi avaliado em R$ 1.000,00 (mil reais). Assim, o prejuízo total de Hermínio foi de R$ 1.400,00 (mil e quatrocentos reais). A tese defensiva de mera participação de menor importância dos acusados não se aplica ao caso em concreto, já que coautores do crime e não mero partícipes, de acordo com a teoria unitária vigente na lei penal (cf. artigo 29 do Código Penal). Ambos participaram diretamente da abordagem e auxiliaram de maneira decisiva na consecução da ação criminosa, mediante artifício (encenação) e ardil (mentiras verbais, conversa ardilosa e enganosa).Veja-se que o golpe do bilhete premiado é praticado por uma dupla de criminosos, em que um se apresenta como uma pessoa humilde que não consegue resgatar o prêmio por algum motivo e está desesperada para recebê-lo, e a outra surge para validar a história, comprometendo-se a ajudar mediante recompensa para convencer a vítima a também fazê-lo, conduta que facilita a consumação do crime. Julio Fabbrini Mirabete leciona sobre o tema: “Embora de forma não expressa, ao tratar do concurso de pessoas, a lei distingue a co-autoria da participação. Aquela existe quando o agente pratica ato de execução do ilícito, ou, conforme a teoria moderna, quando tem o domínio final do fato; esta quando a pessoa colabora com o ilícito em ato penalmente indiferente em si, sem praticar ato de execução ou ter o domínio do fato”. (Código Penal interpretado, 1 a . ed., São Paulo: Atlas, 2000. p. 237) A jurisprudência não se distancia da doutrina: “É co-autor do roubo qualificado pelo resultado lesão grave o agente que, na realização do roubo, também tinha o domínio do fato delituoso pela realização conjunta da conduta criminosa, dentro do prévio ajuste e da colaboração material, ainda que seu comparsa tenha sido o único autor dos disparos feitos contra vítima, lesionada gravemente”. (TACRSP RJDTACRIM) "Para a caracterização da coautoria no concurso de pessoas é necessário somente a colaboração do agente para o deslinde da prática delituosa, inexigindo-se que todos os partícipes tenham consumado atos típicos de execução"(RT 751/695). Ainda, para o Tribunal de Justiça do Paraná, a participação de cada réu em golpe do bilhete premiado, com divisão de tarefas clara entre eles, caracteriza a coautoria nos crimes. Nesse sentido: DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO, FURTO QUALIFICADO TENTADO E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. RECURSO DOS RÉUS (APELAÇÕES 1, 2, 3, 4, 5 E 6) – PLEITOS ABSOLUTÓRIOS – ACOLHIMENTO PARCIAL APENAS EM RELAÇÃO AOS RÉUS JAKSON (APELAÇÃO 1) E JULIANO (APELAÇÃO 3) – PEDIDOS DE REFORMA DA DOSIMETRIA –IMPROCEDÊNCIA. I. CASO EM EXAME1. Apelação crime visando a reforma da sentença que condenou os réus pela prática dos crimes de estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, em decorrência da aplicação do golpe do bilhete premiado, onde os denunciados abordaram a vítima, induzindo-a a erro e causando-lhe prejuízo financeiro significativo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se os apelantes devem ser absolvidos das acusações de estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, ou se as condenações devem ser mantidas com base nas provas apresentadas nos autos. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Os réus foram condenados por estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, com base em provas robustas, incluindo depoimentos das vítimas e imagens de câmeras de segurança.4. A participação de cada réu foi devidamente comprovada, com divisão de tarefas clara entre eles, caracterizando a coautoria nos crimes, exceto em relação ao réu Jakson (em relação aos delitos de furto qualificado e associação criminosa) e em relação ao réu Juliano (em relação ao crime de associação criminosa).5. O réu Jakson deve ser absolvido do crime de furto qualificado tentado, pois não participou da subtração do cartão bancário.6. Os réus Jakson e Juliano devem ser absolvidos da acusação de prática do delito de associação criminosa7. As alegações de nulidade das provas e de ausência de justa causa foram rejeitadas, pois a denúncia foi fundamentada em indícios suficientes de autoria e materialidade dos delitos.8. Os pedidos de revisão de dosimetria da pena não comportam acolhimento.IV. DISPOSITIVO 9. Apelação 1 conhecida e parcialmente provida; apelação 2 parcialmente conhecida e não provida; apelação 3 conhecida e parcialmente provida; apelações 4, 5 e 6 conhecidas e não providas. (...) (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0003573-29.2023.8.16.0031 - Guarapuava - Rel.: SUBSTITUTO PEDRO LUIS SANSON CORAT - J. 27.03.2025) [grifo nosso] Aplicável, portanto, o artigo 29, caput, do Código Penal, pois todo aquele que concorre para o crime responde pelas penas a este cominadas. Cabe mencionar, ainda, que, apesar de a defesa técnica não ter suscitado expressamente a tese de estado de necessidade, o acusado Cleisson alegou ter praticado o delito por estar passando por dificuldades financeiras. Contudo, o fato de o réu estar em momento financeiro delicado – assim como milhões de brasileiros – não configura a excludente de ilicitude do artigo 24 do Código Penal – e não autoriza a prática de condutas típicas.Em caso recente e semelhante, assim também julgou o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: “APELAÇÃO CRIMINAL. AÇÃO PENAL. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. BUSCA E APREENSÃO. ENCONTRADO NA RESIDÊNCIA DO RÉU 1 BALANÇA DE PRECISÃO, QUANTIA EM DINHEIRO (R$21,55), 27 (VINTE E SENTE) GRAMAS DE COCAÍNA E 113 (CENTO E TREZE) GRAMAS DE MACONHA. PRISÃO EM FLAGRANTE. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO. FALTA DE INTERESSE RECURSAL QUANTO ÀS ATENUANTES DE CONFISSÃO E MENORIDADE RELATIVA. SENTENÇA QUE CONCEDEU TAIS BENESSES. ALEGAÇÃO DE ESTADO DE NECESSIDADE. DESCABIMENTO. REQUISITOS DO ARTIGO 24 DO CP NÃO PREENCHIDOS. DIFICULDADE FINANCEIRA QUE NÃO EXCLUI A ILICITUDE DELITUOSA. PLEITO PELA DIMINUIÇÃO DE PENA POR TRÁFICO PRIVILEGIADO. DEPOIMENTO DO RÉU QUE EVIDENCIA SUA DEDICAÇÃO À ATIVIDADE ILÍCITA. REQUISITOS LEGAIS DO PARÁGRAFO 4º DO ARTIGO 33 DA LEI Nº 11.343/06 NÃO SATISFEITOS. QUANTIDADE DA PENA QUE IMPOSSIBILITA A SUBSTITUIÇÃO DA PRIVATIVA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. REGIME INICIAL QUE DEVE SER O SEMI-ABERTO, CONFORME ALÍNEA “B” DO PARÁGRAFO 2º DO ARTIGO 33 DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, NÃO PROVIDO. (TJPR - 3ª C.Criminal - 0027060-46.2018.8.16.0017 - Maringá - Rel.: DESEMBARGADOR SERGIO ROBERTO NOBREGA ROLANSKI - J. 18.05.2020) [grifo nosso] Depreende-se, portanto, que as provas são aptas em apontar a prática do delito de estelionato em desfavor dos acusados, os quais obtiveram para si vantagem pecuniária, induzindo e mantendo a vítima em erro mediante afirmação de que havia um bilhete premiado. Observou-se, por fim, que os réus possuíam plenas condições de compreender o caráter criminoso de suas condutas, podendo determinar-se de acordo com tal entendimento, de forma que conheciam a ilicitude dos fatos por eles praticados, deles se exigindo atitude diversa. 1.3. DO ARTIGO 171, PARAGRAFO 4º, DO CÓDIGO PENAL (2º FATO) A materialidade do delito foi demonstrada pelo boletim de ocorrência (cf. mov. 1.2), pelos autos de reconhecimento fotográfico de Roni e de Cleisson (cf. mov.12.7), pelo extrato bancário que comprova os saques realizados (cf. mov. 202, item IV) e pela prova oral colhida nos autos. Cumpre ressaltar que as provas produzidas na fase policial possuem pleno valor probatório e são aptas a embasar uma condenação, desde que confirmadas em juízo, observando-se o contraditório e a ampla defesa. Foi o que se constatou no caso em tela, em que a robusta prova obtida na fase policial, ainda no calor dos fatos, foi corroborada pelo conjunto probatório produzido em juízo. A jurisprudência nacional confirma o afirmado supra: “A prova policial só deve ser desprezada, afastada, como elemento válido e aceitável de convicção, quando totalmente ausente prova judicial confirmatória ou quando desmentida, contrariada ou nulificada pelos elementos probantes colhidos em juízo através de regular instrução. Havendo, porém, prova produzida no contraditório, ainda que menos consistente, pode e deve aquela ser considerada e chamada para, em conjunto com esta, compor quadro probante suficientemente nítido e preciso” (TJRS, RJTJERGS 150/143- 4). [grifo nosso] A autoria, por sua vez, também foi devidamente comprovada pelos documentos já referidos e pela prova oral produzida em juízo. O ofendido Inácio Fidelis Gomes disse que era analfabeto e foi abordado na rua por dois indivíduos, um mais baixo e moreno e outro mais alto e claro, separadamente. O primeiro pediu um endereço, mencionando querer comprar um “ arriame” a um animal. Quando o segundo elemento chegou em um carro preto, eles começaram a falar sobre um bilhete premiado, pediram R$ 9.000,00 (nove mil reais) e, de alguma forma o convenceram a ir à sua casa buscar seu cartão bancário. Em seguida, os homens o levaram a dois bancos diferentes. No primeiro, o homem mais alto entrou com ele e realizou a operação no caixa eletrônico. No segundo, ele próprio fez a operação no caixa. Usou sua digital para autorizar as transações bancárias. Os criminosos sacaram um total de R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais), sendo R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) em um banco e R$ 5.000,00 (cinco mil reais) no outro. Depois os suspeitos pediram que comprasse um lanche e o deixaram em um terminal de ônibus. Então, percebeu ter sido enganado. Na delegacia, reconheceu os suspeitos por fotografias de vários homens e o delegadoconfirmou, em seguida, que eles eram conhecidos por crimes semelhantes (cf. mov. 118.3). Destarte, deve-se conferir especial destaque ao valor probatório da palavra da vítima em casos como o em tela, a qual vem sendo reconhecida pela jurisprudência nacional como prova apta a embasar a condenação: APELAÇÃO CRIMINAL - ESTELIONATO (ART. 171, CAPUT, C/C ART. 71, AMBOS DO CP) - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELA DEFESA DO RÉU - PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO, NA MODALIDADE RETROATIVA - RECONHECIMENTO, DE OFÍCIO, DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO ACUSADO, EM RELAÇÃO A OITO DOS NOVE FATOS DELITIVOS - INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 107, INCISO IV; 109, INCISO V; E 110, §1º, TODOS DO CP - PLEITO PELA ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO - AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – PALAVRA DA VÍTIMA QUE TEM ELEVADO VALOR PROBANTE E ESTÁ EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS - PRECEDENTES DESTA CORTE - CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE A ENSEJAR NA CONDENAÇÃO DO RÉU - READEQUAÇÃO DA PENA FINAL - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 5ª C. Criminal - AC - 1710156-5 - Guarapuava - Rel.: Luiz Osorio Moraes Panza - Unânime - J. 14.12.2017) [griso nosso] APELAÇÃO CRIMINAL – ESTELIONATO (ART. 171, DO CP) – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELA DEFESA DO RÉU – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO, NA MODALIDADE RETROATIVA – REJEIÇÃO – LAPSO TEMPORAL DA PRETENSÃO PUNITIVA QUE NÃO FORA EXTRAPOLADO – PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO – AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – OFENDIDO QUE RECONHECEU, SEM SOMBRA DE DÚVIDA, O ACUSADO COMO AUTOR DO ESTELIONATO – PALAVRA DA VÍTIMA QUE TEM ELEVADO VALOR PROBANTE E ESTÁ EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS – PRECEDENTES DESTA CORTE – RÉU QUE FORNECEU CHEQUE PRODUTO DE FURTO COMO FORMA DE PAGAMENTO DO CAMINHÃO DA VÍTIMA – PREJUÍZO EVIDENCIADO – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE A ENSEJAR A CONDENAÇÃO DO RÉU – PLEITO PELA REDUÇÃO DO VALOR FIXADO PARA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA – POSSIBILIDADE – JUÍZO QUE ARBITROUA QUO VALOR SUPERIOR AO MÍNIMO LEGAL SEM APRESENTAR FUNDAMENTAÇÃO PARA TANTO – NECESSIDADE DE READEQUAÇÃO DO PARA O MÍNIMO LEGAL, QUALQUANTUM SEJA, 01 (UM) SALÁRIO MÍNIMO – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 5ª C. Criminal - 0000368-16.2015.8.16.0146 - Rio Negro - Rel.: Luiz Osório Moraes Panza - J. 14.02.2019) [griso nosso]O acusado Roni Márcio Machado confessou a prática dos crimes de estelionato contra idosos. Segundo ele, o golpe do bilhete premiado era praticado por duas pessoas. Uma assumia o papel de colono, fingia estar perdida e pedia ajuda com um bilhete de loteria nas mãos. A outra assumia o papel de executivo e simulava uma ligação à Caixa Econômica Federal, confirmando um valor alto de prêmio. A vítima era convencida a fazer transferências de dinheiro (via Pix, por exemplo) em troca de uma parte. Foi ele que fez o papel do executivo e não havia necessidade de violência, apenas da ganância da vítima (cf. mov. 172.5). O acusado Cleisson de Souza Guil dos Santos afirmou em seu interrogatório que todas as acusações de estelionato eram verdadeiras. De acordo com ele, no golpe do bilhete premiado, ele se passava por “caipira do mato”, uma pessoa sem instrução, que havia ganhado na loteria, e Roni simulava uma ligação à Caixa Econômica Federal para confirmar o valor do prêmio e oferecia uma gratificação para a vítima ajudar a receber o dinheiro. Nunca precisou forçar ninguém; as vítimas sempre acreditavam na vantagem prometida. O réu conheceu Roni no bairro onde morava e aceitou participar dos golpes, devido à necessidade financeira e à falta de instrução. Admitiu ter praticado outros golpes no passado e somente recebia uma pequena parte do dinheiro obtido com as vítimas (cf. mov. 172.6). Com efeito, pela análise conjunta das provas produzidas nos autos é possível vislumbrar com absoluta certeza o modus operandi dos acusados, que aplicaram na vítima, com 75 anos de idade na época dos fatos, o chamado golpe do bilhete premiado, no dia 30/1/2024. Cleisson abordou a vítima em via pública, solicitando informações. Em seguida, Roni surgiu na condução de um veículo, como um estranho querendo ajudar, e, ao saber que Cleisson tinha um bilhete de loteria, mas enfrentava dificuldades para resgatar o prêmio, visando convencer a vítima da narrativa, fingiu que confirmava a história. Depois ele e seu comparsa pediram que a vítima entregasse dinheiro em troca de parte do valor que supostamente seria recebido por Cleisson. No entanto, logo após a entrega do dinheiro que o próprio Roni ajudou a sacar, foi solicitado à vítima que comprasse um lanche, enquanto os golpistas se evadiram.O depoimento do ofendido foi coeso e ela reconheceu os acusados. Tem-se, ainda, que tanto Cleisson quanto Roni confessaram a prática do delito ao serem interrogados em juízo. Muito embora Inácio tenha dito que foram feitos dois saques em sua conta bancária, o extrato bancário juntado no mov. 202.1, item IV, comprovou saques de R$ 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta reais), de R$ 300,00 (trezentos reais), de R$ 300,00 (trezentos reais) e de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) em caixas eletrônicos e de R$ 5.0000,00 (cinco mil reais) em uma agência, totalizando R$ 7.000,00 (sete mil reais). Confira-se: A tese defensiva de mera participação de menor importância dos acusados não se aplica ao caso em concreto, pois coautores do crime e não mero partícipes, de acordo com a teoria unitária vigente na lei penal (cf. artigo 29 do Código Penal). Ambos participaram diretamente da abordagem e auxiliaram de maneira decisiva na consecução da ação criminosa, mediante artifício (encenação) e ardil (mentiras verbais, conversa ardilosa e enganosa). Veja-se que o golpe do bilhete premiado é praticado por uma dupla de criminosos, em que um se apresenta como uma pessoa humilde que não consegue resgatar o prêmio por algum motivo e está desesperada para recebê-lo, e a outra surge para validar a história, comprometendo-se a ajudar mediante recompensa para convencer a vítima a também fazê-lo, conduta que facilita a consumação do crime. Julio Fabbrini Mirabete leciona sobre o tema:“Embora de forma não expressa, ao tratar do concurso de pessoas, a lei distingue a co-autoria da participação. Aquela existe quando o agente pratica ato de execução do ilícito, ou, conforme a teoria moderna, quando tem o domínio final do fato; esta quando a pessoa colabora com o ilícito em ato penalmente indiferente em si, sem praticar ato de execução ou ter o domínio do fato”. (Código Penal interpretado, 1 a . ed., São Paulo: Atlas, 2000. p. 237) A jurisprudência não se distancia da doutrina: “É co-autor do roubo qualificado pelo resultado lesão grave o agente que, na realização do roubo, também tinha o domínio do fato delituoso pela realização conjunta da conduta criminosa, dentro do prévio ajuste e da colaboração material, ainda que seu comparsa tenha sido o único autor dos disparos feitos contra vítima, lesionada gravemente”. (TACRSP RJDTACRIM) "Para a caracterização da coautoria no concurso de pessoas é necessário somente a colaboração do agente para o deslinde da prática delituosa, inexigindo-se que todos os partícipes tenham consumado atos típicos de execução"(RT 751/695). Ainda, para o Tribunal de Justiça do Paraná, a participação de cada réu em golpe do bilhete premiado, com divisão de tarefas clara entre eles, caracteriza a coautoria nos crimes. Nesse sentido: DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO, FURTO QUALIFICADO TENTADO E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. RECURSO DOS RÉUS (APELAÇÕES 1, 2, 3, 4, 5 E 6) – PLEITOS ABSOLUTÓRIOS – ACOLHIMENTO PARCIAL APENAS EM RELAÇÃO AOS RÉUS JAKSON (APELAÇÃO 1) E JULIANO (APELAÇÃO 3) – PEDIDOS DE REFORMA DA DOSIMETRIA – IMPROCEDÊNCIA. I. CASO EM EXAME1. Apelação crime visando a reforma da sentença que condenou os réus pela prática dos crimes de estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, em decorrência da aplicação do golpe do bilhete premiado, onde os denunciados abordaram a vítima, induzindo-a a erro e causando-lhe prejuízo financeiro significativo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se os apelantes devem ser absolvidos das acusações de estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, ou se as condenações devem ser mantidas com base nas provas apresentadas nos autos.III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Os réus foram condenados por estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, com base em provas robustas, incluindo depoimentos das vítimas e imagens de câmeras de segurança.4. A participação de cada réu foi devidamente comprovada, com divisão de tarefas clara entre eles, caracterizando a coautoria nos crimes, exceto em relação ao réu Jakson (em relação aos delitos de furto qualificado e associação criminosa) e em relação ao réu Juliano (em relação ao crime de associação criminosa).5. O réu Jakson deve ser absolvido do crime de furto qualificado tentado, pois não participou da subtração do cartão bancário.6. Os réus Jakson e Juliano devem ser absolvidos da acusação de prática do delito de associação criminosa7. As alegações de nulidade das provas e de ausência de justa causa foram rejeitadas, pois a denúncia foi fundamentada em indícios suficientes de autoria e materialidade dos delitos.8. Os pedidos de revisão de dosimetria da pena não comportam acolhimento.IV. DISPOSITIVO 9. Apelação 1 conhecida e parcialmente provida; apelação 2 parcialmente conhecida e não provida; apelação 3 conhecida e parcialmente provida; apelações 4, 5 e 6 conhecidas e não providas. (...) (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0003573-29.2023.8.16.0031 - Guarapuava - Rel.: SUBSTITUTO PEDRO LUIS SANSON CORAT - J. 27.03.2025) [grifo nosso] Aplicável, portanto, o artigo 29, caput, do Código Penal, pois todo aquele que concorre para o crime responde pelas penas a este cominadas. Cabe mencionar, ainda, que, apesar de a defesa técnica não ter suscitado expressamente a tese de estado de necessidade, o acusado Cleisson alegou ter praticado o delito por estar passando por dificuldades financeiras. Contudo, o fato de o réu estar em momento financeiro delicado – assim como milhões de brasileiros – não configura a excludente de ilicitude do artigo 24 do Código Penal – e não autoriza a prática de condutas típicas. Em caso recente e semelhante, assim também julgou o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: “APELAÇÃO CRIMINAL. AÇÃO PENAL. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. BUSCA E APREENSÃO. ENCONTRADO NA RESIDÊNCIA DO RÉU 1 BALANÇA DE PRECISÃO, QUANTIA EM DINHEIRO (R$21,55), 27 (VINTE E SENTE) GRAMAS DE COCAÍNA E 113 (CENTO E TREZE) GRAMAS DE MACONHA. PRISÃO EM FLAGRANTE. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO. FALTA DE INTERESSE RECURSAL QUANTO ÀS ATENUANTES DE CONFISSÃO EMENORIDADE RELATIVA. SENTENÇA QUE CONCEDEU TAIS BENESSES. ALEGAÇÃO DE ESTADO DE NECESSIDADE. DESCABIMENTO. REQUISITOS DO ARTIGO 24 DO CP NÃO PREENCHIDOS. DIFICULDADE FINANCEIRA QUE NÃO EXCLUI A ILICITUDE DELITUOSA. PLEITO PELA DIMINUIÇÃO DE PENA POR TRÁFICO PRIVILEGIADO. DEPOIMENTO DO RÉU QUE EVIDENCIA SUA DEDICAÇÃO À ATIVIDADE ILÍCITA. REQUISITOS LEGAIS DO PARÁGRAFO 4º DO ARTIGO 33 DA LEI Nº 11.343/06 NÃO SATISFEITOS. QUANTIDADE DA PENA QUE IMPOSSIBILITA A SUBSTITUIÇÃO DA PRIVATIVA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. REGIME INICIAL QUE DEVE SER O SEMI-ABERTO, CONFORME ALÍNEA “B” DO PARÁGRAFO 2º DO ARTIGO 33 DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, NÃO PROVIDO. (TJPR - 3ª C.Criminal - 0027060-46.2018.8.16.0017 - Maringá - Rel.: DESEMBARGADOR SERGIO ROBERTO NOBREGA ROLANSKI - J. 18.05.2020) [grifo nosso] Depreende-se, portanto, que as provas são aptas em apontar a prática do delito de estelionato em desfavor dos acusados, os quais obtiveram para si vantagem pecuniária, induzindo e mantendo a vítima em erro mediante afirmação de que havia um bilhete premiado. Observou-se, por fim, que os réus possuíam plenas condições de compreender o caráter criminoso de suas condutas, podendo determinar-se de acordo com tal entendimento, de forma que conheciam a ilicitude dos fatos por eles praticados, deles se exigindo atitude diversa. 1.4. DO ARTIGO 171, PARÁGRAFO 4º, DO CÓDIGO PENAL (3º FATO) A materialidade do delito foi demonstrada pelo boletim de ocorrência (cf. mov.12.15, p. 3-4), pelos autos de reconhecimento fotográfico de Roni e de Cleisson (cf. mov. 12.5, p. 15-20), pelo extrato bancário que comprova os saques realizados (cf. mov. 12.15, p. 14), pelo auto de avaliação (cf. mov. 69.1), pelas imagens das câmeras de segurança (cf. movs. 1.11 a 1.14 da ação da cautelar n. 0011878- 22.2024.8.16.0013) e pela prova oral colhida nos autos. Cumpre ressaltar que as provas produzidas na fase policial possuem pleno valor probatório e são aptas a embasar uma condenação, desde que confirmadas em juízo, observando-se o contraditório e a ampla defesa. Foi o que se constatou no caso em tela, em que a robusta prova obtida na fase policial, ainda no calor dos fatos, foi corroborada peloconjunto probatório produzido em juízo. A jurisprudência nacional confirma o afirmado supra: “A prova policial só deve ser desprezada, afastada, como elemento válido e aceitável de convicção, quando totalmente ausente prova judicial confirmatória ou quando desmentida, contrariada ou nulificada pelos elementos probantes colhidos em juízo através de regular instrução. Havendo, porém, prova produzida no contraditório, ainda que menos consistente, pode e deve aquela ser considerada e chamada para, em conjunto com esta, compor quadro probante suficientemente nítido e preciso” (TJRS, RJTJERGS 150/143- 4). [grifo nosso] A autoria, por sua vez, também foi devidamente comprovada pelos documentos já referidos e pela prova oral produzida em juízo. O ofendido Agostinho Damratt declarou que foi à Caixa Econômica Federal, fez um jogo e sacou dinheiro. A caminho de casa, um homem moreno pediu informação, mas não foi compreendido. Nesse momento, um carro de cor prata chegou, um homem mais alto desceu e perguntou o que estava acontecendo. Respondeu que não estava entendendo o que o primeiro homem disse. Este, por sua vez, mencionou um bilhete premiado e o homem mais alto sugeriu que dividissem o prêmio. Inicialmente recusou, mas foi convencido a ajudá-los. O homem mais alto pegou seu cartão e sua senha, sacou R$ 1.800,00 (mil e oitocentos reais) em uma agência, depois R$ 3.000,00 (três mil reais) na lotérica e mais R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em outra agência, totalizando R$ 10.000,00 (dez mil reais). A vítima não entrou na lotérica, mas esperou o criminoso do lado de fora, conforme imagens das câmeras de segurança juntadas no mov. 1.11 dos autos n. 11878-22.2024.8.16.0013. Depois foi deixado em Pinhais/PR e somente então percebeu que se tratava de um golpe. Quando conseguiu um extrato, viu que seu cartão foi clonado e mais R$ 4.000,00 (quatro mil reais) foram gastos em lojas de conveniência. Seu celular foi tomado e não devolvido. Em delegacia, viu fotografias dos acusados e do veículo e os reconheceu (cf. mov. 172.4). Destarte, deve-se conferir especial destaque ao valor probatório da palavra da vítima em casos como o em tela, a qual vem sendo reconhecida pela jurisprudência nacional como prova apta a embasar a condenação:APELAÇÃO CRIMINAL - ESTELIONATO (ART. 171, CAPUT, C/C ART. 71, AMBOS DO CP) - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELA DEFESA DO RÉU - PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO, NA MODALIDADE RETROATIVA - RECONHECIMENTO, DE OFÍCIO, DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO ACUSADO, EM RELAÇÃO A OITO DOS NOVE FATOS DELITIVOS - INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 107, INCISO IV; 109, INCISO V; E 110, §1º, TODOS DO CP - PLEITO PELA ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO - AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – PALAVRA DA VÍTIMA QUE TEM ELEVADO VALOR PROBANTE E ESTÁ EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS - PRECEDENTES DESTA CORTE - CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE A ENSEJAR NA CONDENAÇÃO DO RÉU - READEQUAÇÃO DA PENA FINAL - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 5ª C. Criminal - AC - 1710156-5 - Guarapuava - Rel.: Luiz Osorio Moraes Panza - Unânime - J. 14.12.2017) [griso nosso] APELAÇÃO CRIMINAL – ESTELIONATO (ART. 171, DO CP) – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELA DEFESA DO RÉU – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO, NA MODALIDADE RETROATIVA – REJEIÇÃO – LAPSO TEMPORAL DA PRETENSÃO PUNITIVA QUE NÃO FORA EXTRAPOLADO – PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO – AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – OFENDIDO QUE RECONHECEU, SEM SOMBRA DE DÚVIDA, O ACUSADO COMO AUTOR DO ESTELIONATO – PALAVRA DA VÍTIMA QUE TEM ELEVADO VALOR PROBANTE E ESTÁ EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS – PRECEDENTES DESTA CORTE – RÉU QUE FORNECEU CHEQUE PRODUTO DE FURTO COMO FORMA DE PAGAMENTO DO CAMINHÃO DA VÍTIMA – PREJUÍZO EVIDENCIADO – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE A ENSEJAR A CONDENAÇÃO DO RÉU – PLEITO PELA REDUÇÃO DO VALOR FIXADO PARA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA – POSSIBILIDADE – JUÍZO QUE ARBITROUA QUO VALOR SUPERIOR AO MÍNIMO LEGAL SEM APRESENTAR FUNDAMENTAÇÃO PARA TANTO – NECESSIDADE DE READEQUAÇÃO DO PARA O MÍNIMO LEGAL, QUALQUANTUM SEJA, 01 (UM) SALÁRIO MÍNIMO – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 5ª C. Criminal - 0000368-16.2015.8.16.0146 - Rio Negro - Rel.: Luiz Osório Moraes Panza - J. 14.02.2019) [griso nosso] O acusado Roni Márcio Machado confessou a prática dos crimes de estelionato contra idosos. Segundo ele, o golpe do bilhete premiado era praticado por duas pessoas. Uma assumia o papel de colono, fingia estar perdida e pedia ajuda com um bilhete de loteria nas mãos. A outra assumia o papel de executivo e simulava uma ligação à Caixa Econômica Federal, confirmando um valor alto de prêmio. A vítima eraconvencida a fazer transferências de dinheiro (via Pix, por exemplo) em troca de uma parte do prêmio. Foi ele que fez o papel do executivo e não havia necessidade de violência, apenas da ganância da vítima (cf. mov. 172.5). O acusado Cleisson de Souza Guil dos Santos afirmou em seu interrogatório que todas as acusações de estelionato eram verdadeiras. De acordo com ele, no golpe do bilhete premiado ele se passava por “caipira do mato”, uma pessoa sem instrução, que havia ganhado na loteria, e Roni simulava uma ligação à Caixa Econômica Federal para confirmar o valor do prêmio e oferecia uma gratificação para a vítima ajudar a receber o dinheiro. Nunca precisou forçar ninguém; as vítimas sempre acreditavam na vantagem prometida. O réu conheceu Roni no bairro onde morava e aceitou participar dos golpes, devido à necessidade financeira e à falta de instrução. Admitiu ter praticado outros golpes no passado e contou que somente recebia uma pequena parte do dinheiro obtido com as vítimas (cf. mov. 172.6). Com efeito, pela análise conjunta das provas produzidas nos autos é possível vislumbrar com absoluta certeza o modus operandi dos acusados, que aplicaram na vítima, com 63 anos de idade na época dos fatos, o chamado golpe do bilhete premiado, no dia 7/5/2024. Cleisson abordou o ofendido em via pública com uma história confusa. Roni surgiu na condução de um veículo como um estranho querendo ajudar e, ao saber que Cleisson tinha um bilhete de loteria e não conseguia resgatar o prêmio, visando convencer a vítima da narrativa, fingiu que confirmava a história. Depois ele e seu comparsa pediram que a vítima entregasse dinheiro em troca de parte do valor que supostamente seria recebido por Cleisson. No entanto, logo após a entrega do valor que o próprio Roni ajudou a sacar, a vítima foi deixada na cidade de Pinhais/PR, enquanto os golpistas se evadiram com seu celular. O depoimento da vítima foi harmônico e coeso e ela reconheceu os acusados. Tem-se, ainda, que tanto Cleisson quanto Roni confessaram a prática do delito ao serem interrogados em juízo. As imagens juntadas aos autos e o extrato bancário demonstram, ainda, que os fatos ocorreram conforme a narrativa da vítima.O documento juntado no mov. 12.15, p. 14, comprova saques de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais, R$ 3.800,00 e R$ 5.000,00 e uma compra no débito no valor de R$ 4.000,00). A vítima entregou seu celular aos réus, avaliado em R$ 1.000,00 (mil reais, cf. auto de avaliação de mov. 69.1), totalizando R$ 15.000,00 (quinze mil reais) de prejuízo. A propósito: O acusado Roni, de acordo com a vítima, entrou com ela na Caixa Econômica Federal do Pinheirinho e fez o saque no valor de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais). Em seguida, conforme imagens de câmeras de segurança juntadas nos movs. 1.11-1.14 da ação cautelar n. 0011878-22.2024.8.16.0013, Roni ficou aguardando o ofendido fazer um saque de R$ 3.800,00 do lado de fora de uma lotérica no Bairro Capão Raso.E, por último, acompanhou a vítima em outra agência da Caixa Econômica Federal, no Bairro Capão Raso, e fez um saque de R$ 5.000,00. A tese defensiva de mera participação de menor importância dos acusados não se aplica ao caso em concreto, pois coautores do crime e não mero partícipes, de acordo com a teoria unitária vigente na lei penal (cf. artigo 29 do Código Penal). Ambos participaram diretamente da abordagem e auxiliaram de maneira decisiva na consecução da ação criminosa, mediante artifício (encenação) e ardil (mentiras verbais, conversa ardilosa e enganosa). Veja-se que o golpe do bilhete premiado é praticado por uma dupla de criminosos, em que um se apresenta como uma pessoa humilde que não consegue resgatar o prêmio por algum motivo e está desesperada para recebê-lo, e a outrasurge para validar a história, comprometendo-se a ajudar mediante recompensa para convencer a vítima a também fazê-lo, conduta que facilita a consumação do crime. Julio Fabbrini Mirabete leciona sobre o tema: “Embora de forma não expressa, ao tratar do concurso de pessoas, a lei distingue a co-autoria da participação. Aquela existe quando o agente pratica ato de execução do ilícito, ou, conforme a teoria moderna, quando tem o domínio final do fato; esta quando a pessoa colabora com o ilícito em ato penalmente indiferente em si, sem praticar ato de execução ou ter o domínio do fato”. (Código Penal interpretado, 1 a . ed., São Paulo: Atlas, 2000. p. 237) A jurisprudência não se distancia da doutrina: “É co-autor do roubo qualificado pelo resultado lesão grave o agente que, na realização do roubo, também tinha o domínio do fato delituoso pela realização conjunta da conduta criminosa, dentro do prévio ajuste e da colaboração material, ainda que seu comparsa tenha sido o único autor dos disparos feitos contra vítima, lesionada gravemente”. (TACRSP RJDTACRIM) "Para a caracterização da coautoria no concurso de pessoas é necessário somente a colaboração do agente para o deslinde da prática delituosa, inexigindo-se que todos os partícipes tenham consumado atos típicos de execução"(RT 751/695). Ainda, para o Tribunal de Justiça do Paraná, a participação de cada réu em golpe do bilhete premiado, com divisão de tarefas clara entre eles, caracteriza a coautoria nos crimes. Nesse sentido: DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO, FURTO QUALIFICADO TENTADO E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. RECURSO DOS RÉUS (APELAÇÕES 1, 2, 3, 4, 5 E 6) – PLEITOS ABSOLUTÓRIOS – ACOLHIMENTO PARCIAL APENAS EM RELAÇÃO AOS RÉUS JAKSON (APELAÇÃO 1) E JULIANO (APELAÇÃO 3) – PEDIDOS DE REFORMA DA DOSIMETRIA – IMPROCEDÊNCIA. I. CASO EM EXAME1. Apelação crime visando a reforma da sentença que condenou os réus pela prática dos crimes de estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, em decorrência da aplicação do golpe do bilhete premiado, onde os denunciados abordaram a vítima, induzindo-a a erro e causando-lhe prejuízo financeirosignificativo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se os apelantes devem ser absolvidos das acusações de estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, ou se as condenações devem ser mantidas com base nas provas apresentadas nos autos. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Os réus foram condenados por estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, com base em provas robustas, incluindo depoimentos das vítimas e imagens de câmeras de segurança.4. A participação de cada réu foi devidamente comprovada, com divisão de tarefas clara entre eles, caracterizando a coautoria nos crimes, exceto em relação ao réu Jakson (em relação aos delitos de furto qualificado e associação criminosa) e em relação ao réu Juliano (em relação ao crime de associação criminosa).5. O réu Jakson deve ser absolvido do crime de furto qualificado tentado, pois não participou da subtração do cartão bancário.6. Os réus Jakson e Juliano devem ser absolvidos da acusação de prática do delito de associação criminosa7. As alegações de nulidade das provas e de ausência de justa causa foram rejeitadas, pois a denúncia foi fundamentada em indícios suficientes de autoria e materialidade dos delitos.8. Os pedidos de revisão de dosimetria da pena não comportam acolhimento.IV. DISPOSITIVO 9. Apelação 1 conhecida e parcialmente provida; apelação 2 parcialmente conhecida e não provida; apelação 3 conhecida e parcialmente provida; apelações 4, 5 e 6 conhecidas e não providas. (...) (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0003573-29.2023.8.16.0031 - Guarapuava - Rel.: SUBSTITUTO PEDRO LUIS SANSON CORAT - J. 27.03.2025) [grifo nosso] Aplicável, portanto, o artigo 29, caput, do Código Penal, pois todo aquele que concorre para o crime responde pelas penas a este cominadas. Cabe mencionar, ainda, que, apesar de a defesa técnica não ter suscitado expressamente a tese de estado de necessidade, o acusado Cleisson alegou ter praticado o delito por estar passando por dificuldades financeiras. Contudo, o fato de o réu estar em momento financeiro delicado – assim como milhões de brasileiros – não configura a excludente de ilicitude do artigo 24 do Código Penal – e não autoriza a prática de condutas típicas. Em caso recente e semelhante, assim também julgou o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: “APELAÇÃO CRIMINAL. AÇÃO PENAL. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. BUSCA E APREENSÃO.ENCONTRADO NA RESIDÊNCIA DO RÉU 1 BALANÇA DE PRECISÃO, QUANTIA EM DINHEIRO (R$21,55), 27 (VINTE E SENTE) GRAMAS DE COCAÍNA E 113 (CENTO E TREZE) GRAMAS DE MACONHA. PRISÃO EM FLAGRANTE. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO. FALTA DE INTERESSE RECURSAL QUANTO ÀS ATENUANTES DE CONFISSÃO E MENORIDADE RELATIVA. SENTENÇA QUE CONCEDEU TAIS BENESSES. ALEGAÇÃO DE ESTADO DE NECESSIDADE. DESCABIMENTO. REQUISITOS DO ARTIGO 24 DO CP NÃO PREENCHIDOS. DIFICULDADE FINANCEIRA QUE NÃO EXCLUI A ILICITUDE DELITUOSA. PLEITO PELA DIMINUIÇÃO DE PENA POR TRÁFICO PRIVILEGIADO. DEPOIMENTO DO RÉU QUE EVIDENCIA SUA DEDICAÇÃO À ATIVIDADE ILÍCITA. REQUISITOS LEGAIS DO PARÁGRAFO 4º DO ARTIGO 33 DA LEI Nº 11.343/06 NÃO SATISFEITOS. QUANTIDADE DA PENA QUE IMPOSSIBILITA A SUBSTITUIÇÃO DA PRIVATIVA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. REGIME INICIAL QUE DEVE SER O SEMI-ABERTO, CONFORME ALÍNEA “B” DO PARÁGRAFO 2º DO ARTIGO 33 DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, NÃO PROVIDO. (TJPR - 3ª C.Criminal - 0027060-46.2018.8.16.0017 - Maringá - Rel.: DESEMBARGADOR SERGIO ROBERTO NOBREGA ROLANSKI - J. 18.05.2020) [grifo nosso] Depreende-se, portanto, que as provas são aptas em apontar a prática do delito de estelionato em desfavor dos acusados, os quais obtiveram para si vantagem pecuniária, induzindo e mantendo a vítima em erro mediante afirmação de que havia um bilhete premiado. Observou-se, por fim, que os réus possuíam plenas condições de compreender o caráter criminoso de suas condutas, podendo determinar-se de acordo com tal entendimento, de forma que conheciam a ilicitude dos fatos por eles praticados, deles se exigindo atitude diversa. 1.5. DO ARTIGO 171, PARÁGRAFO 4º, DO CÓDIGO PENAL (4º FATO) A materialidade do delito foi demonstrada pelo boletim de ocorrência (cf. mov. 12.17, p. 4-5), pelo auto de reconhecimento fotográfico de Roni (cf. mov. 12.17, p. 22-24), pelos extratos bancários que comprovam os saques realizados (cf. mov. 12.17, p. 11-15), pelo relatório de imagens (cf. movs. 12.17, p. 34-36 e 12.21 a 12.25) e pela prova oral colhida nos autos. Cumpre ressaltar que as provas produzidas na fase policial possuem pleno valor probatório e são aptas aembasar uma condenação, desde que confirmadas em juízo, observando-se o contraditório e a ampla defesa. Foi o que se constatou no caso em tela, em que a robusta prova obtida na fase policial, ainda no calor dos fatos, foi corroborada pelo conjunto probatório produzido em juízo. A jurisprudência nacional confirma o afirmado supra: “A prova policial só deve ser desprezada, afastada, como elemento válido e aceitável de convicção, quando totalmente ausente prova judicial confirmatória ou quando desmentida, contrariada ou nulificada pelos elementos probantes colhidos em juízo através de regular instrução. Havendo, porém, prova produzida no contraditório, ainda que menos consistente, pode e deve aquela ser considerada e chamada para, em conjunto com esta, compor quadro probante suficientemente nítido e preciso” (TJRS, RJTJERGS 150/143- 4). [grifo nosso] A autoria, por sua vez, também foi devidamente comprovada pelos documentos já referidos e pela prova oral produzida em juízo e recai sob o réu Roni. O ofendido Antônio Alves Feitosa disse que foi abordado por um indivíduo branco, que aparentava ter cerca de 35 anos, e procurava um endereço. Outro homem se aproximou, afirmando que o endereço não existia. Então, o primeiro indivíduo falou estar com um bilhete premiado e o segundo ligou para o gerente da Caixa Econômica Federal e confirmou que ele era premiado. Depois ele sugeriu dividir o valor, que seria de aproximadamente R$ 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil reais), e o convenceu a fornecer seus dados pessoais e a senha do cartão em troca da divisão de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais). Os golpistas realizaram saques e transações em diferentes lugares. Na Caixa Econômica Federal, foram feitos saques de R$ 2.000,00 (dois mil reais) e de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em duas agências. O primeiro saque foi feito pelos criminosos, e o segundo pelo ofendido. Em uma panificadora, uma maquininha foi usada para debitar R$ 5.000,00 (cinco mil reais) de sua poupança. No Banco Itaú, os golpistas sacaram R$ 1.300,00 (três mil e trezentos reais). Eles também o levaram à sua casa, onde pegou e entregou aos criminosos R$ 1.000,00 (mil reais). Após perceber que o bilhete que eles deixaram com ele era falso, registrou boletim de ocorrência e bloqueou os cartões. Indagado, descreveu que um dos indivíduos era mais velho e tinha cabelo grisalho, e o outro era mais jovem, magro e bem trajado, com cabelo maisescuro. Viu fotografias de duas pessoas em delegacia e, sem qualquer dúvida, as reconheceu como autoras do delito (cf. mov. 118.4). Destarte, deve-se conferir especial destaque ao valor probatório da palavra da vítima em casos como o em tela, a qual vem sendo reconhecida pela jurisprudência nacional como prova apta a embasar a condenação: APELAÇÃO CRIMINAL - ESTELIONATO (ART. 171, CAPUT, C/C ART. 71, AMBOS DO CP) - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELA DEFESA DO RÉU - PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO, NA MODALIDADE RETROATIVA - RECONHECIMENTO, DE OFÍCIO, DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO ACUSADO, EM RELAÇÃO A OITO DOS NOVE FATOS DELITIVOS - INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 107, INCISO IV; 109, INCISO V; E 110, §1º, TODOS DO CP - PLEITO PELA ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO - AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – PALAVRA DA VÍTIMA QUE TEM ELEVADO VALOR PROBANTE E ESTÁ EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS - PRECEDENTES DESTA CORTE - CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE A ENSEJAR NA CONDENAÇÃO DO RÉU - READEQUAÇÃO DA PENA FINAL - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 5ª C. Criminal - AC - 1710156-5 - Guarapuava - Rel.: Luiz Osorio Moraes Panza - Unânime - J. 14.12.2017) [griso nosso] APELAÇÃO CRIMINAL – ESTELIONATO (ART. 171, DO CP) – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO PELA DEFESA DO RÉU – PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO, NA MODALIDADE RETROATIVA – REJEIÇÃO – LAPSO TEMPORAL DA PRETENSÃO PUNITIVA QUE NÃO FORA EXTRAPOLADO – PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO – AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – OFENDIDO QUE RECONHECEU, SEM SOMBRA DE DÚVIDA, O ACUSADO COMO AUTOR DO ESTELIONATO – PALAVRA DA VÍTIMA QUE TEM ELEVADO VALOR PROBANTE E ESTÁ EM CONSONÂNCIA COM AS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS – PRECEDENTES DESTA CORTE – RÉU QUE FORNECEU CHEQUE PRODUTO DE FURTO COMO FORMA DE PAGAMENTO DO CAMINHÃO DA VÍTIMA – PREJUÍZO EVIDENCIADO – CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE A ENSEJAR A CONDENAÇÃO DO RÉU – PLEITO PELA REDUÇÃO DO VALOR FIXADO PARA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA – POSSIBILIDADE – JUÍZO QUE ARBITROUA QUO VALOR SUPERIOR AO MÍNIMO LEGAL SEM APRESENTAR FUNDAMENTAÇÃO PARA TANTO – NECESSIDADE DE READEQUAÇÃO DO PARA O MÍNIMO LEGAL, QUALQUANTUM SEJA, 01 (UM) SALÁRIO MÍNIMO – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 5ª C. Criminal - 0000368-16.2015.8.16.0146 - Rio Negro - Rel.: Luiz Osório Moraes Panza - J. 14.02.2019) [griso nosso]O acusado Cleisson de Souza Guil dos Santos afirmou inicialmente em seu interrogatório que todas as acusações de estelionato eram verdadeiras. Em seguida, descreveu como ele e Roni aplicavam os golpes, cabendo a ele o papel de “caipira do mato”, uma pessoa sem instrução, que havia ganhado na loteria, e a Roni confirmar o valor do prêmio e oferecer uma gratificação às vítimas, caso elas o ajudassem a receber o dinheiro. Todavia, ao ser indagado pela defesa acerca do fato de somente Roni ter sido reconhecido pela vítima, afirmou o réu que já não estava mais “trabalhando” com ele na data em que o fato foi praticado, pois, em julho de 2024, já tinha um salão de beleza com sua esposa (cf. mov. 172.6). O acusado Roni Márcio Machado confessou a prática dos crimes de estelionato contra idosos. Segundo ele, o golpe do bilhete premiado era praticado por duas pessoas. Uma assumia o papel de colono, fingia estar perdida e pedia ajuda com um bilhete de loteria nas mãos. A outra assumia o papel de executivo e simulava uma ligação à Caixa Econômica Federal, confirmando um valor alto de prêmio. A vítima era convencida a fazer transferências de dinheiro (via Pix, por exemplo) em troca de uma parte do prêmio. Foi ele que fez o papel do executivo e não havia necessidade de violência, apenas da ganância da vítima (cf. mov. 172.5). Com efeito, pela análise conjunta das provas produzidas nos autos, é possível vislumbrar com absoluta certeza o modus operandi do acusado Roni, que aplicou na vítima, com 72 anos de idade, o chamado golpe do bilhete premiado, no dia 9/7/2024. Costa nos autos que um indivíduo pediu informações ao ofendido em via pública. Roni surgiu na condução de um veículo como um estranho querendo ajudar e, ao saber que este terceiro tinha um bilhete de loteria e não conseguia resgatar o prêmio, visando convencer a vítima da narrativa, fingiu que confirmava a história. Depois ele e seu comparsa pediram que a vítima entregasse dinheiro em troca de parte do valor que supostamente seria recebido por Cleisson. No entanto, logo após a entrega do dinheiro que o próprio Roni ajudou a sacar, os golpistas se evadiram, deixando o bilhete com a vítima, que, segundo consta no boletim de ocorrência, somente percebeu a fraude após relatar os fatos aos seus familiares.O depoimento da vítima foi coeso e ela reconheceu o acusado Roni. Tem-se, ainda, que Roni confessou a prática do delito ao ser interrogado em juízo. As imagens juntadas aos autos e o extrato bancário demonstram, ainda, que os fatos ocorreram conforme a narrativa da vítima. O documento juntado no mov. 12.17, p. 12/13 comprova os saques de R$1.200,00 (mil e duzentos reais), R$800,00 (oitocentos reais) e R$5.000,00 (cinco mil reais) em uma agência da Caixa Econômica Federal e o cartão de Antônio foi usado na Padaria Verona, de propriedade de Camila de Souza Rissardo, ocasião em que foi debitado R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Também foi feito um saque de R$ 500,00 (quinhentos reais) em uma agência do Banco Itaú e, posteriormente, os réus realizaram uma compra de R$ 1.300,00 (mil e trezentos reais - beneficiário RSHOP-MP Ateliê), totalizando R$ 13.800,00 (treze mil e oitocentos reais) de prejuízo. Nesse sentido:As imagens juntadas no relatório acostado no mov. 12.17, p. 34 a 36, demonstram também que Roni acompanhou Antônio no Banco Itaú.A tese defensiva de mera participação de menor importância de Roni não se aplica ao caso em concreto, pois coautor do crime e não mero partícipe, de acordo com a teoria unitária vigente na lei penal (cf. artigo 29 do Código Penal). Ele participou diretamente da abordagem e auxiliou de maneira decisiva na consecução da ação criminosa, mediante artifício (encenação) e ardil (mentiras verbais, conversa ardilosa e enganosa). Veja-se que o golpe do bilhete premiado é praticado por uma dupla de criminosos, em que um se apresenta como uma pessoa humilde que não consegue resgatar o prêmio por algum motivo e está desesperada para recebê-lo, e a outra surge para validar a história, comprometendo-se a ajudar mediante recompensa para convencer a vítima a também fazê-lo, conduta que facilita a consumação do crime. Julio Fabbrini Mirabete leciona sobre o tema: “Embora de forma não expressa, ao tratar do concurso de pessoas, a lei distingue a co-autoria da participação. Aquela existe quando o agente pratica ato de execução do ilícito, ou, conforme a teoria moderna, quando tem o domínio final do fato; esta quando a pessoa colabora com o ilícitoem ato penalmente indiferente em si, sem praticar ato de execução ou ter o domínio do fato”. (Código Penal interpretado, 1 a . ed., São Paulo: Atlas, 2000. p. 237) A jurisprudência não se distancia da doutrina: “É co-autor do roubo qualificado pelo resultado lesão grave o agente que, na realização do roubo, também tinha o domínio do fato delituoso pela realização conjunta da conduta criminosa, dentro do prévio ajuste e da colaboração material, ainda que seu comparsa tenha sido o único autor dos disparos feitos contra vítima, lesionada gravemente”. (TACRSP RJDTACRIM) "Para a caracterização da coautoria no concurso de pessoas é necessário somente a colaboração do agente para o deslinde da prática delituosa, inexigindo-se que todos os partícipes tenham consumado atos típicos de execução"(RT 751/695). Ainda, para o Tribunal de Justiça do Paraná, a participação de cada réu em golpe do bilhete premiado, com divisão de tarefas clara entre eles, caracteriza a coautoria nos crimes. Nesse sentido: DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO, FURTO QUALIFICADO TENTADO E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. RECURSO DOS RÉUS (APELAÇÕES 1, 2, 3, 4, 5 E 6) – PLEITOS ABSOLUTÓRIOS – ACOLHIMENTO PARCIAL APENAS EM RELAÇÃO AOS RÉUS JAKSON (APELAÇÃO 1) E JULIANO (APELAÇÃO 3) – PEDIDOS DE REFORMA DA DOSIMETRIA – IMPROCEDÊNCIA. I. CASO EM EXAME1. Apelação crime visando a reforma da sentença que condenou os réus pela prática dos crimes de estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, em decorrência da aplicação do golpe do bilhete premiado, onde os denunciados abordaram a vítima, induzindo-a a erro e causando-lhe prejuízo financeiro significativo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se os apelantes devem ser absolvidos das acusações de estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, ou se as condenações devem ser mantidas com base nas provas apresentadas nos autos. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Os réus foram condenados por estelionato, furto qualificado tentado e associação criminosa, com base em provas robustas, incluindo depoimentos das vítimas e imagens de câmeras de segurança.4. A participação de cada réu foi devidamente comprovada, com divisão de tarefas clara entre eles, caracterizando acoautoria nos crimes, exceto em relação ao réu Jakson (em relação aos delitos de furto qualificado e associação criminosa) e em relação ao réu Juliano (em relação ao crime de associação criminosa).5. O réu Jakson deve ser absolvido do crime de furto qualificado tentado, pois não participou da subtração do cartão bancário.6. Os réus Jakson e Juliano devem ser absolvidos da acusação de prática do delito de associação criminosa7. As alegações de nulidade das provas e de ausência de justa causa foram rejeitadas, pois a denúncia foi fundamentada em indícios suficientes de autoria e materialidade dos delitos.8. Os pedidos de revisão de dosimetria da pena não comportam acolhimento.IV. DISPOSITIVO 9. Apelação 1 conhecida e parcialmente provida; apelação 2 parcialmente conhecida e não provida; apelação 3 conhecida e parcialmente provida; apelações 4, 5 e 6 conhecidas e não providas. (...) (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0003573-29.2023.8.16.0031 - Guarapuava - Rel.: SUBSTITUTO PEDRO LUIS SANSON CORAT - J. 27.03.2025) [grifo nosso] Aplicável, portanto, o artigo 29, caput, do Código Penal, pois todo aquele que concorre para o crime responde pelas penas a este cominadas. Depreende-se, portanto, que as provas são aptas em apontar a prática do delito de estelionato em desfavor do acusado Roni, o qual obteve para si vantagem pecuniária, induzindo e mantendo a vítima em erro mediante afirmação de que havia um bilhete premiado. Situação diversa, no entanto, afigura-se em relação ao réu Cleisson. Isso porque, embora o codenunciado tenha afirmado ter agido da mesma forma em todos os crimes de estelionato, sempre em companhia de Cleisson, não foi acostado ao feito qualquer auto de reconhecimento em relação a ele. Ademais, Cleisson negou a prática do delito quando foi interrogado. Com esta afirmação, não se está a dizer que o réu não cometeu o delito, mas apenas que há fundada dúvida da autoria do delito em relação a Cleisson, que não pode ser dirimida em seu desfavor. Dessa forma, apesar das suspeitas, a prova colhida em juízo não foi apta em apontar a prática do delito de estelionato contra a vítima Antônio em desfavor do réu.Uma condenação não pode se embasar em meras conjeturas, sendo exigida a certeza da configuração da infração penal, circunstância que não se configurou no caso concreto, conforme acima descrito. A jurisprudência nacional confirma o afirmado supra: APELAÇÃO CRIME – CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA – 1. DEFESA PELA AUSÊNCIA DE INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA NA DENÚNCIA – AFASTADO – DESCRIÇÃO DOS FATOS CRIMINOSOS NA DENÚNCIA APTOS A PERMITIR O EXERCÍCIO DA AMPLA DEFESA – 2. ABSOLVIÇÃO – CABIMENTO – DÚVIDAS ACERCA DA AUTORIA DELITIVA – ACUSADOS QUE DECLARARAM QUE A EMPRESA ERA NA REALIDADE DOS FATOS ADMINISTRADA PELO IRMÃO JEAN – IRMÃO E DEMAIS TESTEMUNHAS DE DEFESA ARROLADAS EM RESPOSTA À ACUSAÇÃO – INDEFERIMENTO DA PROVA TESTEMUNHAL - VEDADA RESPONSABILIDADE PENAL OBJETIVA - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. “A denúncia, na hipótese de crime societário, não precisa conter descrição minuciosa e pormenorizada da conduta de cada acusado, sendo suficiente que, demonstrando o vínculo dos indiciados com a sociedade comercial, narre as condutas delituosas de forma a possibilitar o exercício da ampla defesa. ” (STF, HC 122450, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julg. 28.10.2014). Tendo em vista que existe nos autos dúvida de que os acusados foram autores do crime contra a ordem tributária, possuindo domínio do fato, impõe-se acolher o pedido de absolvição, com base no princípio in dubio pro reo. (TJPR - 2ª C.Criminal - 0007790-98.2016.8.16.0019 - Ponta Grossa - Rel.: DESEMBARGADOR LUIS CARLOS XAVIER - J. 23.05.2019) [grifo nosso] Forçosa, pois, a absolvição de Cleisson, em face da inexistência de provas suficientes para a condenação. Observou-se, por fim, que o réu Roni possuía plenas condições de compreender o caráter criminoso de sua conduta, podendo determinar-se de acordo com tal entendimento, de forma que conhecia a ilicitude do fato por ele praticado, dele se exigindo atitude diversa.1.6. DO ARTIGO 158, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL (5º FATO) A materialidade do delito foi demonstrada pelo boletim de ocorrência (cf. mov. 12.16, p. 3-4), pelos autos de reconhecimento fotográfico de Roni e Cleisson (cf. mov. 12.5, 12.6 e 12.16, p. 17-22), pelos extratos bancários que comprovam transferências por PIX (cf. mov. 12.16, p. 10/12), pelos extratos PIX – Pagamento Instantâneo (cf. mov. 161.2 dos autos n. 0011878-22.2024.8.16.0013) e pela prova oral colhida nos autos. Cumpre ressaltar que as provas produzidas na fase policial possuem pleno valor probatório e são aptas a embasar uma condenação, desde que confirmadas em juízo, observando-se o contraditório e a ampla defesa. Foi o que se constatou no caso em tela, em que a robusta prova obtida na fase policial, ainda no calor dos fatos, foi corroborada pelo conjunto probatório produzido em juízo. A jurisprudência nacional confirma o afirmado supra: “A prova policial só deve ser desprezada, afastada, como elemento válido e aceitável de convicção, quando totalmente ausente prova judicial confirmatória ou quando desmentida, contrariada ou nulificada pelos elementos probantes colhidos em juízo através de regular instrução. Havendo, porém, prova produzida no contraditório, ainda que menos consistente, pode e deve aquela ser considerada e chamada para, em conjunto com esta, compor quadro probante suficientemente nítido e preciso” (TJRS, RJTJERGS 150/143- 4). [grifo nosso] A autoria, por sua vez, também foi devidamente comprovada pelos documentos já referidos e pela prova oral produzida em juízo. O ofendido Nelson José da Silva contou que estava caminhando em uma estrada próxima à sua residência, quando foi abordado por um homem, que pediu informações e mostrou um cartão de loteria. Logo em seguida, outro indivíduo apareceu e, quando tentou se afastar, intimidou-o com uma arma de fogo. Depois foi colocado em um carro prata e indagado se tinha cartões bancários e aplicativos instalados em seu celular. Os sequestradores o levaram à sua casa e exigiram que ele pegasse o celular, sob a ameaça de invadi-la. Sua esposa,filha e neta recém-nascida estavam lá; por isso, ficou com medo e obedeceu a ordem. Depois, os criminosos exigiram que acessasse seus aplicativos e realizasse transferências via Pix, totalizando R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) do Banco Bradesco e R$ 5.000,00 (cinco mil reais) do Banco Inter. Após cerca de duas horas, foi libertado próximo ao aeroporto de São José dos Pinhais/PR. O primeiro agressor era um homem moreno, de cabelo curto e altura semelhante à sua, com aproximadamente 1,68 m. O segundo era mais velho, com cabelo grisalho e calvo, de estrutura física mais encorpada; ele estava armado, dirigiu o carro e ameaçou entrar em sua residência caso não saísse de lá rapidamente com seu celular. Enquanto esteve com os criminosos, eles pararam o veículo diversas vezes, a cada duas ou três quadras, e se revezaram ao se afastar do carro. Acreditava que, nestes momentos, eles verificavam se as transferências foram efetivadas, inclusive pelo seu celular, que eles levaram com eles. Na delegacia, viu fotografias e reconheceu os acusados sem qualquer dúvida. Mais tarde, confirmou o reconhecimento ao avistar cinco ou seis pessoas por um vidro. Somente o Banco Inter ressarciu a vítima. O ofendido ficou nervoso e não prestou atenção onde os indivíduos fizeram paradas. Não se recordava de eles terem parado no Posto Dois Irmãos e oferecido água ou lanche. Na Av. Rui Barbosa houve uma parada, mas não soube se ela ocorreu nas proximidades de uma empresa de ônibus. Também não soube qual tipo de arma eles usaram para intimidá-lo; o ofendido viu o artefato quando foi abordado e em sua casa. Acrescentou, ainda, que tinha R$ 129.000,00 (cento e vinte e nove mil reais) em sua conta, mas seu limite de transferência por PIX era R$ 60.000,00 (sessenta mil reais); portanto, os réus não sacaram tudo (cf. mov. 118.5). Destarte, deve-se conferir especial destaque ao valor probatório da palavra da vítima em casos como o em tela, o qual vem sendo reconhecida pela jurisprudência nacional como prova apta a embasar a condenação: “APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE EXTORSÃO QUALIFICADA MEDIANTE RESTRIÇÃO DA LIBERDADE DA VÍTIMA (ARTIGO 158, §3º, DO CÓDIGO PENAL), DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL E DE ROUBO TENTADO. NULIDADE DAPRELIMINAR INSTRUÇÃO PROCESSUAL. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL. ILICITUDE INEXISTENTE. REJEIÇÃO. PLEITOMÉRITO ABSOLUTÓRIO QUANTO AOS DELITOS DE EXTORSÃO E CONSTRANGIMENTO ILEGAL. IMPOSSIBILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. PALAVRA DA VÍTIMA CORROBORADA PELAS DEMAIS PROVAS DOS AUTOS. VALIDADE. CONDENAÇÃO MANTIDA.PEDIDO DE ISENÇÃO DA PENA QUANTO AO CRIME DE ROUBO TENTADO. DEPENDENTE QUÍMICO. NÃO ACOLHIMENTO. CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA. NÃO CONHECIMENTO. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CABIMENTO. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO, COM FIXAÇÃO DE VERBA HONORÁRIA”. (TJPR - 5ª C. Criminal - 0000004-72.2018.8.16.0038 - Fazenda Rio Grande - Rel.: Desembargadora Maria José de Toledo Marcondes Teixeira - J. 12.09.2019) [griso nosso] “APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME DE EXTORSÃO QUALIFICADA E MAJORADA (ARTIGO 158, § § 1º E 3º, DO código penal) – RECURSO DA DEFESA – PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE ESTELIONATO – NÃO ACOLHIMENTO – PALAVRA DA VÍTIMA, DE RELEVANTE VALOR PROBATÓRIO EM CRIMES DESSA NATUREZA, QUE CONFIRMA O CONSTRANGIMENTO, MEDIANTE GRAVE AMEAÇA, COM O INTUITO DE OBTER EXPRESSIVA VANTAGEM ECONÔMICA, COM RESTRIÇÃO A SUA LIBERDADE POR CERCA DE DUAS HORAS, AO EFEITO DECONDUZI-LA A DIVERSOS CAIXAS ELETRÔNICOS PARA EFETUAR SAQUES E EMPRÉSTIMOS A SEREM ENTREGUES AO ACUSADO E SEU COMPARSA – MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS CABALMENTE COMPROVADAS – TESE DESCLASSIFICATÓRIA NÃO ACOLHIDA, ATÉ PORQUE, não DEMONSTRADO QUE A OFENDIDA INCIDIU EM ERRO - CONDENAÇÃO MANTIDA - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO, COM IMEDIATA COMUNICAÇÃO AO JUÍZO”. (TJPR - 5ª C. Criminal - 0012405-96.2009.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: Desembargador Marcus Vinícius de Lacerda Costa - J. 25.04.2019) [griso nosso] O acusado Roni Márcio Machado declarou que aplicou o golpe do bilhete contra a vítima Nelson e não precisou mostrar arma de fogo nem a ameaçar para obter vantagem indevida. De acordo com ele, Cleisson abordou o ofendido na rua, afirmando que estava perdido e tinha um bilhete de loteria. Ele passou ao lado, foi chamado e confirmou que o bilhete era premiado. Cleisson disse que não tinha documento, porque o paiol de seu sítio pegou fogo, e daria dinheiro se ajudassem. Então, convenceu a vítima a aceitar a proposta e todos entraram em seu carro. Enquanto conversavam, o próprio ofendido propôs fazer transferência por PIX e fez duas, de contas diferentes, no valor total de R$ 65.000,00 (sessenta e cinco mil). Cabia a ele dar mais R$ 135.000,00 (cento e trinta e cinco mil reais) para ficarem com o bilhete premiado. Acabaram parando o carro em um posto de gasolina e, mesmo a vítima não querendo, entregou água a ela. Em seguida, pararam novamente, em outro lugar, porque o Wi-Fi estava ruim. Logo em seguida, quando as transferências finalizaram, pediu que a vítima fosse comprar água e foiembora com Cleisson. Rone alegou ainda que somente precisava de um bilhete de loteria que custava R$ 2,50 (dois reais e cinquenta centavos) e da ganância da vítima para aplicar o golpe. Desse modo, o crime praticado contra a vítima Nelson seria um estelionato e não uma extorsão (cf. mov. 172.5). O acusado Cleisson de Souza Guil dos Santos também negou ter ocorrido extorsão contra a vítima Nelson com uso de arma. Nunca precisou forçar ninguém, pois as vítimas sempre acreditavam na vantagem prometida. Roni propôs que ele e a vítima comprassem o bilhete por R$ 200.000,00 (duzentos mil reais). Quando afirmou que eles não tinham este valor, o ofendido disse que tinha e fez um Pix de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) de uma conta. Em seguida, ela tentou fazer outra transferência, de outra conta, no valor de R$ 9.000,00 (nove mil reais), mas não conseguiu. Nesse momento, ela disse que seu limite era de apenas R$ 5.000,00 (cinco mil reais), tendo feito um PIX neste valor. Quando a transação foi concluída, ele e Roni pediram que a vítima fosse comprar água e foram embora (cf. mov. 172.6). Sendo assim, muito embora tenham as defesas sustentado a desclassificação do delito imputado para o de estelionato, não há nos autos qualquer prova capaz de suscitar dúvida. Isso porque os réus constrangeram a vítima, mediante grave ameaça, a transferir valores de suas contas bancárias. Observe-se que Nelson foi abordado pelos acusados em via pública como as vítimas dos outros fatos, mas, diferentemente delas, os ignorou. Ainda segundo seus relatos, neste instante, houve emprego de arma de fogo pelo acusado Roni e quando foi obrigado a buscar seu celular, para garantir que nada relatasse a seus familiares. A ação dos réus envolveu, portanto, grave ameaça, imputando temor real à vítima, fato que se comprovou a partir do testemunho dela que, com clareza, afirmou em juízo o medo experimentado pela conduta dos acusados. De posse do celular de Nelson, os réus acessaram os aplicativos de Bancos Inter e Itaú, preencheram os valoresdas transferências por PIX no valor total de R$ 65.000,00 (sessenta e cinco mil reais), à conta de titularidade de Mell Aparecida Rissardo, e fizeram o idoso digitar suas senhas. Nelson permaneceu em poder de Roni e de Cleisson, trafegando por vias públicas, por cerca de duas horas, enquanto aguardavam a finalização das transferências e, concluídas, o abandonaram no Município de São José dos Pinhais/PR. Veja-se que não existe motivo para se duvidar da imparcialidade da vítima ouvida em juízo, porque ela olhou para cima em alguns momentos. Ausente nos autos qualquer indício que possa ensejar suspeita. A defesa, por outro lado, não produziu qualquer prova em sentido contrário, ônus que lhe competia, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal. Os extratos bancários acostados no mov. 12.16, p. 12 e 23 demonstram, ainda, que os fatos ocorreram conforme a narrativa da vítima. Some-se a isso o fato de Nelson também ter reconhecido Roni e Cleisson como autores do delito por fotografia e pessoalmente (cf. mov. 12.16, p. 17-22). Não há dúvidas, pois, de que os réus constrangeram a vítima mediante grave ameaça, usando uma arma de fogo para ter acesso a seus aplicativos bancários e senhas, com o fim de obter vantagem ilícita, isto é, R$ 65.000,00 (sessenta e cinco mil reais), além do celular da vítima. Nessa linha, os seguintes julgados:CRIME DE EXTORSÃO TENTADO (ART. 158 C/C ART. 14, INCISO II, AMBOS DO CP). PLEITO DE JUSTIÇA GRATUITA. NÃO CONHECIDO. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO. PRECEDENTE. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. NÃO ACOLHIDO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA. COMPROVADAS. PALAVRA DA VÍTIMA EM CONSONÂNCIA COM OS DEMAIS ELEMENTOS EXISTENTES NOS AUTOS. CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL DO RÉU. PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE ESTELIONATO. REJEITADO. CRIME PRATICADO MEDIANTE GRAVE AMEAÇA. CONDUTA QUE SE AMOLDA AO DISPOSTO NO TIPO PENAL PREVISTO NO ARTIGO 158 DO CP. SENTENÇA MANTIDA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 3ª Câmara Criminal - 0002231-07.2022.8.16.0196 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR JOÃO DOMINGOS KÜSTER PUPPI - J. 25.03.2024) [grifo nosso] APELAÇÃO CRIMINAL. EXTORSÃO (ARTIGO 158, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL). PRELIMINAR. ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA, POR FALTA DE REALIZAÇÃO DA EXTRAÇÃO DE DADOS NO APARELHO CELULAR DO AGENTE. REJEIÇÃO. MÉRITO. ABSOLVIÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. PRÁTICA DO CRIME DE EXTORSÃO CONFIGURADA. PROVAS SEGURAS. PALAVRA DA VÍTIMA. RELEVÂNCIA. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE ESTELIONATO. NÃO ACOLHIMENTO. CONDENAÇÃO MANTIDA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. POSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO, PRELIMINAR REJEITADA, MÉRITO DESPROVIDO, COM FIXAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. Não há que se falar em absolvição do delito de extorsão, uma vez que o conjunto probatório colhido nos autos é suficiente para embasar o édito condenatório. (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0002130-36.2023.8.16.0098 - Jacarezinho - Rel.: DESEMBARGADORA MARIA JOSÉ DE TOLEDO MARCONDES TEIXEIRA - J. 24.02.2024) [grifo nosso] A tese defensiva de mera participação de menor importância dos acusados não se aplica ao caso em concreto, pois coautores do crime e não mero partícipes, de acordo com a teoria unitária vigente na lei penal (cf. artigo 29 do Código Penal). Ambos participaram diretamente da abordagem e auxiliaram de maneira decisiva na consecução da ação criminosa. Veja-se que a superioridade numérica de agentes, somada à grave ameaça pelo uso de arma por parte de um dos criminosos, incutiu medo à vítima, o que facilitou a consumação do crime. Julio Fabbrini Mirabete leciona sobre o tema: “Embora de forma não expressa, ao tratar do concurso de pessoas, a lei distingue a co-autoria da participação. Aquela existe quando o agente pratica ato de execução do ilícito, ou, conforme a teoria moderna, quando tem o domíniofinal do fato; esta quando a pessoa colabora com o ilícito em ato penalmente indiferente em si, sem praticar ato de execução ou ter o domínio do fato”. (Código Penal interpretado, 1 a . ed., São Paulo: Atlas, 2000. p. 237) A jurisprudência não se distancia da doutrina: “É co-autor do roubo qualificado pelo resultado lesão grave o agente que, na realização do roubo, também tinha o domínio do fato delituoso pela realização conjunta da conduta criminosa, dentro do prévio ajuste e da colaboração material, ainda que seu comparsa tenha sido o único autor dos disparos feitos contra vítima, lesionada gravemente”. (TACRSP RJDTACRIM) "Para a caracterização da coautoria no concurso de pessoas é necessário somente a colaboração do agente para o deslinde da prática delituosa, inexigindo-se que todos os partícipes tenham consumado atos típicos de execução"(RT 751/695). Aplicável, portanto, o artigo 29, caput, do Código Penal, pois todo aquele que concorre para o crime responde pelas penas a este cominadas. E apesar de a defesa técnica não ter suscitado expressamente a tese de estado de necessidade, o acusado Cleisson alegou ter praticado o delito por estar passando por dificuldades financeiras. Contudo, o fato de estar em momento financeiro delicado – assim como milhões de brasileiros – não configura a excludente de ilicitude do artigo 24 do Código Penal – e não autoriza a prática de condutas típicas. Em caso recente e semelhante, assim também julgou o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: “APELAÇÃO CRIMINAL. AÇÃO PENAL. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. BUSCA E APREENSÃO. ENCONTRADO NA RESIDÊNCIA DO RÉU 1 BALANÇA DE PRECISÃO, QUANTIA EM DINHEIRO (R$21,55), 27 (VINTE E SENTE) GRAMAS DE COCAÍNA E 113 (CENTO E TREZE) GRAMAS DE MACONHA. PRISÃO EM FLAGRANTE. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO. FALTA DE INTERESSE RECURSAL QUANTO ÀS ATENUANTES DE CONFISSÃO E MENORIDADE RELATIVA. SENTENÇA QUE CONCEDEU TAIS BENESSES. ALEGAÇÃO DE ESTADO DE NECESSIDADE. DESCABIMENTO. REQUISITOS DO ARTIGO 24 DO CP NÃO PREENCHIDOS. DIFICULDADE FINANCEIRA QUE NÃO EXCLUI A ILICITUDE DELITUOSA. PLEITO PELA DIMINUIÇÃODE PENA POR TRÁFICO PRIVILEGIADO. DEPOIMENTO DO RÉU QUE EVIDENCIA SUA DEDICAÇÃO À ATIVIDADE ILÍCITA. REQUISITOS LEGAIS DO PARÁGRAFO 4º DO ARTIGO 33 DA LEI Nº 11.343/06 NÃO SATISFEITOS. QUANTIDADE DA PENA QUE IMPOSSIBILITA A SUBSTITUIÇÃO DA PRIVATIVA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. REGIME INICIAL QUE DEVE SER O SEMI-ABERTO, CONFORME ALÍNEA “B” DO PARÁGRAFO 2º DO ARTIGO 33 DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, NÃO PROVIDO. (TJPR - 3ª C.Criminal - 0027060-46.2018.8.16.0017 - Maringá - Rel.: DESEMBARGADOR SERGIO ROBERTO NOBREGA ROLANSKI - J. 18.05.2020) [grifo nosso] A majorante prevista pelo artigo 158, parágrafo 1º, do Código Penal, outrossim, deve ser prontamente reconhecida, pois se evidenciou, até mesmo pela fundamentação supra, que o delito se deu mediante concurso de pessoas e com emprego de arma de fogo. Nem se diga que a falta de apreensão da arma e a realização de exame pericial para atestar a sua potencialidade lesiva retira a incidência da citada majorante. Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça permite a incidência da majorante do emprego de arma de fogo sem a necessidade de apreensão, desde que comprovado por outros meios de prova (Neste sentido: REsp n. 2.172.293/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 18/2/2025, DJEN de 25/2/2025 e HC n. 876.904/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 10/12/2024, DJEN de 16/12/2024). E foi o que se observou no caso em liça, pois a robusta prova oral (declaração consistente da vítima) deu conta da utilização de uma arma de fogo na prática do delito de extorsão. Observou-se, por fim, que os réus possuíam plenas condições de compreender o caráter criminoso de suas condutas, podendo determinar-se de acordo com tal entendimento, de forma que conheciam a ilicitude dos fatos praticados, deles se exigindo atitude diversa. 2. DISPOSITIVOPelo exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado, para o fim de para o fim condenar RONI MÁRCIO MACHADO pela prática dos delitos previstos pelo artigo 171, parágrafo 4º (1º, 2º, 3º e 4º fatos), e pelo artigo 158, parágrafo 1º (5º fato), na forma do artigo 69, todos do Código Penal. CLEISSON DE SOUZA DIAS DOS SANTOS pela prática dos delitos previstos pelo artigo 171, parágrafo 4º (1º, 2º e 3º fatos), por três vezes, e pelo artigo 158, parágrafo 1º (5º fato), na forma do artigo 69, todos do Código Penal. Absolvo, por outro lado, o réu CLEISSON DE SOUZA DIAS DOS SANTOS da imputação do delito previsto pelo artigo 171, parágrafo 4º (4º fato), com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. A pedido da defesa, concedo aos acusados os benefícios da justiça gratuita, isentando-os do pagamento das custas processuais. Observe-se a fixação da pena a seguir. 2.1. DO RÉU RONI MÁRCIO MACHADO Embora o réu tenha praticado quatro crimes de estelionato, será explicitada somente duas dosimetrias, uma para a vítima Hermínio e outra às demais vítimas, pois seriam absolutamente idênticas. 2.1.1. DO ARTIGO 171, PARÁGRAFO 4º, DO CÓDIGO PENAL (1º FATO) A culpabilidade da conduta do réu se demonstrou agravada, haja vista que presente no caso em liça a premeditação; veja-se que o condenado e seu comparsa atuaram de acordo com a história inventada para enganar a vítima idosa; um deles era humilde e ganhou na loteria, e o outro convenceu a vítima ao confirmar o prêmio e quando aceitou a proposta de ajudar mediante recompensa; some-se a isso o fato de os réus terem os dados de contas de terceiros (da empresa Mell Aparecida Rissardo LTDA., de José Luís Rissardo e de suafilha Camila de Souza Rissardo) para receber transferências ou débitos, caso não fosse possível o saque em dinheiro ou fosse mais conveniente outra espécie de transação bancária; a respeito do assunto, destaque-se julgado do Tribunal de Justiça do Paraná: AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LATROCÍNIO. DOSIMETRIA DA PENA. MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA. DECISÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM CONFORME JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PENA RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. 1. Não há contradição, pois a decisão agravada reconheceu a circunstância atenuante somente em relação ao corréu José, haja vista que a possibilidade de reconhecimento dessa circunstância também para o agravante não foi objeto de análise do Tribunal de origem, seja no acórdão que julgou o apelo criminal (fls. 2.570-2.592), seja no acórdão que rejeitou os embargos de declaração (fls. 3.125-3.128), isto é, a matéria carece de prequestionamento, devendo, então, ser aplicado o verbete 211 da Súmula desta Corte Superior. 2. Não há omissão na decisão agravada, pois nela consta claramente que se tem por fundamentada a valoração negativa das circunstâncias do delito, praticado mediante concurso de mais de duas pessoas e com emprego de arma de fogo, com grande poder de destruição, porquanto em sintonia com a jurisprudência desta Corte; assim como, constitui fundamento válido para a negativação das consequências do delito o fato de uma das vítima ter sido feita refém, com restrição de liberdade, sendo ainda causadas lesões corporais de natureza grave; e ainda a valoração negativa da culpabilidade também não é ilegal, pois, nos termos do entendimento do STJ, "a premeditação do crime permite, a toda evidência, a majoração da pena-base a título de culpabilidade, pois demonstra o dolo intenso e o maior grau de censura a ensejar resposta penal superior" (HC n. 553.427/PE, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 12/2/2020). 3. Refutou-se também, na decisão agravada, a tese de ocorrência de participação de menor importância, pois, de acordo com a jurisprudência, "descabida a alegação dos agentes quanto à participação de menor importância no delito, porquanto é pacífico o entendimento no sentido de que todos que participam do latrocínio em concurso de agentes são responsáveis pelo resultado mais gravoso, seguindo regra prevista no art. 29, caput, do Código Penal" (AgRg no AgRg no AREsp n. 1710516/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 6/10/2020, DJe 13/10/2020), sendo, de toda sorte, imprópria a via do especial à revisão do entendimento firmado pelas instâncias ordinárias. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no AREsp n. 1.932.846/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato(Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 8/8/2023, DJe de 18/8/2023.) [grifo nosso] Observe-se que, em decisão envolvendo o próprio acusado em caso semelhante, no RHC/218493 - Recurso Ordinário em Habeas Corpus, o Supremo Tribunal Federal manteve decisão de que a valoração negativa da culpabilidade decorre do maior grau de reprovabilidade da conduta, aferido pela premeditação, a qual não constitui elemento do tipo; o condenado possui maus antecedentes, pois foi condenado pelo crime de estelionato contra idoso em quatro oportunidades (autos n. 0000634- 09.2018.8.24.0135, Vara Criminal de Navegantes/SC, com trânsito em julgado em 18/8/2020; autos n. 5004284- 06.2022.8.24.0113, Vara Criminal de Balneário Camboriú/SC, com trânsito em julgado em 17/12/2022 e autos n. 0008396- 06.2017.8.24.0008, 2ª Vara Criminal de Blumenau/SC, com trânsito em julgado em 16/2/20248. A pena de todos os crimes foi extinta pelo cumprimento, em 12/6/2024; também foi o réu condenado por estelionato tentado nos autos n. 0002681- 47.2015.8.16.0146, na Vara Criminal de Rio Negro/PR, com trânsito em julgado em 12/6/2019 e extinção da pena em 11/9/2020 (cf. mov. 234.1 dos autos de execução n. 0000739- 49.2019.8.24.0135 - SEEU); como todas importam em reincidência, uma delas pode ser utilizada nesta fase de dosimetria de pena sem que haja bis in idem (TJPR - 3ª C.Criminal em Composição Integral - RCACI - 824094-0 - Paranavaí - Rel.: José Cichocki Neto - Unânime - J. 31.01.2013); não há elementos nos autos capazes de conferir subsídios para a análise da conduta social e da personalidade do réu; o motivo do crime é o esperado para delitos como o em tela; as circunstâncias não se afastaram da normalidade do esperado pelo tipo penal; as consequências do crime praticado pelo condenado não foram graves; o comportamento da vítima não influiu na prática delituosa do condenado, não podendo ser utilizado como critério para aumentar ou diminuir a pena-base. Tendo em vista o exposto supra, fixo a pena base em 2 (dois) anos reclusão e 97 (noventa e sete) dias- multa. Cabe acrescentar que a pena de multa aplicada é plenamente proporcional com a sanção privativa de liberdade. Conforme pôde se observar, o critério utilizado por este magistrado na primeira fase de dosimetria de pena foi puramente matemático: considerou-se a pena máxima cominada, aqual foi diminuída pela mínima; o resultado deste cálculo foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Tal critério é o melhor possível, pois é o único que tornaria possível a eventual aplicação de uma sanção privativa de liberdade máxima, caso todas as circunstâncias judiciais fossem ruins. O mesmo critério foi utilizado com relação à pena de multa. Considerou-se o máximo possível (360 dias- multa) e o mínimo (10 dias-multa), e o resultado da diminuição de ambos foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Somente assim, em caso de pena privativa de liberdade máxima, seria matematicamente possível aplicar também a sanção de multa em seu patamar máximo. Diante disso, tanto a pena corporal quanto a de multa guardam plena proporção entre si, o que torna sem sentido o critério aplicado em algumas decisões dos tribunais, que tão somente transformam em dias-multa o número obtido pela pena privativa de liberdade: tal cálculo inviabilizaria qualquer possibilidade de aplicação de sanção máxima de multa, pois, caso a pena do estelionato fosse de 5 (cinco) anos de reclusão, a multa atingiria somente 60 (sessenta) dias-multa, circunstância que não guarda qualquer lógica. Concorre a circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea ‘d’, do Código Penal, verificada na confissão espontânea da autoria do crime, com a circunstância agravante prevista no artigo 61, inciso I, do mesmo diploma legal, pois consta que o réu é reincidente (cf. mov. 234.1). Tendo em vista que o condenado possui múltiplas condenações definitivas, aplica-se ao caso em tela o TEMA 585 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que "(...) nos casos de multirreincidência, deve ser reconhecida a preponderância da agravante prevista no artigo 61, I, do Código Penal , sendo admissível a sua compensação proporcional com a atenuante da confissão espontânea, em estrito atendimento aos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade". De mais a mais, mostra-se proporcional o aumento da pena em 1/6 (um sexto), segundo recentíssima decisão do mesmo tribunal: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. MULTIREINCIDÊNCIA. PREPONDERÂNCIA DA AGRAVANTE. POSSIBILIDADE. QUANTUM DE 1/6 PROPORCIONALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Nos casos de multirreincidência deve ser reconhecida a preponderância da agravante prevista no art. 61, I, doCódigo Penal, sendo admissível a sua compensação proporcional com a atenuante da confissão espontânea. 2. No caso em exame, não se mostra possível proceder à compensação integral entre a reincidência e a confissão espontânea, tendo em vista que o recorrente possui múltiplas condenações definitivas, o que, nos termos da jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, permite a preponderância da circunstância agravante. 3. O aumento da pena em 1/6 em razão da reincidência mostra- se proporcional, não havendo ilegalidade a ser sanada. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 959.588/SC, relator Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 26/3/2025, DJEN de 31/3/2025.) [grifo nosso] Sendo assim, aumento a pena em 1/6, resultando em uma sanção de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 113 (cento e treze) dias-multa. O crime foi cometido contra idoso, nos termos do parágrafo 4º do artigo 171 do Código Penal; a pena aumenta- se, portanto, em 1/3 (um terço), motivo pelo qual fixo a sanção penal em 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão e 150 (cento e cinquenta) dias-multa, a ser cumprida inicialmente em regime fechado, tendo em vista a reincidência, nos termos do artigo 33, parágrafo 2º, alínea ‘a’, do Código Penal. Levando-se em conta a situação econômica do réu, nos termos do artigo 60, caput, do Código Penal, fixo o valor do dia-multa em um trigésimo do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, quantia esta que deverá ser atualizada, quando da execução, pelos índices de correção monetária vigentes (cf. artigo 49, parágrafos 1º e 2º, do Código Penal). Em razão da reincidência em crime doloso, da aplicação da regra do cúmulo material e das péssimas circunstâncias judiciais, deixo de aplicar as benesses dos artigos 44 e 77, ambos do Código Penal. 2.1.2. DO ARTIGO 171, PARÁGRAFO 4º, DO CÓDIGO PENAL (2º, 3º E 4º FATOS) A culpabilidade da conduta do réu se demonstrou agravada, haja vista que presente no caso em liça apremeditação; veja-se que o condenado e seu comparsa atuaram de acordo com a história inventada para enganar a vítima idosa; um deles era humilde e ganhou na loteria, e o outro convenceu a vítima ao confirmar o prêmio e quando aceitou a proposta de ajudar mediante recompensa; some-se a isso o fato de os réus terem os dados de contas de terceiros (da empresa Mell Aparecida Rissardo LTDA., de José Luís Rissardo e de sua filha Camila de Souza Rissardo) para receber transferências ou débitos, caso não fosse possível o saque em dinheiro ou fosse mais conveniente outra espécie de transação bancária; a respeito do assunto, destaque-se julgado do Tribunal de Justiça do Paraná: AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LATROCÍNIO. DOSIMETRIA DA PENA. MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA. DECISÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM CONFORME JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PENA RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. 1. Não há contradição, pois a decisão agravada reconheceu a circunstância atenuante somente em relação ao corréu José, haja vista que a possibilidade de reconhecimento dessa circunstância também para o agravante não foi objeto de análise do Tribunal de origem, seja no acórdão que julgou o apelo criminal (fls. 2.570-2.592), seja no acórdão que rejeitou os embargos de declaração (fls. 3.125-3.128), isto é, a matéria carece de prequestionamento, devendo, então, ser aplicado o verbete 211 da Súmula desta Corte Superior. 2. Não há omissão na decisão agravada, pois nela consta claramente que se tem por fundamentada a valoração negativa das circunstâncias do delito, praticado mediante concurso de mais de duas pessoas e com emprego de arma de fogo, com grande poder de destruição, porquanto em sintonia com a jurisprudência desta Corte; assim como, constitui fundamento válido para a negativação das consequências do delito o fato de uma das vítima ter sido feita refém, com restrição de liberdade, sendo ainda causadas lesões corporais de natureza grave; e ainda a valoração negativa da culpabilidade também não é ilegal, pois, nos termos do entendimento do STJ, "a premeditação do crime permite, a toda evidência, a majoração da pena-base a título de culpabilidade, pois demonstra o dolo intenso e o maior grau de censura a ensejar resposta penal superior" (HC n. 553.427/PE, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 12/2/2020). 3. Refutou-se também, na decisão agravada, a tese de ocorrência de participação de menor importância, pois, de acordo com a jurisprudência, "descabida a alegação dos agentes quanto à participação de menor importância no delito, porquanto é pacífico o entendimento no sentido de que todos que participam do latrocínio em concurso de agentes são responsáveis peloresultado mais gravoso, seguindo regra prevista no art. 29, caput, do Código Penal" (AgRg no AgRg no AREsp n. 1710516/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 6/10/2020, DJe 13/10/2020), sendo, de toda sorte, imprópria a via do especial à revisão do entendimento firmado pelas instâncias ordinárias. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no AREsp n. 1.932.846/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 8/8/2023, DJe de 18/8/2023.) [grifo nosso] Observe-se que, em decisão envolvendo o próprio acusado em caso semelhante, no RHC/218493 - Recurso Ordinário em Habeas Corpus, o Supremo Tribunal Federal manteve decisão de que a valoração negativa da culpabilidade decorre do maior grau de reprovabilidade da conduta, aferido pela premeditação, que não constitui elemento do tipo; o condenado possui maus antecedentes, pois foi condenado pelo crime de estelionato contra idoso em quatro oportunidades (autos n. 0000634- 09.2018.8.24.0135, Vara Criminal de Navegantes/SC, com trânsito em julgado em 18/8/2020; autos n. 5004284- 06.2022.8.24.0113, Vara Criminal de Balneário Camboriú/SC, com trânsito em julgado em 17/12/2022 e autos n. 0008396- 06.2017.8.24.0008, 2ª Vara Criminal de Blumenau/SC, com trânsito em julgado em 16/2/20248; a pena de todos os crimes foi extinta pelo cumprimento, em 12/6/2024; também foi o réu condenado por estelionato tentado nos autos n. 0002681- 47.2015.8.16.0146, Vara Criminal de Rio Negro/PR, com trânsito em julgado em 12/6/2019 e extinção da pena em 11/9/2020 (cf. mov. 234.1 dos autos de execução n. 0002825-79.2019.8.16.0146 - SEEU); veja-se que, como todas importam em reincidência, uma delas pode ser utilizada nesta fase de dosimetria de pena sem que haja bis in idem (TJPR - 3ª C.Criminal em Composição Integral - RCACI - 824094-0 - Paranavaí - Rel.: José Cichocki Neto - Unânime - J. 31.01.2013); não há elementos nos autos capazes de conferir subsídios para a análise da conduta social e da personalidade do réu; o motivo do crime é o esperado para delitos como o em tela; as circunstâncias não se afastaram da normalidade do esperado pelo tipo penal; as consequências dos crimes praticado pelo condenado foram graves; isso porque as vítimas tiveram elevado prejuízo financeiro com transferências de valores de suas contas bancárias até que atingissem o limite acordado com seus bancos; em outras palavras, entregaram as vítimas tudo que podiam ao réu e seu comparsa, comprometendo, portanto, suas economias; assim, nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná,quando o prejuízo é de grande monta, deve ser elevada a pena- base: “APELAÇÃO CRIME. APROPRIAÇÃO INDÉBITA MAJORADA EM RAZÃO DA PROFISSÃO (ARTIGO 168, § 1º, INCISO III DO CÓDIGO PENAL) POR 96 VEZES E ESTELIONATO (ARTIGO 171, CAPUT DO CÓDIGO PENAL) EM CONCURSO MATERIAL. (...) DOSIMETRIA DA PENA-BASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO DE GRANDE MONTA QUE AUTORIZA O JUÍZO DE MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. SENTENÇA MANTIDA.RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) IX - "(...)3. Admite-se a consideração do montante do prejuízo para se valorar negativamente a circunstância judicial atinente às consequências do crime de estelionato, desde que se verifique a ocorrência de especial reprovabilidade, como na hipótese concreta. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 184.906/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 04/06/2014)"” (TJPR - 4ª C.Criminal - AC - 1590599-0 - Curitiba - Rel.: Desembargador Celso Jair Mainardi - Unânime - J. 06.07.2017) “APELAÇÕES CRIMINAIS. ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO. CONCURSO DE PESSOAS. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. AÇÃO PENAL PÚBLICA. SENTENÇA CONDENATÓRIA.1. RECURSO DA DEFESA. PLEITO DE REVISÃO DO CONJUNTO DOSIMÉTRICO. AFASTAMENTO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS NEGATIVAMENTE VALORADAS. ANTECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE. PRÁTICA DE CRIME ANTERIOR AOS FATOS COM TRÂNSITO EM JULGADO POSTERIOR QUE CONFIGURA MAUS ANTECEDENTES. MOTIVOS DO CRIME. NECESSIDADE DE AFASTAMENTO. FUNDAMENTAÇÃO INERENTE AO TIPO PENAL. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. INVIABILIDADE. INCIDÊNCIA DE DUAS MAJORANTES, SENDO QUE UMA DELAS FOI ADEQUADAMENTE VALORADA NA PRIMEIRA FASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO DE GRANDE MONTA QUE AUTORIZA O JUÍZO DE MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. (...) IV - Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, “admite -se a exasperação da pena-base pela valoração negativa das consequências do delito com base no valor do prejuízo sofrido pela vítima (AgRg no REsp n. 1.728.124/RO, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 6/6/2018 (...) (TJPR – 4ª C.Criminal – 0064116-25.2018.8.16.0014 – Londrina - Rel.: Desembargador Celso Jair Mainardi - J. 11.07.2019) “APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. PRELIMINAR. PROVA EMPRESTADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO. MÉRITO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. PALAVRAS DAS VÍTIMAS. RECONHECIMENTO REALIZADO E CONFIRMADO EM JUÍZO. CONJUNTO PROBATÓRIO SEGURO. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO QUE É DE RIGOR. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO RELEVANTE. MOTIVAÇÃOIDÔNEA. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APLICAÇÃO DA LEI ANTERIOR (MAIS BENÉFICA). NÃO CONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. REGIME ABERTO. IMPOSSIBILIDADE. EXEGESE DO ART. 33, §2°, “B”, DO CÓDIGO PENAL. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO. (TJPR - 5ª C.Criminal - 0015444-86.2018.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: Desembargadora Maria José de Toledo Marcondes Teixeira – J. 11.07.2019) O comportamento das vítimas não influiu na prática delituosa do condenado, não podendo ser utilizado como critério para aumentar ou diminuir a pena-base. Tendo em vista o exposto supra, fixo a pena base em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 141 (cento e quarenta e um) dias-multa. Cabe acrescentar que a pena de multa aplicada é plenamente proporcional com a sanção privativa de liberdade. Conforme pôde se observar, o critério utilizado por este magistrado na primeira fase de dosimetria de pena foi puramente matemático: considerou-se a pena máxima cominada, a qual foi diminuída pela mínima; o resultado deste cálculo foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Tal critério é o melhor possível, pois é o único que tornaria possível a eventual aplicação de uma sanção privativa de liberdade máxima, caso todas as circunstâncias judiciais fossem ruins. O mesmo critério foi utilizado com relação à pena de multa. Considerou-se o máximo possível (360 dias- multa) e o mínimo (10 dias-multa), e o resultado da diminuição de ambos foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Somente assim, em caso de pena privativa de liberdade máxima, seria matematicamente possível aplicar também a sanção de multa em seu patamar máximo. Diante disso, tanto a pena corporal quanto a de multa guardam plena proporção entre si, o que torna sem sentido o critério aplicado em algumas decisões dos tribunais, que tão somente transformam em dias-multa o número obtido pela pena privativa de liberdade: tal cálculo inviabilizaria qualquer possibilidade de aplicação de sanção máxima de multa, pois, caso a pena do estelionato fosse de 5 (cinco) anos de reclusão, a multa atingiria somente 60 (sessenta) dias-multa, circunstância que não guarda qualquer lógica.Concorre a circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea ‘d’, do Código Penal, verificada na confissão espontânea da autoria do crime, com a circunstância agravante prevista no artigo 61, inciso I, do mesmo diploma legal, pois consta nos autos que o réu possuiu várias condenações (cf. mov. 234.1). Tendo em vista que o réu possui múltiplas condenações definitivas, aplica-se ao caso em tela o TEMA 585 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que "(...) nos casos de multirreincidência, deve ser reconhecida a preponderância da agravante prevista no artigo 61, I, do Código Penal , sendo admissível a sua compensação proporcional com a atenuante da confissão espontânea, em estrito atendimento aos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade". De mais a mais, mostra-se proporcional o aumento da pena em 1/6, segundo recentíssima decisão do mesmo tribunal: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. MULTIREINCIDÊNCIA. PREPONDERÂNCIA DA AGRAVANTE. POSSIBILIDADE. QUANTUM DE 1/6 PROPORCIONALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Nos casos de multirreincidência deve ser reconhecida a preponderância da agravante prevista no art. 61, I, do Código Penal, sendo admissível a sua compensação proporcional com a atenuante da confissão espontânea. 2. No caso em exame, não se mostra possível proceder à compensação integral entre a reincidência e a confissão espontânea, tendo em vista que o recorrente possui múltiplas condenações definitivas, o que, nos termos da jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, permite a preponderância da circunstância agravante. 3. O aumento da pena em 1/6 em razão da reincidência mostra- se proporcional, não havendo ilegalidade a ser sanada. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 959.588/SC, relator Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 26/3/2025, DJEN de 31/3/2025.) [grifo nosso] Sendo assim, aumento a pena em 1/6, resultando em uma sanção de 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão e 164 (cento e sessenta e quatro) dias-multa. Os crimes foram cometidos contra idosos, nos termos do parágrafo 4º do artigo 171 do Código Penal; a pena aumenta-se, portanto, em 1/3 (um terço), motivo pelo qual fixo a sanção penal 3 (três) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 218 (duzentos e dezoito) dias-multa, a ser cumprida inicialmente em regime fechado, tendo em vista areincidência em crime doloso, nos termos do artigo 33, parágrafo 2º, alínea ‘a’, do Código Penal. Levando-se em conta a situação econômica do réu, nos termos do artigo 60, caput, do Código Penal, fixo o valor do dia-multa em um trigésimo do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, quantia esta que deverá ser atualizada, quando da execução, pelos índices de correção monetária vigentes (cf. artigo 49, parágrafos 1º e 2º, do Código Penal). Em razão da reincidência em crime doloso, da aplicação da regra de exasperação da pena e das péssimas circunstâncias judiciais, deixo de aplicar as benesses dos artigos 44 e 77, ambos do Código Penal. 2.1.3. DO ARTIGO 158, PARÁGRAFO 1º, DO CÓDIGO PENAL (5º FATO) A culpabilidade da conduta do réu se demonstrou agravada, haja vista que presente no caso em liça a premeditação; veja-se que o condenado e seu comparsa atuaram de acordo com a história inventada para enganar a vítima idosa; um deles era humilde e ganhou na loteria, e o outro convenceu a vítima ao confirmar o prêmio e quando aceitou a proposta de ajudar mediante recompensa; some-se a isso o fato de os réus terem os dados de contas de terceiros (da empresa Mell Aparecida Rissardo LTDA., de José Luís Rissardo e de sua filha Camila de Souza Rissardo) para receber transferências ou débitos, caso não fosse possível o saque em dinheiro ou fosse mais conveniente outra espécie de transação bancária; a respeito do assunto, destaque-se julgado do Tribunal de Justiça do Paraná: AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LATROCÍNIO. DOSIMETRIA DA PENA. MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA. DECISÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM CONFORME JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PENA RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. 1. Não há contradição, pois a decisão agravada reconheceu a circunstância atenuante somente em relação ao corréu José, haja vista que a possibilidade de reconhecimento dessa circunstância também para o agravante não foi objeto de análise do Tribunal de origem, seja no acórdão que julgou o apelo criminal (fls. 2.570-2.592), seja no acórdão que rejeitou os embargos de declaração (fls. 3.125-3.128), istoé, a matéria carece de prequestionamento, devendo, então, ser aplicado o verbete 211 da Súmula desta Corte Superior. 2. Não há omissão na decisão agravada, pois nela consta claramente que se tem por fundamentada a valoração negativa das circunstâncias do delito, praticado mediante concurso de mais de duas pessoas e com emprego de arma de fogo, com grande poder de destruição, porquanto em sintonia com a jurisprudência desta Corte; assim como, constitui fundamento válido para a negativação das consequências do delito o fato de uma das vítima ter sido feita refém, com restrição de liberdade, sendo ainda causadas lesões corporais de natureza grave; e ainda a valoração negativa da culpabilidade também não é ilegal, pois, nos termos do entendimento do STJ, "a premeditação do crime permite, a toda evidência, a majoração da pena-base a título de culpabilidade, pois demonstra o dolo intenso e o maior grau de censura a ensejar resposta penal superior" (HC n. 553.427/PE, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 12/2/2020). 3. Refutou-se também, na decisão agravada, a tese de ocorrência de participação de menor importância, pois, de acordo com a jurisprudência, "descabida a alegação dos agentes quanto à participação de menor importância no delito, porquanto é pacífico o entendimento no sentido de que todos que participam do latrocínio em concurso de agentes são responsáveis pelo resultado mais gravoso, seguindo regra prevista no art. 29, caput, do Código Penal" (AgRg no AgRg no AREsp n. 1710516/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 6/10/2020, DJe 13/10/2020), sendo, de toda sorte, imprópria a via do especial à revisão do entendimento firmado pelas instâncias ordinárias. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no AREsp n. 1.932.846/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 8/8/2023, DJe de 18/8/2023.) [grifo nosso] Observe-se que, em decisão envolvendo o próprio acusado em caso semelhante, no RHC/218493 - Recurso Ordinário em Habeas Corpus, o Supremo Tribunal Federal manteve decisão de que a valoração negativa da culpabilidade decorre do maior grau de reprovabilidade da conduta, aferido pela premeditação, que não constitui elemento do tipo; o condenado possui maus antecedentes, pois foi condenado pelo crime de estelionato contra idoso em quatro oportunidades (autos n. 0000634- 09.2018.8.24.0135, Vara Criminal de Navegantes/SC, com trânsito em julgado em 18/8/2020; autos n. 5004284- 06.2022.8.24.0113, Vara Criminal de Balneário Camboriú/SC, com trânsito em julgado em 17/12/2022 e autos n. 0008396- 06.2017.8.24.0008, 2ª Vara Criminal de Blumenau/SC, comtrânsito em julgado em 16/2/20248; a pena de todos os crimes foi extinta pelo cumprimento, em 12/6/2024; também foi o réu condenado por estelionato tentado nos autos n. 0002681- 47.2015.8.16.0146, Vara Criminal de Rio Negro/PR, com trânsito em julgado em 12/6/2019 e extinção da pena em 11/9/2020 (cf. mov. 234.1 dos autos de execução n. 0002825-79.2019.8.16.0146 - SEEU); veja-se que, como todas importam em reincidência, uma delas pode ser utilizada nesta fase de dosimetria de pena sem que haja bis in idem (TJPR - 3ª C.Criminal em Composição Integral - RCACI - 824094-0 - Paranavaí - Rel.: José Cichocki Neto - Unânime - J. 31.01.2013); não há elementos nos autos capazes de conferir subsídios para a análise da conduta social e da personalidade do réu; o motivo do crime é o esperado para delitos como o em tela; as circunstâncias não se afastaram da normalidade do esperado pelo tipo penal; as consequências dos crimes praticado pelo condenado foram graves; isso porque as vítimas tiveram elevado prejuízo financeiro com transferências de valores de suas contas bancárias até que atingissem o limite acordado com seus bancos; em outras palavras, entregaram as vítimas tudo que podiam ao réu e seu comparsa, comprometendo, portanto, suas economias; assim, nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, quando o prejuízo é de grande monta, deve ser elevada a pena- base: “APELAÇÃO CRIME. APROPRIAÇÃO INDÉBITA MAJORADA EM RAZÃO DA PROFISSÃO (ARTIGO 168, § 1º, INCISO III DO CÓDIGO PENAL) POR 96 VEZES E ESTELIONATO (ARTIGO 171, CAPUT DO CÓDIGO PENAL) EM CONCURSO MATERIAL. (...) DOSIMETRIA DA PENA-BASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO DE GRANDE MONTA QUE AUTORIZA O JUÍZO DE MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. SENTENÇA MANTIDA.RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) IX - "(...)3. Admite-se a consideração do montante do prejuízo para se valorar negativamente a circunstância judicial atinente às consequências do crime de estelionato, desde que se verifique a ocorrência de especial reprovabilidade, como na hipótese concreta. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 184.906/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 04/06/2014)" (TJPR - 4ª C.Criminal - AC - 1590599-0 - Curitiba - Rel.: Desembargador Celso Jair Mainardi - Unânime - J. 06.07.2017) “APELAÇÕES CRIMINAIS. ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO. CONCURSO DE PESSOAS. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. AÇÃO PENAL PÚBLICA. SENTENÇA CONDENATÓRIA.1. RECURSO DA DEFESA. PLEITO DE REVISÃO DO CONJUNTO DOSIMÉTRICO. AFASTAMENTO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS NEGATIVAMENTE VALORADAS.ANTECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE. PRÁTICA DE CRIME ANTERIOR AOS FATOS COM TRÂNSITO EM JULGADO POSTERIOR QUE CONFIGURA MAUS ANTECEDENTES. MOTIVOS DO CRIME. NECESSIDADE DE AFASTAMENTO. FUNDAMENTAÇÃO INERENTE AO TIPO PENAL. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. INVIABILIDADE. INCIDÊNCIA DE DUAS MAJORANTES, SENDO QUE UMA DELAS FOI ADEQUADAMENTE VALORADA NA PRIMEIRA FASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO DE GRANDE MONTA QUE AUTORIZA O JUÍZO DE MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. (...) IV - Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, “admite -se a exasperação da pena-base pela valoração negativa das consequências do delito com base no valor do prejuízo sofrido pela vítima (AgRg no REsp n. 1.728.124/RO, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 6/6/2018 (...) (TJPR – 4ª C.Criminal – 0064116-25.2018.8.16.0014 – Londrina - Rel.: Desembargador Celso Jair Mainardi - J. 11.07.2019) “APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. PRELIMINAR. PROVA EMPRESTADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO. MÉRITO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. PALAVRAS DAS VÍTIMAS. RECONHECIMENTO REALIZADO E CONFIRMADO EM JUÍZO. CONJUNTO PROBATÓRIO SEGURO. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO QUE É DE RIGOR. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO RELEVANTE. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APLICAÇÃO DA LEI ANTERIOR (MAIS BENÉFICA). NÃO CONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. REGIME ABERTO. IMPOSSIBILIDADE. EXEGESE DO ART. 33, §2°, “B”, DO CÓDIGO PENAL. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO. (TJPR - 5ª C.Criminal - 0015444-86.2018.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: Desembargadora Maria José de Toledo Marcondes Teixeira - J. 11.07.2019) O comportamento da vítima não influiu na prática delituosa do condenado, não podendo ser utilizado como critério para aumentar ou diminuir a pena-base. Tendo em vista o exposto supra, fixo a pena- base em 6 (seis) anos e 3 (três) meses de reclusão e 141 (cento e quarenta e um) dias-multa. Cabe acrescentar que a pena de multa aplicada é plenamente proporcional com a sanção privativa de liberdade. Conforme pôde se observar, o critério utilizado por este magistrado na primeira fase de dosimetria de pena foi puramente matemático: considerou-se a pena máxima cominada, a qual foi diminuída pela mínima; o resultado deste cálculo foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei.Tal critério é o melhor possível, pois é o único que tornaria possível a eventual aplicação de uma sanção privativa de liberdade máxima, caso todas as circunstâncias judiciais fossem ruins. O mesmo critério foi utilizado com relação à pena de multa. Considerou-se o máximo possível (360 dias- multa) e o mínimo (10 dias-multa), e o resultado da diminuição de ambos foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Somente assim, em caso de pena privativa de liberdade máxima, seria matematicamente possível aplicar também a sanção de multa em seu patamar máximo. Diante disso, tanto a pena corporal quanto a de multa guardam plena proporção entre si, o que torna sem sentido o critério aplicado em algumas decisões dos tribunais, que tão somente transformam em dias-multa o número obtido pela pena privativa de liberdade: tal cálculo inviabilizaria qualquer possibilidade de aplicação de sanção máxima de multa, pois, caso a pena do extorsão fosse de 10 (dez) anos de reclusão, a multa atingiria somente 120 (cento e vinte) dias-multa, circunstância que não guardaria qualquer lógica. Não se aplica a circunstância atenuante da confissão, tendo em vista que o acusado, apesar de confirmar ter aplicado o golpe do bilhete premiado, negou ter constrangido a vítima mediante grave ameaça. Mesmo que assim não fosse, aplicar-se-ia ao caso em tela o TEMA 585 do Superior Tribunal de Justiça pelo fato de o réu ser multireincidente. Observou-se que o réu é reincidente (cf. mov. 234.1). Nesse sentido, deve ser aplicada a circunstância agravante prevista pelo artigo 61, inciso I, do Código Penal. Seguindo amplo entendimento jurisprudencial (HC 186.769/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, T5, DJe 12/06/2012), aumento a pena em 1/6, resultando em uma sanção de 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 164 (cento e sessenta e quatro) dias-multa. Tem-se, ainda, que o crime foi cometido por duas pessoas, circunstância que elevou o poder de intimidação, e com emprego de arma de fogo, aumentando o potencial lesivo da ação criminosa, diante do alto poder ofensivo do armamento, motivo pelo qual aplico a causa especial de aumento prevista pelo parágrafo 1º do artigo 158 do Código Penal com aumento da pena acima do mínimo previsto. Sendo assim, aplicando-se umacréscimo de 1/2, fixo a pena em 10 (dez) anos, 11 (onze) meses e 7 (sete) dias de reclusão e 246 (duzentos e quarenta e seis) dias-multa, a ser cumprida inicialmente em regime fechado, tendo em vista a reincidência em crime doloso, nos termos do artigo 33, parágrafo 2, alínea ‘a’, do Código Penal. Levando-se em conta a situação econômica do réu, nos termos do artigo 60, caput, do Código Penal, fixo o valor do dia-multa em um trigésimo do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, quantia esta que deverá ser atualizada, quando da execução, pelos índices de correção monetária vigentes (cf. artigo 49, parágrafos 1º e 2º, do Código Penal). Em razão da reincidência em crime doloso, da quantidade de pena aplicada, da aplicação da regra do cúmulo material, da grave ameaça e das péssimas circunstâncias judiciais, deixo de aplicar as benesses dos artigos 44 e 77, ambos do Código Penal. 2.1.4. DA APLICAÇÃO DA REGRA DO ARTIGO 69 DO CÓDIGO PENAL Deve ser reconhecido o concurso material entre os quatro crimes de estelionato e o de extorsão. Isso porque, conforme se extrai do conjunto probatório, a prática dos delitos não foi eventual e esporádica e não havia um vínculo subjetivo ligando as condutas imputadas ao condenado. Em outras palavras, foi comprovado que o réu praticou os delitos com desígnios autônomos, sendo delinquente contumaz, porquanto praticou os ilícitos em 10/11/2023, 30/1/2024, 7/5/2024 e 9/7/2024 (não estando também exatamente preenchido o requisito objetivo de 30 dias entre cada delito). Além disso, conforme a certidão do sistema oráculo, o acusado cometeu outros crimes de estelionato, empregando o mesmo modus operandi, indicando, indubitavelmente, que fazia do crime seu meio de subsistência desde 2015 (cf. mov. 234.1 – autos n. 0000634- 09.2018.8.24.0135, praticado em 20/2/2018; autos n. 5004284- 06.2022.8.24.0113, praticado em 26/5/2022; autos n. 0008396-06.2017.8.24.0008, praticado em 1º/6/2016 e autos n. 0002681- 47.2015.8.16.0146, praticado em 24/7/2015). A habitualidade delitiva, segundo entendimento jurisprudencial, afasta a possibilidade de reconhecimento da continuidade entre os crimes de estelionato. Nesse sentido: RECURSOS DE APELAÇÃO CRIME. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, ROUBOS MAJORADOS PELO CONURSO DE AGENTES E PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO E CORRUPÇÃO DE MENORES.RECURSO DO RÉU MARCELO. PLEITO PARA ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. NÃO ACOLHIMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE A DEMONSTRAR A ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA DOS INTEGRANTES. CONDENAÇÃO MANTIDA. PLEITO PARA ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE CORRUPÇÃO DE MENORES. IMPOSSIBILIDADE. CRIME DE PERIGO ABSTRATO QUE INDEPENDE DA EFETIVA CORRUPÇÃO DO MENOR. SÚMULA 500, DO STJ. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDORECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INSURGÊNCIA VOLTADA UNICAMENTE À DOSIMETRIA DA PENA DOS DELITOS DE ROUBOS. PLEITO PARA RECRUDESCIMENTO DA PENA-BASE PELA DESVALORAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. ACOLHIMENTO. EXCESSIVA AGRESSIVIDADE MANIFESTADA POR OCASIÃO DOS DELITOS, ALÉM DA UTILIZAÇÃO DA ARMA DE FOGO. PLEITO PARA AFASTAMENTO DO CONCURSO MATERIAL ENTRE OS FATOS 4 E 5, ACOLHIMENTO. HABITUALIDADE NA PRÁTICA DELITIVA QUE AFASTA A APLICAÇÃO DA CONTINUIDADE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO, COM A READEQUAÇÃO DA PENA IMPOSTA. (TJPR - 3ª C.Criminal - 0010248- 77.2014.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ CARLOS DALACQUA - J. 30.11.2021) [grifo nosso] PENAL. ESTELIONATO. CONTINUIDADE DELITIVA. ART. 71 DO CP. RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITO SUBJETIVO. AUSÊNCIA. DELINQUÊNCIA HABITUAL. DILAÇÃO PROBATÓRIA. VEDAÇÃO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça entende que, para a caracterização da continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), é necessário que estejam preenchidos, cumulativamente, os requisitos de ordem objetiva (pluralidade de ações, mesmas condições de tempo, lugar e modo de execução) e o de ordem subjetiva, assim entendido como a unidade de desígnios ou o vínculo subjetivo havido entre os eventos delituosos. 2. A Corte local concluiu que os crimes foram perpetrados com desígnios autônomos, elemento que demonstra a ausência de preenchimento do requisito subjetivo, indispensável ao reconhecimento da continuidade delitiva. 3. Consoante orientação desta Corte Superior e do Supremo Tribunal Federal, a reiteração indicativa de delinquência habitual ou profissional é suficiente para afastar a caracterização do crime continuado.4. O mandamus não é a via apta para a realização de juízo de constatação da existência de suporte probatório a amparar a tese defensiva, o que seria necessário para a averiguação da ocorrência da continuidade delitiva. Precedentes. 5. Habeas corpus não conhecido. (HC 297.624/MS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 24/02/2015, DJe 02/03/2015) [grifo nosso] Portanto, dada a inexistência do elemento subjetivo, em especial se tratando de criminoso habitual, incabível a aplicação do benefício da continuidade delitiva entre os delitos de estelionato, devendo ser considerado o concurso material com o crime de extorsão, nos termos do artigo 69 do Código Penal, somando-se as penas impostas. Posto isto, condeno o réu a uma pena de 25 (vinte e cinco) anos, 8 (oito) meses e 17 (dezessete) dias de reclusão e 1.050 (mil e cinquenta) dias-multa (cf. artigo 72 do Código Penal), a ser cumprida inicialmente em regime fechado, tendo em vista a reincidência e o disposto no artigo 33, parágrafo 2º, alínea ‘a’, do Código Penal. Quanto ao disposto no artigo 387, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal, o tempo de prisão cumprido até a presente data é de 8 (oito) meses e 15 (quinze) dias – segundo informação extraída do sistema PROJUDI - período esse que, detraído da sanção fixada, importa em um quantum de pena remanescente de 25 (vinte e cinco) anos e 2 (dois) dias; tal circunstância, no entanto, não foi suficiente para alterar o regime de cumprimento da sanção penal, máxime diante da quantidade de pena remanescente. Levando-se em conta a situação econômica do réu, nos termos do artigo 60, caput, do Código Penal, fixo o valor do dia-multa em um trigésimo do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, quantia esta que deverá ser atualizada, quando da execução, pelos índices de correção monetária vigentes (cf. artigo 49, parágrafos 1º e 2º, do Código Penal). Tendo em vista a reincidência em crime doloso, a quantidade de pena aplicada, as péssimas circunstâncias judiciais e a grave ameaça do crime de extorsão, deixo de aplicar as regras previstas pelos artigos 44 e 77, ambos do Código Penal.2.2. DO RÉU CLEISSON DE SOUZA DIAS DOS SANTOS Embora o réu tenha praticado três crimes de estelionato, será explicitada somente duas dosimetrias, uma para a vítima Hermínio e outra para as demais vítimas, pois seriam absolutamente idênticas. 2.2.1. DO ARTIGO 171, PARÁGRAFO 4º, DO CÓDIGO PENAL (1º FATO) A culpabilidade da conduta do réu se demonstrou agravada, haja vista que presente no caso em liça a premeditação; veja-se que o condenado e seu comparsa atuaram de acordo com a história inventada para enganar a vítima idosa; um deles era humilde e ganhou na loteria, e o outro convenceu a vítima ao confirmar o prêmio e quando aceitou a proposta de ajudar mediante recompensa; some-se a isso o fato de os réus terem os dados de contas de terceiros (da empresa Mell Aparecida Rissardo LTDA., de José Luís Rissardo e de sua filha Camila de Souza Rissardo) para receber transferências ou débitos, caso não fosse possível o saque em dinheiro ou fosse mais conveniente outra espécie de transação bancária; a respeito do assunto, destaque-se julgado do Tribunal de Justiça do Paraná: AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LATROCÍNIO. DOSIMETRIA DA PENA. MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA. DECISÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM CONFORME JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PENA RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. 1. Não há contradição, pois a decisão agravada reconheceu a circunstância atenuante somente em relação ao corréu José, haja vista que a possibilidade de reconhecimento dessa circunstância também para o agravante não foi objeto de análise do Tribunal de origem, seja no acórdão que julgou o apelo criminal (fls. 2.570-2.592), seja no acórdão que rejeitou os embargos de declaração (fls. 3.125-3.128), isto é, a matéria carece de prequestionamento, devendo, então, ser aplicado o verbete 211 da Súmula desta Corte Superior. 2. Não há omissão na decisão agravada, pois nela consta claramente que se tem por fundamentada a valoração negativa das circunstâncias do delito, praticado mediante concurso de mais de duas pessoas e com emprego de arma de fogo, com grande poder de destruição, porquanto em sintonia com a jurisprudência desta Corte; assim como, constitui fundamento válido para a negativação das consequências do delito o fatode uma das vítima ter sido feita refém, com restrição de liberdade, sendo ainda causadas lesões corporais de natureza grave; e ainda a valoração negativa da culpabilidade também não é ilegal, pois, nos termos do entendimento do STJ, "a premeditação do crime permite, a toda evidência, a majoração da pena-base a título de culpabilidade, pois demonstra o dolo intenso e o maior grau de censura a ensejar resposta penal superior" (HC n. 553.427/PE, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 12/2/2020). 3. Refutou-se também, na decisão agravada, a tese de ocorrência de participação de menor importância, pois, de acordo com a jurisprudência, "descabida a alegação dos agentes quanto à participação de menor importância no delito, porquanto é pacífico o entendimento no sentido de que todos que participam do latrocínio em concurso de agentes são responsáveis pelo resultado mais gravoso, seguindo regra prevista no art. 29, caput, do Código Penal" (AgRg no AgRg no AREsp n. 1710516/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 6/10/2020, DJe 13/10/2020), sendo, de toda sorte, imprópria a via do especial à revisão do entendimento firmado pelas instâncias ordinárias. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no AREsp n. 1.932.846/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 8/8/2023, DJe de 18/8/2023.) [grifo nosso] Observe-se que, em decisão envolvendo o corréu em caso semelhante, no RHC/218493 - Recurso Ordinário em Habeas Corpus, o Supremo Tribunal Federal manteve decisão de que a valoração negativa da culpabilidade decorre do maior grau de reprovabilidade da conduta, aferido pela premeditação, que não constitui elemento do tipo; o condenado não possui maus antecedentes, considerando-se tecnicamente como tais toda condenação anterior transitada em julgado e que não importe em reincidência, esta avaliada na segunda fase da fixação da pena; não há elementos nos autos capazes de conferir subsídios para a análise da conduta social e da personalidade do réu; o motivo do crime é o esperado para delitos como o em tela; as circunstâncias não se afastaram da normalidade do esperado pelo tipo penal; as consequências do crime praticado pelo condenado não foram graves; o comportamento da vítima não influiu na prática delituosa do condenado, não podendo ser utilizado como critério para aumentar ou diminuir a pena-base. Tendo em vista o exposto supra, fixo a pena base em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão e 53 (cinquenta e três) dias-multa.Cabe acrescentar que a pena de multa aplicada é plenamente proporcional com a sanção privativa de liberdade. Conforme pôde se observar, o critério utilizado por este magistrado na primeira fase de dosimetria de pena foi puramente matemático: considerou-se a pena máxima cominada, a qual foi diminuída pela mínima; o resultado deste cálculo foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Tal critério é o melhor possível, pois é o único que tornaria possível a eventual aplicação de uma sanção privativa de liberdade máxima, caso todas as circunstâncias judiciais fossem ruins. O mesmo critério foi utilizado com relação à pena de multa. Considerou-se o máximo possível (360 dias- multa) e o mínimo (10 dias-multa), e o resultado da diminuição de ambos foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Somente assim, em caso de pena privativa de liberdade máxima, seria matematicamente possível aplicar também a sanção de multa em seu patamar máximo. Diante disso, tanto a pena corporal quanto a de multa guardam plena proporção entre si, o que torna sem sentido o critério aplicado em algumas decisões dos tribunais, que tão somente transformam em dias-multa o número obtido pela pena privativa de liberdade: tal cálculo inviabilizaria qualquer possibilidade de aplicação de sanção máxima de multa, pois, caso a pena do estelionato fosse de 5 (cinco) anos de reclusão, a multa atingiria somente 60 (sessenta) dias-multa, circunstância que não guarda qualquer lógica. Concorre a circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea ‘d’, do Código Penal, verificada na confissão espontânea da autoria do crime, com a circunstância agravante prevista no artigo 61, inciso I, do Código Penal, pois consta condenação em desfavor do réu transitada em julgado e que importa em reincidência (autos 0000634-09.2018.8.24.0135, com trânsito em julgado em 2/4/2019 e cuja pena foi extinta pelo cumprimento em 15/1/2025 (cf. mov. 233.1 e autos de execução n. 0016315-82.2019.8.16.0013 - SEEU). Considerando que ambas as circunstâncias possuem o mesmo valor, mantém-se a pena inalterada. O crime foi cometido contra idoso, nos termos do parágrafo 4º do artigo 171 do Código Penal; a pena aumenta-se, portanto, em 1/3 (um terço), motivo pelo qual fixo a sanção penal 2 (dois) anos de reclusão e 70 (setenta) dias-multa, aser cumprida inicialmente em regime fechado, em face da reincidência, nos termos do artigo 33, parágrafo 2º, alínea ‘ a’, do Código Penal (inaplicável a Súmula n. 269 do Superior Tribunal de Justiça, pois as circunstâncias judiciais não foram inteiramente favoráveis). Levando-se em conta a situação econômica do réu, nos termos do artigo 60, caput, do Código Penal, fixo o valor do dia-multa em um trigésimo do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, quantia esta que deverá ser atualizada, quando da execução, pelos índices de correção monetária vigentes (cf. artigo 49, parágrafos 1º e 2º, do Código Penal). Em razão da reincidência em crime doloso e da aplicação da regra do cúmulo material, deixo de aplicar as benesses dos artigos 44 e 77, ambos do Código Penal. 2.2.2. DO ARTIGO 171, PARÁGRAFO 4º, DO CÓDIGO PENAL (2º e 3º FATOS) A culpabilidade da conduta do réu se demonstrou agravada, haja vista que presente no caso em liça a premeditação; veja-se que o condenado e seu comparsa atuaram de acordo com a história inventada para enganar a vítima idosa; um deles era humilde e ganhou na loteria, e o outro convenceu a vítima ao confirmar o prêmio e quando aceitou a proposta de ajudar mediante recompensa; some-se a isso o fato de os réus terem os dados de contas de terceiros (da empresa Mell Aparecida Rissardo LTDA., de José Luís Rissardo e de sua filha Camila de Souza Rissardo) para receber transferências ou débitos, caso não fosse possível o saque em dinheiro ou fosse mais conveniente outra espécie de transação bancária; a respeito do assunto, destaque-se julgado do Tribunal de Justiça do Paraná: AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LATROCÍNIO. DOSIMETRIA DA PENA. MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA. DECISÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM CONFORME JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PENA RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. 1. Não há contradição, pois a decisão agravada reconheceu a circunstância atenuante somente em relação ao corréu José, haja vista que a possibilidade de reconhecimento dessa circunstância também para o agravante não foi objeto de análise do Tribunal de origem, seja no acórdão que julgou oapelo criminal (fls. 2.570-2.592), seja no acórdão que rejeitou os embargos de declaração (fls. 3.125-3.128), isto é, a matéria carece de prequestionamento, devendo, então, ser aplicado o verbete 211 da Súmula desta Corte Superior. 2. Não há omissão na decisão agravada, pois nela consta claramente que se tem por fundamentada a valoração negativa das circunstâncias do delito, praticado mediante concurso de mais de duas pessoas e com emprego de arma de fogo, com grande poder de destruição, porquanto em sintonia com a jurisprudência desta Corte; assim como, constitui fundamento válido para a negativação das consequências do delito o fato de uma das vítima ter sido feita refém, com restrição de liberdade, sendo ainda causadas lesões corporais de natureza grave; e ainda a valoração negativa da culpabilidade também não é ilegal, pois, nos termos do entendimento do STJ, "a premeditação do crime permite, a toda evidência, a majoração da pena-base a título de culpabilidade, pois demonstra o dolo intenso e o maior grau de censura a ensejar resposta penal superior" (HC n. 553.427/PE, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 12/2/2020). 3. Refutou-se também, na decisão agravada, a tese de ocorrência de participação de menor importância, pois, de acordo com a jurisprudência, "descabida a alegação dos agentes quanto à participação de menor importância no delito, porquanto é pacífico o entendimento no sentido de que todos que participam do latrocínio em concurso de agentes são responsáveis pelo resultado mais gravoso, seguindo regra prevista no art. 29, caput, do Código Penal" (AgRg no AgRg no AREsp n. 1710516/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 6/10/2020, DJe 13/10/2020), sendo, de toda sorte, imprópria a via do especial à revisão do entendimento firmado pelas instâncias ordinárias. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no AREsp n. 1.932.846/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 8/8/2023, DJe de 18/8/2023.) [grifo nosso] Observe-se que, em decisão envolvendo o corréu em caso semelhante, no RHC/218493 - Recurso Ordinário em Habeas Corpus, o Supremo Tribunal Federal manteve decisão de que a valoração negativa da culpabilidade decorre do maior grau de reprovabilidade da conduta, aferido pela premeditação, que não constitui elemento do tipo; o condenado não possui maus antecedentes, considerando-se tecnicamente como tais toda condenação anterior transitada em julgado e que não importe em reincidência, esta avaliada na segunda fase da fixação da pena; não há elementos nos autos capazes de conferir subsídios para a análise da conduta social e da personalidade do réu; omotivo do crime é o esperado para delitos como o em tela; as circunstâncias não se afastaram da normalidade do esperado pelo tipo penal; as consequências do crime praticado pelo condenado foram graves; isso porque as vítimas tiveram elevado prejuízo financeiro com transferências de valores de suas contas bancárias até que atingissem o limite acordado com seus bancos; em outras palavras, entregaram as vítimas tudo que podiam ao réu e seu comparsa, comprometendo, portanto, suas economias; assim, nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, quando o prejuízo é de grande monta, deve ser elevada a pena-base: “APELAÇÃO CRIME. APROPRIAÇÃO INDÉBITA MAJORADA EM RAZÃO DA PROFISSÃO (ARTIGO 168, § 1º, INCISO III DO CÓDIGO PENAL) POR 96 VEZES E ESTELIONATO (ARTIGO 171, CAPUT DO CÓDIGO PENAL) EM CONCURSO MATERIAL. (...) DOSIMETRIA DA PENA-BASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO DE GRANDE MONTA QUE AUTORIZA O JUÍZO DE MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. SENTENÇA MANTIDA.RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) IX - "(...)3. Admite-se a consideração do montante do prejuízo para se valorar negativamente a circunstância judicial atinente às consequências do crime de estelionato, desde que se verifique a ocorrência de especial reprovabilidade, como na hipótese concreta. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 184.906/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 04/06/2014)"” (TJPR - 4ª C.Criminal - AC - 1590599-0 - Curitiba - Rel.: Desembargador Celso Jair Mainardi - Unânime - J. 06.07.2017) “APELAÇÕES CRIMINAIS. ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO. CONCURSO DE PESSOAS. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. AÇÃO PENAL PÚBLICA. SENTENÇA CONDENATÓRIA.1. RECURSO DA DEFESA. PLEITO DE REVISÃO DO CONJUNTO DOSIMÉTRICO. AFASTAMENTO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS NEGATIVAMENTE VALORADAS. ANTECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE. PRÁTICA DE CRIME ANTERIOR AOS FATOS COM TRÂNSITO EM JULGADO POSTERIOR QUE CONFIGURA MAUS ANTECEDENTES. MOTIVOS DO CRIME. NECESSIDADE DE AFASTAMENTO. FUNDAMENTAÇÃO INERENTE AO TIPO PENAL. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. INVIABILIDADE. INCIDÊNCIA DE DUAS MAJORANTES, SENDO QUE UMA DELAS FOI ADEQUADAMENTE VALORADA NA PRIMEIRA FASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO DE GRANDE MONTA QUE AUTORIZA O JUÍZO DE MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. (...) IV - Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, “admite -se a exasperação da pena-base pela valoração negativa das consequências do delito com base no valor do prejuízo sofrido pela vítima (AgRg no REsp n. 1.728.124/RO, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 6/6/2018 (...) (TJPR – 4ª C.Criminal – 0064116-25.2018.8.16.0014 –Londrina - Rel.: Desembargador Celso Jair Mainardi - J. 11.07.2019) “APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. PRELIMINAR. PROVA EMPRESTADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO. MÉRITO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. PALAVRAS DAS VÍTIMAS. RECONHECIMENTO REALIZADO E CONFIRMADO EM JUÍZO. CONJUNTO PROBATÓRIO SEGURO. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO QUE É DE RIGOR. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO RELEVANTE. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APLICAÇÃO DA LEI ANTERIOR (MAIS BENÉFICA). NÃO CONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. REGIME ABERTO. IMPOSSIBILIDADE. EXEGESE DO ART. 33, §2°, “B”, DO CÓDIGO PENAL. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO. (TJPR - 5ª C.Criminal - 0015444-86.2018.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: Desembargadora Maria José de Toledo Marcondes Teixeira - J. 11.07.2019) O comportamento das vítimas não influiu na prática delituosa do condenado, não podendo ser utilizado como critério para aumentar ou diminuir a pena-base. Tendo em vista o exposto supra, fixo a pena base em 2 (dois) anos de reclusão e 97 (noventa e sete) dias- multa. Cabe acrescentar que a pena de multa aplicada é plenamente proporcional com a sanção privativa de liberdade. Conforme pôde se observar, o critério utilizado por este magistrado na primeira fase de dosimetria de pena foi puramente matemático: considerou-se a pena máxima cominada, a qual foi diminuída pela mínima; o resultado deste cálculo foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Tal critério é o melhor possível, pois é o único que tornaria possível a eventual aplicação de uma sanção privativa de liberdade máxima, caso todas as circunstâncias judiciais fossem ruins. O mesmo critério foi utilizado com relação à pena de multa. Considerou-se o máximo possível (360 dias- multa) e o mínimo (10 dias-multa), e o resultado da diminuição de ambos foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Somente assim, em caso de pena privativa de liberdade máxima, seria matematicamente possível aplicar também a sanção de multa em seu patamar máximo. Diante disso, tanto a pena corporal quanto a de multa guardam plenaproporção entre si, o que torna sem sentido o critério aplicado em algumas decisões dos tribunais, que tão somente transformam em dias-multa o número obtido pela pena privativa de liberdade: tal cálculo inviabilizaria qualquer possibilidade de aplicação de sanção máxima de multa, pois, caso a pena do estelionato fosse de 5 (cinco) anos de reclusão, a multa atingiria somente 60 (sessenta) dias-multa, circunstância que não guarda qualquer lógica. Concorre a circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea ‘d’, do Código Penal, verificada na confissão espontânea da autoria do crime, com a circunstância agravante prevista no artigo 61, inciso I, do Código Penal, pois consta condenação em desfavor do réu transitada em julgado e que importa em reincidência (autos 0000634-09.2018.8.24.0135, com trânsito em julgado em 2/4/2019 e cuja pena foi extinta pelo cumprimento em m 15/1/2025 (cf. mov. 233.1 e autos de execução n. 0016315-82.2019.8.16.0013 - SEEU). Considerando que ambas as circunstâncias possuem o mesmo valor, mantém-se a pena inalterada. Os crimes foram cometidos contra idosos, nos termos do parágrafo 4º do artigo 171 do Código Penal; a pena aumenta-se, portanto, em 1/3 (um terço), motivo pelo qual fixo a sanção penal 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 129 (cento e vinte e nove) dias-multa, a ser cumprida inicialmente em regime fechado, em face da reincidência, nos termos do artigo 33, parágrafo 2º, alínea ‘a’, do Código Penal (inaplicável a Súmula n. 269 do Superior Tribunal de Justiça, pois as circunstâncias judiciais não foram inteiramente favoráveis). Levando-se em conta a situação econômica do réu, nos termos do artigo 60, caput, do Código Penal, fixo o valor do dia-multa em um trigésimo do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, quantia esta que deverá ser atualizada, quando da execução, pelos índices de correção monetária vigentes (cf. artigo 49, parágrafos 1º e 2º, do Código Penal). Em razão da reincidência em crime doloso e da aplicação da regra do cúmulo material, deixo de aplicar as benesses dos artigos 44 e 77, ambos do Código Penal.2.2.3. DO ARTIGO 158, PARÁGRAFO 1º, DO CÓDIGO PENAL (5º FATO) A culpabilidade da conduta do réu se demonstrou agravada, haja vista que presente no caso em liça a premeditação; o condenado e seu comparsa atuaram de acordo com a história inventada para enganar a vítima idosa; um deles era humilde e ganhou na loteria, e o outro convenceu a vítima ao confirmar o prêmio e se propor a ajudar mediante recompensa; some-se a isso o fato de os réus terem levado uma arma para constranger a vítima que não caísse no golpe e terem os dados de contas de terceiros (da empresa Mell Aparecida Rissardo LTDA., de José Luís Rissardo e de sua filha Camila de Souza Rissardo) para receber transferências ou débitos, caso não fosse possível o saque em dinheiro ou fosse mais conveniente outra espécie de transação bancária; a respeito do assunto, destaque-se julgado do Tribunal de Justiça do Paraná: AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LATROCÍNIO. DOSIMETRIA DA PENA. MATÉRIA NÃO PREQUESTIONADA. DECISÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM CONFORME JURISPRUDÊNCIA DO STJ. PENA RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. 1. Não há contradição, pois a decisão agravada reconheceu a circunstância atenuante somente em relação ao corréu José, haja vista que a possibilidade de reconhecimento dessa circunstância também para o agravante não foi objeto de análise do Tribunal de origem, seja no acórdão que julgou o apelo criminal (fls. 2.570-2.592), seja no acórdão que rejeitou os embargos de declaração (fls. 3.125-3.128), isto é, a matéria carece de prequestionamento, devendo, então, ser aplicado o verbete 211 da Súmula desta Corte Superior. 2. Não há omissão na decisão agravada, pois nela consta claramente que se tem por fundamentada a valoração negativa das circunstâncias do delito, praticado mediante concurso de mais de duas pessoas e com emprego de arma de fogo, com grande poder de destruição, porquanto em sintonia com a jurisprudência desta Corte; assim como, constitui fundamento válido para a negativação das consequências do delito o fato de uma das vítima ter sido feita refém, com restrição de liberdade, sendo ainda causadas lesões corporais de natureza grave; e ainda a valoração negativa da culpabilidade também não é ilegal, pois, nos termos do entendimento do STJ, "a premeditação do crime permite, a toda evidência, a majoração da pena-base a título de culpabilidade, pois demonstra o dolo intenso e o maior grau de censura a ensejar resposta penal superior" (HC n. 553.427/PE, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 12/2/2020). 3. Refutou-se também, na decisão agravada, a tese de ocorrência de participação demenor importância, pois, de acordo com a jurisprudência, "descabida a alegação dos agentes quanto à participação de menor importância no delito, porquanto é pacífico o entendimento no sentido de que todos que participam do latrocínio em concurso de agentes são responsáveis pelo resultado mais gravoso, seguindo regra prevista no art. 29, caput, do Código Penal" (AgRg no AgRg no AREsp n. 1710516/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 6/10/2020, DJe 13/10/2020), sendo, de toda sorte, imprópria a via do especial à revisão do entendimento firmado pelas instâncias ordinárias. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no AREsp n. 1.932.846/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 8/8/2023, DJe de 18/8/2023.) [grifo nosso] Observe-se que, em decisão envolvendo o corréu em caso semelhante, no RHC/218493 - Recurso Ordinário em Habeas Corpus, o Supremo Tribunal Federal manteve decisão de que a valoração negativa da culpabilidade decorre do maior grau de reprovabilidade da conduta, aferido pela premeditação, que não constitui elemento do tipo; o condenado não possui maus antecedentes, considerando-se tecnicamente como tais toda condenação anterior transitada em julgado e que não importe em reincidência, esta avaliada na segunda fase da fixação da pena; não há elementos nos autos capazes de conferir subsídios para a análise da conduta social e da personalidade do réu; o motivo do crime é o esperado para delitos como o em tela; as circunstâncias não se afastaram da normalidade do esperado pelo tipo penal; as consequências do crime praticado pelo condenado foram graves; isso porque a vítima teve elevado prejuízo com transferências de valores de suas contas bancárias até que atingissem o limite acordado com os bancos; em outras palavras, entregou a vítima tudo que podia ao réu e seu comparsa, comprometendo, portanto, suas economias; assim, nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, quando o prejuízo é de grande monta, deve ser elevada a pena-base: “APELAÇÃO CRIME. APROPRIAÇÃO INDÉBITA MAJORADA EM RAZÃO DA PROFISSÃO (ARTIGO 168, § 1º, INCISO III DO CÓDIGO PENAL) POR 96 VEZES E ESTELIONATO (ARTIGO 171, CAPUT DO CÓDIGO PENAL) EM CONCURSO MATERIAL. (...) DOSIMETRIA DA PENA-BASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO DE GRANDE MONTA QUE AUTORIZA O JUÍZO DE MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. SENTENÇA MANTIDA.RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) IX - "(...)3. Admite-se a consideração do montante do prejuízo para se valorar negativamente a circunstância judicial atinente às consequências do crime de estelionato, desde que se verifique a ocorrência de especial reprovabilidade, como na hipótese concreta. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 184.906/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 04/06/2014)"” (TJPR - 4ª C.Criminal - AC - 1590599-0 - Curitiba - Rel.: Desembargador Celso Jair Mainardi - Unânime - J. 06.07.2017) “APELAÇÕES CRIMINAIS. ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO. CONCURSO DE PESSOAS. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. AÇÃO PENAL PÚBLICA. SENTENÇA CONDENATÓRIA.1. RECURSO DA DEFESA. PLEITO DE REVISÃO DO CONJUNTO DOSIMÉTRICO. AFASTAMENTO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS NEGATIVAMENTE VALORADAS. ANTECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE. PRÁTICA DE CRIME ANTERIOR AOS FATOS COM TRÂNSITO EM JULGADO POSTERIOR QUE CONFIGURA MAUS ANTECEDENTES. MOTIVOS DO CRIME. NECESSIDADE DE AFASTAMENTO. FUNDAMENTAÇÃO INERENTE AO TIPO PENAL. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. INVIABILIDADE. INCIDÊNCIA DE DUAS MAJORANTES, SENDO QUE UMA DELAS FOI ADEQUADAMENTE VALORADA NA PRIMEIRA FASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO DE GRANDE MONTA QUE AUTORIZA O JUÍZO DE MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. (...) IV - Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, “admite -se a exasperação da pena-base pela valoração negativa das consequências do delito com base no valor do prejuízo sofrido pela vítima (AgRg no REsp n. 1.728.124/RO, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 6/6/2018 (...) (TJPR – 4ª C.Criminal – 0064116-25.2018.8.16.0014 – Londrina - Rel.: Desembargador Celso Jair Mainardi - J. 11.07.2019) “APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. PRELIMINAR. PROVA EMPRESTADA. CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO. MÉRITO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. PALAVRAS DAS VÍTIMAS. RECONHECIMENTO REALIZADO E CONFIRMADO EM JUÍZO. CONJUNTO PROBATÓRIO SEGURO. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO QUE É DE RIGOR. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. PREJUÍZO RELEVANTE. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APLICAÇÃO DA LEI ANTERIOR (MAIS BENÉFICA). NÃO CONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. REGIME ABERTO. IMPOSSIBILIDADE. EXEGESE DO ART. 33, §2°, “B”, DO CÓDIGO PENAL. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO. (TJPR - 5ª C.Criminal - 0015444-86.2018.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: Desembargadora Maria José de Toledo Marcondes Teixeira - J. 11.07.2019)O comportamento da vítima não influiu na prática delituosa do condenado, não podendo ser utilizado como critério para aumentar ou diminuir a pena-base. Tendo em vista o exposto supra, fixo a pena- base em 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 97 (noventa e sete) dias-multa. Cabe acrescentar que a pena de multa aplicada é plenamente proporcional com a sanção privativa de liberdade. Conforme pôde se observar, o critério utilizado por este magistrado na primeira fase de dosimetria de pena foi puramente matemático: considerou-se a pena máxima cominada, a qual foi diminuída pela mínima; o resultado deste cálculo foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Tal critério é o melhor possível, pois é o único que tornaria possível a eventual aplicação de uma sanção privativa de liberdade máxima, caso todas as circunstâncias judiciais fossem ruins. O mesmo critério foi utilizado com relação à pena de multa. Considerou-se o máximo possível (360 dias- multa) e o mínimo (10 dias-multa), e o resultado da diminuição de ambos foi dividido pelas oito circunstâncias judiciais previstas em lei. Somente assim, em caso de pena privativa de liberdade máxima, seria matematicamente possível aplicar também a sanção de multa em seu patamar máximo. Diante disso, tanto a pena corporal quanto a de multa guardam plena proporção entre si, o que torna sem sentido o critério aplicado em algumas decisões dos tribunais, que tão somente transformam em dias-multa o número obtido pela pena privativa de liberdade: tal cálculo inviabilizaria qualquer possibilidade de aplicação de sanção máxima de multa, pois, caso a pena do extorsão fosse de 10 (dez) anos de reclusão, a multa atingiria somente 120 (cento e vinte) dias-multa, circunstância que não guardaria qualquer lógica. Não é aplicável a circunstância atenuante da confissão, tendo em vista que o acusado, apesar de confirmar ter aplicado o golpe do bilhete premiado, negou ter constrangido a vítima mediante grave ameaça. Observou-se que o réu é reincidente específico (autos 0000634-09.2018.8.24.0135, com trânsito em julgado em 2/4/2019 e cuja pena foi extinta pelo cumprimento em 15/1/2025 (cf. mov. 233.1 e autos de execução n. 0016315-82.2019.8.16.0013 - SEEU). Nesse sentido, deve ser aplicada a circunstância agravante prevista pelo artigo 61, inciso I, do Código Penal. Seguindo amplo entendimento jurisprudencial (HC 186.769/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, T5, DJe 12/06/2012), aumento a pena em 1/6, resultando em uma sanção de 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de reclusão e 113 (cento e treze) dias-multa. Tem-se, ainda, que o crime foi cometido por duas pessoas, circunstância que elevou as chances de sucesso do ilícito, e com emprego de arma de fogo, o que aumentou o potencial lesivo da ação criminosa, diante do alto poder ofensivo do armamento, motivo pelo qual aplico a causa especial de aumento prevista pelo parágrafo 1º do artigo 158 do Código Penal com aumento da pena acima do mínimo previsto. Sendo assim, aplicando-se um acréscimo de 1/2, fixo a pena em 9 (nove) anos, 7 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 169 (cento e sessenta e nove) dias-multa, a ser cumprida inicialmente em regime fechado, em face da reincidência, nos termos do artigo 33, parágrafo 2º, alínea ‘a’, do Código Penal (inaplicável a Súmula n. 269 do Superior Tribunal de Justiça, pois as circunstâncias judiciais não foram inteiramente favoráveis). Levando-se em conta a situação econômica do réu, nos termos do artigo 60, caput, do Código Penal, fixo o valor do dia-multa em um trigésimo do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, quantia esta que deverá ser atualizada, quando da execução, pelos índices de correção monetária vigentes (cf. artigo 49, parágrafos 1º e 2º, do Código Penal). Em razão da reincidência em crime doloso, da quantidade de pena aplicada, da aplicação da regra do cúmulo material e da grave ameaça exercida no crime de extorsão, deixo de aplicar as benesses dos artigos 44 e 77, ambos do Código Penal. 2.2.4. DA APLICAÇÃO DA REGRA DO ARTIGO 69 DO CÓDIGO PENAL Deve ser reconhecido o concurso material entre os três crimes de estelionato e o de extorsão.Isso porque, conforme se extrai do conjunto probatório, a prática dos crimes não foi eventual e esporádica e não havia um vínculo subjetivo ligando as condutas imputadas ao condenado. Em outras palavras, foi comprovado que o réu praticou os delitos com desígnios autônomos, sendo delinquente contumaz, porquanto praticou os delitos em 10/11/2023, 30/1/2024 e 07/5/2024 (não houve também o preenchimento do requisito objetivo de 30 dias entre cada delito). Além disso, conforme a certidão do sistema oráculo, o acusado cometeu outro delito de estelionato, empregando o mesmo modus operandi, indicando, indubitavelmente, que fazia do crime seu meio de subsistência (cf. mov. 233.1 – autos n. 0000634-09.2018.8.24.0135, praticado em 20/2/2018). A habitualidade delitiva, segundo entendimento jurisprudencial, também afasta a possibilidade de reconhecimento da continuidade entre os crimes de estelionato. Nesse sentido: RECURSOS DE APELAÇÃO CRIME. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, ROUBOS MAJORADOS PELO CONURSO DE AGENTES E PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO E CORRUPÇÃO DE MENORES.RECURSO DO RÉU MARCELO. PLEITO PARA ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. NÃO ACOLHIMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE A DEMONSTRAR A ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA DOS INTEGRANTES. CONDENAÇÃO MANTIDA. PLEITO PARA ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE CORRUPÇÃO DE MENORES. IMPOSSIBILIDADE. CRIME DE PERIGO ABSTRATO QUE INDEPENDE DA EFETIVA CORRUPÇÃO DO MENOR. SÚMULA 500, DO STJ. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDORECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INSURGÊNCIA VOLTADA UNICAMENTE À DOSIMETRIA DA PENA DOS DELITOS DE ROUBOS. PLEITO PARA RECRUDESCIMENTO DA PENA-BASE PELA DESVALORAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. ACOLHIMENTO. EXCESSIVA AGRESSIVIDADE MANIFESTADA POR OCASIÃO DOS DELITOS, ALÉM DA UTILIZAÇÃO DA ARMA DE FOGO. PLEITO PARA AFASTAMENTO DO CONCURSO MATERIAL ENTRE OS FATOS 4 E 5, ACOLHIMENTO. HABITUALIDADE NA PRÁTICA DELITIVA QUE AFASTA A APLICAÇÃO DA CONTINUIDADE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO, COM A READEQUAÇÃO DA PENA IMPOSTA. (TJPR - 3ª C.Criminal - 0010248-77.2014.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR JOSÉ CARLOS DALACQUA - J. 30.11.2021) [grifo nosso]PENAL. ESTELIONATO. CONTINUIDADE DELITIVA. ART. 71 DO CP. RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITO SUBJETIVO. AUSÊNCIA. DELINQUÊNCIA HABITUAL. DILAÇÃO PROBATÓRIA. VEDAÇÃO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça entende que, para a caracterização da continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), é necessário que estejam preenchidos, cumulativamente, os requisitos de ordem objetiva (pluralidade de ações, mesmas condições de tempo, lugar e modo de execução) e o de ordem subjetiva, assim entendido como a unidade de desígnios ou o vínculo subjetivo havido entre os eventos delituosos. 2. A Corte local concluiu que os crimes foram perpetrados com desígnios autônomos, elemento que demonstra a ausência de preenchimento do requisito subjetivo, indispensável ao reconhecimento da continuidade delitiva. 3. Consoante orientação desta Corte Superior e do Supremo Tribunal Federal, a reiteração indicativa de delinquência habitual ou profissional é suficiente para afastar a caracterização do crime continuado. 4. O mandamus não é a via apta para a realização de juízo de constatação da existência de suporte probatório a amparar a tese defensiva, o que seria necessário para a averiguação da ocorrência da continuidade delitiva. Precedentes. 5. Habeas corpus não conhecido. (HC 297.624/MS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 24/02/2015, DJe 02/03/2015) [grifo nosso] Portanto, dada a inexistência do elemento subjetivo, em especial se tratando de criminoso habitual, incabível a aplicação do benefício da continuidade delitiva entre os delitos de estelionato, devendo ser considerado o concurso material com o delito de extorsão, nos termos do artigo 69 do Código Penal, somando-se as penas impostas. Posto isto, condeno o réu a uma pena de 16 (dezesseis) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 497 (quatrocentos e noventa e sete) dias-multa (cf. artigo 72 do Código Penal, a ser cumprida inicialmente em regime fechado, nos termos do artigo 33, parágrafo 2º, alínea ‘ a’, do Código Penal. Quanto ao disposto no artigo 387, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal, o tempo de prisão cumprido até a presente data é de 8 (oito) meses e 15 (quinze) dias – segundo informação extraída do sistema PROJUDI - período esse que, detraído da sanção fixada, importa em um quantum de pena remanescente de 16 (dezesseis) anos e 3 (dois) meses; talcircunstância, no entanto, não foi suficiente para alterar o regime de cumprimento da sanção penal, máxime diante da quantidade de pena remanescente. Levando-se em conta a situação econômica do réu, nos termos do artigo 60, caput, do Código Penal, fixo o valor do dia-multa em um trigésimo do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, quantia esta que deverá ser atualizada, quando da execução, pelos índices de correção monetária vigentes (cf. artigo 49, parágrafos 1º e 2º, do Código Penal). Tendo em vista a reincidência em crime doloso, a quantidade de pena aplicada e a grave ameaça do delito de extorsão, deixo de aplicar as regras previstas pelos artigos 44 e 77, ambos do Código Penal. 2.3. DA NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA Diante da condenação, impõe-se a prisão dos condenados neste momento, não podendo recorrer em liberdade. Os pressupostos da custódia foram assentados pelo presente 'decisum', quais sejam, a prova da materialidade e da autoria, o que motivou a condenação. As condições de procedibilidade são evidentes: trata-se de delito doloso, punido com reclusão, sendo que a pena máxima cominada é superior a 4 (quatro) anos (artigo 313, inciso I, do Código de Processo Penal; além disso, os réus foram condenados por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado (artigo 313, inciso II, do Código de Processo Penal). Quanto aos fundamentos da prisão cautelar, percebe-se que a custódia processual deve ser mantida para a garantia da ordem pública, uma vez que, em liberdade, os condenados certamente encontraram os mesmos estímulos para a prática de novos delitos, demonstrando os agentes causarem perigo para a comunidade em que vivem. Outrossim, a prisão nesta fase - e dadas as circunstâncias específicas deste processo - é medida inafastável para a credibilidade da justiça, eis que, reconhecida por sentença condenatória com base em prova plena a prática de graves crimes contra o patrimônio, a soltura se revela incompatível, mormente em face do estrago moral causadoà comunidade, já tão castigada por delitos de natureza semelhante. Os réus são reincidentes específicos e praticam crimes de forma habitual contra vítimas idosas (cf. movs. 233.1 e 234.1) Tal situação impede a concessão de liberdade provisória, nos termos do artigo 310, parágrafo 2°, do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei Federal n. 13.964/19. Sobre a possibilidade de decretar a prisão nesses termos, o seguinte excerto jurisprudencial a título de ilustração: “HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE ENTORPECENTES. SENTENÇA CONDENATÓRIA. PROIBIÇÃO DE RECORRER EM LIBERDADE. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA DO DELITO. GRANDE QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA E CONSTITUCIONAL. PERICULOSIDADE DO AGENTE. REITERAÇÃO CRIMINOSA. SEGREGAÇÃO JUSTIFICADA E NECESSÁRIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO DEMONSTRADO. ORDEM DENEGADA. 1. Não fere o princípio da presunção de inocência e do duplo grau de jurisdição a vedação do direito de recorrer em liberdade, se ocorrentes os pressupostos legalmente exigidos para a preservação do paciente na prisão, a exemplo da garantia da ordem pública, em razão da gravidade concreta do delito em tese praticado e da periculosidade do agente. 2. Verificam-se presentes as hipóteses autorizadoras da prisão cautelar, especialmente a garantia da ordem pública, tendo em vista o envolvimento do paciente com uma organizada rede criminosa voltada ao tráfico de drogas e a gravidade concreta da conduta, evidenciada pela grande quantidade de entorpecente apreendido - aproximadamente 24 (vinte e quatro) quilos de cocaína. 3. Não há que se falar em constrangimento ilegal quando devidamente apontados os motivos ensejadores da custódia cautelar, em especial para fazer cessar a continuidade criminosa, visto que o paciente apresenta maus antecedentes e já foi condenado pelo delito de tráfico de entorpecentes, circunstâncias que revelam a sua propensão a atividades ilícitas, demonstram a sua periculosidade e a real possibilidade de que, solto, volte a delinquir. 4. Habeas corpus denegado.” (HC 218.403/RO, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 17/04/2012, DJe 08/05/2012) [grifo nosso] Some-se a isso o disposto na Súmula n. 9 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual "A exigência daprisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência". ExpeçaM-se, pois, guias de recolhimento provisórias para o início imediato do cumprimento da pena (caso haja recurso por parte das defesas). 2.4. DA FIXAÇÃO DE VALOR MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS PELA INFRAÇÃO Nos termos do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, conforme requerido pelo Ministério Público e de acordo com os extratos juntados nos autos, como o valor mínimo para a reparação dos danos causados pelas infrações, fixo a quantia de a) R$400,00 (quatrocentos reais), em favor de Hermínio de Barros (1º Fato); b) R$7.000,00 (sete mil reais), em favor de Inácio Fidelis Gomes (2º Fato); c) R$14.000,00 (quatorze mil reais), em favor de Agostinho Damratt (3º Fato); d) valor de R$13.800,00 (treze mil e oitocentos reais), em favor de Antônio Alves Feitosa (4º Fato); e e) R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais), em favor de Nelson José da Silva (5º Fato). DISPOSIÇÕES FINAIS: Após o trânsito em julgado, devem ser adotadas as seguintes providências: • expeçam-se guias de recolhimento, remetendo-a à Vara de Execuções Penais; • remetam-se os autos ao contador judicial para o cálculo da pena de multa; • notifique-se os condenados para o pagamento da pena de multa, em 10 (dez) dias – ou por edital, com prazo de 15 (quinze) dias, se necessário -, sob pena de execução naforma do artigo 51 do Código Penal; não recolhida a multa no prazo determinado na guia, deverá ser emitida a “certidão da sentença” ao FUPEN, possibilitando a execução do título judicial; • comuniquem-se o Distribuidor, o Instituto de Identificação do Paraná, a Delegacia Policial de origem e o juízo eleitoral desta Comarca. Cientifiquem-se as vítimas - por edital, com prazo de 15 (quinze) dias, se necessário -, a respeito desta sentença. Publique-se, registre-se e intimem-se (os réus por edital, com prazo de 90 dias, se necessário). Curitiba, 14 de abril de 2025 César Maranhão de Loyola Furtado Juiz de Direito
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