Processo nº 0003359-80.2024.8.17.2260
ID: 334759634
Tribunal: TJPE
Órgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Belo Jardim
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0003359-80.2024.8.17.2260
Data de Disponibilização:
25/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RAQUEL KECIANNY ROCHA DOS SANTOS
OAB/SE XXXXXX
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Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 1ª Vara Cível da Comarca de Belo Jardim Pç JOÃO TORRES GALINDO, S/N, EDSON MORORO MOURA, BELO JARDIM - PE - CEP: 55150-590 - F:(81) 37268903 Process…
Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 1ª Vara Cível da Comarca de Belo Jardim Pç JOÃO TORRES GALINDO, S/N, EDSON MORORO MOURA, BELO JARDIM - PE - CEP: 55150-590 - F:(81) 37268903 Processo nº 0003359-80.2024.8.17.2260 AUTOR(A): GRACE KELLY ROCHA FURETTI RÉU: SHPS TECNOLOGIA E SERVICOS LTDA. SENTENÇA I – RELATÓRIO Vistos etc. Trata-se de Ação de Responsabilização por Vício do Produto c/c Indenização por Danos Materiais e Morais,ajuizada por GRACE KELLY ROCHA FURETTI em desfavor de SHPS TECNOLOGIA E SERVICOS LTDA. Consta na inicial que, em abril de 2024, a autora efetuou a compra de 3 (três) banquetas bordo com encosto linho bege, no valor de R$ 1.279,00, através do aplicativo da Shopee. Os produtos foram entregues em 09 de maio de 2024, porém, chegaram danificados. A requerente tentou solucionar o problema diversas vezes por meio do chat do aplicativo, gerando vários protocolos, mas todas as tentativas foram infrutíferas, causando desgaste emocional. A autora alegou que os produtos estavam disponíveis para busca e ressarcimento, tendo permanecido intactos desde o desembalamento. Diante da ausência de resolução e da má-fé da empresa ré, que forneceu um serviço defeituoso e causou perda de tempo útil, a autora buscou a via judicial. A demandante requereu a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita. Requereu no mérito: a) A procedência total da ação, para condenar a empresa ré ao pagamento de indenização por dano material na quantia de R$ 1.279,00 (um mil, duzentos e setenta e nove reais), e a condenação da ré ao pagamento de quantia de R$ 8.000,00 (oito mil reais), a título de dano moral, por todo sofrimento causado a Autora. A SHPS TECNOLOGIA E SERVICOS LTDA. foi citada eletronicamente e apresentou "Petição Simples de Terceiro Interessado" em 26/11/2024 (Id. 189380341) e "Contestação" em 17/12/2024 (Id. 191435810). Na contestação, a ré arguiu preliminares de ilegitimidade passiva, sob a alegação de ser mera intermediadora (marketplace) e não possuir responsabilidade sobre os produtos comercializados por terceiros, bem como ausência de interesse processual, argumentando que a culpa seria exclusiva de terceiro (o vendedor) e que a autora não teria seguido corretamente os trâmites da plataforma para devolução. A contestação também impugnou o pedido de justiça gratuita da autora. No mérito, defendeu a inexistência de dano moral, por não ter praticado ato ilícito, e que o suposto dano não passaria de mero aborrecimento, devendo ser observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade na fixação de eventual indenização. A ré ainda impugnou a totalidade dos documentos acostados na inicial, exceto os pessoais da autora, por considerá-los imprestáveis para comprovar os danos alegados. Por fim, pugnou pelo afastamento da inversão do ônus da prova. A parte autora apresentou réplica em 04/02/2025 (Id. 194354678). Na réplica, a autora rebateu as preliminares, afirmando a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e a responsabilidade solidária da Shopee como parte da cadeia de fornecimento, bem como a responsabilidade objetiva da ré pela falha na segurança do serviço de intermediação. A autora reiterou a presença do interesse processual, argumentando que tentou solucionar a questão administrativamente, mas a ré se omitiu ou impôs obstáculos. Ratificou o pedido de inversão do ônus da prova. Quanto ao dano moral, defendeu que a conduta omissiva da ré ultrapassa meros aborrecimentos, justificando a indenização. As partes foram intimadas para indicar outras provas a produzir, em 13/01/2025 (Id. 192419591 e Id. 192419593). A parte ré, em manifestação datada de 14/01/2025 (Id. 192605871), informou que não possuía novas provas a serem produzidas e concordava com o julgamento antecipado do feito. A parte autora, em 10/03/2025, solicitou o impulsionamento processual e a designação de audiência de conciliação (Id. 197281317). Após, vieram-me os autos conclusos. É o relatório. Passo a decidir. PRELIMINARES Da Legitimidade Passiva da SHPS TECNOLOGIA E SERVICOS LTDA. (SHOPEE) A tese de ilegitimidade passiva, sustentada pela ré sob o argumento de que seria mera intermediadora (marketplace) e, portanto, não teria responsabilidade pelos produtos comercializados por terceiros, deve ser veementemente rechaçada. A relação jurídica estabelecida entre a autora, consumidora, e a plataforma Shopee, insere-se inequivocamente no âmbito das relações de consumo, regidas pelas normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90). O artigo 3º do CDC define fornecedor como toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. A Shopee, ao disponibilizar sua plataforma para a concretização de transações comerciais, ao controlar os pagamentos e ao intervir nas etapas da relação de consumo, mesmo que de forma "intermediadora" , integra a cadeia de fornecimento e se equipara a um fornecedor de serviços. Nesse sentido, o artigo 7º, parágrafo único, do CDC, estabelece a responsabilidade solidária de todos aqueles que participam da cadeia de consumo pelos danos causados ao consumidor. Da mesma forma, o artigo 18 do CDC é claro ao dispor que "os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor". A solidariedade imposta pelo diploma consumerista visa a proteger o elo mais fraco da relação, garantindo que o consumidor possa buscar a reparação de seus direitos contra qualquer dos integrantes da cadeia de produção ou distribuição. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já pacificou o entendimento de que os sites de intermediação de negócios e pagamentos respondem objetivamente pela falha na segurança do serviço oferecido. Conforme precedente do STJ, o prestador de serviços responde objetivamente pela falha de segurança do serviço de intermediação de negócios e pagamentos oferecido ao consumidor. Adicionalmente, o Tribunal da Cidadania reitera que a estipulação pelo fornecedor de cláusula exoneratória ou atenuante de sua responsabilidade é vedada pelo art. 25 do Código de Defesa do Consumidor. Isso significa que a tentativa da Shopee de se eximir da responsabilidade, alegando ser apenas um "marketplace", é inadmissível à luz da legislação consumerista e da jurisprudência consolidada. A responsabilidade da plataforma, nesse contexto, decorre da teoria do risco-proveito, segundo a qual os riscos da atividade empresarial devem ser suportados por quem dela aufere lucros, e não pelo consumidor hipossuficiente. Portanto, a SHPS TECNOLOGIA E SERVICOS LTDA. é parte legítima para figurar no polo passivo da presente demanda, haja vista sua atuação como fornecedora de serviços na cadeia de consumo. Nesse sentido, a jurisprudência pátria tem se consolidado no reconhecimento da responsabilidade solidária dos marketplaces em situações como a presente. O próprio TJPE, em caso análogo, já decidiu o seguinte: EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. SISTEMA DE MARKETPLACE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. PRODUTO NÃO ENTREGUE. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. JUROS DE MORA A PARTIR DO EVENTO DANOSO. RECURSO IMPROVIDO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA DE OFÍCIO. Apelação Cível interposta por Magazine Luiza S/A contra sentença da 3ª Vara Cível da Comarca de Carpina, que condenou a Apelante a pagar R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por danos morais e a devolver R$ 499,00 (quatrocentos e noventa e nove reais) referentes a produto não entregue, com acréscimos legais. II. A questão em discussão consiste em (i) avaliar a legitimidade passiva e responsabilidade da Apelante no sistema de marketplace; (ii) analisar a configuração do dano moral e a adequação do valor arbitrado; e (iii) determinar o termo inicial para os juros de mora.3. No âmbito das relações de consumo, os fornecedores, inclusive intermediadores de marketplace, são solidariamente responsáveis pelos danos causados (art. 18 do CDC).4. A ausência de entrega do produto adquirido e do estorno tempestivo configura falha grave que compromete a confiança do consumidor e excede mero aborrecimento, justificando a indenização por danos morais, conforme art. 5º, V, da CF/1988.5. O montante de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) atende aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, com funções pedagógica e compensatória.6. Reformou-se, de ofício, o termo inicial dos juros de mora para a data do evento danoso, em observância à Súmula 54 do STJ.7. Recurso improvido, com reforma parcial de ofício da sentença. (APELAÇÃO CÍVEL 0000569-80.2021.8.17.2470, Rel. FABIO EUGENIO DANTAS DE OLIVEIRA LIMA, Gabinete do Des. Luiz Gustavo Mendonça de Araújo (5ª CC), julgado em 04/02/2025, DJe ) Dessa forma, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva. Da Ausência de Interesse Processual A alegação de ausência de interesse processual, sob o fundamento de que a autora não teria seguido corretamente os trâmites da plataforma para devolução e que o código de devolução teria expirado, igualmente não se sustenta. O interesse de agir, uma das condições da ação, configura-se pela necessidade, utilidade e adequação do provimento jurisdicional buscado. No caso em tela, a autora demonstrou que, após receber o produto danificado, buscou incansavelmente a solução do problema por meio dos canais de atendimento da ré, conforme as diversas capturas de tela e protocolos anexados à inicial. O fato de o problema não ter sido solucionado administrativamente, e de a própria ré informar que o código de devolução "restou expirado", evidencia a pretensão resistida e a necessidade da tutela jurisdicional para a satisfação do direito da consumidora. A inércia ou a burocracia excessiva da empresa em resolver a questão pela via administrativa, ou mesmo a ineficácia dos mecanismos internos de solução, justificam plenamente a provocação do Poder Judiciário. Conforme a doutrina, existe interesse processual quando a parte tem NECESSIDADE de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma UTILIDADE, do ponto de vista prático. A impossibilidade de utilização do produto adquirido, aliada à falta de um retorno efetivo da empresa para a resolução do problema, demonstra cabalmente a utilidade e a necessidade da presente ação. Da Impugnação ao Pedido de Gratuidade de Justiça A ré impugnou o pedido de gratuidade da justiça formulado pela autora, alegando a ausência dos elementos autorizadores previstos na Lei nº 1.060/50 e nos artigos 98 a 101 do Código de Processo Civil, e que a mera declaração de hipossuficiência seria insuficiente para comprovar a necessidade do benefício. Contudo, tal preliminar não merece guarida. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso LXXIV, assegura a assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. O Código de Processo Civil de 2015, por sua vez, em seu artigo 99, § 3º, estabelece que a alegação de insuficiência deduzida por pessoa natural presume-se verdadeira. A autora, em sua petição inicial, apresentou declaração de hipossuficiência (Id. 188285825), que, por si só, é suficiente para a concessão do benefício, salvo prova em contrário produzida pela parte adversa. A ré, ao impugnar a gratuidade de justiça, não trouxe aos autos qualquer elemento concreto capaz de ilidir a presunção legal de veracidade da declaração de hipossuficiência da autora. A simples alegação de que não se encontram presentes os elementos autorizadores, sem a devida comprovação de capacidade financeira da autora que contradiga sua declaração, é insuficiente para revogar o benefício. Nesse sentido, a jurisprudência é pacífica ao afirmar que a declaração de pobreza firmada pela parte goza de presunção relativa de veracidade, cabendo à parte contrária, ou ao próprio juiz, havendo fundadas razões, provar a capacidade financeira do requerente para arcar com as custas e despesas processuais. A ausência de tal prova nos autos impõe a manutenção do benefício concedido. Portanto, rejeito a preliminar de impugnação ao pedido de gratuidade de justiça, mantendo o benefício concedido à autora. Superadas as preliminares, passa-se à análise do mérito. II – FUNDAMENTAÇÃO Do Mérito A autora alega ter adquirido 3 (três) banquetas via aplicativo da Shopee, no valor de R$ 1.279,00, e que tais produtos chegaram danificados. Diante disso, buscou contato com a ré para solucionar o problema, sem sucesso. A ré, por sua vez, não nega a compra ou a entrega do produto, mas argumenta que sua responsabilidade é limitada à intermediação, sendo a culpa exclusiva do vendedor. Afirma que a autora não efetuou a devolução do produto no prazo estipulado, o que levou ao cancelamento automático do código de devolução. A questão controvertida central reside em determinar a responsabilidade da plataforma Shopee pelo vício do produto entregue e pela falha na prestação do serviço de pós-venda, bem como a existência e extensão dos danos materiais e morais alegados. Da Responsabilidade da Shopee pela Falha na Prestação do Serviço e Vício do Produto A argumentação da ré de culpa exclusiva de terceiro (o vendedor) não prospera. Conforme já delineado na análise das preliminares, a Shopee, ao atuar como intermediadora e gestora do ambiente virtual de compras, integra a cadeia de consumo e possui responsabilidade solidária pelos vícios e falhas na prestação dos serviços. O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 14, estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, independentemente da existência de culpa. A falha no fornecimento do produto em perfeitas condições de uso, somada à ineficiência ou obstáculo na solução do problema pela via administrativa, caracteriza defeito na prestação do serviço da plataforma. As provas documentais apresentadas pela autora, especialmente as capturas de tela das conversas com o suporte da Shopee (ID 188285831 - Págs. 1-6), demonstram a persistência da consumidora em resolver a questão e a ausência de uma solução efetiva por parte da ré. É evidente o "padrão de solicitações de reembolso que violam os Termos de Serviço da Shopee", conforme afirmado pelos próprios atendentes da plataforma. Essa postura da ré, que se esquiva de sua responsabilidade sob a alegação de violação de termos de serviço, sem demonstrar concretamente em que consistiria tal violação, configura uma prática abusiva. Ainda que a ré tenha alegado que o código de devolução "restou expirado" devido à inércia da autora em devolver o produto, não demonstrou ter fornecido à consumidora as informações claras e precisas para a realização dessa devolução de forma tempestiva. Pelo contrário, as conversas indicam uma dificuldade da autora em entender o procedimento de devolução, perguntando "Como? Quais os passos?" e "Preciso de um código para enviar pelos correios? Vcs vão mandar a transportadora aqui para buscar? Qual o procedimento?". A falha na comunicação e na orientação para o procedimento de devolução, que impediu a autora de exercitar seu direito, é de responsabilidade da plataforma. Portanto, a Shopee falhou em seu dever de oferecer um serviço seguro e eficaz, tanto na entrega do produto em condições adequadas quanto no suporte pós-venda para a resolução do problema. A ausência de resolução do vício no prazo de 30 dias, conforme preconiza o §1º do art. 18 do CDC , confere à consumidora o direito de exigir, alternativamente e à sua escolha, a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso, ou a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada. Do Dano Material No que tange ao dano material, a autora comprovou o valor da compra das banquetas, qual seja, R$ 1.279,00 (um mil, duzentos e setenta e nove reais). Tendo em vista que o produto chegou danificado e que não houve a devida substituição ou ressarcimento do valor pago pela ré, o dano material é evidente. Assim, o valor de R$ 1.279,00 (um mil, duzentos e setenta e nove reais) deve ser integralmente restituído à autora. DANOS MORAIS A ré argumenta que os fatos narrados configuram mero aborrecimento, insuscetível de gerar dano moral. No entanto, a situação vivenciada pela autora, com a aquisição de um produto danificado e a peregrinação por diversos contatos infrutíferos com a empresa para solucionar o problema, configura mais do que um simples dissabor cotidiano. A conduta omissiva e desrespeitosa da empresa, ao não resolver o problema de forma eficaz e ao impor obstáculos burocráticos à consumidora, gerou perda de tempo útil e um sentimento de impotência e frustração que extravasam o mero aborrecimento. A teoria do desvio produtivo do consumidor, amplamente reconhecida na jurisprudência, aplica-se ao caso, uma vez que a autora foi compelida a dispender seu tempo e energia para solucionar um problema causado pela falha na prestação do serviço da ré, tempo este que poderia ter sido dedicado a outras atividades. Tal estado de coisas acarreta, por parte de quem lhe deu causa, o dever de ressarcir o dano (moral); neste caso, sua culpa é presumida, se não agiu com cuidado e zelo, requisitos necessários ao desenvolvimento de suas atividades, pois lida com um imenso universo de consumidores, na sua grande maioria pessoas simples, cuja regra é acreditar na honradez da instituição (personificada em seus agentes). Modernos doutrinadores apontam o dano moral como inerente aos efeitos negativos que a lesão provoca na pessoa. Será preciso, então, reparar o prejuízo decorrente da consequência desvaliosa, do menoscabo à personalidade. Ou seja, “o dano moral importa em diminuição à subjetividade da pessoa, derivada da lesão a um interesse espiritual”. Nessas concepções teóricas, enquadram-se as mais variadas situações de fato submetidas ao julgamento dos tribunais: “a dor pela perda de um ente querido, vergonha decorrente de uma deformidade física, o constrangimento de quem sofre imputação ofensiva à sua honra ou dignidade, o vexame social diante da execração por um crédito negado etc..”. Em acórdão publicado na RT 693/188 são alinhadas diversas classes de danos morais: “a) os que se refletem no crédito e, por isso, no patrimônio da vítima - injúria, difamação, usurpação do nome, firma ou marca; b) os que produzem privação do amparo econômico e moral de que a vítima gozava; c) os que representam possível privação do incremento duma eventual sucessão; d) os que determinam grande choque moral, equivalendo ou excedendo a graves ofensas corporais, por serem feridas incuráveis;” Desta forma, o dano moral é entendido como a dor resultante da violação de um bem juridicamente tutelado, sem repercussão patrimonial. Seja a dor física — dor-sensação — nascida de uma lesão material; seja a dor moral — dor-sentimento — nascida de causa material, como o abalo do sentimento de uma pessoa, provocando-lhe dor, tristeza, desgosto, depressão, enfim, perda da alegria de viver. Não é que a vítima, ao pleitear reparação pelo dano moral sofrido, esteja estipulando um preço para a sua dor. Procura somente um modo de atenuar as consequências sofridas, não em condição de equivalência ao patrimônio lesado, como ocorre com os danos patrimoniais, mas como função satisfatória e também de pena ao agressor, sanção esta que, por menor que seja, é consoladora e satisfativa, demonstrando que o ordenamento jurídico reprova o ofensor e se preocupa com o ofendido. Se é certa a pertinência de indenização no caso em tela, também o é a limitação no que pertine ao alcance do dano para a fixação da reparação. Ausente previsão legal quanto ao valor da indenização, há consenso em que deve ele ser fixado sob prudente arbítrio do julgador. Para isso, são conferidos parâmetros para a fixação do quanto devido, indicados na extensão ou intensidade do dano e na capacidade econômica de quem paga e de quem recebe a reparação. Neste sentido: “No direito brasileiro, o arbitramento da indenização do dano moral ficou entregue ao prudente arbítrio do juiz. Portanto, em sendo assim, desinfluente será o parâmetro por ele usado na fixação da mesma, desde que leve em conta a repercussão social do dano e seja compatível com a situação econômica das partes e, portanto, razoável” (EI 4130, 11.1.94, 1° Gr.Cs. TJRJ, rel. Des. Marlan Marinho, in ADV JUR 1994, p. 650, v. 66984); Em complemento, o mestre YUSSEF SAID CAHALI esclarece que, dentre outros pontos norteadores para a fixação do dano moral, deve preponderar “o bom senso para que a indenização não seja extremamente irrisória ou meramente simbólica, mas que também não seja extremamente gravosa de modo a inviabilizar a sua execução ou representar, a um tempo, verdadeiro enriquecimento sem causa”. Assim sendo, deve ser estipulado o valor do ressarcimento ao desconforto e incômodo causados ao promovente. Ainda, em relação ao quantum indenizatório a ser fixado, deve o magistrado levar em conta os fins perseguidos pela sua finalidade precípua, quais sejam: REPARAR OS DANOS SOFRIDOS PELA VÍTIMA E INIBIR E DESESTIMULAR A RÉ A PRATICAR NOVOS FATOS DESSA NATUREZA, redobrando as suas cautelas para evitar a ocorrência de danos a terceiros. A despeito disso, evidentemente se trata de dano intenso. Atendendo a lógica do art. 944 do Código Civil, a extensão do dano é critério preponderante na fixação do quantum reparatório. A indenização por danos morais não possui apenas caráter compensatório à vítima, mas também punitivo ao ofensor, visando a desestimular a reincidência de condutas ilícitas. Ao fixar o quantum indenizatório, deve-se observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como a extensão do dano, a capacidade econômica das partes e o caráter pedagógico da medida. A autora pleiteou R$ 8.000,00 (oito mil reais). Embora reconhecido o dano moral, o valor postulado se mostra excessivo em relação ao dano efetivamente sofrido, considerando a natureza do bem e a ausência de maiores repercussões na vida da autora. Assim, em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, entendo que a indenização por danos morais deve ser fixada em patamar mais justo e adequado ao caso concreto. III - DISPOSITIVO Posto isso, com fundamento nas razões sobreditas, RESOLVO, com fulcro no art. 487, I, do CPC/15: a) CONDENAR a ré SHPS TECNOLOGIA E SERVICOS LTDA. ao pagamento de indenização por danos morais à autora GRACE KELLY ROCHA FURETTI no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), acrescidos de juros de mora incidentes a contar do evento danoso (Súmula 54 do STJ), na ordem de 1% ao mês (art. 406 do CC, c/c art. 161, § 1 º, do CTN) e correção monetária, cujo termo inicial incide a partir do arbitramento feito nesta sentença, nos moldes da Súmula nº 362 do STJ. A partir do dia 28/08/2024, aplicar-se-á o disposto na Lei nº 14.905/2024 (a correção monetária deverá ser calculada pela variação do IPCA e os juros de mora pela taxa SELIC, descontando-se a variação do IPCA e desconsiderando-se eventuais juros negativos), tudo devidamente apurado na fase de cumprimento de sentença. b) CONDENAR a ré SHPS TECNOLOGIA E SERVICOS LTDA. a restituir à autora GRACE KELLY ROCHA FURETTI o valor de R$ 1.279,00 (um mil, duzentos e setenta e nove reais), a título de danos materiais acrescidos de juros de mora incidentes a contar da citação, na ordem de 1% ao mês (art. 406 do CC, c/c art. 161, § 1 º, do CTN) e correção monetária, cujo termo inicial incide a partir do arbitramento feito nesta sentença, nos moldes da Súmula nº 362 do STJ. A partir do dia 28/08/2024, aplicar-se-á o disposto na Lei nº 14.905/2024 (a correção monetária deverá ser calculada pela variação do IPCA e os juros de mora pela taxa SELIC, descontando-se a variação do IPCA e desconsiderando-se eventuais juros negativos), tudo devidamente apurado na fase de cumprimento de sentença. c) CONDENO, por fim, a parte demandada, em razão de sua sucumbência, ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 15% do valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. DOS RECURSOS Se apresentado EMBARGOS DE DECLARAÇÃO: Se tempestivos, de logo, recebo-o, ficando interrompido o prazo para a apresentação de outros recursos (CPC, art. 1.026). Intime-se a parte adversa, por seu advogado, para se manifestar, querendo, no prazo de 05 dias, sob pena de preclusão. Após, com ou sem manifestação, façam-me conclusos. Se apresentado RECURSO DE APELAÇÃO: Diante do recurso de apelação apresentado, intime-se o recorrido para contrarrazoar, no prazo de 15 dais, bem como, intime-se o recorrente para responder, em igual prazo, em caso de interposição de apelação na forma adesiva (CPC, arts. 997, §2º e 1.010, §§1º e 2º). Em seguida, independentemente de juízo de admissibilidade, remetam-se os autos à superior instância, com nossos cumprimentos. DO PAGAMENTO FINAL DAS CUSTAS ANTES DO ARQUIVAMENTO I. Caso haja inadimplemento em relação ao pagamento da taxa judiciária e das custas processuais, intime-se a parte devedora para promover o respectivo recolhimento, no prazo de 15 (quinze) dias, ADVERTINDO-A de que se não houver o adimplemento no prazo assinalado, incidirá multa de 20% sobre o valor devido, sem prejuízo das demais consequências previstas na legislação processual em vigor, nos termos do art.22, da lei nº 17.116, de 4 de dezembro de 2020. Havendo o pagamento e não existindo outras formalidades a cumprir, arquivem-se os autos. II. Caso o devedor permaneça inadimplente, emita-se certidão do trânsito em julgado e planilha de cálculo fornecida pelo sistema informatizado, encaminhando-os ao Comitê Gestor de Arrecadação, que adotará as providências previstas em ato normativo específico, podendo, inclusive, proceder ao protesto do título judicial e à inclusão do devedor nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito, nos termos do art.27, §3°, lei nº 17.116, de 4 de dezembro de 2020. Certificado o trânsito em julgado e não havendo mais outras formalidades a cumprir, arquivem-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Belo Jardim/PE, 23 de julho de 2025. DOUGLAS JOSÉ DA SILVA Juiz de Direito
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