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Processo nº 5265451-35.2020.8.09.0143

ID: 258267827

Tribunal: TJGO Órgão: São Miguel do Araguaia - Vara das Fazendas Públicas Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL Nº Processo: 5265451-35.2020.8.09.0143

Data de Disponibilização: 22/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MARIA JOSÉ MORAES COSTA RENATO PERBONI

Sentença

Advogados:

EDIVALDO CARDOSO DE PAULA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

CESAR JOSE ROSA FILHO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ALEXANDRE CARDOSO HUNGRIA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE GOIÁS - PODER JUDICIÁRIOCOMARCA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIAServentia: Vara das Fazendas PúblicasE-mail: cartcrim1saomiguel@tjgo.jus.br Balcão Virtual: (62) 99244-8455 Gabinete Virtual: (6… ESTADO DE GOIÁS - PODER JUDICIÁRIOCOMARCA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIAServentia: Vara das Fazendas PúblicasE-mail: cartcrim1saomiguel@tjgo.jus.br Balcão Virtual: (62) 99244-8455 Gabinete Virtual: (62) 99922-6548 Processo n. 5265451-35.2020.8.09.0143Parte requerente: Ministério Público do Estado de GoiásParte requerida: Renato Perboni; Maria José Moraes CostaSENTENÇA Trata-se de ação civil pública por dano ambiental, com pedido de liminar, proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS em face de RENATO PERBONI e MARIA JOSÉ MORAES COSTA, partes qualificadas/individualizadas nos autos.Narra o autor, em suma, que após inspeção realizada pelo IBAMA, no dia 18 de junho de 2018, na propriedade rural denominada Fazenda Ipê, situada na zona rural desta Comarca, registrou-se as seguintes infrações ambientais: a) ter em depósito a quantidade de 103,21 estéreos de madeira de origem nativa, sem documento de origem florestal; b) funcionar atividade potencialmente poluidora, abastecimento de combustível, sem o devido licenciamento ambiental; c) realizar limpeza da pastagem com rendimento lenhoso, sem a devida Autorização de Supressão Vegetal; e d) realizar a intervenção em APP, com supressão de vegetação nativa, sem o devido licenciamento.Pela razão acima, o órgão ministerial pugna pela concessão de tutela de urgência liminar, consistente na obrigação de fazer, sob pena de multa diária, a elaboração de um plano, no prazo de 30 (trinta) dias, e executar, no prazo de 02 (dois) anos, Plano de Recuperação de Área Degradada, por técnico ambiental habilitado e com recolhimento de taxa de Anotação de Responsabilidade Técnica - ART, em razão do desmatamento de vegetação nativa sem autorização do órgão ministerial competente de 4,82 (quatro vírgula oitenta e dois) hectares, na propriedade Fazenda Ipê.Ao final, requer a procedência do pedido, com a confirmação da tutela antecipada, a fim de condenar o requerido nas seguintes obrigações: a) de fazer, consistente em elaborar, no prazo de 30 (trinta) dias, e executar, no prazo máximo de 02 (dois) anos, observado o calendário previsto, Plano de Recuperação de Área Degradada — PRAD, por técnico ambiental habilitado e com recolhimento de taxa de Anotação de Responsabilidade Técnica — ART, referente ao desmatamento de vegetação nativa, sem autorização do órgão ambiental, competente em área de 4,82 (quatro vírgula oitenta e dois) hectares, propriedade rural denominada Fazenda Ipê, situada na zona rural do Município de São Miguel do Araguaia/GO; b) de pagar, a título de indenização, a quantia de R$ 192.793,92 (cento e noventa e dois mil, setecentos e noventa e três reais e noventa e dois centavos), referente aos custos do reflorestamento e de impactos ecossistêmicos, quantia a ser corrigida.Decisão deferiu liminar e inverteu o ônus probatório (mov. 4).Sobreveio ofício comunicatório da decisão monocrática que concedeu efeito suspensivo no Agravo de Instrumento, até o julgamento final do recurso, em face da liminar deferida (mov. 42).Devidamente citado, o Requerido Renato Perboni apresentou defesa, tempestivamente, em forma de contestação e juntou documentos (mov. 45). Em síntese, o primeiro requerido apresenta sua contestação e pugna pela total improcedência dos pedidos formulados na exordial, com a consequente condenação da parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais.Decisão final em sede de agravo de instrumento para revogar a decisão liminar (mov. 51).O Ministério Público requereu (mov. 56): a) a inclusão, no polo passivo, de Maria José Moraes Costa; b) a averbação, junto à matrícula do imóvel denominado "Fazenda Itapê", da existência da presente demanda judicial; c) a juntada da certidão atualizada de matrícula do imóvel aos presentes autos, para fins de instrução processual; d) a expedição de ofício judicial para informar o Juízo Federal, da 2ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária de Goiás, que preside os autos n. 1004362-72.2019.4.01.3500, a respeito da existência do presente processo civil coletivo, para fins de mister; e) designação de audiência de conciliação para data próxima.O Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de São Miguel do Araguaia-GO promoveu a averbação na margem da matrícula n. 10.040 (AV-25-10.040) (mov. 76). Devidamente citada, após ter sido incluída no polo passivo (mov. 58), a requerida Maria José Moraes Costa apresentou defesa, tempestivamente, em forma de contestação e juntou documentos (mov. 78). Em suma, a segunda requerida sustenta sua ilegitimidade e pugna pelo deferimento da justiça gratuita. Subsidiariamente, pugna pela improcedência da ação e, caso sobrevenha improvável condenação, requer-se que esta não exceda os limites do termo de autorização.Designada audiência conciliatória, a tentativa de acordo restou infrutífera (mov. 92).O Ministério Público pugnou pelo julgamento antecipado da lide, sem a necessidade de produção de prova oral e com a procedência dos pedidos iniciais (mov. 98).Decisão saneadora que rechaçou a preliminar de mérito sustentada pelo requerido Renato Perboni e delimitou a questão probatória, fatos controvertidos e matéria de direito e manteve a inversão do ônus da prova. Ademais, determinou a intimação da Requerida, Maria José Moraes Costa, para comprovar a insuficiência de recursos financeiros que justifique a concessão do benefício da gratuidade da justiça, nos termos da legislação vigente (mov. 100).A requerida Maria José Moraes Costa interpôs embargos de declaração suscitando a sua ilegitimidade passiva pelo fato de não ser mais proprietária do imóvel rural objeto da lide (mov. 104).Instado, o Ministério Público manifestou-se pela rejeição dos embargos de declaração e reforçou o pleito de julgamento antecipado da lide (mov. 108).Os embargos de declaração foram rejeitados e a embargante/requerida Maria José Moraes Costa foi mantida no polo passivo (mov. 109).Os autos vieram conclusos.É o relatório. DECIDO.DO INDEFERIMENTO DA JUSTIÇA GRATUITA À REQUERIDA MARIA JOSÉA Súmula n. 25 do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás que preconiza que “faz jus à gratuidade da justiça a pessoa, natural ou jurídica, que comprovar a impossibilidade de arcar com os encargos processuais”.Ressalta-se que a concessão do beneplácito da gratuidade da justiça não depende da comprovação de um estado de miserabilidade absoluta, contudo, para evitar a utilização dessa benesse como subterfúgio para aqueles que, mesmo podendo, optam por furtar-se ao dever de pagamento das custas e despesas processuais, faz-se necessário uma averiguação minuciosa da situação do requerente. Nesse sentido: EMENTA: Agravo Interno em Agravo de Instrumento. Ação de rescisão contratual c/c restituição de valores pagos. I. Gratuidade da justiça indeferida. Escassez de provas. Insuficiência de recursos não comprovada. Nos termos do artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição da República, bem como do Enunciado Sumular n. 25 deste Tribunal de Justiça, impõe-se o indeferimento do pedido de concessão dos beneplácitos da gratuidade da justiça ao requerente que alegar e não comprovar a insuficiência de recursos para pagar as custas e demais despesas processuais, como na espécie. II. Ausência de argumento capaz de justificar a retratação. Os argumentos apresentados pela parte agravante são incapazes de demonstrar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão combatida e justificar a retratação prevista no artigo 1.021, § 2º, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual deve ser desprovido o agravo interno. Agravo Interno conhecido e desprovido. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Agravos -> Agravo de Instrumento 5651425-81.2023.8.09.0168, Rel. Des(a). ANA CRISTINA RIBEIRO PETERNELLA FRANÇA, 7ª Câmara Cível, julgado em 06/11/2023, DJe de 06/11/2023) (grifei)No caso, a segunda requerida, Maria José, pugnou pelo deferimento da justiça gratuita em seu favor – mov. 78, porém, devidamente intimada para instruir seu pedido de justiça gratuita, não juntou documentos que comprovassem a alegada impossibilidade de arcar com os encargos processuais.Portanto, indefiro o pedido de justiça gratuita.PRELIMINARESAs preliminares suscitadas foram devidamente afastadas por este Juízo na decisão saneadora de mov. 100, tendo sido rejeitada a tese de ilegitimidade passiva de Maria José Moraes Costa na decisão de mov. 109.Inexistem questões processuais pendentes ou nulidades processuais que possam obstar o julgamento de mérito, os autos estão devidamente instruídos, aptos à apreciação das questões controvertidas.MÉRITOMadura e estabilizada a lide, com acervo probatório suficiente para o deslinde da controvérsia, sem necessidade de produção de outras provas, presentes os pressupostos processuais de existência e validade, bem como as condições da ação, passo ao julgamento do feito.Importa pontuar que, após o saneamento do feito, foi oportunizada às partes a produção de provas além daquelas já documentadas nos autos, porém nada foi requerido no prazo estipulado (mov. 114), operando-se verdadeira preclusão com relação às provas genericamente requeridas na fase postulatória (inicial e contestação). Com efeito, a ausência de manifestação das partes quanto à produção probatória, no momento de especificação de provas, gera a preclusão consumativa e presume a satisfação da parte com os elementos já carreados aos autos ou a renúncia tácita a tal direito, o que impede posterior alegação de prejuízo ou cerceamento de defesa, sob pena de violação aos princípios da boa-fé e da cooperação processual.DA PROTEÇÃO INTEGRAL DO MEIO AMBIENTEO princípio da proteção integral do meio ambiente está previsto no art. 225, caput, da Constituição Federal, sendo estabelecido que: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”O meio ambiente ecologicamente equilibrado é considerando bem difuso, classificado como direito humano de terceira geração. A Constituição o define como de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, e impõe, sobretudo ao Poder Público e à coletividade, um elenco de obrigações e deveres para defender o meio ambiente ecologicamente equilibrado, criando um pacto intergeracional que deve ser respeitado.O dano ambiental consiste em um prejuízo causado ao meio ambiente por ação ou omissão humana. Esse prejuízo viola o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e, consequentemente, afeta negativamente toda a coletividade, seja de forma direta ou indireta.Ressalte-se a relevância e a magnitude do direito protegido de natureza transindividual e difusa, de modo que a degradação do meio ambiente gera reflexos que atinge a todos, na medida em que os priva de gozar de direitos constitucionalmente protegidos, consistentes no meio ambiente equilibrado e na sadia qualidade de vida (CF/88, art. 225, caput).DA PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO E DO RELATÓRIO DE FISCALIZAÇÃOO auto de infração e o relatório de fiscalização revestem-se de presunção relativa de legitimidade e veracidade (iuris tantum), em decorrência da fé pública atribuída aos agentes dos órgãos ambientais, sobretudo quando não apresentada qualquer prova em contrário capaz de desacreditá-los. Outrossim, são documentos lavrados por agentes administrativos no exercício do Poder de Polícia, perfeitamente idôneos, portanto, a subsidiar a propositura da ação e servir de prova do dano ambiental.Nesse passo, face à plausível exposição da parte autora, com respaldo na prova material trazida, competia aos réus demonstrar a existência de licença dos órgãos competentes para proceder à supressão da vegetação nativa, bem assim trazer elementos que infirmassem a conclusão de que houve ilícito ambiental, o que não ocorreu na espécie.DA RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL PELO DANO CAUSADO AO MEIO AMBIENTEQuanto à obrigação de reparar o dano causado, em matéria ambiental, o §3º do art. 225 da CF/88 estabelece a tríplice responsabilização penal, administrativa e civil do poluidor em decorrência da consumação de condutas lesivas ao meio ambiente.Assim, as responsabilidades penal, administrativa e civil possuem características próprias e são regidas por sistemas jurídicos específicos, o que reforça o caráter de independência entre si.A obrigação de reparar os danos ambientais vincula-se ao domínio da propriedade como obrigação propter rem, sendo possível exigir do atual proprietário ou possuidor as medidas necessárias para sanar danos causados por antigos donos ou terceiros. Assim, o dever fundamental de reparação ambiental pode ser cobrado de qualquer pessoa.Nesse sentido, a matéria foi edição da Súmula n. 623 do Superior Tribunal de Justiça: “As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor.”Considerando os contornos delineados nesta ação, a responsabilidade a ser verificada, no caso, é a civil.Com o fim de dar efetividade ao comando constitucional de proteção ao meio ambiente, foi criado, ainda, o Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), o qual disciplina sobre as áreas de preservação permanente, que em seu artigo 3º, inciso II, traz a definição de área de preservação permanente – APP:"Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas." Já o artigo 7º dispõe sobre a manutenção da APP: "Art. 7º A vegetação situada em Área de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado.§ 1º Tendo ocorrido supressão de vegetação situada em Área de Preservação Permanente, o proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título é obrigado a promover a recomposição da vegetação, ressalvados os usos autorizados previstos nesta Lei.§ 2º A obrigação prevista no § 1º tem natureza real e é transmitida ao sucessor no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural." Segundo a Lei n. 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, poluidor é: a “pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” (art. 3º, inciso IV).Infere-se do referido texto legal, que um dos objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente é: a “imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos” (art. 4º, inciso VII).Os elementos da responsabilidade civil ambiental decorrem do art. 14, §1º da PNMA, ao cravar que: é o “poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”. Assim, o responsável pelo ilícito ambiental – seja pessoa física ou jurídica – está sujeito à obrigação de reparar os danos causados por atividades lesivas ao meio ambiente, independentemente de dolo ou culpa.O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema 707, em sede de recurso especial repetitivo, firmou entendimento de que a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, na modalidade de risco integral, devendo-se comprovar a existência de nexo de causalidade apto a vincular o resultado lesivo efetivamente verificado ao comportamento (comissivo ou omissivo) daquele a quem se repute a condição de agente causador, sendo inadmissível a alegação de excludente de responsabilidade civil. Veja:Tema Repetitivo 707. Tese firmada: a) a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação, pela empresa responsável pelo dano ambiental, de excludentes de responsabilidade civil para afastar sua obrigação de indenizar; b) em decorrência do acidente, a empresa deve recompor os danos materiais e morais causados; c) na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito caso a caso e com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico do autor, e, ainda, ao porte da empresa, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de modo a que, de um lado, não haja enriquecimento sem causa de quem recebe a indenização e, de outro, haja efetiva compensação pelos danos morais experimentados por aquele que fora lesado.A área objeto dos autos enquadra-se legalmente (ope legis) como APP no disposto no artigo 4º do Código Florestal. Conforme a norma, a vegetação localizada em área de preservação permanente deve ser mantida pelo proprietário, possuidor ou ocupante, a qualquer título. Dessa forma, a responsabilidade por quaisquer danos é objetiva.Conforme se verifica nas infrações ambientais praticadas na propriedade rural denominada Fazenda Ipê, situada na zona rural deste Município, e consoante Relatório de Fiscalização n. 12/2018, emitido pelo IBAMA, que acompanha os respectivos autos de infração (mov. 1, arq. 4, p. 3), houve constatação na fiscalização em:“4.1.1 Ter em depósito 103,21 estéreos de madeira (37,58 estéreos em estacas roliças no depósito 1 - Coordenadas Geográficas 13° 25' 24,3'' S / 50° 21' 31,0'' O e 65,23 estéreos no depósito 2 - Coordenadas Geográficas 13° 14' 09,2'' S / 50° 16' 17,9" O, sendo 31,16 estéreos em estacas roliças e lascas e mais 34,47 estéreos em mourões), de origem nativa, sem Documento de Origem Florestal – DOF;4.1.2. Funcionar atividade potencialmente poluidora, abastecimento de combustível, sem o devido licenciamento ambiental; 4.1.3. Realizar limpeza de pastagem com rendimento lenhoso (retirada de árvores isoladas) sem a devida Autorização de Supressão Vegetal. A Dispensa de Licença apresentada refere-se à limpeza de pastagem sem rendimento lenhoso, o que não é o caso;4.1.4. Realizar intervenção em APP, com supressão de vegetação nativa, sem o devido licenciamento ambiental.” (grifei)Ademais, os agentes do IBAMA também constataram que os Documentos de Origem Florestal (DOFs) apresentados pelo Sr. Renato Perboni, que indicavam-no como destinatário, eram falsos, conforme registrado no referido relatório (item 4.2 - mov. 1, arq. 4, p. 3). Ocorre que o requerido “nunca acessou o sistema DOF e nunca possuiu pátio em seu nome”, motivo pelo qual não poderia ter recebido o madeiramento, do que se conclui que o primeiro requerido tinha plena ciência da situação irregular da madeira.Nesse ínterim, os fiscais também apuraram que o Sr. Renato Perboni apresentou licenças ambientais do CONVALC em relação aos barramentos de água (item 4.3 - mov. 1, arq. 4, p. 11), os quais, todavia, situavam-se em local de vegetação nativa na Área de Preservação Permanente – APP, de modo que as referidas licenças são insuficientes para legitimar tais barramentos, já que a CONVALC não possui Termo de Cooperação com a Secretaria de Meio Ambiente, Recursos Hídricos, Infraestrutura, Cidades e Assuntos Metropolitanos (SECIMA) que autorize a supressão de rendimento lenhoso.Com base nas apurações do Inquérito Civil n. 201900095886 (consta documentação comprobatória da degradação ambiental, inclusive com registros fotográficos e imagens de satélite) e no Relatório de Fiscalização n. 12/2018, emitido pelo IBAMA, que acompanha os respectivos autos de infração (mov. 1, arq. 4, p. 3), verifica-se que houve conduta transgressora dos requeridos em degradar Área de Preservação Permanente – APP, em área de 4,82 (quatro vírgula oitenta e dois) hectares (coordenação geográfica 13°15’28”S e 50°15’52’W), conduta que caracteriza a responsabilidade por dano coletivo ambiental. Portanto, é evidente o dano ambiental decorrente da degradação da APP e o nexo de causalidade entre a conduta da parte Requerida e o dano perpetrado.Destaco que não contêm nos autos elementos que comprovem a inviabilidade da restauração in natura da área, conforme definido no art. 2º, XIV, da Lei n. 9.985/00 (Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza - SNUC).DA QUANTIFICAÇÃO DO DANOÉ oportuno ressaltar que a ação civil pública por dano ambiental pode ter dois desfechos distintos: indenização em dinheiro (condenatória pecuniária) ou obrigação de fazer ou não fazer (condenatória mandamental), sendo, contudo, perfeitamente admissível a cumulação das sanções, como ocorreu na hipótese.O Superior Tribunal de Justiça editou súmula em relação à cumulação da obrigação de fazer ou não fazer com a obrigação de pagar quando existente dano ambiental:Súmula n. 629: Quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar.Ainda sobre o tema, o STJ sedimentou o entendimento de que tal medida não configura dupla incidência sobre a mesma conduta (bis in idem), porquanto “a indenização não é para o dano especificamente já reparado, mas para os seus efeitos remanescentes, reflexos ou transitórios, com destaque para a privação temporária da fruição do bem de uso comum do povo, até sua efetiva e completa recomposição, assim como o retorno ao patrimônio público dos benefícios econômicos ilegalmente auferidos” (REsp n. 1.180.078 – MG).Com efeito, a imposição da obrigação de reparar o dano não exclui a possibilidade de fixação de indenização pelo dano ambiental, especialmente devido à privação temporária da fruição do bem ambiental pela coletividade até a completa restauração - consoante entendimento do STJ que trago a seguir – e porque determinados danos são irreparáveis. Assim, cabe ao julgador verificar, casuisticamente, a necessidade e a possibilidade da indenização. Nesse sentido:DIREITO AMBIENTAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MEIO AMBIENTE. DESMATAMENTO DE ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. MATA ATLÂNTICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER E PAGAR QUANTIA. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. EXISTÊNCIA DE DANO MORAL COLETIVO AMBIENTAL. 1. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público estadual em virtude de desmatamento de Área de Preservação Permanente em mata nativa, no Município de Mariana/MG. O Parquet pede a condenação do infrator a reflorestar e a pagar indenização pelos danos causados ao meio ambiente. O ato ilícito, o seu nexo de causalidade e os danos ambientais foram constatados nos autos, portanto não existem dúvidas de que ocorreram. 2. A cumulação de obrigação de fazer, de não fazer e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização, inclusive pelo dano moral coletivo, em vez de considerar lesão específica já ecologicamente restaurada ou a ser restaurada, põe o foco em parcela do dano que, embora causada pelo mesmo comportamento pretérito do agente, apresenta efeitos deletérios de cunho futuro, irreparável ou intangível. Precedentes: REsp 1.328.753/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 3/2/2015; REsp 1.382.999/SC, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 18.9.2014; REsp 1.307.938/GO, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 16.9.2014; REsp 1.227.139/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 13.4.2012; REsp 1.115.555/MG, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe de 23.2.2011. 3. Recurso Especial provido. (REsp n. 1.635.451/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/12/2016, DJe de 28/8/2020)(grifei)Portanto, os pedidos formulados pelo autor são legítimos quando combinam a recomposição do dano ambiental com a indenização pecuniária, não sendo a última medida substitutiva da obrigação de reparação in natura do dano ambiental. Tal entendimento afasta qualquer alegação de dupla punição sobre a mesma conduta (bis in idem).O valor pugnado pelo Ministério Público quanto à indenização no valor total do dano ambiental corresponde ao somatório dos custos de reparação da área degradada (reflorestamento) e dos serviços ecossistêmicos perdidos, ambos calculados em função do tamanho da área degradada (em hectares) e do tempo de duração dos danos (em anos).A reparação almejada é por danos intercorrentes ou interinos, porquanto o meio ambiente deve ser protegido desde o momento da lesão ou dano (tempo passado) até sua completa reparação (tempo futuro).O dano intercorrente ou interino decorre da redução temporária do valor do bem ambiental em suas diversas formas de valor de uso e constitui uma compensação devida à sociedade pelo período em que esta foi privada dos serviços e recursos ecológicos, incluindo a título de reserva e precaução da natureza. Sobre o assunto, o Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou:PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA . RECURSO ESPECIAL. DANO INTERCORRENTE (INTERINO, TRANSITÓRIO, TEMPORÁRIO, INTERMEDIÁRIO, PROVISÓRIO). INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA. POSSIBILIDADE . ESPÉCIE DE DANO DISTINTA DO DANO RESIDUAL (PERMANENTE, DEFINITIVO, PERENE). VÍCIO DE FUNDAMENTAÇÃO. REENVIO DO FEITO À ORIGEM. 1 . Os danos ambientais interinos (também ditos intercorrentes, transitórios, temporários, provisórios ou intermediários) não se confundem com os danos ambientais definitivos (residuais, perenes ou permanentes). 2. Os danos definitivos somente se verificam, e são indenizáveis em pecúnia, se a reparação integral da área degradada não for possível em tempo razoável, após o cumprimento das obrigações de fazer. Seu marco inicial, portanto, é o término das ações de restauração do meio ambiente . 3. O marco inicial do dano intercorrente, a seu turno, é a própria lesão ambiental. Seu marco final é o da reparação da área, seja por restauração in natura, seja por compensação indenizatória do dano residual, se a restauração não for viável. 4 . O dano residual compensa a natureza pela impossibilidade de retorná-la ao estado anterior à lesão. O dano intercorrente compensa a natureza pelos prejuízos causados entre o ato degradante e sua reparação. 5. O poluidor deve não só devolver a natureza a seu estado anterior, mas reparar os prejuízos experimentados no interregno, pela indisponibilidade dos serviços e recursos ambientais nesse período . 6. A origem afastou a indenização pela possibilidade de restauração integral da natureza a seu estado anterior com o cumprimento das obrigações de fazer. A hipótese, efetivamente, trata de dano residual. 7 . Ao tratar o dano intercorrente, especificamente suscitado por ocasião dos aclaratórios, como se afastado diante dos fundamentos de inexistência de dano residual, o acórdão incorre em relevante omissão e, em consequência, nulidade do julgamento integrativo. 8. O acolhimento do vício de fundamentação prejudica o exame da matéria de fundo. 9 . Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido, para determinar o reenvio do feito à origem, para saneamento da omissão ora afirmada. (STJ - REsp: 1845200 SC 2019/0206423-2, Data de Julgamento: 16/08/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/09/2022) (grifei)Uma vez provada a ocorrência do dano, é indispensável apurar sua extensão para fins indenizatórios, o que exige perícia ou laudo técnico até a integral reparação da área degradada necessária, valor que deverá ser apurado em fase de liquidação de sentença, mediante a apresentação de metodologia de cálculo que toma referência o custo completo de recuperação da área degradada - incluindo o tamanho da área degradada (em hectares) e do tempo de duração dos danos (anos) - limitado aos valores requeridos na inicial.Reforço que a quantia deverá servir como parâmetro mínimo em eventual conversão em perdas e danos, a ser liquidada, sem prejuízo da multa fixada periodicamente para compelir a parte requerida ao cumprimento da obrigação (CPC, art. 500).DATA DO EVENTO DANOSOConsidero a data da imagem de satélite que comprova o dano como a data do evento danoso (infração ambiental) para fins de atualização da indenização objeto desta condenação, qual seja: 15/08/2018 (mov. 1, arq. 7, p. 2).DA HIPÓTESE DE DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZEREm caso de descumprimento da obrigação de recuperar a área degradada, há possibilidade de converter a obrigação de fazer em seu equivalente pecuniário (CPC, art. 499, do CPC), valor que deve corresponder aos cálculos apresentados a título de indenização pelos danos ambientais provocados.Para garantir a adequada recomposição da área, no caso de mora, a parte requerida deve ser condenada a abster-se de utilizar a área degradada ilegalmente, permitindo a restauração passiva do local – ou seja, a regeneração natural por meio das dinâmicas ambientais próprias da natureza, sem intervenção humana.DISPOSITIVOAnte o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I do CPC, resolvo o mérito e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial para condenar RENATO PERBONI e MARIA JOSÉ MORAES COSTA, solidariamente, em:a) OBRIGAÇÃO DE FAZER (art. 2º, XIV, Lei n. 9.985/00 - SNUC) consistente em: a.1) ELABORAR, no prazo de 30 (trinta) dias, Plano de Recuperação de Área Degradada — PRAD, elaborado por técnico ambiental habilitado e com recolhimento de taxa de Anotação de Responsabilidade Técnica — ART, referente ao desmatamento de vegetação nativa sem autorização do órgão ambiental competente em área de 4,82 (quatro vírgula oitenta e dois) hectares de vegetação nativa situada em área de preservação permanente – APP (coordenação geográfica 13°15’28”S e 50°15’52’W), na Fazenda Ipê, localizada neste município de São Miguel do Araguaia/GO, indicada no auto de infração e Relatório de Fiscalização n. 12/2018 apresentados na inicial;a.2) EXECUTAR, em até 02 (dois) anos, salvo se recomendável em prazo menor, a restauração da área degradada, observado o calendário previsto no PRAD homologado;b) OBRIGAÇÃO DE PAGAR a título de dano intercorrente ou interino, pelos danos ambientais provocados, desde a data do evento danoso até a data da completa reparação da área degradada, valor que deverá ser apurado em fase de liquidação de sentença, devendo apresentar metodologia de cálculo que toma referência o custo completo de recuperação da área - incluindo o tamanho da área degradada (em hectares) e do tempo de duração dos danos (anos) - limitado aos valores requeridos na inicial, a ser revertido ao Fundo Estadual do Meio Ambiente (art. 13 da Lei n. 7.347/85).CONDENO os requeridos em custas processuais (CPC, art. 82), porém deixo de condená-los em honorários advocatícios, na forma do art. 18, Lei n. 7.347/1985 (Precedentes do STJ: EDcl no REsp 1354802/RJ; EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL 2012/0216674-6; REsp 1346571/PR; RECURSO ESPECIAL 2011/0114205-5).Em caso de descumprimento da obrigação de fazer: a) fica o Ministério Público, desde já, autorizado a mandar executar a realização do PRAD, às expensas da parte Requerida, sem prejuízo de eventual multa ou indenização cabível (CC, art. 249 c/c CPC, art. 497); b) Para garantir a adequada recomposição da área, a parte requerida deverá abster-se de utilizar a área degradada ilegalmente, permitindo a restauração passiva do local – ou seja, a regeneração natural por meio das dinâmicas ambientais próprias da natureza, sem intervenção humana.Sem embargo da apresentação tempestiva do PRAD, a homologação do Plano dependerá de oitiva prévia do Ministério Público, a ser realizada na fase própria de liquidação e/ou cumprimento de sentença. Em razão das alterações promovidas no Código Civil por meio da Lei n. 14.905/2024, a incidência de juros corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), deduzido o IPCA (CC, art. 406, § 1º), contados da data da constatação do evento danoso; e correção monetária pelo IPCA a contar da data da prolação desta sentença (art. 389, parágrafo único do CC e Súmula n. 43 do STJ).Por fim, em caso de descumprimento da obrigação de fazer, FIXO MULTA cominatória, conforme previsão do art. 11 da Lei n. 7.347/85, no valor diário de R$1.000,00 (mil reais), limitada a 60 (sessenta) dias, valor que deverá ser revertido ao Fundo Estadual do Meio Ambiente.Oportunamente, dê-se baixa e arquivem-se os autos, observadas as cautelas e formalidades legais.Sentença publicada e registrada eletronicamente na data da assinatura eletrônica. Intimem-se. Cumpra-se.São Miguel do Araguaia, data e hora da assinatura eletrônica. Luiz Fabiano DidonéJuiz SubstitutoDecreto Judiciário n. 1.396/2025

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