Processo nº 1004467-59.2024.8.11.0041
ID: 259832942
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1004467-59.2024.8.11.0041
Data de Disponibilização:
24/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1004467-59.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Indenização por Dano Moral,…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1004467-59.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Empréstimo consignado, Liminar] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [BANCO PAN S.A. - CNPJ: 59.285.411/0001-13 (APELANTE), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), OSVANETH APARECIDA GRISOLIA - CPF: 329.034.211-53 (APELADO), UBIRAJARA GALVAO DE OLIVEIRA - CPF: 760.336.198-20 (ADVOGADO), RODRIGO PALOMARES MAIOLINO DE MENDONCA - CPF: 013.946.171-00 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E BANCÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. CONTRATAÇÃO IRREGULAR. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. CONVERSÃO EM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. TAXA MÉDIA DE MERCADO. REPETIÇÃO SIMPLES DE INDÉBITO. AUSÊNCIA DE ABALO MORAL. DANO EXTRAPATRIMONIAL AFASTADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta por instituição financeira contra sentença que converteu contrato de cartão de crédito consignado em empréstimo consignado, determinou a restituição simples de valores pagos indevidamente e fixou indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais). II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) saber se ocorreu a decadência do direito de pleitear anulação do negócio jurídico ou prescrição da pretensão indenizatória; (ii) verificar a validade do contrato de cartão de crédito consignado e a possibilidade de sua conversão em empréstimo consignado; e (iii) analisar a configuração de dano moral indenizável decorrente da contratação em modalidade diversa da pretendida pelo consumidor. III. Razões de decidir 3. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo, com descontos mensais continuados na remuneração do consumidor até fevereiro de 2024, não há que se falar em decadência ou prescrição, pois o termo inicial de contagem dos prazos é renovado a cada desconto realizado. 4. A instituição financeira que induz o consumidor a erro, oferecendo cartão de crédito consignado quando este pretende contratar empréstimo consignado tradicional, incorre em falha no dever de informação, violando os princípios da transparência, boa-fé objetiva e o dever de cooperação previstos nos arts. 4º, 6º, III, e 46 do CDC. 5. A ausência de utilização efetiva do cartão para compras e a transferência dos valores por TED evidenciam que a vontade real da consumidora era a contratação de empréstimo consignado, justificando a conversão da modalidade contratual, com aplicação da taxa média de mercado e restituição simples dos valores pagos em excesso. 6. A mera contratação em modalidade diversa da pretendida, embora configure falha na prestação do serviço, não caracteriza, por si só, dano moral indenizável, por não ultrapassar a esfera do mero aborrecimento, inexistindo negativação indevida, comprometimento do mínimo existencial ou exposição a situação vexatória. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso parcialmente provido para afastar a condenação por danos morais, mantida a conversão do contrato para empréstimo consignado com aplicação da taxa média de mercado do BCB à época da contratação. Tese de julgamento: "1. Nas obrigações de trato sucessivo, o termo inicial para contagem dos prazos de decadência e prescrição é renovado a cada novo desconto. 2. A contratação de cartão de crédito consignado quando o consumidor pretendia empréstimo consignado caracteriza falha no dever de informação, justificando sua conversão para empréstimo consignado tradicional. 3. A mera contratação em modalidade diversa da pretendida não configura dano moral indenizável, salvo se acompanhada de circunstâncias excepcionais capazes de causar efetivo abalo à dignidade do consumidor." Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 4º, 6º, III e VIII, 39, V, 42, 46; CC, arts. 170, 178, II, 205, 421; Lei nº 10.820/03; Lei nº 13.172/15. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1658793/MS, 4ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 25.05.2020; TJMT, RAC 1010568-54.2020.8.11.0041, 4ª Câmara de Direito Privado; TJMT, RAC 1017336-93.2020.8.11.0041, 3ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 27.04.2022; TJMT, RAC 1046534-15.2019.8.11.0041, 3ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 03.02.2021. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo BANCO PAN S.A. contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Especializada em Direito Bancário de Cuiabá, na Ação Declaratória c/c Indenizatória e Pedido de Tutela Provisória de Urgência n. 1004467-59.2024.8.11.0041, ajuizada por OSVANETH APARECIDA GRISOLIA, que julgou parcialmente procedentes os pedidos inaugurais, convertendo o contrato de cartão de crédito para contrato de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de mercado do BCB da data da contratação. Consignou que “a devolução dos valores ilegalmente descontados, se houver, será de forma simples, com a compensação do crédito eventualmente existente em favor do Banco”. Além disso, manteve a tutela de urgência anteriormente concedida para “determinar que até que ocorra liquidação do contrato, seja suspensa a cobrança do débito na folha de pagamento da parte autora. Ao final, havendo saldo em favor do requerido, deverá dar continuidade aos referidos descontos com a atualização a ser feita”. Por fim, condenou o banco requerido, ora apelante, “ao pagamento da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais)”, com a incidência dos consectários legais, além do pagamento das custas e despesas processuais e honorários sucumbenciais, fixados em 15% (quinze por cento) do proveito econômico obtido pela autora, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. O apelante alega, preliminarmente, a incidência da decadência do direito de pleitear a anulação do negócio jurídico, com fundamento no art. 178, II, do Código Civil, sustentando que o prazo quadrienal para arguição de vício de consentimento findou-se em 2020, considerando que o contrato de cartão de crédito consignado foi celebrado em 2016, enquanto a ação foi distribuída apenas em 2024. Além disso, invoca a prescrição quinquenal prevista no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, argumentando que, por tratar-se de suposto fato do serviço, o prazo prescricional de cinco anos iniciou-se com a ciência do dano, que coincide com o primeiro desconto ou, no mínimo, limitaria a pretensão reparatória aos últimos cinco anos anteriores ao ajuizamento da demanda. No mérito, o apelante sustenta a plena validade do contrato de cartão de crédito consignado, respaldado pela Lei n. 10.820/03, pela Instrução Normativa INSS/PRES n. 28/2008 e pela Lei n. 13.172/15, argumentando a inexistência de vício de consentimento, vez que as cláusulas contratuais atenderam o disposto no art. 54, §3º do CDC. Invoca o princípio da boa-fé objetiva e o instituto do venire contra factum proprium como garantidores da manutenção do contrato, corroborado por jurisprudência do STJ, demonstrando que a transferência bancária para conta da apelada no valor de R$ 10.186,56 em 30/06/2016 corresponde à modalidade de saque prevista no art. 16 da Instrução Normativa INSS nº 28/2008. Alternativamente, caso mantida a invalidade contratual, pleiteia a anulação do negócio com retorno ao status quo ante, sustentando a impossibilidade técnica de conversão do contrato de cartão de crédito em empréstimo consignado, ante as distintas reservas de margens consignáveis (5% e 35%, respectivamente), cuja transmutação poderia ocasionar o excesso da margem consignável total disponível. Por fim, contesta a condenação por danos morais, alegando inexistência de ato ilícito e ausência de nexo causal, e subsidiariamente requer: a redução do quantum indenizatório de R$ 8.000,00; a alteração do termo inicial dos juros moratórios para a data do arbitramento; a adequação da base de cálculo dos honorários ao valor da condenação; e a correção dos índices de atualização monetária e juros conforme a Lei nº 14.905/2024. Contrarrazões apresentadas em id. 275904867. Desnecessária a intervenção ministerial, nos termos do art. 178 do CPC. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Preambularmente, verifico que o recurso merece ser conhecido, pois presentes os pressupostos de admissibilidade. Conforme relatado, trata-se de recurso de apelação interposto pelo BANCO PAN S.A. contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos inaugurais, convertendo o contrato de cartão de crédito para contrato de empréstimo pessoal consignado, com aplicação da taxa média de mercado do BCB da data da contratação, mantendo a tutela de urgência para suspensão dos descontos em folha de pagamento até a liquidação do contrato, ordenando a restituição simples de valores eventualmente cobrados indevidamente, com compensação de créditos existentes em favor da instituição financeira, e condenando o banco apelante ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 8.000,00 (oito mil reais), acrescido de correção monetária e juros legais, além de custas processuais e honorários advocatícios fixados em 15% sobre o proveito econômico obtido pela parte autora. · PRELIMINARES – DA PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA Inicialmente, cabe à análise das preliminares suscitadas pela parte apelante. O apelante sustenta a ocorrência simultânea de dois fenômenos extintivos de direitos: (i) a decadência do direito de pleitear a anulação do negócio jurídico, com fundamento no art. 178, II, do Código Civil, ao argumento de que o prazo quadrienal para arguição de vício de consentimento findou-se em 2020, considerando que o contrato de cartão de crédito consignado foi celebrado em 2016; e (ii) a prescrição quinquenal prevista no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, aduzindo que, por tratar-se de suposto fato do serviço, o prazo prescricional de cinco anos iniciou-se com a ciência do dano, que coincidiria com o primeiro desconto, em 2016. A análise aprofundada de ambos os institutos revela que as prejudiciais não merecem acolhimento. Primeiramente, quanto à natureza jurídica da relação obrigacional em exame, resta inequívoco tratar-se de obrigação de trato sucessivo, caracterizada pelos descontos mensais continuados na remuneração da autora, que se renovam periodicamente. Tal classificação implica consequências jurídicas determinantes para o deslinde da controvérsia quanto aos prazos extintivos, uma vez que a contagem dos prazos decadencial e prescricional tem início a partir do último pagamento. No caso sub examine, extrai-se da documentação carreada aos autos que os descontos na conta da autora, relativos ao questionado cartão de crédito consignado, perduraram até fevereiro de 2024, evidenciando a contemporaneidade da pretensão deduzida em juízo, principalmente em razão do termo inicial do prazo prescricional ser o vencimento da última parcela. Nesse sentido é o entendimento jurisprudencial, in verbis: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. (...) 3. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido. Precedentes. (...)” (STJ, AgInt no AREsp 1658793/MS, 4ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 25.05.2020 – negritei e grifei) O eg. TJMT já assentou: “AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL E RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – PRESCRIÇÃO AFASTADA – ONEROSIDADE EXCESSIVA – JUROS REMUNERATÓRIOS – TAXA MÉDIA DE MERCADO - SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O objeto da lide se refere a contrato de cartão de crédito consignado, cuja obrigação é de trato sucessivo, em que o termo inicial do prazo prescricional é o vencimento da última parcela. (...) (TJMT, 1028705-16.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/07/2024, Publicado no DJE 14/07/2024 - destaquei). Logo, não há falar em prescrição, pois apesar da contratação realizada ainda em 21.12.2015, as prestações continuam a ser debitadas diretamente da folha de pagamento do apelante até os dias atuais, de modo que rejeito a preliminar de prescrição suscitada. Quanto à preliminar de decadência, é possível observar que os autos versam não somente sobre pedido de anulação do contrato, mas também pela revisão e conversão da modalidade do pacto, motivo pelo qual não há que se falar na incidência da regra do art. 178 do Código Civil. Nesse sentido, “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE/INEXIGIBILIDADE DE DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINAR DE DECADÊNCIA – REJEITADA – CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO DE CARTÃO DE CRÉDITO – VÍCIO DE CONSENTIMENTO EVIDENCIADO – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – DETERMINAÇÃO DE RECÁLCULO DOS VALORES – REPETIÇÃO DO INDÉBITO – POSSIBILIDADE – RECURSO CONHECIDO DESPROVIDO. A ação revisional de cláusulas não deve ser confundida com anulação do negócio jurídico, razão pela qual não há incidência do prazo decadencial previsto no art. 178, II, do CC. (...)”. (RAC n.º 1017336-93.2020.8.11.0041, 3ª Câm. Direito Privado, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 27.04.2022 – negritei). “PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR – RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E NULIDADE CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL – VIOLAÇÃO – INEXISTÊNCIA – PRELIMINAR – REJEIÇÃO – DECADÊNCIA – INOCORRÊNCIA – PRESCRIÇÃO – AUSÊNCIA DE HIPÓTESE – PREJUDICIAIS DE MÉRITO – NÃO ACOLHIMENTO – CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONVERSÃO EM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – SAQUE DE LIMITE DE CARTÃO DE CRÉDITO – DEVER DE INFORMAÇÃO – VIOLAÇÃO – ILEGALIDADE CONSTATAÇÃO – TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS – ADEQUAÇÃO À MÉDIA PRATICADA NA ÉPOCA DO SAQUE – RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO – FORMA SIMPLES – DANO MORAL – NÃO CONFIGURAÇÃO – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) 2. Sabe-se que, nos casos de revisão contratual de contratos bancários, com pedido de restituição de valores pagos indevidamente, o prazo prescricional se amolda à previsão decenal do artigo 205 do Código Civil. 3. Nas hipóteses que envolvem prestações de trato sucessivo, o pacto se renova ao longo do tempo, de forma automática, devido aos descontos efetuados mensalmente e, portanto, a cada novo desconto, o período de decadência é renovado e o termo inicial para contagem do prazo decadencial é o vencimento da última parcela. (...)” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10437150320228110041, Relator.: MARCIO VIDAL, Data de Julgamento: 09/07/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/07/2024- destaquei). Desta forma, não há que se falar em decadência ou prescrição, ainda que parcial, pois as prestações continuaram a ser debitadas diretamente da conta do apelado até fevereiro de 2024. Diante disso, REJEITO as prejudiciais de prescrição e decadência. MÉRITO Após cuidadosa análise dos autos e da extensa documentação que o instrui, passo à apreciação do mérito recursal. A controvérsia central gravita em torno da caracterização jurídica do contrato celebrado entre as partes - se efetivamente consiste na modalidade de cartão de crédito consignado com Reserva de Margem Consignável (RMC) ou se constitui empréstimo consignado tradicional - e, por conseguinte, da existência de falha no dever de informação capaz de gerar danos materiais e morais à parte autora. De início, cumpre destacar que a relação jurídica estabelecida entre as partes se submete aos ditames do Código de Defesa do Consumidor, consoante o entendimento consolidado na Súmula 297 do STJ: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras". Nesta toada, a parte autora, na condição de consumidora, goza da prerrogativa de inversão do ônus probatório, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC. Ressalte-se que, contemporaneamente, a modalidade de cartão de crédito consignado difunde-se como operação de crédito peculiar, na qual a instituição financeira disponibiliza ao consumidor um cartão de crédito, cujo valor mínimo da fatura é descontado diretamente de sua remuneração, com reserva de margem consignável de 5% (cinco por cento), diversa dos 35% (trinta e cinco por cento) destinados a empréstimos consignados propriamente ditos. Todavia, a prática negocial revela que, frequentemente, o consumidor, ao procurar a instituição financeira com o desiderato de obter um empréstimo consignado tradicional, depara-se com a oferta de cartão de crédito consignado, culminando na imediata transferência do valor contratado para sua conta corrente, sem a efetiva emissão do cartão físico ou, quando emitido, sem a utilização para operações comerciais. No caso em comento, a análise detida dos elementos probatórios coligidos aos autos evidencia que a parte autora, de fato, foi induzida a celebrar contrato de cartão de crédito consignado quando, na realidade, almejava contratar empréstimo consignado tradicional. As faturas apresentadas pela instituição financeira recorrente (id. 275904853) corroboram a tese autoral, porquanto demonstram que nenhuma compra foi realizada através do cartão, tendo sido contabilizados apenas IOF e demais encargos. A ausência de efetiva utilização do cartão para fins de compras, aliada ao recebimento dos valores por meio de transferência bancária (TED), constitui indício robusto de que a vontade real da consumidora era a celebração de contrato de empréstimo consignado, não de cartão de crédito consignado. Desse modo, a conduta da instituição financeira, ao não propiciar informações claras e adequadas sobre a natureza e características do produto contratado, ofendeu o princípio da transparência e o dever de informação, insculpidos nos arts. 4º, caput, 6º, III, e 46, todos do CDC, configurando manifesta vulneração à boa-fé objetiva e ao dever de cooperação que devem nortear os contratos. A concepção moderna de boa-fé contratual, desenvolvida a partir do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF) e da função social do contrato (art. 421, CC), exige dos contratantes comportamento pautado pela lealdade e cooperação, de modo a assegurar que a autodeterminação negocial seja exercida com pleno discernimento sobre o conteúdo e efeitos da avença. No caso em análise, o Banco recorrente, valendo-se de sua posição de superioridade técnica e informacional, propiciou à consumidora contrato diverso daquele efetivamente desejado, induzindo-a à celebração de negócio jurídico manifestamente oneroso, cujas taxas de juros são notoriamente superiores às praticadas em empréstimos consignados. Nesse passo, conforme o disposto no art. 39, inciso V, do CDC, é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas, exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva. Assim, embora a declaração de inexistência do débito não encontre amparo, mormente pelo fato de que o valor foi disponibilizado ao apelante, tenho que a operação realizada entre as partes deve ser convertida para a modalidade de empréstimo consignado com desconto em folha, conforme estabelecido na sentença recorrida, com a incidência de juros remuneratórios de acordo com a taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central à época da contratação, ou seja, de cada TED. Acerca do tema, o art. 170, do C. Civil, dispõe que se “o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.” Vale ressaltar que a 4ª Câmara de Direito Privado do TJMT, em técnica de julgamento proferido no recurso de Apelação Cível nº 1010568-54.2020.8.11.0041, firmou entendimento acerca da presente matéria e restou determinado, naquela ocasião, que nos casos de contratação de cartão de crédito consignado, em que o consumidor acredite se tratar de empréstimo consignado regular, será o caso de converter a modalidade contratual para empréstimo consignado, com a consequente alteração das taxas de juros, bem como de restituição, na forma simples, na hipótese de ausência de má-fé, de valores descontados em excesso, caso haja comprovação em liquidação. O entendimento vem sendo aplicado pelas demais câmaras, in verbis: "DIREITO DO CONSUMIDOR E DIREITO BANCÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM INDENIZATÓRIA. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. INDUÇÃO EM ERRO. CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO TRADICIONAL. TAXA DE JUROS. DEVOLUÇÃO SIMPLES. DANO MORAL AFASTADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) 3. Nos termos do CDC, a instituição financeira tem responsabilidade objetiva e o dever de informação. 4. Ausência de prova documental da efetiva emissão, recebimento ou uso do cartão pelo consumidor, o que caracteriza vício de consentimento. 5. Conversão do contrato para empréstimo consignado com incidência de taxa de juros média de mercado, conforme a Súmula 530 do STJ. 6. Devolução dos valores pagos em excesso na forma simples, por ausência de comprovação de má-fé da instituição financeira. 7. Inexistência de dano moral in re ipsa, ausente negativação indevida ou constrangimento adicional. (...) Tese de julgamento: “A ausência de previsão da taxa de juros no contrato autoriza a fixação pela taxa média indicada pelo BACEN, conforme previsão da Súmula 530 do STJ, e devolução simples dos valores indevidamente cobrados, salvo prova de má-fé da instituição financeira. O simples vício de consentimento não enseja dano moral, salvo situação excepcional devidamente comprovada.” (N.U 1003247-19.2023.8.11.0087, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/02/2025, Publicado no DJE 26/02/2025 – grifo nosso) “RECURSOS DE APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO - PRINTS DE TELA SISTÊMICA – NÃO COMPROVAÇÃO – CONVERSÃO DO CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO EM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES –DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – RECURSOS DESPROVIDOS. Telas sistêmicas são documentos unilateralmente produzidos e que de per si carecem de valor probatório para comprovar a relação jurídica referente à contratação de prestação de serviços. Não obstante a Instituição Financeira não ter trazido aos autos cópia do contrato de empréstimo e sua modalidade, a parte Autora reconhece ter contratado empréstimo consignado com o Banco, de forma que, à luz do princípio da conservação do contrato, a solução adotada na sentença, com a conversão da avença, encontra-se escorreita. Ausentes nos autos elementos que comprovem a má-fé da Instituição bancária, hipótese dos autos, a restituição dos valores indevidamente cobrados deve se dar na forma simples. A mera cobrança indevida não é suficiente para, por si só, ensejar indenização por danos morais, por não se tratar de hipótese de dano moral in re ipsa.” (N.U 1010741-10.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 16/12/2024, Publicado no DJE 16/12/2024 – grifo nosso) “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO DE CARTÃO DE CRÉDITO – VÍCIO DE CONSENTIMENTO EVIDENCIADO – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO, PARA APOSENTADO – DETERMINAÇÃO DE RECÁLCULO DOS VALORES – EVENTUAL COBRANÇA INDEVIDA – MERO DISSABOR NÃO INDENIZÁVEL – DANO MORAL AFASTADO – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (...) Necessária a conversão da contratação para empréstimo consignado, observada a taxa média de mercado dos juros remuneratórios para operações da mesma natureza, de modo a evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes. Não há dano moral indenizável no caso concreto, haja vista a inexistência de comprovação do dano real sofrido pela parte, já que a parte autora teve a clara intenção de contratar um empréstimo consignado. Logo, a simples cobrança indevida, por si só, não configura situação vexatória nem abalo psíquico, tratando-se, na verdade, de mero dissabor.” (RAC n. 1046534-15.2019.8.11.0041, 3ª Câm. de Direito Privado, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 03.02.2021 - negritei) “APELAÇÃO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE ATO JURÍDICO C/C DANOS MORAIS - UTILIZAÇÃO DE SALDO DO CARTÃO DE CRÉDITO (RMC) - VÍCIO DE CONSENTIMENTO - CONVERSÃO DA MODALIDADE CONTRATUAL PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS - RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES DOS VALORES DESCONTADOS EM EXCESSO, CASO HAJA COMPROVAÇÃO - DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...). 1. A jurisprudência do STJ entende que a pretensão de repetição de valores pagos indevidamente em função de contrato bancário está sujeita ao prazo prescricional vintenário na vigência do CC/1916 e ao decenal na vigência do CC/2002, contado da efetiva lesão, ou seja, do pagamento. (...)” (AgInt no AREsp 1234635/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 01/03/2021, DJe 03/03/2021). Não configurada a decadência, porquanto o caso é de obrigação de trato sucessivo, já que há renovação automática do pacto ao longo do tempo, por meio dos descontos realizados mensalmente. Configura falha na prestação do serviço a conduta da instituição financeira que induz o cliente a erro ao celebrar contrato de cartão de crédito consignado, quando o consumidor acredita tratar-se de empréstimo pessoal. É caso de conversão da contratação para empréstimo consignado, observada a taxa média de mercado dos juros remuneratórios para operações da mesma natureza, condição que enseja a restituição, na forma simples, de valores descontados em excesso, caso haja comprovação. Se não demonstrados os requisitos da reparação civil, não é cabível a indenização a título de dano moral.” (RAC n.º 1002981-46.2021.8.11.0008, 4ª Câm. de Direito Privado, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 22.02.2023 – destaquei). “APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – CONTRATAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO - PRÁTICA ABUSIVA - NECESSÁRIA ALTERAÇÃO DA MODALIDADE DA AVENÇA - ADEQUAÇÃO DOS JUROS DEVIDA - LESÃO EXTRAPATRIMONIAL NÃO CONFIGURADA - RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO - FORMA SIMPLES - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. A contratação de cartão de crédito consignado com a prática de desconto do pagamento mínimo em folha que amortiza apenas os juros de financiamento do saldo devedor, impedindo a quitação da dívida principal é abusiva, sendo devida a conversão da modalidade contratual e a adequação da taxa de juros. A cobrança injustificada não configura, por si só, o dano moral. As parcelas imotivadamente descontadas devem ser restituídas na forma simples quando não constatada a intenção dolosa.” (RAC n.º 1013845-10.2022.8.11.0041, 4ª Câm. Direito Privado, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 15.02.2023 - destaquei) DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO. CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DEVOLUÇÃO SIMPLES DOS VALORES PAGOS A MAIOR. DANOS MORAIS AFASTADOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) O Código de Defesa do Consumidor se aplica às instituições financeiras, impondo-lhes o dever de transparência e informação clara sobre os produtos ofertados. A instituição financeira não comprovou que a consumidora tinha plena ciência da modalidade contratada, caracterizando falha no dever de informação e vício de consentimento. A conversão do contrato em empréstimo consignado, com aplicação dos juros médios de mercado, é medida adequada para reequilibrar a relação contratual. A restituição dos valores pagos a maior deve ocorrer de forma simples, pois não demonstrada má-fé da instituição financeira. A cobrança indevida, sem comprovação de constrangimento excepcional, não configura dano moral indenizável. (...) Tese de julgamento: “1. A falha no dever de informação na contratação de cartão de crédito consignado caracteriza vício de consentimento, justificando sua conversão em empréstimo consignado. 2. A devolução dos valores pagos a maior deve ocorrer de forma simples, salvo comprovação de má-fé da instituição financeira. 3. A mera cobrança indevida não configura dano moral, salvo se comprovado constrangimento excepcional.” (N.U 1025025-86.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/03/2025, Publicado no DJE 24/03/2025 – grifo nosso) Por conseguinte, em observância aos princípios da função social do contrato (art. 421 do CC) e da preservação dos negócios jurídicos (art. 170 do CC), deve ser mantida a sentença que determinou a readequação do instrumento para a modalidade de mútuo consignado, com aplicação dos encargos próprios desta linha de crédito conforme as taxas médias de mercado divulgadas pelo Banco Central para o período. Sendo assim, tal conversão permitirá o reequilíbrio da relação contratual, preservando tanto o capital efetivamente emprestado quanto a legítima remuneração da instituição financeira, sem onerar excessivamente qualquer das partes. Reconhecido o vício na contratação, resta evidente que após a conversão, haverá o dever de a instituição financeira restituir os valores descontados em excesso, que deverão ser apurados em liquidação, conforme estabelecido na sentença recorrida, sob pena de inarredável enriquecimento sem causa por parte da instituição financeira. Não obstante, repiso que a referida repetição, à que alude o art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, pressupõe a existência de má-fé do credor. No caso dos autos a devolução deve ser feita de forma simples, uma vez que não restou comprovada a má-fé do banco, que, aliás, não se presume. No tocante ao dano moral, no escólio de Maria Helena Diniz (Curso de Direito Civil brasileiro: responsabilidade civil. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 112), o direito à indenização por dano moral exsurge de condutas que ofendam direitos da personalidade ou a dignidade da pessoa humana, abrangendo interesses que, embora desprovidos de conteúdo patrimonial, são dotados de extrema relevância na ordem jurídica pátria. É consabido, ainda, que a responsabilidade civil demanda, para sua configuração, a presença dos seguintes elementos: (i) conduta ilícita; (ii) dano; (iii) nexo de causalidade; e (iv) culpa, sendo este último dispensável nas hipóteses de responsabilidade objetiva, como é o caso das relações consumeristas, nos termos do art. 14 do CDC. Nesse contexto, analisadas detidamente as circunstâncias da presente lide, não se constata lesão aos direitos de personalidade do consumidor apta a superar o conceito de mero descumprimento contratual e ensejar indenização por danos morais. Insisto, a caracterização dos danos morais demanda a comprovação de uma situação de tamanha gravidade que ofenda a honra ou abale sobremaneira o estado psicológico do indivíduo, circunstância não configurada na hipótese dos autos, pois não ultrapassa o limite do dissabor ou do aborrecimento, sendo insuficiente para ensejar reparação por danos morais. Na espécie, embora se verifique a ocorrência de falha na prestação do serviço, ante a inobservância do dever de informação por parte da instituição financeira, esse fato, por si só, não enseja automaticamente a condenação por danos morais. Com efeito, no caso em exame, revela-se significativa a circunstância de que a parte autora teve a intenção efetiva de contratar um empréstimo, dispondo-se a adimplir as parcelas correspondentes. De fato, os descontos foram realizados, ainda que sob a rubrica de "reserva de margem consignável", valor esse que, uma vez recalculado conforme os parâmetros do empréstimo consignado tradicional, será devidamente compensado. A celebração de contrato diverso do efetivamente desejado, sem que daí decorra situação excepcional de abalo anímico, não configura dano moral indenizável. Embora questionado o negócio jurídico quanto à sua validade e reconhecido que houve simples cobrança indevida por insuficiência de informações, com a necessidade de conversão da natureza do contrato, sem qualquer repercussão na esfera personalíssima ou na dignidade da pretensa vítima, não se visualiza a realidade geradora de obrigação de indenizar por dano moral. Com efeito, “APELAÇÃO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - EMPRÉSTIMO PESSOAL OFERECIDO PELO BANCO - DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO - UTILIZAÇÃO DE SALDO DO CARTÃO DE CRÉDITO (RMC) - VÍCIO DE CONSENTIMENTO - CONVERSÃO DA MODALIDADE CONTRATUAL PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS - RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES DOS VALORES DESCONTADOS EM EXCESSO, CASO HAJA COMPROVAÇÃO - DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Configura falha na prestação do serviço a conduta da instituição financeira que induz o cliente a erro ao celebrar contrato de cartão de crédito consignado, quando o consumidor acredita tratar-se de empréstimo pessoal. É caso de conversão da contratação para empréstimo consignado, observada a taxa média de mercado dos juros remuneratórios para operações da mesma natureza, condição que enseja a restituição, na forma simples, de valores descontados em excesso, caso haja comprovação. Se não demonstrados os requisitos da reparação civil, não é cabível a indenização a título de dano moral.” (TJ-MT 10027532120198110015 MT, Relator.: GUIOMAR TEODORO BORGES, Data de Julgamento: 16/03/2022, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/03/2022 – grifo nosso) “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE/INEXIGIBILIDADE DE DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO – PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADA – MÉRITO – FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO – CONVERSÃO DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PARA BENEFICIÁRIO DO INSS – REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Não há falar em cerceamento de defesa se a prova requerida se revela desnecessária à solução da controvérsia, máxime quando os demais elementos do processo se mostraram suficientes para a formação de juízo seguro sobre os fatos discutidos na lide. Configura prática abusiva, que viola aos princípios da lealdade, boa-fé e transparência, a concessão de empréstimo pessoal consignado na modalidade de cartão de crédito, sem o consentimento do contratante, de forma que o empréstimo deve ser convertido para a modalidade de empréstimo consignado para aposentado, mediante repetição do indébito na forma simples, a ser apurado em liquidação de sentença. A abusividade da contratação não caracteriza, por si só, dano moral, porquanto não houve negativação do nome do autor ou exposição fática a situação constrangedora, mas sim mero aborrecimento pela adesão inadvertida ao cartão de crédito oneroso e desvantajoso ao consumidor.” (RAC n.º 1022081-02.2021.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, 3ª Câm. Direito Privado, Relatora Desa. Antônia Siqueira Gonçalves, j. 08.02.2023 – destaquei) DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO. CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DEVOLUÇÃO SIMPLES DOS VALORES PAGOS A MAIOR. DANOS MORAIS AFASTADOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) A conversão do contrato em empréstimo consignado, com aplicação dos juros médios de mercado, é medida adequada para reequilibrar a relação contratual. (...) A cobrança indevida, sem comprovação de constrangimento excepcional, não configura dano moral indenizável. (...) “1. A falha no dever de informação na contratação de cartão de crédito consignado caracteriza vício de consentimento, justificando sua conversão em empréstimo consignado. 2. A devolução dos valores pagos a maior deve ocorrer de forma simples, salvo comprovação de má-fé da instituição financeira. 3. A mera cobrança indevida não configura dano moral, salvo se comprovado constrangimento excepcional.” (N.U 1025025-86.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/03/2025, Publicado no DJE 24/03/2025 – grifo nosso) “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE DE CARTÃO DE CRÉDITO – FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO – CONVERSÃO DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PARA BENEFICIÁRIO DO INSS – REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) A abusividade da contratação não caracteriza, por si só, dano moral, porquanto não houve negativação do nome do autor ou exposição fática a situação constrangedora, mas sim mero aborrecimento pela adesão inadvertida ao cartão de crédito oneroso e desvantajoso ao consumidor”. (TJMT, 1004467-63.2023.8.11.0051, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/12/2024, Publicado no DJE 13/12/2024 - destaquei). “DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). CONVERSÃO EM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. REPETIÇÃO SIMPLES DE INDÉBITO. DANO MORAL AFASTADO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO (...) (iii) é devida indenização por dano moral em razão dos descontos indevidos; (...) O dano moral não é configurado in re ipsa, pois a cobrança indevida, por si só, não gera lesão extrapatrimonial quando não há restrição de crédito ou constrangimento excessivo. (...) IV. DISPOSITIVO E TESE (...) 3. O dano moral não se presume em casos de cobrança indevida, sendo necessária a demonstração de efetivo prejuízo extrapatrimonial. (...)” (TJMT, 1045368-40.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 12/02/2025, Publicado no DJE 15/02/2025 - destaquei). Diferente seria se a instituição financeira houvesse inserido o nome da autora em cadastros de inadimplentes, ou se os descontos tivessem comprometido seu mínimo existencial, privando-a de recursos imprescindíveis para sua subsistência, ou, ainda, se a conduta do banco houvesse exposto a consumidora a situação vexatória ou degradante, hipóteses nas quais o dano moral se revelaria in re ipsa. No entanto, a mera contratação de modalidade diversa, conquanto configure falha na prestação do serviço e enseje a conversão do negócio jurídico, não gera, automaticamente, dano à esfera extrapatrimonial da consumidora. No que tange ao termo inicial dos juros de mora e a correção dos índices aplicados aos consectários legais, tendo em vista a exclusão da indenização por dano moral, a questão fica prejudicada. Assim, tenho que o decisum objurgado merece reforma parcial para excluir os danos morais. Posto isso, conheço do recurso e lhe DOU PARCIAL PROVIMENTO, excluindo os danos morais da condenação estabelecida, mantendo a sentença inalterada em seus demais termos. Por conseguinte, modificado o julgado e provido em parte o recurso, impõe-se a readequação dos honorários sucumbenciais, de modo a refletir a sucumbência recíproca. Assim, faz-se necessária a distribuição do ônus sucumbencial, sendo devida por ambas as partes, na proporção de 70% para o Apelante, e 30% para a Apelada. Visando evitar a oposição de embargos declaratórios e, desde logo, para viabilizar eventual acesso às vias extraordinária e especial, considera-se prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional, observado o pacífico entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, tratando-se de prequestionamento, é desnecessária a citação numérica dos dispositivos legais, bastando que a questão posta tenha sido decidida (EDROMS 18.205/SP, Eminente Ministro Felix Fischer, DJ 08/05/2006, p. 240). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025
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