Processo nº 0000120-85.2013.8.11.0105
ID: 325958825
Tribunal: TJMT
Órgão: VARA ÚNICA DE COLNIZA
Classe: AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Nº Processo: 0000120-85.2013.8.11.0105
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
POLIANA POLTRONIERI
OAB/SP XXXXXX
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PROCESSO N. 0000120-85.2013.8.11.0105 AUTOR: MUNICÍPIO DE COLNIZA REQUERIDOS: ESPÓLIO DE NELCI CAPITANI – Representado por Nicole Francesca Capitani SENTENÇA 1 – RELATÓRIO Trata-se de Ação Civil Públ…
PROCESSO N. 0000120-85.2013.8.11.0105 AUTOR: MUNICÍPIO DE COLNIZA REQUERIDOS: ESPÓLIO DE NELCI CAPITANI – Representado por Nicole Francesca Capitani SENTENÇA 1 – RELATÓRIO Trata-se de Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa com Pedido de Tutela de Urgência ajuizada pelo Município de Colniza/MT em face de Nelci Capitani, em razão de supostas irregularidades administrativas durante a sua gestão como prefeita do município. Segundo a parte autora, no ano de 2002, a requerida firmou com o Ministério da Cultura, o Convênio 386/2002-CGPRO/SPMAP, para a construção do Centro Cultural na sede do município de Colniza/MT, mediante a liberação pela concedente de verba no valor de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais), sendo acordado a contrapartida pela convenente do valor de R$ 6.319,82. Expôs que em fiscalização, constataram-se algumas irregularidades no Convênio, dentre elas: que a pessoa autorizada a representar a Prefeitura Municipal de Colniza para assinatura do Convênio n. 386/2002 junto ao Ministério da Cultura, não tinha qualquer vínculo com a Administração Municipal, além de ser pessoa vinculada à empresa vencedora do Convite n. 19/02, objeto do convênio; falta no aporte da contrapartida; falhas na instrução do Convite 19/02, inclusive em razão de suposto favorecimento particular em detrimento de interesse público; ausência de planilha de medições e falta de efetivo acompanhamento da obra pactuada e modificações na execução da obra sem aprovação prévia do órgão competente; ofensa ao princípio da impessoalidade. Apontou, ainda, que apresentada à prestação de contas final do convênio, sobreveio Parecer Técnico que concluiu pela não aprovação das contas do referido Convênio em razão das irregularidades, sendo o Município notificado para a devolução do valor repassado para os cofres da União, o que não teria sido cumprido, acarretando a inserção do Município no SIAFI – cadastro de inadimplentes, e a impossibilidade de se firmar novos contratos e convênios. Postulou em sede liminar, pela exclusão do nome do município dos cadastros de inadimplentes e a decretação de indisponibilidade dos bens da requerida. No mérito, requereu a procedência da ação, para condenar a requerida nas sanções previstas nos incisos II e III, do artigo 12, da Lei 8.429/92, e no ressarcimento integral do dano ao erário no valor corrigido de R$ 366.688,08 (trezentos e sessenta e seis mil, seiscentos e oitenta e oito reais e oito centavos), além da perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente. O Ministério Público Estadual manifestou pelo deferimento da liminar de indisponibilidade de bens da requerida e opinou pelo chamamento da União à lide, em razão do pedido liminar de exclusão do Município de Colniza do SIAF (id. 57259236) Decisão de emenda da inicial (id. 57259236-fl. 19). Manifestação da União quanto à ausência de interesse em ingressar no feito (id. 57259236 – fl. 36-45). Em nova manifestação (id. 57259236 – fl. 56), o Ministério Público opina pelo declínio de competência da Justiça Estadual para a Justiça Federal. Diante da notícia de falecimento da requerida, Nelci Capitani, os autos foram suspensos pelo prazo de 02 meses para a regularização do polo passivo. Regularizado o polo passivo na pessoa de Nicole Francesca Capitani, aportou a Contestação (id. 156398369) na qual sustentou a competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito. Arguiu a ilegitimidade ativa do município de Colniza para a propositura da ação, além da exigência de intervenção do Ministério Público. Defendeu à retroatividade e aplicação da Lei 14.230/2021, que alterou a Lei 8.429/92, ao suprimir a modalidade culposa no âmbito da incidência das sanções previstas na referida norma, além de dispor acerca de uma nova sistemática da prescrição dos atos dolosos de improbidade. Asseverou a falta de interesse de agir em razão da descaracterização das condutas dolosas elencadas na Lei n. 8.429/92. Registrou, ainda, no que toca a prescritibilidade das ações reparatórias fundadas em ato culposo. Nesse contexto, a requerida postulou pelo reconhecimento da incompetência do Juízo da Vara Única da comarca de Colniza, com a remessa do feito ao Juízo Federal. Subsidiariamente, seja a ação extinta, sem julgamento de mérito, ou desmembrada quanto à União Federal, ou ainda, a extinção da ação por ilegitimidade ativa do município e o reconhecimento de nulidade processual insanável, por ausência de intervenção obrigatória do Ministério Público no processo para apuração de irregularidades. Postulou, por sua vez, pela improcedência da ação em razão da ausência de conduta culposa. Impugnação à Contestação (id. 156535575). Intimadas as partes para especificarem as provas que pretendem produzir (id. 183326083), ambos postularam pelo julgamento do feito (id. 184310904 e 184742808). Os autos vieram conclusos. É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO De início, registra-se que as partes, embora devidamente intimadas para manifestarem a pretensão de produção de provas, postularam pelo julgamento do feito. Não fosse assim, certo é que a matéria controvertida é unicamente de direito, não havendo necessidade de produção de outras provas, conforme disposto no art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil. 2.1. PRELIMINARES 2.1.1. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL Trata-se de Ação Civil por Improbidade Administrativa, na qual o Município de Colniza imputa a ex-prefeita irregularidades em relação ao Convênio nº 386/2002 firmado com o Ministério da Cultura para a construção de centro cultural. De acordo com a requerida, a competência para processar e julgar a presente ação de improbidade é da Justiça Federal, em razão do interesse da União. Referida preliminar não merece prosperar. Isso porque, debate-se no presente feito a existência de ato de improbidade administrativa causada pela ex-prefeita municipal, sendo a competência para julgamento desta matéria da Justiça Estadual. Como não se desconhece, a competência da Justiça Federal na esfera cível se verifica quando a União tiver legítimo interesse para atuar como autora, ré, assistente ou opoente, conforme disposto no art. 109, I, da Constituição Federal. Cuida-se, pois, da regra de competência ratione personae. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO. VERBAS DO PNAE. PRESTAÇÃO DE CONTAS. AUSÊNCIA DE INTERESSE DA UNIÃO. SÚMULA 150/STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. I - Na origem, trata-se de ação civil pública por ato de improbidade administrativa c/c ressarcimento de dano ao erário público proposta pelo Município de Monte Alegre/SE em desfavor do ex-prefeito, João Vieira de Aragão. II - A matéria objeto do presente conflito de competência já ascendeu a esta Corte em outras oportunidades, dando ensejo à sedimentação do seguinte entendimento: AgRg no CC 133.619/PA, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 9/5/2018, DJe 16/5/2018 e AgInt no REsp 1589661 / SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/2/2017, DJe 24/3/2017. III - A fixação da competência em favor da Justiça Federal ocorre apenas nas causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes (CF, art. 109, I). Cuida-se, pois, de regra de competência ratione personae. IV - A teor do enunciado da Súmula 150 do Superior Tribunal de Justiça, "Compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas pública". No caso, o Juízo Federal suscitado declinou sua competência em virtude da ausência de manifestação de interesse do FNDE em integrar a lide. Nesse sentido, já decidiu a C. Primeira Seção desta Corte, em processo de minha relatoria: AgInt no CC 138.008/PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/3/2017, DJe 27/3/2017. V - Há de se reconhecer, portanto, a incompetência do Juízo Federal para o processamento e julgamento da presente demanda, declarando-se competente o Juízo Estadual suscitante. VI - Agravo interno improvido. (AgInt no CC n. 167.313/SE, relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Seção, julgado em 11/3/2020, DJe de 16/3/2020.) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VERBAS REPASSADAS AO MUNICÍPIO POR MEIO DE CONVÊNIO COM O FNDE. AUSÊNCIA DE INTERESSE DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1. Nos termos do art. 109, I, da CF, a competência da Justiça Federal é ratione personae, exigindo-se a presença da União, de entidade autárquica ou de empresa pública federal na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes. 2. Em regra, é competente a Justiça Estadual para processar e julgar agente público acusado de desvio de verba recebida em razão de convênio firmado com a ente federal. 3. Considerando que na subjacente ação civil pública por ato de improbidade administrativa não se descortina reflexo direto em interesse da União, consoante se infere dos pedidos formulados na respectiva petição inicial, deve-se manter a competência do Juízo de Direito da Vara de Aurora do Pará/PA. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no CC 133.619/PA, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 9/5/2018, DJe 16/5/2018) Ademais, a Súmula nº 209 do C. STJ, bem define a questão: “Compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal”. Neste ponto, o entendimento do e. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso: REMESSA NECESSÁRIA – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – CONVÊNIO CELEBRADO COM O GOVERNO FEDERAL – CONSTRUÇÃO DE CRECHE – VERBA FEDERAL INCORPORADA AO PATRIMÔNIO DE MUNICÍPIO – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL – SÚMULA 209 DO STJ – ALEGADA OMISSÃO OU RETARDO NA PRESTAÇÃO DE CONTAS – INEXISTÊNCIA – APROVAÇÃO DAS CONTAS EM SEDE DE JULGAMENTO DE TOMADA DE CONTAS ESPECIAL PELO TCU – ATO DE IMPROBIDADE NÃO CONFIGURADO – IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS – SENTENÇA RATIFICADA. A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem assentado o entendimento de que a ação contra prefeito acusado de malversação de verbas federais transferidas aos municípios deve tramitar perante a Justiça Estadual, no caso de incorporação do repasse ao patrimônio da municipalidade, nos termos da Súmula nº. 209 do Superior Tribunal de Justiça [“Compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal”]. Nos termos da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, “para a configuração do ato de improbidade previsto no art. 11, inc. VI, da Lei n. 8.429/92, não basta o mero atraso na prestação de contas, sendo necessário demonstrar a má-fé ou o dolo genérico na prática de ato tipificado no aludido preceito normativo” [AgInt no AREsp 953.949/BA, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/05/2018, DJe 21/05/2018]. Assim, comprovado nos autos a regularidade das contas do Convênio firmado com órgão federal, por intermédio do julgamento definitivo de tomada de contas especial pelo Tribunal de Contas da União, acertada a sentença que julga improcedentes os pedidos voltados à condenação de ex-alcaide com substrato no art. 11, VI, da LIA. (N.U 0001714-21.2005.8.11.0007, , ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES , SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, Julgado em 18/12/2018, Publicado no DJE 22/01/2019) Logo, rejeita-se a preliminar de incompetência da Justiça Estadual. 2.1.2. ILEGITIMIDADE ATIVA DO MUNICÍPIO DE COLNIZA/MT A requerida defende a legitimação ativa exclusiva do Ministério Público para o ajuizamento da ação de improbidade administrativa, nos termos do art. 17 da Lei n. 8.429/92. Razão não lhe assiste. Como se sabe, a legitimidade da parte está ligada à titularidade do direito material em litígio. Cabe observar, para que se verifique se a parte está legitimada a figurar no polo ativo da ação, se esta possui relação com o direito que se postula. Sobre o tema, confira-se a doutrina de Misael Montenegro Filho: A legitimidade da parte que se apresenta em juízo refere-se, em princípio, a ser titular do direito material em litígio, alçado à relação processual por meio da propositura da ação. O art. 6o do CPC (correspondendo ao art. 17 do projeto do novo Código de Processo Civil) textualiza que "ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei". Esse dispositivo determina que o direito de ação deve ser exercitado por e contra as pessoas que se encontram atadas ao direito material, ao conflito de interesses, evitando que pessoas estranhas ao direito pudessem pleitear o seu reconhecimento em nome e em favor dos seus titulares. (MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. V. 1. 10. ed. Atlas, 2014. VitalBook file. p. 118/119) Em particular, acerca da legitimidade para o ajuizamento da Ação Civil de Improbidade Administrativa, não se olvida quanto ao disposto no respectivo art. 17, com redação dada pela Lei n. 14.230/2021: “A ação para aplicação das sanções de que trata esta Lei será proposta pelo Ministério Público e seguirá o procedimento comum previsto na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015”. Porém, cumpre registrar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADI’s nº 7.042 e 7.043/DF, reconheceu a legitimidade ativa concorrente entre o Ministério Público e o ente público lesado. E, no caso, o município pretende, além da condenação da ex-prefeita nas sanções da Lei 8.429/92, o ressarcimento dos danos causados cofres públicos municipais, em decorrência de irregularidades do Convênio nº 386/2002, o que faz despontar sua legitimidade. Nesse sentido: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ORDINÁRIA DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO – PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA, INÉPCIA DA INICIAL E PERDA DO OBJETO – REJEIÇÃO – PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO POR DESERÇÃO – AFASTAMENTO – EX-PREFEITO – IRREGULARIDADES NA UTILIZAÇÃO DE VERBAS PÚBLICAS E AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CONVÊNIO FIRMADO COM O ESTADO DE MATO GROSSO – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO ALEGADO PREJUÍZO – ÔNUS DA PROVA QUE COMPETE AO AUTOR – SENTENÇA REFORMADA PARA JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO – RECURSO PROVIDO. 1. O Município tem legitimidade ativa para pleitear o ressarcimento por danos decorrente de irregularidades na execução de convênio celebrado por ex-prefeito. 2. In casu, verificando-se que o pedido de ressarcimento de danos ao erário está em consonância com a causa de pedir, não há que se falar em inépcia da inicial. 3. Não se confundem a pretensão de punição do agente público em decorrência de suposto ato ímprobo com a de ressarcimento ao erário do dano decorrente daquele ato, de forma que eventual improcedência da ação que visa a condenação por ato de improbidade administrativa não vincula o juízo da ação reparatória, o que afasta a arguição de perda do objeto da presente ação. 4. Diante regularidade do pagamento do preparo do recurso, não deve ser aplicada a pena de deserção. 5. Em se tratando de ação que busca exclusivamente o ressarcimento ao erário, a sua procedência se condiciona à efetiva comprovação da ocorrência de lesão ao patrimônio público, não se admitindo o dano presumido. 6. Somente quando comprovada a existência de dano ao erário e o consequente nexo causal em relação a quem se atribui eventual responsabilidade é que se deverá ser determinado o ressarcimento, situação que não verificou no caso dos autos. (TJMT - N.U 0004656-72.2009.8.11.0011, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 28/08/2024, Publicado no DJE 30/08/2024) No mesmo sentido: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO ILEGITIMIDADE ATIVA DO MUNICÍPIO - REJEIÇÃO - EX-PREFEITO - DESCUMPRIMENTO DE CONVÊNIO - PREJUÍZO AO ERÁRIO - COMPROVAÇÃO - AUSÊNCIA. 1- O Município tem legitimidade ativa para pleitear o ressarcimento por danos decorrente do não cumprimento de convênio celebrado por ex-prefeito; 2- Tratando-se de ação de ressarcimento é indispensável que a parte requerente comprove a ocorrência de dano, que pode ser presumido. Se não há prova de dano, não há o que se reparar por meio da ação ressarcitória. (TJ-MG - AC: 00514343520138130713 Viçosa, Relator: Des.(a) Renato Dresch, Data de Julgamento: 23/03/2017, 4ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 28/03/2017). Sendo assim, rejeita-se a preliminar de ilegitimidade ativa. 3. DO MÉRITO Quanto ao mérito, a Ação Civil de Improbidade Administrativa tem por esteio irregularidades praticadas pela ex-prefeita do município de Colniza, na execução do Convênio nº 386/2002, firmado com o Ministério da Cultura, para a construção do Centro Cultural na sede do município. Pois bem. Na hipótese, cumpre inicialmente registrar que a Lei n. 14.230/2021, promoveu alterações na Lei 8.429/92, em grande medida mais benéficas ao requerido da ação civil pública por improbidade administrativa, sobretudo no tocante à extinção da modalidade culposa e do dolo genérico na prática dos atos ímprobos. E, no caso, não há dúvida quanto a sua aplicação aos processos em curso, como o aqui examinado, como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 843.989 (Tema 1.199), com a fixação das seguintes teses: 1) é necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se – nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA – a presença do elemento subjetivo – dolo; 2) a norma benéfica da Lei 14.230/2021 – revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é irretroativa, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da CF, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada, nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) a nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior de lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior, devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) o novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é irretroativo, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - INDISPONBILIDADE DE BENS - BEM DE FAMÍLIA - ALTERAÇÃO LEGISLATIVA - ART. 16, § 14, DA LEI N. 8.429/92 - DIREITO MATERIAL - DECISAO REFORMADA. - Ao integrar o "direito administrativo sancionador", permite-se a aplicação dos princípios e das garantias ínsitos ao direito penal às demandas em que se discuta a responsabilização de atos de improbidade administrativa. - Aos processos em curso, salvo melhor juízo, aplica-se a retroatividade da novel legislação nas hipóteses mais benéficas ao réu quanto ao direito material e, com relação às normas de natureza processual, tem-se a imediata aplicação das regras atuais da LIA, em observância à teoria do isolamento dos atos processuais, consoante disposto no art. 14 do CPC. - A garantia conferida ao bem de família ostenta natureza de direito material, pelo que deve ser retirada a indisponibilidade que sobre ele recaiu, em razão da vedação expressa no § 14 do art. 16 da Lei n. 4.239/92, incluído pela Lei n. 14.230/21. (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0672.12.029740-9/002, Relator(a): Des.(a) Maurício Soares , 3ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 19/08/2022, publicação da súmula em 23/08/2022) g.n. Dito isso, verifica-se que o conjunto probatório documental não revela a prática de ato de improbidade administrativa, porquanto ausente à demonstração de que a requerida, na qualidade de ex-prefeita, tenha agido com o objetivo específico de descumprir a execução do Convênio nº 386/2002, seja com a intenção de causar dano ao erário. Vale dizer, da análise detida das provas, não se verifica ter o autor comprovado o dolo específico da requerida quanto às apontadas irregularidades na execução do Convênio, sobretudo quando ao que tudo indica, não se nega a construção do Centro Cultural. Ora, a inicial se limita a apontar eventuais irregularidades, que poderiam indicar negligência do agente público, o que, de acordo, com a sistemática introduzida pela Lei n. 14.230/21, é insuficiente para ensejar o dolo específico, ou seja, a vontade livre e consciente de se alcançar um resultado ilícito, conforme o art. 1º, § 2º, da Lei n. 8.429/92, in verbis: “Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) ... § 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) § 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) § 3º O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa. Sobre o tema: Direito Administrativo e Processual Civil. Apelação Cível. Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa. Insuficiência Probatória. Necessidade de Comprovação de Dolo Específico. Recurso Desprovido. I. Caso em exame 1. Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa promovida pelo Ministério Público, alegando a emissão de notas fiscais fraudulentas, sem prestação de serviços, visando lesão ao erário municipal. A sentença de primeiro grau julgou improcedentes os pedidos pela ausência de prova suficiente de dolo específico, conforme exigências da Lei nº 14.230/2021. II. Questão em discussão 2. A questão consiste em avaliar se as provas apresentadas são suficientes para comprovar o dolo específico necessário à configuração de improbidade administrativa, à luz das alterações promovidas pela Lei nº 14.230/2021. III. Razões de decidir 3. A Lei nº 8.429/92, com redação atualizada pela Lei nº 14.230/2021, exige dolo específico para configurar ato de improbidade administrativa, afastando a responsabilização por dolo genérico ou mera culpa. 4. Os depoimentos e provas constantes nos autos, como os testemunhos sobre a emissão de notas fiscais, não demonstram de forma inequívoca a intenção desonesta dos apelados para configurar ato ímprobo. 5. Em consonância com o princípio da presunção de inocência e o uso da máxima "in dubio pro reo", a falta de provas robustas impede a condenação por ato de improbidade administrativa. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso de apelação desprovido. Tese de julgamento: "Para a configuração de ato de improbidade administrativa, é imprescindível a comprovação de dolo específico; provas insuficientes ou genéricas não configuram tal intenção desonesta." Dispositivos relevantes citados: Lei n.º 8.429/92, arts. 9º, 10 e 11 (com redação pela Lei n.º 14.230/2021). Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1913638/MA; TJ-MT, Apelação Cível nº 0006109-40.2020.8.11.0004, Apelação Cível nº 0000009-34.2014.8.11.0019. (N.U 0000010-19.2014.8.11.0019, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 04/12/2024, Publicado no DJE 07/01/2025) APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS - LEI Nº 8.429/1992 COM ALTERAÇÕES DADAS PELA LEI Nº 14.230/2021 - DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR - RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA - TEMA 1.199 DO STF- PRESTAÇÃO DE CONTAS - IRREGULARIDADE - DOLO ESPECÍFICO DO AGENTE - NÃO COMPROVADO - ATO IMPROBO NÃO CONFIGUARADO -SENTENÇA MANTIDA. O ato de improbidade pressupõe em aproveitar-se da função pública para obter ou distribuir, em proveito próprio ou para outros, vantagem ilegal ou imoral, de qualquer gênero e, de alguma maneira, infringindo aos princípios que norteiam as atividades na Administração Pública. O Supremo Tribunal Federal, apreciando o Tema 1.199, definiu que "é necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO". O ato de improbidade administrativa decorrente da omissão na prestação de contas por aquele que esteja obrigado a fazê-lo somente se caracteriza se presente o dolo específico do agente em ocultar irregularidades ou obter vantagem ilícita. In casu, ausente a prova do elemento subjetivo, necessário à caracterização do ato de improbidade administrativa imputado à requerida, é de se denegar a pretensão de sua condenação nas sanções da Lei 8.429/1992, com alterações dadas pela Lei nº 14.230/2021. Recurso conhecido e não provido. (TJMG - Apelação Cível 1.0382.14.011626-2/001, Relator(a): Des.(a) Fábio Torres de Sousa , 5ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 13/04/2023, publicação da súmula em 13/04/2023) Por sua vez, em se tratando de ação que busca o ressarcimento ao erário, a sua procedência se condiciona à efetiva comprovação da ocorrência de lesão ao patrimônio público, não se admitindo o dano presumido. Vale dizer, somente quando comprovada a existência de dano ao erário e o consequente nexo causal em relação a quem se atribui eventual responsabilidade é que se deverá ser determinado o ressarcimento, situação que não verificou no caso dos autos. Sobre o tema: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO – MÁFIA DOS SANGUESSUGAS – PRELIMINAR DE COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – REJEITADA – MÉRITO – CONVÊNIO FIRMADO COM SUBSÍDIO FEDERAL E MUNICIPAL – AQUISIÇÃO DE AMBULÂNCIAS E INSTRUMENTOS MÉDICOS E ODONTOLÓGICOS – VERBA DO MUNICÍPIO – AUSÊNCIA DE PROVAS – NEXO CAUSAL ENTRE AS ALEGAÇÕES E A OCORRÊNCIA DE ATO ÍMPROBO – AUSÊNCIA – SENTENÇA BASEADA NA DECISÃO DO ACÓRDÃO DO TCU – INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS – ATO SENTENCIAL REFORMADO – IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS – RECURSO PROVIDO. Não deve subsistir a sentença que condena o Réu somente com base na decisão do Tribunal de Contas da União, uma vez que se trata de órgão de controle externo e independente, devendo, o processo judicial formar conjunto probatório que confirme, inequivocamente, as alegações contidas na inicial da Ação Civil Pública. Na hipótese de inexistirem provas que comprovem o nexo de causalidade entre os fatos alegados e a conduta da parte Requerida, não há falar em condenação por ressarcimento de dano ao erário, em razão da ausência de ato de improbidade administrativa. (TJMT - N.U 0000871-59.2014.8.11.0098, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARCIO VIDAL, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 18/05/2020, Publicado no DJE 03/06/2020) Por todo o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos deduzidos na presente Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa proposta pelo Município de Colniza em face de Nelci Capitani, substituída por Nicole Francesca Capitani Menicatti, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Sem custas e honorários advocatícios (art. 23-B, § 2º, da Lei n. 8.429/92). Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Sem reexame necessário, nos termos do artigo 17, § 19, inciso IV, da Lei 8.429/92. No caso de interposição de recurso, INTIME-SE a parte adversa para, querendo, apresentar contrarrazões e, em seguida, REMETAM-SE os autos ao Tribunal de Justiça. Após o trânsito em julgado, CERTIFIQUE-SE e REMETAM-SE os autos ao arquivo definitivo, com as baixas devidas. Colniza-MT, datado e assinado digitalmente. GUILHERME LEITE RORIZ Juiz de Direito Substituto
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