Processo nº 0023969-41.2012.8.11.0002
ID: 323649680
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL
Nº Processo: 0023969-41.2012.8.11.0002
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JEAN WALTER WAHLBRINK
OAB/MT XXXXXX
Desbloquear
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0023969-41.2012.8.11.0002 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Inden…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0023969-41.2012.8.11.0002 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [W R CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA - CNPJ: 09.416.112/0001-00 (EMBARGADO), CARLOS AUGUSTO MOREIRA DA SILVA JUNIOR - CPF: 701.631.381-68 (ADVOGADO), JORGE LUIZ HADDAD - CPF: 140.442.261-72 (ADVOGADO), ELIEZER COLETO DE ARAUJO JUNIOR - CPF: 513.669.321-53 (ADVOGADO), ROGERIO LUIS GONCALVES AUREA - CPF: 466.306.941-04 (EMBARGANTE), JEAN WALTER WAHLBRINK - CPF: 785.605.781-53 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, REJEITOU OS EMBARGOS. E M E N T A EMBARGANTE(S): ROGERIO LUIS GONCALVES AUREA. EMBARGADO(S): W R CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO. CLÁUSULA PENAL. REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. ALEGAÇÃO DE JULGAMENTO EXTRA PETITA. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DA CAUSA DE PEDIR. OBSERVÂNCIA DOS LIMITES DA LIDE. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. INEXISTÊNCIA DOS VÍCIOS DO ART. 1.022 DO CPC. RECURSO REJEITADO. A redução da cláusula penal em razão do cumprimento parcial do contrato encontra respaldo na prova dos autos e no conjunto da causa de pedir, não se configurando julgamento extra petita. A jurisprudência admite interpretação lógico-sistemática da pretensão deduzida em juízo, desde que compatível com os elementos fáticos e jurídicos trazidos pelas partes, afastando eventual alegação de extrapolação do pedido. O acórdão embargado enfrentou adequadamente todas as questões relevantes para o deslinde da controvérsia, não havendo omissão, contradição, obscuridade ou erro material. Embargos de declaração conhecidos e rejeitados. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA Egrégia Câmara Trata-se de Embargos de declaração opostos por ROGÉRIO LUIS GONÇALVES AUREA contra o acórdão de ID nº 292252855, exarado pela Colenda Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, que, por unanimidade de votos, deu parcial provimento ao recurso, para o fim de reduzir o montante indenizatório, antes fixado em R$ 110.783,30, para R$ 68.022,69 (sessenta e oito mil e vinte e dois reais e sessenta e nove centavos), com incidência de juros e correção monetária nos termos definidos na sentença; aplicar a cláusula penal, no percentual de 10%, anteriormente calculada sobre R$ 387.000,00, para a base de cálculo no montante de R$ 110.783,30, resultando em R$ 11.078,33 (onze mil, setenta e oito reais e trinta e três centavos), com incidência de juros e correção monetária nos termos definidos na sentença; e afastar a condenação da apelante ao pagamento da indenização por danos morais. A parte embargante alega que o acórdão incorreu em nulidade, por ter julgado matéria não ventilada pelas partes, especialmente quanto à aplicação da cláusula penal. Argumenta que o tribunal reformou a sentença para aplicar a multa contratual sobre o valor de R$ 110.783,30 (apurado pela perícia), ao invés do valor do contrato (R$ 387.000,00), sem que houvesse pedido nesse sentido por parte da empresa ré. Sustenta, assim, julgamento extra petita, com violação aos artigos 1.013, §1º, e 1.014 do CPC, postulando o acolhimento dos embargos com efeitos modificativos, para restabelecer a aplicação da cláusula penal nos termos do contrato. Em contrarrazões, a embargada sustenta que os embargos não se prestam ao reexame da matéria decidida, inexistindo omissão, obscuridade ou contradição no acórdão. Argumenta que o recurso tem caráter meramente protelatório, requerendo seu julgamento improcedente. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R EMBARGANTE(S): ROGERIO LUIS GONCALVES AUREA. EMBARGADO(S): W R CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA. VOTO Egrégia Câmara Conforme relatado, trata-se de Embargos de declaração opostos por ROGÉRIO LUIS GONÇALVES AUREA contra o acórdão de ID nº 292252855, exarado pela Colenda Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, que, por unanimidade de votos, deu parcial provimento ao recurso, para o fim de reduzir o montante indenizatório, antes fixado em R$ 110.783,30, para R$ 68.022,69 (sessenta e oito mil e vinte e dois reais e sessenta e nove centavos), com incidência de juros e correção monetária nos termos definidos na sentença; aplicar a cláusula penal, no percentual de 10%, anteriormente calculada sobre R$ 387.000,00, para a base de cálculo no montante de R$ 110.783,30, resultando em R$ 11.078,33 (onze mil, setenta e oito reais e trinta e três centavos), com incidência de juros e correção monetária nos termos definidos na sentença; e afastar a condenação da apelante ao pagamento da indenização por danos morais. O recurso de embargos de declaração tem fundamentação vinculada e estrita, possuindo a finalidade de esclarecer obscuridades, eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material observados na sentença, acórdão ou decisão, conforme disposto no artigo 1.022, CPC, vejamos: Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material. Caso não existam, na decisão judicial embargada, tais defeitos de forma, não há que interpor embargos de declaração, pois estes não devem ser utilizados para reexame e novo julgamento do que já foi decidido, dado que, para tanto, há o recurso próprio previsto na legislação. O acórdão Embargado restou assim proferido: “APELANTES: W R CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA. APELADOS: ROGERIO LUIS GONÇALVES AUREA EMENTA. DIREITO CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PRELIMINAR DE VIOLAÇÃO À DIALETICIDADE RECURSAL. REJEITADA. PRELIMINAR DE INOVAÇÃO RECURSAL. REJEITADA. MÉRITO. CONTRATO DE EMPREITADA. CONSTRUÇÃO DE IMÓVEL RESIDENCIAL. ATRASOS NAS ETAPAS DE CONSTRUÇÃO DA OBRA E DESCUMPRIMENTOS CONTRATUAIS DIVERSOS. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. CONDENAÇÃO DA CONSTRUTORA A RESSARCIR VALORES PAGOS POR SERVIÇOS NÃO PRESTADOS. MINORAÇÃO. SENTENÇAULTRA PETITAQUE ULTRAPASSOU O MONTANTE POSTULADO NA EXORDIAL. CLÁUSULA PENAL. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. CONDENAÇÃO EM RESTITUIÇÃO DE VALORES QUE NÃO SE CONFUNDE COM LUCROS CESSANTES OU DANOS EMERGENTES. PERCENTUAL DE 10% SOBRE O PREÇO GLOBAL DA MÃO DE OBRA. NECESSIDADE DE REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. CONSTRUÇÃO CUMPRIDA EM PARTE. ART. 413 DO CÓDIGO CIVIL. INCIDÊNCIA SOBRE O MONTANTE REMANESCENTE CONSTATADO PELA PERÍCIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESOLUÇÃO DO CONTRATO NOTIFICADA NO ÚLTIMO DIA PARA A CONCLUSÃO DA OBRA. DESCUMPRIMENTOS CONTRATUAIS QUE NÃO RESULTARAM EM DANOS MORAIS. PROVIMENTO PARCIAL. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta por empresa de construção civil contra sentença que julgou parcialmente procedente ação de indenização por danos materiais e morais, com condenação à restituição de valores pagos por serviços não prestados, pagamento de cláusula penal de 10% sobre o valor global da mão de obra (R$ 387.000,00) e indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2. Preliminares: 2.1. Verificar se o recurso de apelação atende ao princípio da dialeticidade. 2.2. Avaliar eventual inovação recursal. 3. Mérito: 3.1. Examinar a extensão do inadimplemento contratual e a correção ou não do montante fixado a título de danos materiais. 3.2. Analisar a base de cálculo da cláusula penal prevista contratualmente e a possibilidade de sua cumulação. 3.3. Verificar a configuração de dano moral indenizável em razão da frustração contratual. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. As preliminares de ausência de dialeticidade e inovação recursal foram rejeitadas. O recurso impugna de forma direta os fundamentos da sentença e não inova, uma vez que não trata de verbas trabalhistas, conforme alegado pelo apelado, o que denota erro material na inserção do tópico das contrarrazões. 5. A perícia judicial confirmou a existência de valores pagos por serviços não executados. Assim,diferentemente do sustentado pela apelante, o montante a ser restituído pela construtora não se trata de danos aos produtos para a obra adquiridos pessoalmente pelo autor. 6. Quanto ao montante, a perícia judicial apurou inadimplemento parcial da obra, com execução de etapas que somaram R$ 76.622,00, frente ao adiantamento de R$ 187.000,00, resultando em crédito favorável ao autor de R$ 110.783,30. Todavia, o montante constatado pela perícia excedeu o valor postulado na petição inicial (R$ 68.022,69), caracterizando sentençaultra petita, com necessária adequação ao pedido formulado, sob pena de violação aos princípios da congruência ou adstrição, nos termos dos arts. 141 e 492 do Código de Processo Civil. 7. A cumulação entre cláusula penal compensatória e devolução de valores pagos, por serviços não executados, é admitida, pois a restituição de valores não se confunde com lucros cessantes, inexistindo ofensa ao Tema nº 970 do Superior Tribunal de Justiça. 8. A cláusula penal, prevista em 10% sobre o preço global da mão de obra (R$ 387.000,00), teve sua base de cálculo redimensionada, com fundamento no art. 413 do Código Civil, pois parte da construção foi executada, devendo incidir sobre o montante remanescente apurado pela perícia (R$ 110.783,30), referente ao inadimplemento parcial. 9. A condenação por danos morais foi afastada, considerando que a resolução contratual foi notificada pelo autor na data final ajustada pelo próprio dono da obra (30/04/2012). Descumprimentos no decorrer do prazo contratual que resultam em danos materiais, mas não implicam em indenização por danos morais. Aplicação do art. 944 do Código Civil e do art. 8º do CPC, com observância aos princípios da proporcionalidade, razoabilidade e da reparação na medida do dano. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recurso parcialmente provido, para: a) reduzir o valor da condenação por danos materiais ao montante postulado na petição inicial (R$ 68.022,69); b) aplicar a cláusula penal de 10% sobre o valor apurado de R$ 110.783,30, resultando em R$ 11.078,33; c) excluir a condenação por danos morais. Teses de julgamento: a) “A sentença não pode ultrapassar o valor certo e determinado da indenização por danos materiais postulado na exordial, sob pena de violação aos princípios da congruência e da adstrição, conforme os arts. 141 e 492 do Código de Processo Civil.” b) “É admissível a cumulação entre cláusula penal e devolução de valores pagos por serviços não executados, por se tratarem de espécies indenizatórias de naturezas distintas.” c) “Em contratos de empreitada, a cláusula penal pode ter sua base de cálculo reduzida quando constatado o cumprimento parcial do contrato, nos termos do art. 413 do Código Civil." d) “O inadimplemento contratual não implica automaticamente a configuração de dano moral, exigindo circunstância concreta de violação à dignidade ou aos direitos da personalidade do contratante prejudicado.” _________ Dispositivos relevantes citados: Código Civil, arts. 186, 187, 413, 421, 422, 475, 476, 884, 927 e 944; Código de Defesa do Consumidor, arts. 6º, IV; 14 e 39, II, V e VI; Código de Processo Civil, arts. 8º, 141 e 492. Jurisprudência relevante citada: Tema Repetitivo n.º 970 do STJ; STJ - AgInt no REsp: 1848125 RJ 2019/0337119-0, Relator.: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 20/03/2023; STJ - AgInt no REsp: 1932682 RJ 2021/0109604-9, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 21/03/2022; STJ - REsp: 816732 RS 2006/0025717-4, Relator.: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 02/02/2010; TJ-SP - Apelação Cível: 10024150320228260281 Itatiba, Relator.: João Baptista Galhardo Júnior, Data de Julgamento: 27/10/2024; TJMT, AC 1012349-97.2017.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Vice-Presidência, Julgado em 29/07/2020; TJMT, AC 1008172-87.2023.8.11.0045, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/01/2025. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA Egrégia Câmara: Trata-se Recurso de Apelação, interposto por W R CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA., contra sentença (ID. 287364894) proferida pelo Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande-MT que, na Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais proposta por ROGERIO LUIS GONÇALVES AUREA, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, nos seguintes termos: [...] Trata-se de ação de indenização por danos materiais e moral ajuizada por Rogério Luis Gonçalves Aurea em desfavor de WR Construtora e Incorporadora Ltda. e Washington Carlos de Melo, todos devidamente qualificados nos autos, pela qual busca ser indenizado por danos materiais e moral decorrente de rescisão do contrato de prestação de serviços de mão de obra para construção de imóvel residencial firmado com a empresa ré, por suposto atraso na conclusão das etapas da obra, pela aquisição de materiais não utilizados, valores pagos por serviços não realizados, além de multa contratual. [...] In casu, a controvérsia central da presente demanda reside na responsabilização pelo inadimplemento contratual relativo à execução de obra residencial, objeto de contrato de prestação de serviços firmado entre o autor e a empresa ré, em especial quanto à apuração de eventuais prejuízos materiais decorrentes de: i) atraso na entrega da obra, ii) aquisição de materiais não utilizados ou em excesso, iii) serviços pagos e não executados, iv) cumprimento parcial das etapas contratadas, bem como v) a legitimidade da cláusula penal e vi) a existência de danos morais. Discute-se, ainda, em sede de reconvenção, a eventual inadimplência do autor e sua responsabilidade pelos atrasos, alterações contratuais e pagamentos de serviços executados e não quitados, com pleito de indenização por perdas e danos. A controvérsia está, pois, na apuração de quem deu causa à rescisão contratual e qual das partes faz jus à restituição de valores ou à indenização por descumprimento do pactuado. Pois bem. Ação principal e a reconvenção serão analisadas em conjunto, ante a semelhanças das alegações e dos pedidos apresentados. De pronto, verifica-se que a relação jurídica entre as partes configura relação de consumo, nos termos dos arts. 2º e 3º, ambos do CDC, pois o autor, na condição de consumidor, é destinatário final do bem adquirido. Assim, é cediço que o pacto em questão está submetido a legislação consumerista, consoante entendimento do c. STJ que pode ser perfeitamente aplicado ao caso, verbis: [...] As partes celebraram Contrato Particular Prestação de Serviços de Mão de obra e aditivos, em 17.06.2011, para construção de imóvel residencial, com área total construída de 568,37m2, além de 227,22m2 de área externa e revestimento de área permeável com grama esmeralda de 17,51m2, conforme cláusula 1ª do aludido pacto, pelo valor total de R$ 387.000,00 (trezentos e oitenta e sete mil reais), sendo R$ 100.000,00 (cem mil reais) pagos na assinatura do contrato, R$ 87.000,00 (oitenta e sete mil reais) através da entrega de um veículo BMW X5 FA51 2002 e R$ 100.000,00 (cem mil reais) na conclusão da 5ª etapa da obra (acabamento/revestimento/piscina 40%) e R$ 100.000,00 (cem mil reais) na conclusão da 6ª etapa da obra (pintura 10%) e entrega das chaves, nos termos da cláusula 3ª, sendo a conclusão da obra prevista para o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias úteis, contados da assinatura do contrato alhures (id. 80222206 – pág. 31/). Visto isso, pelo que se denota dos autos, não há qualquer cláusula de tolerância prevista no contrato firmado entre as partes. Com efeito, a Cláusula Segunda do aludido pacto, assim prevê: “CLÁUSULA SEGUNDA – DO PRAZO PARA EXECUÇÃO: A execução da obra descrita na cláusula primeira deste instrumento será realizada pela CONSTRUTORA no prazo improrrogável de 180 9cento e oitenta) dias úteis, contado da assinatura do presente contrato, incluindo-se eventual ocorrência de motivos considerados de caso fortuito ou força maior previstos no artigo 393 do Código Civil, como falta de material, a ocorrência comprovadas de chuvas prolongadas, greves parciais ou gerais de transporte público coletivo etc.”. (id. 80222206 – pág. 39). Nesta esteira, eventual prorrogação razoável da entrega da obra afigura-se lícita, uma vez que estabelecida de forma proporcional. Digo isso, porque é de conhecimento público e notório que a construção civil envolve diversas variáveis, tais como materiais, mão-de-obra, inadimplência, entre outros, sendo razoável, repiso, a prorrogação do prazo de entrega de 180 (cento e oitenta dias), tendo em vista a dificuldade na definição exata do término da obra. [...] Entretanto, na hipótese em voga, conforme se verifica das provas trazidas à baila, além do contrato firmado entre as partes não prever qualquer prorrogação, o prazo dado pela ré incluía eventuais atrasa [sic] por entrega de materiais, razão pela qual tais fatos não podem ser alegados em sua defesa para o atraso verificado. Além disso, é fato incontroverso que, após aproximadamente 01 (um) anos do início dos trabalhos, a ré não entregou o abro[sic],mesmo com a dilação do prazo em diversas oportunidades, configurando atraso totalmente desarrazoado. Não obstante, diante da controvérsia da demanda, foi prova pericial nos documentos trazidos à baila pelas partes, tendo o expert concluído que: “Diante desse cenário, podemos dizer que o atraso na conclusão das etapas iniciou-se de imediato logo no pagamento da 1ª etapa. Ressaltamos que na prática não é usual o pagamento antecipado dos serviços com valores expressivos tal como colocado acima. [...] Logo, restando evidente que, no caso específico dos autos, a rescisão do contrato de compra e venda de imóvel firmado entre as partes não se deu por decisão imotivada da compradora, deve ser reconhecida a inadimplência da primeira ré, bem como a possibilidade de rescisão contratual, na forma do art. 475, do C. Civil, que assim dispõe: “A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos”. Desse modo, a demandada é responsável pelos transtornos, estresse, e preocupação que afligiram o autor pela má prestação de serviços e na forma do artigo 18, §1º, do CDC. Assim, verificada a responsabilidade civil da ré pelo fato, passa-se, nesta oportunidade, à análise da ocorrência de possíveis danos materiais e morais indenizáveis. Avançando na elucidação da celeuma, o art. 884, do Código Civil veda o enriquecimento sem causa, obrigando a parte inadimplente a restituir o que foi recebido indevidamente. No caso, em que pese as alegações das partes, tenho que o perito judicial foi categórico em afirmar que o autor possui um crédito a receber da ré no montante de R$ 110.783,30 (cento e dez mil, trezentos e oitenta e três reais e trinta centavos), em razão de serviços pagos e não executados, bem como de materiais adquiridos e não utilizados, conforme também confessado pela própria ré em sua peça de defesa. Destarte, sendo a ré quem deu causa à rescisão do contrato, conforme devidamente provado, inclusive por prova pericial, a cláusula penal ajustada na avença firmada entre as partes (cláusula nona), deverá ser revertida em favor da autora, nos termos do entendimento firmado pelo c. STJ ao julgar o REsp n. 1.614.721/DF e REsp n. 1.631.485/DF sob o rito dos recursos repetitivos, senão vejamos, verbis: [...] De outra banda, necessário se faz ressaltar que muito embora não haja adstrição do juiz ao laudo pericial (art. 479, CPC), é recomendável que ocorrendo divergência entre a perícia oficial e a irresignação da parte adversa, deva prevalecer aquela, por estar o expert subordinado à lei e devidamente compromissado, garantindo a imparcialidade necessária à prestação jurisdicional. Outro não é o entendimento dos Tribunais pátrios, verbis: [...] Apenas para colocar uma pá de cal na questão, ressalto que a realização de nova perícia afrontaria os princípios da economia e celeridade processual em razão da patente desnecessidade. Nesse sentido, é o entendimento do e. TJMT, confira, verbis: [...] Por último, não é demais lembrar que a perícia foi efetuada por perito judicial, de idoneidade e competência reconhecida pelo Juízo. Sendo assim, no caso em voga, a cláusula 9ª (id. 80222206 – pág. 42), prevê em favor da parte prejudicada uma multa de 10% (dez por cento) sobre o preço global da mão de obra (R$ 38.700,00), em função do desfazimento do negócio, a título de cláusula penal, que deve ser estendida a contratante. Nesse sentido: [...] Assim, a ré deve pagar ao autor 10% (dez por cento) sobre o preço global da mão de obra (R$ 38.700,00), como penalidade pelo descumprimento. Quanto ao dano moral, a hipótese não se trata de mero descumprimento contratual, porque não se está diante da compra de um objeto útil ao lazer ou da realização de um anseio de consumo, mas, representa o rompimento do sonho da casa própria, alcançado, via de regra, com extremo sacrifício, cuja conduta extrapola a boa-fé contratual, portanto, cabível a indenização por danos morais. Digo, embora a jurisprudência do STJ caminhe no sentido de que, em caso de descumprimento contratual, o dano moral não é presumido, entendo que as especificidades do caso concreto evidenciam a configuração do prejuízo, dada a extensão do atraso imputável à primeira ré, que até o momento não comprovou a entrega do empreendimento. Destarte, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade da empresa ré pelo dano sofrido. Reafirmo ainda, que o caso em tela não retrata uma mera frustração do cotidiano, mas, o descumprimento de uma obrigação que proporcionaria a autora a modificação de todo o seu planejamento financeiro e pessoal, sendo inegável a sua angústia e sofrimento. No mais, o dano moral atinge os atributos da personalidade humana, prejudica a paz espiritual, os sentimentos, a convivência social e, no mais, a saúde psíquica do ofendido, tudo claramente evidente no caso vertente. Nesse sentido caminha a jurisprudência do e. TJMT ao julgar casos semelhantes, vejamos: [...] Por conseguinte, há de se concluir pela responsabilidade da ré quanto ao dano sofrido pelo autor em razão do erro cometido. Restando dessa forma caracterizado o dever de indenizar, passo ao arbitramento do quantum indenizatório que deve atender aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, a extensão do dano causado, de modo a atender sua dupla finalidade, qual seja, amenizar a dor da vítima e punir a conduta ilícita do ofensor. [...] Nesta ótica, o princípio do livre convencimento confere ao magistrado a prudente prerrogativa de arbitrar o valor que entender justo, sempre de acordo com as peculiaridades do caso concreto, fazendo uma correspondência entre a ofensa e o valor da condenação, observando os princípios que norteiam o dano moral tais como: a posição social do ofendido, a capacidade econômica do causador e a extensão da dor sofrida, sob pena de propiciar o locupletamento ilícito a vítima, ao mesmo tempo o valor deve ser significativo para que não passe despercebido coibindo a conduta negligente do agente. Não é demais ressaltar, que o valor indenizatório devido no dano moral tem dupla função: compensatória em relação ao dano sofrido e penalizadora pela conduta negligente do agente causador. Logo, considerando o grau de responsabilidade da empresa ré frente ao dano causado e o abalo moral sofrido pelo autor, fixo o valor da indenização em R$ 10.000,00 (dez mil reais), sendo este justo para reparar o dano moral sofrido. DISPOSITIVO Diante do exposto, com fulcro no artigo 487, I do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação de indenização por danos materiais e moral ajuizada por Rogério Luis Gonçalves Aurea em desfavor de WR Construtora e Incorporadora Ltda., para condenar a ré ao pagamento de R$ 110.783,30 (cento e dez mil, trezentos e oitenta e três reais e trinta centavos) ao autor pelos danos materiais, acrescido de juros e correção monetária pela Taxa Selic até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e Selic para juros, abatido desta o valor do IPCA, a partir do desembolso, bem como ao pagamento de R$ 37.800,00 (trinta e sete mil e oitocentos reais), a título de multa contratual (10%), acrescido de juros e correção monetária pela Taxa Selic até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e Selic para juros, abatido desta o valor do IPCA, a partir da citação e do descumprimento contratual, respectivamente, e de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de dano moral, acrescido de juros e correção monetária pela Taxa Selic até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e Selic para juros, abatido desta o valor do IPCA, a partir da citação e do arbitramento, respectivamente Condeno a ré ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, na forma do art. 85, §2º, do CPC. Em relação à reconvenção, com fulcro no artigo 487, I do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos e condeno a reconvinte ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC. [...] [grifo nosso] Em suas razões recursais (ID. 287364898), a apelante sustenta as seguintes teses: 1. Justificativas para o atraso e ausência de responsabilidade civil por danos materiais 2. Impugnação à aplicação da cláusula penal de 10% sobre o preço global da mão de obra 3. Não incidência de danos morais O apelado, por sua vez, apresento contrarrazões (ID. 287364902) nas quais suscita as seguintes preliminares: 1. Violação ao princípio da dialeticidade 2. Inovação recursal No mérito, o apelado rebate as alegações da apelante. Dispensado o Parecer Ministerial em razão da matéria. Recurso tempestivo, conforme aba de expedientes dos autos de origem (sentença-38968036), e preparo efetuado, nos termos da certidão de ID. 287478870. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator APELANTES: W R CONSTRUTORA E INCORPORADORA LTDA. APELADOS: ROGERIO LUIS GONÇALVES AUREA VOTO PRELIMINAR Egrégia Câmara: Reitero que se trata de Recurso de Apelação interposto contra sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande-MT que, na Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais proposta pelo ora apelado, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial e improcedente a reconvenção para condenar a apelante ao pagamento deR$ 110.783,30 por danos materiais; R$ 37.800,00 a título de cláusula penal (10%) e R$ 10.000,00 por danos morais, além das custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da condenação e, quanto à reconvenção, em 10% sobre o valor atualizado da causa. Em síntese, o Juízoa quoasseverou e concluiu que a parte requerida, ora apelante, descumpriu cláusulas essenciais do contrato de prestação de serviços de mão de obra, ao não concluir a obra dentro do prazo acordado, não justificar tecnicamente as interrupções e atrasos, bem como ao não comprovar que as alterações de projeto ou atrasos no fornecimento de materiais, alegadamente atribuídos ao autor, tenham efetivamente comprometido o cronograma de execução. Destacou-se, ainda, que o laudo pericial produzido nos autos evidenciou a existência de serviços pagos e não executados, além de materiais adquiridos e não utilizados, com responsabilidade atribuída à construtora. Quanto aos danos morais, entendeu-se configurado o abalo decorrente do inadimplemento contratual prolongado, por se tratar de frustração de legítima expectativa do consumidor quanto à edificação de imóvel residencial próprio. Por fim, reconheceu a incidência da cláusula penal prevista contratualmente, fixada em 10% sobre o valor total do contrato, e julgou improcedente a reconvenção formulada pela ré, diante da ausência de comprovação de inadimplemento contratual por parte do autor. A seguir, passo ao exame das teses preliminares sustentadas pela parte apelada. 1. Violação ao princípio da dialeticidade O apelado sustenta que o recurso é inadmissível por não atacar especificamente os fundamentos da sentença. Sustenta que o recorrente repete argumentos da contestação, sem rebater os fundamentos centrais da decisão. Assim, requer o não conhecimento do recurso com base nesse vício formal. Pois bem. Não assiste razão ao apelado, pois as razões recursais abordam, detalhadamente, os pontos fático-jurídicos expostos na sentença fustigada, não se tratando de mera reprodução da peça defensiva. Ademais, não há ausência de dialeticidade se as razões expostas pela apelante combatem os fundamentos da sentença, como determina o art. 1.010, II do Código de Processo Civil. A corroborar o entendimento, cita-se: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MANUTENÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Recurso de Apelação Cível interposto por FAVORITO SUPERMERCADO LTDA. contra sentença que, nos autos de Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Dano Moral ajuizada por SABOR E SAÚDE COMÉRCIO DE PRODUTOS NATURAIS E DIETÉTICOS LTDA., declarou a inexistência do débito, reconheceu a ilicitude da inscrição do nome da Apelada nos cadastros de inadimplentes e condenou a Apelante ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$7.000,00. II. Questão em discussão 2. As questões em discussão consistem em: (i) verificar se a Apelada atendeu aos requisitos de admissibilidade recursal, considerando a alegação de violação ao princípio da dialeticidade; e (ii) determinar a regularidade da inscrição da Apelada nos cadastros restritivos de crédito e a proporcionalidade do quantum indenizatório fixado a título de danos morais. III. Razões de decidir 3. O recurso de apelação preenche os requisitos de admissibilidade previstos no art. 1.010, III, do CPC, uma vez que as razões recursais atacam os fundamentos da sentença e demonstram o interesse na reforma do decisum, inexistindo violação ao princípio da dialeticidade. [...] (TJMT, AC 1008172-87.2023.8.11.0045, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 21/01/2025, Publicado no DJE 27/01/2025) [grifo nosso] Desse modo, a preliminar deve ser rejeitada. É como voto. 2. Inovação recursal O apelado sustenta que, no recurso, a apelante inova em seus argumentos relacionados à pretensão recursal de revogação da sentença para declarar a nulidade do acordo de compensação de jornadas e banco de horas. Assim, argumenta que tais alegações do Recorrente devem ser desconsideradas, à vista de que constitui intolerável alegação de novos fundamentos de defesa, em ofensa ao art. 303, do CPC. Pois bem. Sem razão o apelado. Verifica-se que a alegação aparenta ser um erro material ou um trecho padronizado indevidamente inserido nas contrarrazões, pois a relação processual trata de obra de construção civil e inadimplemento contratual, de competência da Justiça Comum e não da Justiça do Trabalho, além de inexistir, na apelação, qualquer discussão sobre jornada de trabalho ou banco de horas, temas típicos de relação trabalhista. Portanto, inaplicável o art. 1.014 do Código de Processo Civil, pois a preliminar carece de especificidade e consistência fática e, assim, deve ser rejeitada. Desse modo, verifico a presença dos requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal. É como voto. VOTO DE MÉRITO Egrégia Câmara: 1. Justificativas para o atraso e ausência de responsabilidade civil por danos materiais A apelante sustenta que, com fulcro no “pacta sunt servanda”, a cláusula contratual primeira estabelece que caberia à apelante apenas a prestação de serviços de mão de obra e execução de alvenaria; além do fornecimento de tijolo, areia, cascalho e cimento. Assim, alega que demais materiais eram de responsabilidade do apelado e que não se pode imputar à apelante responsabilidade por obrigações que não assumiu contratualmente. Quanto ao atraso, argumenta que foi justificado. Aduz que o contrato previa prazo de 180 dias para execução, mas que a obra só foi autorizada em 30/08/2011, com 74 dias de atraso no início. Argumenta, ainda, que o terreno era de aterro, exigindo reforço de fundação, o que implicou em mais atrasos. Sustenta, também, atraso decorrente da entrega de materiais de responsabilidade do apelado. Assevera a existência de notificação ao apelado, em 16/12/2011, para fornecer os materiais em 72 horas. Alega, ainda, que em virtude de dificuldades na fundação e atrasos no fornecimento de materiais por parte do apelado, pediu a prorrogação do prazo contratual por mais 80 dias úteis. Aduz, também, atraso decorrente de alterações constantes do projeto por iniciativa do apelado. Assim, argumenta que os atrasos são de responsabilidade exclusiva do recorrido. Ademais, contesta o valor de R$ 110.783,30 de condenação por danos materiais, pois sustenta que foi baseada exclusivamente em laudo pericial, em que pese o apelado ser o responsável pela aquisição dos materiais. O recorrente argumenta que, quando adquiriu materiais, foi com autorização do apelado e que alterações no projeto feitas pelo recorrido geraram a não utilização de certos materiais. Assevera, ainda, que o contrato era de prestação de mão de obra e não de fornecimento de materiais. O apelado, por sua vez, ressalta que o contrato previa prazo improrrogável de 180 dias úteis, incluindo previsões para imprevistos (ex.: chuvas, materiais), mas que não havia cláusula de tolerância. Destaca que, após 01 (um) ano, a obra não havia sido concluída. Defende a aplicação do art. 14, §1º do Código de Defesa do Consumidor, que prevê responsabilidade objetiva por falha na prestação do serviço. Assevera que o a prova pericial confirma que os atrasos começaram logo após o pagamento da 1ª etapa e que não há que se imputar ao recorrido a responsabilidade pelo descumprimento do contrato. No que tange às alterações do projeto, argumenta que a apelante não comprovou que houve alterações relevantes no projeto e que os documentos nas fls. 35/58 comprovariam inexistência de alterações impactantes. Assim, argumenta que a apelante não demonstrou qualquer vínculo causal entre alterações e o atraso. Destaca, também, que o Laudo Pericial comprovou o dano decorrente de serviços pagos e não executados e de materiais adquiridos, a pedido da construtora apelante, mas não utilizados. Nesse sentido, ressalta, também, o reconhecimento pela apelante, por confissão em sua contestação, de que materiais foram adquiridos por sua iniciativa. Aduz, ainda, que inexiste justificativa plausível para não utilização ou prejuízo dos materiais comprados pelo apelado. Assim, entende que o valor da condenação em danos materiais de R$ 110.783,30 deve ser mantido integralmente. Pois bem. Ressai dos autos que o autor, ora apelado, em 17.06.2011, celebrou contrato de prestação de serviços de empreitada (ID. 287364429, p. 58) com a empresa ré, ora apelante, para construção de imóvel residencial, com área total construída de 568,37 m², além de 227,22 m² de área externa e revestimento de área permeável com grama esmeralda de 17,51 m², conforme cláusula 1ª do aludido pacto, pelo valor total de R$ 387.000,00 (trezentos e oitenta e sete mil reais), sendo R$ 100.000,00 (cem mil reais) pagos na assinatura do contrato, R$ 87.000,00 (oitenta e sete mil reais) através da entrega de um veículo BMW X5 FA51 2002 e R$ 100.000,00 (cem mil reais) na conclusão da 5ª etapa da obra (acabamento/revestimento/piscina 40%); e R$ 100.000,00 (cem mil reais) na conclusão da 6ª etapa da obra (pintura 10%) e entrega das chaves, nos termos da cláusula 3ª. A conclusão da obra, por sua vez, deveria ocorrer no prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias úteis, contados da assinatura do referido contrato, nos termos da cláusula 2ª,in verbis: CLÁUSULA SEGUNDA – DO PRAZO PARA EXECUÇÃO: A execução da obra descrita na cláusula primeira deste instrumento será realizada pela CONSTRUTORA no prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias úteis, contado da assinatura do presente contrato, incluindo-se eventual ocorrência de motivos considerados de caso fortuito ou força maior previstos no artigo 393 do Código Civil, como a falta de material, a ocorrência comprovada de chuvas prolongadas, greves parciais ou gerais de transporte público coletivo etc. [...] (ID. 287364429, p. 71) [grifos nossos e do original] Por outro lado, verifica-se que o Condomínio Alphaville Cuiabá apenas autorizou a execução da obra a partir de 30/08/2011, o que resultou no atraso de 74 (setenta e quatro) dias para o início das obras (287364448, p. 55). O referido atraso foi reconhecido pelo apelado, em sua impugnação à contestação da apelante, conforme cita-se: [...] Conforme já declinado na petição inicial à fl. 18, de fato, houve um atraso na liberação da execução da obra pelo Condomínio Alphaville I Cuiabá, entretanto, esse atraso foi devidamente acrescido no prazo inicialmente estabelecido – prorrogação 40 dias úteis –, razão pela qual não se pode atribuir a esse fato a não conclusão da obra pelos Requeridos. [...] (ID. 287364866, p. 36) [grifo nosso] Assim, contando-se os 180 dias a partir de 30/08/2011, o termo final para a conclusão da obra, em consonância com o art. 132 do Código Civil, findaria em 27/02/2012. Porém, em 09/01/2012, a apelante notificou (ID. 287364448, p. 55) o apelado para solicitar 80 (oitenta) dias de prorrogação ao termo final de conclusão da obra, além de asseverar a necessidade de se descontar, no prazo total, o supramencionado atraso inicial de 74 dias. A prorrogação solicitada pela apelante foi baseada nos seguintes argumentos: a) o atraso de 74 dias para a autorização da obra pelo Condomínio Alphaville Cuiabá; b) atrasos constantes do apelado para a entrega do material solicitado pela construtora, que ocorreriam em torno de 15 dias em média, a partir da solicitação pela apelante; Além da proposta de prorrogação para 80 dias, a apelante, na referida notificação (ID. 287364448, p. 55), exigiu: [...]A partir deste fica o NOTIFICADO ciente que o Material solicitado pelo NOTIFICANTE, deverá ser entregue na obra, no prazo máximo de 72 horas a partir da solicitação expedida pelo NOTIFICANTE. [...] (ID. 287364448, p. 55) [grifo nosso] Ou seja, a apelante pretendeu que o término da obra, previsto para 27/02/2012, fosse prorrogado até o dia 17/05/2012. O apelado, por sua vez, contranotificou a recorrente, em 14/01/2012 (ID. 287364448, p. 58), para que a prorrogação fosse reduzida para 40 dias de dilação do termo final. Desse modo, o apelado postulou que a obra fosse concluída até o dia 10/04/2012. Além disso, destacam-se, da referida contranotificação, os seguintes trechos e argumentos: a) questionou a alegação de atraso costumeiro, pois justificou que os atrasos na entrega de materiais decorriam de superfaturamento de orçamentos, apresentados pela apelante, ou por quantidade exorbitante de material solicitada, também pela recorrente, para a execução de projetos hidráulicos e elétricos da construção. A exemplificar, citou orçamento de lajes treliçadas, no valor de R$ 21.249,00, muito inferior ao orçamento original que o fornecedor havia repassado à própria recorrente (R$ 11.028,54); b) Também asseverou que os materiais solicitados pela apelante, para serem entregues com urgência, foram adquiridos, mas estariam parados na obra em razão da falta de funcionários para executar o serviço; c) em razão dos alegados orçamentos superfaturados e da discrepância da quantidade de materiais necessários, o apelado relatou que teve que contratar uma engenheira para acompanhar a execução da obra e revisar todas as solicitações de materiais e orçamentos; d) que à época da contranotificação (14/01/2012), as solicitações de materiais para a obra estariam sendo feitas diretamente pela engenheira contratada pelo apelado, a qual também estava acompanhando diariamente a obra; e) número insuficiente de funcionários trabalhando na obra, muito aquém do necessário para o andamento regular da construção; f) paralisação, por insuficiência de funcionários, de vários serviços de construção para a obra; e g) grande quantidade de material não pode ser entregue na obra, por falta de espaço para armazenamento no local, em razão de já estar ocupado com grande quantidade de material parado. Na mesma contranotificação, o apelado asseverou que concordava com a exigência da apelante quanto ao prazo de 72 horas para a aquisição do material solicitado, porém, ressaltou que a entrega dependeria da disponibilidade e responsabilidade do fornecedor. Sobre as despesas extras, constata-se dos autos que o apelado solicitou aditivos contratuais para serviços extras referentes à obra, conforme se relaciona: 1) Em 26/01/2012: muro de contenção próximo à piscina; estruturação e moldagem com armadura; vigas e contra vigas e muro de arrimo para a lateral direita do terreno, além de 05 “mãos francesas”, totalizando o valor de R$ 13.095,22 já pagos à apelante (ID. 287364448, p. 48). 2) Em 23/02/2012: montagem e estruturação de vigas e complementação de colunas de apoio com moldagem de caixaria, armadura, escora e travamento (76,00 metros lineares); modelagem de laje armada com aplicação de concreto e ferragens área laje (Caixa d’água 2,50 x 6,00); modelagem de laje armada com aplicação de concreto e ferragens área laje (Rômer 1,20 x 2,50); armação de alvenaria complementar com tijolos 12x19x19 (especial), ), totalizando R$ 9.730,00 de mão de obra também já pagos à apelante (ID. 287364448, p. 49). Em sequência, sem resposta à contranotificação, o apelado encaminhou à apelante ofício (ID. 287364448, p. 65-66), pelos Correios, com Aviso de Recebimento, aceitando a dilação do contrato para um novo prazo final de conclusão da obra, qual seja, até 30/04/2012. A apelante, por sua vez, encaminhou nova notificação (ID. 287364448, p. 69) ao apelado, em 25/04/2012, postulando por novo aditivo contratual que deveria contar com as seguintes obrigações: a) que se fizesse constar no contrato que a responsabilidade da apelante seria apenas pelos serviços a serem executados, ou seja, somente quanto à mão de obra para a execução de projeto de alvenaria; b) que fosse contratado um assessor técnico (arquiteto de interiores) para acompanhar a execução do cronograma de execução; c) que o valor de R$ 64.000,00, referente a serviços extras de mão de obra, fosse restituído à apelante, uma vez que já teria efetuado despesas quanto ao valor; d) que o montante de R$ 52.720,00, referente às etapas já concluídas, fossem pago à apelante; e) que o prazo de execução do projeto fosse dilatado por mais 95 dias úteis a partir da assinatura do ativo e desde que o apelado contratasse o arquiteto de interiores; f) que o apelado deveria solicitar, à apelante, os materiais necessários à execução do projeto, com no mínimo 05 dias de antecedência. Quanto aos aludidos valores, na mesma notificação a apelante esclareceu a cobrança dos R$ 64.000,00 argumentando que o valor de R$ 64.000,00 foi decorrente de despesas extras, assumidas pela recorrente, em razão da necessidade de adequação do projeto, pois durante sua execução, a apelante teria constatado que o solo não era compatível com o projeto estrutural e, assim, teve que adquirir e usar pilares protendidos e que a adequação já teria sido totalmente efetivada pela recorrente. Por fim, em sequência, o recorrido entendeu por notificar a apelante (ID. 287364449, p. 54), mediante e-mail datado de 30/04/2012, data do prazo final que o apelado havia concordado em prorrogar a entrega da obra (40 dias após o termo final do contrato), para asseverar que a obra estava apenas parcialmente executado e que, assim, não pretendia mais prorrogar o contrato e que, portanto, a execução dos serviços deveriam ser paralisados. No mesmo e-mail, foi informado à apelante que, quanto à notificação encaminhada pela recorrente em 25/04/2012, o apelado faria a análise para a liquidação do contrato mediante contranotificação. Em 30/05/2012, a apelante recebeu a referida contranotificação remetida pelo recorrido, na qual, quanto ao montante de R$ 64.000,000 cobrado, o apelado contra-argumentou (ID. 287364449, p. 55): a) o valor divergia significativamente dos comprovantes de despesas apresentados pela apelante; b) que alguns comprovantes faziam referência a outro contratado; c) que alguns dos materiais e serviços, relacionados nas despesas extras e que somariam R$ 24.460,00, não poderiam ter sido usados na obra, pois se referem a serviços de carpintaria relacionados às vigas superiores, como vigas lineares, escoramento para laje e caixas estruturais destinadas à concretagem, armação de ferragem e outros serviços que não derivam da colocação de pilares protendidos e compõem a rotina habitual da obra. Assim, não haveria justificativa para seu enquadramento como despesa extra, muito menos para fundamentar pedido de reembolso ou ressarcimento; d) o recibo no montante de R$ 23.370,00, sem CNPJ, identificação do assinante e demais dados, teria sido “fabricado”; e) a quantidade de material referida nos recibos divergia da que teria sido realmente usada na obra; f) há recibo com data anterior aos recibos de quitação por serviços extras que já teriam sido executados e pagos; g) que o apelado deveria ter sido informado, previamente, quanto às despesas extras. Também destacou que não reconhecia os supostos serviços extras no montante de R$ 52.720,00. Além disso, na mesma contranotificação, o apelado asseverou que inúmeros itens de cada etapa da construção não foram concluídos e que, assim, reconhecia como executado apenas o valor total de R$ 139.001,52. Por fim, postulou, na contranotificação, para que a apelante restituísse ao apelado a quantia total de R$ 89.299,25 (oitenta e nove mil, duzentos e noventa e nove reais e vinte e cinco centavos), assim discriminada: a) R$ 50.599,25 (cinquenta mil, quinhentos e noventa e nove reais e vinte e cinco centavos), referentes ao pagamento de serviços não executados; b) R$ 654,77 pagamento concernente ao primeiro aditivo contratual; c) R$ 1.946,00 pagamento referente ao segundo aditivo contratual; d) R$ 47.998,48 pagamento relativo à obra total. Sem sucesso quanto à supramencionada contranotificação, o apelado ajuizou, em 13/12/2012, a ação indenizatória ora em exame. Desse modo, verifica-se que, entre o termo final para a conclusão da bora, inicialmente previsto para 27/02/2012, já com o acréscimo do atraso de 74 dias para iniciar, e mesmo que fossem concedidos os 80 dias postulados pela apelante, o que prorrogaria o prazo final para até 17/05/2012, a recorrente novamente solicitou, em 25/04/2012, nova prorrogação para mais 95 dias, os quais deveriam ser contados somente a partir da assinatura do aditivo contratual e desde que o apelado contratasse um arquiteto de interiores para acompanhar a obra. Ou seja, desta vez, quanto à última notificação de prorrogação contratual encaminhada pela apelante, além de não ser possível aferir quando seria o exato termo final da nova prorrogação, pois o termo inicial dependeria da assinatura de novo aditivo, verifica-se que foi feita exigência para além do pactuado no contrato original, qual seja, a de que o recorrente deveria contratar um arquiteto de interiores para acompanhar a conclusão da obra. Ora, a conduta da apelante resulta em ofensa aos arts. 6º, IV, e 39, II, V, VI, do Código de Defesa do Consumidor, bem como aos arts. 421, 422, 475 e 476 do Código Civil, com violação aos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e do equilíbrio contratual. Veja-se: Código de Defesa do Consumidor Art. 6º São direitos básicos do consumidor: [...] IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços; [...] Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: [...] II - recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes; [...] V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; VI - executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes; [...] [grifo nosso] Código Civil Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. (texto vigente à época dos fatos) [...] Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. [...] Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro. [grifo nosso] Assim, o art. 6º, IV, do Código de Defesa do Consumidor assegura ao consumidor o direito à proteção contra práticas e cláusulas abusivas, bem como contra métodos comerciais coercitivos ou desleais. Por sua vez, o art. 39, incisos II, V e VI, do mesmo diploma, veda expressamente, entre outras condutas, a exigência de vantagem manifestamente excessiva, a execução de serviços sem autorização expressa e a recusa injustificada no atendimento à demanda do consumidor. No caso em apreço, ao impor ao consumidor novas obrigações não previstas contratualmente, como a contratação de arquiteto de interiores, e ao condicionar a continuidade da obra à assinatura de novo aditivo contratual, cuja prorrogação só passaria a contar a partir de sua formalização, desconsiderando tanto a cláusula dos 180 dias do contrato original quanto o prazo de 80 dias de dilação anteriormente requerido pela própria apelante, esta incorreu em alteração unilateral do contrato, com a consequente transferência indevida dos riscos do negócio ao consumidor, em manifesta afronta aos dispositivos consumeristas supracitados. E sob a perspectiva do Código Civil, os arts. 421 e 422 impõem que a liberdade contratual seja exercida dentro dos limites da função social do contrato e com observância dos princípios da probidade e da boa-fé, tanto na formação quanto na execução da avença. O art. 475, por sua vez, assegura à parte lesada pelo inadimplemento o direito de resolver o contrato ou exigir seu cumprimento, com indenização pelas perdas e danos. Já o art. 476 consagra a exceptio non adimpleti contractus, segundo a qual nenhuma das partes, nos contratos bilaterais, pode exigir da outra o cumprimento de sua obrigação sem que tenha, antes, adimplido a sua própria. Ademais, verifica-se violação ao teor do art. 619 do Código Civil, que veda, sem prévia estipulação em contrário, que o empreiteiro exija acréscimo no preço sem que resulte de instruções escritas do dono da obra, veja-se: Art. 619. Salvo estipulação em contrário, o empreiteiro que se incumbir de executar uma obra, segundo plano aceito por quem a encomendou, não terá direito a exigir acréscimo no preço, ainda que sejam introduzidas modificações no projeto, a não ser que estas resultem de instruções escritas do dono da obra. Parágrafo único. Ainda que não tenha havido autorização escrita, o dono da obra é obrigado a pagar ao empreiteiro os aumentos e acréscimos, segundo o que for arbitrado, se, sempre presente à obra, por continuadas visitas, não podia ignorar o que se estava passando, e nunca protestou. [grifo nosso] Desse modo, o descumprimento contratual é evidente, restando demonstrado que a apelante não só descumpriu com a obrigação de concluir a obra, mas também exigiu passou a condicionar a continuidade da obra à novas obrigações e valores não pactuados, o que caracteriza conduta abusiva e contrária ao próprio “pacta sunt servanda” e aos deveres de boa-fé contratual. A corroborar o entendimento, cita-se: CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO. AÇÃO DE CONHECIMENTO. RESCISÃO CONTRATUAL. CONTRATO DE EMPREITADA. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. CONFIGURADO. CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR. NÃO DEMONSTRADO. CULPA EXCLUSIVA DA CONSTRUTORA. RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS. DESCONTO DA PARTE DA OBRA EXECUTADA. CLÁUSULA PENAL. INCIDÊNCIA. 1. Embora o contrato de empreitada seja de natureza civil, tal aspecto, por si só, não afasta a incidência do Código de Defesa do Consumidor se também constatada típica relação de consumo, como no caso em concreto, em que é evidente a figura do consumidor e do fornecedor, conforme conceituação descrita nos artigos 2º e 3º do CDC, uma vez que os autores são destinatários finais do serviço de construção de seu imóvel confiados à parte ré da área de construção. 1.1. A relação jurídica havida entre as partes qualifica-se como de consumo e, portanto, reclama a aplicação das normas de proteção ao consumidor. 2. A cláusula do contrato que prevê prazo estimativo para o início das obras, contados a partir da data de perfuração das estacas da fundação ou da liberação do alvará de construção é abusiva, como disposto no art. 39, inciso XII, da Lei nº 8.078/90, por colocar o consumidor em situação de onerosidade excessiva, devendo ela ser declarada nula, para que o contrato se coadune com os princípios do direito consumerista. 3. Como o adimplemento da obrigação da construtora ocorre apenas com a efetiva entrega da obra, o que não se deu durante o prazo previsto no contrato, nem mesmo durante o lapso da prorrogação de 60 dias, impõe-se, inequivocamente, a conclusão de que, na hipótese, houve descumprimento contratual por culpa exclusiva da ré/apelante, impondo-se a rescisão do contrato, mediante a devolução integral e imediata das parcelas vertidas pelos autores, com os respectivos descontos da parte da obra já executada, desconsiderados os valores para reparos. 4. A cláusula penal, também denominada de pena convencional, tem por objetivo estimular o devedor a cumprir a obrigação principal (caráter compulsório) e fixar previamente as perdas e danos em caso de descumprimento (caráter compensatório). 4 .1 Como a mencionada cláusula penal foi inserida no contrato pela construtora, não lhe socorre a pretensão de exclusão da penalidade, devendo ser mantida a previsão contratual livremente pactuada, e nos termos consignados na sentença, uma vez não configurado caso fortuito ou força maior. 5. Apelação da ré conhecida e desprovida. Apelação dos autores conhecida e parcialmente provida. (TJ-DF 07384194420218070001 1694385, Relator.: GISLENE PINHEIRO, Data de Julgamento: 26/04/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 08/05/2023) INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – Contrato de empreitada – Construção de imóvel residencial – Rescisão contratual por culpa da empreiteira – Prova pericial – Constatação de atraso no cronograma e paralisação das obras – Pagamentos realizados pela autora que superaram a proporção dos serviços realizados pela empreiteira – Restituição parcial dos valores pagos que se impõe – Descumprimento do prazo contratual de entrega da obra que fez a autora arcar com aluguéis de outro imóvel – Danos materiais caracterizados – Juros de mora corretamente fixados, nos termos do art. 405 do CC – Procedência parcial da ação movida pela dona da obra e improcedência da reconvenção intentada pela empreiteira – Sentença mantida – Art. 252 do RITJSP – Recurso improvido. (TJ-SP - AC: 10045692820168260079 SP 1004569-28 .2016.8.26.0079, Relator.: Lígia Araújo Bisogni, Data de Julgamento: 18/12/2020, 34ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/12/2020) [grifo nosso] Assim, cabe, em sequência, aferir se o montante estipulado na sentença, no valor de R$ 110.783,30 por danos materiais, encontra respaldo nas provas constantes dos autos. No caso em análise, observa-se que o valor foi apurado com base em laudo pericial judicial, que identificou a existência de serviços pagos e não executados. Verifica-se que a prova pericial teve por objetivo examinar os seguintes pontos controvertidos fixados pela decisão saneadora do Juízoa quo: [...] “a) se houve atraso na conclusão das etapas da obra e, se positivo, os motivos de sua ocorrência; b) se os materiais adquiridos e não utilizados decorreram de alterações no projeto original; c) qual a proporção dos serviços executados pelo requerido em cada uma da 1ª a 5ª etapa da obra e, seus respectivos valores em relação aquele contratado; d) quem deu causa ao descumprimento do contrato; e, e) se há crédito em favor do autor ou do requerido e seu respectivo valor.” [...] (ID. 287364894) Do Laudo Pericial Judicial, por sua vez, destacam-se as seguintes constatações da perícia: [...] PONTOS CONTROVERTIDOS INDICADOS PELA JUÍZA CONFORME DESPACHO DE FLS. 535 A – Se houve atraso na conclusão das etapas da obra, e se positivo, os motivos de usa ocorrência. Resposta: [...] podemos dizer que o atraso na conclusão das etapas iniciou-se de imediato logo no pagamento da 1ª etapa. Ressaltamos que na prática não é usual o pagamento antecipado de serviços com valores expressivos tal como colocado acima. [...] E - Se há crédito em favor do Autor ou do Requerido e seu respectivo valor. [...] Conforme exposto ao quadro temos 2 (duas) situações: I – No caso do Contrato de Prestação de Serviços (Rogerio Aurea × WR Construtora) temos um adiantamento contratual à Contratada WR Construtora e Incorporadora Ltda de R$ 187.000,00. Os valores de serviços atestados/executados na 1ª, 2ª, 3ª, 4ª e a 5ª etapas acima, perfaz um montante de R$ 76.622,00, temos assim um crédito a favor do Autor de R$ 187.000,00 – R$ 76.622,00 que totaliza em R$ 110.378,00 (cento dez mil trezentos setenta oito reais). II – No caso dos Aditivos temos um crédito em favor do Autor de R$ 405,30 (quatrocentos e cinco reais e trinta centavos) Portanto R$ 110.378,00 + 405,30 = R$ 110.783,30 (cento dez mil setecentos oitenta três reais e trinta centavos) de crédito a favor do Autor. [...] Quesitos da Contratada – WR Construtora e Incorporadora Ltda. Requerida 1 - Houve alteração do projeto original na obra? Resposta: Não. Conforme os 6 (seis) projetos gráficos abaixo relacionados, apenas os descritos aos itens 1, 2 e 4 estão legalmente aprovados pela Prefeitura Municipal de Cuiabá – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, portanto contratuais. Não há mais nos autos registros técnicos ou projetos devidamente assinados por profissionais habilitados que demonstram alterações nos projetos aprovados. [...] 2 - Na execução do projeto, na fase inicial de fundação, o solo era compatível com o projeto? Resposta: Não há nos autos o projeto de fundações. [...] (ID. 287364871, p. 77) Assim, confirmado o dano, de responsabilidade da apelante, surge o correspondente dever de indenizar, em consonância com o art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, cumulado com os arts. 186, 187 e 927 do Código Civil, e sob pena de enriquecimento sem causa da apelante, nos termos do art. 884 do Código Civil, uma vez que recebeu à mais por serviços não totalmente executados. Assevera-se que não se trata de pedido indenizatório por lucros cessantes ou danos emergentes, mas de indenização para devolução de valores pagos sem a devida contraprestação dos serviços, a fim de se afastar o enriquecimento sem causa, uma vez que a cumulação de lucros cessantes com a cobrança de cláusula penal é vedada, conforme precedente da tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo n.º 970. Destaca-se, ainda, que diferentemente do sustentado pela apelante, o montante apurado pela perícia judicial, a ser restituído pela construtora, não se trata de danos aos produtos da obra adquiridos pelo autor, mas de ressarcimento por valores já pagos à recorrente, mas que não foram acompanhados dos respectivos serviços. Porém, em que pese a constatação da perícia, acolhida pela sentença, de que o montante indenizável seria em R$ 110.783,30, verifica-se que a decisão do Juízoa quoéultra petita, uma vez que ultrapassou o montante indenizatório, por danos materiais, postulado pelo apelado em sua exordial, qual seja, o valor de R$ 68.022,69 (sessenta e oito mil e vinte e dois reais e sessenta e nove centavos). A corroborar o entendimento, cita-se trechos da inicial ajuizada pelo ora apelado: [...] No presente caso, quanto aos danos materiais, o nexo de causalidade entre o ato ilícito praticado e os danos experimentados pelo Requerente estão claramente demonstrados pela não restituição dos materiais adquiridos e não utilizados na obra, bem como pela não execução da totalidade dos serviços pagos. Assim, a Requerida deve arcar com os danos materiais causados ao Requerente no valor total de R$ 68.022,69 (sessenta e oito mil e vinte e dois reais e sessenta e nove centavos). [...] DOS PEDIDOS [...] c) No final, seja esta ação julgada procedente para condenar a Requerida a reparar os danos materiais causados ao Requerente, no valor de R$ 68.022,69 (sessenta e oito mil e vinte e dois reais e sessenta e nove centavos) a título de danos materiais, tudo acrescido de juros e correção monetária até a data do efetivo pagamento; [...] (ID. 287364448, p. 22 e 27) [grifo nosso] Assim, embora o valor de R$ 110.783,30 tenha sido aferido com base em prova pericial idônea e técnica, sua condenação integral na sentença representa violação ao princípio da congruência ou adstrição, nos termos dos arts. 141 e 492 do Código de Processo Civil,in verbis: Art. 141. O juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte. [...] Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado. [...] Nesse sentido, cita-se ementa de julgado do Superior Tribunal de Justiça e deste egrégio Tribunal,in verbis: RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. CONDENAÇÃO A VALOR SUPERIOR AO REQUERIDO. JULGAMENTO ULTRA PETITA. DECOTE DO EXCESSO. NECESSIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. VALOR DA CONDENAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. COMPENSAÇÃO DE HONORÁRIOS. SUMULA N. 306/STJ. 1. Não há por que falar em violação do art . 535 do CPC quando o acórdão recorrido, integrado pelo julgado proferido nos embargos de declaração, dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas nas razões recursais. 2. A sentença ultra petita é defeituosa porque o juiz, ao decidir o pedido, vai além dele e concede ao peticionário mais do que o requerido. Para a correção do vício deve ser decotado o excesso verificado. 3. Nas demandas em que o provimento jurisdicional tem natureza condenatória, o parâmetro que há de servir de base para o cálculo da verba honorária é o valor da condenação, e não o valor da causa. 4. Havendo sucumbência recíproca, o valor dos honorários advocatícios deverão ser compensados, a teor do disposto na Súmula n. 306 do STJ. 5. Recurso especial conhecido em parte e provido. (STJ - REsp: 816732 RS 2006/0025717-4, Relator.: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 02/02/2010, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/02/2010) [grifo nosso] APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO COMINATÓRIA PARA SUBSTITUIÇÃO DE PRODUTO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – AQUISIÇÃO DE VEÍCULO NOVO – CHAMAMENTO AO PROCESSO DO FABRICANTE –INVIABILIDADE – INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 88 E 101, INCISO II, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – PARTICIPAÇÃO DA REVENDEDORA NA CADEIA DE CONSUMO – VÍCIO ORIUNDO DE FATO RELACIONADO À FABRICAÇÃO – RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO FABRICANTE E DO REVENDEDOR – INCIDÊNCIA DO ART. 18 DO CDC – LEGITIMIDADE DE PARTE EVIDENCIADA – PRAZO DE TRINTA DIAS PARA CONSERTO NÃO RESPEITADO – PRESENÇA DOS REQUISITOS DO DEVER DE INDENIZAR – DANO MORAL MANTIDO – VALOR QUE ATENDE AOS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE – PEDIDO ALTERNATIVO PARA REEMBOLSO DO VALOR PAGO PELO BEM – DECISÃO ULTRA PETITA – IMPOSIÇÃO AFASTADA – SENTENÇA REFORMADA NO PONTO – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. De acordo com os artigos 88 e 101, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor, não é processualmente admissível a denunciação da lide ou o chamamento ao processo do fabricante do veículo em demanda ajuizada pelo consumidor com fundamento na responsabilidade por vício do produto (TJ-DF 20170610005214). Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade. Vício de qualidade, aparente ou oculto, é o defeito ou a falha que torna a coisa imprópria ou inadequada para o uso que se destina ou que lhe diminua o valor. Segundo o Superior Tribunal de Justiça “em diversos precedentes da Corte, diante de questões relativas a defeitos apresentados em veículos automotores novos, firmaram a incidência do art. 18 do Código de Defesa do Consumidor para reconhecer a responsabilidade solidária entre o fabricante e o fornecedor” (REsp. nº 547.794/PR). É cediço que a decisão deve ater-se às pretensões deduzidas pelas partes, em atenção ao princípio da adstrição ou da congruência entre o pedido e a sentença (arts. 141 e 492 do CPC), sob pena de ser citra, ultra ou extra petita. Deve ser mantido o valor da indenização fixado dentro dos padrões de razoabilidade e proporcionalidade. (TJMT, AC 1012349-97.2017.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Vice-Presidência, Julgado em 29/07/2020, publicado no DJE 03/08/2020) [grifo nosso] Assim, diante do exposto, quanto à condenação da apelante à indenização por danos materiais, o recurso deve ser parcialmente provido para reformar a sentença a fim de se reduzir o montante indenizatório, antes fixado em R$ 110.783,30, para R$ 68.022,69 (sessenta e oito mil e vinte e dois reais e sessenta e nove centavos), com incidência de juros e correção monetária nos termos definidos na sentença. 2. Impugnação à aplicação da cláusula penal de 10% sobre o preço global da mão de obra A apelante sustenta que a aplicação da cláusula penal de 10% sobre o preço global da mão de obra, resultando no valor de R$ 38.700,00, uma vez que o referido preço global foi pactuado em R$ 387.000,00, é indevida, pois o descumprimento contratual teria decorrido de conduta do apelado. Assevera, novamente, que os atrasos e falhas ocorreram por autorização tardia do início da obra e por múltiplas alterações do projeto. Assim, postula para que a multa seja imposta ao recorrido e não à apelante. O apelado, por sua vez, sustenta que o atraso na obra é de responsabilidade da recorrente e que a multa é devida em conformidade com a previsão contratual. Pois bem. Ressai dos autos que o contrato firmado entre as partes contém cláusula penal expressa, prevista na cláusula 9ª,in verbis: CLÁUSULA NONA: DAS PENALIDADES: A parte que infringir qualquer das disposições contratuais ora estipuladas ficará sujeita a uma multa correspondente a 10% (dez por cento) do preço global da mão-de-obra R$ 38.700,00 (trinta e oito mil e setecentos reais). (ID. 287364448, p. 42) [grifos nossos e do original] Ademais, conforme já asseverado, com fulcro nos arts. 6º, IV, e 39, II, V, VI, do Código de Defesa do Consumidor, bem como nos arts. 421, 422, 475 e 476 do Código Civil, a culpa pelo descumprimento do contrato é da apelante, uma vez que impôs novas condições não previstas contratualmente, prorrogou o prazo de forma unilateral e transferiu ao consumidor obrigações indevidas, em manifesta afronta aos princípios da boa-fé, do equilíbrio contratual e da função social do contrato. Destaca-se, também, conforme já asseverado, a possibilidade de cumulação da indenização por danos materiais, decorrentes de valores pagos a maior, por serviços não executados - que tem natureza e finalidade distintas e não se confunde com lucros cessantes ou danos emergentes - com a cobrança de cláusula penal, não infringindo o teor do Tema Repetitivo n.º 970 do Superior Tribunal de Justiça. A corroborar o entendimento, cita-se a tese firmada no referido Tema: A cláusula penal moratória tem a finalidade de indenizar pelo adimplemento tardio da obrigação, e, em regra, estabelecida em valor equivalente ao locativo, afasta-se sua cumulação com lucros cessantes. [grifo nosso] Porém, quanto ao montante da multa, uma vez que a obrigação contratual foi cumprida em parte, verifica-se a falta de razoabilidade e proporcionalidade do percentual da cláusula penal, pois fixada em 10% sobre o valor total do preço global da mão de obra, o que atrai a necessidade de sua redução, com fulcro no art. 413 do Código Civil,in verbis: Art. 413. A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio. [grifo nosso] Assim, em que pese o apelado ter postulado, em sua exordial, pela incidência dos 10% sobre o valor integral da empreitada, qual seja, o de R$387.000,00, o laudo pericial constatou que, deste valor, restava a execução de serviços equivalentes a R$ 110.783,30 (cento dez mil setecentos oitenta três reais e trinta centavos). Portanto, a incidência da cláusula penal em exame, embora o percentual de 10% não aparente ser oneroso, revela-se desproporcional e irrazoável quanto à sua base de cálculo, pois deveria incidir sobre R$ 110.783,30, e não sobre R$ 387.000,00, sob pena de enriquecimento sem causa do autor, ora apelado (art. 884 do Código Civil). A corroborar o entendimento, cita-se: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ABANDONO DE OBRA PELO EMPREITEIRO. RESCISÃO CONTRATUAL. MULTA CONTRATUAL DEVIDA, PORÉM, REDUZIDA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DISTRIBUIÇÃO PROPORCIONAL DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível contra r. sentença que julgou parcialmente procedente a ação de rescisão contratual cumulada com indenização por danos materiais e morais, com condenação do requerido ao pagamento de multa contratual e indenização por danos morais, além de declarar a rescisão do contrato por culpa do requerido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão são: (i) se houve abandono da obra por parte do requerido, justificando a rescisão contratual com base no descumprimento do contrato; (ii) se a multa contratual é devida e se comporta redução; e (iii) se caracterizados danos morais indenizáveis. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. As provas, documental e pericial, amealhadas informam o abandono da obra muito antes da sua finalização ao lado da necessidade de reparos nos serviços realizados, o que justifica a rescisão do contrato por culpa do requerido, com aplicação da multa contratual. 4. A multa contratual merece, todavia, redução, nos termos do art. 413 do Código Civil, pena de configuração de enriquecimento despido de causa do autor – de 50% para 25% da somatória dos valores correspondentes a todas as etapas incompletas da obra. 5. Os danos morais restaram caracterizados, emergindo devida a indenização no título chancelada. 6. A repartição do ônus sucumbencial deve ser proporcional entre as partes. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Apelação parcialmente provida. Tese de julgamento: "A rescisão contratual pela não finalização da obra, por abandono, ao lado de vícios nos serviços prestados, justifica a rescisão contratual com a aplicação da multa contratual, a qual merece, todavia, redução nos termos do art. 413 do CC.." Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 413. (TJ-SP - Apelação Cível: 10024150320228260281 Itatiba, Relator.: João Baptista Galhardo Júnior, Data de Julgamento: 27/10/2024, 28ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 27/10/2024) [grifo nosso] Por conseguinte, neste ponto, o recurso deve ser parcialmente provido para que a sentença seja reformada, a fim de se aplicar a cláusula penal, no percentual de 10% sobre o valor de R$ 110.783,30, resultando em R$ 11.078,33 (onze mil, setenta e oito reais e trinta e três centavos), com incidência de juros e correção monetária nos termos definidos na sentença. 3. Não incidência de danos morais A apelante sustenta que a simples frustração de expectativa não configura dano moral indenizável e que não houve prova de situação excepcional ou sofrimento além do mero aborrecimento contratual. Assim, aduz que o atraso na entrega de obra, por si só, não gera dano moral. O apelado, por sua vez, assevera que houve abalo à sua dignidade de consumidor, dada a frustração do projeto de vida familiar e descumprimento grave do contrato. Ademais, ressalta que o valor arbitrado em R$ 10.000,00 está dentro dos parâmetros da razoabilidade. Pois bem. Conforme já asseverado, o caso em exame envolve um contrato cujo termo final para a conclusão da obra, considerando os 74 dias de atraso para o início decorrente da espera da autorização do Condomínio, findaria em 27/02/2012. E conforme já destacado, o apelado, por sua vez, concordou com a dilação da entrega da obra para o dia 30/04/2012. Porém, em 25/04/2012, a obra ainda não estava concluída e, nesta data, a construtora recorrente postulou por mais 95 dias de prorrogação, todavia, vinculando o termo inicial apenas após a assinatura do aditivo, que fazia também a cobrança de valores expressivos por supostas despesas extras, além da exigência abusiva, fora do teor da avença, para que o apelado contratasse um arquiteto de interiores. O apelado, por sua vez, optou pela resolução do contrato em 30/04/2012, ao verificar que não seria possível o término da obra conforme combinado. Admitindo-se, por hipótese, que o aditivo contratual fosse assinado pelas partes, nesta mesma data (25/04/2012), com o atendimento de todas as condições abusivas que foram impostas pela recorrente, o novo prazo final para a conclusão da obra, somando-se os 95 dias corridos de prorrogação postulada pela construtora, findaria em 29 de julho de 2012, o que totalizaria 153 (cento e cinquenta e três dias) de atraso, equivalentes, aproximadamente, a 5 (cinco) meses e 3 (três) dias de atraso. Mas, atendo-se à realidade dos fatos, constata-se que o apelado notificou a apelante, quanto à resolução do contrato, no dia 30/04/2012, ou seja, no último dia para a conclusão da obra. Desse modo, cuida-se de situação peculiar, distinta dos costumeiros significativos atrasos de obra após o termo final estipulado, pois, neste caso, antes de se extrapolar o próprio prazo dilatado indicado pelo recorrido, este resolveu não esperar pelo decurso de tempo para além da data final, em razão de descumprimentos contratuais e da conduta contratual abusiva por parte da construtora apelante, que passou a exigir obrigações não previstas na avença original. Dessa forma, embora tenha havido descumprimento contratual e conduta contratual abusiva por parte da apelante, que resultou em responsabilidade civil para devolução de valores e pagamento de cláusula penal, não se constata, no caso em exame, repercussão concreta e grave à esfera existencial do recorrido que extrapole os efeitos ordinários de uma relação contratual frustrada, especialmente diante do fato de que, conforme asseverado, o próprio autor optou pela resolução do contrato antes do esgotamento do prazo de conclusão por ele mesmo admitido (30/04/2012). Assim, a extensão dos danos materiais, nos termos do art. 944,caput, do Código Civil, não foi significativa ao ponto de resultar em lesão a direitos da personalidade, em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade (art. 8º do Código de Processo Civil). Assevera-se que a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça entende inexistir dano moral pelo mero descumprimento contratual, exceto quando verificada situação peculiar, apta a justificar o reconhecimento de violação a direitos da personalidade, o que não se identificou no caso concreto. A corroborar o entendimento, cita-se ementas de julgado do colendo Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. MERO INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. 1. Simples descumprimento contratual que, nos termos da jurisprudência deste Superior Tribunal, não tem o condão de, por si só, ocasionar o surgimento de danos morais, sendo imprescindível a ocorrência de situação excepcional, capaz de ensejar sofrimento indenizável. 2. Caso concreto em que o acórdão recorrido havia fixado indenização por danos morais em razão do mero atraso na entrega de bem imóvel, sem indicar qualquer circunstância excepcional que levasse à referida conclusão. 3. Necessidade de reforma do acórdão recorrido, não se mostrando aplicável ao caso a Súmula 7/STJ .AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (STJ - AgInt no REsp: 1848125 RJ 2019/0337119-0, Relator.: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 20/03/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/03/2023) [grifo nosso] AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DA UNIDADE IMOBILIÁRIA. DANO MORAL. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. NÃO OCORRÊNCIA. PRECEDENTES. 1. Nos termos da jurisprudência do STJ, o simples inadimplemento contratual, em regra, não configura dano indenizável, devendo haver consequências fáticas capazes de ensejar o dano moral. Precedentes. 2 . Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no REsp: 1932682 RJ 2021/0109604-9, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 21/03/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/03/2022) [grifo nosso] Assim, no caso em exame, impõe-se o provimento do recurso, neste ponto, para afastar a condenação da apelante ao pagamento de indenização por danos morais. Diante do exposto, conheço do recurso e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO para reformar a sentença a fim de: a) reduzir o montante indenizatório, antes fixado em R$ 110.783,30, para R$ 68.022,69 (sessenta e oito mil e vinte e dois reais e sessenta e nove centavos), com incidência de juros e correção monetária nos termos definidos na sentença; b) aplicar a cláusula penal, no percentual de 10%, anteriormente calculada sobre R$ 387.000,00, para a base de cálculo no montante de R$ 110.783,30, resultando em R$ 11.078,33 (onze mil, setenta e oito reais e trinta e três centavos), com incidência de juros e correção monetária nos termos definidos na sentença; e c) afastar a condenação da apelante ao pagamento da indenização por danos morais. Por fim, em razão da modificação significativa quanto à procedência parcial dos pedidos da exordial,redistribuo o ônus sucumbencialpara que as custas, despesas processuais e honorários advocatícios sejam fixados na proporção de 80% pela parte requerida, ora apelante, e 20% para a parte autora, ora apelada, devendo a verba honorária ser calculada em 10% sobre o valor da condenação, nos termos dos arts. 85, §2 e 3º, I e 86 do Código de Processo Civil. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator A parte embargante sustenta, em síntese, que o acórdão incorreu em vício de omissão, porquanto teria reformado a sentença originária com base em fundamento jurídico não suscitado pelas partes. Alega, especificamente, que a redução da base de cálculo da cláusula penal de 10% sobre o valor total da mão de obra (R$ 387.000,00) para 10% sobre o montante do inadimplemento apurado pericialmente (R$ 110.783,30) foi efetuada com base no art. 413 do Código Civil, sem que a parte adversa tivesse requerido tal redimensionamento, o que, segundo afirma, configura julgamento extra petita e afronta aos arts. 141 e 492 do Código de Processo Civil. No caso em exame, não se vislumbra a existência de qualquer dos vícios mencionados. A decisão embargada enfrentou, de forma fundamentada e completa, todas as teses jurídicas e questões de fato pertinentes à controvérsia, com base no conjunto probatório dos autos, especialmente no conteúdo da perícia judicial que apurou o inadimplemento parcial da obrigação contratual. A tese de que houve julgamento extra petita não procede. A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso reconhece que o pedido pode ser compreendido não apenas pela literalidade da peça recursal, mas também por interpretação lógico-sistemática da causa de pedir, o que afasta a alegação de extrapolação dos limites do pedido. Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE DANOS DECORRENTES DE INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. CONTRATO ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. PREGÃO . ALEGAÇÃO DE SENTENÇA EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. PEDIDO IMPLÍCITO DEDUZIDO DA CAUSA DE PEDIR. ADMISSIBILIDADE. PEDIDO DE REDUÇÃO DO VALOR DA MULTA APLICADA. ACOLHIMENTO. DESPROPORCIONALIDADE E IRRAZOABILIDADE VERIFICADAS. RECÁLCULO DA SANÇÃO COM BASE NO PERCENTUAL DE DESCRUMPRIMENTO DO CONTRATO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. O pedido pode estar expresso na inicial ou ser extraído de seus termos por interpretação lógico sistemática. Assim, não há como rotular de extra petita a sentença que aplica a cláusula moratória pelo inadimplemento do contrato, porquanto houve pedido expresso de ressarcimento dos danos materiais. Se os fatos narrados na peça preambular e a causa de pedir ajustam-se à natureza do provimento conferido à parte autora pela sentença, não cabe falar em julgamento extra petita, tampouco em contrariedade ao art. 460 do CPC. Restou comprovado que a empresa contratada descumpriu as normas pactuadas nos contratos com relação ao atraso na prestação da garantia, sendo devida a aplicação da penalidade. Contudo, não obstante a sanção pecuniária possua o objetivo de desestimular o descumprimento das obrigações contratadas, ela não pode onerar excessivamente o contratado a ponto de representar a inviabilidade da execução contratual e o locupletamento indevido do contratante. Isto é, as disposições atinentes ao atraso da empresa com relação aos chamados não atendidos não podem se sobrepor de maneira absoluta aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. A aplicação das multas nos valores arbitrados pelo Juízo de origem revela onerosidade excessiva e viola os postulados da proporcionalidade, razoabilidade e adequação, razão pela qual admite-se a revisão. Recurso parcialmente provido. (N.U 0018530-15.2013.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, Vice-Presidência, Julgado em 08/07/2024, Publicado no DJE 08/07/2024)” O mesmo entendimento é reiteradamente adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, inclusive em hipóteses análogas: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 535, I E II, DO CPC. REDUÇÃO DO VALOR DA PENSÃO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Não se constata violação ao art. 535, I e II, do Código de Processo Civil quando a col. Corte de origem dirime, fundamentadamente, todas as questões que lhe foram submetidas. Havendo manifestação expressa acerca dos temas necessários à integral solução da lide, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte, fica afastada qualquer omissão, contradição ou obscuridade. 2. Nos termos da orientação jurisprudencial desta Corte Superior, "não é extra petita a sentença que, diante do pedido de exoneração total de pensão, defere a redução dos alimentos. Como se sabe, no pedido mais abrangente se inclui o de menor abrangência" ( REsp 249.513/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 6/3/2003, DJ de 7/4/2003, p. 289). 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ - AgRg no REsp: 1352321 PB 2012/0233938-5, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 24/02/2015, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/03/2015)” Tais precedentes deixam claro que, ao reconhecer o cumprimento parcial do contrato e aplicar, de ofício, o redutor da cláusula penal com fundamento no art. 413 do Código Civil, a Turma julgadora atuou dentro dos limites do litígio, adotando providência compatível com o princípio da proporcionalidade, sem que se caracterize violação aos limites do pedido ou omissão relevante. É de se lembrar que a cláusula penal, enquanto instrumento de pré-avaliação de perdas e danos, deve observar os princípios da boa-fé objetiva, razoabilidade e vedação ao enriquecimento sem causa. Assim, nos termos do art. 413 do Código Civil, a penalidade pode ser revista judicialmente, inclusive de ofício, quando a obrigação tiver sido cumprida em parte ou se tornar manifestamente excessiva. A atuação judicial, nesse contexto, foi fundamentada na prova pericial e no exame da cláusula contratual pactuada entre as partes, com aplicação dos dispositivos legais pertinentes, em observância aos artigos 8º, 141 e 492 do CPC e art. 413 do Código Civil, como consta expressamente no acórdão embargado. Por fim, ressalta-se que a pretensão da parte embargante, sob a roupagem de omissão, busca, em verdade, a rediscussão da matéria decidida, o que é vedado em sede de embargos declaratórios, conforme firme orientação do Superior Tribunal de Justiça: Portanto, a decisão é clara, em seus fundamentos, há lógica entre a conclusão e suas premissas a não ensejar contradição, como todas as matérias questionadas na pretensão subjetiva foram examinadas a contento, não existindo, ainda, erro material a ser suprido. O mero inconformismo do Embargante não pode ensejar a oposição de embargos de declaração, os quais não são apropriados para rediscussão da matéria já decidida, ainda que, supostamente, incoerente, segundo o entendimento dele. Evidente, assim, a impropriedade do manejo dos embargos de declaração, que não se configuram como outra instância recursal, pois, mesmo para fins de prequestionamento, o uso deste recurso se limita à demonstração de ocorrência das hipóteses contempladas no art. 1.022, CPC. Por essas razões, CONHEÇO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO opostos, PORÉM, REJEITO-OS. Por fim, fica a parte embargante advertida de que a oposição de novos embargos de declaração manifestamente protelatórios, em que não aponte, de modo concreto e consistente, quaisquer dos vícios previstos no art. 1.022 do CPC, prolongando indevidamente a conclusão da demanda e distorcendo a finalidade do recurso, resultará na aplicação de multa sobre o valor da causa atualizado, conforme preceitua o art. 1.026, § 2º, do CPC. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear