Processo nº 1000857-35.2023.8.11.0036
ID: 314296907
Tribunal: TJMT
Órgão: Quarta Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1000857-35.2023.8.11.0036
Data de Disponibilização:
02/07/2025
Advogados:
NATALIA ZARDINI DOURADO ZEQUINI
OAB/MT XXXXXX
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ISABELA KUCK BEFFA
OAB/MT XXXXXX
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RONALDO BEZERRA DOS SANTOS
OAB/MT XXXXXX
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ELLEN MARCIA GALVAO ITACARAMBY
OAB/MT XXXXXX
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MARCELO DOS SANTOS RUFINO
OAB/MT XXXXXX
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FERNANDO FERREIRA DA SILVA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000857-35.2023.8.11.0036 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Colaboração com Grupo, Organização ou Associação Destin…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000857-35.2023.8.11.0036 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Colaboração com Grupo, Organização ou Associação Destinados à Produção ou Tráfico de Drogas, Descumprimento de determinação de sigilo] Relator: Des(a). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO Turma Julgadora: [DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, DES(A). HELIO NISHIYAMA] Parte(s): [SIRLEI APARECIDA VALERIO - CPF: 474.218.271-53 (APELANTE), LUIZ FERNANDO BARROS REZENDE - CPF: 047.099.831-86 (APELANTE), FERNANDO FERREIRA DA SILVA - CPF: 442.443.201-72 (ADVOGADO), GABRIEL SANTOS DE OLIVEIRA - CPF: 703.889.771-32 (APELANTE), ELLEN MARCIA GALVAO ITACARAMBY - CPF: 001.212.391-95 (ADVOGADO), DOUGLAS RODRIGUES DA SILVA - CPF: 057.923.451-71 (APELANTE), SAMUEL VICTOR RODRIGUES DA SILVA - CPF: 070.100.931-48 (APELANTE), NATALIA ZARDINI DOURADO ZEQUINI - CPF: 053.328.861-44 (ADVOGADO), PAULO ALEXSANDER DOS SANTOS CARDOSO - CPF: 058.684.071-05 (APELANTE), RONALDO BEZERRA DOS SANTOS - CPF: 020.982.599-56 (ADVOGADO), ISABELA KUCK BEFFA - CPF: 028.253.991-32 (ADVOGADO), ELAINE DA MATTA SOUZA - CPF: 938.794.401-82 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), HUGO LEANDRO DOURADO DIAS - CPF: 063.023.991-65 (TERCEIRO INTERESSADO), DANILO SANTOS SILVA - CPF: 056.871.161-09 (TERCEIRO INTERESSADO), LUIZ GUSTAVO MODESTO DE SOUZA - CPF: 051.440.381-07 (TERCEIRO INTERESSADO), FERNANDO FERREIRA DA SILVA - CPF: 442.443.201-72 (ADVOGADO), FERNANDO FERREIRA DA SILVA - CPF: 442.443.201-72 (ADVOGADO), MARCELO DOS SANTOS RUFINO - CPF: 006.266.151-51 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). HELIO NISHIYAMA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AOS RECURSOS INTERPOSTOS POR DOUGLAS RODRIGUES DA SILVA, ELAINE DA MATTA SOUZA, PAULO ALEXSANDER DOS SANTOS CARDOSO, GABRIEL SANTOS DE OLIVEIRA, LUIZ FERNANDO BARROS REZENDE E SIRLEI APARECIDA VALÉRIO, E DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO POR SAMUEL VICTOR RODRIGUES DA SILVA, TODOS NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. TRÁFICO DE DROGAS. PLURALIDADE DE RÉUS. COMPETÊNCIA DA 7ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ (MT). LEGALIDADE DA RESOLUÇÃO N. 11/2017-TP. PRELIMINARES AFASTADAS. PROVA ILÍCITA NÃO CONFIGURADA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO ENTRE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INVIABILIDADE DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO DE UM DOS RÉUS E, DOS DEMAIS, RECURSOS DESPROVIDOS. I. Caso em exame: Apelações criminais interpostas por sete réus condenados pelos crimes previstos nos arts. 33 e 35, da Lei n. 11.343/06 e art. 2º, da Lei n. 12.850/13, com penas privativas de liberdade impostas em regime fechado. II. Questão em discussão: As questões em discussão são (i) a constitucionalidade e validade da Resolução n. 11/2017-TP quanto à competência da 7ª Vara Criminal de Cuiabá (MT); (ii) a existência de nulidades processuais e supostas provas ilícitas; (iii) a presença de elementos probatórios suficientes para a manutenção das condenações pela prática dos delitos previstos no art. 33 e art. 35, ambos da Lei n. 11.343/06, bem como art. 2º, da Lei n. 12.850/13; (iv) analisar a possibilidade de desclassificação do tráfico de drogas para uso pessoal; (v) avaliar a incidência da causa de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06; e (vi) definir a possibilidade de condenações cumulativas pelos crimes de organização criminosa e associação para o tráfico de drogas. III. Razões de decidir: 1. A Resolução n. 11/2017-TP, que confere jurisdição estadual à 7ª Vara Criminal de Cuiabá para processar crimes relacionados à criminalidade organizada, observa a auto-organização dos tribunais (art. 125 da CF/88), sendo compatível com os princípios do juiz natural e do devido processo legal. 2. A alegação de ilicitude das provas interceptadas não prospera, pois foram autorizadas judicialmente com base em indícios robustos, não havendo demonstração de nulidade ou prejuízo à ampla defesa. 3. As condenações encontram respaldo em conjunto probatório coerente, composto por elementos telemáticos, testemunhos de usuários, laudos e relatórios policiais, que revelam atuação estável, funcional e hierarquizada dos réus no tráfico de entorpecentes. 4. Não se verifica nos autos situação que autorize a desclassificação do crime de tráfico para o delito de porte para uso pessoal, diante da quantidade de drogas, da forma de acondicionamento e das provas de destinação à mercancia. 5. A aplicação do tráfico privilegiado está afastada, nos termos do § 4º do art. 33, da Lei n. 11.343/06, diante da dedicação dos réus à atividade criminosa e do vínculo com organização estruturada para o tráfico. 6. A condenação simultânea pelos crimes de organização criminosa (art. 2º, da Lei n. 12.850/13) e associação para o tráfico (art. 35, da Lei n. 11.343/06) é juridicamente admissível, desde que demonstradas estruturas distintas e finalidades autônomas, como no caso concreto, em que os réus integravam facção criminosa nacional (Comando Vermelho) e, ao mesmo tempo, associavam-se de forma estável e consciente com outros agentes locais para a mercancia de drogas em rede regional estruturada. IV. Dispositivo e Tese: Recurso parcialmente provido de um dos réus e, dos demais, recursos desprovidos. Tese de julgamento: “1. A especialização da 7ª Vara Criminal de Cuiabá (MT), com jurisdição estadual, para julgar crimes de organização criminosa é compatível com a Constituição Federal e não viola o princípio do juiz natural. 2. Provas oriundas de extração de dados telemáticos devidamente autorizadas judicialmente são lícitas quando embasadas em elementos objetivos. 3. O conjunto probatório demonstrou a atuação estável e coordenada dos réus no tráfico de drogas e sua integração a organização criminosa, autorizando a manutenção das condenações. 4. É possível a condenação simultânea pelos crimes de organização criminosa e associação para o tráfico, quando restarem configuradas estruturas autônomas e finalidades distintas. 5. O tráfico privilegiado é incabível quando comprovada a dedicação habitual à atividade ilícita e a vinculação do agente a organização criminosa. 6. A desclassificação para uso pessoal é inviável quando as circunstâncias da apreensão evidenciam mercancia. Dispositivos relevantes citados: art. 125, §§ 1º e 2º, da CF/88; arts. 69, 70, 76 e 78 do CPP; arts. 33, caput, § 4º, e 35 da Lei n. 11.343/06; art. 2º, caput e § 3º, da Lei n. 12.850/13. Jurisprudência relevante citada: STF – ADI n. 4414, Rel. Min. Luiz Fux; STJ – AgRg no REsp n. 1611615/MT, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. em 06/10/2020. TJMT – RACrim n. 1000695-23.2021.8.11.0032, Rel. Des. Marcos Regenold Fernandes, j. em 11/09/2024; TJMT – RACrim n. 0046818-71.2018.8.11.0042, Rel. Des. Gilberto Giraldelli, j. em 31/07/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. LÍDIO MODESTO DA SILVA FILHO Egrégia Câmara: Tratam-se de recursos de Apelação Criminal interpostos por DOUGLAS RODRIGUES DA SILVA, SAMUEL VICTOR RODRIGUES DA SILVA, ELAINE DA MATTA SOUZA, PAULO ALEXSANDER DOS SANTOS CARDOSO, GABRIEL SANTOS DE OLIVEIRA, LUIZ FERNANDO BARROS REZENDE e SIRLEI APARECIDA VALÉRIO contra sentença prolatada pelo Juízo da 7ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá (MT) (Id. 268533654 – p. 1.835-1.864). Douglas Rodrigues da Silva foi condenado pela prática dos delitos tipificados no art. 33 e art. 35, ambos da Lei de Drogas, à pena privativa de liberdade de 9 (nove) anos e 1 (um) mês de reclusão e 1.532 (mil quinhentos e trinta e dois) dias-multa. Samuel Victor Rodrigues da Silva foi condenado pela prática dos delitos tipificados no art. 33 e art. 35, ambos da Lei de Drogas, à pena privativa de liberdade de 10 (dez) anos, 7 (sete) meses e 5 (cinco) dias de reclusão e 1.688 (mil seiscentos e oitenta e oito) dias-multa. Elaine da Matta Souza foi condenada pela prática dos delitos tipificados no art. 33 e art. 35, ambos da Lei de Drogas, à pena privativa de liberdade de 09 (nove) anos e 01 (um) mês de reclusão e 1.532 (mil quinhentos e trinta e dois) dias-multa. Paulo Alexsander dos Santos Cardoso foi condenado pela prática dos delitos tipificados no art. 2º, caput, da Lei n. 12.850/13, art. 33 e art. 35, ambos previstos na Lei de Drogas, à pena privativa de liberdade de 14 (catorze) anos, 01 (um) mês e 05 (cinco) dias de reclusão e 1.411 (mil e quatrocentos e onze) dias-multa. Gabriel Santos de Oliveira foi condenado pela prática dos delitos tipificados no art. 2º, caput, da Lei n. 12.850/13, art. 33 e art. 35, ambos previstos na Lei de Drogas, à pena privativa de liberdade de 14 (catorze) anos e 9 (nove) meses de reclusão e 1.547 (mil e quarenta e sete) dias-multa. Luiz Fernando Barros Rezende foi condenado pela prática dos delitos tipificados no art. 2º, § 3º, da Lei n. 12.850/2013, no art. 33 e art. 35, ambos previstos da Lei de Drogas, à pena privativa de liberdade de 12 (doze) anos, 3 (três) meses e 18 (dezoito) dias de reclusão e 1.215 (mil duzentos e quinze) dias-multa. Sirlei Aparecida Valério foi condenada pela prática dos delitos tipificados no art. 33 e art. 35, ambos da Lei de Drogas, à pena privativa de liberdade de 12 (doze) anos, 5 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 1.900 (mil e novecentos) dias-multa. A Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso, representando os acusados DOUGLAS, SIRLEI e ELAINE, sustentou, em suas razões recursais, a preliminar da (a) ilegalidade parcial da Resolução n. 11/2017, do Tribunal Pleno deste Tribunal, requerendo a supressão da expressão com jurisdição em todo o Estado do referido ato normativo e, por consequência, a remessa dos autos à Comarca de Guiratinga (MT), por ser, segundo a tese defensiva, o foro competente para o processamento e julgamento da ação penal (Id. 268533744 – p. 2.352 – 2.380). No mérito, a defesa requereu (b) a absolvição dos réus da prática do crime de associação para o tráfico (art. 35, da Lei n. 11.343/06); (c) a absolvição da ré Elaine da prática do crime de tráfico de drogas (art. 33, da Lei n. 11.343/06), ante à ausência de materialidade definitiva; e, (d) em favor da ré Sirlei, pugna pela desclassificação da conduta prevista no art. 33, da Lei n. 11.343/06 para aquela prevista no art. 28, do mesmo diploma legal, sob o argumento de que a substância apreendida se destinaria a consumo pessoal (Id. 268533744 – p. 2.352 – 2.380). O réu SAMUEL por meio de seu advogado, sustentou, em preliminar (e) a nulidade da sentença, por ter sido fundada em prova ilícita (busca e apreensão baseada em interceptação dirigida a terceiro); (f) a nulidade em razão de suposto cerceamento de defesa, ante à negativa de acesso aos autos das interceptações que embasaram a medida cautelar; e (g) concessão dos benefícios de gratuidade da justiça (Id. 268533713 – p. 2.204-2.235). No mérito, requer (h) absolvição quanto ao crime de associação para o tráfico (art. 35, da Lei 11.343/06), por ausência de estabilidade e permanência; (i) do reconhecimento da atenuante da menoridade relativa (art. 65, inc. I, do CP); (j) a reforma da pena de multa em razão da sua hipossuficiência; e, por fim, (k) a retificação da detração penal feita pelo juízo sentenciante. O réu PAULO ALEXSANDER, em suas razões, requer (l) a absolvição quanto aos crimes de associação para o tráfico e tráfico de drogas (art. 33 e art. 35, ambos da Lei 11.343/06). Subsidiarimente, requer (m) a desclassificação do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 para o delito de porte de drogas para consumo pessoal; (n) o reconhecimento da causa de diminuição do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06); e, por fim, (o) a redução da pena de multa imposta ao réu (Id. 268533755 – p. 2.393 – 2.404). O réu GABRIEL requer (p) a absolvição quanto aos crimes de associação para o tráfico e tráfico de drogas (art. 33 e art. 35, ambos da Lei 11.343/06) e, subsidiariamente, (q) a desclassificação do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 para o delito de porte de drogas para consumo pessoal; e (r) o reconhecimento de bis in idem entre os delitos de organização criminosa (art. 2º, da Lei n. 12.850/13) e de associação para o tráfico (art. 35, da Lei n. 11.343/2006) (Id. 272730891 – p. 2.582 - 2.594). Por fim, o réu LUIZ FERNANDO requer (s) a absolvição quanto ao crime de organização criminosa (art. 2º, § 3º, da Lei 12.850/2013); (t) a absolvição quanto aos crimes de associação para o tráfico e tráfico de drogas (art. 33 e art. 35, ambos da Lei n. 11.343/06); ou, não sendo o caso, subsidiariamente, requer (u) o reconhecimento da absorção do crime de organização criminosa pelo delito de associação para o tráfico (Id. 272719390 – p. 2.571 – 2.581). Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou pelo desprovimento dos recursos de apelação, a fim de manter a condenação em seus exatos termos (Id. 268533758 – p. 2.408 - 2.447; Id. 268533760 – p. 2.449 - 2.488; Id. 2688533761 – p. 2.489 - 2.514; Id. 268533762 – p. 2.515 – 2.536; Id. 268533762 – p. 277861352 – p. 2.598 - 2.621). O parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, de lavra do d. Procurador de Justiça João Augusto Veras Gadelha, é pelo desprovimento dos apelos defensivos (Id. 285448378 – p. 2.626 - 2.779). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. LÍDIO MODESTO DA SILVA FILHO Egrégia Câmara: Presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço dos apelos manejados pelos réus. De início, destaco que em razão da pluralidade de acusados e a diversidade de fundamentos deduzidos nos recursos interpostos,adoto como critério de organização a apreciação dos apelos conforme a origem de sua subscrição. Assim, os recursos serão examinados separadamente por advogado constituído, respeitando-se a individualização das teses defensivas. Entretanto,em razão de a Defensoria Pública patrocinar conjuntamente a defesa de três réus — Sirlei Aparecida Valério, Douglas Rodrigues da Silva e Elaine da Matta Souza —, a análise recursal destes será feita de forma unificada, dada a identidade de teses jurídicas e o entrelaçamento fático das imputações. Passo à análise. DOS RÉUS DOUGLAS, SIRLEI E ELAINE 1.1. DA PRELIMNAR a) Do pleito de ilegalidade parcial da Resolução n. 11/2017, do Tribunal Pleno deste Tribunal, requerendo a supressão da expressão com jurisdição em todo o Estado do referido ato normativo e, por consequência, a remessa dos autos à Comarca de Guiratinga (MT): A defesa alega que a Resolução n. 11/2017, ao atribuir jurisdição em todo o Estado à 7ª Vara Criminal de Cuiabá/MT para processamento de feitos relacionados a organizações criminosas, violou regras legais sobre competência territorial, notadamente os arts.69 a 83 do Código de Processo Penal, e os princípios constitucionais do juiz natural e do devido processo legal. Sustenta que a Resolução em questão extrapola os limites da normatização administrativa interna do Poder Judiciário, criando regra de competência absoluta por ato infralegal, o que configura usurpação de competência do Poder Legislativo e afronta ao princípio da legalidade (CF/88, art. 5º, II e LIII). Não assiste razão à defesa. Verifica-se que, a partir da Recomendação n. 03 do Conselho Nacional de Justiça, o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, diante da necessidade de oferecer uma resposta jurisdicional ágil e eficaz no combate ao crime organizado, promoveu a especialização da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, atualmente assim denominada, para processar e julgar os delitos relacionados a organizações criminosas, com jurisdição em todo o Estado. Nesse contexto, o Provimento n. 004/2008-CM, editado pelo Tribunal de Justiça em observância à referida Recomendação n. 03 do CNJ, formalizou a atribuição de jurisdição estadual à 7ª Vara Criminal de Cuiabá para o processamento e julgamento de feitos relacionados ao crime organizado. Posteriormente, a competência da referida unidade judiciária passou a ser regulamentada pela Resolução n. 11/2017-TP, não se verificando qualquer afronta à Constituição Federal, especialmente no que tange à alegada usurpação da competência privativa da União para legislar sobre Direito Penal e Processual Penal. Isso porque a especialização de varas e a fixação de competência por natureza da infração penal constituem matéria de organização judiciária, de atribuição dos tribunais, não sendo alcançada pela cláusula da reserva legal em sentido estrito. Tal constatação encontra respaldo na Constituição Federal que estabelece em seu artigo 125 a outorga aos Estados da Federação a organização da prestação jurisdicional, senão vejamos: Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição. § 1º. A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça. § 2º. Cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único órgão. § 3º. A lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar estadual, constituída, em primeiro grau, pelos juízes de direito e pelos Conselhos de Justiça e, em segundo grau, pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por Tribunal de Justiça Militar nos Estados em que o efetivo militar seja superior a vinte mil integrantes. § 4º. Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças. § 5º. Compete aos juízes de direito do juízo militar processar e julgar, singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de Justiça, sob a presidência de juiz de direito, processar e julgar os demais crimes militares. § 6º. O Tribunal de Justiça poderá funcionar descentralizadamente, constituindo Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo. § 7º. O Tribunal de Justiça instalará a justiça itinerante, com a realização de audiências e demais funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários. Portanto, não se pode olvidar que é competência do Estado de Mato Grosso dispor acerca das regras de distribuição do foro, por meio da Lei de Organização Judiciária, de modo que lhe é concedida a possibilidade de criar, cindir, reunir comarcas, estabelecendo o âmbito territorial de abrangência, sem, contudo, implicar em usurpação da competência legislativa da União. E nesse cenário, o Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso é legitimado para estabelecer a jurisdição em todo o Estado para a 7ª Vara Criminal de Cuiabá processar e julgar os crimes de Organização Criminosa, uma vez que a competência territorial, contrariamente da competência material, pode ser relativizada, sem violação ao Princípio do Juiz Natural. Essa é a conclusão insculpida no voto proferido pelo Ministro Luiz Fux, por ocasião do julgamento da ADI n. 4414, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, objetivando atacar a Lei n. 6.806/2007 do Estado de Alagoas, que instituiu a 17ª Vara Criminal da Capital, atribuindo-lhe a competência exclusiva para processar e julgar crimes perpetrados por organizações criminosas dentro do território alagoano. Naquela ocasião, o STF manifestou pela possibilidade de atribuição à determinada célula jurisdicional a competência territorial que englobe todo o território da Unidade Federativa, destacando da ementa que: (...) 10. O princípio do juiz natural não resta violado na hipótese em que Lei estadual atribui a Vara especializada competência territorial abrangente de todo o território da unidade federada, com fundamento no art. 125 da Constituição, porquanto o tema gravita em torno da organização judiciária, inexistindo afronta aos princípios da territorialidade e do Juiz natural. (...) Assim, nos termos da decisão do STF, demonstra-se possível e legal a ampliação da competência territorial extrapolando-se o limite territorial da comarca, desde que atenda o interesse público e com critérios impessoais, objetivos e pré-estabelecidos, em total harmonia com a Constituição Federal. No que pertine à ofensa dos arts. 69, 70, 76, I e 78, II “a”, do CPP, consigno que tais dispositivos devem ser aplicados sob a exegese em que exista a concorrência de comarcas/varas de mesma categoria, o que não se observa na hipótese, considerando a especialização da vara em razão da matéria e a abrangência territorial. É necessário estabelecer que a condição da Vara Especializada e com competência territorial de abrangência estadual faz com que ela concorra com todas as unidades do Estado de Mato Grosso, e isso significa dizer que ela é onipresente em todas as comarcas do Estado e não somente na Comarca de Cuiabá, razão pela qual a tramitação dos processos nesta unidade não viola o artigo 69, do CPP, porque a Vara também tem jurisdição em Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). Registro que este Sodalício em diversos julgados, inclusive recentes, rejeitou alegações de inconstitucionalidade da aludida resolução. Vejamos: RECURSOS DE APELAÇÃO CRIMINAL - ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA - TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO - PRELIMINAR DE NÃO APLICAÇÃO DO JUÍZO APARENTE - INCONSTITUCIONALIDADE DA RESOLUÇÃO N.º 11/2017 - RATIFICAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES PELO JUÍZO COMPETENTE - ESPECIALIZAÇÃO DE VARAS PARA O PROCESSAMENTO DE FEITOS RESTRITOS POR MATÉRIA - ESPECIALIZAÇÃO DOS TRIBUNAIS ESTADUAIS - RECOMENDAÇÃO DO CNJ - PRECEDENTES DO STJ (...). “(...) A jurisprudência desta eg. Corte, alinhando-se ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, é a de autorização para que Tribunais locais procedam à especialização de Varas para o processamento de feitos restritos por matéria. Assim, apesar de terem sido cometidos os delitos na Comarca de Rondonópolis, o julgamento perante a Vara Especializada contra o Crime Organizado, os Crimes contra a Ordem Tributária e Econômica e os Crimes contra a Administração Pública se mostra acertado porquanto prevalece o Juízo especializado em razão da matéria (STJ, AgRg no REsp n. 1611615/MT). (...). (N.U 1000695-23.2021.8.11.0032, Rel. Des. MARCOS REGENOLD FERNANDES, Segunda Câmara Criminal, j. em 11/09/2024, Publicado no DJE 12/09/2024) (grifos meus). APELAÇÃO CRIMINAL - ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA - SENTENÇA CONDENATÓRIA - IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA - 1. PRELIMINAR ARGUIDA PELA DEFESA - INCONSTITUCIONALIDADE E ILEGALIDADE PARCIAIS DA RESOLUÇÃO N.º 11/2017/TP DO TJMT, QUE ATRIBUIU COMPETÊNCIA À 7.ª VARA CRIMINAL DA CAPITAL PARA JULGAR GRUPOS CRIMINAIS ORGANIZADOS, COM JURISDIÇÃO EM TODO O ESTADO - TESE DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO SENTENCIANTE E PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DO FEITO À COMARCA ONDE AS INFRAÇÕES SE CONSUMARAM - REJEIÇÃO - ESPECIALIZAÇÃO DE VARAS EM RAZÃO DA MATÉRIA - DEFINIÇÃO PELO TRIBUNAL - COMPETÊNCIA PREVALENTE DA VARA ESPECIALIZADA QUE ABRANGE TODO O TERRITÓRIO ESTADUAL - LEGALIDADE E CONSTITUCIONALIDADE DA NORMA JÁ DECLARADA POR ESTE SODALÍCIO E PELAS CORTES SUPERIORES - PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL NÃO VIOLADO - PRELIMINAR AFASTADA - (...). 4. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO, COM REJEIÇÃO DAS PRELIMINARES, E, NO MÉRITO, DESPROVIDO. 1. Por força do Provimento n. 004/2008/CM e da Resolução n. 11/2017/TP, expedidos por este Tribunal de Justiça dentro da sua prerrogativa de auto-organização, compete ao Juízo da 7.ª Vara Criminal Especializada da Comarca de Cuiabá/MT processar e julgar infrações penais envolvendo organizações criminosas, com jurisdição em todo o território estadual, de modo que inexiste ilegalidade ou inconstitucionalidade na tramitação de persecução penal deflagrada inicialmente no interior do Estado e, depois, remetida para o Juízo Especializado, que prevalece sobre os demais. (...). 4. Apelação conhecida, com rejeição das preliminares, e, no mérito, desprovida. (N.U 0046818-71.2018.8.11.0042, Rel. Des. GILBERTO GIRALDELLI, Terceira Câmara Criminal, j. em 31/07/2024, Publicado no DJE 02/08/2024) (grifos meus). APELAÇÃO CRIMINAL - ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E PICHAÇÃO DE EDIFICAÇÃO URBANA - SENTENÇA CONDENATÓRIA - IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA - PRELIMINARES: 1.1) INCONSTITUCIONALIDADE E ILEGALIDADE DA RESOLUÇÃO N. 11/2017 DO TRIBUNAL PLENO – INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO DA 7ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE CUIABÁ/MT – NECESSIDADE DE REMESSA DOS AUTOS PARA A COMARCA DE ORIGEM – INVIABILIDADE – LEGALIDADE DA TRAMITAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS CONTRA O CRIME ORGANIZADO NA VARA ESPECIALIZADA DESTA CAPITAL (...). RECURSO DESPROVIDO, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. É competente a 7ª Vara Criminal de Cuiabá/MT para processar e julgar a ação penal em que se apurar crime de organização criminosa, cometido em Ponte Branca/MT – município abrangido pela jurisdição de Alto Araguaia/MT –, por força do que dispõe a Resolução n. 11/2017, do Tribunal Pleno. “A especialização de varas consiste em alteração de competência territorial em razão da matéria, e não alteração de competência material, regida pelo art. 22 da Constituição Federal” [STF, HC nº 113.018/RS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2ª Turma, julgado em 29.10.2012]. “[...] não há ilegalidade na tramitação de ação penal deflagrada inicialmente no interior e, depois, remetida para o Juízo da 7ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá-MT, já que este é especializado quanto à matéria, e prevalece sobre os demais juízos, conforme regulamentação administrativa do tribunal” [TJMT, N.U 1018752-88.2021.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RONDON BASSIL DOWER FILHO, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 17/11/2021, publicado no DJE 19/11/2021]. (...). (N.U 1000795-14.2021.8.11.0020, Rel. Des. ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, j. em 05/03/2024, Publicado no DJE 11/03/2024) (grifos meus). A Defensoria tem absoluto conhecimento acerca da possibilidade de as instituições de Justiça organizarem-se administrativamente, tanto que a própria instituição optou por não ter defensores em todas as Comarcas, tendo concentrado as forças de trabalho em cidades maiores e mais estruturadas, sem que isso fosse contestado, ainda que em claro prejuízo ao atendimento da sociedade. Portanto, tem-se que os processos penais que apurem a prática de crimes por organizações criminosas, mesmo que praticados em outras Comarcas do interior do Estado de Mato Grosso, como é o caso dos autos, submetem-se à apreciação judicial do Juízo da 7ª Vara Criminal de Cuiabá (MT), razão pela qual a tese defensiva não comporta acolhimento nesse ponto, de maneira que, não reconhecendo os argumentos de inconstitucionalidade e ilegalidade da Resolução n. 11/2017-TP, REJEITO a preliminar. 1.2. DO MÉRITO (b) Do pleito de absolvição dos réus da prática do crime de associação para o tráfico (art. 35, da Lei n. 11.343/06): Em suas razões, a defesa sustenta a inexistência de provas suficientes para a condenação dos réus SIRLEI, DOUGLAS E ELAINE pela prática do crime de associação para o tráfico (art. 35, da Lei n. 11.343/2006). Argumenta que os elementos constantes nos autos não comprovam a existência de vínculo estável e permanente entre os acusados, tampouco demonstram a presença do animus associativo específico exigido pelo tipo penal. Não assiste razão à defesa. Preceitua o art. 35, da Lei n. 11.343/2006: associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput, e § 1º, e art. 34 desta Lei. O crime de associação para o tráfico de drogas demanda a comprovação da existência de uma vinculação psicológica, de um vínculo associativo entre os agentes especialmente criado para o fim de traficar drogas, o que, ao contrário do alegado pela defesa, ficou comprovado nos autos. O juízo de origem reconheceu, com base em laudos, documentos, provas testemunhais e análise de dados digitais, que os réus SIRLEI, DOUGLAS e ELAINE mantinham vínculo estável e consciente com a facção Comando Vermelho, colaborando de maneira permanente e organizada na prática do tráfico de drogas, o que configura, de forma inequívoca, o animus associativo exigido pelo art. 35, da Lei n. 11.343/2006. DA RÉ SIRLEI APARECIDA Durante as investigações e conforme relatórios extraídos dos aparelhos telefônicos da ré SIRLEI, identificou-se que a acusada participava ativamente de um grupo no aplicativo WhatsApp denominado Associação Comercial Industrial de Graça, cuja função era operacionalizar e organizar a rede de pontos de venda de drogas. Tal grupo tinha como administrador o corréu Luiz Fernando Barros Rezende, apontado como liderança da organização, sendo que os integrantes se denominavam lojistas, expressão esta utilizada para indicar traficantes com ponto fixo de venda. As provas demonstram que SIRLEI mantinha comunicação direta com LUIZ FERNANDO, líder da organização, tratando de temas claramente relacionados ao tráfico de drogas. Em uma dessas conversas, o referido corréu questiona Sirlei sobre o galo (cocaína) e gordura (pasta base de cocaína), demonstrando familiaridade no uso de termos codificados e, sobretudo, a existência de um vínculo funcional entre os interlocutores (Id. 268533367 – p. 541). Além disso, constam nos autos provas que demonstram que a ré SIRLEI mantinha diálogo com o corréu Hugo, então responsável pela distribuição dos entorpecentes, tratando diretamente da aquisição de drogas para revenda a usuários. Conforme destacado no relatório policial, há registros de negociação em que a ré realiza pagamento no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais)pela obtenção/compra de entorpecentes com intuito de revenda. E, na mesma data, no período noturno, o fornecedor informa, por meio de áudio, que está momentaneamente sem mercadoria para distribuição, mas ressalta que SIRLEI tem prioridade no abastecimento por ser companheira de Gabriel, integrante da organização criminosa. Do relatório policial, extrai-se: Áudio de Hugo falando com SIRLEI. Dia 15/11/2022, às 19:07:01: “NÉ NÃO PÔ, PQ TÁ SEM MERCADORIA MESMO, ÔH, CHEGUEI LÁ NO POVO LÉ E O POVO NADA, ENTENDEU? NÃO É MINHA PARTE, NÉ? NÃO, MAS TAMO JUNTÃO PÔ, CÊ CHEGAR VÊ ESSE MANO JÁ LIGA DE IMEDIATO” (Id. 268533367 – p. 536) Áudio de Hugo falando com SIRLEI. Dia 15/11/2022, às 19:07:29 “AH EU SEI QUE CÊ É CUNHADA E SEU POVO TÁ PRESO, NÉ MANO? TÁ LIGADO? CANTANDO AQUI PÔ, JÁ DE IMEDIATO A SENHORA É POPRIEDADE TÁ LIGADO? O MANO LÁ É NOSSO, PÔ” (Id. 268533367 – p. 536). SIRLEI, em conversa com o corréu, ainda afirma estar catando latinha pra comprar uma cerveja, pq eu não posso mexer no dinheiro que tem guardado, né? O dinheiro ao qual a ré se refere é aquele decorrente da comercialização de entorpecentes (Id. 268533367 – p. 536). Na residência da ré ainda foi realizada a apreensão de porções de cocaína, dinheiro em espécie, uma máquina de cartão e dois aparelhos celulares, corroborando os elementos digitais de sua atuação no comércio ilícito de entorpecentes. Foram colhidos testemunhos de usuários de entorpecentes que confirmaram que SIRLEI era conhecida na região como Véia e era identificada como fornecedora, inclusive sendo mencionada em áudios trocados entre outros membros da organização como uma das prioridades para abastecimento de entorpecentes, especialmente após a prisão de seu companheiro. Ao ser ouvido perante a autoridade policial, a testemunha N.R.K, usuário de drogas, ao ser perguntado se já comprou drogas da ré, afirmou que sim (Id. 268533314 – p. 403). Da mesma forma, ao ser ouvido perante a autoridade policial, a testemunha Talles, usuário de drogas, afirmou que comprava entorpecente com várias pessoas nessa cidade, entre eles estão Sirlei Aparecida Valério, vulgo véia, na casa deles, na avenida Rio das Garças (Id. 268533314 – p. 405). Além do relatório policial e dos elementos informativos constantes no Inquérito Policial, durante a instrução criminal, foi realizada a oitiva da testemunha Lígia Pinto da Silveira Avelar, delegada de polícia civil; Nazírio Ribeiro de Matos Junior, Investigador da Polícia Civil; Vinícius Franciscon Prezoto, delegado da polícia civil e Magno Rosa Martins, Investigador da Polícia Civil. Sob o crivo do contraditório, a delegada Lígia afirmou: Quando eu assumi, havia um inquérito em trâmite, que era o inquérito 59/2022, em que tinha sido apreendido o celular da investigada Sirlei. Que a partir da extração de dados desse celular, foi feito um relatório foi feito um relatório pelos investigadores da Delegacia de Guiratinga e, nesse relatório, nós verificamos que existia um grupo de WhatsApp que era denominado Lojistas e Comerciantes, algo assim. Que na verdade esse grupo era voltado para o controle do tráfico na região. Que com a análise desses dados, foi feito um relatório, eu instaurei um novo inquérito, usando esse relatório inicial como prova emprestada, para apurar a conduta dessas pessoas que hoje são rés. Que no decorrer das investigações, nós verificamos, principalmente da análise desse celular da Sirlei, que o líder do grupo era o Luiz Fernando. Que o grupo era voltado para controlar a venda da droga, a chegada da droga em Guiratinga, a divisão dessa droga e a entrega para cada boca de fumo, como se diz, para cada lojista, é o termo que eles utilizavam. Que era voltado, também, para controlar a movimentação da polícia na cidade, era um grupo em que percebemos uma hierarquia, o Luiz Fernando era responsável tanto pela cobrança, como pela liberação da droga (...). Que a Sirlei e o Gabriel estão vinculados ao Luiz Fernando, se não me engano. Que todos eles, apesar de manterem um relacionamento entre si, todos se reportam sempre ao Luiz Fernando (Id. 268533594) (grifos meus). Ao ser perguntada sobre a função de SIRLEI na organização, a testemunha afirmou que ela tinha um ponto de venda de drogas e que ela era vinculada ao Luiz Fernando. E continuou, afirmando que Sirlei substituiu o seu companheiro Gabriel na venda de entorpecentes, porque na época da primeira operação, ele se encontrava segregado pela prática do crime de tráfico de drogas (Id. 268533594). Aliado a isto, tanto a delegada de polícia Lígia Pinto da Silveira Avelar quanto o investigador Nazírio Ribeiro de Matos Júnior foram uníssonos em afirmar que toda a operação policial deflagrada teve origem na extração de dados do aparelho celular da própria ré SIRLEI, sendo a análise desse conteúdo o ponto de partida para a instauração de novo inquérito e a identificação da estrutura hierárquica da organização criminosa atuante na região (Id. 268533594). Portanto, os elementos probatórios colhidos em ambas as fases da persecução penal e ao fato de que o ponto de partida de toda operação foram os dados colhidos do celular da ré SIRLEI evidenciam, com clareza, o grau de envolvimento da acusada com a facção criminosa, revelando sua integração funcional e consciente à associação voltada para o tráfico de entorpecentes, nos exatos termos do art. 35, da Lei n. 11.343/2006. Portanto, inviável cogitar a sua absolvição. DO RÉU DOUGLAS Durante as investigações, identificou-se que o réu DOUGLAS, conhecido pelos vulgos “Dog”, “Doguinha” ou “Douglinhas”, também participava ativamente de grupos no aplicativo WhatsApp diretamente vinculados à estrutura do tráfico de drogas na cidade de Guiratinga (MT). Consta nos autos que DOUGLAS também integrava o grupo denominado Associação Comercial Industrial de Graça, administrado pelo corréu Luiz Fernando Barros Rezende, apontado como líder local da facção, sendo os participantes identificados como lojistas, isto é, responsáveis por pontos fixos de venda de entorpecentes. As provas demonstram que DOUGLAS integrava a rede criminosa de forma funcional e hierarquizada, mantendo comunicação com outros membros do grupo, inclusive tratando da venda de substâncias entorpecentes e atuando também no monitoramento das forças de segurança na cidade, conforme evidenciado pelos relatórios policiais e pelas transcrições extraídas dos dispositivos eletrônicos apreendidos. Durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão na residência do réu DOUGLAS, foram encontrados entorpecentes, objetos com resquícios de drogas e anotações vinculadas à atividade do tráfico, os quais foram devidamente periciados e positivados quanto à presença de substâncias ilícitas No relatório da polícia civil consta que, ao perguntarem sobre quem estaria ativo na comercialização do chá (maconha) no grupo dos lojistas, este liderado por Luiz Fernando, o réu DOUGLAS manifesta positivamente sobre estar comercializando o entorpecente (Id. 268533367 – p. 518). Posteriormente, naquele mesmo grupo, Luiz Fernando cobra a caixinha dos traficantes, obtida com a venda dos entorpecentes, afirmando, ainda, que caso haja atraso no pagamento, a lojinha ficará travada (Id. 268533367 – p. 518). Neste cenário, está comprovado que DOUGLAS estava associado aos demais traficantes para a prática organizada e coordenada da comercialização de entorpecentes na região de Guiratinga (MT) e Tesouro (MT), integrando a estrutura criminosa de modo consciente, com vínculo funcional subordinado às regras da facção, especialmente no tocante ao repasse de parte do lucro obtido com a venda de entorpecentes e ao controle da atividade ilícita. Aliado aos dados retirados do aparelho celular da ré SIRLEI, tem-se os depoimentos das autoridades policiais responsáveis pela realização da operação destinada ao combate ao tráfico. A autoridades policiais foram categóricas em reconhecer a participação ativa do réu DOUGLAS na associação para o tráfico de drogas, esta, como já dito, liderada por Luiz Fernando, sendo o réu devidamente identificado como integrante dos grupos de comunicação utilizados pela facção para coordenar a venda de entorpecentes e monitorar a atuação policial. O investigador da polícia civil Nazírio Ribeiro de Matos Junior, afirmou: Que o Douglas, era do tráfico de drogas. Além do tráfico, todos eles tinham a função de monitorar a atividade dos policiais, a delegacia, as viaturas. Que o Douglas também tinha função de vender drogas e monitorar as atividades policiais (Id. 268533594). No mesmo sentido, são as declarações da delegada Lígia, a qual afirmou em juízo que, no dia da operação, o réu fugiu de sua residência, embora tenha havido a apreensão de entorpecentes no local. Destacou que a vinculação do acusado à organização criminosa decorreu da análise dos aparelhos celulares apreendidos. Vejamos: Que ele fugiu no dia da operação. Que foi apreendido droga na casa dele. Que tem uma testemunha, não me lembro se é o Sebastião ou o Talles, que fala que já comprou droga dele. Que é uma pessoa que percebemos a participação por meio dos telefones, das conversas mesmo, dos grupos que ele participa (Id. 268533594) (grifos meus). Portanto, diante dos elementos probatórios, não há dúvidas da ligação do réu DOUGLAS na estrutura organizada da associação criminosa dedicada ao tráfico de drogas em Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). A combinação das provas extraídas dos aparelhos celulares, os depoimentos das autoridades policiais evidenciam sua participação estável, consciente e funcional, atuando em consonância com as diretrizes estabelecidas pela liderança da facção, liderada por LUIZ FERNANDO. Assim, afasta-se qualquer alegação de ausência de animus associativo, mantendo-se a condenação de DOUGLAS pela prática do crime previsto no art. 35, da Lei n. 11.343/06. DA RÉ ELAINE DA MATTA Da mesma forma que ocorre com os demais corréus, durante as investigações realizadas pelas autoridades policiais, identificou-se que a ré ELAINE, também estava diretamente vinculada à estrutura do tráfico de drogas na cidade de Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). Durante a instrução criminal, em seus depoimentos, os policiais e investigadores relataram que ELAINE, vulgo Tia, além de ser fornecedora de drogas para outro traficante da região, mantinha contato com Luiz Fernando, cedendo, inclusive, a sua residência como ponto de entrega para entorpecentes, bem como para aplicação de salves. Em seu depoimento na fase inquisitorial, Elaine afirmou: Que Luiz Fernando ia frequentemente até a casa da depoente receber dinheiro de venda de drogas, sendo o recebimento feito em frente a casa da depoente, contudo, esta afirma que nunca ficou com dinheiro do tráfico para repassar ao Luiz Fernando. Que, QUE as pessoas que iam pagar o LUIZ FERNANDO eram os "lojistas" GABRIEL, vulgo "DILAM" e o SEBASTIÃO, vulgo "TIAOZINHO"; que a casa da depoente já foi usada pelo comando vermelho para aplicar um "salve" em uma pessoa, contudo a depoente não se lembra o nome da pessoa que sofreu o castigo físico denominado salve, sendo que que naquela ocasião foi utilizado uma tábua para bater nas nádegas e tapas no rosto (...). QUE o pessoal do comando que frequentam a casa da depoente são SEBASTIÃO, o qual utilizou a casa da depoente para porcionar e vender drogas; QUE permitia que o comando usasse sua casa como ponto de apoio para ganhar algum entorpecente para usar, sendo que ganhou de TIÃO algumas vezes, e de usuários que iriam lá comprar permitiam que a depoente usasse com eles (Id. 268533260 – p. 108-109). Não obstante o fato de ELAINE ter permanecido em silêncio em juízo, suas declarações perante a autoridade policial são corroboradas pelas informações extraídas dos aparelhos telefônicos apreendidos. O relatório de análise IP n. 28/2023, da Delegacia de Polícia de Guiratinga, foi elaborado com base em conteúdos extraídos de quatro celulares, tendo sido constatada, na aba “contas de usuário”, a existência de ao menos vinte contas, a maioria delas em nome da própria ELAINE. Os dados extraídos evidenciam que ELAINE possuía diálogos rotineiros com Sebastião Souza, o Tiãozinho, sobre a venda de entorpecentes. Vejamos trechos das conversas interceptadas: ELAINE: Espero q n apareça ninguém aqui hj querendo corre. Meu Filho Tião: Kkkk (...). ELAINE: Ela já pegou aqui viu Meu Filho Tião: Ok ELAINE: N demora n pq se n eles vão em outro lugar meu filho Meu Filho Tião: Tô indo. (Id. 268533714 – p. 2.274 - 2.300). Ao mencionar a expectativa de que não apareça ninguém querendo corre e alertar sobre a possibilidade de os compradores se dirigirem a outro local, a ré demonstra conhecimento operacional sobre a dinâmica do comércio ilegal de drogas, assumindo papel ativo nas transações realizadas. Em outra ocasião, os diálogos extraídos evidenciam que Luiz Fernando, líder da organização, foi o responsável por informar à corré a chave PIX de Sebastião, demonstrando que, além de manter contato direto com Sebastião, a ré ELAINE também possuía acesso a Luiz Fernando. Colaciono o referido diálogo: ELAINE: Vc n deixou seu pix comigo ne ELAINE: Mas o bobo me passou Meu Filho Tião: Pra? ELAINE: Uai vende parada (Id. 268533714 – p. 2.274 - 2.300). Esses elementos comprovam a integração da corré na estrutura da organização criminosa, configurando seu envolvimento funcional e consciente na comercialização de entorpecentes. Essa dinâmica fica ainda mais clara pelo extrato de pagamento no valor de R$ 50,00, efetuado em favor de Sebastião, referente à venda realizada por ELAINE, bem como pelo fato de um dos traficantes afirmarem que LUIZ FERNANDO pediu que o buscasse na residência de ELAINE (Id. 268533586 – p. 1.467). Para melhor compreensão, vejamos a transcrição do áudio do réu GABRIEL, vulgo Dylon: Cara, fala pô, cê véi, fiz o mais rápido aqui, mas não deu certo não véi. Bôbo deixou eu lá em casa, peguei o carro, desci aqui aí ele falou pra mim buscá ele na Eliane (as provas demonstram que ele se refere a ré ELAINE), eu já desci direto na Mônica, falei que nada! Vô pegá o dinheiro na Mônica, vô depositá logo, vai fechar o banco, cheguei aqui já tava marcando 22 horas (Id. 268533582 – p. 1.434) (grifos meus). Corroborando esses elementos, ainda há o depoimento da testemunha Sebastião, usuário de entorpecentes que, perante a Autoridade Policial, afirmou que já pegou drogas do vulgo Tiãozinho na casa de Elaine da Mata e que lá é um ponto de entrega de drogas e não de venda (Id. 26853332 – p. 413). Também, há os depoimentos das autoridades policiais que, em juízo, ao serem questionadas sobre a participação de ELAINE, afirmaram: A Elaine ela serve como fornecedora de droga para outro traficante, o Tiãozinho. Que ele não foi investigado nesse inquérito. Que a casa dela seria um ponto de entrega e, tem algumas informações que lá seria utilizado para aplicar salve (Trecho das Declarações de Lígia Pinto da Silveira Avelar – Id. Id. 268533594). Que a casa da Elaine era um ponto de drogas, mas era um ponto de apoio para a facção (Trecho das Declarações de Nazício Id. 268533594). Portanto, diante do conjunto probatório colacionado e dos depoimentos harmônicos dos agentes públicos responsáveis pelas investigações, não há dúvidas de que a ré ELAINE integrava de forma consciente e funcional a organização criminosa voltada ao tráfico de drogas em Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). Ainda que não tenha auferido diretamente lucros financeiros decorrentes da venda de entorpecentes, ficou comprovado que ELAINE cedia sua residência como ponto de apoio logístico para a entrega e distribuição de drogas, bem como para a aplicação de punições internas, conhecidas como salves, pelos membros da facção criminosa, com o propósito de ser recompensada com porções de entorpecentes destinadas ao consumo próprio. Tal conduta evidencia sua participação estável e colaborativa na estrutura criminosa, confirmando sua inserção na associação para o tráfico, conforme previsto no art. 35, da Lei n. 11.343/2006. Assim, incabível se falar em absolvição da acusada. Sem prejuízo do já exposto em relação a cada um dos corréus ELAINE, DOUGLAS e SIRLEI, cumpre destacar, de maneira mais ampla e detalhada, que as investigações policiais que culminaram na presente ação penal iniciaram no ano de 2022, a partir da extração e análise minuciosa dos dados contidos no aparelho celular pertencente à ré Sirlei Aparecida Valério. Tal diligência revelou um vasto e complexo conjunto de informações que demonstravam a existência de uma organização criminosa dedicada ao tráfico de entorpecentes, com atuação contínua e estruturada na região de Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). Em virtude da profundidade e extensão das provas colhidas, mostrou-se imprescindível a instauração de um novo inquérito policial no ano subsequente, 2023, com o propósito de aprofundar a apuração e garantir a robustez das medidas investigativas. Essa circunstância reforça de maneira irrefutável o vínculo perene, estável e funcional entre os membros integrantes da organização, evidenciando a existência de um núcleo criminoso bem articulado, hierarquizado e coordenado, cujas ações se davam de forma contínua e permanente, em completa consonância com os elementos fáticos e jurídicos que sustentam a imputação do crime de associação para o tráfico previsto no art. 35, da Lei n. 11.343/2006. A propósito, nesse sentido: 1. Inviável a absolvição pelo crime de associação ao narcotráfico se os depoimentos das testemunhas em juízo estão corroborados pelo restante do acervo probatório que inclui os relatórios de investigação confeccionados durante um ano de diligências empreendidas pelos investigadores da Polícia Judiciária Civil, tornando evidente a materialidade e autoria do delito, bem como o dolo associandi dos apelantes e a clara divisão de tarefas da associação que formaram para o fim de praticar a traficância (...); (TJ-MT - APELAÇÃO CRIMINAL: 00032393920188110021, Relator.: GILBERTO GIRALDELLI, Data de Julgamento: 29/05/2024, Terceira Câmara Criminal, Data de Publicação: 29/05/2024). 3. O depoimento de policiais, somados a aspectos documentais e circunstanciais de peso e relevância, incluindo relatórios de extração de conteúdo de aparelhos celulares apreendidos, em sentido altamente incriminador, e a palavra de outras testemunhas, constituem elementos que determinam de modo claro e indene de dúvida a autoria dos crimes de associação e tráfico de drogas, autorizando a mantença da condenação. Inteligência do Enunciado n. 08/TJMT. (...). (TJ-MT - APR: 00020804520198110015 MT, Relator.: JUVENAL PEREIRA DA SILVA, Data de Julgamento: 17/06/2020, Terceira Câmara Criminal, Data de Publicação: 22/06/2020). Assim, mantenho a condenação dos réus SIRLEI, DOUGLAS e ELAINE pela prática do delito previsto no art. 35, da Lei 11.343/2006. c) Do pleito de absolvição da ré Elaine da prática do crime de tráfico de drogas (art. 33, da Lei n. 11.343/06), ante à ausência de materialidade definitiva: Em sede recursal, a defesa de ELAINE pugna, entre outros pontos, pela sua absolvição quanto à imputação da prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, ao argumento de que não foi apreendida substância entorpecente em sua posse direta, sustentando, com base nisso, a inexistência de materialidade delitiva ou, alternativamente, a insuficiência de provas para embasar o decreto condenatório. De início, registro que não desconheço o posicionamento adotado Superior Tribunal de Justiça no que pertine à materialidade do crime de tráfico de drogas (art. 33, da Lei n. 11.343/06), especialmente nos casos em que não há apreensão direta de entorpecentes em poder do agente denunciado. Sobre o tema, o STJ vem reconhecendo que, na ausência de apreensão de entorpecente com qualquer dos acusados, ainda que existam elementos como depoimentos de policiais e registros de comunicação, não se pode afirmar a materialidade do crime de tráfico de drogas, sob pena de condenação com base em presunções. Exemplo disso encontra-se no julgamento do AgRg no AREsp 2411534/MG, julgado em março de 2024, em que a Terceira Seção da Corte reafirmou ser imprescindível a apreensão da droga com ao menos um dos réus ou terceiros para a configuração do tipo penal previsto no art. 33, da Lei n. 11.343/2006. Nesse julgado, consignou-se que a inexistência de droga inviabiliza a comprovação da materialidade, mesmo quando presentes outros indícios, como interceptações telefônicas ou depoimentos policiais. Para melhor compreensão, colaciono a ementa do referido acórdão: (...) 1. Em recente julgado, a Terceira Seção desta Corte Superior reiterou o posicionamento pela impossibilidade de condenação, pelo crime do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, quando não há apreensão de droga, ainda que sejam mencionadas outras provas a indicar a dedicação do acusado à venda de entorpecentes. Na oportunidade, concluiu-se que, "embora os depoimentos testemunhais e as provas oriundas das interceptações telefônicas judicialmente autorizadas tenham evidenciado que a paciente e os demais corréus supostamente adquiriam, vendiam e ofereciam 'drogas' a terceiros - tais como maconha, cocaína e crack -, não há como subsistir a condenação pela prática do delito descrito no art. 33, caput , da Lei n. 11.343/2006, se, em nenhum momento, houve a apreensão de qualquer substância entorpecente, seja em poder dela, seja em poder dos corréus ou de terceiros não identificados" (HC n . 686.312/MS, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Ministro Rogerio Schietti, 3ª S., DJe 19/4/2023). (STJ - AgRg no AREsp: 2411534 MG 2023/0250687-0, Relator.: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 19/03/2024, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/04/2024) (grifos meus). Por outro lado, o STF prestigia o raciocínio de que a apreensão da substância entorpecente com o réu não é condição absoluta para o reconhecimento da materialidade do delito, bastando que o conjunto probatório, de modo coeso e consistente, indique a prática da traficância de forma inequívoca. A exemplo disso, vejamos: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSAO GERAL DA MATÉRIA. TRÁFICO DE DROGAS. AUSÊNCIA DE APREENSÃO DOS ENTORPECENTES. MATERIALIDADE DO DELITO DEMONSTRADA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Cumprida a obrigação do recorrente de apresentar, formal e motivadamente, a repercussão geral da matéria discutida nos autos. O tema controvertido (a) é portador de ampla repercussão e de suma importância para o cenário político, social e jurídico e (b) a matéria não interessa única e simplesmente às partes envolvidas na lide. 2. A ausência de apreensão de entorpecentes não conduz, necessariamente, à atipicidade da conduta ou à absolvição do réu se existirem outros elementos de prova aptos a comprovarem a mercancia ilícita. Precedentes. 3. Agravo Interno a que se nega provimento. (ARE 1476455 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 15-04-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n. DIVULG 23-04-2024. PUBLIC 24-04-2024) (grifos meus). Feitas essas considerações iniciais, destaco que não obstante a defesa sustentar que o contexto probatório envolvendo a acusada ELAINE se enquadraria na orientação firmada pelo STJ no sentido de que, na ausência de materialidade delitiva, isto é, ausente a apreensão de entorpecentes, é inviável a manutenção da condenação pelo crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, tal alegação não encontra respaldo na realidade processual dos presentes autos. Isto porque, embora não tenha sido apreendida substância entorpecente na posse direta da ré, restou inequivocamente comprovado que ELAINE mantinha vínculo funcional e estrutural com os demais corréus, em especial com LUIZ FERNANDO e SEBASTIÃO, no âmbito de organização criminosa voltada à mercancia de drogas na cidade de Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). Tal participação, além de confessada parcialmente em sede inquisitorial, é corroborada por provas digitais extraídas de aparelhos celulares, interceptações de mensagens, comprovantes de repasses e diálogos em que a acusada figura como elo ativo na engrenagem do tráfico local. E mais: os demais corréus com os quais a ré se associava de modo consciente e voluntário foram efetivamente flagrados na posse de substâncias entorpecentes, sendo essas apreensões devidamente registradas e periciadas nos autos. Rememore-se que com os corréus SIRLEI, PAULO ALEXSANDER, DOUGLAS e SAMUEL, traficantes subordinados a LUIZ FERNANDO, foram apreendidos porções de entorpecentes de duas naturezas, como cocaína e maconha, além de outros apetrechos costumeiramente utilizados para a prática do crime de tráfico de drogas (Id. 268533304 – p. 349-352); Aliado a isto, tem-se o fato de que os relatórios extraídos dos aparelhos celulares de ELAINE demonstram que ela intermediava a compra e venda de entorpecentes para Tião e LUIZ FERNANDO. O Relatório de Análise IP 48/2023 comprova que ELAINE se reportava a LUIZ FERNANDO e Sebastiãozinho com objetivo de atender usuários de entorpecentes que a procuravam em sua residência (Id. 268533586 – p. 1.489-1.500). Em um dos diálogos extraídos, Tião, traficante atuante na região de Tesouro, questiona ELAINE sobre quantas parada ela tinha vendido, sendo que ela responde dizendo que era a primeira. Em outra ocasião ELAINE afirma que vendeu a última e que era um corre de galo (cocaína) (Id. 268533586 – p. 1.489-1.500). Neste ponto, cumpre destacar que, não obstante a ré ELAINE manter diálogos rotineiros com Tião, e este não ter sido formalmente indiciado nos presentes autos, tal circunstância não afasta a sua vinculação com LUIZ FERNANDO, posto que, conforme amplamente demonstrado, este exercia a função de liderança da organização criminosa da qual tanto ELAINE quanto Tião integravam. O conjunto probatório dos autos evidencia que a situação se amolda à tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, consolidada no Informativo de Jurisprudência n. 21, Edição Extraordinária do dia 30/04/2024, no sentido de que para a caracterização do crime de tráfico de drogas basta que, evidenciado o liame subjetivo entre os agentes, haja a apreensão de drogas com apenas um deles para que esteja evidenciada a prática do delito. No voto do eminente Ministro Relator Rogério Schietti Cruz, ficou consignado que a situação em que há apreensão de substâncias entorpecentes na posse de corréus difere substancialmente daquela em que não se verifica a apreensão de qualquer entorpecente ao longo da persecução penal, sendo esta última hipótese, sim, suscetível de afastar a materialidade delitiva quando desprovida de outros elementos probatórios idôneos. Colaciono fragmento decisório: Por fim, apenas ressalto que a hipótese tratada nestes autos – em que a droga foi apreendida somente com os corréus ou mesmo com terceiros não identificados – é distinta daquelas em que não há apreensão de droga nenhuma, caso em que, aí sim, não é possível a condenação de alguém pela suposta prática do crime de tráfico de drogas (art. 33 da Lei n. 11.343/2006), por ausência de provas acerca da materialidade do crime (AgRg no AREsp n. 2.324.545/SC, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 19/3/2024, DJe de 2/4/2024) (grifos meus). Portanto, diferentemente do que sustenta a defesa, o caso concreto não se amolda à situação em que inexistem vestígios materiais do tráfico em toda a investigação, pois embora não tenha sido efetivamente apreendida droga em posse pessoal de ELAINE, os autos comprovam que houve apreensão de entorpecentes em poder de outros corréus diretamente vinculados a ela na cadeia criminosa, com os quais, conforme analisado anteriormente, mantinha estreito vínculo funcional, relação de confiança e clara divisão de tarefas no contexto da associação voltada à traficância local. Assim, não prospera o pleito de absolvição da ré pela prática do crime previsto no art. 33, da Lei n. 11.343/06, mantendo-se, portanto, a sua condenação. d) Do pleito de desclassificação da conduta prevista no art. 33, da Lei n. 11.343/06 para aquela prevista no art. 28, do mesmo diploma legal, em favor da ré Sirlei: No que pertine ao pedido de desclassificação para o delito previsto no artigo 28, da Lei n. 11.343/06 em favor da ré SIRLEI, cumpre destacar que a condição de usuário não exclui, por si só, a prática do tráfico de drogas, sendo comum que o agente, para sustentar seu vício, também atue na comercialização de entorpecentes. A mera alegação de uso pessoal é insuficiente para desconstituir o crime tipificado no artigo 33, da referida lei, especialmente quando os elementos probatórios evidenciam o contrário. No caso em apreço, as provas colhidas por meio das interceptações telefônicas, além dos depoimentos colhidos em juízo demonstram a finalidade comercial dos entorpecentes apreendidos com a ré SIRLEI. Na data da operação policial, na residência de SIRLEI, foram apreendidas 31 porções de substância análoga à cocaína, uma máquina de cartão, R$ 109,00 (cento e nove reais) em espécie e dois aparelhos celulares, elementos que, aliados aos demais elementos probatórios produzidos em ambas as fases da persecução penal, evidenciam a destinação mercantil dos entorpecentes. Além da referida apreensão, os dados extraídos do aparelho celular da acusada demonstram de forma contundente que SIRLEI atuava ativamente na comercialização de substâncias entorpecentes, havendo elementos probatórios que revelam a realização de compras regulares de drogas com nítido propósito de revenda, inclusive com o registro de pagamento no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais) por uma das remessas adquiridas. Também constam nos autos conversas mantidas entre SIRLEI e usuários de drogas, nas quais a acusada, além de venda, efetua cobranças relacionadas a transações anteriores, o que reforça o caráter comercial de sua atuação, afastando por completo qualquer alegação de consumo pessoal. Vejamos: SIRLEI: Ontem na praça da bandeira se pego 100 dê galo (cocaína) com dylon. SIRLEI: Aqui e Sirlei mulher dele SIRLEI: Esse pix e chave. 6699254-1682 Nubank Gabriel Santos (Id. 268533585 – p. 1.476). Áudio de SIRLEI cobrando pagamento de entorpecentes em 16/11/22, as 00:39:40: CÊ TÁ LIGADO QUE EU PODIA MUITO BEM USAR DE MÁ E PEGAR SEU TELEFONE AQUELE DIA E SÓ TE DEVOLVER A HORA QUE VOCÊ PAGASSE O QUE TAVA RESTANDO PRA TRÁS, NÉ? MAS EU NÃO DESSE TIPO DE PESSOA NÃO, EU CONFIO, CONFIO E AÍ, ATÉ ENTÃO, ONDE QUE VAI DÁ ISSO? (Id. 268533367 – p. 527) Áudio de SIRLEI em 16/11/22, as 00:40min: AÍ EU QUERIA QUE CÊ ENTENDESSE QUE NÃO TEM CONDIÇÕES DE ESPERAR MAIS NÃO, ENTENDEU? EU ATÉ ENTENDO SEU LADO E TUDO, MAIS E AÍ? DROGA É CABULOSO! VÉI, CÊ TÁ LIGADO, ESSAS MANOBRAS AÍ NÃO VIRA NÃO (Id. 268533367 – p. 527). Em outra ocasião, SIRLEI encaminha um áudio a um usuário de drogas afirmando eu não vendo parada de 20 meu amigo e outra, não tem ninguém que tem mercadoria na cidade, nós estamos esperando e nada (Id. 268533367 – p. 522). Durante a instrução criminal, evidenciou-se que SIRLEI teria substituído seu companheiro Gabriel, corréu, na comercialização de entorpecentes no período em que ele se encontrava preso, o que é comprovado pelo áudio encaminhado por Gabriel a um usuário que o procura para adquirir entorpecentes. O usuário numeral (66) 99640-2298, com nome de Fazenda Duas Medidas, encaminha vê aí 50. Gabriel responde minha mulher (SIRLEI) vai lançar pra você aí demorô? E aí vê aí o que vai fazer aí. As autoridades policiais, sob o crivo do contraditório, afirmaram: Que o Gabriel é o esposo da Sirlei, companheiro, e quando ele estava preso, a Sirlei assumiu a venda de drogas em substituição a ele. Que pelo que a gente apurou, os dois vendiam juntos (...) (Trecho das Declarações de Lígia Pinto da Silveira Avelar – Id. 268533594). A Sirlei, o vulgo dela é veia (...). Que ela tinha um ponto de venda de drogas. Que ela era vinculada ao Luiz Fernando. Que o Douglas, era o tráfico de drogas. (Trecho das Declarações de Lígia Pinto da Silveira Avelar – Id. 268533594). Diante desse cenário fático-probatório, inviável acolher a tese de desclassificação do delito para a conduta prevista no art. 28, da Lei n. 11.343/06, notadamente ante à grande quantidade de entorpecentes apreendida, aliada aos relatórios policiais, bem como os testemunhos das autoridades públicas que gozam de presunção de credibilidade e são válidos para fundamentar a condenação, especialmente quando corroborados por outros elementos de prova. Com efeito, é cediço que tanto no crime de tráfico de drogas como no delito de porte para uso, semelhantes são os verbos nucleares dispostos nos artigos 28 e 33, da Lei 11.343/06, residindo a diferenciação entre as condutas apenas quanto à finalidade específica do agente em relação à substância, depreendendo-se da prova em qual tipo penal a conduta do acusado irá se subsumir. Não é outro o preceito contido no Enunciado Orientativo n. 03, da Jurisprudência Uniformizada da C. Turma de Câmaras Criminais Reunidas desta e. Corte de Justiça estadual, cuja redação dispõe que a condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006. (Incidente de Uniformização de Jurisprudência n. 101532/2015, DJE n. 9.998, de 11/04/2017). Importante destacar que nos termos do Enunciado Orientativo n. 07, da TCCR/TJMT, o fato de o agente não ter sido flagrado na efetiva mercancia de substâncias ilícitas não obsta a configuração do delito de tráfico de drogas, pois para a sua caracterização é prescindível prova flagrancial do comércio ilícito, bastando que a pessoa seja surpreendida praticando quaisquer das ações descritas no tipo penal, em contexto que evidencie a saciedade o seu envolvimento com o comércio legalmente proibido, porquanto se trata de tipo penal misto alternativo, cuja consumação se dá com o cometimento de quaisquer das condutas nele especificadas. A propósito, é esse o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: As instâncias ordinárias, mediante exame amplo e aprofundado do acervo probatório coligido nos autos, entenderam comprovadas a materialidade e a autoria delitivas, com amparo nos depoimentos prestados pelos policiais que efetuaram a prisão e nos laudos periciais produzidos, os quais, harmônicos e coerentes entre si, confirmaram, tanto na fase inquisitorial como no curso da instrução processual, os fatos deduzidos na exordial acusatória, atribuindo a autoria do delito do art. 33, caput, da Lei. n. 11.343/2006 ao réu, ora agravante. (...) (STJ, AgRg no HC n. 850.008/MG, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Des. convocado do TJDFT), Sexta Turma, j. em 21/05/2024, DJe de 24/05/2024). Nesse mesmo sentido colaciono o entendimento desta eg. Câmara Criminal: A condição de usuário de drogas não impede a caracterização da traficância, sendo comum àqueles que fazem uso de drogas utilizarem-se da venda não só como forma de sobrevivência no meio da criminalidade, mas também como forma de manutenção do próprio vício. 02. Em crimes praticados na clandestinidade, como o tráfico de drogas, é preciso reconhecera importância e validade dos depoimentos dos agentes do sistema de segurança pública, pois esses estão diretamente envolvidos nas regiões de traficância, com a colheita de informações de moradores e usuários de droga, que auxiliam na identificação dos responsáveis pela prática criminosa. 03. No caso, o apelante manteve em depósito entorpecentes, para fins de entrega a consumo de terceiros, o que impede a desclassificação do delito de tráfico de drogas para a infração penal do art. 28 da Lei 11.343/06 (consumo pessoal) (...) (N.U 1005024-88.2023.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, HELIO NISHIYAMA, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 07/05/2024, Publicado no DJE 10/05/2024). Posto isso, não há se falar em absolvição e nem em desclassificação do crime capitulado na denúncia para aquele previsto no art. 28, da Lei n. 11.343/06. DO RÉU SAMUEL VICTOR 2.1. DAS PRELIMARES e) Do pleito de nulidade da sentença, por ter sido fundada em prova ilícita (busca e apreensão baseada em interceptação dirigida a terceiro): Neste ponto, a defesa do réu SAMUEL sustenta que a sentença padece de nulidade absoluta, uma vez que teria se fundamentado em provas ilícitas, derivadas de busca e apreensão realizada sem a devida motivação legal. A defesa alega que o réu não era alvo das interceptações telefônicas que deram ensejo à medida, o que violaria o art. 5º, inc. XI, da Constituição Federal, bem como o art. 157, § 1º, do Código de Processo Penal, invocando, inclusive, a teoria dos frutos da árvore envenenada. Todavia, tal alegação não se sustenta. No caso em tela, verifica-se que as provas incriminadoras existentes nos autos decorrem de extração de dados telefônicos da ré SIRLEI, devidamente autorizada, com respaldo legal e judicial, sendo direcionada à apuração de prática criminosa organizada, voltada ao tráfico de entorpecentes, na região de Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). No decurso da investigação, surgiram indícios robustos da participação da pessoa do recorrente SAMUEL nos grupos da associação criminosa, comandados pelo LUIZ FERNANDO, motivando, de forma autônoma e devidamente fundamentada, a expedição de mandado de busca e apreensão em desfavor de SAMUEL e, subsequentemente, a sua responsabilização penal. Neste ponto, importa destacar o princípio da serendipidade, amplamente reconhecido na jurisprudência pátria, segundo o qual é lícita a utilização de provas obtidas fortuitamente durante diligências regularmente autorizadas para investigação de outros fatos ou pessoas, desde que exista autorização judicial válida e não haja desvio de finalidade. Sobre o tema: Tese de julgamento: "1. A busca e apreensão é válida quando fundamentada em indícios concretos de autoria e materialidade de crimes. 2. A teoria da serendipidade permite a validade de provas encontradas casualmente, desde que não haja desvio de finalidade." Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 240.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 933.727/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 27/11/2024, DJEN de 3/12/2024. (RHC n. 196.186/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 26/3/2025, DJEN de 31/3/2025). 2. O princípio da serendipidade valida provas encontradas casualmente durante investigações autorizadas, desde que não haja desvio de finalidade. 3. A defesa deve apresentar argumentos específicos e pormenorizados para impugnar a decisão recorrida." Dispositivos relevantes citados: Súmula n. 182 do STJ. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp 1.676.717/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe 17/12/2021; STJ, AgRg no HC 861.941/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe 11/12/2023. (AgRg no RHC n. 178.864/RS, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 12/3/2025, DJEN de 19/3/2025) (gri. A despeito da alegação defensiva de que SAMUEL não era alvo da investigação e de que sua qualificação teria sido equivocada, exsurge do Relatório Técnico n. 2023.13.40958, elaborado por equipe especializada, que os dados cadastrais vinculados ao número telefônico (66) 99691-4065 — número este comprovadamente identificado como participante dos grupos de comunicação da associação criminosa — foram obtidos por meio de requisição formal de informações à operadora VIVO S.A. Tal circunstância confere robustez, segurança e precisão à identificação e qualificação do réu SAMUEL no contexto da presente investigação, afastando-se, por completo, a tese de equívoco ou de ausência de vínculo subjetivo com o objeto da apuração (Id. 268533367 – P. 507-559). Ainda que se admitisse, por hipótese meramente abstrata, a existência de algum tipo de precariedade ou imprecisão na qualificação do réu — o que, como já ficou devidamente esclarecido, não se verifica nos presentes autos —, cumpre destacar que a defesa se insurge contra tal questão somente em sede recursal, revelando, assim, manifesta intempestividade quanto à alegação de nulidade das provas. Além disso, ressalto que os relatórios policiais que fundamentam a qualificação foram apresentados nos autos antes mesmo da realização da audiência de instrução criminal, oportunidade em que a defesa poderia ter exercido o direito de impugná-los, por meio da apresentação de quesitos, requerimentos de diligência ou impugnação formal, o que não ocorreu, configurando, portanto, preclusão quanto à matéria. Destaco, também, que a ausência de comprovação de prejuízo a defesa de eventual erro na qualificação do réu é considerada nulidade relativa e, nesse ponto, a orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal (STF) é no sentido de que o princípio do pas de nullité sans grief exige, em regra, a demonstração de prejuízo concreto à parte que suscita o vício, podendo ser ela tanto a nulidade absoluta quanto a relativa, pois não se decreta nulidade processual por mera presunção. Neste sentido: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. NULIDADE. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. PRECEDENTES. 1. A decisão impugnada está alinhada com a orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal no sentido de que “o princípio do pas de nullité sans grief exige, em regra, a demonstração de prejuízo concreto à parte que suscita o vício, podendo ser ela tanto a nulidade absoluta quanto a relativa, pois não se decreta nulidade processual por mera presunção” (HC 132.149-AgR, Rel. Min. Luiz Fux). Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - AgR HC: 173789 PB - PARAÍBA 0026464-11.2019.1.00.0000, Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 06/03/2020, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-081 02-04-2020) (grifos meus). Dessa forma, sem que seja apontado ou evidenciado efetivo prejuízo a alguma das partes decorrente de eventual qualificação precária do réu, o que repiso, não ocorreu, resta inviável a anulação dos atos processuais combatidos, razão pela qual rejeito a preliminar suscitada. f) Do pleito da nulidade em razão de suposto cerceamento de defesa, ante a negativa de acesso aos autos das interceptações que embasaram a medida cautelar; A defesa do réu SAMUEL sustenta que não teve acesso integral aos processos que embasaram as medidas cautelares e interceptações utilizadas na presente investigação, especificamente os autos de n. 1000973-75.2022.811.0036 e n. 1000887-07.2022.811.0036, onde teriam sido autorizadas as extrações de dados telemáticos que culminaram na busca e apreensão domiciliar realizada na residência de SAMUEL. Razão não lhe assiste. Não obstante a defesa alegar a suposta nulidade decorrente da ausência de acesso aos autos que originaram as interceptações telefônicas, o que poderia caracterizar cerceamento de defesa, a jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores é no sentido de que as nulidades devem ser arguidas oportunamente, sob pena de preclusão temporal, devendo ser suscitadas até as alegações finais Sobre o tema, o STJ entendeu: 2. As nulidades eventualmente ocorridas durante a instrução criminal, no procedimento comum, devem ser arguidas até as alegações finais (art. 571, inciso II, do Código de Processo Penal), sob pena de preclusão". (AgRg no REsp n. 1.692.392/PA, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 3/4/2018, DJe de 6/4/2018). (AgRg no AREsp n. 2.678.743/PA, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 20/3/2025, DJEN de 28/3/2025) (grifos meus). 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, primando pela segurança jurídica e pela lealdade processual, tem se orientado no sentido de que as nulidades denominadas absolutas também devem ser arguidas em momento oportuno, sujeitando-se à preclusão temporal (AgRg no RHC n. 167.077/GO, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 21/5/2024, DJe de 28/5/2024.). 4. A jurisprudência dos Tribunais Superiores "não tolera a referida nulidade de algibeira - eiva esta que, podendo ser sanada pela insurgência imediata da defesa após ciência do vício, não é alegada como estratégia, numa perspectiva de melhor conveniência futura" (AgRg na RvCr n. 5.565/RS, Relator Ministro JESUÍNO RISSATO (Desembargador Convocado do TJDFT), Terceira Seção, julgado em 23/11/2022, DJe de 29/11/2022) (AgRg no AREsp n. 2.728.169/SC, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 4/2/2025, DJEN de 13/2/2025) (grifos meus). 2. As nulidades ocorridas durante a instrução devem ser apontadas até as alegações finais, sob pena de preclusão. No caso, constatado que a defesa não promoveu a arguição até aquele momento processual, sendo correto o reconhecimento da preclusão. 2.1. O princípio do pas de nullité sans grief exige, em regra, a demonstração de prejuízo concreto à parte que suscita o vício, independentemente da sanção prevista para o ato e do caráter relativo ou absoluto da nulidade, uma vez que não se decreta nulidade processual por mera presunção (...). (STJ - AgRg no AREsp: 2171393 TO 2022/0218428-0, Relator.: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 28/08/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/08/2023) (grifos meus). No caso em exame, a defesa do réu SAMUEL em momento algum insurgiu-se, durante a instrução criminal, sobre eventual cerceamento de defesa decorrente da ausência de acesso aos autos referidos, o que somente veio a ocorrer em sede recursal, revelando manifesta perda da oportunidade processual. Com efeito, na apresentação da defesa prévia, a defesa registrou: (...) o acusado prefere aguardar a instrução processual, deixando para apresentar toda matéria de defesa nas alegações finais, posto que até o presente momento não existem provas coligadas que os desfavorecem, mas, somente elementos informativos colhidos durante a investigação criminal (Id. 268533443 – p. 814-815). Nas alegações finais, igualmente, foram sustentadas apenas teses de mérito, conforme se extrai do documento de Id. 268533634 (p. 1.747-1.757) e este fato é expressamente reconhecido na sentença condenatória, a qual consignou: A defesa dos acusados LUIZ GUSTAVO MODESTO SOUZA, SAMUEL VICTOR RODRIGUES DA SILVA, DOUGLAS RODRIGUES DA SILVA E LUIZ FERNANDO BARROS REZENDE não apontou preliminares (Id. 268533653) (grifos meus). Dessa forma, não há como se reconhecer a nulidade ora suscitada, porquanto alcançada pelo instituto da preclusão, em razão da inércia da própria defesa técnica, que deixou de exercer oportunamente os meios de impugnação disponíveis. Ademais, a defesa não logrou demonstrar de que modo a ausência de acesso integral aos processos conexos teria efetivamente causado prejuízo à ampla defesa ou influenciado negativamente na formação da culpa, ônus que lhe competia nos termos do art. 563, do CPP (princípio pas de nullité sans grief). Tanto é assim que, ao longo de toda a instrução processual, a defesa técnica não formulou qualquer objeção ou requerimento com base na suposta ausência de acesso aos referidos autos, revelando que tal argumento foi articulado apenas de forma extemporânea, no momento recursal. Assim, rejeito a preliminar. (g) Do pleito de concessão dos benefícios de gratuidade da justiça: O apelante SAMUEL requer a concessão dos benefícios da justiça gratuita sustentando ser hipossuficiente e incapaz de arcar com as custas processuais sem prejuízo do seu sustento. Sobre o assunto, imperioso salientar que a hipossuficiência financeira do recorrente não impede a sua eventual condenação ao pagamento das referidas custas, a qual configura consequência lógica da própria condenação criminal, nos termos do artigo 804, do Código de Processo Penal, que assim preceitua: a sentença ou o acórdão, que julgar a ação, qualquer incidente ou recurso, condenará nas custas o vencido. Contudo, constatada a condição de hipossuficiente do apelante é possível a suspensão da exigibilidade da obrigação, pelo período de 05 (cinco) anos, após o trânsito em julgado da condenação, sendo que neste período poderá ser executada se houver a possibilidade de pagamento, sem prejuízo do sustento próprio e da família. Veja o que diz o CPC, art. 98, §§ 2º e 3º: CPC, art. 98 (...). § 2º. A concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência. § 3º. Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. No entanto, cabe ao juízo da execução penal avaliar as condições financeiras do agente, com vista à possível suspensão da exigibilidade. Nesse sentido: 5. Ademais, o momento adequado para aferir a situação econômica do condenado para eventual suspensão da exigibilidade do pagamento das custas processuais é a fase de execução. 6. A defesa não apresentou argumentos novos capazes de modificar a decisão monocrática. IV. Dispositivo e tese. 7. Agravo regimental desprovido. Tese de julgamento: "A revisão do entendimento do Tribunal de origem acerca da ausência de comprovação dos requisitos para a concessão da justiça gratuita encontra óbice na Súmula n. 7 do STJ." Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 804; CPC, art. 932, III. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp n. 2.209.933/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do Tjdft), Sexta Turma, julgado em 12/12/2023, DJe de 15/12/2023; STJ, AgRg no REsp 1.929.430/RS, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, j. 15.03.2022; AgInt no REsp n. 1.569.916/PE, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 22/3/2018, DJe de 3/4/2018. (AgRg no AREsp n. 2.555.553/MS, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 22/10/2024, DJe de 25/10/2024). 4. A condenação ao pagamento das custas processuais é decorrência legal da sentença penal condenatória, cabendo ao juízo da execução eventual suspensão da exigibilidade. Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 148, § 2º; 61, II, “f”; CPP, arts. 385 e 804. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp n. 2.462.460/SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, j. 4/6/2024, DJe 6/6/2024; STJ, AgRg no REsp n. 904.588/RJ, Rel.ª Min.ª Laurita Vaz, Sexta Turma, j. 8/3/2022, DJe 14/3/2022; STJ, AgRg no AREsp n. 2.365.825/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, j. 22/8/2023, DJe 28/8/2023. Logo, incabível, neste momento, o pedido de concessão dos benefícios de justiça gratuita e isenção das custas processuais. 2.2. DO MÉRITO (h) Do pleito de absolvição do réu quanto ao crime de associação para o tráfico (art. 35, da Lei 11.343/06), por ausência de estabilidade e permanência: Durante as investigações e conforme relatórios extraídos dos aparelhos telefônicos dos investigados, identificou-se que o réu SAMUEL VICTOR RODRIGUES DA SILVA, conhecido pelo vulgo “Berréu”, participava de grupos no aplicativo WhatsApp diretamente vinculados à estrutura de atuação da facção criminosa voltada para o tráfico de drogas nos municípios de Tesouro e Guiratinga (MT) (Id. 268533367 – p. 542-548). As autoridades policiais, ao analisarem os dados telemáticos apreendidos, identificaram que SAMUEL mantinha vínculos com integrantes da organização e com os lojistas que comercializavam entorpecentes em pontos fixos. A Delegada de Polícia Lígia relatou que quando da chegada das equipes policiais para o cumprimento do mandado de prisão, SAMUEL foi ao banheiro para tentar se desfazer dos entorpecentes e destruiu seu próprio aparelho telefônico, de modo a impedir a análise do conteúdo probatório armazenado no dispositivo, prática que, como relatado pelas autoridades policiais é típica dos faccionados. Vejamos o depoimento da Delegada: (...) O Samuel ele nem foi preso no dia, nós cumprimos o mandado na casa dele cerca de uma semana depois. Inclusive, no cumprimento do mandado na casa dele, eu já tinha voltado de férias e eu fui. Que temos conversas nos grupos que ele participa da organização. Que, no dia, quando chegamos, ele quebrou o telefone dele. Que teve pouca extração, poucos dados. Que ele tava com droga lá, tentou jogar fora, mas não deu tempo. Que é uma casa pequena, que quando entramos, ele tava deitado. Que ele jogou o telefone no chão, quebrou e correu para o banheiro para jogar fora a droga, mas não conseguiu. Que lá tinha plástico filme, embalagem de plástico filme e as conversas de telefone, dos outros grupos. Que do celular dele não teve extração. Ele é mencionado nos grupos, ele mora em tesouro (...). Que a atividade dele é em tesouro (Id. 268533594) (grifos meus). Além de participar do grupo da organização criminosa onde era negociada a venda de entorpecentes, exsurge dos autos que SAMUEL mantinha contato com ELAINE que, como dito, era uma das intermediarias de entrega de entorpecentes dos traficantes de Tesouro (MT), bem como do corréu LUIZ FERNANDO, sendo, como já comprovado, ponto de apoio da associação criminosa. Vejamos diálogos entre os corréus: SAMUEL: E tia SAMUEL: Ntv Elaine da Matta: Tia? SAMUEL: Tião Elaine: Ele tá jantando Elaine: Mas pode falar comigo SAMUEL: Eu quero 2 Elaine: Manda mensagem para ele aí SAMUEL: Você podia trazer Elaine: Qualquer coisa eu levo aí Elaine: Iai ele te respondeu? SAMUEL: Pode trazer O referido diálogo é capaz de demonstrar que o SAMUEL, além de participar dos grupos de WhatsApp da organização criminosa, mantinha contato não apenas com a corré Elaine, mas igualmente com Tiãozinho, traficante atuante na região de Tesouro, evidenciando sua integração orgânica e rotineira à rede de comercialização de entorpecentes. Portanto, a alegação defensiva no sentido de que SAMUEL jamais manteve qualquer tipo de envolvimento com os demais corréus, tampouco teria relação com a organização criminosa investigada, não se sustenta frente ao conjunto probatório coligido nos autos. A defesa insiste em afirmar que o termo “Berréu”, supostamente relacionado ao acusado, seria mera gíria popular utilizada nos grupos de WhatsApp da facção para transmitir recados, e não um apelido ou identificação pessoal do réu. Todavia, essa versão defensiva se revela isolada e desprovida de sustentação técnica, especialmente porque não refuta — nem direta nem indiretamente — o fato de SAMUEL integrar os grupos de WhatsApp utilizados pela organização criminosa para coordenar a mercancia de drogas, circunstância comprovada nos autos pelos relatórios policiais (Id. 268533367 – p. 542-548). Destaco, ainda, que as investigações não se limitaram à cidade de Guiratinga (MT). Pelo contrário, as autoridades policiais são claras ao esclarecer que o raio de atuação da organização criminosa abrangia também o município de Tesouro (MT), onde SAMUEL residia e foi flagrado em atividade ligada ao tráfico de drogas. Por essas razões, afasto a tese de ausência de vínculo com os demais corréus, uma vez que os autos demonstram de forma clara que o réu SAMUEL integrava o núcleo da organização criminosa operante na cidade de Tesouro, atuando com voluntariedade e estabilidade, conforme exige o tipo penal previsto no art. 35, da Lei n. 11.343/2006. (i) Do pleito do reconhecimento da atenuante da menoridade relativa (art. 65, inc. I, do CP): Neste ponto, a defesa pugna pela reforma da sentença para que seja devidamente reconhecida a atenuante da causa especial de diminuição da pena prevista no art. 65, inc. I, do CP. Assiste razão à defesa. A denúncia ofertada pelo Ministério Público dispõe: Infere-se dos autos que a Polícia Judiciária Civil de Guiratinga identificou que, no período compreendido entre os anos de 2022 à 2023, nas comarcas de Guiratinga e Tesouro, os denunciados 2-HUGO LEANDRO DOURADO DIAS, 3- GABRIEL SANTOS DE OLIVEIRA, 4-DOUGLAS RODRIGUES DA SILVA, 5-SAMUEL VICTOR RODRIGUES DA SILVA 6-DANILO SANTOS SILVA, 7- PAULO ALEXSANDER DOS SANTOS CARDOSO, 8-ELAINE DA MATTA SOUZA, 9-LUIS GUSTAVO MODESTO SOUZA e 10-SIRLEI APARECIDA VALERIO e tendo como líder o denunciado 10-LUIZ FERNANDO BARROS REZENDE, onde constituíram e integraram organização criminosa, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas entre si, com objetivo de obter vantagem mediante o tráfico ilícito de entorpecentes, lavagem de dinheiro e outros crimes (Id. 268533351 – p. 471-472). Portanto, evidencia-se que os crimes apurados na presente ação tiveram início no ano de 2022, período em que SAMUEL ainda contava com menos de 21 anos de idade. Conforme se verifica no comprovante de situação cadastral do CPF emitido pela Receita Federal, anexado pela defesa, o réu nasceu em 01 de janeiro de 2002, fazendo jus à aplicação da atenuante prevista no art. 65, inc. I, do Código Penal (Id. 268533715). Destaco que o redimensionamento da pena do acusado, com a devida consideração da atenuante reconhecida, será oportunamente realizado após a apreciação das demais teses defensivas suscitadas no presente recurso, de modo a garantir coerência e unidade na fixação da reprimenda final. (j) Do pleito da reforma da pena de multa em razão da sua hipossuficiência: Em relação ao pleito de afastamento da pena de multa fixada em razão da condenação pelos crimes de tráfico e associação para o tráfico, ao argumento de que o apelante é hipossuficiente, a razão também não lhe assiste. A pena de multa é uma sanção penal de natureza patrimonial (art. 5º, XLVI, c, da Constituição Federal), podendo ser aplicada de forma isolada ou juntamente com a pena privativa de liberdade. Vale ressaltar que a imposição da multa está expressamente prevista no preceito secundário do art. 33 e art. 35, ambos da Lei n. 11.343/06, sendo obrigatória e cumulativa com a pena privativa de liberdade, sem previsão legal para sua exclusão devido às condições financeiras do condenado. Nesses casos, cabe ao magistrado, ao aplicar a pena pecuniária, observar os limites mínimo e máximo de dias-multa, levando em consideração a capacidade econômica do condenado ao fixar o valor do dia-multa, observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. No que pertine ao tema, a Turma de Câmaras Criminais Reunidas deste Sodalício aprovou ainda o Enunciado n. 33, segundo o qual: A fixação da pena de multa deve observar duas etapas, sendo definida na primeira a quantidade de dias-multa, em patamar proporcional à pena privativa de liberdade e, na segunda, o montante do dia-multa, de acordo com a capacidade econômica do apenado. Nesta quadra, conclui-se que o pedido do apelante para afastar a pena de multa não merece ser acolhido. Ademais, o valor unitário da multa foi estipulado na fração mínima de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na época dos fatos. Nos termos da jurisprudência deste Tribunal, não se admite a isenção da pena de multa prevista no preceito secundário da norma penal incriminadora, por falta de previsão legal. Já no que pertine ao afastamento da condenação das custas processuais, como já exposto em tópico anterior, a hipossuficiência financeira do acusado não impede a sua eventual condenação ao pagamento das referidas custas, a qual configura consequência lógica da própria condenação criminal, nos termos do artigo 804, CPP. Assim, repiso que, cabe ao juízo da execução penal avaliar as condições financeiras do agente, com vista à possível suspensão da exigibilidade. Portanto, mantenho a condenação do acusado em custas processuais, bem como em dias-multa. (k) Do pleito de retificação da detração penal feita pelo juízo sentenciante: Assiste razão à defesa quanto ao pleito de retificação do marco inicial da prisão cautelar do acusado, devendo ser reconhecido, como data correta da segregação, o dia 21/12/2023, conforme se extrai do Auto de Prisão em Flagrante Delito (Id. 268533304 – p. 344). Assim, esta deverá ser a data considerada para fins de detração penal, nos termos do que dispõe o art. 42, do CP e a Lei n. 12.736/2012. Não obstante o acolhimento da pretensão no tocante à correção da data de início da custódia, cumpre esclarecer que a efetivação do cálculo do tempo de pena a ser deduzido competirá ao Juízo da Execução Penal, conforme estabelece o art. 66, inc. III, alínea “c”, da Lei de Execuções Penais. Ressalta-se, ademais, que, embora tenha havido erro na data inicialmente considerada, a diferença reconhecida (2 dias) não possui repercussão prática suficiente para alterar o regime inicial de cumprimento da pena, o como se demonstrará no tópico do apenamento. Passo ao redimensionamento da pena do réu SAMUEL. 2.3. DO APENAMENTO DO RÉU SAMUEL 2.4. DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, DA LEI N. 11.343/06). O crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 possui pena de reclusão de 05 (cinco) a 15 (quinze) anos, além do pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. Na primeira fase da dosimetria da pena, como pontuado pelo juízo de origem, ao analisar as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal verifico que são inerentes ao tipo penal, razão pela qual fixo a pena base em 05 (cinco) anos de reclusão, bem como 500 (quinhentos) dias-multa, sendo o mínimo legal. Na segunda fase dosimétrica, reconheço a presença da agravante da reincidência (art. 61, I, CP), decorrente do executivo de pena n. 2000068-87.2021.8.11.0036, e a presença da atenuante da menoridade relativa (art. 65, III, “d”, CP). A jurisprudência deste Sodalício é no sentido de que a atenuante da menoridade relativa pode ser integralmente compensada com a agravante da reincidência (...) (N.U 0008374-08.2014.8.11.0042, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 01/04/2025, publicado no DJE 03/04/2025). Assim, faço compensação integral entre os institutos, encontrando a pena em formação de 05 (cinco) anos de reclusão, bem como 500 (quinhentos) dias-multa. Na terceira fase, em razão da ausência de causas de aumento ou diminuição da pena, torno em definitiva a pena de 05 (cinco) anos de reclusão, bem como 500 (quinhentos) dias-multa. 2.5. DO CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO (ART. 35, DA LEI N. 11.343/06). O crime de associação para o tráfico, previsto no art. 35, caput, da Lei n. 11.343/06 possui pena de reclusão de 03 (três) a 10 (dez) anos, além do pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa. Na primeira fase da dosimetria da pena, mantenho a valoração negativa da culpabilidade fundamentada pelo magistrado de origem nos termos por ele expostos, vejamos: O delito apresentou culpabilidade exacerbada, tendo em vista que o réu praticou o crime de associação para o tráfico de drogas como integrante da organização criminosa Comando Vermelho, grupo bem articulado, com várias ramificações, divisão de funções definidas, reconhecida nacionalmente por atos de extrema violência e voltada para a prática não apenas do comércio ilegal de entorpecentes, mas de outros delitos, como tortura, homicídio, roubo e lesão corporal. Outrossim, o grupo é causador de inúmeros problemas na sociedade, atuando dentro e fora dos presídios de todo o país, ordenando “salves” e até morte de desafetos, pelo que merece valoração negativa, como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ - AgRg no HC: 775179 MA 2022/0314445-2, Data de Julgamento: 18/10/2022, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/10/2022) (...) (grifos meus). Assim, mantenho a pena base em 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão, bem como 933 (novecentos e trinta e três) dias-multa, sendo o mínimo legal. Na segunda fase dosimétrica, reconheço a presença da agravante da reincidência (art. 61, I, CP), decorrente do executivo de pena n. 2000068-87.2021.8.11.0036, e a presença da atenuante da menoridade relativa (art. 65, III, “d”, CP). E, em consonância com a jurisprudência deste Tribunal, faço compensação integral entre os institutos, mantendo a pena em formação em 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão, bem como 933 (novecentos e trinta e três) dias-multa. Na terceira fase, em razão da ausência de causas de aumento ou diminuição da pena, torno em definitiva a pena de 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão, bem como 933 (novecentos e trinta e três) dias-multa. 2.6. DO CONCURSO MATERIAL: Em razão do reconhecimento do concurso material pelo juízo de origem, instituto previsto no art. 69, do CP, fica o réu SAMUEL condenado, definitivamente, à pena privativa de liberdade de 9 ANOS e 1 MÊS DE RECLUSÃO, bem como ao pagamento de 1.433 (mil, quatrocentos e trinta e três) dias-multa. Mantenho, nos moldes da sentença, o regime inicial FECHADO para início do cumprimento da pena, nos termos do art. 33, § 2º, alínea “c”, e § 3º, do Código Penal. Quanto à detração, repiso que a efetivação do cálculo do tempo de pena competirá ao Juízo da Execução Penal, nos termos do art. 66, inc. III, alínea “c”, da Lei de Execuções Penais, devendo ser utilizada, como anteriormente consignado, a data de 21/12/2023, correspondente ao efetivo início da prisão do réu, para fins de abatimento na pena privativa de liberdade imposta. DO RÉU PAULO ALEXSANDER 3.1. DO MÉRITO l) Do pleito de absolvição quanto ao crime de associação para o tráfico (art. 35, da Lei 11.343/06): No que pertine ao crime de associação, a defesa sustenta que a condenação do réu PAULO se baseou exclusivamente em provas obtidas a partir da extração de dados do celular da corré Sirlei, sem que houvesse produção de outras provas em contraditório judicial. Aliado a isto, afirma que não há provas concretas de que o acusado integrava organização criminosa, não ficando demonstrada a existência de animus associativo. Razão não lhe assiste. De início, destaco que a extração dos dados telemáticos do aparelho celular da corré SIRLEI foi devidamente autorizada pelo juízo competente, sendo possível que as autoridades policiais pudessem identificar outros indivíduos diretamente vinculados à organização criminosa, dentro os quais, figura PAULO ALEXSANDER. Não obstante o fato de as provas terem sido extraídas pela equipe técnica da Polícia Civil, não se verifica qualquer violação ao devido processo legal, tampouco afronta ao contraditório ou à legalidade das provas, uma vez que o material probatório foi juntado nos autos e disponibilizado às defesas técnicas dos réus, o que ocorreu antes mesmo da realização da audiência de instrução e julgamento. Destaca-se, ademais, que durante a audiência de instrução a defesa de PAULO teve plena possibilidade de, caso houvesse interesse, formular quesitos, impugnar os elementos colhidos e exercer o contraditório na plenitude, não havendo, portanto, qualquer prejuízo processual a defesa. A propósito, sobre o tema, este Sodalício já se posicionou: (...) 5. Não há nulidade das provas digitais, pois a extração de dados foi realizada com autorização judicial, sem indícios de adulteração ou prejuízo à defesa. A ausência de registro formal da cadeia de custódia não invalida automaticamente a prova colhida, nos termos da jurisprudência do STJ. 6. A autoria e a materialidade dos crimes restaram comprovadas pelas provas testemunhais, periciais e documentais, incluindo interceptações telefônicas e extração de dados de celulares, que evidenciaram a participação dos recorrentes na comercialização de drogas e na organização criminosa (...). (TJ-MT - APELAÇÃO CRIMINAL: 10027867320228110025, Relator.: ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Data de Julgamento: 18/02/2025, Primeira Câmara Criminal, Data de Publicação: 21/02/2025) (grifos meus). Assim, sendo o procedimento regularmente instaurado, devidamente supervisionado pelo Poder Judiciário e submetido ao contraditório, não prospera a alegação defensiva no sentido de que os elementos probatórios dele decorrentes não poderiam ser considerados para a formação do convencimento do julgador quanto aos fatos aqui apurados. Dito isto, passo à análise das provas existentes em desfavor de PAULO ALEXSANDER. As provas produzidas durante a persecução penal comprovam que PAULO ALEXSANDER estava diretamente vinculado à estrutura do tráfico de drogas na região dos municípios de Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). Durante a instrução criminal, em seus depoimentos, os policiais e investigadores relataram que PAULO ALEXSANDER, além de realizar a comercialização de entorpecentes, participava dos grupos da associação criminosa liderada por LUIZ FERNANDO onde, além de realizarem tratativas sobre o comércio ilícito de entorpecentes, monitorava a ação da polícia no município de Guiratinga (MT). O investigador de polícia Nazírio, sob o crivo do contraditório, afirmou que PAULO ALEXSANDER mantinha diversas conversas com usuários de entorpecentes, conforme verificado da extração dos dados telemáticos, e registrou, ainda, que o referido acusado atuava sob o gerenciamento direto de LUIZ FERNANDO, líder da organização criminosa. Para melhor compreensão, colaciono trecho do depoimento da testemunha Nazírio: Que o gerente é o Luiz Fernando e ele vendia drogas, além de monitorar as viaturas. Que são várias mensagens, dele no grupo, dele conversando com Luiz Fernando, ele conversando com Dylan. Ele conversando com usuário, comprando drogas dele. Que Geysi é companheira do Paulo Alexander. Que ele tinha dois celulares, inclusive, uma das conversas, conversando com usuário, ele deixa bem claro, porque o usuário fala: tem hora que eu converso com você em um número, tem hora que você conversa em outro número. Que aí, ele explica para o usuário, que esse aqui é meu número particular, aquele outro é dos corres. Que eu acho que esse grupo, salvar, era tipo um controle das finanças do tráfico. Quem devia, quanto estava devendo. (Id. 2685333594). O relatório de análise n. 2024.13.74049/2023, da Delegacia de Polícia de Guiratinga, devidamente realizado após autorização judicial, foi elaborado com base em conteúdos extraídos dos celulares do réu e corréus, demonstra que PAULO participava dos grupos Energiza, este grupo destinado a tratar de assuntos relacionados à associação criminosa, além de realizar o monitoramento de viaturas policiais e operações policiais (Id. 268533582 – p. 1330). Vejamos trechos das conversas existentes no grupo criminoso: No áudio abaixo LUIZ FERNANDO, vulgo BÔBO, dá as boas vindas aos novos integrantes: MANO TSUNAMI, MANA LORENA E MANO LUCAS COM NÓIS, GP DOS IRMÃOS DE GUIRATINGA E TESOURO, SEJAM TODOS BEM VINDOS (Id. 268533582 – p. 1.399). LUIZ FERNANDO alerta, no grupo, a presença da Polícia Militar (Força Tática) na cidade: Dirceu Peças e Serviços (Luiz Fernando): Força Tática na cidade viu meus irmãos. Dirceu Peças e Serviços (Luiz Fernando): 4 dentro. Dirceu Peças e Serviços (Luiz Fernando): Eles saíram de dentro da secretaria de saúde 2 (Id. 268533582 – p. 1.399). Posteriormente, LUIZ FERNANDO encaminha no grupo: Dirceu Peças e Serviços (Luiz Fernando): Meus irmãos Dirceu Peças e Serviços (Luiz Fernando): Ntva Dirceu Peças e Serviços (Luiz Fernando): VT da força tática parada no amigos do laço. Além disso, corroborando o relatado pelo Investigador de Polícia Narzírio, as provas nos autos comprovam que PAULO ALEXSANDER, além de atuar no comércio ilícito de entorpecentes com sua esposa, estava associado a LUIZ FERNANDO na prática delitiva, sendo que o réu se reportava ao líder da organização para retirar porções para comercialização, bem como para reposição do seu estoque. Extrai-se do relatório policial: PAULO ALEXSANDER, vulgo KANDY, informa que ligou para DIRCEU (LUIZ FERNANDO) e ele autorizou a realizar as porções: ÁUDIO KANDY: “MANO, EU LIGUEI PRO DIRCEU, VÉI, O DIRCEU FALOU QUE TAVA CERTO, QUE ERA UMA PARADINHA DE 20 QUE TINHA LÁ MERMO, AINDA PERGUNTEI PARA ELE SE PODIA MEXÊ, PÔ, ACABEI DE TIRÁ UMA G DELA (Id. 268533582 – p. 1.439). PAULO ALEXSANDER, vulgo KANDY, pede mais feijão (maconha) a LUIZ FERNANDO, vulgo BÔBO, para repor o estoque. ÁUDIO KANDY: “DEIXA EU TE FALA, EU VÔ QUERE MAIS UMA 250 DE FEIJÃO HEIN MEU FÍ, AÍ MEU FEIJÃO TÁ 2” (Id. 268533582 – p. 1.391). PAULO ALEXSANDER também mantinha contato direto com outros corréus. Conforme demonstrado pelas conversas extraídas dos aparelhos celulares apreendidos, o acusado estava envolvido na prática delitiva em articulação com outros traficantes da região, integrando a rede organizada voltada à comercialização de entorpecentes aqui investigada. Há registros de conversas entre PAULO ALEXSANDER e o corréu GABRIEL, nas quais este solicita a PAULO a conversão de valores via PIX em dinheiro em espécie. Em resposta, PAULO orienta Gabriel a buscar o montante com a traficante Mônica. Gabriel: Zika se num tem 750 em dinheiro, tenho 750 no pix querendo trocar no rex. PAULO: Mano, só se o cê fô lá na Mônica lá e pegá, lá tem uns setecentos e pouco (Id. 268533582 – p. 1.442). PAULO, vulgo KANDY, pede entorpecentes para GABRIEL, vulgo DYLON: ÁUDIO KANDY (PAULO): Na ativa mano véi, deixa eu te fala, eu precisava de uma força do senhor, mas só se tiver no alcance do senhor, senhor não arruma uma grama aí até mais tarde, até eu pegar minha 25 não pô? (Id. 268533582 – p. 1.431). DYLON (GABRIEL) PARA KANDY (PAULO): Nativa, vo precisar daquela situação hoje bixo ou se puder manda o dinheiro preciso pagar o galo, falta só 100$ (Id. 268533582 – p. 1.431). ÁUDIO KANDY (PAULO) para DYLON (GABRIEL): Na ativa mano véi, deixa eu falá aqui pro senhor, o senhor não tem umas 2g de galo pra me arrumá até fim de semana não? (Id. 268533582 – p. 1.433). Dessa forma, não há como prosperar a alegação defensiva de que o réu PAULO ALEXSANDER não mantinha vínculo permanente com a associação criminosa, pois os elementos constantes nos autos evidenciam, de maneira clara, que ele detinha pleno conhecimento dos objetivos ilícitos dos grupos dos quais participava ativamente, bem como estava associado com os demais corréus na prática delitiva. A participação em grupos de mensagens controlados pela facção, o conteúdo das conversas extraídas, o contato direto com outros corréus e a adesão às orientações e determinações disseminadas por membros da administração da organização, reforçam o grau de inserção consciente e funcional de PAULO ALEXSANDER na estrutura da organização criminosa, afastando, por completo, qualquer alegação de eventualidade ou desconhecimento da prática delitiva coletiva. Assim, estando confirmada a sua inserção na associação para o tráfico, impõe-se a manutenção da condenação do apelante pela prática do crime previsto no art. 35, da Lei n. 11.343/2006. (m) Do pleito da desclassificação do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 para o delito de porte de drogas para consumo pessoal (art. 28, da Lei n. 11.343/06): No que pertine ao pedido de desclassificação para o delito previsto no artigo 28, da Lei n. 11.343/06 em favor do réu PAULO ALEXSANDER, cumpre destacar que a condição de usuário não exclui, por si só, a prática do tráfico de drogas, sendo comum que o agente, para sustentar seu vício, também atue na comercialização de entorpecentes. A mera alegação de uso pessoal é insuficiente para desconstituir o crime tipificado no artigo 33 da referida lei, especialmente quando os elementos probatórios evidenciam o contrário. No caso em apreço, as provas colhidas por meio das interceptações telefônicas, além dos depoimentos colhidos em juízo demonstram a finalidade comercial dos entorpecentes apreendidos com o réu PAULO ALEXSANDER. Na data da operação policial, na residência do acusado, foram apreendidos entorpecentes (porção de maconha e cocaína), dinheiro em espécie, quatro celulares, um pote verde com resquícios de entorpecentes, além de balança de precisão, elementos que, aliados aos demais elementos probatórios produzidos em ambas as fases da persecução penal, evidenciam a destinação mercantil dos entorpecentes. Além da referida apreensão, os dados extraídos do aparelho celular de PAULO ALEXSANDER demonstram de forma contundente que ele atuava ativamente na comercialização de substâncias entorpecentes, havendo elementos probatórios que revelam conversas mantidas entre o acusado e usuários de drogas, bem como registros de controle financeiro dos entorpecentes comercializados, o que reforça o caráter comercial de sua atuação. Colaciono para melhor compreensão, elementos probatórios extraídos dos aparelhos celulares apreendidos. PAULO, em uma conversa com sua companheira JEYCE, faz o controle financeiro dos entorpecentes, registrando Feijão (maconha) e Galo (Cocaína): DEZEMBRO Neguim 675 G Patrick 50 F Thiago 50 F Sapão 50 F Testa 50 F Edilson 50 F Jherfinho 50 F Paulo André 50 F PAULO recebe mensagens de uma usuária, identificada como Alice, afirmando que estava na atividade da comercialização de cocaína: Alice: Ntv Alice: Oii Alice: ? PAULO: Oi PAULO: Quem? Alice: Sou Alice aqui do bar da cigana Transcrição do áudio de Alice: O Everton me passou o seu contato, você está na ativa do pó? PAULO: Que Everton? PAULO: Me manda o número dele? Alice: Compartilha contato de Weverton Alice: Esse Alice: O neto do seu Dimas PAULO: Btf PAULO: Tô sim (Id. 268533582 – p. 1.344) Em outra ocasião, um usuário dialoga com PAULO sobre a qualidade da cocaína: Usuário: E aí meu truta, como é que cê tá? Só de boa? Tá na ativa do galo não? Usuário: Bom em esse galo PAULO: Desse aí que você pegou aí eu não experimentei ainda não, que ele cantou hoje pra mim, agorinha vou experimentar ele uai. Vê se é top mesmo. Usuário: Bom em, suavão Usuário: Nem arde o nariz (Id. 268533582 – p. 1.349). Além dos referidos diálogos, tem-se o depoimento de Sebastião Fernando, usuário de entorpecente que, perante a autoridade policial, afirmou que já comprou drogas de várias pessoas na cidade, inclusive, relatou que já comprou também de Paulo Alexsander (Id. 268533320 – p. 413). Diante desse cenário fático-probatório, inviável acolher a tese de desclassificação do delito para a conduta prevista no art. 28, da Lei n. 11.343/06, notadamente ante aos relatórios policiais, bem como os testemunhos das autoridades públicas que gozam de presunção de credibilidade e são válidos para fundamentar a condenação, especialmente quando corroborados por outros elementos de prova. Com consignado em relação à corré SIRLEI, é cediço que tanto no crime de tráfico de drogas como no delito de porte para uso, semelhantes são os verbos nucleares dispostos nos artigos 28 e 33, da Lei 11.343/06, residindo a diferenciação entre as condutas apenas quanto à finalidade específica do agente em relação à substância, depreendendo-se da prova em qual tipo penal a conduta do acusado irá se subsumir. Não é outro o preceito contido no Enunciado Orientativo n. 03, da Jurisprudência Uniformizada da C. Turma de Câmaras Criminais Reunidas desta e. Corte de Justiça estadual, cuja redação dispõe que a condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006. (Incidente de Uniformização de Jurisprudência n. 101532/2015, DJE n. 9.998, de 11/04/2017). Importante destacar que nos termos do Enunciado Orientativo n. 07, da TCCR/TJMT, o fato de o agente não ter sido flagrado na efetiva mercancia de substâncias ilícitas não obsta a configuração do delito de tráfico de drogas, pois para a sua caracterização é prescindível prova flagrancial do comércio ilícito, bastando que a pessoa seja surpreendida praticando quaisquer das ações descritas no tipo penal, em contexto que evidencie a saciedade o seu envolvimento com o comércio legalmente proibido, porquanto se trata de tipo penal misto alternativo, cuja consumação se dá com o cometimento de quaisquer das condutas nele especificadas. A propósito, é esse o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: As instâncias ordinárias, mediante exame amplo e aprofundado do acervo probatório coligido nos autos, entenderam comprovadas a materialidade e a autoria delitivas, com amparo nos depoimentos prestados pelos policiais que efetuaram a prisão e nos laudos periciais produzidos, os quais, harmônicos e coerentes entre si, confirmaram, tanto na fase inquisitorial como no curso da instrução processual, os fatos deduzidos na exordial acusatória, atribuindo a autoria do delito do art. 33, caput, da Lei. n. 11.343/2006 ao réu, ora agravante. (...) (STJ, AgRg no HC n. 850.008/MG, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Des. convocado do TJDFT), Sexta Turma, j. em 21/05/2024, DJe de 24/05/2024). Nesse mesmo sentido colaciono o entendimento desta eg. Câmara Criminal: A condição de usuário de drogas não impede a caracterização da traficância, sendo comum àqueles que fazem uso de drogas utilizarem-se da venda não só como forma de sobrevivência no meio da criminalidade, mas também como forma de manutenção do próprio vício. 02. Em crimes praticados na clandestinidade, como o tráfico de drogas, é preciso reconhecera importância e validade dos depoimentos dos agentes do sistema de segurança pública, pois esses estão diretamente envolvidos nas regiões de traficância, com a colheita de informações de moradores e usuários de droga, que auxiliam na identificação dos responsáveis pela prática criminosa. 03. No caso, o apelante manteve em depósito entorpecentes, para fins de entrega a consumo de terceiros, o que impede a desclassificação do delito de tráfico de drogas para a infração penal do art. 28 da Lei 11.343/06 (consumo pessoal) (...) (N.U 1005024-88.2023.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, HELIO NISHIYAMA, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 07/05/2024, Publicado no DJE 10/05/2024). Posto isso, não há se falar em absolvição e nem em desclassificação do crime capitulado na denúncia para aquele previsto no art. 28, da Lei n. 11.343/06. (n) Do pleito de reconhecimento da causa de diminuição do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06): A figura do tráfico privilegiado está disposta no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, in verbis: Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: (...). § 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa (grifos meus). Nos termos do dispositivo legal, para a concessão da benesse do tráfico privilegiado se faz necessário que o agente preencha, cumulativamente, os requisitos estabelecidos na lei, sendo, portanto, primário, de bons antecedentes e não se dedicando a atividade criminosa ou integrando organização criminosa. No caso dos autos, as provas demonstraram, indene de dúvidas, a dedicação de PAULO às atividades criminosas, bem como o seu envolvimento com organização criminosa, sendo o réu, inclusive, condenado pela prática do delito de associação para o tráfico (art. 35, caput, da Lei n. 11.343/06). Nesse sentido: APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. CONDENAÇÃO. IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA. POSTULADO O RECONHECIMENTO DA CAUSA DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NOART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/06. INVIABILIDADE. APELANTE QUE SE DEDICAVA A ATIVIDADES CRIMINOSAS E INTEGRAVA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. RECURSO DESPROVIDO. Na espécie, restando comprovada que o apelante se dedicava a atividades criminosas e integrava organização criminosa, em especial, ao comércio malsão, não preenche, ele, os requisitos do art. 33, § 4°, da Lei n. 11.343/2006. Recurso desprovido. (N.U 1009273-87.2020.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, LUIZ FERREIRA DA SILVA, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 07/08/2024, Publicado no DJE 09/08/2024). (...) Para aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, o condenado deve preencher, cumulativamente, todos os requisitos legais, quais sejam, ser primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas e nem integrar organização criminosa, podendo a reprimenda ser reduzida de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), a depender das circunstâncias do caso concreto. III - Na hipótese, a quantidade e natureza da droga apreendida, aliada à existência de condenação anterior transitada em julgado por outro crime de tráfico de drogas, ostentada pelo agravante afasta a benesse pleiteada, ante o não preenchimento de um dos requisitos legais cumulativos previstos no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006. Precedentes. IV - A jurisprudência deste Tribunal é assente no sentido de que as condenações alcançadas pelo período depurador de 5 anos, previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal, afastam os efeitos da reincidência, mas não impedem a configuração de maus antecedentes. Precedentes (...) (AgRg no HC n. 762.943/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Quinta Turma, julgado em 25/10/2022, DJe de 14/11/2022). Assim, com o reconhecimento de que PAULO ALEXSANDER, na época dos fatos, integrava associação para o tráfico e sua condenação na sanção prevista no art. 35, caput, da Lei n. 11.343/06,não há se falar na aplicação da causa de diminuição do tráfico privilegiado em favor do apelante. (o) Do pleito de redução da pena de multa imposta ao réu: De maneira semelhante ao consignado ao corréu SAMUEL, a pena de multa imposta ao réu PAULO, por sua natureza patrimonial, é sanção penal prevista expressamente nos arts. 33 e 35 da Lei n. 11.343/06, sendo obrigatória e cumulativa com a pena privativa de liberdade, sem possibilidade de exclusão com base na condição financeira do réu. A fixação da multa deve observar dois momentos: a definição da quantidade de dias-multa, proporcional à pena corporal, e o valor do dia-multa, conforme a capacidade econômica do apenado, nos termos do Enunciado n. 33, das Câmaras Criminais Reunidas do TJMT. No caso concreto, a multa foi fixada em montante proporcional a pena privativa de liberdade imposta ao recorrente e no valor mínimo legal (1/30 do salário mínimo), razão pela qual o pedido defensivo de isenção ou afastamento não merece acolhida, por ausência de previsão legal para tal exclusão. Por fim, ressalto que cabe ao juízo da execução penal avaliar as condições financeiras do agente, com vista à possível suspensão da exigibilidade da cobrança da multa e custas processuais. DO RÉU GABRIEL 4.1. DO MÉRITO p) Do pleito de absolvição quanto aos crimes de associação para o tráfico e tráfico de drogas (art. 33 e art. 35, ambos da Lei 11.343/06): No que pertine ao crime de associação para o tráfico e tráfico de drogas, de forma semelhante aos demais corréus, a defesa sustenta que a condenação se baseou exclusivamente em provas obtidas a partir da extração de dados do celular da corré Sirlei, sem que houvesse produção de outras provas em contraditório judicial. Aliado a isto, afirma que não há provas concretas de que o acusado integrava organização criminosa, não ficando demonstrada a existência de animus associativo. Razão não lhe assiste. De início, adoto integralmente os fundamentos já expendidos por este juízo quando da análise da conduta do réu PAULO ALEXSANDER, no que pertine à validade das provas telemáticas constantes nos autos, especialmente no que se refere à regularidade da extração dos dados, à autorização judicial das diligências e ao respeito ao contraditório e à ampla defesa, a fim de evitar repetições desnecessárias nesta etapa da fundamentação. Assim, passo à análise da conduta do réu GABRIEL. As provas produzidas durante a persecução penal comprovam que GABRIEL estava diretamente vinculado à estrutura do tráfico de drogas na região dos municípios de Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). Durante a instrução criminal, em seus depoimentos, os policiais e investigadores relataram que GABRIEL, participava dos grupos da associação criminosa liderada por LUIZ FERNANDO e comercializava entorpecentes na companhia de sua esposa, a corré SIRLEI. As autoridades policiais, em juízo, afirmaram: Que o GABRIEL é o esposo da Sirlei, companheiro, e quando ele estava preso, a Sirlei assumiu a venda de drogas em substituição a ele. Que pelo que a gente apurou, os dois vendiam juntos, a princípio. Que o Gabriel saiu da prisão, voltou a vender, ele também faz parte desse grupo de logistas que é comandado pelo Luiz Fernando. Que no dia da operação, no dia 13/12, foi encontrado droga na casa dos dois. Que tem várias conversas, depois disso, nos celulares que foram analisados, que demonstram que ele também faz parte da organização, que ele também se reporta ao Luiz Fernando, aos demais traficantes, eles têm um sistema de apoio mútuo. Que inclusive eles são chamados de irmão. Que os demais traficantes chamam a Sirlei de cunhada, tudo isso, a gente percebe que existe essa familiaridade entre eles e ele faz parte de todas as conversas dos celulares que analisamos e em alguma medida, tem a participação dele. Apelido Gabriel é Dylon ou Dylan (Trecho das declarações da delegada Lígia – Id. 268533594- p. 1.532). Que o GABRIEL é esposo da Sirlei, ela teve o celular apreendido e na época, o Dylan tava preso, por tráfico de drogas também. Que na última operação, ele já tava solto. Que inclusive, uma equipe de policiais, encontrou droga na casa dele. Que um dos celulares que fiz a extração, tem diálogos deles conversando, falando até que comprou/entregou droga errada. Que fiz a extração do celular do Paulo Alexsander (Trecho das declarações do Investigador de Polícia Nazírio - Id. 268533594- p. 1.532). O relatório de análise n. 2023.13.40958, da Delegacia de Polícia de Guiratinga (MT), devidamente realizado após autorização judicial, foi elaborado com base em conteúdos extraídos do celular da ré SIRLEI, companheira de GABRIEL, demonstra que o apelante participava do grupo dos lojistas, chamado de Associação Comercial Industrial de Garça, este grupo destinado a tratar de assuntos relacionados ao tráfico de entorpecentes sendo gerenciado por LUIZ FERNANDO (Id. 268533367 – p. 509). Vejamos trechos diálogos extraídos do grupo no qual GABRIEL participava: Cachorro (LUIZ FERNANDO): Vcs tem o prazo pra chegar junto Cachorro (LUIZ FERNANDO): Porém fez o dinheiro antes do prazo Cachorro (LUIZ FERNANDO): Fechou a mercadoria Cachorro (LUIZ FERNANDO): Já tem que tá chegando no responsável pra estar mandando. Cachorro (LUIZ FERNANDO): Não tem que ficar em cima do dinheiro não. Cachorro (LUIZ FERNANDO): Os lojistas chegar junto com o caixinha de vcs hj Cachorro (LUIZ FERNANDO): Por gentileza Cachorro (LUIZ FERNANDO): Se atrasar vai ficar com a lojinha travada Além disso, corroborando o relatado pelas autoridades policiais, as provas nos autos comprovam que GABRIEL, além de atuar no comércio ilícito de entorpecentes com sua esposa, estava associado a LUIZ FERNANDO na prática delitiva, pois o fato de SIRLEI ser esposa de GABRIEL garantia prioridade no abastecimento, elemento comprovado pela fala do corréu HUGO que, falando com SIRLEI, diz ah, eu sei que cê é cunhada e seu povo (GABRIEL) tá preso, né mano? Tá ligado? Cantando aqui pô, já de imediato a senhora é popriedade tá ligado? O mano lá é nosso, pô (Id. 268533367 – p. 535). Se extrai do relatório policial diálogos que comprovam que GABRIEL comercializa entorpecentes de acordo com as instruções de LUIZ FERNANDO, repassando a este os lucros financeiros provenientes da atividade ilícita. Vejamos: PAULO ALEXSANDER, vulgo KANDY, menciona outro traficante conhecido por DYLAN, que se chama GABRIEL SANTOS DE OLIVEIRA, com passagens por tráfico, ele fez um acerto de drogas com BÔBO (LUIZ FERNANDO): ÁUDIO KANDY (PAULO ALEXSANDER): “AÍ MEU FEIJÃO TÁ 2, SÓ QUE CÊ TEM QUE VIM AQUI EM CASA PRA MIM TROCAR IDEIA COM CÊ PRA TE EXPLICÁ, O DYLON (GABRIEL) TE ENTREGOU UM DINHEIRO ONTEM NÃO ENTREGÔ? 370? No relatório de imagens do aparelho, constata-se um comprovante de pagamento via pix feito por GABRIEL em favor da empresa LG Estética Automotiva que, após consulta, foi constatado que o CNPJ está em nome de LUIZ FERNANDO, responsável pelo fornecimento de entorpecentes. Trago abaixo o referido comprovante: GABRIEL também mantinha contato direto com outros corréus. Conforme demonstrado pelas conversas extraídas dos aparelhos celulares apreendidos, o acusado estava envolvido na prática delitiva em articulação com outros traficantes da região, integrando a rede organizada voltada à comercialização de entorpecentes aqui investigada. Quando da análise da conduta de PAULO ALEXSANDER, há registros de conversas entre PAULO e o corréu GABRIEL, nas quais GABRIEL solicita a PAULO a conversão de valores via PIX em dinheiro em espécie. Gabriel: Zika se num tem 750 em dinheiro, tenho 750 no pix querendo trocar no rex. PAULO: Mano, só se o cê fô lá na Mônica lá e pegá, lá tem uns setecentos e pouco. PAULO, vulgo KANDY, pede entorpecentes para GABRIEL, vulgo DYLON: ÁUDIO KANDY (PAULO) para DYLON (GABRIEL): Na ativa mano véi, deixa eu falá aqui pro senhor, o senhor não tem umas 2g de galo pra me arrumá até fim de semana não? ÁUDIO DYLON (GABRIEL): Vixi, tem não hein bicho, agora eu tô quebrado, tá ligado? Só tô com a situação mesmo de pagá mesmo, pra mim pegá outro. Por fim, exsurge dos autos, ainda, conversas que comprovam que GABRIEL era um dos lojistas (traficantes) que atuava na cidade de Guiratinga (MT). Nos diálogos abaixo GABRIEL realiza venda de entorpecentes para Negão Lacoste, bem como cobra LUIZ FERNANDO o fornecimento de drogas para realizar o comércio: Negão Lacoste: Eai ntv GABRIEL: Vai lá em casa GABRIEL: Vai lá em casa pô, os filhos do Tião tá lá, minha mulher (SIRLEI) ta lá, ta de boa lá Negão Lacoste: Ela ta nativa lá? Tá com ela lá? Eu vou pedir para menino ir buscar para mim, o Luanzinho buscar para mim. Negão Lacoste: Deixa eu falar pra você, vou pedir para Luan pegar para mim a bala (cocaína) lá então, demorou? Aí, cê manda seu pix pra mim que eu já mando o pix já, aí ele já vai lá buscar, demorou? (Id. 268533584 – p. 1.460). (...). GABRIEL: 66992541682 GABRIEL: Nubank GABRIEL: Gabriel Santos (Id. 268533367 – p. 536). (...) GABRIEL manda mensagem para Thiaozinho e pede para ele perguntar ao Luiz Fernando, vulgo BOBO, que estava junto com ele, a respeito da mercadoria para ele “mexer”, que em seguida Luiz Fernando, responde através de áudio, utilizando o celular de Thiazinho, dizendo que o “galo” ele teria levado la para casa do Thião, pois GABRIEL não tinha ido buscar la na casa do Pipoca, haja vista que Pipoca não toma os cuidados necessários para guarda a droga e resolveu tirar de lá (Id. 268533584 – p. 1.466). Transcrição do áudio de GABRIEL: Fala para esse viado cade a mercadoria para mim mexer? LUIZ FERNANDO: Uai viado aquela hora eu tava aí na sua casa eu falei pro ce que a mercadoria, galo, eu levei la para casa do THIÃO, voce não foi la buscar no do PIPOCA, aí agorinha nois ta aí na rua, aí eu levo la para sua casa, porque de manhã eu achei que você ta dormindo pô, aí eu peguei de la porque PIPOCA deixa o trem no tempo aberto lá, ele ta nem aí não o bixo é doido (Id. 268533584 – p. 1.466). Posteriormente, GABRIEL cobra Thiãozinho de uma dívida no valor de R$ 250,00 em entorpecentes que ele teria pegado. GABRIEL: Zika aquele 250 de parada GABRIEL: ? Áudio de Thiãozinho: Então mano, aquele dia eu peguei 5 parada com a Branca (SIRLEI) aí, para mim devolver depois as 5, agora vocês falou que é para eu passar o dinheiro pro Dirceu. Áudio de Thiãozinho: Eu falei para ela tem como você me arrumar “5 parada” ai, porque eu não tenho nenhuma pronta la em casa, nos chegou agorinha, ai amanha adiante quando eu preparar eu trago as 5 de novo (Id. 268533584 – p. 1.465). Dessa forma, não há como prosperar a alegação defensiva de que o réu GABRIEL não mantinha vínculo permanente com a associação criminosa e que não praticava o comércio de entorpecentes, pois os elementos constantes nos autos evidenciam, de maneira clara, que o acusado detinha pleno conhecimento dos objetivos ilícitos dos grupos dos quais participava ativamente, bem como estava associado com os demais corréus na prática delitiva. Assim, impõe-se a manutenção da condenação do apelante pela prática dos crimes previstos no art. 33 e art. 35, ambos da Lei n. 11.343/2006. q) Do pleito de desclassificação do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06 para o delito de porte de drogas para consumo pessoal: A defesa do réu GABRIEL pleiteia a desclassificação do crime previsto no art. 33 da Lei n. 11.343/06 para aquele previsto no art. 28 do mesmo diploma legal. Contudo, tais alegações não merecem prosperar. De início, a fim de evitar redundâncias e reiteradas exposições, adoto integralmente os fundamentos jurídicos já expostos em relação à ré SIRLEI, especialmente no que tange à distinção entre o porte para uso e a prática do tráfico, evidenciada pela finalidade de comercialização. Passo, então, à individualização das provas que comprovam a conduta do réu GABRIEL, tendo em vista que os elementos constantes nos autos demonstram que ele e a corré Sirlei, sua companheira, atuavam de forma conjunta na comercialização de entorpecentes. Vejamos: SIRLEI cobra usuário que teria pegado R$ 100,00 de cocaína com GABRIEL: SIRLEI: Ontem na praça da bandeira se pego 100 dê galo (cocaína) com Dylon (GABRIEL). SIRLEI: Aqui e Sirlei mulher dele SIRLEI: Esse pix e chave. 6699254-1682 Nubank Gabriel Santos Sirlei encaminha mensagem para GABRIEL perguntando se ele já estava indo para casa e, em seguida, avisa GABRIEL que teria um corre de 100 de galo (cocaína) esperando (Id. 268533585 – p. 1.479). Sirlei: Ta vindo amor Sirlei: Tem um corre de 100 Sirlei: De galo (Id. 268533585 – p. 1.479).2 Sirlei e GABRIEL faziam o controle das vendas de entorpecentes através de mensagens encaminhadas para Sirlei, mensagens que continham o nome/vulgo do usuário e o valor comercializado (Id. 268533585 – p. 1.483-1.485). GABRIEL: 100 Arcie GABRIEL: LK 100 GABRIEL: Fgner 100 GABRIEL: Hrds 50 GABRIEL: Biguá 50 GABRIEL: Maci 200 GABRIEL: Percs 50 GABRIEL: Hrfs 50 GABRIEL: Biguá 50 GABRIEL: 100 LK GABRIEL: 100 Gibi GABRIEL: 50 Elne GABRIEL: Hrds 50 Por fim, repiso que na data da operação policial, na residência de GABRIEL, foram apreendidas 31 porções de substância análoga à cocaína, uma máquina de cartão, R$ 109,00 (cento e nove reais) em espécie e dois aparelhos celulares, elementos que, aliados aos demais elementos probatórios produzidos em ambas as fases da persecução penal, evidenciam a destinação mercantil dos entorpecentes. Assim, inviável a desclassificação do delito para aquele previsto no art. 28, da Lei n. 11.343/06. (r) Do pleito de reconhecimento de bis in idem entre os delitos de organização criminosa (art. 2º da Lei n. 12.850/13) e de associação para o tráfico (art. 35 da Lei n. 11.343/2006): A defesa de GABRIEL sustenta que deve ser reformada a sentença condenatória no que pertine à condenação do acusado pela prática dos crimes previstos no art. 2º, da Lei n. 12.850/13 e art. 35, da Lei n. 11.343/06, sob o fundamento da ocorrência de bis in idem, pois entende que ambos os tipos penais pelos quais GABRIEL foi condenado punem a associação de pessoas com a finalidade da prática de crimes. Não lhe assiste razão. Ao condenar GABRIEL pela prática de ambos os delitos, o juízo consignou: No tange ao acusado supramencionado, em que pese tenha negado todas as imputações em juízo, as provas colacionadas aos autos demonstram que o acusado integrava Organização Criminosa Comando Vermelho e associou-se a outros acusados para o cometimento do tráfico de drogas. Nessa linha, salienta-se que em razão da natureza das ações do réu, o delito tipificado no art. 2° da Lei 12.850/2013 não pode ser absorvido pelo crime do art. 35 da Lei Antidrogas, na medida em que as condutas se constituíram de forma autônoma e o acusado não participou unicamente do tráfico de drogas. No relatório de extração de id 166028916- fls.77 e ss., ficou suficientemente demonstrado que o acusado participava de um grupo de WhatsApp autodenominado “Energisa”, o qual, além das mensagens referentes ao tráfico de drogas, vislumbram-se conversas encaminhas por outros integrantes referentes ao estatuto da Organização e ideologias da empreitada criminosa, logo, sendo o increpado participante do referido grupo, comprova-se seu animus associativo para integrar a Orcrim, vejamos: Com efeito, na hipótese de ficar evidenciado que um agente integrou a organização criminosa Comando Vermelho com intuito único de comercializar entorpecentes, valendo-se da ORCRIM como meio necessário para se associar a outros agentes para traficar, é possível a absorção de um delito pelo outro, dada a comprovada relação de meio e fim entre ambos, aplicando-se, para tanto, o chamado princípio da consunção. Todavia, uma vez comprovado que o agente possui animus associativo tanto para o tráfico de drogas – configurando-se, assim, o delito do art. 35 da Lei 11.343/2006 – quanto para integrar a organização criminosa e se dedicar a ela por outras razões e com outros objetivos, ambos os crimes subsistem de forma independente e não há falar em bis in idem pela dupla imputação. Acertada a decisão de origem. Sobre o tema, a jurisprudência do STJ é no sentido de que não há bis in idem na condenação pela prática do crime de organização criminosa e associação para o tráfico, quando há indicação da prática autônoma das referidas infrações (...). (STJ - AgRg no AREsp: 2673259 AL 2024/0224566-2, Relator.: Ministro RIBEIRO DANTAS, Data de Julgamento: 10/09/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/09/2024). No mesmo sentido, este Sodalício entendeu: Não há bis in idem pela condenação do apelante tanto por organização criminosa quanto por associação para o tráfico de drogas, diante da pluralidade de vínculos associativos, em diferentes contextos fáticos e com condutas distintas. O c. STJ firmou entendimento de que é possível a imputação de organização criminosa e associação para o tráfico de drogas, sem que configure bis in idem, por serem “tipos penais autônomos” (AgRg no HC 491153/SC; AgRg no AREsp: 1593941/TO). (TJ-MT - APELAÇÃO CRIMINAL: 10114435020228110042, Relator.: MARCOS MACHADO, Data de Julgamento: 20/08/2024, Primeira Câmara Criminal, Data de Publicação: 26/08/2024). No caso dos autos, como bem pontuado pelo juízo, GABRIEL, além de se associar aos corréus para prática o comércio ilícito de entorpecentes, participava de grupos da organização criminosa Comando Vermelho. Exsurge do relatório policial que GABRIEL integrava um grupo de WhatsApp no qual, além da disseminação do estatuto da facção criminosa Comando Vermelho entre os seus “irmãos” — como se autodenominavam os participantes —, foram registradas cobranças de que os participantes estivessem em sintonia com os comandos repassados pela Diretoria, bem como realizassem o monitoramento da atividade policial. Colaciono trecho dos diálogos: Portanto, além de se associar aos corréus para a prática do crime de tráfico de drogas, ficou comprovado que GABRIEL também integrava, de forma autônoma e em contexto distinto, a facção criminosa Comando Vermelho. As provas constantes nos autos demonstram que o réu participava de grupos de WhatsApp vinculados à organização, nos quais a liderança da facção não apenas transmitia ordens operacionais relativas ao tráfico, mas também disseminava o estatuto interno da organização e esclarecia regras de conduta e disciplina aos denominados irmãos. Assim, GABRIEL não apenas colaborava na mercancia de entorpecentes, mas também aderiu, de forma consciente, à estrutura hierárquica, à ideologia e ao funcionamento autônomo da facção criminosa, configurando-se, assim, o crime previsto no art. 2º, § 3º, da Lei n. 12.850/2013. DO RÉU LUIZ FERNANDO 5.1. DO MÉRITO De início, registro que a defesa de LUIZ FERNANDO expõe que o recorrente foi condenado nos seguintes termos: 1. 05 (cinco) anos, 07 (sete) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e ao pagamento da pena de multa em 15 (quinze) dias-multa, pela prática do crime previsto no art. 2º, § 3º, da lei n. 12.850/2013; 2. 05 (cinco) anos de reclusão e ao pagamento de 500 dias-multa pela prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06; e 3. 03 (três) anos de reclusão e ao pagamento de 700 (setecentos) dias-multa pela prática do crime previsto no art. 35, caput, da Lei n. 11.343/06. Aplicado o concurso material de crimes, LUIZ FERNANDO foi condenado a pena total de 13 (treze) anos, 07 (sete) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, além do pagamento de 1.215 (mil duzentos e quinze) dias-multa. Em razão disso e do manifesto desejo do réu em recorrer da sentença condenatória, a defesa alega que a decisão deve ser reformada com base nas argumentações a seguir expostas. Portanto, passo à análise. (s) Do pleito da absolvição quanto ao crime de organização criminosa (art. 2º, § 3º, da Lei 12.850/2013): Neste ponto, em síntese, a defesa sustenta que a denúncia, ao imputar ao réu LUIZ FERNANDO a conduta prevista no art. 2º, § 3º, da Lei 12.850/2013, por supostamente integrar a facção Comando Vermelho, fundamentou-se em provas colhidas no âmbito de investigação sobre tráfico de entorpecentes nas regiões de Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). Alega que não ficou demonstrada nos autos qualquer conduta específica capaz de se amoldar ao tipo penal previsto no referido dispositivo legal. Afirma que os elementos probatórios, apesar de indicarem a prática dos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico, não são suficientes para embasar a condenação do apelante pela participação na organização criminosa descrita no art. 2º, § 3º, da Lei 12.850/2013, especialmente porque o relatório policial não apresenta qualquer elemento concreto que comprove a vinculação de LUIZ FERNANDO à facção Comando Vermelho. Não assiste razão à defesa. Ao condenar LUIZ FERNANDO pela prática de ambos os delitos, o juízo consignou: Diante do acervo probatório que pesa contra o acusado, restou suficientemente comprovado que o réu integra Organização Criminosa Comando Vermelho, exerce a função de liderança e associou-se a outros indivíduos para praticar o delito de tráfico de drogas, assim como incorreu na prática do crime previsto no art. 33 da Lei de Drogas. Nessa linha, salienta-se que em razão da natureza das ações do réu e da posição que este ocupa na organização criminosa, o delito tipificado no art. 2° da Lei 12.850/2013 não pode ser absorvido pelo crime do art. 35 da Lei Antidrogas, na medida em que as condutas se constituíram de forma autônoma e o acusado não participou unicamente do tráfico de drogas. Com efeito, na hipótese de ficar evidenciado que um agente integrou a organização criminosa Comando Vermelho com intuito único de comercializar entorpecentes, valendo-se da ORCRIM como meio necessário para se associar a outros agentes para traficar, é possível a absorção de um delito pelo outro, dada a comprovada relação de meio e fim entre ambos, aplicando-se, para tanto, o chamado princípio da consunção. Todavia, uma vez comprovado que o agente possui animus associativo tanto para o tráfico de drogas – configurando-se, assim, o delito do art. 35 da Lei 11.343/2006 – quanto para integrar a organização criminosa e se dedicar a ela por outras razões e com outros objetivos, ambos os crimes subsistem de forma independente e não há falar em bis in idem pela dupla imputação (Id. 268533653). Acertada a decisão de origem. Apesar de a defesa sustentar que as provas apresentadas são insuficientes para a condenação do apelante pela integração à facção Comando Vermelho, tal alegação não merece prosperar, pois o conjunto probatório carreado aos autos demonstra, de forma clara e inequívoca, a participação efetiva de LUIZ FERNANDO na organização criminosa. No caso dos autos, como pontuado pelo juízo, LUIZ FERNANDO, além de se associar aos corréus para prática o comércio ilícito de entorpecentes, participava e liderava grupos da organização criminosa Comando Vermelho. Exsurge dos relatórios policiais que o réu exercia função de liderança dentro da organização criminosa Comando Vermelho, atuando como figura central na gerência das atividades ilícitas na região. Também, constata-se que LUIZ FERNANDO não apenas coordenava o comércio de entorpecentes, mas tambémcobrava sistematicamente os traficantes subordinados pelos repasses dos valores arrecadados em razão da atividade criminosa, os chamados “caixas” ou “camisas”. Além disso, era dele a incumbência de determinar e cobrar que os integrantes da facçãomonitorassem constantemente as atividades das forças de segurança pública, incluindo a circulação de viaturas, operações e movimentações suspeitas na cidade— conduta típica de facções com atuação estruturada e disciplinada. No exercício do domínio sobre a organização, LUIZ FERNANDO também era responsável pela aplicação das chamadas “disciplinas internas” ou “salves”, castigos físicos impostos àqueles que violavam as normas internas da facção. Como exemplo, há nos autos registros de diálogo onde alguns traficantes afirmam que LUIZ FERNANDO iria matar a traficante Mônica, circunstância que evidencia sua autoridade para determinar represálias dentro da estrutura criminosa, conforme a lógica punitiva típica das organizações como o Comando Vermelho. Vejamos: Neste ponto, o relatório policial registra: Nesta conversa, ELAINE envia mensagem para TIAO perguntado: “UAI PQ O BOBO VAI MATAR A MÔNICA?”. ELAINE quando menciona a pessoa conhecida como “BOBO” ela faz referência a LUIZ FERNANDO BARROS REZENDE, que exerce função de liderança do “COMANDO VERMELHO” na cidade de Guiratinga. Já MÔNICA é conhecida por essa Delegacia como sendo uma usuária e traficante de droga nesta cidade, e que conforme pode perceber na mensagem “BOBO” iria matar MÔNICA. ELAINE, faz outro questionamento a TIAO em outra mensagem: “JA FALOU PRO BOBO DO LEANDRINHO” “??” “DO PÓ VIRADO”. Podemos perceber que “BOBO”, é pessoa muito influente no Tráfico de Drogas em Guiratinga, há vista que a gíria usada “PÓ VIRADO”, é a adição de ácido bórico e outras substâncias ao crack, para ser usado por viciados em cocaína, como forma de baratear o custo, pois a cocaína tem custo mais elevado, e que conforme percebe-se na mensagem Thiao iria levar esse fato ao conhecimento de “BOBO”, pois não permitem o “PÓ VIRADO” (Id. 268533586 – p. 1.494). Importante destacar, ainda, as declarações das autoridades policiais que participaram das investigações e da operação, sob o crivo do contraditório, as quais confirmaram a liderança e a participação ativa de Luiz Fernando na facção Comando Vermelho, assim como a utilização de sua residência e de seus aparelhos telefônicos para coordenar as atividades criminosas (Trechos das declarações da delegada Lígia Pinto da Silveira Avelar e do investigador Nazírio Ribeiro de Matos Junior, Id. 268533594- p. 1.532). Neste ponto, as testemunhas relataram: Que não eram todos os traficantes que poderiam vender todas as drogas. Que nós vimos, pela análise do celular da Sirlei, que o Luiz Fernando era o responsável por ser o disciplina do Comando Vermelho, ele aplicava os salves do Comando, naqueles que não pagavam a mensalidade, aquilo que eles chamam de camisa, né? Que esses salves, muitas vezes eram aplicados na casa da Elaine. Que a casa era utilizada tanto para os salves como para a entrega de droga. Que, pelo que me recordo, o Luiz Fernando era sempre ajudado pelo Luiz Gustavo Modesto e os demais, que integravam o grupo, além de se reportarem ao Luiz Fernando, eram responsáveis pelo tráfico na cidade (...). Que o Luiz Fernando participa, ainda, desse grupo Energisa. Que tomamos conhecimento desse grupo depois da apreensão desses telefones. Que é um grupo voltado para monitorar a atuação da polícia civil e militar da Cidade de Guiratinga (MT). Que, então, é um grupo que eles comentam que tem viatura diferente na cidade, que tem uma viatura descaracterizada na porta de um dos traficantes. Que o plantão militar é o do policial Cristiano, por exemplo. Que tem viatura da Polícia Militar, da Força Tática em Guiratinga. Que é um grupo específico para monitoramento das ruas da cidade, da movimentação da polícia. Que o Luiz Fernando participa de um grupo chamado Diretoria que, salvo engano, esse grupo é para controle da venda, da porcentagem, dos valores repassados pelos traficantes. Que são encaminhados para um líder, que é chamado de véio, entre eles, que é o Gilmar e, também, para troca de fotos de pessoas que são juradas de morte pela facção e controle das finanças na cidade (...). Que tudo isso tá no celular do Luiz Fernando, esse controle financeiro, tanto da venda de cigarros, apreensão de cigarros, tem fotos de cigarros apreendidos pelos faccionados e são repassados para ele. Que tanto a venda de cigarro quanto o percentual de jogos é repassado para ele. Que ele que faz o controle financeiro disso aí. Que o apelido do Luiz Fernando é bobo (...). Que havia de doação de cestas básicas, o Luiz Gustavo ajuda o Luiz Fernando (...). Que a entrega de cestas é uma atividade corriqueira da organização e o Luiz Gustavo participava, ajudava a entregar. Que se eu não me engano, na casa do Luiz Fernando foi localizado comprovante, nota fiscal das cestas. Que é uma atividade que eles continuam exercendo (...). Que tinha um controle de quem ia ser beneficiado. Que teve uma testemunha que falou, é porque na verdade, o Luiz Fernando falou que as cestas eram para ser vendidas. Mas, uma pessoa que recebeu a cesta falou que eles, de fato, estavam doando as cestas. Que não tinha uma razão específica para fazer essa caridade (...). Que é uma atividade que é fomentada pelo Comando, tanto para cooptar mais pessoas, como ajudar a família daqueles que estão presos (Id. 268533594- p. 1.532). No mesmo sentido, o investigador de polícia Nazírio, em juízo, afirmou: Que a equipe, que eu me lembro, que quando eles cumpriram mandado na casa do Luiz Fernando, o próprio Luiz Fernando confessou para eles que era integrante da facção. Que eu me lembro de cartões, cartela de bingo, celulares, drogas não lembro de ser apreendida. Que a questão de drogas, a função era mais o gerenciamento (...). Lá era possível notar que o Luiz Fernando ele era o administrador, ele repassava as ordens, cobrava os caixas/logistas. Que ele cobrava o dinheiro do tráfico. Que teve testemunhas que falaram ter sofrido salve, uma forma de castigo deles, aplicado pelo Luiz Fernando (Id. 268533594- p. 1.532). Esses elementos, somados aos diversos diálogos em que os demais integrantes se referem a Luiz Fernando como liderança e executor de ordens superiores — já exaustivamente apresentados nos autos e devidamente consignados neste voto —, demonstram, de forma clara e inafastável, o seu papel de comando e a sua vinculação direta à facção criminosa, nos termos do art. 2º, § 3º, da Lei n. 12.850/2013. Por fim, não restou apresentada qualquer prova capaz de desconstituir o quadro probatório robusto que embasa a condenação do réu. A defesa limitou-se a alegações genéricas e meras negativas, sem aportar elementos capazes de infirmar as evidências reunidas, o que reforça a suficiência das provas para manutenção da condenação. Portanto, entendo que as condenações foram lastreadas nas provas colhidas durante as fases policial e judicial, submetidas ao crivo do contraditório e ampla defesa, de maneira que não há espaço para se falar em insuficiência probatória. A sentença prolatada muito bem identifica e correlaciona que os crimes perpetrados estão interligados e foram coordenados por lideranças de facção criminosa, o que se evidenciam do acervo probatório, em especial as mensagens degravadas/extraídas, mediante autorização judicial, dos aparelhos celulares apreendidos. Veja que o Enunciado n. 8, da TCCR/TJMT ao dispor que “os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal” (Incidente de Uniformização de Jurisprudência n. 101532/2015, disponibilizado no DJe n. 9998, de 11/04/2017, publicado em 12/04/2017), confere a idoneidade a referida prova encartada nos autos. Diante desse quadro tem-se que a tese defensiva de absolvição se releva isolada e completamente dissonante do acervo probatório constantes nos autos, sendo que o prints de conversas extraídos dos celulares apreendidos, e os depoimentos colhidos e ratificados em juízo todos em consonância com acervo probatório carreados nos autos atentam a idoneidade da prova obtida a sustentar o edito condenatório. A propósito: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. ALEGADA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7/STJ. IMPOSSIBILIDADE. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS CORROBORADOS POR OUTROS ELEMENTOS DE PROVAS. VALOR PROBANTE. OFENSA AO ART. 155 DO CPP. NÃO CONFIGURADA. CONDENAÇÃO LASTREADA EM ELEMENTOS SUBMETIDOS AO CRIVO DO CONTRADITÓRIO JUDICIAL. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...). 3. Ademais, conforme asseverado pelas instâncias ordinárias, a prática do delito pelo recorrente foi devidamente comprovada por elementos de prova colhidos na fase investigativa, e corroborados pela prova testemunhal colhida na fase judicial, circunstância que afasta a alegada violação do art. 155, do CPP. 4. Outrossim, é pacífica a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça no sentido de que os depoimentos prestados por policiais têm valor probante, na medida em que seus atos são revestidos de fé pública, sobretudo quando se mostram coerentes e compatíveis com os demais elementos de prova dos autos, e ausentes quaisquer indícios de motivos pessoais para a incriminação injustificada do investigado, como na espécie. Precedentes. 5. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no AREsp: 1997048 ES 2021/0336495-0, Rel. Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, j. em 15/02/2022, T5 - Quinta Turma, Data de Publicação: DJe 21/02/2022) (grifos meus). APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE ENTORPECENTES E ORGANIZAÇÃO CRIMONOSA - CONDENAÇÃO NAS SANÇÕES DO ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/06 E ART. 2º DA LEI N. 12.850/2013 - PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO DO DELITO DE INTEGRAR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA - IMPOSSIBILIDADE - TESTEMUNHOS DE AGENTES POLICIAIS SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO - RELATÓRIOS DO NÚCLEO DE INTELIGÊNCIA - DIÁLOGOS EXTRAÍDOS DE APARELHO CELULAR - SENTENÇA MANTIDA - BENESSES DO TRÁFICO PRIVILEGIADO - NÃO INCIDÊNCIA - CONDENAÇÃO PELO DELITO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA - RECURSO IMPROVIDO, EM CONSONÂNCIA AO PARECER MINISTERIAL. Os testemunhos de agentes policiais gozam de presunção de credibilidade e são válidos para fundamentar a condenação, mormente quando colhidos sob o crivo do contraditório. Os diálogos extraídos do aparelho celular, os relatórios do Núcleo de Inteligência e as declarações dos policiais que realizaram as investigações, sob o crivo do contraditório, revelam que o apelante integra organização criminosa no Estado de Mato Grosso denominada Comando Vermelho de forma estruturalmente ordenada, exercendo o comércio de drogas, além da função de cobrar dos demais integrantes o devido cumprimento do ‘código/regimento criminoso’. A condenação concomitante pelo crime tipificado no art. 2ª da Lei 13.850/2013, inviabiliza o reconhecimento do tráfico privilegiado. (TJMT - APELAÇÃO CRIMINAL: 0004900-07.2019.8.11.0025, Relator: Des. PAULO DA CUNHA, Primeira Câmara Criminal, j. em 26/03/2024, Data de Publicação: 27/03/2024) (grifos meus). Diante desse conjunto probatório consistente, não há como acolher a alegação de insuficiência de provas quanto ao crime de associação criminosa em relação ao acusado LUIZ FERNANDO. (t) Do pleito da absolvição quanto aos crimes de associação para o tráfico e tráfico de drogas (art. 33 e art. 35, ambos da Lei 11.343/06): No que pertine ao crime de associação para o tráfico e tráfico de drogas, de forma semelhante aos demais corréus, a defesa sustenta que a condenação se baseou exclusivamente em provas obtidas a partir da extração de dados do celular da corré Sirlei, sem que houvesse produção de outras provas em contraditório judicial. Aliado a isto, afirma que não há provas concretas de que o acusado integrava organização criminosa, não ficando demonstrada a existência de animus associativo. Razão não lhe assiste. De início, adoto integralmente os fundamentos já expendidos por este juízo quando da análise da conduta do réu PAULO ALEXSANDER e GABRIEL, no que pertine à validade das provas telemáticas constantes nos autos, especialmente no que se refere à regularidade da extração dos dados, à autorização judicial das diligências e ao respeito ao contraditório e à ampla defesa, a fim de evitar repetições desnecessárias nesta etapa da fundamentação. Assim, passo à análise da conduta do réu LUIZ FERNANDO. As provas produzidas durante a persecução penal comprovam que LUIZ FERNANDO estava diretamente vinculado à estrutura do tráfico de drogas na região dos municípios de Guiratinga (MT) e Tesouro (MT). Durante a instrução criminal, em seus depoimentos, os policiais e investigadores relataram que LUIZ FERNANDO liderava os grupos da associação criminosa e era para quem os lojistas, traficantes, eram subordinados. A delegada Lígia, em juízo, afirmou: Que no decorrer das investigações, nós verificamos, principalmente da análise desse celular da Sirlei, que o líder do grupo era o Luiz Fernando. Que o grupo era voltado para controlar a venda da droga, a chegada da droga em Guiratinga, a divisão dessa droga e a entrega para cada boca de fumo, como se diz, para cada lojista, é o termo que eles utilizavam. Que era voltado, também, para controlar a movimentação da polícia na cidade, era um grupo em que percebemos uma hierarquia, o Luiz Fernando era responsável tanto pela cobrança, como pela liberação da droga. Que não era qualquer traficante que ele aceitava vender todos os tipos de droga (...). Que o Gabriel saiu da prisão, voltou a vender, ele também faz parte desse grupo de logistas que é comandado pelo Luiz Fernando. Que no dia da operação, no dia 13/12, foi encontrado droga na casa dos dois. Que tem várias conversas, depois disso, nos celulares que foram analisados, que demonstram que ele também faz parte da organização, que ele também se reporta ao Luiz Fernando, aos demais traficantes, eles têm um sistema de apoio mútuo. Que inclusive eles são chamados de irmão (...). Que ele participa também do grupo dos logistas, que o Luiz Fernando é administrador. Que Paulo participa do grupo salvar, que é só ele e a esposa dele para controle financeiro da venda de drogas. Que consta quem está devendo, para quem eles têm que entregar drogas. Que ele participa do grupo os apocalípticos, que serve para monitorar as atividades da polícia na cidade. Que ele era vinculado ao Luiz Fernando (Id. 268533594- p. 1.532). Como consignado em tópico anterior, o relatório de análise n. 2023.13.40958, da Delegacia de Polícia de Guiratinga (MT), devidamente realizado após autorização judicial, foi elaborado com base em conteúdos extraídos do celular da ré SIRLEI, demonstra que o LUIZ FERNANDO era o responsável por dar as orientações nos do grupo dos lojistas, chamado de Associação Comercial Industrial de Garça (Id. 268533367 – p. 509-). Vejamos trechos de diálogos extraídos do grupo no qual LUIZ FERNANDO repassava as informações: Cachorro (LUIZ FERNANDO): Vcs tem o prazo pra chegar junto Cachorro (LUIZ FERNANDO): Porém fez o dinheiro antes do prazo Cachorro (LUIZ FERNANDO): Fechou a mercadoria Cachorro (LUIZ FERNANDO): Já tem que tá chegando no responsável pra estar mandando. Cachorro (LUIZ FERNANDO): Não tem que ficar em cima do dinheiro não (Id. 268533367 – p. 512). Cachorro (LUIZ FERNANDO): Os lojistas chegar junto com o caixinha de vcs hj Cachorro (LUIZ FERNANDO): Por gentileza Cachorro (LUIZ FERNANDO): Se atrasar vai ficar com a lojinha travada (Id. 268533367 – p. 520). Além disso, corroborando o relatado pelas autoridades policiais, as provas nos autos comprovam que os corréus comercializavam entorpecentes de acordo com as instruções de LUIZ FERNANDO, repassando a este os lucros financeiros provenientes da atividade ilícita. Vejamos: PAULO ALEXSANDER, vulgo KANDY, menciona outro traficante conhecido por DYLAN, que se chama GABRIEL SANTOS DE OLIVEIRA, com passagens por tráfico, ele fez um acerto de drogas com BÔBO (LUIZ FERNANDO): ÁUDIO KANDY (PAULO ALEXSANDER) PARA LUIZ FERNANDO: “AÍ MEU FEIJÃO TÁ 2, SÓ QUE CÊ TEM QUE VIM AQUI EM CASA PRA MIM TROCAR IDEIA COM CÊ PRA TE EXPLICÁ, O DYLON (GABRIEL) TE ENTREGOU UM DINHEIRO ONTEM NÃO ENTREGÔ? 370? (Id. 26853358 – p. 1.392) No relatório de imagens do aparelho, constata-se um comprovante de pagamento via pix feito por GABRIEL, corréu, em favor da empresa LG Estética Automotiva que, após consulta, foi constatado que o CNPJ está em nome de LUIZ FERNANDO, responsável pelo fornecimento de entorpecentes. Novamente, trago abaixo o referido comprovante: Portanto, não há como prosperar a alegação defensiva de que o réu LUIZ FERNANDO não mantinha vínculo permanente com a associação criminosa e que não praticava o comércio de entorpecentes, pois os elementos constantes nos autos evidenciam, de maneira clara, que o acusado detinha pleno conhecimento dos objetivos ilícitos dos grupos dos quais participava ativamente, bem como estava associado com os demais corréus na prática delitiva sendo o responsável, inclusive, pelo abastecimento dos pontos de venda. De forma análoga ao consignado quando da análise da conduta da corré ELAINE, o fato de não ter sido apreendidos entorpecentes com LUIZ FERNANDO não é capaz de afastar a condenação pela prática do crime de tráfico de drogas. Isto porque, com os corréus SIRLEI, PAULO ALEXSANDER, DOUGLAS e SAMUEL, traficantes, inclusive, subordinados a LUIZ FERNANDO, foram apreendidos porções de entorpecentes, além de outros apetrechos costumeiramente utilizados para a prática do crime de tráfico de drogas (Id. 268533304 – p. 349-352); Portanto, o conjunto probatório dos autos evidencia que a situação do réu LUIZ FERNANDO também se amolda à tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, consolidada no Informativo de Jurisprudência n. 21, Edição Extraordinária do dia 30/04/2024, no sentido de que para a caracterização do crime de tráfico de drogas basta que, evidenciado o liame subjetivo entre os agentes, haja a apreensão de drogas com apenas um deles para que esteja evidenciada a prática do delito. Assim, impõe-se a manutenção da condenação do apelante pela prática dos crimes previstos no art. 33 e art. 35, ambos da Lei n. 11.343/2006. (u) Do pleito de reconhecimento da absorção do crime de organização criminosa pelo delito de associação para o tráfico: A tese defensiva de absorção do crime de organização criminosa (art. 2º, da Lei n. 12.850/2013) pelo delito de associação para o tráfico (art. 35, da Lei n. 11.343/2006) não merece prosperar. Como já consolidado pela jurisprudência pátria e aqui consignado, trata-se de tipos penaisautônomos, com núcleos típicos e elementares distintas, que não se confundem nem se excluem mutuamente. Como consignado quando da análise do pedido do corréu GABRIEL, a jurisprudência do STJ é no sentido de que não há bis in idem na condenação pela prática do crime de organização criminosa e associação para o tráfico, quando há indicação da prática autônoma das referidas infrações (...). (STJ - AgRg no AREsp: 2673259 AL 2024/0224566-2, Relator.: Ministro RIBEIRO DANTAS, Data de Julgamento: 10/09/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/09/2024). No mesmo sentido, este Sodalício entendeu: Não há bis in idem pela condenação do apelante tanto por organização criminosa quanto por associação para o tráfico de drogas, diante da pluralidade de vínculos associativos, em diferentes contextos fáticos e com condutas distintas. O c. STJ firmou entendimento de que é possível a imputação de organização criminosa e associação para o tráfico de drogas, sem que configure bis in idem, por serem “tipos penais autônomos” (AgRg no HC 491153/SC; AgRg no AREsp: 1593941/TO). (TJ-MT - APELAÇÃO CRIMINAL: 10114435020228110042, Relator.: MARCOS MACHADO, Data de Julgamento: 20/08/2024, Primeira Câmara Criminal, Data de Publicação: 26/08/2024). No caso concreto, está plenamente comprovado que LUIZ FERNANDO, além de se associar com outros indivíduos para a prática do crime de tráfico de drogas — em típica atuação voltada à divisão de tarefas e estabilidade de funções no comércio de entorpecentes —,também integrava, em contexto distinto e com objetivos mais amplos, a facção criminosa Comando Vermelho, exercendo papel de liderança regional. A sua atuação extrapolava em muito os limites da associação voltada exclusivamente ao tráfico, como restou evidenciado pelas provas coligidas nos autos. LUIZ FERNANDO aplicava punições internas salves, gerenciava a logística da entrega e distribuição de cestas básicas como forma de cooptação social, exigia o pagamento das “camisas” (contribuições mensais dos membros), repassava ordens à base e determinava a conduta dos membros hierarquicamente inferiores, mantendo rígido controle disciplinar conforme as diretrizes internas da facção. Assim, evidenciado que as condutas atribuídas ao réu revelamduas frentes de atuação distintas, com elementos próprios e autônomos — uma voltada à associação estável para o tráfico de entorpecentes e outra voltada à integração e comando de organização criminosa de abrangência estadual e nacional —, impõe-se o afastamento da alegada absorção, coma manutenção da condenação pelos dois delitos. Para terminar, cumpre ressaltar que o presente caso possui certo grau de complexidade, envolvendo múltiplos acusados e uma vasta gama de provas reunidas no curso da investigação criminal. As evidências foram obtidas, em grande parte, por meio da extração de dados telemáticos dos aparelhos celulares dos réus, autorizadas judicialmente, as quais revelaram a existência de uma estrutura organizada e funcional destinada à prática reiterada do comércio ilícito de entorpecentes, com a atuação coordenada de diversos agentes em diferentes níveis hierárquicos. Ademais, parte dos apelantes não apenas integrava a associação voltada ao tráfico, mas também participava, de modo autônomo, de organização criminosa estruturada, com vínculo direto com a facção Comando Vermelho. Tais provas, embora inicialmente produzidas na fase inquisitorial, foram devidamente corroboradas e ampliadas durante a instrução criminal, especialmente pelos depoimentos firmes, coesos e circunstanciados prestados pelas autoridades policiais responsáveis pelas diligências. Nesse sentido, em plena consonância com o Enunciado Orientativo n. 8 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, os elementos probatórios colhidos mostram-se idôneos e suficientes para sustentar as condenações impostas, evidenciando de forma clara, concreta e específica a prática criminosa perpetrada pelos apelantes. Inviável, portanto, qualquer alegação de insuficiência probatória. Também registro que no presente voto realizei a análise de forma individualizada a conduta de cada um dos réus, de modo a garantir a adequada valoração do conjunto probatório com base nos princípios do contraditório e da ampla defesa. Com todas essas considerações, em dissonância com o parecer ministerial, NEGO PROVIMENTO aos recursos interpostos por Douglas Rodrigues Da Silva, Elaine Da Matta Souza, Paulo Alexsander Dos Santos Cardoso, Gabriel Santos De Oliveira, Luiz Fernando Barros Rezende E Sirlei Aparecida Valério e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por SAMUEL VICTOR RODRIGUES DA SILVA, impondo-lhe a pena privativa de liberdade de 9 anos e 1 mês de reclusão, bem como ao pagamento de 1.433 (mil, quatrocentos e trinta e três) dias-multa. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025
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