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Processo nº 1006027-28.2021.8.11.0013

ID: 322800882

Tribunal: TJMT Órgão: 3ª VARA DE PONTES E LACERDA Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 1006027-28.2021.8.11.0013

Data de Disponibilização: 11/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

GILSON MARCOS RODRIGUES

Sentença

Advogados:

MARIO ALCIDES SAMPAIO E SILVA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 3ª VARA DE PONTES E LACERDA Processo: 1006027-28.2021.8.11.0013 AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: GILSON MARCOS RODRIGUES SENTENÇA 1. R… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 3ª VARA DE PONTES E LACERDA Processo: 1006027-28.2021.8.11.0013 AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: GILSON MARCOS RODRIGUES SENTENÇA 1. RELATÓRIO O Ministério Público do Estado de Mato Grosso, no uso de suas atribuições legais e constitucionais, ofereceu denúncia em desfavor de GILSON MARCOS RODRIGUES, atribuindo-lhe a prática da conduta assim descrita: “Extrai-se dos autos de inquérito policial que, a ofendida Barbara Manetti Senhorinho Rampanelli, na qualidade de advogada, representou Oscar Lopes de Oliveira e Cecilia Rakel Borges dos Reis em uma Ação Judicial1 em desfavor de Jenivaldo Ferreira Da Silva, Maria Ivete Da Silva, Juliana Martins De Oliveira e do denunciado Gilson Marcos Rodrigues. Com efeito, a ação foi julgada procedente, sendo que a ofendida receberia o valor de R$ 110.861,00 (cento e dez mil oitocentos e sessenta e um reais) na forma de pagamento de Honorários Sucumbenciais. Nesse sentido, como medida judicial, o juízo ordenou o bloqueio de parte do referido valor na conta bancária do denunciado Gilson Marcos Rodrigues. Gilson Marcos Rodrigues, então, no dia 14 de outubro de 2021, dirigiu-se até o escritório de advocacia da ofendida Barbara Manetti Senhorinho Rampanelli e passou a proferir ameaças contra esta, dizendo: “que faria picadinho e se queria conhecer Jesus, e se tivesse mais qualquer bloqueio na conta dele ou da esposa, voltaria com tudo no escritório”. Além disso, no dia 15 de outubro de 2021, durante o período matutino, o increpado Gilson Marcos Rodrigues dirigiu-se até o estabelecimento comercial do sogro da ofendida, dizendo a este que a ofendida deveria parar com o processo, se não terminaria de um jeito que não seria legal, outrossim, proferiu ofensas verbais e palavras de baixo calão. Por fim, frisa-se que, a ofendida Barbara Manetti Senhorinho Rampanelli e a parte credora da referida ação judicial realizaram um acordo extrajudicial com as partes devedoras, dentre elas, o denunciado Gilson Marcos Rodrigues, ao passo que este, posteriormente, pagou o valor referente aos honorários de sucumbência”. Agindo assim, o Ministério Público denunciou o réu como incurso nas sanções penais do artigo 344 do Código Penal. A denúncia foi recebida no dia 12 de agosto de 2023. O denunciado foi regularmente citado (mov. 25.1) e apresentou resposta à acusação (mov. 26.1). Face à ausência de quaisquer das hipóteses previstas no artigo 397 do CPP, afastou-se a possibilidade de absolvição sumária, sendo então designada audiencia de instrução (mov. 37.1). Duante a instrução do processo foi ouvida a vítima Barbara Manetti Senhorinho Rampanelli, Ary Santa Catarina, Wesllen Rampanelli Santa Catarina e realizado o interrogatório do réu. O Ministério Público, em alegações finais, aduziu que as provas ilustraram a autoria e a materialidade delitiva, posicionando-se, assim, pela condenação do réu nas sanções do artigo 344 do Código Penal. Ao seu turno, o acusado, na mesma fase processual, requereu a aplicação da confissão espontânea, primariedade, fixação de pena mínima e substituição da pena. Vieram conclusos para sentença. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de ação penal pública incondicionada, pela qual o Ministério Público atribui ao acusado Gilson Marcos Rodrigues a prática do crime de coação no curso do processo, previsto no artigo 344 do Código Penal. A presente Ação Penal Pública transcorreu normalmente, não havendo irregularidades a serem sanadas ou nulidades a serem declaradas. Sendo assim, pelo que presentes as condições da ação e seus pressupostos processuais, passo à análise do mérito. A materialidade do delito é inconteste e vem delineada no procedimento investigatório criminal (id. 70585510) e prova oral produzida nos autos. Da mesma forma, a autoria é certa e recai sobre o denunciado, tal como se apura em especial pela prova oral produzida em juízo sob o crivo do contraditório. A vítima Barbara Manetti Senhorinho Rampanelli, em juízo, esclareceu que atuava como advogada e foi convidada por uma colega de profissão, doutora Sara, para auxliar em uma ação possessória. Narrou que acompanhou parte do processo judicial cível, inclusive a fase instrutória, sendo que ao final houve a condenação ao pagamento de honorários de sucumbência. Narrou que peticionou na demanda o cumprimento de sentença e pedido de penhora online. Detalhou em juízo que chegou a entrar em contato com o advogado do ora réu para tentar resolver a questão, mas não teve resposta. Sobre os fatos, detalha que estava em seu escritório e a campainha foi tocada. Naquela circunstância, o acusado Gilson entrou no escritório da vítima bastante nervoso e agressivo argumentando que não devia nada à vítima, sendo que nesta ocasião, tentava explicar o que estava acontecendo (aqui, referindo-se aos honorários de sucumbência devidos). Afirmou a vítima, ainda, que o réu estava alterado e disse cerca de duas vezes que iria fazer picadinho da vítima e que ela iria conhecer Jesus e, ainda, proferiu ameças caso houvesse novos bloqueios judiciais em sua conta bancária. Prosseguindo, a vítima detalhou que saiu do escritório bastante nervosa, passou na empresa de seu marido e, após, dirigiu-se à Delegacia de Polícia para registrar o boletim de ocorrência. A vítima narrou que na manhã seguinte seu esposo Wesllen teria narrado que o acusado foi até a empresa da família também com o intuito de paralisar a demanda judicial que a vítima movia. Segue detalhando, ademais, que quando foi até a Delegacia de Polícia, a delegada responsável afimrou que o réu não possuía registros criminais graves, mas tinha posse de arma de fogo; que após certo tempo realizou acordo com o réu no processo cível, mas que este fora entabulado após medo e pressão externa. Acrescenta, por fim, que após a realização do acordo não teve contato com o acusado. O informante Wesllen Rampanelli, em juízo, afirmou: “ela me ligou não me lembro que horas do dia falando, chorando, desesperada, que tinha sido ameaçada por um cara por conta de um processo, então corri lá no escritório dela pra entender o que estava acontecendo [...] então pelo Instagram ela me mostrou a foto de uma pessoa [...] aí ela explicou que ele foi no escritório dela por conta do processo que ele perdeu e ele teria que pagar não sei qual o valor, mas que era melhor tirar o processo, porque se não ele ia fazer alguma coisa. E ela sem saber o que fazer [...] então ela pegou, foi em CISC no mesmo dia, registrou o boletim de ocorrência e eu descobri o telefone do cara [...] hora que chegou na empresa, ele já parou a caminhonete dele do lado e já correu pra dentro da empresa [...] nessa hora eu corri lá pra frente do meu pai também porque meu pai não sabia da história, então eu corri lá, Gilson chegou eu cheguei junto”. Narrou o informante que o acusado disse para a vítima retirar o processo ou não ia acabar bem. Além disso, detalhou que o advogado do acusado no processo cível, Dr. Alan, o chamou para conversarem reservadamente sobre o assunto, ocasião em que o citado advogado teria reportado que o acusado estava muito nervoso, que não era fácil de lidar, que tem fama de ser bravo, e que era para tentar um acordo; que o réu xingou a vítima por telefone. O réu Gilson Marcos Rodrigues, em Juízo, confessou parcialmente os fatos ao apresentar sua versão. O lastro probatório carreado nos autos é incontroverso, robusto e unânime no sentido de corroborar os fatos narrado na exordial acusatória, o qual se amolda com plenitude ao tipo penal capitulado no artigo 344 do Código Penal. Segundo a inicial acusatória, o acusado, com consciência e vontade, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, usou de grave ameaça contra a vítima Bárbara, consistente na promessa de prática de mal futuro de que faria picadinho da ofendida, além de outros dizeres, com a finalidade de favorecer interesse próprio, eis que o acusado era executado em ação de cumprimento de sentença que tramitava na esfera cível, sobretudo com o intuito de não pagar os honorários de sucumbência devidos à ofendida que atuava, à época, como advogada. O delito cometido pelo acusado está previsto no art. 344 do Código Penal, assim descrito: Art. 344 - Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa, além da pena correspondente à violência. A configuração do ilícito penal passa pela necessária presença da tipicidade formal e material, antijuridicidade e culpabilidade. Nesse caminho, o quadro probatório é suficiente para justificar a condenação pelo crime de coação no curso de processo, isso porque como se infere dos depoimentos acima transcritos, são claros ao demonstrar a prática do ilícito, qual seja, a ameaça se deu com a finalidade de obter favorecimento a interesse próprio em processo judicial. Obviamente, para a caracterização do ilícito cometido pelo acusado, é necessário a demonstração do elemento subjetivo especifico, qual seja: a obtenção de favorecimento a interesse próprio ou alheio em processo judicial, policial ou administrativo ou juízo arbitral, o que está claro nos autos. Nesse ponto, destaco que os depoimentos colhidos em sede judicial deixam claro que a intenção do acusado era de que a vítima não desse prosseguimento ao cumprimento de sentença, com o intuito de desfazer, inclusive, o bloqueio de ativos feitos judicialmente. Nota-se que a ofendida relatou em Juízo os acontecimentos com clareza de detalhes, e na mesma linha do depoimento prestado pelo informante Wesllen. Vale ressaltar que, no caso em exame, não existe qualquer indicativo de que a vítima ou o informante pretendem punir injustificadamente o acusado, razão pela qual seu depoimento assume grande relevância. Quanto à configuração do crime de coação no curso do processo, cabe destacar as lições de Guilherme de Souza Nucci: “usar (empregar ou servir-se de violência (coação física) ou grave ameaça (séria intimidação) para coagir pessoa envolvida em processo judicial, policial ou administrativo ou juízo arbitral”. Sobre o caráter da ameaça, o autor explica que “não se exige que se trate de causar à vítima algo injusto, mas há de ser intimidação envolvendo uma conduta ilícita do agente, isto é, configura-se o delito quando alguém usa, contra pessoa que funciona em processo judicial, por exemplo, de grave ameaça justa, para obter vantagem”. Portanto, não existindo circunstâncias que possam conduzir à exclusão da ilicitude ou mesmo dirimir a culpabilidade do réu e, demonstrado o fato típico, antijurídico e culpável, a responsabilidade penal do acusado é medida que se impõe. 3. DISPOSITIVO Posto isso e, por tudo mais que dos autos consta, julgo PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para o fim de CONDENAR o réu GILSON MARCOS RODRIGUES nas penas do artigo 344, do Código Penal. Passo a dosar a pena. 4. DOSIMETRIA Circunstâncias Judiciais a) Culpabilidade: não extrapola a normalidade; b) Antecedentes: réu é primário; c) Conduta Social e Personalidade: não há elementos concretos no feito que permitam fazer um juízo desfavorável ao denunciado; d) Motivos: não destoa daquele normalmente verificado na prática usual do delito, não demonstrando, portanto, maior reprovabilidade da conduta; e) Circunstâncias: são comuns; f) Consequências: extrapolam o tipo penal e devem ser valoradas de forma negativa, eis que a conduta do réu gerou abalos psicológicos na vítima que chorou ao narrar os fatos em juízo, cujo mal causado transcende o resultado típico. g) Comportamento da vítima: A vítima, ao menos não há prova em sentido contrário, não contribuiu para a prática da infração. Assim, diante da existência de uma circunstância desfavorável, elevo a pena em 1/6 e fixo a pena-base em 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, além de 12 (doze) dias-multa. Atenuantes ou agravantes Não existem agravantes a serem analisadas. Presente a atenuante da confissão. Fica, portanto, a reprimenda provisoriamente estabelecida em 01 (um) ano de reclusão, além de 10 (dez) dias-multa, eis que não é possível a fixação da reprimenda abaixo do mínimo legal na segunda fase da dosimetria, nos termos do enunciado de Súmula n. 231/STJ. Causas de aumento e diminuição da pena Inexistem causas especiais de aumento ou diminuição de pena. Pena Definitiva Cumpridas as fases do art. 68 do Código Penal e diante da ausência de outras circunstâncias modificativas, fixo a pena privativa de liberdade do acusado, definitivamente, em 01 (um) ano de reclusão, além de 10 (dez) dias-multa. Regime inicial de cumprimento da pena Considerando o quantum da pena privativa de liberdade aplicada e as condições pessoais do condenado e, ainda, tendo em vista os critérios estabelecidos pelo artigo 59, muito embora as circunstâncias judiciais não sejam totalmente favoráveis, porém, considerando que o condenado não é reincidente, com fundamento no artigo 33, parágrafo 2º, alínea “b” e parágrafo 3º, do mesmo diploma legal, fixo, para início do cumprimento da pena, o regime aberto. Das penas alternativas Inviável a substituição pretendida, porquanto incide aqui a restrição do art. 44, I, do Código Penal (crime praticado com grave ameaça à pessoa). O sursis penal também não pode ser concedido ao réu, uma vez que não atende aos requisitos impostos pelo artigo 77 do Código Penal, mormente em razão da existência de circunstância judicial negativa. Das Custas e Despesas Processuais Em consonância ao contido no artigo 804, do Código de Processo Penal, bem como ao artigo 5º, inciso LXXIV, da Magna Carta, eis que não foi comprovado nos autos a insuficiência de recursos para arcá-las, condeno, ainda, o Réu ao pagamento das custas e despesas processuais. Valor do dia-multa Em função da situação econômica do réu, fixo cada dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo federal vigente por ocasião dos fatos e atualizado até a data do pagamento. Do direito de apelar em liberdade Considerando que a pena do réu será em regime de liberdade, CONCEDO a ele o direito de apelar desta sentença, querendo, em liberdade. 5 – Disposições finais O réu deve ser intimado por meio da defesa, conforme art. 392, inciso II, do CPP. Após o trânsito em julgado, determino: Façam-se as devidas comunicações, inclusive ao Juízo Eleitoral, para fins do art. 15, III, da Constituição Federal; Expeça-se guia para cumprimento da pena. Após as comunicações necessárias e o cumprimento das determinações supra, arquivem-se estes autos, nos termos da CNGC. Diligências necessárias. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se. Pontes e Lacerda/MT, 10 de julho de 2025. Djéssica Giseli Küntzer Juíza de Direito

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Processo nº 1006027-19.2025.8.11.0003

ID: 339903287

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA ESP. DA FAZENDA PÚBLICA DE RONDONÓPOLIS Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1006027-19.2025.8.11.0003

Data de Disponibilização: 31/07/2025

Polo Ativo:

NARALLYNE ZONER DIGIGOV COSTA

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

RENATO OCAMPOS CARDOSO

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PROCESSO N. º 1006027-19.2025.8.11.0003 VISTO. NARALLYNE ZONER DIGIGOV COSTA ajuizou ação de indenização por dano moral em face do MUNICÍPIO DE RONDONÓPOLIS, aduzindo, em síntese, que é irmã de MATHE… PROCESSO N. º 1006027-19.2025.8.11.0003 VISTO. NARALLYNE ZONER DIGIGOV COSTA ajuizou ação de indenização por dano moral em face do MUNICÍPIO DE RONDONÓPOLIS, aduzindo, em síntese, que é irmã de MATHEUS VINICIUS ZONER ROCHA, falecido em 16/05/2022, às 9h30min, em decorrência de acidente de trânsito, aos 24 anos de idade. Aduz que o falecido deixou pai, mãe e dois irmãos. Informa que a mãe do "de cujus", que também é mãe da autora, ajuizou ação de indenização por dano moral e material contra o réu (autos nº 1031837-64.2023.8.11.0003), que tramitou perante esta 1ª Vara Especializada em Fazenda Pública de Rondonópolis, tendo sido julgada procedente, condenando o réu ao pagamento de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) por dano moral, além de dano material em pensão mensal. Referido processo encontra-se em fase recursal. Alega que a condenação na ação indenizatória não foi extensiva quanto ao dano moral à filha/autora, por não ter sido objeto daquela ação, razão pela qual ajuíza a presente demanda. Sustenta que o preposto do réu, ao conduzir um micro-ônibus, adentrou em via preferencial sem a devida atenção (não respeitando a placa de sinalização PARE), vindo a colidir/atropelar a motocicleta conduzida pelo seu irmão, causando-lhe ferimentos que resultaram em sua morte. Requer a concessão dos benefícios da justiça gratuita e, no mérito, a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Devidamente citado, o réu apresentou contestação, arguindo preliminarmente: a) ilegitimidade ativa da autora, por entender que irmãos não detêm legitimidade para pleitear indenização por danos morais decorrentes de morte; b) coisa julgada e segurança jurídica, alegando que novo pleito de indenização pela mesma causa de pedir e com idêntico objeto configura afronta aos princípios da segurança jurídica e da coisa julgada. No mérito, reiterou a alegação de que a autora não se encontra no rol de sucessores legitimados a receber indenização por morte de parente próximo e que o pleito desta visa apenas alcançar vantagem econômica. Ao final, pugnou pela improcedência do pedido inicial (id. 192415084). A autora apresentou impugnação à contestação, rebatendo as preliminares e reiterando os termos da inicial (id. 194504485). Instadas as partes a especificarem as provas que pretendiam produzir, a autora manifestou-se informando que não pretendia produzir mais provas, requerendo o julgamento antecipado da lide, com a utilização das provas emprestadas dos autos 1031837-64.2023.8.11.0003 (ação indenizatória) e 1025301-71.2022.8.11.0003 (ação penal) (id. 194803764). O réu também se manifestou informando que não possuía interesse na produção de novas provas, requerendo o julgamento antecipado da lide (id. 196492523). A autora juntou aos autos o acórdão proferido nos autos nº 1031837-64.2023.8.11.0003, que negou provimento ao recurso do Município (id. 197775872). É o relatório. Decido. O feito encontra-se maduro para julgamento, sendo desnecessária a produção de outras provas além daquelas já constantes dos autos, razão pela qual passo ao julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil. 1. DAS PRELIMINARES 1.1. Da ilegitimidade ativa O réu alega que a autora, na qualidade de irmã do falecido, não detém legitimidade ativa para pleitear indenização por danos morais decorrente de sua morte. A preliminar não merece acolhimento. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado no sentido de que os irmãos possuem legitimidade ativa para pleitear indenização pela morte do outro irmão, de forma independente dos pais e demais familiares, pois quando se verifica que o terceiro sofre efetivamente com a lesão causada à vítima, nasce para ele um dano moral reflexo, ou dano moral por ricochete, que é específico e autônomo. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PRAZO VINTENÁRIO. SÚMULA 83 DO STJ. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. MATÉRIA QUE DEMANDA REEXAME DE FATOS E PROVAS. SUMULA 7 DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. (...). 2. Os irmãos possuem legitimidade ativa para pleitear indenização pela morte do outro irmão, de forma independente dos pais e demais familiares, pois quando se verifica que o terceiro sofre efetivamente com a lesão causada à vítima, nasce para ele um dano moral reflexo, 'par ricochet', que é específico e autônomo. Isto significa que todos aqueles que sofrem com a morte da vítima terão direito, separadamente, à indenização pelo dano moral a eles reflexamente causado. E, ainda, o valor deverá ser diferente e específico para cada um, dependendo de sua ligação com a vítima (AgRg no Ag 1413481/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/03/2012, DJe 19/03/2012). 3. As conclusões do Tribunal de origem em relação ao início da contagem do prazo prescricional, afastamento da prescrição, e reconhecimento do dever de indenizar, não podem ser revistas por esta Corte Superior, pois demandaria, necessariamente, reexame do conjunto fático - probatório dos autos, o que é vedado em razão do óbice da Súmula 7 do STJ. 4. A alegação genérica de violação à lei federal, sem indicar de forma precisa o artigo, parágrafo ou alínea, da legislação tida por violada, tampouco em que medida teria o acórdão recorrido vulnerado a lei federal, bem como em que consistiu a suposta negativa de vigência da lei e, ainda, qual seria sua correta interpretação, ensejam deficiência de fundamentação no recurso especial, inviabilizando a abertura da instância excepcional. Não se revela admissível o recurso excepcional, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia. Incidência da Súmula 284-STF. 5. Agravo interno não provido." (destaquei) (AgInt no AREsp n. 1.153.161/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 30/5/2019, DJe de 4/6/2019). AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. MORTE DE PASSAGEIROS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. IRMÃOS DA VÍTIMA. LEGITIMIDADE ATIVA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. De acordo com a jurisprudência desta Casa, são ordinariamente legitimados para a ação indenizatória o cônjuge ou companheiro, os descendentes, os ascendentes e os colaterais, de modo não excludente. Relativamente aos colaterais, aliás, a orientação desta Casa firmou-se no sentido de que" os irmãos de vítima fatal de acidente aéreo possuem legitimidade para pleitear indenização por danos morais ainda que não demonstrado o vínculo afetivo entre eles ou que tenha sido celebrado acordo com resultado indenizatório com outros familiares (AgRg no AREsp n. 461.548/DF, Relator o Ministro João Otávio de Noronha, DJe de 27/11/2014). 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp n. 1.418.703/RJ, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 24/5/2016, DJe de 6/6/2016). Portanto, sendo a autora irmã do falecido, possui legitimidade para pleitear indenização por danos morais decorrentes do falecimento, razão pela qual rejeito a preliminar. 1.2. Da coisa julgada e segurança jurídica O réu alega que novo pleito de indenização pela mesma causa de pedir e com idêntico objeto configura afronta aos princípios da segurança jurídica e da coisa julgada. A preliminar também não merece acolhimento. Embora os fatos sejam os mesmos (acidente que vitimou Matheus Vinícius Zoner Rocha), as partes são distintas. Na ação anterior (autos nº 1031837-64.2023.8.11.0003), a autora era a mãe da vítima, enquanto na presente demanda a autora é a irmã. O dano moral é personalíssimo, de modo que cada pessoa próxima à vítima pode sofrer abalo moral próprio e distinto, sendo legítima a pretensão de cada uma delas em buscar reparação pelo dano sofrido. Não há, portanto, identidade de partes, o que afasta a configuração da coisa julgada, nos termos do art. 337, §§ 1º, 2º e 4º, do CPC. Rejeito, portanto, a preliminar. 2. DO MÉRITO 2.1. Da responsabilidade civil do Município A responsabilidade civil do Estado, incluindo os Municípios, é objetiva, conforme previsão do art. 37, § 6º, da Constituição Federal: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. Assim, para a configuração da responsabilidade civil objetiva do Estado, basta a comprovação do dano e do nexo causal entre este e a conduta do agente público, sendo desnecessária a demonstração de culpa. No caso em análise, conforme se verifica dos documentos juntados aos autos, especialmente o laudo pericial criminal n. 511.2.20.9151.2023.06358-A01, confeccionado pela Gerência de Criminalística de Rondonópolis, restou comprovado que o acidente que vitimou o irmão da autora ocorreu por culpa exclusiva do motorista do micro-ônibus de propriedade do réu, que não respeitou a sinalização de "PARE" existente no cruzamento, ingressando na via preferencial e interceptando a trajetória da motocicleta conduzida pela vítima. Conforme conclusão do laudo pericial: “Considerando as análises discorridas no tópico 4 Análises e Interpretações dos Vestígios e a Dinâmica Parcial do Evento apresentada no tópico 5, utilizando-se da metodologia de abordagem da visão sistêmica do ocorrido, o Perito conclui por indução que as causas determinantes imediatas da colisão FORAM ATRIBUÍDAS AO FATOR HOMEM, onde o condutor de V2 (Ônibus) avançou sobre a intersecção sinalizada (PARE) quando as condições de tráfego não lhes eram favoráveis, interceptando V1 (VTR) que deslocava-se regularmente em via transversal” (id. 186633880). Ademais, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, ao julgar o recurso de apelação nos autos nº 1031837-64.2023.8.11.0003, confirmou a responsabilidade do Município pelo acidente, conforme acórdão juntado aos autos (id. 197775874). Portanto, restou comprovado o nexo causal entre a conduta do preposto do réu e o dano sofrido pela autora (morte de seu irmão), configurando-se a responsabilidade civil objetiva do Município. 2.2. Do dano moral Dispõe o Código Civil, artigo 186: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Cometendo ato ilícito, o agente fica obrigado a repará-lo, nos termos do art. 927 do Código Civil: “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” Ambos os artigos foram construídos sob a égide forte da Carta Maior, no seu artigo 5°, inciso X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;”. Assim, os danos morais configuram-se na violação de um bem juridicamente protegido, que não afeta o patrimônio, mas atinge direitos da personalidade, causando sofrimento ao ofendido. Mesmo quando restritos ao plano moral, esses danos geram a obrigação de indenizar, conforme o artigo 186 do Código Civil. No caso em análise, é inegável que a morte prematura e violenta de um irmão causa profundo abalo emocional, dor e sofrimento, configurando dano moral indenizável. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico no sentido de que o dano moral decorrente da morte de parente próximo é presumido (in re ipsa), dispensando-se a comprovação do sofrimento, que é inerente a essa situação: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ATROPELAMENTO EM VIA FÉRREA. MORTE DA VÍTIMA. DANOS MORAIS AOS IRMÃOS. CABIMENTO. DESPESAS DE FUNERAL E SEPULTAMENTO. PROVA. DESNECESSIDADE. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Presume-se o dano moral na hipótese de morte de parente, tendo em vista que o trauma e o sentimento causado pela perda da pessoa amada são inerentes aos familiares próximos à vítima. 2. Os irmãos, vítimas por ricochete, têm direito de requerer a indenização pelo sofrimento da perda do ente querido, sendo desnecessária a prova do abalo íntimo. No entanto, o valor indenizatório pode variar, dependendo do grau de parentesco ou proximidade, pois o sofrimento pela morte de familiar atinge os membros do núcleo familiar em gradações diversas, o que deve ser observado pelo magistrado para arbitrar o valor da reparação . 3. Na presente hipótese, foi fixada a indenização por danos morais aos irmãos da vítima no valor correspondente a R$ 15.000,00 (quinze mil reais), quantia razoável e proporcional ao montante arbitrado aos genitores (R$ 30.000,00) . 4. Segundo a jurisprudência desta Corte, não se exige a prova do valor efetivamente desembolsado com despesas de funeral e sepultamento, em face da inevitabilidade de tais gastos. 5. Agravo interno não provido (STJ - AgInt no REsp: 1165102 RJ 2009/0218978-5, Relator.: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 17/11/2016, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/12/2016 RMDCPC vol. 75 p. 133). Portanto, reconheço a existência de dano moral indenizável. 2.3. Do quantum indenizatório No que tange à fixação do valor da indenização por danos morais, deve-se levar em consideração os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como as circunstâncias do caso concreto, a gravidade do dano, a situação do ofensor, a condição do lesado e a finalidade da reparação civil, que possui caráter compensatório e punitivo. No caso em análise, considerando a gravidade do dano (morte de um irmão), as circunstâncias do acidente (imprudência do motorista do micro-ônibus), bem como o valor fixado na ação movida pela mãe da vítima (R$ 150.000,00), entendo razoável fixar a indenização por danos morais em favor da autora no valor de R$ 70.000,00 (setenta mil reais). Esse valor atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sendo suficiente para compensar o dano sofrido pela autora, sem configurar enriquecimento sem causa, e para desestimular a reiteração da conduta pelo réu. DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial para CONDENAR o MUNICÍPIO DE RONDONÓPOLIS ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 70.000,00 (setenta mil reais) em favor da autora NARALLYNE ZONER DIGIGOV COSTA, acrescido de juros de mora equivalentes aos juros aplicáveis à caderneta de poupança, a partir do evento danoso (16/05/2022), na forma da Súmula 54 do STJ, até a data da sentença, a partir de então, aplica-se taxa SELIC, a qual engloba correção monetária e juros. Isento o requerido do pagamento das custas, em face do art. 3º, I, da Lei Estadual nº 7.603/01. Condeno o Município de Rondonópolis ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §3º, I, do CPC. Esta sentença não está sujeita a reexame necessário porque o valor da condenação e o proveito econômico obtido na causa não excedem a 100 (cem) salários mínimos (art. 496, § 3º, III, do CPC). P.R.I.C. Rondonópolis, data do sistema. FRANCISCO ROGÉRIO BARROS Juiz de Direito

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Iraci Pereira Caires x Allianz Seguros S/A e outros

ID: 310204210

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Jaú - 1ª Vara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1003699-46.2023.8.26.0302

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

IRACI PEREIRA CAIRES

Polo Passivo:

ALLIANZ SEGUROS S/A PAULO SERGIO DE PIERI

Intimação

Advogados:

WAGNER PARRONCHI

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RENATA HONORIO YAZBEK

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NELSON RICARDO DE OLIVEIRA RIZZO

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AMANDA LEONELLI ABRANTES

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Processo 1003699-46.2023.8.26.0302 - Procedimento Comum Cível - Acidente de Trânsito - Iraci Pereira Caires - Paulo Sergio de Pieri - - Allianz Seguros S/A - Vistos. IRACI PEREIRA CAIRES, devidame… Processo 1003699-46.2023.8.26.0302 - Procedimento Comum Cível - Acidente de Trânsito - Iraci Pereira Caires - Paulo Sergio de Pieri - - Allianz Seguros S/A - Vistos. IRACI PEREIRA CAIRES, devidamente qualificada nos autos, ajuizou a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, ESTÉTICOS E MORAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DE TRÂNSITO em face de PAULO SÉRGIO DE PIERI e ALLIANZ SEGUROS S/A, alegando, em síntese, que, em 04/04/2022, estava tragando com sua motocicleta Honda Biz 125 ES, placa DVP9733, ano/modelo 2007, em direção ao seu trabalho, quando, na Avenida João Franceschi, em frente à igreja Ventos do Avivamento, o veículo Hyundai Creta 2017, conduzido pelo primeiro réu, não parou, invadindo a preferencial, acarretando na colisão. Informa que caiu no solo e foi socorrida, mas o acidente acarretou a fratura exposta do platô tibial e a fratura de cinco costelas, além de que sua bacia trincou, tendo que se submeter a cirurgias. Relata que foi informada pelos médicos das sequelas permanentes, fato que a prejudicaria nas atividades laborais e cotidianas, além das marcas deixadas no corpo. Aduz que ainda sente dores, sendo necessário o pedido de afastamento do trabalho pelo INSS. Destaca que o primeiro requerido possui seguro junto à corré, a qual a ressarciu pelos danos da motocicleta (R$ 5.550,00) e ofereceu proposta de indenização de R$ 87.000,00, a qual foi recusada. Outra proposta foi feita foi no montante de R$ 38.500,00, com o argumento de melhora da autora, fato que ela alega ser uma inverdade. Ademais, ilustra que o seu salário reduziu, em virtude do afastamento de suas atividades laborais, e que ainda não recebeu o seguro DPVAT por não ter tido alta médica. Pede a gratuidade judiciária e a procedência da ação para condenar os réus ao pagamento do tratamento médico (R$ 1.000,00), da pensão mensal temporária e vitalícia (R$ 56.427,60 e R$ 28.213,80), da indenização por danos estéticos (R$ 50.000,00), bem como por danos morais (R$ 50.000,00). Com a inicial, vieram documentos (fls. 30/142). A decisão de fl. 143 concedeu os benefícios da gratuidade judiciária à autora. O réu Paulo Sérgio de Pieri ofertou contestação (fls. 150/175), alegando, em suma, que estava no canteiro central da referida avenida, devidamente parado da sinalização de "PARE". Acontece que, em decorrência do horário (6h50), a visão fica prejudicada para quem está realizando o cruzamento. Aduz que a motocicleta da autora estava impossibilitada de trafegar, tendo em vista que estava com a licença atrasada e o farol com a lente amarelada, fatores que contribuíram para que ela não fosse vista, resultando no acidente. Informa, também, que a autora estava em uma velocidade superior ao permitido no local. Reconhece sua culpa, mas pleiteia que os valores indenizatórios sejam reduzidos pela metade, uma vez que a requerente contribuiu para os resultados. Pede a improcedência da ação e, em caso de eventual condenação, que seja determinada a redução em 50%, com a atribuição do pagamento à segunda requerida. Juntou documentos (fls. 176/217). A ré Allianz Seguros S/A também apresentou defesa (fls. 218/244), aduzindo, em preliminar, ilegitimidade passiva. Relata que a garantia é o interesse do segurado e não do terceiro eventualmente prejudicado, uma vez que não concorreu direta ou indiretamente para o evento. No mérito, alega que o contrato firmado com o primeiro réu propõe o pagamento de indenizações a terceiros, desde que os danos não estejam excluídos das cláusulas e o montante pago resulte de sentença condenatória transitada em julgado. Ressalta que a obrigação está limitada aos prejuízos materiais e corporais. Menciona que, no caso de procedência da ação, os limites máximos de indenização e as exclusões devem ser avaliados. Ademais, ilustra que a apresentou inúmeras propostas à autora, a fim de encerrar o sinistro, mas sem sucesso. Pede o reconhecimento da preliminar arguida e a improcedência da ação. Juntou documentos (fls. 245/364). Houve réplica (fls. 368/393). A decisão de fls. 394 determinou que as partes especificassem, no prazo de dez dias, as provas que pretendiam produzir, bem como informassem se tinham interesse na realização de audiência virtual de conciliação. Os réus Paulo Sérgio de Pieri e Allianz Seguros S/A requereram perícia médica e técnica indireta, depoimento pessoal, prova testemunhal e documental e a expedição de ofícios (fls. 397/399 e 404/405). A autora pediu a produção de perícia médica e prova oral (fls. 400/403). A decisão de fl. 406 designou audiência de conciliação no CEJUSC. A audiência restou infrutífera (fl. 419). A decisão de fls. 422/423 afastou a preliminar de ilegitimidade da segunda ré, declarando o feito saneado e deferindo as provas documental, oral e pericial médica. O laudo pericial veio aos autos em fls. 471/486. As partes se manifestaram sobre ele (fls. 490/495, 496/497 e 498/499). É O RELATÓRIO. DECIDO. Trata-se de ação de indenização por danos materiais, estéticos e morais decorrentes de acidente de trânsito que Iraci Pereira Caires move em face de Paulo Sérgio de Pieri e Allianz Seguros S/A, alegando que o réu invadiu a via preferencial em que ela trafegava, dando causa à colisão entre sua motocicleta e o veículo dele em 04/04/2022. Informa que caiu no solo e, diante das lesões, ficou internada por sete dias na Santa Casa de Jaú, tendo se submetido a cirurgias. Afirma que ficou afastada pelo INSS até 17/01/2025, ante a gravidade do caso, período em que recebeu valores mensais inferiores ao seu salário. Relata que a seguradora corré pagou-lhe R$ 5.500,00, relativos aos consertos da motocicleta, e que ainda não conseguiu receber indenização do seguro DPVAT, pois não recebeu alta médica. Pede a procedência da ação, condenando os réus, solidariamente, a custear todo seu tratamento médico, a pagar pensão mensal temporária enquanto permanecer afastada pelo INSS e pensão mensal temporária ou vitalícia após a consolidação das lesões. Requer, também, indenização por danos estéticos de R$ 50.000,00 e por danos morais no mesmo importe. O réu Paulo Sérgio, em defesa, afirmou que estava parado na sinalização de "PARE" e que tomou as cautelas necessárias para cruzar a via. Contudo, naquele horário, o sol estava nascendo e ofuscando boa parte da visão. Ressalta que a autora estava com a licença atrasada e com o farol amarelado, o que dificultou que fosse vista, além de que trafegava em velocidade superior à permitida. Afirma que, diante desses fatores, ocorreu a colisão, o que caracteriza a culpa exclusiva da vítima. Argumenta que, na hipótese de ser reconhecida a culpa concorrente, a indenização deve ser reduzida pela metade. A seguradora requerida argumentou, em sua contestação, que a condenação deve observar os limites da apólice contratada. Informa que, no caso, o segurado contratou R$ 100.000,00 para danos materiais, R$ 200.000,00 para danos corporais e R$ 30.000,00 para danos morais/estéticos. Afirma que apresentou várias propostas à requerente, a fim de encerrar o sinistro, mas nenhuma delas foi aceita. Requer a improcedência da ação e, em caso de procedência, que haja o abatimento dos valores recebidos a título de seguro DPVAT. A ação é procedente em parte. De uma análise de todo o processado, verifica-se que, no dia do acidente, a autora trafegava com uma motocicleta de sua propriedade (Honda Biz) pela Avenida João Franceschi, nesta cidade de Jaú/SP, via esta preferencial, e, ao chegar ao cruzamento com a Rua Elías Bichara Tabbal, foi abalroada pelo veículo dirigido pelo réu (Hyundai Creta). Conforme se verifica das fotos acostadas aos autos (fls. 179/181), bem como do Boletim de Ocorrência (fls. 33/47), a moto da autora foi atingida em sua parte dianteira e lateral esquerda, enquanto o carro do réu foi danificado em sua parte frontal. Referido exame dos veículos permite chegar à conclusão de que a dinâmica do acidente foi justamente aquela narrada na inicial: a moto Honda Biz trafegava pela avenida, via esta preferencial e, quando passava pelo cruzamento com a Rua Elias Bichara Tabbal, foi abalroada pelo carro do requerido (Hyundai Creta). O comando administrativo de parada obrigatória estava voltado ao réu, sendo que ele deveria ter adotado as cautelas necessárias ao efetuar o cruzamento da avenida de forma segura. Contudo, não o fez e, ao chegar ao canteiro da via, acabou por abalroar a moto da autora, que era dirigida pela preferencial. Inclusive, em sua defesa (fl. 154), assim como no Boletim de Ocorrência (fl. 36), o requerido confessou que não conseguiu enxergar a requerente. Tal indica que ele não respeitou mesmo a sinalização de parada obrigatória presente no canteiro central da avenida, invadindo a preferencial e dando causa à colisão. Afirma, o réu, visando atribuir a responsabilidade pelo acidente à autora ou culpa concorrente, que ela não tomou as cautelas necessárias. Isso porque, o local era de difícil visibilidade, em razão do horário de nascer do sol. Além disso, o farol da motocicleta estava amarelado e ela desenvolvia velocidade acima da permitida. Contudo, tais argumentos não se sustentam. A jurisprudência leva em conta que o desrespeito à sinalização que ordena prévia parada constitui-se em conduta decisiva para a ocorrência de acidente de trânsito. E, além do mais, caso o réu entenda que, de fato, a visibilidade estava comprometida no local e que a autora desenvolvia velocidade excessiva, trafegando com farol amarelado, tais circunstâncias impõem que tivesse ainda mais cautela ao atravessar o cruzamento. Assim, deveria ter adotado os cuidados necessários para evitar a ocorrência de colisão, respeitando o sinal de parada obrigatória. É o que entende a jurisprudência: "APELAÇÃO AÇÃO INDENIZATÓRIA ACIDENTEDETRÂNSITO CRUZAMENTO DE VIAS URBANAS SINALIZADO PLACA DE "PARE" Demonstrada a culpa da ré condutora, elemento fundamental à caracterização da responsabilidade civil extracontratual subjetiva Conjunto probatório dos autos que aponta para conduta culposa (imperita, imprudente ou negligente) em desrespeito à sinalização e preferencial de tráfego por ela determinada no local CONDIÇÕES ADVERSAS DEVER DE CAUTELA Alegadas condições adversas devisibilidadeque apenas acentuam o dever de cautela da condutora (artigo 220, inciso IX, do CTB) ÔNUS DA PROVA Art. 373, II, do CPC em vigor DANOS MORAIS ("in re ipsa") Evidentes reflexos na vida da vítima, a qual, em razão doacidente, sofreu diversas lesões corporais de natureza grave Manutenção do valor fixado na r. sentença, pois que pautado pela razoabilidade e adequado à compensação dos danos suportados, mostrando-se justo, sem que se possa cogitar enriquecimento sem causa da parte requerente DANOS MATERIAIS "QUANTUM DEBEATUR" Indenizados na medida de sua comprovação e na proporção em que guardam correlação direta com as consequências danosas doacidente, com base em documentos não impugnados efetivamente SUCUMBÊNCIA Princípio da causalidade Honorários advocatícios recursais Art. 85, §§ 1º, 2º e 11 do CPC em vigor Negado provimento". (TJSP; 25ª Câm. Dir. Privado; Ap. 0001724-46.2015.8.26.0541; Des. Rel. Hugo Crepaldi; j. 24/11/2016). (Grifo meu). O artigo 44 do Código de Trânsito Brasileiro dispõe no seguinte sentido acerca da prudência que deve ser adotada pelo condutor ao chegar a um cruzamento: Art. 44. Ao aproximar-se de qualquer tipo de cruzamento, o condutor do veículo deve demonstrar prudência especial, transitando em velocidade moderada, de forma que possa deter seu veículo com segurança para dar passagem a pedestre e a veículos que tenham o direito de preferência. Não há dúvidas, pois, que o réu deu causa ao acidente, pois, se tivesse aguardado a passagem da motocicleta, por certo que o sinistro não teria ocorrido. Ele agiu com culpa, na modalidade imprudência, ao ultrapassar cruzamento dotado de placa pare sem o devido cuidado, dando, assim, causa aos danos sofridos pela autora. Por fim, o fato da motocicleta não estar devidamente licenciada (fl. 42) tampouco contribui para culpa exclusiva da vítima ou culpa concorrente, já que consiste apenas em infração administrativa e não influencia na dinâmica do acidente. É o entendimento do E. TJSP, do qual compartilho: "Apelação cível. Ação indenizatória por danos morais e materiais, fundada emacidentedetrânsito. Sentença de parcial procedência. Apelos do corréu condutor e de sua empregadora. Concessão dos benefícios da gratuidade judiciária ao corréu condutor. Colisão frontal entre veículo e motocicleta. A versão dos fatos trazida com a contestação não possui o condão de afastar aquela que já constou do boletim de ocorrência. A narrativa das defesas reforça a afirmação de que a colisão se deu em faixa onde era permitido otrânsitonormal de veículos e que o corréu cruzava ou trafegava por essa faixa, saindo de uma área restrita para trabalhadores e pretendendo alcançar outra área também restrita. A afirmação de que freou o veículo e esperou que o autor desviasse robora, de outra banda, o fato de que o corréu trafegou nesse trecho na contramão de direção, ausente alegação de que o autor trafegava pela contramão. A falta delicenciamentoda motocicleta configura mera infração administrativa e não caracteriza causa eficiente ou concorrente doacidente. Autor que utilizava capacete "aberto". Ausência de prova de sua irregularidade. Verbas indenizatórias acolhidas na r. sentença que são mantidas, com alteração, de ofício, do termo inicial dos juros de mora (Súmula 54, STJ) e dos índices a serem adotados, conforme alteração do CC pela Lei 14.905/24. Apelação do corréu condutor provida em parte, apenas no tocante à gratuidade da justiça. Apelação da corré empregadora não provida". (TJSP; Ap. 1001096-81.2022.8.26.0157; j. 30/04/2025; Des. Rel. Morais Pucci). (Grifei). Portanto, uma vez que a culpa do acidente foi do réu, ele deverá responder pelos prejuízos causados à autora. O Código Civil, acerca da responsabilidade civil, assim dispõe: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Pleiteia, a autora, o custeio de seu tratamento médico, pensão mensal temporária/vitalícia e indenização por danos morais e estéticos. A respeito do tratamento médico, consistente em consultas, exames, fisioterapia, cirurgias e medicamentos, a autora informou que os valores seriam apurados em liquidação e cumprimento de sentença (fl. 11). Uma vez que o réu deu causa ao acidente e, consequentemente, a esses gastos, tal pleito merece prosperar, competindo à requerente juntar a documentação que comprove essas despesas em liquidação/cumprimento de sentença. Sobre a mencionada pensão mensal temporária (fl. 28, item "b"), prospera apenas em parte, somente no que tange à diferença entre o valor que foi pago pelo INSS e o salário da requerente, como se vê em fls. 08/09. Desde 21/06/2022 a 17/01/2025 (fl. 86), a autora recebeu benefício previdenciário, o qual é inferior ao salário que receberia se estivesse trabalhando (fl. 08). Assim, evidente que o réu deverá arcar com essas diferenças, já que deu causa ao acidente e, em consequência, ao afastamento da autora de seu labor. Com relação ao pedido de pensão mensal temporária ou vitalícia (fl. 28, item "c"), observa-se que o artigo 950 do Código Civil assim dispõe: "Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu." Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez". (Grifei). Diante do explicitado, não resta dúvida de que há nexo causal entre a conduta do réu e os danos suportados pela autora, tendo em vista que os prejuízos poderiam ter sido evitados com a adoção de cautela ao cruzar a avenida. Em comento ao referido dispositivo do Código Civil, acima transcrito, J.M. CARVALHO SANTOS, na obra CÓDIGO SIVIL BRASILEIRO INTERPRETADO. Vol. XXI, 12ª edição, Livraria Freitas Bastos S.A., observa que: Se da ofensa resultar defeito, pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua o valor do trabalho ... Pressupõe-se agora que da lesão corporal resultaram conseqüências permanentes de importância tal, que prejudiquem a capacidade de trabalho do ofendido. Pouco importa que diminua apenas essa capacidade de trabalho ou vá ao extremo de impedir totalmente possa o ofendido trabalhar. O que variará é a indenização, que será sempre correspondente à inabilitação para o trabalho, ou à depreciação sofrida, conforme a hipótese, nos termos que serão examinados dentre em pouco. Em qualquer hipótese, realmente, justifica-se a indenização aqui determinada, por isso que, mesmo no caso de apreciação do valor do trabalho, há um dano especial que precisa ser ressarcido. Se, por exemplo, em conseqüência da lesão, o ofendido veio a perder uma perna, embora possa continuar a trabalhar, certo é que o seu trabalho já não renderá tanto quanto antes do acidente. Houve uma diminuição de rendas, que precisa ser indenizada. Na perícia realizada neste feito (fls. 471/486), constou que: "Há caracterização de incapacidade parcial e permanente para gestos que necessite de flexão total do joelho esquerdo. Estando em condições clínicas já estabelecidas, estáveis insusceptível de melhora ou de restabelecimento morfológico do segmento acometido. [...] Consoante a tabela SUSEP, estima-se o percentual do correspondente dano patrimonial físico sequelar totalizando 10% (dez por cento)" (fl. 479). Dessa forma, o caso em tela preenche os requisitos legais, a fim de que a requerente seja beneficiária de um pensionamento mensal vitalício, posto que sua capacidade laboral foi reduzida pelas sequelas decorrentes do acidente de trânsito do qual foi vítima. E esse valor deve ser pago de uma só vez, como foi pleiteado na exordial (fl. 28). Quanto ao valor da pensão, em regra, deve ser fixado com base na remuneração percebida pelo beneficiário quando do início da incapacidade, que era de R$ 2.351,15 (fl. 131). De acordo com a orientação jurisprudencial do C. Superior Tribunal de Justiça, o termo final da pensão por morte decorrente de ato ilícito deve levar em consideração as peculiaridades do caso concreto, bem assim dados atuais sobre a expectativa de vida média do brasileiro, baseada esta nos dados estatísticos fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. (AgInt no AREsp 794.430/CE, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, j. 28/06/2016). Ressalte-se que o IBGE registrou, em 2024, um aumento da expectativa de vida das mulheres para 79,7 anos, como se vê no sítio eletrônico https://agenciagov.ebc.com.br/noticias/202408/expectativa-de-vida-sobe-para-76-4-anos-no-brasil-apos-queda-durante-a-pandemia. Sendo assim, o pensionamento devido à autora estende-se até os 79 anos de idade. Destarte, levando-se em conta todo o exposto, a pensão pela redução da capacidade laboral da autora é devida desde a data do acidente até a data em que ela completar 79 anos de idade. O valor equivale ao salário que ela percebia à época do acidente, R$ 2.351,15, acrescido de 10%, que corresponde à perda de capacidade laboral, identificada pela perícia. O pedido de indenização por danos morais e estéticos também merece acolhimento, porém, em valor inferior. O exame pericial de fls. 471/486, sobre os danos estéticos, mencionou que: "Dano estético é toda ofensa que agride a pessoa nos seus sentimentos de autoestima, prejudicando sua avaliação própria como ser humano, deve ser observada numa perspectiva dinâmica e estática. Como proposta da quantificação é sugerida uma escala de 01 a 06 (ausente, mínimo, leve, moderado, grave e gravíssimo). Para a pericianda em questão pode-se considerar dano estético grau 04". (Grifei). Destarte, a perícia encontrou dano estético moderado sofrido pela autora. As imagens de fls. 105/107 retratam as grandes cicatrizes em sua perna, constatadas pelo Perito. Além disso, a requerente comprovou os danos morais sofridos. Era entendimento anterior que o dano moral não se indenizava. Isto porque não seria possível compensar uma dor moral com o dinheiro. Hodiernamente, tem-se admitido que o dando moral é ressarcível, por representar uma compensação, ainda que pequena, pela tristeza infligida injustamente a outrem. Segundo ensinamento de Pontes de Miranda, dano não patrimonial é o que, só atingindo o devedor como ser humano, não lhe atinge o patrimônio O dano moral alcança prevalentemente valores ideais, não apenas a dor física que geralmente o acompanha, nem se descaracteriza quando simultaneamente ocorrem danos patrimoniais, que podem até consistir numa decorrência, de sorte que as duas modalidades se cumulam e tem incidências autônomas (Súmula 37 do STJ) Restou devidamente comprovado nos autos que a autora, em virtude do acidente, suportou danos morais, sofrendo graves lesões em sua perna, com fratura exposta, motivo pelo qual necessitou ser submetida a procedimento cirúrgico para colocação de parafusos, placa e fixador. Por isso, não consegue mais exercer movimento de flexão total dos joelhos e teve sua capacidade laboral reduzida. Além disso, ficou por muitos meses afastada do trabalho e de seus afazeres habituais. Assim, a requerente merece ser indenizada pelos danos morais que sofreu em decorrência do acidente. Perfeitamente possível a cumulação de indenização por dano moral e estético. Tais indenizações são devidas, uma não conflitando com a outra, pois diversas as suas naturezas e causas que as determinaram. O entendimento mais correto na hipótese, embora haja decisões contrárias, é que o "dano estético vai-se convertendo, progressivamente, em dano patrimonial, pelos progressos da cirurgia restauradora e da clínica de recuperação". (RE 57.697, rel. Min. Victor Nunes, Repertório de Jurisprudência do STF, v. I, p. 78). Destarte, a indenização pelo dano estético é perfeitamente possível, em decorrência da natureza e consequências das lesões sofridas pela vítima, e não se confunde com as verbas pleiteadas a título de reparação pelos danos morais. Sobre o tema, inclusive, cite-se o entendimento do STJ: "Ação de indenização. Acidente de trânsito. Dano moral. Dano estético. Cumulabilidade. Admissível a indenização por dano moral e dano estético, cumulativamente, ainda que derivados do mesmo fato. Incidência da Súm. 37 do STJ. Recurso conhecido e, parcialmente, provido". (STJ, 3ª T., REsp 40.259-0-RJ, rel. Min. Waldemar Zveiter, j. em 08.02.1994, v.u). Oportuna, outrossim, a citação de Arnaldo Rizzardo, (A reparação nos acidentes de trânsito. 2. ed. São Paulo : Ed. RT, p. 120-121) verbis: "É falaz o raciocínio de que a indenização patrimonial, por perdas e danos, lucros cessantes e aquisição de aparelhos ortopédicos envolve ou faz desaparecer o dano moral, como mostra certa jurisprudência (RT 502/239). Sob aquele prisma, recupera-se exclusivamente o dano material. Com a verba a título de satisfação do sofrimento moral causado pela cicatriz permanente, ou carência de um membro, ou desfiguração corporal, busca-se atenuar estes males. A natureza é distinta. Clara é a duplicidade do mal sofrido: moral e patrimonial. Por isso, a indenização abrangerá, 'além de parcelas outras', as 'correspondentes ao dano estético' (RTJ 57/786)". No mesmo sentido, a doutrina de Maria Helena Diniz (Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Ed. RT, 7º v., p. 65.): "O dano estético é toda alteração morfológica do indivíduo, que, além do aleijão, abrange as deformidades ou deformações, marcas e defeitos, ainda que mínimos, e que impliquem sob qualquer aspecto um afeiamento da vítima, consistindo numa simples lesão desgostante ou num permanente motivo de exposição ao ridículo ou de complexo de inferioridade, exercendo ou não influência sobre sua capacidade laborativa ... Realmente, o CC, no artigo 1.538, parágrafos 1º e 2º, ao utilizar os termos 'aleijão e deformidade', alargou o conceito de dano estético". Quanto ao valor dos danos morais e estéticos, certo que a lei não estabelece um critério para a sua fixação, deixando-o ao prudente arbítrio do Juiz. É sabido que tal fixação não pode dar causa a um enriquecimento indevido por parte da vítima e nem a um empobrecimento sem causa, da parte do causador dos danos. No caso, deve-se fixá-lo de molde a ser suportável pelo devedor, como também se deve arbitrar uma quantia que não seja ínfima à credora. Sopesando os paradigmas, critérios e dados enunciados acima, fixo a indenização dos danos morais e estéticos em R$ 50.000,00, sendo R$ 25.000,00 relativos a danos morais e R$ 25.000,00 aos estéticos, tendo em vista todo o sofrimento e a dor pelos quais a autora passou desde o acidente até sua recuperação, possuindo, ainda, danos corporais irreparáveis, o que me parece justo para o deslinde do litígio versado nestes autos. Cumpre fazer uma ressalva a respeito do DPVAT, eventualmente recebido pela requerente. A Súmula 246 do Superior Tribunal de Justiça determina que o valor coberto pelo seguro DPVAT deverá ser descontado na indenização fixada: O valor do seguro obrigatório deve ser deduzido da indenização judicialmente fixada. Assim, em que pese não haja informações concretas no feito sobre o recebimento do seguro DPVAT pela autora, certo é que, caso tenha sido pago, deve ser abatido da indenização ora fixada, o que será apurado em cumprimento de sentença, mediante ofício a ser enviado à CEF para este fim. Com relação à seguradora, a demanda também merece prosperar em parte. Em fls. 256/260, foi acostada aos autos a apólice com as cláusulas do seguro veicular contratado pelo requerido. Verifica-se, em fl. 257, que foram contratadas coberturas para danos materiais, corporais e morais de R$ 100.000,00, R$ 200.000,00 e R$ 30.000,00, respectivamente. Assim, a seguradora apenas será condenada ao pagamento dessas indenizações, considerando os valores máximos previstos, assim como os riscos excluídos. Posto isto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente ação movida por IRACI PEREIRA CAIRES e o faço para condenar os réus, solidariamente, a pagarem à autora: a) indenização pelos danos materiais, relativos aos tratamentos médicos da autora, desde o acidente ocorrido em 04/04/2022 até o fim da convalescença, cujos recibos serão apresentados em cumprimento de sentença e serão devidamente atualizados com correção monetária segundo a tabela prática do TJSP desde cada desembolso e com juros de mora de 1% ao mês desde a citação, até 27/08/2024 e, após esta data, com a entrada em vigor da Lei 14.905/24, será aplicada a Selic, que engloba juros e correção, diminuindo-se desta o valor do IPCA/IBGE (art. 406, § 1º, do CC), desconsiderando-se eventuais juros negativos (art. 406, § 3º, do CC); b) indenização por danos morais e estéticos no valor de R$ 25.000,00 cada um, totalizando R$ 50.000,00, que deve ser corrigido monetariamente pelo IPCA (art. 389, p.u.) desde a data do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e com juros de mora de 1% ao mês desde a data do evento danoso (Súmula 54 do STJ), ou seja, desde o acidente (04/04/2022), até 27/08/2024 e, após esta data, com a entrada em vigor da Lei 14.905/24, será aplicada a Selic, que engloba juros e correção, diminuindo-se desta o valor do IPCA/IBGE (art. 406, § 1º, do CC), desconsiderando-se eventuais juros negativos (art. 406, § 3º, do CC); c) indenização por danos materiais, relativos às diferenças entre o benefício previdenciário pago à autora em decorrência do acidente e o salário dela (fl. 131 - R$ 2.351,15), que serão devidamente atualizados com correção monetária segundo a tabela prática do TJSP desde cada pagamento do benefício previdenciário e com juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, até 27/08/2024 e, após esta data, com a entrada em vigor da Lei 14.905/24, será aplicada a Selic, que engloba juros e correção, diminuindo-se desta o valor do IPCA/IBGE (art. 406, § 1º, do CC), desconsiderando-se eventuais juros negativos (art. 406, § 3º, do CC); d) uma pensão mensal vitalícia, decorrente da redução da capacidade de trabalho da autora, no valor do salário que ela auferia à época do acidente (fl. 131 - R$ 2.351,15), acrescido de 10%, devida desde a data desse sinistro até o dia em que completar 79 anos de idade, a ser paga de uma só vez, conforme artigo 950, parágrafo único do Código Civil. Quanto às pensões vencidas até o início do cumprimento de sentença, incidirão juros de mora e correção monetária, ambos contados de cada vencimento, desde a data do acidente e observadas as alterações trazidas pela Lei 14.905/2024 ao artigo 406 do Código Civil. A solidariedade da seguradora dá-se nos limites da apólice (fls. 256/260), observados os riscos contratuais excluídos. Sucumbência mínima da autora. Arcarão, os réus, com custas processuais e com os honorários do patrono dela, que fixo em 10% do valor da condenação atualizado, rateado igualmente entre eles. Na hipótese de interposição de apelação, tendo em vista a nova sistemática estabelecida pelo NCPC, que extinguiu o juízo de admissibilidade a ser exercido pelo Juízo "a quo" (art. 1.010 do NCPC), sem nova conclusão, intime-se a parte contrária para que ofereça resposta no prazo de 15 (quinze) dias. Havendo recurso adesivo, também deve ser intimada a parte contrária para oferecer contrarrazões. Ainda, na hipótese de eventual recurso, deverá a parte recorrente recolher o preparo no valor de R$ 8.000,00, que fixo por equidade, bem como os valores correspondentes ao porte de remessa e retorno de autos físicos e/ou mídia(s)/objeto(s), sendo R$ 43,00 por volume (na guia FEDT. Código 110-4), conforme Provimento 833/2004, atualizado pelo Provimento CSM nº 2516/2019. Por fim, cumpra a Serventia o disposto no artigo 1093, § 6º, das NSCGJ. Após, remetam-se os autos à superior instância. A autora fica isenta de preparo, ante a gratuidade. Transitada em julgado e transcorrido o prazo de 30 dias do trânsito sem que a parte vencedora ingresse com o respectivo cumprimento de sentença, arquive-se definitivamente no código 61615. P.I. - ADV: NELSON RICARDO DE OLIVEIRA RIZZO (OAB 168689/SP), RENATA HONORIO YAZBEK (OAB 162811/SP), WAGNER PARRONCHI (OAB 208835/SP), AMANDA LEONELLI ABRANTES (OAB 424258/SP)

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Processo nº 1009251-28.2023.8.11.0037

ID: 325969217

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1009251-28.2023.8.11.0037

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

NAIARA RAQUEL BORGES SCHUH ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

DARLAN DE OLIVEIRA BERNARDINO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1009251-28.2023.8.11.0037 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Falsificação de documento público, Tráfico de Drogas e… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1009251-28.2023.8.11.0037 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Falsificação de documento público, Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Associação para a Produção e Tráfico e Condutas Afins] Relator: Des(a). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES Turma Julgadora: [DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [NAIARA RAQUEL BORGES SCHUH - CPF: 033.108.261-63 (APELANTE), ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA - CPF: 015.410.631-39 (APELANTE), RODRIGO DA COSTA RIBEIRO - CPF: 876.151.851-49 (ADVOGADO), POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), DALTON RIBAS NERY - CPF: 000.786.321-70 (ASSISTENTE), GILVAN ANTONIO DE SA TELES - CPF: 654.718.812-49 (ASSISTENTE), IRONDINA BORGES (ASSISTENTE), DOUGLAS CRISTIANO ALVES LOPES - CPF: 357.495.248-17 (ADVOGADO), DARLAN DE OLIVEIRA BERNARDINO - CPF: 052.103.781-60 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. PRELIMINAR DE INTEMPESTIVIDADE AFASTADA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA BUSCA DOMICILIAR. CUMPRIMENTO DE MANDADO DE PRISÃO. ENCONTRO FORTUITO DE PROVAS (SERENDIPIDADE). LEGALIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. DEDICAÇÃO A ATIVIDADES CRIMINOSAS. INAPLICABILIDADE DO PRIVILÉGIO. DOSIMETRIA. MAUS ANTECEDENTES. AÇÕES PENAIS SEM TRÂNSITO EM JULGADO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS. I. CASO EM EXAME Trata-se de recursos de apelação criminal interpostos por ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA e NAIARA RAQUEL BORGES TERRA DE OLIVEIRA contra sentença que os condenou pela prática de tráfico de drogas (art. 33, caput, Lei 11.343/06) e associação para o tráfico (art. 35, Lei 11.343/06). Roberto também foi condenado por falsificação de documento público (art. 297, caput, CP). As penas iniciais foram de 9 anos e 4 meses para Naiara e 13 anos e 6 meses para Roberto, ambos em regime fechado, mais multa. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO A defesa de NAIARA pleiteia a desclassificação do tráfico para posse para consumo, a absolvição do crime de associação para o tráfico, e subsidiariamente, a revisão da dosimetria (afastamento da exasperação da pena-base por fundamentação genérica, ou readequação da fração), e aplicação do tráfico privilegiado com abrandamento do regime. A defesa de ROBERTO requer a nulidade das apreensões por suposta violação de domicílio (mandado de prisão sem busca e apreensão). No mérito, pugna pela absolvição dos crimes de tráfico e associação, alegando insuficiência de provas e que as drogas pertenciam à corré. III. RAZÕES DE DECIDIR Da Preliminar de Intempestividade (Roberto): A preliminar suscitada pelo Ministério Público é afastada. A manifestação do interesse em recorrer ocorreu dentro do prazo legal de 5 (cinco) dias (art. 593, I, CPP), e a apresentação das razões recursais na instância superior, embora posterior, configura mera irregularidade formal que não obsta o conhecimento do apelo, prática plenamente admitida pelos tribunais superiores (art. 600, CPP). Da Preliminar de Nulidade da Busca Domiciliar (Roberto): A arguição de ilicitude da prova não prospera. A apreensão das drogas na residência enquadra-se no fenômeno da serendipidade ou encontro fortuito de provas. Durante o cumprimento de mandados de prisão legítimos, os policiais visualizaram a corré Naiara arremessando porções de drogas sobre o guarda-roupa. A jurisprudência das Cortes Superiores (STF e STJ) chancela a validade da prova obtida fortuitamente em diligência legítima, desde que não seja resultado de busca preordenada ou disfarçada, o que não se verificou no caso. A entrada dos policiais no domicílio para cumprir mandado de prisão é lícita. Do Mérito - Tráfico e Associação para o Tráfico (Ambos Apelantes): A materialidade dos crimes de tráfico e associação está comprovada por auto de prisão em flagrante, boletim de ocorrência, termo de exibição e apreensão, laudo pericial (75,50g de maconha) e relatório de investigação que revelou contabilidade de tráfico detalhada. A autoria é demonstrada pelos depoimentos harmônicos e coerentes dos policiais civis, que narraram as circunstâncias da prisão, a atitude de Naiara de ocultar drogas e dinheiro, a tentativa de Roberto de destruir seu celular, e o encontro de cadernos com anotações de contabilidade do tráfico. A quantidade de droga (75,50g de maconha), acondicionada em porções, e os valores em dinheiro (R$ 2.400,00) em notas diversas, são compatíveis com a traficância. Investigações anteriores (Operação "Alter Ego" de 2022) já apontavam Roberto como gerente do Comando Vermelho e Naiara na função financeira da organização. Ambos possuem histórico criminal e respondem a outras ações penais por organização criminosa e lavagem de dinheiro, revelando dedicação a atividades criminosas. A associação para o tráfico (art. 35 da Lei nº 11.343/06) está configurada pela estabilidade e permanência, com divisão de tarefas (Roberto como líder/gerente e Naiara na parte financeira), afastando a tese de mera coautoria ou consumo pessoal. A robustez das provas afasta as teses absolutórias e desclassificatórias. A condição de usuário de drogas não elide a responsabilidade pelo tráfico (Enunciado nº 3 da TCCR/TJMT). Do Tráfico Privilegiado (Naiara): A dedicação da recorrente a atividades criminosas (comprovada pela condenação pela associação para o tráfico e por outras ações penais em andamento por organização criminosa e lavagem de dinheiro) obsta a incidência da causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas. Da Dosimetria da Pena (Naiara): A sentença exasperou a pena-base de Naiara com fundamento em maus antecedentes, utilizando inquéritos policiais e ações penais em andamento, sem trânsito em julgado. Tal fundamento viola o princípio da presunção de inocência e a Súmula nº 444 do STJ. Impõe-se a readequação da pena-base para o mínimo legal, tanto para o tráfico de drogas (05 anos de reclusão e 500 dias-multa) quanto para a associação para o tráfico (03 anos de reclusão e 700 dias-multa). A confissão espontânea não pode ser aplicada se a ré não admitiu a traficância, mas apenas o uso (Súmula 630, STJ). Operando o cúmulo material (art. 69, CP), a pena total é de 08 (oito) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto (art. 33, § 2º, "b", CP), mais 1.200 (mil e duzentos) dias-multa, ao mínimo unitário. IV. DISPOSITIVO E TESE NEGADO PROVIMENTO ao recurso de apelação criminal aforado por ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA, mantendo-se intacta a sentença em relação a ele. DADO PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação criminal manejado por NAIARA RAQUEL BORGES TERRA DE OLIVEIRA, para reduzir sua pena ao montante de 08 (oito) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, mais o pagamento de 1.200 (mil e duzentos) dias-multa, ao mínimo unitário. Tese de Julgamento: "É lícita a apreensão de drogas e outros materiais ilícitos por serendipidade durante o cumprimento de mandado de prisão, sem mandado de busca e apreensão. A condenação por tráfico e associação para o tráfico se sustenta em robusto conjunto probatório que indica a divisão de tarefas, hierarquia e prévio envolvimento com organização criminosa. A existência de inquéritos ou ações penais sem trânsito em julgado não pode exasperar a pena-base, sob pena de violação ao princípio da presunção de inocência e à Súmula 444 do STJ. A dedicação a atividades criminosas, evidenciada pela condenação por associação, afasta o tráfico privilegiado." Dispositivos Legais, Súmulas e Jurisprudência Mencionados: Código de Processo Penal (CPP): Art. 577, Art. 593, I, Art. 600. Código Penal (CP): Art. 297, caput; Art. 33, § 2º, "b"; Art. 69. Lei nº 11.343/06 (Lei de Drogas): Art. 33, caput, § 4º; Art. 35. Lei nº 12.850/2013 (Lei de Organizações Criminosas): Art. 2º. Lei nº 9.613/1998 (Lei de Lavagem de Dinheiro): Art. 1º, §§ 1º, II, e 4º. Súmulas: Súmula nº 444/STJ: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e de ações penais em curso para agravar a pena-base." Súmula nº 630/STJ: "A incidência da atenuante da confissão espontânea no crime de tráfico ilícito de entorpecentes exige o reconhecimento da traficância pelo acusado, não bastando a mera admissão da posse ou propriedade para uso próprio." Enunciado do TJMT: Enunciado nº 3 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas (TCCR/TJMT): "A condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006." Enunciado nº 8 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas (TCCR/TJMT): (Mencionado genericamente sobre idoneidade dos depoimentos policiais). Jurisprudência: STJ - Agravo Regimental no Habeas Corpus: AgRg no HC 832882 RS 2023/0213046-2, da relatoria do Ministro Messod Azulay Neto, julgado em 24/06/2024. STJ - AgRg no AREsp 2010603 TO 2021/0360913-6, da relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior. STJ - AgRg no HC n. 876.898/SC , Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 20/3/2024. N.U 1001347-81.2023.8.11.0028, Câmaras Isoladas Criminais, 2ª Câmara Criminal, Julgado em 13/03/2024, Publicado no DJE 17/03/2024. Processos de Origem/Mencionados: Ação Penal nº 1006027-67.2023.8.11.0042 (7ª Vara de Cuiabá/MT); SEEU 0008998-67.2017.8.11.0037; Ação Penal nº 1001153-54.2023.8.11.0037 (7ª Vara de Cuiabá/MT). RELATÓRIO EXMO. SR. DES. JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES (RELATOR). Egrégia Câmara: Trata-se de RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL interposto por AIARA RAQUEL BORGES TERRA DE OLIVEIRA e ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA, pretendendo a reforma da sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Primavera do Leste/MT, os quais foram condenados pela prática dos delitos previstos nos arts. 33, caput, e 35, caput, da Lei n. 11.343/06 (Lei de Drogas), sendo ainda ROBERTO condenado também pelo art. 297, caput, do Código Penal (uso de documento falso). A sentença prolatada pelo Juízo a quo condenou o réu ROBERTO à pena de 13 (treze) anos, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial fechado, além de 1.644 (mil seiscentos e quarenta e quatro) dias-multa; e a ré NAIARA à pena de 9 (nove) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, também em regime inicial fechado, e idêntico número de dias-multa. Em suas razões recursais, apelante NAIARA RAQUEL pugna pela desclassificação do crime de tráfico para o tipo previsto no art. 28 da Lei 11.343/06 (porte de drogas para consumo pessoal), sob o fundamento de ausência de provas da finalidade mercantil da conduta, bem como pela absolvição da imputação relativa ao art. 35 da mesma lei. Subsidiariamente, requer: (I) revisão da dosimetria da pena, com afastamento das circunstâncias judiciais negativadas com fundamentação genérica; (II) reconhecimento e aplicação da causa de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06 (tráfico privilegiado); (III) abrandamento do regime inicial de cumprimento da pena. Por sua vez, a defesa técnica do corréu ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA argumenta, preliminarmente, pela nulidade das provas decorrentes da diligência de apreensão realizada no interior da residência do acusado, por ausência de autorização judicial específica para busca domiciliar, apesar da existência de mandado de prisão. No mérito, requer a absolvição quanto aos delitos de tráfico e associação para o tráfico, por ausência de provas da autoria, atribuindo a droga apreendida exclusivamente à corré NAIARA. O Ministério Público manifestou-se pelo desprovimento do recurso, pugnando pela manutenção da sentença objurgada. A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso interposto, de forma a manter-se incólume a sentença condenatória. É o relatório. À douta revisão. VOTO Preliminar de intempestividade Inicialmente, cumpre rechaçar a preliminar de intempestividade suscitada pelo Ministério Público em sede de contrarrazões. Com efeito, o Código de Processo Penal, em seu artigo 593, inciso I, estabelece o lapso temporal de 5 (cinco) dias para a interposição do Recurso de Apelação. O mesmo diploma legal, em seu artigo 600, prevê que as razões recursais devem ser apresentadas no prazo de 8 (oito) dias. No entanto, é cediço na jurisprudência pátria que a não apresentação das razões recursais dentro do prazo legal configura mera irregularidade, de índole formal, que não possui o condão de obstar o conhecimento do recurso interposto, máxime quando o ato processual da interposição recursal se deu no prazo legal. No caso em tela, observa-se que a sentença condenatória foi exarada em 11 de junho de 2024 (ID 251505348). Ato contínuo, o recorrente Roberto Terra de Oliveira, intimado pessoalmente da decisão em 18 de junho de 2024, manifestou seu inequívoco interesse em recorrer (ID 251505361). A materialização do apelo, por intermédio de seu advogado, ocorreu em 21 de junho de 2024, com a expressa ressalva de apresentação das razões recursais na instância superior (ID 251505367), prática plenamente admitida pelos tribunais superiores. A tempestividade da interposição do recurso, ademais, foi certificada nos autos (ID 251505371), o que corrobora a regularidade do ato. Em síntese, o recurso é tempestivo, porque apresentadas as razões dentro do prazo de oito dias a partir da intimação pessoal do réu, que tem legitimação autônoma para recorrer. Desta feita, considerando ainda a distinção entre o prazo para interposição do recurso e o prazo para apresentação das razões, bem como a manifestação inequívoca do desejo de recorrer dentro do lustro legal, impõe-se, sem titubeios, a rejeição da preliminar de intempestividade e, consequentemente, o conhecimento do apelo interposto pela defesa. Da preliminar de nulidade da busca domiciliar A defesa constituída por Roberto Terra de Oliveira requer o reconhecimento da nulidade das apreensões realizadas, sob alegação de suposta violação de domicílio, pois o mandado contra ele expedido referia-se exclusivamente a uma ordem de prisão e não de busca e apreensão domiciliar. Sem razão, contudo Com efeito, a arguição defensiva de ilicitude da prova não prospera, especialmente quando confrontada com o fenômeno da serendipidade, ou como também se denomina, encontro fortuito de provas. Este instituto jurídico, amplamente reconhecido e chancelado pela jurisprudência das Cortes Superiores, opera quando, no curso de uma diligência legítima e devidamente amparada por ordem judicial – como no presente caso, onde se cumpriam mandados de prisão –, os agentes públicos se deparam, de forma inesperada e casual, com elementos probatórios de crime diverso daquele que motivou a ação inicial. Nesse diapasão, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça têm reiteradamente afirmado que a descoberta de objetos ou substâncias ilícitas durante o cumprimento de mandados de prisão, ainda que sem autorização específica para busca e apreensão, não invalida a prova obtida, desde que a apreensão não tenha sido resultado de uma busca preordenada e disfarçada, mas sim de um encontro casual e fortuito, tal como se verificou nos autos. A ação policial, nesse cenário, não denotou qualquer desvio de finalidade ou intenção de burlar as garantias constitucionais do domicílio. Ao contrário, a evidência colhida surgiu de forma espontânea, revelando-se um achado incidental durante uma intervenção policial que se revestia de legitimidade. Observe-se, a propósito, que os policiais ouvidos narraram, de forma uníssona, que, ao adentrarem na residência, pela manhã, para dar cumprimento ao mandado de prisão, visualizaram a recorrente Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira arremessando três porções de drogas para cima do guarda-roupa do casal. Confira-se, a propósito, a iterativa jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. NULIDADE DA BUSCA DOMICILIAR. CUMPRIMENTO DE MANDADO DE PRISÃO. ENCONTRO FORTUITO DE PROVAS. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA SERENDIPIDADE. INVIABILIDADE DO REEXAME DE FATOS E PROVAS NA VIA ELEITA. INEXISTÊNCIA DE NOVOS ARGUMENTOS HÁBEIS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (...) II - Na hipótese dos autos, ao entrar no imóvel para o cumprimento do mandado de prisão, o que já dispensaria a autorização também dada pelo morador, os agentes públicos encontraram 117,90g de maconha, além de uma balança de precisão, um caderno com anotações típicas de traficância e quantia em dinheiro (fl. 179). III - Portanto o que se tem, neste caso, é o encontro fortuito de provas, também chamado pela doutrina de serendipidade, pois a entrada dos policiais no domicílio do agravante se deu de forma lícita, sem que se possa falar em violação de domicílio, e, a partir daí, instaurou-se o estado de flagrância, quando localizada a droga e apetrechos ligados ao tráfico. (...) (Agravo Regimental no Habeas Corpus: AgRg no HC 832882 RS 2023/0213046-2, da relatoria do Ministro Messod Azulay Neto, julgado em 24/06/2024)” “AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. TESE DE NULIDADE. PROVAS ILÍCITAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. VERIFICAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. BUSCA DOMICILIAR. JUSTA CAUSA DEMONSTRADA PELA CORTE DE ORIGEM. EXISTÊNCIA DE MANDADO JUDICIAL DE PRISÃO PREVENTIVA EXPEDIDO CONTRA O AGRAVANTE. 1. Consta da exordial acusatória que, segundo restou apurado, os policiais civis diligenciaram até o Setor Costa Esmeralda com o intuito de dar cumprimento ao mandado de prisão preventiva expedido em desfavor do denunciado Jailson Gomes Ferreira, proveniente dos autos de nº. 0025098-63.2018.827.2706. [...] Ato contínuo, a equipe obteve a informação de que o Jailson estava hospedado na residência do denunciadoGabriel, tendo a equipe se deslocado até o local, dando cumprimento ao referido mandado. (fl. 16).2. Ao analisar a aludida nulidade, assim manifestou-se a Corte de origem (fls. 413/414): no caso dos autos, havia mandado judicial de prisão preventiva expedido contra Jailson Gomes, que se encontrava na residência do corréuGabriel Silva Almeida, e, em cumprimento a medida, os policiais constaram a presença de entorpecentes e a arma de fogo no local, evidenciando a situação de flagrância apta a justiçar a busca e apreensão, o que afasta qualquer nulidade. [...] Sendo assim, além de terem permissão legal para entrar no domicilio e efetuar a prisão do réu Jailson, os policiais se depararam, no interior do local, com os narcóticos e o armamento citado, o que configura o estado de flagrância. Nessas circunstâncias, o texto constitucional flexibiliza o direito fundamental à inviolabilidade de domicílio, dispensando eventual necessidade de autorização do morador para que os policiais adentrem na habitação, ex vi do disposto no artigo 5º, XI da CF. 3. Não se verifica ilegalidade na conduta perpetrada pelos policiais, notadamente diante do prévio mandado judicial de prisão preventiva expedido contra o agravante. 4. "Nos termos do disposto no art. 293 do CPP, o mandado de prisão expedido por autoridade competente é suficiente para autorizar o ingresso dos policiais no domicílio da ré, durante o dia, independentemente de permissão específica para a entrada na residência ou do consentimento do morador" (HC n. 559.652/MA, relator MinistroRibeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 23/6/2020, DJe de 26/6/2020.) - (AgRg no HC n. 876.898/SC, MinistroRibeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 20/3/2024). 5. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp 2010603 TO 2021/0360913-6, da relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior).” Logo, a apreensão das drogas na residência do apelante Roberto Terra de Oliveira enquadra-se perfeitamente no conceito de serendipidade, haja vista que os policiais, ao cumprirem os mandados de prisão, depararam-se, fortuitamente, com as substâncias entorpecentes. Não há nos autos qualquer indício de que a entrada dos agentes na residência tenha sido motivada por uma investigação prévia e clandestina com o intuito de localizar drogas, ou que o cumprimento dos mandados de prisão tenha servido de mero pretexto para uma busca ilícita. A regularidade da diligência inicial para cumprimento dos mandados de prisão outorga a validade da prova incidentalmente obtida, porquanto a descoberta da materialidade delitiva ocorreu em um contexto de legalidade e sem qualquer vício de origem. Destarte, a tese preliminar de nulidade suscitada pela defesa não se sustenta, revelando-se descabida ante a robustez da prova colhida sob o manto do encontro fortuito. A manutenção da higidez da prova, neste cenário, é medida que se impõe à luz da jurisprudência consolidada, assegurando a validade do procedimento e a regularidade do processo penal. Do mérito. Consta da denúncia a seguinte narrativa fática: “1º FATO: No dia 13 de setembro de 2023, por volta das 06 horas, na Rua Castelândia, nº 251, Bairro Castelândia, nesta cidade de Primavera do Leste/MT, os denunciados ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA e NAIARA RAQUEL BORGES TERRA DE OLIVEIRA, mantendo associação permanente e duradoura para a prática destas condutas, guardavam e tinham em depósito, para venda e entrega ao consumo de terceiros, 75,50g (setenta e cinco gramas e cinquenta centigramas) de maconha, acondicionada na forma de 03 (três) porções, (...) 2º FATO: Em datas e horários incertos, o denunciado ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA falsificou documento público verdadeiro, consistente em documento de identificação civil, que apresenta foto do denunciado e dados de identificação de terceiro, constando da cédula número de Registro Geral alterado, consoante Termo de Exibição e Apreensão (fl. 19 da Num. 130934266) e Relatório de Investigação n° 2023.13.77925 (fls.139/147 da Num. 130934445 - Pág. 1/9). HISTÓRICO DOS FATOS: Consta do caderno investigativo que agentes policiais visualizaram um casal, cuja aparência se assemelhava à dos denunciados ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA e NAIARA RAQUEL BORGES TERRA DE OLIVEIRA, adentrando na residência situada na Rua Castelândia nº 251, Bairro Parque Castelândia, no dia 12/09/2023. Diante do conhecimento da existência de mandados de prisão em face do denunciado ROBERTO, os policiais realizaram diligências para confirmar a identidade dos suspeitos avistados, bem como se realmente residiam naquela residência, o que restou confirmado por volta das 22 horas do dia 12 de setembro, quando novamente avistaram o denunciado ROBERTO no imóvel, bem como por outras diligências que ligavam NAIARA aquele imóvel. No dia seguinte, portanto 13 de setembro de 2023, por volta das 06 horas, os policiais civis adentraram ao imóvel, a fim de cumprirem o mandado de prisão em face do denunciado ROBERTO, que por sua vez quebrou seu aparelho celular ao avistar a equipe policial. Já a denunciada NAIARA RAQUEL, esposa do denunciado ROBERTO TERRA e que lá estava, ao avistar os agentes policiais jogou drogas e dinheiro em cima de um guarda-roupas no interior do imóvel, tentando escondê-los, o que foi avistado por um dos policiais que lá estavam. Em razão desta atitude suspeita da denunciada, os policiais civis verificaram o referido guarda-roupas, que ficava no quarto do casal denunciado, onde encontraram drogas e R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos reais) em espécie, levando os agentes públicos a procederem buscas no restante do imóvel. Nessas buscas subsequentes foram localizados um aparelho eletrônico Tablet, seis aparelhos celulares, outras porções de drogas, anotações contábeis relativas ao tráfico de drogas, além de uma cédula de identidade falsificada, contendo a foto do denunciado ROBERTO TERRA, mas constando o nome de Francisco Santos, bem como outros dados divergentes dos do denunciado ROBERTO. Às fls.139/147 da Num. 130934445 - Pág. 1/9 está encartado Relatório de Investigações elaborado pela Polícia Civil, onde se relatam as investigações prévias contra ambos os denunciados, por integrarem Organização Criminosa, bem como por operaram juntos e associados no tráfico de drogas, sendo que os documentos que ora se junta demonstram que estão associados pelo menos desde o ano de 2022. “Ex positis” e, pelo que mais consta no incluso caderno informativo, o Ministério Público oferece DENÚNCIA em desfavor de ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA, como incurso nas sanções do artigo 33, “caput”, artigo 35, “caput”, ambos da Lei 11.343/06 e artigo 297, “caput”, do Código Penal; e de NAIARA RAQUEL BORGES TERRA DE OLIVEIRA, como incursa nas sanções do artigo 33, “caput” e artigo 35, “caput”, ambos da Lei 11.343/06;” Não existe qualquer pedido de absolvição em relação ao crime de falso. Das teses absolutórias e de desclassificação. Considerando a diversidade de pedidos absolutórios, em relação aos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico de drogas, reputo conveniente uma análise panorâmica das provas colhidas ao longo da persecução penal. Acerca da materialidade desses crimes, resta comprovada por diversos documentos, incluindo o Auto de Prisão em Flagrante Delito (ID. 130934261), Boletim de Ocorrência (ID. 130934263), Termo de Exibição e Apreensão (ID. 130934266), e o Relatório de Investigação nº 2023.13.77925 (ID. 130934445). Além disso, menciono o Laudo Pericial nº 512.3.10.9871.2023.136640-A01 (IDs 130934288 e 251505151) confirmou a presença de três porções de maconha, pesando 75,50 g gramas. Do mesmo modo, as declarações das testemunhas também corroboram a materialidade. Destaco, do auto de apreensão, os seguintes itens: três porções de maconha; R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos reais) em espécie, em notas de 100, 50, 2, 10, 5 e 2; aparelhos eletrônicos (1 tablet e 6 aparelhos celulares); uma cédula de identidade com Indícios de falsificação; um cartão Nubank em nome de Supernatural Food; 01(um) unidade(s) Lacre 04118649 Contendo Folhas de Anotação, Código de Apreensão 38131 (em Custódia na Delegacia). Consta dos autos, ainda, o RELATÓRIO DE INVESTIGAÇÃO N° 2023.13.77925, que revela, a partir de uma análise das folhas de caderno apreendidas, uma contabilidade de tráfico de drogas detalhada em anotações, onde indivíduos como "Jogador", "Higuim", "Pelega" e "Catri" (Nathalia Borges) são associados a dívidas e grandes quantidades de entorpecentes, em quilogramas, como maconha, referida pelo termo "feijão", comprovando transações e volumes expressivos. Vejamos, ademais, as provas orais produzidas em juízo: O Delegado de Polícia, Ilustríssimo Senhor Honório Gonçalves dos Anjos Neto, em juízo, relatou sua atuação na fase inquisitiva: “(...) Promotora de Justiça: Doutor Honório, o senhor foi responsável pela condução das investigações no inquérito policial, onde se apura a prática dos delitos de tráfico de associação e de uso de documento falso envolvendo Naiara Raquel Borges e Roberto Terra de Oliveira, consta também que foi realizado um trabalho bem minucioso em relação à constatação de que os mesmos faziam parte de uma organização criminosa e tinham uma posição de destaque inclusive na organização que funciona, que existe aqui em Primavera do Leste, o senhor pode contar para a gente como é que os fatos se deram, as investigações que foram realizadas, as conclusões que a autoridade policial chegou, por favor? Del. Honório Gonçalves dos Anjos Neto: Sim, doutora, iniciou com a operação Alter Ego de 2022, nessa operação os investigadores conseguiram levantar elementos que apontavam que o Roberto Terra era um gerente do Comando Vermelho, aqui na cidade de Primavera do Leste e a esposa dele também exercia uma função financeira nessa organização criminosa, diante disso, né, teve a deflagração da operação, e ambos foragiram da cidade na época da deflagração, desde então os investigadores continuaram tentando localizar os suspeitos, né, e com base nesses levantamentos, os investigadores conseguiram identificar que ambos os suspeitos estavam em Primavera do Leste no ano passado, e que estariam numa residência ali no bairro Castelândia, iniciou-se uma diligência de campo, foi feito essa diligência de campo e os investigadores conseguiram visualizar o casal saindo numa motocicleta Honda Biz de uma residência e com base nisso eles puderam confirmar que aquela residência era da mãe da Naiara, ela tem uma residência ali na frente e tem várias quitinetes também naquele endereço, nesse mesmo dia os investigadores chegaram de passar por volta das 9 e pouco, 10 da noite, na residência e conseguiram visualizar o suspeito Roberto Terra, imediatamente chegaram de me comunicar, comunicar também o doutor Rodolfo, que é delegado aqui da DERF, e por conta de empecilhos jurídicos, né, por não ser permitido, foi feito um planejamento, na noite anterior, para poder executar às 6:00 da manhã o cumprimento do mandado de prisão contra o Roberto Terra, ele possuía dois mandados de prisão em aberto, salvo me engano, era decorrente da operação Alter Ego, que é tráfico de drogas, associação para o tráfico e organização criminosa, e também possuía um mandado de prisão em aberto por homicídio ou tentativa de homicídios, se não me falha a memória, então às 6 da manhã foi dado o cumprimento, inclusive eu estive no local juntamente com os investigadores, nós entramos na residência, na primeira residência, ali fica a mãe da Naiara, e eles estavam num compartimento ao lado, que ali são vários quartinhos, né, eles estavam lá, nós chegamos de bater na porta, a Naiara pegou e saiu, estava juntamente com mais duas filhas, né, inicialmente ali os policiais não tinham, não a haviam reconhecido, né, e nesse momento lá dentro do quarto o Roberto Terra, ele quebrou o celular dele, inclusive o celular pegou fogo, e a partir disso os investigadores entraram na residência e localizaram ele dentro do quarto do casal, com o celular no chão pegando fogo, e também durante esse adentramento, um dos investigadores pela janela conseguiu visualizar a suspeita Raquel jogando, jogando coisas em cima do guarda-roupa do casal, quando nós entramos no quarto havia dinheiro e também drogas em cima do guarda-roupa, e dentro do quarto também foi encontrado mais drogas, os investigadores encontraram mais drogas e salvo engano também algumas anotações e, além disso, dentro das coisas que tinham ali no quarto, os investigadores encontraram um documento que estava com dados de um terceiro e com a foto do Roberto Terra, informalmente ali ele até comentou que estaria até utilizando esse documento ali para poder fazer, pegar remédio, fazer tratamento, alguma coisa nesse sentido, né, diante disso, eles foram conduzidos e nós lavramos o flagrante pelo pelos crimes de tráfico de drogas e também a associação e o documento falso, foi mais ou menos esse sentido, doutora, pelo que eu me recordo. Promotora de Justiça: Foram juntados aos autos um relatório, né, da atividade policial, em que mencionava também o envolvimento da Naiara, na contabilidade dessa, nessa questão da comercialização de substâncias entorpecentes, o senhor pode falar um pouco para a gente? Del. Honório Gonçalves dos Anjos Neto: Então, doutora, é durante operação Alter Ego, identificou-se que ela fazia parte da contabilidade, inclusive ela possui ou possuía uma pessoa jurídica, né, que chama “Cartório Urgente”, que fica ali próximo da Câmara municipal, e foi identificado ali naquele inquérito, movimentações, dentro aí da facção criminosa, conversas, inclusive dentro do caderno de anotações do Léo do Chevette possuía várias menções ao Roberto Terra, né, e Naiara, ela teria essa função, né, da parte financeira, inclusive por meio dessa pessoa jurídica. Promotora de Justiça: Tem até registro fotográfico, das anotações que foram que foram localizadas, né, o senhor recorda o conteúdo dessas anotações, se guardavam referência à venda, a entrega, valores a receber, relacionados com a traficância? Del. Honório Gonçalves dos Anjos Neto: Doutora, essas, essas anotações eu não me, não me lembro de cabeça agora, né, mas ali no momento da prisão em flagrante, quando os investigadores estavam analisando, os papéis, o dinheiro, a droga, eles chegaram de repassar pra mim e pro doutor Rodolfo, e naquele momento ali, que é a parte, assim que eu tenho uma maior lembrança, por conta da diligência, tinha uma correlação e por conta disso nós fizemos a arrecadação e depois a apreensão. Promotora de Justiça: Em relação à droga, o senhor recorda, a quantidade, de que droga se tratava, como é que era a forma de acondicionamento? Del. Honório Gonçalves dos Anjos Neto: Ó, doutora, eu me recordo que era maconha, mas a forma de acondicionamento eu não me recordo. Promotora de Justiça: E essa droga foi localizada em cima do guarda-roupa? Del. Honório Gonçalves dos Anjos Neto: Em cima do guarda-roupa e também em mais locais dentro daquele quarto, lá dentro do quarto do casal, aí acredito que os investigadores que encontraram vão especificar melhor, mas toda a droga ali foi dentro do quarto do casal, droga e também dinheiro, dinheiro em cima do guarda-roupa, tinha muito dinheiro mesmo trocado, que ela pegou e jogou, não é muito comum não, inclusive alguns estava até amassado. (...) Del. Honório Gonçalves dos Anjos Neto: (...) Os investigadores, através da atividade típica mesmo, eles rodam a cidade, né, e fazem outras investigações, eles também procuram, vão atrás de foragidos, não só da questão da Alter Ego, mas de mandado de prisão que são expedidos, então eles têm a eles têm o hábito de pelo menos é uma ou duas vezes ao mês pegar os mandados de prisão em aberto e fazer diligências, e no ano passado, eles através de diligências, né, eles souberam que o Roberto Terra poderia estar aqui em Primavera, e assim depois, durante o levantamento, verificou-se que um casal, que se assemelhava muito à Naiara e o Roberto, saiu de uma residência, aí quando eles verificaram a residência, era da mãe da Raquel, né, e com base nisso, eles fizeram uma campana e conseguiram visualizar o alvo, a partir desse momento eles chegaram de me comunicar, aí eles tinham certeza que ele estava lá dentro, inclusive nós tomamos todos os cuidados pra dar o cumprimento legal, né, da ordem de prisão e entramos somente no outro dia, o que é permitido em lei, né, então nós tomamos todas as precauções, mas foi com base doutor, no dia a dia mesmo dos policiais, que eles conseguiram descobrir. (...) Advogado: O senhor sabe quanto tempo o senhor Roberto estava ai na região de Primavera do Leste? Del. Honório Gonçalves dos Anjos Neto: Não, quanto a isso, quanto a isso não, pelo que eles me passaram, seria que ele estaria de forma transitória aqui. Advogado: É, outra coisa, o senhor mencionou aqui que a senhora Naiara estava com mandado de prisão em aberto? Del. Honório Gonçalves dos Anjos Neto: Não, não, o Roberto Terra estava com mandado de prisão em aberto, né, pela Alter Ego e a questão do homicídio, quando nós chegamos lá, a gente suspeitava que ela estava com o mandado em aberto, né, mas depois ela chegou de explicar que estava com tornozeleira eletrônica em relação à operação Alter Ego, nós sequer tínhamos conhecimento que ela estava com tornozeleira eletrônica, então assim, quando nós fomos lá, é que nós descobrimos realmente que ela estava usando tornozeleira (...) Del. Honório Gonçalves dos Anjos Neto: Ó doutor, o que existe é o que está, né, mas eu vou te explicar o porquê que nós fizemos o auto de prisão em flagrante pelo tráfico e também o indiciamento, como o Roberto Terra, ele já era investigado por tráfico de drogas, organização criminosa e a associação para o tráfico, é muito comum geralmente, quando o suspeito está preso, ou está fora, falece, a esposa dá continuidade, e também já tinha informação anterior, né, que eu menciono a Alter Ego, né, que eles possuem envolvimento com o Comando Vermelho e com o tráfico de drogas, então a partir do momento que a gente encontra o entorpecente dentro da casa e também outros materiais, dinheiro, inclusive ela jogou, tentou esconder o dinheiro e a droga e as anotações, nós entendemos ali pela lei de drogas que haviam indícios suficientes para o tráfico e não para o uso, para o uso não, não, não havia nenhum elemento que indicasse, nenhum, sei lá, um cachimbo ou uma quantidade pequena, mas assim, tinha anotação e também tinha um processo anterior por tráfico, então para a gente foi suficiente essa investigação anterior por tráfico, para poder lavrar o auto de prisão em flagrante e indiciar também pelo tráfico de drogas. (...) Advogado: Além do que o senhor falou que encontrou, que foi encontrado, foi encontrado apetrechos para configurar ainda mais, para dar, robustecer o tráfico de drogas, como papel, invólucros, balança de precisão foi encontrado? Del. Honório Gonçalves dos Anjos Neto: Doutor, nós encontramos, pelo que me recordo, dinheiro que ela jogou, né, que é comum no tráfico e também anotação, que inclusive assim, foi juntado, foi até expedido uma ordem de serviço para os investigadores, fazerem um relatório, então esse foram esses elementos aí que que nós entendemos que havia o tráfico de drogas (...)” (Registro Audiovisual – ID 138803798). Confira-se, ademais, o depoimento prestado em juízo pelo Policial Civil, senhor Dalton Ribas Nery: “(...) PC Dalton Ribas Nery: O Roberto Terra, ele era procurado, né, tinha um mandado de prisão, né, expedidos na justiça, né, onde ele era investigado por tráfico e entregar a organização criminosa, inclusive ele foi indiciado e denunciado por essa por essa prática e pedido a prisão preventiva e foi deferida na época, foi feita uma operação e ele foragiu naquela época, dessa operação, e nós conseguimos localizar ele nesse endereço que a senhora descreveu, na Rua Castelândia, nº 251, (...) durante a ação para dar cumprimento ao mandado de prisão, né, colega policial viu a Naiara jogar o dinheiro, um pacote de dinheiro, em cima do guarda-roupa, aquilo chamou a atenção da equipe policial, que foi verificar, né, encontrou o dinheiro, né, e encontrou também entorpecente dentro do guarda-roupas, ali no guarda-roupa, dentro do quarto também nós encontramos anotações acerca, seria do controle do tráfico de drogas, anotações relativas a pesos e a valores recebidos, (...) Promotora de Justiça: É foram juntados também no termo de exibição, um documento de identificação civil, né, um RG falsificado, com a foto dele, mas com dados de terceira pessoa, o senhor recorda disso, se ele foi indagado que justificativa ele deu? PC Dalton Ribas Nery: Doutora, o documento foi achado durante essa busca, né, esse documento, né, o documento, né, ali tem, tinha a foto, né, do Roberto Terra, né, mas os dados contidos naquela RG eram de outra pessoa, né, outra pessoa que existe, que existe, né, pegou a foto e colocou ali no suporte de RG com dados de outra pessoa. Promotora de Justiça: É em relação ao que foi localizado, né, uma quantidade de maconha, o senhor recorda da forma de acondicionamento? (...) PC Dalton Ribas Nery: Ambas estavam embaladas, uma estava numa embalagem, uma quantidade maior de maconha, né, e havia mais 2 outras quantidades, se não me engano, envolvida em aqueles papéis insulfilme. (...) Promotora de Justiça: O senhor consegue lembrar do conteúdo dessas anotações, o senhor disse que fazia, é tinha relação com comercialização de drogas, né? PC Dalton Ribas Nery: Eu cheguei a visualizar as anotações ali era controle de distribuição de drogas, que falava em quilos, né, de feijão, ou seja, maconha, né, e era associado a alguns vulgos que a gente conhece, né, por exemplo, “boladão”, alguns outros indivíduos que a gente sabe que opera no tráfico, inclusive na operação em que ele foi indiciado e denunciado, esses indivíduos também foram denunciados e indiciados por integrar a organização criminosa junto com ele. Promotora de Justiça: Essa questão da contabilidade, né, ela ficava sobre a responsabilidade da Naiara, o senhor sabe dizer se alguma coisa foi apurada nesse sentido? PC Dalton Ribas Nery: Não, doutora, na prisão em flagrante, a gente só recolheu essas anotações, e elas não, a gente não conseguiu determinar se era feito pela Naiara ou pelo próprio Roberto, essa apuração não teve; (...) PC Dalton Ribas Nery: (...) Visualizou os dois entrando na residência, né, somado à que a gente sabia que aquele endereço tinha relação com eles, né, foi o que nós desconfiamos que fosse eles, né, e aí foi feita a vigilância, confirmamos que eles estavam lá os dois e a autoridade policial resolveu dar cumprimento ao mandado de prisão, eu acho que foi horas, de lapso temporal, de quando nós tomamos conhecimento que estavam lá até a execução, do cumprimento de mandado de prisão; (...)” (Registro Audiovisual – ID 138803798). Consta, outrossim, o depoimento judicial do Policial Civil Gilvan Antônio de Sá Teles: “(...) Promotora de Justiça: O senhor participou da investigação envolvendo esses fatos? PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Então, eu participei da operação que deu cumprimento ao mandado de prisão do Roberto, nós tínhamos a informação de que o Roberto Terra, que estava foragido da justiça, detinha mandado de prisão em seu desfavor pelo crime de tráfico de drogas e organização criminosa, que ele estava escondido numa residência do bairro Castelândia, minha equipe fez essa verificação, esse monitoramento, foi confirmado que realmente ele estava naquele local, foi montado uma operação, né, para o cumprimento de mandado, chegando ao local as equipes se posicionaram à residência, eu estava ao lado ali, e percebi que existia uma janela que estava aberta, e eu fiquei ali verificando e também fazendo ali a segurança da equipe que se posicionou na porta ali, e as equipes ao se identificar como policiais, eu vi que a senhora Naiara, ela arremessou um objeto em cima do guarda-roupa, antes de abrir a porta pra equipe, né, então eu orientei as equipes né, que existiu sobre esse fato, as equipes então fizeram uma vistoria no local indicado, e foi encontrado ali uma quantidade de dinheiro, e através também de outras buscas ali no local foi encontrado drogas, anotações referente ao tráfico de drogas, e o Roberto Terra também antes da senhora Naiara abrir a porta, ele quebrou o celular, né, e até circuitou e pegou fogo dentro do quarto deles, no quarto do casal. Promotora de Justiça: O senhor disse que o senhor Roberto ele tinha mandado de prisão, ele também era investigado, tanto ele como ela, por envolvimento com organização criminosa? PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Sim excelência, esses dois já são réus, né, no crime de tráfico de drogas e por integrar organização criminosa, por ser integrante de uma facção. Promotora de justiça: De qual facção? PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Comando Vermelho. Promotora de justiça: Os senhores fizeram ali uma, teria sido um, teriam monitorado essa residência um tempo para verificar se ele estava ali, como que foi esse trabalho? PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Eu não participei, mas houve sim um monitoramento no local para confirmar e realmente foi confirmado, foi visto ali o Roberto e a sua esposa naquele local e diante disso que foi desencadeada essa operação para cumprimento de prisão. Promotora de Justiça: Lá no local, o senhor disse que houve a apreensão de cadernos com anotações para o tráfico, né? PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Sim, foi apreendido. Promotora de Justiça: Nessa apuração anterior, foi possível ver se a Naiara tinha alguma ocupação lícita, algum trabalho lícito ou não? PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Não, nesse monitoramento não, não, não tivemos esse conhecimento não, não chegamos a ter conhecimento se tinha alguma atividade. Promotora de Justiça: E ali, naquele local, naquela residência, pelos policiais que fizeram um monitoramento, ou pelo senhor, foi visto alguma movimentação envolvendo tráfico ou tinha ainda denúncias de que eles continuavam com a traficância? PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Não, porque foi um caso fortuito né, na verdade a gente foi lá para dar um cumprimento de prisão, até porque o Roberto era foragido da justiça, acontece que o Roberto não, eu não tenho conhecimento também que o Roberto Terra tem, ou teve alguma atividade lícita, a não ser o tráfico de drogas. Promotora de Justiça: Ele não tem atividade lícita, apenas tráfico, é isso? PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Isso mesmo. Promotora de Justiça: Ele era foragido já há bastante tempo? PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Tinha algum tempo, excelência, desde que foi desencadeada a operação, se eu não me engano, em 2022, ele ficou todo esse tempo foragido (...) PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Doutor, o que que acontece, igual a doutora falou, se existia movimentação de pessoas que, existe outras condutas que configuram o tráfico de drogas, não necessariamente deve existir a todo o tempo uma movimentação de pessoas, uma movimentação de usuários de drogas naquele local, até porque o Roberto Terra, ele é líder de uma facção, a função dele é de liderança, então, o Roberto Terra, não ia, não é o perfil dele ficar, vamos dizer, traficando ali esse tráfico doméstico, ou seja, de fato não existia uma movimentação, até porque existem outras condutas, como guardar ou ter em deposito, não necessariamente deve existir uma movimentação. (...) Advogado: Que drogas foram encontradas? PC Gilvan Antônio de Sá Teles: Maconha, doutor, eu não acho, tudo o que eu falo é baseado em investigações, tanto que na questão do tráfico de drogas e da organização criminosa existe relatório, né, existem provas em relação a isso (...)” (Registro Audiovisual – ID 141894957) Os recorrentes foram interrogados em juízo, apresentando suas versões do fato: “(...) Juiz de Direito: Entendeu a acusação? Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira: Sim. Juiz de Direito: Ela é verdadeira? Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira: Não, senhor. Juiz de Direito: De quem que era a droga que estava lá? Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira: A droga era minha sim, para o meu consumo, eu sou usuária desde muito nova, de maconha, faço uso da maconha, (...) assim, eu peço uma nova oportunidade, mas eu nunca cometi tráfico de droga, nunca me envolvi em nada de ilícito; Juiz de Direito: Essa quantidade de droga, cada gama de maconha é suficiente para fazer 3 cigarros, 75 g seria o suficiente, equivalente a 225 cigarros, em quanto tempo a senhora ia fumar isso daí? Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira: É, assim, igual eu te falei, (...) eu trabalho, então não faço consumo na frente das minhas filhas, nem nada, em torno de uns 20 a 30 dias, senhor, eu sou viciada desde os meus 14 anos de idade; Juiz de Direito: Certo, e o dinheiro que estava lá? Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira: O dinheiro era 2000 reais que eu tinha recebido do meu serviço, que eu trabalho no empório buritis, eu sou caixa lá, operadora de caixa, eu tinha recebido naquele dia o meu salário de 2000 reais e os outros 400 reais que estava lá, era do meu esposo que ele tinha chegado de viagem, estava dentro da carteira dele; Juiz de Direito: Certo, e as anotações que tinham lá? Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira: Senhor, não sou ciente dessas anotações e nunca vi essas anotações dentro de casa. (...) Juiz de Direito: E o celular, que que aconteceu com o celular do seu esposo? Acusada: Ah, o celular, ele quebrou o celular; Juiz de Direito: Por qual motivo? Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira: Eu não, não, não sei te falar; Juiz de Direito: Ele mesmo que quebrou? Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira: Sim, ele mesmo quebrou; Juiz de Direito: E o da senhora? Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira: O meu celular, meu celular já estava quebrado fazia dias, eu estava sem o celular, já tinha uns 4 ou 5 dias, mas eles levaram meu telefone; Juiz de Direito: Tá, mas ninguém quebrou? Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira: Não, o meu não (...)” (Registro Audiovisual – ID 141894957). Recorrente Roberto, em juízo: “(...) Roberto Terra de Oliveira: Eu não tenho conhecimento, nem da droga, nem do dinheiro, porque eu não se encontrava, tinha dois dias que eu tinha chegado na cidade, (...) fui preso por esse mandado aí, né, que é da sétima Vara, que foi 2022, dia 13 de 2022, né, (...), e a outra coisa, traficando, eu jamais estava traficando, estava correndo atrás, né, da minha doença. (...) Promotora de Justiça: A droga que estava lá era de quem? Roberto Terra de Oliveira: A droga eu não tenho conhecimento, eu não tinha conhecimento. Promotora de Justiça: O senhor era companheiro da Naiara? Roberto Terra de Oliveira: Não, eu estava casada com ela no papel civil, casado e tem filho registrado, inclusive tem 5 (...). Promotora de Justiça: O senhor é casado com ela há quanto tempo? Roberto Terra de Oliveira: Sou casado com ela, assim já juntado com ela há 5 anos, só que nós casou depois. Promotora de Justiça: Tá, mas ela morava ali na Rua Castelândia, 251? Roberto Terra de Oliveira: Ali morava a mãe dela, porque quando eu estava fazendo tratamento, ela foi lá para a casa da mãe dela, e o meu endereço é Avenida Florianópolis, 810, entendeu, inclusive eu morava lá, inclusive foi lá que foi a operação, foi lá que foi buscar eu (...)” Promotora de Justiça: Tá, eu já vou chegar no documento, o senhor falsificou um documento, então, é isso? Roberto Terra de Oliveira: Não, eu falsifiquei o documento, mas eu não usei pra nada. Promotora de Justiça: E no que que consistiu essa falsificação, o senhor colocou uma foto do senhor no documento de Francisco Santos? Roberto Terra de Oliveira: É coloquei uma foto, senhora. Promotora de Justiça: Colocou uma foto no documento, isso? Roberto Terra de Oliveira: *Confirma com a cabeça* Promotora de Justiça: E o senhor estava fazendo o tratamento com o nome de Francisco Santos? Roberto Terra de Oliveira: Não, fiz tratamento no nome de Roberto Terra de Oliveira, foi orientado pelo meu advogado, fiz com meu nome. Promotora de Justiça: E o senhor fez esse documento de Francisco Santos por que o senhor estava com medo de ser preso, é isso? Roberto Terra de Oliveira: É porque eu já sabia já do mandado de prisão, entendeu, e eu com medo de ir de preso porque, como que eu ia me tratar (...)” Promotora de Justiça: Esse valor, esse dinheiro que foi apreendido na residência do senhor era de quem? Roberto Terra de Oliveira: Isso aí é do serviço dela, que eu não tinha conhecimento desse dinheiro não, é do serviço que ela estava trabalhando. Promotora de Justiça: Da Naiara, ela trabalhava com o quê? Roberto Terra de Oliveira: Ela trabalhava com conveniência, na conveniência, registrada. Promotora de Justiça: Tá, e essas anotações envolvendo tráfico de drogas são de quem? Roberto Terra de Oliveira: Não, não tem anotações não, inclusive pode fazer esse negócio de coisa, foi a polícia que colocou esse negócio, tem anotação minha não, eu não tenho conhecimento disso não; (...) Promotora de Justiça: O senhor está vendo a anotação aí? Roberto Terra de Oliveira: Estou vendo. Promotora de Justiça: Não é do senhor? Roberto Terra de Oliveira: Não, não, não, senhora. Promotora de Justiça: E nem da esposa do senhor? Roberto Terra de Oliveira: Não, senhora. Promotora de Justiça: E esse dinheiro aqui era da esposa do senhor? Roberto Terra de Oliveira: Esse dinheiro aí é dela, né, que ela trabalhava, eu tinha, eu tinha da minha viagem, eu tinha 400 reais na minha carteira, eles não devolveu e não fala que pegou o dinheiro da minha carteira, né. Promotora de Justiça: O senhor trabalhava, o senhor estava trabalhando? Roberto Terra de Oliveira: Não, eu tava fazendo o tratamento que eu não conseguia trabalhar mais, mas eu tinha firma aberta, inclusive, trancaram o meu, por causa dessa operação, trancaram meu CNPJ lá, entendeu, eu já prestava o serviço pra fazenda; (...). Roberto Terra de Oliveira: A esposa do senhor é usuária de drogas? Roberto Terra de Oliveira: Inclusive nós briga muito, briga muito, porque né, por causa que ela tem esse problema, entendeu né, problema de vício, então nós já tentemos, tentemos clínica, eu converso com ela bastante, entendeu, né, mas ela mudou bastante, assim que a gente ficava pegando no pé dela, eu junto com a mãe dela, (...) pegamos no pé dela, né, mas ela melhorou bastante, mas infelizmente não conseguiu parar. Promotora de Justiça: Quando ela arremessou essa droga para cima do guarda-roupa, o senhor viu isso? Acusado: Não, eu não vi, isso eu não vi. Promotora de Justiça: O senhor estava há dois dias na casa, mas não tinha visto a droga? Roberto Terra de Oliveira: Não tinha visto a droga lá, porque eu brigo demais com ela por causa da droga, ela tava escondendo de mim. Promotora de Justiça: E o senhor não tinha visto ela fazer uso da droga então nesses dias? Roberto Terra de Oliveira: Nesses dois dias, não. Promotora de Justiça: O senhor tinha saído com ela em uma motocicleta, uma Honda Bis? (...) Roberto Terra de Oliveira: Sim, senhora (...); Promotora de Justiça: O senhor faz tratamento do que, qual é a doença do senhor? Roberto Terra de Oliveira: Diabetes, diabetes severa descompensada (...)” (Registro Audiovisual – ID 141894957). (Registro Audiovisual – ID 141894957). Do detido cotejo dos elementos probatórios, concluo que as condutas dos apelantes se subsumem, integralmente, aos tipos penais imputados. Os depoimentos dos policiais, colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, revelaram-se harmônicos e coerentes, narrando com riqueza de detalhes as circunstâncias que levaram à prisão dos réus e à apreensão das substâncias entorpecentes, do dinheiro em espécie, do caderno de contabilidade do tráfico e do documento de identificação falso. A credibilidade de tais testemunhos é inquestionável, mormente porquanto inexistente qualquer indicativo de má-fé ou interesse indevido na condenação dos acusados. Cuida-se de entendimento pacificado na jurisprudência pátria e reiteradamente aplicado, conforme entendimento da Colenda Turma de Câmaras Criminais Reunidas do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, no Enunciado nº 8, que preconiza a idoneidade dos depoimentos policiais para sustentar a condenação criminal, desde que harmônicos com as demais provas. Nesse diapasão, a quantidade da droga apreendida, 75,50g de maconha, acondicionada em três porções, não se afigura compatível com o mero consumo pessoal, máxime quando cotejada com as demais provas dos autos. Ademais, a tentativa de Roberto em destruir seu aparelho celular no momento da abordagem policial, evidenciando seu comportamento altamente comprometedor, já bastante conhecido entre membros de facções criminosas, e a atitude de Naiara em ocultar objetos no guarda-roupas, denotam a inequívoca intenção de obstar a ação da justiça e de esconder a prática criminosa. A alegação de Naiara de ser usuária, por si só, não afasta a configuração do tráfico, porquanto é sabido que, muitas vezes, o vício impulsiona a atividade ilícita como meio de subsistência. A defesa não se desincumbiu do ônus de comprovar a destinação exclusiva para uso próprio, restando, portanto, isolada a tese desclassificatória no contexto probatório. Em sintonia com esse posicionamento, segue o teor doEnunciado nº. 3 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas: “A condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006”. Assim sendo, diante do contexto probatório, temos que não hádúvida quanto a destinação mercantil das substâncias entorpecentes, de modo que não há quese falar em desclassificação da conduta imputada à recorrente Naiara para o delito previsto no art. 28 da mesma Lei Antidrogas. Vejamos jurisprudência aplicável ao caso: “APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – (...) DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME PREVISTO NO ART. 28, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/2006 – DESCABIMENTO – ELEMENTOS SUFICIENTES A CARACTERIZAR A TRAFICÂNCIA – RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO – INVIABILIDADE – RÉU REINCIDENTE –DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE – INVIABILIDADE - RECURSO DESPROVIDO. (...) Se as circunstâncias elencadas nos autos não deixam dúvidas de que as drogas apreendidas seriam destinadas à difusão ilícita, não há falar-se em desclassificação do crime de tráfico para o de uso próprio, disposto no art. 28, da Lei n. 11.343/2006. Inviável o reconhecimento da causa de diminuição do tráfico privilegiado, se não preenchidos os requisitos expressamente previstos no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343 /2006, mormente quando comprovada a reincidência do agente. “Não há lógica em deferir ao condenado o direito de recorrer solto quando permaneceu segregado durante a persecução criminal, se persistentes os motivos para a manutenção da medida extrema” (STJ, HC n. 442.163/MA). (N.U 1001347-81.2023.8.11.0028, Câmaras Isoladas Criminais, Não Informado, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 13/03/2024, Publicado no DJE 17/03/2024). Diante desse contexto, ao contrário do que sustenta a defesa, as provas produzidas são suficientes para demonstrar a responsabilidade criminal imputada à apelante,impondo-se preservar a condenação do apelante por tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006). Outrossim, a robustez da prova emerge de investigações anteriores que já apontavam o envolvimento dos apelantes com o tráfico de drogas e organização criminosa desde 2022. Nesse sentido, os relatos dos Delegados Honório Gonçalves dos Anjos Neto e dos Policiais Civis Dalton Ribas Nery e Gilvan Antônio de Sá Teles são elucidativos. A Operação "Alter Ego" de 2022 já indicava Roberto como gerente do Comando Vermelho em Primavera do Leste e Naiara como responsável pela função financeira da organização. As anotações de controle de distribuição de drogas, as transferências bancárias para Luís André da Silva Neves originadas da empresa de Naiara, e o histórico criminal de Roberto, que responde a outra ação penal por organização criminosa, tráfico e associação para o tráfico (processo nº 1006027-67.2023.8.11.0042, da 7ª Vara de Cuiabá/MT), além de possuir condenação com trânsito em julgado (SEEU 0008998-67.2017.8.11.0037), revelam a contumácia delitiva. De igual modo, Naiara responde à ação penal nº 1001153-54.2023.8.11.0037, também na 7ª Vara de Cuiabá/MT, por organização criminosa e lavagem de dinheiro, o que corrobora sua participação ativa na estrutura criminosa. Nesse contexto, mostra-se completamente inverossímil a inexperiência alegada por ambos os recorrentes, sendo inacreditável a versão de Roberto de que apenas sua esposa seria usuária, e de que ele mesmo desconhecia a existência da droga em um único cômodo dividido pelo casal. A presença do caderno com anotações de contabilidade do tráfico, apreendido na residência do casal juntamente com as drogas e o dinheiro, corrobora o envolvimento em atividades de grande envergadura. Consta, ainda, que os nomes anotados no mencionado caderno, eram de pessoas conhecidas pela polícia pelo envolvimento no tráfico de drogas, sem perder de vista que, conforme testemunhos, os réus constavam de anotações de outros traficantes, apuradas em outros autos. As notas dão conta de elevados valores, mencionam expressamente a comercialização em quilogramas, de feijão, jargão corrente no meio da criminalidade para se referir à maconha. A mera negativa de autoria, dissociada de qualquer elemento probatório que a sustente, não tem o condão de ilidir o conjunto de provas que aponta para a atuação dos apelantes no comércio ilícito de entorpecentes. No que concerne à associação para o tráfico de drogas (art. 35 da Lei n.º 11.343/06) tem-se que o tipo penal exige, para a sua caracterização, a associação estável e permanente de dois ou mais agentes, agrupados com a finalidade de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, capute § 1º, e 34 do referido diploma legal. Na espécie, o acervo probatório demonstra, à saciedade, o animus associativo entre os réus, em caráter de estabilidade e permanência, com a finalidade precípua de traficar entorpecentes, e não apenas uma coautoria ocasional. A existência de hierarquia, divisão de tarefas e responsabilidades entre Roberto, como gerente da facção, e Naiara, no papel financeiro, revela a societas sceleris necessária à configuração do delito previsto no artigo 35 da Lei nº 11.343/06. As provas evidenciam uma ligação estreita e duradoura entre ambos, com o objetivo de perpetrar o tráfico de drogas, o que afasta a tese de mera coautoria ou participação. Dessa forma, diante da farta prova produzida nos autos, que inclui depoimentos policiais coesos e corroborados por investigações pretéritas, apreensão de quantidade significativa de droga, valores em dinheiro, material de contabilidade do tráfico, bem como o histórico criminal dos réus e suas ações evasivas no momento da abordagem, a manutenção da condenação pelos crimes de tráfico e associação para o tráfico é medida que se impõe, porquanto devidamente demonstradas a materialidade e a autoria delitivas, em conformidade com o ordenamento jurídico e a jurisprudência dominante. Conclusivamente, devem ser mantidas as condenações de ambos os recorrentes, pelos crimes descritos nos artigos 33 e 35 da Lei de Drogas. Por isso mesmo, ou seja, porque mantida a condenação pelo crime de associação para o tráfico, e sem perder de vista que a recorrente Naiara já responde a outra ação por delito semelhante, tem-se por delineada sua dedicação ao tráfico de drogas, fator a obstar a incidência da causa especial de diminuição de pena descrita no artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas. Da reforma da dosimetria. Por derradeiro, a recorrente Naiara pugna pela reforma da dosimetria, para que se afaste a exasperação das penas iniciais, sob o argumento de fundamentação inidônea, ou, ao menos, colima a readequação da fração aplicada a cada circunstância negativa. No ponto, o inconformismo prospera. Deveras, o juízo de primeira instância elevou as penas-basilares da apelante, considerando seus maus antecedentes. Para isso, anotou que a ré é alvo de outra ação penal (código 1001153-54.2023.8.11.0037) por envolvimento em organização criminosa (art. 2º da Lei nº 12.850/2013) e lavagem de dinheiro (art. 1º, §§ 1º, II, e 4º, da Lei nº 9.613/1998), em crimes cometidos entre fevereiro e março de 2022. Importante ressaltar que, até o momento, não foi proferida sentença condenatória nesse outro processo. Tal decisão não se coaduna com o entendimento pacificado desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, a exasperação da pena-base com fundamento em inquéritos policiais ou ações penais em andamento, sem o respectivo trânsito em julgado, configura inegável violação ao princípio da presunção de inocência, erigido à condição de garantia fundamental em nossa Carta Magna. Não se pode olvidar que a Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça é cristalina ao vedar peremptoriamente o uso de tais elementos para a valoração negativa das circunstâncias judiciais, mormente a dos antecedentes. Assim, o fato de a apelante responder a outra ação penal, ainda que por crimes graves como os descritos na Lei Federal nº 12.850/2013 e na Lei nº 9.613/1998, não tem o condão de justificar a majoração da pena-base, porquanto ausente a definitividade da condenação. Destarte, impõe-se a readequação da dosimetria das penas iniciais impostas à apelante Naiara. Em relação ao crime de tráfico de drogas, estabeleço a reprimenda basilar em seu mínimo legal, isto é, 05 anos de reclusão. Não constato a existência de atenuantes ou agravantes, sobretudo porque, nos termos da súmula 630 do STJ, “a incidência da atenuante da confissão espontânea no crime de tráfico ilícito de entorpecentes exige o reconhecimento da traficância pelo acusado, não bastando a mera admissão da posse ou propriedade para uso próprio”. Não constato qualquer causa de aumento ou diminuição de pena, sobretudo nos termos da fundamentação anterior, no sentido da inaplicabilidade da causa especial de diminuição de pena do artigo 33, § 4°, da Lei de Drogas, diante da dedicação ao tráfico de entorpecentes e da condenação pelo crime de associação para o tráfico. Portanto, fixo a pena do crime de tráfico de drogas em 05 (cinco) anos de reclusão, mais o pagamento de 500 dias-multa, ao mínimo legal. Em relação ao crime de associação para o tráfico, estabeleço a pena no mínimo legal, isto é, 03 (três) anos de reclusão, e 700 (setecentos) dias-multa, ao mínimo legal, reprimenda que torno definitiva, diante da inexistência de agravantes, atenuantes, causas de aumento ou de diminuição de pena. Operando a soma das sanções, diante do cúmulo material (art. 69, do Código Penal), encontro a pena total de 08 (oito) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, nos termos do artigo 33, § 2º, “b”, do Código Penal, mais o pagamento de 1.200 (mil e duzentos) dias-multa, ao mínimo unitário. DISPOSITIVO Logo, em consonância com o parecer, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação criminal aforado por ROBERTO TERRA DE OLIVEIRA e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação criminal manejado por NAIARA RAQUEL BORGES TERRA DE OLIVEIRA, pare reduzir sua pena ao montante de 08 (oito) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, mais o pagamento de 1.200 (mil e duzentos) dias-multa, ao mínimo unitário. Oficie-se ao Juízo da Execução Penal acerca da modificação operada na pena da recorrente Naiara Raquel Borges Terra de Oliveira. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025

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