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Severino Felix De Sousa x Banco Do Estado Do Rio Grande Do Sul Sa

ID: 283306157

Tribunal: TJCE Órgão: 5º Gabinete da 4ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 3000066-30.2025.8.06.0059

Data de Disponibilização: 29/05/2025

Polo Ativo:

SEVERINO FELIX DE SOUSA

Polo Passivo:

BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL SA

Intimação

Advogados:

ALEX SCHOPP DOS SANTOS

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

MARCOSORRITE GOMES ALVES

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE PARA EMENDA. AFRONTA AOS ARTS. 321 E 10, DO… EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE PARA EMENDA. AFRONTA AOS ARTS. 321 E 10, DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por SEVERINO FELIX DE SOUSA contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Caririaçu/CE, que indeferiu liminarmente a petição inicial da Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Repetição de Indébito e Danos Morais, ajuizada em face do BANRISUL S/A, extinguindo o feito sem resolução do mérito com base no art. 330, III, e art. 485, VI, do CPC, e na Recomendação nº 159/2024 do CNJ, sob o fundamento de ausência de interesse de agir. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se é válida a extinção do processo sem resolução do mérito por ausência de interesse de agir, em razão da existência de outras demandas conexas contra o mesmo réu; (ii) examinar se o indeferimento liminar da petição inicial, sem prévia intimação para emenda, configura nulidade por violação aos arts. 321 e 10 do CPC. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O art. 321 do CPC impõe ao juiz o dever de intimar a parte autora para emendar a inicial, sempre que constatadas irregularidades que dificultem o julgamento de mérito, sendo o indeferimento imediato da exordial permitido apenas após o não cumprimento dessa diligência. 4. A ausência de intimação para a emenda da petição inicial viola o princípio da não surpresa (CPC, art. 10) e o devido processo legal, resultando em nulidade insanável da sentença por error in procedendo. 5. A multiplicidade de ações contra o mesmo réu, fundadas em contratos distintos, não caracteriza ausência de interesse de agir nem prática predatória, sendo legítima a separação das demandas com base em causas de pedir diversas. 6. A cumulação de pedidos em uma única ação é faculdade do autor (CPC, art. 327), não sendo obrigatória, tampouco a sua não observância constitui fundamento para extinção do feito. 7. A Recomendação nº 159/2024 do CNJ, ainda que busque prevenir condutas abusivas, não possui força normativa suficiente para restringir direitos processuais constitucionalmente garantidos, como o acesso à justiça (CF, art. 5º, XXXV). 8. Não havendo risco concreto de decisões conflitantes, a reunião de processos por conexão (CPC, art. 55) é facultativa e não pode ser imposta como condição para o reconhecimento do interesse processual. IV. DISPOSITIVO: 9. Recurso provido. ________ Dispositivos legais relevantes citados: CF/1988, art. 5º, incs. XXXV, LIV e LXXIV; CPC, arts. 6º, 10, 55, 321, 327, 330, III e 485, VI. Jurisprudências relevantes citadas: TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Rel. Des. Everardo Lucena Segundo, j. 28.08.2024; TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Rel. Des. Francisco Darival Beserra Primo, j. 03.10.2023; TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Rel. Des. Carlos Alberto Mendes Forte, j. 26.02.2025; TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Rel.ª Des.ª Jane Ruth Maia de Queiroga, j. 26.02.2025; TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Rel.ª Des.ª Maria Regina Oliveira, j. 06.11.2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do recurso para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por SEVERINO FELIX DE SOUSA, com o objetivo de reformar a sentença de Id. nº 19936870, proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Caririaçu/CE, que extinguiu sem resolução do mérito a Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Repetição de Indébito c/c Condenação por Danos Morais, ajuizada pela parte ora Apelante em desfavor de BANRISUL S/A. Eis o dispositivo da sentença: "(...) Isto posto, indefiro a petição inicial, por ausência de interesse de agir, nos termos do art. 330, inciso III, e art. 485, VI, ambos do CPC e da Recomendação 159/2024 do CNJ. Fica a parte autora intimada para, no prazo de 15 dias, aditar o pedido nos autos n.º 3000068- 97.2025.8.06.0059 (processo mais antigo), único que continuará tramitando neste Juízo, a fim de incluir o contrato (s) ora questionado (s) naqueles autos, de modo que não terá nenhum prejuízo no seu direito de acesso à justiça. P.R.I Sem custas e honorários. Com o trânsito em julgado, arquive-se." Irresignada com a sentença, a parte Apelante interpôs o presente recurso, requerendo a reforma do decisum, anexando a minuta recursal no Id. nº 19936884, alegando, em apertada síntese, que ao indeferir a petição inicial, sem possibilitar ao Apelante a discussão acerca das cláusulas contratuais abusivas, o juízo a quo cerceou o seu direito de acesso ao Judiciário. Argumenta, também não há que se falar em reunião dos processos, uma vez que as ações apontadas tratam de fatos jurídicos diversos. Ao final, requereu o total provimento do recurso de Apelação para cassar a sentença proferida, determinando a remessa dos autos para o Juízo a quo, para o devido prosseguimento do feito. Contrarrazões no Id. nº 19936888. É o breve relatório, passo a decidir. VOTO I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL: Ab initito, quanto ao pedido de gratuidade judiciária, a parte Apelante declara a impossibilidade de arcar com as despesas processuais sem prejuízo do seu próprio sustento. É cediço que o instituto da assistência judiciária gratuita constitui meio de efetivação do direito constitucional de petição e do pleno acesso à justiça, destinando-se àqueles cuja situação econômico-financeira não lhes permita arcar com as despesas processuais sem prejuízo de sua subsistência. Nos termos do artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição da República, é assegurada assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Conforme dispõe o artigo 98, caput, e o artigo 99, ambos do Código de Processo Civil, a concessão da gratuidade judiciária depende de declaração da parte atestando sua incapacidade financeira. Quando formulada por pessoa natural, tal alegação goza de presunção relativa de veracidade, admitindo prova em contrário pela parte adversa ou sendo afastada pelo magistrado se houver nos autos elementos que evidenciem a ausência dos requisitos legais. Nesse sentido, em respeito ao princípio do amplo acesso à justiça e diante da ausência de prova em sentido contrário, concedo o benefício da Justiça Gratuita à parte Apelante, assegurando-lhe o acesso à jurisdição. Por conseguinte, em juízo antecedente de admissibilidade recursal, observo que estão presentes os demais pressupostos intrínsecos ou subjetivos (cabimento, interesse e legitimidade, inexistência de súmula impeditiva) e extrínsecos ou objetivos (tempestividade, dispensa preparo, regularidade formal e a inexistência de fatos extintivos ou impeditivos do direito de recorrer), razão pela qual CONHEÇO DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. II - DO MÉRITO RECURSAL: O ponto central da controvérsia recursal consiste em avaliar se deve ser mantida ou reformada a sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo originário sem resolução de mérito, com fundamento no art. 330, inc. III c/c art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil e na Recomendação nº 159/2024 do Conselho Nacional de Justiça. Pois bem. In casu, com a devida vênia, impende destacar, desde logo, que o recurso comporta provimento. De início, vislumbra-se que o julgamento do feito foi proferido de forma equivocada, ao indeferir de plano a ação, sem oportunizar à parte Autora, ora Apelante, a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme estabelece o artigo 321 do Código de Processo Civil. É cediço que o referido dispositivo legal prevê, de forma expressa, que, ao constatar que a petição inicial não atende aos requisitos dos artigos 319 e 320 ou apresenta falhas que possam comprometer o julgamento do mérito, o magistrado deve intimar a parte autora para promover as correções ou complementações necessárias, fixando o prazo de 15 (quinze) dias e indicando de maneira clara o vício a ser sanado. O parágrafo único do artigo 321 ainda estabelece que apenas no caso de descumprimento da diligência é que a petição inicial poderá ser indeferida, in verbis: "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Com efeito, ao magistrado somente é lícito indeferir a petição inicial após oportunizar à parte Autora a possibilidade de sanar eventuais vícios que possam macular a sua peça vestibular. A inobservância desse procedimento implica a supressão do direito subjetivo da parte e configura manifesta afronta ao princípio da não surpresa, expressamente consagrado no artigo 10 do Código de Processo Civil: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." Dessa forma, a concessão de prazo para a emenda da inicial não representa mera faculdade do juízo, mas sim um direito processual da parte Autora e um dever legal do magistrado. Tal providência visa assegurar a observância de princípios constitucionais e processuais fundamentais, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a economia processual, a instrumentalidade das formas e a vedação às decisões-surpresa. Nesse contexto, consolidou-se a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça no sentido de que o indeferimento liminar da petição inicial, sem a prévia intimação para emenda, resulta na nulidade da sentença. Tal prática caracteriza erro de procedimento, uma vez que viola não apenas o devido processo legal, mas também compromete a efetividade da tutela jurisdicional, na medida em que desconsidera a primazia do julgamento de mérito e os princípios da economia e celeridade processuais. Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 485, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA DA INICIAL. CONTRARIEDADE AO PROCEDIMENTO DO ART. 321 DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE INSANÁVEL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A EXTINÇÃO DA AÇÃO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença decretou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por indeferimento da petição inicial, na forma do art. 485, I, do CPC, sob o fundamento de que o ajuizamento de que o fracionamento indevido de ações conexas configura abuso do direito de ação. 2. O art. 321, do Código de Processo Civil prevê expressamente que, quando o juiz constatar que a petição inicial não atende as exigências do art. 319 e 320, ou apresentar falhas que possam atrapalhar o julgamento de mérito, não só deverá intimar a parte autora para realizar as correções ou complementações necessárias no prazo de 15 (quinze) dias, como deverá indicar claramente o vício a ser corrigido. E prossegue, em seu parágrafo único, determinando que apenas em caso de não cumprimento da diligência a petição inicial será indeferida. 3. Assim, a oportunidade de emenda da inicial constitui, não só um direito da parte autora, como também é o procedimento legal a ser observado pelo juiz da causa, em atenção aos princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 4. Desse modo, há de se reconhecer que a extinção do feito pelo indeferimento liminar da inicial sem que seja dada à parte autora a oportunidade de emendar a petição inicial, infringe comando legal do art. 321, do CPC, fere os princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento de mérito, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 5. Além disso, devo observar que a configuração de conduta predatória do advogado não ocorre pela simples verificação da quantidade de ações ajuizadas, mas pela presença de outras circunstâncias associadas, como por exemplo, o fracionamento indevidos de pedidos relativos a um mesmo contrato em diferentes ações ou o ajuizamento da mesma ação (parte, pedido e causa de pedir) em diferentes varas ou comarcas, visando escolher o juízo que lhe parece ter o entendimento mais favorável, para depois desistir dos outros processos, burlando o princípio do juiz natural, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Desse modo, é absolutamente irrazoável a conclusão de que o ajuizamento de 3 (três) ações, em que cada uma aborda um contrato diferente do outro, constitua abuso do deito de ação e fragmentação indevida de processos. 7. Nesse contexto, estando descaracterizada a existência de abuso de direito de ação e de fragmentação indevida e estando evidenciada a causa de pedir, a legitimidade da parte e o interesse processual, há de se reconhecer a ausência de justa causa para a extinção do feito, por violação dos princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e do devido processo legal, consagrados pelo art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal, comprometendo a finalidade do processo, que é a satisfação do direito material pela primazia da sentença de mérito, nos termos dos arts. 4º e 6º, do CPC. 8. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Relator: Desembargador EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 28/08/2024, Data da publicação: 28/08/2024). (Destaquei). EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA OPORTUNIZAÇÃO DE EMENDA À INICIAL. OFENSA AO ART. 321 DO CPC E AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O cerne da questão posta à desate cinge-se a analisar a sentença hostilizada que, em face da ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito. 2. Da detida análise do fascículo processual, observa-se que o decisum foi proferido de forma equivocada, porquanto indeferiu de plano a ação, sem oportunizar à parte a possibilidade de emendar à inicial, nos termos do art. 321 do CPC. 3. Por consequência, caracterizada a ausência de oportunização à parte autora de emenda à inicial, em violação aos artigos 321 e 10 do CPC, a anulação da sentença é medida impositiva. 4. Apelação conhecida e provida. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Relator: Desembargador FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, 3ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 03/10/2023, Data da publicação: 04/10/2023). (Destaquei). Para além disso, no que se refere à alegação de abuso do direito de ação, ou o denominado "uso predatório da jurisdição", cumpre observar que, embora tal conduta possa, em tese, configurar prática temerária, não se amolda à hipótese prevista no art. 330, inciso III, do Código de Processo Civil. Isso porque o interesse processual - entendido como o binômio necessidade e adequação - encontra-se plenamente caracterizado no caso concreto. A necessidade decorre da vedação à autotutela no ordenamento jurídico pátrio, de modo que, inexistindo mecanismos extrajudiciais idôneos para a satisfação de sua pretensão, incumbe à parte Autora recorrer ao Poder Judiciário. Por sua vez, a adequação refere-se à utilização dos instrumentos processuais apropriados para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida. Nesse contexto, a cumulação de pedidos contra o mesmo réu, ainda que tenham como origem contratos/fatos diversos, configura mera faculdade, e não obrigatoriedade, deferida à parte, nos termos do art. 327 do CPC, que assim dispõe: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326 . Diante disso, não é válida a fundamentação do Magistrado de primeira instância de que a existência de múltiplas ações movidas para anular negócios jurídicos e requerer indenização por danos morais em face da mesma instituição financeira indicaria falta de interesse processual, uma vez que a Autora deveria ter apresentado apenas uma demanda. Isso se deve ao fato de que, em situações de conexão entre ações, a consequência processual é a junção dos processos para julgamento conjunto e não a sua extinção por ausência de interesse de agir, conforme preleciona o art. 55, do CPC, in verbis: "Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II - às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre ele." Assim, tem-se que a conexão entre os processos têm como objetivo evitar decisões conflitantes, garantindo que, caso haja a possibilidade de ocorrerem decisões contraditórias e/ou prejudiciais as partes envolvidas, as demandas sejam julgadas simultaneamente pelo mesmo juízo. A multiplicidade de ações, nesse contexto, reflete a diversidade das relações jurídicas analisadas, sendo inadequada a extinção de processos com fundamento na quantidade de demandas ajuizadas. Tal medida se mostra incompatível com os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal, assegurados pela Constituição. Cada ação deve ser examinada individualmente, levando em conta os direitos materiais em debate e a necessidade de proteção contra eventuais práticas contratuais abusivas ou irregulares. No caso concreto, embora os processos tratem de questões semelhantes, os objetos das ações são distintos, versando cada uma sobre diferentes contratos, razão pela qual não há que se falar em conexão, visto que não há igualdade entre as causas de pedir. A propósito, colaciona-se precedente desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDEFERIMENTO. IMPROPRIEDADE. AJUIZAMENTO DE MÚLTIPLAS AÇÕES. CAUSA DE PEDIR DISTINTAS. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta por Maria Deusina Freitas Ferreira Pires em contrariedade a sentença que indeferiu a inicial e julgou extinta a ação declaratória negativa de débito c/c indenização por dano moral ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, ora recorrido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão diz respeito à análise do acerto da sentença de extinção sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O Juízo a quo indeferiu a petição inicial declarando extinta a presente ação sem resolução de mérito, em face do ajuizamento de várias ações contra o mesmo réu sobre fatos semelhantes, em vez de propor uma única ação. 4. Contudo, compulsando os fólios processuais, verifica-se que a petição inicial atende os requisitos estabelecidos pela legislação processual civil, de modo que as condições da ação estão presente no caso em análise, sobretudo porque o fundamento utilizado para o indeferimento da inicial não é albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. 5. Apesar de as ações se referirem ao mesmo réu, verifica-se que as demandas são fundamentadas em causa de pedir diversas, especialmente porque são distintas os valores das dívidas e contratos. 6. Dessa forma, ao prolatar a sentença, o Juízo a quo não agiu com acerto, incorrendo em error in procedendo, devendo, pois, os presentes autos ser devolvidos à instância de origem para regular processamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso provido, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. (TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Relator: Desembargador CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, 2ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 27/02/2025). (Destaquei). EMENTA: Apelação Cível. Direito Processual Civil. Empréstimo Consignado. Ajuizamento de Diversas Ações. Sentença de Indeferimento da Petição Inicial e Extinção Do Processo Sem Resolução Do Mérito. Impossibilidade. Recurso Conhecido e Provido. Sentença Anulada. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pela parte autora objetivando a anulação da sentença que indeferiu a petição inicial (art. 330, III, do CPC), em sede de ação declaratória de inexistência/nulidade de débito movida em desfavor do Banco Bradesco S/A. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar se a mera quantidade de ações ajuizadas pela parte apelante contra a mesma instituição financeira é causa para extinção do feito sem resolução de mérito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. No caso, a parte autora impugna o contrato de empréstimo consignado de nº 393193016, com descontos mensais no valor de R$ 51,10, a ser quitado em 32 parcelas. 4. O julgador proferiu a sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, após verificar que a parte ajuizou diversas ações contra a mesma instituição financeira, impugnando diversos contratos supostamente realizados por ela. 5. Considerando que cada contrato realizado resulta em novo desconto adicionado aos proventos de aposentadoria da parte demandante, sendo esta sua causa de pedir, e que a parte tem a necessidade/utilidade de ir ao Judiciário para obter provimento jurisdicional apto a barrar tais descontos, não há que se falar em ausência de interesse processual no presente caso. 6. Ademais, o acesso à Justiça deve ser priorizado, em detrimento do excesso de formalismo, que resultou, no caso concreto, impedimento do acesso da parte apelante à jurisdição, ferindo a sua garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF, na qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". IV. DISPOSITIVO 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Relatora: Desembargadora JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 26/02/2025). (Destaquei). EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL POR FRACIONAMENTO DE DEMANDAS. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. I- Cinge-se a controvérsia em perquirir o acerto ou desacerto da sentença impugnada, que indeferiu a petição inicial, sob a fundamentação de existência de três ações, esta e outras duas, ajuizadas pela autora buscando anular descontos, supostamente indevidos, o que configuraria ausência de interesse processual, uma vez que a parte deveria ajuizar somente uma demanda. II- No caso concreto, conquanto os processos versem sobre matéria similar, ou seja, cobranças indevidas; referem-se a descontos de timbres, contratos e períodos diversos; assim, relações jurídicas distintas. Patente, pois, a legitimidade e o interesse processual. III- O fundamento utilizado pelo magistrado sentenciante não se aplica ao caso sub judice, ante a diferenciação entre as ações paradigmas por ostentarem como causa de pedir contratos diversos, o que descaracteriza a multiplicidade de ações; afastando-se, pois, a ocorrência do instituto da conexão e, ainda, a possibilidade de ocorrência do mero risco de decisões conflitantes, a que se refere o art. 55, § 3º do CPC. IV- Em que pese se tratar das mesmas partes, o fato de cada processo ostentar Contratos distintos, já é o suficiente para que se permita o processamento em separado, porquanto, antes de ser uma obrigação, a reunião dos pedidos em uma só demanda é uma faculdade (art. 327, CPC). V- Em homenagem aos princípios da cooperação, da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da primazia do julgamento de mérito; devemos autos retornar ao juízo de origem para que a inicial seja recebida, processada e sentenciada, na forma da lei. VI- Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Relatora: Desembargadora MARIA REGINA OLIVEIRA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 06/11/2024, Data da publicação: 06/11/2024). (Destaquei). Com efeito, os elementos probatórios apresentados pela parte Autora, ora Apelante, aliados à ausência de indícios concretos de litigância abusiva, demonstram que não se justifica a invocação genérica da Recomendação nº 159/2024 do CNJ como fundamento para restringir o direito de acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, a sentença ora recorrida se revela em desconformidade com o princípio da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, bem como afronta a garantia constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, segundo a qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Ademais, não se vislumbra, no caso em exame, fundamento jurídico que justifique a reunião dos feitos para instrução e julgamento conjuntos, uma vez que as demandas apresentam distinções relevantes quanto às circunstâncias fáticas que embasam o direito invocado pela parte ora Apelante. Dessa forma, inexiste risco concreto de prolação de decisões conflitantes, a afastar a necessidade de eventual reunião dos processos. Destarte, conclui-se que o Juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em error in procedendo, violando normas fundamentais do devido processo legal. Impõe-se, portanto, a anulação da sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja oportunizado o regular prosseguimento do feito, com observância aos princípios que regem o processo civil e às garantias constitucionais do jurisdicionado. DISPOSITIVO Diante do exposto, pelos argumentos fartamente coligidos e com fulcro nos documentos e dispositivos legais acima invocados, CONHEÇO do presente recurso de Apelação Cível para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, a fim de decretar a nulidade da sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. É como voto. Fortaleza, data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator

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Raimundo Nonato Rabelo x Banco Pan S.A.

ID: 321295622

Tribunal: TJCE Órgão: 5º Gabinete da 4ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 3000135-49.2025.8.06.0128

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

RAIMUNDO NONATO RABELO

Polo Passivo:

BANCO PAN S.A.

Intimação

Advogados:

FELICIANO LYRA MOURA

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JOSE IDEMBERG NOBRE DE SENA

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EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE CONTRATO C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E DANOS MORAIS. INDEFERIMENTO LIMINAR DA INICIAL. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA. VIOLAÇÃO A… EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE CONTRATO C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E DANOS MORAIS. INDEFERIMENTO LIMINAR DA INICIAL. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 321 E 10 DO CPC. PRINCÍPIOS DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DO MÉRITO E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por Raimundo Nonato Rabelo contra sentença que extinguiu, sem resolução de mérito, ação anulatória de contrato cumulada com repetição do indébito e danos morais, sob o fundamento de ausência de interesse processual e configuração de fracionamento indevido de demandas. O Apelante sustenta a inexistência de litispendência e a legitimidade das ações, por versarem sobre contratos distintos e firmados com instituições diferentes. Requereu a cassação da sentença para o regular prosseguimento da demanda. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se o indeferimento da petição inicial, sem a prévia intimação da parte para emenda, viola os arts. 321 e 10 do CPC; (ii) definir se a multiplicidade de ações propostas pela parte autora, cada qual tratando de contratos diversos, configura ausência de interesse de agir ou litigância abusiva. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O indeferimento liminar da petição inicial, sem concessão de prazo para emenda, viola o art. 321 do CPC, que impõe ao magistrado o dever de oportunizar à parte a correção de vícios, sob pena de nulidade da decisão. 4. A ausência de intimação prévia para manifestação sobre fundamento decisório afronta o princípio da não surpresa, previsto no art. 10 do CPC, configurando cerceamento do direito de defesa. 5. A jurisprudência do TJCE é pacífica no sentido de que o não atendimento ao art. 321 do CPC implica nulidade da sentença por error in procedendo, com retorno dos autos à origem. 6. O ajuizamento de múltiplas ações que envolvem contratos distintos não configura, por si só, abuso do direito de ação ou ausência de interesse processual, conforme entendimento consolidado no TJCE. 7. O art. 327 do CPC estabelece que a cumulação de pedidos em uma única demanda é faculdade da parte, e não imposição legal, sendo legítima a proposição de ações autônomas quando fundadas em relações jurídicas distintas. 8. A extinção do processo, com base em presunções sobre eventual uso predatório da jurisdição, sem indícios concretos de má-fé, viola os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do acesso à justiça (CF, art. 5º, incs. XXXV e LIV). 9. A Recomendação nº 159/2024 do CNJ, citada de forma genérica, não autoriza a supressão de direitos processuais fundamentais, tampouco legitima decisões sem observância do contraditório e da cooperação processual (CPC, art. 6º). IV. DISPOSITIVO: 10. Recurso provido. ________ Dispositivos legais relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXV, LIV; CPC, arts. 4º, 6º, 10, 55, 321, 327, 485, VI. Jurisprudências relevantes citadas: TJCE, ApCiv nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Rel. Des. Everardo Lucena Segundo, j. 28.08.2024; TJCE, ApCiv nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Rel. Des. Francisco Darival Beserra Primo, j. 03.10.2023; TJCE, ApCiv nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Rel. Des. Carlos Alberto Mendes Forte, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Rel. Des. Jane Ruth Maia de Queiroga, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Rel. Des. Maria Regina Oliveira, j. 06.11.2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do recurso para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por RAIMUNDO NONATO RABELO, com o objetivo de reformar a sentença de Id. nº 23296396, proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Morada Nova/CE, que extinguiu sem resolução do mérito a Ação Anulatória de Contrato c/c Repetição do Indébito e Condenação por Danos Morais, ajuizada pela parte ora Apelante em desfavor de BANCO PAN S/A. Eis o dispositivo da sentença: "(...) Pelo exposto, com base nos artigos 330, III, e 485, VI, do CPC e art. 5°, LV, da Constituição Federal, INDEFIRO a petição inicial, extinguindo o processo sem resolução do mérito. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais, suspensa a exigibilidade pela gratuidade da justiça ora concedida, com fundamento no art. 98, §3º, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as cautelas legais." Irresignada com a sentença, a parte Apelante interpôs o presente recurso, requerendo a reforma do decisum, anexando a minuta recursal no Id. nº 23296401, alegando, em apertada síntese, que não se configura litispendência, nos termos da legislação processual vigente, uma vez que as demandas foram ajuizadas com o propósito de impugnar contratos distintos, inclusive firmados com instituições diversas. Assim, não se pode admitir que o requerente - pessoa idosa, consumidor e parte hipossuficiente na relação jurídica - permaneça desamparado pela jurisdição estatal, unicamente pelo fato de ter optado por postular seus direitos em ações autônomas, relativas a vínculos contratuais distintos. Argumenta que não se pode afirmar que a recorrente carece de interesse processual, uma vez que restou diretamente afetada em seu único patrimônio - o benefício previdenciário -, utilizado para sua subsistência e de sua família, sendo este objeto de descontos mensais. Tal circunstância evidencia, de forma inequívoca, seu interesse de agir. Aduz que não se pode indeferir a petição inicial em evidente prejuízo do consumidor, com base em meras suposições que desqualificam, de forma prematura, sua idoneidade. Tal conduta, além de contrariar o princípio da boa-fé, acaba por fomentar, ainda que indiretamente, a perpetuação de práticas abusivas por parte das instituições financeiras contra o consumidor hipossuficiente. Ao final, requereu o total provimento do recurso de Apelação para cassar a sentença proferida, determinando a remessa dos autos para o Juízo a quo, para o devido prosseguimento do feito. Justiça Gratuita deferida à parte Autora, ora Apelante, na sentença de Id. nº 23296396. Contrarrazões juntada no Id. nº 23296406. É o breve relatório, passo a decidir. VOTO I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL: Ab initio, em juízo antecedente de admissibilidade recursal, presentes os pressupostos intrínsecos ou subjetivos (cabimento, interesse e legitimidade, inexistência de súmula impeditiva) e extrínsecos ou objetivos (tempestividade, preparo, regularidade formal e a inexistência de fatos extintivos ou impeditivos do direito de recorrer), hei por bem CONHECER DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO. II - DO MÉRITO RECURSAL: O ponto central da controvérsia recursal consiste em avaliar se deve ser mantida ou reformada a sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo originário sem resolução de mérito, com fundamento no art. 330, inc. III c/c art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil. Pois bem. In casu, com a devida vênia, impende destacar, desde logo, que o recurso comporta provimento. De início, vislumbra-se que o julgamento do feito foi proferido de forma equivocada, ao indeferir de plano a ação, sem oportunizar à parte Autora, ora Apelante, a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme estabelece o artigo 321 do Código de Processo Civil. É cediço que o referido dispositivo legal prevê, de forma expressa, que, ao constatar que a petição inicial não atende aos requisitos dos artigos 319 e 320 ou apresenta falhas que possam comprometer o julgamento do mérito, o magistrado deve intimar a parte autora para promover as correções ou complementações necessárias, fixando o prazo de 15 (quinze) dias e indicando de maneira clara o vício a ser sanado. O parágrafo único do artigo 321 ainda estabelece que apenas no caso de descumprimento da diligência é que a petição inicial poderá ser indeferida, in verbis: "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Com efeito, ao magistrado somente é lícito indeferir a petição inicial após oportunizar à parte Autora a possibilidade de sanar eventuais vícios que possam macular a sua peça vestibular. A inobservância desse procedimento implica a supressão do direito subjetivo da parte e configura manifesta afronta ao princípio da não surpresa, expressamente consagrado no artigo 10 do Código de Processo Civil: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." Dessa forma, a concessão de prazo para a emenda da inicial não representa mera faculdade do juízo, mas sim um direito processual da parte Autora e um dever legal do magistrado. Tal providência visa assegurar a observância de princípios constitucionais e processuais fundamentais, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a economia processual, a instrumentalidade das formas e a vedação às decisões-surpresa. Nesse contexto, consolidou-se a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça no sentido de que o indeferimento liminar da petição inicial, sem a prévia intimação para emenda, resulta na nulidade da sentença. Tal prática caracteriza erro de procedimento, uma vez que viola não apenas o devido processo legal, mas também compromete a efetividade da tutela jurisdicional, na medida em que desconsidera a primazia do julgamento de mérito e os princípios da economia e celeridade processuais. Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 485, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA DA INICIAL. CONTRARIEDADE AO PROCEDIMENTO DO ART. 321 DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE INSANÁVEL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A EXTINÇÃO DA AÇÃO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença decretou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por indeferimento da petição inicial, na forma do art. 485, I, do CPC, sob o fundamento de que o ajuizamento de que o fracionamento indevido de ações conexas configura abuso do direito de ação. 2. O art. 321, do Código de Processo Civil prevê expressamente que, quando o juiz constatar que a petição inicial não atende as exigências do art. 319 e 320, ou apresentar falhas que possam atrapalhar o julgamento de mérito, não só deverá intimar a parte autora para realizar as correções ou complementações necessárias no prazo de 15 (quinze) dias, como deverá indicar claramente o vício a ser corrigido. E prossegue, em seu parágrafo único, determinando que apenas em caso de não cumprimento da diligência a petição inicial será indeferida. 3. Assim, a oportunidade de emenda da inicial constitui, não só um direito da parte autora, como também é o procedimento legal a ser observado pelo juiz da causa, em atenção aos princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 4. Desse modo, há de se reconhecer que a extinção do feito pelo indeferimento liminar da inicial sem que seja dada à parte autora a oportunidade de emendar a petição inicial, infringe comando legal do art. 321, do CPC, fere os princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento de mérito, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 5. Além disso, devo observar que a configuração de conduta predatória do advogado não ocorre pela simples verificação da quantidade de ações ajuizadas, mas pela presença de outras circunstâncias associadas, como por exemplo, o fracionamento indevidos de pedidos relativos a um mesmo contrato em diferentes ações ou o ajuizamento da mesma ação (parte, pedido e causa de pedir) em diferentes varas ou comarcas, visando escolher o juízo que lhe parece ter o entendimento mais favorável, para depois desistir dos outros processos, burlando o princípio do juiz natural, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Desse modo, é absolutamente irrazoável a conclusão de que o ajuizamento de 3 (três) ações, em que cada uma aborda um contrato diferente do outro, constitua abuso do deito de ação e fragmentação indevida de processos. 7. Nesse contexto, estando descaracterizada a existência de abuso de direito de ação e de fragmentação indevida e estando evidenciada a causa de pedir, a legitimidade da parte e o interesse processual, há de se reconhecer a ausência de justa causa para a extinção do feito, por violação dos princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e do devido processo legal, consagrados pelo art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal, comprometendo a finalidade do processo, que é a satisfação do direito material pela primazia da sentença de mérito, nos termos dos arts. 4º e 6º, do CPC. 8. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Relator: Desembargador EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 28/08/2024, Data da publicação: 28/08/2024). (Destaquei). EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA OPORTUNIZAÇÃO DE EMENDA À INICIAL. OFENSA AO ART. 321 DO CPC E AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O cerne da questão posta à desate cinge-se a analisar a sentença hostilizada que, em face da ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito. 2. Da detida análise do fascículo processual, observa-se que o decisum foi proferido de forma equivocada, porquanto indeferiu de plano a ação, sem oportunizar à parte a possibilidade de emendar à inicial, nos termos do art. 321 do CPC. 3. Por consequência, caracterizada a ausência de oportunização à parte autora de emenda à inicial, em violação aos artigos 321 e 10 do CPC, a anulação da sentença é medida impositiva. 4. Apelação conhecida e provida. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Relator: Desembargador FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, 3ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 03/10/2023, Data da publicação: 04/10/2023). (Destaquei). Para além disso, no que se refere à alegação de abuso do direito de ação, ou o denominado "uso predatório da jurisdição", cumpre observar que, embora tal conduta possa, em tese, configurar prática temerária, não se amolda à hipótese prevista no art. 330, inciso III, do Código de Processo Civil. Isso porque o interesse processual - entendido como o binômio necessidade e adequação - encontra-se plenamente caracterizado no caso concreto. A necessidade decorre da vedação à autotutela no ordenamento jurídico pátrio, de modo que, inexistindo mecanismos extrajudiciais idôneos para a satisfação de sua pretensão, incumbe à parte Autora recorrer ao Poder Judiciário. Por sua vez, a adequação refere-se à utilização dos instrumentos processuais apropriados para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida. Nesse contexto, a cumulação de pedidos contra o mesmo réu, ainda que tenham como origem contratos/fatos diversos, configura mera faculdade, e não obrigatoriedade, deferida à parte, nos termos do art. 327 do CPC, que assim dispõe: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326 . Diante disso, não é válida a fundamentação da Magistrada de primeira instância de que a existência de múltiplas ações movidas para anular negócios jurídicos indicaria falta de interesse processual, uma vez que a Autora deveria ter apresentado apenas uma demanda. Isso se deve ao fato de que, em situações de conexão entre ações, a consequência processual é a junção dos processos para julgamento conjunto e não a sua extinção por ausência de interesse de agir, conforme preleciona o art. 55, do CPC, in verbis: "Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II - às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre ele." Assim, tem-se que a conexão entre os processos têm como objetivo evitar decisões conflitantes, garantindo que, caso haja a possibilidade de ocorrerem decisões contraditórias e/ou prejudiciais as partes envolvidas, as demandas sejam julgadas simultaneamente pelo mesmo juízo. A multiplicidade de ações, nesse contexto, reflete a diversidade das relações jurídicas analisadas, sendo inadequada a extinção de processos com fundamento na quantidade de demandas ajuizadas. Tal medida se mostra incompatível com os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal, assegurados pela Constituição. Cada ação deve ser examinada individualmente, levando em conta os direitos materiais em debate e a necessidade de proteção contra eventuais práticas contratuais abusivas ou irregulares. A propósito, colaciona-se precedente desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDEFERIMENTO. IMPROPRIEDADE. AJUIZAMENTO DE MÚLTIPLAS AÇÕES. CAUSA DE PEDIR DISTINTAS. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta por Maria Deusina Freitas Ferreira Pires em contrariedade a sentença que indeferiu a inicial e julgou extinta a ação declaratória negativa de débito c/c indenização por dano moral ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, ora recorrido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão diz respeito à análise do acerto da sentença de extinção sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O Juízo a quo indeferiu a petição inicial declarando extinta a presente ação sem resolução de mérito, em face do ajuizamento de várias ações contra o mesmo réu sobre fatos semelhantes, em vez de propor uma única ação. 4. Contudo, compulsando os fólios processuais, verifica-se que a petição inicial atende os requisitos estabelecidos pela legislação processual civil, de modo que as condições da ação estão presente no caso em análise, sobretudo porque o fundamento utilizado para o indeferimento da inicial não é albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. 5. Apesar de as ações se referirem ao mesmo réu, verifica-se que as demandas são fundamentadas em causa de pedir diversas, especialmente porque são distintas os valores das dívidas e contratos. 6. Dessa forma, ao prolatar a sentença, o Juízo a quo não agiu com acerto, incorrendo em error in procedendo, devendo, pois, os presentes autos ser devolvidos à instância de origem para regular processamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso provido, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. (TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Relator: Desembargador CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, 2ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 27/02/2025). (Destaquei). EMENTA: Apelação Cível. Direito Processual Civil. Empréstimo Consignado. Ajuizamento de Diversas Ações. Sentença de Indeferimento da Petição Inicial e Extinção Do Processo Sem Resolução Do Mérito. Impossibilidade. Recurso Conhecido e Provido. Sentença Anulada. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pela parte autora objetivando a anulação da sentença que indeferiu a petição inicial (art. 330, III, do CPC), em sede de ação declaratória de inexistência/nulidade de débito movida em desfavor do Banco Bradesco S/A. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar se a mera quantidade de ações ajuizadas pela parte apelante contra a mesma instituição financeira é causa para extinção do feito sem resolução de mérito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. No caso, a parte autora impugna o contrato de empréstimo consignado de nº 393193016, com descontos mensais no valor de R$ 51,10, a ser quitado em 32 parcelas. 4. O julgador proferiu a sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, após verificar que a parte ajuizou diversas ações contra a mesma instituição financeira, impugnando diversos contratos supostamente realizados por ela. 5. Considerando que cada contrato realizado resulta em novo desconto adicionado aos proventos de aposentadoria da parte demandante, sendo esta sua causa de pedir, e que a parte tem a necessidade/utilidade de ir ao Judiciário para obter provimento jurisdicional apto a barrar tais descontos, não há que se falar em ausência de interesse processual no presente caso. 6. Ademais, o acesso à Justiça deve ser priorizado, em detrimento do excesso de formalismo, que resultou, no caso concreto, impedimento do acesso da parte apelante à jurisdição, ferindo a sua garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF, na qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". IV. DISPOSITIVO 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Relatora: Desembargadora JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 26/02/2025). (Destaquei). EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL POR FRACIONAMENTO DE DEMANDAS. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. I- Cinge-se a controvérsia em perquirir o acerto ou desacerto da sentença impugnada, que indeferiu a petição inicial, sob a fundamentação de existência de três ações, esta e outras duas, ajuizadas pela autora buscando anular descontos, supostamente indevidos, o que configuraria ausência de interesse processual, uma vez que a parte deveria ajuizar somente uma demanda. II- No caso concreto, conquanto os processos versem sobre matéria similar, ou seja, cobranças indevidas; referem-se a descontos de timbres, contratos e períodos diversos; assim, relações jurídicas distintas. Patente, pois, a legitimidade e o interesse processual. III- O fundamento utilizado pelo magistrado sentenciante não se aplica ao caso sub judice, ante a diferenciação entre as ações paradigmas por ostentarem como causa de pedir contratos diversos, o que descaracteriza a multiplicidade de ações; afastando-se, pois, a ocorrência do instituto da conexão e, ainda, a possibilidade de ocorrência do mero risco de decisões conflitantes, a que se refere o art. 55, § 3º do CPC. IV- Em que pese se tratar das mesmas partes, o fato de cada processo ostentar Contratos distintos, já é o suficiente para que se permita o processamento em separado, porquanto, antes de ser uma obrigação, a reunião dos pedidos em uma só demanda é uma faculdade (art. 327, CPC). V- Em homenagem aos princípios da cooperação, da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da primazia do julgamento de mérito; devemos autos retornar ao juízo de origem para que a inicial seja recebida, processada e sentenciada, na forma da lei. VI- Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Relatora: Desembargadora MARIA REGINA OLIVEIRA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 06/11/2024, Data da publicação: 06/11/2024). (Destaquei). Com efeito, os elementos probatórios apresentados pela parte Autora, ora Apelante, aliados à ausência de indícios concretos de litigância abusiva, demonstram que não se justifica a invocação genérica da Recomendação nº 159/2024 do CNJ como fundamento para restringir o direito de acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, a sentença ora recorrida se revela em desconformidade com o princípio da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, bem como afronta a garantia constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, segundo a qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Destarte, conclui-se que o Juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em error in procedendo, violando normas fundamentais do devido processo legal. Impõe-se, portanto, a anulação da sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja oportunizado o regular prosseguimento do feito, com observância aos princípios que regem o processo civil e às garantias constitucionais do jurisdicionado. DISPOSITIVO Diante do exposto, pelos argumentos fartamente coligidos e com fulcro nos documentos e dispositivos legais acima invocados, CONHEÇO do presente recurso de Apelação Cível para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, a fim de decretar a nulidade da sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. É como voto. Fortaleza, data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator

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Maria Frauzina De Oliveira x Banco Bradesco S/A e outros

ID: 321269524

Tribunal: TJCE Órgão: 5º Gabinete da 4ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 3000133-82.2025.8.06.0030

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

MARIA FRAUZINA DE OLIVEIRA

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO S/A PAULISTA - SERVICOS DE RECEBIMENTOS E PAGAMENTOS LTDA

Intimação

Advogados:

PAULO EDUARDO PRADO

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

GILMARIO DOMINGOS DE SOUZA

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EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE PARA EMENDA. AFRONTA AOS ARTS. 321 E 10, DO… EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE PARA EMENDA. AFRONTA AOS ARTS. 321 E 10, DO CPC. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por Maria Frauzina de Oliveira contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Aiuaba/CE que indeferiu a petição inicial e extinguiu a Ação Declaratória de Nulidade c/c Condenação em Danos Morais, sob fundamento de ausência de interesse de agir, nos termos do art. 330, III, do CPC e da Recomendação nº 159/2024 do CNJ. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se o indeferimento da petição inicial, sem prévia intimação para emenda, violou o art. 321 do CPC e o princípio da não surpresa; (ii) analisar se a multiplicidade de ações ajuizadas pela mesma parte, versando sobre contratos distintos, caracteriza abuso do direito de ação ou ausência de interesse processual. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O art. 321 do CPC impõe ao magistrado o dever de intimar a parte autora para emendar a petição inicial quando esta apresentar defeitos ou irregularidades que possam comprometer o julgamento do mérito, devendo, apenas no caso de inércia da parte autora, indeferir a inicial. 4. A sentença que indefere a inicial sem oportunizar a emenda afronta o princípio do devido processo legal e o princípio da não surpresa (art. 10 do CPC), configurando error in procedendo e acarretando nulidade absoluta. 5. A multiplicidade de ações ajuizadas pela parte autora, ainda que contra o mesmo réu, não configura, por si só, abuso do direito de ação ou falta de interesse processual, especialmente quando se referem a contratos distintos, valores diferentes e fatos autônomos. 6. O art. 327 do CPC autoriza a cumulação facultativa de pedidos, não impondo ao autor a obrigação de ajuizar uma única ação para discutir todos os contratos. 7. Não há justa causa para extinguir a ação sob o fundamento de fragmentação indevida, quando ausente litigância predatória ou elementos de má-fé processual. 8. A extinção da ação com base na Recomendação nº 159/2024 do CNJ não prescinde de análise concreta da conduta processual da parte, sendo vedada a restrição genérica ao direito de ação. IV. DISPOSITIVO: 9. Recurso provido. ________ Dispositivos legais relevantes citados: CPC, arts. 321, 327 e 10; CF/1988, art. 5º, incisos XXXV, LIV e LXXIV. Jurisprudências relevantes citadas: TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Rel. Des. Everardo Lucena Segundo, 2ª Câmara Direito Privado, j. 28.08.2024; TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Rel. Des. Carlos Alberto Mendes Forte, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 26.02.2025; TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Rel. Des. Maria Regina Oliveira, 1ª Câmara de Direito Privado, j. 06.11.2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do recurso para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador JOSÉ KRENTEL FERREIRA FILHO Juiz convocado (Portaria. 1458/2025) Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por MARIA FRAUZINA DE OLIVEIRA, com o objetivo de reformar a sentença de Id. nº 21330392, proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Aiuaba/CE, que extinguiu sem resolução do mérito a Ação Declaratória de Nulidade c/c Condenação em Danos Morais, ajuizada pela parte ora Apelante em desfavor de PSERV - Paulista Serviços de Recebimentos e Pagamentos LTDA. Eis o dispositivo da sentença: "(...) Ante o exposto, indefiro a petição inicial, por ausência de interesse de agir, nos termos do art. 330, inciso III, do CPC e da Recomendação 159/2024 do CNJ. Sem custas e honorários. Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos." Irresignada com a sentença, a parte Apelante interpôs o presente recurso, requerendo a reforma do decisum, anexando a minuta recursal no Id. nº 21330413, alegando, em síntese, que o fundamento para a extinção, qual seja a fragmentação indevida de duas ações, configuraria abuso de direito, não subsiste, pois os contratos são distintos, os descontos ocorreram em momentos diversos e os valores envolvidos também são diferentes. Assim, assevera que as ações não foram fracionadas indevidamente, mas sim ajuizadas de forma autônoma, a fim de possibilitar a análise individualizada de cada contrato e a responsabilização específica de cada réu conforme sua atuação no caso. Argumenta, também, que não foi formulada nenhuma exigência ao Apelante, e que a petição inicial foi instruída com procuração, declaração de hipossuficiência, documentos pessoais, comprovante de residência, extratos bancários que evidenciam os descontos, e CNPJ da empresa ré. Dessa forma, todos os requisitos legais para o prosseguimento da demanda foram devidamente cumpridos, inexistindo justificativa para o indeferimento da inicial nos termos do art. 330 do CPC. Ao final, requer o total provimento do recurso de Apelação para cassar a sentença proferida, determinando a remessa dos autos para o Juízo a quo, para o devido prosseguimento do feito. Requer, ainda, a concessão dos benefícios da justiça gratuita, nos termos do art. 98 do CPC. Contrarrazões no Id. nº 21330420. É o breve relatório, passo a decidir. VOTO I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL: Ab initito, quanto ao pedido de gratuidade judiciária, a parte Apelante declara a impossibilidade de arcar com as despesas processuais sem prejuízo do seu próprio sustento. É cediço que o instituto da assistência judiciária gratuita constitui meio de efetivação do direito constitucional de petição e do pleno acesso à justiça, destinando-se àqueles cuja situação econômico-financeira não lhes permita arcar com as despesas processuais sem prejuízo de sua subsistência. Nos termos do artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição da República, é assegurada assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Conforme dispõe o artigo 98, caput, e o artigo 99, ambos do Código de Processo Civil, a concessão da gratuidade judiciária depende de declaração da parte atestando sua incapacidade financeira. Quando formulada por pessoa natural, tal alegação goza de presunção relativa de veracidade, admitindo prova em contrário pela parte adversa ou sendo afastada pelo magistrado se houver nos autos elementos que evidenciem a ausência dos requisitos legais. Nesse sentido, em respeito ao princípio do amplo acesso à justiça e diante da ausência de prova em sentido contrário, concedo o benefício da Justiça Gratuita à parte Apelante, assegurando-lhe o acesso à jurisdição. Por conseguinte, em juízo antecedente de admissibilidade recursal, observo que estão presentes os demais pressupostos intrínsecos ou subjetivos (cabimento, interesse e legitimidade, inexistência de súmula impeditiva) e extrínsecos ou objetivos (tempestividade, dispensa preparo, regularidade formal e a inexistência de fatos extintivos ou impeditivos do direito de recorrer), razão pela qual CONHEÇO DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. II - DO MÉRITO RECURSAL: O ponto central da controvérsia recursal consiste em avaliar se deve ser mantida ou reformada a sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo originário sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 330, inc. III c/c na Recomendação nº 159/2024 do Conselho Nacional de Justiça. Pois bem. In casu, com a devida vênia, impende destacar, desde logo, que o recurso comporta provimento. De início, vislumbra-se que o julgamento do feito foi proferido de forma equivocada, ao indeferir de plano a ação, sem oportunizar à parte Autora, ora Apelante, a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme estabelece o artigo 321 do Código de Processo Civil. É cediço que o referido dispositivo legal prevê, de forma expressa, que, ao constatar que a petição inicial não atende aos requisitos dos artigos 319 e 320 ou apresenta falhas que possam comprometer o julgamento do mérito, o magistrado deve intimar a parte autora para promover as correções ou complementações necessárias, fixando o prazo de 15 (quinze) dias e indicando de maneira clara o vício a ser sanado. O parágrafo único do artigo 321 ainda estabelece que apenas no caso de descumprimento da diligência é que a petição inicial poderá ser indeferida, in verbis: "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Com efeito, ao magistrado somente é lícito indeferir a petição inicial após oportunizar à parte Autora a possibilidade de sanar eventuais vícios que possam macular a sua peça vestibular. A inobservância desse procedimento implica a supressão do direito subjetivo da parte e configura manifesta afronta ao princípio da não surpresa, expressamente consagrado no artigo 10 do Código de Processo Civil: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." Dessa forma, a concessão de prazo para a emenda da inicial não representa mera faculdade do juízo, mas sim um direito processual da parte Autora e um dever legal do magistrado. Tal providência visa assegurar a observância de princípios constitucionais e processuais fundamentais, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a economia processual, a instrumentalidade das formas e a vedação às decisões-surpresa. Nesse contexto, consolidou-se a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça no sentido de que o indeferimento liminar da petição inicial, sem a prévia intimação para emenda, resulta na nulidade da sentença. Tal prática caracteriza erro de procedimento, uma vez que viola não apenas o devido processo legal, mas também compromete a efetividade da tutela jurisdicional, na medida em que desconsidera a primazia do julgamento de mérito e os princípios da economia e celeridade processuais. Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 485, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA DA INICIAL. CONTRARIEDADE AO PROCEDIMENTO DO ART. 321 DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE INSANÁVEL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A EXTINÇÃO DA AÇÃO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença decretou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por indeferimento da petição inicial, na forma do art. 485, I, do CPC, sob o fundamento de que o ajuizamento de que o fracionamento indevido de ações conexas configura abuso do direito de ação. 2. O art. 321, do Código de Processo Civil prevê expressamente que, quando o juiz constatar que a petição inicial não atende as exigências do art. 319 e 320, ou apresentar falhas que possam atrapalhar o julgamento de mérito, não só deverá intimar a parte autora para realizar as correções ou complementações necessárias no prazo de 15 (quinze) dias, como deverá indicar claramente o vício a ser corrigido. E prossegue, em seu parágrafo único, determinando que apenas em caso de não cumprimento da diligência a petição inicial será indeferida. 3. Assim, a oportunidade de emenda da inicial constitui, não só um direito da parte autora, como também é o procedimento legal a ser observado pelo juiz da causa, em atenção aos princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 4. Desse modo, há de se reconhecer que a extinção do feito pelo indeferimento liminar da inicial sem que seja dada à parte autora a oportunidade de emendar a petição inicial, infringe comando legal do art. 321, do CPC, fere os princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento de mérito, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 5. Além disso, devo observar que a configuração de conduta predatória do advogado não ocorre pela simples verificação da quantidade de ações ajuizadas, mas pela presença de outras circunstâncias associadas, como por exemplo, o fracionamento indevidos de pedidos relativos a um mesmo contrato em diferentes ações ou o ajuizamento da mesma ação (parte, pedido e causa de pedir) em diferentes varas ou comarcas, visando escolher o juízo que lhe parece ter o entendimento mais favorável, para depois desistir dos outros processos, burlando o princípio do juiz natural, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Desse modo, é absolutamente irrazoável a conclusão de que o ajuizamento de 3 (três) ações, em que cada uma aborda um contrato diferente do outro, constitua abuso do deito de ação e fragmentação indevida de processos. 7. Nesse contexto, estando descaracterizada a existência de abuso de direito de ação e de fragmentação indevida e estando evidenciada a causa de pedir, a legitimidade da parte e o interesse processual, há de se reconhecer a ausência de justa causa para a extinção do feito, por violação dos princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e do devido processo legal, consagrados pelo art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal, comprometendo a finalidade do processo, que é a satisfação do direito material pela primazia da sentença de mérito, nos termos dos arts. 4º e 6º, do CPC. 8. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Relator: Desembargador EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 28/08/2024, Data da publicação: 28/08/2024). (Destaquei). EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA OPORTUNIZAÇÃO DE EMENDA À INICIAL. OFENSA AO ART. 321 DO CPC E AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O cerne da questão posta à desate cinge-se a analisar a sentença hostilizada que, em face da ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito. 2. Da detida análise do fascículo processual, observa-se que o decisum foi proferido de forma equivocada, porquanto indeferiu de plano a ação, sem oportunizar à parte a possibilidade de emendar à inicial, nos termos do art. 321 do CPC. 3. Por consequência, caracterizada a ausência de oportunização à parte autora de emenda à inicial, em violação aos artigos 321 e 10 do CPC, a anulação da sentença é medida impositiva. 4. Apelação conhecida e provida. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Relator: Desembargador FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, 3ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 03/10/2023, Data da publicação: 04/10/2023). (Destaquei). Para além disso, no que se refere à alegação de abuso do direito de ação, ou o denominado "uso predatório da jurisdição", cumpre observar que, embora tal conduta possa, em tese, configurar prática temerária, não se amolda à hipótese prevista no art. 330, inciso III, do Código de Processo Civil. Isso porque o interesse processual - entendido como o binômio necessidade e adequação - encontra-se plenamente caracterizado no caso concreto. A necessidade decorre da vedação à autotutela no ordenamento jurídico pátrio, de modo que, inexistindo mecanismos extrajudiciais idôneos para a satisfação de sua pretensão, incumbe à parte Autora recorrer ao Poder Judiciário. Por sua vez, a adequação refere-se à utilização dos instrumentos processuais apropriados para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida. Nesse contexto, a cumulação de pedidos contra o mesmo réu, ainda que tenham como origem contratos/fatos diversos, configura mera faculdade, e não obrigatoriedade, deferida à parte, nos termos do art. 327 do CPC, que assim dispõe: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326 . Diante disso, não é válida a fundamentação do Magistrado de primeira instância de que a existência de múltiplas ações indicaria falta de interesse processual, uma vez que a Autora deveria ter apresentado apenas uma demanda. Isso se deve ao fato de que, em situações de conexão entre ações, a consequência processual é a junção dos processos para julgamento conjunto e não a sua extinção por ausência de interesse de agir, conforme preleciona o art. 55, do CPC, in verbis: "Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II - às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre ele." Assim, tem-se que a conexão entre os processos têm como objetivo evitar decisões conflitantes, garantindo que, caso haja a possibilidade de ocorrerem decisões contraditórias e/ou prejudiciais as partes envolvidas, as demandas sejam julgadas simultaneamente pelo mesmo juízo. A multiplicidade de ações, nesse contexto, reflete a diversidade das relações jurídicas analisadas, sendo inadequada a extinção de processos com fundamento na quantidade de demandas ajuizadas. Tal medida se mostra incompatível com os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal, assegurados pela Constituição. Cada ação deve ser examinada individualmente, levando em conta os direitos materiais em debate e a necessidade de proteção contra eventuais práticas contratuais abusivas ou irregulares. No caso concreto, embora os processos tratem de questões semelhantes, os objetos das ações são distintos, versando cada uma sobre diferentes contratos, razão pela qual não há que se falar em conexão, visto que não há igualdade entre as causas de pedir. A propósito, colaciona-se precedente desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDEFERIMENTO. IMPROPRIEDADE. AJUIZAMENTO DE MÚLTIPLAS AÇÕES. CAUSA DE PEDIR DISTINTAS. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta por Maria Deusina Freitas Ferreira Pires em contrariedade a sentença que indeferiu a inicial e julgou extinta a ação declaratória negativa de débito c/c indenização por dano moral ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, ora recorrido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão diz respeito à análise do acerto da sentença de extinção sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O Juízo a quo indeferiu a petição inicial declarando extinta a presente ação sem resolução de mérito, em face do ajuizamento de várias ações contra o mesmo réu sobre fatos semelhantes, em vez de propor uma única ação. 4. Contudo, compulsando os fólios processuais, verifica-se que a petição inicial atende os requisitos estabelecidos pela legislação processual civil, de modo que as condições da ação estão presente no caso em análise, sobretudo porque o fundamento utilizado para o indeferimento da inicial não é albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. 5. Apesar de as ações se referirem ao mesmo réu, verifica-se que as demandas são fundamentadas em causa de pedir diversas, especialmente porque são distintas os valores das dívidas e contratos. 6. Dessa forma, ao prolatar a sentença, o Juízo a quo não agiu com acerto, incorrendo em error in procedendo, devendo, pois, os presentes autos ser devolvidos à instância de origem para regular processamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso provido, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. (TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Relator: Desembargador CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, 2ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 27/02/2025). (Destaquei). EMENTA: Apelação Cível. Direito Processual Civil. Empréstimo Consignado. Ajuizamento de Diversas Ações. Sentença de Indeferimento da Petição Inicial e Extinção Do Processo Sem Resolução Do Mérito. Impossibilidade. Recurso Conhecido e Provido. Sentença Anulada. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pela parte autora objetivando a anulação da sentença que indeferiu a petição inicial (art. 330, III, do CPC), em sede de ação declaratória de inexistência/nulidade de débito movida em desfavor do Banco Bradesco S/A. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar se a mera quantidade de ações ajuizadas pela parte apelante contra a mesma instituição financeira é causa para extinção do feito sem resolução de mérito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. No caso, a parte autora impugna o contrato de empréstimo consignado de nº 393193016, com descontos mensais no valor de R$ 51,10, a ser quitado em 32 parcelas. 4. O julgador proferiu a sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, após verificar que a parte ajuizou diversas ações contra a mesma instituição financeira, impugnando diversos contratos supostamente realizados por ela. 5. Considerando que cada contrato realizado resulta em novo desconto adicionado aos proventos de aposentadoria da parte demandante, sendo esta sua causa de pedir, e que a parte tem a necessidade/utilidade de ir ao Judiciário para obter provimento jurisdicional apto a barrar tais descontos, não há que se falar em ausência de interesse processual no presente caso. 6. Ademais, o acesso à Justiça deve ser priorizado, em detrimento do excesso de formalismo, que resultou, no caso concreto, impedimento do acesso da parte apelante à jurisdição, ferindo a sua garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF, na qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". IV. DISPOSITIVO 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Relatora: Desembargadora JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 26/02/2025). (Destaquei). EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL POR FRACIONAMENTO DE DEMANDAS. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. I- Cinge-se a controvérsia em perquirir o acerto ou desacerto da sentença impugnada, que indeferiu a petição inicial, sob a fundamentação de existência de três ações, esta e outras duas, ajuizadas pela autora buscando anular descontos, supostamente indevidos, o que configuraria ausência de interesse processual, uma vez que a parte deveria ajuizar somente uma demanda. II- No caso concreto, conquanto os processos versem sobre matéria similar, ou seja, cobranças indevidas; referem-se a descontos de timbres, contratos e períodos diversos; assim, relações jurídicas distintas. Patente, pois, a legitimidade e o interesse processual. III- O fundamento utilizado pelo magistrado sentenciante não se aplica ao caso sub judice, ante a diferenciação entre as ações paradigmas por ostentarem como causa de pedir contratos diversos, o que descaracteriza a multiplicidade de ações; afastando-se, pois, a ocorrência do instituto da conexão e, ainda, a possibilidade de ocorrência do mero risco de decisões conflitantes, a que se refere o art. 55, § 3º do CPC. IV- Em que pese se tratar das mesmas partes, o fato de cada processo ostentar Contratos distintos, já é o suficiente para que se permita o processamento em separado, porquanto, antes de ser uma obrigação, a reunião dos pedidos em uma só demanda é uma faculdade (art. 327, CPC). V- Em homenagem aos princípios da cooperação, da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da primazia do julgamento de mérito; devemos autos retornar ao juízo de origem para que a inicial seja recebida, processada e sentenciada, na forma da lei. VI- Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Relatora: Desembargadora MARIA REGINA OLIVEIRA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 06/11/2024, Data da publicação: 06/11/2024). (Destaquei). Com efeito, os elementos probatórios apresentados pela parte Autora, ora Apelante, aliados à ausência de indícios concretos de litigância abusiva, demonstram que não se justifica a invocação genérica da Recomendação nº 159/2024 do CNJ como fundamento para restringir o direito de acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, a sentença ora recorrida se revela em desconformidade com o princípio da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, bem como afronta a garantia constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, segundo a qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Ademais, não se vislumbra, no caso em exame, fundamento jurídico que justifique a reunião dos feitos para instrução e julgamento conjuntos, uma vez que as demandas apresentam distinções relevantes quanto às circunstâncias fáticas que embasam o direito invocado pela parte ora Apelante. Dessa forma, inexiste risco concreto de prolação de decisões conflitantes, a afastar a necessidade de eventual reunião dos processos. Destarte, conclui-se que o Juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em error in procedendo, violando normas fundamentais do devido processo legal. Impõe-se, portanto, a anulação da sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja oportunizado o regular prosseguimento do feito, com observância aos princípios que regem o processo civil e às garantias constitucionais do jurisdicionado. DISPOSITIVO Diante do exposto, pelos argumentos fartamente coligidos e com fulcro nos documentos e dispositivos legais acima invocados, CONHEÇO do presente recurso de Apelação Cível para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, a fim de decretar a nulidade da sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. É como voto. Fortaleza, data e hora da assinatura digital. JOSÉ KRENTEL FERREIRA FILHO Juiz convocado (Portaria. 1458/2025) Relator

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Maria Duarte Ricardo x Banco Bradesco Sa

ID: 321472974

Tribunal: TJCE Órgão: 5º Gabinete da 4ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 3000090-32.2025.8.06.0100

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

MARIA DUARTE RICARDO

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO SA

Intimação

Advogados:

FELIPE GAZOLA VIEIRA MARQUES

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ANTONIO LUCAS CAMELO MORAIS

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EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE PARA EMENDA. AFRONTA AOS ARTS. 321 E 10, DO… EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE PARA EMENDA. AFRONTA AOS ARTS. 321 E 10, DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por Maria Duarte Ricardo contra sentença da 2ª Vara Cível da Comarca de Itapajé/CE que extinguiu, sem resolução de mérito, a Ação de Nulidade de Negócio Jurídico c/c Indenização por Danos Materiais e Morais ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, com fundamento nos arts. 330, III, e 485, VI, do CPC. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se a ausência de intimação para emenda da petição inicial constitui nulidade da sentença; e (ii) examinar se o ajuizamento de ações múltiplas, com causa de pedir e contratos distintos, caracteriza ausência de interesse processual. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O artigo 321 do CPC impõe ao magistrado o dever de oportunizar à parte autora a emenda da petição inicial, sempre que verificada irregularidade que possa dificultar o julgamento do mérito, sob pena de nulidade da sentença por error in procedendo. 4. A decisão de indeferimento liminar da petição inicial sem a concessão de prazo para regularização viola o princípio da não surpresa, previsto no artigo 10 do CPC, bem como os princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. 5. A jurisprudência do TJCE é firme no sentido de que o indeferimento da inicial sem prévia intimação para emenda, nos moldes do art. 321 do CPC, acarreta nulidade da sentença, ainda que o julgador entenda pela ausência de interesse de agir. 6. A cumulação de ações fundadas em contratos distintos não caracteriza litigância predatória nem ausência de interesse processual, sendo direito do autor ajuizar demandas individualizadas, conforme previsão do art. 327 do CPC. 7. A eventual existência de conexão entre as ações não justifica a extinção do processo, mas sim a reunião para julgamento conjunto, nos termos do art. 55 do CPC, inexistindo, no caso, abuso do direito de ação ou tentativa de manipulação do juízo. 8. A fundamentação do juízo singular, baseada em suposto uso predatório da jurisdição, sem elementos objetivos que demonstrem má-fé processual, revela-se insuficiente para justificar a extinção do feito, afrontando a garantia do acesso à justiça (CF, art. 5º, XXXV). IV. DISPOSITIVO: 9. Recurso provido. ________ Dispositivos legais relevantes citados: CF/1988, art. 5º, incs. XXXV, LIV e LV; CPC, arts. 10, 55, 321, 327, 330, III, e 485, VI. Jurisprudências relevantes citadas: TJCE, ApCiv nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Rel. Des. Everardo Lucena Segundo, j. 28.08.2024; TJCE, ApCiv nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Rel. Des. Francisco Darival Beserra Primo, j. 03.10.2023; TJCE, ApCiv nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Rel. Des. Carlos Alberto Mendes Forte, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Rel. Des. Jane Ruth Maia de Queiroga, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Rel. Des. Maria Regina Oliveira, j. 06.11.2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do recurso para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por MARIA DUARTE RICARDO, com o objetivo de reformar a sentença de Id. nº 23282213, proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Itapajé/CE, que extinguiu sem resolução do mérito a Ação de Nulidade de Negócio Jurídico c/c Indenização por Danos Materiais e Morais, ajuizada pela parte ora Apelante em desfavor de BANCO BRADESCO S/A. Eis o dispositivo da sentença: "(...) Pelo exposto, JULGO EXTINTO O PROCESSO, com base nos artigos 330, inciso III, e 485, inciso VI, do Código de Processo Civil. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais, no entanto, suspendo a exigibilidade devido à gratuidade da justiça concedida, com fundamento no artigo 98, §3º, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com baixa definitiva. Expedientes necessários." Irresignada com a sentença, a parte Apelante interpôs o presente recurso, requerendo a reforma do decisum, anexando a minuta recursal no Id. nº 23282215, alegando, em apertada síntese, que o juízo a quo ao determinar de forma precoce e sem fundamento fático a extinção do feito sem resolução de mérito agiu de forma precária e sem fundamento. Argumenta que a existência de outra ação anteriormente ajuizada, envolvendo suposta cobrança de serviços indevidos, mas relativa a período distinto e a contrato diverso daquele ora discutido, não configura hipótese de litispendência ou ausência de interesse processual, tampouco justifica o indeferimento liminar da petição inicial. Ressalta que não há identidade entre as demandas, motivo pelo qual não há que se falar em conexão ou continência. Alega, ainda, que a extinção do feito sem sequer oportunizar a manifestação da parte autora configura violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como demonstra ausência de cautela por parte do juízo singular. Nesse contexto, reforça que subsiste o interesse processual da Apelante, haja vista que a presente demanda versa sobre fatos, contratos e fundamentos jurídicos distintos. Ao final, requereu o total provimento do recurso de Apelação para cassar a sentença proferida, determinando a remessa dos autos para o Juízo a quo, para o devido prosseguimento do feito. Justiça Gratuita deferida à parte Autora, ora Apelante, na sentença de Id. nº 23282213. Contrarrazões juntada no Id. nº 23282218. É o breve relatório, passo a decidir. VOTO I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL: Ab initio, em juízo antecedente de admissibilidade recursal, presentes os pressupostos intrínsecos ou subjetivos (cabimento, interesse e legitimidade, inexistência de súmula impeditiva) e extrínsecos ou objetivos (tempestividade, preparo, regularidade formal e a inexistência de fatos extintivos ou impeditivos do direito de recorrer), hei por bem CONHECER DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO. II - DO MÉRITO RECURSAL: O ponto central da controvérsia recursal consiste em avaliar se deve ser mantida ou reformada a sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo originário sem resolução de mérito, com fundamento no art. 330, inc. III c/c art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil. Pois bem. In casu, com a devida vênia, impende destacar, desde logo, que o recurso comporta provimento. De início, vislumbra-se que o julgamento do feito foi proferido de forma equivocada, ao indeferir de plano a ação, sem oportunizar à parte Autora, ora Apelante, a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme estabelece o artigo 321 do Código de Processo Civil. É cediço que o referido dispositivo legal prevê, de forma expressa, que, ao constatar que a petição inicial não atende aos requisitos dos artigos 319 e 320 ou apresenta falhas que possam comprometer o julgamento do mérito, o magistrado deve intimar a parte autora para promover as correções ou complementações necessárias, fixando o prazo de 15 (quinze) dias e indicando de maneira clara o vício a ser sanado. O parágrafo único do artigo 321 ainda estabelece que apenas no caso de descumprimento da diligência é que a petição inicial poderá ser indeferida, in verbis: "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Com efeito, ao magistrado somente é lícito indeferir a petição inicial após oportunizar à parte Autora a possibilidade de sanar eventuais vícios que possam macular a sua peça vestibular. A inobservância desse procedimento implica a supressão do direito subjetivo da parte e configura manifesta afronta ao princípio da não surpresa, expressamente consagrado no artigo 10 do Código de Processo Civil: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." Dessa forma, a concessão de prazo para a emenda da inicial não representa mera faculdade do juízo, mas sim um direito processual da parte Autora e um dever legal do magistrado. Tal providência visa assegurar a observância de princípios constitucionais e processuais fundamentais, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a economia processual, a instrumentalidade das formas e a vedação às decisões-surpresa. Nesse contexto, consolidou-se a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça no sentido de que o indeferimento liminar da petição inicial, sem a prévia intimação para emenda, resulta na nulidade da sentença. Tal prática caracteriza erro de procedimento, uma vez que viola não apenas o devido processo legal, mas também compromete a efetividade da tutela jurisdicional, na medida em que desconsidera a primazia do julgamento de mérito e os princípios da economia e celeridade processuais. Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 485, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA DA INICIAL. CONTRARIEDADE AO PROCEDIMENTO DO ART. 321 DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE INSANÁVEL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A EXTINÇÃO DA AÇÃO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença decretou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por indeferimento da petição inicial, na forma do art. 485, I, do CPC, sob o fundamento de que o ajuizamento de que o fracionamento indevido de ações conexas configura abuso do direito de ação. 2. O art. 321, do Código de Processo Civil prevê expressamente que, quando o juiz constatar que a petição inicial não atende as exigências do art. 319 e 320, ou apresentar falhas que possam atrapalhar o julgamento de mérito, não só deverá intimar a parte autora para realizar as correções ou complementações necessárias no prazo de 15 (quinze) dias, como deverá indicar claramente o vício a ser corrigido. E prossegue, em seu parágrafo único, determinando que apenas em caso de não cumprimento da diligência a petição inicial será indeferida. 3. Assim, a oportunidade de emenda da inicial constitui, não só um direito da parte autora, como também é o procedimento legal a ser observado pelo juiz da causa, em atenção aos princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 4. Desse modo, há de se reconhecer que a extinção do feito pelo indeferimento liminar da inicial sem que seja dada à parte autora a oportunidade de emendar a petição inicial, infringe comando legal do art. 321, do CPC, fere os princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento de mérito, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 5. Além disso, devo observar que a configuração de conduta predatória do advogado não ocorre pela simples verificação da quantidade de ações ajuizadas, mas pela presença de outras circunstâncias associadas, como por exemplo, o fracionamento indevidos de pedidos relativos a um mesmo contrato em diferentes ações ou o ajuizamento da mesma ação (parte, pedido e causa de pedir) em diferentes varas ou comarcas, visando escolher o juízo que lhe parece ter o entendimento mais favorável, para depois desistir dos outros processos, burlando o princípio do juiz natural, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Desse modo, é absolutamente irrazoável a conclusão de que o ajuizamento de 3 (três) ações, em que cada uma aborda um contrato diferente do outro, constitua abuso do deito de ação e fragmentação indevida de processos. 7. Nesse contexto, estando descaracterizada a existência de abuso de direito de ação e de fragmentação indevida e estando evidenciada a causa de pedir, a legitimidade da parte e o interesse processual, há de se reconhecer a ausência de justa causa para a extinção do feito, por violação dos princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e do devido processo legal, consagrados pelo art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal, comprometendo a finalidade do processo, que é a satisfação do direito material pela primazia da sentença de mérito, nos termos dos arts. 4º e 6º, do CPC. 8. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Relator: Desembargador EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 28/08/2024, Data da publicação: 28/08/2024). (Destaquei). EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA OPORTUNIZAÇÃO DE EMENDA À INICIAL. OFENSA AO ART. 321 DO CPC E AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O cerne da questão posta à desate cinge-se a analisar a sentença hostilizada que, em face da ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito. 2. Da detida análise do fascículo processual, observa-se que o decisum foi proferido de forma equivocada, porquanto indeferiu de plano a ação, sem oportunizar à parte a possibilidade de emendar à inicial, nos termos do art. 321 do CPC. 3. Por consequência, caracterizada a ausência de oportunização à parte autora de emenda à inicial, em violação aos artigos 321 e 10 do CPC, a anulação da sentença é medida impositiva. 4. Apelação conhecida e provida. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Relator: Desembargador FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, 3ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 03/10/2023, Data da publicação: 04/10/2023). (Destaquei). Para além disso, no que se refere à alegação de abuso do direito de ação, ou o denominado "uso predatório da jurisdição", cumpre observar que, embora tal conduta possa, em tese, configurar prática temerária, não se amolda à hipótese prevista no art. 330, inciso III, do Código de Processo Civil. Isso porque o interesse processual - entendido como o binômio necessidade e adequação - encontra-se plenamente caracterizado no caso concreto. A necessidade decorre da vedação à autotutela no ordenamento jurídico pátrio, de modo que, inexistindo mecanismos extrajudiciais idôneos para a satisfação de sua pretensão, incumbe à parte Autora recorrer ao Poder Judiciário. Por sua vez, a adequação refere-se à utilização dos instrumentos processuais apropriados para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida. Nesse contexto, a cumulação de pedidos contra o mesmo réu, ainda que tenham como origem contratos/fatos diversos, configura mera faculdade, e não obrigatoriedade, deferida à parte, nos termos do art. 327 do CPC, que assim dispõe: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326 . Diante disso, não é válida a fundamentação do Magistrado de primeira instância de que a existência de múltiplas ações movidas para anular negócios jurídicos indicaria falta de interesse processual, uma vez que a parte Autora deveria ter apresentado apenas uma demanda. Isso se deve ao fato de que, em situações de conexão entre ações, a consequência processual é a junção dos processos para julgamento conjunto e não a sua extinção por ausência de interesse de agir, conforme preleciona o art. 55, do CPC, in verbis: "Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II - às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre ele." Assim, tem-se que a conexão entre os processos têm como objetivo evitar decisões conflitantes, garantindo que, caso haja a possibilidade de ocorrerem decisões contraditórias e/ou prejudiciais as partes envolvidas, as demandas sejam julgadas simultaneamente pelo mesmo juízo. A multiplicidade de ações, nesse contexto, reflete a diversidade das relações jurídicas analisadas, sendo inadequada a extinção de processos com fundamento na quantidade de demandas ajuizadas. Tal medida se mostra incompatível com os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal, assegurados pela Constituição. Cada ação deve ser examinada individualmente, levando em conta os direitos materiais em debate e a necessidade de proteção contra eventuais práticas contratuais abusivas ou irregulares. A propósito, colaciona-se precedente desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDEFERIMENTO. IMPROPRIEDADE. AJUIZAMENTO DE MÚLTIPLAS AÇÕES. CAUSA DE PEDIR DISTINTAS. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta por Maria Deusina Freitas Ferreira Pires em contrariedade a sentença que indeferiu a inicial e julgou extinta a ação declaratória negativa de débito c/c indenização por dano moral ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, ora recorrido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão diz respeito à análise do acerto da sentença de extinção sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O Juízo a quo indeferiu a petição inicial declarando extinta a presente ação sem resolução de mérito, em face do ajuizamento de várias ações contra o mesmo réu sobre fatos semelhantes, em vez de propor uma única ação. 4. Contudo, compulsando os fólios processuais, verifica-se que a petição inicial atende os requisitos estabelecidos pela legislação processual civil, de modo que as condições da ação estão presente no caso em análise, sobretudo porque o fundamento utilizado para o indeferimento da inicial não é albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. 5. Apesar de as ações se referirem ao mesmo réu, verifica-se que as demandas são fundamentadas em causa de pedir diversas, especialmente porque são distintas os valores das dívidas e contratos. 6. Dessa forma, ao prolatar a sentença, o Juízo a quo não agiu com acerto, incorrendo em error in procedendo, devendo, pois, os presentes autos ser devolvidos à instância de origem para regular processamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso provido, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. (TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Relator: Desembargador CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, 2ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 27/02/2025). (Destaquei). EMENTA: Apelação Cível. Direito Processual Civil. Empréstimo Consignado. Ajuizamento de Diversas Ações. Sentença de Indeferimento da Petição Inicial e Extinção Do Processo Sem Resolução Do Mérito. Impossibilidade. Recurso Conhecido e Provido. Sentença Anulada. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pela parte autora objetivando a anulação da sentença que indeferiu a petição inicial (art. 330, III, do CPC), em sede de ação declaratória de inexistência/nulidade de débito movida em desfavor do Banco Bradesco S/A. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar se a mera quantidade de ações ajuizadas pela parte apelante contra a mesma instituição financeira é causa para extinção do feito sem resolução de mérito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. No caso, a parte autora impugna o contrato de empréstimo consignado de nº 393193016, com descontos mensais no valor de R$ 51,10, a ser quitado em 32 parcelas. 4. O julgador proferiu a sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, após verificar que a parte ajuizou diversas ações contra a mesma instituição financeira, impugnando diversos contratos supostamente realizados por ela. 5. Considerando que cada contrato realizado resulta em novo desconto adicionado aos proventos de aposentadoria da parte demandante, sendo esta sua causa de pedir, e que a parte tem a necessidade/utilidade de ir ao Judiciário para obter provimento jurisdicional apto a barrar tais descontos, não há que se falar em ausência de interesse processual no presente caso. 6. Ademais, o acesso à Justiça deve ser priorizado, em detrimento do excesso de formalismo, que resultou, no caso concreto, impedimento do acesso da parte apelante à jurisdição, ferindo a sua garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF, na qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". IV. DISPOSITIVO 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Relatora: Desembargadora JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 26/02/2025). (Destaquei). EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL POR FRACIONAMENTO DE DEMANDAS. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. I- Cinge-se a controvérsia em perquirir o acerto ou desacerto da sentença impugnada, que indeferiu a petição inicial, sob a fundamentação de existência de três ações, esta e outras duas, ajuizadas pela autora buscando anular descontos, supostamente indevidos, o que configuraria ausência de interesse processual, uma vez que a parte deveria ajuizar somente uma demanda. II- No caso concreto, conquanto os processos versem sobre matéria similar, ou seja, cobranças indevidas; referem-se a descontos de timbres, contratos e períodos diversos; assim, relações jurídicas distintas. Patente, pois, a legitimidade e o interesse processual. III- O fundamento utilizado pelo magistrado sentenciante não se aplica ao caso sub judice, ante a diferenciação entre as ações paradigmas por ostentarem como causa de pedir contratos diversos, o que descaracteriza a multiplicidade de ações; afastando-se, pois, a ocorrência do instituto da conexão e, ainda, a possibilidade de ocorrência do mero risco de decisões conflitantes, a que se refere o art. 55, § 3º do CPC. IV- Em que pese se tratar das mesmas partes, o fato de cada processo ostentar Contratos distintos, já é o suficiente para que se permita o processamento em separado, porquanto, antes de ser uma obrigação, a reunião dos pedidos em uma só demanda é uma faculdade (art. 327, CPC). V- Em homenagem aos princípios da cooperação, da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da primazia do julgamento de mérito; devemos autos retornar ao juízo de origem para que a inicial seja recebida, processada e sentenciada, na forma da lei. VI- Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Relatora: Desembargadora MARIA REGINA OLIVEIRA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 06/11/2024, Data da publicação: 06/11/2024). (Destaquei). Com efeito, os elementos probatórios apresentados pela parte Autora, ora Apelante, aliados à ausência de indícios concretos de litigância abusiva, demonstram que não se justifica a invocação genérica da Recomendação nº 159/2024 do CNJ como fundamento para restringir o direito de acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, a sentença ora recorrida se revela em desconformidade com o princípio da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, bem como afronta a garantia constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, segundo a qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Destarte, conclui-se que o Juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em error in procedendo, violando normas fundamentais do devido processo legal. Impõe-se, portanto, a anulação da sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja oportunizado o regular prosseguimento do feito, com observância aos princípios que regem o processo civil e às garantias constitucionais do jurisdicionado. DISPOSITIVO Diante do exposto, pelos argumentos fartamente coligidos e com fulcro nos documentos e dispositivos legais acima invocados, CONHEÇO do presente recurso de Apelação Cível para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, a fim de decretar a nulidade da sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. É como voto. Fortaleza, data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator

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Maria Do Socorro Rabelo Araujo x Banco Pan S.A.

ID: 322554730

Tribunal: TJCE Órgão: 5º Gabinete da 4ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 3000199-59.2025.8.06.0128

Data de Disponibilização: 11/07/2025

Polo Ativo:

MARIA DO SOCORRO RABELO ARAUJO

Polo Passivo:

BANCO PAN S.A.

Intimação

Advogados:

FELICIANO LYRA MOURA

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JOSE IDEMBERG NOBRE DE SENA

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EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL SEM PRÉVIA INTIMAÇÃO PARA EMENDA. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL NÃO CONFIGURADA. AÇÕES AUTÔNOMAS RELATIVAS A CONT… EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL SEM PRÉVIA INTIMAÇÃO PARA EMENDA. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL NÃO CONFIGURADA. AÇÕES AUTÔNOMAS RELATIVAS A CONTRATOS DISTINTOS. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por Maria do Socorro Rabelo Araújo contra sentença da 2ª Vara Cível da Comarca de Morada Nova/CE, que indeferiu a petição inicial e extinguiu, sem resolução do mérito, Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Repetição do Indébito e Indenização por Danos Morais ajuizada em face do Banco PAN S/A, ao fundamento de ausência de interesse de agir, em razão do suposto ajuizamento predatório de ações semelhantes. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se a extinção do processo sem resolução de mérito é válida diante da ausência de intimação da parte autora para emendar a petição inicial, conforme exigido pelo art. 321 do CPC; (ii) examinar se há, de fato, ausência de interesse processual ou abuso do direito de ação diante do ajuizamento de múltiplas demandas relativas a contratos diversos. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O juiz somente pode indeferir a petição inicial após conceder à parte autora a oportunidade de emenda, conforme estabelece o art. 321 do CPC. A inobservância dessa regra processual acarreta nulidade da sentença, por ofensa ao contraditório e ao princípio da não surpresa (art. 10 do CPC). 4. A caracterização de interesse processual exige a presença dos requisitos de necessidade e adequação. No caso, a parte autora impugna contratos distintos, cujos descontos incidem diretamente sobre sua aposentadoria, o que evidencia seu interesse de agir. 5. A cumulação de pedidos é faculdade da parte (art. 327 do CPC), e a existência de múltiplas ações com fundamentos diversos não configura, por si só, litigância predatória ou abuso do direito de ação. 6. O fundamento de eventual conexão entre ações não justifica a extinção do processo, sendo cabível, nesses casos, a reunião dos feitos para julgamento conjunto (art. 55, §§ 1º e 3º do CPC), e não o indeferimento da inicial por ausência de interesse de agir. 7. Precedentes do TJCE reconhecem a nulidade da sentença em casos análogos, reforçando que o ajuizamento de ações distintas para questionar contratos diferentes não configura fracionamento indevido ou conduta abusiva. 8. A sentença impugnada afronta os princípios constitucionais do devido processo legal, da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV) e da primazia do julgamento de mérito (CPC, art. 4º), impondo sua anulação. IV. DISPOSITIVO: 9. Recurso provido. ________ Dispositivos legais relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXV, LIV; CPC, arts. 4º, 6º, 10, 55, 321, 327, 485, VI. Jurisprudências relevantes citadas: TJCE, ApCiv nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Rel. Des. Everardo Lucena Segundo, j. 28.08.2024; TJCE, ApCiv nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Rel. Des. Francisco Darival Beserra Primo, j. 03.10.2023; TJCE, ApCiv nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Rel. Des. Carlos Alberto Mendes Forte, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Rel. Des. Jane Ruth Maia de Queiroga, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Rel. Des. Maria Regina Oliveira, j. 06.11.2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do recurso para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por MARIA DO SOCORRO RABELO ARAÚJO, com o objetivo de reformar a sentença de Id. nº 23296067, proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Morada Nova/CE, que extinguiu sem resolução do mérito a Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Repetição do Indébito e Condenação por Danos Morais, ajuizada pela parte ora Apelante em desfavor de BANCO PAN S/A. Eis o dispositivo da sentença: "(...) Pelo exposto, com base nos artigos 330, III, e 485, VI, do CPC e art. 5°, LV, da Constituição Federal, INDEFIRO a petição inicial, extinguindo o processo sem resolução do mérito. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais, suspensa a exigibilidade pela gratuidade da justiça ora concedida, com fundamento no art. 98, §3º, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as cautelas legais" Irresignada com a sentença, a parte Apelante interpôs o presente recurso, requerendo a reforma do decisum, anexando a minuta recursal no Id. nº 23296070, alegando, em apertada síntese, que não se configura litispendência, nos termos da legislação processual vigente, uma vez que as demandas foram ajuizadas com o propósito de impugnar contratos distintos, inclusive firmados com instituições diversas. Assim, não se pode admitir que a requerente - pessoa idosa, consumidora e parte hipossuficiente na relação jurídica - permaneça desamparada pela jurisdição estatal, unicamente pelo fato de ter optado por postular seus direitos em ações autônomas, relativas a vínculos contratuais distintos. Argumenta que não se pode afirmar que a recorrente carece de interesse processual, uma vez que restou diretamente afetada em seu único patrimônio - o benefício previdenciário -, utilizado para sua subsistência e de sua família, sendo este objeto de descontos mensais. Tal circunstância evidencia, de forma inequívoca, seu interesse de agir. Aduz que não se pode indeferir a petição inicial em evidente prejuízo do consumidor, com base em meras suposições que desqualificam, de forma prematura, sua idoneidade. Tal conduta, além de contrariar o princípio da boa-fé, acaba por fomentar, ainda que indiretamente, a perpetuação de práticas abusivas por parte das instituições financeiras contra o consumidor hipossuficiente. Ao final, requereu o total provimento do recurso de Apelação para cassar a sentença proferida, determinando a remessa dos autos para o Juízo a quo, para o devido prosseguimento do feito. Justiça Gratuita deferida à parte Autora, ora Apelante, na sentença de Id. nº 23296067. Contrarrazões juntada no Id. nº 23296077. É o breve relatório, passo a decidir. VOTO I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL: Ab initio, em juízo antecedente de admissibilidade recursal, presentes os pressupostos intrínsecos ou subjetivos (cabimento, interesse e legitimidade, inexistência de súmula impeditiva) e extrínsecos ou objetivos (tempestividade, preparo, regularidade formal e a inexistência de fatos extintivos ou impeditivos do direito de recorrer), hei por bem CONHECER DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO. II - DO MÉRITO RECURSAL: O ponto central da controvérsia recursal consiste em avaliar se deve ser mantida ou reformada a sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo originário sem resolução de mérito, com fundamento no art. 330, inc. III c/c art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil. Pois bem. In casu, com a devida vênia, impende destacar, desde logo, que o recurso comporta provimento. De início, vislumbra-se que o julgamento do feito foi proferido de forma equivocada, ao indeferir de plano a ação, sem oportunizar à parte Autora, ora Apelante, a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme estabelece o artigo 321 do Código de Processo Civil. É cediço que o referido dispositivo legal prevê, de forma expressa, que, ao constatar que a petição inicial não atende aos requisitos dos artigos 319 e 320 ou apresenta falhas que possam comprometer o julgamento do mérito, o magistrado deve intimar a parte autora para promover as correções ou complementações necessárias, fixando o prazo de 15 (quinze) dias e indicando de maneira clara o vício a ser sanado. O parágrafo único do artigo 321 ainda estabelece que apenas no caso de descumprimento da diligência é que a petição inicial poderá ser indeferida, in verbis: "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Com efeito, ao magistrado somente é lícito indeferir a petição inicial após oportunizar à parte Autora a possibilidade de sanar eventuais vícios que possam macular a sua peça vestibular. A inobservância desse procedimento implica a supressão do direito subjetivo da parte e configura manifesta afronta ao princípio da não surpresa, expressamente consagrado no artigo 10 do Código de Processo Civil: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." Dessa forma, a concessão de prazo para a emenda da inicial não representa mera faculdade do juízo, mas sim um direito processual da parte Autora e um dever legal do magistrado. Tal providência visa assegurar a observância de princípios constitucionais e processuais fundamentais, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a economia processual, a instrumentalidade das formas e a vedação às decisões-surpresa. Nesse contexto, consolidou-se a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça no sentido de que o indeferimento liminar da petição inicial, sem a prévia intimação para emenda, resulta na nulidade da sentença. Tal prática caracteriza erro de procedimento, uma vez que viola não apenas o devido processo legal, mas também compromete a efetividade da tutela jurisdicional, na medida em que desconsidera a primazia do julgamento de mérito e os princípios da economia e celeridade processuais. Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 485, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA DA INICIAL. CONTRARIEDADE AO PROCEDIMENTO DO ART. 321 DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE INSANÁVEL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A EXTINÇÃO DA AÇÃO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença decretou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por indeferimento da petição inicial, na forma do art. 485, I, do CPC, sob o fundamento de que o ajuizamento de que o fracionamento indevido de ações conexas configura abuso do direito de ação. 2. O art. 321, do Código de Processo Civil prevê expressamente que, quando o juiz constatar que a petição inicial não atende as exigências do art. 319 e 320, ou apresentar falhas que possam atrapalhar o julgamento de mérito, não só deverá intimar a parte autora para realizar as correções ou complementações necessárias no prazo de 15 (quinze) dias, como deverá indicar claramente o vício a ser corrigido. E prossegue, em seu parágrafo único, determinando que apenas em caso de não cumprimento da diligência a petição inicial será indeferida. 3. Assim, a oportunidade de emenda da inicial constitui, não só um direito da parte autora, como também é o procedimento legal a ser observado pelo juiz da causa, em atenção aos princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 4. Desse modo, há de se reconhecer que a extinção do feito pelo indeferimento liminar da inicial sem que seja dada à parte autora a oportunidade de emendar a petição inicial, infringe comando legal do art. 321, do CPC, fere os princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento de mérito, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 5. Além disso, devo observar que a configuração de conduta predatória do advogado não ocorre pela simples verificação da quantidade de ações ajuizadas, mas pela presença de outras circunstâncias associadas, como por exemplo, o fracionamento indevidos de pedidos relativos a um mesmo contrato em diferentes ações ou o ajuizamento da mesma ação (parte, pedido e causa de pedir) em diferentes varas ou comarcas, visando escolher o juízo que lhe parece ter o entendimento mais favorável, para depois desistir dos outros processos, burlando o princípio do juiz natural, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Desse modo, é absolutamente irrazoável a conclusão de que o ajuizamento de 3 (três) ações, em que cada uma aborda um contrato diferente do outro, constitua abuso do deito de ação e fragmentação indevida de processos. 7. Nesse contexto, estando descaracterizada a existência de abuso de direito de ação e de fragmentação indevida e estando evidenciada a causa de pedir, a legitimidade da parte e o interesse processual, há de se reconhecer a ausência de justa causa para a extinção do feito, por violação dos princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e do devido processo legal, consagrados pelo art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal, comprometendo a finalidade do processo, que é a satisfação do direito material pela primazia da sentença de mérito, nos termos dos arts. 4º e 6º, do CPC. 8. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Relator: Desembargador EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 28/08/2024, Data da publicação: 28/08/2024). (Destaquei). EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA OPORTUNIZAÇÃO DE EMENDA À INICIAL. OFENSA AO ART. 321 DO CPC E AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O cerne da questão posta à desate cinge-se a analisar a sentença hostilizada que, em face da ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito. 2. Da detida análise do fascículo processual, observa-se que o decisum foi proferido de forma equivocada, porquanto indeferiu de plano a ação, sem oportunizar à parte a possibilidade de emendar à inicial, nos termos do art. 321 do CPC. 3. Por consequência, caracterizada a ausência de oportunização à parte autora de emenda à inicial, em violação aos artigos 321 e 10 do CPC, a anulação da sentença é medida impositiva. 4. Apelação conhecida e provida. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Relator: Desembargador FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, 3ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 03/10/2023, Data da publicação: 04/10/2023). (Destaquei). Para além disso, no que se refere à alegação de abuso do direito de ação, ou o denominado "uso predatório da jurisdição", cumpre observar que, embora tal conduta possa, em tese, configurar prática temerária, não se amolda à hipótese prevista no art. 330, inciso III, do Código de Processo Civil. Isso porque o interesse processual - entendido como o binômio necessidade e adequação - encontra-se plenamente caracterizado no caso concreto. A necessidade decorre da vedação à autotutela no ordenamento jurídico pátrio, de modo que, inexistindo mecanismos extrajudiciais idôneos para a satisfação de sua pretensão, incumbe à parte Autora recorrer ao Poder Judiciário. Por sua vez, a adequação refere-se à utilização dos instrumentos processuais apropriados para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida. Nesse contexto, a cumulação de pedidos contra o mesmo réu, ainda que tenham como origem contratos/fatos diversos, configura mera faculdade, e não obrigatoriedade, deferida à parte, nos termos do art. 327 do CPC, que assim dispõe: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326 . Diante disso, não é válida a fundamentação da Magistrada de primeira instância de que a existência de múltiplas ações movidas para anular negócios jurídicos indicaria falta de interesse processual, uma vez que a Autora deveria ter apresentado apenas uma demanda. Isso se deve ao fato de que, em situações de conexão entre ações, a consequência processual é a junção dos processos para julgamento conjunto e não a sua extinção por ausência de interesse de agir, conforme preleciona o art. 55, do CPC, in verbis: "Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II - às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre ele." Assim, tem-se que a conexão entre os processos têm como objetivo evitar decisões conflitantes, garantindo que, caso haja a possibilidade de ocorrerem decisões contraditórias e/ou prejudiciais as partes envolvidas, as demandas sejam julgadas simultaneamente pelo mesmo juízo. A multiplicidade de ações, nesse contexto, reflete a diversidade das relações jurídicas analisadas, sendo inadequada a extinção de processos com fundamento na quantidade de demandas ajuizadas. Tal medida se mostra incompatível com os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal, assegurados pela Constituição. Cada ação deve ser examinada individualmente, levando em conta os direitos materiais em debate e a necessidade de proteção contra eventuais práticas contratuais abusivas ou irregulares. No caso concreto, embora os processos tratem de questões semelhantes, os objetos das ações são distintos, versando cada uma sobre diferentes contratos, razão pela qual não há que se falar em conexão, visto que não há igualdade entre as causas de pedir. A propósito, colaciona-se precedente desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDEFERIMENTO. IMPROPRIEDADE. AJUIZAMENTO DE MÚLTIPLAS AÇÕES. CAUSA DE PEDIR DISTINTAS. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta por Maria Deusina Freitas Ferreira Pires em contrariedade a sentença que indeferiu a inicial e julgou extinta a ação declaratória negativa de débito c/c indenização por dano moral ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, ora recorrido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão diz respeito à análise do acerto da sentença de extinção sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O Juízo a quo indeferiu a petição inicial declarando extinta a presente ação sem resolução de mérito, em face do ajuizamento de várias ações contra o mesmo réu sobre fatos semelhantes, em vez de propor uma única ação. 4. Contudo, compulsando os fólios processuais, verifica-se que a petição inicial atende os requisitos estabelecidos pela legislação processual civil, de modo que as condições da ação estão presente no caso em análise, sobretudo porque o fundamento utilizado para o indeferimento da inicial não é albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. 5. Apesar de as ações se referirem ao mesmo réu, verifica-se que as demandas são fundamentadas em causa de pedir diversas, especialmente porque são distintas os valores das dívidas e contratos. 6. Dessa forma, ao prolatar a sentença, o Juízo a quo não agiu com acerto, incorrendo em error in procedendo, devendo, pois, os presentes autos ser devolvidos à instância de origem para regular processamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso provido, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. (TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Relator: Desembargador CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, 2ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 27/02/2025). (Destaquei). EMENTA: Apelação Cível. Direito Processual Civil. Empréstimo Consignado. Ajuizamento de Diversas Ações. Sentença de Indeferimento da Petição Inicial e Extinção Do Processo Sem Resolução Do Mérito. Impossibilidade. Recurso Conhecido e Provido. Sentença Anulada. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pela parte autora objetivando a anulação da sentença que indeferiu a petição inicial (art. 330, III, do CPC), em sede de ação declaratória de inexistência/nulidade de débito movida em desfavor do Banco Bradesco S/A. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar se a mera quantidade de ações ajuizadas pela parte apelante contra a mesma instituição financeira é causa para extinção do feito sem resolução de mérito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. No caso, a parte autora impugna o contrato de empréstimo consignado de nº 393193016, com descontos mensais no valor de R$ 51,10, a ser quitado em 32 parcelas. 4. O julgador proferiu a sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, após verificar que a parte ajuizou diversas ações contra a mesma instituição financeira, impugnando diversos contratos supostamente realizados por ela. 5. Considerando que cada contrato realizado resulta em novo desconto adicionado aos proventos de aposentadoria da parte demandante, sendo esta sua causa de pedir, e que a parte tem a necessidade/utilidade de ir ao Judiciário para obter provimento jurisdicional apto a barrar tais descontos, não há que se falar em ausência de interesse processual no presente caso. 6. Ademais, o acesso à Justiça deve ser priorizado, em detrimento do excesso de formalismo, que resultou, no caso concreto, impedimento do acesso da parte apelante à jurisdição, ferindo a sua garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF, na qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". IV. DISPOSITIVO 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Relatora: Desembargadora JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 26/02/2025). (Destaquei). EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL POR FRACIONAMENTO DE DEMANDAS. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. I- Cinge-se a controvérsia em perquirir o acerto ou desacerto da sentença impugnada, que indeferiu a petição inicial, sob a fundamentação de existência de três ações, esta e outras duas, ajuizadas pela autora buscando anular descontos, supostamente indevidos, o que configuraria ausência de interesse processual, uma vez que a parte deveria ajuizar somente uma demanda. II- No caso concreto, conquanto os processos versem sobre matéria similar, ou seja, cobranças indevidas; referem-se a descontos de timbres, contratos e períodos diversos; assim, relações jurídicas distintas. Patente, pois, a legitimidade e o interesse processual. III- O fundamento utilizado pelo magistrado sentenciante não se aplica ao caso sub judice, ante a diferenciação entre as ações paradigmas por ostentarem como causa de pedir contratos diversos, o que descaracteriza a multiplicidade de ações; afastando-se, pois, a ocorrência do instituto da conexão e, ainda, a possibilidade de ocorrência do mero risco de decisões conflitantes, a que se refere o art. 55, § 3º do CPC. IV- Em que pese se tratar das mesmas partes, o fato de cada processo ostentar Contratos distintos, já é o suficiente para que se permita o processamento em separado, porquanto, antes de ser uma obrigação, a reunião dos pedidos em uma só demanda é uma faculdade (art. 327, CPC). V- Em homenagem aos princípios da cooperação, da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da primazia do julgamento de mérito; devemos autos retornar ao juízo de origem para que a inicial seja recebida, processada e sentenciada, na forma da lei. VI- Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Relatora: Desembargadora MARIA REGINA OLIVEIRA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 06/11/2024, Data da publicação: 06/11/2024). (Destaquei). Com efeito, os elementos probatórios apresentados pela parte Autora, ora Apelante, aliados à ausência de indícios concretos de litigância abusiva, demonstram que não se justifica a invocação genérica da Recomendação nº 159/2024 do CNJ como fundamento para restringir o direito de acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, a sentença ora recorrida se revela em desconformidade com o princípio da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, bem como afronta a garantia constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, segundo a qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Destarte, conclui-se que o Juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em error in procedendo, violando normas fundamentais do devido processo legal. Impõe-se, portanto, a anulação da sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja oportunizado o regular prosseguimento do feito, com observância aos princípios que regem o processo civil e às garantias constitucionais do jurisdicionado. DISPOSITIVO Diante do exposto, pelos argumentos fartamente coligidos e com fulcro nos documentos e dispositivos legais acima invocados, CONHEÇO do presente recurso de Apelação Cível para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, a fim de decretar a nulidade da sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. É como voto. Fortaleza, data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator

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Maria Eurides Rabelo x Bradesco Seguros S/A

ID: 260297680

Tribunal: TJCE Órgão: 5º Gabinete da 4ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 3000446-74.2024.8.06.0128

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

MARIA EURIDES RABELO

Polo Passivo:

BRADESCO SEGUROS S/A

Intimação

Advogados:

ROBERTO DOREA PESSOA

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

VANESSA LIMA DE OLIVEIRA

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EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA NEGATIVA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE PARA EMENDA. AFRONTA AOS ARTS. 321 … EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA NEGATIVA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE PARA EMENDA. AFRONTA AOS ARTS. 321 E 10, DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE DA SENTENÇA. NULIDADE DA SENTENÇA RECONHECIDA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por Maria Eurides Rabelo contra sentença proferida pela 2ª Vara Cível da Comarca de Morada Nova/CE, que extinguiu, sem resolução de mérito, ação declaratória de inexistência de débito c/c repetição de indébito e indenização por danos morais ajuizada em face de Bradesco Seguros S/A, sob fundamento de ausência de interesse processual em razão do fracionamento de demandas similares. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a sentença que extinguiu a ação por indeferimento da petição inicial, com fundamento na ausência de interesse processual, pode subsistir sem a prévia intimação para emenda; e (ii) estabelecer se a multiplicidade de ações ajuizadas pela mesma parte contra a mesma instituição financeira, com base em contratos distintos, configura abuso do direito de ação a justificar a extinção do processo. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O artigo 321 do CPC impõe ao magistrado o dever de oportunizar à parte autora a emenda da petição inicial antes de indeferi-la, sempre que forem identificados vícios ou irregularidades. A ausência dessa providência configura error in procedendo e afronta o devido processo legal. 4. O indeferimento da petição inicial sem a prévia intimação para correção viola o princípio da não surpresa, além de comprometer a garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa. 5. A jurisprudência consolidada do TJCE reconhece a nulidade de sentença proferida nestas condições, com determinação de retorno dos autos à origem para o regular processamento da demanda. 6. A multiplicidade de ações envolvendo contratos diversos não configura, por si só, abuso do direito de ação, sendo facultada à parte autora a escolha entre cumular pedidos ou ajuizar demandas autônomas, nos termos do artigo 327 do CPC. 7. A extinção da ação com base na quantidade de processos ajuizados afronta o princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional, consagrado no artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, e desconsidera que a conexão entre causas não é fundamento legal para o indeferimento da inicial, mas hipótese de reunião de processos para julgamento conjunto (CPC, art. 55). 8. Verificadas causas de pedir distintas entre as ações ajuizadas, é incabível a extinção do feito por ausência de interesse processual, devendo a análise recair sobre os elementos concretos de cada demanda. IV. DISPOSITIVO: 9. Recurso provido. ________ Dispositivos legais relevantes citados: CF/1988, art. 5º, incs. XXXV, LIV e LV; CPC, arts. 6º, 10, 55, 321, 327, 485, VI. Jurisprudências relevantes citadas: TJCE, ApCiv nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Rel. Des. Everardo Lucena Segundo, j. 28.08.2024; TJCE, ApCiv nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Rel. Des. Francisco Darival Beserra Primo, j. 03.10.2023; TJCE, ApCiv nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Rel. Desª. Jane Ruth Maia de Queiroga, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Rel. Desª. Maria Regina Oliveira, j. 06.11.2024; TJCE, ApCiv nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Rel. Des. Carlos Alberto Mendes Forte, j. 26.02.2025. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do recurso para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por MARIA EURIDES RABELO, com o objetivo de reformar a sentença de Id. nº 19353707, proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Morada Nova/CE, que extinguiu sem resolução do mérito a Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Repetição de Indébito e Indenização por Danos Morais, ajuizada pela parte ora Apelante em desfavor de BRADESCO SEGUROS S/A. Eis o dispositivo da sentença: "(...) Pelo exposto, com base nos artigos 330, III, e 485, VI, do CPC e art. 5°, LV, da Constituição Federal, INDEFIRO a petição inicial, extinguindo o processo sem resolução do mérito. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais, suspensa a exigibilidade pela gratuidade da justiça ora concedida, com fundamento no art. 98, §3º, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as cautelas legais." Irresignada com a sentença, a parte Apelante interpôs o presente recurso, requerendo a reforma do decisum, anexando a minuta recursal no Id. nº 19353708, alegando, em apertada síntese, que a anulação do desconto referente ao contrato objeto da presente demanda possui particularidades que o distinguem das demais ações ajuizadas pela mesma parte perante o Juízo a quo. Destaca, ainda, a existência de pedidos específicos na petição inicial que conferem singularidade à presente ação em relação às demais. Ao final, requereu o total provimento do recurso de Apelação para cassar a sentença proferida, determinando a remessa dos autos para o Juízo a quo, para o devido prosseguimento do feito. Contrarrazões no Id. nº 19353713. É o breve relatório, passo a decidir. VOTO I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL: Ab initio, em juízo antecedente de admissibilidade recursal, presentes os pressupostos intrínsecos ou subjetivos (cabimento, interesse e legitimidade, inexistência de súmula impeditiva) e extrínsecos ou objetivos (tempestividade, preparo, regularidade formal e a inexistência de fatos extintivos ou impeditivos do direito de recorrer), hei por bem CONHECER DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO. II - DO MÉRITO RECURSAL: O ponto central da controvérsia recursal consiste em avaliar se deve ser mantida ou reformada a sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo originário sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil. Pois bem. In casu, com a devida vênia, impende destacar, desde logo, que o recurso comporta provimento. De início, vislumbra-se que o julgamento do feito foi proferido de forma equivocada, ao indeferir de plano a ação, sem oportunizar à parte Autora, ora Apelante, a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme estabelece o artigo 321 do Código de Processo Civil. É cediço que o referido dispositivo legal prevê, de forma expressa, que, ao constatar que a petição inicial não atende aos requisitos dos artigos 319 e 320 ou apresenta falhas que possam comprometer o julgamento do mérito, o magistrado deve intimar a parte autora para promover as correções ou complementações necessárias, fixando o prazo de 15 (quinze) dias e indicando de maneira clara o vício a ser sanado. O parágrafo único do artigo 321 ainda estabelece que apenas no caso de descumprimento da diligência é que a petição inicial poderá ser indeferida, in verbis: "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Com efeito, ao magistrado somente é lícito indeferir a petição inicial após oportunizar à parte Autora a possibilidade de sanar eventuais vícios que possam macular a sua peça vestibular. A inobservância desse procedimento implica a supressão do direito subjetivo da parte e configura manifesta afronta ao princípio da não surpresa, expressamente consagrado no artigo 10 do Código de Processo Civil: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." Dessa forma, a concessão de prazo para a emenda da inicial não representa mera faculdade do juízo, mas sim um direito processual da parte Autora e um dever legal do magistrado. Tal providência visa assegurar a observância de princípios constitucionais e processuais fundamentais, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a economia processual, a instrumentalidade das formas e a vedação às decisões-surpresa. Nesse contexto, consolidou-se a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça no sentido de que o indeferimento liminar da petição inicial, sem a prévia intimação para emenda, resulta na nulidade da sentença. Tal prática caracteriza erro de procedimento, uma vez que viola não apenas o devido processo legal, mas também compromete a efetividade da tutela jurisdicional, na medida em que desconsidera a primazia do julgamento de mérito e os princípios da economia e celeridade processuais. Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 485, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA DA INICIAL. CONTRARIEDADE AO PROCEDIMENTO DO ART. 321 DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE INSANÁVEL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A EXTINÇÃO DA AÇÃO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença decretou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por indeferimento da petição inicial, na forma do art. 485, I, do CPC, sob o fundamento de que o ajuizamento de que o fracionamento indevido de ações conexas configura abuso do direito de ação. 2. O art. 321, do Código de Processo Civil prevê expressamente que, quando o juiz constatar que a petição inicial não atende as exigências do art. 319 e 320, ou apresentar falhas que possam atrapalhar o julgamento de mérito, não só deverá intimar a parte autora para realizar as correções ou complementações necessárias no prazo de 15 (quinze) dias, como deverá indicar claramente o vício a ser corrigido. E prossegue, em seu parágrafo único, determinando que apenas em caso de não cumprimento da diligência a petição inicial será indeferida. 3. Assim, a oportunidade de emenda da inicial constitui, não só um direito da parte autora, como também é o procedimento legal a ser observado pelo juiz da causa, em atenção aos princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 4. Desse modo, há de se reconhecer que a extinção do feito pelo indeferimento liminar da inicial sem que seja dada à parte autora a oportunidade de emendar a petição inicial, infringe comando legal do art. 321, do CPC, fere os princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento de mérito, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 5. Além disso, devo observar que a configuração de conduta predatória do advogado não ocorre pela simples verificação da quantidade de ações ajuizadas, mas pela presença de outras circunstâncias associadas, como por exemplo, o fracionamento indevidos de pedidos relativos a um mesmo contrato em diferentes ações ou o ajuizamento da mesma ação (parte, pedido e causa de pedir) em diferentes varas ou comarcas, visando escolher o juízo que lhe parece ter o entendimento mais favorável, para depois desistir dos outros processos, burlando o princípio do juiz natural, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Desse modo, é absolutamente irrazoável a conclusão de que o ajuizamento de 3 (três) ações, em que cada uma aborda um contrato diferente do outro, constitua abuso do deito de ação e fragmentação indevida de processos. 7. Nesse contexto, estando descaracterizada a existência de abuso de direito de ação e de fragmentação indevida e estando evidenciada a causa de pedir, a legitimidade da parte e o interesse processual, há de se reconhecer a ausência de justa causa para a extinção do feito, por violação dos princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e do devido processo legal, consagrados pelo art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal, comprometendo a finalidade do processo, que é a satisfação do direito material pela primazia da sentença de mérito, nos termos dos arts. 4º e 6º, do CPC. 8. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Relator: Desembargador EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 28/08/2024, Data da publicação: 28/08/2024). (Destaquei). EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA OPORTUNIZAÇÃO DE EMENDA À INICIAL. OFENSA AO ART. 321 DO CPC E AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O cerne da questão posta à desate cinge-se a analisar a sentença hostilizada que, em face da ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito. 2. Da detida análise do fascículo processual, observa-se que o decisum foi proferido de forma equivocada, porquanto indeferiu de plano a ação, sem oportunizar à parte a possibilidade de emendar à inicial, nos termos do art. 321 do CPC. 3. Por consequência, caracterizada a ausência de oportunização à parte autora de emenda à inicial, em violação aos artigos 321 e 10 do CPC, a anulação da sentença é medida impositiva. 4. Apelação conhecida e provida. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Relator: Desembargador FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, 3ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 03/10/2023, Data da publicação: 04/10/2023). (Destaquei). Para além disso, no que se refere à alegação de abuso do direito de ação, ou o denominado "uso predatório da jurisdição", cumpre observar que, embora tal conduta possa, em tese, configurar prática temerária, não se amolda à hipótese prevista no art. 330, inciso III, do Código de Processo Civil. Isso porque o interesse processual - entendido como o binômio necessidade e adequação - encontra-se plenamente caracterizado no caso concreto. A necessidade decorre da vedação à autotutela no ordenamento jurídico pátrio, de modo que, inexistindo mecanismos extrajudiciais idôneos para a satisfação de sua pretensão, incumbe à parte Autora recorrer ao Poder Judiciário. Por sua vez, a adequação refere-se à utilização dos instrumentos processuais apropriados para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida. Nesse contexto, a cumulação de pedidos contra o mesmo réu, ainda que tenham como origem contratos/fatos diversos, configura mera faculdade, e não obrigatoriedade, deferida à parte, nos termos do art. 327 do CPC, que assim dispõe: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326 . Diante disso, não é válida a fundamentação da Magistrada de primeira instância de que a existência de múltiplas ações movidas para anular negócios jurídicos e requerer indenização por danos materiais e morais em face da mesma instituição financeira indicaria falta de interesse processual, uma vez que a Autora deveria ter apresentado apenas uma demanda. Isso se deve ao fato de que, em situações de conexão entre ações, a consequência processual é a junção dos processos para julgamento conjunto e não a sua extinção por ausência de interesse de agir, conforme preleciona o art. 55, do CPC, in verbis: "Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II - às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre ele." Assim, tem-se que a conexão entre os processos têm como objetivo evitar decisões conflitantes, garantindo que, caso haja a possibilidade de ocorrerem decisões contraditórias e/ou prejudiciais as partes envolvidas, as demandas sejam julgadas simultaneamente pelo mesmo juízo. A multiplicidade de ações, nesse contexto, reflete a diversidade das relações jurídicas analisadas, sendo inadequada a extinção de processos com fundamento na quantidade de demandas ajuizadas. Tal medida se mostra incompatível com os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal, assegurados pela Constituição. Cada ação deve ser examinada individualmente, levando em conta os direitos materiais em debate e a necessidade de proteção contra eventuais práticas contratuais abusivas ou irregulares. No caso concreto, embora os processos tratem de questões semelhantes, os objetos das ações são distintos, versando cada uma sobre diferentes contratos, razão pela qual não há que se falar em conexão, visto que não há igualdade entre as causas de pedir. A propósito, colaciona-se precedente desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDEFERIMENTO. IMPROPRIEDADE. AJUIZAMENTO DE MÚLTIPLAS AÇÕES. CAUSA DE PEDIR DISTINTAS. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta por Maria Deusina Freitas Ferreira Pires em contrariedade a sentença que indeferiu a inicial e julgou extinta a ação declaratória negativa de débito c/c indenização por dano moral ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, ora recorrido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão diz respeito à análise do acerto da sentença de extinção sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O Juízo a quo indeferiu a petição inicial declarando extinta a presente ação sem resolução de mérito, em face do ajuizamento de várias ações contra o mesmo réu sobre fatos semelhantes, em vez de propor uma única ação. 4. Contudo, compulsando os fólios processuais, verifica-se que a petição inicial atende os requisitos estabelecidos pela legislação processual civil, de modo que as condições da ação estão presente no caso em análise, sobretudo porque o fundamento utilizado para o indeferimento da inicial não é albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. 5. Apesar de as ações se referirem ao mesmo réu, verifica-se que as demandas são fundamentadas em causa de pedir diversas, especialmente porque são distintas os valores das dívidas e contratos. 6. Dessa forma, ao prolatar a sentença, o Juízo a quo não agiu com acerto, incorrendo em error in procedendo, devendo, pois, os presentes autos ser devolvidos à instância de origem para regular processamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso provido, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. (TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Relator: Desembargador CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, 2ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 27/02/2025). (Destaquei). EMENTA: Apelação Cível. Direito Processual Civil. Empréstimo Consignado. Ajuizamento de Diversas Ações. Sentença de Indeferimento da Petição Inicial e Extinção Do Processo Sem Resolução Do Mérito. Impossibilidade. Recurso Conhecido e Provido. Sentença Anulada. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pela parte autora objetivando a anulação da sentença que indeferiu a petição inicial (art. 330, III, do CPC), em sede de ação declaratória de inexistência/nulidade de débito movida em desfavor do Banco Bradesco S/A. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar se a mera quantidade de ações ajuizadas pela parte apelante contra a mesma instituição financeira é causa para extinção do feito sem resolução de mérito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. No caso, a parte autora impugna o contrato de empréstimo consignado de nº 393193016, com descontos mensais no valor de R$ 51,10, a ser quitado em 32 parcelas. 4. O julgador proferiu a sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, após verificar que a parte ajuizou diversas ações contra a mesma instituição financeira, impugnando diversos contratos supostamente realizados por ela. 5. Considerando que cada contrato realizado resulta em novo desconto adicionado aos proventos de aposentadoria da parte demandante, sendo esta sua causa de pedir, e que a parte tem a necessidade/utilidade de ir ao Judiciário para obter provimento jurisdicional apto a barrar tais descontos, não há que se falar em ausência de interesse processual no presente caso. 6. Ademais, o acesso à Justiça deve ser priorizado, em detrimento do excesso de formalismo, que resultou, no caso concreto, impedimento do acesso da parte apelante à jurisdição, ferindo a sua garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF, na qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". IV. DISPOSITIVO 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Relatora: Desembargadora JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 26/02/2025). (Destaquei). EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL POR FRACIONAMENTO DE DEMANDAS. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. I- Cinge-se a controvérsia em perquirir o acerto ou desacerto da sentença impugnada, que indeferiu a petição inicial, sob a fundamentação de existência de três ações, esta e outras duas, ajuizadas pela autora buscando anular descontos, supostamente indevidos, o que configuraria ausência de interesse processual, uma vez que a parte deveria ajuizar somente uma demanda. II- No caso concreto, conquanto os processos versem sobre matéria similar, ou seja, cobranças indevidas; referem-se a descontos de timbres, contratos e períodos diversos; assim, relações jurídicas distintas. Patente, pois, a legitimidade e o interesse processual. III- O fundamento utilizado pelo magistrado sentenciante não se aplica ao caso sub judice, ante a diferenciação entre as ações paradigmas por ostentarem como causa de pedir contratos diversos, o que descaracteriza a multiplicidade de ações; afastando-se, pois, a ocorrência do instituto da conexão e, ainda, a possibilidade de ocorrência do mero risco de decisões conflitantes, a que se refere o art. 55, § 3º do CPC. IV- Em que pese se tratar das mesmas partes, o fato de cada processo ostentar Contratos distintos, já é o suficiente para que se permita o processamento em separado, porquanto, antes de ser uma obrigação, a reunião dos pedidos em uma só demanda é uma faculdade (art. 327, CPC). V- Em homenagem aos princípios da cooperação, da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da primazia do julgamento de mérito; devemos autos retornar ao juízo de origem para que a inicial seja recebida, processada e sentenciada, na forma da lei. VI- Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Relatora: Desembargadora MARIA REGINA OLIVEIRA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 06/11/2024, Data da publicação: 06/11/2024). (Destaquei). Com efeito, os elementos probatórios apresentados pela parte Autora, ora Apelante, aliados à ausência de indícios concretos de litigância abusiva, demonstram que não se justifica a invocação genérica da Recomendação nº 159/2024 do CNJ como fundamento para restringir o direito de acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, a sentença ora recorrida se revela em desconformidade com o princípio da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, bem como afronta a garantia constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, segundo a qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Ademais, não se vislumbra, no caso em exame, fundamento jurídico que justifique a reunião dos feitos para instrução e julgamento conjuntos, uma vez que as demandas apresentam distinções relevantes quanto às circunstâncias fáticas que embasam o direito invocado pela parte ora Apelante. Dessa forma, inexiste risco concreto de prolação de decisões conflitantes, a afastar a necessidade de eventual reunião dos processos. Destarte, conclui-se que o Juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em error in procedendo, violando normas fundamentais do devido processo legal. Impõe-se, portanto, a anulação da sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja oportunizado o regular prosseguimento do feito, com observância aos princípios que regem o processo civil e às garantias constitucionais do jurisdicionado. DISPOSITIVO Diante do exposto, pelos argumentos fartamente coligidos e com fulcro nos documentos e dispositivos legais acima invocados, CONHEÇO do presente recurso de Apelação Cível para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, a fim de decretar a nulidade da sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. É como voto. Fortaleza, data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator

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Francisco Gomes Da Silva x Banco Do Brasil Sa

ID: 333062944

Tribunal: TJCE Órgão: 5º Gabinete da 4ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0202077-51.2024.8.06.0151

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

FRANCISCO GOMES DA SILVA

Polo Passivo:

BANCO DO BRASIL SA

Intimação

Advogados:

DAVID SOMBRA PEIXOTO

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MARLA ISEUDA DA SILVA BARROS

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JOSE IDEMBERG NOBRE DE SENA

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EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTU… EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE PARA EMENDA. AFRONTA AOS ARTS. 321 E 10, DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por FRANCISCO GOMES DA SILVA contra sentença do Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Morada Nova/CE, que extinguiu, sem resolução do mérito, Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Repetição de Indébito e Danos Morais, ajuizada em desfavor do BANCO DO BRASIL S/A, com fundamento nos arts. 330, III, e 485, VI, do CPC, sob fundamento de ausência de interesse processual em razão do fracionamento de demandas similares. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se o indeferimento liminar da petição inicial, sem prévia intimação para emenda, configura nulidade processual; e (ii) definir se a existência de múltiplas ações sobre contratos distintos contra o mesmo réu configura ausência de interesse processual ou uso predatório da jurisdição. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O juiz só pode indeferir a petição inicial quando, após intimada, a parte autora deixa de cumprir diligência para emenda, conforme preceituam os arts. 321 e 10 do CPC, sendo nula a sentença proferida sem essa oportunidade. 4. A ausência de intimação para emendar a petição inicial viola os princípios da cooperação, do contraditório, da ampla defesa, da não surpresa e da primazia do julgamento de mérito. 5. A jurisprudência do TJCE firmou entendimento de que o indeferimento da inicial, sem observância do art. 321 do CPC, configura erro de procedimento e afronta ao devido processo legal. 6. A mera existência de múltiplas ações não caracteriza, por si só, uso abusivo da jurisdição, sobretudo quando cada demanda se refere a contratos distintos e causas de pedir autônomas. 7. A cumulação de pedidos é faculdade do autor, e sua não utilização não implica ausência de interesse processual, sendo inaplicável, no caso, o art. 330, III, do CPC. 8. A desconexão entre as ações, dada a diversidade das relações jurídicas abordadas, afasta a hipótese de litispendência ou fracionamento indevido, inexistindo justa causa para extinção do feito. 9. O indeferimento liminar com base apenas na quantidade de ações viola o art. 5º, XXXV, da CF, que garante o direito de acesso à jurisdição, e compromete a efetividade do processo. IV. DISPOSITIVO: 10. Recurso provido. ________ Dispositivos legais relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXV e LIV; CPC, arts. 6º, 10, 55, 321, 327 e 485, VI. Jurisprudências relevantes citadas: TJCE, ApCiv nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Rel. Des. Everardo Lucena Segundo, j. 28.08.2024; TJCE, ApCiv nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Rel. Des. Francisco Darival Beserra Primo, j. 03.10.2023; TJCE, ApCiv nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Rel. Des. Carlos Alberto Mendes Forte, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Rel. Des. Jane Ruth Maia de Queiroga, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Rel. Des. Maria Regina Oliveira, j. 06.11.2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do recurso para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Desembargador Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por FRANCISCO GOMES DA SILVA, com o objetivo de reformar a sentença de Id. nº 20552979, proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Morada Nova/CE, que extinguiu sem resolução do mérito a Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Repetição de Indébito c/c Condenação por Danos Morais, ajuizada pela parte ora Apelante em desfavor de BANCO DO BRASIL S/A. Eis o dispositivo da sentença: "(...) Diante do exposto, determino a reorganização processual e REJEITO a petição inicial, extinguindo o feito sem análise do mérito, com fundamento nos artigos 330, inciso III, e 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, para que produza todos os efeitos jurídicos e legais cabíveis. Esclareço que a matéria discutida neste processo poderá ser apreciada junto a um dos feitos ajuizados pela parte autora contra o mesmo réu, considerando o estágio mais avançado, ou data da distribuição. Com base no princípio da cooperação, previsto no artigo 6º do CPC, é facultado à parte autora o direito de apresentar emenda à petição inicial na supra referida ação, garantindo-se assim a devida continuidade da demanda sem necessidade de nova propositura. Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais. Entretanto, considerando a presunção de hipossuficiência de pessoa física, conforme disposto nos artigos 98 e 99 do CPC, a exigibilidade dessas custas ficará suspensa pelo período de cinco anos, em razão da concessão da gratuidade judiciária, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC. Não há condenação em honorários advocatícios, visto que a relação processual não chegou a se estabelecer de forma plena. Determino que seja enviada comunicação à Corregedoria Geral de Justiça para ciência do ocorrido e para adoção das providências que considerar necessárias a fim de evitar a distribuição fragmentada de ações similares, conforme dispõe a Recomendação nº 01/2019/NUMOPEDE/CCJCE e Ofício-Circular n. 01/2023 do NUMOPEDE. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as devidas anotações. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Providenciem-se os expedientes necessários." Irresignada com a sentença, a parte Apelante interpôs o presente recurso, requerendo a reforma do decisum, anexando a minuta recursal no Id. nº 20552984, alegando, em apertada síntese, que ainda que tenha ajuizado múltiplas ações, as demandas possuem elementos distintos, e o fato de cada uma delas tratar de um contrato específico não caracteriza, de forma inequívoca, má-fé processual. Argumenta que o direito de acesso à justiça é garantido pela Constituição Federal, e a sua utilização não pode ser obstruída por interpretações rígidas que desconsiderem as dificuldades enfrentadas pela parte Apelante, pessoa idosa e hipossuficiente, como já exposto nos autos. Ao final, requer o total provimento do recurso de Apelação para cassar a sentença proferida, determinando a remessa dos autos para o Juízo a quo, para o devido prosseguimento do feito. Justiça Gratuita deferia à parte Autora, ora Apelante, na sentença de Id. nº 20552979. Contrarrazões no Id. nº 20552987. É o breve relatório, passo a decidir. VOTO I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL: Ab initio, em juízo antecedente de admissibilidade recursal, presentes os pressupostos intrínsecos ou subjetivos (cabimento, interesse e legitimidade, inexistência de súmula impeditiva) e extrínsecos ou objetivos (tempestividade, preparo, regularidade formal e a inexistência de fatos extintivos ou impeditivos do direito de recorrer), hei por bem CONHECER DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO. II - DO MÉRITO RECURSAL: O ponto central da controvérsia recursal consiste em avaliar se deve ser mantida ou reformada a sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo originário sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil. Pois bem. In casu, com a devida vênia, impende destacar, desde logo, que o recurso comporta provimento. De início, vislumbra-se que o julgamento do feito foi proferido de forma equivocada, ao indeferir de plano a ação, sem oportunizar à parte Autora, ora Apelante, a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme estabelece o artigo 321 do Código de Processo Civil. É cediço que o referido dispositivo legal prevê, de forma expressa, que, ao constatar que a petição inicial não atende aos requisitos dos artigos 319 e 320 ou apresenta falhas que possam comprometer o julgamento do mérito, o magistrado deve intimar a parte autora para promover as correções ou complementações necessárias, fixando o prazo de 15 (quinze) dias e indicando de maneira clara o vício a ser sanado. O parágrafo único do artigo 321 ainda estabelece que apenas no caso de descumprimento da diligência é que a petição inicial poderá ser indeferida, in verbis: "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Com efeito, ao magistrado somente é lícito indeferir a petição inicial após oportunizar à parte Autora a possibilidade de sanar eventuais vícios que possam macular a sua peça vestibular. A inobservância desse procedimento implica a supressão do direito subjetivo da parte e configura manifesta afronta ao princípio da não surpresa, expressamente consagrado no artigo 10 do Código de Processo Civil: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." Dessa forma, a concessão de prazo para a emenda da inicial não representa mera faculdade do juízo, mas sim um direito processual da parte Autora e um dever legal do magistrado. Tal providência visa assegurar a observância de princípios constitucionais e processuais fundamentais, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a economia processual, a instrumentalidade das formas e a vedação às decisões-surpresa. Nesse contexto, consolidou-se a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça no sentido de que o indeferimento liminar da petição inicial, sem a prévia intimação para emenda, resulta na nulidade da sentença. Tal prática caracteriza erro de procedimento, uma vez que viola não apenas o devido processo legal, mas também compromete a efetividade da tutela jurisdicional, na medida em que desconsidera a primazia do julgamento de mérito e os princípios da economia e celeridade processuais. Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 485, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA DA INICIAL. CONTRARIEDADE AO PROCEDIMENTO DO ART. 321 DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE INSANÁVEL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A EXTINÇÃO DA AÇÃO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença decretou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por indeferimento da petição inicial, na forma do art. 485, I, do CPC, sob o fundamento de que o ajuizamento de que o fracionamento indevido de ações conexas configura abuso do direito de ação. 2. O art. 321, do Código de Processo Civil prevê expressamente que, quando o juiz constatar que a petição inicial não atende as exigências do art. 319 e 320, ou apresentar falhas que possam atrapalhar o julgamento de mérito, não só deverá intimar a parte autora para realizar as correções ou complementações necessárias no prazo de 15 (quinze) dias, como deverá indicar claramente o vício a ser corrigido. E prossegue, em seu parágrafo único, determinando que apenas em caso de não cumprimento da diligência a petição inicial será indeferida. 3. Assim, a oportunidade de emenda da inicial constitui, não só um direito da parte autora, como também é o procedimento legal a ser observado pelo juiz da causa, em atenção aos princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 4. Desse modo, há de se reconhecer que a extinção do feito pelo indeferimento liminar da inicial sem que seja dada à parte autora a oportunidade de emendar a petição inicial, infringe comando legal do art. 321, do CPC, fere os princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento de mérito, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 5. Além disso, devo observar que a configuração de conduta predatória do advogado não ocorre pela simples verificação da quantidade de ações ajuizadas, mas pela presença de outras circunstâncias associadas, como por exemplo, o fracionamento indevidos de pedidos relativos a um mesmo contrato em diferentes ações ou o ajuizamento da mesma ação (parte, pedido e causa de pedir) em diferentes varas ou comarcas, visando escolher o juízo que lhe parece ter o entendimento mais favorável, para depois desistir dos outros processos, burlando o princípio do juiz natural, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Desse modo, é absolutamente irrazoável a conclusão de que o ajuizamento de 3 (três) ações, em que cada uma aborda um contrato diferente do outro, constitua abuso do deito de ação e fragmentação indevida de processos. 7. Nesse contexto, estando descaracterizada a existência de abuso de direito de ação e de fragmentação indevida e estando evidenciada a causa de pedir, a legitimidade da parte e o interesse processual, há de se reconhecer a ausência de justa causa para a extinção do feito, por violação dos princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e do devido processo legal, consagrados pelo art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal, comprometendo a finalidade do processo, que é a satisfação do direito material pela primazia da sentença de mérito, nos termos dos arts. 4º e 6º, do CPC. 8. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Relator: Desembargador EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 28/08/2024, Data da publicação: 28/08/2024). (Destaquei). EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA OPORTUNIZAÇÃO DE EMENDA À INICIAL. OFENSA AO ART. 321 DO CPC E AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O cerne da questão posta à desate cinge-se a analisar a sentença hostilizada que, em face da ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito. 2. Da detida análise do fascículo processual, observa-se que o decisum foi proferido de forma equivocada, porquanto indeferiu de plano a ação, sem oportunizar à parte a possibilidade de emendar à inicial, nos termos do art. 321 do CPC. 3. Por consequência, caracterizada a ausência de oportunização à parte autora de emenda à inicial, em violação aos artigos 321 e 10 do CPC, a anulação da sentença é medida impositiva. 4. Apelação conhecida e provida. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Relator: Desembargador FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, 3ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 03/10/2023, Data da publicação: 04/10/2023). (Destaquei). Para além disso, no que se refere à alegação de abuso do direito de ação, ou o denominado "uso predatório da jurisdição", cumpre observar que, embora tal conduta possa, em tese, configurar prática temerária, não se amolda à hipótese prevista no art. 330, inciso III, do Código de Processo Civil. Isso porque o interesse processual - entendido como o binômio necessidade e adequação - encontra-se plenamente caracterizado no caso concreto. A necessidade decorre da vedação à autotutela no ordenamento jurídico pátrio, de modo que, inexistindo mecanismos extrajudiciais idôneos para a satisfação de sua pretensão, incumbe à parte Autora recorrer ao Poder Judiciário. Por sua vez, a adequação refere-se à utilização dos instrumentos processuais apropriados para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida. Nesse contexto, a cumulação de pedidos contra o mesmo réu, ainda que tenham como origem contratos/fatos diversos, configura mera faculdade, e não obrigatoriedade, deferida à parte, nos termos do art. 327 do CPC, que assim dispõe: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326 . Diante disso, não é válida a fundamentação do Magistrado de primeira instância de que a existência de múltiplas ações movidas indicaria falta de interesse processual, uma vez que a Autora deveria ter apresentado apenas uma demanda. Isso se deve ao fato de que, em situações de conexão entre ações, a consequência processual é a junção dos processos para julgamento conjunto e não a sua extinção por ausência de interesse de agir, conforme preleciona o art. 55, do CPC, in verbis: "Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II - às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre ele." Assim, tem-se que a conexão entre os processos têm como objetivo evitar decisões conflitantes, garantindo que, caso haja a possibilidade de ocorrerem decisões contraditórias e/ou prejudiciais as partes envolvidas, as demandas sejam julgadas simultaneamente pelo mesmo juízo. A multiplicidade de ações, nesse contexto, reflete a diversidade das relações jurídicas analisadas, sendo inadequada a extinção de processos com fundamento na quantidade de demandas ajuizadas. Tal medida se mostra incompatível com os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal, assegurados pela Constituição. Cada ação deve ser examinada individualmente, levando em conta os direitos materiais em debate e a necessidade de proteção contra eventuais práticas contratuais abusivas ou irregulares. No caso concreto, embora os processos tratem de questões semelhantes, os objetos das ações são distintos, versando cada uma sobre diferentes contratos, razão pela qual não há que se falar em conexão, visto que não há igualdade entre as causas de pedir. A propósito, colaciona-se precedente desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDEFERIMENTO. IMPROPRIEDADE. AJUIZAMENTO DE MÚLTIPLAS AÇÕES. CAUSA DE PEDIR DISTINTAS. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta por Maria Deusina Freitas Ferreira Pires em contrariedade a sentença que indeferiu a inicial e julgou extinta a ação declaratória negativa de débito c/c indenização por dano moral ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, ora recorrido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão diz respeito à análise do acerto da sentença de extinção sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O Juízo a quo indeferiu a petição inicial declarando extinta a presente ação sem resolução de mérito, em face do ajuizamento de várias ações contra o mesmo réu sobre fatos semelhantes, em vez de propor uma única ação. 4. Contudo, compulsando os fólios processuais, verifica-se que a petição inicial atende os requisitos estabelecidos pela legislação processual civil, de modo que as condições da ação estão presente no caso em análise, sobretudo porque o fundamento utilizado para o indeferimento da inicial não é albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. 5. Apesar de as ações se referirem ao mesmo réu, verifica-se que as demandas são fundamentadas em causa de pedir diversas, especialmente porque são distintas os valores das dívidas e contratos. 6. Dessa forma, ao prolatar a sentença, o Juízo a quo não agiu com acerto, incorrendo em error in procedendo, devendo, pois, os presentes autos ser devolvidos à instância de origem para regular processamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso provido, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. (TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Relator: Desembargador CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, 2ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 27/02/2025). (Destaquei). EMENTA: Apelação Cível. Direito Processual Civil. Empréstimo Consignado. Ajuizamento de Diversas Ações. Sentença de Indeferimento da Petição Inicial e Extinção Do Processo Sem Resolução Do Mérito. Impossibilidade. Recurso Conhecido e Provido. Sentença Anulada. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pela parte autora objetivando a anulação da sentença que indeferiu a petição inicial (art. 330, III, do CPC), em sede de ação declaratória de inexistência/nulidade de débito movida em desfavor do Banco Bradesco S/A. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar se a mera quantidade de ações ajuizadas pela parte apelante contra a mesma instituição financeira é causa para extinção do feito sem resolução de mérito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. No caso, a parte autora impugna o contrato de empréstimo consignado de nº 393193016, com descontos mensais no valor de R$ 51,10, a ser quitado em 32 parcelas. 4. O julgador proferiu a sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, após verificar que a parte ajuizou diversas ações contra a mesma instituição financeira, impugnando diversos contratos supostamente realizados por ela. 5. Considerando que cada contrato realizado resulta em novo desconto adicionado aos proventos de aposentadoria da parte demandante, sendo esta sua causa de pedir, e que a parte tem a necessidade/utilidade de ir ao Judiciário para obter provimento jurisdicional apto a barrar tais descontos, não há que se falar em ausência de interesse processual no presente caso. 6. Ademais, o acesso à Justiça deve ser priorizado, em detrimento do excesso de formalismo, que resultou, no caso concreto, impedimento do acesso da parte apelante à jurisdição, ferindo a sua garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF, na qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". IV. DISPOSITIVO 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Relatora: Desembargadora JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 26/02/2025). (Destaquei). EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL POR FRACIONAMENTO DE DEMANDAS. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. I- Cinge-se a controvérsia em perquirir o acerto ou desacerto da sentença impugnada, que indeferiu a petição inicial, sob a fundamentação de existência de três ações, esta e outras duas, ajuizadas pela autora buscando anular descontos, supostamente indevidos, o que configuraria ausência de interesse processual, uma vez que a parte deveria ajuizar somente uma demanda. II- No caso concreto, conquanto os processos versem sobre matéria similar, ou seja, cobranças indevidas; referem-se a descontos de timbres, contratos e períodos diversos; assim, relações jurídicas distintas. Patente, pois, a legitimidade e o interesse processual. III- O fundamento utilizado pelo magistrado sentenciante não se aplica ao caso sub judice, ante a diferenciação entre as ações paradigmas por ostentarem como causa de pedir contratos diversos, o que descaracteriza a multiplicidade de ações; afastando-se, pois, a ocorrência do instituto da conexão e, ainda, a possibilidade de ocorrência do mero risco de decisões conflitantes, a que se refere o art. 55, § 3º do CPC. IV- Em que pese se tratar das mesmas partes, o fato de cada processo ostentar Contratos distintos, já é o suficiente para que se permita o processamento em separado, porquanto, antes de ser uma obrigação, a reunião dos pedidos em uma só demanda é uma faculdade (art. 327, CPC). V- Em homenagem aos princípios da cooperação, da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da primazia do julgamento de mérito; devemos autos retornar ao juízo de origem para que a inicial seja recebida, processada e sentenciada, na forma da lei. VI- Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Relatora: Desembargadora MARIA REGINA OLIVEIRA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 06/11/2024, Data da publicação: 06/11/2024). (Destaquei). Com efeito, os elementos probatórios apresentados pela parte Autora, ora Apelante, aliados à ausência de indícios concretos de litigância abusiva, demonstram que não se justifica a invocação genérica da Recomendação nº 159/2024 do CNJ como fundamento para restringir o direito de acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, a sentença ora recorrida se revela em desconformidade com o princípio da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, bem como afronta a garantia constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, segundo a qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Destarte, conclui-se que o Juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em error in procedendo, violando normas fundamentais do devido processo legal. Impõe-se, portanto, a anulação da sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja oportunizado o regular prosseguimento do feito, com observância aos princípios que regem o processo civil e às garantias constitucionais do jurisdicionado. DISPOSITIVO Diante do exposto, pelos argumentos fartamente coligidos e com fulcro nos documentos e dispositivos legais acima invocados, CONHEÇO do presente recurso de Apelação Cível para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, a fim de decretar a nulidade da sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. É como voto. Fortaleza, data e hora da assinatura digital. FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Desembargador Relator

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Geraldo Cavalcante Lustoza x Banco Itau Bmg Consignado S.A.

ID: 334140415

Tribunal: TJCE Órgão: 5º Gabinete da 4ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 3000201-71.2025.8.06.0114

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

GERALDO CAVALCANTE LUSTOZA

Polo Passivo:

BANCO ITAU BMG CONSIGNADO S.A.

Intimação

Advogados:

ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

LIVIO MARTINS ALVES

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS C/C ANULAÇÃO DE DÉBITO, DANOS MATERIAIS E MORAIS. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIZAÇÃO PARA EME… EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS C/C ANULAÇÃO DE DÉBITO, DANOS MATERIAIS E MORAIS. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIZAÇÃO PARA EMENDA. VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL E AO DIREITO DE AÇÃO. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por Geraldo Cavalcante Lustoza contra sentença que extinguiu, sem resolução do mérito, Ação de Exibição de Documentos cumulada com Anulação de Débito, Danos Materiais e Morais, ajuizada em face do Banco Itaú Consignado S/A. A sentença indeferiu a petição inicial com fundamento no art. 330, III, do CPC, em razão da ausência de interesse de agir, com base também na Recomendação nº 159/2024 do CNJ. O Apelante alega ter sido surpreendido pela extinção do feito sem prévia oportunidade de emenda da inicial, sustentando, ainda, a inexistência de conexão entre os contratos questionados em ações distintas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a sentença é nula por indeferimento da inicial sem a prévia concessão de prazo para emenda, em violação ao art. 321 do CPC e ao princípio da não surpresa; (ii) estabelecer se o ajuizamento de múltiplas ações com causa de pedir distinta configura ausência de interesse processual por suposto uso predatório da jurisdição. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. A inobservância do dever judicial de oportunizar a emenda da inicial, conforme determina o art. 321 do CPC, constitui vício de procedimento que enseja a nulidade da sentença, por afronta ao devido processo legal e ao princípio da não surpresa (art. 10 do CPC). 4. A concessão de prazo para a correção de vícios na petição inicial não é faculdade do juiz, mas dever legal, visando assegurar contraditório, ampla defesa e primazia do julgamento do mérito. 5. A Recomendação nº 159/2024 do CNJ não autoriza, por si só, a extinção de ações autônomas que versem sobre contratos diversos, especialmente na ausência de indícios de litigância predatória. 6. O ajuizamento de múltiplas ações com fundamentos distintos não configura, por si, abuso do direito de ação nem ausência de interesse processual, sendo facultativa a cumulação de pedidos, nos termos do art. 327 do CPC. 7. Não configurada a conexão nos moldes do art. 55 do CPC, tampouco risco de decisões conflitantes, revela-se incabível a extinção da ação com base na existência de outras demandas similares contra o mesmo réu. 8. A jurisprudência do TJCE pacificou o entendimento de que o indeferimento da petição inicial, sem prévia intimação para emenda, constitui error in procedendo, impondo a anulação da sentença e retorno dos autos à origem para regular prosseguimento do feito. IV. DISPOSITIVO: 9. Recurso provido. Sentença anulada. Tese de julgamento: 1. O indeferimento da petição inicial sem a concessão de prazo para emenda viola o art. 321 do CPC e configura nulidade por afronta ao devido processo legal e ao princípio da não surpresa; 2. A existência de múltiplas ações autônomas com causa de pedir distinta não caracteriza, por si só, ausência de interesse processual nem abuso do direito de ação; 3. A Recomendação nº 159/2024 do CNJ não pode ser utilizada isoladamente como fundamento para extinção liminar de ações quando não caracterizada conduta litigante predatória. ________ Dispositivos legais relevantes citados: CF/1988, art. 5º, incs. XXXV e LXXIV; CPC, arts. 6º, 10, 55, 321 e 327. Jurisprudências relevantes citadas: TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Rel. Des. Everardo Lucena Segundo, j. 28.08.2024; TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Rel. Des. Francisco Darival Beserra Primo, j. 03.10.2023; TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Rel. Des. Carlos Alberto Mendes Forte, j. 26.02.2025; TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Rel.ª Des.ª Jane Ruth Maia de Queiroga, j. 26.02.2025; TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Rel.ª Des.ª Maria Regina Oliveira, j. 06.11.2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do recurso para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por GERALDO CAVALCANTE LUSTOZA, com o objetivo de reformar a sentença de Id. nº 24787520, proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Lavras da Mangabeira/CE, que extinguiu sem resolução do mérito a Ação de Exibição de Documentos c/c Anulação de Débito, Danos Materiais e Morais, ajuizada pela parte ora Apelante em desfavor de BANCO ITAÚ CONSIGNADO S/A. Eis o dispositivo da sentença: "(...) Ante o exposto, indefiro a petição inicial, por ausência de interesse de agir, nos termos do art. 330, inciso III, do CPC e da Recomendação 159/2024 do CNJ. Sem custas e honorários. Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos." Irresignada com a sentença, a parte Apelante interpôs o presente recurso, requerendo a reforma do decisum, anexando a minuta recursal no Id. nº 24787522 dos presentes autos, alegando, em síntese, que ajuizou ação em razão de descontos indevidos em seu benefício previdenciário, decorrentes de contrato de empréstimo consignado que afirma não ter celebrado. Defende que cada ação proposta trata de contrato distinto, inexistindo identidade de objeto ou causa de pedir com outras demandas eventualmente ajuizadas contra a mesma instituição financeira, afastando, portanto, a alegada conexão. Argumenta que a extinção do feito sem oportunização de emenda à inicial violou os princípios do contraditório, da cooperação e do aproveitamento dos atos processuais, além do direito constitucional de acesso à justiça. Aponta, ainda, contradição entre os fundamentos e o dispositivo da sentença, pois o magistrado teria inicialmente determinado a emenda da inicial e, posteriormente, extinguido o feito sem análise do mérito. Sustenta que a decisão incorre em erro material e em desrespeito à jurisprudência consolidada, que reconhece a possibilidade de ajuizamento de ações autônomas quando versam sobre contratos distintos. Requer, ao final, o provimento do recurso, com a anulação da sentença e o retorno dos autos ao juízo de origem para regular prosseguimento do feito. Solicita, também, a concessão dos benefícios da justiça gratuita. Contrarrazões no Id. nº 24787531. É o breve relatório, passo a decidir. VOTO I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL: Ab initito, quanto ao pedido de gratuidade judiciária, a parte Apelante declara a impossibilidade de arcar com as despesas processuais sem prejuízo do seu próprio sustento. É cediço que o instituto da assistência judiciária gratuita constitui meio de efetivação do direito constitucional de petição e do pleno acesso à justiça, destinando-se àqueles cuja situação econômico-financeira não lhes permita arcar com as despesas processuais sem prejuízo de sua subsistência. Nos termos do artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição da República, é assegurada assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Conforme dispõe o artigo 98, caput, e o artigo 99, ambos do Código de Processo Civil, a concessão da gratuidade judiciária depende de declaração da parte atestando sua incapacidade financeira. Quando formulada por pessoa natural, tal alegação goza de presunção relativa de veracidade, admitindo prova em contrário pela parte adversa ou sendo afastada pelo magistrado se houver nos autos elementos que evidenciem a ausência dos requisitos legais. Nesse sentido, em respeito ao princípio do amplo acesso à justiça e diante da ausência de prova em sentido contrário, concedo o benefício da Justiça Gratuita à parte Apelante, assegurando-lhe o acesso à jurisdição. Por conseguinte, em juízo antecedente de admissibilidade recursal, observo que estão presentes os demais pressupostos intrínsecos ou subjetivos (cabimento, interesse e legitimidade, inexistência de súmula impeditiva) e extrínsecos ou objetivos (tempestividade, dispensa preparo, regularidade formal e a inexistência de fatos extintivos ou impeditivos do direito de recorrer), razão pela qual CONHEÇO DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. II - DO MÉRITO RECURSAL: O ponto central da controvérsia recursal consiste em avaliar se deve ser mantida ou reformada a sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo originário sem resolução de mérito, com fundamento no art. 330, inc. III do Código de Processo Civil e na Recomendação nº 159/2024 do Conselho Nacional de Justiça. Pois bem. In casu, com a devida vênia, impende destacar, desde logo, que o recurso comporta provimento. De início, vislumbra-se que o julgamento do feito foi proferido de forma equivocada, ao indeferir de plano a ação, sem oportunizar à parte Autora, ora Apelante, a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme estabelece o artigo 321 do Código de Processo Civil. É cediço que o referido dispositivo legal prevê, de forma expressa, que, ao constatar que a petição inicial não atende aos requisitos dos artigos 319 e 320 ou apresenta falhas que possam comprometer o julgamento do mérito, o magistrado deve intimar a parte autora para promover as correções ou complementações necessárias, fixando o prazo de 15 (quinze) dias e indicando de maneira clara o vício a ser sanado. O parágrafo único do artigo 321 ainda estabelece que apenas no caso de descumprimento da diligência é que a petição inicial poderá ser indeferida, in verbis: "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Com efeito, ao magistrado somente é lícito indeferir a petição inicial após oportunizar à parte Autora a possibilidade de sanar eventuais vícios que possam macular a sua peça vestibular. A inobservância desse procedimento implica a supressão do direito subjetivo da parte e configura manifesta afronta ao princípio da não surpresa, expressamente consagrado no artigo 10 do Código de Processo Civil: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." Dessa forma, a concessão de prazo para a emenda da inicial não representa mera faculdade do juízo, mas sim um direito processual da parte Autora e um dever legal do magistrado. Tal providência visa assegurar a observância de princípios constitucionais e processuais fundamentais, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a economia processual, a instrumentalidade das formas e a vedação às decisões-surpresa. Nesse contexto, consolidou-se a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça no sentido de que o indeferimento liminar da petição inicial, sem a prévia intimação para emenda, resulta na nulidade da sentença. Tal prática caracteriza erro de procedimento, uma vez que viola não apenas o devido processo legal, mas também compromete a efetividade da tutela jurisdicional, na medida em que desconsidera a primazia do julgamento de mérito e os princípios da economia e celeridade processuais. Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 485, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA DA INICIAL. CONTRARIEDADE AO PROCEDIMENTO DO ART. 321 DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE INSANÁVEL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A EXTINÇÃO DA AÇÃO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença decretou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por indeferimento da petição inicial, na forma do art. 485, I, do CPC, sob o fundamento de que o ajuizamento de que o fracionamento indevido de ações conexas configura abuso do direito de ação. 2. O art. 321, do Código de Processo Civil prevê expressamente que, quando o juiz constatar que a petição inicial não atende as exigências do art. 319 e 320, ou apresentar falhas que possam atrapalhar o julgamento de mérito, não só deverá intimar a parte autora para realizar as correções ou complementações necessárias no prazo de 15 (quinze) dias, como deverá indicar claramente o vício a ser corrigido. E prossegue, em seu parágrafo único, determinando que apenas em caso de não cumprimento da diligência a petição inicial será indeferida. 3. Assim, a oportunidade de emenda da inicial constitui, não só um direito da parte autora, como também é o procedimento legal a ser observado pelo juiz da causa, em atenção aos princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 4. Desse modo, há de se reconhecer que a extinção do feito pelo indeferimento liminar da inicial sem que seja dada à parte autora a oportunidade de emendar a petição inicial, infringe comando legal do art. 321, do CPC, fere os princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento de mérito, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 5. Além disso, devo observar que a configuração de conduta predatória do advogado não ocorre pela simples verificação da quantidade de ações ajuizadas, mas pela presença de outras circunstâncias associadas, como por exemplo, o fracionamento indevidos de pedidos relativos a um mesmo contrato em diferentes ações ou o ajuizamento da mesma ação (parte, pedido e causa de pedir) em diferentes varas ou comarcas, visando escolher o juízo que lhe parece ter o entendimento mais favorável, para depois desistir dos outros processos, burlando o princípio do juiz natural, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Desse modo, é absolutamente irrazoável a conclusão de que o ajuizamento de 3 (três) ações, em que cada uma aborda um contrato diferente do outro, constitua abuso do deito de ação e fragmentação indevida de processos. 7. Nesse contexto, estando descaracterizada a existência de abuso de direito de ação e de fragmentação indevida e estando evidenciada a causa de pedir, a legitimidade da parte e o interesse processual, há de se reconhecer a ausência de justa causa para a extinção do feito, por violação dos princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e do devido processo legal, consagrados pelo art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal, comprometendo a finalidade do processo, que é a satisfação do direito material pela primazia da sentença de mérito, nos termos dos arts. 4º e 6º, do CPC. 8. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Relator: Desembargador EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 28/08/2024, Data da publicação: 28/08/2024). (Destaquei). EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA OPORTUNIZAÇÃO DE EMENDA À INICIAL. OFENSA AO ART. 321 DO CPC E AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O cerne da questão posta à desate cinge-se a analisar a sentença hostilizada que, em face da ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito. 2. Da detida análise do fascículo processual, observa-se que o decisum foi proferido de forma equivocada, porquanto indeferiu de plano a ação, sem oportunizar à parte a possibilidade de emendar à inicial, nos termos do art. 321 do CPC. 3. Por consequência, caracterizada a ausência de oportunização à parte autora de emenda à inicial, em violação aos artigos 321 e 10 do CPC, a anulação da sentença é medida impositiva. 4. Apelação conhecida e provida. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Relator: Desembargador FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, 3ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 03/10/2023, Data da publicação: 04/10/2023). (Destaquei). Para além disso, no que se refere à alegação de abuso do direito de ação, ou o denominado "uso predatório da jurisdição", cumpre observar que, embora tal conduta possa, em tese, configurar prática temerária, não se amolda à hipótese prevista no art. 330, inciso III, do Código de Processo Civil. Isso porque o interesse processual - entendido como o binômio necessidade e adequação - encontra-se plenamente caracterizado no caso concreto. A necessidade decorre da vedação à autotutela no ordenamento jurídico pátrio, de modo que, inexistindo mecanismos extrajudiciais idôneos para a satisfação de sua pretensão, incumbe à parte Autora recorrer ao Poder Judiciário. Por sua vez, a adequação refere-se à utilização dos instrumentos processuais apropriados para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida. Nesse contexto, a cumulação de pedidos contra o mesmo réu, ainda que tenham como origem contratos/fatos diversos, configura mera faculdade, e não obrigatoriedade, deferida à parte, nos termos do art. 327 do CPC, que assim dispõe: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326 . Diante disso, não é válida a fundamentação do Magistrado de primeira instância de que a existência de múltiplas ações movidas para anular negócios jurídicos indicaria falta de interesse processual, uma vez que a Autora deveria ter apresentado apenas uma demanda. Isso se deve ao fato de que, em situações de conexão entre ações, a consequência processual é a junção dos processos para julgamento conjunto e não a sua extinção por ausência de interesse de agir, conforme preleciona o art. 55, do CPC, in verbis: "Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II - às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre ele." Assim, tem-se que a conexão entre os processos têm como objetivo evitar decisões conflitantes, garantindo que, caso haja a possibilidade de ocorrerem decisões contraditórias e/ou prejudiciais as partes envolvidas, as demandas sejam julgadas simultaneamente pelo mesmo juízo. A multiplicidade de ações, nesse contexto, reflete a diversidade das relações jurídicas analisadas, sendo inadequada a extinção de processos com fundamento na quantidade de demandas ajuizadas. Tal medida se mostra incompatível com os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal, assegurados pela Constituição. Cada ação deve ser examinada individualmente, levando em conta os direitos materiais em debate e a necessidade de proteção contra eventuais práticas contratuais abusivas ou irregulares. No caso concreto, embora os processos tratem de questões semelhantes, os objetos das ações são distintos, versando cada uma sobre diferentes contratos, razão pela qual não há que se falar em conexão, visto que não há igualdade entre as causas de pedir. A propósito, colaciona-se precedente desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDEFERIMENTO. IMPROPRIEDADE. AJUIZAMENTO DE MÚLTIPLAS AÇÕES. CAUSA DE PEDIR DISTINTAS. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta por Maria Deusina Freitas Ferreira Pires em contrariedade a sentença que indeferiu a inicial e julgou extinta a ação declaratória negativa de débito c/c indenização por dano moral ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, ora recorrido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão diz respeito à análise do acerto da sentença de extinção sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O Juízo a quo indeferiu a petição inicial declarando extinta a presente ação sem resolução de mérito, em face do ajuizamento de várias ações contra o mesmo réu sobre fatos semelhantes, em vez de propor uma única ação. 4. Contudo, compulsando os fólios processuais, verifica-se que a petição inicial atende os requisitos estabelecidos pela legislação processual civil, de modo que as condições da ação estão presente no caso em análise, sobretudo porque o fundamento utilizado para o indeferimento da inicial não é albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. 5. Apesar de as ações se referirem ao mesmo réu, verifica-se que as demandas são fundamentadas em causa de pedir diversas, especialmente porque são distintas os valores das dívidas e contratos. 6. Dessa forma, ao prolatar a sentença, o Juízo a quo não agiu com acerto, incorrendo em error in procedendo, devendo, pois, os presentes autos ser devolvidos à instância de origem para regular processamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso provido, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. (TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Relator: Desembargador CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, 2ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 27/02/2025). (Destaquei). EMENTA: Apelação Cível. Direito Processual Civil. Empréstimo Consignado. Ajuizamento de Diversas Ações. Sentença de Indeferimento da Petição Inicial e Extinção Do Processo Sem Resolução Do Mérito. Impossibilidade. Recurso Conhecido e Provido. Sentença Anulada. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pela parte autora objetivando a anulação da sentença que indeferiu a petição inicial (art. 330, III, do CPC), em sede de ação declaratória de inexistência/nulidade de débito movida em desfavor do Banco Bradesco S/A. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar se a mera quantidade de ações ajuizadas pela parte apelante contra a mesma instituição financeira é causa para extinção do feito sem resolução de mérito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. No caso, a parte autora impugna o contrato de empréstimo consignado de nº 393193016, com descontos mensais no valor de R$ 51,10, a ser quitado em 32 parcelas. 4. O julgador proferiu a sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, após verificar que a parte ajuizou diversas ações contra a mesma instituição financeira, impugnando diversos contratos supostamente realizados por ela. 5. Considerando que cada contrato realizado resulta em novo desconto adicionado aos proventos de aposentadoria da parte demandante, sendo esta sua causa de pedir, e que a parte tem a necessidade/utilidade de ir ao Judiciário para obter provimento jurisdicional apto a barrar tais descontos, não há que se falar em ausência de interesse processual no presente caso. 6. Ademais, o acesso à Justiça deve ser priorizado, em detrimento do excesso de formalismo, que resultou, no caso concreto, impedimento do acesso da parte apelante à jurisdição, ferindo a sua garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF, na qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". IV. DISPOSITIVO 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Relatora: Desembargadora JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 26/02/2025). (Destaquei). EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL POR FRACIONAMENTO DE DEMANDAS. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. I- Cinge-se a controvérsia em perquirir o acerto ou desacerto da sentença impugnada, que indeferiu a petição inicial, sob a fundamentação de existência de três ações, esta e outras duas, ajuizadas pela autora buscando anular descontos, supostamente indevidos, o que configuraria ausência de interesse processual, uma vez que a parte deveria ajuizar somente uma demanda. II- No caso concreto, conquanto os processos versem sobre matéria similar, ou seja, cobranças indevidas; referem-se a descontos de timbres, contratos e períodos diversos; assim, relações jurídicas distintas. Patente, pois, a legitimidade e o interesse processual. III- O fundamento utilizado pelo magistrado sentenciante não se aplica ao caso sub judice, ante a diferenciação entre as ações paradigmas por ostentarem como causa de pedir contratos diversos, o que descaracteriza a multiplicidade de ações; afastando-se, pois, a ocorrência do instituto da conexão e, ainda, a possibilidade de ocorrência do mero risco de decisões conflitantes, a que se refere o art. 55, § 3º do CPC. IV- Em que pese se tratar das mesmas partes, o fato de cada processo ostentar Contratos distintos, já é o suficiente para que se permita o processamento em separado, porquanto, antes de ser uma obrigação, a reunião dos pedidos em uma só demanda é uma faculdade (art. 327, CPC). V- Em homenagem aos princípios da cooperação, da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da primazia do julgamento de mérito; devemos autos retornar ao juízo de origem para que a inicial seja recebida, processada e sentenciada, na forma da lei. VI- Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Relatora: Desembargadora MARIA REGINA OLIVEIRA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 06/11/2024, Data da publicação: 06/11/2024). (Destaquei). Com efeito, os elementos probatórios apresentados pela parte Autora, ora Apelante, aliados à ausência de indícios concretos de litigância abusiva, demonstram que não se justifica a invocação genérica da Recomendação nº 159/2024 do CNJ como fundamento para restringir o direito de acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, a sentença ora recorrida se revela em desconformidade com o princípio da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, bem como afronta a garantia constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, segundo a qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Ademais, não se vislumbra, no caso em exame, fundamento jurídico que justifique a reunião dos feitos para instrução e julgamento conjuntos, uma vez que as demandas apresentam distinções relevantes quanto às circunstâncias fáticas que embasam o direito invocado pela parte ora Apelante. Dessa forma, inexiste risco concreto de prolação de decisões conflitantes, a afastar a necessidade de eventual reunião dos processos. Destarte, conclui-se que o Juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em error in procedendo, violando normas fundamentais do devido processo legal. Impõe-se, portanto, a anulação da sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja oportunizado o regular prosseguimento do feito, com observância aos princípios que regem o processo civil e às garantias constitucionais do jurisdicionado. DISPOSITIVO Diante do exposto, pelos argumentos fartamente coligidos e com fulcro nos documentos e dispositivos legais acima invocados, CONHEÇO do presente recurso de Apelação Cível para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, a fim de decretar a nulidade da sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. É como voto. Fortaleza, data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator

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Francisca Rodrigues De Oliveira x Banco Bradesco Sa

ID: 334309211

Tribunal: TJCE Órgão: 5º Gabinete da 4ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 3000389-33.2025.8.06.0092

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

FRANCISCA RODRIGUES DE OLIVEIRA

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO SA

Intimação

Advogados:

ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO

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ANNA RONNERIA LACERDA SOUZA

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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO PROCESSO: 3000389-33.2025.8.06.0092 - APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: FRANCISCA RODRIGUES DE … ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO PROCESSO: 3000389-33.2025.8.06.0092 - APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: FRANCISCA RODRIGUES DE OLIVEIRA APELADO: BANCO BRADESCO S/A EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. INDEFERIMENTO LIMINAR DA INICIAL. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS EM CONTRATOS DISTINTOS. INTERESSE DE AGIR. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por FRANCISCA RODRIGUES DE OLIVEIRA contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Independência/CE, que extinguiu, sem resolução do mérito, a Ação Anulatória de Débito c/c Danos Materiais e Morais proposta em face do BANCO BRADESCO S/A, sob fundamento de ausência de interesse processual, nos termos dos arts. 330, III e 485, VI do CPC. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a ausência de intimação para emenda da petição inicial acarreta nulidade da sentença de indeferimento liminar; (ii) estabelecer se há interesse de agir quando a autora propõe múltiplas ações autônomas fundadas em contratos distintos com a mesma instituição financeira. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. A ausência de intimação para emenda da inicial configura nulidade absoluta da sentença, por violação ao art. 321, parágrafo único, e ao art. 10 do CPC, que garantem à parte autora o direito de sanar vícios apontados antes do indeferimento da inicial. 4. O indeferimento liminar da ação, sem prévia oportunidade de correção, contraria os princípios do contraditório, da não surpresa, do devido processo legal, da instrumentalidade das formas e da primazia do julgamento de mérito. 5. A cumulação de pedidos fundados em relações contratuais diversas é faculdade da parte autora, conforme art. 327 do CPC, não sendo obrigatória a reunião de pretensões em uma única ação, especialmente quando não há conexão entre as causas de pedir. 6. A existência de múltiplas ações autônomas fundadas em contratos distintos não configura, por si só, abuso do direito de ação ou fracionamento indevido, e não justifica a extinção da ação por ausência de interesse de agir. 7. A jurisprudência do TJCE reconhece a legitimidade e autonomia de ações fundadas em diferentes contratos, afastando a presunção de litigância predatória quando não demonstrado dolo, má-fé ou tentativa de burla à distribuição processual. 8. A extinção do processo com base em fundamentação genérica sobre suposta abusividade viola o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), comprometendo a proteção do direito material em juízo. IV. DISPOSITIVO: 9. Recurso provido. ________ Dispositivos legais relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, XXXV, LIV e LXXIV; CPC, arts. 6º, 10, 55, § 3º, 321, 327, 485, VI, e 330, III. Jurisprudências relevantes citadas: TJCE, ApCiv nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Rel. Des. Everardo Lucena Segundo, j. 28.08.2024; TJCE, ApCiv nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Rel. Des. Francisco Darival Beserra Primo, j. 03.10.2023; TJCE, ApCiv nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Rel. Des. Carlos Alberto Mendes Forte, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Rel. Des. Jane Ruth Maia de Queiroga, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Rel. Des. Maria Regina Oliveira, j. 06.11.2024. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do recurso para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por FRANCISCA RODRIGUES DE OLIVEIRA, com o objetivo de reformar a sentença de Id. nº 24491479, proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Independência/CE, que extinguiu sem resolução do mérito a Ação Anulatória de Débito c/c Danos Materiais e Morais, ajuizada pela parte ora Apelante em desfavor de BANCO BRADESCO S/A. Eis o dispositivo da sentença: "(...) Diante dos argumentos acima expostos, com base nos artigos 330, inciso III e 485, inciso VI do CPC, INDEFIRO A PETIÇÃO INICIAL. Elejo o processo nº 300389-33.2025.8.06.0092 como a ação principal, para fins de interposição de recursos referentes às demandas correlatas. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. Desde já, fica a parte alertada que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente de caráter infringente ou protelatória poderá acarretar-lhes a imposição de penalidade prevista na legislação processual civil (art. 1.026, § 2º, do CPC). Sobrevindo recurso de apelação contra esta sentença, intime-se a parte adversa para que, em 15 (quinze) dias, apresente contrarrazões e posterior remessa ao E. TJCE. Após o trânsito em julgado, arquivem-se." Irresignada com a sentença, a parte Apelante interpôs o presente recurso, requerendo a reforma do decisum, anexando a minuta recursal no Id. nº 24491486, alegando, em síntese, que a demanda trata de contrato distinto dos que são objeto de outras ações movidas pela mesma autora, não havendo identidade de causa de pedir ou pedido, o que afasta a configuração de litispendência ou conexão processual. Argumenta, ainda, que a cumulação de pedidos em ação única constitui faculdade da parte, nos termos do art. 327 do CPC, e que a reunião processual só seria cabível diante de efetivo risco de decisões conflitantes, conforme o art. 55, § 3º do CPC - o que não ocorre na espécie. Ressalta jurisprudência do TJCE e de outros tribunais, reconhecendo a autonomia de ações fundadas em contratos distintos, e aponta violação ao art. 489, § 1º, VI do CPC, ante a ausência de fundamentação quanto aos precedentes vinculantes invocados. Ao final, requer a reforma da sentença para o regular prosseguimento da ação, com reconhecimento do interesse de agir, além da concessão dos benefícios da justiça gratuita. Contrarrazões no Id. nº 24491741. É o breve relatório, passo a decidir. VOTO I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL: Ab initito, quanto ao pedido de gratuidade judiciária, a parte Apelante declara a impossibilidade de arcar com as despesas processuais sem prejuízo do seu próprio sustento. É cediço que o instituto da assistência judiciária gratuita constitui meio de efetivação do direito constitucional de petição e do pleno acesso à justiça, destinando-se àqueles cuja situação econômico-financeira não lhes permita arcar com as despesas processuais sem prejuízo de sua subsistência. Nos termos do artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição da República, é assegurada assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Conforme dispõe o artigo 98, caput, e o artigo 99, ambos do Código de Processo Civil, a concessão da gratuidade judiciária depende de declaração da parte atestando sua incapacidade financeira. Quando formulada por pessoa natural, tal alegação goza de presunção relativa de veracidade, admitindo prova em contrário pela parte adversa ou sendo afastada pelo magistrado se houver nos autos elementos que evidenciem a ausência dos requisitos legais. Nesse sentido, em respeito ao princípio do amplo acesso à justiça e diante da ausência de prova em sentido contrário, concedo o benefício da Justiça Gratuita à parte Apelante, assegurando-lhe o acesso à jurisdição. Por conseguinte, em juízo antecedente de admissibilidade recursal, observo que estão presentes os demais pressupostos intrínsecos ou subjetivos (cabimento, interesse e legitimidade, inexistência de súmula impeditiva) e extrínsecos ou objetivos (tempestividade, dispensa preparo, regularidade formal e a inexistência de fatos extintivos ou impeditivos do direito de recorrer), razão pela qual CONHEÇO DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. II - DO MÉRITO RECURSAL: O ponto central da controvérsia recursal consiste em avaliar se deve ser mantida ou reformada a sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo originário sem resolução de mérito, com fundamento no art. 330, inc. III c/c art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil. Pois bem. In casu, com a devida vênia, impende destacar, desde logo, que o recurso comporta provimento. De início, vislumbra-se que o julgamento do feito foi proferido de forma equivocada, ao indeferir de plano a ação, sem oportunizar à parte Autora, ora Apelante, a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme estabelece o artigo 321 do Código de Processo Civil. É cediço que o referido dispositivo legal prevê, de forma expressa, que, ao constatar que a petição inicial não atende aos requisitos dos artigos 319 e 320 ou apresenta falhas que possam comprometer o julgamento do mérito, o magistrado deve intimar a parte autora para promover as correções ou complementações necessárias, fixando o prazo de 15 (quinze) dias e indicando de maneira clara o vício a ser sanado. O parágrafo único do artigo 321 ainda estabelece que apenas no caso de descumprimento da diligência é que a petição inicial poderá ser indeferida, in verbis: "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Com efeito, ao magistrado somente é lícito indeferir a petição inicial após oportunizar à parte Autora a possibilidade de sanar eventuais vícios que possam macular a sua peça vestibular. A inobservância desse procedimento implica a supressão do direito subjetivo da parte e configura manifesta afronta ao princípio da não surpresa, expressamente consagrado no artigo 10 do Código de Processo Civil: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." Dessa forma, a concessão de prazo para a emenda da inicial não representa mera faculdade do juízo, mas sim um direito processual da parte Autora e um dever legal do magistrado. Tal providência visa assegurar a observância de princípios constitucionais e processuais fundamentais, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a economia processual, a instrumentalidade das formas e a vedação às decisões-surpresa. Nesse contexto, consolidou-se a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça no sentido de que o indeferimento liminar da petição inicial, sem a prévia intimação para emenda, resulta na nulidade da sentença. Tal prática caracteriza erro de procedimento, uma vez que viola não apenas o devido processo legal, mas também compromete a efetividade da tutela jurisdicional, na medida em que desconsidera a primazia do julgamento de mérito e os princípios da economia e celeridade processuais. Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 485, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA DA INICIAL. CONTRARIEDADE AO PROCEDIMENTO DO ART. 321 DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE INSANÁVEL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A EXTINÇÃO DA AÇÃO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença decretou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por indeferimento da petição inicial, na forma do art. 485, I, do CPC, sob o fundamento de que o ajuizamento de que o fracionamento indevido de ações conexas configura abuso do direito de ação. 2. O art. 321, do Código de Processo Civil prevê expressamente que, quando o juiz constatar que a petição inicial não atende as exigências do art. 319 e 320, ou apresentar falhas que possam atrapalhar o julgamento de mérito, não só deverá intimar a parte autora para realizar as correções ou complementações necessárias no prazo de 15 (quinze) dias, como deverá indicar claramente o vício a ser corrigido. E prossegue, em seu parágrafo único, determinando que apenas em caso de não cumprimento da diligência a petição inicial será indeferida. 3. Assim, a oportunidade de emenda da inicial constitui, não só um direito da parte autora, como também é o procedimento legal a ser observado pelo juiz da causa, em atenção aos princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 4. Desse modo, há de se reconhecer que a extinção do feito pelo indeferimento liminar da inicial sem que seja dada à parte autora a oportunidade de emendar a petição inicial, infringe comando legal do art. 321, do CPC, fere os princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento de mérito, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 5. Além disso, devo observar que a configuração de conduta predatória do advogado não ocorre pela simples verificação da quantidade de ações ajuizadas, mas pela presença de outras circunstâncias associadas, como por exemplo, o fracionamento indevidos de pedidos relativos a um mesmo contrato em diferentes ações ou o ajuizamento da mesma ação (parte, pedido e causa de pedir) em diferentes varas ou comarcas, visando escolher o juízo que lhe parece ter o entendimento mais favorável, para depois desistir dos outros processos, burlando o princípio do juiz natural, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Desse modo, é absolutamente irrazoável a conclusão de que o ajuizamento de 3 (três) ações, em que cada uma aborda um contrato diferente do outro, constitua abuso do deito de ação e fragmentação indevida de processos. 7. Nesse contexto, estando descaracterizada a existência de abuso de direito de ação e de fragmentação indevida e estando evidenciada a causa de pedir, a legitimidade da parte e o interesse processual, há de se reconhecer a ausência de justa causa para a extinção do feito, por violação dos princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e do devido processo legal, consagrados pelo art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal, comprometendo a finalidade do processo, que é a satisfação do direito material pela primazia da sentença de mérito, nos termos dos arts. 4º e 6º, do CPC. 8. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Relator: Desembargador EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 28/08/2024, Data da publicação: 28/08/2024). (Destaquei). EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA OPORTUNIZAÇÃO DE EMENDA À INICIAL. OFENSA AO ART. 321 DO CPC E AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O cerne da questão posta à desate cinge-se a analisar a sentença hostilizada que, em face da ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito. 2. Da detida análise do fascículo processual, observa-se que o decisum foi proferido de forma equivocada, porquanto indeferiu de plano a ação, sem oportunizar à parte a possibilidade de emendar à inicial, nos termos do art. 321 do CPC. 3. Por consequência, caracterizada a ausência de oportunização à parte autora de emenda à inicial, em violação aos artigos 321 e 10 do CPC, a anulação da sentença é medida impositiva. 4. Apelação conhecida e provida. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Relator: Desembargador FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, 3ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 03/10/2023, Data da publicação: 04/10/2023). (Destaquei). Para além disso, no que se refere à alegação de abuso do direito de ação, ou o denominado "uso predatório da jurisdição", cumpre observar que, embora tal conduta possa, em tese, configurar prática temerária, não se amolda à hipótese prevista no art. 330, inciso III, do Código de Processo Civil. Isso porque o interesse processual - entendido como o binômio necessidade e adequação - encontra-se plenamente caracterizado no caso concreto. A necessidade decorre da vedação à autotutela no ordenamento jurídico pátrio, de modo que, inexistindo mecanismos extrajudiciais idôneos para a satisfação de sua pretensão, incumbe à parte Autora recorrer ao Poder Judiciário. Por sua vez, a adequação refere-se à utilização dos instrumentos processuais apropriados para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida. Nesse contexto, a cumulação de pedidos contra o mesmo réu, ainda que tenham como origem contratos/fatos diversos, configura mera faculdade, e não obrigatoriedade, deferida à parte, nos termos do art. 327 do CPC, que assim dispõe: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326 . Diante disso, não é válida a fundamentação do Magistrado de primeira instância de que a existência de múltiplas ações movidas para anular negócios jurídicos indicaria falta de interesse processual, uma vez que a Autora deveria ter apresentado apenas uma demanda. Isso se deve ao fato de que, em situações de conexão entre ações, a consequência processual é a junção dos processos para julgamento conjunto e não a sua extinção por ausência de interesse de agir, conforme preleciona o art. 55, do CPC, in verbis: "Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II - às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre ele." Assim, tem-se que a conexão entre os processos têm como objetivo evitar decisões conflitantes, garantindo que, caso haja a possibilidade de ocorrerem decisões contraditórias e/ou prejudiciais as partes envolvidas, as demandas sejam julgadas simultaneamente pelo mesmo juízo. A multiplicidade de ações, nesse contexto, reflete a diversidade das relações jurídicas analisadas, sendo inadequada a extinção de processos com fundamento na quantidade de demandas ajuizadas. Tal medida se mostra incompatível com os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal, assegurados pela Constituição. Cada ação deve ser examinada individualmente, levando em conta os direitos materiais em debate e a necessidade de proteção contra eventuais práticas contratuais abusivas ou irregulares. No caso concreto, embora os processos tratem de questões semelhantes, os objetos das ações são distintos, versando cada uma sobre diferentes contratos, razão pela qual não há que se falar em conexão, visto que não há igualdade entre as causas de pedir. A propósito, colaciona-se precedente desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDEFERIMENTO. IMPROPRIEDADE. AJUIZAMENTO DE MÚLTIPLAS AÇÕES. CAUSA DE PEDIR DISTINTAS. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta por Maria Deusina Freitas Ferreira Pires em contrariedade a sentença que indeferiu a inicial e julgou extinta a ação declaratória negativa de débito c/c indenização por dano moral ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, ora recorrido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão diz respeito à análise do acerto da sentença de extinção sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O Juízo a quo indeferiu a petição inicial declarando extinta a presente ação sem resolução de mérito, em face do ajuizamento de várias ações contra o mesmo réu sobre fatos semelhantes, em vez de propor uma única ação. 4. Contudo, compulsando os fólios processuais, verifica-se que a petição inicial atende os requisitos estabelecidos pela legislação processual civil, de modo que as condições da ação estão presente no caso em análise, sobretudo porque o fundamento utilizado para o indeferimento da inicial não é albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. 5. Apesar de as ações se referirem ao mesmo réu, verifica-se que as demandas são fundamentadas em causa de pedir diversas, especialmente porque são distintas os valores das dívidas e contratos. 6. Dessa forma, ao prolatar a sentença, o Juízo a quo não agiu com acerto, incorrendo em error in procedendo, devendo, pois, os presentes autos ser devolvidos à instância de origem para regular processamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso provido, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. (TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Relator: Desembargador CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, 2ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 27/02/2025). (Destaquei). EMENTA: Apelação Cível. Direito Processual Civil. Empréstimo Consignado. Ajuizamento de Diversas Ações. Sentença de Indeferimento da Petição Inicial e Extinção Do Processo Sem Resolução Do Mérito. Impossibilidade. Recurso Conhecido e Provido. Sentença Anulada. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pela parte autora objetivando a anulação da sentença que indeferiu a petição inicial (art. 330, III, do CPC), em sede de ação declaratória de inexistência/nulidade de débito movida em desfavor do Banco Bradesco S/A. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar se a mera quantidade de ações ajuizadas pela parte apelante contra a mesma instituição financeira é causa para extinção do feito sem resolução de mérito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. No caso, a parte autora impugna o contrato de empréstimo consignado de nº 393193016, com descontos mensais no valor de R$ 51,10, a ser quitado em 32 parcelas. 4. O julgador proferiu a sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, após verificar que a parte ajuizou diversas ações contra a mesma instituição financeira, impugnando diversos contratos supostamente realizados por ela. 5. Considerando que cada contrato realizado resulta em novo desconto adicionado aos proventos de aposentadoria da parte demandante, sendo esta sua causa de pedir, e que a parte tem a necessidade/utilidade de ir ao Judiciário para obter provimento jurisdicional apto a barrar tais descontos, não há que se falar em ausência de interesse processual no presente caso. 6. Ademais, o acesso à Justiça deve ser priorizado, em detrimento do excesso de formalismo, que resultou, no caso concreto, impedimento do acesso da parte apelante à jurisdição, ferindo a sua garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF, na qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". IV. DISPOSITIVO 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Relatora: Desembargadora JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 26/02/2025). (Destaquei). EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL POR FRACIONAMENTO DE DEMANDAS. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. I- Cinge-se a controvérsia em perquirir o acerto ou desacerto da sentença impugnada, que indeferiu a petição inicial, sob a fundamentação de existência de três ações, esta e outras duas, ajuizadas pela autora buscando anular descontos, supostamente indevidos, o que configuraria ausência de interesse processual, uma vez que a parte deveria ajuizar somente uma demanda. II- No caso concreto, conquanto os processos versem sobre matéria similar, ou seja, cobranças indevidas; referem-se a descontos de timbres, contratos e períodos diversos; assim, relações jurídicas distintas. Patente, pois, a legitimidade e o interesse processual. III- O fundamento utilizado pelo magistrado sentenciante não se aplica ao caso sub judice, ante a diferenciação entre as ações paradigmas por ostentarem como causa de pedir contratos diversos, o que descaracteriza a multiplicidade de ações; afastando-se, pois, a ocorrência do instituto da conexão e, ainda, a possibilidade de ocorrência do mero risco de decisões conflitantes, a que se refere o art. 55, § 3º do CPC. IV- Em que pese se tratar das mesmas partes, o fato de cada processo ostentar Contratos distintos, já é o suficiente para que se permita o processamento em separado, porquanto, antes de ser uma obrigação, a reunião dos pedidos em uma só demanda é uma faculdade (art. 327, CPC). V- Em homenagem aos princípios da cooperação, da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da primazia do julgamento de mérito; devemos autos retornar ao juízo de origem para que a inicial seja recebida, processada e sentenciada, na forma da lei. VI- Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Relatora: Desembargadora MARIA REGINA OLIVEIRA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 06/11/2024, Data da publicação: 06/11/2024). (Destaquei). Com efeito, os elementos probatórios apresentados pela parte Autora, ora Apelante, aliados à ausência de indícios concretos de litigância abusiva, demonstram que não se justifica a indicação genérica de suposto fracionamento de demandas como fundamento apto a restringir o direito de acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, a sentença ora recorrida se revela em desconformidade com o princípio da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, bem como afronta a garantia constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, segundo a qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Destarte, conclui-se que o Juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em error in procedendo, violando normas fundamentais do devido processo legal. Impõe-se, portanto, a anulação da sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja oportunizado o regular prosseguimento do feito, com observância aos princípios que regem o processo civil e às garantias constitucionais do jurisdicionado. DISPOSITIVO Diante do exposto, pelos argumentos fartamente coligidos e com fulcro nos documentos e dispositivos legais acima invocados, CONHEÇO do presente recurso de Apelação Cível para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, a fim de decretar a nulidade da sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. É como voto. Fortaleza, data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator

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Jose Roberto Coelho Aquino x Banco Bradesco S/A

ID: 334304572

Tribunal: TJCE Órgão: 5º Gabinete da 4ª Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 3000597-82.2024.8.06.0114

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

JOSE ROBERTO COELHO AQUINO

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO S/A

Intimação

Advogados:

PAULO EDUARDO PRADO

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RENATO ALVES DE MELO

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MARIA EUGENIA FILGUEIRAS MILFONT DE ALMEIDA

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JULIANA RIBEIRO PROCOPIO

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JHYULLY CAVALCANTE BESERRA LEITE

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ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉR… ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INDEFERIMENTO DE PLANO DA INICIAL. AUSÊNCIA DE OPORTUNIDADE PARA EMENDA. AFRONTA AOS ARTS. 321 E 10, DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME: 1. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por JOSÉ ROBERTO COELHO DE AQUINO contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Lavras da Mangabeira/CE, que extinguiu, sem resolução do mérito, Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais e Materiais ajuizada contra o BANCO BRADESCO S/A. O juízo a quo fundamentou o indeferimento da petição inicial na ausência de interesse processual, com base no art. 330, III, do CPC e na Recomendação nº 159/2024 do CNJ, sob o argumento de multiplicidade de ações conexas. O Apelante defende a autonomia da demanda, a presença do interesse de agir e a violação ao dever de intimação para emenda da inicial, requerendo a anulação da sentença. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a ausência de intimação para emenda da petição inicial configura nulidade da sentença por violação ao art. 321 do CPC e ao princípio da não surpresa; (ii) estabelecer se a multiplicidade de ações similares, mas com objetos distintos, justifica a extinção do feito por ausência de interesse processual. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O art. 321 do CPC impõe ao magistrado o dever de oportunizar à parte autora a emenda da inicial, quando constatado vício ou irregularidade, sob pena de nulidade da sentença, o que não foi observado no caso concreto. 4. A extinção do processo sem prévia intimação da parte para correção da inicial afronta o art. 10 do CPC, que consagra o princípio da não surpresa, configurando error in procedendo. 5. A jurisprudência do TJCE reconhece que o indeferimento da inicial sem observância do art. 321 do CPC acarreta nulidade absoluta da sentença e impõe o retorno dos autos para regular prosseguimento do feito. 6. A multiplicidade de ações ajuizadas contra o mesmo réu, com objetos e causas de pedir distintas, não caracteriza abuso do direito de ação, tampouco ausência de interesse de agir, conforme já assentado pelo próprio TJCE. 7. O art. 327 do CPC confere à parte autora a faculdade, e não a obrigação, de cumular pedidos distintos contra o mesmo réu, sendo inadequada a extinção do processo por fracionamento de demandas. 8. A conexão entre ações, conforme o art. 55 do CPC, enseja a reunião dos processos para julgamento conjunto, não autorizando, por si só, a extinção por ausência de interesse processual. 9. A Recomendação nº 159/2024 do CNJ não pode ser aplicada de forma genérica e abstrata para justificar a supressão do direito de acesso à justiça, especialmente na ausência de indícios concretos de litigância predatória. IV. DISPOSITIVO: 10. Recurso provido. ________ Dispositivos legais relevantes citados: CF/1988, art. 5º, incs. XXXV, LIV e LXXIV; CPC, arts. 6º, 10, 55, 321, 327, 330, III e 485, VI. Jurisprudências relevantes citadas: TJCE, ApCiv nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Rel. Des. Everardo Lucena Segundo, j. 28.08.2024; TJCE, ApCiv nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Rel. Des. Francisco Darival Beserra Primo, j. 03.10.2023; TJCE, ApCiv nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Rel. Des. Maria Regina Oliveira, j. 06.11.2024; TJCE, ApCiv nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Rel. Des. Jane Ruth Maia de Queiroga, j. 26.02.2025; TJCE, ApCiv nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Rel. Des. Carlos Alberto Mendes Forte, j. 26.02.2025. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em CONHECER do recurso para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Cível interposta por JOSÉ ROBERTO COELHO DE AQUINO, com o objetivo de reformar a sentença de Id. nº 24376903, proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Lavras da Mangabeira/CE, que extinguiu sem resolução do mérito a Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais e Materiais, ajuizada pela parte ora Apelante em desfavor de BANCO BRADESCO S/A. Eis o dispositivo da sentença: "(...) Ante o exposto, indefiro a petição inicial, por ausência de interesse de agir, nos termos do art. 330, inciso III, do CPC e da Recomendação nº 159/2024 do CNJ. Sem custas e honorários. Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos." Na minuta recursal anexada ao Id. nº 24376908, a parte Apelante alega, em síntese, que a ação visa à declaração de inexistência de débitos decorrentes de descontos indevidos realizados em sua conta bancária, a título de tarifa bancária e pacote de serviços, pelo Banco Bradesco S.A., e que tal demanda é autônoma em relação às demais ações ajuizadas, por tratarem de contratos distintos, com partes diversas e objetos específicos, não havendo identidade que justifique conexão ou litisconsórcio obrigatório. Alega que foram devidamente comprovadas a relação jurídica impugnada e a necessidade da tutela jurisdicional, estando presentes os requisitos do interesse de agir (necessidade e adequação). Argumenta, ainda, que a multiplicidade de ações não configura abuso do direito de ação, tampouco litigância predatória, mas sim exercício legítimo da garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição. Aponta violação ao princípio da primazia da decisão de mérito e à jurisprudência consolidada do TJCE, que tem rechaçado a extinção do feito por multiplicidade de demandas quando presentes causas de pedir e pedidos distintos. Requer, ao final, a anulação da sentença e o retorno dos autos ao juízo de origem, com o regular prosseguimento do feito. Contrarrazões no Id. nº 24376917. É o breve relatório, passo a decidir. VOTO I - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL: Ab initio, em juízo antecedente de admissibilidade recursal, presentes os pressupostos intrínsecos ou subjetivos (cabimento, interesse e legitimidade, inexistência de súmula impeditiva) e extrínsecos ou objetivos (tempestividade, preparo, regularidade formal e a inexistência de fatos extintivos ou impeditivos do direito de recorrer), hei por bem CONHECER DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO. II - DO MÉRITO RECURSAL: O ponto central da controvérsia recursal consiste em avaliar se deve ser mantida ou reformada a sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo originário sem resolução de mérito, com fundamento no art. 330, inc. III do Código de Processo Civil e na Recomendação nº 159/2024 do Conselho Nacional de Justiça. Pois bem. In casu, com a devida vênia, impende destacar, desde logo, que o recurso comporta provimento. De início, vislumbra-se que o julgamento do feito foi proferido de forma equivocada, ao indeferir de plano a ação, sem oportunizar à parte Autora, ora Apelante, a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme estabelece o artigo 321 do Código de Processo Civil. É cediço que o referido dispositivo legal prevê, de forma expressa, que, ao constatar que a petição inicial não atende aos requisitos dos artigos 319 e 320 ou apresenta falhas que possam comprometer o julgamento do mérito, o magistrado deve intimar a parte autora para promover as correções ou complementações necessárias, fixando o prazo de 15 (quinze) dias e indicando de maneira clara o vício a ser sanado. O parágrafo único do artigo 321 ainda estabelece que apenas no caso de descumprimento da diligência é que a petição inicial poderá ser indeferida, in verbis: "Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado. Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial." Com efeito, ao magistrado somente é lícito indeferir a petição inicial após oportunizar à parte Autora a possibilidade de sanar eventuais vícios que possam macular a sua peça vestibular. A inobservância desse procedimento implica a supressão do direito subjetivo da parte e configura manifesta afronta ao princípio da não surpresa, expressamente consagrado no artigo 10 do Código de Processo Civil: "Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício." Dessa forma, a concessão de prazo para a emenda da inicial não representa mera faculdade do juízo, mas sim um direito processual da parte Autora e um dever legal do magistrado. Tal providência visa assegurar a observância de princípios constitucionais e processuais fundamentais, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a economia processual, a instrumentalidade das formas e a vedação às decisões-surpresa. Nesse contexto, consolidou-se a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça no sentido de que o indeferimento liminar da petição inicial, sem a prévia intimação para emenda, resulta na nulidade da sentença. Tal prática caracteriza erro de procedimento, uma vez que viola não apenas o devido processo legal, mas também compromete a efetividade da tutela jurisdicional, na medida em que desconsidera a primazia do julgamento de mérito e os princípios da economia e celeridade processuais. Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. ART. 485, I, DO CPC. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA EMENDA DA INICIAL. CONTRARIEDADE AO PROCEDIMENTO DO ART. 321 DO CPC. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NULIDADE INSANÁVEL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A EXTINÇÃO DA AÇÃO. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença decretou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por indeferimento da petição inicial, na forma do art. 485, I, do CPC, sob o fundamento de que o ajuizamento de que o fracionamento indevido de ações conexas configura abuso do direito de ação. 2. O art. 321, do Código de Processo Civil prevê expressamente que, quando o juiz constatar que a petição inicial não atende as exigências do art. 319 e 320, ou apresentar falhas que possam atrapalhar o julgamento de mérito, não só deverá intimar a parte autora para realizar as correções ou complementações necessárias no prazo de 15 (quinze) dias, como deverá indicar claramente o vício a ser corrigido. E prossegue, em seu parágrafo único, determinando que apenas em caso de não cumprimento da diligência a petição inicial será indeferida. 3. Assim, a oportunidade de emenda da inicial constitui, não só um direito da parte autora, como também é o procedimento legal a ser observado pelo juiz da causa, em atenção aos princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 4. Desse modo, há de se reconhecer que a extinção do feito pelo indeferimento liminar da inicial sem que seja dada à parte autora a oportunidade de emendar a petição inicial, infringe comando legal do art. 321, do CPC, fere os princípios do devido processo legal, da economia processual, da instrumentalidade das formas, da primazia do julgamento de mérito, do amplo direito de defesa e da vedação à decisão surpresa. 5. Além disso, devo observar que a configuração de conduta predatória do advogado não ocorre pela simples verificação da quantidade de ações ajuizadas, mas pela presença de outras circunstâncias associadas, como por exemplo, o fracionamento indevidos de pedidos relativos a um mesmo contrato em diferentes ações ou o ajuizamento da mesma ação (parte, pedido e causa de pedir) em diferentes varas ou comarcas, visando escolher o juízo que lhe parece ter o entendimento mais favorável, para depois desistir dos outros processos, burlando o princípio do juiz natural, o que não ocorreu no caso dos autos. 6. Desse modo, é absolutamente irrazoável a conclusão de que o ajuizamento de 3 (três) ações, em que cada uma aborda um contrato diferente do outro, constitua abuso do deito de ação e fragmentação indevida de processos. 7. Nesse contexto, estando descaracterizada a existência de abuso de direito de ação e de fragmentação indevida e estando evidenciada a causa de pedir, a legitimidade da parte e o interesse processual, há de se reconhecer a ausência de justa causa para a extinção do feito, por violação dos princípios da inafastabilidade da tutela jurisdicional e do devido processo legal, consagrados pelo art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição Federal, comprometendo a finalidade do processo, que é a satisfação do direito material pela primazia da sentença de mérito, nos termos dos arts. 4º e 6º, do CPC. 8. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. Retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. (TJCE, Apelação Cível nº 0200266-34.2024.8.06.0126, Relator: Desembargador EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 28/08/2024, Data da publicação: 28/08/2024). (Destaquei). EMENTA: APELAÇÃO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA DE PRÉVIA OPORTUNIZAÇÃO DE EMENDA À INICIAL. OFENSA AO ART. 321 DO CPC E AO PRINCÍPIO DA NÃO SURPRESA. NULIDADE DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. O cerne da questão posta à desate cinge-se a analisar a sentença hostilizada que, em face da ausência de interesse de agir, com fundamento no art. 485, VI c/c o art. 330, III, do CPC, extinguiu o processo sem resolução de mérito. 2. Da detida análise do fascículo processual, observa-se que o decisum foi proferido de forma equivocada, porquanto indeferiu de plano a ação, sem oportunizar à parte a possibilidade de emendar à inicial, nos termos do art. 321 do CPC. 3. Por consequência, caracterizada a ausência de oportunização à parte autora de emenda à inicial, em violação aos artigos 321 e 10 do CPC, a anulação da sentença é medida impositiva. 4. Apelação conhecida e provida. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0100344-17.2018.8.06.0001, Relator: Desembargador FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, 3ª Câmara Direito Privado, Data do julgamento: 03/10/2023, Data da publicação: 04/10/2023). (Destaquei). Para além disso, no que se refere à alegação de abuso do direito de ação, ou o denominado "uso predatório da jurisdição", cumpre observar que, embora tal conduta possa, em tese, configurar prática temerária, não se amolda à hipótese prevista no art. 330, inciso III, do Código de Processo Civil. Isso porque o interesse processual - entendido como o binômio necessidade e adequação - encontra-se plenamente caracterizado no caso concreto. A necessidade decorre da vedação à autotutela no ordenamento jurídico pátrio, de modo que, inexistindo mecanismos extrajudiciais idôneos para a satisfação de sua pretensão, incumbe à parte Autora recorrer ao Poder Judiciário. Por sua vez, a adequação refere-se à utilização dos instrumentos processuais apropriados para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida. Nesse contexto, a cumulação de pedidos contra o mesmo réu, ainda que tenham como origem contratos/fatos diversos, configura mera faculdade, e não obrigatoriedade, deferida à parte, nos termos do art. 327 do CPC, que assim dispõe: Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. § 1º São requisitos de admissibilidade da cumulação que: I - os pedidos sejam compatíveis entre si; II - seja competente para conhecer deles o mesmo juízo; III - seja adequado para todos os pedidos o tipo de procedimento. § 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum. § 3º O inciso I do § 1º não se aplica às cumulações de pedidos de que trata o art. 326 . Diante disso, não é válida a fundamentação do Magistrado de primeira instância de que a existência de múltiplas ações movidas para anular negócios jurídicos indicaria falta de interesse processual, uma vez que a parte Autora deveria ter apresentado apenas uma demanda. Isso se deve ao fato de que, em situações de conexão entre ações, a consequência processual é a junção dos processos para julgamento conjunto e não a sua extinção por ausência de interesse de agir, conforme preleciona o art. 55, do CPC, in verbis: "Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. § 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta salvo se um deles já houver sido sentenciado. § 2º Aplica-se o disposto no caput: I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico; II - às execuções fundadas no mesmo título executivo. § 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre ele." Assim, tem-se que a conexão entre os processos têm como objetivo evitar decisões conflitantes, garantindo que, caso haja a possibilidade de ocorrerem decisões contraditórias e/ou prejudiciais as partes envolvidas, as demandas sejam julgadas simultaneamente pelo mesmo juízo. A multiplicidade de ações, nesse contexto, reflete a diversidade das relações jurídicas analisadas, sendo inadequada a extinção de processos com fundamento na quantidade de demandas ajuizadas. Tal medida se mostra incompatível com os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal, assegurados pela Constituição. Cada ação deve ser examinada individualmente, levando em conta os direitos materiais em debate e a necessidade de proteção contra eventuais práticas contratuais abusivas ou irregulares. No caso concreto, embora os processos tratem de questões semelhantes, os objetos das ações são distintos, versando cada uma sobre diferentes contratos, razão pela qual não há que se falar em conexão, visto que não há igualdade entre as causas de pedir. A propósito, colaciona-se precedente desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos, in verbis: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. INDEFERIMENTO. IMPROPRIEDADE. AJUIZAMENTO DE MÚLTIPLAS AÇÕES. CAUSA DE PEDIR DISTINTAS. I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível interposta por Maria Deusina Freitas Ferreira Pires em contrariedade a sentença que indeferiu a inicial e julgou extinta a ação declaratória negativa de débito c/c indenização por dano moral ajuizada em face do Banco Bradesco S/A, ora recorrido. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão diz respeito à análise do acerto da sentença de extinção sem resolução do mérito, com base no art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. O Juízo a quo indeferiu a petição inicial declarando extinta a presente ação sem resolução de mérito, em face do ajuizamento de várias ações contra o mesmo réu sobre fatos semelhantes, em vez de propor uma única ação. 4. Contudo, compulsando os fólios processuais, verifica-se que a petição inicial atende os requisitos estabelecidos pela legislação processual civil, de modo que as condições da ação estão presente no caso em análise, sobretudo porque o fundamento utilizado para o indeferimento da inicial não é albergado pelo ordenamento jurídico pátrio. 5. Apesar de as ações se referirem ao mesmo réu, verifica-se que as demandas são fundamentadas em causa de pedir diversas, especialmente porque são distintas os valores das dívidas e contratos. 6. Dessa forma, ao prolatar a sentença, o Juízo a quo não agiu com acerto, incorrendo em error in procedendo, devendo, pois, os presentes autos ser devolvidos à instância de origem para regular processamento. IV. DISPOSITIVO E TESE: 7. Recurso provido, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. (TJCE, Apelação Cível nº 0201656-58.2024.8.06.0055, Relator: Desembargador CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, 2ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 27/02/2025). (Destaquei). EMENTA: Apelação Cível. Direito Processual Civil. Empréstimo Consignado. Ajuizamento de Diversas Ações. Sentença de Indeferimento da Petição Inicial e Extinção Do Processo Sem Resolução Do Mérito. Impossibilidade. Recurso Conhecido e Provido. Sentença Anulada. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pela parte autora objetivando a anulação da sentença que indeferiu a petição inicial (art. 330, III, do CPC), em sede de ação declaratória de inexistência/nulidade de débito movida em desfavor do Banco Bradesco S/A. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar se a mera quantidade de ações ajuizadas pela parte apelante contra a mesma instituição financeira é causa para extinção do feito sem resolução de mérito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. No caso, a parte autora impugna o contrato de empréstimo consignado de nº 393193016, com descontos mensais no valor de R$ 51,10, a ser quitado em 32 parcelas. 4. O julgador proferiu a sentença de extinção do feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse processual, após verificar que a parte ajuizou diversas ações contra a mesma instituição financeira, impugnando diversos contratos supostamente realizados por ela. 5. Considerando que cada contrato realizado resulta em novo desconto adicionado aos proventos de aposentadoria da parte demandante, sendo esta sua causa de pedir, e que a parte tem a necessidade/utilidade de ir ao Judiciário para obter provimento jurisdicional apto a barrar tais descontos, não há que se falar em ausência de interesse processual no presente caso. 6. Ademais, o acesso à Justiça deve ser priorizado, em detrimento do excesso de formalismo, que resultou, no caso concreto, impedimento do acesso da parte apelante à jurisdição, ferindo a sua garantia constitucional de inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF, na qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". IV. DISPOSITIVO 7. Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0205783-91.2024.8.06.0167, Relatora: Desembargadora JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 26/02/2025, Data da publicação: 26/02/2025). (Destaquei). EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL POR FRACIONAMENTO DE DEMANDAS. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA ANULADA. I- Cinge-se a controvérsia em perquirir o acerto ou desacerto da sentença impugnada, que indeferiu a petição inicial, sob a fundamentação de existência de três ações, esta e outras duas, ajuizadas pela autora buscando anular descontos, supostamente indevidos, o que configuraria ausência de interesse processual, uma vez que a parte deveria ajuizar somente uma demanda. II- No caso concreto, conquanto os processos versem sobre matéria similar, ou seja, cobranças indevidas; referem-se a descontos de timbres, contratos e períodos diversos; assim, relações jurídicas distintas. Patente, pois, a legitimidade e o interesse processual. III- O fundamento utilizado pelo magistrado sentenciante não se aplica ao caso sub judice, ante a diferenciação entre as ações paradigmas por ostentarem como causa de pedir contratos diversos, o que descaracteriza a multiplicidade de ações; afastando-se, pois, a ocorrência do instituto da conexão e, ainda, a possibilidade de ocorrência do mero risco de decisões conflitantes, a que se refere o art. 55, § 3º do CPC. IV- Em que pese se tratar das mesmas partes, o fato de cada processo ostentar Contratos distintos, já é o suficiente para que se permita o processamento em separado, porquanto, antes de ser uma obrigação, a reunião dos pedidos em uma só demanda é uma faculdade (art. 327, CPC). V- Em homenagem aos princípios da cooperação, da inafastabilidade da tutela jurisdicional e da primazia do julgamento de mérito; devemos autos retornar ao juízo de origem para que a inicial seja recebida, processada e sentenciada, na forma da lei. VI- Recurso conhecido e provido. Sentença anulada. (TJCE, Apelação Cível nº 0201039-18.2024.8.06.0114, Relatora: Desembargadora MARIA REGINA OLIVEIRA, 1ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 06/11/2024, Data da publicação: 06/11/2024). (Destaquei). Com efeito, os elementos probatórios apresentados pela parte Autora, ora Apelante, aliados à ausência de indícios concretos de litigância abusiva, demonstram que não se justifica a invocação genérica da Recomendação nº 159/2024 do CNJ como fundamento para restringir o direito de acesso à justiça. Nessa linha de raciocínio, a sentença ora recorrida se revela em desconformidade com o princípio da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, bem como afronta a garantia constitucional da inafastabilidade da tutela jurisdicional, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Constituição Federal, segundo a qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito". Destarte, conclui-se que o Juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em error in procedendo, violando normas fundamentais do devido processo legal. Impõe-se, portanto, a anulação da sentença e a devolução dos autos ao Juízo de origem, a fim de que seja oportunizado o regular prosseguimento do feito, com observância aos princípios que regem o processo civil e às garantias constitucionais do jurisdicionado. DISPOSITIVO Diante do exposto, pelos argumentos fartamente coligidos e com fulcro nos documentos e dispositivos legais acima invocados, CONHEÇO do presente recurso de Apelação Cível para, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO, a fim de decretar a nulidade da sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito. É como voto. Fortaleza, data e hora da assinatura digital. DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator

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