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Processo nº 1005368-93.2025.8.26.0099

ID: 294509534

Tribunal: TJSP Órgão: Foro de Bragança Paulista - 4ª Vara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1005368-93.2025.8.26.0099

Data de Disponibilização: 10/06/2025

Polo Ativo:

CAIO PIOVESAN TORICELLI

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

GUSTAVO MARZAGÃO XAVIER

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

Processo 1005368-93.2025.8.26.0099 - Procedimento Comum Cível - Tratamento médico-hospitalar - Caio Piovesan Toricelli - Recebo a petição de fls. 101/117, como aditamento à inicial. Representação pro… Processo 1005368-93.2025.8.26.0099 - Procedimento Comum Cível - Tratamento médico-hospitalar - Caio Piovesan Toricelli - Recebo a petição de fls. 101/117, como aditamento à inicial. Representação processual regularizada (fl. 105). Valor da causa retificado para R$ 72.875,00 (correspondente ao valor de 56 cápsulas do medicamento, necessárias para a primeira fase do tratamento). Custas recolhidas na forma da lei. Anote-se. Anote-se, ainda os endereços eletrônicos das partes e o número do WhatsApp do requerente, indicados à fl. 103. Cartório: verificar se houve a correta utilização da funcionalidade que possibilite a indicação do número da guia DARE-SP para a respectiva queima automática da guia (Comunicado Conjunto n. 881/2020 e Comunicado CG n. 2199/2021), lançando certidão nos autos, confirmada a sua inutilização (artigo 1093, §6º das NSCGJ). Trata-se de ação de obrigação de fazer proposta por CAIO PIOVESAN TORICELLI em face de NOTREDAME INTERMEDICA SAÚDE S/A, por meio da qual pretende a condenação da requerida: (i) a disponibilizar/fornecer o medicamento Midostaurina 50mg 2x/dia do D8 a D21 de cada ciclo de indução e consolidação, pelo tempo e frequência necessários ao restabelecimento do paciente e alta médica, a critério do médico especialista; (ii) alternativamente, caso o requerente tenha adquirido o medicamento pela via particular, ao ressarcimento integral do valor despendido; (iii) ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 30.000,00. Em síntese, o requerente alega ser beneficiário do plano de saúde "Smart 500 CE Enf ", oferecido pela empresa requerida, desde o dia 30 de junho de 2019 (fl. 19) e que está em dia com o pagamento das mensalidades (fl. 20). Em 04 de maio de 2025, foi diagnosticado com leucemia mielóide aguda (LMA) com presença de mutação NPM1 e FLT3 - TKD (CID C92.0), oportunidade em que deu início ao urgente tratamento quimioterápico. Diante do grave quadro clínico do paciente, foi prescrito pela médica oncologista que o acompanha o tratamento com uso da medicação Midostaurin 50 mg (nome comercial de Midostaurina), 2x/dia do D8 a D21 de cada ciclo de indução e consolidação (fls. 24/25). No dia 02 de junho de 2025, o requerente solicitou o referido medicamento ao plano de saúde, esclarecendo tratar-se de situação urgente, dado o grave diagnóstico, gerando o protocolo de n° 35901720250602922470, com resposta automática de que a análise seria feita no prazo de 10 dias úteis (fls. 26/27). Decorrido o prazo de 24 horas, previsto pela ANS, para análise e liberação do medicamento, o requerente realizou novo contato com a operadora de saúde, sendo informado que o pedido encontrava-se sob análise, não sabendo precisar o prazo de retorno (protocolo de n° 35901720250605317395). Aduz, ainda, que tal situação configura negativa tácita. Formulou pedido de tutela antecipada para que o plano de saúde requerido seja compelido a fornecer o medicamento Midostaurina 50mg 2x/dia do D8 a D21 de cada ciclo de indução e consolidação, quantas vezes forem necessárias ao restabelecimento e alta médica, a critério do médico especialista, no prazo de 48 horas, sob pena de multa diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco) mil reais. Alternativamente, caso não seja fornecido o medicamento dentro do prazo, além da multa estipulada, requer seja a requerida condenada ao reembolso/ressarcimento integral do valor despendido para a aquisição do medicamento pelo requerente. O requerente trouxe três orçamentos para aquisição do medicamento pela via particular, nos valores de R$ 85.715,00 (fl. 29), R$ 83.601,90 (fl. 110) e R$ 86.524,20 (fls. 111/114), correspondentes a uma caixa do medicamento contendo 112 cápsulas. Para a primeira etapa do tratamento serão necessárias 56 cápsulas da medicação. 1) Tutela antecipada Em sede de cognição sumária, sem aprofundar no mérito da questão, verifica-se que estão presentes os requisitos legais para a concessão da tutela de urgência. Há probabilidade na existência do direito, pois o requerente é beneficiário do plano de saúde, que contempla o tratamento da doença, encontrando-se em dia com o pagamento das prestações. O tratamento foi recomendado, de maneira urgente, pela médica oncologista que acompanha o requerente (fls. 24/25 e 106), sendo que o pedido não foi apreciado pelo plano de saúde oferecido pela requerida até a presente data (fls. 26/28), o que importa em recusa tácita. Ademais, o medicamento prescrito possui registro na Anvisa e possui indicação de uso na bula para o tratamento da doença que acomete o requerente (fls. 30/63). A demora injustificada na autorização do fornecimento do medicamento pelo plano de saúde, dada a urgência do tratamento, configura recusa tácita. Nesse sentido: "RECURSO INOMINADO PLANO DE SAÚDE. OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Demora na autorização para a realização de exames acompanhados de pedido de urgência do médico assistente em razão do grave quadro de saúde da parte ativa. Necessidade de autorização para, com o resultado dos exames, dar início ao tratamento invasivo de quimioterapia . Não aplicação do prazo de 21 dias úteis. Em casos de urgência e emergência os procedimentos e exames devem ser autorizados imediatamente, nos termos do artigo 3º, inciso XIV da Resolução Normativa 259/2011 da ANS. Demora injustificada. A inércia da operadora de plano de saúde em apresentar resposta para a solicitação de autorização de exames, de caráter urgente, configura negativa tácita e, ainda, falha no serviço, afrontando os princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato . Danos morais configurados. Demora que gerou sofrimento psicológico e angústia à parte autora, somente obtido o agendamento dos exames após o ajuizamento da presente ação. Presentes os requisitos do dever de indenizar. Quantum fixado em R$ 4 .000,00, bem sopesado e com em respeito aos princípios da razoabilidade de proporcionalidade. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO." sem destaque no original (TJ-SP - Recurso Inominado Cível: 00021267720238260176 Embu das Artes, Relator.: Olavo Paula Leite Rocha - Colégio Recursal, Data de Julgamento: 03/07/2024, 3ª Turma Recursal Cível, Data de Publicação: 03/07/2024) "AGRAVO DE INSTRUMENTO Plano de Saúde Beneficiário diagnosticado com lombalgia com irradiação para membro inferior direito devido a hérnia discal, com prescrição médica de tratamento cirúrgico Indícios de que tenha procedido à solicitação administrativa de cobertura, sem que tenha havido, contudo, resposta da Operadora, caracterizando negativa tácita de cobertura A Operadora sequer alega a inexistência de cobertura para o tratamento prescrito, o que evidencia o fumus boni iuris, defluindo o periculum in mora do agravamento do estado de saúde do paciente, com fortes dores e comprometimento de sua qualidade de vida, o que é independente da situação de urgência/emergência, e há o perigo na demora mesmo que se cuide de procedimento eletivo Presença dos requisitos do art. 300 do CPC Recurso desprovido." sem destaque no original (TJ-SP - Agravo de Instrumento: 2135159-41.2024 .8.26.0000 Carapicuíba, Relator.: Alcides Leopoldo, Data de Julgamento: 30/05/2024, 4ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 30/05/2024) "DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. OBRIGAÇÃO DE FAZER . TRATAMENTO ONCOLÓGICO. DEMORA NA AUTORIZAÇÃO E CUSTEIO DO TRATAMENTO. URGÊNCIA E EMERGÊNCIA. COBERTURA FORA DA REDE CREDENCIADA . REEMBOLSO. DESNECESSIDADE DE REALIZAÇÃO INTEGRAL DE TRATAMENTO EM FORA DA REDE CREDENCIADA. RECURSO DESPROVIDO. I . CASO EM EXAME 1. Vagner Carlos Pereira ajuizou ação de obrigação de fazer contra Prevent Senior Corporate Operadora de Saúde LTDA., visando a condenação da ré a custear integralmente seu tratamento oncológico fora da rede credenciada ou, subsidiariamente, realizar o tratamento prescrito por médico de sua confiança, em razão da demora injustificada na autorização e início do tratamento quimioterápico. A tutela de urgência foi deferida, determinando à ré o custeio do tratamento em rede credenciada . A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos, condenando a ré a custear imediatamente o tratamento quimioterápico na rede credenciada e a reembolsar despesas com atendimento fora da rede credenciada. A ré interpôs recurso alegando inexistência de recusa na prestação de serviço e atendimento dentro dos prazos da ANS. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2 . Há uma questão em discussão: (i) verificar se houve negativa de cobertura ou mora injustificada por parte da ré no custeio do tratamento oncológico do autor. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A negativa de cobertura ou mora injustificada se configura pela demora da ré em autorizar e custear o tratamento oncológico prescrito, caracterizando descumprimento contratual, especialmente em casos de urgência e emergência, conforme a Resolução nº 566/2022 da ANS . 4. A urgência do tratamento oncológico é evidente, pois a probabilidade de sucesso é proporcional à precocidade do tratamento, sendo que o diagnóstico de câncer exige atendimento imediato. 5. A ré não comprovou ter prestado o atendimento necessário nos prazos previstos, o que justifica a busca do autor por atendimento fora da rede credenciada . 6. O reembolso integral das despesas realizadas fora da rede credenciada é devido somente durante o período de urgência, não sendo necessário custear o tratamento integralmente fora da rede credenciada quando há rede apta disponível para continuidade do tratamento. IV. DISPOSITIVO E TESE 7 . Recurso desprovido. Tese de julgamento: A operadora de saúde deve autorizar e custear o tratamento oncológico imediato quando comprovada a urgência do caso, sob pena de violação da Resolução nº 566/2022 da ANS. O reembolso de despesas fora da rede credenciada é devido em casos de urgência, mas não se estende à continuidade do tratamento quando há rede credenciada apta. A demora injustificada no atendimento por parte da operadora de saúde configura descumprimento contratual e justifica a busca por atendimento fora da rede credenciada, com direito ao reembolso das despesas urgentes. Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 355, I; 374, I; 397, parágrafo único; 486, I; 85, § 8º; CDC; Resolução nº 566/2022 da ANS, art. 3º, XVII. Jurisprudência relevante citada: TJSP, Apelação Cível 1006023-06 .2019.8.26.0704, Rel . Des. Maria de Lourdes Lopez Gil, j. 28/08/2020; TJSP, Apelação Cível 1003887-78.2019 .8.26.0011, Rel. Des . Costa Netto, j. 14/07/2020; TJSP, Apelação Cível 1019992-45.2019.8 .26.0007, Rel. Des. Marcia Dalla Déa Barone, j . 07/04/2022. Ld" sem destaque no original (TJ-SP - Apelação Cível: 10023478120238260228 São Paulo, Relator.: Léa Duarte, Data de Julgamento: 04/07/2024, Núcleo de Justiça 4.0 em Segundo Grau Turma IV (Direito Privado 1), Data de Publicação: 11/09/2024) É evidente o perigo da demora, pois a protelação do tratamento coloca em risco a vida do requerente, justificando a excepcional concessão da tutela antecipada. Ante o exposto, defiro a tutela antecipada, a fim de compelir a requerida a autorizar, fornecer e custear integralmente o procedimento médico de que o requerente necessita, com a administração do medicamento Midostaurina 50mg", duas vezes ao dia do D8 a D21 de cada ciclo de indução e consolidação, sendo permitido o genérico, com o mesmo princípio ativo, enquanto perdurar o tratamento e na forma, modo e dosagem prescritos pela médica especialista, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, sob pena de aplicação de medidas coercitivas diversas, em especial apreensão on-line do valor monetário equivalente para garantir o cumprimento e o custeio do tratamento. Serve a presente decisão, assinada digitalmente, como ofício, a ser encaminhado pelo requerente ao plano de saúde NOTREDAME INTERMEDICA SAÚDE S/A, CNPJ nº 44.649.812/0001-38, com o objetivo de agilizar o cumprimento da tutela antecipada. 2) Citação Mesmo antes do advento do Código de Processo Civil de 2015, este juízo já vinha designando audiências de conciliação no início do processo. Por outro lado, a prática forense revela que não convém realizar audiências de conciliação de forma indiscriminada em todos os feitos, como, entre outros, na hipótese de envolver empresas as quais não costumam formular propostas de transação, ou se a natureza do litígio demonstra improvável composição. É o presente caso. CITE-SE e INTIME-SE a requerida por meio do portal eletrônico, bem como por e-mail (atendimentopme@intermedica.com.br) e WhatsApp (caso seja fornecido), ficando consignado que tem o prazo de 15 dias para oferecer contestação, sob pena de revelia, presumindo-se como verdadeiros os fatos articulados na petição inicial, bem como para que fique ciente sobre o deferimento da tutela antecipada, do prazo para cumprimento e das consequências do descumprimento. 2.1) Validade da citação por meio eletrônico Em um primeiro momento, o CNJ reconheceu a possibilidade de INTIMAÇÃO por meio do aplicativo de mensagens "WhatsApp". Contudo, não houve maiores avanços em relação à citação por este meio. Assim, a utilização do aplicativo "WhatsApp" para realização de citação, diante da ausência de previsão legal, se mostrava, a princípio, inaplicável, sendo mais utilizada inclusive por este Juízo como complementação ao ato formal a ser realizado por meio de carta ou mandado. Contudo, em recentes decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal, ainda que em sede de Habeas Corpus nºs 641.877, 199.548, respectivamente, com aplicação mais especificamente das normais processuais penais, foi validada a citação por meio eletrônico (WhatsApp e e-mail), desde que reunidos elementos que revelem a autenticidade do destinatário. Por oportuno, colaciono ementa dos julgados acima: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. INADEQUAÇÃO. CITAÇÃO VIA WHATSAPP. NULIDADE. PRINCÍPIO DA NECESSIDADE. INADEQUAÇÃO FORMAL E MATERIAL. PAS DE NULlITÉ SANS GRIEF. AFERIÇÃO DA AUTENTICIDADE. CAUTELAS NECESSÁRIAS. NÃO VERIFICAÇÃO NO CASO CONCRETO. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. (...). 2. A citação do acusado revela-se um dos atos mais importantes do processo. É por meio dela que o indivíduo toma conhecimento dos fatos que o Estado, por meio do jus puniendi lhe direciona e, assim, passa a poder demonstrar os seus contra-argumentos à versão acusatória (contraditório, ampla defesa e devido processo legal). (...) 8. Necessário distinguir, porém, essa situação daquela em que, além da escrita pelo citando, há no aplicativo foto individual dele. Nesse caso, ante a mitigação dos riscos, diante da concorrência de três elementos indutivos da autenticidade do destinatário, número de telefone, confirmação escrita e foto individual, entendo possível presumir-se que a citação se deu de maneira válida, ressalvado o direito do citando de, posteriormente, comprovar eventual nulidade, seja com registro de ocorrência de furto, roubo ou perda do celular na época da citação, com contrato de permuta, com testemunhas ou qualquer outro meio válido que autorize concluir de forma assertiva não ter havido citação válida. 9. Habeas corpus não conhecido, mas ordem concedida de ofício para anular a citação via Whatsapp, porque sem nenhum comprovante quanto à autenticidade da identidade do citando, ressaltando, porém, a possibilidade de o comparecimento do acusado suprir o vício, bem como a possibilidade de se usar a referida tecnologia, desde que, com a adoção de medidas suficientes para atestar a identidade do indivíduo com quem se travou a conversa. (HABEAS CORPUS Nº 641.877 DF. RELATOR: MINISTRO RIBEIRO DANTAS julgado 15/03/2021) (sem destaque no original). "EMENTA: Processual Penal. Habeas Corpus. Alegação de nulidade. Ausência de demonstração de prejuízo. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. 1. Trata-se de habeas corpus, com pedido de concessão de liminar, impetrado contra acórdão unânime da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), da Relatoria do Ministro Nefi Cordeiro, assim ementado: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. AMEAÇA E VIAS DE FATO. CITAÇÃO POR MEIO ELETRÔNICO. APLICATIVO DE CELULAR 'WHATSAPP'. PANDEMIA. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL. PREVISÃO EM NORMA DO TRIBUNAL A QUO. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DO RÉU ACERCA DOS TERMOS DA ACUSAÇÃO. PREVISÃO LEGAL. NULIDADE RELATIVA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. ORDEM DENEGADA. 1. A citação por meio eletrônico, quando atinge a sua finalidade e demonstra a ciência inequívoca pelo réu da ação penal, não pode ser simplesmente rechaçada, de plano, por mera inobservância da instrumentalidade das formas. 2. No caso concreto, ponderado o contexto excepcional de pandemia, havendo ainda norma do Tribunal a quo para regulamentar a citação em situações excepcionais (Portaria GC 155, de 9/9/2020, do TJDFT), nota-se que não houve prejuízo processual objetivamente demonstrado que importe em nulidade do ato de citação por meio eletrônico (via conversa pelo aplicativo de celular 'Whatsapp'), uma vez que os elementos necessários para o conhecimento da denúncia foram devidamente encaminhados ao denunciado e não há dúvidas quanto à sua ciência do ato da citação e do teor da acusação que recai contra si. (...) 11. No caso, o STJ não divergiu desse entendimento, ao assentar que, ponderado o contexto excepcional de pandemia, havendo ainda norma do Tribunal a quo para regulamentar a citação em situações excepcionais (Portaria GC 155, de 9/9/2020, do TJDFT), nota-se que não houve prejuízo processual objetivamente demonstrado que importe em nulidade do ato de citação por meio eletrônico (via conversa pelo aplicativo de celular 'Whatsapp'), uma vez que os elementos necessários para o conhecimento da denúncia foram devidamente encaminhados ao denunciado e não há dúvidas quanto à sua ciência do ato da citação e do teor da acusação que recai contra si. Transcrevo, nesse sentido, as seguintes passagens do acórdão impugnado: [...] Conforme relatado, busca a defesa o reconhecimento da nulidade da citação realizada por aplicativo de celular, ante os latentes prejuízos ao devido processo legal, determinando a realização do ato em conformidade com o disposto na Lei para a sua validade (fl. 11). Sobre o tema, extrai-se do acórdão atacado o seguinte (fl. 219): Como se nota, adequada a decisão que confirmou a validade da citação realizada por meio eletrônico, porquanto observados os preceitos da Portaria GC 155, de 09/09/2020, e da decisão proferida no processo SEI PA 0016466/2020, em virtude da situação excepcional provocada pela pandemia da Covid-19. Além disso, a citação alcançou sua finalidade, conforme certificou o Oficial de Justiça responsável pelo ato (ID 22341806 - Pág. 55), pois o citando foi informado do conteúdo da comunicação via contato telefônico, concordou com a realização do ato por meio eletrônico, e recebeu arquivos da denúncia e do mandado de citação (ID 22341806 - Págs. 56/57). Tanto que procurou a Defensoria Pública, que, de pronto, ingressou com pedido de nulidade da citação, e apresentou resposta à acusação. Assim, não se destaca qualquer prejuízo à ampla defesa, ao contraditório, ou ao devido processo legal atribuível à forma como foi concretizada a citação. Ressalte-se que, no campo da nulidade no processo penal, vigora o princípio , que exige a comprovação de efetivo prejuízo para o pas de nullité sans grief reconhecimento de nulidade (art. 563 do Código de Processo Penal), o que não ocorreu na espécie. No caso concreto, ponderado o contexto excepcional de pandemia, havendo ainda norma do Tribunal a quo para regulamentar a citação em situações excepcionais (Portaria GC 155, de 9/9/2020, do TJDFT), nota-se que não houve prejuízo processual objetivamente demonstrado que importe em nulidade do ato de citação por meio eletrônico (via conversa pelo aplicativo de celular 'Whatsapp'), uma vez que os elementos necessários para o conhecimento da denúncia foram devidamente encaminhados ao denunciado e não há dúvidas quanto à sua ciência do ato da citação e do teor da acusação que recai contra si. Posto isso, a citação por meio eletrônico, quando atinge a sua finalidade e demonstra a ciência inequívoca pelo réu da ação penal, não pode ser simplesmente rechaçada, de plano, por mera inobservância da instrumentalidade das formas. Nesse sentido: [... Ademais, a lei processual penal em vigor adota o princípio pas de nullité sans grief (art. 563 do CPP), segundo o qual somente se declara a nulidade caso, alegada oportunamente, haja demonstração ou comprovação de efetivo prejuízo à parte, o que não ocorreu na espécie. Nesse sentido: []. (Grifos acrescentados) 12. Diante do exposto, com fundamento no art. 21, § 1º, do RI/STF, nego seguimento ao habeas corpus. Publique-se. Brasília, 07 de abril de 2021. Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO Relator (STF - HC: 199548 DF 0050402-64.2021.1.00.0000, Relator: ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 07/04/2021, Data de Publicação: 09/04/2021). Além disso, foi promulgada a Lei nº 14.195/21, que dentre outras alterações, tornou prioritária citação por meio eletrônico (art. 246 CPC), condicionando a sua validade à confirmação de recebimento pelo destinatário. Cartório: a) encaminhar a citação da requerida pelo portal eletrônico, observando-se que a despesa correspondente já foi recolhida (fls. 115/117); b) encaminhar a citação por email/whatsapp, caso estes meios eletrônicos estejam no processo, constando que a parte requerida tem o ônus de confirmar o seu recebimento, no prazo de três dias, sob pena de ato atentatório à dignidade da justiça, com incidência de multa de até 5% sobre o valor a causa (art. 246, § 1º-C CPC); c) juntar no processo a resposta da parte requerida e/ou contato telefônico do escrevente confirmando o recebimento, certificando. Int. - ADV: GUSTAVO MARZAGÃO XAVIER (OAB 307100/SP)

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Processo nº 0038266-97.2010.4.01.3700

ID: 307073773

Tribunal: TRF1 Órgão: Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0038266-97.2010.4.01.3700

Data de Disponibilização: 25/06/2025

Polo Ativo:

HELIO DE SOUZA PINTO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOSE GUILHERME CARVALHO ZAGALLO

OAB/MA XXXXXX Desbloquear

JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0038266-97.2010.4.01.3700 PROCESSO REFERÊNCIA: 0038266-97.2010.4.01.3700 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: HELIO DE SOUZA PINTO… JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0038266-97.2010.4.01.3700 PROCESSO REFERÊNCIA: 0038266-97.2010.4.01.3700 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: HELIO DE SOUZA PINTO e outros REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: JOSE GUILHERME CARVALHO ZAGALLO - MA4059-A POLO PASSIVO:HELIO DE SOUZA PINTO e outros REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: JOSE GUILHERME CARVALHO ZAGALLO - MA4059-A RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA PODER JUDICIÁRIO FEDERAL TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0038266-97.2010.4.01.3700 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: HELIO DE SOUZA PINTO e outros APELADO: HELIO DE SOUZA PINTO e outros RELATÓRIO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL DIEGO CARMO DE SOUSA (RELATOR CONVOCADO): Trata-se apelações interpostas pela parte autora e pela UFMA contra sentença em que foi julgado parcialmente procedente o pedido de sustação de descontos a título de reposição ao erário das parcelas referentes a URP/89. Alega a parte autora, em suma, que a Justiça do Trabalho lhe concedeu o direito de incorporar a seus proventos a vantagem relativa à URP (26,05%), referente a fevereiro de 1989, o que torna inviável a supressão determinada pelo TCU, por configurar ofensa à coisa julgada. Sustenta, também, a ocorrência de decadência, bem como a intangibilidade do direito à incorporação. Contrarrazões apresentadas pela UFMA requerendo, em suma, a manutenção do julgado na parte que julgou improcedente o pedido de manutenção da URP. A UFMA também apela arguindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva e, no mérito, sustenta a legalidade do ato do TCU e da determinação de devolução dos valores indevidamente recebidos. Em decisão de Id 78567850 - Pág. 145 foi concedida a assistência jurídica gratuita. Em suas contrarrazões, a parte autora requer a manutenção da sentença na parte em que julgou procedente o pedido. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO FEDERAL TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0038266-97.2010.4.01.3700 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: HELIO DE SOUZA PINTO e outros APELADO: HELIO DE SOUZA PINTO e outros VOTO O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL DIEGO CARMO DE SOUSA (RELATOR CONVOCADO): Da admissibilidade da apelação A sentença foi proferida antes da égide do NCPC e, assim, a hipótese enseja o reexame obrigatório. Conheço do recurso interposto, porquanto preenchidos os pressupostos de sua admissibilidade. Preliminares Da Ilegitimidade Passiva da UFMA Este Tribunal decidiu em casos semelhantes que não há acolher a defesa processual de ilegitimidade passiva ad causam, aduzida pela Universidade Federal do Maranhão -UFMA. Com efeito, o Autor é Servidor aposentado dessa instituição de ensino superior, que goza de autonomia administrativa, financeira e orçamentária, e a quem cabe, por conseguinte, a gestão da folha de pagamento do Requerente (AC 0033043-61.2013.4.01.3700, relator Desembargador Federal Francisco Neves da Cunha, Segunda Turma, e-DJF1 20/08/2019). No mesmo sentido: AC 0005354-81.2009.4.01.3700, 1ª T, Rel. Des. Fed. Eduardo Morais da Rocha, j. 23.11.2023; AC 0031731-50.2013.4.01.3700, 1ª T, Rel. Des. Fed. Eduardo Morais da Rocha, j. 19.09.2023; AC 0055035-78.2013.4.01.3700, 1ª T, Rel. Des. Fed. Gilda Sigmaringa Seixas, j. 07.06.2017. Da impossibilidade jurídica do pedido Não subsiste a alegação de impossibilidade jurídica do pedido, suscitada pela UFMA, visto que a pretensão da parte autora não era vedada pelo ordenamento jurídico então em vigor. A propósito, como há muito vem decidindo esta Primeira Turma em casos semelhantes, “inexiste impossibilidade jurídica do pedido se não há no ordenamento jurídico pátrio vedação alguma à apreciação da matéria discutida, que versa sobre critério de remuneração de servidor público” (AC 0049596-90.1997.4.01.0000, relator Juiz Federal convocado Evaldo de Oliveira Fernandes, filho, Primeira Turma, e-DJF1 04/11/2008, p. 13). Da decadência Quanto à decadência do direito do TCU rever atos concessivos de aposentadoria/pensão a servidores públicos, inclusive no que tange às parcelas incorporadas aos respectivos proventos, tem decidido esta Primeira Turma que “o aperfeiçoamento do ato complexo de concessão de aposentadoria/pensão ocorre apenas com seu registro pelo Tribunal de Contas da União - TCU, após a devida análise de sua legalidade, no exercício de seu controle externo estabelecido na Constituição Federal. Entretanto, com fundamento nos princípios da segurança jurídica e da confiança, bem como à luz do disposto nos arts. 5º, LXXXV e LV, 37, caput, 71 e 74 da CF/88, o e. Supremo Tribunal Federal decidiu no Tema 445 da repercussão geral sobre a incidência do prazo de 5 anos previsto no art. 54 da Lei 9.784/99 para a Administração anular ato de concessão de aposentadoria, notadamente acerca do termo inicial do prazo decadencial. 4. ‘Em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de 5 anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas’ (Tema 445/STF)”. No mesmo sentido, o seguinte julgado do STF: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. APOSENTADORIA. EXAME. DECADÊNCIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. DIREITO AO PAGAMENTO DA UNIDADE DE REFERÊNCIA E PADRÃO – URP DE 26,05%, INCLUSIVE PARA O FUTURO, RECONHECIDO POR SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. PERDA DA EFICÁCIA VINCULANTE DA DECISÃO JUDICIAL, EM RAZÃO DA SUPERVENIENTE ALTERAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS FÁTICOS E JURÍDICOS QUE LHE DERAM SUPORTE. SUBMISSÃO À CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À GARANTIA DA COISA JULGADA. PRECEDENTES. 1. No julgamento do RE 596.663-RG, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. para o Acórdão Min. Teori Zavascki, DJe 26.11.2014, o Tribunal reconheceu que o provimento jurisdicional, ao pronunciar juízos de certeza sobre a existência, a inexistência ou o modo de ser das relações jurídicas, a sentença leva em consideração as circunstâncias de fato e de direito que se apresentam no momento da sua prolação. 2. Tratando-se de relação jurídica de trato continuado, a eficácia temporal da sentença permanece enquanto se mantiverem inalterados esses pressupostos fáticos e jurídicos que lhe serviram de suporte (cláusula rebus sic stantibus). 3. Inexiste ofensa à coisa julgada na decisão do Tribunal de Contas da União que determina a glosa de parcela incorporada aos proventos por decisão judicial, se, após o provimento, há alteração dos pressupostos fáticos e jurídicos que lhe deram suporte. 4. Ordem denegada. (STF, MS 25430, Rel. Min. Eros Grau, Rel. p/ Acórdão Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, j. 26/11/2015). Afasto, assim, o reconhecimento da decadência. Do Mérito A pretensão inicial é de manutenção nos proventos do autor do reajuste de 26,05% referente à URP de fevereiro/89, que lhe foi assegurado por decisão judicial transitada em julgado na Justiça do Trabalho, com a determinação de suspensão do pagamento pelo Tribunal de Contas da União – TCU. No tocante ao mérito, a determinação do TCU para que cessasse o pagamento da URP de fevereiro de 1989 (26,05%) nos vencimentos/proventos do servidor, considerada ilegal após a sua absorção por novo regime de vencimentos, não atenta contra a coisa julgada, uma vez que tal valor não se incorpora definitivamente à remuneração dos servidores. A incorporação em comento, no entanto, foi assegurada quando o autor ocupava emprego púbico e era regido pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. Sabe-se, porém, que servidor público não tem direito a regime jurídico, de modo que se o regime jurídico se altera, não importa se alguma vantagem pecuniária vencimental decorreu de lei ou de decisão judicial, essa vantagem é excluída do regime de retribuição. A decisão judicial apenas ao seu tempo restabelece uma violação de direito qualquer. Se posteriormente o regime jurídico do servidor é alterado, necessariamente a decisão judicial a que se referiu a lei em algum momento perde a sua eficácia, porque senão ter-se-ia assegurado ao servidor a permanência do regime jurídico, pretensão que o Supremo Tribunal há muito tem decidido que não é consentâneo com o sistema jurídico brasileiro. Tratando-se de relação jurídica estatutária, não contratual, pode o Estado alterar as normas de regência da relação entre ele e seu servidor, de modo que pode a lei transformar legitimamente os critérios de remuneração do servidor, prospectivamente. Com efeito, nesse regime, o funcionário se encontra debaixo de uma situação legal, estatutária, que não é produzida mediante um acordo de vontades, mas imposta unilateralmente pelo Estado e, por isso mesmo, suscetível de ser, a qualquer tempo, alterada, sem que o funcionário possa se opor à mudança das condições de prestação de serviço, do sistema de retribuição, de direitos e vantagens, de deveres e limitações, em uma palavra, de regime jurídico, consoante CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, em lição lapidar, em seus Apontamentos Sobre os Agentes e Órgãos Públicos, RT, 1ª ed., 1981, pp. 10-11, e em seu Regime Constitucional dos Servidores, RT, 1ª ed., 1990, pp. 11-12. O Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente decidido que o servidor público não tem direito adquirido a regime jurídico, como dão conta, entre outros, os seguintes e antigos arestos: O Plenário da Corte reiterou o entendimento de que não há direito adquirido a vencimentos de funcionários públicos, nem direito adquirido a regime jurídico instituído por lei (RE n. 293578/PR, relator Ministro Ilmar Galvão); Não há direito adquirido do servidor público estatutário à inalterabilidade do regime jurídico pertinente à composição dos vencimentos, desde que a eventual modificação introduzida por ato legislativo superveniente preserve o montante global da remuneração e, em consequência, não provoque decesso de caráter pecuniário (RE n. 211903 AgR/SC, relator Ministro Marco Aurélio). Figure-se a hipótese de um servidor que no passado obteve por decisão judicial o direito à percepção do adicional por tempo de serviço. Sabem todos que essa vantagem foi extinta. Nesse caso hipotético, o servidor obtém, por qualquer razão, uma contagem de tempo por decisão judicial e passa a perceber o adicional por tempo de serviço ou um acréscimo desse adicional. O regime jurídico foi alterado e o adicional foi extinto. Não é porque ele teve esse adicional por tempo de serviço, ou acréscimo, então assegurado por decisão judicial que terá direito permanentemente a receber um adicional que nenhum outro servidor receberá. O que se resolve aí é como se resolve em todos os casos de alteração de regime jurídico: com o não decesso remuneratório e a percepção de eventual diferença como vantagem pessoal a ser absorvida no futuro. Outro aspecto importante a se fixar é que não há violação de coisa julgada por ato do Tribunal de Contas da União. Não precisaria nem ser decorrente de recomendação do TCU, porque à autoridade administrativa competente, observadas as regras do Sistema de Pessoal da Administração Pública, caberá tomar as providências para ajustar as parcelas da remuneração ao regime jurídico respectivo, agregando eventual excesso a título de VPNI, por exemplo, para não haver sua redução, absorvendo-a paulatinamente. Também não deve impressionar que a iniciativa de poda do excesso foi provocada pelo TCU, fazendo parecer que a Corte de Contas estaria invadindo a seara judicial. Não é isso, porém, porque diante da mudança de regime jurídico a autoridade competente pode e deve extirpar da folha de pagamento do servidor qualquer vantagem que não tenha mais abrigo no sistema de remuneração, ainda que ela tenha sido assegurada, no passado, por decisão judicial. A decisão judicial, nesse caso, tem eficácia rebus sic stantibus, ou seja, ela produziu efeito enquanto vigorou o sistema de remuneração do servidor em cujo contexto ela foi exarada e se o regime de remuneração não mais contempla essa vantagem, não é porque ela foi assegurada por decisão judicial que vai permanecer, porque a decisão judicial perdeu a sua eficácia. De igual forma, não há que se falar em violação ao direito adquirido ou ao princípio da irredutibilidade vencimental, uma vez que inexiste direito adquirido dos servidores públicos a regime jurídico, além do que não ficou evidenciado, por qualquer modo, a ocorrência de redução remuneratória, sendo que o simples fato de ter havido mudança de na estrutura vencimental não é suficiente para demonstrar a diminuição de rendimentos, para cuja constatação deve ser considerado em seu conjunto e não cada parcela/verba isoladamente. Ainda, não há que se discutir quanto à competência do TCU conferida pela Constituição Federal, em seu art. 71, III, para apreciar a legalidade da concessão de vantagem salarial ou para determinar a exclusão de vantagem indevida paga a servidor público, ainda que em decorrência de decisão já transitada em julgado, quando verificada a sua irregularidade. Por fim, é uníssono o entendimento jurisprudencial no sentido de que os efeitos da sentença trabalhista que reconheceu vantagem salarial a servidor público celetista, proferida antes do advento da Lei n. 8.112/90, têm por limite temporal a implantação do novo Regime Jurídico Único - RJU pelo referido diploma legal. Nesse sentido, cito os seguintes precedentes desta Corte: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. URP. 26,05%. VERBA PERCEBIDA POR FORÇA DE SENTENÇA TRABALHISTA TRANSITADA EM JULGADO SUPRESSÃO POR DETERMINAÇÃO DO TCU. MANUTENÇÃO DA PARCELA NA VIGÊNCIA DO REGIME JURÍDICO ÚNICO. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. INOCORRÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA.1. Em se tratando de questão referente a vencimentos e vantagens funcionais de servidores públicos, a pessoa jurídica de direito público a qual estão funcionalmente vinculados os servidores é legitimada para figurar no polo passivo da demanda. Por sua vez, não há falar em ocorrência de decadência, pois "A jurisprudência do STF pacificou-se no sentido de que, em razão da natureza complexa do ato de aposentadoria, a decadência administrativa (artigo 54 da Lei nº 9.784/99) não se opera no período entre a concessão do benefício e o exame de sua legalidade e posterior registro pelo TCU. (MS 24859 [...]) e MS 28604 [...])." (STF, MS 27722 AgR; MS 26297 AgR; MS 25.525; MS 25.697; MS 30780 AgR; MS 34695 AgR; MS 26132 AgR; MS 31704.) "O disposto no artigo 54 da Lei nº 9.784/99, a revelar o prazo de decadência para a Administração Pública rever os próprios atos, por pressupor situação jurídica constituída, não se aplica à aposentadoria, porque esta reclama atos sequenciais [...]. Conforme consta do Verbete Vinculante nº 3 da Súmula do Supremo, o contraditório não alcança o processo de registro de aposentadoria." (STF, MS 25561; MS 25551).2. A parte autora é servidora pública que teve incorporado a seus proventos de aposentadoria a vantagem URP (26,05%) relativa a fevereiro de 1989, garantida por sentença trabalhista transitada em julgado. Com a instituição do Regime Jurídico Único, a vantagem foi suprimida administrativamente por determinação do Tribunal de Contas da União.3. No caso, não há falar em ofensa a coisa julgada, pois a superveniência da Lei nº 8.112/90 estanca a competência da Justiça do Trabalho para dirimir questões afetas ao vínculo de emprego anteriormente mantido com a Administração, ainda que se cuide do reconhecimento de parcela de trato sucessivo, nascida desse contrato, dada a impossibilidade de a Justiça Especial vir a executar o adimplemento de obrigação que se torne devida já sob a égide do regime estatutário. Logo, os efeitos da sentença trabalhista têm por limite temporal o advento do referido diploma. Neste sentido: STF, RE-AgR 330835/RS, Rel. Min. Carlos Britto, Primeira Turma, DJ de 28/09/2004.4. Honorários sucumbenciais mantidos conforme determinado pelo juízo a quo, eis que fixados de acordo com o disposto no art. 20 do CPC/73, vigente à época da prolação da sentença.5. Apelação da parte autora desprovida.(TRF1, AC 0035477-23.2013.4.01.3700, relator Desembargador Federal João Luiz de Sousa, Segunda Turma, PJe 25/08/2022.) ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. URP (PLANOS BRESSER - 26,06%, VERÃO - 26,05% E COLLOR - 84,32%). VÍNCULO CELETISTA. SENTENÇA TRABALHISTA. LIMITAÇÃO TEMPORAL ATÉ O REGIME ESTATUTÁRIO (LEI Nº 8.112, 12/12/90). SUPRESSÃO DE INCORPORAÇÃO SALARIAL.1. A vantagem salarial de servidor público sob o vínculo celetista conquistado na via judicial em reclamação trabalhista relativamente a período anterior à instituição do regime estatutário tem eficácia até o limite temporal da vigência do RJU, com o advento da Lei nº 8.112/90, inexistindo direito adquirido em manter tal vantagem incorporada à sua remuneração.2. A coisa julgada reconhecendo direitos trabalhistas a servidores públicos, não estende seus efeitos a período posterior a edição de lei modificadora do regime jurídico dos mesmos servidores, porque não tem condão de impedir o advento da lei nova que altere tal regime, sendo que não existe direito adquirido à incorporação aos salários, vencimentos, proventos, soldos e pensões, do índice de reajuste de 26, 05% de fevereiro de 1989 (Lei nº 7.730/89) e ao IPC de junho/1987 (26,06%) (Súmula 28-TRF/1ª Região). Precedentes: TRF1 - AC 00325580620044013400 - Rel. JUÍZA FEDERAL ROSIMAYRE GONCALVES DE CARVALHO, 2ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 DATA:13/12/2012 PAGINA:279; TRF1 - AC 00155109520044013800 - Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS OLAVO, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 DATA:24/03/2010 PAGINA:77; TRF1 - AMS 00029286520064014100 - Rel. JUIZ FEDERAL CLEBERSON JOSÉ ROCHA (CONV.), SEGUNDA TURMA, e-DJF1 DATA:05/06/2013 PAGINA:117. (AMS 0003364-24.2006.4.01.4100, JUIZ FEDERAL ANTÔNIO FRANCISCO DO NASCIMENTO, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 20/07/2016 PAG.)3. Apelação da parte autora desprovida.(TRF1, AC 0000196-85.2012.4.01.3200, relator Desembargador Federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, Primeira Turma, PJe 08/03/2021.) O e. STF também já se pronunciou sobre essa temática, em sede de repercussão geral (Tema 494), no julgamento do RE 596.663/RJ, firmando o entendimento de que a eficácia das sentenças sobre relações jurídicas de trato continuado permanece enquanto se mantiverem inalterados os pressupostos fáticos e jurídicos que embasaram o provimento sentencial. Confira-se: CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA AFIRMANDO DIREITO À DIFERENÇA DE PERCENTUAL REMUNERATÓRIO, INCLUSIVE PARA O FUTURO. RELAÇÃO JURÍDICA DE TRATO CONTINUADO. EFICÁCIA TEMPORAL. CLÁUSULA REBUS SIC STANTIBUS. SUPERVENIENTE INCORPORAÇÃO DEFINITIVA NOS VENCIMENTOS POR FORÇA DE DISSÍDIO COLETIVO. EXAURIMENTO DA EFICÁCIA DA SENTENÇA.1. A força vinculativa das sentenças sobre relações jurídicas de trato continuado atua rebus sic stantibus: sua eficácia permanece enquanto se mantiverem inalterados os pressupostos fáticos e jurídicos adotados para o juízo de certeza estabelecido pelo provimento sentencial. A superveniente alteração de qualquer desses pressupostos (a) determina a imediata cessação da eficácia executiva do julgado, independentemente de ação rescisória ou, salvo em estritas hipóteses previstas em lei, de ação revisional, razão pela qual (b) a matéria pode ser alegada como matéria de defesa em impugnação ou em embargos do executado.2. Afirma-se, nessa linha de entendimento, que a sentença que reconhece ao trabalhador ou servidor o direito a determinado percentual de acréscimo remuneratório deixa de ter eficácia a partir da superveniente incorporação definitiva do referido percentual nos seus ganhos.3. Recurso extraordinário improvido.(STF, RE 596.663, relator Ministro Marco Aurélio, relator p/ acórdão Ministro Teori Zavascki, Pleno, julgado em 24/09/2014, repercussão geral, DJe-232 de 26/11/2014). Diante desse quadro, não assiste razão à parte autora quanto à pretensão de restabelecimento do reajuste de 26,05% nos seus proventos. De outro lado, a questão relativa à restituição ao erário de parcelas pagas a servidor público por erro da Administração depende da análise dos princípios da confiança e da boa-fé. Em julgamento sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos, firmou o entendimento de que o art. 46, caput, da Lei n. 8.112/90 deve ser interpretado com base no princípio da boa-fé, nos casos de interpretação errônea de lei (REsp 1.244.182/PB, Tema 531). Confira-se o precedente citado: ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. ART. 46, CAPUT, DA LEI N. 8.112/90 VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA DE LEI. IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO. BOA-FÉ DO ADMINISTRADO. RECURSO SUBMETIDO AO REGIME PREVISTO NO ARTIGO 543-C DO CPC.1. A discussão dos autos visa definir a possibilidade de devolução ao erário dos valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, quando pagos indevidamente pela Administração Pública, em função de interpretação equivocada de lei.2. O art. 46, caput, da Lei n. 8.112/90 deve ser interpretado com alguns temperamentos, mormente em decorrência de princípios gerais do direito, como a boa-fé.3. Com base nisso, quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público.4. Recurso afetado à Seção, por ser representativo de controvérsia, submetido a regime do artigo 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ.5. Recurso especial não provido.(REsp 1244182/PB, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/10/2012). Em momento posterior, o colendo STJ revisou o referido precedente (Tema 531) e, também sob o rito dos recursos repetitivos (REsp 1.769.209/AL e 1.769.306/AL, Tema 1.009), analisou “a abrangência da devolução ao Erário de valores recebidos por servidor público quando o pagamento ocorreu por erro operacional da Administração”. Eis o precedente: ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ARTIGO 46, CAPUT, DA LEI N. 8.112/1990. TESE DEFINIDA NO TEMA 531-STJ. AUSÊNCIA DE ALCANCE NOS CASOS DE PAGAMENTO INDEVIDO DECORRENTE DE ERRO DE CÁLCULO OU OPERACIONAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO. SALVO INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.1. Delimitação do Tema: A afetação como representativo de controvérsia e agora trazido ao colegiado consiste em definir se a tese firmada no Tema 531/STJ seria igualmente aplicável aos casos de erro operacional ou de cálculo, para igualmente desobrigar o servidor público, de boa-fé, a restituir ao Erário a quantia recebida a maior.2. No julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.244.182/PB (Tema 531/STJ), definiu-se que quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, de boa-fé, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, o que está em conformidade com a Súmula 34 da Advocacia Geral da União - AGU.3. O artigo 46, caput, da Lei n. 8.112/1990 estabelece a possibilidade de reposições e indenizações ao erário. Trata-se de disposição legal expressa, plenamente válida, embora com interpretação dada pela jurisprudência com alguns temperamentos, especialmente em observância aos princípios gerais do direito, como boa-fé, a fim de impedir que valores pagos indevidamente sejam devolvidos ao Erário.4. Diferentemente dos casos de errônea ou má aplicação de lei, onde o elemento objetivo é, por si, suficiente para levar à conclusão de que o servidor recebeu o valor de boa-fé, assegurando-lhe o direito da não devolução do valor recebido indevidamente, na hipótese de erro operacional ou de cálculo, deve-se analisar caso a caso, de modo a averiguar se o servidor tinha condições de compreender a ilicitude no recebimento dos valores, de modo a se lhe exigir comportamento diverso perante a Administração Pública.5. Ou seja, na hipótese de erro operacional ou de cálculo não se estende o entendimento firmado no Recurso Especial Repetitivo n. 1.244.182/PB, sem a observância da boa-fé objetiva do servidor, o que possibilita a restituição ao Erário dos valores pagos indevidamente decorrente de erro de cálculo ou operacional da Administração Pública.6. Tese representativa da controvérsia fixada nos seguintes termos: Os pagamentos indevidos aos servidores públicos decorrentes de erro administrativo (operacional ou de cálculo), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, estão sujeitos à devolução, ressalvadas as hipóteses em que o servidor, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.7. Modulação dos efeitos: Os efeitos definidos neste representativo da controvérsia, somente devem atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.8. Solução ao caso concreto (inciso IV do art. 104-A do RISTJ): Cinge-se a controvérsia na origem acerca da legalidade de ato administrativo do Diretor Geral do Departamento de Administração de Pessoal da Universidade Federal de Alagoas - UFAL, onde se impôs ao impetrante, servidor público do Magistério Superior, o desconto em folha de pagamento de valores recebidos a maior no cálculo de parcela de anuênio no período de 22/2/2020 a 31/3/2015, na ordem de 2%.Como bem decidido pelo acórdão recorrido, de fato, era difícil a identificação do pagamento a maior por parte do servidor, haja vista que nos contracheques não constam o percentual nem a base de cálculo de anuênio. Assim, recebida de boa-fé, afasta-se a reposição da quantia paga indevidamente.9. Recurso especial conhecido e improvido. Julgamento submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos.(REsp 1769209/AL, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 19/05/2021). Considerando-se o que foi decidido no Tema 1.009, a análise da existência de boa-fé do servidor, nos casos em que o pagamento ocorreu por erro material da Administração, torna-se questão essencial para a solução da lide. Em precedente que trata de matéria análoga, o STJ estabeleceu critérios para identificação da boa-fé objetiva, aos quais adiro como fundamentos deste voto, nestes termos: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE, POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL NÃO DEFINITIVA. REFORMA DA DECISÃO EM RECURSO ESPECIAL. CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA. INEXISTÊNCIA DE COMPORTAMENTO AMPARADO PELO DIREITO NO CASO CONCRETO. POSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES ART. 46 DA LEI N. 8.112/90.1. A posição jurisprudencial desta Corte, segundo a qual o recebimento de verbas de boa-fé, por servidores públicos, por força de interpretação errônea, caracteriza má aplicação da lei ou erro da administração.2. Sobre a boa-fé, o Superior Tribunal de Justiça tem considerado, ainda que implicitamente, um elemento fático como decisivo na sua identificação: trata-se da legítima confiança ou justificada expectativa que o beneficiário adquire de que os valores recebidos são legais.3. Quando a Administração Pública comete um erro contábil ou interpreta erroneamente uma lei e, com isso, paga em excesso a um servidor, cria-se neste a falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, até porque os atos administrativos possuem a presunção de legalidade. O mesmo ocorre quando a decisão judicial transita em julgado em favor dos servidores. O trânsito em julgado proporciona a confiança de que os valores integraram definitivamente o patrimônio do beneficiário. Nesses casos, eventual utilização dos recursos por parte dos servidores para a satisfação das necessidades materiais e alimentares é plenamente justificada. Objetivamente, a fruição do que foi recebido indevidamente está acobertada pela boa-fé, que, por sua vez, é consequência da legítima confiança de que os valores integravam o patrimônio do beneficiário. (...)(AgRg no AREsp n. 144.877/CE, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 22/5/2012, DJe de 29/5/2012.) Desse modo, não há que se falar em reposição ao erário na espécie, em observância à modulação dos efeitos do julgado proferido pelo e. STJ no Tema 1009, considerando a data de distribuição destes autos na primeira instância, bem como porque o pagamento de parcelas indevidas ocorreu por erro operacional da Administração, com a demonstração da boa-fé do servidor. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora, à apelação da UFMA e à remessa necessária. Deixa-se de majorar os honorários recursais por cuidar-se de sentença proferida sob a égide do CPC/1973. É o voto. Juiz Federal DIEGO CARMO DE SOUSA Relator Convocado PODER JUDICIÁRIO FEDERAL TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 0038266-97.2010.4.01.3700 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) APELANTE: HELIO DE SOUZA PINTO e outros APELADO: HELIO DE SOUZA PINTO e outros EMENTA ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. URP. 26,05%. VERBA PERCEBIDA POR FORÇA DE SENTENÇA TRABALHISTA TRANSITADA EM JULGADO SUPRESSÃO POR DETERMINAÇÃO DO TCU. MANUTENÇÃO DA PARCELA NA VIGÊNCIA DO REGIME JURÍDICO ÚNICO. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS E À COISA JULGADA NÃO CONFIGURADA. 1. A pretensão inicial é de manutenção nos vencimentos/proventos da parte impetrante do reajuste de 26,05% referente à URP de fevereiro/89, que lhe foi assegurado por decisão judicial transitada em julgado na Justiça do Trabalho, com a determinação de suspensão do pagamento pelo Tribunal de Contas da União – TCU. 2. Este Tribunal decidiu em casos semelhantes que não há acolher a defesa processual de ilegitimidade passiva ad causam, aduzida pela Universidade Federal do Maranhão -UFMA. Com efeito, o Autor é Servidor aposentado dessa instituição de ensino superior, que goza de autonomia administrativa, financeira e orçamentária, e a quem cabe, por conseguinte, a gestão da folha de pagamento do Requerente (AC 0033043-61.2013.4.01.3700, relator Desembargador Federal Francisco Neves da Cunha, Segunda Turma, e-DJF1 20/08/2019). 3. Não subsiste a alegação de impossibilidade jurídica do pedido, suscitada pela UFMA, visto que a pretensão da parte autora não era vedada pelo ordenamento jurídico então em vigor. A propósito, como há muito vem decidindo esta Primeira Turma em casos semelhantes, “inexiste impossibilidade jurídica do pedido se não há no ordenamento jurídico pátrio vedação alguma à apreciação da matéria discutida, que versa sobre critério de remuneração de servidor público” (AC 0049596-90.1997.4.01.0000, relator Juiz Federal convocado Evaldo de Oliveira Fernandes, filho, Primeira Turma, e-DJF1 04/11/2008, p. 13). 4. Quanto à decadência do direito do TCU rever atos concessivos de aposentadoria/pensão a servidores públicos, inclusive no que tange às parcelas incorporadas aos respectivos proventos, tem decidido esta Corte que “o aperfeiçoamento do ato complexo de concessão de aposentadoria/pensão ocorre apenas com seu registro pelo Tribunal de Contas da União - TCU, após a devida análise de sua legalidade, no exercício de seu controle externo estabelecido na Constituição Federal. Entretanto, com fundamento nos princípios da segurança jurídica e da confiança, bem como à luz do disposto nos arts. 5º, LXXXV e LV, 37, caput, 71 e 74 da CF/88, o e. Supremo Tribunal Federal decidiu no Tema 445 da repercussão geral sobre a incidência do prazo de 5 anos previsto no art. 54 da Lei 9.784/99 para a Administração anular ato de concessão de aposentadoria, notadamente acerca do termo inicial do prazo decadencial. 4. ‘Em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de 5 anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas’ (Tema 445/STF)”. Na linha da mesma jurisprudência, considerando se tratar de mandado de segurança com vários impetrantes, o que dificulta a “particularização e [...] individualização, no atual momento processual, das situações funcionais dos servidores [...], o que somente será apurado em eventual execução individual a ser promovida pelos beneficiários do título judicial, deve ser reconhecida a decadência do direito de a Administração promover a revisão do ato de concessão das aposentadorias/pensões dos servidores [...], quando decorrido prazo superior a 5 (cinco) anos entre a chegada do processo respectivo na Corte de Contas e o julgamento de legalidade do ato de concessão da aposentadoria/pensão” (AC 1005368-10.2020.4.01.3200, Desembargador Federal Morais da Rocha, Primeira Turma, PJe 05/06/2023). 5. A determinação do TCU para que cessasse o pagamento da URP de fevereiro de 1989 (26,05%) nos vencimentos/proventos dos servidores, considerada ilegal após a sua absorção por novo regime de vencimentos, não atenta contra a coisa julgada, uma vez que tal valor não se incorpora definitivamente à remuneração dos servidores. Precedentes do e. STF: MS 25.777 AgR, relator Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, julgado em 29/09/2015, DJ de 22/10/2015; MS 33.399 AgR, relator Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 19/05/2015, DJe de 02/06/2015). 6. Não há que se falar que a supressão do reajuste de 26,05% incorreu em violação ao direito adquirido ou ao princípio da irredutibilidade vencimental, uma vez que inexiste direito adquirido dos servidores públicos a regime jurídico, além do que não ficou evidenciado, por qualquer modo, a ocorrência de redução remuneratória, sendo que o simples fato de ter havido mudança na estrutura vencimental não é suficiente para demonstrar a diminuição de rendimentos, para cuja constatação deve ser considerado em seu conjunto e não cada parcela/verba isoladamente. 7. Não há que se discutir a competência do TCU conferida pela Constituição Federal, em seu art. 71, III, para apreciar a legalidade da concessão de vantagem salarial ou para determinar a exclusão de vantagem indevida paga a servidor público, ainda que em decorrência de decisão já transitada em julgado, quando verificada a sua irregularidade. 8. O entendimento jurisprudencial firmou-se no sentido de que os efeitos da sentença trabalhista que reconheceu vantagem salarial a servidor público celetista, proferida antes do advento da Lei n. 8.112/1990, têm por limite temporal a implantação do novo Regime Jurídico Único - RJU pelo referido diploma legal. Nesse sentido, os seguintes precedentes desta Corte: AC 0035477-23.2013.4.01.3700, relator Desembargador Federal João Luiz de Sousa, Segunda Turma, PJe 25/08/2022; AC 0000196-85.2012.4.01.3200, relator Desembargador Federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, Primeira Turma, PJe 08/03/2021. 9. O Supremo Tribunal Federal já se pronunciou sobre essa temática, em sede de repercussão geral (Tema 494), no julgamento do RE 596.663/RJ, firmando o entendimento de que a eficácia das sentenças sobre relações jurídicas de trato continuado permanece enquanto se mantiverem inalterados os pressupostos fáticos e jurídicos que embasaram o provimento sentencial. 10. De outro lado, a questão relativa à restituição ao erário de parcelas pagas a servidor público por erro da Administração depende da análise dos princípios da confiança e da boa-fé. Em julgamento sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos, firmou o entendimento de que o art. 46, caput, da Lei n. 8.112/90 deve ser interpretado com base no princípio da boa-fé, nos casos de interpretação errônea de lei (REsp 1.244.182/PB, Tema 531). 11. Negado provimento à apelação da parte autora, à apelação da UFMA e à remessa necessária. A C Ó R D Ã O Decide a Nona Turma negar provimento à apelação da parte autora, à apelação da UFMA e à remessa necessária, à unanimidade, nos termos do voto do Relator. Brasília (DF), (data da Sessão). Juiz Federal DIEGO CARMO DE SOUSA Relator Convocado

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Processo nº 0019180-81.2009.8.11.0041

ID: 315402060

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0019180-81.2009.8.11.0041

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

GUILHERME DA COSTA GARCIA HUMBERTO MELO BOSAIPO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

MARIA ABADIA PEREIRA DE SOUZA AGUIAR

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MARIA ANTONIETA SILVEIRA CASTOR

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JORGE AURELIO ZAMAR TAQUES

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PAULO CESAR ZAMAR TAQUES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 0019180-81.2009.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Dano ao Erário] Relator: Des(a). MAR… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 0019180-81.2009.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Dano ao Erário] Relator: Des(a). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO Turma Julgadora: [DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), JOSE GERALDO RIVA - CPF: 387.539.109-82 (APELANTE), GUSTAVO LISBOA FERNANDES - CPF: 021.663.661-20 (ADVOGADO), ALMINO AFONSO FERNANDES - CPF: 251.784.401-10 (ADVOGADO), HUMBERTO MELO BOSAIPO - CPF: 094.169.601-44 (APELANTE), MARIA ABADIA PEREIRA DE SOUZA AGUIAR - CPF: 009.824.698-45 (ADVOGADO), GUILHERME DA COSTA GARCIA - CPF: 001.706.071-00 (APELANTE), PAULO CESAR ZAMAR TAQUES - CPF: 469.178.881-68 (ADVOGADO), JORGE AURELIO ZAMAR TAQUES - CPF: 424.493.401-49 (ADVOGADO), MARIA ANTONIETA SILVEIRA CASTOR - CPF: 838.963.171-72 (ADVOGADO), NIVALDO DE ARAUJO - CPF: 042.675.241-49 (APELANTE), MARIO RIBEIRO DE SA - CPF: 026.574.901-82 (ADVOGADO), NICHELI MARIEM ARRUDA JAUDY DE ARAUJO - CPF: 954.991.801-72 (APELANTE), NICHELI MARIEM ARRUDA JAUDY DE ARAUJO - CPF: 954.991.801-72 (TERCEIRO INTERESSADO), NIVALDO DE ARAUJO - CPF: 042.675.241-49 (TERCEIRO INTERESSADO), JOSE GERALDO RIVA - CPF: 387.539.109-82 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO A EXCELENTÍSSIMA SRA. DESA. RELATORA MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, 1º VOGAL EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JÚNIOR E 2º VOGAL EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA. EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO DECORRENTE DA PRÁTICA DE ATO ÍMPROBO. DESVIO DE VERBAS MEDIANTE EMPRESA DE FACHADA. DOLO COMPROVADO. RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL DOS GESTORES PÚBLICOS. UTILIZAÇÃO VÁLIDA DA PROVA EMPRESTADA E DE COLABORAÇÃO PREMIADA. RECURSOS NÃO PROVIDOS. SENTENÇA MANTIDA. I. Caso em exame 1. Recursos de apelação interpostos contra sentença que julgou parcialmente procedente a ação civil pública, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, com objetivo de ressarcimento ao erário no montante de R$ 1.899.538,50, em razão de desvio de verbas públicas mediante cheques emitidos à empresa de fachada, sem comprovação de contraprestação. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar: (i) a comprovação do dolo específico exigido pela Lei n.° 8.429/92, com as alterações da Lei n.° 14.230/21, para configuração do ato de improbidade administrativa com dano ao erário; (ii) se a colaboração premiada homologada judicialmente pode ser validamente utilizada em ação civil pública de ressarcimento ao erário por ato de improbidade administrativa; (iii) se é legítima a utilização de prova emprestada, respeitado o contraditório. III. Razões de decidir 3. De acordo com o Supremo Tribunal Federal (Tema n.° 897), os pedidos de ressarcimento fundados no artigo 37, § 5°, da Constituição da República, reclamam o reconhecimento de ato de improbidade doloso como causa do prejuízo alegado. 4. Com as modificações trazidas pela Lei n.° 14.230/21, para a configuração de ato de improbidade administrativa que importa em prejuízo ao erário, tipificado no artigo 10, da Lei n.° 8.429/92, exige-se a comprovação de dolo específico, além da de efetiva perda patrimonial. 5. Os documentos constantes dos autos evidenciam a emissão reiterada de cheques em favor de empresa fictícia, sem amparo contratual ou comprovação de fornecimento de bens ou serviços, configurando atuação dolosa dos agentes públicos. 6. A colaboração premiada de um dos réus, homologada judicialmente e corroborada por outros elementos de prova, reforça a narrativa da conduta dolosa. 7. A utilização de prova emprestada é válida, desde que oportunizado o contraditório às partes, o que se verificou nos autos. 8. A conduta dos apelantes transcendeu a mera omissão funcional, caracterizando participação ativa na execução de esquema de desvio sistemático de recursos públicos, o que justifica a condenação ao ressarcimento integral. IV. Dispositivo e tese 9. Recursos de apelação conhecidos não providos. Tese de julgamento: "1. É devido o ressarcimento ao erário, em razão de ato ímprobo, quando comprovada a conduta dolosa do agente público que, de forma consciente e reiterada, autoriza pagamentos vultosos a empresa de fachada, sem respaldo documental ou comprovação de contraprestação, causando prejuízo efetivo. 2. A demonstração do dolo específico pode decorrer da análise contextual dos elementos objetivos e documentais, inclusive mediante a validação judicial de colaboração premiada corroborada por provas materiais. 3. É legítima a utilização de prova emprestada, desde que respeitado o contraditório, para reforçar a autoria e a materialidade dos atos ímprobos imputados aos réus”. Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5º, XL e LV; art. 37, § 4º e § 5º; Lei n.° 8.429/92, arts. 1º, § 1º e § 4º, 10 e 17. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Plenário, j. 18.08.2022; STF, ARE 1175650, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Plenário, j. 03.07.2023; STJ, REsp 1601868/SC, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, 1ª T., j. 13.08.2024; STJ, AgInt no RMS 61408/RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., j. 11.05.2020. RELATÓRIO: Egrégia Câmara: Trata-se de RECURSOS DE APELAÇÃO, interpostos por HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA, contra a sentença proferida pela Excelentíssima Juíza de Direito, Dra. Célia Regina Vidotti, nos autos de n.° 0019180-81.2009.811.0041, em trâmite perante a Vara Especializada em Ações Coletivas da Comarca de Cuiabá, MT, que julgou procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (ID. 279221428): “Vistos etc. Cuida-se de Ação Civil Pública de Ressarcimento de Danos Causados ao Erário, com pedidos liminares, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, em face de José Geraldo Riva, Humberto Melo Bosaipo, Espólio de Nivaldo de Araújo e Guilherme da Costa Garcia, com fundamento no art. 37, §5º, da Constituição Federal e da Lei nº 7.347/85. O requerente alegou, em síntese, que os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Melo Bosaipo, na qualidade de gestores responsáveis pela Administração da Assembleia Legislativa Estadual, foram responsáveis por desvios na ordem de R$1.899.538,50 (um milhão, oitocentos e noventa e nove mil, quinhentos e trinta e oito reais e cinquenta centavos), identificados por trinta e nove (39) cheques nominais à empresa Livraria e Papelaria Palácio Ltda. Apontou que a empresa acima mencionada nunca existiu e que foi criada fradulentamente, para justificar a emissão dos cheques, para o esquema de lavagem e desvio de dinheiro público perpetrado pelos requeridos. Afirmou que os requeridos Guilherme Garcia e Nivaldo de Araújo, ocupavam à época dos fatos, cargos nos setores de finanças, patrimônio e licitação da AL/MT, tendo colaborado para a prática dos atos fraudulentos, concorrendo com os demais requeridos nas práticas ilícitas descritas na inicial. Asseverou que as sanções pela prática do ato de improbidade administrativa não poderão ser aplicadas, em face da prescrição, afirmando ser perfeitamente possível buscar o ressarcimento ao erário, nos termos do art. 37, § 5º, da Constituição Federal. Requereu, liminarmente, a indisponibilidade de bens dos requeridos, além da exibição de todos os documentos relativos às licitações, que envolvam a empresa Livraria e Papelaria Palácio Ltda., conforme descrito na inicial. No mérito requereu a condenação dos requeridos ao ressarcimento do dano causado ao Estado de Mato Grosso, no valor de R$1.899.538,50 (um milhão, oitocentos e noventa e nove mil, quinhentos e trinta e oito reais e cinquenta centavos). Pela decisão de Id. 62057258 – fls. 42/48 foi indeferido o pedido liminar de indisponibilidade de bens, deferido o pedido liminar de exibição de documentos, bem como foi determinada a intimação do Estado de Mato Grosso, para manifestar interesse na ação, determinando-se a citação dos requeridos. O Estado de Mato Grosso, por intermédio da Procuradoria Geral, manifestou afirmando que não tinha interesse na ação neste momento processual. O requerido Humberto de Melo Bosaipo, por seu patrono, apresentou contestação (Id. 62057265 – fls. 13/24), arguindo a preliminar de nulidade do inquérito civil, por excesso de prazo e, incompetência do Promotor de Justiça que o conduziu. No mérito afirmou que o requerido, na qualidade de Deputado Estadual e Presidente ou Primeiro Secretário da Casa Legislativa, não tinha a função de inspecionar cada um dos processos licitatórios e verificar a efetiva entrega dos serviços ou materiais licitados. Afirmou que não restou demonstrada qualquer ilegalidade de pagamento às empresas fornecedoras ou prestadoras de serviços, tampouco no fato de existirem cheques recebidos e trocados junto às empresas de factoring. Ressaltou, também, que não era a sua função, como membro da mesa diretora, acompanhar as minúcias de cada um dos procedimentos administrativos, sendo certo que todos os atos dos servidores ficavam registrados nos respectivos processos administrativos. Requereu, ao final, o acolhimento da preliminar e a extinção do processo sem julgamento do mérito ou a improcedência da ação. O requerido Guilherme, por seu patrono, apresentou contestação (Id. 62057265 – fls. 39/45), arguindo apenas questões de mérito. Alegou que a ação não descreve quais os supostos benefícios ou a sua ligação com os demais requeridos. Afirmou que no tocante a empresa mencionada na inicial, o requerido não a conhece ou os seus sócios, assim como não conhecia a grande maioria dos fornecedores e prestadores de serviços da AL/MT, na época em que exerceu o cargo de secretário de finanças. Arguiu que se houve pagamento da Assembleia Legislativa à empresa referida, certamente foram em decorrência da efetiva prestação de serviços ou fornecimento de materiais, precedida de licitação, celebração de contrato administrativo e recebimento do material ou serviço. Sustentou que todos os cheques assinados pelo requerido se deram mediante a apresentação dos respectivos procedimentos, onde todas as fases foram cumpridas e atestadas, não havendo nos autos qualquer fato que demonstre irregularidades. Requereu, ao final, a improcedência da ação e a produção de todos os meios de provas admitidos no direito. Os requeridos José Geraldo Riva e Nivaldo de Araújo, representados por seu patrono, apresentaram manifestação nominada de “resposta” (Id. 62057265 –fls. 53/69 e Id. 62057277 – fls. 01/16), arguindo em preliminar a incompetência absoluta deste Juízo, em razão da inconstitucionalidade formal e material do provimento n.º 004/2008/CM; a inconstitucionalidade dos Provimentos 19/2013/CM, 32/2013/CM, 36/2013/CM e 37/2013/CM, uma vez que instituíram regime de exceção na Vara Especializada, afirmando ser esta incompetente, além de configurar ofensa ao princípio do juiz natural. Arguiram, ainda, que os agentes políticos não respondem por atos de improbidade administrativa, mas sim, por crime de responsabilidade (Lei 1.079/50), sendo necessária a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso. No mérito, alegaram a ausência de prova que possa, ao menos, ser indicativo de que os requeridos tenham praticado conduta capaz de causar algum dano ao erário. Afirmaram que o Tribunal de Contas do Estado julgou regular as contas do parlamento estadual, o que significa dizer que todos os pagamentos efetuados pela AL/MT foram feitos em harmonia com a legislação pertinente. Sustentaram que sempre pautaram as suas ações em obediência aos princípios insculpidos na Constituição Federal e, que as provas trazidas pelo Ministério Público do Estado foram obtidas por meio ilegal, não produzindo nenhum efeito no ordenamento jurídico. Requereram, ao final, o reconhecimento das preliminares e a extinção sem resolução do mérito ou a improcedência dos pedidos, afirmando que faltam razões lógicas e a ação não possui os fundamentos legais, jurídicos e constitucionais indispensáveis ao seu prosseguimento. O Ministério Público do Estado, por seu representante, apresentou impugnação às contestações (Id. 62060086 – fls. 43/44), afirmando que as argumentações apresentadas pelos requeridos não trazem nada de novo e, por isso, ratificou integralmente os argumentos constantes na inicial. Os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Melo Bosaipo, por seus patronos, arguiram a incompetência absoluta deste Juízo. No Id. 62060797 – fl. 04 a tramitação da ação foi suspensa diante da noticia do falecimento do requerido Nivaldo Araújo. O representante do Ministério Público do Estado de Mato Grosso afirmou que ajuizou a Ação de Habilitação, para substituir o requerido Nivaldo de Araújo pelo representante do espólio. Pela decisão constante no Id. 62060797 fl. 10, a Sra. Nicheli Mariem Jaudy foi habilitada como representante do espólio do requerido Nivaldo Araújo. O requerido José Geraldo Riva noticiou o “Acordo de Colaboração Premiada” firmado com o Ministério Público e homologado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, retificando a sua defesa e reconhecendo a procedência dos pedidos da ação. O representante do Ministério Público do Estado de Mato Grosso requereu “a homologação do reconhecimento da procedência do pedido feito pelo requerido José Geraldo Riva”, bem como o compartilhamento do acordo de colaboração premiada, em relação aos fatos narrados neste processo. No despacho de Id. 62061413 fl. 09 foi determinado que o requerente juntasse aos autos, copia do anexo da colaboração premiada firmada pelo requerido Jose Geraldo Riva, referente as fatos deste processo, o que foi cumprido. No Id. 67826728 foi determinada a intimação das partes, para indicarem quais provas pretendiam produzir. No Id. 70606720 o requerido Guilherme Garcia pugnou pela produção de prova testemunhal, bem como pela perícia de documentos. O representante do Ministério Público Estadual requereu a produção de prova testemunhal e a produção de prova emprestada das oitivas realizadas perante a 7ª Vara Criminal, no bojo da Ação Penal n. 12284-19.2009.811.0042 (Cód. 145113). Na decisão de Id. 93115330, o processo foi saneado; as preliminares e prejudiciais do mérito arguidas pelas defesas dos requeridos foram afastadas, fixando-se os pontos controvertidos; bem como foi determinada a intimação do requerente e do requerido Guilherme para manifestarem sobre o interesse no aproveitamento de provas em processos semelhantes. No id. 94627045, o requerente manifestou favorável ao aproveitamento das provas produzidas nos autos nº0025212-73.2007.8.11.0041; n. 0005491-72.2006.811.0041 e; n. 0026893-44.2008.811.0041; requerendo o aproveitamento dos depoimentos do requerido José Geraldo Riva e das testemunhas Katia Maria Aprá, Nilson Roberto Teixeira condicionado à observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Reiterou o pedido de prova emprestada do juízo criminal, referente aos depoimentos das testemunhas Juracy Brito, Cristiano Guerino Volpato e Romildo Rosa Nascimento, bem como requereu a redesignação da audiência, para as oitivas das testemunhas Charles Palácio de Massedo e José Antonelli Vieira Filho. No id. 95370440, o requerido Guilherme Garcia, por seu patrono, concordou com o compartilhamento de provas, bem como reiterou os pedidos de juntada integral da delação premiada e pela produção de prova pericial. Na decisão de Id. 107413666 foi determinada a intimação das partes, para manifestarem se concordavam com a utilização de depoimentos das testemunhas arroladas, como prova emprestada de processos semelhantes. Apenas o requerente manifestou concordância sobre a prova emprestada. No Id. 11598825 e Id. 128701300 o requerente desistiu da oitiva das testemunhas Charles Palácio de Massedo, José Antonelli Vieira Filho e Cristiano Volpato, o qual foi homologado no Id. 116038948 e Id. 134074412. Foram juntados os relatórios de mídias das provas emprestadas nos Ids. 107483554, 112725925 e 138852492. No despacho de Id. 151882075, a instrução processual foi encerrada, bem como foi determinada a intimação das partes, para apresentarem os memoriais finais. O representante do Ministério Público apresentou os memoriais finais no Id. 156454611. Na sequência, os requeridos José Geraldo Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia, por seus patronos, apresentaram os memoriais finais nos Ids. 158546311, 158947242 e 161352245. No Id. 161385095 foi certificado que o espolio de Nivaldo Araújo não apresentou seus memoriais. Os autos vieram conclusos. É o breve relato. Decido. Em primeiro lugar, verifico que o requerido Guilherme Garcia requereu, por seus memoriais, acesso integral a delação premiada do requerido José Geraldo Riva. Ocorre que não se faz necessária a sua juntada na íntegra, pois o anexo juntado aos autos é o que diz respeito aos fatos objeto desta ação. Os demais anexos tratam de outros processos e fatos que em nada se relacionam com esta ação, de forma que a juntada é dispensável, pois em nada contribuirá para o deslinde desta ação, além de comprometer o sigilo decretado no feito onde as declarações do colaborador foram prestadas. Anoto, ainda, que o i. desembargador relator da Petição n.º 3478/2020-OE-TJMT, onde se encontra a referida delação premiada, já indeferiu o acesso integral à defesa do requerido Guilherme, no processo nº 0006916-32.2009.8.11.0041, constante no Id. 163780017. Portanto, indefiro o pedido. Em relação a pedido de reconhecimento de prescrição, arguida pela defesa do requerido Humberto Bosaipo em seus memoriais, entendo que a analise do pedido encontra-se prejudicada, uma vez que a presente ação tem por objeto apenas o ressarcimento ao erário, o qual é imprescritível como definido no tema 897/STF. Passo a analise do mérito. Este processo foi distribuído antes da publicação da Lei Federal nº 14.230, de 25/10/2021, que promoveu significativas alterações na Lei n. 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de improbidade administrativa, de que trata o § 4º, do art. 37 da Constituição Federal e dá outras providências. Sobre a aplicação da nova lei, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo nº 843.989/PR, processo-paradigma do Tema n. 1.199, fixou as seguintes teses: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se – nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. As teses acima transcritas possuem caráter vinculante, nos termos do disposto nos arts. 927, inc. III e 987, § 2 º, ambos do Código de Processo Civil e, assim, devem ser observadas nos processos em curso, de modo que a nova norma será aplicada de imediato e não haverá retroatividade para as questões de caráter processual; para as alterações de caráter material, haverá retroatividade, se a nova norma for mais benéfica, respeitada a coisa julgada. Destaca-se, ainda, que a redação dada pela Lei n. 14.230/2021, ao art. 1º e parágrafos, da Lei n. 8.429/92, estabelece que apenas as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 serão consideradas atos de improbidade administrativa, ou seja, somente se admite responsabilizar os atos dolosos praticados com vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito, não bastando a voluntariedade do agente, in verbis: Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. § 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. § 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. § 3º O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa. (grifo nosso). Ainda, vejamos a jurisprudência do nosso Tribunal: JUÍZO DE RETRATAÇÃO – REPERCUSSÃO GERAL – TEMA 1.199 DO STF – ART. 1.030, II, CPC – APELAÇÃO CÍVEL – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – LICITAÇÃO – FRAUDE DEMONSTRADA – DIRECIONAMENTO DO OBJETO À EMPRESA PRÉ-DETERMINADA – VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA –IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CONFIGURADA – DOLO – ATO ÍMPROBO CONFIGURADO – JUÍZO DE RETRAÇÃO NEGATIVO – ACÓRDÃO MANTIDO. 1. NO CASO, RESTANDO Demonstrado o dolo na conduta do agente, não se verifica a existência de divergência com os fundamentos adotados na Tese de Repercussão Geral AFETA DO TEMA N. 1.199 DO STF. 2. “A Tese de Repercussão Geral (Tema nº 1199) não impôs novo julgamento da causa à luz da Lei nº 14.230, de 25 de outubro de 2021, que alterou a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992. De outro lado, cuida-se de questão a ser analisada pelo Tribunal Superior no julgamento do recurso especial.” (TJMT, JUÍZO DE RETAÇÃO N. 0042761-86.2013.8.11.0041, 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, REL. DES. LUIZ CARLOS DA COSTA, J. 18.07.2023). (N.U 0003325-50.2007.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/08/2023, Publicado no DJE 01/09/2023). Ressalta-se, ainda, que o art. 17, §10-D, da mencionada lei, estabelece que: “Para cada ato de improbidade administrativa, deverá necessariamente ser indicado apenas um tipo dentre aqueles previstos nos arts. 9º, 10 e 11, desta Lei”. Feitas essas considerações, verifico que no caso em comento a petição inicial aponta que os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Melo Bosaipo, atuando como responsáveis pela administração da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, teriam praticado atos de improbidade que causaram danos ao erário, enriquecimento ilícito e ofensa a princípios da Administração Pública, mediante fraude à licitação e desvio de recursos públicos, por meio da emissão de trinta e nove (39) cheques, em favor da empresa inexistente Livraria e Papelaria Palácio Ltda. Segundo consta da petição inicial os requeridos Guilherme Garcia e Nivaldo Araújo eram os responsáveis à época dos fatos pelos setores de finanças, patrimônio e licitação da ALMT e, estes teriam colaborado para os pagamentos dos cheques emitidos em nome da empresa inexistente Livraria e Papelaria Palácio Ltda. O representante do Ministério Público apontou que tais ilegalidades, consistentes no uso de empresa inexistente, para o desvio de verba pública, configurou a prática de ato de improbidade administrativa, que causou prejuízo ao erário. Pois bem. De inicio, saliento que o requerido José Geraldo Riva firmou acordo de colaboração premiada com o Ministério Público, devidamente homologado pelo o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, o qual é utilizado nestes autos com finalidade de corroborar os fatos narrados na inicial. Diante da celebração do acordo, o requerido José Geraldo Riva reconheceu os atos ímprobos imputados na petição inicial, o que comporta provimento de natureza declaratória, pois, caso descumpridas as condições pactuadas na colaboração premiada, poderá o requerente comunicar o juízo e buscar a imposição das penalidades impostas no acordo. Ademais, sabe-se que as declarações do colaborador não perfazem prova isoladamente, devendo existir outros elementos corroborativos, para que o Juiz possa formar a sua convicção, para proferir a decisão de mérito. Neste sentido, cabe aqui sopesar as provas contidas na referida delação, juntadas nos Ids. 62061413 ao 62061422, as quais foram confirmadas em juízo no Id. 107483554, uma vez que o colaborador narra detalhadamente como funcionava o esquema de desvio de verbas públicas da AL/MT, consistente no uso não apenas da empresa requerida nesta ação, mas de inúmeras outras empresas fictícias ou irregulares, para figurar em processos licitatórios ou aquisições simplificadas e receber o pagamento por produtos ou serviços que não foram prestados. O colaborador informa, em síntese, que o desvio de verba pública com a utilização de empresas fictícias ou irregulares era uma prática rotineira e comum desenvolvida pelos deputados estaduais, para o recebimento de propina mensal, com a finalidade de manter a governabilidade do executivo. Menciona ainda, que esses desvios ocorreram entre os anos de 1995 a 2015. Percebe-se, assim, que os fatos narrados pelo colaborador corroboram com o que está contido nos documentos que instruem a inicial. Dentre as empresas que participaram do citado esquema, a empresa Livraria e Papelaria Palácio Ltda. teria sido contratada como fornecedora de produtos ou serviços e teria sido beneficiária dos cheques emitidos pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, nos anos de 1999 a 2002. As provas produzidas nos autos demonstram que a empresa Livraria e Papelaria Palácio Ltda. foi utilizada irregularmente pelos requeridos, já que nunca funcionou no endereço constante em seu contrato social, conforme se verifica do relatório juntado no Id. 62055466 – fls. 18. E ainda, a referida empresa sequer renovou sua licença de funcionamento nos exercícios de 1999 a 2004, conforme relatório juntado no Id. 62055463 – fls. 51. Além disso, a empresa inicialmente foi constituída pelo Sr. Joel Quirino e Sra. Maria Benedita, e posteriormente, com a alteração contratual a empresa Livraria e Papelaria Palácio Ltda. foi transferida aos Sres. Charles Palácio e José Antonelli, pessoas fictícias, já que não constam como eleitores ativos e inexiste qualquer beneficio previdenciário, bem como o registro geral do suposto sócio Sr. Charles, sequer foi localizado pela secretaria de segurança do estado, conforme se verifica no Id. 62055463 – fls. 43/45, 58/61 e 63/65. Outrossim, os requeridos não apresentaram nota fiscal ou comprovante de recebimento dos produtos ou serviços, supostamente adquiridos, para justificar esses pagamentos realizados, tampouco comprovaram a existência do regular procedimento licitatório prévio. Certamente, esses produtos ou serviços, assim como a empresa, jamais existiram. Portanto, não há dúvidas de que a empresa Livraria e Papelaria Palácio Ltda. foi utilizada irregularmente, sendo assim, o pagamento à empresa indica a intenção concreta de beneficiar terceiros, com prejuízo ao erário, caracterizando o dolo na conduta ímproba. Os requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia, cada um desempenhando as suas atribuições, tinham a obrigação legal de zelar pelo correto trâmite dos procedimentos de aquisição de bens ou de prestação de serviços. No caso em comento, não há emissão de uma única nota fiscal de serviços prestados ou de produtos entregues pela empresa, a qual sequer tinha autorização para emitir nota fiscal, documento essencial no procedimento de conferencia da prestação do serviço/atesto e de empenho e pagamento, notadamente, quando se tratam de valores expressivos, que exigem modalidade licitatória mais complexa. Desta forma, está demonstrado que os requeridos não fizeram o mínimo do que se espera de um gestor público. Na análise dos autos verifico a existência de trinta e cinco (35) cópias de cheques emitidos pela Assembleia Legislativa, nominais em favor da empresa Livraria e Papelaria Palácio Ltda. quais sejam: 1) Cheque n° 983649, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056325 – fls. 70). 2) Cheque n° 000414, no valor de R$55.400,00 (cinquenta e cinco mil e quatrocentos reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056325 – fls. 73). 3) Cheque n° 000422, no valor de R$44.200,00 (quarenta e quatro mil e duzentos reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056325 – fls. 76). 4) Cheque n° 000694, no valor de R$53.365,00 (cinquenta e três mil, trezentos e sessenta e cinco reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056325 – fls. 79). 5) Cheque n° 001089, no valor de R$6.000,00 (seis mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056325 – fls. 81). 6) Cheque n° 001104, no valor de R$10.000,00 (dez mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056325 – fls. 82). 7) Cheque n° 001106, no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056325 – fls. 83). 8) Cheque n° 001107, no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056327 – fls. 01). 9) Cheque n° 001112, no valor de R$8.000,00 (oito mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056327 – fls. 02). 10) Cheque n° 001110, no valor de R$6.000,00 (seis mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056327 – fls. 04). 11) Cheque n° 001111, no valor de R$4.000,00 (quatro mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056327 – fls. 05). 12) Cheque n° 001170, no valor de R$37.200,00 (trinta e sete mil e duzentos reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056327 – fls. 07). 13) Cheque n° 001533, no valor de R$44.000,00 (quarenta e quatro mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056327 – fls. 10). 14) Cheque n° 002761, no valor de R$1.000,00 (mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056336 – fls. 04). 15) Cheque n° 002997, no valor de R$68.673,50 (sessenta e oito mil, seiscentos e setenta e três reais, cinquenta centavos); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056336 – fls. 06). 16) Cheque n° 003614, no valor de R$72.000,00 (setenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056336 – fls. 08). 17) Cheque n° 003065, no valor de R$74.400,00 (setenta e quatro mil e quatrocentos reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056336 – fls. 10). 18) Cheque n° 003480, no valor de R$72.500,00 (setenta e dois mil e quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056336 – fls. 13). 19) Cheque n° 003893, no valor de R$76.000,00 (setenta e seis mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 15). 20) Cheque n° 003865, no valor de R$62.000,00 (sessenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 18). 21) Cheque n° 003523, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056336 – fls. 22). 22) Cheque n° 005003, no valor de R$62.000,00 (sessenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056336 – fls. 26). 23) Cheque n° 005046, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056336 – fls. 30). 24) Cheque n° 005190, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056336 – fls. 34). 25) Cheque n° 007743, no valor de R$68.500,00 (sessenta e oito mil e quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia (Id. 62056336 – fls. 38). 26) Cheque n° 007258, no valor de R$47.150,00 (quarenta e sete mil, cento e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 50). 27) Cheque n° 009691, no valor de R$73.870,00 (setenta e três mil, oitocentos e setenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 54). 28) Cheque n° 009903, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 58). 29) Cheque n° 010520, no valor de R$73.870,00 (setenta e três mil, oitocentos e setenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 62). 30) Cheque n° 009917, no valor de R$70.000,00 (setenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 66). 31) Cheque n° 010754, no valor de R$66.000,00 (sessenta e seis mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 70). 32) Cheque n° 009905, no valor de R$75.000,00 (setenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 74). 33) Cheque n° 011202, no valor de R$46.410,00 (quarenta e seis mil, quatrocentos e dez reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 78). 34) Cheque n° 009911, no valor de R$75.000,00 (setenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 86). 35) Cheque n° 012207, no valor de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 62056336 – fls. 90). Já os cheques n° 907400; 0008257; 0008506 e; 011186 estão ilegíveis, não sendo possível identificar os valores e o nome da empresa, de modo que não poderão ser objeto de análise. Esses cheques foram emitidos pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, por meio de seus representantes à época, os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Bosaipo, os quais detinham a competência para autorizar esses pagamentos, totalizando o valor de R$1.677.538,50 (um milhão seiscentos e setenta e sete mil quinhentos e trinta e oito reais e cinquenta centavos). No entanto, a empresa beneficiária desses pagamentos não forneceu nenhum produto ou serviço, conforme já esclarecido acima, de modo que os requeridos efetivamente causaram danos ao erário ao permitiram esses pagamentos sem a devida contraprestação. Já o responsável pelo setor de finanças era o requerido Guilherme Garcia e, juntamente com os requeridos José Riva e Humberto Bosaipo, assinou alguns dos cheques autorizando esses pagamentos indevidos, sendo no valor total de R$927.238,50 (novecentos e vinte e sete mil, duzentos e trinta e oito reais e cinquenta centavos), correspondentes a soma dos cheques nº 0983649, nº 000422, nº 000414, nº 000694, nº 00111, nº 01089, nº 001104, nº 001106, nº 001107, nº 001112, nº 001110, nº 001170, nº 001533, nº 002761, nº 002997, nº 003614, nº 003065, nº 003480, nº 003523, nº 005003, nº 005046, nº 005190 e nº 007743. Todos esses fatos demonstram a prática de atos de improbidade administrativa, ficando evidente a existência de conluio entre os agentes públicos com o intuito de desviar dinheiro público. Assim, restou sobejamente demonstrada que os requeridos efetuaram os pagamentos para a empresa fictícia, sem a devida contraprestação, sem qualquer emissão de atesto ou comprovante de entrega dos serviços. Ainda, resguardado o direito ao contraditório e à ampla defesa, nenhum elemento foi trazido que pudesse afastar tal convicção, ou ainda indicar a boa-fé dos requeridos, de forma que resta caracterizada a prática de atos de improbidade administrativa. Não há que se falar em conduta culposa, em desídia ou falta de atenção, pois ficou demonstrado nos autos que os requeridos, cada com sua “atribuição”, concorreram para efetuar pagamentos de serviços que nunca foram prestados, tendo plena ciência de que se tratava de um procedimento, apenas para dar aparência de legalidade aos atos. Ainda, José Geraldo Riva, na condição de colaborador, também participou “do esquema”, juntamente com os demais requeridos, desviando recursos públicos, mediante contratação de empresas inexistentes ou irregulares. Suas afirmações, mesmo que venha de pessoa cujo comportamento anterior seja ética e socialmente reprovável, não retira o valor dos depoimentos prestados, em relação aos pagamentos efetuados por meio de cheques, sem a devida contraprestação. Além disso, toda a narrativa do esquema fraudulento de emissão de cheques com uso de empresas inexistentes ou irregulares é confirmada também pelas testemunhas Nilson Roberto Teixeira, Katia Maria Aprá, Romildo Rosa e Juracy Brito ouvidas em juízo (Id. 112725925 e 138852492). No caso dos autos, alia-se a estes fatos a outros elementos de prova, que encontram harmonia com o depoimento do colaborador premiado, evidenciando a ocorrência da conduta ímproba. Assim, diante da clareza dos elementos de prova documental, corroborado com a colaboração premiada, ficou evidenciado que os requeridos praticaram ato de improbidade administrativa, que efetivamente causou prejuízo ao erário. No mais, em relação ao requerido espólio de Nivaldo Araújo, embora se reconheça que a narrativa apresentada pressupõe indícios de ilegalidades praticadas pelo requerido no exercício de sua função pública, verifico, contudo, que não há qualquer conduta dolosa capaz de configurar ato de improbidade administrativa, pelo contrário, não há nos autos indícios suficientes de sua autoria ou a sua participação direta no esquema fraudulento de emissão de cheques nestes autos. Verifica-se que as imputações atribuídas ao requerido espólio de Nivaldo Araújo foram insuficientes para configurar ato de improbidade administrativa, uma vez que não existe nos autos, algum documento por ele assinado ou algum ato por ele praticado, capaz de comprovar ter agido com dolo, com o objetivo de se beneficiar de um ato ilícito. Assim, impõe-se afastar a responsabilidade deste requerido. Dessa forma, em relação aos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia, em atenção ao exposto acima, verifica-se que dentre as tipificações contidas na lei de improbidade administrativa, aquela prevista no art. 10, da Lei n.º 8.429/92, melhor se amolda aos fatos. Portanto, os requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia devem responder pela prática dos atos de improbidade descritos no art. 10, caput, da Lei nº 8.429/92. Vejamos: Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). A Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92) tutela o dever de probidade do agente público, que é o dever de: o funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer. (CAETANO, Marcello. Manual de Direito Administrativo. 1ª ed. brasileira, t. II/684. Rio de Janeiro: Forense, 1970 apud SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 649). O dolo que se exige para a configuração de improbidade administrativa reflete-se na simples vontade consciente de aderir à conduta descrita no tipo, produzindo os resultados vedados pela norma jurídica, o que ocorreu no caso em questão. Observa-se que o dolo restou configurado no momento em que os requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia, como ordenadores de despesas e responsáveis pelo setor de finanças da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, autorizaram ilegalmente o pagamento para a empresa inexistente Livraria e Papelaria Palácio Ltda, sem a devida contraprestação, causando dano ao erário. A propósito, sobre o dolo, vejamos o entendimento jurisprudencial: JUÍZO DE RETRATAÇÃO – REPERCUSSÃO GERAL – TEMA 1.199 DO STF – ART. 1.030, II, CPC – APELAÇÃO CÍVEL – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – LICITAÇÃO – FRAUDE DEMONSTRADA – DIRECIONAMENTO DO OBJETO À EMPRESA PRÉ-DETERMINADA – VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA –IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CONFIGURADA – DOLO – ATO ÍMPROBO CONFIGURADO – JUÍZO DE RETRAÇÃO NEGATIVO – ACÓRDÃO MANTIDO. 1. NO CASO, RESTANDO Demonstrado o dolo na conduta do agente, não se verifica a existência de divergência com os fundamentos adotados na Tese de Repercussão Geral AFETA DO TEMA N. 1.199 DO STF. 2. “A Tese de Repercussão Geral (Tema nº 1199) não impôs novo julgamento da causa à luz da Lei nº 14.230, de 25 de outubro de 2021, que alterou a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992. De outro lado, cuida-se de questão a ser analisada pelo Tribunal Superior no julgamento do recurso especial.” (TJMT, JUÍZO DE RETAÇÃO N. 0042761-86.2013.8.11.0041, 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, REL. DES. LUIZ CARLOS DA COSTA, J. 18.07.2023). (N.U 0003325-50.2007.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/08/2023, Publicado no DJE 01/09/2023). RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - PREJUDICIAL DE MÉRITO - PRESCRIÇÃO - TEMA 897 DO STF - NÃO OCORRÊNCIA - MÉRITO - APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.230/2021 - ELEMENTO SUBJETIVO DOLO - DEVIDAMENTE COMPROVADO - RECURSO DESPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA. 1. Prescrição. São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa (Tema 897/STF). 2. Mérito. Aquisição de grande quantidade de combustível pela Casa Legislativa do Município de Cuiabá/MT, considerando-se a frota de veículos e o período de utilização: 60.000 (sessenta mil) litros de gasolina, 25.000 (vinte e cinco mil) litros de álcool e 300 (trezentos) litros de óleo lubrificante. 3. Fatos comprovados por auditoria que atesta celeridade atípica no procedimento, aquisição de quantidade de combustível superior à demanda da entidade, em cotejo com período de utilização (dois meses) e a quantidade de veículos (dois) da frota. 4. Notas fiscais emitidas pela empresa vencedora do certame evidenciam a irregularidade do procedimento, porquanto não há informações mínimas acerca dos produtos fornecidos. 5. Demonstrado o dolo específico do recorrente em praticar as condutas vedadas pela lei em benefício próprio e prejuízo ao erário e à coletividade, impõe-se a manutenção da sentença condenatória. 6. Recurso desprovido. (N.U 0010263-34.2013.8.11.0041, Relator: Antonio Veloso Peleja Junior, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, j. em 14/03/2023, publicado no DJE 21/03/2023) (grifo nosso.) RECURSOS DE APELAÇÃO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - INOCORRÊNCIA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - PRELIMINAR - MÉRITO - APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.320/2021- DOLO DEMONSTRADO NA HIPÓTESE – DANO AO ERÁRIO DEVIDAMENTE DEMONSTRADOS – RECURSOS DESPROVIDOS – SENTENÇA MANTIDA. 1. Restando demonstrado, no caso concreto, o dolo específico dos recorrentes em praticar as condutas vedadas pela lei em benefício próprio e prejuízo ao erário e à coletividade, impõe-se a manutenção da sentença que lhes impôs condenação pela prática de ato ímprobo. 2. Recursos desprovidos. (N.U 0008931-83.2012.8.11.0003, Relator: Gerardo Humberto Alves Silva Junior, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, j. em 07/02/2023, publicado no DJE 07/03/2023). (grifo nosso). Desse modo, estando suficientemente comprovados os fatos descritos na inicial, com relação aos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Guilherme Garcia ficou configurada a prática do ato de improbidade administrativa descrita no art. 10 da Lei 8.429/92. Porém, encontra-se prescrita a aplicação da sanção imposta no art. 12, da referida lei. Entretanto, a prescrição desses atos ímprobos não alcança a ação de ressarcimento dos prejuízos causados, nos termos da decisão do Supremo Tribunal Federal em sede de repercussão geral (Tema 897): São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. Portanto, mostra-se devida a condenação dos requeridos em ressarcir o erário, em razão da prática de ato doloso tipificado no art. 10, da Lei de Improbidade Administrativa, pelo prejuízo efetivamente causado referente a somatória dos cheques emitidos em favor da empresa Livraria e Papelaria Palácio Ltda., cujo pagamento foi efetuado sem nenhuma contraprestação. Desta forma, inegável a obrigação dos requeridos em devolver aos cofres públicos o valor do efetivo dano causado ao erário. A imposição de ressarcimento ao erário se faz necessária e exprime a ideia de contraprestação, equivalente à reparação dos danos efetivamente causados pelo agente que, ilicitamente, contribuiu para a sua ocorrência. No caso em comento, esse dano corresponde aos valores pagos por serviços que não foram prestados. Diante do exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos, em relação ao requerido José Geraldo Riva, para reconhecer e declarar a prática do ato de improbidade administrativa previsto no art. 10, caput, da Lei n.º 8.429/92, deixando, contudo, de aplicar a respectiva sanção, haja vista a colaboração premiada existente nos autos. Em relação ao requerido espólio de Nivaldo de Araújo, não havendo provas suficientes da prática do ato ímprobo doloso imputado ao requerido, julgo improcedentes os pedidos, com fundamento no art. 487, I, do CPC. Já em relação aos requeridos Humberto Melo Bosaipo e Guilherme da Costa Garcia, condeno-os ao ressarcimento do dano causado ao erário, de forma solidária, no valor de R$1.677.538,50 (um milhão seiscentos e setenta e sete mil quinhentos e trinta e oito reais e cinquenta centavos). Entretanto, limito a responsabilidade do requerido Guilherme Garcia, no valor de R$927.238,50 (novecentos e vinte e sete mil, duzentos e trinta e oito reais e cinquenta centavos). Sobre o valor referente ao ressarcimento do dano, os valores deverão ser acrescidos de juros de meio por cento (0,5%) ao mês, desde o dano efetivo (desconto dos cheques) até 11/01/2003, quando passa a ser de um por cento (1%) ao mês, com a entrada em vigor do Código Civil (lei 10.406/2002) e correção monetária, pelo INPC, também incidente a partir do dano (art. 398, Código Civil; Súmulas 43 STJ e 54 STF). Condeno os requeridos Humberto Melo Bosaipo e Guilherme da Costa Garcia, ao pagamento das custas e despesas processuais pro rata. Por consequência, julgo extinto o processo com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Transitada em julgado, expeça-se o necessário e, não havendo pendências, arquivem-se os autos, observadas as formalidades legais. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Celia Regina Vidotti Juíza de Direito”. Em suas razões recursais, o apelante HUMBERTO MELO BOSAIPO aduz que não consta do processado elementos probatórios de que tenha realmente contribuído para a suposta lesão ao erário. Argumenta que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estabelece que a delação premiada, por si só, não constitui prova suficiente para fundamentar uma condenação, sendo necessária a apresentação de provas independentes que corroborem as alegações do delator. Salienta, nesse contexto, que inexistem provas adicionais que confirmem as declarações feitas na colaboração premiada e que a condenação da parte apelante está baseada exclusivamente em provas documentais, sem análise técnica e pericial, o que não é suficiente para a configuração do ato improbo. Assevera, ademais, que não já comprovação de que a parte apelante agiu com vontade livre e consciente de desobedecer aos comandos legais e violar os princípios da moralidade, imparcialidade e legalidade. Pontua, por derradeiro, a desproporcionalidade das sanções aplicadas, pois foi condenado ao ressarcimento ao erário, sem provas robustas de sua responsabilidade exclusiva pelo alegado prejuízo. Em face dessa situação, pugna pelo “CONHECIMENTO E PROVIMENTO DA APELAÇÃO, para reformar a r. sentença de primeiro grau, reconhecendo a ilegalidade das provas utilizadas e, consequentemente, JULGANDO IMPROCEDENTE A AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E ABSOLVENDO O APELANTE das sanções impostas; Subsidiariamente, na hipótese de manutenção da condenação, requer-se a redução da sanção aplicada, em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade” (ID. 282630951). Por sua vez, o apelante GUILHERME DA COSTA GARCIA sustenta que a única acusação que pesa em seu desfavor é a de que, na qualidade de Secretário de Orçamento e Finanças da Assembleia Legislativa, teria concorrido com os fatos narrados na petição inicial. Todavia, não foi comprovado benefício ou gratificação alguma recebida nos autos, o que entende indispensável à ação. Pondera, a esse respeito, que não era sua função acompanhar as minúcias dos procedimentos administrativos de aquisições, pois havia setor específico na Assembleia para cuidar do desenvolvimento dos trabalhos de licitação e contratação. Apenas após realizado o certame é que era firmado o contrato administrativo e realizado o empenho e autorizada a realização da despesa pela Secretaria de Finanças. Ressalta que no caso de aquisição de material, sua entrega era feita na Secretaria de Patrimônio ou ao respectivo setor que os solicitou, cabendo-lhes informar o efetivo cumprimento do contrato. Afiança, quanto à alegação do Parquet de que os cheques eram endossados pelos servidores da Assembleia, a fim de possibilitar seu desconto na boca do caixa, que tais assinaturas não representam endosso, mas procedimento destinado a conferir maior segurança ao documento, evitando duplicidade de pagamento ou adulterações. Destaca, para mais, que a condenação ao ressarcimento, nos casos de improbidade administrativa, depende da comprovação da prática de ato doloso, porém o único argumento apresentado pelo Parquet é de que a parte apelante, pelo cargo exercido à época, teria concorrido com o suposto fato, não sendo comprovado enriquecimento ilícito. Posiciona, de outra parte, que a parte apelada não individualizou a conduta da parte apelante na petição inicial e, além disso, o artigo 17, § 10-D, impede a cumulação de atos nos art. 9°, 10 e 11, deve ser indicado apenas um tipo e a acusação cumula indevidamente todos os artigos da Lei de improbidade. Consigna, ainda, que o juízo a quo não cumpriu o acórdão proferido pela Segunda Câmara de Direito Público, nos agravos n.° 0006916-32.2009.811.0041, 0024297- 24.2007.8.11.0041, 0026538-34.2008.8.11.0041, 0006847-97.2009.8.11.0041 e 0000928-30.2009.8.11.0041, que determinam a entrega da delação de José Geraldo Riva em sua integralidade. Por essa razão, requer (ID. 282630954): “a) Que no mérito, seja reformada a sentença objurgada, julgando improcedente a presente ação em relação ao apelante; b) Subsidiariamente, caso não seja julgado improcedente o feito em relação ao apelante, que seja reconhecida a nulidade da sentença proferida, por negativa de cumprimento do juízo de piso, dos acórdãos proferidos pela Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo nos Agravos de Instrumento nº (0006916- 32.2009.811.0041, 0024297-24.2007.8.11.0041, 0026538- 34.2008.8.11.0041, 0006847-97.2009.8.11.0041 e 0000928- 30.2009.8.11.0041)”. Nas contrarrazões, a parte apelada defende que os atos ímprobos estão devidamente comprovados nos autos, pois o esquema criminoso foi confirmado não apenas pelo colaborador, mas por farta documentação e pela prova testemunhal produzida na fase extrajudicial e em juízo, pugnando pelo não provimento dos recursos (ID. 282630960). A Procuradoria-Geral de Justiça opina “pelo desprovimento dos apelos manejados” (ID. 286451374). É o relatório. VOTO DA RELATORA EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO Egrégia Câmara: Como relatado, trata-se de RECURSOS DE APELAÇÃO, interposto pelo HUMBERTO MELO BOSAIPO E OUTROS, contra a sentença proferida pela Excelentíssima Juíza de Direito, Dra. Célia Regina Vidotti, nos autos de n.° 0019180-81.2009.811.0041, em trâmite perante a Vara Especializada em Ações Coletivas da Comarca de Cuiabá, MT, que julgou procedentes os pedidos iniciais. Extrai-se do processado que o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO ajuizou “AÇÃO CIVIL DE RESSARCIMENTO DE DANOS AO ERÁRIO C/C PEDIDO LIMINAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS E EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS” em desfavor de JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO, GUILHERME DA COSTA GARCIA e NIVALDO DE ARAÚJO, visando a condenação de ressarcimento dos danos causados ao erário, no valor de R$ 1.899.538,50 (um milhão e oitocentos e noventa e nove mil e quinhentos e trinta e oito reais e cinquenta centavos). De acordo com o narrado na petição inicial, após investigações iniciadas a partir da operação “Arca de Noé”, constatou-se que os requeridos JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO, então gestores da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso, desviaram R$ 1.899.538,50, mediante 39 (trinta e nove) cheques nominais à empresa Livraria e Papelaria Palácio Ltda, criada de forma fraudulenta para justificar a emissão de cheques, atos para os quais colaboraram GUILHERME DA COSTA GARCIA e NIVALDO DE ARAÚJO, ocupantes de cargos nos setores de finanças, patrimônio e licitação da Assembleia. Citados, os apelados apresentaram Contestação (ID. 282630423, pág. 13/24, 39/45 e 53/68, ID. 282630433, pág. 01/16), impugnadas pelo Parquet no ID. 282630599, pág. 43/44). No curso da instrução, JOSÉ GERALDO RIVA noticiou a celebração de “Acordo de Colaboração Premiada” firmado com o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO e homologado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, ocasião na qual retificou a sua defesa e reconheceu a procedência dos pedidos (ID. 282630666 – pág. 33). Posteriormente, o Parquet pugnou pela homologação e procedência do pedido formulado por JOSÉ GERALDO RIVA, além do compartilhamento do acordo de colaboração premiada em relação aos fatos narrados na ação (ID. 282630667 – pág. 5/7). Intimados para especificar as provas que pretendem produzir, GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID 2826030883) e o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (ID 282630886) postularam pela produção de prova técnica e testemunhal. Saneado o processo (ID. 282630887), a juíza singular justificou que deixou de designar audiência de instrução, considerando que as testemunhas arroladas pelo Parquet coincidem com aquelas ouvidas em ações com identidade de causa de pedir, intimando as partes para manifestar quanto à sua anuência à utilização da prova emprestada. Em atenção à referida intimação, somente o apelante GUILHERME DA COSTA GARCIA concordou com o compartilhamento das provas, postulando pela disponibilização integral da delação premiada (ID. 282630895), enquanto os demais permaneceram silentes. Empós, determinou-se o translado do depoimento do requerido JOSÉ GERALDO RIVA (ID. 282631355), além do depoimento das testemunhas Katia Maria Aprá e Nilson Roberto Teixeira (ID. 282631369), referente ao processo n.° 000980-13.2007.811.0041, e das testemunhas Romildo Rosa Nascimento e Juracy Brito (ID. 282630926), produzidas, respectivamente, nos autos de n.° 0003712-82.2006.811.0041 e 0005699-56.2006.811.0041). Encerrada a instrução processual, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (ID. 282630937), HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630943) e GUILHERME GARCIA (ID. 282630944) apresentaram memoriais. Sobreveio, então, a sentença, já transcrita no relatório, que julgou improcedentes os pedidos em relação a NIVALDO DE ARAÚJO e parcialmente procedentes quanto aos demais requeridos. Com essas considerações, passo à análise das insurgências recursais. De proêmio, salienta-se que os pedidos de ressarcimento, fundados no artigo 37, § 5°, da Constituição da República, reclamam o reconhecimento de ato de improbidade doloso como causa do prejuízo alegado, conforme definido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Leading Case n.° 852475 (Tema n.° 897), no qual fixou a tese no sentido de que: “São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa”. A partir do tema supratranscrito, vê-se que o pedido de ressarcimento ao erário, conquanto imprescritível, subordina-se à prévia análise da ocorrência, ou não, do ato de improbidade administrativa e o elemento subjetivo doloso, ainda que inaplicáveis, por efeitos temporais, as demais sanções previstas na Lei n.° 8.429/92. Como cediço, a Lei n.° 14.230/2021 modificou diversos dispositivos da Lei de Improbidade Administrativa, incluindo, expressamente, os princípios do Direito Administrativo Sancionador, no artigo 1°, § 4°, da Lei n.° 8.429/92, in verbis: “Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (...) § 4º Aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador”. Além disso, a novel legislação passou a exigir o dolo específico para a configuração dos atos de improbidade, revogando expressamente as disposições que admitiam a condenação, às condutas que causam prejuízo ao erário, com base na culpa. Veja-se: “Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) Parágrafo único. (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) § 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) § 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. (...) Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)”. (Grifo nosso). Por se tratar de desmembramento do direito sancionador penal, os mesmos princípios e garantias a ele assegurados, tais como os princípios da legalidade, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, da segurança jurídica, da retroatividade da lei benéfica, da individualização da pena, além da razoabilidade e da proporcionalidade, devem ser observados na esfera administrativa. Dentre os princípios mencionados, sobreleva-se o da retroatividade da norma mais benéfica, previsto no artigo 5°, inciso XL, da Constituição da República. Veja-se: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. Nessa toada, a retroatividade da lei benigna insere-se em princípio constitucional com aplicabilidade para todo o exercício do jus puniendi estatal, nele inserido a improbidade administrativa. Igualmente, convém relembrar que o artigo 9°, do Pacto de San José da Costa Rica, ratificado pelo Brasil com status supralegal, ao replicar o princípio da retroatividade da lei mais benéfica, não o cingiu à norma penal, sendo, portanto, aplicável ao direito sancionador como um todo. Transcrevo: “Ninguém pode ser condenado por ações ou omissões que, no momento em que forem cometidas, não sejam delituosas, de acordo com o direito aplicável. Tampouco se pode impor pena mais grave que a aplicável no momento da perpetração do delito. Se depois da perpetração do delito a lei dispuser a imposição de pena mais leve, o delinqüente será por isso beneficiado”. A propósito, a celeuma quanto à aplicação do princípio da retroatividade, alcançando fatos e atos praticados sob a vigência do texto que precede a reforma, chegou ao colendo Supremo Tribunal Federal que, no julgamento do ARE 843.989, reconheceu a Repercussão Geral (Tema n.° 1.199), fixou a seguinte tese: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei". (ARE 843989, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-251 DIVULG 09-12-2022 PUBLIC 12-12-2022). (Grifo nosso). À vista disso, a despeito do entendimento quanto à irretroatividade da nova lei quanto à prescrição e às demandas já transitadas em julgado, o STF ressalvou a sua retroação benéfica em relação à revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, enfatizando a necessidade de comprovação da responsabilidade subjetiva – dolo – a todos os atos tipificados nos artigos 9°, 10 e 11, da Lei 8.429/92, nas ações pendentes de julgamento. Avançando sobre os atos imputados aos apelados, o pedido de ressarcimento passa pela fundamental demonstração de prejuízo ao erário em decorrência de ato doloso. Nesse contexto, é inegável que a demonstração do dolo, em operações ímprobas, é matéria deveras dificultosa, dada a natureza oculta das práticas ilícitas e as sofisticadas estratégias de dissimulação comumente empresadas. Assim, o elemento subjetivo pode ser inferido de forma indireta, a partir dos elementos objetivos, ou seja, a partir do comportamento objetivo do agente público. Com base nisso, o exame das provas constantes do processado, diferentemente do que defendem os apelantes, revela, com segurança jurídica e densidade probatória suficiente, a presença dos elementos caracterizadores do ato de improbidade administrativa e, consequentemente, do dever de ressarcir ao erário. Os documentos colacionados ao processado, especialmente os cheques assinados pessoalmente pelos apelantes em favor da empresa Livraria e Papelaria Palácio LTDA, sem qualquer lastro documental comprobatório de entrega de bens ou serviços configuram, de início, um forte indicativo de ciência e vontade de participação no esquema fraudulento. Confira-se: · “Cheque n.° 983649, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630354 – pág. 70); · Cheque n.° 000414, no valor de R$55.400,00 (cinquenta e cinco mil e quatrocentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630354 – pág. 73); · Cheque n.° 000422, no valor de R$44.200,00 (quarenta e quatro mil e duzentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630354 – pág. 76); · Cheque n.° 000694, no valor de R$53.365,00 (cinquenta e três mil, trezentos e sessenta e cinco reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630354 – pág. 79); · Cheque n.° 001089, no valor de R$6.000,00 (seis mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630354 – pág. 81); · Cheque n.° 001104, no valor de R$10.000,00 (dez mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630354 – pág. 82); · Cheque n.° 001106, no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630354 – pág. 83); · Cheque n.° 001107, no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630356 – pág. 01); · Cheque n.° 001112, no valor de R$8.000,00 (oito mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630356 – pág. 02); · Cheque n.° 001110, no valor de R$6.000,00 (seis mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630356 – pág. 04); · Cheque n.° 001111, no valor de R$4.000,00 (quatro mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630356 – pág. 05); · Cheque n.° 001170, no valor de R$37.200,00 (trinta e sete mil e duzentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630356 – pág. 07); · Cheque n.° 001533, no valor de R$44.000,00 (quarenta e quatro mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630356 – pág. 10); · Cheque n.° 002761, no valor de R$1.000,00 (mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630368 – pág. 04); · Cheque n.° 002997, no valor de R$68.673,50 (sessenta e oito mil, seiscentos e setenta e três reais, cinquenta centavos), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630368 – pág. 06); · Cheque n.° 003614, no valor de R$72.000,00 (setenta e dois mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630368 – pág. 08); · Cheque n.° 003065, no valor de R$74.400,00 (setenta e quatro mil e quatrocentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630368 – pág. 10); · Cheque n.° 003480, no valor de R$72.500,00 (setenta e dois mil e quinhentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630368 – pág. 13); · Cheque n.° 003893, no valor de R$76.000,00 (setenta e seis mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 15); · Cheque n.° 003865, no valor de R$62.000,00 (sessenta e dois mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 18); · Cheque n.° 003523, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630368 – pág. 22); · Cheque n.° 005003, no valor de R$62.000,00 (sessenta e dois mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630368 – pág. 26); · Cheque n.° 005046, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630368 – pág. 30); · Cheque n.° 005190, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630368 – pág. 34); · Cheque n.° 007743, no valor de R$68.500,00 (sessenta e oito mil e quinhentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e GUILHERME DA COSTA GARCIA (ID. 282630368 – pág. 38); · Cheque n.° 007258, no valor de R$47.150,00 (quarenta e sete mil, cento e cinquenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 50); · Cheque n.° 009691, no valor de R$73.870,00 (setenta e três mil, oitocentos e setenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 54); · Cheque n.° 009903, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 58); · Cheque n.° 010520, no valor de R$73.870,00 (setenta e três mil, oitocentos e setenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 62); · Cheque n.° 009917, no valor de R$70.000,00 (setenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 66); · Cheque n.° 010754, no valor de R$66.000,00 (sessenta e seis mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 70); · Cheque n.° 009905, no valor de R$75.000,00 (setenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 74); · Cheque n.° 011202, no valor de R$46.410,00 (quarenta e seis mil, quatrocentos e dez reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 78); · Cheque n.° 009911, no valor de R$75.000,00 (setenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 86); · Cheque n.° 012207, no valor de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 282630368 – pág. 90)”. A empresa beneficiária, como destacado na sentença, não apenas se revelou inexistente de fato, como foi transferida para o nome de pessoas fictícias ou inidentificáveis, porquanto não constam como eleitores ativos, tampouco foi encontrado o registro geral dos supostos sócios pela Secretaria de Segurança Pública do Estado de Mato Grosso (ID. 282629610 – pág. 43/45, 58/61 e 63/65), o que agrava a avaliação quanto à ilicitude dos atos praticados. Veja-se que a fraude não se revela como mera hipótese, mas como uma realidade documental comprovada. A ausência de qualquer documentação que evidencie a contraprestação, somada à incapacidade dos apelantes de demonstrar a legalidade dos pagamentos, configura flagrante violação ao dever de proteção ao erário, nos termos do artigo 10, da Lei n.° 8.429/92. Alinha-se, a isso, a delação premiada de JOSÉ GERALDO RIVA, devidamente homologada e admitida como prova nos autos, que reforça a conclusão quanto à consciência e voluntariedade da conduta dos apelantes, formando um conjunto harmônico e coerente com as provas, especificamente os cheques, as informações de inatividade da empresa e a ausência de notas fiscais. Para mais, há trecho inequívoco da fala do colaborador, que imputa a HUMBERTO MELO BOSAIPO a participação direta na constituição de empresa de fachada e na manipulação de cheques sem qualquer contrapartida de serviço ou produto. Veja-se (ID. 282631356): “(22:19): “A situação dos saques, ela nunca foi efetivada por nenhuma das empresas, até porque as empresas, eram empresas criadas de forma fraudulenta ou em um determinado momento, como eu já disse, sequer criadas. E esse processo de criação das empresas, ele foi relatado pelo senhor Humberto Bosaipo à época. É... até porque eu não conhecia esse pessoal, que não eram aqui de Cuiabá, alguns deles trabalharam...em... em Barão de Melgaço, pelos...pelos Quirinos, pelo senhor Luiz Dondo, pelo senhor Nivaldo de Araújo e.... à época, a alegação era de que a Confiança Factoring, através do senhor Nilson Teixeira e do senhor João Arcanjo, tinha pleno conhecimento. E em alguns casos até contribuíram. Eu tenho até um caso em que entraram numa... numa... numa ação contra, contra mim e o deputado Bosaipo pedindo indenização, em que a pessoa alega que pegou os documentos lá na Confiança e entregou os documentos na mão dos contadores para que fosse criada as empresas, algumas empresas eram simplesmente dado manutenção de empresas velhas já. Fazia, inclusive, a alteração do ramo de atividade. Outras empresas eram criadas e outras, como eu disse pra vossa excelência, e reafirmo aqui, eram empresas que sequer existiam. Procedimento nenhum era feito, era feito uma relação de cheques e nós recebíamos o pacote de cheques junto à relação e simplesmente assinávamos. A Confiança Factoring, como eu disse, é... recebeu aproximadamente 20 (vinte) e poucos milhões desses valores, sem precisar que haviam 22 (vinte e duas) promissórias de R$ 700.000,00 (setecentos mil) que foram pagos mensalmente, por mim e pelo deputado Humberto Bosaipo e também eram utilizados recursos, às vezes, para campanha eleitoral, para eleições de mesa, e as vezes até para uma questão particular de deputado (...).” Sobre a colaboração premiada, a despeito dos argumentos defensivos que buscam afastar sua legitimidade, perfaz curial salientar que embora não constitua prova isolada suficiente para a condenação, possui natureza de meio de prova validamente admissível, sobretudo quando corroborada por outros elementos probatórios. A propósito, no pertinente à sua utilização no âmbito da Ação civil pública, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 1175650/PR (Tema n.° 1.0433), pacificou o entendimento de que é constitucional a sua admissão na ação de improbidade administrativa, observado, dentre outras diretrizes, a necessidade de estar acompanhada de outras provas: “CONSTITUCIONAL. UTILIZAÇÃO DO ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA (LEI 12.850/2013) NO ÂMBITO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LEI 8.429/1992) . POSSIBILIDADE. DECLARAÇÕES DO AGENTE COLABORADOR COMO ÚNICA PROVA. INSUFICIÊNCIA PARA O INÍCIO DA AÇÃO POR ATO DE IMPROBIDADE. OBRIGAÇÃO DE RESSARCIMENTO INTEGRAL AO ERÁRIO . TRANSAÇÃO APENAS EM TORNO DO MODO E DAS CONDIÇÕES PARA A INDENIZAÇÃO. LEGITIMIDADE PARA CELEBRAÇÃO DO ACORDO. MINISTÉRIO PÚBLICO COM A INTERVENIÊNCIA DA PESSOA JURÍDICA INTERESSADA. 1 . O aperfeiçoamento do combate à corrupção no serviço público foi uma grande preocupação do legislador constituinte, ao estabelecer, no art. 37 da Constituição Federal, verdadeiros códigos de conduta à Administração Pública e aos seus agentes, prevendo, inclusive, pela primeira vez no texto constitucional, a possibilidade de responsabilização e aplicação de graves sanções pela prática de atos de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da CF). 2 . A Constituição de 1988 privilegiou o combate à improbidade administrativa, para evitar que os agentes públicos atuem em detrimento do Estado, pois, como já salientava Platão, na clássica obra REPÚBLICA, a punição e o afastamento da vida pública dos agentes corruptos pretendem fixar uma regra proibitiva para que os servidores públicos não se deixem induzir por preço nenhum a agir em detrimento dos interesses do Estado. 3. O combate à corrupção, à ilegalidade e à imoralidade no seio do Poder Público, com graves reflexos na carência de recursos para implementação de políticas públicas de qualidade, deve ser prioridade absoluta no âmbito de todos os órgãos constitucionalmente institucionalizados. 4 . Exatamente, em respeito à finalidade de garantir a eficácia no combate à improbidade administrativa, a LIA deve ser interpretada no contexto da evolução do microssistema legal de proteção ao patrimônio público e de combate à corrupção e com absoluta observância ao princípio constitucional da eficiência, consagrado no caput do art. 37 da Constituição Federal e que impõe a todos os agentes públicos, inclusive aos membros do Ministério Público e magistrados, o dever de sempre verificar a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, eficaz, sem burocracia, buscando qualidade, primando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para a melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar desperdícios e a garantir uma maior rentabilidade social do exercício da jurisdição, da efetiva prestação jurisdicional. 5. Assim como a Lei Federal 8 .429/1992 visou ao aperfeiçoamento do combate à corrupção no serviço público, no mesmo momento histórico, na esfera penal, encontram-se notáveis esforços do legislador brasileiro dirigidos ao enfrentamento de tais condutas, como lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, falsidades documentais, e outros delitos contra a Administração Pública, notadamente quando praticados por meio de organização criminosa. Nesse contexto, incorporou-se ao ordenamento brasileiro, por meio da edição de diversas leis, o instituto da delação premiada, posteriormente renomeada para colaboração premiada. 6. Importante realçar que o legislador brasileiro, quando editou a Lei 12 .850/2013, pela qual se estabeleceu o conceito de organização criminosa, dispôs que não é qualquer delação que permitirá o benefício de redução da pena ou de perdão judicial, mas somente aquela que produzir os resultados previstos nos incisos do artigo 4º da norma. Importante, ainda, salientar, a respeito da Lei 12.850/2013, que o inciso I do art. 3º do capítulo II estatui ser a colaboração premiada meio de obtenção de prova . Essa natureza jurídica específica é importante para diferenciar a colaboração premiada das hipóteses de justiça consensual ou negocial, como por exemplo a transação penal e o próprio acordo de não persecução, que com ela não se confunde. Em voto na PET 7074-QO/DF, destaquei que o instituto possui natureza jurídica de meio de obtenção de prova, cujo resultado poderá beneficiar o agente colaborador/delator desde que adimplidas as obrigações por ele assumidas e que advenha um ou mais dos resultados indicados na lei, favoráveis à repressão ou prevenção das infrações. 7. Assim, a colaboração premiada, que pode infundir no ânimo do colaborador o desejo de contribuir para a comprovação da materialidade e autoria do delito, mostra-se como valioso instrumento a ser utilizado, também, em instâncias outras, diversas da penal, em especial, quando envolvido o interesse público e o combate à corrupção . 8. O microssistema legal de combate à corrupção, a partir de 1992, evoluiu, de forma clara, específica e objetiva, no sentido de propiciar meios facilitadores à repressão e à prevenção de ilícitos, sobretudo quando ofensivos a interesses supraindividuais e preordenados a causar dano ao patrimônio público. 9. Notadamente, no caso sob exame, em que envolvidas mais de 24 pessoas físicas e jurídicas organizadas em complexa estrutura criminosa e com o objetivo comum de obter vantagem patrimonial, por meio de ajustes de corrupção com grandes empresários sujeitos à fiscalização tributária, revelados na denominada Operação Publicano, a utilização do acordo de colaboração premiada mostra-se de grande valia para se obterem as provas necessárias à comprovação dos delitos e o desbaratamento da organização criminosa . 10. A lesão ao erário causa graves reflexos na carência de recursos para implementação de políticas públicas de qualidade. Não por outra razão é que a reparação integral do dano ao patrimônio público, além de figurar no rol das sanções estabelecidas no art. 12 da Lei 8 .429/1992, também é consequência civil do ato ilícito. Reafirma ainda esse entendimento o teor do parágrafo 2º do art. 17 da LIA, que se manteve inalterado mesmo com a edição da Lei 13.964/2019, onde se lê que A Fazenda Pública, quando for o caso, promoverá as ações necessárias à complementação do ressarcimento do patrimônio público . Assim, não há como transigir a respeito dessa obrigação, consentindo com sua inserção entre os benefícios a serem estendidos àquele que colabora com as investigações no contexto da ação de improbidade decorrente do dano causado. Assim sendo, o acordo de colaboração poderá ser homologado pelo juiz, desde que não isente o colaborador de ressarcir os danos causados, ainda que a forma de como se dará a indenização possa ser objeto de negociação. 11. Outra importante questão diz respeito à colaboração premiada no âmbito civil, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público, em face da legitimidade concorrente para a propositura da ação . 12. O art. 17-A, que seria acrescido à Lei 8.429/1992 pela Lei 13 .964/2019, foi totalmente vetado pelo Presidente da República. Assim, em face do veto aposto ao art. 17-A, que não foi derrubado pelo Congresso Nacional, tem-se que eventuais acordos de colaboração premiada, para serem utilizados em ação civil pública por ato de improbidade administrativa, devem contar com a participação do Ministério Público e da pessoa jurídica de direito público interessada, porém, como interveniente. O posicionamento do interveniente não impedirá a celebração da colaboração premiada pelo Ministério Público, porém deverá ser observada e analisada pelo magistrado no momento de sua homologação . 13. No caso concreto, o Ministério Público do Estado do Paraná propôs ação civil pública por ato de improbidade administrativa em face do ora recorrente e de mais 24 pessoas físicas e jurídicas em razão de fatos revelados na denominada Operação Publicano. Pediu, liminarmente, a indisponibilidade de valores e de bens móveis e imóveis dos demandados; e, ao final, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992 ( Lei de Improbidade Administrativa – LIA) . Entretanto, em relação a alguns réus, requereu apenas o reconhecimento de que praticaram atos de improbidade, sem a imposição das penalidades correspondentes, em razão do acordo de colaboração premiada que foi firmado com as referidas pessoas, valendo-se do instrumento previsto nas disposições do art. 4º, § 4º, da Lei 12.850/2013, c/c os arts. 16 e 17 da Lei 12 .846/2013. 14. O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná confirmou a decisão do magistrado de 1ª instância que decretara a indisponibilidade dos bens de vários réus, entre os quais o ora recorrente. A Corte reputou válido o acordo de colaboração premiada no âmbito da ação de improbidade; e assentou que a decretação da indisponibilidade de bens do agravante se deu nos termos do art . 7º e parágrafo único da Lei 8.429/1992. 15. Pelos termos dos acordos de colaboração acima transcritos, é possível extrair-se a conclusão de que, no caso concreto, os interesses dos colegitimados para ação de improbidade, embora não tenham participado da avença, estão resguardados e que eventual anulação do acordo seria mais deletéria ao interesse público do que a sua manutenção . 16. A interpretação das normas jurídicas deve sempre se pautar pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sob pena de chancelar-se situação jurídica de todo inaceitável. Não é demais advertir que, quando do julgamento do mérito da causa, caberá ao magistrado avaliar se a delação mostra-se consentânea com as outras provas coligidas. 17 . Além disso, o Tribunal de origem, em cognição sumária, decretou a indisponibilidade dos bens do recorrente, por entender estarem presentes os requisitos previstos no art. 7º da Lei 8.429/1992 (fumus boni iuris, a plausibilidade dos fatos e fundamentos jurídicos do pedido inicial), uma vez que existem fundados indícios da prática de atos de improbidade, os quais foram extraídos das provas contidas nos autos do inquérito civil e nas medidas cautelares realizadas pelo MP. 18 . NEGADO PROVIMENTO ao Recurso Extraordinário. TESE DE REPERCUSÃO GERAL: É constitucional a utilização da colaboração premiada, nos termos da Lei 12.850/2013, no âmbito civil, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público, observando-se as seguintes diretrizes: (1) Realizado o acordo de colaboração premiada, serão remetidos ao juiz, para análise, o respectivo termo, as declarações do colaborador e cópia da investigação, devendo o juiz ouvir sigilosamente o colaborador, acompanhado de seu defensor, oportunidade em que analisará os seguintes aspectos na homologação: regularidade, legalidade e voluntariedade da manifestação de vontade, especialmente nos casos em que o colaborador está ou esteve sob efeito de medidas cautelares, nos termos dos §§ 6º e 7º do artigo 4º da referida Lei 12.850/2013 . (2) As declarações do agente colaborador, desacompanhadas de outros elementos de prova, são insuficientes para o início da ação civil por ato de improbidade; (3) A obrigação de ressarcimento do dano causado ao erário pelo agente colaborador deve ser integral, não podendo ser objeto de transação ou acordo, sendo válida a negociação em torno do modo e das condições para a indenização; (4) O acordo de colaboração deve ser celebrado pelo Ministério Público, com a interveniência da pessoa jurídica interessada e devidamente homologado pela autoridade judicial; (5) Os acordos já firmados somente pelo Ministério Público ficam preservados até a data deste julgamento, desde que haja previsão de total ressarcimento do dano, tenham sido devidamente homologados em Juízo e regularmente cumpridos pelo beneficiado". (STF - ARE: 1175650 PR, Relator.: Min. ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento: 03/07/2023, Tribunal Pleno, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 04-10-2023 PUBLIC 05-10-2023). Nessa conjuntura, além da prova documental citada anteriormente, os depoimentos testemunhais, admitidos como prova emprestada, apontam para a atuação dolosa dos apelantes. A exemplo das testemunhas Nilson Teixeira e Kátia Maria Aprá, que confirmam as declarações prestadas na fase investigativa, nas quais apresentaram, minuciosamente, como era realizada a operação com o envolvimento de empresas de fachada e, inclusive, sobre os trâmites internos para a emissão de cheques. Aliás, sobre da prova emprestada, é assente o entendimento quanto à sua admissibilidade, desde que respeitado o contraditório, situação observada nos autos, porquanto as partes foram devidamente intimadas sobre cada elemento probatório juntado aos autos. Nesse sentido: “PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POPULAR. "ESCÂNDALO DOS PRECATÓRIOS". EMISSÃO DE LETRAS FINANCEIRAS DO TESOURO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (LFTSC) SUPOSTAMENTE PARA PAGAMENTO DE PRECATÓRIOS, MAS COM DESTINAÇÃO DIVERSA PARA O DINHEIRO CAPTADO . CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO CELEBRADO PELO BANCO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (BESC), SUCEDIDO PELO BANCO DO BRASIL S/A, COM O BANCO VETOR S/A, SUCEDIDO POR VETOR NEGÓCIOS E PARTICIPAÇÕES S/A. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DE ANULAÇÃO DO CONTRATO E RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO POR FERNANDO FERREIRA DE MELLO JÚNIOR . ALEGAÇÕES DE VIOLAÇÃO AOS ARTS. 125, I, 165, 301, §§ 1º A 3º, 330, 332, 420, PARÁGRAFO ÚNICO, 427, 458, II, TODOS DO CPC/73, BEM COMO AO ART. 7º, "CAPUT", E V, DA LEI 4.717/65, AO ART . 12 DA LEI 8.429/92 E AO ART. 1º DO CÓDIGO CIVIL. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO . [...] 3. O julgamento antecipado da lide não configura cerceamento de defesa e, por conseguinte, nulidade processual, se as instâncias ordinárias consideram prescindível a dilação probatória, por ser eminentemente de direito a controvérsia ou por depender sua resolução apenas do exame de fatos já documentalmente provados.Precedentes . Averiguar a necessidade de dilação probatória no caso concreto, tal como pretendido pelo recorrente, exigiria inevitável reexame de todo o substrato fáticoprobatório da causa, inviável em recurso especial nos termos da Súmula 7/STJ. Não conhecimento do recurso, no ponto, tanto por a quanto por c, do permissivo constitucional. 4. É válida a admissão ao processo de prova emprestada, desde que respeitado o contraditório na demanda em que a prova venha a ser utilizada. Precedentes. [...] (STJ - REsp: 1601868 SC 2016/0126116-9, Relator.: Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, Data de Julgamento: 13/08/2024, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/08/2024). “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO DO JUIZ CRIMINAL QUE DEFERIU O COMPARTILHAMENTO DA PROVA PRODUZIDA NO INQUÉRITO POLICIAL PARA FIM DE INSTRUÇÃO DE AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE . PRECEDENTES. CONTRADITÓRIO DIFERIDO. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS PENAL, CÍVEL E ADMINISTRATIVA. 1 . Hipótese em que o impetrante se insurge contra decisão do juiz criminal que, após homologado o arquivamento do inquérito policial, deferiu o compartilhamento das provas produzidas para fim de instrução de ação cível de improbidade administrativa. 2. "É firme o entendimento jurisprudencial deste Sodalício no sentido da possibilidade de utilização, na seara cível, para fins de apuração de improbidade administrativa, de prova produzida na esfera penal." (AgRg no REsp 1714914/RS, Rel . Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 27/02/2018, DJe 08/03/2018). 3. O uso da prova emprestada estará sujeito à efetivação do contraditório no foro em que a prova vier a ser utilizada. Precedentes . 4. Agravo interno não provido”. (STJ - AgInt no RMS: 61408 RJ 2019/0212188-0, Relator.: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 11/05/2020, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/05/2020). “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC/73 . NÃO OCORRÊNCIA. PROCESSO CRIMINAL. TRÂNSITO EM JULGADO MATERIAL. PROVA EMPRESTADA . VALIDADE. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. OBSERVÂNCIA. SÚMULA Nº 83/STJ . HOMICÍDIO. RESPONSABILIDADE INDIRETA. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7/STJ . DECISÃO MANTIDA 1. Não há afronta ao art. 535 do CPC/73 quando o Tribunal de origem manifesta-se suficientemente sobre a questão controvertida, apenas adotando fundamento diverso daquele perquirido pela parte. 2. É válida a utilização de prova emprestada, desde que observado o contraditório e ampla defesa. Precedentes do STF e do STJ. Súmula nº 83/STJ. 3. A pretensão de verificar se há responsabilidade civil indireta pelo homicídio perpetrado acerca do qual houve condenação criminal transitada em julgado somente se processa mediante o reexame do conjunto probatório carreado aos autos, o que encontra óbice na Súmula nº 7/STJ. 4. Agravo interno não provido”. (STJ - AgInt no REsp: 1426271 MT 2013/0199064-7, Relator.: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 20/08/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/08/2019). A responsabilidade dos apelantes não deriva, portanto, apenas de sua posição formal no organograma da Assembleia Legislativa, mas, sobretudo, de sua atuação direta e ostensiva na cadeia de comando que operacionalizou os desvios. Ambos firmaram ordens de pagamento com base em documentos absolutamente inidôneos, sem amparo em processo licitatório e sem qualquer comprovação de liquidação da despesa. O ordenamento jurídico impõe, aos gestores públicos, um dever objetivo de cuidado — dever esse que não foi meramente negligenciado, mas ativamente violado. Não se trata aqui de erro ou desídia, mas de participação consciente em procedimento montado com o intuito deliberado de fraudar o erário. A assinatura reiterada de cheques, por valores expressivos, em benefício de empresa notoriamente inidônea, não permite presumir boa-fé. Ao contrário: diante da soma dos valores e da constância dos repasses, muitos dos quais fracionados em sequência, há nítido padrão de conduta dolosa. A propósito, importa registrar que esta Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo já enfrentou situação correlata, envolvendo o mesmo réu HUMBERTO MELO BOSAIPO e a mesma dinâmica de desvio sistemático de recursos públicos no contexto do denominado “mensalinho”. Naquele julgamento, de relatoria do Des. Deosdete Cruz Júnior, acompanhado à unanimidade, esta Egrégia Câmara decidiu: “DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. "MENSALINHO" NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA. DANO AO ERÁRIO E ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. RECONHECIMENTO DO DOLO ESPECÍFICO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação Cível interposta pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra sentença que julgou improcedente a Ação Civil Pública de Ressarcimento ao Erário, ajuizada contra Humberto Melo Bosaipo, visando à condenação ao ressarcimento ao erário em decorrência da prática de ato doloso de improbidade administrativa, consubstanciado no recebimento de valores ilícitos entre 2003 e 2007, enquanto exercia o mandato de deputado estadual. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar: (i) se os elementos de prova constantes dos autos são suficientes para comprovar a prática de ato doloso de improbidade administrativa pelo apelado, com consequente dano ao erário e enriquecimento ilícito; e (ii) se a robustez do conjunto probatório permite o afastamento do princípio da presunção de inocência para fins de ressarcimento ao erário. III. Razões de decidir 3. O art. 1º, § 1º, da LIA, com a redação dada pela L. 14.230/2021, exige a comprovação de dolo para a configuração do ato de improbidade administrativa, vedando a responsabilização objetiva e a presunção do elemento subjetivo. 4. A robustez do acervo probatório, integrado por depoimentos de colaboradores premiados, testemunhos em juízo e provas documentais, demonstra, de forma harmônica e segura, que o apelado participou conscientemente do esquema ilícito de repasse de valores desviados do erário, configurando o dolo específico exigido pela atual legislação. 5. A ausência de registros formais, inerente à clandestinidade das práticas ilícitas, não impede o reconhecimento da prática dolosa, uma vez que corroborada por múltiplos meios de prova válidos e idôneos. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso de apelação conhecido e provido, para reformar a sentença e julgar procedentes os pedidos iniciais, condenando Humberto Melo Bosaipo ao ressarcimento integral do dano causado ao erário, no valor de R$ 2.433.330,00, a ser corrigido monetariamente pelo IPCA-E desde a data da exigibilidade e acrescido de juros de mora a partir da citação. Tese de julgamento: " 1. Para a configuração do ato de improbidade administrativa, é imprescindível a comprovação do dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito, à luz da L. 8.429/1992, com as alterações da L. 14.230/2021. 2. Em esquemas de desvio de recursos públicos estruturados para dificultar a rastreabilidade, o dolo pode ser inferido a partir do contexto fático, desde que corroborado por provas robustas e contundentes". (N.U 1005368-95.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, DEOSDETE CRUZ JUNIOR, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 20/05/2025, Publicado no DJE 22/05/2025). Referido enunciado se aplica à presente hipótese, em atenção à coerência decisória que deve nortear os órgãos judicantes. A repetição do modus operandi, o protagonismo dos mesmos agentes políticos e a reprodução de idêntico padrão probatório impõem o reconhecimento da similitude entre os feitos e a manutenção do entendimento jurisprudencial já assentado por este órgão colegiado Por derradeiro, no que tange à tentativa defensiva de afastamento da delação premiada como prova válida, em razão da ausência de acesso integral aos seus anexos, mister pontuar que não houve vedação infundada, uma vez que apenas se restringiu o acesso aos trechos não relacionados ao objeto desta ação, de modo a preservar o sigilo de outras investigações autônomas. O trecho da delação premiada colacionado aos autos, e devidamente admitido pelo juízo de primeiro grau, refere-se diretamente ao caso em análise e aos apelantes, com corroboração documental e testemunhal robusta. Não há, portanto, qualquer cerceamento de defesa ou nulidade a ser reconhecida, nos moldes do que dispõe o art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal. Aliás, o respeito ao contraditório foi plenamente observado, na medida em que os apelantes puderam se manifestar sobre os trechos juntados, requerer diligências e confrontar o teor das declarações. Além disso, não há que se falar em afronta aos acórdãos proferidos nos recursos de agravo de instrumento. E, isso porque, o Agravo de Instrumento interposto contra decisão do juízo a quo, de n.° 1002784-47.2023.811.0000 teve o provimento negado. Ante o exposto, CONHEÇO E NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo-se inalterada a sentença atacada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025

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Humberto Melo Bosaipo e outros x Humberto Melo Bosaipo e outros

ID: 333824572

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0001868-29.2008.8.11.0041

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

HUMBERTO MELO BOSAIPO JOEL QUIRINO PEREIRA

Polo Passivo:

HUMBERTO MELO BOSAIPO JOEL QUIRINO PEREIRA

Acórdão

Advogados:

MARIA ABADIA PEREIRA DE SOUZA AGUIAR

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UBIRAJARA DE SIQUEIRA FILHO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

EZEQUIEL NUNES DE SOUSA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 0001868-29.2008.8.11.0041 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [DANO AO ERÁRIO] RELATORA: EXMA. SRA.… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 0001868-29.2008.8.11.0041 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [DANO AO ERÁRIO] RELATORA: EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO TURMA JULGADORA: [EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JUNIOR, EXMO. SR. DES. MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA] PARTE(S): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE), JOSE GERALDO RIVA - CPF: 387.539.109-82 (APELADO), GUSTAVO LISBOA FERNANDES - CPF: 021.663.661-20 (ADVOGADO), ALMINO AFONSO FERNANDES - CPF: 251.784.401-10 (ADVOGADO), HUMBERTO MELO BOSAIPO - CPF: 094.169.601-44 (APELADO), MARIA ABADIA PEREIRA DE SOUZA AGUIAR - CPF: 009.824.698-45 (ADVOGADO), JOSE QUIRINO PEREIRA - CPF: 411.780.251-87 (APELADO), EZEQUIEL NUNES DE SOUSA - CPF: 476.650.411-91 (ADVOGADO), UBIRAJARA DE SIQUEIRA FILHO - CPF: 513.705.811-49 (ADVOGADO), JOEL QUIRINO PEREIRA - CPF: 544.553.591-68 (APELADO), JOSE GERALDO RIVA - CPF: 387.539.109-82 (TERCEIRO INTERESSADO), GERALDO LAURO - CPF: 201.139.351-53 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), HUMBERTO MELO BOSAIPO - CPF: 094.169.601-44 (APELANTE), MARIA ABADIA PEREIRA DE SOUZA AGUIAR - CPF: 009.824.698-45 (ADVOGADO), JOSE QUIRINO PEREIRA - CPF: 411.780.251-87 (APELANTE), UBIRAJARA DE SIQUEIRA FILHO - CPF: 513.705.811-49 (ADVOGADO), EZEQUIEL NUNES DE SOUSA - CPF: 476.650.411-91 (ADVOGADO), JOEL QUIRINO PEREIRA - CPF: 544.553.591-68 (APELANTE), UBIRAJARA DE SIQUEIRA FILHO - CPF: 513.705.811-49 (ADVOGADO), EZEQUIEL NUNES DE SOUSA - CPF: 476.650.411-91 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGARAM PROVIMENTO AOS RECURSOS DE HUMBERTO MELO BOSAIPO E JOEL QUIRINO PEREIRA, E DERAM PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO A EXCELENTÍSSIMA SRA. DESA. RELATORA MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, 1º VOGAL EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JÚNIOR E 2º VOGAL EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA. E M E N T A DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO DECORRENTE DA PRÁTICA DE ATO ÍMPROBO. DESVIO DE VERBAS MEDIANTE EMPRESA DE FACHADA. DOLO COMPROVADO. RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL DOS GESTORES PÚBLICOS. UTILIZAÇÃO VÁLIDA DA PROVA EMPRESTADA E DE COLABORAÇÃO PREMIADA. RECURSOS DOS REQUERIDOS NÃO PROVIDOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO PROVIDO. I. Caso em exame Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos em ação civil pública de ressarcimento ao erário ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, envolvendo esquema de desvio de recursos públicos mediante contratação fictícia de empresa, na Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. A sentença condenou parte dos requeridos e excluiu José Quirino Pereira da responsabilização. II. Questão em discussão A questão em discussão consiste em verificar: (i) a comprovação do dolo específico exigido pela Lei n.° 8.429/92, com as alterações da Lei n.° 14.230/21, para configuração do ato de improbidade administrativa com dano ao erário; (ii) se a colaboração premiada homologada judicialmente pode ser validamente utilizada em ação civil pública de ressarcimento ao erário por ato de improbidade administrativa; (iii) se é legítima a utilização de prova emprestada, respeitado o contraditório. (iv) se há elementos suficientes para estender a condenação a José Quirino Pereira. III. Razões de decidir De acordo com o Supremo Tribunal Federal (Tema n.° 897), os pedidos de ressarcimento fundados no artigo 37, § 5°, da Constituição da República, reclamam o reconhecimento de ato de improbidade doloso como causa do prejuízo alegado. Com as modificações trazidas pela Lei n.° 14.230/21, para a configuração de ato de improbidade administrativa que importa em prejuízo ao erário, tipificado no artigo 10, da Lei n.° 8.429/92, exige-se a comprovação de dolo específico, além da de efetiva perda patrimonial. As provas documentais e testemunhais, incluindo cheques emitidos sem lastro contratual, depoimentos e arquivos digitais, revelam a existência de estrutura organizada para desvio de recursos públicos com participação direta e consciente dos réus. A colaboração premiada de um dos réus, homologada judicialmente e corroborada por outros elementos de prova, reforça a narrativa da conduta dolosa. A utilização de prova emprestada é válida, desde que oportunizado o contraditório às partes, o que se verificou nos autos. A conduta dos apelantes transcendeu a mera omissão funcional, caracterizando participação ativa na execução de esquema de desvio sistemático de recursos públicos, o que justifica a condenação ao ressarcimento integral. O conjunto probatório aponta que José Quirino Pereira não era mero espectador, mas partícipe ativo no esquema fraudulento. IV. Dispositivo e tese Recursos de apelação de Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira conhecidos e não providos. Recurso de apelação do Ministério Público do Estado de Mato Grosso conhecido e provido para estender a condenação de ressarcimento a José Quirino Pereira. Tese de julgamento: "1. É devido o ressarcimento ao erário, em razão de ato ímprobo, quando comprovada a conduta dolosa do agente público que, de forma consciente e reiterada, autoriza pagamentos vultosos a empresa de fachada, sem respaldo documental ou comprovação de contraprestação, causando prejuízo efetivo. 2. A demonstração do dolo específico pode decorrer da análise contextual dos elementos objetivos e documentais, inclusive mediante a validação judicial de colaboração premiada corroborada por provas materiais. 3. É legítima a utilização de prova emprestada, desde que respeitado o contraditório, para reforçar a autoria e a materialidade dos atos ímprobos imputados aos réus. 4. A responsabilidade pelo ressarcimento ao erário alcança todos aqueles que, ainda que sem vínculo formal com a administração pública, concorreram dolosamente para o ato lesivo.”. Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5º, XL e LV; art. 37, § 4º e § 5º; Lei n.° 8.429/92, arts. 1º, § 1º e § 4º, 10 e 17. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Plenário, j. 18.08.2022; STF, ARE 1175650, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Plenário, j. 03.07.2023; STJ, REsp 1601868/SC, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, 1ª T., j. 13.08.2024; STJ, AgInt no RMS 61408/RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., j. 11.05.2020. R E L A T O R I O EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO (RELATORA): Egrégia Câmara: Trata-se de RECURSOS DE APELAÇÃO, interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, HUMBERTO MELO BOSAIPO e JOEL QUIRINO PEREIRA, contra a sentença proferida pela Excelentíssima Juíza de Direito, Dra. Célia Regina Vidotti, nos autos de n.° 0001868-29.2008.811.0041, em trâmite perante a Vara Especializada em Ações Coletivas da Comarca de Cuiabá, MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (ID. 278677959): “Vistos etc. Cuida-se de Ação Civil Pública de Ressarcimento de Danos Causados ao Erário, com pedidos liminares, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, em face de José Geraldo Riva, Humberto Melo Bosaipo, Geraldo Lauro, Nivaldo de Araujo, José Quirino Pereira e Joel Quirino Pereira, com fundamento no art. 37, §5º, da Constituição Federal e da Lei nº 7.347/85. O requerente alega, em síntese, que os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Melo Bosaipo, na qualidade de gestores responsáveis pela Administração da Assembleia Legislativa Estadual, foram responsáveis por desvios na ordem de R$1.819.430,80 (um milhão, oitocentos e dezenove mil, quatrocentos e trinta reais e oitenta centavos), identificados por trinta e dois (32) cheques nominais à empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. Afirma que os requeridos Geraldo Lauro e Nivaldo de Araújo, ocupavam à época dos fatos, cargos nos setores de patrimônio e licitação da AL/MT, tendo ambos colaborado para a prática dos atos fraudulentos descritos na inicial. Argui que os requeridos Joel Quirino Pereira e José Quirino Pereira, embora não ocupassem cargo público à época dos fatos, teriam agido em concurso dos demais requeridos, sendo eles os responsáveis pela criação e utilização de empresas inexistentes, ou mesmo se utilizar de algumas empresas regulares como supostas beneficiárias de cheques emitidos pela AL/MT, sem que os reais proprietários tivessem conhecimento, como é o caso da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. Assevera que as sanções pela prática do ato de improbidade administrativa não poderão ser aplicadas, em face da prescrição, sendo, porém, perfeitamente possível buscar o ressarcimento ao erário, nos termos do art. 37, § 5º, da Constituição Federal. Requereu, liminarmente, a indisponibilidade de bens dos requeridos, além da concessão de busca e apreensão de todos os documentos relativos às referidas licitações, que envolvam a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, conforme descrito na inicial. No mérito requereu a condenação dos requeridos ao ressarcimento do dano causado ao Estado de Mato Grosso, no valor de R$1.819.430,80 (um milhão, oitocentos e dezenove mil, quatrocentos e trinta reais e oitenta centavos). Pela decisão de Id. 58115740 fls. 158/163, os pedidos liminares foram indeferidos, oportunidade em que foi determinada a intimação do Estado de Mato Grosso, para manifestar interesse na ação e a citação dos requeridos. Os requeridos José Geraldo Riva e Geraldo Lauro, por seus patronos, apresentaram manifestação nominada de “resposta” (Id. 278677094 fls. 44/78), arguindo em preliminar a incompetência absoluta deste Juízo. Arguiram, ainda, que os agentes políticos não respondem por atos de improbidade administrativa, mas sim por crime de responsabilidade, sendo necessária a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso. No mérito, arguiram a ausência de prova que possa, ao menos, ser indicativo de que os requeridos tenham praticado uma conduta capaz de causar algum dano ao erário. O requerido Humberto Melo Bosaipo, por seu patrono, apresentou contestação (Id. 278677097 fls. 123/130), arguindo a preliminar de nulidade do inquérito civil. No mérito, afirmou que o requerido, na qualidade de Deputado Estadual e Presidente ou Primeiro Secretário da Casa Legislativa, não era a sua função inspecionar cada um dos processos licitatórios e verificar a efetiva entrega dos serviços ou materiais licitados. Afirmou que não restou demonstrado qualquer ilegalidade de pagamento as empresas fornecedoras ou prestadoras de serviços, tampouco no fato de haverem cheques recebidos e trocados junto às empresas de factoring. Ressaltou, também, que não era a sua função, como membro da mesa diretora, acompanhar as minúcias de cada um dos procedimentos administrativos, sendo certo que todos os atos dos servidores ficavam registrados nos respectivos processos administrativos. Requereu, ao final, o acolhimento da preliminar e a extinção do processo sem julgamento do mérito ou, com o julgamento do mérito, a improcedência da ação. Pela manifestação constante no Id. 58117355 fls. 05/20, o requerido o requerido Humberto Melo Bosaipo, por seu patrono, arguiu também a incompetência absoluta deste Juízo, em razão da inconstitucionalidade dos Provimentos 19/2013/CM, 32/2013/CM, 36/2013/CM e 37/2013/CM, afirmando que foi instituído regime de exceção na Vara Especializada, sendo esta incompetente. O requerido José Geraldo Riva, manifestou no Id. 58117355 fls. 34/51 e apontou novamente para a incompetência desta Vara Especializada, em razão da inconstitucionalidade formal e material do provimento n.º 004/2008/CM. Pela decisão constante no Id. 278677099 fls. 46/52, as preliminares de incompetência da vara para o processamento e julgamento da ação foram afastadas, oportunidade em que a tramitação do processo foi suspensa em razão do óbito do requerido Nivaldo Araújo, noticiado nos autos nº 9890-13.2007.811.0041 (cód. 289373). O representante do Ministério Público do Estado desistiu da ação em relação ao requerido Nivaldo de Araújo. Pela decisão constante no Id. 278677099 fls. 278/280, foi homologada a desistência da ação com relação ao requerido Nivaldo de Araújo. No Id. 278677099 fls. 283 foi certificado o decurso do prazo sem a apresentação de contestação pelos requeridos José Quirino Pereira e Joel Quirino Pereira. O Ministério Público do Estado, por seu representante, apresentou impugnação às contestações (Id. 278677099 fls. 284/287 e Id. 278677850 fls. 02/20), rechaçando as preliminares arguidas, bem como requerendo a produção todas as provas admitidas em direito. O requerido José Geraldo Riva noticiou o “Acordo de Colaboração Premiada” firmado com o Ministério Público e homologado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, retificando a sua defesa e reconhecendo a procedência dos pedidos da ação. No despacho de Id. 278677851 fls. 09 foi determinado que o requerente juntasse aos autos, o anexo da colaboração premiada firmada pelo requerido Jose Geraldo Riva, o que foi cumprido, conforme Id. 278677851 fls. 12/68 e Ids. 58117362; 278677853 e 58546963. Na decisão de Id. 82158514,as preliminares e prejudiciais do mérito arguidas pelas defesas dos requeridosforam afastadas; foi decretada a revelia dos requeridos Joel Quirino e José Quirino; o processo foi saneado, fixando-se os pontos controvertidos, bem como foi determinada a intimação das partes para indicarem as provas que pretendiam produzir. O requerente e os requeridos Humberto Bosaipo, Geraldo Lauro, José Quirino e Joel Quirino, requereram a produção de prova (Id. 84080195, Id. 84810470 e Id. 84078926). Na decisão de Id. 102553039foi determinada a intimação das partes, para manifestarem se concordavam com a utilização de depoimentos das testemunhas arroladas, como prova emprestada de processos semelhantes. Os requeridos foram intimados e apenas o requerente e o requerido Geraldo Lauro manifestaram expressamente sobre a prova emprestada. Na decisão de Id. 111078670, os pedidos de prova emprestada foram deferidos e trasladados para estes autos. No despacho de Id. 138189213 a instrução processual foi encerrada, bem como foi determinada a intimação das partes, para apresentarem os memoriais finais. O representante do Ministério Público apresentou os memoriais finais no Id. 143950089. Na sequência, os requeridos José Riva, Humberto Bosaipo, Geraldo Lauro, José Quirino e Joel Quirino, por seus patronos, apresentaram os memoriais finais nos Ids. 149316279; 152767102; 15424125 e; 154301185. No Id. 168935879, o representante do Ministério Público informou a formalização de acordo de não persecução cível com o requerido Geraldo Laudo, requerendo a sua homologação. Na sentença preferida no Id. 176228466, o acordo de não persecução cível foi homologado e o processo foi julgado extinto em relação ao requerido Geraldo Lauro. Os autos vieram conclusos. É o relatório. Decido. Em primeiro lugar, em relação ao pedido de reconhecimento de prescrição, arguida pela defesa do requerido Humberto Bosaipo em seus memoriais, entendo que a analise do pedido encontra-se prejudicada, uma vez que a presente ação tem por objeto apenas o ressarcimento ao erário, o qual é imprescritível como definido no tema 897/STF. Passo a analise do mérito. Este processo foi distribuído antes da publicação da Lei Federal nº 14.230, de 25/10/2021, que promoveu significativas alterações na Lei n. 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de improbidade administrativa, de que trata o § 4º, do art. 37, da Constituição Federal e dá outras providências. Sobre a aplicação da nova lei, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo nº 843.989/PR, processo-paradigma do Tema n. 1.199, fixou as seguintes teses: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se – nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. As teses acima transcritas possuem caráter vinculante, nos termos do disposto nos arts. 927, inc. III e 987, § 2 º, ambos do Código de Processo Civil e, assim, devem ser observadas nos processos em curso, de modo que a nova norma será aplicada de imediato e não haverá retroatividade para as questões de caráter processual; para as alterações de caráter material, haverá retroatividade, se a nova norma for mais benéfica, respeitada a coisa julgada. Destaca-se, ainda, que a redação dada pela Lei n. 14.230/2021, ao art. 1º e parágrafos, da Lei n. 8.429/92, estabelece que apenas as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 serão consideradas atos de improbidade administrativa, ou seja, somente se admite responsabilizar os atos dolosos praticados com vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito, não bastando a voluntariedade do agente, in verbis: Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. § 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. § 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. § 3º O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa.(grifo nosso). Ainda, vejamos a jurisprudência do nosso Tribunal: JUÍZO DE RETRATAÇÃO – REPERCUSSÃO GERAL – TEMA 1.199 DO STF – ART. 1.030, II, CPC – APELAÇÃO CÍVEL – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – LICITAÇÃO – FRAUDE DEMONSTRADA – DIRECIONAMENTO DO OBJETO À EMPRESA PRÉ-DETERMINADA – VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA –IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CONFIGURADA – DOLO – ATO ÍMPROBO CONFIGURADO – JUÍZO DE RETRAÇÃO NEGATIVO – ACÓRDÃO MANTIDO. 1. NO CASO, RESTANDO Demonstrado o dolo na conduta do agente, não se verifica a existência de divergência com os fundamentos adotados na Tese de Repercussão Geral AFETA DO TEMA N. 1.199 DO STF. 2. “A Tese de Repercussão Geral (Tema nº 1199) não impôs novo julgamento da causa à luz da Lei nº 14.230, de 25 de outubro de 2021, que alterou a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992. De outro lado, cuida-se de questão a ser analisada pelo Tribunal Superior no julgamento do recurso especial.” (TJMT, JUÍZO DE RETAÇÃO N. 0042761-86.2013.8.11.0041, 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, REL. DES. LUIZ CARLOS DA COSTA, J. 18.07.2023). (N.U 0003325-50.2007.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/08/2023, Publicado no DJE 01/09/2023). Ressalta-se, ainda, que o art. 17, §10-D, da mencionada lei, estabelece que: “Para cada ato de improbidade administrativa, deverá necessariamente ser indicado apenas um tipo dentre aqueles previstos nos arts. 9º, 10 e 11, desta Lei.” Feitas essas considerações, verifico que no caso em comento a petição inicial aponta que os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Melo Bosaipo, atuando como responsáveis pela administração da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, teriam praticado atos de improbidade que causaram danos ao erário, enriquecimento ilícito e ofensa a princípios da Administração Pública, mediante fraude à licitação e desvio de recursos públicos, por meio da emissão de trinta e dois (32) cheques, em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. Segundo consta ainda da petição inicial, a referida empresa foi utilizada irregularmente pelos requeridos José Quirino Pereira e Joel Quirino Pereira, os quais teriam sido os contadores responsáveis pela sua constituição. O representante do Ministério Público apontou que tais ilegalidades, consistentes no uso da empresa, para o desvio de verba pública, configurou a prática de ato de improbidade administrativa, que causou prejuízo ao erário. Pois bem. De inicio, saliento que o requerido José Geraldo Riva firmou acordo de colaboração premiada com o Ministério Público, devidamente homologado pelo o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, o qual é utilizado nestes autos com finalidade de corroborar os fatos narrados na inicial. Diante da celebração do acordo, o requerido José Geraldo Riva reconheceu os atos ímprobos imputados na petição inicial, o que comporta provimento de natureza declaratória, pois, caso descumpridas as condições pactuadas na colaboração premiada, poderá o requerente comunicar o juízo e buscar a imposição das penalidades impostas no acordo. Ademais, sabe-se que as declarações do colaborador não perfazem prova isoladamente, devendo existir outros elementos corroborativos, para que o Juiz possa formar a sua convicção, para proferir a decisão de mérito. Neste sentido, cabe aqui sopesar as provas contidas na referida delação, juntadas nos Ids. 278677851 a 278677853 e, Id. 58546963, as quais foram confirmadas em juízo no Id. 111346986, uma vez que o colaborador narra detalhadamente como funcionava o esquema de desvio de verbas públicas da AL/MT, consistente no uso não apenas da empresa requerida nesta ação, mas de inúmeras outras empresas fictícias ou irregulares, para figurar em processos licitatórios ou aquisições simplificadas e receber o pagamento por produtos ou serviços que não foram prestados. O colaborador informa, em síntese, que o desvio de verba pública com a utilização de empresas fictícias ou irregulares era uma prática rotineira e comum desenvolvida pelos deputados estaduais, para o recebimento de propina mensal, com a finalidade de manter a governabilidade do executivo. Menciona ainda, que esses desvios ocorreram entre os anos de 1995 a 2015. Percebe-se, assim, que os fatos narrados pelo colaborador corroboram com o que está contido nos documentos que instruem a inicial. Dentre as empresas que participaram do citado esquema, a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos teria sido contratada para a prestação de serviços e teria sido beneficiária dos cheques emitidos pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, nos anos de 2001 a 2002. As provas produzidas nos autos demonstram que a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos foi utilizada irregularmente pelos requeridos, já que seu o numero de CNPJ pertencia a outra empresa e foi utilizado para justificar a emissão dos cheques da AL/MT, com a criação da referida empresa inexistente, ou seja, os requeridos se utilizaram do cadastro de uma empresa que se encontrava regular, e utilizaram os dados para criação de outra empresa fictícia para justificar os pagamentos ilegais (Id. 58115730 fls. 29/30). Observa-se que o CNPJ 04.600.944/001-50 consta o nome A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções e, como contador responsável o requerido Joel Quirino, no entanto, o mesmo numero de CNPJ foi utilizado para criar ilegalmente a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos teria, a qual foi utilizada ilegalmente pelos requeridos para emissão de vários cheques nos anos de 2001 a 2002 (Id. 58115730 fls. 29/30 e 47/50). Ademais, o sócio, a pessoa de nome Ademir Caberlin, afirmou que constituiu a empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções, através dos contadores e requeridos Joel Quirino e José Quirino, mas que nunca autorizou a abertura de qualquer outra empresa, bem como que nunca participou de qualquer licitação na AL/MT e que desconhece a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos (Id. 58115733 – fls. 83/86). Outrossim, os requeridos não apresentaram nota fiscal ou comprovante de recebimento dos produtos ou serviços, supostamente adquiridos, para justificar esses pagamentos realizados, tampouco comprovaram a existência do regular procedimento licitatório prévio. Certamente, esses produtos ou serviços, assim como a empresa, jamais existiram. Portanto, não há dúvidas de que os dados da empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construçõesforam utilizados irregularmente, para a criação da empresa inexistente A. Caberlin Publicidade e Eventos, sendo assim, o pagamento à empresa fictícia indica a intenção concreta de beneficiar terceiros, com prejuízo ao erário, caracterizando o dolo na conduta ímproba. Os requeridos Humberto Bosaipo e José Riva, cada um desempenhando as suas atribuições, tinham a obrigação legal de zelar pelo correto trâmite dos procedimentos de aquisição de bens ou de prestação de serviços. No caso em comento, não há emissão de uma única nota fiscal de serviços prestados pela empresa, a qual sequer tinha autorização para emitir nota fiscal, documento essencial no procedimento de conferencia da prestação do serviço/atesto e de empenho e pagamento, notadamente, quando se tratam de valores expressivos, que exigem modalidade licitatória mais complexa. Desta forma, está demonstrado que os requeridos não fizeram o mínimo do que se espera de um gestor público. Na análise dos autos verifico a existência de vinte e nove (29) cópias de cheques emitidos pela Assembleia Legislativa, nominais em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos (Id. 58115738), quais sejam: 1) Cheque n° 010112, no valor de R$72.000,00 (setenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 39). 2) Cheque n° 010611, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 41). 3) Cheque n° 010702, no valor de R$52.000,00 (cinquenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 43). 4) Cheque n° 011210, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 45). 5) Cheque n° 011310, no valor de R$46.000,00 (quarenta e seis mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 47). 6) Cheque n° 011473, no valor de R$65.300,00 (sessenta e cinco mil, trezentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 48). 7) Cheque n° 010374, no valor de R$72.500,00 (setenta e dois mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 50). 8) Cheque n° 011815, no valor de R$74.350,00 (setenta e quatro mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 52). 9) Cheque n° 010720, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 54). 10) Cheque n° 012147, no valor de R$69.526,00 (sessenta e nove mil, quinhentos e vinte e seis reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 56). 11) Cheque n° 010919, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 58). 12) Cheque n° 011980, no valor de R$55.000,00 (cinquenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 60). 13) Cheque n° 012516, no valor de R$52.350,00 (cinquenta e dois mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 62). 14) Cheque n° 012753, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 64). 15) Cheque n° 012610, no valor de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 66). 16) Cheque n° 010727, no valor de R$45.000,00 (cinquenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 68). 17) Cheque n° 013053, no valor de R$48.500,00 (quarenta e oito mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 70). 18) Cheque n° 013228, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 72). 19) Cheque n° 013963, no valor de R$40.000,00 (quarenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 74). 20) Cheque n° 014074, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 76). 21) Cheque n° 014416, no valor de R$51.434,80 (cinquenta e um mil, quatrocentos e trinta e quatro reais, oitenta centavos); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 78). 22) Cheque n° 014561, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 80). 23) Cheque n° 012828, no valor de R$71.500,00 (setenta e um mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 82). 24) Cheque n° 015029, no valor de R$62.350,00 (sessenta e dois mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 84). 25) Cheque n° 016093, no valor de R$67.410,00 (sessenta e sete mil, quatrocentos e dez reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 88). 26) Cheque n° 016116, no valor de R$35.680,00 (trinta e cinco mil, seiscentos e oitenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 89). 27) Cheque n° 015478, no valor de R$42.560,00 (quarenta e dois mil, quinhentos e sessenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 90). 28) Cheque n° 016355, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 91). 29) Cheque n° 016038, no valor de R$67.800,00 (sessenta e sete mil, oitocentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 93). Já os cheques n° 0850004; 014976 e; 015119 estão ilegíveis, não sendo possível identificar os valores e o nome da empresa, de modo que não poderão ser objeto de análise. Esses cheques foram emitidos pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, por meio de seus representantes à época, os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Bosaipo, os quais detinham a competência para autorizar esses pagamentos, totalizando o valor de R$1.616.260,80 (um milhão, seiscentos e dezesseis mil, duzentos e sessenta reais e oitenta centavos). No entanto, a empresa beneficiária desses pagamentos não forneceu nenhum produto ou serviço, conforme já esclarecido acima, de modo que os requeridos efetivamente causaram danos ao erário ao permitiram esses pagamentos sem a devida contraprestação. O requerido Joel Quirino, por sua vez, à época dos fatos era o contador responsável pela empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções perante a Secretaria de Estado de Fazenda de Mato Grosso, conforme consta no Id. 58115730 (fls. 47/50), ficando comprovada a sua efetiva participação no desvio de recursos público, por meio do uso dos dados e da constituição da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. utilizada no esquema com CNPJ de terceiro, no qual o requerido não apresentou nenhuma prova que pudesse afastar tal afirmativa. Todos esses fatos demonstram a prática de atos de improbidade administrativa, ficando evidente a existência de conluio entre os agentes públicos com o intuito de desviar dinheiro público. Assim, restou sobejamente demonstrada que os requeridos efetuaram os pagamentos para a empresa fictícia, sem a devida contraprestação, sem qualquer emissão de atesto ou comprovante de entrega dos serviços. Ainda, resguardado o direito ao contraditório e à ampla defesa, nenhum elemento foi trazido que pudesse afastar tal convicção, ou ainda indicar a boa-fé dos requeridos, de forma que resta caracterizada a prática de atos de improbidade administrativa. Não há que se falar em conduta culposa, em desídia ou falta de atenção, pois ficou demonstrado nos autos que os requeridos, cada com sua “atribuição”, concorreram para efetuar pagamentos de serviços que nunca foram prestados, tendo plena ciência de que se tratava de um procedimento, apenas para dar aparência de legalidade aos atos. Ainda, José Geraldo Riva, na condição de colaborador, também participou “do esquema”, juntamente com os demais requeridos, desviando recursos públicos, mediante contratação de empresas inexistentes ou irregulares. Suas afirmações, mesmo que venha de pessoa cujo comportamento anterior seja ética e socialmente reprovável, não retira o valor dos depoimentos prestados, em relação aos pagamentos efetuados por meio de cheques, sem a devida contraprestação. Além disso, toda a narrativa do esquema fraudulento de emissão de cheques com uso de empresas inexistentes ou irregulares é confirmada também pelas testemunhas Nilson Roberto Teixeira, Katia Maria Aprá, Edil Dias e Raquel Alves ouvidas em juízo (Id. 111342152; 111348683; 111348646; 111348648). No caso dos autos, alia-se a estes fatos a outros elementos de prova, que encontram harmonia com o depoimento do colaborador premiado, evidenciando a ocorrência da conduta ímproba. Assim, diante da clareza dos elementos de prova documental, corroborado com a colaboração premiada, ficou evidenciado que os requeridos praticaram ato de improbidade administrativa, que efetivamente causou prejuízo ao erário. No mais, em relação ao requerido José Quirino, embora se reconheça que a narrativa apresentada pressupõe indícios de ilegalidades praticadas pelo requerido no exercício de sua função como contabilista, verifico, contudo, que não há qualquer conduta dolosa capaz de configurar ato de improbidade administrativa, pelo contrário, não há nos autos indícios suficientes de sua autoria na constituição da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. Verifica-se que as imputações atribuídas ao requerido José Quirino foram insuficientes para configurar ato de improbidade administrativa, uma vez que não existe nos autos, algum documento por ele assinado ou algum ato por ele praticado, capaz de comprovar ter agido com dolo, com o objetivo de se beneficiar de um ato ilícito. Assim, impõe-se afastar a responsabilidade deste requerido. Dessa forma, em relação aos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Joel Quirino, em atenção ao exposto acima, verifica-se que dentre as tipificações contidas na lei de improbidade administrativa, aquela prevista no art. 10, da Lei n.º 8.429/92, melhor se amolda aos fatos. Portanto, os requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Joel Quirino devem responder pela prática dos atos de improbidade descritos no art. 10, caput, c/c art. 3º da Lei nº 8.429/92. Vejamos: Art. 3º As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra dolosamente para a prática do ato de improbidade. Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). A Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92) tutela o dever de probidade do agente público, que é o dever de: o funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer. (CAETANO, Marcello. Manual de Direito Administrativo. 1ª ed. brasileira, t. II/684. Rio de Janeiro: Forense, 1970 apud SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 649). O dolo que se exige para a configuração de improbidade administrativa reflete-se na simples vontade consciente de aderir à conduta descrita no tipo, produzindo os resultados vedados pela norma jurídica, o que ocorreu no caso em questão. Observa-se que o dolo restou configurado no momento em que os requeridos José Riva e Humberto Bosaipo, como ordenadores de despesas e responsáveis pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, autorizaram o pagamento para a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, sem a devida contraprestação, causando dano ao erário. No que tange a conduta dolosa do requerido Joel Quirino, esta se caracterizou no momento em que foi o responsável pela constituição e o uso dos dados da empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções para criação da empresa fictícia A. Caberlin Publicidade e Eventos, o que causou prejuízo aos cofres públicos. A propósito, sobre o dolo, vejamos o entendimento jurisprudencial: JUÍZO DE RETRATAÇÃO – REPERCUSSÃO GERAL – TEMA 1.199 DO STF – ART. 1.030, II, CPC – APELAÇÃO CÍVEL – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – LICITAÇÃO – FRAUDE DEMONSTRADA – DIRECIONAMENTO DO OBJETO À EMPRESA PRÉ-DETERMINADA – VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA –IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CONFIGURADA – DOLO – ATO ÍMPROBO CONFIGURADO – JUÍZO DE RETRAÇÃO NEGATIVO – ACÓRDÃO MANTIDO. 1. NO CASO, RESTANDO Demonstrado o dolo na conduta do agente, não se verifica a existência de divergência com os fundamentos adotados na Tese de Repercussão Geral AFETA DO TEMA N. 1.199 DO STF. 2. “A Tese de Repercussão Geral (Tema nº 1199) não impôs novo julgamento da causa à luz da Lei nº 14.230, de 25 de outubro de 2021, que alterou a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992. De outro lado, cuida-se de questão a ser analisada pelo Tribunal Superior no julgamento do recurso especial.” (TJMT, JUÍZO DE RETAÇÃO N. 0042761-86.2013.8.11.0041, 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, REL. DES. LUIZ CARLOS DA COSTA, J. 18.07.2023). (N.U 0003325-50.2007.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/08/2023, Publicado no DJE 01/09/2023). RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - PREJUDICIAL DE MÉRITO - PRESCRIÇÃO - TEMA 897 DO STF - NÃO OCORRÊNCIA - MÉRITO - APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.230/2021 - ELEMENTO SUBJETIVO DOLO - DEVIDAMENTE COMPROVADO - RECURSO DESPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA. 1. Prescrição. São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa (Tema 897/STF). 2. Mérito. Aquisição de grande quantidade de combustível pela Casa Legislativa do Município de Cuiabá/MT, considerando-se a frota de veículos e o período de utilização: 60.000 (sessenta mil) litros de gasolina, 25.000 (vinte e cinco mil) litros de álcool e 300 (trezentos) litros de óleo lubrificante. 3. Fatos comprovados por auditoria que atesta celeridade atípica no procedimento, aquisição de quantidade de combustível superior à demanda da entidade, em cotejo com período de utilização (dois meses) e a quantidade de veículos (dois) da frota. 4. Notas fiscais emitidas pela empresa vencedora do certame evidenciam a irregularidade do procedimento, porquanto não há informações mínimas acerca dos produtos fornecidos. 5. Demonstrado o dolo específico do recorrente em praticar as condutas vedadas pela lei em benefício próprio e prejuízo ao erário e à coletividade, impõe-se a manutenção da sentença condenatória. 6. Recurso desprovido. (N.U 0010263-34.2013.8.11.0041, Relator: Antonio Veloso Peleja Junior, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, j. em 14/03/2023, publicado no DJE 21/03/2023) (grifo nosso.) RECURSOS DE APELAÇÃO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - INOCORRÊNCIA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - PRELIMINAR - MÉRITO - APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.320/2021- DOLO DEMONSTRADO NA HIPÓTESE – DANO AO ERÁRIO DEVIDAMENTE DEMONSTRADOS – RECURSOS DESPROVIDOS – SENTENÇA MANTIDA. 1. Restando demonstrado, no caso concreto, o dolo específico dos recorrentes em praticar as condutas vedadas pela lei em benefício próprio e prejuízo ao erário e à coletividade, impõe-se a manutenção da sentença que lhes impôs condenação pela prática de ato ímprobo. 2. Recursos desprovidos. (N.U 0008931-83.2012.8.11.0003, Relator: Gerardo Humberto Alves Silva Junior, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, j. em 07/02/2023, publicado no DJE 07/03/2023). (grifo nosso). Desse modo, estando suficientemente comprovados os fatos descritos na inicial, com relação aos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Joel Quirino ficou configurada a prática do ato de improbidade administrativa descrita no art. 10 c/c 3º, da Lei 8.429/92. Porém, encontra-se prescrita a aplicação da sanção imposta no art. 12, da referida lei. Entretanto, a prescrição desses atos ímprobos não alcança a ação de ressarcimento dos prejuízos causados, nos termos da decisão do Supremo Tribunal Federal em sede de repercussão geral (Tema 897): São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. Portanto, mostra-se devida a condenação dos requeridos em ressarcir o erário, em razão da prática de ato doloso tipificado no art. 10, da Lei de Improbidade Administrativa, pelo prejuízo efetivamente causado referente a somatória dos cheques emitidos em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, cujo pagamento foi efetuado sem nenhuma contraprestação. Desta forma, inegável a obrigação dos requeridos em devolver aos cofres públicos o valor do efetivo dano causado ao erário. A imposição de ressarcimento ao erário se faz necessária e exprime a ideia de contraprestação, equivalente à reparação dos danos efetivamente causados pelo agente que, ilicitamente, contribuiu para a sua ocorrência. No caso em comento, esse dano corresponde aos valores pagos por serviços que não foram prestados. Diante do exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos, em relação ao requerido José Geraldo Riva, para reconhecer e declarar a prática do ato deimprobidadeadministrativa previsto no art. 10, caput, da Lei n.º 8.429/92, deixando, contudo, de aplicar a respectiva sanção, haja vista a colaboração premiada existente nos autos. Em relação ao requerido José Quirino Pereira, não havendo provas suficientes da prática do ato ímprobo doloso imputado ao requerido, julgo improcedentes os pedidos, com fundamento no art. 487, I, do CPC. Já em relação aos requeridos Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira, condeno-os ao ressarcimento do dano causado ao erário, de forma solidária, no valor deR$1.616.260,80 (um milhão, seiscentos e dezesseis mil, duzentos e sessenta reais e oitenta centavos). Sobre o valor referente ao ressarcimento do dano, os valores deverão ser acrescidos de juros de meio por cento (0,5%) ao mês, desde o dano efetivo (desconto dos cheques) até 11/01/2003, quando passa a ser de um por cento (1%) ao mês, com a entrada em vigor do Código Civil (lei 10.406/2002) e correção monetária, pelo INPC, também incidente a partir do dano (art. 398, Código Civil; Súmulas 43 STJ e 54 STF). Condeno os requeridos Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira, ao pagamento das custas e despesas processuais pro rata. Por consequência, julgo extinto o processo com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Transitada em julgado, expeça-se o necessário e, não havendo pendências, arquivem-se os autos, observadas as formalidades legais. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Celia Regina Vidotti Juíza de Direito”. Em suas razões recursais, o apelante HUMBERTO MELO BOSAIPO aduz que não consta do processado elementos probatórios de que tenha realmente contribuído para a suposta lesão ao erário. Argumenta que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estabelece que a delação premiada, por si só, não constitui prova suficiente para fundamentar uma condenação, sendo necessária a apresentação de provas independentes que corroborem as alegações do delator. Salienta, nesse contexto, que inexistem provas adicionais que confirmem as declarações feitas na colaboração premiada e que a condenação da parte apelante está baseada exclusivamente em provas documentais, sem análise técnica e pericial, o que não é suficiente para a configuração do ato improbo. Assevera, ademais, que não já comprovação de que a parte apelante agiu com vontade livre e consciente de desobedecer aos comandos legais e violar os princípios da moralidade, imparcialidade e legalidade. Pontua, por derradeiro, a desproporcionalidade das sanções aplicadas, pois foi condenado ao ressarcimento ao erário, sem provas robustas de sua responsabilidade exclusiva pelo alegado prejuízo. Em face dessa situação, pugna pelo “CONHECIMENTO E PROVIMENTO DA APELAÇÃO, para reformar a r. sentença de primeiro grau, reconhecendo a ilegalidade das provas utilizadas e, consequentemente, JULGANDO IMPROCEDENTE A AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E ABSOLVENDO O APELANTE das sanções impostas; Subsidiariamente, na hipótese de manutenção da condenação, requer-se a redução da sanção aplicada, em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade” (ID. 278677962). Por sua vez, o apelante JOEL QUIRINO PEREIRA sustenta que a condenação não possui embasamento probatório, pois não há demonstração de que praticou ato doloso ou utilizou a empresa, existindo apenas “[...] UM PAPEL QUE CONSTA SEU NOME E CRC, SEM ASSINATURA SEM O DOCUMENTOS DE CADASTRO QUE POSSA CONFIRMAR QUE O MESMO AGIU DE MA FÉ OU DOLO”. Pondera que, ao analisar o contrato social, observa-se que o instrumento foi confeccionado pelo escritório “DIEGO COTABILIDADE”, cujo responsável, naquele período, era o contador Luiz Alberto Dondo Gonçalves, não tendo qualquer grafia ou elaboração por parte do apelante, nem mesmo fornecimento da etiqueta do CRC, documento exigido à época. Afirma, nesse contexto, que desconhece o contrato social, os sócios, os seus termos, o advogado subscritor e o extrato do cadastro na SEFAZ sem qualquer critério legal, que inseriu seu nome como contador responsável. Ressalta que por essa razão a defesa insistiu reiteradas vezes pela realização de perícia técnica para apurar os fatos. Afiança a ausência de fundamentação da sentença, pois o seu irmão foi absolvido por não constar seu nome no extrato, enquanto a parte apelante foi condenada somente por tal motivo. Destaca, quando ao mérito, que os atos que lhe são imputados constituem mera irregularidade formal, passível de nulidade tão somente quando lesivo ao erário público, não evidenciada na hipótese. Posiciona, ademais, que não há dolo comprovado, pois não recebeu, pagou, assinou, utilizou, deu manutenção ao ato. Afirma que a pessoa que utilizou apenas colocou o nome em um cheque e cometeu os desvios, sem nenhuma participação sua. Consigna, à vista disso, que a única evidência concreta é que terceiros utilizaram o nome da empresa e cometeram ilícitos sem conluio ou participação da parte apelante. Por essa razão, requer “a total procedência do recurso para reformar a decisão recorrida e determinar a absolvição do apelante” (ID. 278677970). O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, em suas razões, afirma que as provas constantes dos autos evidenciam a participação e o dolo do requerido JOSÉ QUIRINO PEREIRA. Nesse viés, argumenta que em diligências administrativas, não foi possível localizar a empresa A. CABERLIN PUBLICIDADE E EVENTOS, apenas a empresa CENTRO OESTE MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO, cujo nome fantasia é A. CABERLIN. Aponta que o proprietário da referida empresa, ao ser ouvido no curso da investigação extrajudicial, declarou que os atos de constituição da empresa e da filial eram de responsabilidade dos contatores JOEL e JOSÉ QUIRINO. Acrescenta, a esse respeito, que como profissionais experientes e habilitados na área contábil é impossível alegar desconhecimento a respeito das flagrantes irregularidades em relação à empresa A. CABERLIN PUBLICIDADE E EVENTOS. Esclarece que ao elaborarem e analisarem documentos de uma empresa manifestamente inexistente, os contadores afiram com plena consciência da ilicitude de suas condutas, contribuindo deliberadamente para a consumação do ato ilícito. Reporta, outrossim, que no grupo formado na Assembleia Legislativa para forjar empresas e burlar licitações com desvios de dinheiro público, somente JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA possuíam a expertise para burlar toda a burocracia da criação de uma empresa fantasma, o que leva, obrigatoriamente, a concluir que o resultado não ocorreria como de fato aconteceu sem a participação efetiva deles. Ao discorrer sobre isso, acrescenta que diferentemente da conclusão sentencial, o pedido inicial foi instruído com vários materiais encontrados na empresa dos contadores e na residência do apelado, que somados às provas testemunhais e ao depoimento do colaborador JOSÉ GERALDO RIVA, confirmam a sua participação decisiva no esquema criminoso como criador da empresa fantasma. Enuncia, ainda, que “não bastasse os documentos apreendidos de posse do apelado fazer provas contra eles, o vínculo indissolúvel entre esses contadores e os agentes públicos responsáveis por providenciar e efetuar os pagamentos ilícitos, HUMBERTO BOSAIPO e Nivaldo, são confirmados nas declarações, da testemunha Edil Dias Corrêa, ouvida no Processo n.0009890.13.2007.811.0041”. Expõe, em destaque final, que os referidos contadores foram condenados nos autos n.° 4404-47.2007.811.0041, 3668-63.2006.8.11.0041, 45255-75.2007.8.11.0041 e 4135-42.2006.8.11.0041, pela participação no mesmo esquema ilícito. Com base nesses fundamentos, requer “seja conhecido e PROVIDO o presente recurso de Apelação para o fim de reformar a respeitável sentença, com o fito de condenar o apelado JOSÉ QUIRINO PEREIRA às sanções da Lei de Improbidade Administrativa (Lei n.º 8.429/92) pelas práticas descritas na inicial” (ID. 278677974). Nas contrarrazões, o Parquet defende que está comprovada, de forma inequívoca, a existência de esquema de corrupção da qual os apelantes participavam, pugnando, por essa razão, pelo não provimento dos recursos interpostos (ID. 278677981). JOSÉ QUIRINO PEREIRA, ao contrarrazoar o apelo ministerial, reprisa ipsis literis as razões de apelação apresentadas por JOEL QUIRINO PEREIRA, postulando, com esses argumentos, pela manutenção da sentença de absolvição (ID. 278677983). A Procuradoria-Geral de Justiça opina “pelo desprovimento dos apelos manejados por Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira e provimento do recurso interposto pelo Ministério Público” (ID. 284030887). É o relatório. V O T O EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO (RELATORA): Egrégia Câmara: Como relatado, trata-se de RECURSOS DE APELAÇÃO, interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO e por HUMBERTO MELO BOSAIPO e JOEL QUIRINO PEREIRA, contra a sentença proferida pela Excelentíssima Juíza de Direito, Dra. Célia Regina Vidotti, nos autos de n.° 0001868-29.2008.811.0041, em trâmite perante a Vara Especializada em Ações Coletivas da Comarca de Cuiabá, MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais. Extrai-se do processado que o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO ajuizou “AÇÃO CIVIL DE RESSARCIMENTO DE DANOS AO ERÁRIO” em desfavor de JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO, GERALDO LAURO, NIVALDO DE ARAÚJO, JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA, visando a condenação de ressarcimento dos danos causados ao erário, no valor de R$ 1.819.430,80 (um milhão e oitocentos e dezenove mil e quatrocentos e trinta reais e oitenta centavos). De acordo com o narrado na petição inicial, após investigações iniciadas a partir da operação “Arca de Noé”, constatou-se que os requeridos JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO, então gestores da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso, desviaram R$ 1.819.430,80, mediante cheques nominais à empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, criada de forma fraudulenta para justificar a emissão de cheques, atos para os quais colaboraram GERALDO LAURO e NIVALDO DE ARAÚJO, ocupantes de cargos nos setores de finanças, patrimônio e licitação da Assembleia, além de JOEL QUIRINO PEREIRA e JOSÉ QUIRINO PEREIRA, que embora não ocupassem cargos públicos, agiram em concurso com os demais, sendo responsáveis pela criação e utilização de empresas inexistentes. Citados, NIVALDO DE ARAÚJO, GERALDO LAURO, HUMBERTO MELO BOSAIPO apresentaram contestação (ID 278677091 – pág. 15/27, ID. 278677094 – pág. 44/78 e ID. 278677097 – pág. 123/131), JOEL QUIRINO PEREIRA e JOSÉ QUIRINO PEREIRA, a despeito da citação regular, não apresentaram defesa (ID. 278677866) e JOSÉ GERALDO RIVA compareceu espontaneamente aos autos e ofereceu contestação (ID. 278677094 – pág. 44/78), impugnadas pelo Parquet nos IDs. 278677099 - pág. 285/287 e 278677850 - pág. 02/20). Diante do falecimento de NIVALDO DE ARAÚJO, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO requereu a desistência da ação com a extinção do processo em relação a ele (ID. 278677099 – pág. 144/148), homologada pela decisão de ID. 278677099 – pág. 278/281. No curso da instrução, JOSÉ GERALDO RIVA noticiou a celebração de “Acordo de Colaboração Premiada” firmado com o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO e homologado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, ocasião na qual retificou a sua defesa e reconheceu a procedência dos pedidos (ID. 278677850 – pág. 70). Posteriormente, o Parquet pugnou pelo compartilhamento do acordo de colaboração premiada em relação aos fatos narrados na ação, com a juntada dos documentos que a instruem (ID. 278677851 – pag. 05/07 e pág. 14/68, ID. 278677852, 278677853 – pág. 01/87 e 278677856). Sobre os documentos colacionados, manifestaram-se JOEL QUIRINO PEREIRA, JOSÉ QUIRINO PEREIRA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677853 – pág. 91/144 e ID. 278677862). Saneado o processo (ID. 278677867), admitiu-se a prova emprestada (ID. 278677882, ID. 278677894 e ID. 278677895/278677903), além do depoimento pessoal dos requeridos (ID. 278677912 e ID. 278677913). Encerrada a instrução processual, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (ID. 278677925), HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677931), JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA (ID. 278677935) apresentaram memoriais. GERALDO LAURO celebrou Acordo de Não Persecução Cível com o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (ID. 278677952), homologado pela sentença de ID. 278677953. Sobreveio, então, a sentença, já transcrita no relatório, que julgou improcedentes os pedidos em relação a JOSÉ QUIRINO PEREIRA e parcialmente procedentes quanto aos demais requeridos. Com essas considerações, passo à análise das insurgências recursais. DO PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA De proêmio, aponta-se que JOEL QUIRINO PEREIRA solicitou a concessão dos benefícios da justiça gratuita, uma vez que o pagamento do preparo constitui requisito de admissibilidade do recurso. À vista disso, a concessão ou não da assistência judiciária gratuita deve ser ponderada em cada caso específico, em conformidade com os elementos existentes no processo e com amparo no Código de Processo Civil e na Constituição Federal, que objetivam a facilitação do acesso à justiça. Os artigos 98 e 99, do Código de Processo Civil assim dispõem: “Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei. § 1º A gratuidade da justiça compreende: I - as taxas ou as custas judiciais; II - os selos postais; III - as despesas com publicação na imprensa oficial, dispensando-se a publicação em outros meios; IV - a indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá do empregador salário integral, como se em serviço estivesse; V - as despesas com a realização de exame de código genético - DNA e de outros exames considerados essenciais; VI - os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira; VII - o custo com a elaboração de memória de cálculo, quando exigida para instauração da execução; VIII - os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, para propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório; IX - os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido. § 2º A concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência. § 3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. § 4º A concessão de gratuidade não afasta o dever de o beneficiário pagar, ao final, as multas processuais que lhe sejam impostas. § 5º A gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou consistir na redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. § 6º Conforme o caso, o juiz poderá conceder direito ao parcelamento de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. § 7º Aplica-se o disposto no art. 95, §§ 3º a 5º , ao custeio dos emolumentos previstos no § 1º, inciso IX, do presente artigo, observada a tabela e as condições da lei estadual ou distrital respectiva. § 8º Na hipótese do § 1º, inciso IX, havendo dúvida fundada quanto ao preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade, o notário ou registrador, após praticar o ato, pode requerer, ao juízo competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento de que trata o § 6º deste artigo, caso em que o beneficiário será citado para, em 15 (quinze) dias, manifestar-se sobre esse requerimento. Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso. § 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso. § 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos. § 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. § 4º A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça. § 5º Na hipótese do § 4º, o recurso que verse exclusivamente sobre valor de honorários de sucumbência fixados em favor do advogado de beneficiário estará sujeito a preparo, salvo se o próprio advogado demonstrar que tem direito à gratuidade. § 6º O direito à gratuidade da justiça é pessoal, não se estendendo a litisconsorte ou a sucessor do beneficiário, salvo requerimento e deferimento expressos. § 7º Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento”. (grifo nosso). Na mesma vertente, o inciso LXXIV, do artigo 5.º, da Constituição Federal, disciplina em seu texto legal que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. Sob esse aspecto, cabe ao julgador formular o seu entendimento a respeito da questão, para que a aplicação indiscriminada da norma benéfica não desvirtue sua finalidade, que é garantir o acesso à justiça àqueles que, de fato, necessitam do benefício. In casu, de acordo com o despacho lançado no ID. 284903851, a parte apelante foi intimada para comprovar a alegada incapacidade financeira e, na manifestação de ID. 287346364, instruída com documentos, cumpriu a exigência legal. Sendo assim, presentes os requisitos, DEFIRO, ao apelante JOEL QUIRINO PEREIRA, os benefícios da justiça gratuita na seara recursal. DA PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO No recurso de apelação interposto por JOEL QUIRINO PEREIRA e nas contrarrazões de JOSÉ QUIRINO PEREIRA, as partes suscitam a ausência de fundamentação, postulando pela declaração de nulidade da sentença. Como se sabe, o artigo 489, § 1°, do CPC, dispõe que não se considera fundamentada qualquer decisão judicial que: “Art. 489. São elementos essenciais da sentença: [...] § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. § 2º No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão. § 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé”. Na hipótese, a despeito do que argumenta a parte apelante, constata-se que a magistrada a quo expôs os motivos pelos quais julgou parcialmente procedente a ação, analisando o acervo probatório com o devido embasamento de sua decisão em dispositivos de lei e jurisprudência aplicáveis à espécie. Ademais, conforme vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça: “O art. 489 do Código de Processo Civil de 2015 impõe a necessidade de enfrentamento dos argumentos que possuam aptidão, em tese, para infirmar a fundamentação do julgado, não estando o julgador obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão”(AgInt no REsp 1662345 / RJ, Relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, Data do Julgamento: 13/06/2017). Nesse sentido: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – PRELIMINARES DE CERCEAMENTO DE DEFESA E NULIDADE DE SENTENÇA REJEITADAS – PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA ACOLHIDAS – DOAÇÃO DE BEM IMÓVEL PÚBLICO A PARTICULAR – DISPENSA INDEVIDA DE PROCEDIMENTO LICITATÓRIO – AUSÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO – CONDUTAS DOS ARTIGOS 10 E 11 DA LIA – TEMA 1.199/STF – APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.230/21 AOS PROCESSOS EM TRÂMITE – DOLO ESPECÍFICO – NÃO COMPROVADO – AUSÊNCIA DE PERDA PATRIMONIAL EFETIVA – ATOS DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADOS – SENTENÇA REFORMADA – IMPROCEDÊNCIA DO PLEITO INICIAL – RECURSOS CONHECIDOS E PROVIDOS. 1. Não configura cerceamento de defesa o julgamento da causa sem a produção de prova quando o tribunal de origem considerar substancialmente instruído o feito, declarando a existência de provas suficientes para seu convencimento. 2. “Não há se falar em nulidade da sentença, por ausência de fundamentação, se o magistrado exarou motivação suficiente para justificar sua convicção, assente na realidade dos autos, atendendo ao disposto no artigo 458 CPC/73 (489 do CPC/15).” (N.U 1006405-70.2016.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 07/12/2021, Publicado no DJE 14/12/2021). 3. Nos termos do art. 29, VIII da CF e do tema 469/STF, deve ser acolhida a ilegitimidade passiva dos ex-vereadores, pois “nos limites da circunscrição do município e havendo pertinência com o exercício do mandato, garante-se a imunidade ao vereador“. 4. No julgamento do ARE 843.989/PR, afetado como representativo de controvérsia (Tema 1.199), o STF adotou o entendimento de que as alterações promovidas pela Lei nº 14.230/2021 devem ser aplicadas às causas sem trânsito em julgado. 2. Quanto ao dolo específico, a nova redação do artigo 1º, §§ 1º e 2° da Lei de Improbidade Administrativa estabelece que, para a configuração do ato ímprobo, é necessária a comprovação da vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado. 3. A inobservância do ditame legal quanto à dispensa de licitação para doação de bem público, por si só, não caracteriza o ato ímprobo, se não restaram comprovados o elemento subjetivo – dolo específico – dos agentes e a perda patrimonial efetiva, a teor do que dispõe a nova redação dada aos artigos 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992. 4. Recursos conhecidos e providos”. (N.U 0007436-93.2015.8.11.0004, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, EDSON DIAS REIS, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 21/03/2023, Publicado no DJE 10/04/2023). (Grifo nosso). "RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANOS AMBIENTAIS – DESMATAMENTO IRREGULAR – ÁREA DE RESERVA LEGAL E PRESERVAÇÃO PERMANENTE – PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO E CERCEAMENTO DE DEFESA – REJEITADAS – MÉRITO – ALEGAÇÃO DA NECESSIDADE DA PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL OFICIAL – DESNECESSIDADE - EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS PROBANTES NOS AUTOS – MANUTENÇÃO DA MULTA COMINATÓRIA – RECURSO DESPROVIDO. 1 - O art. 489 do Código de Processo Civil de 2015 impõe a necessidade de enfrentamento dos argumentos que possuam aptidão, em tese, para infirmar a fundamentação do julgado, não estando o julgador obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão” (AgInt no REsp 1662345 / RJ, Relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, Data do Julgamento: 13/06/2017). 2 - Não configura cerceamento de defesa o julgamento da causa sem a produção de prova pericial, quando juiz considerar substancialmente instruído o feito, declarando a existência de provas suficientes para seu convencimento. 3 – Verificando razoável a multa cominatória aplicada, não há que se falar em minoração, tendo-se em vista que a finalidade da multa consiste justamente em coibir o descumprimento das obrigações impostas”. (N.U 0004902-28.2010.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 07/03/2023, Publicado no DJE 04/04/2023). (Grifo nosso). “APELAÇÃO CÍVEL RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA – PRELIMINAR NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO – REQUISITOS DO ART. 489 DO CPC OBSERVADOS – PRELIMINAR REJEITADA – MULTA APLICADA PELO PROCON – TEMPO DE ESPERA NA FILA DE AGÊNCIA BANCÁRIA - INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI MUNICIPAL – ASSUNTO DE INTERESSE LOCAL – COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DO MUNICÍPIO – PRECEDENTE DO STF – MULTA EXORBITANTE - VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE NÃO CONFIGURADO – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. Não há se falar em nulidade da sentença, por ausência de fundamentação, se o magistrado exarou motivação suficiente para justificar sua convicção, assente na realidade dos autos, atendendo ao disposto no artigo 458 CPC/73 (489 do CPC/15). O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que os municípios detêm competência legislativa para dispor sobre segurança, rapidez e conforto no atendimento de usuários de serviços bancários, como no caso concreto, por serem tais matérias assuntos de interesse local (RE 610221 RG). Quanto à verificação do acerto ou desacerto da aplicação de multa pelo PROCON, não cabe ao Judiciário rever o mérito dos atos administrativos, mas apenas verificar se foram observados os procedimentos e as normas legais. A graduação da multa administrativa pela não observância ao CDC e às Leis Estaduais e Decreto Federal, se mostra adequada, em especial, gravidade das irregularidades, à luz do art. 57 da legislação consumerista. Não há falar-se em ilegalidade no Processo Administrativo, quando oportunizado à parte a ampla defesa e o contraditório, anterior à aplicação da pena de multa pelo PROCON Municipal, garantindo-se, assim, o devido processo legal. Nos termos do art. 85, §11º, do CPC, ao julgar o recurso, o Tribunal deve majorar a verba honorária anteriormente fixada, levando-se em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, não ultrapassando o percentual máximo disposto nos §§ 2º e 3º, do art. 85, do CPC”. (N.U 1006405-70.2016.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 07/12/2021, Publicado no DJE 14/12/2021). (Grifo nosso). Assim, não se vislumbra a alegada fundamentação insuficiente, apta a macular o decisum. DO MÉRITO Quanto aos recursos propriamente ditos, salienta-se que os pedidos de ressarcimento, fundados no artigo 37, § 5°, da Constituição da República, reclamam o reconhecimento de ato de improbidade doloso como causa do prejuízo alegado, conforme definido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Leading Case n.° 852475 (Tema n.° 897), no qual fixou a tese no sentido de que: “São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa”. A partir do tema supratranscrito, vê-se que o pedido de ressarcimento ao erário, conquanto imprescritível, subordina-se à prévia análise da ocorrência, ou não, do ato de improbidade administrativa e o elemento subjetivo doloso, ainda que inaplicáveis, por efeitos temporais, as demais sanções previstas na Lei n.° 8.429/92. Como cediço, a Lei n.° 14.230/2021 modificou diversos dispositivos da Lei de Improbidade Administrativa, incluindo, expressamente, os princípios do Direito Administrativo Sancionador, no artigo 1°, § 4°, da Lei n.° 8.429/92, in verbis: “Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (...) § 4º Aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador”. Além disso, a novel legislação passou a exigir o dolo específico para a configuração dos atos de improbidade, revogando expressamente as disposições que admitiam a condenação, às condutas que causam prejuízo ao erário, com base na culpa. Veja-se: “Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) Parágrafo único. (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) § 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) § 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. (...) Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)”. (Grifo nosso). Por se tratar de desmembramento do direito sancionador penal, os mesmos princípios e garantias a ele assegurados, tais como os princípios da legalidade, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, da segurança jurídica, da retroatividade da lei benéfica, da individualização da pena, além da razoabilidade e da proporcionalidade, devem ser observados na esfera administrativa. Dentre os princípios mencionados, sobreleva-se o da retroatividade da norma mais benéfica, previsto no artigo 5°, inciso XL, da Constituição da República. Veja-se: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. Nessa toada, a retroatividade da lei benigna insere-se em princípio constitucional com aplicabilidade para todo o exercício do jus puniendi estatal, nele inserido a improbidade administrativa. Igualmente, convém relembrar que o artigo 9°, do Pacto de San José da Costa Rica, ratificado pelo Brasil com status supralegal, ao replicar o princípio da retroatividade da lei mais benéfica, não o cingiu à norma penal, sendo, portanto, aplicável ao direito sancionador como um todo. Transcrevo: “Ninguém pode ser condenado por ações ou omissões que, no momento em que forem cometidas, não sejam delituosas, de acordo com o direito aplicável. Tampouco se pode impor pena mais grave que a aplicável no momento da perpetração do delito.Se depois da perpetração do delito a lei dispuser a imposição de pena mais leve, o delinqüente será por isso beneficiado”. A propósito, a celeuma quanto à aplicação do princípio da retroatividade, alcançando fatos e atos praticados sob a vigência do texto que precede a reforma, chegou ao colendo Supremo Tribunal Federal que, no julgamento do ARE 843.989, reconheceu a Repercussão Geral (Tema n.° 1.199), fixou a seguinte tese: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei". (ARE 843989, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-251 DIVULG 09-12-2022 PUBLIC 12-12-2022). (Grifo nosso). À vista disso, a despeito do entendimento quanto à irretroatividade da nova lei quanto à prescrição e às demandas já transitadas em julgado, o STF ressalvou a sua retroação benéfica em relação à revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, enfatizando a necessidade de comprovação da responsabilidade subjetiva – dolo – a todos os atos tipificados nos artigos 9°, 10 e 11, da Lei 8.429/92, nas ações pendentes de julgamento. Avançando sobre os atos imputados aos apelados, o pedido de ressarcimento passa pela fundamental demonstração de prejuízo ao erário em decorrência de ato doloso. Nesse contexto, considerando a confluência entre os fatos e fundamentos relacionados aos recursos interpostos por JOEL QUIRINO PEREIRA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, ambos os apelos estão sendo apreciados conjuntamente. É inegável que a demonstração do dolo, em operações ímprobas, é matéria deveras dificultosa, dada a natureza oculta das práticas ilícitas e as sofisticadas estratégias de dissimulação comumente empresadas. Assim, o elemento subjetivo pode ser inferido de forma indireta, a partir dos elementos objetivos, ou seja, a partir do comportamento objetivo do agente público. Com base nisso, o exame das provas constantes do processado, diferentemente do que defendem os apelantes, revela, com segurança jurídica e densidade probatória suficiente, a presença dos elementos caracterizadores do ato de improbidade administrativa e, consequentemente, do dever de ressarcir ao erário. Os documentos colacionados aos autos, especialmente os cheques assinados pessoalmente por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, sem qualquer lastro documental comprobatório de entrega de bens ou serviços configuram, de início, um forte indicativo de ciência e vontade de participação no esquema fraudulento, além de evidenciar a materialidade dos fatos. Confira-se: “Cheque n.º 010112, no valor de R$72.000,00 (setenta e dois mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 39); Cheque n.º 010611, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 41); Cheque n.º 010702, no valor de R$52.000,00 (cinquenta e dois mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 43); Cheque n.º 011210, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 45); Cheque n.º 011310, no valor de R$46.000,00 (quarenta e seis mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 47); Cheque n.º 011473, no valor de R$65.300,00 (sessenta e cinco mil e trezentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 48); Cheque n.º 010374, no valor de R$72.500,00 (setenta e dois mil e quinhentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 50); Cheque n.º 011815, no valor de R$74.350,00 (setenta e quatro mil e trezentos e cinquenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 52); Cheque n.º 010720, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 54); Cheque n.º 012147, no valor de R$69.526,00 (sessenta e nove mil e quinhentos e vinte e seis reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 56); Cheque n.º 010919, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 58); Cheque n.º 011980, no valor de R$55.000,00 (cinquenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 60); Cheque n.º 012516, no valor de R$52.350,00 (cinquenta e dois mil e trezentos e cinquenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 62); Cheque n.º 012753, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 64); Cheque n.º 012610, no valor de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 66); Cheque n.º 010727, no valor de R$45.000,00 (cinquenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 68); Cheque n.º 013053, no valor de R$48.500,00 (quarenta e oito mil e quinhentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 70); Cheque n.º 013228, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 72); Cheque n.º 013963, no valor de R$40.000,00 (quarenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 74); Cheque n.º 014074, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 76); Cheque n.º 014416, no valor de R$51.434,80 (cinquenta e um mil e quatrocentos e trinta e quatro reais, oitenta centavos), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 78); Cheque n.º 014561, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 80); Cheque n.º 012828, no valor de R$71.500,00 (setenta e um mil e quinhentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 82); Cheque n.º 015029, no valor de R$62.350,00 (sessenta e dois mil e trezentos e cinquenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 84); Cheque n.º 016093, no valor de R$67.410,00 (sessenta e sete mil e quatrocentos e dez reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 88); Cheque n.º 016116, no valor de R$35.680,00 (trinta e cinco mil e seiscentos e oitenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 89); Cheque n.º 015478, no valor de R$42.560,00 (quarenta e dois mil e quinhentos e sessenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 90); Cheque n.º 016355, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 91); Cheque n.º 016038, no valor de R$67.800,00 (sessenta e sete mil e oitocentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 93)”. As diligências empreendidas na fase investigativa, por sua vez, revelam que o CNPJ pertencente à empresa A. Caberlin – Centro Oeste Materiais para Construções foi manipulado e utilizado para constituir uma empresa fictícia. O sócio formal da empresa real, Sr. Ademir Caberlin, foi enfático ao afirmar que jamais autorizou a abertura de outra pessoa jurídica, tampouco teve qualquer ciência ou participação em processos licitatórios na esfera estadual. Isso reforça que o uso de sua inscrição e dados ocorreu de maneira absolutamente fraudulenta, com o fim específico de dar aparência de legalidade a transações que, em verdade, jamais representaram qualquer prestação de serviço à administração pública. Alinha-se, a isso, a delação premiada de JOSÉ GERALDO RIVA, devidamente homologada e admitida como prova nos autos, que reforça a conclusão quanto à consciência e voluntariedade da conduta dos apelantes, formando um conjunto harmônico e coerente com as provas, especificamente os cheques, as informações de inatividade da empresa e a ausência de notas fiscais. Para mais, há trecho inequívoco da fala do colaborador, que imputa a HUMBERTO MELO BOSAIPO a participação direta na constituição de empresa de fachada e na manipulação de cheques sem qualquer contrapartida de serviço ou produto. Veja-se (ID. 278677856): “(22:19): “A situação dos saques, ela nunca foi efetivada por nenhuma das empresas, até porque as empresas, eram empresas criadas de forma fraudulenta ou em um determinado momento, como eu já disse, sequer criadas. E esse processo de criação das empresas, ele foi relatado pelo senhor Humberto Bosaipo à época. É... até porque eu não conhecia esse pessoal, que não eram aqui de Cuiabá, alguns deles trabalharam...em... em Barão de Melgaço, pelos...pelos Quirinos, pelo senhor Luiz Dondo, pelo senhor Nivaldo de Araújo e.... à época, a alegação era de que a Confiança Factoring, através do senhor Nilson Teixeira e do senhor João Arcanjo, tinha pleno conhecimento. E em alguns casos até contribuíram. Eu tenho até um caso em que entraram numa... numa... numa ação contra, contra mim e o deputado Bosaipo pedindo indenização, em que a pessoa alega que pegou os documentos lá na Confiança e entregou os documentos na mão dos contadores para que fosse criada as empresas, algumas empresas eram simplesmente dado manutenção de empresas velhas já. Fazia, inclusive, a alteração do ramo de atividade. Outras empresas eram criadas e outras, como eu disse pra vossa excelência, e reafirmo aqui, eram empresas que sequer existiam. Procedimento nenhum era feito, era feito uma relação de cheques e nós recebíamos o pacote de cheques junto à relação e simplesmente assinávamos. A Confiança Factoring, como eu disse, é... recebeu aproximadamente 20 (vinte) e poucos milhões desses valores, sem precisar que haviam 22 (vinte e duas) promissórias de R$ 700.000,00 (setecentos mil) que foram pagos mensalmente, por mim e pelo deputado Humberto Bosaipo e também eram utilizados recursos, às vezes, para campanha eleitoral, para eleições de mesa, e as vezes até para uma questão particular de deputado (...).” Sobre a colaboração premiada, não obstante os argumentos defensivos que buscam afastar sua legitimidade, perfaz curial salientar que embora não constitua prova isolada suficiente para a condenação, possui natureza de meio de prova validamente admissível, sobretudo quando corroborada por outros elementos probatórios. A propósito, no pertinente à sua utilização no âmbito da Ação civil pública, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n.° 1175650/PR (Tema n.° 1.0433), pacificou o entendimento de que é constitucional a sua admissão na ação de improbidade administrativa, observado, dentre outras diretrizes, a necessidade de estar acompanhada de outras provas: “CONSTITUCIONAL. UTILIZAÇÃO DO ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA (LEI 12.850/2013) NO ÂMBITO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LEI 8.429/1992) . POSSIBILIDADE. DECLARAÇÕES DO AGENTE COLABORADOR COMO ÚNICA PROVA. INSUFICIÊNCIA PARA O INÍCIO DA AÇÃO POR ATO DE IMPROBIDADE. OBRIGAÇÃO DE RESSARCIMENTO INTEGRAL AO ERÁRIO . TRANSAÇÃO APENAS EM TORNO DO MODO E DAS CONDIÇÕES PARA A INDENIZAÇÃO. LEGITIMIDADE PARA CELEBRAÇÃO DO ACORDO. MINISTÉRIO PÚBLICO COM A INTERVENIÊNCIA DA PESSOA JURÍDICA INTERESSADA. 1 . O aperfeiçoamento do combate à corrupção no serviço público foi uma grande preocupação do legislador constituinte, ao estabelecer, no art. 37 da Constituição Federal, verdadeiros códigos de conduta à Administração Pública e aos seus agentes, prevendo, inclusive, pela primeira vez no texto constitucional, a possibilidade de responsabilização e aplicação de graves sanções pela prática de atos de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da CF). 2 . A Constituição de 1988 privilegiou o combate à improbidade administrativa, para evitar que os agentes públicos atuem em detrimento do Estado, pois, como já salientava Platão, na clássica obra REPÚBLICA, a punição e o afastamento da vida pública dos agentes corruptos pretendem fixar uma regra proibitiva para que os servidores públicos não se deixem induzir por preço nenhum a agir em detrimento dos interesses do Estado. 3. O combate à corrupção, à ilegalidade e à imoralidade no seio do Poder Público, com graves reflexos na carência de recursos para implementação de políticas públicas de qualidade, deve ser prioridade absoluta no âmbito de todos os órgãos constitucionalmente institucionalizados. 4 . Exatamente, em respeito à finalidade de garantir a eficácia no combate à improbidade administrativa, a LIA deve ser interpretada no contexto da evolução do microssistema legal de proteção ao patrimônio público e de combate à corrupção e com absoluta observância ao princípio constitucional da eficiência, consagrado no caput do art. 37 da Constituição Federal e que impõe a todos os agentes públicos, inclusive aos membros do Ministério Público e magistrados, o dever de sempre verificar a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, eficaz, sem burocracia, buscando qualidade, primando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para a melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar desperdícios e a garantir uma maior rentabilidade social do exercício da jurisdição, da efetiva prestação jurisdicional. 5. Assim como a Lei Federal 8 .429/1992 visou ao aperfeiçoamento do combate à corrupção no serviço público, no mesmo momento histórico, na esfera penal, encontram-se notáveis esforços do legislador brasileiro dirigidos ao enfrentamento de tais condutas, como lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, falsidades documentais, e outros delitos contra a Administração Pública, notadamente quando praticados por meio de organização criminosa. Nesse contexto, incorporou-se ao ordenamento brasileiro, por meio da edição de diversas leis, o instituto da delação premiada, posteriormente renomeada para colaboração premiada. 6. Importante realçar que o legislador brasileiro, quando editou a Lei 12 .850/2013, pela qual se estabeleceu o conceito de organização criminosa, dispôs que não é qualquer delação que permitirá o benefício de redução da pena ou de perdão judicial, mas somente aquela que produzir os resultados previstos nos incisos do artigo 4º da norma. Importante, ainda, salientar, a respeito da Lei 12.850/2013, que o inciso I do art. 3º do capítulo II estatui ser a colaboração premiada meio de obtenção de prova . Essa natureza jurídica específica é importante para diferenciar a colaboração premiada das hipóteses de justiça consensual ou negocial, como por exemplo a transação penal e o próprio acordo de não persecução, que com ela não se confunde. Em voto na PET 7074-QO/DF, destaquei que o instituto possui natureza jurídica de meio de obtenção de prova, cujo resultado poderá beneficiar o agente colaborador/delator desde que adimplidas as obrigações por ele assumidas e que advenha um ou mais dos resultados indicados na lei, favoráveis à repressão ou prevenção das infrações. 7. Assim, a colaboração premiada, que pode infundir no ânimo do colaborador o desejo de contribuir para a comprovação da materialidade e autoria do delito, mostra-se como valioso instrumento a ser utilizado, também, em instâncias outras, diversas da penal, em especial, quando envolvido o interesse público e o combate à corrupção . 8. O microssistema legal de combate à corrupção, a partir de 1992, evoluiu, de forma clara, específica e objetiva, no sentido de propiciar meios facilitadores à repressão e à prevenção de ilícitos, sobretudo quando ofensivos a interesses supraindividuais e preordenados a causar dano ao patrimônio público. 9. Notadamente, no caso sob exame, em que envolvidas mais de 24 pessoas físicas e jurídicas organizadas em complexa estrutura criminosa e com o objetivo comum de obter vantagem patrimonial, por meio de ajustes de corrupção com grandes empresários sujeitos à fiscalização tributária, revelados na denominada Operação Publicano, a utilização do acordo de colaboração premiada mostra-se de grande valia para se obterem as provas necessárias à comprovação dos delitos e o desbaratamento da organização criminosa . 10. A lesão ao erário causa graves reflexos na carência de recursos para implementação de políticas públicas de qualidade. Não por outra razão é que a reparação integral do dano ao patrimônio público, além de figurar no rol das sanções estabelecidas no art. 12 da Lei 8 .429/1992, também é consequência civil do ato ilícito. Reafirma ainda esse entendimento o teor do parágrafo 2º do art. 17 da LIA, que se manteve inalterado mesmo com a edição da Lei 13.964/2019, onde se lê que A Fazenda Pública, quando for o caso, promoverá as ações necessárias à complementação do ressarcimento do patrimônio público . Assim, não há como transigir a respeito dessa obrigação, consentindo com sua inserção entre os benefícios a serem estendidos àquele que colabora com as investigações no contexto da ação de improbidade decorrente do dano causado. Assim sendo, o acordo de colaboração poderá ser homologado pelo juiz, desde que não isente o colaborador de ressarcir os danos causados, ainda que a forma de como se dará a indenização possa ser objeto de negociação. 11. Outra importante questão diz respeito à colaboração premiada no âmbito civil, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público, em face da legitimidade concorrente para a propositura da ação . 12. O art. 17-A, que seria acrescido à Lei 8.429/1992 pela Lei 13 .964/2019, foi totalmente vetado pelo Presidente da República. Assim, em face do veto aposto ao art. 17-A, que não foi derrubado pelo Congresso Nacional, tem-se que eventuais acordos de colaboração premiada, para serem utilizados em ação civil pública por ato de improbidade administrativa, devem contar com a participação do Ministério Público e da pessoa jurídica de direito público interessada, porém, como interveniente. O posicionamento do interveniente não impedirá a celebração da colaboração premiada pelo Ministério Público, porém deverá ser observada e analisada pelo magistrado no momento de sua homologação . 13. No caso concreto, o Ministério Público do Estado do Paraná propôs ação civil pública por ato de improbidade administrativa em face do ora recorrente e de mais 24 pessoas físicas e jurídicas em razão de fatos revelados na denominada Operação Publicano. Pediu, liminarmente, a indisponibilidade de valores e de bens móveis e imóveis dos demandados; e, ao final, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992 ( Lei de Improbidade Administrativa – LIA) . Entretanto, em relação a alguns réus, requereu apenas o reconhecimento de que praticaram atos de improbidade, sem a imposição das penalidades correspondentes, em razão do acordo de colaboração premiada que foi firmado com as referidas pessoas, valendo-se do instrumento previsto nas disposições do art. 4º, § 4º, da Lei 12.850/2013, c/c os arts. 16 e 17 da Lei 12 .846/2013. 14. O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná confirmou a decisão do magistrado de 1ª instância que decretara a indisponibilidade dos bens de vários réus, entre os quais o ora recorrente. A Corte reputou válido o acordo de colaboração premiada no âmbito da ação de improbidade; e assentou que a decretação da indisponibilidade de bens do agravante se deu nos termos do art . 7º e parágrafo único da Lei 8.429/1992. 15. Pelos termos dos acordos de colaboração acima transcritos, é possível extrair-se a conclusão de que, no caso concreto, os interesses dos colegitimados para ação de improbidade, embora não tenham participado da avença, estão resguardados e que eventual anulação do acordo seria mais deletéria ao interesse público do que a sua manutenção . 16. A interpretação das normas jurídicas deve sempre se pautar pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sob pena de chancelar-se situação jurídica de todo inaceitável. Não é demais advertir que, quando do julgamento do mérito da causa, caberá ao magistrado avaliar se a delação mostra-se consentânea com as outras provas coligidas. 17 . Além disso, o Tribunal de origem, em cognição sumária, decretou a indisponibilidade dos bens do recorrente, por entender estarem presentes os requisitos previstos no art. 7º da Lei 8.429/1992 (fumus boni iuris, a plausibilidade dos fatos e fundamentos jurídicos do pedido inicial), uma vez que existem fundados indícios da prática de atos de improbidade, os quais foram extraídos das provas contidas nos autos do inquérito civil e nas medidas cautelares realizadas pelo MP. 18 . NEGADO PROVIMENTO ao Recurso Extraordinário. TESE DE REPERCUSÃO GERAL: É constitucional a utilização da colaboração premiada, nos termos da Lei 12.850/2013, no âmbito civil, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público, observando-se as seguintes diretrizes: (1) Realizado o acordo de colaboração premiada, serão remetidos ao juiz, para análise, o respectivo termo, as declarações do colaborador e cópia da investigação, devendo o juiz ouvir sigilosamente o colaborador, acompanhado de seu defensor, oportunidade em que analisará os seguintes aspectos na homologação: regularidade, legalidade e voluntariedade da manifestação de vontade, especialmente nos casos em que o colaborador está ou esteve sob efeito de medidas cautelares, nos termos dos §§ 6º e 7º do artigo 4º da referida Lei 12.850/2013 . (2) As declarações do agente colaborador, desacompanhadas de outros elementos de prova, são insuficientes para o início da ação civil por ato de improbidade; (3) A obrigação de ressarcimento do dano causado ao erário pelo agente colaborador deve ser integral, não podendo ser objeto de transação ou acordo, sendo válida a negociação em torno do modo e das condições para a indenização; (4) O acordo de colaboração deve ser celebrado pelo Ministério Público, com a interveniência da pessoa jurídica interessada e devidamente homologado pela autoridade judicial; (5) Os acordos já firmados somente pelo Ministério Público ficam preservados até a data deste julgamento, desde que haja previsão de total ressarcimento do dano, tenham sido devidamente homologados em Juízo e regularmente cumpridos pelo beneficiado". (STF - ARE: 1175650 PR, Relator.: Min. ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento: 03/07/2023, Tribunal Pleno, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 04-10-2023 PUBLIC 05-10-2023). Nessa conjuntura, além da prova documental citada anteriormente, os depoimentos testemunhais, admitidos como prova emprestada, apontam para a atuação dolosa dos apelantes. A exemplo das testemunhas Nilson Teixeira e Kátia Maria Aprá (ID. 278677895; 278677903; 278677898; 278677900), que confirmam as declarações prestadas na fase investigativa, nas quais apresentaram, minuciosamente, como era realizada a operação com o envolvimento de empresas de fachada e, inclusive, sobre os trâmites internos para a emissão de cheques. Aliás, sobre da prova emprestada, é assente o entendimento quanto à sua admissibilidade, desde que respeitado o contraditório, situação observada nos autos, porquanto as partes foram devidamente intimadas sobre cada elemento probatório juntado aos autos. Nesse sentido: “PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POPULAR. "ESCÂNDALO DOS PRECATÓRIOS". EMISSÃO DE LETRAS FINANCEIRAS DO TESOURO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (LFTSC) SUPOSTAMENTE PARA PAGAMENTO DE PRECATÓRIOS, MAS COM DESTINAÇÃO DIVERSA PARA O DINHEIRO CAPTADO . CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO CELEBRADO PELO BANCO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (BESC), SUCEDIDO PELO BANCO DO BRASIL S/A, COM O BANCO VETOR S/A, SUCEDIDO POR VETOR NEGÓCIOS E PARTICIPAÇÕES S/A. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DE ANULAÇÃO DO CONTRATO E RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO POR FERNANDO FERREIRA DE MELLO JÚNIOR . ALEGAÇÕES DE VIOLAÇÃO AOS ARTS. 125, I, 165, 301, §§ 1º A 3º, 330, 332, 420, PARÁGRAFO ÚNICO, 427, 458, II, TODOS DO CPC/73, BEM COMO AO ART. 7º, "CAPUT", E V, DA LEI 4.717/65, AO ART . 12 DA LEI 8.429/92 E AO ART. 1º DO CÓDIGO CIVIL. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO . [...] 3. O julgamento antecipado da lide não configura cerceamento de defesa e, por conseguinte, nulidade processual, se as instâncias ordinárias consideram prescindível a dilação probatória, por ser eminentemente de direito a controvérsia ou por depender sua resolução apenas do exame de fatos já documentalmente provados.Precedentes . Averiguar a necessidade de dilação probatória no caso concreto, tal como pretendido pelo recorrente, exigiria inevitável reexame de todo o substrato fáticoprobatório da causa, inviável em recurso especial nos termos da Súmula 7/STJ. Não conhecimento do recurso, no ponto, tanto por a quanto por c, do permissivo constitucional. 4. É válida a admissão ao processo de prova emprestada, desde que respeitado o contraditório na demanda em que a prova venha a ser utilizada. Precedentes. [...] (STJ - REsp: 1601868 SC 2016/0126116-9, Relator.: Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, Data de Julgamento: 13/08/2024, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/08/2024). “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO DO JUIZ CRIMINAL QUE DEFERIU O COMPARTILHAMENTO DA PROVA PRODUZIDA NO INQUÉRITO POLICIAL PARA FIM DE INSTRUÇÃO DE AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE . PRECEDENTES. CONTRADITÓRIO DIFERIDO. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS PENAL, CÍVEL E ADMINISTRATIVA. 1 . Hipótese em que o impetrante se insurge contra decisão do juiz criminal que, após homologado o arquivamento do inquérito policial, deferiu o compartilhamento das provas produzidas para fim de instrução de ação cível de improbidade administrativa. 2. "É firme o entendimento jurisprudencial deste Sodalício no sentido da possibilidade de utilização, na seara cível, para fins de apuração de improbidade administrativa, de prova produzida na esfera penal." (AgRg no REsp 1714914/RS, Rel . Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 27/02/2018, DJe 08/03/2018). 3. O uso da prova emprestada estará sujeito à efetivação do contraditório no foro em que a prova vier a ser utilizada. Precedentes . 4. Agravo interno não provido”. (STJ - AgInt no RMS: 61408 RJ 2019/0212188-0, Relator.: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 11/05/2020, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/05/2020). “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC/73 . NÃO OCORRÊNCIA. PROCESSO CRIMINAL. TRÂNSITO EM JULGADO MATERIAL. PROVA EMPRESTADA . VALIDADE. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. OBSERVÂNCIA. SÚMULA Nº 83/STJ . HOMICÍDIO. RESPONSABILIDADE INDIRETA. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7/STJ . DECISÃO MANTIDA 1. Não há afronta ao art. 535 do CPC/73 quando o Tribunal de origem manifesta-se suficientemente sobre a questão controvertida, apenas adotando fundamento diverso daquele perquirido pela parte. 2. É válida a utilização de prova emprestada, desde que observado o contraditório e ampla defesa. Precedentes do STF e do STJ. Súmula nº 83/STJ. 3. A pretensão de verificar se há responsabilidade civil indireta pelo homicídio perpetrado acerca do qual houve condenação criminal transitada em julgado somente se processa mediante o reexame do conjunto probatório carreado aos autos, o que encontra óbice na Súmula nº 7/STJ. 4. Agravo interno não provido”. (STJ - AgInt no REsp: 1426271 MT 2013/0199064-7, Relator.: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 20/08/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/08/2019). A responsabilidade do apelante HUMBERTO MELO BOSAIPO não deriva, portanto, apenas de sua posição formal no organograma da Assembleia Legislativa, mas, sobretudo, de sua atuação direta e ostensiva na cadeia de comando que operacionalizou os desvios. O ordenamento jurídico impõe, aos gestores públicos, um dever objetivo de cuidado — dever esse que não foi meramente negligenciado, mas ativamente violado. Não se trata aqui de erro ou desídia, mas de participação consciente em procedimento montado com o intuito deliberado de fraudar o erário. A assinatura reiterada de cheques, por valores expressivos, em benefício de empresa notoriamente inidônea, não permite presumir boa-fé. Ao contrário: diante da soma dos valores e da constância dos repasses, muitos dos quais fracionados em sequência, há nítido padrão de conduta dolosa. A propósito, importa registrar que esta Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo já enfrentou situação correlata, envolvendo o mesmo réu HUMBERTO MELO BOSAIPO e a mesma dinâmica de desvio sistemático de recursos públicos no contexto do denominado “mensalinho”. Naquele julgamento, de relatoria do Des. Deosdete Cruz Júnior, acompanhado à unanimidade, esta Egrégia Câmara decidiu: “DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. "MENSALINHO" NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA. DANO AO ERÁRIO E ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. RECONHECIMENTO DO DOLO ESPECÍFICO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação Cível interposta pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra sentença que julgou improcedente a Ação Civil Pública de Ressarcimento ao Erário, ajuizada contra Humberto Melo Bosaipo, visando à condenação ao ressarcimento ao erário em decorrência da prática de ato doloso de improbidade administrativa, consubstanciado no recebimento de valores ilícitos entre 2003 e 2007, enquanto exercia o mandato de deputado estadual. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar: (i) se os elementos de prova constantes dos autos são suficientes para comprovar a prática de ato doloso de improbidade administrativa pelo apelado, com consequente dano ao erário e enriquecimento ilícito; e (ii) se a robustez do conjunto probatório permite o afastamento do princípio da presunção de inocência para fins de ressarcimento ao erário. III. Razões de decidir 3. O art. 1º, § 1º, da LIA, com a redação dada pela L. 14.230/2021, exige a comprovação de dolo para a configuração do ato de improbidade administrativa, vedando a responsabilização objetiva e a presunção do elemento subjetivo. 4. A robustez do acervo probatório, integrado por depoimentos de colaboradores premiados, testemunhos em juízo e provas documentais, demonstra, de forma harmônica e segura, que o apelado participou conscientemente do esquema ilícito de repasse de valores desviados do erário, configurando o dolo específico exigido pela atual legislação. 5. A ausência de registros formais, inerente à clandestinidade das práticas ilícitas, não impede o reconhecimento da prática dolosa, uma vez que corroborada por múltiplos meios de prova válidos e idôneos. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso de apelação conhecido e provido, para reformar a sentença e julgar procedentes os pedidos iniciais, condenando Humberto Melo Bosaipo ao ressarcimento integral do dano causado ao erário, no valor de R$ 2.433.330,00, a ser corrigido monetariamente pelo IPCA-E desde a data da exigibilidade e acrescido de juros de mora a partir da citação. Tese de julgamento: " 1. Para a configuração do ato de improbidade administrativa, é imprescindível a comprovação do dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito, à luz da L. 8.429/1992, com as alterações da L. 14.230/2021. 2. Em esquemas de desvio de recursos públicos estruturados para dificultar a rastreabilidade, o dolo pode ser inferido a partir do contexto fático, desde que corroborado por provas robustas e contundentes". (N.U 1005368-95.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, DEOSDETE CRUZ JUNIOR, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 20/05/2025, Publicado no DJE 22/05/2025). Referido enunciado se aplica à presente hipótese, em atenção à coerência decisória que deve nortear os órgãos judicantes. A repetição do modus operandi, o protagonismo dos mesmos agentes políticos e a reprodução de idêntico padrão probatório impõem o reconhecimento da similitude entre os feitos e a manutenção do entendimento jurisprudencial já assentado por este órgão colegiado. Com relação a JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA, destaca-se que as declarações prestadas por José Geraldo Riva na colaboração premiada são coerentes e ricas em detalhes, destacando, com firmeza, que os irmãos atuavam no escritório no qual as empresas eram criadas e manipuladas, muitas vezes com fornecimentos dados pela Confiança Factoring. Veja-se (ID. 278677856): “(...) As empresas foram constituídas dentro do escritório do Dondo, os responsáveis por isso foi o Joel e o José acompanhados pelo Nivaldo Araújo, que eram pessoas de confiança do Bosaipo, já antigas no esquema. E a maior parte de documentação era arrumado pela... pelo grupo do João Arcanjo Ribeiro, especialmente o Nilson Teixeira, e os cheques eram emitidos por Luiz Eugênio de Godoy, por Guilherme Garcia, antes o Guilherme Garcia como secretário de finanças, depois o Luiz Eugênio, mas também o Senhor Guilherme Garcia na condição de secretário-geral”. Tais declarações são corroboradas pela ratificação em juízo (ID. 278677897) e depoimentos testemunhais, além dos documentos que instruem a petição inicial, relacionados às apreensões feitas no âmbito do Inquérito Policial n.° 252/03 (ID. 278677089 – pág. 108/123), especialmente nos computadores da empresa Ômega Auditoria, com diversos arquivos e documentos digitais que evidenciam a atuação dos irmãos contadores, de forma coordenada com outros integrantes do esquema, como responsáveis pela constituição da estrutura societária e contábil que possibilitou a apropriação ilícita dos recursos públicos. Dentre os documentos e arquivos localizados pelo serviço de inteligência, consta que no mesmo computador no qual estava salvo o curriculum de JOSÉ QUIRINO PEREIRA havia relatórios com nomes de pessoas físicas e jurídicas destinados à emissão de cheques da Assembleia Legislativa. Veja-se (ID. 278677089 – pág. 129): Ainda, foi identificada uma relação de custos para a reativação de 11 empresas, enviadas para Nilson Teixeira, integrante do esquema da Confiança Factoring, e um relatório para a Assembleia legislativa, com o nome de algumas empresas e a observação “até o momento sem repetição de bacanas. Obs: falta abrir + cinco empresas”. Confira-se (ID. 278677089 – pág. 122): À luz do artigo 3°, da Lei n.° 8.429/92, respondem por ato de improbidade administrativa, também, aqueles que, mesmo sem exercer função pública, induzem ou concorrem dolosamente para a sua prática. No caso concreto, as provas demonstram que tanto JOEL quanto JOSÉ QUIRINO se valiam de seu conhecimento técnico-contábil para montar estrutura empresarial fictícia e encobrir os rastros da operação fraudulenta, em conluio com os agentes políticos. A adesão consciente, voluntária e reiterada ao esquema evidencia a clara intenção dos requeridos de causar lesão ao erário. Logo, não se sustenta o fundamento da sentença quanto à exclusão de JOSÉ QUIRINO PEREIRA da condenação, tampouco os argumentos recursais para inocentar JOEL QUIRINO PEREIRA. Dessa sorte, a responsabilização de HUMBERTO MELO BOSAIPO, JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA pelo ressarcimento ao erário é medida impositiva, não só para dar resposta à sociedade, como para restaurar a integridade do sistema político violado. Ante o exposto, CONHEÇO E NEGO PROVIMENTO aos recursos de apelação interpostos por HUMBERTO MELO BOSAIPO e JOEL QUIRINO PEREIRA, e CONHEÇO E DOU PROVIMENTO ao apelo do MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO para estender a condenação a JOSÉ QUIRINO PEREIRA, em regime de solidariedade, pelos mesmos fundamentos e valores da sentença a quo. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. DESODETE CRUZ JÚNIOR (1º VOGAL): Acompanho o voto da Relatora V O T O EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA (2º VOGAL): Peço vista dos autos para melhor análise da matéria. SESSÃO DE 21 DE JULHO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O (VISTA) EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA (2º VOGAL): Egrégia Câmara: Humberto Melo Bosaipo, Joel Quirino Pereira e Ministério Público do Estado de Mato Grosso interpuseram recursos de apelação contra a sentença que, na Ação Civil Pública de Ressarcimento de Danos Causados ao Erário nº 0001868-29.2008.8.11.0041, ajuizada em desfavor de José Geraldo Riva, Humberto Melo Bosaipo, Geraldo Lauro, Nivaldo de Araujo, José Quirino Pereira e Joel Quirino Pereira, julgou parcialmente procedentes os pedidos para, dentre outras medidas, condenar Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira ao ressarcimento ao erário do valor de R$1.616.260,80. Essa sentença ainda reconheceu e declarou a prática do ato de improbidade administrativa previsto no art. 10, caput, da Lei nº 8.429/92 por parte de José Geraldo Riva, porém, não lhe aplicou qualquer sanção em razão de ter realizado colaboração premiada nos autos. Outrossim, julgou improcedentes os pedidos em relação a José Quirino Pereira, por ausência de provas suficientes (id. 278677959). Inconformado, Humberto Melo Bosaipo, em seu recurso, sustenta que a sentença deve ser reformada por se basear em provas frágeis e ilegais, destacando que a delação premiada, isoladamente, não é suficiente para fundamentar condenação, sendo necessárias provas independentes que a corroborem. Argumenta que, no caso, não há elementos adicionais que confirmem as declarações da colaboração premiada, pois a condenação apoiou-se apenas em documentos, sem perícias ou análises técnicas que comprovassem sua participação no ato apontado como danoso, o que não configura improbidade administrativa. Alega que não ficou demonstrado dolo, culpa grave ou intenção de beneficiar terceiros, requisitos para a condenação com base no art. 10 da Lei nº 8.429/92, ressaltando que, conforme o art. 1º da mesma lei, a mera ilegalidade não caracteriza improbidade sem prova de má-fé. Sustenta, ainda, a desproporcionalidade das sanções, especialmente o ressarcimento de R$1.616.260,80 e as penas de suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o Poder Público por cinco anos, que considera excessivas diante da ausência de provas robustas de sua responsabilidade exclusiva pelo prejuízo. Ao final, requer o provimento da apelação para reformar a sentença e julgar improcedente a ação de improbidade, absolvendo-o das sanções impostas ou, subsidiariamente, reduzindo-as com base nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade (id. 278677962). Joel Quirino Pereira, em seu recurso, sustenta que a condenação carece de provas, pois não há demonstração de que tenha praticado ato doloso ou se beneficiado da empresa envolvida, existindo apenas um documento que menciona seu nome e registro profissional (CRC), sem assinatura ou cadastro que comprove má-fé ou dolo. Argumenta que o contrato social foi elaborado pelo escritório “Diego Contabilidade”, sob responsabilidade do contador Luiz Alberto Dondo Gonçalves à época, não havendo qualquer grafia, participação ou fornecimento de etiqueta do CRC por parte do apelante. Afirma desconhecer o contrato social, seus sócios, os termos do documento, o advogado subscritor e o extrato de cadastro na SEFAZ, o qual teria inserido seu nome sem respaldo legal. Por isso, a defesa insistiu reiteradamente na realização de perícia técnica para esclarecimento dos fatos. Alega que a sentença é carente de fundamentação, pois seu irmão foi absolvido por não constar seu nome no extrato, enquanto ele foi condenado unicamente por esse motivo. Defende que os atos que lhe foram imputados se tratam de mera irregularidade formal, a qual só poderia ser considerada nula se comprovado prejuízo ao erário, o que não ocorreu no caso. Enfatiza que não há dolo, uma vez que não recebeu valores, não assinou documentos, não deu manutenção ou utilizou os atos ilícitos, sendo que quem cometeu os desvios apenas usou o nome da empresa sem qualquer participação sua. Ao final, requer o provimento do recurso para reformar a decisão recorrida e absolvê-lo das acusações (id. 278677970). Por fim, o Ministério Público, em suas razões recursais, defende a reforma da sentença para que seja condenado também José Quirino Pereira, afirmando que conjunto probatório apresentado tanto na fase extrajudicial quanto na judicial, demonstra claramente a participação de tal requerido no esquema ilícito de desvio e apropriação de recursos do Poder Legislativo Estadual (id. 278677974). A douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo desprovimento dos recursos de Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira e pelo provimento do manejado pelo Ministério Público (id. 284030887). Os autos foram distribuídos à relatora, Desembargadora Maria Aparecida Ferreira Fago, que, em análise às insurgências recursais, rejeitou a preliminar de falta de fundamentação da sentença recorrida e, no mérito, negou provimento aos apelos de Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira, bem como deu provimento ao aviado pelo Ministério Público para estender a condenação de ressarcimento ao erário também a José Quirino Pereira. A esse entendimento aderiu o eminente Desembargador Deosdete Cruz Júnior (1º vogal). Diante da complexidade da matéria, pedi vista dos autos. Pois bem. Ressai dos autos que José Geraldo Riva e Humberto Melo Bosaipo, enquanto administradores da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, com o apoio de Nivaldo de Araújo e Geraldo Lauro, praticaram atos de improbidade administrativa consistentes no desvio e apropriação ilícita de recursos públicos mediante a emissão de 32 cheques em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos nos anos de 2001 a 2002, sem a devida prestação de serviços, causando prejuízo ao erário de R$ 1.819.430,80. Ressai dos autos, também, que a referida empresa seria fictícia, tendo sido constituída irregularmente pelos Contadores José Quirino Pereira e Joel Quirino Pereira, a partir dos dados de empreendimento distinto (A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções), e que se encontrava sob a responsabilidade do escritório de contabilidade dos mesmos (Ômega Contabilidade), exatamente para viabilizar o esquema de desvio de dinheiro público. Após regular tramitação da demanda, em que foi realização de delação premiada por José Geraldo Riva, houve o falecimento de Nivaldo de Araújo e a celebração de Acordo de Não Persecução Cível por Geraldo Lauro, o juízo a quo proferiu sentença de parcial procedência nos seguintes moldes: “Diante do exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos, em relação ao requerido José Geraldo Riva, para reconhecer e declarar a prática do ato de improbidade administrativa previsto no art. 10, caput, da Lei n.º 8.429/92, deixando, contudo, de aplicar a respectiva sanção, haja vista a colaboração premiada existente nos autos. Em relação ao requerido José Quirino Pereira, não havendo provas suficientes da prática do ato ímprobo doloso imputado ao requerido, julgo improcedentes os pedidos, com fundamento no art. 487, I, do CPC. Já em relação aos requeridos Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira, condeno-os ao ressarcimento do dano causado ao erário, de forma solidária, no valor de R$1.616.260,80 (um milhão, seiscentos e dezesseis mil, duzentos e sessenta reais e oitenta centavos). Sobre o valor referente ao ressarcimento do dano, os valores deverão ser acrescidos de juros de meio por cento (0,5%) ao mês, desde o dano efetivo (desconto dos cheques) até 11/01/2003, quando passa a ser de um por cento (1%) ao mês, com a entrada em vigor do Código Civil (lei 10.406/2002) e correção monetária, pelo INPC, também incidente a partir do dano (art. 398, Código Civil; Súmulas 43 STJ e 54 STF). Condeno os requeridos Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira, ao pagamento das custas e despesas processuais pro rata. Por consequência, julgo extinto o processo com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil”. (id. 278677959)Grifos originais. Contra essa sentença, como visto, Humberto Melo Bosaipo, Joel Quirino Pereira e o Ministério Público interpuseram recursos de apelação cível, em relação aos quais não tenho dúvida em acompanhar o entendimento esposado pela douta relatora. Com efeito, quanto à preliminar de falta de fundamentação, arguida pelo apelante Joel Quirino Pereira, realmente não merece prosperar, pois a sentença recorrida expôs com clareza as condutas praticadas por cada um dos requeridos e concluiu, com base na prova produzida nos autos, pela condenação dos mesmos ao ressarcimento ao erário, com exceção de José Quirino Pereira, não havendo que se falar em violação ao art. 93, IX, da Constituição Federal ou ao art. 489, §1º, do CPC. No mérito, no que tange ao apelo de Humberto Bosaipo Melo, não procedem as alegações do apelante de que as provas apresentadas nos autos são ilegais e frágeis para amparar a sua condenação pela prática do ato de improbidade tipificado no art. 10, caput, da Lei nº 8.429/92, pois decorrentes apenas de declarações feitas em colaboração premiada. Além disso, não teria sido demonstrada a presença de dolo ou má-fé em suas ações e as sanções cominadas em seu desfavor pelo juízo a quo seriam desproporcionais. Ocorre que condenação imposta ao apelante não se baseou exclusivamente nas declarações do colaborador premiado, mas em um conjunto de provas robusto e independente, colhido tanto na fase extrajudicial quanto no curso da instrução processual. Nesse cenário, as declarações prestadas no âmbito da colaboração premiada tiveram apenas função acessória, servindo como elemento confirmatório das demais provas já constantes dos autos, as quais, por si sós, eram suficientes para demonstrar a prática de atos ímprobos e justificar a imposição do dever de ressarcimento ao erário. Nesse sentido, o juízo de origem foi claro ao consignar na sentença que as declarações prestadas pelo colaborador premiado não constituíram fundamento isolado ou determinante da condenação. Conforme destacado no decisum, tais declarações apenas corroboraram o robusto conjunto probatório já constante dos autos quanto ao uso de empresa fictícia para o desvio de valores dos cofres da Assembleia Legislativa Estadual, o qual, por si só, revelava de forma suficiente a prática dos atos ilícitos imputados ao apelante e a consequente necessidade de ressarcimento ao erário. Nesse sentido, veja-se o trecho da sentença recorrida: “(...)Pois bem. De inicio, saliento que o requerido José Geraldo Riva firmou acordo de colaboração premiada com o Ministério Público, devidamente homologado pelo o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, o qual é utilizado nestes autos com finalidade de corroborar os fatos narrados na inicial. Diante da celebração do acordo, o requerido José Geraldo Riva reconheceu os atos ímprobos imputados na petição inicial, o que comporta provimento de natureza declaratória, pois, caso descumpridas as condições pactuadas na colaboração premiada, poderá o requerente comunicar o juízo e buscar a imposição das penalidades impostas no acordo. Ademais, sabe-se que as declarações do colaborador não perfazem prova isoladamente, devendo existir outros elementos corroborativos, para que o Juiz possa formar a sua convicção, para proferir a decisão de mérito. Neste sentido, cabe aqui sopesar as provas contidas na referida delação, juntadas nos Ids. 58117361 a 58117365 e, Id. 58546963, as quais foram confirmadas em juízo no Id. 111346986, uma vez que o colaborador narra detalhadamente como funcionava o esquema de desvio de verbas públicas da AL/MT, consistente no uso não apenas da empresa requerida nesta ação, mas de inúmeras outras empresas fictícias ou irregulares, para figurar em processos licitatórios ou aquisições simplificadas e receber o pagamento por produtos ou serviços que não foram prestados. O colaborador informa, em síntese, que o desvio de verba pública com a utilização de empresas fictícias ou irregulares era uma prática rotineira e comum desenvolvida pelos deputados estaduais, para o recebimento de propina mensal, com a finalidade de manter a governabilidade do executivo. Menciona ainda, que esses desvios ocorreram entre os anos de 1995 a 2015. Percebe-se, assim, que os fatos narrados pelo colaborador corroboram com o que está contido nos documentos que instruem a inicial. Dentre as empresas que participaram do citado esquema, a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos teria sido contratada para a prestação de serviços e teria sido beneficiária dos cheques emitidos pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, nos anos de 2001 a 2002. As provas produzidas nos autos demonstram que a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos foi utilizada irregularmente pelos requeridos, já que seu o numero de CNPJ pertencia a outra empresa e foi utilizado para justificar a emissão dos cheques da AL/MT, com a criação da referida empresa inexistente, ou seja, os requeridos se utilizaram do cadastro de uma empresa que se encontrava regular, e utilizaram os dados para criação de outra empresa fictícia para justificar os pagamentos ilegais (Id. 58115730 fls. 29/30). Observa-se que o CNPJ 04.600.944/001-50 consta o nome A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções e, como contador responsável o requerido Joel Quirino, no entanto, o mesmo numero de CNPJ foi utilizado para criar ilegalmente a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos teria, a qual foi utilizada ilegalmente pelos requeridos para emissão de vários cheques nos anos de 2001 a 2002 (Id. 58115730 fls. 29/30 e 47/50). Ademais, o sócio, a pessoa de nome Ademir Caberlin, afirmou que constituiu a empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções, através dos contadores e requeridos Joel Quirino e José Quirino, mas que nunca autorizou a abertura de qualquer outra empresa, bem como que nunca participou de qualquer licitação na AL/MT e que desconhece a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos (Id. 58115733 – fls. 83/86). Outrossim, os requeridos não apresentaram nota fiscal ou comprovante de recebimento dos produtos ou serviços, supostamente adquiridos, para justificar esses pagamentos realizados, tampouco comprovaram a existência do regular procedimento licitatório prévio. Certamente, esses produtos ou serviços, assim como a empresa, jamais existiram. Portanto, não há dúvidas de que os dados da empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções foram utilizados irregularmente, para a criação da empresa inexistente A. Caberlin Publicidade e Eventos, sendo assim, o pagamento à empresa fictícia indica a intenção concreta de beneficiar terceiros, com prejuízo ao erário, caracterizando o dolo na conduta ímproba. Os requeridos Humberto Bosaipo e José Riva, cada um desempenhando as suas atribuições, tinham a obrigação legal de zelar pelo correto trâmite dos procedimentos de aquisição de bens ou de prestação de serviços. No caso em comento, não há emissão de uma única nota fiscal de serviços prestados pela empresa, a qual sequer tinha autorização para emitir nota fiscal, documento essencial no procedimento de conferencia da prestação do serviço/atesto e de empenho e pagamento, notadamente, quando se tratam de valores expressivos, que exigem modalidade licitatória mais complexa. Desta forma, está demonstrado que os requeridos não fizeram o mínimo do que se espera de um gestor público. Na análise dos autos verifico a existência de vinte e nove (29) cópias de cheques emitidos pela Assembleia Legislativa, nominais em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos (Id. 58115738), quais sejam: 1) Cheque n° 010112, no valor de R$72.000,00 (setenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 39). 2) Cheque n° 010611, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 41). 3) Cheque n° 010702, no valor de R$52.000,00 (cinquenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 43). 4) Cheque n° 011210, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 45). 5) Cheque n° 011310, no valor de R$46.000,00 (quarenta e seis mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 47). 6) Cheque n° 011473, no valor de R$65.300,00 (sessenta e cinco mil, trezentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 48). 7) Cheque n° 010374, no valor de R$72.500,00 (setenta e dois mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 50). 8) Cheque n° 011815, no valor de R$74.350,00 (setenta e quatro mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 52). 9) Cheque n° 010720, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 54). 10) Cheque n° 012147, no valor de R$69.526,00 (sessenta e nove mil, quinhentos e vinte e seis reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 56). 11) Cheque n° 010919, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 58). 12) Cheque n° 011980, no valor de R$55.000,00 (cinquenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 60). 13) Cheque n° 012516, no valor de R$52.350,00 (cinquenta e dois mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 62). 14) Cheque n° 012753, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 64). 15) Cheque n° 012610, no valor de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 66). 16) Cheque n° 010727, no valor de R$45.000,00 (cinquenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 68). 17) Cheque n° 013053, no valor de R$48.500,00 (quarenta e oito mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 70). 18) Cheque n° 013228, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 72). 19) Cheque n° 013963, no valor de R$40.000,00 (quarenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 74). 20) Cheque n° 014074, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 76). 21) Cheque n° 014416, no valor de R$51.434,80 (cinquenta e um mil, quatrocentos e trinta e quatro reais, oitenta centavos); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 78). 22) Cheque n° 014561, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 80). 23) Cheque n° 012828, no valor de R$71.500,00 (setenta e um mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 82). 24) Cheque n° 015029, no valor de R$62.350,00 (sessenta e dois mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 84). 25) Cheque n° 016093, no valor de R$67.410,00 (sessenta e sete mil, quatrocentos e dez reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 88). 26) Cheque n° 016116, no valor de R$35.680,00 (trinta e cinco mil, seiscentos e oitenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 89). 27) Cheque n° 015478, no valor de R$42.560,00 (quarenta e dois mil, quinhentos e sessenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 90). 28) Cheque n° 016355, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 91). 29) Cheque n° 016038, no valor de R$67.800,00 (sessenta e sete mil, oitocentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 93). Já os cheques n° 0850004; 014976 e; 015119 estão ilegíveis, não sendo possível identificar os valores e o nome da empresa, de modo que não poderão ser objeto de análise. Esses cheques foram emitidos pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, por meio de seus representantes à época, os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Bosaipo, os quais detinham a competência para autorizar esses pagamentos, totalizando o valor de R$1.616.260,80 (um milhão, seiscentos e dezesseis mil, duzentos e sessenta reais e oitenta centavos). No entanto, a empresa beneficiária desses pagamentos não forneceu nenhum produto ou serviço, conforme já esclarecido acima, de modo que os requeridos efetivamente causaram danos ao erário ao permitiram esses pagamentos sem a devida contraprestação. O requerido Joel Quirino, por sua vez, à época dos fatos era o contador responsável pela empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções perante a Secretaria de Estado de Fazenda de Mato Grosso, conforme consta no Id. 58115730 (fls. 47/50), ficando comprovada a sua efetiva participação no desvio de recursos público, por meio do uso dos dados e da constituição da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. utilizada no esquema com CNPJ de terceiro, no qual o requerido não apresentou nenhuma prova que pudesse afastar tal afirmativa. Todos esses fatos demonstram a prática de atos de improbidade administrativa, ficando evidente a existência de conluio entre os agentes públicos com o intuito de desviar dinheiro público. Assim, restou sobejamente demonstrada que os requeridos efetuaram os pagamentos para a empresa fictícia, sem a devida contraprestação, sem qualquer emissão de atesto ou comprovante de entrega dos serviços. Ainda, resguardado o direito ao contraditório e à ampla defesa, nenhum elemento foi trazido que pudesse afastar tal convicção, ou ainda indicar a boa-fé dos requeridos, de forma que resta caracterizada a prática de atos de improbidade administrativa. Não há que se falar em conduta culposa, em desídia ou falta de atenção, pois ficou demonstrado nos autos que os requeridos, cada com sua “atribuição”, concorreram para efetuar pagamentos de serviços que nunca foram prestados, tendo plena ciência de que se tratava de um procedimento, apenas para dar aparência de legalidade aos atos. Ainda, José Geraldo Riva, na condição de colaborador, também participou “do esquema”, juntamente com os demais requeridos, desviando recursos públicos, mediante contratação de empresas inexistentes ou irregulares. Suas afirmações, mesmo que venha de pessoa cujo comportamento anterior seja ética e socialmente reprovável, não retira o valor dos depoimentos prestados, em relação aos pagamentos efetuados por meio de cheques, sem a devida contraprestação. Além disso, toda a narrativa do esquema fraudulento de emissão de cheques com uso de empresas inexistentes ou irregulares é confirmada também pelas testemunhas Nilson Roberto Teixeira, Katia Maria Aprá, Edil Dias e Raquel Alves ouvidas em juízo (Id. 111342152; 111348683; 111348646; 111348648). No caso dos autos, alia-se a estes fatos a outros elementos de prova, que encontram harmonia com o depoimento do colaborador premiado, evidenciando a ocorrência da conduta ímproba. Assim, diante da clareza dos elementos de prova documental, corroborado com a colaboração premiada, ficou evidenciado que os requeridos praticaram ato de improbidade administrativa, que efetivamente causou prejuízo ao erário”. (id. 278677959) Dessa forma, ao contrário do que sustenta o apelante Humberto Melo Bosaipo em suas razões recursais, não se verifica qualquer irregularidade ou fragilidade nas provas que fundamentaram sua condenação pela prática do ato de improbidade administrativa descrito no caput do art. 10 da Lei nº 8.429/1992. Ao revés, o acervo probatório é consistente e suficientemente robusto para demonstrar a ocorrência da conduta ilícita que lhe foi imputada e para embasar a condenação ao dever de ressarcir o erário, especialmente diante da impossibilidade de aplicação das sanções punitivas previstas na LIA em razão da prescrição. Neste contexto, também não subsiste a tese recursal de que não restou demonstrado dolo específico na conduta imputada ao mencionado apelante e que eventual responsabilização não pode decorrer de mera irregularidade administrativa, à luz do art. 1º da Lei nº 8.429/92, com a redação dada pela Lei nº 14.230/2021. O conjunto probatório constante dos autos revela a participação ativa e consciente do apelante no esquema que resultou em expressiva lesão ao erário da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. De acordo com as provas documentais e orais existentes nos autos, o apelante, na condição de ordenador de despesas à época dos fatos, foi, juntamente com José Geraldo Riva e demais requeridos, o responsável direto pela emissão contínua de 32 cheques nominais a uma empresa que, comprovadamente e com sua ciência, foi constituída de forma fraudulenta, e sem que tivesse havido qualquer demonstração da efetiva prestação dos serviços contratados ou da observância de regular processo licitatório. Logo, a conduta atribuída ao apelante não se limita a uma mera falha administrativa ou a um erro formal no desempenho de suas funções. Ao contrário, está evidenciado nos autos que ele atuou de forma deliberada e consciente com o propósito de desviar recursos públicos, mediante a simulação de contratação com empresa fictícia e pagamento por serviços inexistentes. Tal atuação demonstra dolo específico, nos termos exigidos pela nova redação conferida pela Lei nº 14.230/2021 à Lei de Improbidade Administrativa, ou seja, a vontade dirigida à produção do resultado ilícito – neste caso, a dilapidação dos cofres públicos em benefício próprio, com prejuízo efetivo ao patrimônio estadual. Quanto à alegação de desproporcionalidade das sanções aplicadas, esclareça-se que, no caso, diante da prescrição das penalidades punitivas previstas na Lei nº 8.429/92, o apelante foi condenado apenas a ressarcir ao erário no valor de R$1.616.260,80, que corresponde exatamente ao somatório dos cheques pagos para a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, nos termos do art. 37, §5º, da Constituição Federal e do Tema 897 do Supremo Tribunal Federal. Logo, não há falar-se em desproporcionalidade ou falta de razoabilidade na condenação do recorrente. Dessa forma, como bem entendeu a douta relatora, não assiste razão ao recorrente em sua inconformidade, devendo ser mantida a sentença quanto à sua responsabilização pelo ressarcimento ao erário em decorrência do ato de improbidade previsto no art. 10, caput, da Lei nº 8.429/1992, cuja prática dolosa foi inequivocamente comprovada nos autos. Quanto aos apelos de Joel Quirino Pereira e do Ministério Público Estadual, penso que a sentença deve ser alterada apenas para estender a condenação a José Quirino Pereira. Ocorre que restou devidamente comprovado nos autos a participação de Joel Quirino Pereira e de José Quirino Pereira, como Contadores da empresa Ômega Contabilidade, no esquema para o desvio de recursos da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. Com efeito, conforme se verifica dos autos, o escritório Ômega Contabilidade, pertencente a Joel Quirino Pereira e José Quirino Pereira, atuava, à época dos fatos, como responsável pela empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções perante a Secretaria de Estado de Fazenda de Mato Grosso. Valendo-se das atribuições que exerciam, utilizaram indevidamente os dados dessa empresa para constituir, de forma fraudulenta, outra pessoa jurídica, denominada A. Caberlin Publicidade e Eventos, a qual, no esquema de desvio de recursos públicos, recebeu diversos cheques emitidos pela Assembleia Legislativa Estadual. Tal conclusão decorre de vários elementos convergentes: a experiência técnica e o conhecimento especializado dos requeridos na área contábil e tributária; o fato de serem responsáveis, por meio da empresa Ômega Contabilidade, pela gestão da verdadeira empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções; a atuação específica de Joel Quirino Pereira, que, mediante manipulação dos dados da empresa original, formalizou a constituição da empresa fraudulenta; as provas colhidas em busca e apreensão realizada na Ômega Contabilidade, nas quais constam dados da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos; bem como as declarações prestadas em delação premiada por José Geraldo Riva – posteriormente confirmadas em juízo – e outros depoimentos colhidos ao longo da instrução processual. Nessa mesma linha de raciocínio, a fim de evitar repetições desnecessárias, reproduzem-se, a seguir, excertos do voto proferido pela eminente relatora, que sintetizam de forma precisa e objetiva os fundamentos adotados para a condenação dos requeridos: “(...) As diligências empreendidas na fase investigativa, por sua vez, revelam que o CNPJ pertencente à empresa A. Caberlin – Centro Oeste Materiais para Construções foi manipulado e utilizado para constituir uma empresa fictícia. O sócio formal da empresa real, Sr. Ademir Caberlin, foi enfático ao afirmar que jamais autorizou a abertura de outra pessoa jurídica, tampouco teve qualquer ciência ou participação em processos licitatórios na esfera estadual. Isso reforça que o uso de sua inscrição e dados ocorreu de maneira absolutamente fraudulenta, com o fim específico de dar aparência de legalidade a transações que, em verdade, jamais representaram qualquer prestação de serviço à administração pública. Alinha-se, a isso, a delação premiada de JOSÉ GERALDO RIVA, devidamente homologada e admitida como prova nos autos, que reforça a conclusão quanto à consciência e voluntariedade da conduta dos apelantes, formando um conjunto harmônico e coerente com as provas, especificamente os cheques, as informações de inatividade da empresa e a ausência de notas fiscais. Para mais, há trecho inequívoco da fala do colaborador, que imputa a HUMBERTO MELO BOSAIPO a participação direta na constituição de empresa de fachada e na manipulação de cheques sem qualquer contrapartida de serviço ou produto. Veja-se (ID. 278677856): “(22:19): “A situação dos saques, ela nunca foi efetivada por nenhuma das empresas, até porque as empresas, eram empresas criadas de forma fraudulenta ou em um determinado momento, como eu já disse, sequer criadas. E esse processo de criação das empresas, ele foi relatado pelo senhor Humberto Bosaipo à época. É... até porque eu não conhecia esse pessoal, que não eram aqui de Cuiabá, alguns deles trabalharam...em... em Barão de Melgaço, pelos...pelos Quirinos, pelo senhor Luiz Dondo, pelo senhor Nivaldo de Araújo e.... à época, a alegação era de que a Confiança Factoring, através do senhor Nilson Teixeira e do senhor João Arcanjo, tinha pleno conhecimento. E em alguns casos até contribuíram. Eu tenho até um caso em que entraram numa... numa... numa ação contra, contra mim e o deputado Bosaipo pedindo indenização, em que a pessoa alega que pegou os documentos lá na Confiança e entregou os documentos na mão dos contadores para que fosse criada as empresas, algumas empresas eram simplesmente dado manutenção de empresas velhas já. Fazia, inclusive, a alteração do ramo de atividade. Outras empresas eram criadas e outras, como eu disse pra vossa excelência, e reafirmo aqui, eram empresas que sequer existiam. Procedimento nenhum era feito, era feito uma relação de cheques e nós recebíamos o pacote de cheques junto à relação e simplesmente assinávamos. A Confiança Factoring, como eu disse, é... recebeu aproximadamente 20 (vinte) e poucos milhões desses valores, sem precisar que haviam 22 (vinte e duas) promissórias de R$ 700.000,00 (setecentos mil) que foram pagos mensalmente, por mim e pelo deputado Humberto Bosaipo e também eram utilizados recursos, às vezes, para campanha eleitoral, para eleições de mesa, e as vezes até para uma questão particular de deputado (...).” (...) Com relação a JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA, destaca-se que as declarações prestadas por José Geraldo Riva na colaboração premiada são coerentes e ricas em detalhes, destacando, com firmeza, que os irmãos atuavam no escritório no qual as empresas eram criadas e manipuladas, muitas vezes com fornecimentos dados pela Confiança Factoring. Veja-se (ID. 278677856): “(...) As empresas foram constituídas dentro do escritório do Dondo, os responsáveis por isso foi o Joel e o José acompanhados pelo Nivaldo Araújo, que eram pessoas de confiança do Bosaipo, já antigas no esquema. E a maior parte de documentação era arrumado pela... pelo grupo do João Arcanjo Ribeiro, especialmente o Nilson Teixeira, e os cheques eram emitidos por Luiz Eugênio de Godoy, por Guilherme Garcia, antes o Guilherme Garcia como secretário de finanças, depois o Luiz Eugênio, mas também o Senhor Guilherme Garcia na condição de secretário-geral”. Tais declarações são corroboradas pela ratificação em juízo (ID. 278677897) e depoimentos testemunhais, além dos documentos que instruem a petição inicial, relacionados às apreensões feitas no âmbito do Inquérito Policial n.° 252/03 (ID. 278677089 – pág. 108/123), especialmente nos computadores da empresa Ômega Auditoria, com diversos arquivos e documentos digitais que evidenciam a atuação dos irmãos contadores, de forma coordenada com outros integrantes do esquema, como responsáveis pela constituição da estrutura societária e contábil que possibilitou a apropriação ilícita dos recursos públicos. Dentre os documentos e arquivos localizados pelo serviço de inteligência, consta que no mesmo computador no qual estava salvo o curriculum de JOSÉ QUIRINO PEREIRA havia relatórios com nomes de pessoas físicas e jurídicas destinados à emissão de cheques da Assembleia Legislativa. Veja-se (ID. 278677089 – pág. 129): Ainda, foi identificada uma relação de custos para a reativação de 11 empresas, enviadas para Nilson Teixeira, integrante do esquema da Confiança Factoring, e um relatório para a Assembleia legislativa, com o nome de algumas empresas e a observação “até o momento sem repetição de bacanas. Obs: falta abrir + cinco empresas”. Confira-se (ID. 278677089 – pág. 122): (...). No caso concreto, as provas demonstram que tanto JOEL quanto JOSÉ QUIRINO se valiam de seu conhecimento técnico-contábil para montar estrutura empresarial fictícia e encobrir os rastros da operação fraudulenta, em conluio com os agentes políticos. A adesão consciente, voluntária e reiterada ao esquema evidencia a clara intenção dos requeridos de causar lesão ao erário. Logo, não se sustenta o fundamento da sentença quanto à exclusão de JOSÉ QUIRINO PEREIRA da condenação, tampouco os argumentos recursais para inocentar JOEL QUIRINO PEREIRA. Dessa sorte, a responsabilização de HUMBERTO MELO BOSAIPO, JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA pelo ressarcimento ao erário é medida impositiva, não só para dar resposta à sociedade, como para restaurar a integridade do sistema político violado”. Alie-se a estes fatos que os requeridos Joel Quirino Pereira e José Quirino Pereira responderam e foram condenados exatamente por formalizar a existência de diversas empresas fictícias com a finalidade de dar aparência de legitimidade dos supostos serviços prestados à Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso com vistas a desviar dinheiro público, como bem destacou o Ministério Público em suas razões, inclusive citando os autos de nº 0004404-47.2007.811.0041, nº 0003668-63.2006.8.11.0041, nº 00045255-75.2007.8.11.0041 e nº 0004135-42.2006.8.11.0041. Igualmente, o próprio recorrente Joel Quirino trouxe aos autos decisões no âmbito criminal em que foi condenado, juntamente com seu irmão José Quirino Pereira, pelas mesmas condutas, porém, teve reconhecida a prescrição da pretensão punitiva estatal, na modalidade retroativa (vide id. 287346365). Assim, ainda que o apelante Joel Quirino Pereira alegue ausência de dolo, desconhecimento do contrato social e inexistência de assinatura ou grafia de sua autoria nos documentos, os elementos colhidos em busca e apreensão na Ômega Contabilidade, os depoimentos prestados e as declarações confirmadas em juízo, notadamente a colaboração premiada de José Geraldo Riva, evidenciam seu efetivo envolvimento, juntamente com seu irmão, afastando a tese de mera utilização indevida de seu nome por terceiros. Não se trata, portanto, de simples irregularidade formal sem dano ao erário, mas de conduta dolosa, voltada à criação de empresa fictícia para fins ilícitos, o que justifica a condenação. Destarte, evidente a prática de ato de improbidade doloso que lesa ao erário pelos apelantes Humberto Melo Bosaipo, Joel Quirino Pereira e José Quirino Pereira hábil à condenação dos mesmos ao ressarcimento aos cofres públicos, em conformidade com as provas dos autos. Ante o exposto, em sintonia com o parecer ministerial, não tenho dúvida em acompanhar a douta relatora para negar provimento aos recursos de apelação interpostos por Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira e dar provimento ao manejado pelo Ministério Público, tão-somente para estender a condenação de ressarcimento ao erário a José Quirino Pereira. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 21/07/2025

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Humberto Melo Bosaipo e outros x Humberto Melo Bosaipo e outros

ID: 333824583

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0001868-29.2008.8.11.0041

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

HUMBERTO MELO BOSAIPO JOEL QUIRINO PEREIRA

Polo Passivo:

HUMBERTO MELO BOSAIPO JOEL QUIRINO PEREIRA JOSE QUIRINO PEREIRA

Acórdão

Advogados:

MARIA ABADIA PEREIRA DE SOUZA AGUIAR

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UBIRAJARA DE SIQUEIRA FILHO

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EZEQUIEL NUNES DE SOUSA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 0001868-29.2008.8.11.0041 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [DANO AO ERÁRIO] RELATORA: EXMA. SRA.… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO NÚMERO ÚNICO: 0001868-29.2008.8.11.0041 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO: [DANO AO ERÁRIO] RELATORA: EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO TURMA JULGADORA: [EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JUNIOR, EXMO. SR. DES. MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA] PARTE(S): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE), JOSE GERALDO RIVA - CPF: 387.539.109-82 (APELADO), GUSTAVO LISBOA FERNANDES - CPF: 021.663.661-20 (ADVOGADO), ALMINO AFONSO FERNANDES - CPF: 251.784.401-10 (ADVOGADO), HUMBERTO MELO BOSAIPO - CPF: 094.169.601-44 (APELADO), MARIA ABADIA PEREIRA DE SOUZA AGUIAR - CPF: 009.824.698-45 (ADVOGADO), JOSE QUIRINO PEREIRA - CPF: 411.780.251-87 (APELADO), EZEQUIEL NUNES DE SOUSA - CPF: 476.650.411-91 (ADVOGADO), UBIRAJARA DE SIQUEIRA FILHO - CPF: 513.705.811-49 (ADVOGADO), JOEL QUIRINO PEREIRA - CPF: 544.553.591-68 (APELADO), JOSE GERALDO RIVA - CPF: 387.539.109-82 (TERCEIRO INTERESSADO), GERALDO LAURO - CPF: 201.139.351-53 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), HUMBERTO MELO BOSAIPO - CPF: 094.169.601-44 (APELANTE), MARIA ABADIA PEREIRA DE SOUZA AGUIAR - CPF: 009.824.698-45 (ADVOGADO), JOSE QUIRINO PEREIRA - CPF: 411.780.251-87 (APELANTE), UBIRAJARA DE SIQUEIRA FILHO - CPF: 513.705.811-49 (ADVOGADO), EZEQUIEL NUNES DE SOUSA - CPF: 476.650.411-91 (ADVOGADO), JOEL QUIRINO PEREIRA - CPF: 544.553.591-68 (APELANTE), UBIRAJARA DE SIQUEIRA FILHO - CPF: 513.705.811-49 (ADVOGADO), EZEQUIEL NUNES DE SOUSA - CPF: 476.650.411-91 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGARAM PROVIMENTO AOS RECURSOS DE HUMBERTO MELO BOSAIPO E JOEL QUIRINO PEREIRA, E DERAM PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO A EXCELENTÍSSIMA SRA. DESA. RELATORA MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, 1º VOGAL EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JÚNIOR E 2º VOGAL EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA. E M E N T A DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO DECORRENTE DA PRÁTICA DE ATO ÍMPROBO. DESVIO DE VERBAS MEDIANTE EMPRESA DE FACHADA. DOLO COMPROVADO. RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL DOS GESTORES PÚBLICOS. UTILIZAÇÃO VÁLIDA DA PROVA EMPRESTADA E DE COLABORAÇÃO PREMIADA. RECURSOS DOS REQUERIDOS NÃO PROVIDOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO PROVIDO. I. Caso em exame Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos em ação civil pública de ressarcimento ao erário ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, envolvendo esquema de desvio de recursos públicos mediante contratação fictícia de empresa, na Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. A sentença condenou parte dos requeridos e excluiu José Quirino Pereira da responsabilização. II. Questão em discussão A questão em discussão consiste em verificar: (i) a comprovação do dolo específico exigido pela Lei n.° 8.429/92, com as alterações da Lei n.° 14.230/21, para configuração do ato de improbidade administrativa com dano ao erário; (ii) se a colaboração premiada homologada judicialmente pode ser validamente utilizada em ação civil pública de ressarcimento ao erário por ato de improbidade administrativa; (iii) se é legítima a utilização de prova emprestada, respeitado o contraditório. (iv) se há elementos suficientes para estender a condenação a José Quirino Pereira. III. Razões de decidir De acordo com o Supremo Tribunal Federal (Tema n.° 897), os pedidos de ressarcimento fundados no artigo 37, § 5°, da Constituição da República, reclamam o reconhecimento de ato de improbidade doloso como causa do prejuízo alegado. Com as modificações trazidas pela Lei n.° 14.230/21, para a configuração de ato de improbidade administrativa que importa em prejuízo ao erário, tipificado no artigo 10, da Lei n.° 8.429/92, exige-se a comprovação de dolo específico, além da de efetiva perda patrimonial. As provas documentais e testemunhais, incluindo cheques emitidos sem lastro contratual, depoimentos e arquivos digitais, revelam a existência de estrutura organizada para desvio de recursos públicos com participação direta e consciente dos réus. A colaboração premiada de um dos réus, homologada judicialmente e corroborada por outros elementos de prova, reforça a narrativa da conduta dolosa. A utilização de prova emprestada é válida, desde que oportunizado o contraditório às partes, o que se verificou nos autos. A conduta dos apelantes transcendeu a mera omissão funcional, caracterizando participação ativa na execução de esquema de desvio sistemático de recursos públicos, o que justifica a condenação ao ressarcimento integral. O conjunto probatório aponta que José Quirino Pereira não era mero espectador, mas partícipe ativo no esquema fraudulento. IV. Dispositivo e tese Recursos de apelação de Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira conhecidos e não providos. Recurso de apelação do Ministério Público do Estado de Mato Grosso conhecido e provido para estender a condenação de ressarcimento a José Quirino Pereira. Tese de julgamento: "1. É devido o ressarcimento ao erário, em razão de ato ímprobo, quando comprovada a conduta dolosa do agente público que, de forma consciente e reiterada, autoriza pagamentos vultosos a empresa de fachada, sem respaldo documental ou comprovação de contraprestação, causando prejuízo efetivo. 2. A demonstração do dolo específico pode decorrer da análise contextual dos elementos objetivos e documentais, inclusive mediante a validação judicial de colaboração premiada corroborada por provas materiais. 3. É legítima a utilização de prova emprestada, desde que respeitado o contraditório, para reforçar a autoria e a materialidade dos atos ímprobos imputados aos réus. 4. A responsabilidade pelo ressarcimento ao erário alcança todos aqueles que, ainda que sem vínculo formal com a administração pública, concorreram dolosamente para o ato lesivo.”. Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5º, XL e LV; art. 37, § 4º e § 5º; Lei n.° 8.429/92, arts. 1º, § 1º e § 4º, 10 e 17. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 843.989, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Plenário, j. 18.08.2022; STF, ARE 1175650, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Plenário, j. 03.07.2023; STJ, REsp 1601868/SC, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, 1ª T., j. 13.08.2024; STJ, AgInt no RMS 61408/RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., j. 11.05.2020. R E L A T O R I O EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO (RELATORA): Egrégia Câmara: Trata-se de RECURSOS DE APELAÇÃO, interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, HUMBERTO MELO BOSAIPO e JOEL QUIRINO PEREIRA, contra a sentença proferida pela Excelentíssima Juíza de Direito, Dra. Célia Regina Vidotti, nos autos de n.° 0001868-29.2008.811.0041, em trâmite perante a Vara Especializada em Ações Coletivas da Comarca de Cuiabá, MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (ID. 278677959): “Vistos etc. Cuida-se de Ação Civil Pública de Ressarcimento de Danos Causados ao Erário, com pedidos liminares, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, em face de José Geraldo Riva, Humberto Melo Bosaipo, Geraldo Lauro, Nivaldo de Araujo, José Quirino Pereira e Joel Quirino Pereira, com fundamento no art. 37, §5º, da Constituição Federal e da Lei nº 7.347/85. O requerente alega, em síntese, que os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Melo Bosaipo, na qualidade de gestores responsáveis pela Administração da Assembleia Legislativa Estadual, foram responsáveis por desvios na ordem de R$1.819.430,80 (um milhão, oitocentos e dezenove mil, quatrocentos e trinta reais e oitenta centavos), identificados por trinta e dois (32) cheques nominais à empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. Afirma que os requeridos Geraldo Lauro e Nivaldo de Araújo, ocupavam à época dos fatos, cargos nos setores de patrimônio e licitação da AL/MT, tendo ambos colaborado para a prática dos atos fraudulentos descritos na inicial. Argui que os requeridos Joel Quirino Pereira e José Quirino Pereira, embora não ocupassem cargo público à época dos fatos, teriam agido em concurso dos demais requeridos, sendo eles os responsáveis pela criação e utilização de empresas inexistentes, ou mesmo se utilizar de algumas empresas regulares como supostas beneficiárias de cheques emitidos pela AL/MT, sem que os reais proprietários tivessem conhecimento, como é o caso da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. Assevera que as sanções pela prática do ato de improbidade administrativa não poderão ser aplicadas, em face da prescrição, sendo, porém, perfeitamente possível buscar o ressarcimento ao erário, nos termos do art. 37, § 5º, da Constituição Federal. Requereu, liminarmente, a indisponibilidade de bens dos requeridos, além da concessão de busca e apreensão de todos os documentos relativos às referidas licitações, que envolvam a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, conforme descrito na inicial. No mérito requereu a condenação dos requeridos ao ressarcimento do dano causado ao Estado de Mato Grosso, no valor de R$1.819.430,80 (um milhão, oitocentos e dezenove mil, quatrocentos e trinta reais e oitenta centavos). Pela decisão de Id. 58115740 fls. 158/163, os pedidos liminares foram indeferidos, oportunidade em que foi determinada a intimação do Estado de Mato Grosso, para manifestar interesse na ação e a citação dos requeridos. Os requeridos José Geraldo Riva e Geraldo Lauro, por seus patronos, apresentaram manifestação nominada de “resposta” (Id. 278677094 fls. 44/78), arguindo em preliminar a incompetência absoluta deste Juízo. Arguiram, ainda, que os agentes políticos não respondem por atos de improbidade administrativa, mas sim por crime de responsabilidade, sendo necessária a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso. No mérito, arguiram a ausência de prova que possa, ao menos, ser indicativo de que os requeridos tenham praticado uma conduta capaz de causar algum dano ao erário. O requerido Humberto Melo Bosaipo, por seu patrono, apresentou contestação (Id. 278677097 fls. 123/130), arguindo a preliminar de nulidade do inquérito civil. No mérito, afirmou que o requerido, na qualidade de Deputado Estadual e Presidente ou Primeiro Secretário da Casa Legislativa, não era a sua função inspecionar cada um dos processos licitatórios e verificar a efetiva entrega dos serviços ou materiais licitados. Afirmou que não restou demonstrado qualquer ilegalidade de pagamento as empresas fornecedoras ou prestadoras de serviços, tampouco no fato de haverem cheques recebidos e trocados junto às empresas de factoring. Ressaltou, também, que não era a sua função, como membro da mesa diretora, acompanhar as minúcias de cada um dos procedimentos administrativos, sendo certo que todos os atos dos servidores ficavam registrados nos respectivos processos administrativos. Requereu, ao final, o acolhimento da preliminar e a extinção do processo sem julgamento do mérito ou, com o julgamento do mérito, a improcedência da ação. Pela manifestação constante no Id. 58117355 fls. 05/20, o requerido o requerido Humberto Melo Bosaipo, por seu patrono, arguiu também a incompetência absoluta deste Juízo, em razão da inconstitucionalidade dos Provimentos 19/2013/CM, 32/2013/CM, 36/2013/CM e 37/2013/CM, afirmando que foi instituído regime de exceção na Vara Especializada, sendo esta incompetente. O requerido José Geraldo Riva, manifestou no Id. 58117355 fls. 34/51 e apontou novamente para a incompetência desta Vara Especializada, em razão da inconstitucionalidade formal e material do provimento n.º 004/2008/CM. Pela decisão constante no Id. 278677099 fls. 46/52, as preliminares de incompetência da vara para o processamento e julgamento da ação foram afastadas, oportunidade em que a tramitação do processo foi suspensa em razão do óbito do requerido Nivaldo Araújo, noticiado nos autos nº 9890-13.2007.811.0041 (cód. 289373). O representante do Ministério Público do Estado desistiu da ação em relação ao requerido Nivaldo de Araújo. Pela decisão constante no Id. 278677099 fls. 278/280, foi homologada a desistência da ação com relação ao requerido Nivaldo de Araújo. No Id. 278677099 fls. 283 foi certificado o decurso do prazo sem a apresentação de contestação pelos requeridos José Quirino Pereira e Joel Quirino Pereira. O Ministério Público do Estado, por seu representante, apresentou impugnação às contestações (Id. 278677099 fls. 284/287 e Id. 278677850 fls. 02/20), rechaçando as preliminares arguidas, bem como requerendo a produção todas as provas admitidas em direito. O requerido José Geraldo Riva noticiou o “Acordo de Colaboração Premiada” firmado com o Ministério Público e homologado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, retificando a sua defesa e reconhecendo a procedência dos pedidos da ação. No despacho de Id. 278677851 fls. 09 foi determinado que o requerente juntasse aos autos, o anexo da colaboração premiada firmada pelo requerido Jose Geraldo Riva, o que foi cumprido, conforme Id. 278677851 fls. 12/68 e Ids. 58117362; 278677853 e 58546963. Na decisão de Id. 82158514,as preliminares e prejudiciais do mérito arguidas pelas defesas dos requeridosforam afastadas; foi decretada a revelia dos requeridos Joel Quirino e José Quirino; o processo foi saneado, fixando-se os pontos controvertidos, bem como foi determinada a intimação das partes para indicarem as provas que pretendiam produzir. O requerente e os requeridos Humberto Bosaipo, Geraldo Lauro, José Quirino e Joel Quirino, requereram a produção de prova (Id. 84080195, Id. 84810470 e Id. 84078926). Na decisão de Id. 102553039foi determinada a intimação das partes, para manifestarem se concordavam com a utilização de depoimentos das testemunhas arroladas, como prova emprestada de processos semelhantes. Os requeridos foram intimados e apenas o requerente e o requerido Geraldo Lauro manifestaram expressamente sobre a prova emprestada. Na decisão de Id. 111078670, os pedidos de prova emprestada foram deferidos e trasladados para estes autos. No despacho de Id. 138189213 a instrução processual foi encerrada, bem como foi determinada a intimação das partes, para apresentarem os memoriais finais. O representante do Ministério Público apresentou os memoriais finais no Id. 143950089. Na sequência, os requeridos José Riva, Humberto Bosaipo, Geraldo Lauro, José Quirino e Joel Quirino, por seus patronos, apresentaram os memoriais finais nos Ids. 149316279; 152767102; 15424125 e; 154301185. No Id. 168935879, o representante do Ministério Público informou a formalização de acordo de não persecução cível com o requerido Geraldo Laudo, requerendo a sua homologação. Na sentença preferida no Id. 176228466, o acordo de não persecução cível foi homologado e o processo foi julgado extinto em relação ao requerido Geraldo Lauro. Os autos vieram conclusos. É o relatório. Decido. Em primeiro lugar, em relação ao pedido de reconhecimento de prescrição, arguida pela defesa do requerido Humberto Bosaipo em seus memoriais, entendo que a analise do pedido encontra-se prejudicada, uma vez que a presente ação tem por objeto apenas o ressarcimento ao erário, o qual é imprescritível como definido no tema 897/STF. Passo a analise do mérito. Este processo foi distribuído antes da publicação da Lei Federal nº 14.230, de 25/10/2021, que promoveu significativas alterações na Lei n. 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de improbidade administrativa, de que trata o § 4º, do art. 37, da Constituição Federal e dá outras providências. Sobre a aplicação da nova lei, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo nº 843.989/PR, processo-paradigma do Tema n. 1.199, fixou as seguintes teses: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se – nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. As teses acima transcritas possuem caráter vinculante, nos termos do disposto nos arts. 927, inc. III e 987, § 2 º, ambos do Código de Processo Civil e, assim, devem ser observadas nos processos em curso, de modo que a nova norma será aplicada de imediato e não haverá retroatividade para as questões de caráter processual; para as alterações de caráter material, haverá retroatividade, se a nova norma for mais benéfica, respeitada a coisa julgada. Destaca-se, ainda, que a redação dada pela Lei n. 14.230/2021, ao art. 1º e parágrafos, da Lei n. 8.429/92, estabelece que apenas as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 serão consideradas atos de improbidade administrativa, ou seja, somente se admite responsabilizar os atos dolosos praticados com vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito, não bastando a voluntariedade do agente, in verbis: Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. § 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. § 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. § 3º O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade administrativa.(grifo nosso). Ainda, vejamos a jurisprudência do nosso Tribunal: JUÍZO DE RETRATAÇÃO – REPERCUSSÃO GERAL – TEMA 1.199 DO STF – ART. 1.030, II, CPC – APELAÇÃO CÍVEL – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – LICITAÇÃO – FRAUDE DEMONSTRADA – DIRECIONAMENTO DO OBJETO À EMPRESA PRÉ-DETERMINADA – VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA –IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CONFIGURADA – DOLO – ATO ÍMPROBO CONFIGURADO – JUÍZO DE RETRAÇÃO NEGATIVO – ACÓRDÃO MANTIDO. 1. NO CASO, RESTANDO Demonstrado o dolo na conduta do agente, não se verifica a existência de divergência com os fundamentos adotados na Tese de Repercussão Geral AFETA DO TEMA N. 1.199 DO STF. 2. “A Tese de Repercussão Geral (Tema nº 1199) não impôs novo julgamento da causa à luz da Lei nº 14.230, de 25 de outubro de 2021, que alterou a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992. De outro lado, cuida-se de questão a ser analisada pelo Tribunal Superior no julgamento do recurso especial.” (TJMT, JUÍZO DE RETAÇÃO N. 0042761-86.2013.8.11.0041, 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, REL. DES. LUIZ CARLOS DA COSTA, J. 18.07.2023). (N.U 0003325-50.2007.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/08/2023, Publicado no DJE 01/09/2023). Ressalta-se, ainda, que o art. 17, §10-D, da mencionada lei, estabelece que: “Para cada ato de improbidade administrativa, deverá necessariamente ser indicado apenas um tipo dentre aqueles previstos nos arts. 9º, 10 e 11, desta Lei.” Feitas essas considerações, verifico que no caso em comento a petição inicial aponta que os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Melo Bosaipo, atuando como responsáveis pela administração da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, teriam praticado atos de improbidade que causaram danos ao erário, enriquecimento ilícito e ofensa a princípios da Administração Pública, mediante fraude à licitação e desvio de recursos públicos, por meio da emissão de trinta e dois (32) cheques, em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. Segundo consta ainda da petição inicial, a referida empresa foi utilizada irregularmente pelos requeridos José Quirino Pereira e Joel Quirino Pereira, os quais teriam sido os contadores responsáveis pela sua constituição. O representante do Ministério Público apontou que tais ilegalidades, consistentes no uso da empresa, para o desvio de verba pública, configurou a prática de ato de improbidade administrativa, que causou prejuízo ao erário. Pois bem. De inicio, saliento que o requerido José Geraldo Riva firmou acordo de colaboração premiada com o Ministério Público, devidamente homologado pelo o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, o qual é utilizado nestes autos com finalidade de corroborar os fatos narrados na inicial. Diante da celebração do acordo, o requerido José Geraldo Riva reconheceu os atos ímprobos imputados na petição inicial, o que comporta provimento de natureza declaratória, pois, caso descumpridas as condições pactuadas na colaboração premiada, poderá o requerente comunicar o juízo e buscar a imposição das penalidades impostas no acordo. Ademais, sabe-se que as declarações do colaborador não perfazem prova isoladamente, devendo existir outros elementos corroborativos, para que o Juiz possa formar a sua convicção, para proferir a decisão de mérito. Neste sentido, cabe aqui sopesar as provas contidas na referida delação, juntadas nos Ids. 278677851 a 278677853 e, Id. 58546963, as quais foram confirmadas em juízo no Id. 111346986, uma vez que o colaborador narra detalhadamente como funcionava o esquema de desvio de verbas públicas da AL/MT, consistente no uso não apenas da empresa requerida nesta ação, mas de inúmeras outras empresas fictícias ou irregulares, para figurar em processos licitatórios ou aquisições simplificadas e receber o pagamento por produtos ou serviços que não foram prestados. O colaborador informa, em síntese, que o desvio de verba pública com a utilização de empresas fictícias ou irregulares era uma prática rotineira e comum desenvolvida pelos deputados estaduais, para o recebimento de propina mensal, com a finalidade de manter a governabilidade do executivo. Menciona ainda, que esses desvios ocorreram entre os anos de 1995 a 2015. Percebe-se, assim, que os fatos narrados pelo colaborador corroboram com o que está contido nos documentos que instruem a inicial. Dentre as empresas que participaram do citado esquema, a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos teria sido contratada para a prestação de serviços e teria sido beneficiária dos cheques emitidos pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, nos anos de 2001 a 2002. As provas produzidas nos autos demonstram que a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos foi utilizada irregularmente pelos requeridos, já que seu o numero de CNPJ pertencia a outra empresa e foi utilizado para justificar a emissão dos cheques da AL/MT, com a criação da referida empresa inexistente, ou seja, os requeridos se utilizaram do cadastro de uma empresa que se encontrava regular, e utilizaram os dados para criação de outra empresa fictícia para justificar os pagamentos ilegais (Id. 58115730 fls. 29/30). Observa-se que o CNPJ 04.600.944/001-50 consta o nome A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções e, como contador responsável o requerido Joel Quirino, no entanto, o mesmo numero de CNPJ foi utilizado para criar ilegalmente a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos teria, a qual foi utilizada ilegalmente pelos requeridos para emissão de vários cheques nos anos de 2001 a 2002 (Id. 58115730 fls. 29/30 e 47/50). Ademais, o sócio, a pessoa de nome Ademir Caberlin, afirmou que constituiu a empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções, através dos contadores e requeridos Joel Quirino e José Quirino, mas que nunca autorizou a abertura de qualquer outra empresa, bem como que nunca participou de qualquer licitação na AL/MT e que desconhece a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos (Id. 58115733 – fls. 83/86). Outrossim, os requeridos não apresentaram nota fiscal ou comprovante de recebimento dos produtos ou serviços, supostamente adquiridos, para justificar esses pagamentos realizados, tampouco comprovaram a existência do regular procedimento licitatório prévio. Certamente, esses produtos ou serviços, assim como a empresa, jamais existiram. Portanto, não há dúvidas de que os dados da empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construçõesforam utilizados irregularmente, para a criação da empresa inexistente A. Caberlin Publicidade e Eventos, sendo assim, o pagamento à empresa fictícia indica a intenção concreta de beneficiar terceiros, com prejuízo ao erário, caracterizando o dolo na conduta ímproba. Os requeridos Humberto Bosaipo e José Riva, cada um desempenhando as suas atribuições, tinham a obrigação legal de zelar pelo correto trâmite dos procedimentos de aquisição de bens ou de prestação de serviços. No caso em comento, não há emissão de uma única nota fiscal de serviços prestados pela empresa, a qual sequer tinha autorização para emitir nota fiscal, documento essencial no procedimento de conferencia da prestação do serviço/atesto e de empenho e pagamento, notadamente, quando se tratam de valores expressivos, que exigem modalidade licitatória mais complexa. Desta forma, está demonstrado que os requeridos não fizeram o mínimo do que se espera de um gestor público. Na análise dos autos verifico a existência de vinte e nove (29) cópias de cheques emitidos pela Assembleia Legislativa, nominais em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos (Id. 58115738), quais sejam: 1) Cheque n° 010112, no valor de R$72.000,00 (setenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 39). 2) Cheque n° 010611, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 41). 3) Cheque n° 010702, no valor de R$52.000,00 (cinquenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 43). 4) Cheque n° 011210, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 45). 5) Cheque n° 011310, no valor de R$46.000,00 (quarenta e seis mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 47). 6) Cheque n° 011473, no valor de R$65.300,00 (sessenta e cinco mil, trezentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 48). 7) Cheque n° 010374, no valor de R$72.500,00 (setenta e dois mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 50). 8) Cheque n° 011815, no valor de R$74.350,00 (setenta e quatro mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 52). 9) Cheque n° 010720, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 54). 10) Cheque n° 012147, no valor de R$69.526,00 (sessenta e nove mil, quinhentos e vinte e seis reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 56). 11) Cheque n° 010919, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 58). 12) Cheque n° 011980, no valor de R$55.000,00 (cinquenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 60). 13) Cheque n° 012516, no valor de R$52.350,00 (cinquenta e dois mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 62). 14) Cheque n° 012753, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 64). 15) Cheque n° 012610, no valor de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 66). 16) Cheque n° 010727, no valor de R$45.000,00 (cinquenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 68). 17) Cheque n° 013053, no valor de R$48.500,00 (quarenta e oito mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 70). 18) Cheque n° 013228, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 72). 19) Cheque n° 013963, no valor de R$40.000,00 (quarenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 74). 20) Cheque n° 014074, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 76). 21) Cheque n° 014416, no valor de R$51.434,80 (cinquenta e um mil, quatrocentos e trinta e quatro reais, oitenta centavos); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 78). 22) Cheque n° 014561, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 80). 23) Cheque n° 012828, no valor de R$71.500,00 (setenta e um mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 82). 24) Cheque n° 015029, no valor de R$62.350,00 (sessenta e dois mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 84). 25) Cheque n° 016093, no valor de R$67.410,00 (sessenta e sete mil, quatrocentos e dez reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 88). 26) Cheque n° 016116, no valor de R$35.680,00 (trinta e cinco mil, seiscentos e oitenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 89). 27) Cheque n° 015478, no valor de R$42.560,00 (quarenta e dois mil, quinhentos e sessenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 90). 28) Cheque n° 016355, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 91). 29) Cheque n° 016038, no valor de R$67.800,00 (sessenta e sete mil, oitocentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 93). Já os cheques n° 0850004; 014976 e; 015119 estão ilegíveis, não sendo possível identificar os valores e o nome da empresa, de modo que não poderão ser objeto de análise. Esses cheques foram emitidos pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, por meio de seus representantes à época, os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Bosaipo, os quais detinham a competência para autorizar esses pagamentos, totalizando o valor de R$1.616.260,80 (um milhão, seiscentos e dezesseis mil, duzentos e sessenta reais e oitenta centavos). No entanto, a empresa beneficiária desses pagamentos não forneceu nenhum produto ou serviço, conforme já esclarecido acima, de modo que os requeridos efetivamente causaram danos ao erário ao permitiram esses pagamentos sem a devida contraprestação. O requerido Joel Quirino, por sua vez, à época dos fatos era o contador responsável pela empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções perante a Secretaria de Estado de Fazenda de Mato Grosso, conforme consta no Id. 58115730 (fls. 47/50), ficando comprovada a sua efetiva participação no desvio de recursos público, por meio do uso dos dados e da constituição da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. utilizada no esquema com CNPJ de terceiro, no qual o requerido não apresentou nenhuma prova que pudesse afastar tal afirmativa. Todos esses fatos demonstram a prática de atos de improbidade administrativa, ficando evidente a existência de conluio entre os agentes públicos com o intuito de desviar dinheiro público. Assim, restou sobejamente demonstrada que os requeridos efetuaram os pagamentos para a empresa fictícia, sem a devida contraprestação, sem qualquer emissão de atesto ou comprovante de entrega dos serviços. Ainda, resguardado o direito ao contraditório e à ampla defesa, nenhum elemento foi trazido que pudesse afastar tal convicção, ou ainda indicar a boa-fé dos requeridos, de forma que resta caracterizada a prática de atos de improbidade administrativa. Não há que se falar em conduta culposa, em desídia ou falta de atenção, pois ficou demonstrado nos autos que os requeridos, cada com sua “atribuição”, concorreram para efetuar pagamentos de serviços que nunca foram prestados, tendo plena ciência de que se tratava de um procedimento, apenas para dar aparência de legalidade aos atos. Ainda, José Geraldo Riva, na condição de colaborador, também participou “do esquema”, juntamente com os demais requeridos, desviando recursos públicos, mediante contratação de empresas inexistentes ou irregulares. Suas afirmações, mesmo que venha de pessoa cujo comportamento anterior seja ética e socialmente reprovável, não retira o valor dos depoimentos prestados, em relação aos pagamentos efetuados por meio de cheques, sem a devida contraprestação. Além disso, toda a narrativa do esquema fraudulento de emissão de cheques com uso de empresas inexistentes ou irregulares é confirmada também pelas testemunhas Nilson Roberto Teixeira, Katia Maria Aprá, Edil Dias e Raquel Alves ouvidas em juízo (Id. 111342152; 111348683; 111348646; 111348648). No caso dos autos, alia-se a estes fatos a outros elementos de prova, que encontram harmonia com o depoimento do colaborador premiado, evidenciando a ocorrência da conduta ímproba. Assim, diante da clareza dos elementos de prova documental, corroborado com a colaboração premiada, ficou evidenciado que os requeridos praticaram ato de improbidade administrativa, que efetivamente causou prejuízo ao erário. No mais, em relação ao requerido José Quirino, embora se reconheça que a narrativa apresentada pressupõe indícios de ilegalidades praticadas pelo requerido no exercício de sua função como contabilista, verifico, contudo, que não há qualquer conduta dolosa capaz de configurar ato de improbidade administrativa, pelo contrário, não há nos autos indícios suficientes de sua autoria na constituição da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. Verifica-se que as imputações atribuídas ao requerido José Quirino foram insuficientes para configurar ato de improbidade administrativa, uma vez que não existe nos autos, algum documento por ele assinado ou algum ato por ele praticado, capaz de comprovar ter agido com dolo, com o objetivo de se beneficiar de um ato ilícito. Assim, impõe-se afastar a responsabilidade deste requerido. Dessa forma, em relação aos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Joel Quirino, em atenção ao exposto acima, verifica-se que dentre as tipificações contidas na lei de improbidade administrativa, aquela prevista no art. 10, da Lei n.º 8.429/92, melhor se amolda aos fatos. Portanto, os requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Joel Quirino devem responder pela prática dos atos de improbidade descritos no art. 10, caput, c/c art. 3º da Lei nº 8.429/92. Vejamos: Art. 3º As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra dolosamente para a prática do ato de improbidade. Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...). A Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92) tutela o dever de probidade do agente público, que é o dever de: o funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer. (CAETANO, Marcello. Manual de Direito Administrativo. 1ª ed. brasileira, t. II/684. Rio de Janeiro: Forense, 1970 apud SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 649). O dolo que se exige para a configuração de improbidade administrativa reflete-se na simples vontade consciente de aderir à conduta descrita no tipo, produzindo os resultados vedados pela norma jurídica, o que ocorreu no caso em questão. Observa-se que o dolo restou configurado no momento em que os requeridos José Riva e Humberto Bosaipo, como ordenadores de despesas e responsáveis pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, autorizaram o pagamento para a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, sem a devida contraprestação, causando dano ao erário. No que tange a conduta dolosa do requerido Joel Quirino, esta se caracterizou no momento em que foi o responsável pela constituição e o uso dos dados da empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções para criação da empresa fictícia A. Caberlin Publicidade e Eventos, o que causou prejuízo aos cofres públicos. A propósito, sobre o dolo, vejamos o entendimento jurisprudencial: JUÍZO DE RETRATAÇÃO – REPERCUSSÃO GERAL – TEMA 1.199 DO STF – ART. 1.030, II, CPC – APELAÇÃO CÍVEL – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – LICITAÇÃO – FRAUDE DEMONSTRADA – DIRECIONAMENTO DO OBJETO À EMPRESA PRÉ-DETERMINADA – VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA –IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CONFIGURADA – DOLO – ATO ÍMPROBO CONFIGURADO – JUÍZO DE RETRAÇÃO NEGATIVO – ACÓRDÃO MANTIDO. 1. NO CASO, RESTANDO Demonstrado o dolo na conduta do agente, não se verifica a existência de divergência com os fundamentos adotados na Tese de Repercussão Geral AFETA DO TEMA N. 1.199 DO STF. 2. “A Tese de Repercussão Geral (Tema nº 1199) não impôs novo julgamento da causa à luz da Lei nº 14.230, de 25 de outubro de 2021, que alterou a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992. De outro lado, cuida-se de questão a ser analisada pelo Tribunal Superior no julgamento do recurso especial.” (TJMT, JUÍZO DE RETAÇÃO N. 0042761-86.2013.8.11.0041, 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO, REL. DES. LUIZ CARLOS DA COSTA, J. 18.07.2023). (N.U 0003325-50.2007.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 29/08/2023, Publicado no DJE 01/09/2023). RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - PREJUDICIAL DE MÉRITO - PRESCRIÇÃO - TEMA 897 DO STF - NÃO OCORRÊNCIA - MÉRITO - APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.230/2021 - ELEMENTO SUBJETIVO DOLO - DEVIDAMENTE COMPROVADO - RECURSO DESPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA. 1. Prescrição. São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa (Tema 897/STF). 2. Mérito. Aquisição de grande quantidade de combustível pela Casa Legislativa do Município de Cuiabá/MT, considerando-se a frota de veículos e o período de utilização: 60.000 (sessenta mil) litros de gasolina, 25.000 (vinte e cinco mil) litros de álcool e 300 (trezentos) litros de óleo lubrificante. 3. Fatos comprovados por auditoria que atesta celeridade atípica no procedimento, aquisição de quantidade de combustível superior à demanda da entidade, em cotejo com período de utilização (dois meses) e a quantidade de veículos (dois) da frota. 4. Notas fiscais emitidas pela empresa vencedora do certame evidenciam a irregularidade do procedimento, porquanto não há informações mínimas acerca dos produtos fornecidos. 5. Demonstrado o dolo específico do recorrente em praticar as condutas vedadas pela lei em benefício próprio e prejuízo ao erário e à coletividade, impõe-se a manutenção da sentença condenatória. 6. Recurso desprovido. (N.U 0010263-34.2013.8.11.0041, Relator: Antonio Veloso Peleja Junior, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, j. em 14/03/2023, publicado no DJE 21/03/2023) (grifo nosso.) RECURSOS DE APELAÇÃO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE - INOCORRÊNCIA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - PRELIMINAR - MÉRITO - APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.320/2021- DOLO DEMONSTRADO NA HIPÓTESE – DANO AO ERÁRIO DEVIDAMENTE DEMONSTRADOS – RECURSOS DESPROVIDOS – SENTENÇA MANTIDA. 1. Restando demonstrado, no caso concreto, o dolo específico dos recorrentes em praticar as condutas vedadas pela lei em benefício próprio e prejuízo ao erário e à coletividade, impõe-se a manutenção da sentença que lhes impôs condenação pela prática de ato ímprobo. 2. Recursos desprovidos. (N.U 0008931-83.2012.8.11.0003, Relator: Gerardo Humberto Alves Silva Junior, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, j. em 07/02/2023, publicado no DJE 07/03/2023). (grifo nosso). Desse modo, estando suficientemente comprovados os fatos descritos na inicial, com relação aos requeridos José Riva, Humberto Bosaipo e Joel Quirino ficou configurada a prática do ato de improbidade administrativa descrita no art. 10 c/c 3º, da Lei 8.429/92. Porém, encontra-se prescrita a aplicação da sanção imposta no art. 12, da referida lei. Entretanto, a prescrição desses atos ímprobos não alcança a ação de ressarcimento dos prejuízos causados, nos termos da decisão do Supremo Tribunal Federal em sede de repercussão geral (Tema 897): São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. Portanto, mostra-se devida a condenação dos requeridos em ressarcir o erário, em razão da prática de ato doloso tipificado no art. 10, da Lei de Improbidade Administrativa, pelo prejuízo efetivamente causado referente a somatória dos cheques emitidos em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, cujo pagamento foi efetuado sem nenhuma contraprestação. Desta forma, inegável a obrigação dos requeridos em devolver aos cofres públicos o valor do efetivo dano causado ao erário. A imposição de ressarcimento ao erário se faz necessária e exprime a ideia de contraprestação, equivalente à reparação dos danos efetivamente causados pelo agente que, ilicitamente, contribuiu para a sua ocorrência. No caso em comento, esse dano corresponde aos valores pagos por serviços que não foram prestados. Diante do exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos, em relação ao requerido José Geraldo Riva, para reconhecer e declarar a prática do ato deimprobidadeadministrativa previsto no art. 10, caput, da Lei n.º 8.429/92, deixando, contudo, de aplicar a respectiva sanção, haja vista a colaboração premiada existente nos autos. Em relação ao requerido José Quirino Pereira, não havendo provas suficientes da prática do ato ímprobo doloso imputado ao requerido, julgo improcedentes os pedidos, com fundamento no art. 487, I, do CPC. Já em relação aos requeridos Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira, condeno-os ao ressarcimento do dano causado ao erário, de forma solidária, no valor deR$1.616.260,80 (um milhão, seiscentos e dezesseis mil, duzentos e sessenta reais e oitenta centavos). Sobre o valor referente ao ressarcimento do dano, os valores deverão ser acrescidos de juros de meio por cento (0,5%) ao mês, desde o dano efetivo (desconto dos cheques) até 11/01/2003, quando passa a ser de um por cento (1%) ao mês, com a entrada em vigor do Código Civil (lei 10.406/2002) e correção monetária, pelo INPC, também incidente a partir do dano (art. 398, Código Civil; Súmulas 43 STJ e 54 STF). Condeno os requeridos Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira, ao pagamento das custas e despesas processuais pro rata. Por consequência, julgo extinto o processo com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Transitada em julgado, expeça-se o necessário e, não havendo pendências, arquivem-se os autos, observadas as formalidades legais. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Celia Regina Vidotti Juíza de Direito”. Em suas razões recursais, o apelante HUMBERTO MELO BOSAIPO aduz que não consta do processado elementos probatórios de que tenha realmente contribuído para a suposta lesão ao erário. Argumenta que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça estabelece que a delação premiada, por si só, não constitui prova suficiente para fundamentar uma condenação, sendo necessária a apresentação de provas independentes que corroborem as alegações do delator. Salienta, nesse contexto, que inexistem provas adicionais que confirmem as declarações feitas na colaboração premiada e que a condenação da parte apelante está baseada exclusivamente em provas documentais, sem análise técnica e pericial, o que não é suficiente para a configuração do ato improbo. Assevera, ademais, que não já comprovação de que a parte apelante agiu com vontade livre e consciente de desobedecer aos comandos legais e violar os princípios da moralidade, imparcialidade e legalidade. Pontua, por derradeiro, a desproporcionalidade das sanções aplicadas, pois foi condenado ao ressarcimento ao erário, sem provas robustas de sua responsabilidade exclusiva pelo alegado prejuízo. Em face dessa situação, pugna pelo “CONHECIMENTO E PROVIMENTO DA APELAÇÃO, para reformar a r. sentença de primeiro grau, reconhecendo a ilegalidade das provas utilizadas e, consequentemente, JULGANDO IMPROCEDENTE A AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E ABSOLVENDO O APELANTE das sanções impostas; Subsidiariamente, na hipótese de manutenção da condenação, requer-se a redução da sanção aplicada, em observância aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade” (ID. 278677962). Por sua vez, o apelante JOEL QUIRINO PEREIRA sustenta que a condenação não possui embasamento probatório, pois não há demonstração de que praticou ato doloso ou utilizou a empresa, existindo apenas “[...] UM PAPEL QUE CONSTA SEU NOME E CRC, SEM ASSINATURA SEM O DOCUMENTOS DE CADASTRO QUE POSSA CONFIRMAR QUE O MESMO AGIU DE MA FÉ OU DOLO”. Pondera que, ao analisar o contrato social, observa-se que o instrumento foi confeccionado pelo escritório “DIEGO COTABILIDADE”, cujo responsável, naquele período, era o contador Luiz Alberto Dondo Gonçalves, não tendo qualquer grafia ou elaboração por parte do apelante, nem mesmo fornecimento da etiqueta do CRC, documento exigido à época. Afirma, nesse contexto, que desconhece o contrato social, os sócios, os seus termos, o advogado subscritor e o extrato do cadastro na SEFAZ sem qualquer critério legal, que inseriu seu nome como contador responsável. Ressalta que por essa razão a defesa insistiu reiteradas vezes pela realização de perícia técnica para apurar os fatos. Afiança a ausência de fundamentação da sentença, pois o seu irmão foi absolvido por não constar seu nome no extrato, enquanto a parte apelante foi condenada somente por tal motivo. Destaca, quando ao mérito, que os atos que lhe são imputados constituem mera irregularidade formal, passível de nulidade tão somente quando lesivo ao erário público, não evidenciada na hipótese. Posiciona, ademais, que não há dolo comprovado, pois não recebeu, pagou, assinou, utilizou, deu manutenção ao ato. Afirma que a pessoa que utilizou apenas colocou o nome em um cheque e cometeu os desvios, sem nenhuma participação sua. Consigna, à vista disso, que a única evidência concreta é que terceiros utilizaram o nome da empresa e cometeram ilícitos sem conluio ou participação da parte apelante. Por essa razão, requer “a total procedência do recurso para reformar a decisão recorrida e determinar a absolvição do apelante” (ID. 278677970). O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, em suas razões, afirma que as provas constantes dos autos evidenciam a participação e o dolo do requerido JOSÉ QUIRINO PEREIRA. Nesse viés, argumenta que em diligências administrativas, não foi possível localizar a empresa A. CABERLIN PUBLICIDADE E EVENTOS, apenas a empresa CENTRO OESTE MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO, cujo nome fantasia é A. CABERLIN. Aponta que o proprietário da referida empresa, ao ser ouvido no curso da investigação extrajudicial, declarou que os atos de constituição da empresa e da filial eram de responsabilidade dos contatores JOEL e JOSÉ QUIRINO. Acrescenta, a esse respeito, que como profissionais experientes e habilitados na área contábil é impossível alegar desconhecimento a respeito das flagrantes irregularidades em relação à empresa A. CABERLIN PUBLICIDADE E EVENTOS. Esclarece que ao elaborarem e analisarem documentos de uma empresa manifestamente inexistente, os contadores afiram com plena consciência da ilicitude de suas condutas, contribuindo deliberadamente para a consumação do ato ilícito. Reporta, outrossim, que no grupo formado na Assembleia Legislativa para forjar empresas e burlar licitações com desvios de dinheiro público, somente JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA possuíam a expertise para burlar toda a burocracia da criação de uma empresa fantasma, o que leva, obrigatoriamente, a concluir que o resultado não ocorreria como de fato aconteceu sem a participação efetiva deles. Ao discorrer sobre isso, acrescenta que diferentemente da conclusão sentencial, o pedido inicial foi instruído com vários materiais encontrados na empresa dos contadores e na residência do apelado, que somados às provas testemunhais e ao depoimento do colaborador JOSÉ GERALDO RIVA, confirmam a sua participação decisiva no esquema criminoso como criador da empresa fantasma. Enuncia, ainda, que “não bastasse os documentos apreendidos de posse do apelado fazer provas contra eles, o vínculo indissolúvel entre esses contadores e os agentes públicos responsáveis por providenciar e efetuar os pagamentos ilícitos, HUMBERTO BOSAIPO e Nivaldo, são confirmados nas declarações, da testemunha Edil Dias Corrêa, ouvida no Processo n.0009890.13.2007.811.0041”. Expõe, em destaque final, que os referidos contadores foram condenados nos autos n.° 4404-47.2007.811.0041, 3668-63.2006.8.11.0041, 45255-75.2007.8.11.0041 e 4135-42.2006.8.11.0041, pela participação no mesmo esquema ilícito. Com base nesses fundamentos, requer “seja conhecido e PROVIDO o presente recurso de Apelação para o fim de reformar a respeitável sentença, com o fito de condenar o apelado JOSÉ QUIRINO PEREIRA às sanções da Lei de Improbidade Administrativa (Lei n.º 8.429/92) pelas práticas descritas na inicial” (ID. 278677974). Nas contrarrazões, o Parquet defende que está comprovada, de forma inequívoca, a existência de esquema de corrupção da qual os apelantes participavam, pugnando, por essa razão, pelo não provimento dos recursos interpostos (ID. 278677981). JOSÉ QUIRINO PEREIRA, ao contrarrazoar o apelo ministerial, reprisa ipsis literis as razões de apelação apresentadas por JOEL QUIRINO PEREIRA, postulando, com esses argumentos, pela manutenção da sentença de absolvição (ID. 278677983). A Procuradoria-Geral de Justiça opina “pelo desprovimento dos apelos manejados por Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira e provimento do recurso interposto pelo Ministério Público” (ID. 284030887). É o relatório. V O T O EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO (RELATORA): Egrégia Câmara: Como relatado, trata-se de RECURSOS DE APELAÇÃO, interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO e por HUMBERTO MELO BOSAIPO e JOEL QUIRINO PEREIRA, contra a sentença proferida pela Excelentíssima Juíza de Direito, Dra. Célia Regina Vidotti, nos autos de n.° 0001868-29.2008.811.0041, em trâmite perante a Vara Especializada em Ações Coletivas da Comarca de Cuiabá, MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais. Extrai-se do processado que o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO ajuizou “AÇÃO CIVIL DE RESSARCIMENTO DE DANOS AO ERÁRIO” em desfavor de JOSÉ GERALDO RIVA, HUMBERTO MELO BOSAIPO, GERALDO LAURO, NIVALDO DE ARAÚJO, JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA, visando a condenação de ressarcimento dos danos causados ao erário, no valor de R$ 1.819.430,80 (um milhão e oitocentos e dezenove mil e quatrocentos e trinta reais e oitenta centavos). De acordo com o narrado na petição inicial, após investigações iniciadas a partir da operação “Arca de Noé”, constatou-se que os requeridos JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO, então gestores da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso, desviaram R$ 1.819.430,80, mediante cheques nominais à empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, criada de forma fraudulenta para justificar a emissão de cheques, atos para os quais colaboraram GERALDO LAURO e NIVALDO DE ARAÚJO, ocupantes de cargos nos setores de finanças, patrimônio e licitação da Assembleia, além de JOEL QUIRINO PEREIRA e JOSÉ QUIRINO PEREIRA, que embora não ocupassem cargos públicos, agiram em concurso com os demais, sendo responsáveis pela criação e utilização de empresas inexistentes. Citados, NIVALDO DE ARAÚJO, GERALDO LAURO, HUMBERTO MELO BOSAIPO apresentaram contestação (ID 278677091 – pág. 15/27, ID. 278677094 – pág. 44/78 e ID. 278677097 – pág. 123/131), JOEL QUIRINO PEREIRA e JOSÉ QUIRINO PEREIRA, a despeito da citação regular, não apresentaram defesa (ID. 278677866) e JOSÉ GERALDO RIVA compareceu espontaneamente aos autos e ofereceu contestação (ID. 278677094 – pág. 44/78), impugnadas pelo Parquet nos IDs. 278677099 - pág. 285/287 e 278677850 - pág. 02/20). Diante do falecimento de NIVALDO DE ARAÚJO, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO requereu a desistência da ação com a extinção do processo em relação a ele (ID. 278677099 – pág. 144/148), homologada pela decisão de ID. 278677099 – pág. 278/281. No curso da instrução, JOSÉ GERALDO RIVA noticiou a celebração de “Acordo de Colaboração Premiada” firmado com o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO e homologado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, ocasião na qual retificou a sua defesa e reconheceu a procedência dos pedidos (ID. 278677850 – pág. 70). Posteriormente, o Parquet pugnou pelo compartilhamento do acordo de colaboração premiada em relação aos fatos narrados na ação, com a juntada dos documentos que a instruem (ID. 278677851 – pag. 05/07 e pág. 14/68, ID. 278677852, 278677853 – pág. 01/87 e 278677856). Sobre os documentos colacionados, manifestaram-se JOEL QUIRINO PEREIRA, JOSÉ QUIRINO PEREIRA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677853 – pág. 91/144 e ID. 278677862). Saneado o processo (ID. 278677867), admitiu-se a prova emprestada (ID. 278677882, ID. 278677894 e ID. 278677895/278677903), além do depoimento pessoal dos requeridos (ID. 278677912 e ID. 278677913). Encerrada a instrução processual, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (ID. 278677925), HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677931), JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA (ID. 278677935) apresentaram memoriais. GERALDO LAURO celebrou Acordo de Não Persecução Cível com o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO (ID. 278677952), homologado pela sentença de ID. 278677953. Sobreveio, então, a sentença, já transcrita no relatório, que julgou improcedentes os pedidos em relação a JOSÉ QUIRINO PEREIRA e parcialmente procedentes quanto aos demais requeridos. Com essas considerações, passo à análise das insurgências recursais. DO PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA De proêmio, aponta-se que JOEL QUIRINO PEREIRA solicitou a concessão dos benefícios da justiça gratuita, uma vez que o pagamento do preparo constitui requisito de admissibilidade do recurso. À vista disso, a concessão ou não da assistência judiciária gratuita deve ser ponderada em cada caso específico, em conformidade com os elementos existentes no processo e com amparo no Código de Processo Civil e na Constituição Federal, que objetivam a facilitação do acesso à justiça. Os artigos 98 e 99, do Código de Processo Civil assim dispõem: “Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei. § 1º A gratuidade da justiça compreende: I - as taxas ou as custas judiciais; II - os selos postais; III - as despesas com publicação na imprensa oficial, dispensando-se a publicação em outros meios; IV - a indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá do empregador salário integral, como se em serviço estivesse; V - as despesas com a realização de exame de código genético - DNA e de outros exames considerados essenciais; VI - os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira; VII - o custo com a elaboração de memória de cálculo, quando exigida para instauração da execução; VIII - os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, para propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório; IX - os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido. § 2º A concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência. § 3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. § 4º A concessão de gratuidade não afasta o dever de o beneficiário pagar, ao final, as multas processuais que lhe sejam impostas. § 5º A gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou consistir na redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. § 6º Conforme o caso, o juiz poderá conceder direito ao parcelamento de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. § 7º Aplica-se o disposto no art. 95, §§ 3º a 5º , ao custeio dos emolumentos previstos no § 1º, inciso IX, do presente artigo, observada a tabela e as condições da lei estadual ou distrital respectiva. § 8º Na hipótese do § 1º, inciso IX, havendo dúvida fundada quanto ao preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade, o notário ou registrador, após praticar o ato, pode requerer, ao juízo competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento de que trata o § 6º deste artigo, caso em que o beneficiário será citado para, em 15 (quinze) dias, manifestar-se sobre esse requerimento. Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso. § 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso. § 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos. § 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. § 4º A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça. § 5º Na hipótese do § 4º, o recurso que verse exclusivamente sobre valor de honorários de sucumbência fixados em favor do advogado de beneficiário estará sujeito a preparo, salvo se o próprio advogado demonstrar que tem direito à gratuidade. § 6º O direito à gratuidade da justiça é pessoal, não se estendendo a litisconsorte ou a sucessor do beneficiário, salvo requerimento e deferimento expressos. § 7º Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento”. (grifo nosso). Na mesma vertente, o inciso LXXIV, do artigo 5.º, da Constituição Federal, disciplina em seu texto legal que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. Sob esse aspecto, cabe ao julgador formular o seu entendimento a respeito da questão, para que a aplicação indiscriminada da norma benéfica não desvirtue sua finalidade, que é garantir o acesso à justiça àqueles que, de fato, necessitam do benefício. In casu, de acordo com o despacho lançado no ID. 284903851, a parte apelante foi intimada para comprovar a alegada incapacidade financeira e, na manifestação de ID. 287346364, instruída com documentos, cumpriu a exigência legal. Sendo assim, presentes os requisitos, DEFIRO, ao apelante JOEL QUIRINO PEREIRA, os benefícios da justiça gratuita na seara recursal. DA PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO No recurso de apelação interposto por JOEL QUIRINO PEREIRA e nas contrarrazões de JOSÉ QUIRINO PEREIRA, as partes suscitam a ausência de fundamentação, postulando pela declaração de nulidade da sentença. Como se sabe, o artigo 489, § 1°, do CPC, dispõe que não se considera fundamentada qualquer decisão judicial que: “Art. 489. São elementos essenciais da sentença: [...] § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. § 2º No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão. § 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé”. Na hipótese, a despeito do que argumenta a parte apelante, constata-se que a magistrada a quo expôs os motivos pelos quais julgou parcialmente procedente a ação, analisando o acervo probatório com o devido embasamento de sua decisão em dispositivos de lei e jurisprudência aplicáveis à espécie. Ademais, conforme vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça: “O art. 489 do Código de Processo Civil de 2015 impõe a necessidade de enfrentamento dos argumentos que possuam aptidão, em tese, para infirmar a fundamentação do julgado, não estando o julgador obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão”(AgInt no REsp 1662345 / RJ, Relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, Data do Julgamento: 13/06/2017). Nesse sentido: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – PRELIMINARES DE CERCEAMENTO DE DEFESA E NULIDADE DE SENTENÇA REJEITADAS – PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA ACOLHIDAS – DOAÇÃO DE BEM IMÓVEL PÚBLICO A PARTICULAR – DISPENSA INDEVIDA DE PROCEDIMENTO LICITATÓRIO – AUSÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO – CONDUTAS DOS ARTIGOS 10 E 11 DA LIA – TEMA 1.199/STF – APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.230/21 AOS PROCESSOS EM TRÂMITE – DOLO ESPECÍFICO – NÃO COMPROVADO – AUSÊNCIA DE PERDA PATRIMONIAL EFETIVA – ATOS DE IMPROBIDADE NÃO CARACTERIZADOS – SENTENÇA REFORMADA – IMPROCEDÊNCIA DO PLEITO INICIAL – RECURSOS CONHECIDOS E PROVIDOS. 1. Não configura cerceamento de defesa o julgamento da causa sem a produção de prova quando o tribunal de origem considerar substancialmente instruído o feito, declarando a existência de provas suficientes para seu convencimento. 2. “Não há se falar em nulidade da sentença, por ausência de fundamentação, se o magistrado exarou motivação suficiente para justificar sua convicção, assente na realidade dos autos, atendendo ao disposto no artigo 458 CPC/73 (489 do CPC/15).” (N.U 1006405-70.2016.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 07/12/2021, Publicado no DJE 14/12/2021). 3. Nos termos do art. 29, VIII da CF e do tema 469/STF, deve ser acolhida a ilegitimidade passiva dos ex-vereadores, pois “nos limites da circunscrição do município e havendo pertinência com o exercício do mandato, garante-se a imunidade ao vereador“. 4. No julgamento do ARE 843.989/PR, afetado como representativo de controvérsia (Tema 1.199), o STF adotou o entendimento de que as alterações promovidas pela Lei nº 14.230/2021 devem ser aplicadas às causas sem trânsito em julgado. 2. Quanto ao dolo específico, a nova redação do artigo 1º, §§ 1º e 2° da Lei de Improbidade Administrativa estabelece que, para a configuração do ato ímprobo, é necessária a comprovação da vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado. 3. A inobservância do ditame legal quanto à dispensa de licitação para doação de bem público, por si só, não caracteriza o ato ímprobo, se não restaram comprovados o elemento subjetivo – dolo específico – dos agentes e a perda patrimonial efetiva, a teor do que dispõe a nova redação dada aos artigos 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992. 4. Recursos conhecidos e providos”. (N.U 0007436-93.2015.8.11.0004, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, EDSON DIAS REIS, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 21/03/2023, Publicado no DJE 10/04/2023). (Grifo nosso). "RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANOS AMBIENTAIS – DESMATAMENTO IRREGULAR – ÁREA DE RESERVA LEGAL E PRESERVAÇÃO PERMANENTE – PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO E CERCEAMENTO DE DEFESA – REJEITADAS – MÉRITO – ALEGAÇÃO DA NECESSIDADE DA PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL OFICIAL – DESNECESSIDADE - EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS PROBANTES NOS AUTOS – MANUTENÇÃO DA MULTA COMINATÓRIA – RECURSO DESPROVIDO. 1 - O art. 489 do Código de Processo Civil de 2015 impõe a necessidade de enfrentamento dos argumentos que possuam aptidão, em tese, para infirmar a fundamentação do julgado, não estando o julgador obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão” (AgInt no REsp 1662345 / RJ, Relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, Data do Julgamento: 13/06/2017). 2 - Não configura cerceamento de defesa o julgamento da causa sem a produção de prova pericial, quando juiz considerar substancialmente instruído o feito, declarando a existência de provas suficientes para seu convencimento. 3 – Verificando razoável a multa cominatória aplicada, não há que se falar em minoração, tendo-se em vista que a finalidade da multa consiste justamente em coibir o descumprimento das obrigações impostas”. (N.U 0004902-28.2010.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 07/03/2023, Publicado no DJE 04/04/2023). (Grifo nosso). “APELAÇÃO CÍVEL RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA – PRELIMINAR NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO – REQUISITOS DO ART. 489 DO CPC OBSERVADOS – PRELIMINAR REJEITADA – MULTA APLICADA PELO PROCON – TEMPO DE ESPERA NA FILA DE AGÊNCIA BANCÁRIA - INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI MUNICIPAL – ASSUNTO DE INTERESSE LOCAL – COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DO MUNICÍPIO – PRECEDENTE DO STF – MULTA EXORBITANTE - VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE NÃO CONFIGURADO – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. Não há se falar em nulidade da sentença, por ausência de fundamentação, se o magistrado exarou motivação suficiente para justificar sua convicção, assente na realidade dos autos, atendendo ao disposto no artigo 458 CPC/73 (489 do CPC/15). O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que os municípios detêm competência legislativa para dispor sobre segurança, rapidez e conforto no atendimento de usuários de serviços bancários, como no caso concreto, por serem tais matérias assuntos de interesse local (RE 610221 RG). Quanto à verificação do acerto ou desacerto da aplicação de multa pelo PROCON, não cabe ao Judiciário rever o mérito dos atos administrativos, mas apenas verificar se foram observados os procedimentos e as normas legais. A graduação da multa administrativa pela não observância ao CDC e às Leis Estaduais e Decreto Federal, se mostra adequada, em especial, gravidade das irregularidades, à luz do art. 57 da legislação consumerista. Não há falar-se em ilegalidade no Processo Administrativo, quando oportunizado à parte a ampla defesa e o contraditório, anterior à aplicação da pena de multa pelo PROCON Municipal, garantindo-se, assim, o devido processo legal. Nos termos do art. 85, §11º, do CPC, ao julgar o recurso, o Tribunal deve majorar a verba honorária anteriormente fixada, levando-se em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, não ultrapassando o percentual máximo disposto nos §§ 2º e 3º, do art. 85, do CPC”. (N.U 1006405-70.2016.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 07/12/2021, Publicado no DJE 14/12/2021). (Grifo nosso). Assim, não se vislumbra a alegada fundamentação insuficiente, apta a macular o decisum. DO MÉRITO Quanto aos recursos propriamente ditos, salienta-se que os pedidos de ressarcimento, fundados no artigo 37, § 5°, da Constituição da República, reclamam o reconhecimento de ato de improbidade doloso como causa do prejuízo alegado, conforme definido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Leading Case n.° 852475 (Tema n.° 897), no qual fixou a tese no sentido de que: “São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa”. A partir do tema supratranscrito, vê-se que o pedido de ressarcimento ao erário, conquanto imprescritível, subordina-se à prévia análise da ocorrência, ou não, do ato de improbidade administrativa e o elemento subjetivo doloso, ainda que inaplicáveis, por efeitos temporais, as demais sanções previstas na Lei n.° 8.429/92. Como cediço, a Lei n.° 14.230/2021 modificou diversos dispositivos da Lei de Improbidade Administrativa, incluindo, expressamente, os princípios do Direito Administrativo Sancionador, no artigo 1°, § 4°, da Lei n.° 8.429/92, in verbis: “Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (...) § 4º Aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador”. Além disso, a novel legislação passou a exigir o dolo específico para a configuração dos atos de improbidade, revogando expressamente as disposições que admitiam a condenação, às condutas que causam prejuízo ao erário, com base na culpa. Veja-se: “Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) Parágrafo único. (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) § 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) § 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. (...) Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)”. (Grifo nosso). Por se tratar de desmembramento do direito sancionador penal, os mesmos princípios e garantias a ele assegurados, tais como os princípios da legalidade, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, da segurança jurídica, da retroatividade da lei benéfica, da individualização da pena, além da razoabilidade e da proporcionalidade, devem ser observados na esfera administrativa. Dentre os princípios mencionados, sobreleva-se o da retroatividade da norma mais benéfica, previsto no artigo 5°, inciso XL, da Constituição da República. Veja-se: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”. Nessa toada, a retroatividade da lei benigna insere-se em princípio constitucional com aplicabilidade para todo o exercício do jus puniendi estatal, nele inserido a improbidade administrativa. Igualmente, convém relembrar que o artigo 9°, do Pacto de San José da Costa Rica, ratificado pelo Brasil com status supralegal, ao replicar o princípio da retroatividade da lei mais benéfica, não o cingiu à norma penal, sendo, portanto, aplicável ao direito sancionador como um todo. Transcrevo: “Ninguém pode ser condenado por ações ou omissões que, no momento em que forem cometidas, não sejam delituosas, de acordo com o direito aplicável. Tampouco se pode impor pena mais grave que a aplicável no momento da perpetração do delito.Se depois da perpetração do delito a lei dispuser a imposição de pena mais leve, o delinqüente será por isso beneficiado”. A propósito, a celeuma quanto à aplicação do princípio da retroatividade, alcançando fatos e atos praticados sob a vigência do texto que precede a reforma, chegou ao colendo Supremo Tribunal Federal que, no julgamento do ARE 843.989, reconheceu a Repercussão Geral (Tema n.° 1.199), fixou a seguinte tese: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei". (ARE 843989, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-251 DIVULG 09-12-2022 PUBLIC 12-12-2022). (Grifo nosso). À vista disso, a despeito do entendimento quanto à irretroatividade da nova lei quanto à prescrição e às demandas já transitadas em julgado, o STF ressalvou a sua retroação benéfica em relação à revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, enfatizando a necessidade de comprovação da responsabilidade subjetiva – dolo – a todos os atos tipificados nos artigos 9°, 10 e 11, da Lei 8.429/92, nas ações pendentes de julgamento. Avançando sobre os atos imputados aos apelados, o pedido de ressarcimento passa pela fundamental demonstração de prejuízo ao erário em decorrência de ato doloso. Nesse contexto, considerando a confluência entre os fatos e fundamentos relacionados aos recursos interpostos por JOEL QUIRINO PEREIRA, HUMBERTO MELO BOSAIPO e MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, ambos os apelos estão sendo apreciados conjuntamente. É inegável que a demonstração do dolo, em operações ímprobas, é matéria deveras dificultosa, dada a natureza oculta das práticas ilícitas e as sofisticadas estratégias de dissimulação comumente empresadas. Assim, o elemento subjetivo pode ser inferido de forma indireta, a partir dos elementos objetivos, ou seja, a partir do comportamento objetivo do agente público. Com base nisso, o exame das provas constantes do processado, diferentemente do que defendem os apelantes, revela, com segurança jurídica e densidade probatória suficiente, a presença dos elementos caracterizadores do ato de improbidade administrativa e, consequentemente, do dever de ressarcir ao erário. Os documentos colacionados aos autos, especialmente os cheques assinados pessoalmente por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, sem qualquer lastro documental comprobatório de entrega de bens ou serviços configuram, de início, um forte indicativo de ciência e vontade de participação no esquema fraudulento, além de evidenciar a materialidade dos fatos. Confira-se: “Cheque n.º 010112, no valor de R$72.000,00 (setenta e dois mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 39); Cheque n.º 010611, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 41); Cheque n.º 010702, no valor de R$52.000,00 (cinquenta e dois mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 43); Cheque n.º 011210, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 45); Cheque n.º 011310, no valor de R$46.000,00 (quarenta e seis mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 47); Cheque n.º 011473, no valor de R$65.300,00 (sessenta e cinco mil e trezentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 48); Cheque n.º 010374, no valor de R$72.500,00 (setenta e dois mil e quinhentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 50); Cheque n.º 011815, no valor de R$74.350,00 (setenta e quatro mil e trezentos e cinquenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 52); Cheque n.º 010720, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 54); Cheque n.º 012147, no valor de R$69.526,00 (sessenta e nove mil e quinhentos e vinte e seis reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 56); Cheque n.º 010919, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 58); Cheque n.º 011980, no valor de R$55.000,00 (cinquenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 60); Cheque n.º 012516, no valor de R$52.350,00 (cinquenta e dois mil e trezentos e cinquenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 62); Cheque n.º 012753, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 64); Cheque n.º 012610, no valor de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 66); Cheque n.º 010727, no valor de R$45.000,00 (cinquenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 68); Cheque n.º 013053, no valor de R$48.500,00 (quarenta e oito mil e quinhentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 70); Cheque n.º 013228, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 72); Cheque n.º 013963, no valor de R$40.000,00 (quarenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 74); Cheque n.º 014074, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 76); Cheque n.º 014416, no valor de R$51.434,80 (cinquenta e um mil e quatrocentos e trinta e quatro reais, oitenta centavos), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 78); Cheque n.º 014561, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 80); Cheque n.º 012828, no valor de R$71.500,00 (setenta e um mil e quinhentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 82); Cheque n.º 015029, no valor de R$62.350,00 (sessenta e dois mil e trezentos e cinquenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 84); Cheque n.º 016093, no valor de R$67.410,00 (sessenta e sete mil e quatrocentos e dez reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 88); Cheque n.º 016116, no valor de R$35.680,00 (trinta e cinco mil e seiscentos e oitenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 89); Cheque n.º 015478, no valor de R$42.560,00 (quarenta e dois mil e quinhentos e sessenta reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 90); Cheque n.º 016355, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 91); Cheque n.º 016038, no valor de R$67.800,00 (sessenta e sete mil e oitocentos reais), assinado por JOSÉ GERALDO RIVA e HUMBERTO MELO BOSAIPO (ID. 278677081 – pág. 93)”. As diligências empreendidas na fase investigativa, por sua vez, revelam que o CNPJ pertencente à empresa A. Caberlin – Centro Oeste Materiais para Construções foi manipulado e utilizado para constituir uma empresa fictícia. O sócio formal da empresa real, Sr. Ademir Caberlin, foi enfático ao afirmar que jamais autorizou a abertura de outra pessoa jurídica, tampouco teve qualquer ciência ou participação em processos licitatórios na esfera estadual. Isso reforça que o uso de sua inscrição e dados ocorreu de maneira absolutamente fraudulenta, com o fim específico de dar aparência de legalidade a transações que, em verdade, jamais representaram qualquer prestação de serviço à administração pública. Alinha-se, a isso, a delação premiada de JOSÉ GERALDO RIVA, devidamente homologada e admitida como prova nos autos, que reforça a conclusão quanto à consciência e voluntariedade da conduta dos apelantes, formando um conjunto harmônico e coerente com as provas, especificamente os cheques, as informações de inatividade da empresa e a ausência de notas fiscais. Para mais, há trecho inequívoco da fala do colaborador, que imputa a HUMBERTO MELO BOSAIPO a participação direta na constituição de empresa de fachada e na manipulação de cheques sem qualquer contrapartida de serviço ou produto. Veja-se (ID. 278677856): “(22:19): “A situação dos saques, ela nunca foi efetivada por nenhuma das empresas, até porque as empresas, eram empresas criadas de forma fraudulenta ou em um determinado momento, como eu já disse, sequer criadas. E esse processo de criação das empresas, ele foi relatado pelo senhor Humberto Bosaipo à época. É... até porque eu não conhecia esse pessoal, que não eram aqui de Cuiabá, alguns deles trabalharam...em... em Barão de Melgaço, pelos...pelos Quirinos, pelo senhor Luiz Dondo, pelo senhor Nivaldo de Araújo e.... à época, a alegação era de que a Confiança Factoring, através do senhor Nilson Teixeira e do senhor João Arcanjo, tinha pleno conhecimento. E em alguns casos até contribuíram. Eu tenho até um caso em que entraram numa... numa... numa ação contra, contra mim e o deputado Bosaipo pedindo indenização, em que a pessoa alega que pegou os documentos lá na Confiança e entregou os documentos na mão dos contadores para que fosse criada as empresas, algumas empresas eram simplesmente dado manutenção de empresas velhas já. Fazia, inclusive, a alteração do ramo de atividade. Outras empresas eram criadas e outras, como eu disse pra vossa excelência, e reafirmo aqui, eram empresas que sequer existiam. Procedimento nenhum era feito, era feito uma relação de cheques e nós recebíamos o pacote de cheques junto à relação e simplesmente assinávamos. A Confiança Factoring, como eu disse, é... recebeu aproximadamente 20 (vinte) e poucos milhões desses valores, sem precisar que haviam 22 (vinte e duas) promissórias de R$ 700.000,00 (setecentos mil) que foram pagos mensalmente, por mim e pelo deputado Humberto Bosaipo e também eram utilizados recursos, às vezes, para campanha eleitoral, para eleições de mesa, e as vezes até para uma questão particular de deputado (...).” Sobre a colaboração premiada, não obstante os argumentos defensivos que buscam afastar sua legitimidade, perfaz curial salientar que embora não constitua prova isolada suficiente para a condenação, possui natureza de meio de prova validamente admissível, sobretudo quando corroborada por outros elementos probatórios. A propósito, no pertinente à sua utilização no âmbito da Ação civil pública, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n.° 1175650/PR (Tema n.° 1.0433), pacificou o entendimento de que é constitucional a sua admissão na ação de improbidade administrativa, observado, dentre outras diretrizes, a necessidade de estar acompanhada de outras provas: “CONSTITUCIONAL. UTILIZAÇÃO DO ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA (LEI 12.850/2013) NO ÂMBITO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LEI 8.429/1992) . POSSIBILIDADE. DECLARAÇÕES DO AGENTE COLABORADOR COMO ÚNICA PROVA. INSUFICIÊNCIA PARA O INÍCIO DA AÇÃO POR ATO DE IMPROBIDADE. OBRIGAÇÃO DE RESSARCIMENTO INTEGRAL AO ERÁRIO . TRANSAÇÃO APENAS EM TORNO DO MODO E DAS CONDIÇÕES PARA A INDENIZAÇÃO. LEGITIMIDADE PARA CELEBRAÇÃO DO ACORDO. MINISTÉRIO PÚBLICO COM A INTERVENIÊNCIA DA PESSOA JURÍDICA INTERESSADA. 1 . O aperfeiçoamento do combate à corrupção no serviço público foi uma grande preocupação do legislador constituinte, ao estabelecer, no art. 37 da Constituição Federal, verdadeiros códigos de conduta à Administração Pública e aos seus agentes, prevendo, inclusive, pela primeira vez no texto constitucional, a possibilidade de responsabilização e aplicação de graves sanções pela prática de atos de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da CF). 2 . A Constituição de 1988 privilegiou o combate à improbidade administrativa, para evitar que os agentes públicos atuem em detrimento do Estado, pois, como já salientava Platão, na clássica obra REPÚBLICA, a punição e o afastamento da vida pública dos agentes corruptos pretendem fixar uma regra proibitiva para que os servidores públicos não se deixem induzir por preço nenhum a agir em detrimento dos interesses do Estado. 3. O combate à corrupção, à ilegalidade e à imoralidade no seio do Poder Público, com graves reflexos na carência de recursos para implementação de políticas públicas de qualidade, deve ser prioridade absoluta no âmbito de todos os órgãos constitucionalmente institucionalizados. 4 . Exatamente, em respeito à finalidade de garantir a eficácia no combate à improbidade administrativa, a LIA deve ser interpretada no contexto da evolução do microssistema legal de proteção ao patrimônio público e de combate à corrupção e com absoluta observância ao princípio constitucional da eficiência, consagrado no caput do art. 37 da Constituição Federal e que impõe a todos os agentes públicos, inclusive aos membros do Ministério Público e magistrados, o dever de sempre verificar a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, eficaz, sem burocracia, buscando qualidade, primando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para a melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar desperdícios e a garantir uma maior rentabilidade social do exercício da jurisdição, da efetiva prestação jurisdicional. 5. Assim como a Lei Federal 8 .429/1992 visou ao aperfeiçoamento do combate à corrupção no serviço público, no mesmo momento histórico, na esfera penal, encontram-se notáveis esforços do legislador brasileiro dirigidos ao enfrentamento de tais condutas, como lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, falsidades documentais, e outros delitos contra a Administração Pública, notadamente quando praticados por meio de organização criminosa. Nesse contexto, incorporou-se ao ordenamento brasileiro, por meio da edição de diversas leis, o instituto da delação premiada, posteriormente renomeada para colaboração premiada. 6. Importante realçar que o legislador brasileiro, quando editou a Lei 12 .850/2013, pela qual se estabeleceu o conceito de organização criminosa, dispôs que não é qualquer delação que permitirá o benefício de redução da pena ou de perdão judicial, mas somente aquela que produzir os resultados previstos nos incisos do artigo 4º da norma. Importante, ainda, salientar, a respeito da Lei 12.850/2013, que o inciso I do art. 3º do capítulo II estatui ser a colaboração premiada meio de obtenção de prova . Essa natureza jurídica específica é importante para diferenciar a colaboração premiada das hipóteses de justiça consensual ou negocial, como por exemplo a transação penal e o próprio acordo de não persecução, que com ela não se confunde. Em voto na PET 7074-QO/DF, destaquei que o instituto possui natureza jurídica de meio de obtenção de prova, cujo resultado poderá beneficiar o agente colaborador/delator desde que adimplidas as obrigações por ele assumidas e que advenha um ou mais dos resultados indicados na lei, favoráveis à repressão ou prevenção das infrações. 7. Assim, a colaboração premiada, que pode infundir no ânimo do colaborador o desejo de contribuir para a comprovação da materialidade e autoria do delito, mostra-se como valioso instrumento a ser utilizado, também, em instâncias outras, diversas da penal, em especial, quando envolvido o interesse público e o combate à corrupção . 8. O microssistema legal de combate à corrupção, a partir de 1992, evoluiu, de forma clara, específica e objetiva, no sentido de propiciar meios facilitadores à repressão e à prevenção de ilícitos, sobretudo quando ofensivos a interesses supraindividuais e preordenados a causar dano ao patrimônio público. 9. Notadamente, no caso sob exame, em que envolvidas mais de 24 pessoas físicas e jurídicas organizadas em complexa estrutura criminosa e com o objetivo comum de obter vantagem patrimonial, por meio de ajustes de corrupção com grandes empresários sujeitos à fiscalização tributária, revelados na denominada Operação Publicano, a utilização do acordo de colaboração premiada mostra-se de grande valia para se obterem as provas necessárias à comprovação dos delitos e o desbaratamento da organização criminosa . 10. A lesão ao erário causa graves reflexos na carência de recursos para implementação de políticas públicas de qualidade. Não por outra razão é que a reparação integral do dano ao patrimônio público, além de figurar no rol das sanções estabelecidas no art. 12 da Lei 8 .429/1992, também é consequência civil do ato ilícito. Reafirma ainda esse entendimento o teor do parágrafo 2º do art. 17 da LIA, que se manteve inalterado mesmo com a edição da Lei 13.964/2019, onde se lê que A Fazenda Pública, quando for o caso, promoverá as ações necessárias à complementação do ressarcimento do patrimônio público . Assim, não há como transigir a respeito dessa obrigação, consentindo com sua inserção entre os benefícios a serem estendidos àquele que colabora com as investigações no contexto da ação de improbidade decorrente do dano causado. Assim sendo, o acordo de colaboração poderá ser homologado pelo juiz, desde que não isente o colaborador de ressarcir os danos causados, ainda que a forma de como se dará a indenização possa ser objeto de negociação. 11. Outra importante questão diz respeito à colaboração premiada no âmbito civil, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público, em face da legitimidade concorrente para a propositura da ação . 12. O art. 17-A, que seria acrescido à Lei 8.429/1992 pela Lei 13 .964/2019, foi totalmente vetado pelo Presidente da República. Assim, em face do veto aposto ao art. 17-A, que não foi derrubado pelo Congresso Nacional, tem-se que eventuais acordos de colaboração premiada, para serem utilizados em ação civil pública por ato de improbidade administrativa, devem contar com a participação do Ministério Público e da pessoa jurídica de direito público interessada, porém, como interveniente. O posicionamento do interveniente não impedirá a celebração da colaboração premiada pelo Ministério Público, porém deverá ser observada e analisada pelo magistrado no momento de sua homologação . 13. No caso concreto, o Ministério Público do Estado do Paraná propôs ação civil pública por ato de improbidade administrativa em face do ora recorrente e de mais 24 pessoas físicas e jurídicas em razão de fatos revelados na denominada Operação Publicano. Pediu, liminarmente, a indisponibilidade de valores e de bens móveis e imóveis dos demandados; e, ao final, a imposição das sanções previstas na Lei 8.429/1992 ( Lei de Improbidade Administrativa – LIA) . Entretanto, em relação a alguns réus, requereu apenas o reconhecimento de que praticaram atos de improbidade, sem a imposição das penalidades correspondentes, em razão do acordo de colaboração premiada que foi firmado com as referidas pessoas, valendo-se do instrumento previsto nas disposições do art. 4º, § 4º, da Lei 12.850/2013, c/c os arts. 16 e 17 da Lei 12 .846/2013. 14. O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná confirmou a decisão do magistrado de 1ª instância que decretara a indisponibilidade dos bens de vários réus, entre os quais o ora recorrente. A Corte reputou válido o acordo de colaboração premiada no âmbito da ação de improbidade; e assentou que a decretação da indisponibilidade de bens do agravante se deu nos termos do art . 7º e parágrafo único da Lei 8.429/1992. 15. Pelos termos dos acordos de colaboração acima transcritos, é possível extrair-se a conclusão de que, no caso concreto, os interesses dos colegitimados para ação de improbidade, embora não tenham participado da avença, estão resguardados e que eventual anulação do acordo seria mais deletéria ao interesse público do que a sua manutenção . 16. A interpretação das normas jurídicas deve sempre se pautar pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sob pena de chancelar-se situação jurídica de todo inaceitável. Não é demais advertir que, quando do julgamento do mérito da causa, caberá ao magistrado avaliar se a delação mostra-se consentânea com as outras provas coligidas. 17 . Além disso, o Tribunal de origem, em cognição sumária, decretou a indisponibilidade dos bens do recorrente, por entender estarem presentes os requisitos previstos no art. 7º da Lei 8.429/1992 (fumus boni iuris, a plausibilidade dos fatos e fundamentos jurídicos do pedido inicial), uma vez que existem fundados indícios da prática de atos de improbidade, os quais foram extraídos das provas contidas nos autos do inquérito civil e nas medidas cautelares realizadas pelo MP. 18 . NEGADO PROVIMENTO ao Recurso Extraordinário. TESE DE REPERCUSÃO GERAL: É constitucional a utilização da colaboração premiada, nos termos da Lei 12.850/2013, no âmbito civil, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público, observando-se as seguintes diretrizes: (1) Realizado o acordo de colaboração premiada, serão remetidos ao juiz, para análise, o respectivo termo, as declarações do colaborador e cópia da investigação, devendo o juiz ouvir sigilosamente o colaborador, acompanhado de seu defensor, oportunidade em que analisará os seguintes aspectos na homologação: regularidade, legalidade e voluntariedade da manifestação de vontade, especialmente nos casos em que o colaborador está ou esteve sob efeito de medidas cautelares, nos termos dos §§ 6º e 7º do artigo 4º da referida Lei 12.850/2013 . (2) As declarações do agente colaborador, desacompanhadas de outros elementos de prova, são insuficientes para o início da ação civil por ato de improbidade; (3) A obrigação de ressarcimento do dano causado ao erário pelo agente colaborador deve ser integral, não podendo ser objeto de transação ou acordo, sendo válida a negociação em torno do modo e das condições para a indenização; (4) O acordo de colaboração deve ser celebrado pelo Ministério Público, com a interveniência da pessoa jurídica interessada e devidamente homologado pela autoridade judicial; (5) Os acordos já firmados somente pelo Ministério Público ficam preservados até a data deste julgamento, desde que haja previsão de total ressarcimento do dano, tenham sido devidamente homologados em Juízo e regularmente cumpridos pelo beneficiado". (STF - ARE: 1175650 PR, Relator.: Min. ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento: 03/07/2023, Tribunal Pleno, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 04-10-2023 PUBLIC 05-10-2023). Nessa conjuntura, além da prova documental citada anteriormente, os depoimentos testemunhais, admitidos como prova emprestada, apontam para a atuação dolosa dos apelantes. A exemplo das testemunhas Nilson Teixeira e Kátia Maria Aprá (ID. 278677895; 278677903; 278677898; 278677900), que confirmam as declarações prestadas na fase investigativa, nas quais apresentaram, minuciosamente, como era realizada a operação com o envolvimento de empresas de fachada e, inclusive, sobre os trâmites internos para a emissão de cheques. Aliás, sobre da prova emprestada, é assente o entendimento quanto à sua admissibilidade, desde que respeitado o contraditório, situação observada nos autos, porquanto as partes foram devidamente intimadas sobre cada elemento probatório juntado aos autos. Nesse sentido: “PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POPULAR. "ESCÂNDALO DOS PRECATÓRIOS". EMISSÃO DE LETRAS FINANCEIRAS DO TESOURO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (LFTSC) SUPOSTAMENTE PARA PAGAMENTO DE PRECATÓRIOS, MAS COM DESTINAÇÃO DIVERSA PARA O DINHEIRO CAPTADO . CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO CELEBRADO PELO BANCO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (BESC), SUCEDIDO PELO BANCO DO BRASIL S/A, COM O BANCO VETOR S/A, SUCEDIDO POR VETOR NEGÓCIOS E PARTICIPAÇÕES S/A. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DE ANULAÇÃO DO CONTRATO E RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO POR FERNANDO FERREIRA DE MELLO JÚNIOR . ALEGAÇÕES DE VIOLAÇÃO AOS ARTS. 125, I, 165, 301, §§ 1º A 3º, 330, 332, 420, PARÁGRAFO ÚNICO, 427, 458, II, TODOS DO CPC/73, BEM COMO AO ART. 7º, "CAPUT", E V, DA LEI 4.717/65, AO ART . 12 DA LEI 8.429/92 E AO ART. 1º DO CÓDIGO CIVIL. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO . [...] 3. O julgamento antecipado da lide não configura cerceamento de defesa e, por conseguinte, nulidade processual, se as instâncias ordinárias consideram prescindível a dilação probatória, por ser eminentemente de direito a controvérsia ou por depender sua resolução apenas do exame de fatos já documentalmente provados.Precedentes . Averiguar a necessidade de dilação probatória no caso concreto, tal como pretendido pelo recorrente, exigiria inevitável reexame de todo o substrato fáticoprobatório da causa, inviável em recurso especial nos termos da Súmula 7/STJ. Não conhecimento do recurso, no ponto, tanto por a quanto por c, do permissivo constitucional. 4. É válida a admissão ao processo de prova emprestada, desde que respeitado o contraditório na demanda em que a prova venha a ser utilizada. Precedentes. [...] (STJ - REsp: 1601868 SC 2016/0126116-9, Relator.: Ministro PAULO SÉRGIO DOMINGUES, Data de Julgamento: 13/08/2024, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/08/2024). “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO DO JUIZ CRIMINAL QUE DEFERIU O COMPARTILHAMENTO DA PROVA PRODUZIDA NO INQUÉRITO POLICIAL PARA FIM DE INSTRUÇÃO DE AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE . PRECEDENTES. CONTRADITÓRIO DIFERIDO. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS PENAL, CÍVEL E ADMINISTRATIVA. 1 . Hipótese em que o impetrante se insurge contra decisão do juiz criminal que, após homologado o arquivamento do inquérito policial, deferiu o compartilhamento das provas produzidas para fim de instrução de ação cível de improbidade administrativa. 2. "É firme o entendimento jurisprudencial deste Sodalício no sentido da possibilidade de utilização, na seara cível, para fins de apuração de improbidade administrativa, de prova produzida na esfera penal." (AgRg no REsp 1714914/RS, Rel . Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 27/02/2018, DJe 08/03/2018). 3. O uso da prova emprestada estará sujeito à efetivação do contraditório no foro em que a prova vier a ser utilizada. Precedentes . 4. Agravo interno não provido”. (STJ - AgInt no RMS: 61408 RJ 2019/0212188-0, Relator.: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 11/05/2020, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/05/2020). “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC/73 . NÃO OCORRÊNCIA. PROCESSO CRIMINAL. TRÂNSITO EM JULGADO MATERIAL. PROVA EMPRESTADA . VALIDADE. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. OBSERVÂNCIA. SÚMULA Nº 83/STJ . HOMICÍDIO. RESPONSABILIDADE INDIRETA. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7/STJ . DECISÃO MANTIDA 1. Não há afronta ao art. 535 do CPC/73 quando o Tribunal de origem manifesta-se suficientemente sobre a questão controvertida, apenas adotando fundamento diverso daquele perquirido pela parte. 2. É válida a utilização de prova emprestada, desde que observado o contraditório e ampla defesa. Precedentes do STF e do STJ. Súmula nº 83/STJ. 3. A pretensão de verificar se há responsabilidade civil indireta pelo homicídio perpetrado acerca do qual houve condenação criminal transitada em julgado somente se processa mediante o reexame do conjunto probatório carreado aos autos, o que encontra óbice na Súmula nº 7/STJ. 4. Agravo interno não provido”. (STJ - AgInt no REsp: 1426271 MT 2013/0199064-7, Relator.: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 20/08/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/08/2019). A responsabilidade do apelante HUMBERTO MELO BOSAIPO não deriva, portanto, apenas de sua posição formal no organograma da Assembleia Legislativa, mas, sobretudo, de sua atuação direta e ostensiva na cadeia de comando que operacionalizou os desvios. O ordenamento jurídico impõe, aos gestores públicos, um dever objetivo de cuidado — dever esse que não foi meramente negligenciado, mas ativamente violado. Não se trata aqui de erro ou desídia, mas de participação consciente em procedimento montado com o intuito deliberado de fraudar o erário. A assinatura reiterada de cheques, por valores expressivos, em benefício de empresa notoriamente inidônea, não permite presumir boa-fé. Ao contrário: diante da soma dos valores e da constância dos repasses, muitos dos quais fracionados em sequência, há nítido padrão de conduta dolosa. A propósito, importa registrar que esta Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo já enfrentou situação correlata, envolvendo o mesmo réu HUMBERTO MELO BOSAIPO e a mesma dinâmica de desvio sistemático de recursos públicos no contexto do denominado “mensalinho”. Naquele julgamento, de relatoria do Des. Deosdete Cruz Júnior, acompanhado à unanimidade, esta Egrégia Câmara decidiu: “DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. "MENSALINHO" NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA. DANO AO ERÁRIO E ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. RECONHECIMENTO DO DOLO ESPECÍFICO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação Cível interposta pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra sentença que julgou improcedente a Ação Civil Pública de Ressarcimento ao Erário, ajuizada contra Humberto Melo Bosaipo, visando à condenação ao ressarcimento ao erário em decorrência da prática de ato doloso de improbidade administrativa, consubstanciado no recebimento de valores ilícitos entre 2003 e 2007, enquanto exercia o mandato de deputado estadual. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar: (i) se os elementos de prova constantes dos autos são suficientes para comprovar a prática de ato doloso de improbidade administrativa pelo apelado, com consequente dano ao erário e enriquecimento ilícito; e (ii) se a robustez do conjunto probatório permite o afastamento do princípio da presunção de inocência para fins de ressarcimento ao erário. III. Razões de decidir 3. O art. 1º, § 1º, da LIA, com a redação dada pela L. 14.230/2021, exige a comprovação de dolo para a configuração do ato de improbidade administrativa, vedando a responsabilização objetiva e a presunção do elemento subjetivo. 4. A robustez do acervo probatório, integrado por depoimentos de colaboradores premiados, testemunhos em juízo e provas documentais, demonstra, de forma harmônica e segura, que o apelado participou conscientemente do esquema ilícito de repasse de valores desviados do erário, configurando o dolo específico exigido pela atual legislação. 5. A ausência de registros formais, inerente à clandestinidade das práticas ilícitas, não impede o reconhecimento da prática dolosa, uma vez que corroborada por múltiplos meios de prova válidos e idôneos. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso de apelação conhecido e provido, para reformar a sentença e julgar procedentes os pedidos iniciais, condenando Humberto Melo Bosaipo ao ressarcimento integral do dano causado ao erário, no valor de R$ 2.433.330,00, a ser corrigido monetariamente pelo IPCA-E desde a data da exigibilidade e acrescido de juros de mora a partir da citação. Tese de julgamento: " 1. Para a configuração do ato de improbidade administrativa, é imprescindível a comprovação do dolo específico, consistente na vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito, à luz da L. 8.429/1992, com as alterações da L. 14.230/2021. 2. Em esquemas de desvio de recursos públicos estruturados para dificultar a rastreabilidade, o dolo pode ser inferido a partir do contexto fático, desde que corroborado por provas robustas e contundentes". (N.U 1005368-95.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, DEOSDETE CRUZ JUNIOR, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 20/05/2025, Publicado no DJE 22/05/2025). Referido enunciado se aplica à presente hipótese, em atenção à coerência decisória que deve nortear os órgãos judicantes. A repetição do modus operandi, o protagonismo dos mesmos agentes políticos e a reprodução de idêntico padrão probatório impõem o reconhecimento da similitude entre os feitos e a manutenção do entendimento jurisprudencial já assentado por este órgão colegiado. Com relação a JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA, destaca-se que as declarações prestadas por José Geraldo Riva na colaboração premiada são coerentes e ricas em detalhes, destacando, com firmeza, que os irmãos atuavam no escritório no qual as empresas eram criadas e manipuladas, muitas vezes com fornecimentos dados pela Confiança Factoring. Veja-se (ID. 278677856): “(...) As empresas foram constituídas dentro do escritório do Dondo, os responsáveis por isso foi o Joel e o José acompanhados pelo Nivaldo Araújo, que eram pessoas de confiança do Bosaipo, já antigas no esquema. E a maior parte de documentação era arrumado pela... pelo grupo do João Arcanjo Ribeiro, especialmente o Nilson Teixeira, e os cheques eram emitidos por Luiz Eugênio de Godoy, por Guilherme Garcia, antes o Guilherme Garcia como secretário de finanças, depois o Luiz Eugênio, mas também o Senhor Guilherme Garcia na condição de secretário-geral”. Tais declarações são corroboradas pela ratificação em juízo (ID. 278677897) e depoimentos testemunhais, além dos documentos que instruem a petição inicial, relacionados às apreensões feitas no âmbito do Inquérito Policial n.° 252/03 (ID. 278677089 – pág. 108/123), especialmente nos computadores da empresa Ômega Auditoria, com diversos arquivos e documentos digitais que evidenciam a atuação dos irmãos contadores, de forma coordenada com outros integrantes do esquema, como responsáveis pela constituição da estrutura societária e contábil que possibilitou a apropriação ilícita dos recursos públicos. Dentre os documentos e arquivos localizados pelo serviço de inteligência, consta que no mesmo computador no qual estava salvo o curriculum de JOSÉ QUIRINO PEREIRA havia relatórios com nomes de pessoas físicas e jurídicas destinados à emissão de cheques da Assembleia Legislativa. Veja-se (ID. 278677089 – pág. 129): Ainda, foi identificada uma relação de custos para a reativação de 11 empresas, enviadas para Nilson Teixeira, integrante do esquema da Confiança Factoring, e um relatório para a Assembleia legislativa, com o nome de algumas empresas e a observação “até o momento sem repetição de bacanas. Obs: falta abrir + cinco empresas”. Confira-se (ID. 278677089 – pág. 122): À luz do artigo 3°, da Lei n.° 8.429/92, respondem por ato de improbidade administrativa, também, aqueles que, mesmo sem exercer função pública, induzem ou concorrem dolosamente para a sua prática. No caso concreto, as provas demonstram que tanto JOEL quanto JOSÉ QUIRINO se valiam de seu conhecimento técnico-contábil para montar estrutura empresarial fictícia e encobrir os rastros da operação fraudulenta, em conluio com os agentes políticos. A adesão consciente, voluntária e reiterada ao esquema evidencia a clara intenção dos requeridos de causar lesão ao erário. Logo, não se sustenta o fundamento da sentença quanto à exclusão de JOSÉ QUIRINO PEREIRA da condenação, tampouco os argumentos recursais para inocentar JOEL QUIRINO PEREIRA. Dessa sorte, a responsabilização de HUMBERTO MELO BOSAIPO, JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA pelo ressarcimento ao erário é medida impositiva, não só para dar resposta à sociedade, como para restaurar a integridade do sistema político violado. Ante o exposto, CONHEÇO E NEGO PROVIMENTO aos recursos de apelação interpostos por HUMBERTO MELO BOSAIPO e JOEL QUIRINO PEREIRA, e CONHEÇO E DOU PROVIMENTO ao apelo do MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO para estender a condenação a JOSÉ QUIRINO PEREIRA, em regime de solidariedade, pelos mesmos fundamentos e valores da sentença a quo. É como voto. V O T O EXMO. SR. DES. DESODETE CRUZ JÚNIOR (1º VOGAL): Acompanho o voto da Relatora V O T O EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA (2º VOGAL): Peço vista dos autos para melhor análise da matéria. SESSÃO DE 21 DE JULHO DE 2025 (CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO) V O T O (VISTA) EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA (2º VOGAL): Egrégia Câmara: Humberto Melo Bosaipo, Joel Quirino Pereira e Ministério Público do Estado de Mato Grosso interpuseram recursos de apelação contra a sentença que, na Ação Civil Pública de Ressarcimento de Danos Causados ao Erário nº 0001868-29.2008.8.11.0041, ajuizada em desfavor de José Geraldo Riva, Humberto Melo Bosaipo, Geraldo Lauro, Nivaldo de Araujo, José Quirino Pereira e Joel Quirino Pereira, julgou parcialmente procedentes os pedidos para, dentre outras medidas, condenar Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira ao ressarcimento ao erário do valor de R$1.616.260,80. Essa sentença ainda reconheceu e declarou a prática do ato de improbidade administrativa previsto no art. 10, caput, da Lei nº 8.429/92 por parte de José Geraldo Riva, porém, não lhe aplicou qualquer sanção em razão de ter realizado colaboração premiada nos autos. Outrossim, julgou improcedentes os pedidos em relação a José Quirino Pereira, por ausência de provas suficientes (id. 278677959). Inconformado, Humberto Melo Bosaipo, em seu recurso, sustenta que a sentença deve ser reformada por se basear em provas frágeis e ilegais, destacando que a delação premiada, isoladamente, não é suficiente para fundamentar condenação, sendo necessárias provas independentes que a corroborem. Argumenta que, no caso, não há elementos adicionais que confirmem as declarações da colaboração premiada, pois a condenação apoiou-se apenas em documentos, sem perícias ou análises técnicas que comprovassem sua participação no ato apontado como danoso, o que não configura improbidade administrativa. Alega que não ficou demonstrado dolo, culpa grave ou intenção de beneficiar terceiros, requisitos para a condenação com base no art. 10 da Lei nº 8.429/92, ressaltando que, conforme o art. 1º da mesma lei, a mera ilegalidade não caracteriza improbidade sem prova de má-fé. Sustenta, ainda, a desproporcionalidade das sanções, especialmente o ressarcimento de R$1.616.260,80 e as penas de suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o Poder Público por cinco anos, que considera excessivas diante da ausência de provas robustas de sua responsabilidade exclusiva pelo prejuízo. Ao final, requer o provimento da apelação para reformar a sentença e julgar improcedente a ação de improbidade, absolvendo-o das sanções impostas ou, subsidiariamente, reduzindo-as com base nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade (id. 278677962). Joel Quirino Pereira, em seu recurso, sustenta que a condenação carece de provas, pois não há demonstração de que tenha praticado ato doloso ou se beneficiado da empresa envolvida, existindo apenas um documento que menciona seu nome e registro profissional (CRC), sem assinatura ou cadastro que comprove má-fé ou dolo. Argumenta que o contrato social foi elaborado pelo escritório “Diego Contabilidade”, sob responsabilidade do contador Luiz Alberto Dondo Gonçalves à época, não havendo qualquer grafia, participação ou fornecimento de etiqueta do CRC por parte do apelante. Afirma desconhecer o contrato social, seus sócios, os termos do documento, o advogado subscritor e o extrato de cadastro na SEFAZ, o qual teria inserido seu nome sem respaldo legal. Por isso, a defesa insistiu reiteradamente na realização de perícia técnica para esclarecimento dos fatos. Alega que a sentença é carente de fundamentação, pois seu irmão foi absolvido por não constar seu nome no extrato, enquanto ele foi condenado unicamente por esse motivo. Defende que os atos que lhe foram imputados se tratam de mera irregularidade formal, a qual só poderia ser considerada nula se comprovado prejuízo ao erário, o que não ocorreu no caso. Enfatiza que não há dolo, uma vez que não recebeu valores, não assinou documentos, não deu manutenção ou utilizou os atos ilícitos, sendo que quem cometeu os desvios apenas usou o nome da empresa sem qualquer participação sua. Ao final, requer o provimento do recurso para reformar a decisão recorrida e absolvê-lo das acusações (id. 278677970). Por fim, o Ministério Público, em suas razões recursais, defende a reforma da sentença para que seja condenado também José Quirino Pereira, afirmando que conjunto probatório apresentado tanto na fase extrajudicial quanto na judicial, demonstra claramente a participação de tal requerido no esquema ilícito de desvio e apropriação de recursos do Poder Legislativo Estadual (id. 278677974). A douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo desprovimento dos recursos de Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira e pelo provimento do manejado pelo Ministério Público (id. 284030887). Os autos foram distribuídos à relatora, Desembargadora Maria Aparecida Ferreira Fago, que, em análise às insurgências recursais, rejeitou a preliminar de falta de fundamentação da sentença recorrida e, no mérito, negou provimento aos apelos de Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira, bem como deu provimento ao aviado pelo Ministério Público para estender a condenação de ressarcimento ao erário também a José Quirino Pereira. A esse entendimento aderiu o eminente Desembargador Deosdete Cruz Júnior (1º vogal). Diante da complexidade da matéria, pedi vista dos autos. Pois bem. Ressai dos autos que José Geraldo Riva e Humberto Melo Bosaipo, enquanto administradores da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, com o apoio de Nivaldo de Araújo e Geraldo Lauro, praticaram atos de improbidade administrativa consistentes no desvio e apropriação ilícita de recursos públicos mediante a emissão de 32 cheques em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos nos anos de 2001 a 2002, sem a devida prestação de serviços, causando prejuízo ao erário de R$ 1.819.430,80. Ressai dos autos, também, que a referida empresa seria fictícia, tendo sido constituída irregularmente pelos Contadores José Quirino Pereira e Joel Quirino Pereira, a partir dos dados de empreendimento distinto (A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções), e que se encontrava sob a responsabilidade do escritório de contabilidade dos mesmos (Ômega Contabilidade), exatamente para viabilizar o esquema de desvio de dinheiro público. Após regular tramitação da demanda, em que foi realização de delação premiada por José Geraldo Riva, houve o falecimento de Nivaldo de Araújo e a celebração de Acordo de Não Persecução Cível por Geraldo Lauro, o juízo a quo proferiu sentença de parcial procedência nos seguintes moldes: “Diante do exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos, em relação ao requerido José Geraldo Riva, para reconhecer e declarar a prática do ato de improbidade administrativa previsto no art. 10, caput, da Lei n.º 8.429/92, deixando, contudo, de aplicar a respectiva sanção, haja vista a colaboração premiada existente nos autos. Em relação ao requerido José Quirino Pereira, não havendo provas suficientes da prática do ato ímprobo doloso imputado ao requerido, julgo improcedentes os pedidos, com fundamento no art. 487, I, do CPC. Já em relação aos requeridos Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira, condeno-os ao ressarcimento do dano causado ao erário, de forma solidária, no valor de R$1.616.260,80 (um milhão, seiscentos e dezesseis mil, duzentos e sessenta reais e oitenta centavos). Sobre o valor referente ao ressarcimento do dano, os valores deverão ser acrescidos de juros de meio por cento (0,5%) ao mês, desde o dano efetivo (desconto dos cheques) até 11/01/2003, quando passa a ser de um por cento (1%) ao mês, com a entrada em vigor do Código Civil (lei 10.406/2002) e correção monetária, pelo INPC, também incidente a partir do dano (art. 398, Código Civil; Súmulas 43 STJ e 54 STF). Condeno os requeridos Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira, ao pagamento das custas e despesas processuais pro rata. Por consequência, julgo extinto o processo com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil”. (id. 278677959)Grifos originais. Contra essa sentença, como visto, Humberto Melo Bosaipo, Joel Quirino Pereira e o Ministério Público interpuseram recursos de apelação cível, em relação aos quais não tenho dúvida em acompanhar o entendimento esposado pela douta relatora. Com efeito, quanto à preliminar de falta de fundamentação, arguida pelo apelante Joel Quirino Pereira, realmente não merece prosperar, pois a sentença recorrida expôs com clareza as condutas praticadas por cada um dos requeridos e concluiu, com base na prova produzida nos autos, pela condenação dos mesmos ao ressarcimento ao erário, com exceção de José Quirino Pereira, não havendo que se falar em violação ao art. 93, IX, da Constituição Federal ou ao art. 489, §1º, do CPC. No mérito, no que tange ao apelo de Humberto Bosaipo Melo, não procedem as alegações do apelante de que as provas apresentadas nos autos são ilegais e frágeis para amparar a sua condenação pela prática do ato de improbidade tipificado no art. 10, caput, da Lei nº 8.429/92, pois decorrentes apenas de declarações feitas em colaboração premiada. Além disso, não teria sido demonstrada a presença de dolo ou má-fé em suas ações e as sanções cominadas em seu desfavor pelo juízo a quo seriam desproporcionais. Ocorre que condenação imposta ao apelante não se baseou exclusivamente nas declarações do colaborador premiado, mas em um conjunto de provas robusto e independente, colhido tanto na fase extrajudicial quanto no curso da instrução processual. Nesse cenário, as declarações prestadas no âmbito da colaboração premiada tiveram apenas função acessória, servindo como elemento confirmatório das demais provas já constantes dos autos, as quais, por si sós, eram suficientes para demonstrar a prática de atos ímprobos e justificar a imposição do dever de ressarcimento ao erário. Nesse sentido, o juízo de origem foi claro ao consignar na sentença que as declarações prestadas pelo colaborador premiado não constituíram fundamento isolado ou determinante da condenação. Conforme destacado no decisum, tais declarações apenas corroboraram o robusto conjunto probatório já constante dos autos quanto ao uso de empresa fictícia para o desvio de valores dos cofres da Assembleia Legislativa Estadual, o qual, por si só, revelava de forma suficiente a prática dos atos ilícitos imputados ao apelante e a consequente necessidade de ressarcimento ao erário. Nesse sentido, veja-se o trecho da sentença recorrida: “(...)Pois bem. De inicio, saliento que o requerido José Geraldo Riva firmou acordo de colaboração premiada com o Ministério Público, devidamente homologado pelo o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, o qual é utilizado nestes autos com finalidade de corroborar os fatos narrados na inicial. Diante da celebração do acordo, o requerido José Geraldo Riva reconheceu os atos ímprobos imputados na petição inicial, o que comporta provimento de natureza declaratória, pois, caso descumpridas as condições pactuadas na colaboração premiada, poderá o requerente comunicar o juízo e buscar a imposição das penalidades impostas no acordo. Ademais, sabe-se que as declarações do colaborador não perfazem prova isoladamente, devendo existir outros elementos corroborativos, para que o Juiz possa formar a sua convicção, para proferir a decisão de mérito. Neste sentido, cabe aqui sopesar as provas contidas na referida delação, juntadas nos Ids. 58117361 a 58117365 e, Id. 58546963, as quais foram confirmadas em juízo no Id. 111346986, uma vez que o colaborador narra detalhadamente como funcionava o esquema de desvio de verbas públicas da AL/MT, consistente no uso não apenas da empresa requerida nesta ação, mas de inúmeras outras empresas fictícias ou irregulares, para figurar em processos licitatórios ou aquisições simplificadas e receber o pagamento por produtos ou serviços que não foram prestados. O colaborador informa, em síntese, que o desvio de verba pública com a utilização de empresas fictícias ou irregulares era uma prática rotineira e comum desenvolvida pelos deputados estaduais, para o recebimento de propina mensal, com a finalidade de manter a governabilidade do executivo. Menciona ainda, que esses desvios ocorreram entre os anos de 1995 a 2015. Percebe-se, assim, que os fatos narrados pelo colaborador corroboram com o que está contido nos documentos que instruem a inicial. Dentre as empresas que participaram do citado esquema, a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos teria sido contratada para a prestação de serviços e teria sido beneficiária dos cheques emitidos pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, nos anos de 2001 a 2002. As provas produzidas nos autos demonstram que a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos foi utilizada irregularmente pelos requeridos, já que seu o numero de CNPJ pertencia a outra empresa e foi utilizado para justificar a emissão dos cheques da AL/MT, com a criação da referida empresa inexistente, ou seja, os requeridos se utilizaram do cadastro de uma empresa que se encontrava regular, e utilizaram os dados para criação de outra empresa fictícia para justificar os pagamentos ilegais (Id. 58115730 fls. 29/30). Observa-se que o CNPJ 04.600.944/001-50 consta o nome A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções e, como contador responsável o requerido Joel Quirino, no entanto, o mesmo numero de CNPJ foi utilizado para criar ilegalmente a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos teria, a qual foi utilizada ilegalmente pelos requeridos para emissão de vários cheques nos anos de 2001 a 2002 (Id. 58115730 fls. 29/30 e 47/50). Ademais, o sócio, a pessoa de nome Ademir Caberlin, afirmou que constituiu a empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções, através dos contadores e requeridos Joel Quirino e José Quirino, mas que nunca autorizou a abertura de qualquer outra empresa, bem como que nunca participou de qualquer licitação na AL/MT e que desconhece a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos (Id. 58115733 – fls. 83/86). Outrossim, os requeridos não apresentaram nota fiscal ou comprovante de recebimento dos produtos ou serviços, supostamente adquiridos, para justificar esses pagamentos realizados, tampouco comprovaram a existência do regular procedimento licitatório prévio. Certamente, esses produtos ou serviços, assim como a empresa, jamais existiram. Portanto, não há dúvidas de que os dados da empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções foram utilizados irregularmente, para a criação da empresa inexistente A. Caberlin Publicidade e Eventos, sendo assim, o pagamento à empresa fictícia indica a intenção concreta de beneficiar terceiros, com prejuízo ao erário, caracterizando o dolo na conduta ímproba. Os requeridos Humberto Bosaipo e José Riva, cada um desempenhando as suas atribuições, tinham a obrigação legal de zelar pelo correto trâmite dos procedimentos de aquisição de bens ou de prestação de serviços. No caso em comento, não há emissão de uma única nota fiscal de serviços prestados pela empresa, a qual sequer tinha autorização para emitir nota fiscal, documento essencial no procedimento de conferencia da prestação do serviço/atesto e de empenho e pagamento, notadamente, quando se tratam de valores expressivos, que exigem modalidade licitatória mais complexa. Desta forma, está demonstrado que os requeridos não fizeram o mínimo do que se espera de um gestor público. Na análise dos autos verifico a existência de vinte e nove (29) cópias de cheques emitidos pela Assembleia Legislativa, nominais em favor da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos (Id. 58115738), quais sejam: 1) Cheque n° 010112, no valor de R$72.000,00 (setenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 39). 2) Cheque n° 010611, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 41). 3) Cheque n° 010702, no valor de R$52.000,00 (cinquenta e dois mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 43). 4) Cheque n° 011210, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 45). 5) Cheque n° 011310, no valor de R$46.000,00 (quarenta e seis mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 47). 6) Cheque n° 011473, no valor de R$65.300,00 (sessenta e cinco mil, trezentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 48). 7) Cheque n° 010374, no valor de R$72.500,00 (setenta e dois mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 50). 8) Cheque n° 011815, no valor de R$74.350,00 (setenta e quatro mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 52). 9) Cheque n° 010720, no valor de R$60.000,00 (sessenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 54). 10) Cheque n° 012147, no valor de R$69.526,00 (sessenta e nove mil, quinhentos e vinte e seis reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 56). 11) Cheque n° 010919, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 58). 12) Cheque n° 011980, no valor de R$55.000,00 (cinquenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 60). 13) Cheque n° 012516, no valor de R$52.350,00 (cinquenta e dois mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 62). 14) Cheque n° 012753, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 64). 15) Cheque n° 012610, no valor de R$25.000,00 (vinte e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 66). 16) Cheque n° 010727, no valor de R$45.000,00 (cinquenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 68). 17) Cheque n° 013053, no valor de R$48.500,00 (quarenta e oito mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 70). 18) Cheque n° 013228, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 72). 19) Cheque n° 013963, no valor de R$40.000,00 (quarenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 74). 20) Cheque n° 014074, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 76). 21) Cheque n° 014416, no valor de R$51.434,80 (cinquenta e um mil, quatrocentos e trinta e quatro reais, oitenta centavos); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 78). 22) Cheque n° 014561, no valor de R$65.000,00 (sessenta e cinco mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 80). 23) Cheque n° 012828, no valor de R$71.500,00 (setenta e um mil, quinhentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 82). 24) Cheque n° 015029, no valor de R$62.350,00 (sessenta e dois mil, trezentos e cinquenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 84). 25) Cheque n° 016093, no valor de R$67.410,00 (sessenta e sete mil, quatrocentos e dez reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 88). 26) Cheque n° 016116, no valor de R$35.680,00 (trinta e cinco mil, seiscentos e oitenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 89). 27) Cheque n° 015478, no valor de R$42.560,00 (quarenta e dois mil, quinhentos e sessenta reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 90). 28) Cheque n° 016355, no valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 91). 29) Cheque n° 016038, no valor de R$67.800,00 (sessenta e sete mil, oitocentos reais); assinado pelos requeridos José Riva e Humberto Bosaipo (Id. 58115738 – fls. 93). Já os cheques n° 0850004; 014976 e; 015119 estão ilegíveis, não sendo possível identificar os valores e o nome da empresa, de modo que não poderão ser objeto de análise. Esses cheques foram emitidos pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, por meio de seus representantes à época, os requeridos José Geraldo Riva e Humberto Bosaipo, os quais detinham a competência para autorizar esses pagamentos, totalizando o valor de R$1.616.260,80 (um milhão, seiscentos e dezesseis mil, duzentos e sessenta reais e oitenta centavos). No entanto, a empresa beneficiária desses pagamentos não forneceu nenhum produto ou serviço, conforme já esclarecido acima, de modo que os requeridos efetivamente causaram danos ao erário ao permitiram esses pagamentos sem a devida contraprestação. O requerido Joel Quirino, por sua vez, à época dos fatos era o contador responsável pela empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções perante a Secretaria de Estado de Fazenda de Mato Grosso, conforme consta no Id. 58115730 (fls. 47/50), ficando comprovada a sua efetiva participação no desvio de recursos público, por meio do uso dos dados e da constituição da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos. utilizada no esquema com CNPJ de terceiro, no qual o requerido não apresentou nenhuma prova que pudesse afastar tal afirmativa. Todos esses fatos demonstram a prática de atos de improbidade administrativa, ficando evidente a existência de conluio entre os agentes públicos com o intuito de desviar dinheiro público. Assim, restou sobejamente demonstrada que os requeridos efetuaram os pagamentos para a empresa fictícia, sem a devida contraprestação, sem qualquer emissão de atesto ou comprovante de entrega dos serviços. Ainda, resguardado o direito ao contraditório e à ampla defesa, nenhum elemento foi trazido que pudesse afastar tal convicção, ou ainda indicar a boa-fé dos requeridos, de forma que resta caracterizada a prática de atos de improbidade administrativa. Não há que se falar em conduta culposa, em desídia ou falta de atenção, pois ficou demonstrado nos autos que os requeridos, cada com sua “atribuição”, concorreram para efetuar pagamentos de serviços que nunca foram prestados, tendo plena ciência de que se tratava de um procedimento, apenas para dar aparência de legalidade aos atos. Ainda, José Geraldo Riva, na condição de colaborador, também participou “do esquema”, juntamente com os demais requeridos, desviando recursos públicos, mediante contratação de empresas inexistentes ou irregulares. Suas afirmações, mesmo que venha de pessoa cujo comportamento anterior seja ética e socialmente reprovável, não retira o valor dos depoimentos prestados, em relação aos pagamentos efetuados por meio de cheques, sem a devida contraprestação. Além disso, toda a narrativa do esquema fraudulento de emissão de cheques com uso de empresas inexistentes ou irregulares é confirmada também pelas testemunhas Nilson Roberto Teixeira, Katia Maria Aprá, Edil Dias e Raquel Alves ouvidas em juízo (Id. 111342152; 111348683; 111348646; 111348648). No caso dos autos, alia-se a estes fatos a outros elementos de prova, que encontram harmonia com o depoimento do colaborador premiado, evidenciando a ocorrência da conduta ímproba. Assim, diante da clareza dos elementos de prova documental, corroborado com a colaboração premiada, ficou evidenciado que os requeridos praticaram ato de improbidade administrativa, que efetivamente causou prejuízo ao erário”. (id. 278677959) Dessa forma, ao contrário do que sustenta o apelante Humberto Melo Bosaipo em suas razões recursais, não se verifica qualquer irregularidade ou fragilidade nas provas que fundamentaram sua condenação pela prática do ato de improbidade administrativa descrito no caput do art. 10 da Lei nº 8.429/1992. Ao revés, o acervo probatório é consistente e suficientemente robusto para demonstrar a ocorrência da conduta ilícita que lhe foi imputada e para embasar a condenação ao dever de ressarcir o erário, especialmente diante da impossibilidade de aplicação das sanções punitivas previstas na LIA em razão da prescrição. Neste contexto, também não subsiste a tese recursal de que não restou demonstrado dolo específico na conduta imputada ao mencionado apelante e que eventual responsabilização não pode decorrer de mera irregularidade administrativa, à luz do art. 1º da Lei nº 8.429/92, com a redação dada pela Lei nº 14.230/2021. O conjunto probatório constante dos autos revela a participação ativa e consciente do apelante no esquema que resultou em expressiva lesão ao erário da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. De acordo com as provas documentais e orais existentes nos autos, o apelante, na condição de ordenador de despesas à época dos fatos, foi, juntamente com José Geraldo Riva e demais requeridos, o responsável direto pela emissão contínua de 32 cheques nominais a uma empresa que, comprovadamente e com sua ciência, foi constituída de forma fraudulenta, e sem que tivesse havido qualquer demonstração da efetiva prestação dos serviços contratados ou da observância de regular processo licitatório. Logo, a conduta atribuída ao apelante não se limita a uma mera falha administrativa ou a um erro formal no desempenho de suas funções. Ao contrário, está evidenciado nos autos que ele atuou de forma deliberada e consciente com o propósito de desviar recursos públicos, mediante a simulação de contratação com empresa fictícia e pagamento por serviços inexistentes. Tal atuação demonstra dolo específico, nos termos exigidos pela nova redação conferida pela Lei nº 14.230/2021 à Lei de Improbidade Administrativa, ou seja, a vontade dirigida à produção do resultado ilícito – neste caso, a dilapidação dos cofres públicos em benefício próprio, com prejuízo efetivo ao patrimônio estadual. Quanto à alegação de desproporcionalidade das sanções aplicadas, esclareça-se que, no caso, diante da prescrição das penalidades punitivas previstas na Lei nº 8.429/92, o apelante foi condenado apenas a ressarcir ao erário no valor de R$1.616.260,80, que corresponde exatamente ao somatório dos cheques pagos para a empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos, nos termos do art. 37, §5º, da Constituição Federal e do Tema 897 do Supremo Tribunal Federal. Logo, não há falar-se em desproporcionalidade ou falta de razoabilidade na condenação do recorrente. Dessa forma, como bem entendeu a douta relatora, não assiste razão ao recorrente em sua inconformidade, devendo ser mantida a sentença quanto à sua responsabilização pelo ressarcimento ao erário em decorrência do ato de improbidade previsto no art. 10, caput, da Lei nº 8.429/1992, cuja prática dolosa foi inequivocamente comprovada nos autos. Quanto aos apelos de Joel Quirino Pereira e do Ministério Público Estadual, penso que a sentença deve ser alterada apenas para estender a condenação a José Quirino Pereira. Ocorre que restou devidamente comprovado nos autos a participação de Joel Quirino Pereira e de José Quirino Pereira, como Contadores da empresa Ômega Contabilidade, no esquema para o desvio de recursos da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso. Com efeito, conforme se verifica dos autos, o escritório Ômega Contabilidade, pertencente a Joel Quirino Pereira e José Quirino Pereira, atuava, à época dos fatos, como responsável pela empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções perante a Secretaria de Estado de Fazenda de Mato Grosso. Valendo-se das atribuições que exerciam, utilizaram indevidamente os dados dessa empresa para constituir, de forma fraudulenta, outra pessoa jurídica, denominada A. Caberlin Publicidade e Eventos, a qual, no esquema de desvio de recursos públicos, recebeu diversos cheques emitidos pela Assembleia Legislativa Estadual. Tal conclusão decorre de vários elementos convergentes: a experiência técnica e o conhecimento especializado dos requeridos na área contábil e tributária; o fato de serem responsáveis, por meio da empresa Ômega Contabilidade, pela gestão da verdadeira empresa A. Carbelin – Centro Oeste Materiais para Construções; a atuação específica de Joel Quirino Pereira, que, mediante manipulação dos dados da empresa original, formalizou a constituição da empresa fraudulenta; as provas colhidas em busca e apreensão realizada na Ômega Contabilidade, nas quais constam dados da empresa A. Caberlin Publicidade e Eventos; bem como as declarações prestadas em delação premiada por José Geraldo Riva – posteriormente confirmadas em juízo – e outros depoimentos colhidos ao longo da instrução processual. Nessa mesma linha de raciocínio, a fim de evitar repetições desnecessárias, reproduzem-se, a seguir, excertos do voto proferido pela eminente relatora, que sintetizam de forma precisa e objetiva os fundamentos adotados para a condenação dos requeridos: “(...) As diligências empreendidas na fase investigativa, por sua vez, revelam que o CNPJ pertencente à empresa A. Caberlin – Centro Oeste Materiais para Construções foi manipulado e utilizado para constituir uma empresa fictícia. O sócio formal da empresa real, Sr. Ademir Caberlin, foi enfático ao afirmar que jamais autorizou a abertura de outra pessoa jurídica, tampouco teve qualquer ciência ou participação em processos licitatórios na esfera estadual. Isso reforça que o uso de sua inscrição e dados ocorreu de maneira absolutamente fraudulenta, com o fim específico de dar aparência de legalidade a transações que, em verdade, jamais representaram qualquer prestação de serviço à administração pública. Alinha-se, a isso, a delação premiada de JOSÉ GERALDO RIVA, devidamente homologada e admitida como prova nos autos, que reforça a conclusão quanto à consciência e voluntariedade da conduta dos apelantes, formando um conjunto harmônico e coerente com as provas, especificamente os cheques, as informações de inatividade da empresa e a ausência de notas fiscais. Para mais, há trecho inequívoco da fala do colaborador, que imputa a HUMBERTO MELO BOSAIPO a participação direta na constituição de empresa de fachada e na manipulação de cheques sem qualquer contrapartida de serviço ou produto. Veja-se (ID. 278677856): “(22:19): “A situação dos saques, ela nunca foi efetivada por nenhuma das empresas, até porque as empresas, eram empresas criadas de forma fraudulenta ou em um determinado momento, como eu já disse, sequer criadas. E esse processo de criação das empresas, ele foi relatado pelo senhor Humberto Bosaipo à época. É... até porque eu não conhecia esse pessoal, que não eram aqui de Cuiabá, alguns deles trabalharam...em... em Barão de Melgaço, pelos...pelos Quirinos, pelo senhor Luiz Dondo, pelo senhor Nivaldo de Araújo e.... à época, a alegação era de que a Confiança Factoring, através do senhor Nilson Teixeira e do senhor João Arcanjo, tinha pleno conhecimento. E em alguns casos até contribuíram. Eu tenho até um caso em que entraram numa... numa... numa ação contra, contra mim e o deputado Bosaipo pedindo indenização, em que a pessoa alega que pegou os documentos lá na Confiança e entregou os documentos na mão dos contadores para que fosse criada as empresas, algumas empresas eram simplesmente dado manutenção de empresas velhas já. Fazia, inclusive, a alteração do ramo de atividade. Outras empresas eram criadas e outras, como eu disse pra vossa excelência, e reafirmo aqui, eram empresas que sequer existiam. Procedimento nenhum era feito, era feito uma relação de cheques e nós recebíamos o pacote de cheques junto à relação e simplesmente assinávamos. A Confiança Factoring, como eu disse, é... recebeu aproximadamente 20 (vinte) e poucos milhões desses valores, sem precisar que haviam 22 (vinte e duas) promissórias de R$ 700.000,00 (setecentos mil) que foram pagos mensalmente, por mim e pelo deputado Humberto Bosaipo e também eram utilizados recursos, às vezes, para campanha eleitoral, para eleições de mesa, e as vezes até para uma questão particular de deputado (...).” (...) Com relação a JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA, destaca-se que as declarações prestadas por José Geraldo Riva na colaboração premiada são coerentes e ricas em detalhes, destacando, com firmeza, que os irmãos atuavam no escritório no qual as empresas eram criadas e manipuladas, muitas vezes com fornecimentos dados pela Confiança Factoring. Veja-se (ID. 278677856): “(...) As empresas foram constituídas dentro do escritório do Dondo, os responsáveis por isso foi o Joel e o José acompanhados pelo Nivaldo Araújo, que eram pessoas de confiança do Bosaipo, já antigas no esquema. E a maior parte de documentação era arrumado pela... pelo grupo do João Arcanjo Ribeiro, especialmente o Nilson Teixeira, e os cheques eram emitidos por Luiz Eugênio de Godoy, por Guilherme Garcia, antes o Guilherme Garcia como secretário de finanças, depois o Luiz Eugênio, mas também o Senhor Guilherme Garcia na condição de secretário-geral”. Tais declarações são corroboradas pela ratificação em juízo (ID. 278677897) e depoimentos testemunhais, além dos documentos que instruem a petição inicial, relacionados às apreensões feitas no âmbito do Inquérito Policial n.° 252/03 (ID. 278677089 – pág. 108/123), especialmente nos computadores da empresa Ômega Auditoria, com diversos arquivos e documentos digitais que evidenciam a atuação dos irmãos contadores, de forma coordenada com outros integrantes do esquema, como responsáveis pela constituição da estrutura societária e contábil que possibilitou a apropriação ilícita dos recursos públicos. Dentre os documentos e arquivos localizados pelo serviço de inteligência, consta que no mesmo computador no qual estava salvo o curriculum de JOSÉ QUIRINO PEREIRA havia relatórios com nomes de pessoas físicas e jurídicas destinados à emissão de cheques da Assembleia Legislativa. Veja-se (ID. 278677089 – pág. 129): Ainda, foi identificada uma relação de custos para a reativação de 11 empresas, enviadas para Nilson Teixeira, integrante do esquema da Confiança Factoring, e um relatório para a Assembleia legislativa, com o nome de algumas empresas e a observação “até o momento sem repetição de bacanas. Obs: falta abrir + cinco empresas”. Confira-se (ID. 278677089 – pág. 122): (...). No caso concreto, as provas demonstram que tanto JOEL quanto JOSÉ QUIRINO se valiam de seu conhecimento técnico-contábil para montar estrutura empresarial fictícia e encobrir os rastros da operação fraudulenta, em conluio com os agentes políticos. A adesão consciente, voluntária e reiterada ao esquema evidencia a clara intenção dos requeridos de causar lesão ao erário. Logo, não se sustenta o fundamento da sentença quanto à exclusão de JOSÉ QUIRINO PEREIRA da condenação, tampouco os argumentos recursais para inocentar JOEL QUIRINO PEREIRA. Dessa sorte, a responsabilização de HUMBERTO MELO BOSAIPO, JOSÉ QUIRINO PEREIRA e JOEL QUIRINO PEREIRA pelo ressarcimento ao erário é medida impositiva, não só para dar resposta à sociedade, como para restaurar a integridade do sistema político violado”. Alie-se a estes fatos que os requeridos Joel Quirino Pereira e José Quirino Pereira responderam e foram condenados exatamente por formalizar a existência de diversas empresas fictícias com a finalidade de dar aparência de legitimidade dos supostos serviços prestados à Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso com vistas a desviar dinheiro público, como bem destacou o Ministério Público em suas razões, inclusive citando os autos de nº 0004404-47.2007.811.0041, nº 0003668-63.2006.8.11.0041, nº 00045255-75.2007.8.11.0041 e nº 0004135-42.2006.8.11.0041. Igualmente, o próprio recorrente Joel Quirino trouxe aos autos decisões no âmbito criminal em que foi condenado, juntamente com seu irmão José Quirino Pereira, pelas mesmas condutas, porém, teve reconhecida a prescrição da pretensão punitiva estatal, na modalidade retroativa (vide id. 287346365). Assim, ainda que o apelante Joel Quirino Pereira alegue ausência de dolo, desconhecimento do contrato social e inexistência de assinatura ou grafia de sua autoria nos documentos, os elementos colhidos em busca e apreensão na Ômega Contabilidade, os depoimentos prestados e as declarações confirmadas em juízo, notadamente a colaboração premiada de José Geraldo Riva, evidenciam seu efetivo envolvimento, juntamente com seu irmão, afastando a tese de mera utilização indevida de seu nome por terceiros. Não se trata, portanto, de simples irregularidade formal sem dano ao erário, mas de conduta dolosa, voltada à criação de empresa fictícia para fins ilícitos, o que justifica a condenação. Destarte, evidente a prática de ato de improbidade doloso que lesa ao erário pelos apelantes Humberto Melo Bosaipo, Joel Quirino Pereira e José Quirino Pereira hábil à condenação dos mesmos ao ressarcimento aos cofres públicos, em conformidade com as provas dos autos. Ante o exposto, em sintonia com o parecer ministerial, não tenho dúvida em acompanhar a douta relatora para negar provimento aos recursos de apelação interpostos por Humberto Melo Bosaipo e Joel Quirino Pereira e dar provimento ao manejado pelo Ministério Público, tão-somente para estender a condenação de ressarcimento ao erário a José Quirino Pereira. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 21/07/2025

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