Processo nº 5377354-93.2024.8.21.7000
ID: 309588816
Tribunal: TJRS
Órgão: Secretaria da 19ª Câmara Cível
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 5377354-93.2024.8.21.7000
Data de Disponibilização:
27/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VIVIAN DE FREITAS CAMPOS
OAB/RS XXXXXX
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Agravo de Instrumento Nº 5377354-93.2024.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO:
Superendividamento
RELATOR
: Desembargador ANTONIO MARIA RODRIGUES DE FREITAS ISERHARD
AGRAVADO
: SONIA MARIA DOS SANTOS MATOS
ADV…
Agravo de Instrumento Nº 5377354-93.2024.8.21.7000/RS
TIPO DE AÇÃO:
Superendividamento
RELATOR
: Desembargador ANTONIO MARIA RODRIGUES DE FREITAS ISERHARD
AGRAVADO
: SONIA MARIA DOS SANTOS MATOS
ADVOGADO(A)
: VIVIAN DE FREITAS CAMPOS (OAB RS125258)
EMENTA
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. Negócios jurídicos bancários. TUTELA DE URGÊNCIA. SUPERENDIVIDAMENTO.
I. CASO EM EXAME
O recurso em análise refere-se à decisão que deferiu a tutela de urgência em favor da parte autora, visando a limitação dos descontos em folha de pagamento e conta corrente, em razão da alegação de superendividamento.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
Discute-se a legalidade do deferimento da tutela de urgência, considerando a necessidade de fundamentação da decisão e a observância dos requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil.
III. RAZÕES DE DECIDIR
Cabível a concessão da tutela de urgência nas ações de repactuação de dívidas, sob o rito da Lei do Superendividamento, frente às particularidades da demanda que envolve a proteção do mínimo existencial e a dignidade da pessoa humana, desde que assegurado na origem a realização da audiência conciliatória antes do início da fase processual e estejam presentes os requisitos do artigo 300 do CPC.
No caso concreto, há demonstração que os descontos decorrentes dos contratos firmados pela parte consumidora com seus credores, observada a exceção prevista no artigo 54-A, § 3º, do CDC, estão comprometendo significativamente a sua subsistência, o que enseja a manutenção da tutela concedida na origem. Inaplicabilidade do tema 1085 do superior tribunal de justiça ao tipo de ação.
Multa. O Código de Processo Civil autoriza a fixação de multa para o caso de descumprimento das decisões provisórias e definitivas. No caso em análise, a multa deve ser mantida como forma de coação ao cumprimento da obrigação, pois eventual suspensão, redução ou mudança da periodicidade apenas retiraria o poder de eficácia da decisão agravada, sem prejuízo de eventual modificação oportunamente, nos termos do artigo 537, § 1º, do CPC.
IV. DISPOSITIVO E TESE
Recurso conhecido em parte e desprovido.
Tese de julgamento
:
"A tutela de urgência pode ser concedida em casos de superendividamento, desde que demonstrados os requisitos do artigo 300 do CPC e respeitado o rito da lei 14.181/2021.
________________________________
Dispositivos relevantes citados:
art. 300 do Código de Processo Civil; art. 206, inciso XXXVI do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
Jurisprudência relevante citada:
AgInt no AREsp n. 1.976.621/RJ; Agravo de Instrumento, Nº 51730339620248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS; Agravo de Instrumento, Nº 50886586520248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS; Agravo de Instrumento, Nº 51945976820238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS.
DECISÃO MONOCRÁTICA
Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo BANCO BRADESCO S.A. contra a decisão ao
evento 10, DESPADEC1
que, nos autos da ação de repactuação de dívidas
proposta por
SONIA MARIA DOS SANTOS MATOS
, restou assim proferida:
Defiro a gratuidade judiciária.
Anoto, todavia, que a concessão da benesse é modulada e restrita a determinados atos processuais, na forma do permissivo legal disposto no parágrafo 5º do artigo 98 do Código de Processo Civil.
A esse respeito, adianto que a vedação imposta pelo parágrafo 3º do artigo 104-B do Código de Defesa do Consumidor poderá ser relativizada, em caso de violação do dever de cooperação e lealdade processual, permitindo-se eventual oneração do credor com relação às despesas necessárias ao procedimento de repactuação, as quais poderão ser incluídas na sucumbência em ação de procedência.
Recebo a inicial com base na tutela legal prevista na Lei 14.181/21, tendo em vista que a causa de pedir noticiando o superendividamento do consumidor.
DA FASE CONCILIATÓRIA:
Observado que a fase conciliatória não ocorreu anteriormente ao ajuizamento da ação, SUSPENDO o feito, após o cumprimento da tutela de urgência deferida, se deferida, para DETERMINAR a remessa dos autos ao
CEJUSC
, determinando seja aprazada audiência de conciliação/mediação, porquanto fase obrigatória da Lei 14.181/21, artigo 104-A.
Registro que, de fato, a fase consensual do procedimento é compulsória e prévia, de acordo com o artigo 104-A do CDC.
Excepcionalmente, evidenciada a necessidade, este Juízo tem analisado a tutela de urgência como forma de assegurar a preservação do mínimo existencial.
Por essa razão, consigno que
É OBRIGATÓRIA A PRESENÇA DO CONSUMIDOR
NA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO/MEDIAÇÃO
, pela aplicação do princípio da cooperação, notadamente, porque fase compulsória do procedimento,
sob pena de possibilidade da reapreciação da tutela de urgência,
uma vez que esta se submete ao "
condicionamento de seu efeitos à abstenção, pelo consumidor, de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento
" (art. 104-A,§ 4.º, IV, do CDC).
A ausência deverá ser justificada comprovadamente e de forma prévia ao ato, salvo situação excepcional a ser apreciada.
A ausência injustificada da parte autora importará na revogação da tutela de urgência.
Outrossim, FICAM OS CREDORES ADVERTIDOS, desde já, que a
ausência injustificada
, bem como o
comparecimento do representante do credor sem poderes reais e plenos para transigir
ou, ainda,
a falta de proposta ou de proposta inviável dos credores
, contrariam a finalidade da norma e podem autorizar a aplicação de sanção, em especial e por analogia, do art. 104-A, § 2.º, do CDC, nos termos dos Enunciados n. 36
1
, n. 37
2
, n.º38
3
e n. 39
4
todos do FONAMEC (Fórum Nacional da Mediação e Conciliação).
Para composição, saliento às partes que:
1) A modificação da forma de pagamento pactuada no acordo, com a previsão de desconto em conta-corrente de débitos que foram contratados de forma originária mediante
pagamento por consignação em folha de pagamento
, altera o equilíbrio da relação originariamente pactuada, ante a possibilidade da incidência do Tema 1085 do STJ.
No entanto,
com a concordância expressa o consumidor
, na ausência de margem consignável em folha de pagamento, fica autorizado, TEMPORARIAMENTE, o pagamento mediante desconto em conta-corrente, desde que mantida a natureza da obrigação originária.
2) A pactuação deve observar as informações trazidas pela parte demandante no
plano preliminar
apresentado, especialmente, a parcela disponível para pagamento dos credores, observado o mínimo existencial. Eventual modificação nas possibilidades deverá ser justificada nos autos, sempre que possível, de forma prévia à audiência, com retificação do plano preliminar.
Cite-se a parte demandada para comparecer à audiência de conciliação/mediação.
Não havendo entendimento, deverá apresentar contestação em 15 dias, contados da data da audiência.
Consigno que, nos termos do CPC, a citação será feita preferencialmente por meio eletrônico, no prazo de até 2 (dois) dias úteis, contado da decisão que a determinar, por meio dos endereços eletrônicos indicados pelo citando.
Ainda de acordo com o diploma legal as empresas privadas são obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, as quais serão efetuadas preferencialmente por esse meio.
Ante a ausência de confirmação, no prazo de até 3 (três) dias úteis, contados do recebimento da citação eletrônica, expeça-se Carta AR de citação pelo correio, nos termos do art. 246, §1°-A.
Tendo em vista que se considera ato atentatório à dignidade da justiça, passível de multa de até 5% (cinco por cento) do valor da causa, deixar de confirmar no prazo legal, sem justa causa, o recebimento da citação recebida por meio eletrônico, o réu deverá justificar a falta de confirmação no prazo da contestação.
DA TUTELA DE URGÊNCIA
Trata-se de pedido de tutela de urgência formulado nos autos de repactuação de dívidas sob o rito da Lei 14.181/21.
Consoante determina a Lei 14.181/21, a audiência de conciliação é fase obrigatória, nos termos do artigo 104-A, tratando-se do primeiro ato a ser realizado.
Nada impede
, todavia, que o pedido de tutela de urgência possa ser apreciado tão logo distribuída a ação, até porque, a fase consensual é requisito para a fase de mérito, e não para a fase de cognição sumária.
Nesse sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU A LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EM TUTELA DE URGÊNCIA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO POR VIOLAÇÃO AO ART. 489, §1º, III, DO CPC: A decisão agravada apresenta fundamentos que são coerentes e se conectam diretamente com o caso concreto, observando suas particularidades, de modo que não há nulidade a ser reconhecida. POSSIBILIDADE DO DEFERIMENTO DA TUTELA ANTES DA AUDIÊNCIA CONCILIATÓRIA: Uma vez instaurado o processo, não há obstáculo legal ao deferimento da tutelas antecipatória que, no caso concreto, se deu como meio de assegurar a perfeita eficácia da função jurisdicional e a proteção do consumidor em situação de superendividamento (...). AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 50725947720248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto José Ludwig, Julgado em: 18-03-2024)
Na lição de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:
"(...) Toda e qualquer providência capaz de alcançar um resultado prático à parte pode ser antecipada. Vale dizer: o pedido de tutela de urgência - satisfativa ou cautelar - não está limitado à proteção de apenas determinadas situações substanciais. A atipicidade da tutela de urgência, como da tutela jurisdicional geral, está ligada à necessidade de se oferecer uma cobertura o mais completa possível às situações substanciais carentes de proteção (...)".
5
Outrossim, incidente o artigo 318 do Código de Processo Civil a autorizar a prestação jurisdicional de cognição sumária no procedimento especial instaurado para tratamento do superendividamento, como forma de
assegurar o resultado útil do processo e a preservação do mínimo existencial
:
Art.318: Aplica-se a todas as causas o procedimento comum, salvo disposição em contrário deste Código ou de lei.
Parágrafo único. O procedimento comum aplica-se subsidiariamente aos demais procedimentos especiais e ao processo de execução.
Daí porque, o requerimento de tutela de urgência merece acolhimento, notadamente porque
a demora no recebimento da citação e consequente espera na designação de audiência de conciliação não pode atuar em prejuízo à parte demandante
.
Ademais, ao exame dos documentos colacionados com a inicial (
evento 8, CHEQ4
,
evento 8, EXTRBANC6
,
evento 1, CHEQ4
), verifico que
parte significativa da renda da parte requerente está comprometida
com os descontos praticados pelos empréstimos concedidos pela parte demandada, seja na forma consignada, seja mediante débito direto em conta-corrente.
A probabilidade do afirmado direito decorre dos argumentos expostos pela parte autora que, em sede de cognição sumária, verificam-se coerentes, na medida em que a continuidade dos descontos vinculados à conta bancária e à renda, na proporção efetuada atualmente,
prejudica a sua própria subsistência
,
porque correspondentes a mais de 50% da renda livre auferida (renda bruta - 35%)
.
Neste sentido, a parte reservada ao pagamento das despesas de subsistência encontra identificação na proteção do mínimo existencial, enquanto direito fundamental social de defesa originário do princípio da dignidade da pessoa humana, assegurado na Constituição Federal, art. 1º, inciso III; e no Código de Defesa do Consumidor, art.6o, XII,
in verbis:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
XII - a preservação do mínimo existencial, nos termos da regulamentação, na repactuação de dívidas e na concessão de crédito;
(Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021)
Como tal, o direito fundamental ao mínimo existencial independe de atuação legislativa, uma vez que revestido de eficácia imediata, consoante vasta doutrina de Ingo Wolfgang Sarlet.
Consoante bem delineado pelo douto Desembargador Aymoré Roque Pottes de Mello, quando do julgamento de pretensão similar nos autos do Agravo de Instrumento Nº 51630265020218217000, a manutenção dos descontos "
coloca em risco o postulado constitucional da dignidade da pessoa humana e o princípio de garantia do mínimo existencial, materializados na garantia de subsistência do autor-agravante e de sua família, posto que os valores creditados na sua conta-corrente são utilizados
integralmente
para abater as suas dívidas, não havendo sobra de qualquer dinheiro para garantir o seu
mínimo existencial.
(...)".
Nesta linha de entendimento, situa-se a jurisprudência infra ao preservar a dignidade do consumidor mediante a limitação dos descontos ao percentual de 35% da renda. Neste sentido:
AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO EM JULGAMENTO MONOCRÁTICO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DECLARATÓRIA. PEDIDO DE
LIMITAÇÃO
DE
DESCONTOS
. EMPRÉSTIMOS PESSOAIS CONSIGNADOS PARA BENEFICIÁRIOS DO INSS. EMPRÉSTIMOS PESSOAIS NÃO CONSIGNADOS.
DESCONTOS
DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS NA FOLHA DE PAGAMENTO DO CONSUMIDOR
SUPERENDIVIDADO
. SITUAÇÃO DE
SUPERENDIVIDAMENTO
CARACTERIZADA. 1. MARGEM CONSIGNÁVEL EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO VINCULADO AO INSS. A MARGEM CONSIGNÁVEL DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS VINCULADOS AO INSS É DE
35
% PARA CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO, NA FORMA DA RECENTE LEI FEDERAL N° 14.131/2021 ("LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO
DO CIDADÃO"). 2. TUTELA DE URGÊNCIA. A PRETENSÃO FUNDAMENTADA NA SITUAÇÃO DE
SUPERENDIVIDAMENTO
DO CONSUMIDOR NÃO IMPLICA EM ÓBICE À CONCESSÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA PELA PREVISÃO LEGAL SOBRE A POSSIBILIDADE DE REQUERIMENTO DE CONCILIAÇÃO PARA REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. 3. SITUAÇÃO DE
SUPERENDIVIDAMENTO
. A PESSOA NATURAL
SUPERENDIVIDADA
É AQUELA CUJA RENDA MENSAL ESTÁ SEVERAMENTE COMPROMETIDA, A PONTO DE PERDER A CAPACIDADE DE PAGAR AS SUAS DÍVIDAS, COLOCANDO EM RISCO A SUA PRÓPRIA SUBSISTÊNCIA E A DE SUA FAMÍLIA. 4. PROCEDIMENTALIZADOS, NA FORMA DA LEI, OS
DESCONTOS
MENSAIS CONSIGNADOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DE CONSUMIDORA
SUPERENDIVIDADA
, A JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DO TJRS SINALIZAM A NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA GARANTIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL DA DEVEDORA
SUPERENDIVIDADA
À SUA SUBSISTÊNCIA PRÓPRIA. 5. NA ESPÉCIE, OS
DESCONTOS
MENSAIS DE TODOS OS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS E NÃO CONSIGNADOS DEVIDOS PELA CONSUMIDORA
SUPERENDIVIDADA
CONSOMEM A INTEGRALIDADE DA SUA REMUNERAÇÃO MENSAL LÍQUIDA, COMPROMETENDO A SUA DIGNIDADE E SUBSISTÊNCIA PESSOAL E VEDANDO-LHE O ACESSO A VALORES INDISPENSÁVEIS À SUA SOBREVIVÊNCIA.
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
CONSIGNADOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO A
35
% E LANÇAMENTOS A DÉBITO DIRETO DE EMPRÉSTIMOS NÃO CONSIGNADOS NA CONTA-CORRENTE DA AUTORA-AGRAVANTE A 30% DA SUA REMUNERAÇÃO MENSAL LÍQUIDA. REFORMA PARCIAL DA DECISÃO RECORRIDA, COM RESTRIÇÃO DOS SEUS EFEITOS, ATINGINDO TAMBÉM OS DÉBITOS NÃO CONSIGNADOS, COM
LIMITAÇÃO
A 30% DA REMUNERAÇÃO DA AUTORA-AGRAVADA. 6. NO CASO CONCRETO, PORTANTO, IMPENDE MANTER A DECISÃO RECORRIDA QUANTO À
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
CONSIGNADOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, EXCLUSIVAMENTE EM RELAÇÃO AOS CONTRATOS CONSIGNADOS, E TAMBÉM AMPLIAR OS SEUS EFEITOS, PARA ESTABELECER A
LIMITAÇÃO
DOS DÉBITOS LANÇADOS EM CONTA-CORRENTE A 30% DA REMUNERAÇÃO LÍQUIDA, EXCLUSIVAMENTE EM RELAÇÃO AOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO NÃO CONSIGNADO. PRECEDENTES DO STJ E DO TJRS. 7. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE PROVIDO DE PLANO, COM FUNDAMENTO NO ART. 932, INC. VIII, DO CPC, COMBINADO COM O ART. 206, INC. XXXVI, DO RITJRS. RECURSO DESPROVIDO.M/AG 5.095 – S 24.03.2023 – P 126.(Agravo de Instrumento, Nº 51553675320228217000, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aymoré Roque Pottes de Mello, Julgado em: 24-03-2023)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. TUTELA DE URGÊNCIA. REVOGAÇÃO. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS CONSIGNADOS EM 40% DA REMUNERAÇÃO BRUTA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO INSS. MEDIDA PROVISÓRIA 1.006/2020, CONVERTIDA NA LEI Nº 14.131 DE 30.03.2021. CONFORME ENTENDIMENTO PACIFICADO PELO STJ, OS DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO DEVEM OBEDECER AO PATAMAR DE 30% SOBRE A REMUNERAÇÃO BRUTA DO CONSUMIDOR, INCLUSIVE SOBRE PROVENTOS DE PENSÃO E APOSENTADORIA. A LIMITAÇÃO PREVISTA NO ORDENAMENTO JURÍDICO TEM COMO FINALIDADE EVITAR O ENDIVIDAMENTO DESENFREADO E GARANTIR O MÍNIMO EXISTENCIAL AO SERVIDOR, ASSEGURANDO A SUA PRÓPRIA SUBSISTÊNCIA E A DA SUA FAMÍLIA, COROLÁRIO DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. NO CASO DE CONSIGNAÇÕES EFETUADAS EM FOLHA DE PAGAMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO INSS, APÓS 30.03.2021, OS DESCONTOS CONSIGNADOS NÃO PODEM ULTRAPASSAR O LIMITE DE 40% DA RENDA MENSAL DO BENEFÍCIO DA PARTE SEGURADA, SENDO ATÉ 35% PARA AS OPERAÇÕES DE EMPRÉSTIMO PESSOAL, E ATÉ 5% PARA AS OPERAÇÕES DE CARTÃO DE CRÉDITO, CONFORME A MEDIDA PROVISÓRIA 1.006/2020, CONVERTIDA NA LEI Nº 14.131 DE 30.03.2021. NA ESPÉCIE, OS DESCONTOS CONSIGNADOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO INSS NÃO ULTRAPASSAM O LIMITE LEGAL DE 40% DA REMUNERAÇÃO BRUTA. TUTELA DE URGÊNCIA REVOGADA. RECURSO PROVIDO. UNÂNIME.(Agravo de Instrumento, Nº 50005771420228217000, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Vescia Corssac, Julgado em: 30-03-2022)
Com efeito, a Lei n. 10.820/2003 trouxe o patamar dos
descontos em folha de pagamento ao montante de 35% (trinta e cinco por cento)
. Cabe destacar que, nos termos do Art. 1º, §1º da Lei 10.820/2003, dentre o limite de 35% (trinta e cinco por cento) estipulado para o desconto em folha de pagamento, 5% (cinco por cento) deveriam ser destinados exclusivamente para a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito ou a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito.
Todavia, importa consignar que tais limites restaram alterados, acrescendo-se 5% aos percentuais máximos para contratação até então estipulados, consoante a Lei n. 14.131/2021
1
, a qual converteu a Medida Provisória 1.006/2020, autorizando-se, assim,
consignações de até 40%
quando existente contratação de cartão de crédito:
Art. 1º Até 31 de dezembro de 2021, o percentual máximo de consignação nas hipóteses previstas no
inciso VI do
caput do art. 115 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991
, no
§ 1º do art. 1º
e no
§ 5º do art. 6º da Lei nº 10.820, de 17 de dezembro de 2003
, e no
§ 2º do art. 45 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990
, bem como em outras leis que vierem a sucedê-las no tratamento da matéria, será de 40% (quarenta por cento), dos quais 5% (cinco por cento) serão destinados exclusivamente para:
I - amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou
II - utilização com finalidade de saque por meio do cartão de crédito.
DO CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE - DECRETO 11.567/2023
A leitura do Decreto n.11.567, de 19 de junho de 2023, confrontou o superprincípio da dignidade da pessoa, cuja função precípua era conferir-lhe unidade material.
6
Nessa senda, o princípio da dignidade atua como fundamento à proteção do consumidor superendividado e criador do direito ao mínimo existencial, cuja previsão infraconstitucional foi sedimentada pelo Poder Legislativo na Lei n.14.181/21, que atualizou o Código de Defesa do Consumidor, instalando um microssistema de crédito ao consumo.
Para além da redação do regulamento determinado no Código do Consumidor atualizado, artigo 6
o
, XI, a eficácia horizontal direta dos direitos fundamentais nas relações privadas para a preservação da dignidade da pessoa era avanço doutrinário e jurisprudencial pátrios já reconhecidos, a partir da previsão do art. 5
o
, parágrafo 1
o
da CF/88.
7
A respeito da vigência do Decreto em apreço, duas demandas pendem de julgamento no STF, respectivamente, a ADPF 1.005 e a ADPF 1.006, sob o fundamento da inconstitucionalidade do conteúdo, cuja fundamentação encontra coro na doutrina brasileira e Notas Técnicas elaboradas pelo Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor(Brasilcon), firmada pelo seu diretor-presidente (membro do Ministério Público e professor) Fernando Rodrigues Martins, e do Instituto de Defesa Coletiva, de Belo Horizonte, respectivamente publicadas em 27/7/2022 e 29/7/2022. Afinal, a garantia de R$ 600,00 (seiscentos reais) a qualquer família brasileira, sem considerar a situação sócio-econômica e individualizar as necessidades que comportam as despesas básicas de sobrevivência não representa interpretação harmônica com os valores constitucionais.
Pelo exposto, passo à análise do caso concreto,
sem incidência do Decreto n.11.567/2023, em controle difuso de constitucionalidade.
DA NÃO INCIDÊNCIA DO TEMA 1085 DO STJ:
O fato narrado na inicial apresenta descontos em folha de pagamento, com subsunção aos limites contidos na Lei 10.820/03, assim como descontos realizados diretamente na conta-corrente do consumidor, por força da possível pactuação como forma de pagamento decorrente de cláusula contratual. No ponto, esta última modalidade de desconto foi apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, resultando na formação da tese repetitiva n. 1085, com reconhecimento da ausência de analogia capaz de limitar o percentual de desconto em conta-corrente preponderando a autonomia da vontade das partes.
Contudo, o suporte fático descrito não apresenta, salvo melhor juízo, identidade de fundamentos com aquele que motivou a formação da tese repetitiva em comento, porquanto evidenciado que a globalidade das obrigações existentes apresentam como pano de fundo o superendividamento do consumidor, comprometendo o mínimo existencial, direito básico tutelado pelo artigo 6
o
, XI e XII, ambos do Código de Defesa do Consumidor, como outrora tivemos a oportunidade de diferenciar:
“A tese repetitiva proferida pelo STJ foi ao encontro da teoria dos contratos, no berço da autonomia da vontade, na
pacta sunt servanda
, aplicando todo o arcabouço de uma relação contratual sadia, celebrada e executada dentro da normalidade, sem patologia ou necessidade especial das partes envolvidas; é o desconto de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente de correntistas/consumidores saudáveis, os quais se encontram em condições de manter o pagamento das suas contas básicas, como luz, água e alimentação.
Situação diametralmente oposta são dos correntistas/consumidores superendividados, que buscam no Poder Judiciário a reorganização dos descontos efetuados tanto no contracheque como na conta-corrente sob o fundamento do excesso de descontos em detrimento da preservação do mínimo existencial. Neste cenário vem demonstrados descontos acima do limite legal e extrato bancário com saldo negativo, pois todo o valor líquido depositado em sua conta-corrente está sendo utilizado para pagamento de empréstimos bancários comuns, juros do cheque especial, seguro, entre outros. Nas hipóteses relatadas, verifica-se a diversidade do suporte fático daquele submetido à apreciação no julgado que ensejou a formação do convencimento na tese repetitiva nº. 1085, uma vez que não se estava diante de consumidor superendividado, sujeito destinatário da norma que introduziu no país a concreção da dignidade da pessoa com a preservação do mínimo existencial. Aliás, insta destacar, mínimo existencial já assegurado na fase da formação do contrato, quando da análise da capacidade de reembolso pelo concedente de crédito, de acordo com a inteligência do artigo 54-D do Código atualizado. Daí a interpretação sobre a necessidade de limitação dos descontos em conta-corrente quando evidenciada situação de superendividamento do consumidor.” (
A repactuação de dívidas do consumidor superendividado e os descontos bancários em conta-corrente, BERTONCELLO, Káren R. D.; RANGEL, Andréia Fernandes de Almeida. Extrato texto encaminhado para publicação no CONJUR, novembro/2022)
Em vista disso, com base no artigo 300, do Código de Processo Civil,
DEFIRO parcialmente a tutela de urgência
a fim de determinar que:
a) A parte
ré LIMITE
os descontos relativos a todos os empréstimos consignados com desconto em folha de pagamento e empréstimos não consignados com débito automático na conta-corrente da parte autora ao percentual máximo de
35% dos proventos desta (abatidos os valores da previdência, IRPF e pensão alimentícia)
,
percentual que pode ser acrescido de
5%, em se tratando de dívida de cartão de crédito cujo pagamento decorre de débito em conta;
b) No caso em discussão,
esta limitação também se aplica aos descontos no cheque especial
, dividindo-se o percentual entre todos os credores demandados até elaboração do plano de pagamento ao final do processo.
c) Outrossim, DETERMINO que o (os) credor (res) se
abstenha(m) de incluir a parte autora nos cadastros restritivos de crédito ou emitir títulos para fins de protesto
, enquanto pendente a lide. Caso já o tenham feito, seja SUSPENSO o efeito da restrição.
Advirto que:
A tutela de urgência compreende, em cognição sumária, o restabelecimento do mínimo existencial ao consumidor que detem descontos em folha e/ou conta-corrente em percentuais que comprometam sua sobrevivência, na forma da fundamentação supra.
Daí por que NÃO
abrange eventuais obrigações pendentes, cujo pagamento deva ser efetuado mediante boleto bancário ou outra forma de pagamento voluntária.
Ademais, saliento que a presente decisão
NÃO
abrange
contratos com garantia real e/ou alienação fiduciária
, visto que não apresentam identidade com os pressupostos contidos no artigo 54-A do CDC.
Ainda,
INDEFIRO
a
suspensão indiscriminada de ações ou atos de constrição patrimonial
, ante a impossibilidade de determinação genérica e desprovida de fundamentação.
Fica a parte demandada CIENTIFICADA sobre a impossibilidade de proceder a cobranças
de forma abusiva
.
Fica a parte demandante CIENTIFICADA sobre a
vedação da prática de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento
, sob pena de REVOGAÇÃO DA TUTELA AQUI DEFERIDA.
DO CUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL
O DESCUMPRIMENTO desta decisão judicial importará incidência de multa de R$ 500,00 por cada desconto indevido até o limite da dívida pendente. Saliento que a presente decisão, deverá ser cumprida no prazo máximo de 30 dias. A data inicial de contagem do prazo do descumprimento iniciará do protocolo de entrega do ofício/despacho.
Esta decisão vale como ofício, que deverá ser encaminhado pela parte autora.
DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
Ficam os credores réus intimados a juntar aos autos cópia dos contratos firmados entre as partes e
extratos bancários em formato XLS
, caso ainda não o tenham feito, em face da inversão do ônus da prova em favor da parte autora que, desde já determino, nos termos do disposto no artigo 6°, inciso VIII do CDC.
DA INDICAÇÃO DAS DESPESAS DE SUBSISTÊNCIA
Outrossim, intimo a parte autora para que anexe aos autos comprovantes das despesas de subsistência (alimentação, luz, água, etc.), tendo em vista que serão objeto de análise quando da segunda fase do procedimento.
Tratando-se de Juízo 100% Digital e em atenção aos princípios da celeridade e eficiência, as respostas remetidas por carta não serão anexadas ao processo.
Por fim, cabe ressaltar que o sistema E-proc disponibiliza, no menu principal, a opção substabelecimento com reserva ou sem reserva, viabilizando ao procurador a atualização do cadastro de advogados, para recebimento de intimações,
sendo de responsabilidade do procurador tal gerenciamento e cadastro dos profissionais
, na forma do art. 2º da Lei 11.419/2006.
Sendo a parte Entidade, a retificação/alteração dos procuradores cabe apenas à própria, em atualização cadastral, ou ao procurador.
Para maiores informações sobre o rito da Lei n. 14.181/2021, destaco a leitura da Cartilha sobre Superendividamento do Conselho Nacional de Justiça -
CARTILHA SOBRE O TRATAMENTO DO SUPERENDIVIDAMENTO DO CONSUMIDOR
Nas razões recursais, ao
evento 1, INIC1
, após síntese dos fatos,
sustenta que a decisão que deferiu tutela de urgência, ao limitar os descontos em conta corrente da parte autora ao percentual de 35% de seus rendimentos líquidos e vedar sua inscrição nos cadastros de inadimplentes, padece de ilegalidade, por ausência de respaldo normativo específico. Argumenta que o juízo a quo aplicou indevidamente, por analogia, disposições da Lei nº 10.820/2003 — relativas a empréstimos consignados em folha de pagamento — a contratos de mútuo com débito em conta corrente, em afronta à jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.500.846/DF e Tema 1.085). Alega, ainda, que a medida imposta compromete o equilíbrio contratual, viola a autonomia privada e restringe o exercício regular do direito de crédito. Assevera que a parte autora não comprovou os requisitos legais para ser enquadrada como consumidora superendividada, nos termos da Lei nº 14.181/2021, especialmente quanto à boa-fé objetiva e à demonstração de comprometimento do mínimo existencial, conforme os parâmetros do Decreto nº 11.150/2022. No tocante à vedação de negativação, aduz que não foram preenchidos os pressupostos cumulativos exigidos pela jurisprudência para a sua concessão. Por fim, quanto à multa cominatória fixada em R$ 500,00 por desconto indevido, sustenta sua inexigibilidade diante da ausência de intimação pessoal prévia, nos termos da Súmula 410 do STJ, além de reputar o valor arbitrado como desproporcional, ensejando enriquecimento sem causa. Diante disso, requer a concessão de efeito suspensivo ao presente recurso, com a consequente revogação da decisão agravada.
Vieram-me os autos conclusos.
É o relatório.
Conheço do recurso, pois preenchidos os requisitos de admissibilidade, constituindo hipótese de cabimento, à luz do disposto no artigo 1.015, inciso I, do CPC
1
.
Passo ao julgamento monocrático, com fulcro no enunciado da súmula 568 do egrégio STJ
2
, e no artigo 206, XXXVI do RITJRS
3
, tendo em vista que a matéria devolvida à apreciação desta corte apresenta entendimento dominante, tendo sido objeto de diversos recursos, encontrando solução unânime frente a este órgão julgador.
Ademais, cumpre salientar que o sistema recursal vigente autoriza ao relator julgar monocraticamente a matéria, em virtude da delegação outorgada pelo órgão colegiado, quando esta encontre, como no caso, posicionamento uníssono acerca da controvérsia jurídica estabelecida.
A controvérsia recursal reside no deferimento da tutela de urgência em favor da parte autora.
Superendividamento. Tutela de urgência.
A tutela de urgência no Código de Processo Civil está prevista no artigo 300
4
, sendo requisitos para a sua concessão a presença de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
Sobre o tema, comentam Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero
5
:
A probabilidade que autoriza o emprego da técnica antecipatória para a tutela dos direitos é a probabilidade lógica – que é aquela que surge da confrontação das obrigações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, sendo provável a hipótese que encontra maior grau de confirmação e menor grau de refutação nesses elementos. O juiz tem que se convencer de que o direito é provável para conceder tutela provisória.
No caso concreto, verifica-se o preenchimento dos requisitos acima indicados em favor da parte agravada.
A parte autora ajuizou a presente ação com base na Lei 14.181/2021, que trata do superendividamento.
O artigo 104-A
6
da Lei 14.181/2021 prevê uma fase extrajudicial, com a realização de audiência conciliatória, na presença de todos os credores, oportunidade em que o consumidor deverá apresentar a proposta de pagamento de suas dívidas.
Destaca-se que, de acordo com referida lei, a fase processual, prevista no artigo 104-B
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, só deverá ocorrer caso sem êxito a audiência de conciliação do artigo 104-A.
A cartilha sobre o tratamento do superendividamento do consumidor elaborada pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ
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, trata do sistema binário previsto na lei em discussão, nos seguintes termos:
Embora obrigatória a fase pré-processual, não há impedimento que o pedido de tutela de urgência seja apreciado antes do referido ato, desde que seja assegurado na origem a realização da audiência conciliatória antes do início da fase processual.
O rito previsto na Lei n.º 14.181/2021 deve ser respeitado pelos sujeitos do processo, em que pese a situação financeira do consumidor.
O conceito de superendividamento está previsto no artigo 54-A da Lei 14.181/2021
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como sendo
a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.
Não há como desprezar as particularidades da ação proposta, que envolve a proteção do mínimo existencial do consumidor e a dignidade da pessoa humana
10
, tampouco o disposto na Constituição Federal que assegura a todos os cidadãos direitos sociais
11
, dentre os quais estão a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho e a moradia.
Acrescenta-se, ainda, que Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro
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prevê em seu artigo 5º que
na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
Já o Código de Processo Civil
13
dispõe sobre a possibilidade da concessão da tutela de urgência cautelar ou antecipada, em caráter antecedente.
Tratando do ponto, cita-se a lição de Humberto Theodoro Júnior
14
:
Dispõe o art. 294, parágrafo único, do NCPC, que "tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental". O legislador não prefixou, rigidamente, o momento adequado para a tutela de urgência. Nada impede, portanto, que seja postulada na inicial, cabendo ao juiz apreciá-la antes ou depois da citação do réu - "liminarmente ou após justificação prévia" (art. 300, § 2º ) - , conforme sua maior ou menor urgência.
É possível, ainda, que a urgência seja contemporânea à propositura da ação e que o autor não tenha condições para elaboração de petição inicial completa ou lhe falte interesse imediato numa composição exauriente do litigio. Nessas situações, no novo Código permite que o requerente, num primeiro momento, limite-se "ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo " (art. 303).
Oportuno frisar que a tutela de urgência é fundada em cognição sumária, podendo ser revogada ou alterada a qualquer tempo
15
.
Assim, revendo em parte posicionamento, especialmente, por ter observado alteração de entendimento na origem, com decisões individualizadas, primando pelo cumprimento do rito previsto na Lei n.º 14.181/2021, entendo que deve ser mantida a decisão atacada.
O juízo de origem limitou os descontos na folha de pagamento da parte agravada em 35% sobre os rendimentos; e a parte agravante se insurge contra a decisão que concedeu a tutela sustentando que os contratos foram firmados contemplando os interesses de ambas as partes, não encontrando justificativa para a irresignação que se extrai da petição inicial. Acrescenta, ainda, a inexistência de comprovação da situação de superendividamento da parte consumidora.
Não merece amparo tais alegações.
A ação de repactuação de dívida engloba todos os compromissos financeiros assumidos pelo consumidor decorrentes de relação de consumo, com exceção dos previstos no artigo 54-A, § 3º, do CDC
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, e as dívidas são analisadas de forma global e não individualizada.
Analisando os contracheques ao
evento 8, CHEQ4
verifica-se que a parte autora aufere mensalmente a quantia bruta de R$ 14.793,15, resultado da soma dos vencimentos municipais e estaduais que recebe, sendo descontado de suas folhas de pagamento os seguintes valores a título de empréstimos, totalizando a quantia de R$ 4.243,74:
A parte consumidora ainda informa na inicial que possui contratos de empréstimos com desconto em conta-corrente, bem como despesas com cartão de crédito e seguro, dentre outros descontos, comprometendo ainda mais o seu sustento e de sua família:
Vale frisar que o agravado, no caso, especificou seus gastos básicos na inicial, demonstrando que os descontos vem causando prejuízo à sua manutenção.
Outrossim, em que pese a parte agravante sustente que é descabida a limitação dos descontos diretamente em conta-corrente, esta Corte entende que o Tema 1.085 do Superior Tribunal de Justiça não se aplica ao caso concreto, pois a pretensão aqui tem por fundamento a condição de
superendividamento
, com rito especial especificado em lei própria (Lei nº 14.181/21), diferenciando-se, assim, do paradigma.
Nesse sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO
. DECISÃO QUE DEFERIU A LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EM TUTELA DE URGÊNCIA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO POR VIOLAÇÃO AO ART. 489, §1º, III, DO CPC: A decisão agravada apresenta fundamentos que são coerentes e se conectam diretamente com o caso concreto, observando suas particularidades, de modo que não há nulidade a ser reconhecida. POSSIBILIDADE DO DEFERIMENTO DA TUTELA ANTES DA AUDIÊNCIA CONCILIATÓRIA: Uma vez instaurado o processo, não há obstáculo legal ao deferimento da tutelas antecipatória que, no caso concreto, se deu como meio de assegurar a perfeita eficácia da função jurisdicional e a proteção do consumidor em situação de
superendividamento
. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA MEDIDA: A decisão agravada afastou a incidência do Decreto n.11.567/2023, em controle difuso de constitucionalidade, e se valeu das disposições da Lei n. 10.820/2003 e da Lei n. 14.131/2021 para fundamentar que a ocorrência de descontos em patamar superior a 35% da renda do consumidor comprometeria o seu mínimo existencial. Esse critério vem sendo aceito por esta Câmara no âmbito das ações de repactuação de dívidas, pelo que está presente a probabilidade do direito e a urgência para justificar a concessão da medida, ainda que a parte agravada tenha renda líquida superior a R$ 600,00.
LIMITAÇÃO DE DESCONTOS PARA SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL: Ainda que o empréstimo tenha sido contratado por servidor público estadual, possível a limitação dos descontos no patamar de 35%, considerando a ausência de antinomia entre a norma Estadual e Federal, bem como por se tratar de decisão proferida no âmbito de ação de repactuação de dívidas por
superendividamento
, a qual clama pela observância de critérios específicos e possibilita mesmo a imposição de um plano judicial compulsório caso necessário. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EFETUADOS EM CONTA-CORRENTE: O
Tema
1085/STJ
não se aplica aos contratos discutidos no âmbito de ação de repactuação de dívidas por
superendividamento
, a qual clama pela observância de critérios específicos e possibilita mesmo a imposição de um plano judicial compulsório caso necessário, de modo que é possível a limitação dos descontos efetuados na conta-corrente da parte agravada
. PROLONGAMENTO DAS PARCELAS: O pedido para que seja autorizado o prolongamento das parcelas em razão da limitação nos descontos não comporta conhecimento, sob pena de violação ao duplo grau de jurisdição, pois tal pleito não foi objeto de apreciação pelo juízo a quo. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 51730339620248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto José Ludwig, Julgado em: 04-07-2024) Grifei
SUPERENDIVIDAMENTO
. SERVIDOR PÚBLICO DO ESTADO. 1. PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO POR VIOLAÇÃO AO ART. 489, §1 º, INCISO III, DO CPC. INOCORRÊNCIA. A decisão agravada apresenta fundamentos que são coerentes e se conectam diretamente com o caso concreto, observando suas particularidades, de modo que não há nulidade a ser reconhecida. 2. PRELIMINAR DE ANULAÇÃO DA DECISÃO POR SUPRESSÃO DA FASE DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA. DESCABIMENTO. A decisão de primeiro grau não desconsiderou a obrigatoriedade da audiência de conciliação ao analisar o pedido de tutela de urgência, apenas assegurou a preservação do mínimo existencial e o resultado útil do processo. 3. PRELIMINAR DE PROCEDIMENTO INCOMPATÍVEL. REJEIÇÃO. O regramento para suspensão e tratamento do
superendividamento
foi inserido no Código de Defesa do Consumidor pela Lei 14.181/21, acrescentando o art. 54-A. No caso, o juízo se valeu das disposições da Lei n. 10.820/2003 e da Lei n. 14.131/2021 para fundamentar que a ocorrência de descontos em patamar superior a 35% da renda do consumidor comprometeria o seu mínimo existencial. 4. INCIDÊNCIA DA MARGEM CONSIGNÁVEL PREVISTA EM LEI FEDERAL. LIMITAÇÃO EM 35% DOS RENDIMENTOS LÍQUIDOS. NECESSIDADE DE SE ASSEGURAR UM MÍNIMO INDISPENSÁVEL À SUBSISTÊNCIA DO CONSUMIDOR EM SITUAÇÃO DE
SUPERENDIVIDAMENTO
. A questão já foi enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça, que entendeu pela ausência de antinomia entre as normas Estadual e Federal, entendendo pela imposição da limitação de 30% (que, atualmente, é de 35%), sob pena de violação ao princípio da dignidade da pessoa humana. 5.
SUSPENSÃO OU LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EM CONTA CORRENTE. POSSIBILIDADE. Diante do contexto fático-probatório apresentado na hipótese, e considerando especialmente a natureza alimentar do salário e a necessidade de se assegurar um mínimo indispensável à subsistência do consumidor em situação de
superendividamento
, entende-se cabível a limitação dos descontos dos rendimentos percebidos pela parte autora.
Tema
1085
do STJ inaplicável na hipótese, diante do procedimento de
superendividamento
. Precedentes desta Câmara.
6. PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO PARA PROLONGAR PARCELAS. Matéria que deve ser discutida no juízo de origem na definição do plano de pagamento. RECURSO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 50886586520248217000, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Clovis Moacyr Mattana Ramos, Julgado em: 26-06-2024) Grifei
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS.
SUPERENDIVIDAMENTO
. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
TUTELA
DE URGÊNCIA DEFERIDA. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS. PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS DO ART. 300 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. LEI FEDERAL N.° 14.131/2021. ANTECIPAÇÃO DE
TUTELA
. DESCONTOS QUE TOTALIZAM 78,54% DA REMUNERAÇÃO LÍQUIDA DA PARTE RECORRIDA, RESTA CARACTERIZADA, AO MENOS EM SEDE DE COGNIÇÃO SUMÁRIA, SITUAÇÃO FINANCEIRA EXTREMADA, A AUTORIZAR A CONCESSÃO DA
TUTELA
DE URGÊNCIA.
AFASTADA A APLICABILIDADE, NO PONTO, DO ENTENDIMENTO DO STJ SOB O
TEMA
N.º
1085
, BEM COMO O DISPOSTO NO DECRETO ESTADUAL N.º 43.337/04, POIS COMPROMETERIAM A DIGNIDADE E A SUBSISTÊNCIA DA AGRAVADA. POR FIM, MANTIDAS ASTREINTES DE R$ 500 POR EVENTO (POR DESCONTO INDEVIDO), ATÉ O LIMITE DA DÍVIDA PENDENTE.
AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 50842962020248217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Augusto Guimaraes de Souza, Julgado em: 21-06-2024) Grifei
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO
. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. SUSPENSÃO DOS
DESCONTOS
. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC E DA LEI Nº 14.181/21. HIPÓTESE EM QUE A AÇÃO PROPOSTA PELA PARTE AUTORA TEM LASTRO NA LEI Nº 14.181/21, QUE PROMOVEU ALTERAÇÕES SIGNIFICATIVAS NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, INTRODUZINDO DISPOSIÇÕES A RESPEITO DA PREVENÇÃO E DO TRATAMENTO DO
SUPERENDIVIDAMENTO
NO CONTEXTO DAS RELAÇÕES DE CONSUMO, VISANDO PRECIPUAMENTE AO PAGAMENTO DE DÍVIDAS EM CONDIÇÕES MAIS FAVORÁVEIS AO CONSUMIDOR
SUPERENDIVIDADO
, A SEREM PREVIAMENTE DEBATIDAS ENTRE AS PRÓPRIAS PARTES INTEGRANTES DAS RELAÇÕES OBRIGACIONAIS. EMBORA A LEI 14.181/21 ESTABELEÇA A REALIZAÇÃO DE UMA ETAPA CONCILIATÓRIA PRÉVIA AO PROCESSO JUDICIAL, TAL CIRCUNSTÂNCIA, POR SI SÓ, NÃO OBSTA QUE O CONSUMIDOR PLEITEIE O DEFERIMENTO DE ALGUMA MEDIDA DE URGÊNCIA, CUJO DEFERIMENTO FICARÁ CONDICIONADO AO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC. NO CASO DOS AUTOS, AO MENOS EM JUÍZO DE COGNIÇÃO SUMÁRIA, VERIFICA-SE QUE OS
DESCONTOS
PROVENIENTES DOS EMPRÉSTIMOS QUESTIONADOS, CALCULADOS SOBRE O MONTANTE LÍQUIDO PERCEBIDO PELA PARTE AUTORA, IMPLICAM PREJUÍZO À GARANTIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL, SENDO POSSÍVEL INFERIR QUE A PARTE AGRAVADA SE ENQUADRA NA DEFINIÇÃO LEGAL DE CONSUMIDOR
SUPERENDIVIDADO
PREVISTA NAS ALTERAÇÕES PROMOVIDAS NO CDC. CONTEXTO QUE TAMBÉM ATRAI A URGÊNCIA PARA A CONCESSÃO DA TUTELA PROVISÓRIA RELATIVA À LIMITAÇÃO DOS
DESCONTOS
NA FORMA PLEITEADA.TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA MANTIDA. LIMITAÇÃO DE
DESCONTOS
EFETUADOS EM CONTRATOS NA MODALIDADE NÃO CONSIGNADOS.
EMBORA O ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUANTO AO TEMA 1.085, ACERCA DA "APLICABILIDADE OU NÃO DA LIMITAÇÃO DE 30% PREVISTA NA LEI N. 10.820/2003 (ART. 1º, § 1º), PARA OS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS LIVREMENTE PACTUADOS, NOS QUAIS HAJA PREVISÃO DE
DESCONTO
EM
CONTA
CORRENTE
, AINDA QUE USADA PARA O RECEBIMENTO DE SALÁRIO", NA HIPÓTESE PRESENTE, HÁ EVIDENTE DISTINÇÃO ENTRE O CASO CONCRETO (EM JULGAMENTO) E O
PARADIGMA. A PRETENSÃO DE LIMITAÇÃO DOS
DESCONTOS
TEM POR FUNDAMENTO A CONDIÇÃO DE
SUPERENDIVIDAMENTO
, QUE TEM RITO ESPECIAL ESPECIFICADO EM LEI PRÓPRIA (LEI Nº 14.181/21). NECESSÁRIA PRESERVAÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. APLICAÇÃO DA LIMITAÇÃO A TODOS OS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS,
DESCONTO
EM FOLHA DE PAGAMENTO E DÉBITO AUTOMÁTICO, NA
CONTA
DA PARTE AUTORA
, DE VALORES ATÉ 35% DOS SEUS PROVENTOS (ABATIDOS OS VALORES DA PREVIDÊNCIA E DO IRPF), DIVIDINDO-SE O PERCENTUAL ENTRE TODAS AS DEMANDADAS ATÉ ELABORAÇÃO DO PLANO DE PAGAMENTO AO FINAL DO PROCESSO. ASTREINTES. NATUREZA COERCITIVA. CABIMENTO. NECESSIDADE DE CONFERIR EFETIVIDADE À MEDIDA JUDICIAL. NO CASO, A MULTA POR DESCUMPRIMENTO DA ORDEM SE MOSTRA ADEQUADA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. MANTIDO O VALOR FIXADO NA DECISÃO RECORRIDA. RECURSO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento, Nº 51945976820238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em: 14-06-2024) Grifei
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO
. TUTELA DE URGÊNCIA. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E CONTA CORRENTE. POSSIBILIDADE. MARGEM CONSIGNÁVEL. ABATIMENTO DOS DESCONTOS OBRIGATÓRIOS. READEQUAÇÃO DAS PARCELAS. ORDEM CRONOLÓGICA DOS CONTRATOS. ASTREINTES. MANUTENÇÃO. 1. Da limitação dos descontos em folha de pagamento e conta-corrente. Em relação à limitação dos descontos realizados em folha de pagamento, é pacífico o entendimento de que deve observar o patamar de 30% (que, atualmente, é de 35%) sobre a remuneração bruta do consumidor, não havendo colidência com o Decreto Estadual nº 43.337/04.
Quanto à limitação dos empréstimos debitados em conta-corrente, em que pese o entendimento esposado no
Tema
1.085
do eg. STJ, cabível a limitação dos descontos, tendo em vista o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da garantia ao mínimo existencial.
2. Da base de cálculo para fixação da margem consignável. Para limitação da margem consignável, deve ser observada a renda mensal bruta do consumidor, abatidos os descontos obrigatórios, consoante jurisprudência do eg. STJ. 3. Da ordem cronológica dos contratos. A fim de privilegiar os débitos mais antigos, a readequação das parcelas deverá observar a ordem cronológica das contratações. 4. Das astreintes. A discussão sobre o valor e a periodicidade da multa diária é inócua no cenário de regular cumprimento da ordem judicial. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. (Agravo de Instrumento, Nº 53562378020238217000, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Pedro Cavalli Junior, Julgado em: 24-04-2024) Grifei
Ademais, os descontos oriundos dos contratos de cartão de crédito, cheque especial e empréstimo não consignado não se enquadram na exceção prevista no artigo 54-A, § 3º, do CDC
17
, portanto, devem ser considerados na análise do superendividamento.
Por outro lado, a parte agravante sustenta que a margem consignável da parte consumidora sobre o valor da renda bruta está sendo respeitada, contudo, desconsidera que o entendimento assentado é de que o limite se aplica sobre a renda bruta menos os descontos obrigatórios, previdência e imposto de renda, no percentual de 35%.
Assim, feitas tais considerações, mantenho a decisão agravada.
Multa
O artigo 77, parágrafo 2º do Código de Processo Civil
18
, ao tratar dos deveres das partes, possibilita a fixação de multa para o caso de descumprimento das decisões provisórias ou definitivas.
Já o artigo 537, parágrafo 1º, do mesmo diploma legal, assim dispõe sobre a multa:
Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.
§ 1º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que:
I - se tornou insuficiente ou excessiva;
II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.
Sobre a multa e sua aplicabilidade, destaca-se o magistério de Humberto Theodoro Júnior
19
:
Tem-se como mandamental a decisão que sujeita a parte a cumpri-la, de plano, sob pena de emprego de medidas judiciais de coerção para efetivá-la, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis (CPC/2015, art. 77, § 2º). O ato judicial se apresenta como autoexecutivo, ou seja, seu cumprimento imediato se impõe, por decorrência da força da própria decisão, sem depender de ação ou procedimento executivo comum.
O caráter injuncional (mandamental) é inerente às medidas de tutela de urgência e da evidência. Seu papel consiste, precisamente, em buscar a máxima efetividade da prestação jurisdicional, eliminando ou minimizando os efeitos da inevitável demora da solução definitiva da lide. Por isso mesmo a imposição das medidas provisórias não se faz por meio do sistema comum condenatório, mas através de ordem (comando) judicial a ser imediatamente acatada, sob pena de configurar uma intolerável violação à dignidade da Justiça.
Essa ofensa, a que o direito processual anglo-saxônico denomina contempt of court, a par do emprego de medidas de força para compelir o obrigado ao cumprimento da ordem da autoridade judiciária, acarreta-lhe, entre outras, sanções econômicas, dentre as quais as astreintes e a sujeição à reparação do dano sofrido pela contraparte sem excluir as sanções derivadas diretamente do atentado à dignidade da justiça.
As astreintes são multas progressivas pelo atraso (mora) no cumprimento de obrigações de fazer ou não fazer e de entrega de coisa (art. 536, § 1º), aplicáveis tanto nas decisões provisórias como nas definitivas e nos atos da execução forçada (art. 537). Há, outrossim, multa moratória fixa, cabível no cumprimento de sentença relativa a obrigação de pagar quantia certa (art. 523, § 1º). As multas pelos atos atentatórios à dignidade da justiça (como os de descumprimento dos mandados oriundos da tutela urgente ou evidente) (art. 77, § 2º), são aplicáveis, sem prejuízo das sanções moratórias (fixas ou progressivas) cabíveis na execução forçada dos títulos judiciais definitivos (art. 77, § 4º).
É que a natureza e função das multas são muito diferentes: (i) as moratórias levam em conta o prejuízo sofrido pela parte afetada pelo retardamento do devedor no cumprimento da obrigação prevista na decisão judicial; (ii) enquanto a do descumprimento da ordem mandamental do juiz se funda no atentado cometido contra a dignidade do própria justiça, do qual podem surgir, até mesmo, sanções que ultrapassam a multa aplicável no processo em que ocorreu o contempt of court, ensejando “reprimenda nas esferas civil, penal, administrativa e processual”.
No caso em análise, a multa restou arbitrada em R$ 500,00 por desconto indevido até o limite da dívida.
A periodicidade foi fixada mensalmente, de modo que o valor em discussão se mostra incapaz de gerar enriquecimento ilícito à parte favorecida.
A natureza da multa é coercitiva e não indenizatória e sua fixação deve observar o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, o que ocorreu no caso em análise.
Nessa linha:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS COM BASE NA LEI DO SUPERENDIVIDAMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA PARA DETERMINAR A LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS, BEM COMO QUE A REQUERIDA SE ABSTENHA DE INSCREVER O AUTOR NOS CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO. 1. ARTIGO 300 DO CPC. SÃO REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA, A PROBABILIDADE DO DIREITO ALEGADO PELA PARTE (FUMUS BONI IURIS) E O PERIGO DE DANO OU O RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO (PERICULUM IN MORA). 2. CONFORME ENTENDIMENTO ADOTADO PELA PRESENTE CÂMARA CÍVEL, OS DESCONTOS REFERENTES AOS CONTRATOS FIRMADOS APÓS A EDIÇÃO DA LEI N.º 14.131/21 NÃO DEVEM SUPERAR O PERCENTUAL DE 35% DOS PROVENTOS AUFERIDOS PELO CONSUMIDOR, ACRESCIDOS DE MAIS 5% SE EXISTIREM DESCONTOS ORIUNDOS DE CARTÃO DE CRÉDITO. 3. CASO NO QUAL A PARTE AUTORA REFERE A EXISTÊNCIA DE DÍVIDAS, QUE COMPROMETEM QUASE 64% DOS SEUS VENCIMENTOS MENSAIS. EVIDENCIADA SUFICIENTEMENTE A PROBABILIDADE DO DIREITO. 5. DESCONTOS DIRETAMENTE EM CONTRACHEQUE E CONTA-CORRENTE QUE PODERÃO IMPLICAR EM PREJUÍZO A SUBSISTÊNCIA DA PARTE AUTORA. DA MESMA FORMA, O REGISTRO DE SEU NOME EM CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO PODERÁ ACARRETAR PREJUÍZOS, PREJUDICANDO SEU CRÉDITO E, CONSEQUENTEMENTE, SUA SUBSISTÊNCIA. PERIGO DE DANO DEMONSTRADO. 6. AUSÊNCIA DE IRREVERSIBILIDADE DA MEDIDA. POSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS TAMBÉM EM CONTA-CORRENTE. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. MANUTENÇÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA. 7. TRATANDO-SE DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER, RESULTA VIÁVEL JURIDICAMENTE A IMPOSIÇÃO DE MULTA, NOS TERMOS DO ART. 537 DO CPC.VALOR DA MULTA QUE SE MOSTRA ADEQUADO AO CASO CONCRETO. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento, Nº 51675014420248217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Fabiana Zilles, Julgado em: 28-06-2024)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. Consoante o princípio da motivação todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário devem ser necessariamente motivados, sob pena de nulidade (art. 93, IX, da CF e art. 489 do CPC). No caso concreto, a decisão que analisou a tutela de urgência está suficientemente fundamentada. Preliminar rejeitada. SUPERENDIVIDAMENTO. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. A probabilidade do direito alegado associada ao perigo de dano ou ao risco ao resultado útil do processo são requisitos que devem ser preenchidos pelo consumidor em ruína para o deferimento da tutela provisória de urgência em ação de repactuação de dívidas por superendividamento. No caso concreto, com base nos elementos presentes na petição inicial acerca das dívidas de consumo, sobretudo na discriminação dos empréstimos consignados em folha de pagamento e dos empréstimos com débito em conta-corrente, em cotejo com o montante líquido percebido pela parte-autora, observa-se que há prejuízo à garantia do mínimo existencial e, por conseguinte, a subsistência do consumidor. Decisão mantida MULTA (ASTREINTES). VALOR DAS ASTREINTES. ADEQUAÇÃO. PERIODICIDADE. Tratando-se de obrigação de fazer e de não fazer, resulta viável juridicamente a imposição de multa em decisão interlocutória, podendo o juiz utilizar-se desta faculdade (arts. 536 e 537 do CPC). O valor da multa não pode acarretar o enriquecimento sem causa da parte a quem favorece, devendo ser observados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Sopesados os princípios supramencionados, verifica-se que a multa foi fixada e limitada em valores adequados, porquanto suficientes e compatíveis com a obrigação determinada. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 53720911720238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antonio Angelo, Julgado em: 21-06-2024)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. SUPERENDIVIDAMENTO. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA. LIMITAÇÃO DE DESCONTOS. PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS DO ART. 300 DO CPC. LEI FEDERAL N.° 14.131/2021. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. DESCONTOS QUE ATINGEM 81,38% DA REMUNERAÇÃO LÍQUIDA DO CORRENTISTA OU MUTUÁRIO. CARACTERIZADA, AO MENOS EM SEDE DE COGNIÇÃO SUMÁRIA, SITUAÇÃO FINANCEIRA EXTREMADA, A AUTORIZAR A CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA. AFASTADA A APLICABILIDADE, NO PONTO, DO ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STJ NO TEMA N.º 1085, BEM COMO DO DISPOSTO NO DECRETO ESTADUAL N.º 43.337/04, POIS COMPROMETERIA A DIGNIDADE E A SUBSISTÊNCIA DO AGRAVADO. MULTA COMINATÓRIA. O VALOR DEVE SER FIXADO COM MODERAÇÃO, NÃO INEXPRESSIVO, NEM EXAGERADO, DE MODO A CUMPRIR SUA FUNÇÃO PRIMORDIAL, NO SENTIDO DE OBRIGAR AO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. NO QUE RESPEITA À PERIODICIDADE, NO CASO, EXIBE-SE MAIS APROPRIADA A VINCULADA POR EVENTO (DE DESCUMPRIMENTO), E NÃO POR DIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 50287585420248217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Augusto Guimaraes de Souza, Julgado em: 21-06-2024)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. ART. 300 DO CPC. MULTA COERCITIVA POR EVENTO DE DESCUMPRIMENTO. 1. DISPÕE O ART. 300 DO CPC QUE A TUTELA DE URGÊNCIA SERÁ CONCEDIDA QUANDO HOUVER ELEMENTOS QUE EVIDENCIEM A PROBABILIDADE DO DIREITO E O PERIGO DE DANO OU O RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO. NO CASO EM APREÇO, ESTÁ DEMONSTRADA A SITUAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO, DE MODO QUE SE JUSTIFICA A TUTELA DE URGÊNCIA QUE LIMITOU OS DESCONTOS DECORRENTES DOS CRÉDITOS BANCÁRIOS CONTRATADOS PELA PARTE AUTORA, A FIM DE RESGUARDAR-LHE O MÍNIMO EXISTENCIAL, MODO A GARANTIR A SUA SUBSISTÊNCIA. MANTIDA A OBRIGAÇÃO DE ABSTENÇÃO DE INSCREVER O NOME DO AUTOR NO CADASTRO DE MAUS PAGADORES. 2. MULTA COERCITIVA POR EVENTO DE DESCUMPRIMENTO. FUNÇÃO DE FAZER CUMPRIR A DECISÃO. PODER GERAL DE CAUTELA DO JUIZ. PREVISÃO LEGAL. MANUTENÇÃO DA MEDIDA. VALOR DA MULTA FIXADO DE FORMA SUFICIENTE PARA PROMOVER A FINALIDADE COERCITIVA. PRAZO DE CUMPRIMENTO DE 30 DIAS QUE É ADEQUADO PARA A FINALIDADE COLIMADA. RECURSO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 53714546620238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Mylene Maria Michel, Julgado em: 14-06-2024)
Portanto, a multa deve ser mantida como forma de coação ao cumprimento da obrigação, pois eventual suspensão, redução ou mudança da periodicidade apenas retiraria o poder de eficácia da decisão agravada, sem prejuízo de eventual modificação oportunamente, nos termos do artigo 537, § 1º, do CPC.
Ante o o exposto, de plano, com fundamento no artigo 206, inciso XXXVI, do
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RITJRS, combinado com o artigo 932, inciso VIII, do CPC
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, nego provimento ao recurso, nos termos da fundamentação.
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. E N U N C I A D O Nº36Deverá constar, na notificação encaminhada aoscredores, a advertência de que o não comparecimentoinjustificado à audiência de conciliação ou a presençade procurador sem poderes especiais e plenos paratransigir acarretará a aplicação, por força de lei, dassanções previstas no art. 104-A, parágrafo 2º, do Códigode Defesa do Consumidor.ENUNCIADOS | CADERNO DE ENUNCIADOS 1 7Enunciado aprovado naassembleia realizada em14/04/2023, em BeloHorizonte/MG, no 13ºEncontro do FONAMEC.Enunciado aprovado naassembleia realizada em14/04/2023, em BeloHorizonte/MG, no 13ºEncontro do FONAMEC.Justificativa: A expressa notificação prévia e padronizada dos credores sobre apossibilidade de incidência das sanções contidas no art.104-A, parágrafo 2o doCDC, assegura a preservação do princípio da ampla defesa, do contraditório eda não surpresa. Da mesma forma, contribui com o desenvolvimento dacultura de pacificação social e priorização das soluções autocompositivas,valores fundantes da Resolução n.125 do Conselho Nacional de Justiça e da Lein.14.181/21, que atualizou o Código de Defesa do Consumidor.
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. E N U N C I A D O Nº37Cabe ao Juiz Coordenador do CEJUSC a aplicação, porforça de lei, das sanções previstas no art. 104-A, § 2º, doCódigo de Defesa do Consumidor, em caso de ausênciainjustificada de qualquer credor ou de seu procuradorcom poderes especiais e plenos para transigir àaudiência conciliatória do superendividamento.Justificativa: A expressa previsão legal contida no art.104-A, § 2º do CDCautoriza o Juiz coordenador do CEJUSC a aplicar as sanções contempladas nodiploma, porque incidentes ex vi lege. Além disso, a previsão legal, do pontode vista topológico, está situada na fase consensual e independe da existênciade processo judicial ajuizado (art.104-B, caput) ou capacidade postulatória doconsumidor-devedor.
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. E N U N C I A D O Nº38Em caso de não comparecimento injustificado dequalquer credor à audiência de conciliação préprocessualdo superendividamento, o Juiz Coordenadordo CEJUSC poderá homologar a proposta de sujeiçãocompulsória desse credor ao plano de pagamento dadívida se o montante devido ao credor ausente for certoe conhecido pelo consumidor, consoante previsão do art.104-A, parágrafo 2º, do Código de Defesa doConsumidor.Justificativa: A expressa previsão legal contida no art.104-A, § 2º do CDCautoriza o Juiz coordenador do CEJUSC a aplicar as sanções contempladas nodiploma, porque incidentes ex vi lege. Por “montante devido” e valor “certo econhecido pelo consumidor” sugere-se a demonstração e registro em ata deaudiência, de acordo com as informações prestadas pelo consumidor, paraapreciação pelo Juiz coordenador do Cejusc.
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. E N U N C I A D O Nº39A simples apresentação de procuração com poderesespeciais para transigir não elide a aplicação dasuspensão da exigibilidade do débito e a interrupção dosencargos da mora, caso o procurador não apresenteefetivas propostas de negociação para a formalização doplano de pagamento, em atenção ao dever decooperação, devendo constar tal advertência nanotificação encaminhada aos credores.Justificativa: A ausência injustificada, bem como o comparecimento dorepresentante do credor sem poderes reais e plenos para transigir ou, ainda, afalta de proposta dos credores, contrariam a finalidade da norma e autorizama aplicação de sanção, em especial do art. 104-A, § 2.º, do CDC.A lei não criou o dever de compor, pois violaria o princípio da autonomiaprivada. Contudo, uma das funções exercidas pela boa-fé, de criação dedeveres anexos, endereça o dever de cooperar e o dever de cuidado com ooutro, o cocontratante. No superendividamento, nasce um dever derenegociar, de repactuar, de cooperar vivamente para ajudar o leigo a sair daruína, desde que preenchidos os pressupostos legais. Logo, os credores têm afunção de boa-fé de apresentar propostas e contribuir para a construção doplano de pagamento voluntário. O tratamento diferenciado ao credor quecoopera na fase consensual é identificado ao longo da legislação, a exemploda prioridade de pagamento aos credores que compuseram nesta fase, dapossibilidade de homologação de plano de pagamento apresentado peloconsumidor na hipótese do Enunciado 04, por expressa previsão legal.O Código de Processo Civil de 2015 foi embasado em vários princípios, estandoentre ele o princípio da cooperação das partes, artigo 6.º e o princípio da boafé,artigo 5º. Na essência, significa que o legislador, ao instaurar procedimentode tratamento do superendividamento do consumidor, privilegiou a atuaçãopró-ativa, exigindo a presença qualificada dos credores na construção doplano de pagamento consensual. Nesse sentido, veja-se que o diploma legalem análise destinou tratamento diferenciado aos credores quando previurecebimento preferencial do pagamento no plano consensual, artigo 104-B doCDC.
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. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sergio Cruz; MITIDIERO, Daniel. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: comentado. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 382.
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. Sarlet, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais sociais, mínimo existencial e direito privado, p. 99.Jacintho, Jussara Maria Moreno. Dignidade humana: princípio constitucional. Curitiba: Juruá, 2006. p. 207.
1. Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: (...) I - tutelas provisórias;
2. SÚMULA 568- O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema.
3. Art. 206. Compete ao Relator:(...)XXXVI – negar ou dar provimento ao recurso quando houver jurisprudência dominante acerca do tema no Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça com relação, respectivamente, às matérias constitucional e infraconstitucional e deste Tribunal; (...) .
4. Art. 300 – A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo
5. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo código de processo civil comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. Pág. 312.
6. Art. 104-A. A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas.§ 1º Excluem-se do processo de repactuação as dívidas, ainda que decorrentes de relações de consumo, oriundas de contratos celebrados dolosamente sem o propósito de realizar pagamento, bem como as dívidas provenientes de contratos de crédito com garantia real, de financiamentos imobiliários e de crédito rural.§ 2º O não comparecimento injustificado de qualquer credor, ou de seu procurador com poderes especiais e plenos para transigir, à audiência de conciliação de que trata o caput deste artigo acarretará a suspensão da exigibilidade do débito e a interrupção dos encargos da mora, bem como a sujeição compulsória ao plano de pagamento da dívida se o montante devido ao credor ausente for certo e conhecido pelo consumidor, devendo o pagamento a esse credor ser estipulado para ocorrer apenas após o pagamento aos credores presentes à audiência conciliatória.§ 3º No caso de conciliação, com qualquer credor, a sentença judicial que homologar o acordo descreverá o plano de pagamento da dívida e terá eficácia de título executivo e força de coisa julgada.§ 4º Constarão do plano de pagamento referido no § 3º deste artigo:I - medidas de dilação dos prazos de pagamento e de redução dos encargos da dívida ou da remuneração do fornecedor, entre outras destinadas a facilitar o pagamento da dívida;II - referência à suspensão ou à extinção das ações judiciais em curso;III - data a partir da qual será providenciada a exclusão do consumidor de bancos de dados e de cadastros de inadimplentes;IV - condicionamento de seus efeitos à abstenção, pelo consumidor, de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento.§ 5º O pedido do consumidor a que se refere o caput deste artigo não importará em declaração de insolvência civil e poderá ser repetido somente após decorrido o prazo de 2 (dois) anos, contado da liquidação das obrigações previstas no plano de pagamento homologado, sem prejuízo de eventual repactuação.’
7. ‘Art. 104-B. Se não houver êxito na conciliação em relação a quaisquer credores, o juiz, a pedido do consumidor, instaurará processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório e procederá à citação de todos os credores cujos créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado.§ 1º Serão considerados no processo por superendividamento, se for o caso, os documentos e as informações prestadas em audiência.§ 2º No prazo de 15 (quinze) dias, os credores citados juntarão documentos e as razões da negativa de aceder ao plano voluntário ou de renegociar.§ 3º O juiz poderá nomear administrador, desde que isso não onere as partes, o qual, no prazo de até 30 (trinta) dias, após cumpridas as diligências eventualmente necessárias, apresentará plano de pagamento que contemple medidas de temporização ou de atenuação dos encargos.§ 4º O plano judicial compulsório assegurará aos credores, no mínimo, o valor do principal devido, corrigido monetariamente por índices oficiais de preço, e preverá a liquidação total da dívida, após a quitação do plano de pagamento consensual previsto no art. 104-A deste Código, em, no máximo, 5 (cinco) anos, sendo que a primeira parcela será devida no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, contado de sua homologação judicial, e o restante do saldo será devido em parcelas mensais iguais e sucessivas.’
8. https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/08/cartilha-superendividamento.pdf
9. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14181.htm
10. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:I - a soberania;II - a cidadania;III - a dignidade da pessoa humana;IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; (Vide Lei nº 13.874, de 2019)V - o pluralismo político.Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
11. Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015)Parágrafo único. Todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social terá direito a uma renda básica familiar, garantida pelo poder público em programa permanente de transferência de renda, cujas normas e requisitos de acesso serão determinados em lei, observada a legislação fiscal e orçamentária
12. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657compilado.htm
13. Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.
14. JUNIOR, Humberto Theodoro. Curso de direito processual civil, volume I. 58. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2017, Pg 645.
15. Art. 296. A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada.Parágrafo único. Salvo decisão judicial em contrário, a tutela provisória conservará a eficácia durante o período de suspensão do processo.
16. Art. 54-A. Este Capítulo dispõe sobre a prevenção do superendividamento da pessoa natural, sobre o crédito responsável e sobre a educação financeira do consumidor.§ 1º Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.§ 2º As dívidas referidas no § 1º deste artigo englobam quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada.§ 3º O disposto neste Capítulo não se aplica ao consumidor cujas dívidas tenham sido contraídas mediante fraude ou má-fé, sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor.’
17. Art. 54-A. Este Capítulo dispõe sobre a prevenção do superendividamento da pessoa natural, sobre o crédito responsável e sobre a educação financeira do consumidor.§ 1º Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.§ 2º As dívidas referidas no § 1º deste artigo englobam quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada.§ 3º O disposto neste Capítulo não se aplica ao consumidor cujas dívidas tenham sido contraídas mediante fraude ou má-fé, sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor.
18. Art. 77. Além de outros previstos neste Código, são deveres das partes, de seus procuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo:I - expor os fatos em juízo conforme a verdade;II - não formular pretensão ou de apresentar defesa quando cientes de que são destituídas de fundamento;III - não produzir provas e não praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou à defesa do direito;IV - cumprir com exatidão as decisões jurisdicionais, de natureza provisória ou final, e não criar embaraços à sua efetivação;V - declinar, no primeiro momento que lhes couber falar nos autos, o endereço residencial ou profissional onde receberão intimações, atualizando essa informação sempre que ocorrer qualquer modificação temporária ou definitiva;VI - não praticar inovação ilegal no estado de fato de bem ou direito litigioso.VII - informar e manter atualizados seus dados cadastrais perante os órgãos do Poder Judiciário e, no caso do § 6º do art. 246 deste Código, da Administração Tributária, para recebimento de citações e intimações. (Incluído pela Lei nº 14.195, de 2021)§ 1º Nas hipóteses dos incisos IV e VI, o juiz advertirá qualquer das pessoas mencionadas no caput de que sua conduta poderá ser punida como ato atentatório à dignidade da justiça.§ 2º A violação ao disposto nos incisos IV e VI constitui ato atentatório à dignidade da justiça, devendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa de até vinte por cento do valor da causa, de acordo com a gravidade da conduta.
19. JUNIOR, Humberto Theodoro. Curso de direito processual civil, volume 1. 62. ed. − Rio de Janeiro: Forense, 2021. Pg 646.
20. Art. 206. Compete ao Relator: (...)XXXVI – negar ou dar provimento ao recurso quando houver jurisprudência dominante acerca do tema no Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça com relação, respectivamente, às matérias constitucional e infraconstitucional e deste Tribunal;
21. Art. 932. Incumbe ao relator: (...)VIII - exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal.
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