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1. Patricia Galindo De Godoy Cazaroti (Impetrante) x 2. Tribunal De Justiça Do Estado De São Paulo (Impetrado)

ID: 318710110

Tribunal: STJ Órgão: SPF COORDENADORIA DE PROCESSAMENTO DE FEITOS DE DIREITO PENAL Classe: HABEAS CORPUS Nº Processo: 0175440-79.2025.3.00.0000

Data de Disponibilização: 08/07/2025

Polo Ativo:

1. PATRICIA GALINDO DE GODOY CAZAROTI (IMPETRANTE)

Polo Passivo:

2. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO (IMPETRADO)

DESPACHO / DECISÃO

Advogados:

PATRICIA GALINDO DE GODOY CAZAROTI

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HC 1004070/SP (2025/0175440-9) RELATOR : MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK IMPETRANTE : PATRICIA GALINDO DE GODOY CAZAROTI ADVOGADO : PATRICIA GALINDO DE GODOY CAZAROTI - SP203432 IMPETRADO : TRIBUNAL DE … HC 1004070/SP (2025/0175440-9) RELATOR : MINISTRO JOEL ILAN PACIORNIK IMPETRANTE : PATRICIA GALINDO DE GODOY CAZAROTI ADVOGADO : PATRICIA GALINDO DE GODOY CAZAROTI - SP203432 IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO PACIENTE : FRANCISCO TIAGO AUGUSTO BOBO INTERESSADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO DECISÃO Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em benefício de FRANCISCO TIAGO AUGUSTO BOBO, contra acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO no julgamento do Agravo de Execução Penal n. 0005096-96.2025.8.26.0041. Extrai-se dos autos que o Juízo da Vara de Execução Penal indeferiu o pedido de comutação formulado pelo paciente. O Tribunal de origem negou provimento ao agravo de execução penal interposto pelo paciente, nos termos do acórdão que restou assim ementado (fl. 12): "Agravo. Indeferimento de comutação da pena com fundamento no Decreto nº 12.338/2024. Benefício não alcança condenação por delitos hediondos. Impossibilidade da concessão pretendida. Decreto inviabiliza o benefício de forma expressa. Inteligência artigo 1º, paragrafo 3º, inciso I, do referido Decreto. Sentenciado, reincidente, com envolvimento com facção criminosa. Agravo improvido." No presente writ, a defesa alega ilegalidade na decisão que criou requisitos não previstos em lei, argumentando que a decisão invadiu a competência do Presidente da República, que possui competência privativa para conceder indulto e comutar penas, conforme o art. 84, XII, da Constituição Federal. Sustenta que o Decreto n. 12.338/24 prevê como requisito subjetivo apenas a inexistência de falta grave nos últimos 12 meses, e não durante toda a execução da pena. Aduz que a decisão implica em efeito perpétuo para pena já cumprida, contrariando o princípio constitucional de que não haverá penas de caráter perpétuo, conforme o art. 5º, XLVII, "b", da Constituição Federal. Argumenta que o paciente já cumpriu integralmente a pena do crime hediondo há quase 10 anos, e que o envolvimento com facção criminosa não foi comprovado por decisão judicial transitada em julgado. Requer, em liminar e no mérito, a concessão da ordem para que seja deferido o pedido de comutação das penas. A liminar foi indeferida (fls. 51/52). Informações prestadas pelo Juízo de primeiro grau (fl. 67) e pelo Tribunal de origem (fls. 56/57). O Ministério Público Federal manifestou-se pelo não conhecimento do writ (fls. 74/77). É o relatório. Decido. Diante da hipótese de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, a impetração sequer deveria ser conhecida, segundo orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do próprio Superior Tribunal de Justiça. Contudo, considerando as alegações expostas na inicial, razoável o processamento do feito para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal. Inicialmente, deve ser ressaltado que a concessão de indulto ou comutação da pena é ato de indulgência do Presidente da República, condicionado ao cumprimento, pelo apenado, das exigências taxativas previstas no decreto de regência (AgRg no HC n. 714.744/PR, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 14/6/2022, DJe de 21/6/2022). No caso concreto, o pleito foi originalmente indeferido pelo Juízo das Execuções, por entender, em resumo, que, na hipótese, o ora paciente foi condenado por crime hediondo (extorsão mediante sequestro), tendo o Decreto n. 12.338/2024 vedado, expressamente, o deferimento de indulto aos delitos hediondos e equiparados. Ressalta-se que o benefício executivo foi igualmente indeferido com base na constatação de que o paciente possui envolvimento com organização criminosa, por óbice do artigo 1º, § 3º, do mencionado Decreto Presidencial. Por sua vez, o Tribunal de Justiça manteve o indeferimento com base nos seguintes fundamentos (fls. 13/15): "Em que pese o suscitado pela d. Defesa, a r. decisão deve ser mantida. O agravante é reincidente e cumpre pena pela prática de delito hediondo (extorsão mediante sequestro), além de possuir envolvimento com facção criminosa, conforme exposto acima. Nesse sentido, é certo que o inciso I, do art. 1º, § 3º, inciso I, do Decreto nº 12.338/2024 é claro ao vedar a concessão de indulto ou comutação para integrantes de facção criminosa. De outro lado, anote-se também que a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XLIII, veda os benefícios de indulto e comutação aos sentenciados por crimes hediondos ou equiparados. O C. Supremo Tribunal Federal, no Habeas Corpus 115.099/SP, firmou que: [...] A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que o instituto da graça, previsto no art. 5º, inc. XLIII, da Constituição Federal, engloba o indulto e a comutação de pena, estando a competência privativa do Presidente da República para a concessão desses benefícios limitada pela vedação estabelecida no referido dispositivo constitucional g.n. Ressalte-se ainda que o indulto também é vedado aos crimes hediondos ou equiparados, conforme disposição do artigo 2º, inciso I, da Lei 8.072/90, in verbis: Art. 2º Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de: I - anistia, graça e indulto; Assim, a competência privativa do Presidente da República para a concessão desses benefícios encontra-se limitada pelas vedações estabelecidas nos referidos dispositivos da Constituição Federal e da Legislação Federal. Ainda que assim não fosse, o signatário tem entendido que a concessão do indulto, pleno ou parcial, está condicionada à comprovação do sentenciado possuir méritos para a obtenção do benefício. Nesse passo, insta registrar que o agravante possui histórico de faltas graves e envolvimento com facção criminosa, como visto (fls. 13/14). E tal benefício não será concedido se, apesar de cumprido o requisito temporal, o sentenciado demonstrar não reunir condições pessoais que presumam que não voltará a delinquir ou a praticar faltas disciplinares. Conceder a comutação sem análise de méritos subjetivos ou limitar-se ao período de 12 meses é o mesmo que se fazer “tabula rasa” da lei igualando presos com bom comportamento com os indisciplinados e incorrigíveis. Pelo que se vê, não era mesmo o caso de concessão da benesse. Isso posto, nega-se provimento ao agravo." Constata-se, assim, que o Tribunal de Justiça manteve o indeferimento do pedido de comutação de pena com fundamento na não satisfação de um dos requisitos objetivos, qual seja, a impossibilidade de concessão do benefício a pessoas condenadas por crime hediondo ou equiparado, com fundamento no art. 1º, inciso I, do Decreto n. 12.338/2024, de 23 de dezembro de 2024, que assim dispõe: Art. 1º O indulto e a comutação de pena não alcançam as pessoas, nacionais e migrantes, condenadas: I - por crime hediondo ou equiparado, nos termos do disposto na Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990; Na espécie, verifica-se que o entendimento das instâncias ordinárias está em consonância com a disciplina dada pelo Decreto n. 12.338/2024 e não destoa da jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, pacífica no sentido de que, aos condenados por crimes hediondos ou equiparados, é impossível a concessão de comutação quando tais delitos forem listados como impeditivos da concessão da benesse pelo respectivo Decreto Presidencial. Nessa linha, mutatis mutandis, colaciono os seguintes precedentes em interpretação análoga: RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO PENAL. INDULTO DA PENA DE MULTA. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 2º, X, E 8º, AMBOS DO DECRETO N. 11.846/2023. CONDENAÇÃO POR TRÁFICO DE DROGAS. CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO E INSUSCETÍVEL DE INDULTO. ALEGADA HIPOSSUFICIÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE EXTINÇÃO NO CENÁRIO ATUAL. APENADO QUE AINDA CUMPRE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. INAPLICABILIDADE DO TEMA 931/STJ. Recurso especial desprovido. (REsp n. 2.185.736/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 26/3/2025, DJEN de 31/3/2025.) AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. INSURGÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. INDULTO. DECRETO 11.302/2022. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º REJEITADA. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 11. INEXISTÊNCIA DE ÓBICE À CONCESSÃO DO INDULTO QUANDO O APENADO OSTENTA CONDENAÇÃO POR CRIME IMPEDITIVO E NÃO IMPEDITIVO EM AÇÕES PENAIS DIVERSAS. ORDEM CONCEDIDA PARA RESTABELECER DECISÃO DO JUÍZO DE EXECUÇÃO QUE CONCEDERA INDULTO A EXECUTADO CONDENADO POR DELITO COM PENA MÁXIMA EM ABSTRATO DE ATÉ 5 (CINCO) ANOS, EM AÇÃO PENAL NA QUAL FOI CONSIDERADO PRIMÁRIO E NA QUAL NÃO HAVIA CONCURSO COM CRIME IMPEDITIVO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Na dicção do Supremo Tribunal Federal, a concessão de indulto natalino é um instrumento de política criminal e carcerária adotada pelo Executivo, com amparo em competência constitucional, e encontra restrições apenas na própria Constituição que veda a concessão de anistia, graça ou indulto aos crimes de tortura, tráfico de drogas, terrorismo e aos classificados como hediondos. 2. No julgamento da ADI 5.874, na qual se deliberava sobre a constitucionalidade do Decreto n. 9.246/2017, o plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, afirmou a "Possibilidade de o Poder Judiciário analisar somente a constitucionalidade da concessão da clementia principis, e não o mérito, que deve ser entendido como juízo de conveniência e oportunidade do Presidente da República, que poderá, entre as hipóteses legais e moralmente admissíveis, escolher aquela que entender como a melhor para o interesse público no âmbito da Justiça Criminal". Secundando tal orientação, esta Corte vem entendendo que "O indulto é constitucionalmente considerado como prerrogativa do Presidente da República, podendo ele trazer no ato discricionário e privativo, as condições que entender cabíveis para a concessão do benefício, não se estendendo ao judiciário qualquer ingerência no âmbito de alcance da norma" (AgRg no HC n. 417.366/DF, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 21/11/2017, DJe de 30/11/2017.). 3. Valendo-se de tais premissas, as mesmas razões de decidir que nortearam o reconhecimento da constitucionalidade do Decreto 9.246/2017 se prestam, em princípio, a refutar a alegada inconstitucionalidade do art. 5º do Decreto 11.302/2022, tanto mais quando se sabe que a constitucionalidade da norma é presumida e que o próprio agravante admite que o art. 5º do Decreto 11.302 /2022 não descumpriu os limites expressos no art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal. Ademais, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 7.390, na qual foi questionada a constitucionalidade do art. 5º do Decreto 11.302/2022, ainda não houve deliberação sobre o pedido de liminar, estando os autos conclusos ao Relator desde 28/09/2023. Da mesma forma, no RE n. 1.450.100/DF, atualmente atribuído à Relatoria do Min. Flávio Dino, embora tenha sido reconhecida a repercussão geral do tema (Tema n. 1.267), não houve ainda julgamento de mérito da controvérsia nele posta, vinculando o entendimento desta Corte sobre a matéria. 4. Dando interpretação restritiva à norma contida no parágrafo único do art. 11 do Decreto n. 11.302/2022, a Terceira Seção desta Corte assentou que, "Para fins do referido decreto, apenas no caso de crime impeditivo cometido em concurso com crime não impeditivo que se exige o cumprimento integral da reprimenda dos delitos da primeira espécie. Em se tratando de crimes cometidos em contextos diversos, fora das hipóteses de concurso (material ou formal), não há de se exigir o cumprimento integral da pena pelos crimes impeditivos" (AgRg no HC n. 856.053/SC, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 8/11/2023, DJe de 14/11/2023.) 5. Situação em que a decisão agravada concedeu a ordem, de ofício, para restabelecer decisão do Juízo de Execução que concedera ao paciente o indulto previsto no Decreto Presidencial n. 11.302/2022 em relação ao crime previsto no art. 14, caput, da Lei 10.826/2003 (posse ilegal de arma de fogo de uso permitido), pelo qual fora condenado em ação penal na qual foi considerado primário e na qual não houve concurso com crimes impeditivos. 6. Não se desconhece a liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal na Suspensão de Liminar nº 1698/MC/RS, para determinar a suspensão imediata de ordens concedidas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em quatro habeas corpus. Todavia, trata-se de decisão de caráter precário - decorrente da própria natureza das decisões liminares - em feito no qual ainda não houve o julgamento de mérito pela Suprema Corte. 7. Compete à Terceira Seção o julgamento da matéria penal no Superior Tribunal de Justiça, que tem entre as suas funções a uniformização na interpretação da legislação infraconstitucional, além se tratar de um Corte de precedentes, de forma que até que haja uma revisão do julgado lá proferido, deve ser respeitada a orientação fixada. 8. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 875.785/RS, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 5/3/2024, DJe de 8/3/2024.) Não obstante, ainda que o paciente tivesse cumprido a reprimenda atinente ao crime hediondo há bastante tempo, como sustentado no presente writ, é de se reconhecer que o indeferimento do benefício executivo também fundamentou-se no reconhecimento de que o requerente possui envolvimento com organização criminosa, conforme informação lançada a folhas 3081, corroborada pela condenação no artigo 288 do Código Penal, elementar que não permite a concessão do pleito, nos termos do artigo 1º, §3º, do mencionado Decreto Presidencial (fl. 63). Logo, a comutação estaria obstada, de toda sorte, no fato de possuir o paciente envolvimento relevante em organização criminosa, como concluíram as instâncias ordinárias. Ressalta-se que, para desconstituir esse conclusão, como busca a impetrante, mostra-se necessária incursão aprofundada na seara fático-probatória, procedimento incompatível com os estreitos limites da via eleita. A propósito: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. INDULTO NATALINO. DECRETO PRESIDENCIAL Nº. 11.302 /2022. VEDAÇÃO DO § 1º DO ART. 7º. FACÇÃO CRIMINOSA. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. INDEFERIMENTO FUNDAMENTADO. INTERPRETAÇÃO IN MALAM PARTEM. INEXISTÊNCIA. I - O §1º do art. 7º do Decreto nº 11.302/2022 prescreve hipótese de vedação da concessão de indulto aos integrantes de facções criminosas, ainda que sejam reconhecidas somente no julgamento do pedido. II - Para fins de exame de pedido de indulto com fundamento no Decreto nº 11.302/2022, a discussão sobre eventual diferenciação entre organização criminosa e facção criminosa não tem relevância porque o §1º, art. 7º, do ato normativo, estabeleceu o dever do juízo de reconhecer, de forma fundamentada, ainda que somente no julgamento do pedido de indulto, a participação em facção criminosa. III - No caso dos autos, o indeferimento do indulto está fundamentado em elementos concretos que indicam a participação dos recorrentes em organização reconhecida pelas instâncias ordinárias como facção criminosa, nos moldes do §1º, art. 7º, do Decreto nº 11.302/2022. IV - A compreensão dada pelo Tribunal não implica interpretação extensiva in malam partem. Isso porque a vedação do §1º, art. 7º, Decreto nº 11.302/2022 impede a concessão de um benefício, derivado de discricionariedade do Presidente da República, que desconstitui uma sanção penal aplicada com observância do devido processo legal, nos exatos termos previstos pelo ato concessivo. A vedação, de forma literal, prevê a possibilidade de reconhecimento da participação em facção criminosa ainda que somente no julgamento do pedido de indulto. Agravo regimental desprovido. (AgRg no RHC n. 185.970/PR, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 7/5/2024, DJe de 15/5/2024.) Assim, não configurado, na hipótese, constrangimento ilegal a justificar a concessão da ordem, de ofício. Ante o exposto, com fundamento no art. 34, inciso XX, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, não conheço do habeas corpus. Publique-se. Intimem-se. Relator JOEL ILAN PACIORNIK

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Processo nº 1004070-89.2025.8.11.0000

ID: 324732863

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1004070-89.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

M.W. ROCHA FRADES LTDA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

CLEITON PEREIRA DOS SANTOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1004070-89.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Prestação de Serviços, Acidente de Trân… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1004070-89.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Prestação de Serviços, Acidente de Trânsito, Acidente de Trânsito] Relator: Des(a). MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [CLEITON PEREIRA DOS SANTOS - CPF: 029.794.581-55 (ADVOGADO), M.W. ROCHA FRADES LTDA - CNPJ: 31.222.861/0001-48 (AGRAVANTE), SOLUTION BENEFICIOS E SOCORRO MUTUO - CNPJ: 44.073.766/0001-71 (AGRAVADO), MARCO AURELIO MILANTONIO JUNIOR - CPF: 042.212.439-70 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A EMENTA. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. ESCOLHA DA OFICINA PARA REPARO DE VEÍCULO SINISTRADO. RECUSA DA SEGURADORA FUNDADA EM POLÍTICA DE REDE CREDENCIADA. AUSÊNCIA DE PERIGO DE DANO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de tutela de urgência em ação de obrigação de fazer, ajuizada por empresa associada visando compelir entidade de proteção veicular a custear o conserto de veículo sinistrado em oficina de sua preferência, em razão de orçamento mais vantajoso. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se é aplicável o Código de Defesa do Consumidor na relação jurídica entre as partes; (ii) saber se a agravada possui legitimidade passiva após alegada cessão de carteira; (iii) saber se o segurado tem direito à livre escolha da oficina para o conserto do veículo; (iv) saber se estão presentes os requisitos legais para a concessão de tutela de urgência, nos termos do art. 300 do CPC. III. Razões de decidir 3. As questões preliminares relativas à ilegitimidade passiva e à inaplicabilidade do CDC não foram enfrentadas pelo juízo de origem, não podendo ser conhecidas nesta instância sob pena de supressão de instância. 4. O direito do consumidor à livre escolha da oficina para conserto de veículo sinistrado encontra respaldo no CDC e na Circular SUSEP nº 269/2004. 5. No caso concreto, restou evidenciado que a oficina escolhida pela agravante apresentou orçamento consideravelmente inferior ao da oficina credenciada pela agravada, revelando recusa infundada ao custeio do reparo. 6. Apesar da demonstração da probabilidade do direito, não restou caracterizado o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, pois o veículo permanece inoperante há cerca de oito meses sem comprovação de impacto relevante nas atividades da empresa agravante, descaracterizando a urgência da medida pleiteada. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de agravo de instrumento conhecido e desprovido. Revogação da liminar que concedera efeito suspensivo. Tese de julgamento: "1. Não cabe à instância recursal, em agravo de instrumento, conhecer de matérias não decididas pelo juízo de origem, ainda que de ordem pública, sob pena de supressão de instância. 2. O segurado tem direito à livre escolha da oficina para reparo do veículo sinistrado, desde que respeitado o equilíbrio contratual e a razoabilidade econômica. 3. A ausência de demonstração de urgência real, em virtude da prolongada inatividade do veículo e da inexistência de prejuízo comprovado, afasta a concessão de tutela de urgência." Dispositivos relevantes: CPC, art. 300; CDC, arts. 6º, III, e 39, I; Jurisprudência relevante citada: TJMT, Ap. Cív. nº 1026112-53.2018.8.11.0041, Rel. Des. Carlos Alberto A. Rocha, j. 04/08/2024; TJMT, Ag. Instr. nº 1030446-49.2024.8.11.0000, Rel. Des. Márcio A. Guedes, j. 16/06/2025; TJMT, Ag. Instr. nº 1011650-73.2025.8.11.0000, Rel. Des. Tatiane Colombo, j. 23/06/2025. R E L A T Ó R I O Cuida-se de Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto por M.W. ROCHA FRADES LTDA, contra a r. decisão proferida pela MMª. Juíza de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que nos autos da ação de "Obrigação de Fazer" (Proc. nº 1003700-84.2025.8.11.0041), ajuizada pela agravante contra SOLUTION BENEFÍCIOS E SOCORRO MÚTUO, indeferiu o pedido de tutela de urgência para reparo de veículo sinistrado (cf. Id. nº 182983875). No recurso vinculado ao Id. nº 268111766, a Agravante alega que a decisão não considerou argumentos e provas relevantes que demonstram seu direito como consumidor e o perigo da demora. Sustenta que a escolha da oficina para reparo é direito do consumidor (art. 6º, II, CDC) e que a imposição de oficina credenciada configura prática abusiva. Pede, sob esses fundamentos, a concessão de tutela antecipada recursal para determinar reparo na Concessionária Fiat Domani conforme orçamento apresentado. Nas contrarrazões, o Agravado refuta os argumentos recursais, arguindo preliminar de ilegitimidade passiva por cessão de carteira à COONECTA, e pugna pelo desprovimento do recurso (cf. 279551863). O Eminente Relator deferiu o efeito suspensivo (cf. Id. nº 268483798) É o relatório. MARCIO APARECIDO GUEDES Relator V O T O R E L A T O R Conforme relatado, cuida-se de Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto por M.W. ROCHA FRADES LTDA, contra a r. decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que nos autos da ação de "Obrigação de Fazer com Pedido de Tutela de Urgência", ajuizada pela agravante contra SOLUTION BENEFÍCIOS E SOCORRO MÚTUO, indeferiu o pedido de tutela de urgência para determinar o reparo do veículo sinistrado na oficina de escolha da requerente (cf. Id. nº 182983875 dos autos de origem). Extrai-se da inicial que M.W. ROCHA FRADES LTDA ajuizou a presente demanda em desfavor de SOLUTION BENEFÍCIOS E SOCORRO MÚTUO, requerendo a concessão de tutela de urgência para determinar o reparo de seu veículo Fiat Strada na Concessionária Fiat Domani, conforme orçamento de R$ 33.923,30. Em análise liminar, foi proferida decisão que indeferiu o pedido liminar, diante do fundamento de que não há como asseverar que o menor orçamento é mais vantajoso para a empresa ré, sendo comum que seguradoras mantenham convênios com oficinas, não havendo demonstração de que a oficina indicada não é séria e competente. Esses foram os termos da decisão: “In casu, em que pese os orçamentos apresentados pelo autor indicando que o menor valor para conserto de seu veículo é na Concessionária Fiat Domani, não há como asseverar que este é, de fato, o mais vantajoso para a empresa ré. É muito comum que empresas seguradoras mantenham vínculo/convênio com algumas oficinas mecânicas, de maneira que interferir nessa questão não é medida razoável. Ademais, a ré não está se recusando a efetivar os reparos e pagar o preço do conserto, tampouco há nos autos demonstração de que a oficina escolhida não é séria e competente para o trabalho a ser desenvolvido. Desta feita, nesta quadra processual em que a cognição é feita de modo limitado, não há elementos de convicção suficientes a ensejar o deferimento da tutela de urgência provisória pleiteada. Posto isto, INDEFIRO O PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA.” O Requerido apresentou contraminuta ao agravo de instrumento, arguindo preliminar de ilegitimidade passiva por cessão de carteira à COONECTA e sustentando a inaplicabilidade do CDC por se tratar de associação sem fins lucrativos. Após regular análise, o Magistrado relator deferiu o efeito suspensivo ao recurso, conforme o seguinte: “Ao analisar os autos e considerando a cognição sumária própria deste momento processual, entendo que estão presentes os requisitos para a concessão da tutela de urgência recursal, nos termos do art. 300 do CPC. O direito à escolha da oficina pelo consumidor encontra respaldo tanto no CDC quanto no art. 14, do Anexo da Circular SUSEP nº 269/2004. (...) No caso concreto, verifica-se a probabilidade do direito alegado, pois o documento vinculado ao Id. nº 182091807 dos autos de origem, mostra que, em conversa com a seguradora, o autor/agravante informa que “o orçamento do amigão foi o de valor maior dentre todos os orçamentos. Sendo inclusive o dobro do valor” e em resposta, a seguradora, através da atendente Natália, afirma: “Temos ciência, sr. Rodrigo. No entanto, é nossa credenciada”. Ora, se a seguradora aprovou o conserto do veículo em uma oficina que cobra o dobro do valor cobrado pela oficina de preferência do segurado, a recusa em custear o conserto na oficina de preferência do segurado, é, conforme expressamente dito pela atendente da seguradora, apenas porque "é nossa credenciada", violando o direito do segurado de escolher livremente a empresa em que o veículo será reparado. Ou seja, a justificativa para a recusa do reparo na oficina escolhida pelo agravante não se baseia em qualquer classificação técnica ou econômica, mas exclusivamente na política interna de direcionamento para a rede credenciada, o que viola o direito do segurado de escolher livremente a empresa em que o veículo será reparado. Se a negativa tivesse por fundamento uma questão orçamentária, sendo o valor da oficina escolhida pelo autor/agravante consideravelmente superior ao da credenciada, ainda poderia haver alguma razoabilidade na posição de segurança. Entretanto, no presente caso, a situação é justamente inversa, já que o orçamento da Concessionária Fiat Domani apresenta valor consideravelmente inferior ao da oficina credenciada. O perigo de dano também é demonstrado, na medida em que o veículo em questão é essencial para o desenvolvimento das atividades empresariais do agravante, sendo indispensável para a continuidade de suas operações comerciais. Nesse contexto, a manutenção da decisão agravada poderá causar prejuízo irreparável ou de difícil peças ao agravante, justificando uma intervenção judicial imediata. Portanto, admito a interposição recursal tal como efetivada, de modo que recebo e autorizo o processamento do agravo de instrumento, e DEFIRO o pedido de concessão de efeito suspensivo, ficando o quadro assim acertado até que a Turma Julgadora, melhor e mais informada pelo subsídio de outros elementos que virão aos autos, inclusive pelo contraponto que será feito pelas contrarrazões, possa decidir com certeza e segurança sobre o mérito do recurso”. Inconformada com o desfecho dado à lide, SOLUTION BENEFÍCIOS E SOCORRO MÚTUO pugna pelo desprovimento do recurso, o qual se passa à análise. Cinge-se a controvérsia em definir se a agravada possui legitimidade passiva após alegada cessão de carteira, se a relação é regida pelo CDC ou pelo Código Civil, se o segurado/associado tem direito à livre escolha da oficina para reparo e se estão presentes os requisitos para tutela de urgência. As preliminares de ilegitimidade passiva e inaplicabilidade do CDC arguidas pela agravada em contraminuta não foram objeto de análise na decisão agravada, que se limitou aos requisitos da tutela de urgência. Tratando-se de matérias que demandam cognição exauriente e contraditório amplo, especialmente quanto à alegada cessão de carteira e à natureza jurídica da relação, não cabe sua análise nesta sede recursal, sob pena de supressão de instância, devendo ser remetidas ao juízo de origem para apreciação no momento oportuno. Em outra oportunidade esse relator já decidiu no mesmo sentido: “Ementa: Direito civil e processual civil. Agravo de instrumento. Ação de petição de herança. Tutela provisória de urgência. Impossibilidade de análise de preliminares arguidas por supressão de instância. Averbação nas matrículas imobiliárias. Legitimidade da medida. Recurso desprovido. (...) II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se a decisão agravada poderia ser reformada com base em preliminares de ilegitimidade passiva, litisconsórcio ativo necessário e nulidade da ordem de averbação por ausência de individualização dos bens; (ii) saber se estavam presentes os requisitos legais para concessão da tutela de urgência determinada pelo juízo de origem. III. Razões de decidir 3. As alegações preliminares não podem ser conhecidas nesta sede, pois não foram objeto de deliberação na instância originária, sob pena de supressão de instância. (...) IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de Agravo de Instrumento desprovido. Agravo interno prejudicado. Tese de julgamento: "1. Não cabe à instância recursal, em agravo de instrumento, conhecer de matérias não decididas pelo juízo de origem, ainda que de ordem pública, sob pena de supressão de instância. 2. É legítima a averbação da existência de ação de petição de herança nas matrículas imobiliárias dos bens do suposto espólio, quando presentes os requisitos da tutela provisória de urgência e o interesse legítimo da parte autora." (...) (N.U 1030446-49.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO APARECIDO GUEDES, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 16/06/2025, Publicado no DJE 16/06/2025) Portanto, as preliminares ficam ressalvadas para análise pelo juízo singular na sequência do feito. Superada essa questão, a controvérsia cinge-se em definir se estão presentes os requisitos estabelecidos no artigo 300 do Código de Processo Civil para concessão da tutela de urgência, notadamente quanto ao direito alegado pelo requerente de escolher livremente a oficina para reparo do veículo sinistrado. Para o deslinde da controvérsia, impõe-se a análise dos requisitos cumulativos estabelecidos no artigo 300 do Código de Processo Civil para concessão da tutela de urgência, quais sejam, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Quanto ao primeiro requisito, o direito à livre escolha da oficina pelo segurado encontra sólido respaldo tanto na legislação consumerista quanto na regulamentação específica editada pela Superintendência de Seguros Privados. Com efeito, o art. 14 do Anexo da Circular SUSEP nº 269/2004 estabelece de forma expressa que "deverá ser prevista contratualmente a livre escolha de oficinas pelos segurados, para a recuperação de veículos sinistrados", disposição que confere densidade normativa ao direito postulado pelo agravante. Nesse mesmo sentido, a jurisprudência desse sodalício consolidou entendimento no sentido de reconhecer tal prerrogativa, vide: “E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL – ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO VEICULAR – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – APLICABILIDADE – CONSERTO DE VEÍCULO AUTOMOTOR – OPÇÃO DO CONSUMIDOR – OFICINA NÃO CREDENCIADA – NEGATIVA INJUSTIFICADA NO PAGAMENTO – REEMBOLSO LIMITADO AO VALOR INDICADO PELA REDE CREDENCIADA – CLÁUSULA EXPRESSA – DEVER DE INDENIZAR – DANO MORAL – CONFIGURADO – QUANTUM JUSTO E PROPORCIONAL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Revela-se cogente a aplicação do Código de Defesa do Consumidor quando a ação é proposta pelo associado-segurado contra a associação que presta serviço de proteção veicular, cobrindo riscos predeterminados, caracterizando como relação de consumo, nos termos dos artigos 2º e 3º do CDC. In casu, por força do que foi pactuado, o segurado não era obrigado a realizar o conserto do automóvel na oficina credenciada pela ré, facultado a ele, a realização do reparo em estabelecimento comercial de sua livre escolha, contudo, deve respeitar a cláusula expressa de limitação da indenização para o caso de conserto do bem sinistrado em oficina não credenciada. A recusa indevida da empresa de permitir o conserto do veiculo em oficina escolhida pelos autores, ultrapassa a esfera de mero aborrecimento, caracterizando o dano moral indenizável ao caso concreto. O arbitramento do valor da indenização decorrente de dano moral deve ser feito de acordo com os aspectos do caso, sempre com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes. (N.U 1026112-53.2018.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/08/2024, Publicado no DJE 04/08/2024)” No caso em exame, restou inequivocamente demonstrado pelos documentos acostados aos autos que a oficina escolhida pelo agravante apresenta orçamento significativamente inferior, no valor de R$ 33.923,30, em relação à oficina credenciada indicada pela agravada, cujo orçamento alcança a cifra de R$ 60.781,53, configurando uma diferença expressiva de R$ 26.858,23 em favor da primeira. Essa circunstância evidencia, de forma cristalina, que a recusa manifestada pela agravada não se baseia em critérios técnicos ou econômicos objetivos, mas tão somente na política interna de direcionamento compulsório para sua rede credenciada, o que contraria frontalmente o direito do segurado de exercer escolha livre e consciente. Mais significativo ainda é o fato de que, conforme se depreende das conversas travadas entre as partes e documentadas nos autos, a própria agravada reconheceu expressamente que o orçamento da oficina credenciada representa o dobro do valor da oficina escolhida pelo segurado, justificando sua imposição exclusivamente sob o argumento de que "é nossa credenciada". Tal postura configura manifesta arbitrariedade, na medida em que subordina o interesse legítimo do segurado a meras conveniências administrativas da seguradora, em evidente descompasso com os princípios que regem as relações contratuais contemporâneas. Dessa forma, não restam dúvidas quanto à presença do primeiro requisito da tutela de urgência, uma vez que a probabilidade do direito alegado pelo agravante encontra-se suficientemente caracterizada pelos elementos probatórios carreados aos autos e pelo arcabouço normativo e jurisprudencial aplicável à espécie. Contudo, no que concerne ao segundo requisito - o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo -, a situação fática apresenta contornos que merecem análise mais criteriosa. Embora o agravante sustente que o veículo constitui instrumento essencial para o desenvolvimento de suas atividades empresariais, circunstância que, em tese, poderia justificar a concessão da medida de urgência, os elementos constantes dos autos revelam cenário que enfraquece sobremaneira essa alegação. Com efeito, verifica-se que o veículo encontra-se parado desde novembro de 2024, perfazendo um período de aproximadamente oito meses, sem que tenha havido demonstração efetiva de prejuízo irreparável ou de difícil reparação às atividades desenvolvidas pelo agravante. Essa circunstância temporal assume relevância fundamental para a análise da urgência alegada, porquanto a manutenção prolongada da situação sem aparente comprometimento das atividades empresariais sugere que a pretensão não possui o caráter emergencial que justificaria a intervenção judicial imediata. Além disso, a alegada urgência encontra-se em evidente contradição com a própria conduta adotada pelo agravante, que deliberadamente optou por manter o veículo inoperante durante todos esses meses em vez de aceitar prontamente o reparo nas oficinas credenciadas oferecidas pela agravada. Ora, se houvesse real urgência decorrente da essencialidade do bem para o desenvolvimento das atividades empresariais, seria razoável esperar que o agravante aceitasse de imediato o reparo em qualquer das oficinas disponibilizadas pela agravada, todas aparentemente dotadas de capacidade técnica adequada para a execução dos serviços necessários. Essa conduta contraditória revela que, em verdade, a pretensão do agravante não se funda em urgência genuína, mas em preferência legítima - porém não urgente - por determinado estabelecimento. A escolha pela oficina de sua confiança, conquanto constituía direito reconhecido pelo ordenamento jurídico, representa liberalidade do consumidor que não se confunde com a urgência exigida pelo artigo 300 do Código de Processo Civil para justificar a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional. Nesse contexto, o simples desejo de obter reparo em estabelecimento específico, por mais legítimo que seja, não configura, por si só, perigo de dano irreparável apto a autorizar a concessão da tutela de urgência. A jurisprudência do E. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso é firme no sentido de que a tutela antecipatória pressupõe situação de emergência que não pode aguardar o deslinde natural do processo, sob pena de perecimento do direito ou comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional. “EMENTA. AGRAVO DE INSTRUMENTO - SUSPENSÃO DE AÇÃO DE DIVÓRCIO EM RAZÃO DE AÇÃO ANULATÓRIA - PENHORA INCIDENTE SOBRE CRÉDITO TRABALHISTA - AUSÊNCIA DE PERICULUM IN MORA - RECURSO DESPROVIDO. (...) III. RAZÕES DE DECIDIR 3 - A concessão da tutela de urgência exige a demonstração cumulativa da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, nos termos do art. 300 do CPC. (...) 6 - A ausência de demonstração de risco iminente de perecimento do direito exequendo, especialmente diante da inércia da agravante na adoção de medidas autônomas, afasta o requisito do periculum in mora. 7 - A decisão judicial combatida é provisória e poderá ser revista caso surjam novos elementos, conforme jurisprudência consolidada. IV. DISPOSITIVO E TESE (...) 8 - Recurso desprovido. 3 - A inexistência de risco iminente e de urgência justificada afasta a concessão de tutela recursal para revogar decisão que visa resguardar o contraditório e a prestação jurisdicional efetiva. (N.U 1011650-73.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 23/06/2025, Publicado no DJE 23/06/2025) No presente caso, a manutenção prolongada do veículo sem reparo, quando havia alternativas técnica e juridicamente viáveis disponibilizadas pela agravada, demonstra de forma inequívoca que a pretensão não ostenta o caráter de urgência indispensável à concessão da medida pleiteada. Ademais, cumpre observar que a eventual procedência da pretensão ao final do processo assegurará ao agravante a integral satisfação de seu direito, inclusive com a possibilidade de ressarcimento de eventuais prejuízos comprovadamente sofridos em razão do retardamento do reparo. Não se vislumbra, portanto, risco de perecimento do direito ou de comprometimento da efetividade da tutela jurisdicional que justifique a manutenção da antecipação concedida. Ante o exposto, conheço do recurso e NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento, mantendo incólume a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau. No mesmo ato, revogo a decisão liminar que concedera efeito suspensivo ao presente recurso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025

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Processo nº 1004070-89.2025.8.11.0000

ID: 324732866

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1004070-89.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

SOLUTION BENEFICIOS E SOCORRO MUTUO

Acórdão

Advogados:

MARCO AURELIO MILANTONIO JUNIOR

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1004070-89.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Prestação de Serviços, Acidente de Trân… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1004070-89.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Prestação de Serviços, Acidente de Trânsito, Acidente de Trânsito] Relator: Des(a). MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [CLEITON PEREIRA DOS SANTOS - CPF: 029.794.581-55 (ADVOGADO), M.W. ROCHA FRADES LTDA - CNPJ: 31.222.861/0001-48 (AGRAVANTE), SOLUTION BENEFICIOS E SOCORRO MUTUO - CNPJ: 44.073.766/0001-71 (AGRAVADO), MARCO AURELIO MILANTONIO JUNIOR - CPF: 042.212.439-70 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A EMENTA. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. ESCOLHA DA OFICINA PARA REPARO DE VEÍCULO SINISTRADO. RECUSA DA SEGURADORA FUNDADA EM POLÍTICA DE REDE CREDENCIADA. AUSÊNCIA DE PERIGO DE DANO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de tutela de urgência em ação de obrigação de fazer, ajuizada por empresa associada visando compelir entidade de proteção veicular a custear o conserto de veículo sinistrado em oficina de sua preferência, em razão de orçamento mais vantajoso. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se é aplicável o Código de Defesa do Consumidor na relação jurídica entre as partes; (ii) saber se a agravada possui legitimidade passiva após alegada cessão de carteira; (iii) saber se o segurado tem direito à livre escolha da oficina para o conserto do veículo; (iv) saber se estão presentes os requisitos legais para a concessão de tutela de urgência, nos termos do art. 300 do CPC. III. Razões de decidir 3. As questões preliminares relativas à ilegitimidade passiva e à inaplicabilidade do CDC não foram enfrentadas pelo juízo de origem, não podendo ser conhecidas nesta instância sob pena de supressão de instância. 4. O direito do consumidor à livre escolha da oficina para conserto de veículo sinistrado encontra respaldo no CDC e na Circular SUSEP nº 269/2004. 5. No caso concreto, restou evidenciado que a oficina escolhida pela agravante apresentou orçamento consideravelmente inferior ao da oficina credenciada pela agravada, revelando recusa infundada ao custeio do reparo. 6. Apesar da demonstração da probabilidade do direito, não restou caracterizado o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, pois o veículo permanece inoperante há cerca de oito meses sem comprovação de impacto relevante nas atividades da empresa agravante, descaracterizando a urgência da medida pleiteada. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de agravo de instrumento conhecido e desprovido. Revogação da liminar que concedera efeito suspensivo. Tese de julgamento: "1. Não cabe à instância recursal, em agravo de instrumento, conhecer de matérias não decididas pelo juízo de origem, ainda que de ordem pública, sob pena de supressão de instância. 2. O segurado tem direito à livre escolha da oficina para reparo do veículo sinistrado, desde que respeitado o equilíbrio contratual e a razoabilidade econômica. 3. A ausência de demonstração de urgência real, em virtude da prolongada inatividade do veículo e da inexistência de prejuízo comprovado, afasta a concessão de tutela de urgência." Dispositivos relevantes: CPC, art. 300; CDC, arts. 6º, III, e 39, I; Jurisprudência relevante citada: TJMT, Ap. Cív. nº 1026112-53.2018.8.11.0041, Rel. Des. Carlos Alberto A. Rocha, j. 04/08/2024; TJMT, Ag. Instr. nº 1030446-49.2024.8.11.0000, Rel. Des. Márcio A. Guedes, j. 16/06/2025; TJMT, Ag. Instr. nº 1011650-73.2025.8.11.0000, Rel. Des. Tatiane Colombo, j. 23/06/2025. R E L A T Ó R I O Cuida-se de Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto por M.W. ROCHA FRADES LTDA, contra a r. decisão proferida pela MMª. Juíza de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que nos autos da ação de "Obrigação de Fazer" (Proc. nº 1003700-84.2025.8.11.0041), ajuizada pela agravante contra SOLUTION BENEFÍCIOS E SOCORRO MÚTUO, indeferiu o pedido de tutela de urgência para reparo de veículo sinistrado (cf. Id. nº 182983875). No recurso vinculado ao Id. nº 268111766, a Agravante alega que a decisão não considerou argumentos e provas relevantes que demonstram seu direito como consumidor e o perigo da demora. Sustenta que a escolha da oficina para reparo é direito do consumidor (art. 6º, II, CDC) e que a imposição de oficina credenciada configura prática abusiva. Pede, sob esses fundamentos, a concessão de tutela antecipada recursal para determinar reparo na Concessionária Fiat Domani conforme orçamento apresentado. Nas contrarrazões, o Agravado refuta os argumentos recursais, arguindo preliminar de ilegitimidade passiva por cessão de carteira à COONECTA, e pugna pelo desprovimento do recurso (cf. 279551863). O Eminente Relator deferiu o efeito suspensivo (cf. Id. nº 268483798) É o relatório. MARCIO APARECIDO GUEDES Relator V O T O R E L A T O R Conforme relatado, cuida-se de Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto por M.W. ROCHA FRADES LTDA, contra a r. decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que nos autos da ação de "Obrigação de Fazer com Pedido de Tutela de Urgência", ajuizada pela agravante contra SOLUTION BENEFÍCIOS E SOCORRO MÚTUO, indeferiu o pedido de tutela de urgência para determinar o reparo do veículo sinistrado na oficina de escolha da requerente (cf. Id. nº 182983875 dos autos de origem). Extrai-se da inicial que M.W. ROCHA FRADES LTDA ajuizou a presente demanda em desfavor de SOLUTION BENEFÍCIOS E SOCORRO MÚTUO, requerendo a concessão de tutela de urgência para determinar o reparo de seu veículo Fiat Strada na Concessionária Fiat Domani, conforme orçamento de R$ 33.923,30. Em análise liminar, foi proferida decisão que indeferiu o pedido liminar, diante do fundamento de que não há como asseverar que o menor orçamento é mais vantajoso para a empresa ré, sendo comum que seguradoras mantenham convênios com oficinas, não havendo demonstração de que a oficina indicada não é séria e competente. Esses foram os termos da decisão: “In casu, em que pese os orçamentos apresentados pelo autor indicando que o menor valor para conserto de seu veículo é na Concessionária Fiat Domani, não há como asseverar que este é, de fato, o mais vantajoso para a empresa ré. É muito comum que empresas seguradoras mantenham vínculo/convênio com algumas oficinas mecânicas, de maneira que interferir nessa questão não é medida razoável. Ademais, a ré não está se recusando a efetivar os reparos e pagar o preço do conserto, tampouco há nos autos demonstração de que a oficina escolhida não é séria e competente para o trabalho a ser desenvolvido. Desta feita, nesta quadra processual em que a cognição é feita de modo limitado, não há elementos de convicção suficientes a ensejar o deferimento da tutela de urgência provisória pleiteada. Posto isto, INDEFIRO O PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA.” O Requerido apresentou contraminuta ao agravo de instrumento, arguindo preliminar de ilegitimidade passiva por cessão de carteira à COONECTA e sustentando a inaplicabilidade do CDC por se tratar de associação sem fins lucrativos. Após regular análise, o Magistrado relator deferiu o efeito suspensivo ao recurso, conforme o seguinte: “Ao analisar os autos e considerando a cognição sumária própria deste momento processual, entendo que estão presentes os requisitos para a concessão da tutela de urgência recursal, nos termos do art. 300 do CPC. O direito à escolha da oficina pelo consumidor encontra respaldo tanto no CDC quanto no art. 14, do Anexo da Circular SUSEP nº 269/2004. (...) No caso concreto, verifica-se a probabilidade do direito alegado, pois o documento vinculado ao Id. nº 182091807 dos autos de origem, mostra que, em conversa com a seguradora, o autor/agravante informa que “o orçamento do amigão foi o de valor maior dentre todos os orçamentos. Sendo inclusive o dobro do valor” e em resposta, a seguradora, através da atendente Natália, afirma: “Temos ciência, sr. Rodrigo. No entanto, é nossa credenciada”. Ora, se a seguradora aprovou o conserto do veículo em uma oficina que cobra o dobro do valor cobrado pela oficina de preferência do segurado, a recusa em custear o conserto na oficina de preferência do segurado, é, conforme expressamente dito pela atendente da seguradora, apenas porque "é nossa credenciada", violando o direito do segurado de escolher livremente a empresa em que o veículo será reparado. Ou seja, a justificativa para a recusa do reparo na oficina escolhida pelo agravante não se baseia em qualquer classificação técnica ou econômica, mas exclusivamente na política interna de direcionamento para a rede credenciada, o que viola o direito do segurado de escolher livremente a empresa em que o veículo será reparado. Se a negativa tivesse por fundamento uma questão orçamentária, sendo o valor da oficina escolhida pelo autor/agravante consideravelmente superior ao da credenciada, ainda poderia haver alguma razoabilidade na posição de segurança. Entretanto, no presente caso, a situação é justamente inversa, já que o orçamento da Concessionária Fiat Domani apresenta valor consideravelmente inferior ao da oficina credenciada. O perigo de dano também é demonstrado, na medida em que o veículo em questão é essencial para o desenvolvimento das atividades empresariais do agravante, sendo indispensável para a continuidade de suas operações comerciais. Nesse contexto, a manutenção da decisão agravada poderá causar prejuízo irreparável ou de difícil peças ao agravante, justificando uma intervenção judicial imediata. Portanto, admito a interposição recursal tal como efetivada, de modo que recebo e autorizo o processamento do agravo de instrumento, e DEFIRO o pedido de concessão de efeito suspensivo, ficando o quadro assim acertado até que a Turma Julgadora, melhor e mais informada pelo subsídio de outros elementos que virão aos autos, inclusive pelo contraponto que será feito pelas contrarrazões, possa decidir com certeza e segurança sobre o mérito do recurso”. Inconformada com o desfecho dado à lide, SOLUTION BENEFÍCIOS E SOCORRO MÚTUO pugna pelo desprovimento do recurso, o qual se passa à análise. Cinge-se a controvérsia em definir se a agravada possui legitimidade passiva após alegada cessão de carteira, se a relação é regida pelo CDC ou pelo Código Civil, se o segurado/associado tem direito à livre escolha da oficina para reparo e se estão presentes os requisitos para tutela de urgência. As preliminares de ilegitimidade passiva e inaplicabilidade do CDC arguidas pela agravada em contraminuta não foram objeto de análise na decisão agravada, que se limitou aos requisitos da tutela de urgência. Tratando-se de matérias que demandam cognição exauriente e contraditório amplo, especialmente quanto à alegada cessão de carteira e à natureza jurídica da relação, não cabe sua análise nesta sede recursal, sob pena de supressão de instância, devendo ser remetidas ao juízo de origem para apreciação no momento oportuno. Em outra oportunidade esse relator já decidiu no mesmo sentido: “Ementa: Direito civil e processual civil. Agravo de instrumento. Ação de petição de herança. Tutela provisória de urgência. Impossibilidade de análise de preliminares arguidas por supressão de instância. Averbação nas matrículas imobiliárias. Legitimidade da medida. Recurso desprovido. (...) II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se a decisão agravada poderia ser reformada com base em preliminares de ilegitimidade passiva, litisconsórcio ativo necessário e nulidade da ordem de averbação por ausência de individualização dos bens; (ii) saber se estavam presentes os requisitos legais para concessão da tutela de urgência determinada pelo juízo de origem. III. Razões de decidir 3. As alegações preliminares não podem ser conhecidas nesta sede, pois não foram objeto de deliberação na instância originária, sob pena de supressão de instância. (...) IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de Agravo de Instrumento desprovido. Agravo interno prejudicado. Tese de julgamento: "1. Não cabe à instância recursal, em agravo de instrumento, conhecer de matérias não decididas pelo juízo de origem, ainda que de ordem pública, sob pena de supressão de instância. 2. É legítima a averbação da existência de ação de petição de herança nas matrículas imobiliárias dos bens do suposto espólio, quando presentes os requisitos da tutela provisória de urgência e o interesse legítimo da parte autora." (...) (N.U 1030446-49.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO APARECIDO GUEDES, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 16/06/2025, Publicado no DJE 16/06/2025) Portanto, as preliminares ficam ressalvadas para análise pelo juízo singular na sequência do feito. Superada essa questão, a controvérsia cinge-se em definir se estão presentes os requisitos estabelecidos no artigo 300 do Código de Processo Civil para concessão da tutela de urgência, notadamente quanto ao direito alegado pelo requerente de escolher livremente a oficina para reparo do veículo sinistrado. Para o deslinde da controvérsia, impõe-se a análise dos requisitos cumulativos estabelecidos no artigo 300 do Código de Processo Civil para concessão da tutela de urgência, quais sejam, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Quanto ao primeiro requisito, o direito à livre escolha da oficina pelo segurado encontra sólido respaldo tanto na legislação consumerista quanto na regulamentação específica editada pela Superintendência de Seguros Privados. Com efeito, o art. 14 do Anexo da Circular SUSEP nº 269/2004 estabelece de forma expressa que "deverá ser prevista contratualmente a livre escolha de oficinas pelos segurados, para a recuperação de veículos sinistrados", disposição que confere densidade normativa ao direito postulado pelo agravante. Nesse mesmo sentido, a jurisprudência desse sodalício consolidou entendimento no sentido de reconhecer tal prerrogativa, vide: “E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL – ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO VEICULAR – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – APLICABILIDADE – CONSERTO DE VEÍCULO AUTOMOTOR – OPÇÃO DO CONSUMIDOR – OFICINA NÃO CREDENCIADA – NEGATIVA INJUSTIFICADA NO PAGAMENTO – REEMBOLSO LIMITADO AO VALOR INDICADO PELA REDE CREDENCIADA – CLÁUSULA EXPRESSA – DEVER DE INDENIZAR – DANO MORAL – CONFIGURADO – QUANTUM JUSTO E PROPORCIONAL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Revela-se cogente a aplicação do Código de Defesa do Consumidor quando a ação é proposta pelo associado-segurado contra a associação que presta serviço de proteção veicular, cobrindo riscos predeterminados, caracterizando como relação de consumo, nos termos dos artigos 2º e 3º do CDC. In casu, por força do que foi pactuado, o segurado não era obrigado a realizar o conserto do automóvel na oficina credenciada pela ré, facultado a ele, a realização do reparo em estabelecimento comercial de sua livre escolha, contudo, deve respeitar a cláusula expressa de limitação da indenização para o caso de conserto do bem sinistrado em oficina não credenciada. A recusa indevida da empresa de permitir o conserto do veiculo em oficina escolhida pelos autores, ultrapassa a esfera de mero aborrecimento, caracterizando o dano moral indenizável ao caso concreto. O arbitramento do valor da indenização decorrente de dano moral deve ser feito de acordo com os aspectos do caso, sempre com bom senso, moderação e razoabilidade, atentando-se à proporcionalidade com relação ao grau de culpa, extensão e repercussão dos danos e à capacidade econômica das partes. (N.U 1026112-53.2018.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/08/2024, Publicado no DJE 04/08/2024)” No caso em exame, restou inequivocamente demonstrado pelos documentos acostados aos autos que a oficina escolhida pelo agravante apresenta orçamento significativamente inferior, no valor de R$ 33.923,30, em relação à oficina credenciada indicada pela agravada, cujo orçamento alcança a cifra de R$ 60.781,53, configurando uma diferença expressiva de R$ 26.858,23 em favor da primeira. Essa circunstância evidencia, de forma cristalina, que a recusa manifestada pela agravada não se baseia em critérios técnicos ou econômicos objetivos, mas tão somente na política interna de direcionamento compulsório para sua rede credenciada, o que contraria frontalmente o direito do segurado de exercer escolha livre e consciente. Mais significativo ainda é o fato de que, conforme se depreende das conversas travadas entre as partes e documentadas nos autos, a própria agravada reconheceu expressamente que o orçamento da oficina credenciada representa o dobro do valor da oficina escolhida pelo segurado, justificando sua imposição exclusivamente sob o argumento de que "é nossa credenciada". Tal postura configura manifesta arbitrariedade, na medida em que subordina o interesse legítimo do segurado a meras conveniências administrativas da seguradora, em evidente descompasso com os princípios que regem as relações contratuais contemporâneas. Dessa forma, não restam dúvidas quanto à presença do primeiro requisito da tutela de urgência, uma vez que a probabilidade do direito alegado pelo agravante encontra-se suficientemente caracterizada pelos elementos probatórios carreados aos autos e pelo arcabouço normativo e jurisprudencial aplicável à espécie. Contudo, no que concerne ao segundo requisito - o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo -, a situação fática apresenta contornos que merecem análise mais criteriosa. Embora o agravante sustente que o veículo constitui instrumento essencial para o desenvolvimento de suas atividades empresariais, circunstância que, em tese, poderia justificar a concessão da medida de urgência, os elementos constantes dos autos revelam cenário que enfraquece sobremaneira essa alegação. Com efeito, verifica-se que o veículo encontra-se parado desde novembro de 2024, perfazendo um período de aproximadamente oito meses, sem que tenha havido demonstração efetiva de prejuízo irreparável ou de difícil reparação às atividades desenvolvidas pelo agravante. Essa circunstância temporal assume relevância fundamental para a análise da urgência alegada, porquanto a manutenção prolongada da situação sem aparente comprometimento das atividades empresariais sugere que a pretensão não possui o caráter emergencial que justificaria a intervenção judicial imediata. Além disso, a alegada urgência encontra-se em evidente contradição com a própria conduta adotada pelo agravante, que deliberadamente optou por manter o veículo inoperante durante todos esses meses em vez de aceitar prontamente o reparo nas oficinas credenciadas oferecidas pela agravada. Ora, se houvesse real urgência decorrente da essencialidade do bem para o desenvolvimento das atividades empresariais, seria razoável esperar que o agravante aceitasse de imediato o reparo em qualquer das oficinas disponibilizadas pela agravada, todas aparentemente dotadas de capacidade técnica adequada para a execução dos serviços necessários. Essa conduta contraditória revela que, em verdade, a pretensão do agravante não se funda em urgência genuína, mas em preferência legítima - porém não urgente - por determinado estabelecimento. A escolha pela oficina de sua confiança, conquanto constituía direito reconhecido pelo ordenamento jurídico, representa liberalidade do consumidor que não se confunde com a urgência exigida pelo artigo 300 do Código de Processo Civil para justificar a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional. Nesse contexto, o simples desejo de obter reparo em estabelecimento específico, por mais legítimo que seja, não configura, por si só, perigo de dano irreparável apto a autorizar a concessão da tutela de urgência. A jurisprudência do E. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso é firme no sentido de que a tutela antecipatória pressupõe situação de emergência que não pode aguardar o deslinde natural do processo, sob pena de perecimento do direito ou comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional. “EMENTA. AGRAVO DE INSTRUMENTO - SUSPENSÃO DE AÇÃO DE DIVÓRCIO EM RAZÃO DE AÇÃO ANULATÓRIA - PENHORA INCIDENTE SOBRE CRÉDITO TRABALHISTA - AUSÊNCIA DE PERICULUM IN MORA - RECURSO DESPROVIDO. (...) III. RAZÕES DE DECIDIR 3 - A concessão da tutela de urgência exige a demonstração cumulativa da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, nos termos do art. 300 do CPC. (...) 6 - A ausência de demonstração de risco iminente de perecimento do direito exequendo, especialmente diante da inércia da agravante na adoção de medidas autônomas, afasta o requisito do periculum in mora. 7 - A decisão judicial combatida é provisória e poderá ser revista caso surjam novos elementos, conforme jurisprudência consolidada. IV. DISPOSITIVO E TESE (...) 8 - Recurso desprovido. 3 - A inexistência de risco iminente e de urgência justificada afasta a concessão de tutela recursal para revogar decisão que visa resguardar o contraditório e a prestação jurisdicional efetiva. (N.U 1011650-73.2025.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 23/06/2025, Publicado no DJE 23/06/2025) No presente caso, a manutenção prolongada do veículo sem reparo, quando havia alternativas técnica e juridicamente viáveis disponibilizadas pela agravada, demonstra de forma inequívoca que a pretensão não ostenta o caráter de urgência indispensável à concessão da medida pleiteada. Ademais, cumpre observar que a eventual procedência da pretensão ao final do processo assegurará ao agravante a integral satisfação de seu direito, inclusive com a possibilidade de ressarcimento de eventuais prejuízos comprovadamente sofridos em razão do retardamento do reparo. Não se vislumbra, portanto, risco de perecimento do direito ou de comprometimento da efetividade da tutela jurisdicional que justifique a manutenção da antecipação concedida. Ante o exposto, conheço do recurso e NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento, mantendo incólume a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau. No mesmo ato, revogo a decisão liminar que concedera efeito suspensivo ao presente recurso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025

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