Processo nº 5001219-29.2023.4.03.6113
ID: 276679905
Tribunal: TRF3
Órgão: 2ª Vara Federal de Franca
Classe: MONITóRIA
Nº Processo: 5001219-29.2023.4.03.6113
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ADAUTO DONIZETE DE CAMPOS
OAB/SP XXXXXX
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MONITÓRIA (40) Nº 5001219-29.2023.4.03.6113 / 2ª Vara Federal de Franca AUTOR: CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF PROCURADOR: RODRIGO MOTTA SARAIVA REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO RODRIGO MOTTA SARAIVA Advo…
MONITÓRIA (40) Nº 5001219-29.2023.4.03.6113 / 2ª Vara Federal de Franca AUTOR: CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF PROCURADOR: RODRIGO MOTTA SARAIVA REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO RODRIGO MOTTA SARAIVA Advogados do(a) AUTOR: CARLOS EDUARDO CURY - SP122855, CASSIA APARECIDA DE OLIVEIRA TEIXEIRA - SP225988-B REU: BARSI INDUSTRIA E COMERCIO DE SISTEMAS ELETRONICOS DE SEGURANCA LTDA, VIVIANE APARECIDA BARSI UTRERA, PAULO FERNANDO BARSI JUNIOR Advogado do(a) REU: ADAUTO DONIZETE DE CAMPOS - SP189438 S E N T E N Ç A Vistos em inspeção. I – RELATÓRIO Trata-se de ação monitória ajuizada pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF em face de BARSI INDUSTRIA E COMERCIO DE SISTEMAS ELETRONICOS, PAULO FERNANDO BARSI JUNIOR e VIVIANE APARECIDA BARSI UTRERA, visando ao recebimento de quantia de R$103.339,55 (cento e três mil, trezentos e trinta e nove reais e cinquenta e cinco centavos), decorrente do inadimplemento dos contratos nºs 0000000220651479 e 0009925115034838 (Contrato de Relacionamento - Contratação de Produtos e Serviços Pessoa Jurídica, por Contrato Particular de Consolidação, Confissão, Renegociação de Dívida e Outras Obrigações ou por CCB – Cédula de Crédito Bancário). Com a inicial, vieram documentos. Regularizada a representação processual da CEF (Id 288603754), determinou-se a citação dos correqueridos. Citada a correquerida Viviane Aparecida Barsi, na condição de representante legal da pessoa jurídica e de codevedora (Id 2980426529), decorreu in albis o prazo para efetuar pagamento do débito ou oferecer embargos à ação monitória. Pesquisas de endereço junto aos sistemas Sinesp, Receita Federal do Brasil, Justiça Eleitoral, CNIS e Sisbajud anexadas aos autos (Id 300618139 a Id 301230037). Frustradas as tentativas de citação pessoal por meio de carta, com aviso de recebimento, e por Oficial de Justiça do correquerido Paulo Fernando Barsi Júnior. Intimada a CEF para se manifestar (Id 309053129), declinou novo endereço para citação do correquerido Paulo Fernando Barsi Júnior (Id 309995985). Frustrada nova tentativa de citação (Id 313425443), intimou-se a CEF (Id 315834136), que requereu a realização de busca do atual endereço do correquerido Paulo Fernando Barsi Júnior (Id 316748527), o que foi deferido (Id 321863917). Pesquisas de endereço, via SisbaJud, juntadas aos autos (Id 322847940). Intimada a CEF para se manifestar (Id 326954120), declinou novos endereços e números de telefones (Id 328446379). Determinou-se a citação do correquerido Paulo Fernando Barsi Júnior (Id 329420958). Frustradas as tentativas de citação pessoal (Id 331144723 a Id 332397535), intimou-se a CEF (Id 333561778), que declinou novo endereço (Id 336701791). Despacho que indeferiu a expedição de carta de citação do correquerido para o endereço fornecido pela CEF, uma vez que se trata de endereço do domicílio de sua sogra, cuja diligência restou infrutífera. Determinou-se a citação por meio de edital (Id 336867791). Publicado o edital de citação (Id 341052157) e decorrido o prazo para o correquerido se manifestar, nomeou-se, na forma do art. 72, inciso II, do Código de Processo Civil, curador especial (Id 352218357). Embargos monitórios opostos pelo curador especial (Id 356817015). Preambularmente, requereu a atribuição de efeito suspensivo. Preliminarmente, alegou a nulidade da citação por edital. Requereu a inversão do ônus da prova e a aplicação do estatuto consumerista. No mérito, advoga a abusividade da taxa de juros remuneratórios, a impossibilidade de capitalização de juros por ausência de previsão contratual, a acumulação indevida de juros moratórios e outros encargos com comissão de permanência. Aduz ser abusiva a Cláusula 18.3 do Contrato de Cartão de Crédito, por violar o disposto no art. 51, inciso IV, do CDC e no art. 397, parágrafo único, do Código Civil. Articula a ilegalidade da cobrança de múltiplas e cumulativas tarifas, conforme previsto na Cláusula 8.3 do contrato, em ofensa à Resolução CMN nº 3.919/2010. Refuta a Cláusula 21.1 do contrato que, em violação ao disposto no art. 51, XIII, do CDC, prevê a alteração unilateral do contrato. Sublinha que a Cláusula 1.1, item “r”, do contrato se mostra abusiva, na medida em que prevê responsabilidade solidária automática, em ofensa ao disposto no art. 265 do Código Civil. Pronuncia a existência de excesso de execução, devendo os juros remuneratórios serem limitados à taxa média praticado no mercado, excluindo-se a capitalização mensal e a cumulação indevida de encargos moratórios, além de extirpar as tarifas cobradas indevidamente. Pleiteia, ao final, o recálculo do débito, compensando-se com os valores pagos a maior. Despacho Id 357578863 intimou a parte embargante para emendar a inicial, declarando o valor que reputa como correto, nos termos do art. 702, §§2º e 3º, do Código de Processo Civil. A parte embargante emendou a inicial (Id 361370238), apresentando demonstrativo atualizado do débito e metodologia de cálculo. Requereu a produção de prova pericial contábil. Reiterou, ainda, o pedido de recebimento dos embargos monitórios, atribuindo-lhes efeito suspensivo. Despacho Id 361764614 recebeu a emenda à inicial, suspendendo a eficácia do mandado injuntivo. Intimou-se a parte embargada. Impugnação aos embargos à ação monitória apresentada pela CEF (Id 362504318). Preliminarmente, requereu a rejeição dos embargos monitórios, na forma do art. 702, §2º, do Código de Processo Civil. No mérito, defendeu a higidez dos títulos que aparelham a ação monitória e a regularidade da cobrança judicial. Juntou instrumento de procuração (Id 362504674) e substabelecimento (Id 362505180). Em suma, é o relatório. Fundamento e decido. II – FUNDAMENTAÇÃO O feito comporta julgamento antecipado nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, pois, versando matéria de direito, não existe necessidade de produção de outras provas, além das documentais já produzidas. Ademais, a jurisprudência já firmou entendimento de que não constitui cerceamento de defesa a não realização de prova pericial, vez que as questões relativas à incidência de juros, caracterização de anatocismo, aplicação da comissão de permanência ou do Código de Defesa do Consumidor constituem matéria de direito. Nesse esteira, é o entendimento do Tribunal Regional Federal da 3ª Região: DIREITO CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. CARTÃO DE CRÉDITO. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. 1. Improcede a alegação de cerceamento de defesa, decorrente do indeferimento de produção de prova pericial e de julgamento antecipado da lide, tendo em vista tratar-se de questão eminentemente de direito, na medida em que a solução da lide restringe-se à determinação de quais critérios devem ser aplicados na atualização do débito. 2. Apelação improvida. (ApCiv 0001597-51.2010.4.03.6105, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/05/2017.) AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROVA PERICIAL. RECURSO DESPROVIDO - Há que se considerar que a prova pericial requerida não se demonstra necessária para o deslinde da causa, uma vez que a discussão quanto aos critérios de juros aplicados e a questão relativa ao eventual abuso na cobrança dos encargos contratuais é matéria exclusivamente de direito, bastando, portanto, a mera interpretação das cláusulas do contrato firmado entre as partes para se apurar possíveis irregularidades, documento esse que está colacionado aos autos originários. Logo, concluiu-se pela desnecessidade da realização da perícia contábil. - A valoração que se dará às provas a serem produzidas, depende do livre convencimento motivado, não estando este Juízo adstrito ao laudo pericial a ser produzido (art. 436, do CPC/73- correspondente ao 479 do NCPC). - Recurso desprovido.(AI 5001240-21.2017.4.03.0000, Rel. Juiz Federal Convocado ROBERTO MODESTO JEUKEN, TRF 3 - Segunda Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 11/10/2017). PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR - CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO PARA FINANCIAMENTO DE MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO - CONSTRUCARD - CONTRATO DE CRÉDITO ROTATIVO - CONTRATO DE RELACIONAMENTO - ABERTURA DEE CONTA E ADESÃO A PRODUTOS E SERVIÇOS - PESSOA FÍSICA E CARTÃO DE CRÉDITO - AÇÃO MONITÓRIA - PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA AFASTADA - APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE - PROVA PERICIAL CONTÁBIL - DESNECESSIDADE - RECURSO DE APELAÇÃO IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Nos termos do parágrafo 2º do artigo 1.1.02 c do Código de Processo Civil a ação monitória se converte para o rito ordinário quando opostos os embargos, de modo a possibilitar às partes a discussão sobre a matéria, assegurando o contraditório e a ampla defesa. 2. Assim, a opção da parte autora pela ação monitória não constitui óbice ao provimento jurisdicional, uma vez que não houve prejuízo algum para a parte contrária, que pode exercer o direito ao contraditório por meio da oposição dos embargos. 3. Ademais, aplica-se aos presentes autos, o entendimento cristalizado no enunciado da Súmula 247 do E. Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o contrato de abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado do demonstrativo do débito, constitui documento hábil para ajuizamento da ação monitória. Preliminar de inadequação da via eleita rejeitada. 4. Após a edição da súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça e posicionamento do Supremo Tribunal Federal na ADIN 2591/DF, não há mais controvérsia acerca da aplicabilidade dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor às instituições bancárias. 5. A par disso, na hipótese, inexiste qualquer dificuldade na interpretação das cláusulas contratuais pactuadas, visto que o contrato, embora de adesão, foi redigido de forma clara a possibilitar a identificação de prazos, valores negociados, taxa de juros, encargos a incidir no caso de inadimplência, e demais condições, conforme preconiza o §3º do artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor. 6. Assim, embora inegável a relação de consumo existente entre os litigantes, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, não significa ignorar por completo as cláusulas contratuais pactuadas, a legislação aplicável à espécie e o entendimento jurisprudencial consolidado. 7. Na verdade a parte ré deve se submeter à força vinculante do contrato, que se assenta máxima "pacta sunt servanda", apenas elidida em hipóteses de caso fortuito ou força maior, o que não ocorre nos presentes autos. 8. Não é ilegal, tampouco abusiva, a cláusula que prevê o vencimento antecipado da dívida em caso de inadimplemento, porquanto, como bem assinalou magistrado de primeiro grau, a sua estipulação foi claramente expressa nos instrumentos dos contratos e também porque tem a finalidade de manter o equilíbrio contratual, coibindo a inadimplência. 9. O artigo 330 do Código de Processo Civil permite ao magistrado julgar antecipadamente a causa e dispensar a produção de provas quando a questão for unicamente de direito e os documentos acostados aos autos forem suficientes ao exame do pedido. 10. E o artigo 130 do Código de Processo Civil confere ao magistrado a possibilidade de avaliar a necessidade da prova, e de indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias de modo que, caso a prova pericial contábil fosse efetivamente necessária ao deslinde da questão, teria o magistrado ordenado sua realização, independentemente de requerimento. 11. Além disso, não é demais ponderar que o Excelso Pretório também já se posicionou no sentido de que a necessidade da produção de prova há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique cerceamento de defesa. A antecipação é legítima se os aspectos decisivos estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do Magistrado (RE nº 101.171-8/SP, Rel. Min. Francisco Rezek). 12. No caso, os valores, índices e taxas que incidiram sobre a dívida estão bem especificados nos autos e, além disso, a questão relativa ao abuso na cobrança dos encargos é matéria exclusivamente de direito, porquanto basta mera interpretação das cláusulas do contrato firmado entre as partes para se apurar as eventuais ilegalidades apontadas, razão pela qual não há necessidade de se anular o feito para a produção de prova pericial contábil. 10. Preliminar rejeitada. Recurso de apelação improvido. Sentença mantida. (ApCiv 0000539-17.2013.4.03.6102, DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, TRF3 – Quinta Turma, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/03/2015.) 1. PRELIMINARES 1.1 DA NULIDADE DA CITAÇÃO Ao contrário do que sustenta o embargante Paulo Fernando Barsi Júnior, representado por curador especial nomeado neste feito, foram esgotadas todas as tentativas de citação pessoal por meio de carta, com aviso de recebimento, e por Oficial de Justiça (Id’s 296277002, 297034443, 307021184, 307730442, 313425443, 331144723, 331145534 e 332397535), além de não terem sido localizados novos endereços mediante consulta aos sistemas oficiais (Id 322847940 e Id 300618139 a Id 301230037). Assim, esgotados os meios ordinários para localizar o paradeiro do devedor, frustradas as tentativas de citação pessoal, cabível a citação por edital, consoante inteligência do art. 246, inciso IV, e art. 256 do Código de Processo Civil. 1.2 DA REJEIÇÃO LIMINAR DOS EMBARGOS MONITÓRIOS Rejeito a preliminar suscitada pela CEF de que não foi observado o disposto no artigo 702, §§2º e 3º, do Código de Processo Civil, porquanto a parte embargante indicou os valores reputados excessivos e os respectivos encargos, consoante se infere da petição Id 361370238. Encontram-se presentes as condições da ação, bem como os pressupostos processuais objetivo e subjetivo de existência e validade da relação processual, razão pela qual passo ao exame do mérito da causa. 2. MÉRITO É cediço que ao celebrar contrato de adesão, o devedor (mutuário) não possui a exata noção de quão onerosa tornar-se-á sua dívida em caso de impontualidade. Inicialmente, ressalto que não resta dúvida sobre a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (CDC) aos contratos firmados pelas instituições financeiras com seus clientes, tal o caso em apreço. Sobre o tema, consolidou sua jurisprudência o STJ, especialmente na Súmula nº 297, cujo verbete transcrevo: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Note-se que, não obstante a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de novembro de 1990) às relações contratuais envolvendo instituições financeiras, deve-se verificar, no caso concreto, se o negócio jurídico desenvolveu-se corretamente ou, pelo contrário, de maneira abusiva, provocando onerosidade excessiva do contrato ou, ainda, se descumpriu dolosamente qualquer de suas cláusulas. A teoria maximalista temperada ou finalista mitigada, adotada amplamente pelo STJ, reza que a pessoa jurídica que adquire bens para utilizá-los no exercício de sua atividade econômica pode ser considerada consumidora, desde que demonstre sua vulnerabilidade técnica ou econômica. A sociedade empresária BARSI INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE SISTEMAS ELETRÔNICOS DE SEGURANÇA LTDA. foi constituída em 15/04/2010, com capital social de R$27.000,00 (vinte e sete mil reais), tendo por objeto social o comércio varejista especializado de peças e acessórios para aparelhos eletroeletrônicos para uso doméstico, exceto informática e comunicação (Id 300618139). Trata-se de microempresa optante pelo Simples Nacional, desde 01/01/2020, figurando em seu quadro social Viviane Aparecida Barsi Utrera e Paulo Fernando Barsi Júnior. O valor do capital social mostra-se inferior ao montante dos empréstimos tomados junto à instituição financeira para o desenvolvimento da atividade econômica. Notória a vulnerabilidade econômica em face da instituição financeira, de modo que aplicável o Código de Defesa do Consumidor. Passo ao exame das demais alegações arguidas pelo ora embargante. No julgamento do Resp. 1.061.530/RS, de relatoria da Min. Nancy Andrighi, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça fixou o seguinte entendimento: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROSREMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO⁄MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO Constatada a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, foi instaurado o incidente de processo repetitivo referente aos contratos bancários subordinados ao Código de Defesa doConsumidor, nos termos da ADI n.º 2.591-1. Exceto: cédulas de crédito rural, industrial, bancária e comercial; contratos celebrados por cooperativas de crédito; contratos regidos pelo Sistema Financeiro deHabitação, bem como os de crédito consignado. Para os efeitos do § 7º do art. 543-C do CPC, a questão de direito idêntica, além de estar selecionada na decisão que instaurou o incidente de processo repetitivo, deve ter sido expressamente debatida no acórdão recorrido e nas razões do recurso especial, preenchendo todos os requisitos de admissibilidade. Neste julgamento, os requisitos específicos do incidente foram verificados quanto às seguintes questões: i) juros remuneratórios; ii) configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição⁄manutenção emcadastro de inadimplentes e v) disposições de ofício. PRELIMINAR O Parecer do MPF opinou pela suspensão do recurso até o julgamento definitivo da ADI 2.316⁄DF. Preliminar rejeitada ante a presunção de constitucionalidade do art. 5º da MP n.º 1.963-17⁄00, reeditada sob o n.º 2.170-36⁄01. I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626⁄33), Súmula 596⁄STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c⁄c o art. 406 do CC⁄02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. ORIENTAÇÃO 2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora; b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual. ORIENTAÇÃO 3 - JUROS MORATÓRIOS Nos contratos bancários, não-regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês. ORIENTAÇÃO 4 - INSCRIÇÃO⁄MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES a) A abstenção da inscrição⁄manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e⁄ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) houver depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz; b) A inscrição⁄manutenção do nome do devedor em cadastro de inadimplentes decidida na sentença ou no acórdão observará o que for decidido no mérito do processo. Caracterizada a mora, correta ainscrição⁄manutenção. ORIENTAÇÃO 5 - DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO É vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários. Vencidos quanto a esta matéria a Min. Relatora e o Min. Luis Felipe Salomão. II- JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO (REsp 1.061.530⁄RS) A menção a artigo de lei, sem a demonstração das razões de inconformidade, impõe o não-conhecimento do recurso especial, em razão da sua deficiente fundamentação. Incidência da Súmula 284⁄STF. O recurso especial não constitui via adequada para o exame de temas constitucionais, sob pena de usurpação da competência do STF. Devem ser decotadas as disposições de ofício realizadas pelo acórdão recorrido. Os juros remuneratórios contratados encontram-se no limite que esta Corte tem considerado razoável e, sob a ótica do Direito do Consumidor, não merecem ser revistos, porquanto não demonstrada a onerosidade excessiva na hipótese. Verificada a cobrança de encargo abusivo no período da normalidade contratual, resta descaracterizada a mora do devedor. Afastada a mora: i) é ilegal o envio de dados do consumidor para quaisquer cadastros de inadimplência; ii) deve o consumidor permanecer na posse do bem alienado fiduciariamente e iii) não se admite o protesto do título representativo da dívida. Não há qualquer vedação legal à efetivação de depósitos parciais, segundo o que a parte entende devido. Não se conhece do recurso quanto à comissão de permanência, pois deficiente o fundamento no tocante à alínea "a" do permissivo constitucional e também pelo fato de o dissídio jurisprudencial não ter sidocomprovado, mediante a realização do cotejo entre os julgados tidos como divergentes. Vencidos quanto ao conhecimento do recurso a Min. Relatora e o Min. Carlos Fernando Mathias. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido, para declarar a legalidade da cobrança dos juros remuneratórios, como pactuados, e ainda decotar do julgamento as disposições de ofício. Ônus sucumbenciais redistribuídos. A letra “b” da Orientação 1 foi incorporada no enunciado da Súmula 382 do STJ, segundo o qual “a estipulação de juros remuneratórios, superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”. O Supremo Tribunal Federal também adota a mesma posição, a teor do disposto na Súmula 596 STF - “as disposições do Decreto nº 22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional”. Portanto, para a Corte, é possível a manutenção dos juros ajustados pelas partes, desde que, no caso concreto, não configure o abuso que coloque o consumidor em desvantagem exagerada. Cumpre ressaltar que, nos termos da Súmula nº 648 do Supremo Tribunal Federal, "a norma do § 3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda constitucional nº 40/2003, que limitava a taxa de juros a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar." O E. Pretório editou a Súmula Vinculante nº 07, cujo enunciado repete os termos da Súmula nº 648 ora transcrita, razão pela qual descabe qualquer discussão acerca da limitação constitucional dos juros remuneratórios. Por sua vez, em relação aos juros moratórios, o enunciado da Súmula 379 do STJ dispõe que “nos contratos bancários não regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês”. Dessa forma, os contratos não regidos por leis específicas, mesmo quando pactuados por instituições financeiras, devem obedecer às regras gerais previstas no art. 1º do Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura) e art. 406 do Código Civil c/c art. 161, §1º, do CTN. A capitalização anual dos juros nos contratos firmados com as instituições financeiras, na qual se incluem os contratos de cartão de crédito, é permitida, desde que previamente pactuado pelas partes contratantes. Neste sentido é o entendimento do STJ, que mitigou a posição firmada na Súmula 121 (grifei): AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PERIODICIDADE ANUAL. ART. 591 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. PREVISÃO CONTRATUAL. NECESSIDADE. 1. É permitida a cobrança de juros capitalizados em periodicidade anual nos contratos bancários firmados com instituições financeiras, quando houver expressa pactuação neste sentido, circunstância não ocorrente na espécie. 2. Agravo interno desprovido. (AgRg no REsp 1246559/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 14/06/2011, DJe 01/08/2011) Já a capitalização mensal dos juros pelas instituições financeiras somente é admitida nos casos legalmente previstos, tais como, nos títulos de crédito rural (Decreto-Lei 167/1967), nos títulos de crédito industrial (Decreto Lei 413/1969), e nos títulos de crédito rural (Lei 6.840/1980). Esse inclusive é o entendimento do STJ consolidado na Súmula 93 (“A legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros”). O Superior Tribunal de Justiça entende também que a capitalização dos juros na periodiciade mensal é permitida para os contratos pactuados a partir da MP nº 1.963-17, de 31 de março de 2000, desde que previamente estabelecida pelas partes. No que diz respeito à comissão de permanência, o STJ, no julgamento dos recursos repetitivos Resp 1.058.114/RS e Resp 1.063.343/RS, de relatoria dos Ministros Nancy Andrighi e João Otávio de Noronha, D.J. 12/08/2009, firmou o entendimento no sentido de que é válida a cláusula que prevê a cobrança da comissão de permanência para o período de inadimplência desde que não cumulada com juros remuneratórios, juros moratórios, multa moratória ou correção monetária, devendo ser calculada pela taxa média dos juros de mercado apurada pelo Banco Central. Dessa forma, a fixação da taxa média de mercado utilizada na cobrança da comissão de permanência não se subordina exclusivamente à vontade do banco mutuante, haja vista que se deve ater aos parâmetros e metodologia de cálculo utilizados pelo Bacen. Dispõe o Enunciado de Súmula 472 do STJ: "A cobrança de comissão de permanência - cujo valor não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato - exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual". Quanto à multa moratória, e à luz do disposto no §1º do art. 52 do CDC, aplica-se o entendimento firmado na súmula 285 do STJ (“Nos contratos bancários posteriores ao Código de Defesa do Consumidor incide a multa moratória nele prevista”). Compulsando os documentos que instruem a petição inicial, observa-se o seguinte: (i) Contrato de Prestação de Serviços de Administração dos Cartões de Crédito CAIXA – Pessoa Jurídica, com abertura de conta corrente nº 3042.003.2982-5 em 25/01/2021, figurando como contratante BARSI IND. E COM. DE SISTEMAS ELETRÔNICOS DE SEGURANÇA LTDA. (Id 287816516 e Id 287816518). Dentre os serviços disponibilizados ao correntista, destacam-se produtos de crédito, nas modalidades CHEQUE EMPRESA CAIXA, DECONTO DE CHEQUES, GIROCAIXA INSTANTÂNEO MÚLTIPLO, GIROCAIXA FÁCIL, MICROCRÉDITO PRODUTIVO e CARTÃO DE CRÉDITO. Enuncia o Termo de Cláusulas Gerais de Limites de Crédito Rotativo – Pessoa Jurídica (Id 287816516), o atraso no cumprimento de qualquer obrigação acessória ou principal acarreta a incidência dos seguintes encargos: a) Juros remuneratórios, por dia de atraso, sobre a parcela vencida ou sobre o saldo devedor não liquidado, composto de: a.1) taxas de juros da operação de parcelamento do saldo devedor da fatura, no caso de parcelas vencidas de operações realizadas nesta modalidade de parcelamento; a.2) taxa de juros da modalidade de crédito rotativo, para os demais valores em atraso; b) Multa de 2% (dois por cento); c) Juros de mora de 1% ao mês, "pro rata dia" (Cláusula Décima Oitava). Na hipótese de inadimplência, dispõe, ainda, o Item 18.3 da Cláusula Décima Oitava: “A falta, insuficiência ou atraso de pagamento, na data do vencimento indicado na Fatura Mensal, implica, a critério da Emissora, no vencimento antecipado de todas as dívidas mantidas junto à CAIXA e na constituição em mora da Empresa, mediante disponibilização da Fatura Mensal específica, independentemente de quaisquer outros avisos ou notificações extrajudiciais ou judiciais, sujeitando a Empresa ao pagamento das taxas a que se refere o item 18.1 e ainda de: a) atualização monetária sobre o débito ou indenização por perdas e danos pelos custos nos quais a Emissora tenha incorrido; b) recorrendo a Emissora aos meios judiciais ou a serviços especiais de cobrança para haver o crédito, além do principal e dos encargos previstos nesta Cláusula, responderá a Empresa por todas as despesas de cobrança, custas judiciais e honorários advocatícios, calculados sobre o valor da dívida”. Estabelece também o Item 18.6 da Cláusula Décima Oitava que, permanecendo sem pagamento a fatura por mais de 60 (sessenta) dias, o saldo devedor será enquadrado em cobrança e cancelado o cartão, corrigindo-se o saldo devedor pelo IGPM, acrescido de 1% ou outro índice que venha a substituí-lo. As faturas de cartão de crédito nº 4219XXXX.XXXX.5968, bandeira VISA, indicam o inadimplemento da fatura com vencimento em 12/04/2022. Sobre o total da fatura anterior incidiram juros por atraso de 7,00% ao mês, multa de atraso de 2,00%, juros moratórios de 1,00% ao mês e juros pelo não pagamento mínimo (Id 287816519). (ii) Em 25/01/2021, pactuou-se contrato de mútuo, com emissão de Cédula de Crédito Bancário nº 001.150.348, no valor de R$94.523,46, parcelado em 36 prestações, com prazo de carência de 3 meses, com vencimento da primeira prestação em 25/05/2021. O instrumento contratual prevê os seguintes encargos da operação: (a) juros remuneratórios à taxa mensal de 1,19%, capitalizado mensalmente (Cláusula Terceira), tendo como indexador a taxa SELIC, adotando-se o Sistema de Amortização Francês – Tabela PRICE; (b) IOF no valor de R$1.715,46; (c) Tarifa TARC no valor de R$2.808,00 (Id 287816517). Dispõe, ainda, a Cláusula Nona, que, no período de inadimplência, o saldo devedor ficará sujeito à atualização monetária pela TR ou índice que venha a sucedê-la; juros de mora de 1% ao mês ou fração; multa de 2%; tributos previstos em lei; custas e honorários advocatícios à razão de 10% sobre o valor total recebido/renegociado, em caso de intervenção de advogado. A planilha de débito (Id 287816520) indica a aplicação de juros remuneratórios de 1,190% ao mês, taxa de juros anual nominal de 14,28% e efetiva de 15,2527%, adotando-se o Sistema de Amortização da Tabela PRICE, vencendo-se a última operação em 25/05/2024. O inadimplemento iniciou-se a partir de 25/01/2022, não tendo sido adimplidas as prestações referentes às competências de janeiro/2022 a janeiro/2023, perfazendo o saldo devedor, em 06/02/2023, o valor de R$101.204,15 (Id 287816522). Observa-se que os negócios jurídicos foram firmados em momento posterior à vigência da MP nº. 1.963-17/2000 (reeditada sob o nº. 2.170-36), que passou a admitir a capitalização mensal de juros. Ademais, o artigo 28, § 1º, I, da Lei 10.931/04 contempla previsão expressa de incidência de juros capitalizados em Cédula de Crédito Bancário. Conquanto a questão da constitucionalidade da referida norma seja objeto da ADIn nº 2316, registre-se que não há pronunciamento definitivo do E. Supremo Tribunal Federal, razão pela qual deve prevalecer a presunção de constitucionalidade da MP nº 1.963-17/00, reeditada sob o nº 2.170-36/01, que admite a capitalização mensal de juros nas operações realizadas por instituições financeiras.(cf. voto preliminar no Resp nº 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009). Em suma: em contratos bancários, para que seja legítima a capitalização mensal nos juros, é fundamental a presença de cláusula expressa prevendo esta possibilidade. Para isso, basta que, no contrato, esteja prevista a taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal. Os bancos não precisam dizer expressamente no contrato que estão adotando a “capitalização de juros”, sendo suficiente explicitar com clareza as taxas cobradas (STJ, 2ª Seção, REsp 973.827/RS, julgado em 27/06/2012). Em relação ao contrato de cartão de crédito, a Cláusula Décima Oitava, combinada com o detalhamento da fatura, evidencia que juro anual é superior ao duodécuplo dos juros mensais, o que, por si só, é suficiente para permitir a capitalização. No que toca à limitação dos juros pactuados, não há que se falar em ilegalidade e abusividade da cláusula contratual que deixa de fixar a priori a taxa de juros aplicável no decorrer dos contratos, uma vez que ela é estipulada de acordo com as regras do mercado financeiro, ditadas pelo Conselho Monetário Nacional e Banco Central do Brasil, não estando sujeitas a qualquer limitação. Ainda no tocante aos juros, entendo que não é aplicável o limite de 12% (doze por cento), previsto na redação anterior do art. 192 da Constituição Federal, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal: “EMENTA: - Direito Constitucional. Taxa de juros reais. Limite de 12% ao ano. Art. 192, §. 3.º, da Constituição Federal. Em face do que ficou decidido pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADIn n.º 4, o limite de 12% ao ano, previsto, para os juros reais, pelo § 3.º do art. 192 da Constituição Federal, depende da aprovação da Lei Complementar regulamentadora do Sistema Financeiro Nacional, a que se referem o "caput" e seus incisos do mesmo dispositivo. R.E. conhecido e provido, para se cancelar a limitação estabelecida no acórdão recorrido.” (Origem: STF - Supremo Tribunal Federal Classe: RE - RECURSO EXTRAORDINÁRIO Processo: 156399 UF: RS - RIO GRANDE DO SUL Orgão Julgador: Data da decisão: Documento: DJ 02-06-1995 PP-16239 EMENT VOL 01789-03 PP-00449 SYDNEY SANCHES) No mesmo sentido colaciono precedente do Superior Tribunal de Justiça (grifei): “CONTRATO BANCÁRIO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. TAXA DE JUROS. LIMITAÇÃO. ABUSIVIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO. CABIMENTO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. COBRANÇA. ADMISSIBILIDADE. COMPENSAÇÃO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PROVA DE ERRO NO PAGAMENTO. DESNECESSIDADE. DEPÓSITO JUDICIAL DE VALORES. POSSIBILIDADE. COBRANÇA DE ENCARGOS EXCESSIVOS. MORA. DESCARACTERIZAÇÃO. CADASTRO DE INADIMPLENTES. INSCRIÇÃO. POSSIBILIDADE. CLÁUSULA MANDATO. SÚMULA 60/STJ. I - Inexiste julgamento extra petita no reconhecimento de nulidade de cláusulas contratuais com base no Código de Defesa do Consumidor. II - Embora incidente o diploma consumerista aos contratos bancários, os juros pactuados em limite superior a 12% ao ano não são considerados abusivos, exceto quando comprovado que discrepantes em relação à taxa de mercado, após vencida a obrigação.” (Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL – 788045 Processo: 200501700186 UF: RS Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA Data da decisão: 21/02/2006 Documento: STJ000678384 DJ DATA:10/04/2006 PÁGINA:191 CASTRO FILHO) Assim sendo, a taxa de juros a ser aplicada é a estabelecida pelas partes, até porque não ficou demonstrado abuso na sua estipulação. No mais, a abusividade só poderia ser reconhecida se tivesse ficado evidenciado que a instituição financeira obteve vantagem absolutamente excessiva e em descompasso com os valores de mercado. Dessa forma, índices superiores a 1% (um por cento) ao mês são juridicamente perfeitos, em razão de as entidades financeiras não serem subordinadas aos limites de juros especificados na Lei de Usura. No caso em concreto, em relação à Cédula de Crédito Bancário nº 001.150.348, os juros remuneratórios, no período de vigência do contrato, foram aplicados em percentual notoriamente abaixo do mercado (1,19% ao mês). Ao contrário do que aduz o embargante, não houve cumulação dos juros remuneratórios com comissão de permanência. Quanto aos juros superiores a 12% ao ano aplicados no Contrato de Serviço de Cartão de Crédito em razão da inadimplência do embargante, repise-se que, nos termos da Súmula nº 382/STJ, não há, por si só, abusividade na estipulação de juros superiores a 12% ao ano. Colhe-se dos documentos juntados aos autos que os juros aplicados foram livremente pactuados entre partes capazes, de modo que desde o momento da contratação houve ciência do conteúdo e do modo avençado. Assim, a taxa de juros remuneratórios aplicada pela instituição financeira não configura conduta abusiva do fornecedor de serviço. No que diz respeito aos juros moratórios, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que o reconhecimento da abusividade dos encargos essenciais exigidos no período da normalidade contratual descaracteriza a mora (REsp. 775.765/RS e REsp. 1.061.530/RS). Por outro lado, a abusividade de encargos acessórios não descaracteriza a mora (REsp. 1.639.259/SP). Afigura-se lícita a cumulação de juros remuneratórios e moratórios, no caso de inadimplência. Os juros remuneratórios e moratórios têm finalidades distintas. O primeiro remunera o mutuante pelo uso do dinheiro, pelo tempo em que este fica à disposição do mutuário. Já o segundo configura verdadeira sanção ao devedor inadimplente, visando desestimular o inadimplemento das obrigações. Com efeito, a Súmula nº 296 do STJ admite expressamente a possibilidade de incidência dos juros remuneratórios no período de inadimplência, ressalvando apenas a sua não cumulabilidade com a comissão de permanência. Em se tratando de inadimplemento de obrigação positiva e líquida no seu termo, constitui-se de pleno direito em mora o devedor (art. 397 do Código Civil). A mora ex re decorre de descumprimento de obrigação, positiva e líquida, pelo devedor independentemente de provação do credor, ante a aplicação da regra dies interpellat pro homine. Com efeito, restou plenamente caracterizado o inadimplemento e, de outro, não foi demonstrada justa causa para o afastamento dos encargos decorrentes da mora. No caso em comento, tanto em relação às Cédula de Crédito Bancário quanto ao Contrato de Serviço de Cartão de Crédito foram aplicados juros de mora de 1,00% ao mês, sem capitalização mensal, conforme se infere das planilhas de cálculo. A multa contratual foi aplicada em conformidade com o art. 52, §1º, do Código de Defesa do Consumidor, observando-se o patamar de 2% (dois por cento). O contrato foi devidamente subscrito pelas partes, prevendo expressamente a forma de cálculo dos juros, com a qual anuiu a contratante. Configurado o inadimplemento da obrigação principal, não pode agora ser beneficiada com taxas diferentes das contratadas, bem como de substituição do método de amortização da dívida, devendo ser respeitado o princípio do pacta sunt servanda. Nesse sentido, confira-se (destaquei): DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO PRIVADO. AGRAVO INTERNO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. AÇÃO DE COBRANÇA. CARTÃO DE CRÉDITO EMPRESARIAL. JULGAMENTO ANTECIPADO. EXTRAVIO DO CONTRATO. COMPROVAÇÃO PELO CONJUNTO PROBATÓRIO. ENCARGOS INDEVIDOS E ABUSIVOS INCOMPROVADOS. SUCUMBÊNCIA. 1. Embora registrado distrato social, firme a jurisprudência em reconhecer que sem a liquidação de bens não se extingue personalidade jurídica e, portanto, pode prosseguir a ação contra pessoa jurídica em tal condição. Ainda que não provada liquidação patrimonial, a circunstância de a empresa estar inativa no exercício da atividade social é indicativo que respalda a pretensão de litigar ao amparo da gratuidade de justiça, nos termos da Súmula 481/STJ, pelo que se provê o agravo interno. 2. Afastada a nulidade do julgamento antecipado, pois, ainda que requerida prova pericial e oitiva de testemunhas, a causa em discussão não exige dilação probatória, sendo suficiente o acervo instrutório documentado nos autos para o julgamento do mérito da controvérsia. A preliminar de inépcia da inicial por falta de documentos envolve igualmente trato concernente ao próprio mérito. 3. No mérito, conquanto aplicáveis o Código de Defesa do Consumidor e a inversão do ônus da prova, não procede a alegação de que a autora não logrou comprovar a existência do débito ou a incidência dos encargos legais. O extravio dos contratos bancários se obsta que a pretensão seja exercida de forma executiva não é, porém, impedimento a que seja viabilizada a discussão, por ação de cobrança, da existência do negócio jurídico, valor envolvido e inadimplência configurada para efeito de condenação da parte requerida ao pagamento do acordado. 4. A formulação de proposta de cartão de crédito empresarial demonstra o vínculo obrigacional, e as faturas apontam a utilização do crédito e sua inadimplência, e a evolução do valor da dívida conforme demonstrativos. Tal prova não expõe dados bancários sigilosos, sobretudo quando utilizados em ação de cobrança entre as partes. Os lançamentos de valores, ainda que unilaterais, decorrem do tipo de negócio jurídico firmado e, discordando a empresa, cumpre-lhe impugnar especificamente. 5. A documentação não revela cobrança de encargos abusivos, pois, quanto à comissão de permanência, nada consta como tendo sido lançado a tal título nos extratos da fatura e nos discriminativos de lançamentos. Ademais, eventual cobrança, se tivesse havido, seria indevida apenas se fosse cumulada com correção monetária, juros remuneratórios de mora e multa contratual (Súmulas 30, 296 e 472/STJ), fato que se não se extrai da documentação juntada. 6. Sobre não terem sido demonstrados quais foram os encargos contratados, além de constar das faturas os critérios de cobrança quanto à multa, mora, parcelado com juros, custo efetivo total - CET com juros, encargos do crédito rotativo, consta, ainda, registro de acordo administrativo entre as partes, a corroborar o entendimento de adesão quanto aos critérios e forma de cálculo da dívida sem comprovação em contrário. É inviável, assim, supor que tenham sido cobrados encargos ilegais ou excessivos diante do contratado, quando firmado acordo administrativo entre as partes, não havendo contraprova nos autos de que juros remuneratórios, ainda que capitalizados, sejam indevidos à luz da jurisprudência, que os contempla e permite (Súmulas 596/STF e 539/STJ). 7. O princípio do pacta sunt servanda em função da autonomia da vontade e da liberdade individual de contratar não permite revisar contrato, salvo se demonstrada manifesta ilegalidade ou abusividade, o que, na espécie, não foi demonstrado ainda que considerada em prol da defesa a regra da inversão do ônus da prova. 8. Pela sucumbência recursal, a parte apelante deve suportar condenação adicional, nos termos do artigo 85, § 11, CPC, no equivalente a 5% do valor da condenação, a ser acrescida à sucumbência fixada pela sentença pelo decaimento na instância de origem, suspensa a exigibilidade nos termos do artigo 98, § 3º, CPC. 9. Apelação desprovida e agravo interno provido”. (AC nº 5004967-54.2018.4.03.6110, Primeira Turma, Rel. Des. Fed. Carlos Muta, j. 26/6/23, DJEN 29/6/23, grifos nossos) A alegação de que a Cláusula 18.3 do Contrato de Cartão de Crédito é abusiva, uma vez que viola o disposto no art. 51, inciso IV, do CDC e no art. 397, parágrafo único, do Código Civil, não merece acolhida. O vencimento antecipado da dívida por falta, insuficiência ou atraso de pagamento, na data do vencimento, do valor indicado na fatura mensal, ao contrário do que aduz o embargante, guarda correlação com o disposto no art. 397, caput, do Código Civil. Ora, o inadimplemento do devedor de obrigação líquida e positiva, no termo pactuado entre as partes, implica a mora ex re. Ressalta-se ser lícita a cumulação de juros remuneratórios e moratórios, no caso de inadimplência, consoante estabelece a Súmula nº 296/STJ. Igualmente, não merece guarida a versão de ser ilegal a cobrança de múltiplas e cumulativas tarifas, conforme previsto na Cláusula 8.3 do Contrato de Cartão de Crédito, em ofensa à Resolução CMN nº 3.919/2010. Dispõe o Item 8.3 da Cláusula Oitava do instrumento contratual: “8.3 Poderão ser cobradas, ainda, Tarifas, cujos valores constam na Tabela de Tarifas CAIXA e discriminados na Fatura Mensal. Essa cobrança pode incidir sobre os seguintes serviços: Saques, consultas reiteradas ao Atendimento Cartões Empresariais CAIXA, 2ª via para reposição do Cartão, por exceder a Linha de Crédito, uso do Sistema Parcelado Sem Juros, manutenção de saldo credor em conta inativa, emissão de 2ª via da Fatura Mensal, Manutenção Mensal da Conta, cópias adicionais de documentos representativos de Transações, participação em programas de incentivos, seguros, serviços de compra de ingressos em espetáculos no Brasil e/ou no exterior, pagamentos de tributos com o Cartão, de abertura de crédito e de serviços de cobrança, 2ª via da carta de senha, entrega emergencial de cartão, envio de mensagens – SMS.” Consoante dicção do art. 4º, inciso IX, da Lei nº 4.595/1964, “Compete ao Conselho Monetário Nacional, segundo diretrizes estabelecidas pelo Presidente da República (...) limitar, sempre que necessário, as taxas de juros, descontos comissões e qualquer outra forma de remuneração de operações e serviços bancários ou financeiros, inclusive os prestados pelo Banco Central da República do Brasil (...)”. No exercício dessa competência, o Conselho Monetário Nacional editou sucessivas Resoluções (Res. CMN nºs. 2.303/1996, 3.518/2007 e 3.919/2010). A Resolução CMN n° 3.919/2010 consolidou as normas sobre cobrança de tarifas pela prestação de serviços pelas instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil - BACEN, sendo que as tarifas elencadas no Item 8.3 da Cláusula Oitava guardam previsão no referido ato normativo. Com efeito, o C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.251.331/RS, em sede de repercussão geral, firmou o entendimento de que a tarifa de abertura de crédito (TAC) e a tarifa de emissão de carnê (TEC) não possuem mais supedâneo legal para contratos firmados com pessoas físicas após 30/04/2008, início da vigência da Resolução CMN nº 3.518/2007. Foram editadas a Súmula nº 565-STJ – “A pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, é válida apenas nos contratos bancários anteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008” – e Súmula nº 566-STJ – “Nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira”. Em suma: a cobrança da Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), nos contratos pactuados com pessoa física, passaram a ser proibidas a partir de 30/4/2008, ainda que com outros nomes, admitindo-se, todavia, sua cobrança, quando previstas em contratos anteriores a essa data. Para os empréstimos voltados a pessoas jurídicas, a cobrança dessas tarifas continua sendo admitida, desde que previamente pactuadas. Vê-se que o contrato em questão, além de ter sido firmado com pessoa jurídica, não contempla a Tarifa de Abertura de Crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC). Também não assiste razão ao embargante a afirmação de que a Cláusula 21.1 do contrato afronta o disposto no art. 51, XIII, do CDC, na medida em que prevê a alteração unilateral do negócio jurídico. Dispõem os Itens 21.1 a 21 da Cláusula Vigésima Primeira do contrato: “21.1 A Emissora poderá modificar o texto deste Contrato mediante prévia comunicação ao portador, com pelo menos 30 dias de antecedência, por qualquer meio de comunicação efetiva, incluindo, mas não se limitando a: correspondência, informações e/ou mensagens inseridas na Fatura Mensal ou, ainda, remetendo um novo contrato, devidamente registrado em Cartório de Registro de Títulos e Documentos. 21.2 Caso a Empresa não esteja de acordo com as modificações, poderá exercer o direito de resilir o Contrato, conforme disposto na Cláusula Vigésima Segunda. 21.3 O não exercício do direito de resilir o Contrato nos termos do item anterior ou uso do Cartão, após a comunicação da alteração, implica sua aceitação.” Não se trata de modificação unilateral do contrato em prejuízo ao consumidor, porquanto a alteração dos termos do contrato submete-se ao prévio conhecimento do aderente e de sua aceitação. Do mesmo modo, deve ser rechaçada a alegação de que a Cláusula 1.1, item “r”, do contrato se mostra abusiva, na medida em que prevê responsabilidade solidária automática, em ofensa ao disposto no art. 265 do Código Civil. Estabelece o Item “r” da Cláusula 1.1 do instrumento contratual: “1.1 Para perfeito entendimento e interpretação deste contrato são adotadas as seguintes definições: (...) r) Responsabilidade Solidária - ambos, Portador (es) e Empresa, são solidariamente responsáveis perante a Emissora por todas as obrigações e deveres, a cada qual atribuídos em decorrência deste Contrato, na forma dos artigos 265 e 285 do Código Civil Brasileiro.” Dessume-se da análise da aludida cláusula contratual que se trata de norma conceitual, que visa esclarecer ao consumidor o conceito de responsabilidade solidária, para fim de interpretação e integração das normas que regem o negócio jurídico. Não se trata de atribuição automática de responsabilidade solidária. De mais a mais, o artigo 265 do Código Civil preconiza que a solidariedade não se presume, podendo decorrer da lei ou da vontade das partes (autonomia privada). Dessarte, inexistem cláusulas contratuais que imponham excessiva onerosidade ao embargante, restando demonstrado que o montante exigido pela CEF, obtido a partir de critérios objetivos e previamente estabelecidos, em conformidade com a legislação de regência, decorre exclusivamente do inadimplemento imotivado das obrigações pecuniárias livremente pactuadas, caracterizando a mora do devedor. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pelo embargante nestes embargos à ação monitória, na forma do artigo 487, inciso I do Código de Processo Civil. Custas ex lege. Com fundamento no art. 85, §2º, do CPC, fixo os honorários advocatícios em 10% sobre o valor atualizado da causa, observando-se que o embargante é beneficiário da assistência judiciária gratuita. Tendo em vista o teor desta sentença, constitui-se de pleno direito o título executivo judicial, diante da nova sistemática empregada pelo artigo 702, §8º, do Código de Processo Civil. Com fundamento nos arts. 25 e 27 da Resolução CJF nº 305/2014, fixo os honorários do advogado dativo no valor máximo da Tabela I do Anexo Único, o qual deverá ser pago após o trânsito em julgado da sentença. Sentença eletronicamente registrada. Publique-se. Intimem-se. Franca, datado e assinado eletronicamente. Samuel de Castro Barbosa Melo Juiz Federal
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