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Processo nº 0000287-55.2025.8.17.2970

ID: 276116776

Tribunal: TJPE Órgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Moreno Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0000287-55.2025.8.17.2970

Data de Disponibilização: 22/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CREFISA

Sentença (Outras)

Advogados:

ALEXSANDRO DA SILVA LINCK

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

RAFAEL MATOS GOBIRA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 1ª Vara Cível da Comarca de Moreno Av Cleto Campelo, 3189, Centro, MORENO - PE - CEP: 54800-000 - F:(81) 31819385 Processo nº 0000287-55.2025.8.17.2… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 1ª Vara Cível da Comarca de Moreno Av Cleto Campelo, 3189, Centro, MORENO - PE - CEP: 54800-000 - F:(81) 31819385 Processo nº 0000287-55.2025.8.17.2970 AUTOR(A): MAGARI DA SILVA RÉU: CREFISA SENTENÇA Trata-se de ação de declaração de inexistência de debito c.c dano moral movida por MAGARI DA SILVA em face de CREFISA, alegando irregularidades nos descontos oriundos dos contratos realizados em desfavor do requerido, além de cobrança indevida que, ao final, resultou na restrição de nome junto aos órgãos de proteção ao crédito. Citado, o reu apresentou defesa. Houve réplica. Em sede de provas nada foi requerido. É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. O feito comporta julgamento nesta fase, sem dilação probatória. A matéria discutida é só de direito. Assim, possível o julgamento antecipado, nos termos dos artigos 139, II e 355, I, ambos do CPC, sem olvidar o princípio constitucional da razoável duração do processo (artigo 5º, LXXVIII, CF). Oportuno lembrar que: “Presentes as condições que ensejam o julgamento antecipado da causa, é dever do juiz e não mera faculdade, assim proceder.” (STJ-4ª TURMA, Resp. 2.832-RJ, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 14.8.90, DJU 17.9.90, citado por NEGRÃO, Theotonio, GOUVEIA, José Roberto. Código de processo civil e legislação processual civil em vigor. 37.ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 430). Neste sentido: STF - AI 142.023-5- SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence (RT726/247). Por primeiro, registro que se trata de relação de consumo, nos termos dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, enquadrando-se a empresa requerida no conceito de fornecedor, como prestadora de serviço, e, o autor, no de consumidor final deste serviço prestado. Portanto, deve ser amparado pela legislação consumerista. No caso, os descontos na conta bancária do autor foram devidamente comprovados. A autora alega que: A Sra. Magari relata uma série de problemas relacionados a cobranças indevidas e irregularidades no tratamento de seu contrato de empréstimo junto à empresa Crefisa. Desde março de 2024, a autora tem observado descontos recorrentes e não autorizados no valor de R$10,29, R$49,00 e R$21,00, debitados mensalmente de sua conta poupança. Esses descontos não autorizados totalizam um montante de R$ 695,45 (11 parcelas de R$49,00, 5 parcelas de 10,29 e 5 parcelas de R$21,00), valor cuja restituição a Sra. Magari requer, considerando serem cobranças indevidas e sem qualquer justificativa válida. Além disso, a Sra. Magari foi surpreendida pela inclusão indevida de seu nome nos órgãos de proteção ao crédito, constando como devedora por parcelas do contrato de empréstimo número 060470026054-4 com a Crefisa. O presente litígio versa, à evidência, sobre relação de consumo envolvendo, de um lado, a autora, na qualidade de consumidora e, de outro lado, o requerido, como fornecedor de serviços. Posta esta premissa, verifica-se que a autora alega irregularidades na cobrança dos valores contratados, incluindo a negativação de seu nome junto ao órgão de restrição de crédito. Incumbiria ao réu o ônus da prova dos fatos impeditivos do direito da parte autora, ou seja, de que ela própria celebrou o negócio jurídico impugnado nestes autos, a teor do disposto no art. 373, inciso II, do Novo Código de Processo Civil. Entendo que o requerido comprovou a regularidade dos descontos e a inadimplência da própria autora, em situação que beira a má-fé processual na tentativa de utilizar o Judiciário para se locupletar indevidamente através de informações contrárias ao contido no próprio contrato. Os contratos questionados de refinanciamento que legitimam o vínculo entre as partes e as cobranças se encontram nos IDs n. 202293420 e 202293421. Ao contrário da alegação inicial, não se trata de empréstimo consignado, mas sim empréstimo pessoal com autorização de pagamento mediante desconto em conta bancária, o que se extrai em simples leitura da contratação acostada aos autos. Ao contrário da alegação inicial, ainda, se trata de contrato devidamente formalizado entre as partes com liberação de valores contratados em favor da autora, ciente de todas as clausulas e de seu dever de quitação. Em ambos os contratos constam de forma expressa o formato de pagamento no anexo I, constando de forma clara nas clausulas II, III e V as obrigações das partes e implicações em caso de atraso e inadimplemento, inclusive a fixação de obrigação de saldo positivo de responsabilidade da contratante. Na forma do ID n. 202293423, 202293424 e 202293426, o requerido comprovou a inexistência de saldo para quitação da obrigação da autora, bem como a ausência de adimplemento integral do contrato. Inclusive, informou claramente os meses que se encontravam em aberto e os meses que foram adimplidos parcialmente em razão da inexistência de saldo integral para amortização das parcelas. Em sede de réplica, a autora não comprovou efetivamente o pagamento da contratação, se limitando a questionar a regularidade do contrato em afronta aos termos voluntariamente pactuado junto ao requerido. Há de se considerar, ainda, que o ordenamento jurídico pátrio amplamente abarcou os princípios do pacta sunt servanda e da segurança jurídica, decorrentes estes dos princípios da livre iniciativa e da liberdade em contratar, não devendo o Poder Judiciário, fora dos casos excepcionais previstos nos arts. 51 e 52 do CDC e, entre outros, no art. 157 do CC, adentrar na esfera privada, intervindo ou dirigindo a vontade livremente manifestada pelas partes, a qual deve suportar os riscos normais de um negócio como outro qualquer, exceto, evidentemente, nos casos de verdadeiras exorbitâncias a exigirem a revisão contratual, com fins de equilibrar a relação jurídica, em atenção, agora, ao princípio da função social do contrato e da boa fé objetiva nas formas previstas nos arts. 421 e 422 do CC. Registro que, nesse sentido, o C. STJ no REsp n. 1.863.973, entendeu que não cabe limitação em contratos de natureza pessoal e não consignados. A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.085), estabeleceu a tese de que são lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, desde que previamente autorizados pelo mutuário e enquanto essa autorização durar – não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista no artigo 1º, parágrafo 1º, da Lei 10.820/2003, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento. Segundo Bellizze, foi exatamente em razão do modo como se dá o consignado que a lei estabeleceu um limite para os descontos, com o objetivo de impedir que o tomador de empréstimo, diante das vantagens dessa modalidade, acabe comprometendo sua remuneração e prejudicando a subsistência familiar. Nas demais espécies de mútuo bancário, o ministro ressaltou que o estabelecimento de cláusula que autoriza os descontos em conta-corrente é uma faculdade das partes. Nesses casos, explicou, o desconto automático incide sobre o saldo da conta, não sendo possível ao banco individualizar a origem dos créditos para determinar se o valor existente no dia do pagamento é a remuneração do mutuário ou tem outra fonte. "Ressai de todo evidenciado, assim, que o mutuário tem em seu poder muitos mecanismos para evitar que a instituição financeira realize os descontos contratados, possuindo livre acesso e disposição sobre todo o numerário constante em sua conta-corrente", afirmou o relator. No mais, a parte autora, utilizou os valores fornecidos pelo réu. Tinha plena consciência da necessidade de pagamento da contraprestação correspondente, assim como dos encargos remuneratórios e moratórios, os quais deveria suportar em conformidade ao contratado. Tinha ciência dos valores contratados e das parcelas contratadas, tanto que demorou mais de um ano para acionar o Poder Judiciário. Escolheu, conscientemente, a parte ré para que o negócio jurídico fosse concretizado, mesmo ciente de que poderia ter realizado a contratação junto a outra instituição, pesquisando melhores taxas de juros ou outros meios de amortização e contraprestação. Não agiu a parte contratante mancomunada em prejuízo de terceiros ao entabular a avença. Destarte, a emissão de sua declaração jurídico-negocial não se reveste de vício de consentimento ou social. Não obstante o princípio pacta sunt servanda, a conferir a natureza ao contrato de “lei entre as partes”, sofrer, no moderno direito obrigacional, relativização, notadamente por normas de ordem pública e, por consequência, de caráter cogente, como as aplicáveis às relações de consumo, a força vinculante do pacto prevalece. A propósito, julgado do Colendo Superior Tribunal de Justiça: “HERANÇA DE DIREITO ROMANO, PREVALECE ENTRE NÓS, O PRINCIPIO 'PACTA SUNT SERVANDA' - OU SEJA, ENQUANTO EXISTE A RELAÇÃO JURÍDICA, DEVE SER CUMPRIDA AS RESPECTIVAS OBRIGAÇÕES (...) (REsp 167.978/PR, Rel. Ministro LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, SEXTA TURMA, julgado em 26.05.1998, DJ 22.06.1998 p. 213). Cumpre anotar, ainda, segundo ensina Antônio Junqueira de Azevedo, que “a declaração de vontade, tomada primeiramente como um todo, deverá ser: a) resultante de um processo volitivo; b) querida com plena consciência da realidade; c) escolhida com liberdade; d) deliberada sem má-fé” (Negócio Jurídico - Existência, Validade e Eficácia, 4a ed., São Paulo: 2002, p. 43). Na hipótese sub judice, inegável, pois, a obrigatoriedade do contrato, especialmente, tendo em vista a ausência de vício a macular a manifestação de vontade da parte requerente. De fato, a parte autora, necessitando de um numerário, procurou uma instituição financeira para obtê-lo. Tinha plena consciência da necessidade de pagamento da contraprestação correspondente, assim como dos encargos remuneratórios e moratórios, além das tarifas, prêmio de seguro e tributos inerentes à contratação, os quais deveria suportar em conformidade ao contratado. Escolheu, conscientemente, a parte ré para que o negócio jurídico fosse concretizado. Noto, a propósito, que as parcelas foram prefixadas, tendo a autora conhecimento, no momento da assinatura do contrato, do quanto pagaria do início ao fim da relação negocial, sendo sua obrigação reservar valores mensais na conta informada para o adimplemento da obrigação. A inicial não comprova a existência de saldo na data do vencimento contido no anexo I de cada contrato. Acrescente-se que é de conhecimento geral a prática de juros remuneratórios comumente empregados pela ré, CREFISA S/A, superiores, em regra, à taxa média praticada pelas demais instituições financeiras, uma vez que em se tratando dos clientes da requerida, existe a característica de possuírem perfil de risco elevado, de modo que não seria razoável exigir que o banco praticasse a tal taxa média de mercado, ainda mais em contratos de crédito pessoal, sem qualquer garantia ou consignação, pois é natural que os juros pela disponibilidade dos valores sejam mais elevados em razão do próprio risco do negócio. Assim, em exercício regular de direito a ré na tentativa de reaver o seu crédito prosseguiu com as inscrições juntos aos órgãos de proteção ao crédito, de forma licita. Neste sentido: "AÇÃO DECLARATÓRIA C.C. REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. Cartão de crédito. Inadimplência provada pela Apelada. Negativação. Admissibilidade. Exercício regular de direito. Negativações pretéritas. Súmula 385 do STJ. Condenação às penas por litigância de má-fé. Alteração da verdade dos fatos. Manutenção. Sentença mantida na íntegra. Recurso não provido." (TJ-SP - APL: 10037044520148260347 SP 1003704-45.2014.8.26.0347, Relator: Tasso Duarte de Melo, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 15/04/2016). "APELAÇÃO - AÇÃO ORDINÁRIA - NEGATIVAÇÃO - DÍVIDA COMPROVADA - EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO - PLEITO IMPROCEDENTE. 1. Alegando a autora inexistência de débito justificador da inclusão de seu nome em serviço de proteção ao crédito compete ao réu, por se tratar de fato negativo, demonstrar a existência do negócio jurídico e do inadimplemento. 2. Constitui exercício regular de direito a inscrição do nome do devedor nos serviços de restrição ao crédito, se há dívida previamente constituída e não paga." (TJMG - AC: 10000180150435001 MG, Relator: Alberto Diniz Junior, Data de Julgamento: 09/04/0018). Ademais, verificando o ID n. 202293427, constato que a autora é recorrente na inadimplência de dividas, havendo dezenas de restrições ao crédito oriundo de inúmeras empresas, incidindo, ainda, a sumula n. 385 do STJ assim dispõe: Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento. Quanto às demais teses: “O magistrado não está obrigado a abordar todas as questões levantadas pelas partes, quando já encontrou motivo suficiente ao desfecho que vem proclamar” (Apelação nº. 17942-4/2, 5ª Câmara de Direito Privado, Relator Des Ivan Sartori). Por essas razões, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS formulados na exordial, ao tempo em que extingo o processo com resolução de mérito na forma do art. 487, I, CPC. Custas pela autora, bem como honorários advocatícios no montante de 10% do valor da causa, observada a suspensão da exigibilidade do ônus decorrente de sua sucumbência, em razão da gratuidade de justiça que lhe foi deferida (Art. 98, § 3º do CPC). A oposição de recurso de embargos de declaração com o fito exclusivo de rediscussão de mérito poderá ensejar a aplicação do art. 1026, §2º, CPC. Havendo recurso de apelação, vista a parte contraria e, após, remeta-se ao E. TJPE. Com o trânsito em julgado, arquive-se. P. R. I. MORENO, 21 de maio de 2025 Juiz(a) de Direito

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Processo nº 1003704-78.2025.4.01.4004

ID: 317856694

Tribunal: TRF1 Órgão: Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à Vara Federal da SSJ de São Raimundo Nonato-PI Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1003704-78.2025.4.01.4004

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

ADENILSON RODRIGUES DOS SANTOS

Polo Passivo:

Sentença Tipo A

Advogados:

HELDIR MACEDO AZEVEDO

OAB/PI XXXXXX Desbloquear

PROCESSO: 1003704-78.2025.4.01.4004 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) AUTOR: ADENILSON RODRIGUES DOS SANTOS REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS SENTENÇA – Tipo A Resolu… PROCESSO: 1003704-78.2025.4.01.4004 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) AUTOR: ADENILSON RODRIGUES DOS SANTOS REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS SENTENÇA – Tipo A Resolução CJF nº 535/06 1.0 - RELATÓRIO Dispensado o relatório na forma do artigo 38 da Lei 9.099/95. PRELIMINARMENTE, registro que o patrono da causa tem adotado perante este juízo orientações aos seus clientes, por sua conta e risco, que extrapolam o bom senso e a lealdade processual, causando prejuízo de grande monta aos agendamentos das perícias médicas, nesta Subseção Judiciária. Observamos que desde set/2024, tem sido recorrente a falta à perícia médica dos seus patrocinados, tendo sido o fato notado com quase todos os peritos nomeados pelo juízo, principalmente o Dr. Lucas Rodrigues, a Dra. Luísa Neiva e o Dr. Pedro José, dando a entender que se trata de escolha de perito que melhor lhe aprouver, pois em muitos casos repropõe a demanda, configurando, ainda, litigância de má-fé. Ressalto que houve pautas agendadas, para clientes desse patrono, que tiveram de 90 a 100% de faltas, sem nenhuma justificativa nos autos. O último episódio foi registrado, em 27/06/2025. Contando com a presente ação, foram agendados 11 (onze) processos, para perícia médica, com o Dr. Pedro José. O referido perito informou que houve 10 (dez) faltas injustificáveis. Analisando os autos, verificamos que o referido patrono não se manifesta acerca da ausência de seus clientes à perícia médica designada, tampouco apresenta justificativas para o periciando não comparecer. Não houve em nenhum dos processos mencionados, qualquer pedido de redesignação do ato pericial. Sendo assim, se faz necessária a adoção de medidas de maior gravame, para tentar desestimular a prática de ações desta natureza, cujo início foi detectado, em set/2024 e vem se repetindo até o presente momento. 2.0 – FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de ação em que a parte autora postula o (a)restabelecimento/concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença e, sendo constatada a sua incapacidade total e definitiva para o trabalho, a sua conversão em aposentadoria por invalidez/incapacitante. A propósito do auxílio-doença/aposentadoria por invalidez, confira-se a legislação vigente: “Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição. § 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança. § 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão. (...). “Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. § 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão. Destarte, a percepção do auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez demandam a satisfação dos seguintes requisitos erigidos como essenciais pela legislação reitora da matéria (art. 59 da Lei n.º 8.213/1991): (a) Qualidade de segurado do Regime Geral da Previdência Social (RGPS); (b) Carência de 12 (doze) meses; (c) Incapacidade laborativa. De partida, verifico que a parte autora, através de seu representante legal constituído nos autos, foi devidamente intimada a comparecer no local e data designada, para se submeter à perícia médica judicial. Ocorre que a parte autora não compareceu perante o perito médico designado pelo juízo da causa, dando a entender, por sua conta e risco, suficientes os documentos nosológicos já apresentados nos autos. Observo, mais que a parte autora deixou decorrer, in albis, o prazo para eventual manifestação acerca da perícia designada e/ou impugnar a designação do perito nomeado. Na verdade, não apresentou nenhuma informação, ainda que plausível, para justificar o não comparecimento à perícia médica agendada por este juízo. Registro, mais, que o interesse de se submeter à presença do perito judicial, para esclarecer o que for perguntado pelo expert é de total responsabilidade da parte autora, não sendo o caso de adoção de medidas cautelares judiciais de força, para o comparecimento compulsório. Com efeito, uma vez o processo da parte autora encaminhado para perícia médica judicial, não quer dizer que necessariamente a causa só possa ser conhecida e, ainda, seu mérito apreciado se obrigatoriamente houver um laudo judicial realizado com a presença da parte autora, até porque o juízo da causa não está vinculado ao que conter no exame pericial, seja do perito judicial, seja do perito do INSS, podendo a causa ser decidida pela sua livre persuasão racional, podendo, inclusive, firmar sua convicção com base na narrativa dos autos e em outros documentos a eles acostados se entender suficientes os já apresentados para analisar a qualidade de segurado do Regime Geral da Previdência Social (RGPS), a carência de 12 (doze) meses e a incapacidade ou capacidade laborativa. A lei Processual confere ao Juiz da causa o perfil de “peritus peritorum”. Quero dizer, o juiz não deve necessariamente ficar adstrito ao conteúdo de certa prova pericial, ainda que produzida pelo expert judicial, quando houver nos autos elementos probatórios que indiquem entendimento contrário ao requerimento da parte autora, especialmente quando esta por sua livre iniciativa, resolve não comparecer a um chamado do processo. Nesse compasso, não há qualquer impedimento ao exame da matéria técnica pelo juiz, mesmo em cognição sumária, desde que se sinta amparado pelas provas já colacionadas aos autos, como na hipótese em exame. Vale, ainda, lembrar que o Art. 479 do CPC/2015, concretizando o brocardo latino judex est peritus peritorum (“o juiz é o perito dos peritos), autoriza que, de forma fundamentada, o juiz considere as conclusões de certo laudo pericial como razões de decidir a contenda, haja vista que o encargo de perito seja na via judicial ou administrativa requer imparcialidade e ética profissional, para o cumprimento do seu mister. No caso em tela, não deve prevalecer a aplicação do princípio do in dubio pro misero, pois não se detectou falha alguma na tramitação do processo. Dúvida alguma não há. A parte autora não aventou nenhuma manifestação capaz de retroceder a marcha processual, ou seja, manteve-se inerte e em total silêncio quando lhe foi oportunizada a participação em um ato do processo, por sua própria conta e risco. Embora ausente a parte autora ao ato pericial designado pelo juízo da causa, observo no laudo administrativo constante dos autos que o perito do INSS concluiu, no campo referente à capacidade laborativa que a parte autora NÃO ÉPORTADORA de doença ou lesão, que gere incapacidade laborativa alguma para a sua atividade de trabalho habitual, ou seja “Não houve comprovação da incapacidade na via administrativa”. Nesse prisma, o Art. 371, do CPC/2015, diz que “O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.” Com efeito, considero suficientes as informações técnicas relatadas no laudo pericial administrativo, sem necessidade de acréscimo algum, para conhecimento da demanda. Isso porque os documentos médicos juntados pela parte autora, com data após a perícia médica administrativa não foram oportunizados à parte requerida, para apreciar o requerimento administrativo, cerceando, inclusive, a própria defesa da parte ré. Vejamos o que diz o Art. 129-A, inciso II, alínea “c”da Lei nº8.213, in verbis: “Art. 129-A. Os litígios e as medidas cautelares relativos aos benefícios por incapacidade de que trata esta Lei, inclusive os relativos a acidentes do trabalho, observarão o seguinte: (...) II – para atendimento do disposto no art. 320 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), a petição inicial, qualquer que seja o rito ou procedimento adotado, deverá ser instruída pelo autor com os seguintes documentos: (grifo nosso) (...) c) documentação médica de que dispuser relativa à doença alegada como a causa da incapacidade discutida na via administrativa.”(grifo nosso) De acordo como dispositivo retro, verifico que a Lei Previdenciária considera o termo inicial da causa de pedir, para fins de análise do mérito na via judicial, a data da entrada do requerimento administrativo e seu termo final a lavratura conclusiva do laudo pericial, concluindo a discussão relativa à incapacidade alegada na via administrativa. Reitero que a parte autora foi regularmente intimada para se manifestar sobre o agendamento da perícia designada. Nesse viés, não apresentou, no interstício de tempo decorrido entre o recebimento da intimação e a data da perícia, nenhum vício processual formal, material, direto, indireto ou alguma resistência à nomeação do perito nomeado passíveis de inquiná-lo de nulidade o ato de designação, razão pela qual não vislumbro óbices em adotar as conclusões do laudo médico pericial administrativo (PERÍCIA MÉDICA FEDERAL) trazida aos autos, como razão de decidir. Destaque-se, ademais, que o laudo médico pericial administrativo, afigura-se satisfatório e adequado como meio probante da capacidade laborativa do autor. 3.0 – ÔNUS DA PROVA Considerando que o ônus da prova, quanto ao fato constitutivo de seu direito, incumbe à parte autora (Art. 373, I, CPC/2015) e tendo em vista o intuito deliberado da parte autora em não realizar a prova necessária para reconhecimento do alegado direito, este juízo passa a analisar, desde logo, o mérito da demanda considerando as provas presentes nos autos. Sob o tema do ônus da prova, vejamos a jurisprudência dos tribunais federais: TRF4 - PROCESSO: 5027753-04.2019.4.04.9999/Data da publicação: 26/05/2020 PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. FALTA DE JUSTIFICATIVA PARA O NÃO COMPARECIMENTO À PERÍCIA MÉDICA AGENDADA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. São quatro os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo/temporário da incapacidade. 2. A falta de justificativa para o não comparecimento à perícia médica agendada caracteriza desistência do meio de prova. Na hipótese, a parte autora não logrou êxito em comprovar fato constitutivo do seu direito, consoante o inciso I do artigo 373 do Código de Processo Civil. Manutenção da sentença de improcedência. (...). TRF1 - PROCESSO: 1011579-93.2024.4.01.9999/Data da publicação: 11/09/2024 PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA INJUSTIFICADA PARA A REALIZAÇÃO DA PERÍCIA MÉDICA. NÃO COMPROVAÇÃO DE INCAPACIDADE LABORAL. APELAÇÃO DESPROVIDA.1. Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra a sentença que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez rural, considerando que apesar do juízo agendar perícia e intimar a parte para comparecimento, esta deixou de comparecer a perícia sem qualquer justificativa plausível, havendo nova intimação, de forma pessoal, com prazo de 30 dias para manifestação, contudo, quedou-se inerte.2. Em suas razões recursais, a parte autora sustenta, em síntese, cerceamento do direito de defesa, atentando contra o princípio do contraditório, tendo em vista que a falta da prova técnica impede a defesa do pleito.3. A concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez está subordinada à verificação, pela perícia médica, de que o segurado se encontra incapaz temporária ou permanentemente, de forma parcial ou total, para o exercício de suas atividades habituais, na forma dos arts. 42 e 59, da Lei n. 8.213/91.4. Sem razão a parte autora, eis que o ônus da prova da doença que leva à incapacidade para o trabalho compete à parte autora, nos termos do art. 373, I, do CPC/2015.5. Ademais, não cabe falar em cerceamento de defesa quando agendada a perícia médica oficial e intimada a parte para comparecimento, esta deixa de comparecer a perícia sem justificativa plausível, incorrendo em preclusão de oportunidade probatória essencial ao litígio.6. Apelação da parte autora desprovida. Em suma, ao deixar de envidar esforços para consecução do ato processual necessário, a parte autora desatendeu ao ônus processual que lhe incumbia pela alegada existência do fato incontroverso. A preclusão da prova é a consequência inarredável do comportamento desidioso, que no caso, era a realização da perícia médica, uma vez que a falta da prova decorreu de conduta exclusiva da parte autora. 4.0 – JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO – POSSIBILIDADE De acordo com o Ato Conjunto 2/2023, do TRF1, de 18/12/2023, celebrado com o aval da Procuradora Regional Federal da 1ª Região, gizou em seu Art. 1º, inciso II, que “O INSS será citado apenas após a juntada aos autos dos laudos médico e social, quando aplicável, quando o laudo da perícia judicial for favorável, total ou parcialmente, à parte autora, nos processos que tratam de benefícios por incapacidade e assistenciais.” No presente caso, aplica-se a dispensa de citação prévia do INSS, bastando, para tanto, a intimação da sentença proferida, conforme o Art. 1º, inciso I, do referido Ato Conjunto, para conhecimento e demais consectários legais. Por assim ser, nos termos do Art. 355, I, do NCPC, O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando não houver necessidade de produção de outras provas. No caso em exame, a parte autora não se manifestou acerca da ausência à perícia médica designada, tampouco apresentou justificativas para não comparecer. O Comparecimento à perícia médica designada era de sua total responsabilidade. Desse modo, se em certas demandas, a exemplo desta, o julgador firmar entendimento desfavorável à pretensão da parte autora, nada mais adequado que seja abreviada a tramitação do feito neste grau de jurisdição, com o julgamento de mérito antecipado. Tal providência acabará sendo até favorável ao autor, que não teve que, inutilmente, submeter-se a um procedimento alongado sem qualquer perspectiva de sucesso. De resto, o laudo médico pericial administrativo (PERÍCIA MÉDICA FEDERAL), baseado nos dados clínico-periciais atuais, concluiu que não há incapacidade laborativa para a atividade declarada. Sendo assim, não constatada a incapacidade para o trabalho, sequer é necessário aventar a presença da condição de segurado da parte autora. Desse modo, em não havendo incapacidade laboral, não faz jus à concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. Forte nesse entendimento, estando a matéria suficientemente esclarecida (Art. 480 do CPC/2015), passo à resolução do mérito da lide, conforme o estado do processo, sendo desnecessária a remarcação da perícia médica (frustrada por conta da própria parte autora), assim como considero preclusa a abertura de algum prazo para eventual manifestação. Por derradeiro, configurada a preclusão da perícia médica ante o não comparecimento da parte autora na data designada, sem qualquer razão plausível a justificar a ausência, e inexistente prova suficiente para demonstrar a incapacidade profissional reclamada, tem-se por correto o decreto de improcedência do pedido, com a consequente extinção do feito com julgamento do mérito. 5.0 – DISPOSITIVO Diante do exposto, antecipadamente, julgo improcedente o pedido e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do Art. 487, I, c/c Art. 355, I, e, ainda, Art. 371 e Art. 479, tudo do CPC/2015. Defiro os benefícios da justiça gratuita. Sem custas e tampouco honorários advocatícios (art. 55 da Lei 9.099/95). Intimem-se as partes. Havendo recurso, promova-se a comunicação da apelação ao réu, para, querendo, apresentar contrarrazões, no prazo legal. Após, encaminhem-se os autos à Turma Recursal Federal/PI. Arquivem-se, quando oportuno. São Raimundo Nonato/PI, [datado automaticamente]. (assinado eletronicamente, cf. Lei nº 11.419/2006) Juiz(a) Federal Vara Única da Subseção Judiciária de SRN/PI

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Processo nº 1003704-78.2025.4.01.4004

ID: 317849084

Tribunal: TRF1 Órgão: Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à Vara Federal da SSJ de São Raimundo Nonato-PI Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1003704-78.2025.4.01.4004

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

ADENILSON RODRIGUES DOS SANTOS

Polo Passivo:

Sentença Tipo A

Advogados:

HELDIR MACEDO AZEVEDO

OAB/PI XXXXXX Desbloquear

PROCESSO: 1003704-78.2025.4.01.4004 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) AUTOR: ADENILSON RODRIGUES DOS SANTOS REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS SENTENÇA – Tipo A Resolu… PROCESSO: 1003704-78.2025.4.01.4004 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) AUTOR: ADENILSON RODRIGUES DOS SANTOS REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS SENTENÇA – Tipo A Resolução CJF nº 535/06 1.0 - RELATÓRIO Dispensado o relatório na forma do artigo 38 da Lei 9.099/95. PRELIMINARMENTE, registro que o patrono da causa tem adotado perante este juízo orientações aos seus clientes, por sua conta e risco, que extrapolam o bom senso e a lealdade processual, causando prejuízo de grande monta aos agendamentos das perícias médicas, nesta Subseção Judiciária. Observamos que desde set/2024, tem sido recorrente a falta à perícia médica dos seus patrocinados, tendo sido o fato notado com quase todos os peritos nomeados pelo juízo, principalmente o Dr. Lucas Rodrigues, a Dra. Luísa Neiva e o Dr. Pedro José, dando a entender que se trata de escolha de perito que melhor lhe aprouver, pois em muitos casos repropõe a demanda, configurando, ainda, litigância de má-fé. Ressalto que houve pautas agendadas, para clientes desse patrono, que tiveram de 90 a 100% de faltas, sem nenhuma justificativa nos autos. O último episódio foi registrado, em 27/06/2025. Contando com a presente ação, foram agendados 11 (onze) processos, para perícia médica, com o Dr. Pedro José. O referido perito informou que houve 10 (dez) faltas injustificáveis. Analisando os autos, verificamos que o referido patrono não se manifesta acerca da ausência de seus clientes à perícia médica designada, tampouco apresenta justificativas para o periciando não comparecer. Não houve em nenhum dos processos mencionados, qualquer pedido de redesignação do ato pericial. Sendo assim, se faz necessária a adoção de medidas de maior gravame, para tentar desestimular a prática de ações desta natureza, cujo início foi detectado, em set/2024 e vem se repetindo até o presente momento. 2.0 – FUNDAMENTAÇÃO Trata-se de ação em que a parte autora postula o (a)restabelecimento/concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença e, sendo constatada a sua incapacidade total e definitiva para o trabalho, a sua conversão em aposentadoria por invalidez/incapacitante. A propósito do auxílio-doença/aposentadoria por invalidez, confira-se a legislação vigente: “Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição. § 1º A concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação da condição de incapacidade mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança. § 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão. (...). “Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. § 1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão. Destarte, a percepção do auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez demandam a satisfação dos seguintes requisitos erigidos como essenciais pela legislação reitora da matéria (art. 59 da Lei n.º 8.213/1991): (a) Qualidade de segurado do Regime Geral da Previdência Social (RGPS); (b) Carência de 12 (doze) meses; (c) Incapacidade laborativa. De partida, verifico que a parte autora, através de seu representante legal constituído nos autos, foi devidamente intimada a comparecer no local e data designada, para se submeter à perícia médica judicial. Ocorre que a parte autora não compareceu perante o perito médico designado pelo juízo da causa, dando a entender, por sua conta e risco, suficientes os documentos nosológicos já apresentados nos autos. Observo, mais que a parte autora deixou decorrer, in albis, o prazo para eventual manifestação acerca da perícia designada e/ou impugnar a designação do perito nomeado. Na verdade, não apresentou nenhuma informação, ainda que plausível, para justificar o não comparecimento à perícia médica agendada por este juízo. Registro, mais, que o interesse de se submeter à presença do perito judicial, para esclarecer o que for perguntado pelo expert é de total responsabilidade da parte autora, não sendo o caso de adoção de medidas cautelares judiciais de força, para o comparecimento compulsório. Com efeito, uma vez o processo da parte autora encaminhado para perícia médica judicial, não quer dizer que necessariamente a causa só possa ser conhecida e, ainda, seu mérito apreciado se obrigatoriamente houver um laudo judicial realizado com a presença da parte autora, até porque o juízo da causa não está vinculado ao que conter no exame pericial, seja do perito judicial, seja do perito do INSS, podendo a causa ser decidida pela sua livre persuasão racional, podendo, inclusive, firmar sua convicção com base na narrativa dos autos e em outros documentos a eles acostados se entender suficientes os já apresentados para analisar a qualidade de segurado do Regime Geral da Previdência Social (RGPS), a carência de 12 (doze) meses e a incapacidade ou capacidade laborativa. A lei Processual confere ao Juiz da causa o perfil de “peritus peritorum”. Quero dizer, o juiz não deve necessariamente ficar adstrito ao conteúdo de certa prova pericial, ainda que produzida pelo expert judicial, quando houver nos autos elementos probatórios que indiquem entendimento contrário ao requerimento da parte autora, especialmente quando esta por sua livre iniciativa, resolve não comparecer a um chamado do processo. Nesse compasso, não há qualquer impedimento ao exame da matéria técnica pelo juiz, mesmo em cognição sumária, desde que se sinta amparado pelas provas já colacionadas aos autos, como na hipótese em exame. Vale, ainda, lembrar que o Art. 479 do CPC/2015, concretizando o brocardo latino judex est peritus peritorum (“o juiz é o perito dos peritos), autoriza que, de forma fundamentada, o juiz considere as conclusões de certo laudo pericial como razões de decidir a contenda, haja vista que o encargo de perito seja na via judicial ou administrativa requer imparcialidade e ética profissional, para o cumprimento do seu mister. No caso em tela, não deve prevalecer a aplicação do princípio do in dubio pro misero, pois não se detectou falha alguma na tramitação do processo. Dúvida alguma não há. A parte autora não aventou nenhuma manifestação capaz de retroceder a marcha processual, ou seja, manteve-se inerte e em total silêncio quando lhe foi oportunizada a participação em um ato do processo, por sua própria conta e risco. Embora ausente a parte autora ao ato pericial designado pelo juízo da causa, observo no laudo administrativo constante dos autos que o perito do INSS concluiu, no campo referente à capacidade laborativa que a parte autora NÃO ÉPORTADORA de doença ou lesão, que gere incapacidade laborativa alguma para a sua atividade de trabalho habitual, ou seja “Não houve comprovação da incapacidade na via administrativa”. Nesse prisma, o Art. 371, do CPC/2015, diz que “O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento.” Com efeito, considero suficientes as informações técnicas relatadas no laudo pericial administrativo, sem necessidade de acréscimo algum, para conhecimento da demanda. Isso porque os documentos médicos juntados pela parte autora, com data após a perícia médica administrativa não foram oportunizados à parte requerida, para apreciar o requerimento administrativo, cerceando, inclusive, a própria defesa da parte ré. Vejamos o que diz o Art. 129-A, inciso II, alínea “c”da Lei nº8.213, in verbis: “Art. 129-A. Os litígios e as medidas cautelares relativos aos benefícios por incapacidade de que trata esta Lei, inclusive os relativos a acidentes do trabalho, observarão o seguinte: (...) II – para atendimento do disposto no art. 320 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), a petição inicial, qualquer que seja o rito ou procedimento adotado, deverá ser instruída pelo autor com os seguintes documentos: (grifo nosso) (...) c) documentação médica de que dispuser relativa à doença alegada como a causa da incapacidade discutida na via administrativa.”(grifo nosso) De acordo como dispositivo retro, verifico que a Lei Previdenciária considera o termo inicial da causa de pedir, para fins de análise do mérito na via judicial, a data da entrada do requerimento administrativo e seu termo final a lavratura conclusiva do laudo pericial, concluindo a discussão relativa à incapacidade alegada na via administrativa. Reitero que a parte autora foi regularmente intimada para se manifestar sobre o agendamento da perícia designada. Nesse viés, não apresentou, no interstício de tempo decorrido entre o recebimento da intimação e a data da perícia, nenhum vício processual formal, material, direto, indireto ou alguma resistência à nomeação do perito nomeado passíveis de inquiná-lo de nulidade o ato de designação, razão pela qual não vislumbro óbices em adotar as conclusões do laudo médico pericial administrativo (PERÍCIA MÉDICA FEDERAL) trazida aos autos, como razão de decidir. Destaque-se, ademais, que o laudo médico pericial administrativo, afigura-se satisfatório e adequado como meio probante da capacidade laborativa do autor. 3.0 – ÔNUS DA PROVA Considerando que o ônus da prova, quanto ao fato constitutivo de seu direito, incumbe à parte autora (Art. 373, I, CPC/2015) e tendo em vista o intuito deliberado da parte autora em não realizar a prova necessária para reconhecimento do alegado direito, este juízo passa a analisar, desde logo, o mérito da demanda considerando as provas presentes nos autos. Sob o tema do ônus da prova, vejamos a jurisprudência dos tribunais federais: TRF4 - PROCESSO: 5027753-04.2019.4.04.9999/Data da publicação: 26/05/2020 PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. FALTA DE JUSTIFICATIVA PARA O NÃO COMPARECIMENTO À PERÍCIA MÉDICA AGENDADA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. São quatro os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo/temporário da incapacidade. 2. A falta de justificativa para o não comparecimento à perícia médica agendada caracteriza desistência do meio de prova. Na hipótese, a parte autora não logrou êxito em comprovar fato constitutivo do seu direito, consoante o inciso I do artigo 373 do Código de Processo Civil. Manutenção da sentença de improcedência. (...). TRF1 - PROCESSO: 1011579-93.2024.4.01.9999/Data da publicação: 11/09/2024 PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA INJUSTIFICADA PARA A REALIZAÇÃO DA PERÍCIA MÉDICA. NÃO COMPROVAÇÃO DE INCAPACIDADE LABORAL. APELAÇÃO DESPROVIDA.1. Trata-se de apelação interposta pela parte autora contra a sentença que julgou improcedente o pedido de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez rural, considerando que apesar do juízo agendar perícia e intimar a parte para comparecimento, esta deixou de comparecer a perícia sem qualquer justificativa plausível, havendo nova intimação, de forma pessoal, com prazo de 30 dias para manifestação, contudo, quedou-se inerte.2. Em suas razões recursais, a parte autora sustenta, em síntese, cerceamento do direito de defesa, atentando contra o princípio do contraditório, tendo em vista que a falta da prova técnica impede a defesa do pleito.3. A concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez está subordinada à verificação, pela perícia médica, de que o segurado se encontra incapaz temporária ou permanentemente, de forma parcial ou total, para o exercício de suas atividades habituais, na forma dos arts. 42 e 59, da Lei n. 8.213/91.4. Sem razão a parte autora, eis que o ônus da prova da doença que leva à incapacidade para o trabalho compete à parte autora, nos termos do art. 373, I, do CPC/2015.5. Ademais, não cabe falar em cerceamento de defesa quando agendada a perícia médica oficial e intimada a parte para comparecimento, esta deixa de comparecer a perícia sem justificativa plausível, incorrendo em preclusão de oportunidade probatória essencial ao litígio.6. Apelação da parte autora desprovida. Em suma, ao deixar de envidar esforços para consecução do ato processual necessário, a parte autora desatendeu ao ônus processual que lhe incumbia pela alegada existência do fato incontroverso. A preclusão da prova é a consequência inarredável do comportamento desidioso, que no caso, era a realização da perícia médica, uma vez que a falta da prova decorreu de conduta exclusiva da parte autora. 4.0 – JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO – POSSIBILIDADE De acordo com o Ato Conjunto 2/2023, do TRF1, de 18/12/2023, celebrado com o aval da Procuradora Regional Federal da 1ª Região, gizou em seu Art. 1º, inciso II, que “O INSS será citado apenas após a juntada aos autos dos laudos médico e social, quando aplicável, quando o laudo da perícia judicial for favorável, total ou parcialmente, à parte autora, nos processos que tratam de benefícios por incapacidade e assistenciais.” No presente caso, aplica-se a dispensa de citação prévia do INSS, bastando, para tanto, a intimação da sentença proferida, conforme o Art. 1º, inciso I, do referido Ato Conjunto, para conhecimento e demais consectários legais. Por assim ser, nos termos do Art. 355, I, do NCPC, O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando não houver necessidade de produção de outras provas. No caso em exame, a parte autora não se manifestou acerca da ausência à perícia médica designada, tampouco apresentou justificativas para não comparecer. O Comparecimento à perícia médica designada era de sua total responsabilidade. Desse modo, se em certas demandas, a exemplo desta, o julgador firmar entendimento desfavorável à pretensão da parte autora, nada mais adequado que seja abreviada a tramitação do feito neste grau de jurisdição, com o julgamento de mérito antecipado. Tal providência acabará sendo até favorável ao autor, que não teve que, inutilmente, submeter-se a um procedimento alongado sem qualquer perspectiva de sucesso. De resto, o laudo médico pericial administrativo (PERÍCIA MÉDICA FEDERAL), baseado nos dados clínico-periciais atuais, concluiu que não há incapacidade laborativa para a atividade declarada. Sendo assim, não constatada a incapacidade para o trabalho, sequer é necessário aventar a presença da condição de segurado da parte autora. Desse modo, em não havendo incapacidade laboral, não faz jus à concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. Forte nesse entendimento, estando a matéria suficientemente esclarecida (Art. 480 do CPC/2015), passo à resolução do mérito da lide, conforme o estado do processo, sendo desnecessária a remarcação da perícia médica (frustrada por conta da própria parte autora), assim como considero preclusa a abertura de algum prazo para eventual manifestação. Por derradeiro, configurada a preclusão da perícia médica ante o não comparecimento da parte autora na data designada, sem qualquer razão plausível a justificar a ausência, e inexistente prova suficiente para demonstrar a incapacidade profissional reclamada, tem-se por correto o decreto de improcedência do pedido, com a consequente extinção do feito com julgamento do mérito. 5.0 – DISPOSITIVO Diante do exposto, antecipadamente, julgo improcedente o pedido e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do Art. 487, I, c/c Art. 355, I, e, ainda, Art. 371 e Art. 479, tudo do CPC/2015. Defiro os benefícios da justiça gratuita. Sem custas e tampouco honorários advocatícios (art. 55 da Lei 9.099/95). Intimem-se as partes. Havendo recurso, promova-se a comunicação da apelação ao réu, para, querendo, apresentar contrarrazões, no prazo legal. Após, encaminhem-se os autos à Turma Recursal Federal/PI. Arquivem-se, quando oportuno. São Raimundo Nonato/PI, [datado automaticamente]. (assinado eletronicamente, cf. Lei nº 11.419/2006) Juiz(a) Federal Vara Única da Subseção Judiciária de SRN/PI

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Processo nº 1003704-12.2023.8.11.0003

ID: 280753800

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1003704-12.2023.8.11.0003

Data de Disponibilização: 27/05/2025

Polo Ativo:

IBRAHIM MOHAMED CHARANEK

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

KARINE FLORENCIANA DURAN

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DENISE RODEGUER

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003704-12.2023.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Da… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003704-12.2023.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Turma Julgadora: [DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [IBRAHIM MOHAMED CHARANEK - CPF: 594.398.901-34 (APELANTE), DENISE RODEGUER - CPF: 330.525.518-84 (ADVOGADO), KARINE FLORENCIANA DURAN - CPF: 041.089.261-02 (ADVOGADO), FANCAR DISTRIBUIDORA DE VEICULOS LTDA - CNPJ: 00.784.470/0001-93 (APELADO), GISELE KARINE COSTA - CPF: 030.360.159-06 (ADVOGADO), FORD MOTOR COMPANY BRASIL LTDA - CNPJ: 03.470.727/0001-20 (APELADO), CELSO DE FARIA MONTEIRO - CPF: 182.328.128-18 (ADVOGADO), REINALDO DE SOUZA FREITAS - CPF: 003.607.217-61 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. VÍCIO EM VEÍCULO. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO. INEXISTÊNCIA DE DEFEITO. VALIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente ação de indenização por danos materiais e moral fundada em defeito de fabricação de veículo. II. Questão em discussão Há duas questões em discussão: (i) saber se o laudo pericial oficial é tecnicamente idôneo para comprovar a inexistência de vício oculto; e (ii) saber se há direito à indenização por danos materiais e moral. III. Razões de decidir O laudo pericial foi elaborado por perito regularmente nomeado, acompanhado pelas partes, e embasado em inspeção visual, funcional e diagnóstico eletrônico, revelando que o veículo não apresentava falhas no sistema de câmbio no momento da perícia. Não houve demonstração de vício atual ou de defeito persistente por prova técnica autônoma do autor. A responsabilidade do fornecedor por vícios no produto exige a demonstração do defeito e do nexo causal com os danos alegados, o que não ocorreu no caso dos autos. IV. Dispositivo e tese Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: “1. A validade do laudo pericial judicial, quando elaborado com observância dos critérios técnicos, contraditório e fundamentação, afasta a alegação de vício no produto. 2. Não comprovado o vício, são indevidos os pedidos de restituição em dobro e de indenização por dano material e moral.” Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 373, I e 473, §§ 1º e 2º; CC, arts. 186 e 927; CDC, arts. 6º, VIII, e 18. Jurisprudência relevante citada: TJMT, RAC nº 1027846-68.2020.8.11.0041, 3ª Câm. Dir. Priv., Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 19.03.2025; TJMT, RAC nº 1012805-15.2019.8.11.0003, 3ª Câm. Dir. Priv., Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 24.03.2021. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação cível interposto por Ibrahim Mohamed Charanek, em face da r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis, que nos autos da ação de indenização por danos materiais e morais, movida contra Fancar Distribuidora de Veículos Ltda. e Ford Motor Company Brasil Ltda., julgou improcedente os pedidos iniciais, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, suspensa a exigibilidade por ser beneficiário da justiça gratuita. Inconformado, o apelante recorre arguindo a nulidade do laudo pericial judicial, por considerá-lo tecnicamente inidôneo, superficial e comprometido. Afirma que o perito não conduziu pessoalmente os exames e não operou o equipamento de diagnóstico eletrônico, utilizando-se de estrutura e instrumentos da própria demandada. Alega que o perito não realizou inspeção interna do câmbio, tampouco abriu o conjunto de transmissão para verificação efetiva dos componentes, limitando-se a análise superficial com base em sintomas momentaneamente ausentes. Além disso, sustenta que as provas demonstram que o defeito é estrutural e conhecido da montadora, objeto de inúmeros procedimentos de recall, de ações judiciais coletivas no Brasil e nos EUA. Aponta que, apesar das sucessivas promessas de reparo, o veículo voltou a apresentar os mesmos sintomas após as últimas intervenções, inclusive com emissão de novos orçamentos que preveem a troca de embreagem e corpo de borboleta, sem que tais serviços tenham sido realizados. Argumenta que os vícios persistem e que a perícia não foi capaz de desconstituir as provas apresentadas. Ao final requer a reforma da sentença, com a declaração de nulidade do laudo, a condenação das rés à substituição do veículo, ou restituição do valor pago, além da reparação por danos materiais e moral. As apeladas apresentaram contrarrazões no id. 281116450 e id. 281116451, ambas pugnando pelo desprovimento do apelo. É o relatório. Inclua-se na pauta. Cuiabá, 21 de maio de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator V O T O R E L A T O R Cinge-se dos autos que Ibrahim Mohamed Charanek ajuizou ação de indenização por danos materiais e moral em desfavor de Ford Motor Company Brasil Ltda. e Fancar Distribuidora de Veículos Ltda., aduzindo que adquiriu veículo Ford New Fiesta, ano 2013/2014, dotado de câmbio automatizado Powershift, notoriamente marcado por vício oculto de fabricação, cuja existência foi objeto de diversos recalls e acordos indenizatórios em jurisdições estrangeiras. Alega que, em 2018, foi surpreendido por defeitos mecânicos recorrentes, consistentes em trepidações, falhas de aceleração, perda de potência, baixa rotação, além de abertura inesperada das portas durante a condução. Embora tenha recorrido à concessionária e ao Procon, restaram pendentes reparos essenciais, em especial, a substituição do conjunto completo do sistema de atuadores do câmbio, o que, segundo alega, foi omitido de forma dolosa, mediante emissão de ordem de serviço em branco, sem nota fiscal correspondente. O vício retornou em 2023, com o veículo ainda dentro da garantia estendida de 10 anos ou 240 mil km, oferecida pela montadora. O diagnóstico revelou novamente o mesmo defeito de fricção no sistema Powershift, sendo efetuado novo reparo parcial pela ré, sem êxito, restando o veículo inutilizável, tendo inclusive o autor registrado boletim de ocorrência relatando os perigos à integridade física e à segurança pública. Segue afirmando que passou a alugar um veículo do próprio filho no valor de R$ 2.600,00 mensais, de modo a manter suas atividades laborais e apoio ao negócio da filha, cujo restaurante depende de entregas. Assevera que deixou de quitar as parcelas do financiamento do automóvel objeto da ação, dado o redirecionamento de seus recursos à locação de outro veículo funcional. Alega, ainda, que há impossibilidade de alienar o bem com vício notório e insanável, o que lhe acarreta dupla frustração patrimonial. Ao final pleiteia a substituição do veículo ou a restituição em dobro do valor de mercado, por má-fé contratual das rés, no importe de R$ 81.352,00, além de reparação dos danos materiais decorrentes da locação do carro (estimada em R$ 2.600,00 mensais por 12 meses), bem como a quitação das parcelas inadimplidas do financiamento (R$ 2.426,64). Requer ainda indenização por dano moral de, no mínimo, R$ 20.000,00. Os requeridos apresentaram contestação. A Ford Motor Company Brasil Ltda. sustentou, em suma, que inexiste qualquer vício de fabricação no câmbio do veículo Ford Fiesta adquirido pelo autor, atribuindo os defeitos relatados ao desgaste natural decorrente do uso prolongado e à falta de manutenção regular, considerando que o automóvel já ultrapassava 160 mil quilômetros rodados. Alegou, ainda, que o veículo estava fora do prazo de garantia contratual e legal, e que os reparos realizados em 2018 e 2023 foram prestados em regime de cortesia, sem que isso representasse reconhecimento de defeito oculto ou responsabilidade objetiva. Rechaçou, por fim, a existência de dano moral ou material indenizável, uma vez que o bem se encontrava em perfeitas condições de uso e não houve omissão no dever de assistência técnica (id. 281116381). Já a Fancar Distribuidora de Veículos Ltda., concessionária ré, defendeu-se principalmente sob a tese de ilegitimidade passiva, alegando que não comercializou o veículo ao autor, tendo atuado apenas como oficina autorizada para diagnósticos e reparos, por solicitação da montadora. Sustentou que jamais se comprometeu contratualmente com o consumidor quanto à venda ou garantia do automóvel, não podendo ser responsabilizada pelos eventuais vícios de fabricação. Acrescentou que os serviços executados seguiram os protocolos técnicos da fabricante, sendo o veículo devolvido ao autor em perfeito estado de funcionamento após as intervenções, o que excluiria qualquer falha na prestação de serviço por parte da concessionária (id. 281116383). O requerente apresentou impugnação às contestações, no id. 281116390. O feito foi saneado (id. 281116394), sendo afastadas as preliminares arguidas e deferida a prova pericial. O laudo pericial foi juntado no id. 281116435. O autor impugnou o laudo pericial, requerendo a decretação de nulidade (id. 281116441). Por outro lado, as empresas requeridas manifestaram concordância com o laudo (id. 281116444 e id. 281116445). Na sequência, após o devido processo legal, o douto magistrado a quo, entendeu que não restou comprovado vício atual ou persistente no veículo e, com base no laudo pericial conclusivo, reconheceu que os reparos anteriormente realizados pelas rés foram eficazes e suficientes, inexistindo elementos que justificassem substituição do bem, restituição do valor pago ou reparação por danos materiais ou moral. Diante disso, julgou improcedente os pedidos iniciais, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, suspensa a exigibilidade por ser beneficiário da justiça gratuita (id. 281116446). Inconformado, o apelante recorre arguindo a nulidade do laudo pericial judicial, por considerá-lo tecnicamente inidôneo, superficial e comprometido. Afirma que o perito não conduziu pessoalmente os exames e não operou o equipamento de diagnóstico eletrônico, utilizando-se de estrutura e instrumentos da própria demandada. Alega que o perito não realizou inspeção interna do câmbio, tampouco abriu o conjunto de transmissão para verificação efetiva dos componentes, limitando-se a análise superficial com base em sintomas momentaneamente ausentes. Além disso, sustenta que as provas demonstram que o defeito é estrutural e conhecido da montadora, objeto de inúmeros procedimentos de recall, de ações judiciais coletivas no Brasil e nos EUA. Argumenta que os vícios persistem e que a perícia não foi capaz de desconstituir as provas apresentadas. Ao final requer a reforma da sentença, com a declaração de nulidade do laudo, a condenação das rés à substituição do veículo, ou restituição do valor pago, além da reparação por danos materiais e moral. Pois bem. Após detida análise dos autos, verifico que a questão não é de difícil elucidação. Inicialmente, mister se faz constar que o art. 373, inc. I e II, do CPC, preceitua que cabe ao autor comprovar o fato constitutivo de seu direito, determinando ser ônus do réu apresentar provas hábeis a demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito por aquele postulado. Entretanto, diante da alegada inversão do onus probandi em decorrência da aplicação do Código de Defesa do Consumidor, algumas considerações merecem destaque. Em primeiro lugar, esclareço, desde já, que apesar da inquestionável existência de relação consumerista entre as partes e do pleito de inversão do ônus da prova em razão do CDC, cabe ao autor, ainda que minimamente, demonstrar a existência de ato ou fato por ele descrito na inicial como ensejador do seu direito, que, in casu, é o vício no produto. Nesse sentido, reproduz-se a lição doutrinária, da lavra do i. Ministro Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, vejamos, verbis: “Como, nas demandas que tenham por base o CDC, o objetivo básico é a proteção ao consumidor, procura-se facilitar a sua atuação em juízo. Apesar disso, o consumidor não fica dispensado de produzir provas. Pelo contrário, a regra continua a mesma, ou seja, o consumidor, como autor da ação de indenização, deverá comprovar os fatos constitutivos do seu direito. (...) Deve ficar claro, porém, que o ônus de comprovar a ocorrência dos danos e da sua relação de causalidade com determinado produto ou serviço é do consumidor. Em relação a esses dois pressupostos da responsabilidade civil do fornecedor (dano e nexo causal), não houve alteração da norma de distribuição do encargo probatório do artigo 333 do CPC.” (Responsabilidade Civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor. 3ª Ed., São Paulo: Editora Saraiva, 2010). Nesta senda, já tive oportunidade de assim julgar, verbis: “AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL – ACIDENTE EM SUPERMERCADO – AUSÊNCIA DE PROVA DO DANO E NEXO DE CAUSALIDADE – ART. 373, I, CPC – SENTENÇA MANTIDA – HONORÁRIOS RECURSAL – RECURSO DESPROVIDO. Sendo aplicado o CDC, não se desconhece a existência da inversão do ônus da prova, baseada no seu art. 6º, inc. VIII, todavia, ainda que haja a referida, o certo é que cabe ao consumidor provar, mesmo que minimamente, o quanto alegado na inicial, consoante preceitua o art. 373, inc. I, do CPC, o que não ocorreu no caso vertente. No caso, a autora não demonstrou que as lesões apresentadas no acervo fotográfico advieram, de fato, da colisão com a porta do supermercado apelado. Em razão do trabalho adicional empregado pelo advogado, da natureza e da importância da causa, majoram-se os honorários advocatícios, nos moldes do art. 85, §11, do CPC.” (RAC n. 1012805-15.2019.8.11.0003, 3ª Câm. Dir. Priv., minha relatoria, j. 24.03.2021 – negritei). Em relação ao suposto vício no produto adquirido, o art. 18 do Código de Defesa do Consumidor, dispõe que “os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas”. No caso em tela, o apelante sustenta que adquiriu veículo Ford New Fiesta, ano 2013/2014, dotado de câmbio automatizado Powershift, notoriamente marcado por vício oculto de fabricação, sendo surpreendido por defeitos mecânicos recorrentes, consistentes em trepidações, falhas de aceleração, perda de potência, baixa rotação, além de abertura inesperada das portas durante a condução. Primeiramente, é incontroverso que o perito judicial foi regularmente nomeado, habilitado como engenheiro mecânico, inscrito no banco de profissionais da vara e, como se verifica, não apresentou qualquer impedimento ou suspeição legal que ensejasse sua substituição. Por outro lado, a irresignação do recorrente funda-se no argumento de que o perito judicial teria se limitado a observar a execução do diagnóstico eletrônico, realizado por funcionário da própria concessionária demandada, sem conduzir pessoalmente a operação dos equipamentos de leitura e sem desmontar fisicamente o conjunto de transmissão, o que, segundo sustenta, comprometeria a fidedignidade da prova técnica e sua aptidão para apurar vícios de natureza oculta ou intermitente. Contudo, tais alegações não têm o condão de infirmar a regularidade, validade e suficiência técnico-metodológica do laudo pericial constante dos autos (id. 281116435). Como dito, o perito foi regularmente nomeado pelo Juízo singular, aceitou o encargo sem apresentar qualquer impedimento, e teve sua atuação acompanhada pelas partes e assistentes técnicos, o que garante a observância ao contraditório e à ampla defesa (art. 473, §§ 1º e 2º, do CPC). Em relação à prova técnica, verifica-se que o perito procedeu a inspeção visual e funcional do veículo, acompanhou a realização do teste de rodagem por mais de 40 minutos, e utilizou scanner (equipamento de diagnóstico eletrônico) homologado pela própria montadora, a fim de extrair os códigos de falha eletrônica, valendo-se dos meios e estruturas disponíveis com o devido controle de confiabilidade técnica. O fato de o diagnóstico eletrônico ter sido operado por profissional treinado da concessionária não retira a responsabilidade técnica e o juízo crítico do perito, que permaneceu presente durante todo o procedimento, registrando, avaliando e interpretando os dados com autonomia técnica. Ademais, inexiste nos autos qualquer prova técnica divergente trazida pelo autor, apta a refutar o conteúdo da perícia oficial, o que impede o reconhecimento de invalidade da prova por mera insatisfação subjetiva. A propósito, colaciono trecho do referido documento, in litteris: “CONCLUSÃO A realização do trabalho pericial baseou-se na inspeção do Ford Fiesta, objeto da lide, no teste de rodagem e na análise dos documentos contidos nas peças do processo, além daqueles agregados durante a diligência. O prazo de garantia do veículo é de 36 meses, com quilometragem ilimitada, iniciando-se a partir do mês de aquisição do veículo 0 km ao primeiro proprietário. Como o automóvel tem a data de aquisição (lançada no manual) sendo o dia 26 de julho de 2013, o prazo de garantia terminou em 26 de julho de 2016. No entanto, o Módulo de Controle da Transmissão (TCM), o disco de embreagem, os retentores do eixo de entrada e a recalibração do software da transmissão tiveram uma extensão da garantia. O módulo TCM teve o prazo da garantia aumentado até o dia 26/07/2023. Para as demais peças e a recalibração do software, a garantia foi até o dia 26/07/2018. A Requerida FANCAR fez a substituição do jogo de embreagem, da placa traseira (é uma junta) e do fluido de transmissão, por 2 (duas) vezes, em garantia: em 31/05/2016 (o veículo tinha 43.365 km e pertencia à mãe do Autor) e em 25/01/2018 (o carro estava com 119.579 km e ainda pertencia à mãe do Autor). A Requerida FANCAR também fez a substituição e reprogramação do módulo TCM, em garantia, quando o automóvel possuía 119.579 km e pertencia à mãe do Autor. Além dessas intervenções mecânicas, em garantia, a Requerida FANCAR fez a substituição dos 2 (dois) atuadores elétricos, como cortesia comercial, em 04/01/2023 (a proprietária era a Sra. Yasmin Ibrahim Charanek). Vale lembrar que esses atuadores não pertenciam a nenhum Programa de Extensão de Garantia e o veículo já se encontrava fora do prazo da garantia contratual de 36 meses. Portanto, o Autor não teve custo para estes reparos mencionados. Durante o teste de rodagem, este perito observou que o veículo estava trocando as marchas, normalmente, sem trepidar e sem perder força. Não foi observado problema no câmbio nem vício no veículo. Também não foi identificada dificuldade na partida do automóvel. Uma luz amarela (de advertência) permanecia acesa e indica que o carro alcançou a quilometragem ou tempo (o que vencer primeiro), para que seus itens de manutenção programada sejam executados, de acordo com as tabelas de manutenção programada. Essa informação aparece na página 72 do manual do Ford Fiesta. Posteriormente, utilizando um equipamento de diagnóstico veicular, foi analisado o código de falha que apareceu (ver figura 5). Concluiu-se que a luz amarela no painel do automóvel é referente ao corpo de borboleta do carro (ver figura 6 e 7), que precisa ser substituído. Trata-se de uma manutenção normal, em um automóvel que está com 181.749 quilômetros rodados e não tem histórico dessa intervenção. Por fim, é fato que o veículo, em análise, teve problemas originados na fabricação, com relação à embreagem e ao Módulo de Controle da Transmissão (TCM). No entanto, o automóvel foi reparado, sem custo para os proprietários, e se encontra em condições normais de utilização. Sendo certo que o presente laudo técnico se caracteriza como um dos elementos de convencimento do Emérito Magistrado, que não se encontra adstrito ao mesmo.” (id. 281116435). Devo ressaltar, ainda, que o laudo pericial é detalhado, claro, objetivo e conclusivo, respondendo de modo fundamentado a todos os quesitos formulados, inclusive identificando que o único alerta eletrônico registrado no veículo dizia respeito ao corpo de borboleta do motor, peça estranha ao câmbio automatizado Powershift, e que não compromete a funcionalidade geral do sistema de transmissão, Confira: “4) Caso não esteja sendo utilizado, esclareça o Senhor Perito o motivo e se esse motivo se relaciona ao sistema de câmbio. Resposta: O Autor informou que não está rodando com o seu automóvel, pois o mesmo está com a luz amarela (chave de boca) acesa no painel, o carro perde força e não consegue trocar de marcha. No entanto, após o teste de rodagem, este perito observou que o veículo estava trocando as marchas, normalmente, sem trepidar e sem perder força. Essa luz amarela (de advertência) continua acesa e indica que o automóvel alcançou a quilometragem ou tempo (o que vencer primeiro), para que seus itens de manutenção programada sejam executados, de acordo com as tabelas de manutenção programada. Essa informação aparece na página 72 do manual do Ford Fiesta. Analisando o código de falha que apareceu no equipamento de diagnóstico ver figura 5), conclui-se que a luz amarela no painel do carro é referente ao corpo de borboleta do veículo (ver figura 6 e 7), que precisa ser substituído. Portanto, esse problema não tem a ver com o sistema de câmbio. (...) 11) Informe o Sr. Perito se o carro em questão New Fiesta apresenta dificuldade no engate de marchas, caso positivo é passível de reparo. Resposta: Após o teste de rodagem, este perito observou que o veículo estava trocando as marchas, normalmente, sem trepidar e sem perder força. (...) 15) Informe o Sr. Perito se o carro tem alteração do tempo de troca das marchas, dificuldade de partida e perda de potência com o uso prolongado do veículo? Resposta: Nenhum destes problemas foi encontrado, durante o teste de rodagem, por 44 (quarenta e quatro) minutos. O automóvel circulou só em asfalto, por 14 (quatorze) quilômetros, com velocidade de até 70 km/h, tendo passado por trânsito lento. Foi verificado que o carro fazia as trocas de marcha, normalmente, sem trepidação e sem perder força. Também não foi identificada dificuldade na partida do veículo. 16) O veículo periciado apresenta algum vício/defeito? Caso apresente, o vício/defeito decorre da tecnologia Powershift? Resposta: Nenhum vício foi apresentado pelo veículo, objeto da lide. A única manutenção necessária é a substituição do o seu corpo de borboleta. Trata-se de uma manutenção normal, em um automóvel que está com 181.749 quilômetros rodados e não tem histórico dessa intervenção. (...) 24) Os problemas apresentados, bem como a utilização da tecnologia Powershift reduzem o valor de mercado do automóvel em comparação com outros que não utilizam a garantia ? Resposta: O veículo, objeto da lide, teve problemas originados na fabricação, com relação à embreagem e ao Módulo de Controle da Transmissão (TCM). No entanto, o automóvel foi reparado e se encontra em condições normais de utilização. As de Garantia oferecidos pela montadora e Requerida FORD MOTOR COMPANY BRASIL. Além disso, a Requerida FANCAR fez a substituição dos 2 (dois) atuadores elétricos, em cortesia comercial para o Autor (conforme O.S nº 171830 e NF nº 104.671, de 06/01/2023). Vale lembrar que esses atuadores não pertenciam ao Programa de Extensão de Garantia – 14M01 (comunicado BTSA 034/15). Sendo assim, esses problemas apresentados e a tecnologia Powershift não influenciam e nem reduzem o valor de mercado do Ford Fiesta, em questão. O valor de referência para o carro, em questão, se encontra na Tabela FIPE. intervenções nessas peças foram realizadas dentro dos 2 (dois) Programas de Extensão.” Logo, tenho que a metodologia e imparcialidade do laudo pericial devem ser reconhecidas e prestigiadas como instrumento fundamental à formação da convicção judicial. A propósito, assim decidiu esta Terceira Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS – PASEP – PRELIMINAR DE SUSPENSÃO DO FEITO – INAPLICABILIDADE AO CASO – VALORES SUBTRAÍDOS DA CONTA – SUPOSTA MÁ-GESTÃO DE RECURSOS PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA – FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO AUTORAL EVIDENCIADOS – PROVA PERICIAL CONTÁBIL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Não se insere a presente questão submetida a julgamento à ordem de suspensão de processos proferida pelo STJ no Recurso Especial nº 2162222-PE (2024/0292186-1). O laudo pericial, elaborado por perito nomeado pelo juízo, goza de presunção de veracidade, de forma que, inexistindo prova hábil capaz de elidir o seu teor conclusivo, deve ser ele considerado correto e, por conseguinte, homologado em decisão devidamente fundamentada, como no caso dos autos. A manutenção da sentença fundada na conclusão da prova técnica é medida que se impõe, notadamente se ausentes elementos aptos a infirmá-la.” (RAC n.º 1027846-68.2020.8.11.0041, 3ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 19.03.2025 – destaquei). A propósito, sobre a prova pericial, bem salientou o douto magistrado, verbis: “(...) Dito isto, em prosseguimento, e já adentrando-se ao mérito da lide, propriamente dito, tem-se que o imbróglio instalado entre as partes somente poderia ser dirimido a partir da constatação da existência de vícios/defeitos/problemas no veículo objeto da lide; bem como das causas dos mesmos - a fim de ser apurada a responsabilidade de cada sujeito processual envolvido na demanda. E, para auxiliar o Juízo na busca de tais informações, outro caminho não haveria que ser tomado, senão a produção de prova pericial que, desenvolvida a partir da vistoria in loco e estudos específicos das normas que regem o tema, trouxesse para o processo as informações necessárias para se averiguar os apontamentos deduzidos pelas partes. Em se tratando de ponto controvertido que gira em torno de vício/problema/defeito de fabricação em veículo automotor, é certo que a lide se resolve com prova igualmente técnica - de modo que impertinente a produção de outras provas, bastando os documentos que constam dos autos e a aplicação do Direito; não havendo que se falar em prova oral, sem força para afastar as conclusões tiradas pelo auxiliar do Juízo, a quem é confiada a análise técnica da lide, conforme art. 443, I e II, do CPC. E, nesse ponto, o Perito Judicial foi firme e claro em concluir pela inexistência de vícios/problemas/defeitos no veículo, que pudessem ser atribuídos à responsabilidade da parte requerida. Atente-se: “... é fato que o veículo, em análise, teve problemas originados na fabricação, com relação à embreagem e ao Módulo de Controle da Transmissão (TCM). No entanto, o automóvel foi reparado, sem custo para os proprietários, e se encontra em condições normais de utilização.” Valioso destacar que o laudo pericial evidencia a realização de um trabalho técnico minucioso no veículo vistoriado, trazendo registros fotográficos e detalhamentos explicativos sobre cada ponto apontado. Ademais, todos os quesitos apresentados pelas partes foram detalhadamente respondidos – sem deixar margem para dúvidas ou opiniões pessoais desprovidas de razão lógica e fundamentada de forma técnica. Dito isso, sem delongas, tem-se que a ação não comporta procedência, na medida em que o laudo pericial, elaborado por profissional técnico capacitado, concluiu que os vícios que existiam no veículo já foram totalmente sanados (sem custo para o autor) e o carro está em perfeitas condições de utilização.” (id. 281116446 - negritei). Desse modo, ainda que se inverta o ônus da prova, caberia ao autor o ônus de comprovar, minimamente, o fato constitutivo de seu direito. No caso, a parte apelante não trouxe prova técnica autônoma ou robusta apta a infirmar a conclusão do laudo judicial, ônus do qual, repiso, não se desincumbiu. Sobre a distribuição do ônus da prova, eis a lição de Moacyr Amaral Santos, verbis: “O critério da distribuição do ônus da prova deduzida do ônus da afirmação evoca a antítese entre ação, no sentido lato, e exceção, também no sentido lato, a cujos ônus respectivos se coordena o ônus da afirmação para os fins da prova. O ônus da prova - é útil insistir - é determinado pelo ônus da afirmação, e este, por sua vez, é determinado pelo ônus da demanda, que assume duas posturas diferentes, apresentando-se da parte do autor, como ônus da ação, e da parte do réu como ônus da exceção. (...) Em suma, quem tem o ônus da ação tem o de afirmar e provar os fatos que servem de fundamento à relação jurídica litigiosa; quem tem o ônus da exceção tem o de afirmar e provar os fatos que servem de fundamento a ela. Assim ao autor cumprirá provar os fatos constitutivos, ao réu os impeditivos, extintivos ou modificativos.” (Comentários ao Código de Processo Civil, Ed. Forense, v. IV, p. 33). À vista disso, não basta à parte autora alegar o dano material e moral, mas sim, demonstrar a existência da conduta negligente, ou ainda a falha na prestação do serviço, além do nexo causal entre esta e o dano suportado, motivo pelo qual, sem tal comprovação, não há como acolher a pretensão deduzida na peça de ingresso. É cediço que o ônus da prova é regra fundamental em nosso Estado Democrático de Direito, que atrai para a parte autora o encargo de provar de forma robusta suas alegações, ônus este do qual não se libertou, já que não demonstrou concretamente o alegado, razão pela qual não há que se falar na responsabilização das apeladas seja a título de dano material ou moral. Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial, verbis: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REDIBITÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS E DANO MORAL – AQUISIÇÃO DE VEÍCULO USADO – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE VÍCIO OCULTO NO MOMENTO DA AQUISIÇÃO – INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 333, I DO CPC/1973 - DESGASTE DECORRENTE DO TEMPO DE USO DO BEM – FALTA DE CAUTELA DO CONSUMIDOR – AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO – RECURSO DESPROVIDO. A ausência de demonstração pelo autor de que veículo usado foi vendido com vício oculto no motor (artigo 333, I do CPC/1973), acarreta a improcedência do pedido de indenização por dano material consistentes na restituição dos reparos mecânicos realizados. Com a inexistência de ato ilícito, bem como, ausência de abalo subjetivo, fica afastada a indenização por dano moral.” (TJMT, RAC n. 0001928-68.2009.8.11.0040, 1ª Câm. Dir. Priv., Rela. Desa. Nilza Maria Pôssas de Carvalho, j. 19.09.2017 – negritei). “APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE PERDAS E DANOS C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER. Ausência de prova dos fatos constitutivos dos direitos da autora, como prevê o art. 373, I, do CPC. Aquisição de veículo com 10 anos de uso, em que o desgaste natural das peças se insere no plano dos riscos inerentes à própria natureza do negócio realizado. Vício oculto em veículo usado. Inocorrência. APELO DESPROVIDO.” (TJRS, RAC n. 70081298762, 11ª Câm. Cív., Rel. Des. Bayard Ney de Freitas Barcellos, j. 16.12.2020 – negritei). Assim, ante a não comprovação da existência de ato ilícito apto a ensejar a condenação por dano moral, nos termos dos arts. 186 e 927, ambos do Código Civil, tenho que a manutenção da r. sentença é medida que se impõe. Portanto, por estes termos e estribado nessas razões, tenho que a r. sentença está em consonância com a legislação pátria, doutrina e jurisprudência, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos. De outra banda, estando desprovido o recurso do apelante, majoro a condenação em honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, atendendo ao que dispõe o art. 85, §11, do CPC, devendo ser observado o quanto disposto no art. 98, §3º, do mesmo codex. Posto isso, conheço do recurso e lhe NEGO PROVIMENTO. Cuiabá, 21 de maio de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 21/05/2025

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Processo nº 1003704-12.2023.8.11.0003

ID: 280753816

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1003704-12.2023.8.11.0003

Data de Disponibilização: 27/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

FANCAR DISTRIBUIDORA DE VEICULOS LTDA FORD MOTOR COMPANY BRASIL LTDA

Acórdão

Advogados:

CELSO DE FARIA MONTEIRO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

GISELE KARINE COSTA

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003704-12.2023.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Da… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003704-12.2023.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Turma Julgadora: [DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [IBRAHIM MOHAMED CHARANEK - CPF: 594.398.901-34 (APELANTE), DENISE RODEGUER - CPF: 330.525.518-84 (ADVOGADO), KARINE FLORENCIANA DURAN - CPF: 041.089.261-02 (ADVOGADO), FANCAR DISTRIBUIDORA DE VEICULOS LTDA - CNPJ: 00.784.470/0001-93 (APELADO), GISELE KARINE COSTA - CPF: 030.360.159-06 (ADVOGADO), FORD MOTOR COMPANY BRASIL LTDA - CNPJ: 03.470.727/0001-20 (APELADO), CELSO DE FARIA MONTEIRO - CPF: 182.328.128-18 (ADVOGADO), REINALDO DE SOUZA FREITAS - CPF: 003.607.217-61 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL. VÍCIO EM VEÍCULO. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO. INEXISTÊNCIA DE DEFEITO. VALIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente ação de indenização por danos materiais e moral fundada em defeito de fabricação de veículo. II. Questão em discussão Há duas questões em discussão: (i) saber se o laudo pericial oficial é tecnicamente idôneo para comprovar a inexistência de vício oculto; e (ii) saber se há direito à indenização por danos materiais e moral. III. Razões de decidir O laudo pericial foi elaborado por perito regularmente nomeado, acompanhado pelas partes, e embasado em inspeção visual, funcional e diagnóstico eletrônico, revelando que o veículo não apresentava falhas no sistema de câmbio no momento da perícia. Não houve demonstração de vício atual ou de defeito persistente por prova técnica autônoma do autor. A responsabilidade do fornecedor por vícios no produto exige a demonstração do defeito e do nexo causal com os danos alegados, o que não ocorreu no caso dos autos. IV. Dispositivo e tese Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: “1. A validade do laudo pericial judicial, quando elaborado com observância dos critérios técnicos, contraditório e fundamentação, afasta a alegação de vício no produto. 2. Não comprovado o vício, são indevidos os pedidos de restituição em dobro e de indenização por dano material e moral.” Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 373, I e 473, §§ 1º e 2º; CC, arts. 186 e 927; CDC, arts. 6º, VIII, e 18. Jurisprudência relevante citada: TJMT, RAC nº 1027846-68.2020.8.11.0041, 3ª Câm. Dir. Priv., Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 19.03.2025; TJMT, RAC nº 1012805-15.2019.8.11.0003, 3ª Câm. Dir. Priv., Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 24.03.2021. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação cível interposto por Ibrahim Mohamed Charanek, em face da r. sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis, que nos autos da ação de indenização por danos materiais e morais, movida contra Fancar Distribuidora de Veículos Ltda. e Ford Motor Company Brasil Ltda., julgou improcedente os pedidos iniciais, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, suspensa a exigibilidade por ser beneficiário da justiça gratuita. Inconformado, o apelante recorre arguindo a nulidade do laudo pericial judicial, por considerá-lo tecnicamente inidôneo, superficial e comprometido. Afirma que o perito não conduziu pessoalmente os exames e não operou o equipamento de diagnóstico eletrônico, utilizando-se de estrutura e instrumentos da própria demandada. Alega que o perito não realizou inspeção interna do câmbio, tampouco abriu o conjunto de transmissão para verificação efetiva dos componentes, limitando-se a análise superficial com base em sintomas momentaneamente ausentes. Além disso, sustenta que as provas demonstram que o defeito é estrutural e conhecido da montadora, objeto de inúmeros procedimentos de recall, de ações judiciais coletivas no Brasil e nos EUA. Aponta que, apesar das sucessivas promessas de reparo, o veículo voltou a apresentar os mesmos sintomas após as últimas intervenções, inclusive com emissão de novos orçamentos que preveem a troca de embreagem e corpo de borboleta, sem que tais serviços tenham sido realizados. Argumenta que os vícios persistem e que a perícia não foi capaz de desconstituir as provas apresentadas. Ao final requer a reforma da sentença, com a declaração de nulidade do laudo, a condenação das rés à substituição do veículo, ou restituição do valor pago, além da reparação por danos materiais e moral. As apeladas apresentaram contrarrazões no id. 281116450 e id. 281116451, ambas pugnando pelo desprovimento do apelo. É o relatório. Inclua-se na pauta. Cuiabá, 21 de maio de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator V O T O R E L A T O R Cinge-se dos autos que Ibrahim Mohamed Charanek ajuizou ação de indenização por danos materiais e moral em desfavor de Ford Motor Company Brasil Ltda. e Fancar Distribuidora de Veículos Ltda., aduzindo que adquiriu veículo Ford New Fiesta, ano 2013/2014, dotado de câmbio automatizado Powershift, notoriamente marcado por vício oculto de fabricação, cuja existência foi objeto de diversos recalls e acordos indenizatórios em jurisdições estrangeiras. Alega que, em 2018, foi surpreendido por defeitos mecânicos recorrentes, consistentes em trepidações, falhas de aceleração, perda de potência, baixa rotação, além de abertura inesperada das portas durante a condução. Embora tenha recorrido à concessionária e ao Procon, restaram pendentes reparos essenciais, em especial, a substituição do conjunto completo do sistema de atuadores do câmbio, o que, segundo alega, foi omitido de forma dolosa, mediante emissão de ordem de serviço em branco, sem nota fiscal correspondente. O vício retornou em 2023, com o veículo ainda dentro da garantia estendida de 10 anos ou 240 mil km, oferecida pela montadora. O diagnóstico revelou novamente o mesmo defeito de fricção no sistema Powershift, sendo efetuado novo reparo parcial pela ré, sem êxito, restando o veículo inutilizável, tendo inclusive o autor registrado boletim de ocorrência relatando os perigos à integridade física e à segurança pública. Segue afirmando que passou a alugar um veículo do próprio filho no valor de R$ 2.600,00 mensais, de modo a manter suas atividades laborais e apoio ao negócio da filha, cujo restaurante depende de entregas. Assevera que deixou de quitar as parcelas do financiamento do automóvel objeto da ação, dado o redirecionamento de seus recursos à locação de outro veículo funcional. Alega, ainda, que há impossibilidade de alienar o bem com vício notório e insanável, o que lhe acarreta dupla frustração patrimonial. Ao final pleiteia a substituição do veículo ou a restituição em dobro do valor de mercado, por má-fé contratual das rés, no importe de R$ 81.352,00, além de reparação dos danos materiais decorrentes da locação do carro (estimada em R$ 2.600,00 mensais por 12 meses), bem como a quitação das parcelas inadimplidas do financiamento (R$ 2.426,64). Requer ainda indenização por dano moral de, no mínimo, R$ 20.000,00. Os requeridos apresentaram contestação. A Ford Motor Company Brasil Ltda. sustentou, em suma, que inexiste qualquer vício de fabricação no câmbio do veículo Ford Fiesta adquirido pelo autor, atribuindo os defeitos relatados ao desgaste natural decorrente do uso prolongado e à falta de manutenção regular, considerando que o automóvel já ultrapassava 160 mil quilômetros rodados. Alegou, ainda, que o veículo estava fora do prazo de garantia contratual e legal, e que os reparos realizados em 2018 e 2023 foram prestados em regime de cortesia, sem que isso representasse reconhecimento de defeito oculto ou responsabilidade objetiva. Rechaçou, por fim, a existência de dano moral ou material indenizável, uma vez que o bem se encontrava em perfeitas condições de uso e não houve omissão no dever de assistência técnica (id. 281116381). Já a Fancar Distribuidora de Veículos Ltda., concessionária ré, defendeu-se principalmente sob a tese de ilegitimidade passiva, alegando que não comercializou o veículo ao autor, tendo atuado apenas como oficina autorizada para diagnósticos e reparos, por solicitação da montadora. Sustentou que jamais se comprometeu contratualmente com o consumidor quanto à venda ou garantia do automóvel, não podendo ser responsabilizada pelos eventuais vícios de fabricação. Acrescentou que os serviços executados seguiram os protocolos técnicos da fabricante, sendo o veículo devolvido ao autor em perfeito estado de funcionamento após as intervenções, o que excluiria qualquer falha na prestação de serviço por parte da concessionária (id. 281116383). O requerente apresentou impugnação às contestações, no id. 281116390. O feito foi saneado (id. 281116394), sendo afastadas as preliminares arguidas e deferida a prova pericial. O laudo pericial foi juntado no id. 281116435. O autor impugnou o laudo pericial, requerendo a decretação de nulidade (id. 281116441). Por outro lado, as empresas requeridas manifestaram concordância com o laudo (id. 281116444 e id. 281116445). Na sequência, após o devido processo legal, o douto magistrado a quo, entendeu que não restou comprovado vício atual ou persistente no veículo e, com base no laudo pericial conclusivo, reconheceu que os reparos anteriormente realizados pelas rés foram eficazes e suficientes, inexistindo elementos que justificassem substituição do bem, restituição do valor pago ou reparação por danos materiais ou moral. Diante disso, julgou improcedente os pedidos iniciais, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, suspensa a exigibilidade por ser beneficiário da justiça gratuita (id. 281116446). Inconformado, o apelante recorre arguindo a nulidade do laudo pericial judicial, por considerá-lo tecnicamente inidôneo, superficial e comprometido. Afirma que o perito não conduziu pessoalmente os exames e não operou o equipamento de diagnóstico eletrônico, utilizando-se de estrutura e instrumentos da própria demandada. Alega que o perito não realizou inspeção interna do câmbio, tampouco abriu o conjunto de transmissão para verificação efetiva dos componentes, limitando-se a análise superficial com base em sintomas momentaneamente ausentes. Além disso, sustenta que as provas demonstram que o defeito é estrutural e conhecido da montadora, objeto de inúmeros procedimentos de recall, de ações judiciais coletivas no Brasil e nos EUA. Argumenta que os vícios persistem e que a perícia não foi capaz de desconstituir as provas apresentadas. Ao final requer a reforma da sentença, com a declaração de nulidade do laudo, a condenação das rés à substituição do veículo, ou restituição do valor pago, além da reparação por danos materiais e moral. Pois bem. Após detida análise dos autos, verifico que a questão não é de difícil elucidação. Inicialmente, mister se faz constar que o art. 373, inc. I e II, do CPC, preceitua que cabe ao autor comprovar o fato constitutivo de seu direito, determinando ser ônus do réu apresentar provas hábeis a demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito por aquele postulado. Entretanto, diante da alegada inversão do onus probandi em decorrência da aplicação do Código de Defesa do Consumidor, algumas considerações merecem destaque. Em primeiro lugar, esclareço, desde já, que apesar da inquestionável existência de relação consumerista entre as partes e do pleito de inversão do ônus da prova em razão do CDC, cabe ao autor, ainda que minimamente, demonstrar a existência de ato ou fato por ele descrito na inicial como ensejador do seu direito, que, in casu, é o vício no produto. Nesse sentido, reproduz-se a lição doutrinária, da lavra do i. Ministro Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, vejamos, verbis: “Como, nas demandas que tenham por base o CDC, o objetivo básico é a proteção ao consumidor, procura-se facilitar a sua atuação em juízo. Apesar disso, o consumidor não fica dispensado de produzir provas. Pelo contrário, a regra continua a mesma, ou seja, o consumidor, como autor da ação de indenização, deverá comprovar os fatos constitutivos do seu direito. (...) Deve ficar claro, porém, que o ônus de comprovar a ocorrência dos danos e da sua relação de causalidade com determinado produto ou serviço é do consumidor. Em relação a esses dois pressupostos da responsabilidade civil do fornecedor (dano e nexo causal), não houve alteração da norma de distribuição do encargo probatório do artigo 333 do CPC.” (Responsabilidade Civil no Código do Consumidor e a Defesa do Fornecedor. 3ª Ed., São Paulo: Editora Saraiva, 2010). Nesta senda, já tive oportunidade de assim julgar, verbis: “AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL – ACIDENTE EM SUPERMERCADO – AUSÊNCIA DE PROVA DO DANO E NEXO DE CAUSALIDADE – ART. 373, I, CPC – SENTENÇA MANTIDA – HONORÁRIOS RECURSAL – RECURSO DESPROVIDO. Sendo aplicado o CDC, não se desconhece a existência da inversão do ônus da prova, baseada no seu art. 6º, inc. VIII, todavia, ainda que haja a referida, o certo é que cabe ao consumidor provar, mesmo que minimamente, o quanto alegado na inicial, consoante preceitua o art. 373, inc. I, do CPC, o que não ocorreu no caso vertente. No caso, a autora não demonstrou que as lesões apresentadas no acervo fotográfico advieram, de fato, da colisão com a porta do supermercado apelado. Em razão do trabalho adicional empregado pelo advogado, da natureza e da importância da causa, majoram-se os honorários advocatícios, nos moldes do art. 85, §11, do CPC.” (RAC n. 1012805-15.2019.8.11.0003, 3ª Câm. Dir. Priv., minha relatoria, j. 24.03.2021 – negritei). Em relação ao suposto vício no produto adquirido, o art. 18 do Código de Defesa do Consumidor, dispõe que “os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas”. No caso em tela, o apelante sustenta que adquiriu veículo Ford New Fiesta, ano 2013/2014, dotado de câmbio automatizado Powershift, notoriamente marcado por vício oculto de fabricação, sendo surpreendido por defeitos mecânicos recorrentes, consistentes em trepidações, falhas de aceleração, perda de potência, baixa rotação, além de abertura inesperada das portas durante a condução. Primeiramente, é incontroverso que o perito judicial foi regularmente nomeado, habilitado como engenheiro mecânico, inscrito no banco de profissionais da vara e, como se verifica, não apresentou qualquer impedimento ou suspeição legal que ensejasse sua substituição. Por outro lado, a irresignação do recorrente funda-se no argumento de que o perito judicial teria se limitado a observar a execução do diagnóstico eletrônico, realizado por funcionário da própria concessionária demandada, sem conduzir pessoalmente a operação dos equipamentos de leitura e sem desmontar fisicamente o conjunto de transmissão, o que, segundo sustenta, comprometeria a fidedignidade da prova técnica e sua aptidão para apurar vícios de natureza oculta ou intermitente. Contudo, tais alegações não têm o condão de infirmar a regularidade, validade e suficiência técnico-metodológica do laudo pericial constante dos autos (id. 281116435). Como dito, o perito foi regularmente nomeado pelo Juízo singular, aceitou o encargo sem apresentar qualquer impedimento, e teve sua atuação acompanhada pelas partes e assistentes técnicos, o que garante a observância ao contraditório e à ampla defesa (art. 473, §§ 1º e 2º, do CPC). Em relação à prova técnica, verifica-se que o perito procedeu a inspeção visual e funcional do veículo, acompanhou a realização do teste de rodagem por mais de 40 minutos, e utilizou scanner (equipamento de diagnóstico eletrônico) homologado pela própria montadora, a fim de extrair os códigos de falha eletrônica, valendo-se dos meios e estruturas disponíveis com o devido controle de confiabilidade técnica. O fato de o diagnóstico eletrônico ter sido operado por profissional treinado da concessionária não retira a responsabilidade técnica e o juízo crítico do perito, que permaneceu presente durante todo o procedimento, registrando, avaliando e interpretando os dados com autonomia técnica. Ademais, inexiste nos autos qualquer prova técnica divergente trazida pelo autor, apta a refutar o conteúdo da perícia oficial, o que impede o reconhecimento de invalidade da prova por mera insatisfação subjetiva. A propósito, colaciono trecho do referido documento, in litteris: “CONCLUSÃO A realização do trabalho pericial baseou-se na inspeção do Ford Fiesta, objeto da lide, no teste de rodagem e na análise dos documentos contidos nas peças do processo, além daqueles agregados durante a diligência. O prazo de garantia do veículo é de 36 meses, com quilometragem ilimitada, iniciando-se a partir do mês de aquisição do veículo 0 km ao primeiro proprietário. Como o automóvel tem a data de aquisição (lançada no manual) sendo o dia 26 de julho de 2013, o prazo de garantia terminou em 26 de julho de 2016. No entanto, o Módulo de Controle da Transmissão (TCM), o disco de embreagem, os retentores do eixo de entrada e a recalibração do software da transmissão tiveram uma extensão da garantia. O módulo TCM teve o prazo da garantia aumentado até o dia 26/07/2023. Para as demais peças e a recalibração do software, a garantia foi até o dia 26/07/2018. A Requerida FANCAR fez a substituição do jogo de embreagem, da placa traseira (é uma junta) e do fluido de transmissão, por 2 (duas) vezes, em garantia: em 31/05/2016 (o veículo tinha 43.365 km e pertencia à mãe do Autor) e em 25/01/2018 (o carro estava com 119.579 km e ainda pertencia à mãe do Autor). A Requerida FANCAR também fez a substituição e reprogramação do módulo TCM, em garantia, quando o automóvel possuía 119.579 km e pertencia à mãe do Autor. Além dessas intervenções mecânicas, em garantia, a Requerida FANCAR fez a substituição dos 2 (dois) atuadores elétricos, como cortesia comercial, em 04/01/2023 (a proprietária era a Sra. Yasmin Ibrahim Charanek). Vale lembrar que esses atuadores não pertenciam a nenhum Programa de Extensão de Garantia e o veículo já se encontrava fora do prazo da garantia contratual de 36 meses. Portanto, o Autor não teve custo para estes reparos mencionados. Durante o teste de rodagem, este perito observou que o veículo estava trocando as marchas, normalmente, sem trepidar e sem perder força. Não foi observado problema no câmbio nem vício no veículo. Também não foi identificada dificuldade na partida do automóvel. Uma luz amarela (de advertência) permanecia acesa e indica que o carro alcançou a quilometragem ou tempo (o que vencer primeiro), para que seus itens de manutenção programada sejam executados, de acordo com as tabelas de manutenção programada. Essa informação aparece na página 72 do manual do Ford Fiesta. Posteriormente, utilizando um equipamento de diagnóstico veicular, foi analisado o código de falha que apareceu (ver figura 5). Concluiu-se que a luz amarela no painel do automóvel é referente ao corpo de borboleta do carro (ver figura 6 e 7), que precisa ser substituído. Trata-se de uma manutenção normal, em um automóvel que está com 181.749 quilômetros rodados e não tem histórico dessa intervenção. Por fim, é fato que o veículo, em análise, teve problemas originados na fabricação, com relação à embreagem e ao Módulo de Controle da Transmissão (TCM). No entanto, o automóvel foi reparado, sem custo para os proprietários, e se encontra em condições normais de utilização. Sendo certo que o presente laudo técnico se caracteriza como um dos elementos de convencimento do Emérito Magistrado, que não se encontra adstrito ao mesmo.” (id. 281116435). Devo ressaltar, ainda, que o laudo pericial é detalhado, claro, objetivo e conclusivo, respondendo de modo fundamentado a todos os quesitos formulados, inclusive identificando que o único alerta eletrônico registrado no veículo dizia respeito ao corpo de borboleta do motor, peça estranha ao câmbio automatizado Powershift, e que não compromete a funcionalidade geral do sistema de transmissão, Confira: “4) Caso não esteja sendo utilizado, esclareça o Senhor Perito o motivo e se esse motivo se relaciona ao sistema de câmbio. Resposta: O Autor informou que não está rodando com o seu automóvel, pois o mesmo está com a luz amarela (chave de boca) acesa no painel, o carro perde força e não consegue trocar de marcha. No entanto, após o teste de rodagem, este perito observou que o veículo estava trocando as marchas, normalmente, sem trepidar e sem perder força. Essa luz amarela (de advertência) continua acesa e indica que o automóvel alcançou a quilometragem ou tempo (o que vencer primeiro), para que seus itens de manutenção programada sejam executados, de acordo com as tabelas de manutenção programada. Essa informação aparece na página 72 do manual do Ford Fiesta. Analisando o código de falha que apareceu no equipamento de diagnóstico ver figura 5), conclui-se que a luz amarela no painel do carro é referente ao corpo de borboleta do veículo (ver figura 6 e 7), que precisa ser substituído. Portanto, esse problema não tem a ver com o sistema de câmbio. (...) 11) Informe o Sr. Perito se o carro em questão New Fiesta apresenta dificuldade no engate de marchas, caso positivo é passível de reparo. Resposta: Após o teste de rodagem, este perito observou que o veículo estava trocando as marchas, normalmente, sem trepidar e sem perder força. (...) 15) Informe o Sr. Perito se o carro tem alteração do tempo de troca das marchas, dificuldade de partida e perda de potência com o uso prolongado do veículo? Resposta: Nenhum destes problemas foi encontrado, durante o teste de rodagem, por 44 (quarenta e quatro) minutos. O automóvel circulou só em asfalto, por 14 (quatorze) quilômetros, com velocidade de até 70 km/h, tendo passado por trânsito lento. Foi verificado que o carro fazia as trocas de marcha, normalmente, sem trepidação e sem perder força. Também não foi identificada dificuldade na partida do veículo. 16) O veículo periciado apresenta algum vício/defeito? Caso apresente, o vício/defeito decorre da tecnologia Powershift? Resposta: Nenhum vício foi apresentado pelo veículo, objeto da lide. A única manutenção necessária é a substituição do o seu corpo de borboleta. Trata-se de uma manutenção normal, em um automóvel que está com 181.749 quilômetros rodados e não tem histórico dessa intervenção. (...) 24) Os problemas apresentados, bem como a utilização da tecnologia Powershift reduzem o valor de mercado do automóvel em comparação com outros que não utilizam a garantia ? Resposta: O veículo, objeto da lide, teve problemas originados na fabricação, com relação à embreagem e ao Módulo de Controle da Transmissão (TCM). No entanto, o automóvel foi reparado e se encontra em condições normais de utilização. As de Garantia oferecidos pela montadora e Requerida FORD MOTOR COMPANY BRASIL. Além disso, a Requerida FANCAR fez a substituição dos 2 (dois) atuadores elétricos, em cortesia comercial para o Autor (conforme O.S nº 171830 e NF nº 104.671, de 06/01/2023). Vale lembrar que esses atuadores não pertenciam ao Programa de Extensão de Garantia – 14M01 (comunicado BTSA 034/15). Sendo assim, esses problemas apresentados e a tecnologia Powershift não influenciam e nem reduzem o valor de mercado do Ford Fiesta, em questão. O valor de referência para o carro, em questão, se encontra na Tabela FIPE. intervenções nessas peças foram realizadas dentro dos 2 (dois) Programas de Extensão.” Logo, tenho que a metodologia e imparcialidade do laudo pericial devem ser reconhecidas e prestigiadas como instrumento fundamental à formação da convicção judicial. A propósito, assim decidiu esta Terceira Câmara: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS – PASEP – PRELIMINAR DE SUSPENSÃO DO FEITO – INAPLICABILIDADE AO CASO – VALORES SUBTRAÍDOS DA CONTA – SUPOSTA MÁ-GESTÃO DE RECURSOS PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA – FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO AUTORAL EVIDENCIADOS – PROVA PERICIAL CONTÁBIL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Não se insere a presente questão submetida a julgamento à ordem de suspensão de processos proferida pelo STJ no Recurso Especial nº 2162222-PE (2024/0292186-1). O laudo pericial, elaborado por perito nomeado pelo juízo, goza de presunção de veracidade, de forma que, inexistindo prova hábil capaz de elidir o seu teor conclusivo, deve ser ele considerado correto e, por conseguinte, homologado em decisão devidamente fundamentada, como no caso dos autos. A manutenção da sentença fundada na conclusão da prova técnica é medida que se impõe, notadamente se ausentes elementos aptos a infirmá-la.” (RAC n.º 1027846-68.2020.8.11.0041, 3ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Dirceu dos Santos, j. 19.03.2025 – destaquei). A propósito, sobre a prova pericial, bem salientou o douto magistrado, verbis: “(...) Dito isto, em prosseguimento, e já adentrando-se ao mérito da lide, propriamente dito, tem-se que o imbróglio instalado entre as partes somente poderia ser dirimido a partir da constatação da existência de vícios/defeitos/problemas no veículo objeto da lide; bem como das causas dos mesmos - a fim de ser apurada a responsabilidade de cada sujeito processual envolvido na demanda. E, para auxiliar o Juízo na busca de tais informações, outro caminho não haveria que ser tomado, senão a produção de prova pericial que, desenvolvida a partir da vistoria in loco e estudos específicos das normas que regem o tema, trouxesse para o processo as informações necessárias para se averiguar os apontamentos deduzidos pelas partes. Em se tratando de ponto controvertido que gira em torno de vício/problema/defeito de fabricação em veículo automotor, é certo que a lide se resolve com prova igualmente técnica - de modo que impertinente a produção de outras provas, bastando os documentos que constam dos autos e a aplicação do Direito; não havendo que se falar em prova oral, sem força para afastar as conclusões tiradas pelo auxiliar do Juízo, a quem é confiada a análise técnica da lide, conforme art. 443, I e II, do CPC. E, nesse ponto, o Perito Judicial foi firme e claro em concluir pela inexistência de vícios/problemas/defeitos no veículo, que pudessem ser atribuídos à responsabilidade da parte requerida. Atente-se: “... é fato que o veículo, em análise, teve problemas originados na fabricação, com relação à embreagem e ao Módulo de Controle da Transmissão (TCM). No entanto, o automóvel foi reparado, sem custo para os proprietários, e se encontra em condições normais de utilização.” Valioso destacar que o laudo pericial evidencia a realização de um trabalho técnico minucioso no veículo vistoriado, trazendo registros fotográficos e detalhamentos explicativos sobre cada ponto apontado. Ademais, todos os quesitos apresentados pelas partes foram detalhadamente respondidos – sem deixar margem para dúvidas ou opiniões pessoais desprovidas de razão lógica e fundamentada de forma técnica. Dito isso, sem delongas, tem-se que a ação não comporta procedência, na medida em que o laudo pericial, elaborado por profissional técnico capacitado, concluiu que os vícios que existiam no veículo já foram totalmente sanados (sem custo para o autor) e o carro está em perfeitas condições de utilização.” (id. 281116446 - negritei). Desse modo, ainda que se inverta o ônus da prova, caberia ao autor o ônus de comprovar, minimamente, o fato constitutivo de seu direito. No caso, a parte apelante não trouxe prova técnica autônoma ou robusta apta a infirmar a conclusão do laudo judicial, ônus do qual, repiso, não se desincumbiu. Sobre a distribuição do ônus da prova, eis a lição de Moacyr Amaral Santos, verbis: “O critério da distribuição do ônus da prova deduzida do ônus da afirmação evoca a antítese entre ação, no sentido lato, e exceção, também no sentido lato, a cujos ônus respectivos se coordena o ônus da afirmação para os fins da prova. O ônus da prova - é útil insistir - é determinado pelo ônus da afirmação, e este, por sua vez, é determinado pelo ônus da demanda, que assume duas posturas diferentes, apresentando-se da parte do autor, como ônus da ação, e da parte do réu como ônus da exceção. (...) Em suma, quem tem o ônus da ação tem o de afirmar e provar os fatos que servem de fundamento à relação jurídica litigiosa; quem tem o ônus da exceção tem o de afirmar e provar os fatos que servem de fundamento a ela. Assim ao autor cumprirá provar os fatos constitutivos, ao réu os impeditivos, extintivos ou modificativos.” (Comentários ao Código de Processo Civil, Ed. Forense, v. IV, p. 33). À vista disso, não basta à parte autora alegar o dano material e moral, mas sim, demonstrar a existência da conduta negligente, ou ainda a falha na prestação do serviço, além do nexo causal entre esta e o dano suportado, motivo pelo qual, sem tal comprovação, não há como acolher a pretensão deduzida na peça de ingresso. É cediço que o ônus da prova é regra fundamental em nosso Estado Democrático de Direito, que atrai para a parte autora o encargo de provar de forma robusta suas alegações, ônus este do qual não se libertou, já que não demonstrou concretamente o alegado, razão pela qual não há que se falar na responsabilização das apeladas seja a título de dano material ou moral. Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial, verbis: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REDIBITÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS E DANO MORAL – AQUISIÇÃO DE VEÍCULO USADO – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE VÍCIO OCULTO NO MOMENTO DA AQUISIÇÃO – INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 333, I DO CPC/1973 - DESGASTE DECORRENTE DO TEMPO DE USO DO BEM – FALTA DE CAUTELA DO CONSUMIDOR – AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO – RECURSO DESPROVIDO. A ausência de demonstração pelo autor de que veículo usado foi vendido com vício oculto no motor (artigo 333, I do CPC/1973), acarreta a improcedência do pedido de indenização por dano material consistentes na restituição dos reparos mecânicos realizados. Com a inexistência de ato ilícito, bem como, ausência de abalo subjetivo, fica afastada a indenização por dano moral.” (TJMT, RAC n. 0001928-68.2009.8.11.0040, 1ª Câm. Dir. Priv., Rela. Desa. Nilza Maria Pôssas de Carvalho, j. 19.09.2017 – negritei). “APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE PERDAS E DANOS C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER. Ausência de prova dos fatos constitutivos dos direitos da autora, como prevê o art. 373, I, do CPC. Aquisição de veículo com 10 anos de uso, em que o desgaste natural das peças se insere no plano dos riscos inerentes à própria natureza do negócio realizado. Vício oculto em veículo usado. Inocorrência. APELO DESPROVIDO.” (TJRS, RAC n. 70081298762, 11ª Câm. Cív., Rel. Des. Bayard Ney de Freitas Barcellos, j. 16.12.2020 – negritei). Assim, ante a não comprovação da existência de ato ilícito apto a ensejar a condenação por dano moral, nos termos dos arts. 186 e 927, ambos do Código Civil, tenho que a manutenção da r. sentença é medida que se impõe. Portanto, por estes termos e estribado nessas razões, tenho que a r. sentença está em consonância com a legislação pátria, doutrina e jurisprudência, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos. De outra banda, estando desprovido o recurso do apelante, majoro a condenação em honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, atendendo ao que dispõe o art. 85, §11, do CPC, devendo ser observado o quanto disposto no art. 98, §3º, do mesmo codex. Posto isso, conheço do recurso e lhe NEGO PROVIMENTO. Cuiabá, 21 de maio de 2025. CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 21/05/2025

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