Processo nº 5000278-85.2011.4.04.7014
ID: 331362107
Tribunal: TRF4
Órgão: 11ª Vara Federal de Curitiba
Classe: CUMPRIMENTO DE SENTENçA
Nº Processo: 5000278-85.2011.4.04.7014
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Advogados:
MARTIM FRANCISCO RIBAS
OAB/PR XXXXXX
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MARILICE PERAZZOLI COLLIN
OAB/PR XXXXXX
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GABRIEL WIESE PEROTTI
OAB/PR XXXXXX
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LUCAS WINTER
OAB/PR XXXXXX
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CUMPRIMENTO DE SENTENÇA Nº 5000278-85.2011.4.04.7014/PR
REPRESENTANTE LEGAL DO EXECUTADO
: JULIANE PIGATTO WIESE PEROTTI (Sucessor)
ADVOGADO(A)
: GABRIEL WIESE PEROTTI (OAB PR103834)
ADVOGADO(A)
: L…
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA Nº 5000278-85.2011.4.04.7014/PR
REPRESENTANTE LEGAL DO EXECUTADO
: JULIANE PIGATTO WIESE PEROTTI (Sucessor)
ADVOGADO(A)
: GABRIEL WIESE PEROTTI (OAB PR103834)
ADVOGADO(A)
: LUCAS WINTER (OAB PR110641)
REPRESENTANTE LEGAL DO EXECUTADO
: CIRENE PIGATTO WIESE (Sucessor)
ADVOGADO(A)
: GABRIEL WIESE PEROTTI (OAB PR103834)
ADVOGADO(A)
: LUCAS WINTER (OAB PR110641)
EXECUTADO
: MADEIREIRA PINHALAO S A IND E COM
ADVOGADO(A)
: MARILICE PERAZZOLI COLLIN (OAB PR035505)
EXECUTADO
: FRANCISCO PIGATTO NETO
ADVOGADO(A)
: MARTIM FRANCISCO RIBAS (OAB PR014028)
EXECUTADO
: ALTAIR WIESE (Sucessão)
ADVOGADO(A)
: MARTIM FRANCISCO RIBAS (OAB PR014028)
EXECUTADO
: AGROFLORESTA BAPTISTA PIGATTO S/A
ADVOGADO(A)
: MARILICE PERAZZOLI COLLIN (OAB PR035505)
DESPACHO/DECISÃO
I - RELATÓRIO
1.1. Relatório do processo de conhecimento:
Em 26 de abril de 2011, o IBAMA deflagrou a presente ação civil pública em face das empresas AGROFLORESTAL BAPTISTA PIGATTO S/A, MADEIREIRA PINHALÃO S/A IND. E COMÉRCIO, VIMADE – VITÓRIA INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE MADEIRAS LTD.,
ALTAIR WIESE
, ANTÔNIO ILSON PIGAT
TO,
FRANCISCO PIGATTO NETO
,
pretendendo a condenação dos requeridos
"a apresentarem laudo ambiental ao Juízo a cada seis meses para demonstração do cumprimento da recuperação do meio ambiente degradado, elaborado por técnico habilitado, laudo este que deverá ser submetido à aprovação do IBAMA, sob pena de pagamento de multa diária pelo descumprimento do prazo de entrega, bem como pela caracterização da não adequada recuperação do ambiente."
Postulou a condenação dos demandados à reparação de
"danos morais, em valor a ser arbitrado pelo juízo, cujo montante deve ser aplicado em projeto ambiental desenvolvido por entidade pública ou privada de preservação da flora e/ou fauna dentro do Estado do Paraná, por meio da transferência direta dos recursos pela parte Ré à entidade, com prévia análise do IBAMA, que terá o direito de rejeitar a indicação feita pela parte, desde que de maneira fundamentada. Ainda, a entidade que receber recursos deverá comprovar, também em juízo, a efetiva aplicação do dinheiro em ações de recuperação, melhoria e conservação da fauna e/ou da flora no Estado do Paraná."
Transcrevo o relatório promovido na sentença de movimento 105 deste eproc:
"A primeira requerida (Agroflorestal Baptista Pigatto S/A) foi autuada em 02/08/2003 pelos seguintes ilícitos: a) Auto 271.536 - D: destruir 24,72 hectares de floresta nativa (corte raso), envolvendo espécies em fase de extinção (imbuia e xaxim) objeto de especial preservação; aplicada multa, no montante de R$ 37.500,00 e embargada a área; b) Auto 260.463 - D: provocar incêndio em 24,72 hectares sem autorização do órgão ambiental competente; aplicada multa no montante de R$ 37.500,00. Segundo alega o IBAMA, houve plantio de pinus na área desmatada. A primeira requerida apresentou defesa administrativa - rejeitada - e Projeto de Recuperação dos Danos, mas não o cumpriu, tampouco quis assinar Termo de Compromisso de Recuperação de Área Degradada."
Ademais,
"A primeira requerida seria a responsável direta pelos danos ambientais, mas, tendo encerrado as atividades irregularmente, necessária a desconsideração da personalidade jurídica e atribuição de responsabilidade solidária aos diretores:
Altair Wiese
, Francisco Pigatto e Antônio Ilson Pigatto. O imóvel onde ocorreu a degradação ambiental pertence aos três réus pessoas jurídicas, sendo eles também solidariamente responsáveis pelos danos ambientais. Afirmou que a área degradada está localizada no Bioma Mata Atlântica. Disse que, embora a legislação da época permitisse a exploração seletiva, desde que observada uma série de requisitos, o primeiro réu não tinha autorização para exploração, bem como efetuou corte raso e ateou fogo na área."
Além disso,
"a petição inicial aponta violação a diversos dispositivos da Lei 9.605/98, do decreto regulamentador, e do Código Florestal. Requereu antecipação de tutela e, ao final: - desconsideração da personalidade jurídica da empresa Agroflorestal Baptista Pigatto S/A, com a condenação solidária dos respectivos diretores; - condenação dos co-proprietários a recuperar integralmente a área degradada; - condenação do réu à apresentação de laudos ambientais semestrais para comprovação do cumprimento da recuperação da área; - condenação do requerido ao pagamento de indenização por dano moral coletivo."
Na sequência,
"foi concedida antecipação da tutela nos seguintes termos: [...] determinar que o réu imediatamente desocupe as áreas degradas, protegendo-as contra a intervenção de terceiros e ocupação por animais que possam comprometer a sua recuperação, devendo impedir qualquer contato da área com o fogo, assim referidas nos autos de infração n.º 271536-D e 260463-D, lavrados pelo IBAMA, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 200,00 (duzentos reais). Determino, de ofício, que seja averbada à margem da matrícula n. 631, do Registro de Imóveis da 1ª Circunscrição de União da Vitória, a existência da Ação Civil Pública em questão, a fim de salvaguardar interesses de terceiros."
Na mesma decisão,
"foi o IBAMA incumbido de fiscalizar o cumprimento das determinações da antecipação de tutela. Intimado, o Instituto Ambiental do Paraná manifestou ausência de interesse de ingresso no pólo ativo da demanda (evento 9). Manifestação do MPF de atuar apenas como custus legis (10). Agravada a decisão que deferiu parcialmente a antecipação de tutela, restou mantida pelo e. TRF/4, conforme evento 28. Tendo o réu Antônio Ilson Pigatto falecido em 1997, o IBAMA requereu a exclusão dele do pólo passivo."
Ainda nos termos do relatório veiculado na sentença de movimento 105,
"a decisão do evento 35 excluiu do pólo passivo o réu Antônio Ilson Pigatto, por ilegitimidade passiva, tendo em vista ter falecido antes da lavratura do auto de infração. Os réus Agroflorestal Baptista Pigatto e Madeireira Pinhalão apresentaram contestação no evento 45. Alegaram: - preliminarmente: a) ilegitimidade do Ministério Público Federal para atuar neste feito, pois o IBAMA teria enviado comunicação ao Ministério Público Estadual apontando suposto cometimento de crime ambiental; b) ausência de interesse processual, pois somente não assinou o Termo de Compromisso porque continha erros não sanados pelo IBAMA; c) inépcia da inicial, pois não comprovados os danos ambientais (ausência de laudo técnico e superficialidade do laudo de constatação); d) inviabilidade da cumulação de pedidos de obrigação de fazer e pagar em ação civil pública, por conta do disposto no art. 3º da Lei 7.347/85; - no mérito: a) ausência de prova do dano ambiental e nexo de causalidade entre a conduta dos réus e o dano; b) inexistência de dano moral; c) inviabilidade de inversão do ônus da prova; d) que os servidores do IBAMA que lavraram os autos de infração não poderiam exercer a função de fiscalização, bem como pertencem ao quadro de funcionários de Estado diverso daquele onde ocorreu o dano, não tendo, por isso, jurisdição; e) que não houve encerramento irregular das atividades; f) que o pedido de parcelamento das multas resultantes dos autos de infração representa boa-fé; g) que a propriedade possui área preservada acima da obrigatoriedade."
D'outro tanto,
"
Altair Wiese
,
Francisco Pigatto Neto
e Espólio de Antônio Ilson Pigatto contestaram no evento 48. Alegaram: - preliminarmente: a) carência de ação, pois a Agroflorestal Batista Pigatto não assinou o termo de recuperação de área degradada apenas porque este continha erros na identificação da empresa, os quais não foram sanados pelo IBAMA; b) ilegitimidade passiva do réu
Francisco Pigatto Neto
, pois este teria se afastado da diretoria da empresa em 1996, antes da lavratura do auto de infração, em 2003; c) ilegitimidade passiva do réu
Antonio Ilson Pigatto
, pois o mesmo faleceu em 1997, antes da lavratura do auto de infração; c) ilegitimidade passiva do réu
Altair Wiese
, pois, embora fosse diretor da empresa, sequer conhece a área onde ocorreu o fato; - no mérito: que o local onde houve o suposto dano ambiental era área em estágio inicial de regeneração, como predominância da espécie bracatinga; que o incêndio começou em uma fazenda vizinha e se alastrou até a propriedade das empresas requeridas. A decisão do evento 52 declarou a revelia da ré Vimade - Vitória Industrial e Comércio de Madeiras Ltda, não induzindo, contudo, os efeitos do art. 319 do CPC, ante a pluralidade de réus e contestações por eles apresentadas. Instadas, as partes não requereram a produção de outras provas, conforme decisão do evento 67. Agravo retido dos réus Agroflorestal Baptista Pigatto e Madeireira Pinhalão processado nos eventos 80, 94, 96 e 103. Manifestação do IBAMA no evento 95."
Foi prolatada sentença, como o seguinte dispositivo:
"Diante do exposto: I - julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, nos termos do inciso VI do art. 267 do CPC, em relação aos réus
Antonio Ilson Pigatto
e
Francisco Pigatto Neto
, em face da ilegitimidade passiva;
II - resolvo o mérito, nos temos do inciso I do art. 269 do CPC,
julgando parcialmente procedente
o pedido, para:
- reconhecer a responsabilidade solidária dos réus Agroflorestal Baptista Pigatto S/A, Madeireira Pinhalão S/A Indústria e Comércio, Vimade-Vitória Indústria e Comércio de Madeira Ltda, e
Altair Wiese
, este último em face da desconsideração da personalidade jurídica da primeira ré;
- condenar os réus, solidariamente, à reparação dos danos ambientais, mediante: a) apresentação de projeto de recuperação ambiental, a ser submetido diretamente ao IBAMA, no prazo de
3 (três) meses a contar da intimação da sentença, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento
; b) implementação da recuperação prevista em tal projeto, comprovando-a anualmente ao IBAMA, por meio de laudo técnico, sob pena de pagamento de R$ 100,00 (cem reais) diários por falta de iniciativa ou inadequado procedimento de recuperação, bem como multa de R$ 50,00 (cinquenta reais) diários por ausência de apresentação do referido laudo; c)
pagamento de indenização por danos materiais ambientais, ora arbitrado em de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), cuja maior gravidade poderá ser comprovada em liquidação de sentença
.
Ficam mantidos todos os embargos de atividades determinados administrativamente. Condeno, ainda, o réu ao pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 20 do CPC.
Mantenho a antecipação da tutela, à qual adiciono o imediato corte das árvores de pinus, corte esse que será executado pelo réu, o qual deverá entregar a madeira ao IBAMA para que este a destine conforme a legislação ambiental. O réu terá o prazo de 60 (sessenta) dias a contar da intimação da sentença para cumprir tal determinação, sob pena de multa de R$ 200,00 (duzentos reais) por dia. Ficam mantidas as multas aplicadas pelo descumprimento das determinações da antecipação de tutela originariamente deferida
."
As empresas Agroflorestal Baptista Pigatto S/A e Madeireira Pinhalão S/A – Indústria e Comércio opuseram embargos declaratórios, rejeitados pelo Juízo - evento 118. Seguiram-se apelações, apreciadas pelo Tribunal Regional da 4 Região, nos termos seguintes:
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA EXTRA PETITA - PRELIMINARAES AFASTADAS. DANOS MORAIS COLETIVOS - AFASTAMENTO.
1. Não procede a alegação de cerceamento de defesa por parte dos réus, tendo em vista que restou provado que o magistrado
a quo
oportunizou a produção de provas no momento próprio da instrução do processo. Da mesma forma, não procede a alegação de sentença prolatada além dos limites da lide, pois a condenação se deu especificada para atender ao objeto da inicial de reparação eficiente dos danos ambientais comprovadamente causados.
2. Não procede o pedido do IBAMA de arbitramento de danos morais pela degradação ambiental causada pelos réus, tendo em vista que o abalo não se verificou na comunidade local, cingindo-se ao imóvel rural.
Desse modo, a sentença foi mantida pelo Tribunal. Ao apreciar embargos declaratórios, o Colegiado Recusal deliberou
"1. São pré-requisitos autorizadores dos embargos de declaração a omissão, contradição ou obscuridade na decisão embargada. Também a jurisprudência os admite para a correção de erro material e para fim de prequestionamento. 2. Os embargos não constituem via própria para fazer prevalecer tese jurídica diferente da que foi acolhida no acórdão quando, em sua essência e finalidade, não se dirigem à omissão ou outro vício, mas a novo julgamento de mérito. 3. Constatada a omissão, supre-se para fins de fazer constar no dispositivo a negativa de provimento ao agravo retido e à apelação."
Foram interpostos recursos de caráter extraordinário (REsp e RE). O procesamento de ambos os recursos foi deferido pelo TRF4. Perante o STJ, foi distribuído o REsp 1.597.754/RS. Em deliberação monocrática, o recurso foi apreciado como segue:
"Ante o exposto, com base no art. 255, § 4º, I, do RISTJ, NÃO CONHEÇO do recurso especial dos particulares e, com fulcro nos incisos I e II, do mesmo dispositivo do RISTJ, CONHEÇO PARCIALMENTE do recurso especial do IBAMA e, nessa extensão, NEGO-LHE PROVIMENTO. Sem majoração da verba honorária (art. 85, § 11, do CPC/2015), em razão do disposto no Enunciado Administrativo n. 7 do STJ."
Seguiu-se a interposição de agravo interno no REsp 1.597.754/RS, rejeitado pelo STJ. O recurso extraordinário foi autuado perante a Suprema Corte como RE 1.310.319/PR. O STF determinou, então, o seguinte: "
Ex positis, determino a devolução dos autos à Corte de origem para que adote, conforme a situação do(s) referido(s) tema(s) de repercussão geral, os procedimentos previstos nos incisos I a III do artigo 1.030 do Código de Processo Civil (alínea c do inciso V do art. 13 do Regimento Interno doSupremoTribunalFederal)."
Por conta disso, no movimento 95 dos autos de apelação, o TRF4 reformou o juízo de admissibilidade do recurso, indeferindo o seu processamento. A decisão transitou em julgado.
1.2. Relatório do cumprimento de sentença:
No movimento 167 deste eproc, o IBAMA deflagrou o cumprimento da sentença transitada em julgado. Quanto à obrigação de prestar serviço, a autarquia sustentou:
"Consoante consta na sentença, confirmada em grau recursal, aos réus foi
solidariamente
imposta a obrigação de fazer consistente na apresentação de projeto de recuperação ambiental, a ser submetido diretamente ao IBAMA, no prazo de 3 (três) meses a contar da intimação da sentença, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento. Dessa forma, devem os réus serem intimados para que cumpram a obrigação de fazer imposta, qual seja, recuperação da área mediante a apresentação de PRAD no prazo de 30 dias. Requer, ainda, seja majorada a multa diária que já está incidindo desde 14/06/2013 (3 meses após a intimação da sentença), uma vez que não houve a apresentação do referido PRAD."
Quanto à obrigação de reparar danos morais coletivos, o IBAMA postulou a
"intimação dos devedores para que efetuem o pagamento espontâneo do débito,
o qual perfaz a quantia de R$ 49.742,65
(atualizado até 03/2022), sob pena de aplicação de multa de 10% sobre o montante da condenação e mais 10% de honorários advocatícios, segundo dispõe o art. 523 do CPC e Súmula 517 do STJ. Destaca-se que os referidos valores deverão ser atualizados até a data do depósito, o qual deverá ocorrer em contas judiciais DJE - OPERAÇÃO 635 separadas (uma conta para os honorários de sucumbência e outra para a indenização), a fim de possibilitar a posterior conversão em renda."
Quanto à multa cominada na deliberação liminar, o IBAMA sustentou:
"Pelos relatórios do IBAMA datados de 08/03/2012 e 09/05/2015, anexados respectivamente no evento 95 destes autos e evento 09 dos autos de apelação, não consta o descumprimento da liminar pelos réus. Assim, por hora, não há causa que justifique a cobrança da referida multa."
Quanto à multa cominada por conta de eventual corte de árvores, a autarquia disse que
"conforme laudo acostado no evento 09 dos autos de apelação, os réus efetuaram o corte das árvores, mas não as entregaram ao IBAMA. Dessa forma, deve ser calculada a multa diária de R$ 200,00 entre 14/05/2013 (60 dias após a intimação da sentença, ocorrido em 14/03/2013 - evento 114) e até 09/05/2015, data em que constatado o corte das árvores pelo IBAMA; salvo a comprovação dos réus de que efetuaram o cumprimento da decisão em data anterior."
Quanto à multa por ausência de elaboração e apresentação do PRAD, enfatizou
"Consoante consta no dispositivo da sentença, confirmada em grau recursal, aos réus foi
solidariamente
imposta a obrigação de fazer consistente na apresentação de projeto de recuperação ambiental, a ser submetido diretamente ao IBAMA, no prazo de 3 (três) meses a contar da intimação da sentença, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento. Assim, diante da ausência de notícias acerca da apresentação do PRAD até o presente momento, a multa diária de R$ 100,00 está incidindo desde 14/06/2013 (3 meses após a intimação da sentença, ocorrido em 14/03/2013 - evento 114)."
No que tocava à apuração de danos de maior gravidade, alegou ser necessária a liquidação de sentença:
"A sentença condenou os réus
solidariamente
ao pagamento de indenização por danos materiais ambientais, ora arbitrado em de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), cuja maior gravidade poderá ser comprovada em liquidação de sentença. Dessa forma, necessária a instauração do procedimento de liquidação de sentença, a fim de apurar a real extensão dos danos ambientais na área. Entretanto, para subsidiar o referido procedimento foram solicitadas à área técnica da autarquia informações sobre a extensão do dano ambiental."
Por fim, quanto à ausência de entrega de árvores, destacou:
"Como já visto, a sentença determinou aos réus o imediato corte das árvores de pinus no prazo de 60 dias a contar da intimação da sentença, com a entrega ao IBAMA, sob pena de multa diaria de R$ 200,00. Todavia, conforme laudo acostado no evento 09 dos autos de apelação, os réus efetuaram o corte das árvores, mas não as entregaram ao IBAMA. Assim, imperiosa a conversão da referida obrigação em perdas e danos, sob pena de enriqueicmento ilícito, que também deve ser apurada em liquidação de sentença. Do mesmo modo, para subsidiar o referido procedimento foram solicitadas à área técnica da autarquia informações sobre o valor comercial das referidas árvores e/ou o proveito econômico obtido pelos réus."
A demanda foi redistribuída perante a 19.VF de Curitiba, ao que determinou-se sua restituição à origem - evento 173. A causa foi encaminhada, então, ao Juízo Substituto da 1.VF da Subseção de União da Vitória. Na sequência, o IBAMA postulou a habilitação dos sucessores dos requeridos: JULIANE PIGATTO WIESE,
Kleber Pigatto Wiese
e
Cirene Pigatto Wiese
. No evento 182, o Juízo de origem despachou:
"O IBAMA informou a inexistência da abertura do inventário e postulou a habilitação dos sucessores JULIANA PIGATTO WIESE,
KLEBER PIGATTO WIESE
e
CIRENE PIGATTO WIESE
, apresentando a certidão de óbito do executado
ALTAIR WIESE
, onde se demonstra que as pessoas acima indicadas são seus herdeiros para fins de sucessão processual (evento 180). Desta forma, retifique-se a autuação para que passe a constar no polo passivo
ALTAIR WIESE
-Sucessão, representado pelos sucessores acima indicados."
No movimento 192, o IBAMA enfatizou não ter havido apresentação de PRAD quanto à recuperação da área em questão, descumprindo-se com isso a sentença transitada em julgado. Destacou:
"Quanto a informação sobre apresentação/execução de PRAD na área e a natureza da cobertura vegetal presente, apura-se da Ficha de campo_Altair_Wiese (13454500) (SEI nº 14606536) que a Técnica de recuperação verificada em campo é "passiva" (ítem 3 da ficha- TÉCNICAS(s) de recuperação); ou seja, a vegetação que ocorre na área é derivada de regeneração natural sem execução de PRAD, sendo que a técnica de restauração passiva foi julgada inadequada pela equipe que vistoriou o local a qual concluiu que "A área vistoriada encontra-se em estágio inicial de recuperação com baixa riqueza de espécies, e com ocupação residual de pinus. Presença significativa de espécie hiperdominante (taquara). O interessado deverá promover o enriquecimento com espécies zoocóricas e secundárias, bem como a retirada ou anelamento das exóticas residuais.""
Reportou-se à Informação Técnica nº 36/2022-Nubio-PR/Ditec-PR/Supes-PR. Disse ainda que,
"por meio da Informação Técnica nº 2/2023-Nubio-PR/Ditec-PR/Supes-PR, restou confirmado que o valor dos danos ambientais é de no mínimo R$ 438.611,17: Quanto a Valoração do dano: Tanto na Ficha de campo quanto no Relatório consta que " O interessado deverá promover o enriquecimento com espécies zoocóricas e secundárias, bem como a retirada ou anelamento das exóticas residuais"; ou seja verificou-se em campo a necessidade da adoção de técnica de plantio de mudas para promoção do enriquecimento com espécies secundárias e zoocóricas; diante de tal informação a valoração obtida conforme Informação Técnica 36 (SEI nº 12984602) a ser considerada é R$ 438.611,16. Por fim, o valor comercial/proveito econômico obtido pelos réus com o corte e a venda das árvores de pinus foi apurado em R$ 1.232.025,00, sendo que estimou-se a produtividade e redimento do plantio utilizando-se o programa da EMBRAPA "sispinus" e para o cálculo do valor do produto foi utilizada a tabela da SEAB, com preços oficiais de mercado, consoante consignado na Informação Técnica nº 36/2022-Nubio-PR/Ditec-PR/Supes-PR."
No evento 193, encontram-se documentos alusivos à situação da área em questão. As sucessoras JULIANE PIGATTO WIESE e
CIRENE PIGATTO WIESE
constituíram advogado(a) no processo, conforme evento 196. A citação de
KLEBER PIGATTO WIESE
foi documentada no evento 197.
A causa foi redistribuída perante esta unidade jurisdicional, ao que seguiu-se despacho no evento 202, declarando a competênica do Juízo e equacionamento vetores a respeito do cumprimento de sentença. No evento 211, o IBAMA sustentou o seguinte:
"Conforme Informação Técnica nº 36/2022-Nubio-PR/Ditec-PR/Supes-PR restou comprovado que o valor dos danos ambientais é de no mínimo R$ 438.611,17; portanto, muito superior aquele inicalmente previsto na sentença. Assim, apurardo pela área técnica do IBAMA a ocorrência de dano de maior gravidade, este deverá ser o valor a ser objeto de execução em substituição aquele apontada na sentença; o qual, contudo, deverá ser apurado em procedimento de liquidação de sentença, conforme determinação judicial."
A fim de evitar tumulto processual e considerando que as pretensões executórias são distintas e requerem procedimentos específicos, requereu que fosse processado nesse eproc
"apenas o cumprimento de sentença relativo a obrigação de fazer (reparação do dano ambiental);
autuando-se em apartado um procedimento para a liquidação de sentença, outro para o cumprimento de sentença relativo aos honorários de sucumbência e outro para a apuração e execução das multas devidas pelos réus
."
Francisco Pigatto Neto
alegou, no evento 215, que
"Embora não faça parte da Diretoria da empresa Ré destes Autos Agroflorestal Baptista Pigatto, o ora manifestante reporta-se aos fatos no sentido de que tem conhecimento de que o PRAD foi implantado na área. Para tal, a fim de dar cumprimento à ordem judicial da qual foi intimado, junta em anexo o comprovante do protocolo do PRAD perante o IBAMA, de modo que desde logo demonstra estar satisfeita esta ordem judicial."
No movimento 220, o IBAMA alegou não ter havido recuperação da área em questão.
"Em relação a situação da área degrada, o IBAMA realizou vistoria em 17/08/2022 concluindo que não houve a recuperação ambiental, conforme Relatório de Vistoria nº 26/2022-Nubio-PR/Ditec-PR/Supes-PR (ev. 192/193)."
No movimento 221, o MPF juntou parecer enfatizando que
"Com razão o IBAMA. O PRAD juntado ao evento 215, OUT2, expressamente identifica sua elaboração em março de 2010. Trata-se de idêntico projeto que já fora apresentado pela executada Agroflorestal Baptista Pigatto S/A anteriormente, inclusive juntado pelo IBAMA no evento 1, PROCADM4, em anexo à petição inicial, além de apreciação pela sentença. A absoluta negligência na conduta das partes executadas, que, intimadas para apresentar NOVO PRAD, apresentaram documento do ano de 2010, beira à litigância de má fé (art. 80, CPC). Veja-se que há relatório de vistoria de 2022 (eventos 192 e 193), e o IBAMA destacou que não houve apresentação de PRAD pelos réus na esfera administrativa. Ante o exposto, o Ministério Público Federal, em complemento aos requerimentos do IBAMA, requer seja majorada a multa diária já arbitrada na sentença, nos termos da decisão de evento 202, em razão da grave negligência no cumprimento da obrigação de fazer, bem como nova intimação para apresentação de novo PRAD."
Os autos vieram conclusos.
II - FUNDAMENTAÇÃO
A fim de sanear a situação deste processo, retomo alguns tópicos equacionados no despacho de movimento 202, complementando-o.
2.1. Competência da Justiça Federal:
A presente demanda submete-se à alçada da Justiça Federal, conforme art. 109, I, Constituição e art. 10 da lei n. 5.010/66, dado versar sobre pretensão deduzida pelo IBAMA, autarquia federal criada por força do art. 2. da lei n. 7.735, de 22 de fevereiro de 1989.
2.2. Competência deste Juízo:
Anoto que o presente cumprimento de sentença submeter-se-ia, em princípio, à alçada do Juízo Substituto da 1. Vara Federal da Subseção de União da Vitória, responsável pela prolação da sentença, por
força do
art. 516, II, Código de Processo Civil/15
.
A demanda restou redistribuída perante este Juízo Substituto da 11.VF da Subseção de Curitiba, por força da
resolução nº 258, de 01/12/2022, do Tribunal Regional da 4. Região
, medida que não chegou a ser impugnada pelas partes. Por conta do exposto, declaro a competência desta unidade jurisdicional para processo e julgamento deste cumprimento de sentença.
2.3.
Conexão processual - considerações gerais:
O processualista Bruno S. Dantas enfatiza que
"
com o início de vigência do CPC/2015, será considerado prevento o juízo perante o qual houver ocorrido o registro ou a distribuição (conforme o caso) da primeira de uma série de demandas conexas, ainda que tal registro ou distribuição tenha ocorrido durante a vigência do CPC/1973
. Desde que a prevenção, ela própria, não se tenha consumado sob a égide do CPC/1973 (por um dos alternativos critérios previstos nos seus arts. 106 e 2019), incidirá de plano o disposto no art. 59 da codificação de 2015 definindo-se o juízo prevento para um conjunto de demandas conexas pela anterioridade dos registros ou das distribuições (conforme o caso) das mesmas. Os arts. 60 e 61 do CPC/2015, por sua vez, praticamente repetem os arts. 107 e 108 do CPC/1973, dispensando, por tal razão, maiores comentários a respeito nesta oportunidade."
(DANTAS, B. S.
in
WAMBIER, Teresa A. Alvim et al.
Breves comentários ao novo código de processo civil.
SP: RT, 2015, p. 229).
Convém ter em conta a lição de Araken de Assis, sobre o tema:
"(...)
O art. 55, caput, definiu a conexão como a identidade de pedido ou de causa inspirado no propósito de erradicar as tergiversações constatadas na vigência do CPC de 1939. A proposição legislativa, excepcional no direito estrangeiro, porque prepondera a tendência de encarregar o órgão judicial de indicar os casos do fenômeno, consonante controvérsia haurida do direito comum, e feita em sentido oposto à do CPC de 1939, em todo caso revela-se incompleta e insuficiente. Não abrange a totalidade das hipóteses de conexão
. O art. 55, § 3.º (“… mesmo sem conexão entre eles”) alude à conexão em sentido estrito do art. 55, caput. Ao nosso ver, os vínculos que geram o risco da prolação de “decisões conflitantes ou contraditórias”, a teor do art. 55, § 3.º, inserem-se na rubrica da conexão em sentido amplo. Não há outro sítio adequado para situar o liame entre os objetos litigiosos
O art. 113 do NCPC, arrolando os casos em que se admite a demanda conjunta, ou litisconsórcio, demonstra que existem outros laços, mais tênues e distantes, que autorizam o processo cumulativo. E a outro juízo não se chega ao avaliar o nexo exigido pelo art. 343 na reconvenção, como ocorria no direito anterior. Retira-se, daí, segura conclusão
. As duas hipóteses descritas no art. 55, caput – identidade de causa ou identidade de pedido – constituem “uma, entre as várias em que ocorre a conexão”. Por isso, antes do CPC de 1939, descreveu-se a conexão como “laço envolvente, que se insinua por entre as relações jurídicas, ora prendendo-as de um modo indissolúvel, por forma a exigir uma única decisão; ora criando entre elas pontos de contato mais ou menos íntimo, que aconselham a reunião em um só processo, ainda quando possam ser decididas separadamente, sem maior dano, a não ser a lentidão e o gravame de maiores despesas”.
Exemplos de causas conexas, segundo a literalidade do art. 55, caput: (a) A reivindica o imóvel x perante B, e, paralelamente, C também reivindica o imóvel x, do mesmo réu, hipótese em que a identidade recai sobre o pedido (objeto) mediato; (b) o locatário A propõe consignatória dos aluguéis perante o locador B, o qual, de seu turno, propõe ação de despejo, fundada no inadimplemento dos aluguéis, perante o inquilino.
Para os efeitos da modificação da competência, as hipóteses contempladas no art. 55, caput – identidade de causa de pedir ou identidade de pedido –, então, ainda consideram-se exemplificativas. Um laço menos intenso já serve para reunir os processos. O objetivo da regra reside em evitar decisões conflitantes, “por isso a indagação sobre o objeto ou a causa de pedir, que o artigo por primeiro quer que seja comum, deve ser entendida em termos, não se exigindo a perfeita identidade, senão que haja um liame que os faça passíveis de decisão unificada”. Em outra oportunidade, reiterou-se que “não é necessário que se cuide de causas idênticas (quanto aos fundamentos e ao objeto {rectius: pedido})”, bastando “que as ações sejam análogas, semelhantes”, insistiu no “escopo da junção das demandas para um único julgamento é a mera possibilidade da superveniência de julgamentos discrepantes
”.
Por conseguinte, a jurisprudência, atendendo às finalidades da modificação da competência, em que a derrogação das regras gerais se justifica pela economia de atividade e pela erradicação do risco de julgamentos conflitantes, rejeita a exigência de identidade absoluta de causa ou de pedido, aceitando simples analogia entre as ações
. Porém, preocupa-se com o risco de julgamentos contraditórios, evento apurado caso a caso, mas verificado em todas as hipóteses do art. 113, inclusive na afinidade de ponto comum de direito ou de fato (inc. III). Ora, parece difícil visualizar semelhante risco no cúmulo simples de pedidos, em que há total autonomia das pretensões deduzidas, no mesmo processo, contra o réu. Por isso, o intuito de erradicar pronunciamentos conflitantes não oferece a única e constante justificativa para o processo cumulativo e, muito menos, a prorrogação da competência. Ao menos na conexão subjetiva, no caso da cumulação simples de pedidos, impera o princípio da economia processual. E, de toda sorte, as finalidades visadas no processo cumulativo, e na reunião de causas inicialmente autônomas, mostram-se estranhas à verdadeira causa desses fenômenos, que residiria no vínculo entre partes, causa e pedido." (ASSIS, Araken.
Processo civil brasileiro.
Volume I. São Paulo: RT, 2015, tópico 302)
Deve-se aferir, ademais, a eventual aplicação do art. 55, §1º, parte final, CPC/15:
"Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta,
salvo se um deles já houver sido sentenciado
."
Semelhante é o conteúdo da mencionada súmula 235, STJ:
"
A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado
."
2.4. Eventual conexão - caso em exame:
No presente caso, a demanda encontra-se em fase de cumprimento de sentença, de modo que eventual conexão com outras demandas não ensejaria a reunião dos autos para solução conjunta, diante do disposto no art. 55, §1, Código de Processo Civil, e súmula 235, Superior Tribunal de Justiça.
2.5. Respeito à coisa julgada - considerações gerais:
Como sabido, a coisa julgada é assegurada constitucionalmente, na forma do art. 5, XXXVI, Lei Maior/88, enquanto projeção da garantia da segurança jurídica. Eventual sentença transitada em julgada em regra não pode ser alterada pelo Juízo e tampouco pela parte atingida, salvo eventual celebração de acordo com a parte reconhecida como credora na decisão (lógica, por exemplo, do art. 190, CPC).
"A sentença de mérito transitada em julgado só pode ser desconstituída mediante ajuizamento de específica ação autônoma de impugnação (ação rescisória) que
haja sido proposta na fluência do prazo decadencial previsto em lei
, pois, com o exaurimento de referido lapso temporal,
estar-se-á diante da coisa soberanamente julgada, insuscetível de ulterior modificação, ainda que o ato sentencial encontre fundamento em legislação que, em momento posterior, tenha sido declarada inconstitucional pelo STF, quer em sede de controle abstrato, quer no âmbito de fiscalização incidental de constitucionalidade
. A superveniência de decisão do STF, declaratória de inconstitucionalidade de diploma normativo utilizado como fundamento do título judicial questionado, ainda que impregnada de eficácia ex tunc - como sucede, ordinariamente, com os julgamentos proferidos em sede de fiscalização concentrada (RTJ 87/758 - RTJ 164/506-509 - RTJ 201/765) -, não se revela apta, só por si, a desconstituir a autoridade da coisa julgada, que traduz, em nosso sistema jurídico, limite insuperável à força retroativa resultante dos pronunciamentos que emanam, in abstracto, da Suprema Corte." (RE 592.912-AgR, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 3-4-2012, Segunda Turma, DJE de 22-11-2012.)
Atente-se também para a lição de Humberto Theodoro Jr.:
"A coisa julgada é fenômeno próprio do processo de conhecimento, cuja sentença tende a fazer extinguir a incerteza provocada pela lide instalada entre as partes. Mas fazer cessar a incerteza jurídica não significa apenas fazer conhecer a solução cabível, mas impô-la, tornando-a obrigatória para todos os sujeitos do processo, inclusive o próprio juiz. Às vezes, o comando sentencial tem de ser executado por meio de realização coativa da prestação devida pelo vencido. Outras vezes, a declaração apenas é suficiente para eliminar o foco da desavença. Nem sempre, portanto, o processo civil está predisposto a providências executivas. Há acertamentos condenatórios, mas há também os não condenatórios, que se desenvolvem em torno de pretensões constitutivas ou apenas declaratórias.
Uma vez, porém, concluído o acertamento da controvérsia, seja por sentença de imposição de sanção, seja por sentença puramente declaratória, a coisa julgada se estabelece com a mesma função, ou seja, a certeza jurídica em torno da relação controvertida se implanta com plenitude, vinculando as partes e o juiz.
Essa situação jurídica cristalizada pela coisa julgada caracteriza-se por dois aspectos fundamentais: de um lado, vincula definitivamente as partes; de outro, impede, partes e juiz, de restabelecer a mesma controvérsia não só no processo encerrado, como em qualquer outro.
Admite-se, dessa maneira, uma
função negativa
e uma
função positiva
para a coisa julgada. Pela função negativa exaure ela a
ação exercida
, excluindo a possibilidade de sua
reproposição
. Pela função positiva, “impõe às partes obediência ao julgado como norma
indiscutível
de disciplina das relações extrajudiciais entre elas e obriga a autoridade judiciária a ajustar-se a ela, nos pronunciamento que a pressuponham e que a ela se devem coordenar
” (
apud
NEVES, Celso.
Coisa Julgada Civil.
São Paulo: RT, 1971, p. 383-383).
A coisa julgada, por sua força vinculativa e impeditiva, não permite que partes e juiz escapem da definitiva sujeição aos efeitos do acertamento consumado no processo de conhecimento. O resultado prático é caber a qualquer dos litigantes “a
exceptio rei iudicatae,
para excluir novo debate sobre a relação jurídica decidida” (
apud
NEVES, Celso. Op. Cit, p. 489), e ao juiz o poder de, até mesmo de ofício, extinguir o processo sem julgamento do mérito, sempre que encontrar configurada a ofensa à coisa julgada (ar. 267, V e § 3º).
Portanto, quando o art. 467 fala em
indiscutibilidade
e
imutabilidade
da sentença transitada em julgado refere-se a duas coisas distintas: a) pela
imutabilidade
, as partes estão proibidas de propor ação idêntica àquela em que se estabeleceu a coisa julgada; b) pela
indiscutibilidade
, o juiz é que em novo processo, no qual se tenha de tomar a situação jurídica definida anteriormente pela coisa julgada como razão de decidir, não poderá reexaminá-la ou rejulgá-la; terá de tomá-la simplesmente como
premissa
indiscutível. No primeiro caso atua a força
proibitiva
(ou negativa) da coisa julgada, e, no segundo, sua força
normativa
(ou positiva)
." (THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Curso de Direito Processual Civil:
Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 587-588).
Nesse mesmo sentido, leiam-se também os seguintes julgados: RE 444.816, rel. min. Marco Aurélio, julgamento em 29-5-2012, Primeira Turma, DJE de 27-8-2012; RE 594.350, rel. min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 25-5-2010, DJE de 11-6-2010.
Segundo o conhecido art. 502, CPC/15,
"
Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso
.
" O art. 503, do mesmo código, preconiza que
"A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida."
Merece ênfase, ademais, o art. 508, CPC:
"Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido."
Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero são precisos quando enfatizam que
"
A coisa julgada pressuposto do discurso jurídico - constitui uma regra sobre o discurso. Não admite, nesse sentido, ponderação. Representa evidente agressão ao Estado Constitucional e ao próprio discurso jurídico a tentativa de relativizar a coisa julgada
."
(MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel.
Código de processo cvil.
6. ed. rev. atual. São Paulo: RT, 2014, p. 449).
Desse modo, a sentença transitada em julgado não pode ser alterada ou desconsiderada pelo Juízo, conforme lógica do art. 508, CPC/15. Tal alteração apenas seria admissível em casos de negócio processual, avençado entre as partes, versando sobre pretensões disponíveis, conforme art. 190, CPC/15. Também seria cabível em hipótese de ação rescisória, interposta perante o Tribunal competente e com atenção ao prazo do art. 975, CPC/15; em caso de
querela nullitatis insanabilis
ou de declaração, pela Suprema Corte, da inconstitucionalidade de norma tomada como fundamento para prolação da sentença (art. 535, §4º, CPC).
2.6. Respeito à coisa julgada - caso em exame:
No caso em análise, portanto, o cumprimento de sentença deve se dar com irrestrito respeito à sentença transitada em julgado. O dispositivo da deliberação deve ser compreendido, ademais, tomando-se em conta a integralidade da sentença, conforme disposto no art. 489, §3, CPC/15.
2.7. Litispendência - considerações gerais:
De alguma forma, o tema do
ne bis in idem
tem origem no âmbito do direito sancionador, dado que ninguém pode ser sancionado duplamente por uma mesma infração administrativa ou penal
. Essa vedação decorre da própria cláusula do devido processo, tanto na vertente substantiva quanto procedimental. Daí que ninguém pode responder a simultâneos processos administrativos versando sobre a mesma suspeita/imputação, tampouco podendo responder a distintos processo penais com lastro na mesma arguição.
Esse é o conteúdo da cláusula do
double jeopardy,
assegurada pela 5ª e pela 14ª Emendas da Constituição dos EUA (aplicadas aos Estados-membros a partir do caso
Benton v. Maryland - 1969,
Suprema Corte). No âmbito da
Civil Law
isso se traduz na cláusula do
ne bis in idem,
assegurado expressamente pelo art. 8º do Pacto de San José da Costa Rica e em inúmeros outros tratados internacionais. No caso alemão, essa vedação está expressa no art. 103 da Lei Fundamental (
Doppelverwertungsverbot -
proibição de dupla valoração do mesmo fato:
"
Ninguém pode ser punido mais de uma vez pelo mesmo fato, com base no direito penal comum
",
em tradução livre).
Apesar de se tratar de garantia antiga - há quem alegue que o
ne bis in idem
teria origem sob o governo de Henrique II, na Inglaterra (por volta de 1100 D.C, conforme RUDSTEIN, David S.
Double
jeopardy:
a reference guide to the United States Constitution. Westport: Praeger, 2004, p. 4-8), há várias discussões a respeito do seu alcance. Anote-se, por exemplo, que García de Enterría sustentava que o
ne bis in idem
impediria a cumulação de sanções penais e administrativas diante de uma mesma imputação, por força da redação do art. 25 da Constituição da Espanha (veja-se AISA, Estrella Escuchuri.
Teoría del concurso de leyes y de delitos:
bases para una revisión crítica. Granada: Comares, 2004, p. 123). Mas, essa opinião não ganhou maiores adeptos.
O fato é que o
bis in idem
ocorre quando alguém é sancionado mais de uma vez pela mesma imputação. Daí que deve se tratar da mesma conduta e também da punição ao mesmo título, dado que é cabível - no território nacional - que alguém responda a uma sanção pela infração tributária e também responda por eventual crime previsto na lei 8.137/1990. Em outras palavras, um determinado comportamento pode configurar, a um só tempo, infração a cláusulas contratuais - dando ensejo à aplicação de cláusulas penais -; ilícito administrativo; ilícito tributário e ilícito penal, contanto que haja efetiva diferença entre os escopos sancionatórios de cada uma dessas imputações.
No caso, nesse primeiro e precário exame, não diviso sinais de litispendência, o que pressupõe - conforme
art. 337, §2, CPC/15
- identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. No presente processo, a aludida exceção não foi suscitada pelas partes e não constato o cogitado
bis in idem
, no que tange ao exame de ofício.
Aludido requisito de identidade de partes nas demandas é esmaecido, e fato, quando em causa processos coletivos, na medida em que o(a) autor(a) pode então deduzir pretensão em nome de coletividades.
Quando em causa ações coletivas
, o que não é a hipótese em exame, é salutar ter em conta
"que a aferição da litispendência na tutela coletiva deve ser regida não pela análise de quem formalmente se apresenta como autor das diversas demandas, mas, sim, pela qualificação jurídica de tal legitimação. Vale dizer, indagando-se a que título estão as diferentes entidades autoras em juízo, deduzindo idênticas pretensões de tutela de direitos meta-individuais (mesmos pedidos e causas de pedir), quando, então, será possível afirmar serem idênticas as demandas coletivas.
Deste modo, em virtude da especialidade do modelo processual coletivo, e, notadamete da qualificação da legitimação ativa empregaada, revela-se equivocada a afirmação de inexistência de litispendência entre ações coletivas através das quais sejam deduzidas idênticas pretensões, pelo tão-só fato de terem sido propostas por entidades diferentes
."
(VENTURI, Elton.
Processo civil coletivo:
a tutela jurisdicional dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos no Brasil. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 331).
De toda sorte, não há preclusão
pro iudicato
para exame do tema adiante, notadamente em fase de saneamento, caso acorram aos autos elementos que demandem a revisão deste despacho.
"
Sob outra perspectiva, dentre as espécies de preclusão, em relação aos protagonistas do processo, há ainda a denominada preclusão pro iudicato, pela qual é vedado ao juiz decidir questão já julgada. Assim, a preclusão, normalmente, atinge a atividade das partes, mas, igualmente, pode também ocorrer em relação ao órgão jurisdicional, impondo-lhe o obstáculo de não mais poder decidir matéria de direito disponível, a qual, nos termos do caput do art. 505, foi objeto de precedente julgamento
.
Cumpre deixar claro que a vedação no sentido de desautorizar o juiz a rever anterior ato decisório concerne apenas questões de direito disponível, uma vez que, consoante o disposto no art. 485, § 3.º, do CPC, não alcança a matéria de ordem pública, que pode ser reexaminada, pelo próprio juiz da causa, até o momento de proferir sentença.
Fredie Didier Júnior, enfrentando está questão já sob as novas regras processuais, sustenta diferente opinião, trazendo inúmeros argumentos que convidam à reflexão. Embora entendendo que o art. 485, § 3.º, do CPC, autoriza a cognição em qualquer grau e tempo de jurisdição da matéria ali especificada, isso somente ocorrerá se não tiver sido precedentemente examinada: “convém precisar a correta interpretação que se deve dar ao enunciado do § 3.º do art. 485 do CPC. O que ali se permite é o conhecimento, a qualquer tempo, das questões relacionadas à admissibilidade do processo – não há preclusão para a verificação de tais questões, que podem ser conhecidas ex officio, até o trânsito em julgado da decisão final, mesmo pelos tribunais. Mas não há qualquer referência no texto legal à inexistência de preclusão em torno das questões já decididas.
Se fosse consistente esta linha de raciocínio, quando já decidida, por exemplo, em primeiro grau uma preliminar de natureza processual, não impugnada a decisão por meio do recurso cabível, o tribunal estaria impedido de reexaminá-la de ofício, porque coberta pela preclusão. Na verdade, o tribunal não só pode como deve enfrentar as questões de ordem pública, visto que não há se falar em preclusão pro iudicato sobre esta matéri
a.
Atualmente, vinga esse posicionamento em nossos tribunais, como, v.g., colhe-se em acórdão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no Agravo Regimental no Recurso Especial 1.377.422-PR, relatado pelo Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva: “Nos termos da jurisprudência desta Corte as matérias de ordem pública decididas por ocasião do despacho saneador não precluem, podendo ser suscitadas na apelação, ainda que a parte não tenha interposto o recurso de agravo”. Em senso análogo, a 2.ª Turma, a seu turno, por ocasião do julgamento do Recurso Especial 1.483.180-PE, com voto condutor do Ministro Herman Benjamin, assentou, à unanimidade de votos, que: “Esta Corte Superior possui entendimento consolidado de que as matérias de ordem pública decididas por ocasião do despacho saneador não precluem, podendo ser suscitadas na apelação, ainda que a parte não tenha interposto o recurso de agravo.
Tive oportunidade de examinar esta problemática sob a égide do CPC re- vogado, valendo-me da lição de Galeno Lacerda. [4]Na verdade, há ensinamentos que se perpetuam. Como a redação do atual caput do art. 505 é praticamente a mesma da anterior (art. 471), invoco mais uma vez a dou- trina do insigne processualista gaúcho, ainda atual, ao refutar a posição de Liebman, no sentido da impossibilidade de ser reavivado, no curso do pro- cesso, o exame acerca de questões cujo deslinde já havia sido coberto pela preclusão.
Com efeito, após sistematizar as nulidades processuais e tentar solucionar os problemas que defluíam da atividade saneadora do juiz, Galeno Lacerda afirmava que: “a violação de normas imperativas, ao contrário do que ocorre com a anulabilidade, deve ser declarada de ofício pelo magistrado. Enquanto, porém, a ofensa à lei reclamada pelo interesse público provoca nulidade insanável, a infração de preceito imperativo ditado em consideração a interesse da parte impede o juiz a tentar o suprimento, antes de declarar a nulidade. Ora, o problema da preclusão de decisões no curso do processo é substancialmente diverso do problema da preclusão das decisões terminativas. Enquanto nestas o magistrado esgota a jurisdição, extinguindo a relação processual, naquelas ele conserva a função jurisdicional, continua preso à relação do processo. Em face desta premissa, a pergunta se impõe:
Pode o magistrado, que conserva a jurisdição, fugir ao mandamento de norma imperativa, que o obriga a agir de ofício, sob pre- texto de que a decisão interlocutória precluiu? Reconhecido o próprio erro, poderá a falta de impugnação da parte impedi-lo de retratar-se? Terá esta com sua anuência, tal poder de disposição sobre a atividade ulterior do juiz? A resposta, evidentemente, no caso, deve ser negativa
. Se o juiz conserva a jurisdição, para ele não preclui a faculdade de reexaminar a questão julgada, desde que ela escape à disposição da parte, por emanar de norma processual imperativa. Daí se conclui que a preclusão no curso do processo depende, em última análise da disponibilidade da parte em relação à matéria decidida. Se indisponível a questão, a ausência de recurso não impede o reexame pelo juiz. Se disponível, a falta de impugnação im- porta concordância tácita à decisão. Firma-se o efeito preclusivo não só para as partes, mas também para o juiz, no sentido de vedada se torna a retratação".
Desse modo, também sob a vigência do novo CPC, se no curso do processo, enquanto não esgotada a jurisdição, entender o juiz que se equivocara em decisão sobre as matérias arroladas nos incs. IV, V, VI e XI do art. 485, im- põem-lhe a função de dirigente do processo e o dever de velar pela duração razoável do processo (art. 139), reexaminá-la e resolvê-la novamente. É o que determina o art. 485, § 3.o, no sentido de autorizar ao juiz conhecer de ofício das supra aludidas matérias, até que, à evidência, não tenha exaurido a sua própria jurisdição
." (TUCCI, José.
Comentários ao Código de Processo Civil:
artigos 485 ao 538. São Paulo: RT. 2016, comentário ao art. 485).
Convém destacar esse último excerto:
"Desse modo, também sob a vigência do novo CPC, se no curso do processo, enquanto não esgotada a jurisdição, entender o juiz que se equivocara em decisão sobre as matérias arroladas nos incs. IV, V, VI e XI do art. 485, im- põem-lhe a função de dirigente do processo e o dever de velar pela duração razoável do processo (art. 139), reexaminá-la e resolvê-la novamente. É o que determina o art. 485, § 3.o, no sentido de autorizar ao juiz conhecer de ofício das supra aludidas matérias, até que, à evidência, não tenha exaurido a sua própria jurisdição."
2.8. Cogitada litispendência - caso em exame:
No caso em apreço, no curso do processo de conhecimento não foram apresentados indicativos de que a presente causa seja reiteração de alguma outra em curso, na forma do art. 337, §2, CPC, de modo que entendo não ahver sinais de
bis in idem.
Nessa fase, tampouco vislumbro sinais disso, no que toca ao presente exame de ofício - art. 485, §3, CPC/15.
2.9. Suspensão da demanda - considerações gerais:
Não diviso a presença dos requisitos que ensejariam eventual suspensão do processo, nesta etapa da causa, por conta de alguma questão prejudicial - art. 313, Código de Processo Civil/15: "
Suspende-se o processo: (...) V -
quando a sentença de mérito: a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente
; b) tiver de ser proferida somente após a verificação de determinado fato ou a produção de certa prova, requisitada a outro juízo. (...) § 4 O prazo de suspensão do processo nunca poderá exceder 1 (um) ano nas hipóteses do inciso V e 6 (seis) meses naquela prevista no inciso II. §5 O juiz determinará o prosseguimento do processo assim que esgotados os prazos previstos no §4."
A respeito dos aludidos preceitos, convém registrar aqui a análise detida promovida por Araken de Assis:
"Prejudicial externa civil – A hipótese mais frisante de suspensão do processo em razão de prejudicialidade externa homogênea é a prevista no art. 313, V, a, do NCPC.
Toda vez que o julgamento do mérito “depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente”, o juiz suspenderá o processo
. Derivações dessa regra avultam na possibilidade de o relator suspender os processos que dependam do julgamento da ação declaratória de constitucionalidade (art. 21 da Lei 9.868/1999) e da arguição de descumprimento de preceito fundamental (art. 5.º, § 3.º, da Lei 9.882/1999) – não, porém, a suspensão em decorrência do incidente de resolução das demandas repetitivas ou do julgamento do recurso extraordinário e do recurso especial repetitivos: a questão aí julgada é principal. O art. 313, V, a, trata da suspensão por causa prejudicial, que é a aptidão da prejudicial em tornar-se objeto litigioso em outro processo.
Fica evidente da redação da norma que a prejudicial é externa, porque há de consistir em “objeto principal de outro processo”. Não importa a circunstância de a questão prejudicial consistir no objeto originário do outro processo (v.g., A postula a invalidade do contrato firmado com B, mas B pleiteia o cumprimento da prestação devida por A) ou decorrer do alargamento desse objeto, por força de declaração incidente (v.g. B pleiteou de A, no primeiro processo, o principal da dívida, mas A reagiu pleiteando a declaração incidente da validade do contrato; no segundo processo, B pleiteia de A os juros da dívida). Importa a resolução da questão comum no outro processo, com autoridade de coisa julgada. E, nesse caso, o vínculo produzido na causa subordinante estender-se-á à causa subordinada ou, vencido o prazo máximo de suspensão – hipótese mais do que provável, vez que o interregno de um ano (art. 313, § 4.º) é muito curto, pressupondo-se elastério mais dilatado para o julgamento, por forçada ordem cronológica do art. 12, e o trânsito em julgado –, sobre a deliberação incidental na causa subordinada não recairá a coisa julgada (art. 503, § 1.º, III, in fine). Realmente, a questão comum não constitui o objeto principal da causa condicionada. Do contrário, configurar-se-ia um dos efeitos da litispendência, a proibição de renovação de causa idêntica. Cumprirá ao juiz julgá-la vencido o prazo hábil de espera, incidentalmente, apesar dos esforços de concatenação empreendidos pelo expediente da suspensão.
O exemplo ministrado, em que uma das partes pleiteia a decretação da invalidade do contrato e a outra reclama a prestação, releva que tampouco importa a diversidade da força da ação (declarativa, constitutiva, condenatória, executiva e mandamental) e a espécie de procedimento. A pretensão de A contra B para decretar a invalidade do contrato tem força constitutiva negativa, a de B contra A para realizar a prestação tem força condenatória. Nada obstante, o primeiro processo funciona como causa prejudicial relativamente à pretensão deduzida no segundo: decretada a invalidade do contrato naquele, fica predeterminado o desfecho deste (improcedência). Evidentemente, havendo a possibilidade de reunir os processos no mesmo juízo (retro, 305), para julgamento simultâneo, por força da conexão (retro, 303), inexiste a necessidade de suspender a causa condicionada, porque os processos conexos serão julgados simultaneamente (art. 55, § 1.º).
O objetivo da suspensão prevista no art. 313, V, a, consiste em evitar a emissão de provimentos conflitantes, logicamente incompatíveis, a respeito da questão prejudicial. Por esse motivo, causa prejudicial envolvendo partes distintas raramente constitui razão bastante para suspender outro processo, por mais relevante que seja a questão comum controvertida em ambos, ressalva feita às hipóteses de o julgamento da causa subordinante produzir efeitos erga omnes, como acontece na ação declaratória de constitucionalidade (art. 102, § 2.º, da CF/1988). Aliás, essa é uma característica – a falta de identidade de partes – da prejudicial de constitucionalidade, objeto do controle concentrado, todavia alheio à incidência do art. 313, V, a. Em outras palavras, o juiz da causa condicionada não suspenderá o processo em que se controverta norma objeto de controle concentrado de constitucionalidade
. Em tal hipótese, ou o STF concedeu liminar, suspendendo a vigência da norma, e o juiz não poderá aplicá-la; ou não concedeu, e o juiz haverá de aplicá-la no julgamento do mérito, ou não, exercendo o controle difuso. A superveniência do julgamento do STF, pronunciando a inconstitucionalidade, será recepcionado no julgamento do mérito ou, havendo ocorrido o trânsito em julgado, a sentença se tornará inexequível, nas condições do art. 525, § 1.º, III, c/c § 12.
No tocante ao estágio do processo subordinado, a suspensão poderá ocorrer no primeiro e no segundo graus; em particular, “o fato de já ter sido proferida sentença no processo prejudicado não afasta, portanto, a possibilidade de sua suspensão”. Conforme deflui da cláusula final do art. 313, V, a, que alude a “outro processo pendente”, tampouco o estágio do processo subordinante se mostra relevante à suspensão, bastando que subsistam os efeitos da litispendência. Encontrando-se a causa prejudicial no tribunal, por força de apelação, admite-se a suspensão, hipótese em que, presumivelmente, o desfecho ocorrerá dentro do prazo de suspensão
.
Era particularmente difícil a interpretação da regra particular do direito anterior, declarando haver suspensão do processo que “tiver por pressuposto o julgamento de questão de estado, requerido como declaração incidente” (art. 265, IV, c, do CPC de 1973). A esse propósito, havia dois termos de alternativa: ou se cuidava de prejudicial externa, caracterizada pelo fato se tratar de questão de estado (v.g., na ação de divórcio, a validade do casamento), hipótese em que incorreria a lei em indesejável redundância; ou se tratava de prejudicial interna, caso em que ocorreria colisão com o sistema da declaração incidente, e, pior, nenhuma justificativa plausível para suspender o processo, pois o juiz da causa resolverá conjuntamente a questão prejudicial, e, conforme o teor da resolução, passando ou não à análise da questão prejudicada. Essa situação constitui simples subespécie da regra geral do art. 313, V, a, do NCPC. É digno de nota a possibilidade de o juízo não exibir competência em razão da matéria para julgar questões de estado em caráter principalmente, hipótese em que a resolução incidental porventura tomada não se revestirá de auctoritas rei iudicate, nos termos do art. 503, § 1.º, III." (ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro:
volume II. Tomo II. Parte geral. São Paulo: RT. 2015. p. 809 e ss.)
2.10. Eventual suspensão da demanda - caso em apreço:
No caso em apreço, não há sinais de alguma questão prejudicial a ensejar a suspensão desta demanda no aguardo da sua solução. Por conta do exposto, a causa deve evoluir até efetivo cumprimento do julgado.
2.11. Legitimidade do IBAMA para a demanda:
A parte autora está legitimada para o presente cumprimento de sentença, eis que sua pretensão condenatória foi julgada parcialmente procedente pelo presente juízo, nos termos da sentença transitada em julgado.
2.12. Legitimidade - cobrança de eventuais honorários:
Modificando o sistema que havia vigorado sob a lei n. 4.215/1963 c/ art. 20, CPC/1973, o
art. 23 da lei n. 8906/1994
atribuiu ao advogado os honorários sucumbenciais arbitrados na sentença, remanescendo algumas críticas contra tal dispositivo, por pretensamente violentar a cláusula do devido processo, ao não assegurar efetiva reparação do dano, na medida em que o litigante não resta totalmente indenizado de todas as despesas decorrentes do litígio, mesmo quando não tenha sucumbido no processo.
Ao apreciar o
RE 384.866
, a Suprema Corte enfatizou que o arbitramento dos aludidos honorários estaria destinado a assegurar a efetiva recomposição do patrimônio da parte vitoriosa na demanda.
De todo modo, manteve-se a premissa de que aludida verba deve ser destinada aos(às) advogados(as). Tem-se reconhecido, porém, a legitimidade concorrente - parte e advogados - para cobrança de tal montante
:
Reporto-me, a respeito da questão, aos julgados abaixo transcritos:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA ALIMENTAR. SUBMISSÃO AO REGIME CONSTITUCIONAL DOS PRECATÓRIOS, OBSERVADA ORDEM ESPECIAL. 1.
Os honorários advocatícios incluídos na condenação pertencem ao advogado e possuem natureza alimentícia
. A satisfação pela Fazenda Pública se dá por precatório, observada ordem especial restrita aos créditos de igual natureza. Precedentes: AIs 623.145, sob a relatoria do ministro Dias Toffoli; 691.824, sob a relatoria do ministro Marco Aurélio; 732.358-AgR, sob a relatoria do ministro Ricardo Lewandowski; e 758.435, sob a relatoria do ministro Cezar Peluso; REs 470.407, sob a relatoria do ministro Marco Aurélio; 538.810, sob a relatoria do ministro Eros Grau; e 568.215, sob a relatoria da ministra Cármen Lúcia; bem como SL 158-AgR. 2. Agravo regimental desprovido.
(RE-AgR 415950, AYRES BRITTO, STF.)
PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PLEITO RECURSAL DE MAJORAÇÃO. LEGITIMIDADE CONCORRENTE. RECURSO EM NOME DA PARTE. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO DO ART. 23 DA LEI 8.906/1994. 1. A controvérsia devolvida no Recurso Especial cinge-se à legitimidade da parte que titulariza o direito material discutido na ação para postular, em recurso de Apelação, a majoração dos honorários sucumbenciais fixados na sentença. 2. O Tribunal de origem entendeu que o art. 23 da Lei 8.906/1994 estabelece que os honorários pertencem ao advogado, não à parte, razão pela qual faltaria a esta interesse em recorrer para elevá-lo, uma vez ser defeso postular em nome próprio direito alheio (art. 6º do CPC/1973). 3.
A jurisprudência do STJ é tranquila no sentido de que, apesar de os honorários advocatícios constituírem direito autônomo do advogado, não se exclui da parte a legitimidade concorrente para discuti-los, ante a ratio essendi do art. 23 da Lei nº 8.906/94
(REsp 828.300/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 24/4/2008). Nesse sentido: AgRg no REsp 1.644.878/SC, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 16/5/2017, DJe 24/5/2017; REsp 1.596.062/SP, Rel. Ministra Diva Malerbi (Desembargadora Convocada TRF 3ª REGIÃO), Segunda Turma, julgado em 7/6/2016, DJe 14/6/2016; AgRg no REsp 1.466.005/SP, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 17/9/2015, DJe 29/9/2015; AgRg no REsp 1.378.162/SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 4/2/2014, DJe 10/2/2014. 4. Recurso Especial provido. ..EMEN:
(RESP 201701884312, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:19/12/2017 ..DTPB:.)
Assim, aludida legitimação concorrente é um pontual exceção à vedação do art. 18, Código de Processo Civil/15.
2.13. Legitimidade dos requeridos:
Os demandados que restaram condenados no título executivo estão legitimados para o presente cumprimento de sentença, diante do alcance do título executivo transitado em julgado, de modo que o endereçamento da pretensão executiva se revela escorreito.
Na sentença de movimento 105, o processo foi extinto sem solução de mérito no que tocava à pretensão endereçada aos demandados
Antonio Ilson Pigatto
e
Francisco Pigatto Neto
, por conta da declaração da ilegitimidade de ambos para a demanda.
Quanto ao mais, sobreveio condenação ao cumprimento, em regime de solidariedade passiva, dos requeridos
Agroflorestal Baptista Pigatto S/A, Madeireira Pinhalão S/A Indústria e Comércio, Vimade-Vitória Indústria e Comércio de Madeira Ltda, e
Altair Wiese
(nesse caso, por força da desconsideração da personalidade jurídica da empresa Agroflorestal Baptista Pigatto S/A)
. Logo, aludidos requeridos estão legitimados para figurarem como demandados neste cumprimento de sentença.
2.14. Sucessão processual em razão do falecimento:
Sabe-se que -
quanto se dá no curso de uma demanda
-, nos termos do art. 313, I, CPC, a morte de qualquer das partes é causa de suspensão do processo. Por outro lado, segundo o art. 313, §2º, II, CPC/15,
"falecido o autor e sendo transmissível o direito em litígio, determinará a
intimação de seu espólio, de quem for o sucessor ou, se for o caso, dos herdeiros, pelos meios de divulgação que reputar mais adequados, para que manifestem interesse na sucessão processual e promovam a respectiva habilitação no prazo designado, sob pena de extinção do processo sem resolução de mérito
."
Atente-se para a lição de Araken de Assis, a respeito do tema:
"(...) O falecimento da pessoa natural que figura como parte em determinado processo é tanto causa de suspensão do processo (retro, 1.534.1), transmitido o objeto litigioso mortis causa, quanto de emissão de sentença terminativa, a teor do art. 485, IX, não se transmitindo o objeto litigioso. A causa da extinção reside no decesso do autor ou do réu, em virtude do caráter intransmissível, mortis causa, desse objeto. Desaparece o único legitimado possível.
Em princípio, os direitos, as pretensões e as ações mostram-se transmissíveis, mortis causa, litigiosos ou não. A exceção consiste na intransmissibilidade. Não é por outra razão que, em área de suma importância, o art. 943 do CC estabelece: O direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança. O dispositivo se aplica às ações de reparação do dano patrimonial e extrapatrimonial
.
Lei em sentido formal há de declarar intransmissível o direito. Tal exigência se deduz do art. 485, IX, referindo “disposição legal”. E, de fato, há direitos que, personalíssimos, extinguem-se com a morte do seu titular, antes ou depois do respectivo exercício, conforme estipulação legal. Essa característica permite classificar a intransmissibilidade em duas espécies: (a) absoluta; (b) relativa.
Intransmissibilidade absoluta do objeto litigioso – Em alguns casos, a morte da pessoa titular do direito, antes ou depois do seu exercício em juízo, provocará o desaparecimento imediato e irreversível do direito alegado e transformado, no processo, em hipótese de trabalho
.
É o caso do direito de pleitear a separação do cônjuge. A morte de per si extinguirá a sociedade conjugal (art. 1.571, I, do CC) e, por incompatibilidade, eliminam-se todos os direitos tendentes à obtenção da mesma finalidade. O STJ decidiu que os sucessores do sócio falecido não podem prosseguir na ação de exclusão de outro sócio, porque os primeiros, em razão da morte, por sua vez deixaram de integrar a sociedade."
(ASSIS, Araken de.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo II: institutos fundamentais. São Paulo: RT. 2015. p. 972-973).
2.15. Casos de intransmissibilidade:
Há hipóteses, portanto, em que o falecimento da parte enseja
extinção da demanda
, sem solução do mérito, por conta do caráter intransmissível da pretensão deduzida em juízo, notadamente quanto versam sobre direitos personalíssimos.
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. ARTIGO 557, § 1º, CPC. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CARÁTER PERSONALÍSSIMO. MORTE DO BENEFICIÁIO. INTRANSMISSIBILIDADE. EXTINÇÃO DO PROCESSO. 1.O
benefício de prestação continuada é revestido de caráter personalíssimo, não transmissível aos dependentes do beneficiário, devendo ser cessado o seu pagamento no momento em que forem superadas as condições previstas pela lei ou em caso de morte do beneficiário
. 2. Não tem direito os sucessores aos valores atrasados do benefício em questão, uma vez que a sua finalidade restringe-se ao amparo material, que tornou-se descessário com a morte da parte Autora. Ademais, trata-se de benefício assistencial e não contributivo. 3. Agravo legal o qual se nega provimento.
(AC 00054093520054036119, DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, TRF3 - SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/06/2010 PÁGINA: 369 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
2.16. Teoria da
Saisine
e representação do espólio:
Nos demais casos, porém, o falecimento da parte implicou suspensão da demanda, na forma do já mencionado art. 313, I, CPC, Note-se que, por força da teoria da
Saisine,
esposada pelo art. 1.784, Código Civil/2002,
"
Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários
."
Isso não vigora, porém, quando eventual herança seja alvo de renúncia por parte do sucessor (art. 1804, parágrafo único, Código Civil/2002).
Em tais hipóteses, a parte deve ser substituída pelo espólio ou por seus sucessores. Note-se que, como regra, a lei exige que a habilitação se dê mediante comprovação do inventário/partilha (art. 687 e ss., CPC/15), por conta da regra do art. 1.991, Código Civil:
"
Desde a assinatura do compromisso até a homologação da partilha, a administração da herança será exercida pelo inventariante
."
A tanto converge, igualmente, o art. 75, VII, CPC/15.
2.17. Habilitação direta:
Em determinados casos, os herdeiros podem ser convocados a responder por eventuais dívidas do falecido, observados os limites da herança (art. 1.997 e art. 1792, Código Civil/2002). Atente-se, de toda sorte, para a lógica da
lei 6.858/1980
dispõe sobre o pagamento de valores devidos aos empregados, por parte dos seus empregadores:
Art. 1º - Os valores devidos pelos empregadores aos empregados e os montantes das contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não recebidos em vida pelos respectivos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da legislação específica dos servidores civis e militares, e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial,
independentemente de inventário ou arrolamento
.
Art. 2º - O disposto nesta Lei se aplica às restituições relativas ao Imposto de Renda e outros tributos, recolhidos por pessoa física, e, não existindo outros bens sujeitos a inventário, aos saldos bancários e de contas de cadernetas de poupança e fundos de investimento de valor até 500 (quinhentas) Obrigações do Tesouro Nacional.
Parágrafo único. Na hipótese de inexistirem dependentes ou sucessores do titular, os valores referidos neste artigo reverterão em favor do Fundo de Previdência e Assistência Social.
Menciono ainda o art. 112 da lei 8.213/1991:
"O
valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento
."
Vê-se que a aludida legislação busca simplificar o recebimento dos valores, de modo que a prova da condição de sucessor, já promovida junto ao INSS, basta para a percepção dos valores em juízo.
CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CERTIDÃO DA HABILITAÇÃO DE HERDEIROS PERANTE A PREVIDÊNCIA SOCIAL. DISPENSA EM FACE DO DISPOSTO NOS ARTS. 1º E 2º, DA LEI 6.858/80. - Diante da legislação em epígrafe,
o pagamento dos valores a que se refere pode, inequivocamente, ser feito, em um segundo grau de comprovação
,
aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial
, independentemente de inventário ou arrolamento, se, no primeiro grau de comprovação, não houver evidência de dependentes habilitados perante a Previdência Social ou, em se tratando de servidores públicos civis e militares, na forma da legislação específica que lhes for pertinente. Razoabilidade dos fundamentos da sentença recorrida." (AC 200270000422471/PR, Relator(a) Des. Federal VALDEMAR CAPELETTI, DJU 31/03/2004)
Também há situações, por outro lado, em que se admite a chamada
habilitação direta ou simplificada
(prevista no art. 689, CPC/15). Ela opera-se quando não há resistência por parte da parte antagônica; e exige a prova de que todos os herdeiros acorreram ao feito.
A cautela é necessária, dado que a destinação dos recursos deve ser promovida a quem possui aptidão para outorgar quitação da obrigação pertinente (art. 311, CC/2002), a fim de que o cumprimento de sentença seja então extinto, quanto ao débito em questão, conforme art. 924, II, CPC/15. Segundo conhecido ditado popular, quem paga mal, paga duas vezes.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. SUCESSÃO. HERDEIROS. HABILITAÇÃO DIRETA. DESCABIMENTO. ABERTURA DE INVENTÁRIO. NECESSIDADE. PREQUESTIONAMENTO.
Só é admissível a habilitação direta dos herdeiros na execução, independentemente de autorização expressa do Juízo de Inventário ou do Juízo competente em matéria de sucessões, quando inexistirem outros bens a inventariar ou testamento a ser verificado, condições não atendidas no caso em exame
. Registra-se, desde já, especialmente para fins de eventual interposição de recursos às Instâncias Superiores, que a presente decisão não implica violação a qualquer dispositivo legal, em especial ao art. 1.060, inc. I, do CPC que resta devidamente prequestionado nos termos da fundamentação. (AG 200904000203224, VALDEMAR CAPELETTI, TRF4 - QUARTA TURMA, D.E. 17/08/2009.)
"-A Corte Superior, inclusive com apoio no artigo 43, do Código de Processo Civil "Ocorrendo a morte de qualquer das partes, dar-se-á a substituição pelo seu espólio ou pelos seus sucessores, observado o disposto no art.265.", reconhece a possibilidade da sucessão processual, em sintonia com o artigo 1060, I, do mesmo Codex, ocorrer em favor de
TODOS
os sucessores, anote-se, hodiernamente, observado os artigos 1791, e § único do Código Civil, "
A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros. Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio
.", artigo 1829, inciso I a IV," A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); 298 ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III - ao cônjuge sobrevivente; IV - aos colaterais.", todos do Código Civil - (RSTJ 130/299, 3ª Turma; RSTJ 172/451, 4ª Turma; STJ, 1ª Turma, Resp 1028187, DJ 4/6/08, mutatis mutandis), o que conduz, como corolário ao não trânsito do inconformismo. -Assim sendo, a meu juízo os argumentos alinhados, em nada abalam o teor da decisão objurgada, não se vislumbrando motivos para o exercício de retratação, nem para que se reforme o decisum, razão pela qual mantenho-a por seus próprios fundamentos. -Recurso desprovido." (AG 201002010038001, Desembargador Federal POUL ERIK DYRLUND, TRF2 - PRESIDÊNCIA, E-DJF2R - Data::18/11/2013, omiti parte do julgado)
Deve-se aplicar à sucessão a legislação vigente ao tempo do falecimento do instituidor da herança.
2.18.
Ordem de sucessão
hereditária:
No que diz respeito à ordem de sucessão hereditária, convém atentar para os seguintes dispositivos, todos do Código Civil/2002:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: (Vide Recurso Extraordinário nº 646.721) (Vide Recurso Extraordinário nº 878.694) I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III - ao cônjuge sobrevivente; IV - aos colaterais. Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente. Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar. Art. 1.832. Em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I) caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer. Art. 1.833. Entre os descendentes, os em grau mais próximo excluem os mais remotos, salvo o direito de representação. Art. 1.834. Os descendentes da mesma classe têm os mesmos direitos à sucessão de seus ascendentes. Art. 1.840. Na classe dos colaterais, os mais próximos excluem os mais remotos, salvo o direito de representação concedido aos filhos de irmãos. Art. 1.841. Concorrendo à herança do falecido irmãos bilaterais com irmãos unilaterais, cada um destes herdará metade do que cada um daqueles herdar. Art. 1.842. Não concorrendo à herança irmão bilateral, herdarão, em partes iguais, os unilaterais. Art. 1.843. Na falta de irmãos, herdarão os filhos destes e, não os havendo, os tios. § 1 o Se concorrerem à herança somente filhos de irmãos falecidos, herdarão por cabeça. § 2 o Se concorrem filhos de irmãos bilaterais com filhos de irmãos unilaterais, cada um destes herdará a metade do que herdar cada um daqueles. § 3 o Se todos forem filhos de irmãos bilaterais, ou todos de irmãos unilaterais, herdarão por igual.
Logo, são herdeiros do autor sua esposa e seus filhos, nos termos da escritura pública de declaração de nomeação de inventariante (mov. 1.4).
2.19. Eventual execução e limite da herança:
Por outro lado, sabe-se que, em solo nacional, não e herdam dívidas, salvo quando tais dívidas possam ser suportadas por eventuais bens auferidos mediante sucessão
causa mortis,
conforme ar
ts. 830 e 1792 do Código Civil/02
. Cabe ao executado o õnus da prova de eventual excesso.
APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EMBARGOS À EXECUÇÃO. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. AÇÃO AJUIZADA CONTRA DEVEDOR FALECIDO. LEGITIMIDADE PASSIVA DOS HERDEIROS DO FALECIDO PARA RESPONDER A EXECUÇÃO ATÉ O LIMITE DA HERANÇA. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. NÃO DEMONSTRADA. Legitimidade passiva. Não há falar em ilegitimidade, pois, à ausência de inventários, os sucessores são legitimados a compor o polo passivo da lide, desde que observado o limite da herança em relação a cada um dos herdeiros para responder à presente execução. Artigo 1.792, Código Civil:
?O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demostrando o valor dos bens herdado
s?. Juros remureratórios. Não se apresenta abusiva a pactuação em percentual superior a 12% ao ano, uma vez que as instituições financeiras não estão sujeitas às disposições do Decreto nº 22.626/1933. Súmula 382 do STJ: ?A estipulação de juros remuneratórios superior a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade?.NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UN NIME.(Apelação Cível, Nº 70081743494, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Giovanni Conti, Julgado em: 24-10-2019) (TJ-RS - AC: 70081743494 RS, Relator: Giovanni Conti, Data de Julgamento: 24/10/2019, Décima Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: 31/10/2019)
2.20. Habilitação - caso em exame:
Na hipótese, portanto, a execução promovida em face dos sucessores de
ALTAIR WIESE
, o montante a ser auferido em razão desta medida ficará limitado ao montante herdado por parte dos sucessores, em virtude do falecimento do instituidor da herança. Cabe aos demandados, porém, fazer prova de tal limite, conforme mencionado art. 1.792, Código Civil:
"O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a escuse, demostrando o valor dos bens herdados."
Ademais, a condenação do sr.
Altair Wiese
se deu em regime de solidariedade passiva com os demais requeridos - arts. 942 e 275 e ss., CC/02.
No evento 202, deliberou-se:
"A substituição da parte executada falecida, por seus herdeiros, nos termos do artigo 1.997 do Código Civil Brasileiro, é possível, cabendo à parte exequente diligenciar a localização dos herdeiros. Na hipótese de que não exista inventário aberto, incumbe ao administrador provisório a representação ativa e passiva do espólio, conforme artigo 613 do Código de Processo Civil c/c o artigo 1.797 do Código Civil. No caso do executado falecido
ALTAIR WIESE
, considerando que não há notícia a respeito da existência de inventário, a execução deverá prosseguir contra o espólio, cabendo ao administrador provisório representá-lo judicialmente. Assim, a administração provisória do espólio deve ficar, nos termos do artigo 1.797, I, do Código Civil, a cargo de
CIRENE PIGATTO WIESE
, viúva do executado falecido. Registre-se, outrossim, que, no nosso sistema legislativo, ninguém herda dívidas. Melhor dizendo, o sucessor apenas pode ser cobrado quanto a uma dívida do instituidor da herança nos limites dos bens adquiridos por conta da sucessão hereditária, conforme art. 1.792, do Código Civil. Logo, para que a parte exequente possa cobrar seus créditos junto aos sucessores do demandante falecido deverá apurar/demonstrar se ele(a) chegou a receber bens em herança, superiores ao valor do débito em discussão."
2.21. Atuação do MPF:
No presente caso, o Ministério Público foi intimado a respeito do cumprimento de sentença e apresentou parecer, o que atendeu ao disposto no art. 5, §1, da lei de ação civil pública - lei 7.347/1985.
2.22. Interesse processual:
O IBAMA atua com i interesse processual na medida, eis que, ao que consta, não houve cumprimento voluntário da sentença transitada em julgado. A efetivação da medida lhe será útil, assegurando-lhe a efetivação da prestação imposta na sentença. O procedimento adotado se revela adequado, conforme arts. 534 e ss., Código de Processo Civil:
2.23. Título executivo transitado em julgado:
O juízo de origem prolatou sentença com o seguinte dispositivo:
"Diante do exposto: I - julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, nos termos do inciso VI do art. 267 do CPC, em relação aos réus
Antonio Ilson Pigatto
e
Francisco Pigatto Neto
, em face da ilegitimidade passiva;
II - resolvo o mérito, nos temos do inciso I do art. 269 do CPC,
julgando parcialmente procedente
o pedido, para:
- reconhecer a responsabilidade solidária dos réus Agroflorestal Baptista Pigatto S/A, Madeireira Pinhalão S/A Indústria e Comércio, Vimade-Vitória Indústria e Comércio de Madeira Ltda, e
Altair Wiese
, este último em face da desconsideração da personalidade jurídica da primeira ré;
- condenar os réus, solidariamente, à reparação dos danos ambientais, mediante: a) apresentação de projeto de recuperação ambiental, a ser submetido diretamente ao IBAMA, no prazo de
3 (três) meses a contar da intimação da sentença, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento
; b) implementação da recuperação prevista em tal projeto, comprovando-a anualmente ao IBAMA, por meio de laudo técnico, sob pena de pagamento de R$ 100,00 (cem reais) diários por falta de iniciativa ou inadequado procedimento de recuperação, bem como multa de R$ 50,00 (cinquenta reais) diários por ausência de apresentação do referido laudo; c)
pagamento de indenização por danos materiais ambientais, ora arbitrado em de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), cuja maior gravidade poderá ser comprovada em liquidação de sentença
.
Ficam mantidos todos os embargos de atividades determinados administrativamente. Condeno, ainda, o réu ao pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 20 do CPC.
Mantenho a antecipação da tutela, à qual adiciono o imediato corte das árvores de pinus, corte esse que será executado pelo réu, o qual deverá entregar a madeira ao IBAMA para que este a destine conforme a legislação ambiental. O réu terá o prazo de 60 (sessenta) dias a contar da intimação da sentença para cumprir tal determinação, sob pena de multa de R$ 200,00 (duzentos reais) por dia. Ficam mantidas as multas aplicadas pelo descumprimento das determinações da antecipação de tutela originariamente deferida
."
As empresas Agroflorestal Baptista Pigatto S/A e Madeireira Pinhalão S/A – Indústria e Comércio opuseram embargos declaratórios, rejeitados pelo Juízo - evento 118. Seguiram-se apelações, apreciadas pelo Tribunal Regional da 4 Região, nos termos seguintes:
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA EXTRA PETITA - PRELIMINARAES AFASTADAS. DANOS MORAIS COLETIVOS - AFASTAMENTO.
1.
Não procede a alegação de cerceamento de defesa por parte dos réus, tendo em vista que restou provado que o magistrado
a quo
oportunizou a produção de provas no momento próprio da instrução do processo. Da mesma forma, não procede a alegação de sentença prolatada além dos limites da lide, pois a condenação se deu especificada para atender ao objeto da inicial de reparação eficiente dos danos ambientais comprovadamente causados
.
2. Não procede o pedido do IBAMA de arbitramento de danos morais pela degradação ambiental causada pelos réus, tendo em vista que o abalo não se verificou na comunidade local, cingindo-se ao imóvel rural.
Desse modo, a sentença foi mantida pelo Tribunal. Ao apreciar embargos declaratórios, o Colegiado Recusal deliberou
"1. São pré-requisitos autorizadores dos embargos de declaração a omissão, contradição ou obscuridade na decisão embargada. Também a jurisprudência os admite para a correção de erro material e para fim de prequestionamento. 2. Os embargos não constituem via própria para fazer prevalecer tese jurídica diferente da que foi acolhida no acórdão quando, em sua essência e finalidade, não se dirigem à omissão ou outro vício, mas a novo julgamento de mérito. 3. Constatada a omissão, supre-se para fins de fazer constar no dispositivo a negativa de provimento ao agravo retido e à apelação."
Foram interpostos recursos de caráter extraordinário (REsp e RE). O procesamento de ambos os recursos foi deferido pelo TRF4. Perante o STJ, foi distribuído o REsp 1.597.754/RS. Em deliberação monocrática, o recurso foi apreciado como segue:
"Ante o exposto, com base no art. 255, § 4º, I, do RISTJ, NÃO CONHEÇO do recurso especial dos particulares e, com fulcro nos incisos I e II, do mesmo dispositivo do RISTJ, CONHEÇO PARCIALMENTE do recurso especial do IBAMA e, nessa extensão, NEGO-LHE PROVIMENTO. Sem majoração da verba honorária (art. 85, § 11, do CPC/2015), em razão do disposto no Enunciado Administrativo n. 7 do STJ."
Seguiu-se a interposição de agravo interno no REsp 1.597.754/RS, rejeitado pelo STJ. O recurso extraordinário foi autuado perante a Suprema Corte como RE 1.310.319/PR. O STF determinou, então, o seguinte: "
Ex positis, determino a devolução dos autos à Corte de origem para que adote, conforme a situação do(s) referido(s) tema(s) de repercussão geral, os procedimentos previstos nos incisos I a III do artigo 1.030 do Código de Processo Civil (alínea c do inciso V do art. 13 do Regimento Interno doSupremoTribunalFederal)."
Por conta disso, no movimento 95 dos autos de apelação, o TRF4 reformou o juízo de admissibilidade do recurso, indeferindo o seu processamento. A decisão transitou em julgado
. Desse modo, a sentença de primeira instância foi mantida nos seus exatos termos.
2.24. Compreensão do julgado:
Segundo dispõe o art. 504, I, Código de Processo Civil, a fundamentação da sentença não chega a transitar em julgado. Contudo, ela se presta à adequada compreensão do alcance do dispositivo, conforme art. 489, §3, Código de Processo Civil/15:
"A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé."
No caso em exame, de todo modo, o dispositivo da sentença não veicula ambiguidades a demandar alguma forma de complementação ou elucidação a partir da conjuntação com sua fundamentação.
2.25. Prolação de sentença condicional:
Em regra, é vedada a prolação de sentença condicional. Ou seja, aquela cujos efeitos fiquem na dependência de efeitos incertos e futuros, conforme art. 492, parágrafo único, Código de Processo Civil:
"A decisão deve ser certa, ainda que resolva relação jurídica condicional."
Araken de Assis trata do tema como segue:
"Toda sentença há de ser certa, nada obstante o objeto litigioso envolva relação jurídica subordinada por condição resolutiva ou suspensiva, como determina o art. 492, parágrafo único.
A rejeição à sentença puramente condicional baseia-se no princípio da segurança jurídica. O pronunciamento desse teor apresentaria grave incerteza quanto ao alcance do respectivo comando. E a incerteza gera insegurança.
É dessa espécie a sentença que acolhe o pedido, mas sujeita tal juízo à ulterior apuração da existência do dano, na verdade pressuposto do próprio juízo de procedência. Em certa ocasião, no mesmo sentido, deliberou o STJ: “A prova do lucro cessante deve ser feita no processo de conhecimento, jamais na liquidação. Não demonstrada a sua ocorrência, a sentença de mérito declarará improcedente a pretensão”
A sentença condicional não se confunde com a sentença que, em virtude do caráter sumário da cognição, reserva certas exceções do réu, objeto próprio para ulterior processo (solve et repete). É o caso das seguintes demandas: (a) ação cambiária, quando impedido o emprego das exceções derivadas do negócio jurídico subjacente, reservadas para outra oportunidade; e (b) da ação possessória, pré-excluída a controvérsia sobre o domínio (art. 557, caput), salvo pretensão autônoma contra terceiro. O direito brasileiro não conhece a sentença condicional do direito alemão (Vorbehaltsurteil), cujo dispositivo condena o réu, mas reserva exceções para julgamento ulterior no mesmo grau. Entre nós, a reserva se encontra implícita no objeto litigioso e nas limitações intrínsecas ao julgamento.
Revela-se distinta e escapa à proibição a hipótese de julgamento de relação jurídica que se constituirá ulteriormente, em razão do advento da condição, e, principalmente, se tornará eficaz no futuro, por força do vencimento de termo. Negar a prestação jurisdicional nesses casos afrontaria o direito fundamental de acesso à Justiça em caráter preventivo (art. 5.º, XXXV, da CF/ 1988). Nesta contingência, apreciando tal relação jurídica, o juiz acolherá o pedido, embora incerta a obrigação; mas, “a incerteza da obrigação é fundamento de oposição a execução, que a lei considera diferente da inexequibilidade do título”. Em outras palavras, a sentença “condicional” se tornará exequível verificada a condição. A esses pronunciamentos – o termo é equívoco, mas a tradição chancela o uso –, comumente se designa de sentença condicional. É bem de ver que o juiz reconhecerá obrigação a cargo do vencido, e, portanto, a condenação para o futuro é condenação como qualquer outra. Localiza-se a base legal da emissão dessa espécie de pronunciamento no art. 514. O dispositivo dispensa ulteriores investigações acerca da admissibilidade, em tese, da condenação para o futuro no direito brasileiro.
Exemplo frisante e raro de aplicação do art. 514 consiste na pretensão do consorciado desistente contra a administradora do grupo. Não se mostra necessário o consorciado aguardar o encerramento do grupo para postular a restituição dos valores desembolsados. Todavia, a condenação da administradora somente se tornará exigível após o termo previsto na cláusula contratual. E há interesse de agir – a administradora nega o dever de restituir no presente –, condenando para o futuro. Incidirá correção monetária (Súmula do STJ, n.º 35). A jurisprudência do STJ vacilou quanto ao momento da restituição, mas firmou-se no sentido da necessidade de aguardar o encerramento do grupo. Os juros moratórios fluirão a partir do vencimento do termo.
Esse exemplo demonstra que o credor tomará a iniciativa de buscar a condenação do obrigado antes da ocorrência da condição suspensiva em razão de circunstâncias peculiares, avaliadas a cada caso Recusando o obrigado o cumprimento antecipadamente, a condenação diferida economiza tempo e, talvez, o condenado se resolva a adimplir.
Exemplo mais corriqueiro de condenação para o futuro localiza-se nos contratos de longa duração, em que há prestações periódicas dos figurantes, e nas relações de trato sucessivo, a exemplo da obrigação de prestar alimentos. O art. 323 declara desnecessário o autor pleitear as prestações vincendas, todas e cada qual, bastando pedir a condenação do réu nas prestações já vencidas. Implicitamente, as prestações futuras se incluem no objeto litigioso por força de lei
. A condenação incluirá as que se vencerem no curso do processo e as que se vencerem posteriormente no curso do processo. A exigibilidade dessas prestações dependerá do vencimento do respectivo termo. Não está claro até quando as prestações vincendas são abrangidas pela sentença. Conforme a duração do contrato, talvez o juiz julgue e o órgão ad quem, interposta apelação, pronuncie-se antes do término do contrato. A melhor solução é entender abrangido no comando judicial todas as prestações, inclusive as que se vencerem após o trânsito em julgado.
Vencido o beneficiário da gratuidade, as obrigações resultantes da sucumbência subordinam-se a condição suspensiva, pelo prazo de cinco anos subsequente ao trânsito em julgado, cabendo ao credor exigi-las nesse período através da demonstração de mudança na situação financeira do devedor (art. 98, § 3.º). Nesses termos, esta parte da sentença subordina-se a condição suspensiva: alterada a situação financeira do vencido, cujo patrimônio pode satisfazer o vencedor sem o prejuízo à subsistência própria e da família, nasce para o vencedor pretensão a executar. É a condenação mesma que descansa em condição suspensiva." (ASSIS, Araken de.
Processo Civil Brasileiro
- Vol. II. São Paulo: RT. 2015. tópico 1.566.2.1.)
No caso, o Juízo relegou para o período da liquidação a apuração efetiva do dano. A medida está em conformidade, em princípio, com a lógica do art. 324, §1, II, Código de Processo Civil/15, projeção do art. 286, II, Código de Processo Civil/1973, vigente ao tempo da prolação da sentença. No caso, portanto, diante da inviabilidade de delimitar
ex ante
o alcance do dano, a medida foi postergada para a liquidação. Por outro lado, as partes não se insurgiram contra o tópico, e a sentença transitou em julgado.
2.26. Prazos prescricionais - pretensão executiva:
As pretensões condenatórias deduzidas pela Administração Pública prescrevem, como regra, em 05 anos, contados da data em que ela tenha tomado conhecimento da agressão aos seus interesses, conforme postulado da
actio nata,
lógica do ar.t 189, Código Civil/2002 e art. 1 do decreto 20.910/32.
Aludido prazo também é oponível à
pretensão executiva
, conforme
súmula 150, STF
, devendo ser computados da data em que a parte credora tenha sido intimada a respeito da sentença. Lógica semelhante se aplica à pretensão satisfativa de eventual crédito de eventuais honorários sucumbenciais, porventura deduzida, nesse caso com o prazo de 5 anos, conforme
art. 25 da lei 8.906/1994
.
Na espécie, tanto por isso, não se operou a prescrição, eis que não se esgotou, até a deflagração do cumprimento de sentença, mais de 05 anos, contados desde a intimação da parte autora a respeito do trânsito em julgado da sentença. É o que se infere do confronto da data de trânsito em julgado da sentença (14 de março de 2022) e a data da deflagração desta etapa da demanda (data de 25 de março de 2022 - evento 167 deste eproc).
Ademais, os Tribunais têm enfatizado a natureza imprescritível da pretensão à reparação de danos ambientais:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 999. CONSTITUCIONAL. DANO AMBIENTAL. REPARAÇÃO. IMPRESCRITIBILIDADE. 1. Debate-se nestes autos se deve prevalecer o princípio da segurança jurídica, que beneficia o autor do dano ambiental diante da inércia do Poder Público; ou se devem prevalecer os princípios constitucionais de proteção, preservação e reparação do meio ambiente, que beneficiam toda a coletividade. 2. Em nosso ordenamento jurídico, a regra é a prescrição da pretensão reparatória. A imprescritibilidade, por sua vez, é exceção. Depende, portanto, de fatores externos, que o ordenamento jurídico reputa inderrogáveis pelo tempo. 3. Embora a Constituição e as leis ordinárias não disponham acerca do prazo prescricional para a reparação de danos civis ambientais, sendo regra a estipulação de prazo para pretensão ressarcitória, a tutela constitucional a determinados valores impõe o reconhecimento de pretensões imprescritíveis. 4. O meio ambiente deve ser considerado patrimônio comum de toda humanidade, para a garantia de sua integral proteção, especialmente em relação às gerações futuras. Todas as condutas do Poder Público estatal devem ser direcionadas no sentido de integral proteção legislativa interna e de adesão aos pactos e tratados internacionais protetivos desse direito humano fundamental de 3ª geração, para evitar prejuízo da coletividade em face de uma afetação de certo bem (recurso natural) a uma finalidade individual. 5.
A reparação do dano ao meio ambiente é direito fundamental indisponível, sendo imperativo o reconhecimento da imprescritibilidade no que toca à recomposição dos danos ambientais. 6. Extinção do processo, com julgamento de mérito, em relação ao Espólio de Orleir Messias Cameli e a Marmud Cameli Ltda, com base no art. 487, III, b do Código de Processo Civil de 2015, ficando prejudicado o Recurso Extraordinário. Afirmação de tese segundo a qual
É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental.
(STF - RE: 654833 AC, Relator: ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento: 20/04/2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 24/06/2020)
ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL - DIREITO
AMBIENTAL
- AÇÃO CIVIL PÚBLICA - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL - IMPRESCRITIBILIDADE DA REPARAÇÃO DO DANO
AMBIENTAL
- PEDIDO GENÉRICO - ARBITRAMENTO DO QUANTUM DEBEATUR NA SENTENÇA: REVISÃO, POSSIBILIDADE - SÚMULAS 284/STF E 7/STJ. 1.É da competência da Justiça Federal o processo e julgamento de Ação Civil Pública visando indenizar a comunidade indígena Ashaninka-Kampa do rio Amônia. 2. Segundo a jurisprudência do STJ e STF trata-se de competência territorial e funcional, eis que o dano
ambiental
não integra apenas o foro estadual da Comarca local, sendo bem mais abrangente espraiando-se por todo o território do Estado, dentro da esfera de competência do Juiz Federal. 3. Reparação pelos danos materiais e morais, consubstanciados na extração ilegal de madeira da área indígena. 4. O dano
ambiental
além de atingir de imediato o bem jurídico que lhe está próximo, a comunidade indígena, também atinge a todos os integrantes do Estado, espraiando-se para toda a comunidade local, não indígena e para futuras gerações pela irreversibilidade do mal ocasionado. 5. Tratando-se de direito difuso, a reparação civil assume grande amplitude, com profundas implicações na espécie de responsabilidade do degradador que é objetiva, fundada no simples risco ou no simples fato da atividade danosa, independentemente da culpa do agente causador do dano. 6. O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro da logicidade hermenêutica, está protegido pelo manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos, independentemente de não estar expresso em texto legal. 7. Em matéria de prescrição cumpre distinguir qual o bem jurídico tutelado: se eminentemente privado seguem-se os prazos normais das ações indenizatórias; se o bem jurídico é indisponível, fundamental, antecedendo a todos os demais direitos, pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer, considera-se imprescritível o direito à reparação. 8. O dano
ambiental
inclui-se dentre os direitos indisponíveis e como tal está dentre os poucos acobertados pelo manto da imprescritibilidade a ação que visa reparar o dano
ambiental
. 9. Quando o pedido é genérico, pode o magistrado determinar, desde já, o montante da reparação, havendo elementos suficientes nos autos. Precedentes do STJ. 10. Inviável, no presente recurso especial modificar o entendimento adotado pela instância ordinária, no que tange aos valores arbitrados a título de indenização, por incidência das Súmulas 284/STF e 7/STJ. 11. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido. ( REsp 1120117/AC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/11/2009, DJe 19/11/2009)
Assim, no caso, a pretensão executiva do IBAMA não foi atingida pela prescrição.
Tampouco há lastro para a prescrição intercorrente, prevista no art. 921, Código de Processo Civil, eis que não atendidos os seus requisitos. No caso, ainda que se cuide de pretensão endereçada a executados submetidos ao regime de direito privado, não houve suspensão da demanda e suspensão do cômputo da prescrição quanto a primeiro ano de estagnação do processo etc., demodo que os requisitos do art. 921, CPC, não foram atendidos.
A lei 9.873/99, que versa sobre prescrição intercorrente de pretensões no processo administrativo, não se aplica ao caso.
2.27. Eventual decadência:
O instituto da decadência é aplicável quando em causa cogitados direitos potestativos (direitos formativos geradores, na expressão de Pontes de Miranda). Ou seja, direitos que podem ser exercidos sem prévia aquiescência da contraparte, a exemplo do direito do Fisco promover o lançamento fiscal de revisão (art. 150, §4, CTN), direito à anulação de casamento, direito à demissão de empregados sem justa causa, direito à desistência de compra promovida pela internet etc. Em todos esses casos, sempre que a legislação houver fixado prazo para seu exercício, tratar-se-á de lapso decadencial.
No caso em exame,
isso não se aplica
, já que efetivação da pretensão do IBAMA não possui natureza potestativa. Ela depende da atuação dos executados, mediante apresentação do PRAD e recuperação da área em causa. Tanto por isso, não se incide no caso o instituto da caducidade.
2.28.
Intimação na pessoa
do(a) advogado(a):
Os Tribunais consolidaram o entendimento de que, em fase de cumprimento de sentença, a intimação do devedor para pagamento pode ser promovida na pessoa do seu advogado ou da sua advogada, conforme bem ilustram os julgados abaixo transcritos:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA. TÍTULO JUDICIAL. MULTA DO ARTIGO 475-J DO CPC. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO APENAS NA PESSOA DO ADVOGADO DO DEVEDOR, MEDIANTE PUBLICAÇÃO NA IMPRENSA OFICIAL. 1. Para fins do art. 543-C do CPC: Na fase de cumprimento de sentença, o devedor deverá ser intimado,
na pessoa de seu advogado
, mediante publicação na imprensa oficial, para efetuar o pagamento no prazo de 15 (quinze) dias, a partir de quando, caso não o efetue, passará a incidir a multa de 10% (dez por cento) sobre montante da condenação (art. 475-J do CPC). 2. No caso concreto, recurso especial parcialmente provido, apenas para sanar o erro material detectado no acórdão que julgou os embargos de declaração, de modo que não há falar em aplicação da multa do artigo 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil. (STJ - REsp: 1262933 RJ 2011/0150035-8, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 19/06/2013, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 20/08/2013)
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AUTO DE PENHORA E AVALIAÇÃO. INTIMAÇÃO FEITA POR CARTA COM AVISO DE RECEBIMENTO EM UMA DAS AGÊNCIAS BANCÁRIAS DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ART. 475-J DO CPC/73. FORMA. PREJUÍZO. DEMONSTRAÇÃO. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO NA PESSOA DO ADVOGADO JÁ CONSTITUÍDO. 1.
Havendo procurador constituído nos autos, a intimação do devedor acerca da penhora realizada, bem como para oferecer impugnação ao cumprimento de sentença, deve ser feita na pessoa do advogado, nos termos do art. 475-J do Código de Processo Civil de 1973. 2. Existência, nos autos, de anterior manifestação em que se indicou garantia do juízo e se formulou pedido expresso para que a intimação da penhora fosse realizada na pessoa do advogado então constituído
. 3. A intimação da penhora realizada por meio de carta com aviso de recebimento, endereçada a uma das agências da instituição financeira, não atendeu ao objetivo da lei (art. 475-J do CPC/73) e trouxe prejuízo processual concreto, que, no caso, culminou no transcurso in albis do prazo para a apresentação da impugnação ao cumprimento de sentença. 4. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 1677894 RS 2015/0207584-0, Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 15/12/2020, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/02/2021)
2.29. Eventual intimação da Fazenda Pública:
A intimação da Fazenda Pública no curso da demanda opera-se na pessoa dos seus procuradores - lei complementar 73, de 10/02/1993:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA RURAL. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER. INTIMAÇÃO DA AUTARQUIA REALIZADA ATRAVÉS DO PROCURADOR FEDERAL. DESNECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DA AGÊNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. AGRAVO INTERNO DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1.
A ciência dos atos e ordens judiciais aos Entes Públicos, bem como às suas autarquias e fundações de direito público, deve observar a regra da intimação na pessoa de seus procuradores, os quais detêm capacidade postulatória, nos termos do art. 269, § 3o. do Código Fux
. 2. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento. (STJ - AgInt no REsp: 1800818 RS 2019/0057295-4, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 19/10/2020, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/10/2020)
2.30. Intimação mediante consulta periódica aos autos:
Por outro lado, desde que haja procurador(a) constituído nos autos, cabe-lhe acessar periodicamente o eproc, na forma do art. 5 da lei n. 11.419/2006, sob pena de que tal intimação seja tida como efetivada, por decurso de prazo.
Art. 5º As intimações serão feitas por meio eletrônico em portal próprio aos que se cadastrarem na forma do art. 2º desta Lei, dispensando-se a publicação no órgão oficial, inclusive eletrônico. § 1º Considerar-se-á realizada a intimação no dia em que o intimando efetivar a consulta eletrônica ao teor da intimação, certificando-se nos autos a sua realização. § 2º Na hipótese do § 1º deste artigo, nos casos em que a consulta se dê em dia não útil, a intimação será considerada como realizada no primeiro dia útil seguinte. § 3º
A consulta referida nos §§ 1º e 2º deste artigo deverá ser feita em até 10 (dez) dias corridos contados da data do envio da intimação, sob pena de considerar-se a intimação automaticamente realizada na data do término desse prazo
. § 4º Em caráter informativo, poderá ser efetivada remessa de correspondência eletrônica, comunicando o envio da intimação e a abertura automática do prazo processual nos termos do § 3º deste artigo, aos que manifestarem interesse por esse serviço. § 5º Nos casos urgentes em que a intimação feita na forma deste artigo possa causar prejuízo a quaisquer das partes ou nos casos em que for evidenciada qualquer tentativa de burla ao sistema, o ato processual deverá ser realizado por outro meio que atinja a sua finalidade, conforme determinado pelo juiz. § 6º As intimações feitas na forma deste artigo, inclusive da Fazenda Pública, serão consideradas pessoais para todos os efeitos legais.
Atente-se para os seguintes acórdãos:
AGRAVO INTERNO IN REVISÃO CRIMINAL. LEGITIMIDADE ATIVA. ADVOGADO. INSTRUMENTO DE PROCURAÇÃO. AUSÊNCIA. INTIMAÇÃO ELETRÔNICA. E-PROC. LEI Nº 11.419/16. JUNTADA. INTEMPESTIVIDADE. JUÍZO PERFUNCTÓRIO. INEXISTÊNCIA DE CONDIÇÕES EXIGIDAS. INADMISSIBILIDADE DA VIA REVISIONAL. 1. Embora a Revisão Criminal também possa ser requerida por advogado legalmente habilitado, nos termos do art. 553 do CPPM, este deve apresentar o instrumento de procuração assinada pelo condenado. 2.
A partir da implementação do processo eletrônico, a intimação para o cumprimento de atos dar-se-á por meio de publicação de eventos no sistema informatizado, cabendo ao advogado, nos termos da Lei nº 11.419/16, o acesso periódico para inteirar-se da movimentação do feito. Para tanto, a citada lei confere um prazo de graça, o qual, vencido, materializa a intimação e, por conseguinte, consigna a abertura de contagem do prazo para a prática de ato processual subsequente, sobretudo o eventual recurso
. 3. Da análise perfunctória da Inicial verifica-se a inexistência dos requisitos necessários e exigidos no art. 551 do CPPM para a admissão da via revisional. 4. Agravo Interno rejeitado. Decisão unânime. (STM - AGT: 70001154520197000000, Relator: MARCO ANTÔNIO DE FARIAS, Data de Julgamento: 25/04/2019, Data de Publicação: 13/05/2019)
AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA CUMULADA COM REPARAÇÃO DE DANOS. PROTESTO. CANCELAMENTO. DANO MORAL. SÚMULA 385/STJ. RECURSO ESPECIAL. INTEMPESTIVIDADE. 1.
Conforme o § 3º do artigo 5º da Lei n. 11.419/2006, "a consulta referida nos §§ 1º e 2º deste artigo deverá ser feita em até 10 (dez) dias corridos contados", portanto, conforme consignado no Tribunal de origem, intempestivo o recurso
. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 2025050 MG 2021/0362748-6, Data de Julgamento: 12/09/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/09/2022)
Ademais,
"Segundo a norma, portanto, caberá aos atores processuais cadastrados a realização de consultas periódicas de acompanhamento, em até
10 (dez) dias
, aos portais de acesso às ações eletrônicas como é o caso do Sistema Eproc, sob pena de se considerar perfectibilizada a intimação."
(TRF-4 - AC: 50019035420204047107, Relator: RODRIGO BECKER PINTO, 23/09/2022, SEGUNDA TURMA)
2.31.
Obrigações de pagar quantia certa:
No caso, no essencial, a sentença veiculou a condenação dos requeridos à prestação de obrigações de fazer, cominando multas-diárias para o fins de eventual inadimplemento. Logo, o pagamento de valores está atrelado ao eventual inadimplemento da obrigação de adotar um determinado comportamento, detalhado na sentença.
O Juízo condenou os requeridos, de toda sorte, ao pagamento de honorários sucumbenciais:
"
Condeno, ainda, o réu ao pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 20 do CPC
."
2.32.
Obrigação de fazer:
Na sentença, como registrei acima, o Juízo condenou os requeridos na forma seguinte:
"resolvo o mérito, nos temos do inciso I do art. 269 do CPC, julgando parcialmente procedente o pedido, para: - reconhecer a responsabilidade solidária dos réus Agroflorestal Baptista Pigatto S/A, Madeireira Pinhalão S/A Indústria e Comércio, Vimade-Vitória Indústria e Comércio de Madeira Ltda, e
Altair Wiese
, este último em face da desconsideração da personalidade jurídica da primeira ré; - condenar os réus, solidariamente, à reparação dos danos ambientais, mediante: a) apresentação de projeto de recuperação ambiental, a ser submetido diretamente ao IBAMA, no prazo de 3 (três) meses a contar da intimação da sentença, sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento; b) implementação da recuperação prevista em tal projeto, comprovando-a anualmente ao IBAMA, por meio de laudo técnico, sob pena de pagamento de R$ 100,00 (cem reais) diários por falta de iniciativa ou inadequado procedimento de recuperação, bem como multa de R$ 50,00 (cinquenta reais) diários por ausência de apresentação do referido laudo; c) pagamento de indenização por danos materiais ambientais, ora arbitrado em de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), cuja maior gravidade poderá ser comprovada em liquidação de sentença. Ficam mantidos todos os embargos de atividades determinados administrativamente. Condeno, ainda, o réu ao pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 20 do CPC. Mantenho a antecipação da tutela, à qual adiciono o imediato corte das árvores de pinus, corte esse que será executado pelo réu, o qual deverá entregar a madeira ao IBAMA para que este a destine conforme a legislação ambiental. O réu terá o prazo de 60 (sessenta) dias a contar da intimação da sentença para cumprir tal determinação, sob pena de multa de R$ 200,00 (duzentos reais) por dia. Ficam mantidas as multas aplicadas pelo descumprimento das determinações da antecipação de tutela originariamente deferida."
2.33.
Duração razoável
do processo:
Os sujeitos fazem jus à razoável duração do processo, conforme art. 5º, LXXVIII, CF, aplicável também no âmbito administrativo. Daí que, por força do direito de petição (art. 5º, XXXIII e XXXIV, CF), as pessoas fazem jus ao direito de obter uma resposta motivada/fundamentada, junto à administração tributária, quanto aos pedidos de compensação formulados.
No que toca aos prazos, no âmbito administrativo, pode-se cogitar da aplicação dos arts. 48 e 49 da lei 9784, de 1999:
Art. 48.
A Administração tem o dever de explicitamente emitir decisão nos processos administrativos e sobre solicitações ou reclamações, em matéria de sua competência
.
Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada.
Deve-se atentar também para o art. 24 da lei n. 11.457, de 2007:
"
É obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar do protocolo de petições,defesas ou recursos administrativos do contribuinte
."
"
A EC 45/2004 acrescentou o inc. LXXVIII ao art. 5.º do texto constitucional, estabelecendo a garantia da razoável duração do processo e dos meios que garantam a celeridade da sua tramitação. Trata-se de uma consequência direta do devido processo legal; afinal, para o processo ser devido, é imprescindível que não seja injustificadamente moroso
.
A ideia de duração razoável surge no Brasil como uma necessária resposta ao imenso volume de trabalho dos tribunais, que resulta quase que inescapavelmente na tramitação lenta dos processos. Ainda mais, este princípio relaciona-se com a frequente dificuldade de satisfação das pretensões submetidas ao Judiciário, uma vez que a mera declaração do direito, sem sua realização, não é ainda a entrega da tutela jurisdicional. E é tendo em vista essa situação que o art. 4.º do CPC/2015 garante “o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.
O trecho final do artigo dá a necessária importância à adoção de meios adequados e efetivos à realização prática dos direitos pleiteados. É tarefa do Poder Judiciário valer-se de técnicas processuais aptas a dar à parte vencedora do litígio, na medida do possível, exatamente aquilo que foi pleiteado. Exemplos de meios coercitivos para a obtenção de satisfatividade são os arts. 461 e 461-A do CPC/1973, e a correspondente possibilidade de tutela específica nos arts. 497 a 500 do CPC/2015.
Na realidade, não existe um princípio que ordene a celeridade processual. O processo não precisa correr, com pressa, sob risco de serem esquecidas ou abandonadas as garantias do devido processo legal. A necessidade é a de que o procedimento dure apenas, e tão somente, o tempo necessário. A duração razoável comporta, isto é, um “processo sem dilações indevidas”. Esta é a meta de uma situação ideal.
A importância do tempo dentro do processo é uma preocupação crescente, em especial no atual contexto de rapidez e quase imediatidade da troca de informações em meio virtual. Se outros setores da vida em sociedade aceleram o ritmo, é esperado pelo jurisdicionado que a vida do processo tenha a mesma sorte – e daí podem surgir insatisfações generalizadas com o funcionamento do Judiciário e a administração da Justiça
. O ponto de equilíbrio, é sempre bom lembrar, deve ser o respeito ao devido processo legal, cujas garantias implicam quase que inevitavelmente a prática de mais atos processuais. Salvo exceções justificadas – como a concessão de medidas de urgência inaudita et altera pars –, é o devido processo, e não a celeridade, que deve ter prevalência." (ALVIM, Arruda.
Novo contencioso cível no CPC/2015
. SP: RT. 2016. item 1.6).
Em determinados contextos, referido lapso pode ser controlado pelo Poder Judiciário, na tarefa de sindicalizar a validade dos atos administrativos.
"(...) -
Extrapolando os limites da razoabilidade, conduta que por sua vez viola o princípio da legalidade, poderá o Judiciário intervir no ato administrativo, fazendo cumprir, como no presente caso, o prazo de 30 dias fixado no artigo 49 da Lei nº 9.784/99, para decisão em processo administrativo
.- (...)" (AMS 00055261020104036100, JUIZ CONVOCADO LEONEL FERREIRA, TRF3 - QUARTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/03/2013 ..FONTE_REPUBLICACAO:., omiti parte da ementa)
"TRIBUTÁRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. PRAZO PARA PROLAÇÃO DE DECISÃO. ART. 24 DA LEI Nº 11.457/2007. PRECEDENTE. - Pedidos de ressarcimento de PIS/PASEP e COFINS, incidentes sobre as matérias-primas e demais insumos necessários à industrialização de produto destinado à exportação, no período compreendido entre o 4º trimestre de 2002 e o 2º trimestre de 2006 (PIS), protocolados pelos contribuinte no período de novembro/2003 a outubro/2009. - A Lei nº 11.547/2007 cuida do processo administrativo junto à Administração Pública Federal, preconizando no seu art. 24 que "é obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta)dias a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos administrativos do contribuinte."
Os arts. 48 e 49 da Lei nº 9.784/99, que regula o processoadministrativo no âmbito da Administração Pública Federal não tem aplicabilidade no presente caso, tendo em vista o seu caráter subsidiário, ante a existência de norma específica. Há de se tomar como obrigatório para a prolação de decisão administrativa o prazo de 360 dias. Precedente do STJ
(RESP 200900847330, LUIZ FUX, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, 01/09/2010) - Apelação e remessa oficial desprovidas.
"
(APELREEX 00083000220124058100, Desembargador Federal Francisco Wildo, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data::10/01/2013 - Página::105.)
Não se pode ignorar, por certo, as dificuldades enfrentadas pelo Poder Executivo no desempenho de suas relevantes funções, quais sejam a eventual falta de colaboração do administrado, a grande quantidade de documentos a analisar, a escassez de recursos materiais e humanos, além do sempre crescente volume de trabalho. Também deve-se ter em conta a necessidade de cautela e zelo a que estão jungidos todos os servidores públicos, no trato da coisa pública, atividade que nos impõe sérias responsabilidades e, exatamente por isso, demanda tempo.
Daí que referida questão exige um exame tópico, caso a caso, diante da complexidade de cada situação, em confronto com o prazo decorrido para a apreciação do pedido pela Administração Pública.
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ADMINISTRATIVO. DEMORA NA DECISÃO. RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. 1.
A excessiva demora da decisão acerca do requerimento/ recurso administrativo, sem justificado motivo, não se mostra em consonância com o direito fundamental à razoável duração do processo, e tampouco está em sintonia com os princípios da razoabilidade e da eficiência da Administração Pública
. 2. Considerando a demora excessiva da decisão administrativa, restou justificada a concessão da segurança. (TRF-4 - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL: 50053121620214047200 SC 5005312-16.2021.4.04.7200, Relator: SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Data de Julgamento: 23/11/2021, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC)
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA, INCOMPETENCIA DO JUÍZO, DECADENCIA E CARENCIA DA AÇÃO REJEITADAS. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEMORA INJUSTIFICADA. OMISSÃO ADMINISTRATIVA. PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA E DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. SENTENÇA MANTIDA. I - No que tange à demora injustificada no procedimento administrativo, este possui legitimidade para figurar no polo passivo da demanda, uma vez que, conforme se observa do processo administrativo, este ainda tramita aos seus cuidados visto que, quando da impetração do presente mandamus, ainda se encontrava na "Superintendência do IBAMA no Mato Grosso". Sendo o Superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis do Mato Grosso parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, é competente a Seção Judiciária do Mato Grosso para julgamento desta demanda. II - "Quando o ato apontado como coator configura-se ato omissivo e continuado, não há que se falar em decadência do prazo de 120 (cento e vinte) dias disposto no art. 23 da Lei 12.016/2009, o qual se renova continuamente" ( AMS 0003978-89.2011.4.01.3700/MA, TRF1, Quinta Turma, Relator Juiz Federal convocado Rodrigo Navarro de Oliveira, unânime, e-DJF1 de 22/01/2018). III - Deve ser rejeitada também a preliminar carência de ação, suscitada ao argumento que, embora o Impetrante alegue ter apresentado as autorizações expedidas pelo órgão ambiental, não consta nos autos qualquer Licença Ambiental, uma vez que o pedido em análise se refere à morosidade do procedimento administrativo e não quanto ao seu mérito. IV - "
Verificada a demora injustificada, correta a estipulação de prazo para que a administração conclua procedimento administrativo. Aplicável a jurisprudência da Corte que assegura a razoável duração do processo, segundo os princípios da eficiência e da moralidade, não se podendo permitir que a Administração postergue, indefinidamente, a conclusão de procedimento administrativo." (STJ, REsp 1145692/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 16/03/2010, DJe 24/03/2010) V - Apelação e remessa oficial às que se nega provimento
. (TRF-1 - AMS: 00108410220134013600, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, Data de Julgamento: 03/02/2020, SEXTA TURMA, Data de Publicação: 13/02/2020)
Em que pese ser indispensável que o requerido adote redobrados cuidados no exame de tais pleitos, impõe-se que haja exame em prazo razoável, por conta das premissas já entabuladas acima. Assim, conquanto não desconsidere as dificuldades burocráticas e estruturais enfrentadas pelos diligentes servidores da autarquia -
algumas das quais compartilhadas pelo próprio Poder Judiciário
-, é fato que eventual demora na apreciação de pedidos administrativos pode dar causa a danos ao(s) postulante(s).
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRELIMINARES DE ILETITIMIDADE PASSIVA, INCOMPETENCIA DO JUÍZO, DECADENCIA E CARENCIA DA AÇÃO REJEITADAS. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEMORA INJUSTIFICADA. OMISSÃO ADMINISTRATIVA. PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA E DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. SENTENÇA MANTIDA. I - No que tange à demora injustificada no procedimento administrativo, este possui legitimidade para figurar no polo passivo da demanda, uma vez que, conforme se observa do processo administrativo, este ainda tramita aos seus cuidados visto que, quando da impetração do presente mandamus, ainda se encontrava na "Superintendência do IBAMA no Mato Grosso". Sendo o Superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis do Mato Grosso parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, é competente a Seção Judiciária do Mato Grosso para julgamento desta demanda. II - "Quando o ato apontado como coator configura-se ato omissivo e continuado, não há que se falar em decadência do prazo de 120 (cento e vinte) dias disposto no art. 23 da Lei 12.016/2009, o qual se renova continuamente" ( AMS 0003978-89.2011.4.01.3700/MA, TRF1, Quinta Turma, Relator Juiz Federal convocado Rodrigo Navarro de Oliveira, unânime, e-DJF1 de 22/01/2018). III - Deve ser rejeitada também a preliminar carência de ação, suscitada ao argumento que, embora o Impetrante alegue ter apresentado as autorizações expedidas pelo órgão ambiental, não consta nos autos qualquer Licença Ambiental, uma vez que o pedido em análise se refere à morosidade do procedimento administrativo e não quanto ao seu mérito. IV - "
Verificada a demora injustificada, correta a estipulação de prazo para que a administração conclua procedimento administrativo. Aplicável a jurisprudência da Corte que assegura a razoável duração do processo, segundo os princípios da eficiência e da moralidade, não se podendo permitir que a Administração postergue, indefinidamente, a conclusão de procedimento administrativo." (STJ, REsp 1145692/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 16/03/2010, DJe 24/03/2010) V - Apelação e remessa oficial às que se nega provimento
. (TRF-1 - AMS: 00108410220134013600, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, Data de Julgamento: 03/02/2020, SEXTA TURMA, Data de Publicação: 13/02/2020)
Impõe-se, portanto, que o presente processo passe a evoluir com prioridade, a fim de que a obrigação ambiental seja satisfeita.
2.34. Prazos arbitrados na sentença:
Na sentença, foi fixado o prazo de 3 meses para apresentação de PRAD, a contar da intimação da parte a respeito do conteúdo da sentença - ou seja, antes do trânsito em julgado. Foi mantida a antecipação de tutela, conferindo um prazo adicional de 60 dias corridos, conforme legislação da época, para entregar a madeira apreendida ao IBAMA.
No que toca à obrigação de prestar serviço - obrigação de fazer - destaco o alcance das multas-diárias, como segue nos tópicos abaixo.
2.35.
Multas-diárias
- considerações gerais:
Como notório, a cominação de multas diárias
destina-se a dissuadir a renitência no descumprimento de ordem judicial, encontrando expressa previsão nos arts. 536 e 537, CPC/15, projeção do art. 461, CPC/1973:
Com efeito, no dizer de Araken de Assis,
"Entre nós, a técnica coercitiva da astreinte é contemplada em diversos dispositivos legais, avultando, por óbvio, o já mencionado art. 536, § 1.º. Mas, como deflui de certas disposições incriminatórias, a exemplo do art. 22, caput, da Lei 5.478/1968, e da genérica possibilidade de qualificar o comportamento concreto da parte como ofensivo à dignidade da jurisdição (art. 77, IV, c/c § 2.º), caracterizando desacato, o direito pátrio sanciona penalmente situações análogas. Caminha o ordenamento, portanto, nos rumos do contempt of court, porque reclamado pela generalização da eficácia mandamental. Entre nós, o atentado à atividade jurisdicional rende multa (art. 77, § 2.º; art. 774, I a V, c/c parágrafo único), mas subsiste o clamor para agravar a situação do desobediente, submetendo-o a tipo penal específico em tais casos."
(ASSIS, A.
Manual da execução.
18. ed. São Paulo: RT. 2016. p. 189).
D'outro tanto, diante do Código de 1973, o STJ consolidou o entendimento de que
"
O valor referente à multa cominatória, prevista no art. 461, §4.º,
[do CPC/1973]
deve ser revertido para o credor, independentemente do recebimento de perdas e danos
."
(REsp n. 1.063.902/SC, rel. Min. Francisco Falcão, DJE de 01.09.2008), questão de resto reverberada com a redação do art. 537, §2º, do CPC atualmente vigente.
Atente-se para a lição de Araken de Assis:
"Esse meio executório se originou na jurisprudência francesa. Não é isenta de gênio. O advento do CC francês de 1808 consagrou o adágio nemo potest cogi ad factum, princípio ideológico basilar daquele ordenamento, o qual vedou, na execução do facere, o emprego de constrições pessoais sobre o devedor. Em consequência, a efetivação específica desta classe de obrigações acabou comprometida. O inadimplemento do obrigado gerava apenas perdas e danos. Entre nós, seguiu a trilha o art. 880 do CC de 1916, segundo o qual o obrigado indenizaria perdas e danos pelo descumprimento de prestação a ele só imposta, ou só por ele exequível. Como assinalava-se perante esse texto, não tolera a lei que possa o devedor ser forçado, por qualquer meio de violência à sua pessoa, a cumprir a obrigação. Infelizmente, o art. 247 do CC vigente em nada inovou, ignorando a disciplina do processo, sacrificando a tutela específica do credor.
Contra as repercussões práticas dessa orientação, os tribunais franceses desenvolveram o expediente de aplicar, em casos tais, multa de valor extraordinário e extremamente gravosa, com o fito de premir a vontade do obrigado. Trata-se de sanção indireta ao inadimplemento, baseada numa lei psicológica que proclama a preferência da pessoa humana pelos comportamentos de menor esforço, e sua aplicação reiterada, na maioria das vezes, forçou o obrigado ao cumprimento pontual
.
Assiste razão, pois, ao alvitre de a sanção pecuniária é instrumento executivo, meio e modo de forçar o cumprimento da obrigação", em que pese cooptar a vontade do obrigado. Ela provoca intercâmbio patrimonial e, por isso, escapa ao âmbito dos poderes cautelares do órgão judiciário.
Segundo opinião haurida do direito francês, comentando a disciplina legal posteriormente outorgada à astreinte, ocorreu a incorporação das "soluções adquiridas na jurisprudência". E, aduiu-se, afinal se estabeleceu "elo oficial entre este importante meio de pressão e o conjunto das vias executivas". Em França, a astreinte é definitiva - insuscetível de revisão - ou provisória (cominatória), quer dizer, é ou não limitada no tempo e, portanto, tem valor final determinado, e é aplicada de ofício pelo juiz da execução. Liquida-se a pena tão logo constatado o atraso ou o descumprimento, total ou parcial, do devedor. Se provisória a pena, o órgão judiciário poderá suprimi-la e moderá-la, adequando-a, assim, à expressão econômica da obrigação. Mas, sendo definitiva a astreinte, o obrigado somente se livrará do pesado ônus em virtude de força maior ou de caso fortuito, porque a pena possui valor adrede estabelecido, tenha ou não o credor obtido, entrementes, o adimplemento in natura.
A Corte de Cassação francesa, em 29.05.1990, aplicou astreinte para constranger o devedor ao adimplemento de obrigação pecuniária. O precedente constitui notável avanço e ampliação do campo de atuação da técnica executiva. Por outro lado, o art. 36 da Lei (francesa) 91.650, de 09.07.1997, permite que, em certos casos, a multa beneficie instituições de caridade, em lugar do credor, e seu valor definitivo poderá ser diminuído. Esta última providência também se admite no direito brasileiro (infra, 222.4). Quanto ao destinatário, porém, o art. 537, § 2.º, enunciou, pela vez primeira, constituir crédito do exequente. O destinatário será o Estado-membro ou a União, conforme o caso, na multa por ato atentatório à dignidade da justiça (art. 77, § 2.º), ressalva feita à prática de atos considerados da mesma natureza, mas distintos dos contemplados no art. 77, § 2.º e § 3.º, na própria execução (art. 774, parágrafo único).
Seja como for, a astreinte coíbe "uma situação ilícita, p. ex., as precipitações poluentes de certa indústria em águas públicas (non facere)", ou coage "o poeta a compor o prometido soneto (facere), mediante a virulência da pena pecuniária". Todavia, alcançado o adimplemento ou tornado possível esse resultado, ao juiz se faculta diminuir a pena, evitando o enriquecimento injustificado do credor. Uma progressiva dissociação das perdas e danos marcou o desenvolvimento da astreinte. E, ademais, abandonou o campo restrito das obrigações de fazer, abrangendo também obrigações pecuniárias.
Mediante as reformas introduzidas na lei processual brasileira, a disciplina em vigor se aproximou do paradigma francês, no que tange ao aspecto da possibilidade de diminuição do valor da pena, evolução culminada pelo art. 537 do NCPC.
Independentemente de regra nesse sentido, o STJ promovera a redução do valor da pena, com o fito de evitar o enriquecimento sem causa. Em sentido contrário, asseverou outro julgado do STJ: "A lei processual de 1973 não estabeleceu limites à fixação da pena pecuniária por dia de atraso no cumprimento de obrigações de fazer e de não fazer. Impossibilidade de aplicação analógica do art. 920 do CC-16, porque aquele dispositivo visa coibir abusos nas penas convencionais, enquanto a cominação judicial objetiva garantir a efetividade do processo". O art. 920 do CC de 1916, citado no precedente, corresponde, verbum ad verbum, ao art. 412 do CC.
De acordo com o art. 537, § 1.º, I, o juiz poderá reduzir ou aumentar o valor e a periodicidade da multa, tornando-se "insuficiente ou excessiva". Seus poderes compreendem as mudanças no valor diário e no montante geral, após a fluência da astreinte. Por esse motivo, concebe-se que, a despeito da fluência da multa, o executado dela seja exonerado posteriormente, haja vista seu adimplemento tardio. De outro lado, o STJ reafirmou a possibilidade de a multa "ser modificada, pelo juiz da execução, quando venha a revelar-se insuficiente ou excessiva
".
De qualquer modo, a astreinte representa meio executório poderoso, aplicável vantajosamente para executar de modo específico obrigação de fazer infungível. Somente indevida resistência a esta imprescindível técnica executiva pode deturpar e refrear sua aplicação." (ASSIS, Araken de.
Manual da execução.
18. ed. São Paulo: RT. 2016. p. 821-824)
Ademais, a cominação da multa depende de prévia intimação do destinatário da ordem judicial, conforme súmula 410, STJ:
"
A prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer
."
Note-se que, por óbvio,
"O fim da astreinte não é o de criar crédito pecuniário em favor do exequente, embora tal aconteça no caso de recalcitrância, mas o de premir o executado para realizar execução específica."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 830).
Pode-se afastar a multa, conforme lógica do art. 537, §1º, CPC/15, e lógica do art. 461, CPC/1973,
"(a) no caso de revelar-se insuficiente ou excessiva (inciso I); (b) o executado comprovar o cumprimento parcial superveniente ou justa causa para o descumprimento (inciso II). Nesse último caso, também se afastará a multa por dolo processual e a responsabilidade penal antevista no art. 536, § 3.º"
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 832).
Outrossim,
"
Também se excluirá a pena, a critério do órgão judiciário, no caso de o executado cumpra, no todo ou em parte, mas com atraso a prestação ou a ordem judicial (art. 537, § 1.º, II, 1.ª parte), com o fito de evitar o enriquecimento do exequente
. É o que se recomenda nas hipóteses de cominação da pena, ilegitimamente que seja, contra a Fazenda Pública (retro, 221). Não tem justificativa social e jurídica plausível realizar atribuição patrimonial expressiva em favor de um único necessitado, por exemplo, em detrimento do conjunto, ou seja, em desfavor da própria sociedade. Por outro lado, o exequente há de se comportar com boa-fé (art. 5.º do NCPC) e, na medida do possível, cooperar no cumprimento do exequente, impedindo que, em razão de ato imputável a ele, o valor da pena aumente consideravelmente. Por exemplo, aguardar longo tempo sem iniciar a execução da multa que incidiu, posto que descumprido o provimento favorável pelo adversário."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 832-833).
Atente-se, aliás, para os seguintes precedentes do STJ:
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PROCESSUAL CIVIL. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. CADERNETA DE POUPANÇA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. EXIBIÇÃO DE EXTRATOS BANCÁRIOS. ASTREINTES. DESCABIMENTO. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. 1. Para fins do art. 543-C do CPC: 1.1. "Descabimento de multa cominatória na exibição, incidental ou autônoma, de documento relativo a direito disponível." 1.2. "
A decisão que comina astreintes não preclui, não fazendo tampouco coisa julgada.
" 2. Caso concreto: Exclusão das astreintes. 3. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. ..EMEN: (RESP 201201441618, PAULO DE TARSO SANSEVERINO, STJ - SEGUNDA SEÇÃO, DJE DATA:11/04/2014 ..DTPB:.)
RECURSO ESPECIAL - ASTREINTE - APLICAÇÃO E REVOGAÇÃO - DISCRICIONARIEDADE DO JULGADOR - APRECIAÇÃO EM SEDE DE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - POSSIBILIDADE - RECURSO IMPROVIDO. 1 -
A decisão que arbitra a astreinte não faz coisa julgada material, pois ao magistrado é facultado impor essa coerção, de ofício ou a requerimento da parte, cabendo a ele, da mesma forma, a sua revogação nos casos em que a multa se tornar desnecessária
. 2. É cabível exceção de pré-executividade com objetivo de discutir matéria atinente à astreinte. 3 - Recurso improvido. ..EMEN: (RESP 200702881965, MASSAMI UYEDA, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:15/12/2011 RB VOL.:00579 PG:00051 RT VOL.:00918 PG:00783 ..DTPB:.)
Em sentido semelhante, reporto-me também ao seguinte julgado:
"
A decisão que comina astreintes não preclui, não fazendo tampouco coisa julgada
." 2. Caso concreto: Exclusão das astreintes. 3. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
(REsp 1333988/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, 2. SEÇÃO, julgado em 09/04/2014, DJe 11/04/2014).
Sem dúvida, porém, que,
"
a análise sobre o excesso da multa deve ser pensada de acordo com as condições enfrentadas no momento em que a multa incidia e com o grau de resistência do devedor. Não se pode analisá-la na perspectiva de quem, olhando os fatos já consolidados no tempo, depois de cumprida a obrigação, procura razoabilidade que, na raiz do problema, existe um comportamento desarrazoado de uma das partes
"
(STJ, REsp 1.135.824/MG, rel. Min. Nancy Andrighi, DJE de 14.03.2011).
Diante do eventual descumprimento da ordem, deve-se examinar os meios para sua efetivação. De partida, registro que há alguma polêmica a respeito da validade do bloqueio de recursos públicos com o escopo de se viabilizar a efetivação de comandos judiciais. Isso pelo fato de que a Constituição dispôs que o tal sequestro seria cabível nos casos em que a ordem cronológica de pagamento dos precatórios não fosse observada (art. 100, §6º - EC 62/2009).
Daí que, em leitura
a contrario sensu,
tem-se sustentado que o bloqueio de recursos estatais para cumprimento de ordens judiciais violentaria o postulado de que todas as despesas estatais devem estar detalhada e previamente previstas na lei do orçamento anual (art. 165, Constituição).
Nesse sentido, menciono os julgados abaixo:
'Avocação de causa. Deferimento pelo STF, diante do perigo de grave lesão às finanças públicas, em face de decisão de Juiz de primeiro grau, que, em processo de desapropriação indireta, fixou prazo de 30 dias para o depósito prévio de vultosa indenização, sob pena de bloqueio de valores. Suspensão dos efeitos de tal decisão para que o STF resolva essa questão incidente
(artigos 119, I, 'o', da CF, 252 e 258, do RISTF) - (in RTJ 125/1).
STF, Pedido de Avocação nº 12-MA, rel. Ministro Sidney Sanches.
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. TRATAMENTO DE SAÚDE E FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS A NECESSITADO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. SEQÜESTRO DE VERBAS PÚBLICAS. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Controvérsia adstrita à possibilidade de seqüestro liminar de verbas públicas para garantir o cumprimento de decisão judicial que deferiu antecipação de tutela impondo ao Estado obrigação de tratamento necessário a portador de distonia cervical diapática. 2. A execução em face da Fazenda Pública e, a fortiori, a efetivação das decisões de urgência inadmitem os meios de sub-rogação tradicionais, à semelhança do que dispõe o artigo 730 do CPC, muito embora o ordenamento contemple as astreintes como instrumento de coerção.
O seqüestro de recursos públicos, consoante reiterada jurisprudência do E. STF somente é admissível na estrita hipótese de quebra da ordem cronológica dos precatórios. (RCL 2452/CE, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 19/03/2004) RMS 18.328/PR, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 06/09/2004;RMS 18.367/PR, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 13/12/2004); RCL 2363/PA, Rel. Gilmar Ferreira Mendes
. 3. "Consoante entendimento consolidado neste Tribunal, em se tratando de obrigação de fazer, é permitido ao juízo da execução, de ofício ou a requerimento da parte, a imposição de multa cominatória ao devedor, mesmo que seja contra a Fazenda Pública." (AGRGRESP 189.108/SP, Relator Ministro Gilson Dipp, DJ de 02.04.2001). 4. Precedentes jurisprudenciais do STJ: RESP 490228/RS, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ de 31.05.2004; AGRGRESP 440686/RS, Felix Fischer, DJ de 16.12.2002; AGRESP 554776/SP, Relator Ministro Paulo Medina, DJ de 06.10.2003; AgRgREsp 189.108/SP, Relator Ministro Gilson Dipp, DJ 02.04.2001 e AgRgAg 334.301/SP, Relator Ministro Fernando Gonçalves, DJ 05.02.2001. 5. Recurso do Estado provido. ..EMEN: (RESP 200400292579, LUIZ FUX, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJ DATA:14/11/2005 PG:00191 ..DTPB:.)
Há, todavia, precedentes em sentido contrário, como bem ilustram as ementas que transcrevo adiante:
"(...) 10. O art. 461, §5.º do CPC, faz pressupor que o legislador, ao possibilitar ao juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas assecuratórias como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial, não o fez de forma taxativa, mas sim exemplificativa, pelo que, in casu, o seqüestro ou bloqueio da verba necessária à aquisição de medicamento objeto da tutela deferida, providência excepcional adotada em face da urgência e imprescindibilidade da prestação dos mesmos, revela-se medida legítima, válida e razoável. 11. Recurso especial que encerra questão referente à possibilidade de o julgador determinar, em ação que tenha por objeto o fornecimento de medicamento necessário a menor portador de cardiopatia congênita, medidas executivas assecuratórias ao cumprimento de decisão judicial antecipatória dos efeitos da tutela proferida em desfavor de ente estatal, que resultem no bloqueio ou seqüestro de verbas deste depositadas em conta corrente. 12.
Deveras, é lícito ao julgador, à vista das circunstâncias do caso concreto, aferir o modo mais adequado para tornar efetiva a tutela, tendo em vista o fim da norma e a impossibilidade de previsão legal de todas as hipóteses fáticas. Máxime diante de situação fática, na qual a desídia do ente estatal, frente ao comando judicial emitido, pode resultar em grave lesão à saúde ou mesmo por em risco a vida do demandante
. 13. Os direitos fundamentais à vida e à saúde são direitos subjetivos inalienáveis, constitucionalmente consagrados, cujo primado, em um Estado Democrático de Direito como o nosso, que reserva especial proteção à dignidade da pessoa humana, há de superar quaisquer espécies de restrições legais. Não obstante o fundamento constitucional, in casu, merece destaque a Lei Estadual n.º 9.908/93, do Estado do Rio Grande do Sul, que assim dispõe em seu art. 1.º: "Art. 1.º. O Estado deve fornecer, de forma gratuita, medicamentos excepcionais para pessoas que não puderem prover as despesas com os referidos medicamentos, sem privarem-se dos recurso indispensáveis ao próprio sustento e de sua família. Parágrafo único. Consideram-se medicamentos excepcionais aqueles que devem ser usados com freqüência e de forma permanente, sendo indispensáveis à vida do paciente." 14.
A Constituição não é ornamental
, não se resume a um museu de princípios, não é meramente um ideário; reclama efetividade real de suas normas. Destarte, na aplicação das normas constitucionais, a exegese deve partir dos princípios fundamentais, para os princípios setoriais. E, sob esse ângulo, merece destaque o princípio fundante da República que destina especial proteção a dignidade da pessoa humana. 15.
Outrossim, a tutela jurisdicional para ser efetiva deve dar ao lesado resultado prático equivalente ao que obteria se a prestação fosse cumprida voluntariamente. O meio de coerção tem validade quando capaz de subjugar a recalcitrância do devedor. O Poder Judiciário não deve compactuar com o proceder do Estado, que condenado pela urgência da situação a entregar medicamentos imprescindíveis proteção da saúde e da vida de cidadão necessitado, revela-se indiferente à tutela judicial deferida e aos valores fundamentais por ele eclipsados
. 16.
In casu, a decisão ora hostilizada importa concessão do bloqueio de verba pública diante da recusa do ora recorrente em fornecer o medicamento necessário ao desenvolvimentode portador de cardiopatia congênita
. 17. Por fim, sob o ângulo analógico, as quantias de pequeno valor podem ser pagas independentemente de precatório e a fortiori serem, também, entregues, por ato de império do Poder Judiciário. 18. Recurso especial desprovido. (RESP 200601525703, LUIZ FUX, STJ - PRIMEIRA TURMA, 15/10/2007)
Ora, não se pode perder de vista que as
astreintes
são mecanismos indispensáveis para se assegurar a efetividade da tutela jurisdicional, dado que o ordenamento pátrio não comporta maiores mecanismos de
contempt of Court.
Ao que releva mais de perto ao caso vertente, por outro lado, o STJ tem reconhecido a validade da aplicação de multa diária diretamente ao servidor público responsável por cumprir a ordem.
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. REVISÃO DE PENSÃO. DEFERIMENTO DE LIMINAR. MULTA DIÁRIA DIRECIONADA À AUTORIDADE IMPETRADA. POSSIBILIDADE. 1. A questão nos autos indaga saber se pode a multa cominatória ser direcionada ao agente público que figura como impetrado na ação mandamental. 2. Segundo o Tribunal de origem, "a imposição da multa pessoal cominada ao Presidente do RIOPREVIDENCIA, vez que em consonância com o parágrafo único do art. 14 do CPC, [...] tem por finalidade reprimir embaraços a efetivação do provimento judicial". 3.
A cominação de
astreintes
pode ser direcionada não apenas ao ente estatal, mas também pessoalmente às autoridades ou aos agentes responsáveis pelo cumprimento das determinações judiciais
. (Precedente: REsp 1111562/RN, da relatoria do Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, publicado em 18/09/2009). 4. Agravo regimental não provido. ..EMEN: (AGARESP 201400259520, MAURO CAMPBELL MARQUES, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:09/06/2014 ..DTPB:.)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ASTREINTES. AGENTE POLÍTICO QUE FOI PARTE NO POLO PASSIVO DA AÇÃO, BEM COMO TEVE SUA RESPONSABILIDADE PESSOAL ATESTADA NA ORIGEM. CABIMENTO DA MULTA DIÁRIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DE DISPOSITIVO TIDO COMO VIOLADO. SÚMULAS 282 E 356 DO STF, APLICÁVEIS POR ANALOGIA. COISA JULGADA. PRETENSÃO DE REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. DIVERGÊNCIA NÃO DEMONSTRADA. 1. O ora agravante, à época Secretário de Estado da Administração e dos Recursos Humanos do Governo do Rio Grande do Norte, foi condenado, ante sua responsabilidade pessoal, pela Corte de origem ao pagamento de astreintes devido ao não cumprimento imediato de determinação judicial no bojo de mandado de segurança do qual ele foi, efetivamente, parte impetrada. 2. A matéria não analisada no julgado a quo cujo debate não foi suscitado pela oposição de embargos declaratórios naquela instância encontra óbice nas Súmulas 282 e 356 do STF, aplicáveis por analogia. 3.
As astreintes podem ser direcionadas pessoalmente às autoridades ou aos agentes responsáveis pelo cumprimento das determinações judiciais, em particular quando eles foram parte na ação. Precedentes: AgRg no AREsp 472.750/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe 9/6/2014; e REsp 1.111.562/RN, Rel. Min. CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe 18/9/2009
. 4. O reexame de violação da coisa julgada implica nova análise do acervo fático-probatório, sendo obstado pela Súmula 7/STJ. 5. A divergência jurisprudencial é incognoscível quando o caso não apresenta similitude com as situações fáticas descritas nos paradigmas colacionados. Agravo regimental improvido. ..EMEN: (AGRESP 201301740875, HUMBERTO MARTINS, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:30/10/2014 ..DTPB:.)
Reporto-me também ao seguinte julgado, emanado do TRF4:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MANUTENÇÃO DE RODOVIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. DEFERIMENTO. MULTA POR DESCUMPRIMENTO. IMPOSIÇÃO À FAZENDA E AO AGENTE PÚBLICO. 1. Com a edição da MP 82/02, a princípio, havia um interesse em repassar a malha rodoviária federal para os Estados, com o escopo óbvio de redução de gastos. Posteriormente, a intenção do Governo Federal se modificou, vindo a vetar integralmente o Projeto de Lei de Conversão nº 3, de 2003 (MP no 82/02), por contrariar o interesse público. Esta mudança de entendimento importa, ao que parece, em assunção de responsabilidade pela manutenção das estradas, por parte da União Federal, já que se mostra inequívoco o propósito de reaver o domínio das rodovias que foram objeto de transferência pela aludida Medida Provisória. 2. O Superior Tribunal de Justiça já lançou o entendimento de que é possível ao juiz, ex officio ou por meio de requerimento da parte, a fixação de multa diária cominatória (astreintes) contra a Fazenda Pública, em caso de descumprimento de obrigação de fazer. 3.
Por outro lado, vale registrar que, a aplicação de astreintes à Fazenda Pública é pouco eficaz como meio de coerção psicológica, já que sujeitas ao regime de precatório. Tal coerção somente seria mais eficiente se incidisse sobre o agente que detém responsabilidade direta pelo descumprimento da ordem, descumprimento este que gera imediatos efeitos penais e administrativos
. (AG 200604000197247, VÂNIA HACK DE ALMEIDA, TRF4 - TERCEIRA TURMA, D.E. 28/03/2007.)
Nesse âmbito, remanesce o dilema, não raro, de se viabilizar o enriquecimento sem causa de uma das partes, depois de ter obtido o bem da vida demandado em juízo (ainda que com atraso), ou se estimular uma cultura de descumprimento de ordens judiciais, na crença de que, em caso de renitência, o Juízo poderá sempre exonerar a parte faltosa quanto ao pagamento da multa diária. Daí que é necessária certa
phronesis
na apreciação do tema, tomando-se sempre em conta as vicissitudes presentes em cada caso.
2.36. Alcance da súmula 410 - STJ:
Ao publicar a súmula 410, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que
"
A prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer
."
A mencionada súmula denota um especial cuidado com o demandado, dados os impactos decorrentes da fixação de
astreintes
em seu desfavor. Teme-se que, do contrário, a reiteração das multas diárias ocorra à sorrelfa do demandado. Ao mesmo tempo, reputa insuficiente a intimação do(a) advogado(a), conquanto para inúmeros outros temas - até mesmo o início do cumprimento de sentença - essa intimação na pessoa do procurador constituído pela parte se revele adequada.
Sabe-se que a mencionada súmula 410, STJ, decorreu da jurisprudência consolidada em decorrência da
leis 11.232/2005 e 11.382/2006
. Note-se que a lei 11.232/2005 unificou, em alguns casos, os processos de conhecimento e de execução, convertendo-a em mero desdobramento do primeiro, e acrescentou ao Código de Processo Civil de 1973 o art. 475-J, cominando multa de 10% ao devedor que não cumprisse voluntariamente a obrigação de pagar quantia certa. Os Tribunais deliberaram, então, que o alegado devedor deveria ser intimado na pessoa de seu advogado, por publicação na imprensa oficial, para cumprir a obrigação de pagar quantia certa a que fora condenado, no prazo legal (STJ, REsp nº 940.274/MS).
Por seu turno, a lei 11.382/2006 inseriu ao art. 652, §4º, do Código de Processo Civil de 1973, preconizando que, nas execuções por quantia certa, para indicação de bens à penhora, o devedor seria intimado na pessoa de seu advogado, fazendo-se tal intimação pessoalmente somente caso não possuísse procurador constituído no processo. Isso eclodiu no entendimento, já mencionado acima, de que- para fins de cumprimento de obrigação de pagar quantia certa - bastaria a a intimação do devedor na pessoa do seu advogado. Esse entendimento passou a ser aplicado analogicamente também às obrigações prestacionais, sob o fundamento de não haver distinção entre o ato de pagar e o ato de fazer que justificasse diferenciação entre a forma de intimação da parte em um e outro caso. Sustentou-se que a multa cominatória seria exigível mesmo se o devedor fosse intimado na pessoa de seu advogado, conforme intelecção dispensada ao art. 461, CPC/73.
Por força das 11.232/2005 e 11.382/2006, a 2. Seção do Superior Tribunal de Justiça, por época do julgamento dos
EAg nº 857.758/RS
, de 23.02.2011, sustentou que o entendimento consolidado na súmula nº 410/STJ estaria superado. Bastaria, assim, a intimação do(a) advogado(a) do executado, para constituição do termo inicial do cômputo da multa, sem necessidade de intimação pessoal do demandado. Nesse sentido, leia-se REsp nº 1.121.457/PR.
PROCESSO CIVIL. CONDENAÇÃO A OBRIGAÇÃO DE FAZER. 'ASTREINTE'. 'DIESA QUO'. ENUNCIADO 410 DA SÚMULA/STJ. APARENTE CONFLITO COM O PRECEDENTE FORMADO NO JULGAMENTO DO EAG. 857.758/RS. HARMONIZAÇÃO.DIREITO INTERTEMPORAL. 1.
No julgamento do EAg 857.758/RS ficou estabelecido que, diante do panorama processual estabelecido a partir da Lei 11.232/2005, seria desnecessária a intimação pessoal da parte para que se iniciasse o prazo de que disporia para cumprir uma obrigação de fazer. A exemplo do que ocorre em obrigações de pagar quantia certa, também as obrigações de fazer seriam automaticamente eficazes, contando-se o prazo de que a parte dispõe para cumpri-las antes de incidente a multa diária a partir do trânsito em julgado da sentença, em primeiro grau, ou da publicação do despacho de 'cumpra-se', na hipótese em que a sentença tenha sido impugnada mediante recurso
. 2. Para as obrigações anteriores ao novo regime processual, contudo,permanece a orientação estabelecida no Enunciado 410 da Súmula/STJ,ou seja: a intimação pessoal da parte é imprescindível para que se inicie a contagem do prazo de que dispõe para cumprir a obrigação de fazer ou de não fazer sem incorrer em multa diária. 3. Na hipótese dos autos, a sentença transitou em julgado antes de promulgada a Lei 11.232/2005, de modo que a intimação pessoal da parte seria imprescindível. 4. Recurso especial conhecido e não provido. (STJ - REsp: 1121457 PR 2009/0020178-7, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 12/04/2012, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/04/2012)
Em 2013, contudo, a 2. Seção do Superior Tribunal de Justiça revisou o entendimento exarado ao julgar os
EAg nº 857.758/RS
, por meio do julgamento do
REsp nº 1.349.790/RJ
. O STJ enfatizou, então, que a Súmula nº 410/STJ manter-se-ia hígida, de modo que a prévia intimação pessoal do devedor continuaria sendo uma condição necessária para a cobrança da multa cominatória pelo descumprimento da obrigação de fazer ou não fazer.
Com a publicação do Código de Processo Civil de 2015, seu artigo 513, §2º, I dispôs que a intimação do devedor para o cumprimento de sentença deve se dar mediante publicação no Diário da Justiça, na pessoa de seu advogado, superando aparentemente a Súmula nº 410/STJ. O tema foi submetido à Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, por força dos embargos de divergência em REsp nº 1.360.577/MG. A Corte sustentou ser
“necessária a prévia intimação pessoal do devedor para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, antes e após a edição das Leis nº 11.232/2005 e 11.382/2006, nos termos da Súmula 410 do STJ, cujo teor permanece hígido também após a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil."
Desde então, o Superior Tribunal de Justiça tem promovido reiterada aplicação da súmula 410, mesmo após a vigência do Código de Processo Civil de 2015
. Nesse sentido, é relevante notar que os Ministros Herman Benjamin e Nancy Andrighi, que votaram contrariamente ao posicionamento adotado pela Corte Especial no julgamento dos EREsp nº 1.360.577/MG, proferiram julgados posteriores submetendo-se ao entendimento firmado pelo Colegiado, a exemplo dos julgados REsp nº 1.798.900/SP e o AgInt no REsp nº 1.509.707/MG.
Atente-se para o julgado abaixo, datado de 2022:
PROCESSUAL CIVIL. OBRIGAÇÃO DE FAZER, COM COMINAÇÃO DE ASTREINTES. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO EXECUTADO. SÚMULA 410 DO STJ. 1. "
É necessária a prévia intimação pessoal do devedor para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer antes e após a edição das Leis n. 11.232/2005 e 11.382/2006, nos termos da Súmula 410 do STJ, cujo teor permanece hígido também após a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil" (EREsp 1.360.577/MG, Rel. Ministro Humberto Martins, Rel. p/ Acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 7.3.2019). 2. "Esta Corte Superior de Justiça possui entendimento sumulado reconhecendo que"a prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer"(enunciado da Súmula 410 do STJ), ao passo que o e-mail enviado à executado não substitui a intimação pessoal a ser realizada pelo judiciário
" ( AgInt no AREsp 1.470.751/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 30.9.2019) 3. Agravo Interno não provido. (STJ - AgInt no REsp: 1965390 SP 2021/0283735-4, Data de Julgamento: 09/05/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/06/2022)
O entendimento consolidado na
súmula 410, STJ
, continua hígido e deve ser privilegiado pelo presente Juízo, diante dos arts. 927 e 489, §1º, VI, CPC, alvo dos lúcidos comentários de Araken de Assis:
"Por mais de uma razão só em sentido amplíssimo mostra-se possível conceber o julgamento segundo a legalidade, conseguintemente, a obediência do juiz à lei. O juiz não deve contas unicamente à sua consciência e aos pendores do senso de justiça próprio. Não julga porque quer, nem recebeu investidura nesse sentido. O Estado outorgou-lhe esse poder, consoante o modelo constitucional, exigindo-lhe modesta contrapartida: obediência ao ordenamento jurídico, principalmente à lei, ou seja, ao direito vigente no Estado, na sua inteireza, especialmente quanto às fontes formais do Poder Legislativo. E impõe essa exigência por razão básica, mas fundamental: a conduta prescrita aos particulares e aos agentes públicos e conhecida prévia e abstratamente nas normas legais, e o próprio juiz, o mais importante órgão estatal, não se furta desses comandos. O problema da legitimidade democrática da criação judicial não pode ser resolvidos pelos controles internos da magistratura, porque esses são exercidos por outros juízes.
Em matéria de previsibilidade dos pronunciamentos judiciais, e, portanto, de segurança e de certeza, que constituem o cimento imprescindível à ordem jurídica justa, a súmula vinculante significou notável avanço, agora acompanhado dos precedentes no julgamento dos casos repetitivos (art. 928, I e II). E, perante a súmula vinculante e o precedente, a obediência à lei (ou antes, à consciência da pessoa investida na função judicamente) não serve de pretexto hábil ao seu descumprimento
.
À primeira vista,as operações intelectuais do órgão judiciário, perante o verbete, não se distinguiriam das feitas para aplicar o direito objetivo. Embora a aplicação da súmula vinculante e do precedente não seja mecânica e automática, pois a adequação da tese jurídica à questão de fato depende de interpretação, ensejando pronunciamento alternativo, tal questão não toca o ponto.
E, com efeito, se a tese jurídica consagrada na súmula e no precedente rege a espécie litigiosa, todavia, ao órgão judiciário faltará a liberdade de aplicá-la, ou não. É imperativo que a aplique ao objeto litigioso. Ficará impedido de rejeitá-la, oferecendo sua própria interpretação da questão constitucional. E deixando de aplicá-la, estritamente, ensejará a reclamação prevista no art. 103, §3º, CF e no art. 988, NCPC. O acolhimento da reclamação implicará nulidade do provimento contrário à súmula. Desaparece, correlatamente, a independência do juiz.
Essa situação de modo algum equivale à submissão do juiz ao ordenamento jurídico subentendida no art. 8º. O juiz é livre para negar aplicação à lei e para interpretá-la a seu modo, adotando entendimento minoritário ou vencido, o que nunca ocorrerá perante uma súmula vinculante ao precedente. Em suma, a liberdade de interpretação fica restrita à adequação da tese jurídica ao material de fato (art. 489, §1º, VI) e desaparece a liberdade de aplicação
." (ASSIS,
Araken
.
Processo civil brasileiro.
Volume II - Tomo I. Parte geral. Institutos Fundamentais. Sâo Paulo: RT, 2015, p. 926-927)
2.37. Aplicação da súmula 410, STJ:
Tudo conjugado, em que pese as ressalvas acima, em princípio as
astreintes
são devidas a partir da data da intimação pessoal dos requeridos. Deve-se apreciar, no momento oportuno, se o art. 5 da lei n. 11.419/2006 implicou superação desse entendimento, no âmbito do processo eletrônico.
Anoto que isso não se aplica, porém, à multa prevista no art. 523, CPC, como se infere da própria origem da súmula 410, STJ
. No que toca às
astreintes,
caso a intimação/notificação pessoal ainda não tenha ocorrido, oportunamente deverá ser expedido o documento necessário para isso que seja feito. Em situações em que se revele inviável a intimação pelo sistema eletrônico, deve-se aplicar o art. 5º, §5º, da mencionada lei n. 11.419/2006:
"
Nos casos urgentes em que a intimação feita na forma deste artigo possa causar prejuízo a quaisquer das partes ou nos casos em que for evidenciada qualquer tentativa de burla ao sistema, o ato processual deverá ser realizado por outro meio que atinja a sua finalidade, conforme determinado pelo juiz
."
PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO - INCLUSÃO EM PAUTA - URGÊNCIA - REGULAMENTAÇÃO DAS INTIMAÇÕES. Dispõe o parágrafo 5º artigo 5º da Lei nº 11.419/2006, que regulamenta as intimações no Processo Judicial Eletrônico: "
Nos casos urgentes em que a intimação feita na forma deste artigo possa causar prejuízo a quaisquer das partes ou nos casos em que for evidenciada qualquer tentativa de burla ao sistema, o ato processual deverá ser realizado por outro meio que atinja a sua finalidade, conforme determinado pelo juiz
." (TRT-3 - RO: 00111191620135030091 MG 0011119-16.2013.5.03.0091, Relator: Jales Valadao Cardoso, Data de Julgamento: 19/03/2014, Segunda Turma, Data de Publicação: 20/03/2014. DEJT/TRT3/Cad.Jud. Página 98. Boletim: Não.)
2.38.
Atualização monetária - considerações gerais:
No que toca à correção monetária, a
"Dívida em dinheiro é a que se representa pela moeda considerada em seu valor nominal, isto é, pelo importe econômico nela numericamente consignado. É aquela contraída em determinada moeda, e que deve ser adimplida pelo valor estampado na sua face, consistindo, assim, na mais acabada expressão do nominalismo."
(MARTINS-COSTA, Judith.
Comentários ao novo Código Civil.
Arts. 304-388. Vol. V. Tomo I. 2. ed. RJ: Forense, 2005, p. 251).
Uma nota promissória insuscetível de correção monetária retrataria, a bem da verdade, uma espécie de obrigação de entregar quantum certo, a despeito da sua efetiva capacidade aquisitiva. Mas não é o que ocorre com o adimplemento tardio, pela União Federal, de obrigações para com os servidores do povo lotados nos seus quadros.
Judith Martins-Costa enfatiza, todavia, que
"A expressão dívida de dinheiro não representa, pois, nem o valor material no qual expressa a unidade monetária, nem o valor de compra de produtos ou o valor de serviços, nem objetiva, nem subjetivamente. Ela é, simplesmente, a forma material de uma vinculação monetária, vinculação abstrata e, por isso, apta a comprar e a pagar tudo o que pode ser objeto de patrimônio. É este, diz El-Gamal, o segredo que lhe permite desempenhar as funções prodigiosas nas relações econômicas. Sendo assim, força é concluir que o dinheiro não tem um valor em si, e o que se chama de valor da moeda é o nível geral dos preços, dos produtos e dos serviços, o que não é matéria concernente ao sistema monetária, mas ao sistema econômico."
(MARTINS-COSTA.
Obra citada.
p. 252).
Ora, nas dívidas de valor (
Wertschuld
),
"a moeda não constitui o objeto da dívida. São débitos que visam assegurar ao credor um
quid
e não um
quantum,
uma situação patrimonial determinada e não um certo número de unidades monetárias. Assim, nas dívidas de valor, a quantia em dinheiro é apenas a representação ou tradução transitória, num determinado momento, do valor devido. Variando o poder aquisitivo da moeda, o valor necessário para alcançar a finalidade do débito sofre uma modificação no seu
quantum
monetário, impondo-se, pois, um reajustamento. Em conclusão: enquanto nas dívidas de dinheiro, o
quantum
é o único objeto do débito, nas dívidas de valor, a soma de dinheiro é a quantia correspondente, nas condições atuais, a determinar o poder aquisitivo que o devedor se obrigou a fornecer ao credor."
(WALD, Arnoldo. A teoria das dívidas de valor e as indenizações decorrentes de responsabilidade civil
in
Revista da Procuradoria do Estado do Rio de Janeiro.
Volume 23, 1970, p. 22).
Ademais, atente-se para o conteúdo da súmula 9 do eg. TRF4:
"Incide correção monetária sobre os valores pagos com atraso, na via administrativa, a título de vencimento, remuneração, provento, soldo, pensão ou benefício previdenciário, face à sua natureza alimentar. "
Semelhante é o conteúdo da súmula 38/2008 da AGU, datada de 16.09.2008:
"Incide a correção monetária sobre as parcelas em atraso não prescritas, relativas aos débitos de natureza alimentar, assim como aos benefícios previdenciários, desde o momento em que passaram a ser devidos, mesmo que em período anterior ao ajuizamento de ação judicial."
2.39.
Fator de correção - período anterior à EC 113/21:
Compartilho do entendimento verbalizado pela Suprema Corte, ao apreciar as ADIns 4357 e 4425. Por conseguinte, reputo inconstitucional a imposição da variação da taxa referencial básica como fator de correção das dívidas estatais (art. 1º-F, lei 9.494/1997 c/ lei 11.960/2009).
Anoto que a lei 12.919/2013 preconizou a utilização do IPCA-E para fins de correção dos precatórios judiciais - art. 27.
Por sinal, o Superior Tribunal de Justiça fixou aludido entendimento, ao apreciar o
REsp n. 1.492.221/PR
, rel. Min. Mauro Campbell Marques, cuja ementa transcrevo. Desse modo, a variação do IPCA-E há de ser adotada como critério de atualização monetária quanto ao período anterior à publicação da Emenda Constitucional 113, de 2021.
2.40. Fator de correção das multas - EC 113/2021:
Sabe-se que a EC nº 113/2021, em seu art 3°, determinou o emprego da taxa SELIC para atualização e compensação da mora.
"Art. 3º
Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente
."
Guardo, é fato, dúvidas quanto à constitucionalidade do aludido indexador. Menciono, por exemplo, o estudo do Ministro do STJ, Franciulli Neto, conforme se lê FRANCIULLI NETO, Domingos: Da Inconstitucionalidade da taxa SELIC para fins tributários in
Revista Dialética de Direito tributário.
São Paulo. n. 58, p. 7-30, jul. 2000.
Em sentido semelhante, atente-se para o RESP 200101461855, LAURITA VAZ, STJ - SEGUNDA TURMA, DJ DATA:28/03/2006 PG:00201:
'(...)
A Taxa SELIC para fins tributários é, a um tempo, inconstitucional e ilegal. Como não há pronunciamento de mérito da Corte Especial deste egrégio Tribunal que, em decisão relativamente recente, não conheceu da argüição de inconstitucionalidade correspectiva (cf. Incidente de Inconstitucionalidade no REsp 215.881/PR), permanecendo a mácula também na esfera infraconstitucional, nada está a empecer seja essa indigitada
Taxa proscrita do sistema e substituída pelos juros previstos no Código tributário (artigo 161, § 1º, do CTN). O Codex tributário, ao disciplinar, em seu art. 167, a restituição de tributos, determinou a incidência de juros moratórios, na mesma intensidade que aqueles aplicados nos casos de mora do contribuinte e previstos no § 1º do art. 161, ou seja, no percentual de 1% ao mês. Se basta a declaração do contribuinte para o nascimento do débito perante o Poder Público, com a conseqüente aplicação das penalidades por eventual atraso no pagamento, quando o tributo é pago regularmente pelo contribuinte, mas indevidamente cobrado pelo Fisco, naturalmente deve incidir a mesma punição, diante da regra de isonomia. Não se pode dizer que o pagamento dos tributos cujo lançamento se dá por homologação depende unicamente da iniciativa do contribuinte, uma vez que 'o pagamento de tributo é espontâneo, na medida em que decorre de lei que deve ser cumprida compulsoriamente' (REsp 146.568/MG, Rel. Min. Ari Pargendler, DJU 9.12.1997). Julgamento deste recurso especial em 07 de novembro de 2002. Recurso especial provido em parte, para afastar a incidência da Taxa SELIC e determinar a aplicação de juros moratórios a partir do trânsito em julgado. ..EMEN:' (RESP 200101461855, LAURITA VAZ, STJ - SEGUNDA TURMA, DJ DATA:28/03/2006 PG:00201 ..DTPB:.)
Em princípio, as mesmas críticas formuladas pelo STF, ao apreciar a ADin 493-0 (insurgência contra a aplicação da TRB para a correção de dívidas do SFH) e as ADIs 4425 e 4357(insurgência contra a aplicação da TRB como critério de correção monetária dos precatórios) são oponíveis à SELIC.
Também é certo, porém, que a jurisprudência predominante sobre o tema tem aplicado aludido fator de indexação para fins de atualização monetária da repetição de indébitos tributários, por força do art. 39, §4º, da lei 9.250, de 1995, ou como juros moratórios. Tramita perante a Suprema Corte a ADI ADI 7.047, deflagrada pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT, impugnando a aludida EC nº 113/2021. A causa foi distribuída à relatoria da Min. Rosa Weber.
Ao que consta, o pedido de antecipação de tutela ainda não foi apreciado pelo Supremo Tribunal.
Logo, a Emenda Constitucional 113 deve ser aplicada, até eventual ordem em sentido contrário por parte do STF
. Assim, salvo eventual deliberação em contrário por parte dos Tribunais, é fato que, quanto ao período subsequente à publicação da EC 113, de 08 de dezembro de 2021, o débito em debate neste processo deve ser atualizado pela variação da taxa SELIC.
Quanto ao último mês do pagamento, não estando definida a SELIC, deve-se aplicar 1% (um por cento) ao mês, de modo linear e
pro rata die,
a título de correção monetária, conforme lógica do art. 39, §4, da lei n. 9.250, de 26 de dezembro de 1995
.
2.41.
Aplicação da
SELIC
e coisa julgada:
A aplicação da SELIC pode se revelar controversa
, por conta dos limites do acórdão transitado em julgado, em cujo âmbito foi imposto o IPCA-E. Isso se deu antes da promulgação da EC 113, devendo-se apurar, caso se faça necessário, se tal emenda teria o condão de alterar o indexar em questão.
A questão está em saber se aludida EC 113/2021 poderia incidir validamente no caso, ou se isso afrontaria a coisa julgada, garantia constitucional (art. 5, XXXV, Constituição) e cláusula pétrea (art. 60, §4, Constituição Federal). Melhor dizendo, deve-se examinar se a cláusula de eternidade veda apenas a supressão em abstrato da garantia da coisa julgada ou se ela impede que emendas constitucionais modifiquem critérios estipulados em sentença transitada em julgado.
Debate semelhante já foi entabulado no âmbito dos contratos, tendo em conta a garantia do respeito ao ato jurídico perfeito, conforme art. 6 do decreto 4.657/1942.
"A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. (Redação dada pela Lei nº 3.238, de 1957) § 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou."
Nesse âmbito contratual, ao apreciar a ADI 493-0, versando sobre a lei n. 8.177/1991, responsável pela criação da taxa referencial básica e imposição do indexador aos pactos em curso, o STF enfatizou que nem mesmo normas de ordem pública poderiam alterar avenças celebradas antes da sua vigência. No seu voto, o Min. Reltor Moreira Alves discorreu sobre as hipóteses de retrotividade da lei e concluiu que, como regra, leis poderiores não poderiam alterar contratos em curso, sem que houvesse consenso entre ambos os pactuantes. Sem dúvida também que aludida restrição tem sido excepcionada em vários casos, notadamente quando há alteração de critérios de correção monetária, alteração do padrão monetário (p.ex., promovido pelo Plano Real - lei 9.069/1995, que atingiu pactos negociados antes da publicação da referida lei etc.).
2.42.
Termos inicial e final dos honorários sucumbenciais:
O valor dos honorários deve ser pago de modo corrigido. Dado que foi fixado tomando por base o valor da causa, o termo inicial da correção recai na data da distribuição da peça inicial, com aplicação do IPCA-E. O termo final da aplicação do IPCA-E recai em 07 de dezembro de 2021, inclusive.
Quanto ao período de 08 de dezembro de 2021, inclusive, até o efetivo pagamento, deve ser aplicada a taxa SELIC. Caso seja aplicada a SELIC, quanto ao mês de pagamento, não estando definida a taxa SELIC, deverá ser aplicado 1% (um por cento) ao mês, de modo linear e
pro rata die,
a título de correção, conforme aplicação analógica do art. 39, §4, da lei n. 9.250/1995. O pagamento deve ser promovido
na forma dos arts. 523 e ss., CPC.
2.43.
Termos inicial e final da correção - multas diárias:
As
astreintes
devem ser pagas de modo corrigido, de modo a preservar seu poder aquisitivo. O
termo inicial da correção deve recair na data em que a multa tenha incidido - ou seja, em série histórica. A incidência se dá no exato momento de caracterização do atraso dos requeridos no cumprimento da antecipação de tutela, observados os prazos da sentença.
Termo final da correção, data do efetivo pagamento. Caso seja aplicada a SELIC, quanto ao mês de pagamento, não estando definida a taxa SELIC, deverá ser aplicado 1% (um por cento) ao mês, de modo linear e
pro rata die,
a título de correção, conforme aplicação analógica do art. 39, §4, da lei n. 9.250/1995.
2.44. Termo inicial e final da correção - danos morais:
Quanto aos danos morais coletivos, o termo
inicial da correção deve recair na data da prolação da sentença, conforme lógica da súmula 362, STJ. Aludida súmula, conquanto concebida para a reparação de danos morais individuais, também se aplica ao danos de reparação de danos coletivos, dada a ausência de algum fator a exigir solução distinta.
Aplicação do IPCA-E com termo inicial na data da prolação da senteança e termo final em 07 de dezembro de 2021. Aplicação da SELIC quanto ao período de 08 de dezembro de 2021 em diante, até efetivo pagmaento.
Quanto ao mês de pagamento, não estando definida a taxa SELIC, deverá ser aplicado 1% (um por cento) ao mês, de modo linear e
pro rata die,
a título de correção, conforme aplicação analógica do art. 39, §4, da lei n. 9.250/1995.
2.45. Juros moratórios - considerações gerais:
Ao contrário do que ocorre com juros remuneratórios e juros compensatórios, os juros moratórios destinam-se a reparar danos causados pela mora, como explicita Luiz Antônio Scavone Júnior:
"
Como os juros moratórios decorrem da mora, mister se faz verificar brevemente alguns conceitos do instituto, necessários ao seu entendimento. Para a doutrina clássica, a mora era considerada apenas o retardamento culposo em pagar o que se deve e receber o que é devido
: mora est dilatio culpa non carens debiti solvendi, vel credito accipiendi. Segundo Agostinho Alvim, a mora nada mais é do que o não pagamento culposo, bem como a recusa de receber no tempo, lugar e forma devidos. De fato, no direito pátrio, o art. 955, Código Civil/1916, estabeleceu que se encontra em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que o não quiser receber no tempo, lugar e forma convencionados (.... forma que a lei ou a convenção estabelecer, de acordo com o art. 394, Código Civil de 2002)."
(SCAVONE JR., Luiz Antônio.
Juros no direito brasileiro.
São Paulo: RT, 2003, p. 101-102)
Ainda segundo Scavone,
"
A mora do devedor se dá pela imperfeição no cumprimento da obrigação, seja pelo retardamento culposo seja pela imperfeição que atinge o lugar ou a forma convencionados. Sendo assim, não só o pagamento ou o recebimento intempestivos configuram a mora, mas, igualmente, o pagamento ou o recebimento em outro lugar ou por outra fora, que não o contratados
."
(SCAVONE.
Obra citada.
p. 98). Ou seja,
"Os juros moratórios convencionais ou legais são aqueles que decorrem do descumprimento das obrigações e, mais frequentemente, do retardamento na restituição do capital ou do pagamento em dinheiro."
(Obra citada. p. 95).
Note-se, por conseguinte, que os juros moratórios podem ser pactuadas, à semelhança do que ocorre com cláusulas penais. Não se cuidando de hipótese de cumprimento de avenças, pode-se cogitar também dos juros moratórios pré-fixados em lei, conforme art. 404, Código Civil.
Art. 404 - As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.
Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar.
Vê-se, portanto, que aludidos juros possuem possuem escopo indenizatório; por sinal, tem-se até mesmo reconhecido que os valores recebidos a tal título não chegaram a compor a base de cálculo do imposto de renda:
"TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IMPOSTO DE RENDA. PARCELAS RECEBIDAS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. INCIDÊNCIA. REGIME DE COMPETÊNCIA. ART. 12 DA LEI Nº 7.713/88. JUROS MORATÓRIOS. CARÁTER INDENIZATÓRIO.
O imposto de renda incidente sobre rendimentos pagos acumuladamente deve ser calculado com base nas tabelas e alíquotas vigentes à época a que se referiam tais rendimentos. Não são passíveis de incidência do imposto de renda os valores recebidos a título de juros de mora acrescidos às verbas definidas em ação judicial, por constituírem indenização pelo prejuízo resultante de um atraso culposo no pagamento de determinadas parcelas
. (APELREEX 50089680920114047110, IVORI LUÍS DA SILVA SCHEFFER, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, D.E. 14/08/2013.)"
Esse é um primeiro aspecto da questão. Por outro lado, convém atentar para a distinção entre mora
ex re
e mora
ex persona,
o que gravita em torno da necessidade de se constituir o devedor em mora, mediantes atos específicos de comunicação/notificação.
"A mora ex re se dá em razão de fato previsto em lei. Em consonância com o acatado, o art. 960 do Código Civil de 1916 e o art. 397 do Código Civil de 2002 determina que o inadimplemento de prestação positiva (dar ou fazer) e líquida (certa quanto à sua existência e determinada quanto ao seu objeto) - Código Civil de 1916, art. 1533, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor. Ou seja, havendo o dia de vencimento nessa espécie de obrigação (positiva e líquida), independentemente de qualquer atitude do credor, o devedor que não cumpre o avençado estará automaticamente constituído em mora, segundo a regra
dies interpellat pro homine.
No caso de obrigação negativa, também há mora ex re. Com efeito, a partir do momento em que o devedor da obrigação de não fazer pratica o ato que se obrigara a não praticar, estará em mora (Código Civil de 1916, art. 961 e art. 390 do CC/2002). Nesse caso, a mora confunde-se com o próprio inadimplemento absoluto
.
Por outro lado, a mora ex persona configura-se na hipótese da necessária providência do credor. O art. 960, segunda parte, CC/1916 determinava que não havendo prazo assinado, começa ela (a mora) desde a interpelação ou notificação.
No código civil de 2002, de acordo com o art. 397, parágrafo único, não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial. As obrigações ilíquidas também necessitam de providência do credor para a constituição do devedor em mora, nos termos do Código Civil de 2002, arts. 405 e 407."
(SCAVONE JR., Luiz Antônio.
Juros no direito brasileiro.
São Paulo: RT, 2003, p. 101-102)
Por outro lado, a legislação estipula que os juros moratórios são devidos desde a data da citação, conforme se infere do art. 240, CPC/15, esposando a distinção entre juros moratórios convencionais (p.ex., art. 292, I, CPC) e os juros moratórios legais (art. 322, §1º, CPC). Quando se trata de repetição de indébito tributário, a lei fixa como termo inicial da incidência de juros moratórios a data do trânsito em julgado da sentença condenatória (art. 167, CTN), o que também ocorre quanto aos honorários sucumbenciais arbitrados em valores fixos, na sentença (art. 85, §16, CPC). Também deve ser destacado o alcance da súmula 54, STJ, quando preconiza que
"Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual",
o que abrange os pedidos de responsabilização civil por atos ilícitos, ao invés de simples cobrança de valores não adimplidos tempestivamente.
Enfatizo que os juros podem ser exigidos, não raro, mesmo quando não tenham sido postulados expressamente na peça inicial, conforme art. 322, §1, CPC/15:
"Compreendem-se no principal os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive os honorários advocatícios."
A tanto converge a
súmula 254
, Supremo Tribunal.
2.46. Juros moratórios - honorários sucumbenciais:
No caso, os honorários sucumbenciais foram arbitrados antes da publicação do CPC/15, de modo que estavam regrados pelos arts. 20 e ss., Código de Processo Civil/1973. Eventuais juros moratórios sobre honrários se faziam devidos a partir da intimação para cumprimento.
No caso, a intimação para cumprimento se dá em momento em que já está sendo aplicada a taxa SELIC como fator de correção. Os Tribunais têm reiterado que a taxa SELIC já veicula, na sua composição, índices de correção e juros moratórios. Logo, se revela incabível a incidência autônoma de juros moratórios sobre honorários sucumbenciais, sob pena de
bis in idem
vedado pelo sistema jurídico.
"(...)
A correção monetária deve incidir sobre os valores pagos indevidamente desde a data do pagamento, sendo aplicável a UFIR (jan/92 a dez/95), e a partir de 01/01/96, deve ser computada somente a taxa SELIC, excluindo-se qualquer índice de correção monetária ou juros de mora (art. 39,§ 4º, da Lei nº 9.250/95)
. 14. No tocante à aplicação do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n.º 11.960, de 29 de junho de 2009, não pode ser critério de atualização de tributos. Contudo, deve ser aplicado na atualização do valor relativo à condenação nos honorários advocatícios, posto que não possui natureza tributária." (APELREEX 50036379820104047201, JOEL ILAN PACIORNIK, TRF4 - PRIMEIRA TURMA, D.E. 01/12/2011, omiti parte da ementa)
2.47. Juros moratórios - multas diárias:
Por outro lado, também se revela incabível a incidência de jurso moratórios sobre as multas-diárias, eis que ambos são instrumentos disuasórios. A incidência de juros moratórios em tal caso caracterizará
bis in idem,
constituindo-se em reforço indevido da multa.
Havendo necessidade, a multa pode ser exasperada. Não há necessidade, enfim, da incidência de juros moratórios em tal caso. Quando incidentes no curso do processo de conhecimento, por sinal, as multas apenas podem ser cobradas após o trânsito em julgado da sentença que as mantenha.
2.48. Juros moratórios - indenização:
Situação distinta ocorre com as indenizações. Nesse caso, conquanto a correção monetária seja devida desde a prolação da sentença - súmula 362, STJ -, os juros moratórios são devidos desde a data do dano ambiental, conforme súmula 54, STJ.
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL.
DANOS MORAIS COLETIVOS
. DEVER INDENIZATÓRIO RECONHECIDO . REVISÃO DO VALOR ARBITRADO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ . TERMO INICIAL DO JUROS DE MORA. SÚMULA 54/STJ. 1. A modificação do entendimento firmado, acerca do dever de indenizar por danos morais coletivos, na estreita via do recurso especial, encontra óbice na Súmula 7/STJ . 2. Em regra, não é cabível na via especial a revisão do montante que foi estipulado pelas instâncias ordinárias a título de indenização por danos morais, ante a impossibilidade de reanálise de fatos e provas por este Sodalício, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite, somente em caráter excepcional, que o quantum arbitrado seja alterado caso se mostre irrisório ou exorbitante, em clara afronta aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o que não se verifica na espécie. 3 . "
A conclusão do Tribunal a quo está em harmonia com a jurisprudência do STJ, firmada no sentido de que os juros moratórios, em caso de responsabilidade extracontratual, devem incidir a partir da data do evento danoso, nos termos da Súmula 54/STJ
" ( AgInt no AREsp 1.419.627/MS, Rel. Ministro MANOEL ERHARDT, DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF5, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/10/2021, DJe 14/10/2021) . 4. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no REsp: 1990643 PR 2022/0070372-4, Data de Julgamento: 22/11/2022, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/11/2022)
Logo, no caso, são devidos juros moratórios desde a data da primeira agressão ao ambiente documentada nos autos e reconhecida na sentença, a ser apurada pelas partes.
Quanto ao índice aplicável, registro a seguinte evolução legislativa. Sob a vigência do Código Civil de 1916 - art. 1.062, aplicavam-se juros de mora de 0,5% ao mês, de modo linear e
pro rata die.
A partir de 11 de janeiro de 2003, com a vigência do CC/2002, foi prevista a aplicação de juros moratórios de 1% ao mês, de modo linear e
pro rata die,
conforme enunciado 20 das Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal. O tema envolve certa polêmica, dado que, com lastro no art. 406, STJ, os Tribunais também aplicavam a taxa SELIC como indexador de juros moratórios.
A Medida Provisória 2.180-35/2001 introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, limitando os juros a 6% ao ano para verbas remuneratórias de servidores públicos. A lei n. 11.960/2006, conversão da MP 457/2009, determinou a incidência, a título de juros moratórios, dos mesmos juros remuneratórios aplicados à caderneta de poupança. Logo, do índice de 0,5% (meio por cento) ao mês, com a limitação prevista no 12, II, da lei n. 8.177/1991 - eis que, em conjunto, esses critérios concidem com os juros incidentes sobre a caderneta de poupança, reitero). A diferença pontual é que os juros da caderneta de poupança incidem de modo composto (6,17% ao ano), enquanto que os juros moratórios incidem de modo linear e
pro rata die
(exceção feita à SELIC, que também incide de modo composto).
Logo, aludidos critérios devem ser aplicados ao caso.
Termo inicial da incidência de juros moratórios sobre a indenização de danos morais coletivos: data da citação. Termo final: dia 07 de dezembro de 2021, eis que, a partir de então, aludidos juros já estarão incluídos na variação da SELIC, como registrei acima, sendo indevida a incidência concomitante, sob pena de
bis in idem.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. cumprimento de sentença.eletrobrás. TAXA selic. 6.3 JUROS MORATÓRIOS: Sobre os valores apurados em liquidação de sentença devem incidir, até o efetivo pagamento, correção monetária e juros moratórios a partir da citação:a) de 6% ao ano, até 11/01/2003 (quando entrou em vigor o novo Código Civil)- arts. 1.062 e 1.063 do CC/1916; b) a partir da vigência do CC/2002, deve incidir a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. Segundo a jurisprudência desta Corte, o índice a que se refere o dispositivo é a taxa SELIC. 7. NÃO CUMULAÇÃO DA TAXA SELIC:
Considerando que a taxa SELIC, em sua essência, já compreende juros de mora e atualização monetária, a partir de sua incidência não há cumulação desse índice com juros de mora. Não aplicação de juros moratórios na hipótese dos autos, em atenção ao princípio da non reformatio in pejus
. (TRF-4 - AG: 50218550520174040000 5021855-05.2017.4.04.0000, Relator: LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH, Data de Julgamento: 29/08/2017, SEGUNDA TURMA)
2.49. Majoração das
multas-diárias
no caso:
Registro que, quando arbitrada, a multa pode ser majorada, caso se faça necessário, conforme art. 537 com art. 296, CPC/15. A verba, se devida pelo requerido e paga, deve ser convertida em renda a favor da autora (art. 537, §2, CPC/15). Registro que aludido valor pode ser modulado, com sua redução, caso se revele excessivo, conforme art. 884, Código Civil/02.
A medida é modulável
, eis que se destina a dissuadir o renitente descumprimento de ordem judicial, impondo-se que seja majorada na medida em que destinatário do comando judicial dê ensejo a isso. Em um Estado Constitucional, exige-se que o Poder Judiciário tutela os direitos fundamentais com efetividade.
A modulação das
astreintes
é um instrumento indispensável para esse fim, considerando-se a pena cominada ao crime de desobediência - por sinal, inaplicável quando haja cominação de multa - e considerando a ausência, no geral, de mecanismos de
contempt of Court
em solo nacional
.
Sabe-se, por outro lado,
"A multa diária prevista no § 4º do art. 461 do CPC , devida desde o dia em que configurado o descumprimento, quando fixada em antecipação de tutela, somente poderá ser objeto de execução provisória após a sua confirmação pela sentença de mérito e desde que o recurso eventualmente interposto não seja recebido com efeito suspensivo"
(REsp nº 1.200.856 , Rel. Min. Sidnei Beneti , DJe 17/9/2014).
No caso em exame,
já esgotou-se há muito o prazo estipulado na sentença para que os requeridos cumprissem as determinações do Poder Judiciário. Por conta disso, MAJORO a multa para R$ 1.000,00 (um mil reais) para cada dia de descumprimento injustificado da medida, sem prejuízo da cobrança das multas já incorridas pelos demandados.
Aludida multa há de incidir de modo individualizado sobre cada um dos demandados, não se cuidando de obrigação solidária. Logo, é ônus de cada executado adotar medidas para cumprir o julgado, apresentando justificativas consistentes em caso de impossibilidade, atentando para o conceito de caso fortuito e força maior (art. 393, parágrafo único, Código Civil).
2.50 Execução das astreintes:
Dado que a sentença já transitou em julgado, é dado ao IBAMA promover desde logo o cumprimento de sentença quanto às multas incorridas pela empresa, atentando para os mecanismos de satisfação de obrigações.
2.51. Prazo para impugnação do cumprimento de sentença:
Acrescento que, no caso, o prazo para impugnação ao cumprimento de sentença já se esgotou, conforme arts. 525, CPC - cumprimento de obrigação de pagar quantia certa - e arts. 536 e ss., CPC - cumprimento da obrigação de fazer.
A parte requerida incorreu em preclusão quanto ao tópico, de modo que eventuais impugnações restam adstritas à eventual penhora, arrematação de bens, sem prejuízo da conferência dos prazos para tanto previstos.
2.52.
H
onorários
-
cumprimento
de sentença:
Em regra, devem ser arbitrados honorários de sucumbência em fase de cumprimento de sentença, conforme se infere do art. 85, §1, CPC:
"São devidos honorários advocatícios na reconvenção,
no cumprimento de sentença
, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente."
Deve-se atentar para o art. 85, §7, CPC:
"
Não serão devidos honorários no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública que enseje expedição de precatório, desde que não tenha sido impugnada
."
Nos casos de cumprimentos de sentença que ensejem a expedição de requisições de pequeno valor - RPV
, na forma do art. 100, Constituição, em princípio, a parte demandada deveria suportar o pagamento de honorários, conforme leitura
a contrario sensu
do referido dispositivo legal:
PREVIDENCIÁRIO. CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DE SENTENÇA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. RESISTÊNCIA NÃO OFERECIDA. FAZENDA PÚBLICA. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. DESCABIMENTO. 1. Como regra geral, é cabível a fixação dos honorários advocatícios de sucumbência, na fase de cumprimento de sentença, seja ela provisória ou definitiva e nas hipóteses em que houve resistência ou não do executado, por força do princípio da causalidade, diante da ausência de cumprimento espontâneo da obrigação. 2. Ocorre que tal premissa é excepcionada nos casos em que a Fazenda Pública figura como ente devedor, segundo preceitua o § 7º do artigo 85 do CPC: § 7º
Não serão devidos honorários no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública que enseje expedição de precatório, desde que não tenha sido impugnada. (...)” . Nesse contexto, tratando-se de execução contra a Fazenda Pública, oriunda de demanda individual, é devida a fixação de honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença nas hipóteses em que há impugnação da Fazenda Pública. 3. Em sentido análogo, uma vez que, no caso concreto, instaurado o cumprimento provisório do julgado, o ente autárquico não ofereceu qualquer resistência no tocante à reativação da citada benesse, é descabida a fixação dos honorários sucumbenciais
. 4. Agravo não provido. (TRF-3 - AI: 50138075020184030000 SP, Relator: Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES, Data de Julgamento: 23/02/2021, 7ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 05/03/2021)
Note-se, porém, que, no curso de 2024, o STJ consolidou entendimento distinto:
"
Na ausência de impugnação à pretensão executória, não são devidos honorários advocatícios sucumbenciais em cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública, ainda que o crédito esteja submetido a pagamento por meio de requisição de pequeno valor
."
(tema 1.190, STJ).
Por outro lado, não raro, quando cabível, o arbitramento de honorários ao início do procedimento é promovido com caráter precário
, dado que o valor pode se revelar indevido (
súmula 519, STJ
), superior ou inferior ao devido. A decisão promovida ao início do processo de execução/cumprimento do julgado não enseja preclusão
pro iudicato,
dado que o tema pode e deve ser revisto ao se apreciar os argumentos dos contendores, a respeito da quantia a que realmente faz jus o demandante.
Reporto-me aos seguintes julgados:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PRECLUSÃO DA DECISÃO QUE FIXOU HONORÁRIOS PROVISÓRIOS AFASTADA. PROPOSTA DE PAGAMENTO ESPONT NEO. REJEIÇÃO PELO CREDOR. DIVERGÊNCIA NOS CRITÉRIOS DE CÁLCULO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DEVIDOS. BASE DE CÁLCULO. VALOR CONTROVERTIDO. I -
Alegação de preclusão da primitiva decisão que fixou honorários advocatícios sobre o valor da condenação afastada. II - Proposta de pagamento espontâneo - execução invertida - rejeitada pelo credor por discordar dos critérios utilizados pela Fazenda Pública no cálculo
. III - Divergência nos parâmetros dos cálculos apresentados pelas partes a ser resolvida em sede de cumprimento de sentença. Situação que descaracteriza a hipótese de execução invertida. IV - Honorários advocatícios devidos. Verba a ser arbitrada sobre o valor controvertido. Aplicação sistemática do disposto nos arts. 523, §§ 1º e 2º; 534, § 2º; e, 535, § 4º, todos do CPC/15. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70075065367, Vigésima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Pippi Schmidt, Julgado em 05/12/2017). (TJ-RS - AI: 70075065367 RS, Relator: Ricardo Pippi Schmidt, Data de Julgamento: 05/12/2017, Vigésima Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 13/12/2017)
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PLEITO PARA QUE SE DETERMINE O PAGAMENTO IMEDIATO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM RAZÃO DA APRESENTAÇÃO DE IMPUGNAÇÃO PELA FAZENDA PÚBLICA. DESCABIMENTO. IMPUGNAÇÃO QUE SEQUER FOI JULGADA. SUCUMBÊNCIA DO ENTE PÚBLICO NÃO CONFIGURADA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. 1. Nos processos executivos os honorários sucumbenciais são fixados desde o despacho de “cite-se” ou da intimação da parte contrária, porquanto a intenção aqui é a de atender integralmente tanto a obrigação principal que emana do título executivo judicial ou extrajudicial quanto os honorários a que faz jus o patrono, evitando que o processo de execução, uma vez satisfeita a obrigação principal, tenha que prosseguir apenas para atender outra dívida, relacionada aos honorários advocatícios. 2.
Nisso o processo de execução difere do processo de conhecimento. No âmbito do processo de conhecimento, os honorários advocatícios são fixados apenas por ocasião da sentença, quando se tem condições efetivas de aquilatar a sucumbência das partes e quem deverá, em razão dela, arcar com a verba honorária. 3. No processo executivo, portanto, os honorários são fixados pelo juiz desde a instauração da fase de cumprimento de sentença ou da propositura da execução de título extrajudicial. Cabe ressaltar, porém, que ESTES HONORÁRIOS SÃO PROVISÓRIOS, pois é dado à parte devedora impugnar o cumprimento de sentença ou opor embargos à execução, no bojo dos quais poderá se sagrar vencedora e alterar a sucumbência
. 4. As recorrentes pretendem receber os honorários advocatícios que foram fixados no início do cumprimento de sentença e, além disso, honorários advocatícios derivados da mera apresentação de impugnação por parte da Fazenda Nacional. Ocorre, contudo, que a impugnação em referência sequer foi julgada. Se a impugnação ao cumprimento de sentença não foi julgada, descabe à parte alegar a existência de direito aos honorários sucumbenciais, na medida em que não se sabe qual será o juízo que se fará da impugnação. 5. Não há como apontar que uma parte é sucumbente e a outra vencedora, tendo em vista que sequer houve julgamento da defesa apresentada pelo ente federal. Por outras palavras, não há condições de aquilatar o cabimento dos honorários definitivos em favor da parte exequente, porque não se tem consumado o insucesso da impugnação ofertada pela Fazenda Pública, razão pela qual a manutenção da decisão agravada é medida que se impõe. 6. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (TRF-3 - AI: 50126137820194030000 SP, Relator: Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO, Data de Julgamento: 14/02/2020, 1ª Turma, Data de Publicação: e - DJF3 Judicial 1 DATA: 18/02/2020)
Com efeito, o arbitramento inicial de honorários - quando devidos - não impede eventual revisão judicial sobre o tema, notadamente em sede de apreciação de impugnação ao cumprimento do julgado.
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. EMBARGOS À EXECUÇÃO. HONORÁRIOS SOBRE HONORÁRIOS. FASES DIVERSAS. CABIMENTO. 1. Trata-se na origem de cumprimento de sentença de execução de verba honorária no valor de R$ 3.185,51. A decisão indeferiu a fixação de novos honorários por importar em bis in idem. O acórdão confirmou a sentença e foram rejeitados os Embargos de Declaração. 2. O atual entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de vedar o arbitramento de verba honorária em duplicidade dentro da mesma fase processual (execução) e em favor de advogado da mesma parte (exequente), porquanto tal situação implica bis in idem. 3.
"Eventual bis in idem somente ocorreria se a pretensão se voltasse na exigência de fixar nova verba honorária sobre honorários estabelecidos na fase de execução/cumprimento de sentença, porquanto indevida quando referente à mesma fase processual, evitando-se, assim, que o exequente utilize-se de diversas execuções para promover ganho sucumbencial em cascata" (REsp 1.551.850/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 15.10.2015). 4. A tese recursal desenvolvida no Recurso Especial interposto refere-se à possibilidade de os honorários fixados na execução incidirem sobre os honorários sucumbenciais arbitrados na ação de conhecimento, fases distintas portanto. 5. Recurso Especial provido para fixar a verba honoraria em 10% sobre o valor devido
. (STJ - REsp: 1767599 RS 2018/0241181-5, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 04/12/2018, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/04/2019)
2.53. Eventuais honorários sobre honorários:
O STJ tem decidido não haver
bis in idem
inválido, quando os honorários sobre honorários
incidem em fases distintas
do processo:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. EMBARGOS À EXECUÇÃO. HONORÁRIOS SOBRE HONORÁRIOS. FASES DIVERSAS. CABIMENTO. 1. Trata-se na origem de cumprimento de sentença de execução de verba honorária no valor de R$ 3.185,51. A decisão indeferiu a fixação de novos honorários por importar em bis in idem. O acórdão confirmou a sentença e foram rejeitados os Embargos de Declaração. 2.
O atual entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de vedar o arbitramento de verba honorária em duplicidade dentro da mesma fase processual (execução) e em favor de advogado da mesma parte (exequente), porquanto tal situação implica bis in idem. 3. "Eventual bis in idem somente ocorreria se a pretensão se voltasse na exigência de fixar nova verba honorária sobre honorários estabelecidos na fase de execução/cumprimento de sentença, porquanto indevida quando referente à mesma fase processual, evitando-se, assim, que o exequente utilize-se de diversas execuções para promover ganho sucumbencial em cascata
" (REsp 1.551.850/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 15.10.2015). 4. A tese recursal desenvolvida no Recurso Especial interposto refere-se à possibilidade de os honorários fixados na execução incidirem sobre os honorários sucumbenciais arbitrados na ação de conhecimento, fases distintas portanto. 5. Recurso Especial provido para fixar a verba honoraria em 10% sobre o valor devido. (STJ - REsp: 1767599 RS 2018/0241181-5, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 04/12/2018, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/04/2019)
2.54. Honorários - casos de expedição de RPV:
Conquanto a leitura
a contrario sensu
do art. 85, §7, CPC, enseje a compreensão de serem devidos honorários, em fase de cumprimento de sentença, quando se trate de cobrança de valores a serem requisitados mediante RPV - requisição de pequeno valor, o STJ consolidou entendimento distinto.
Ao publicar o
tema 1190
, o Superior Tribunal de Justiça divulgou o entendimento de que
não são devidos honorários advocatícios sucumbenciais em cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública
não impugnado, mesmo quando o crédito estiver sujeito ao pagamento por meio de RPV. Alyudido entendimento deve ser privilegiado pelo Juízo, conforme art. 927, CPC/15.
2.55. Verbas sucumbenciais, quando em causa juizados:
Ademais as Turmas Recursais têm reputado ser incabível a condenação dos litigantes ao pagamento de verbas sucumbenciais em cumprimento de sentença, em 1. instância
, conforme arts. 54 e 55 da lei n. 9.099, de 1995, normas não ab-rogadas pelos arts. 82 e 85, CPC, de 2015, dada a redação do art. 2º, §2, DL 4.657, de 1942.
MANDADO DE SEGURANÇA. PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INCABÍVEL. SEGURANÇA DENEGADA. 1.
O cumprimento de obrigação de pagar quantia certa no âmbito dos Juizados Especiais Federais rege-se pelo artigo 17 da Lei 10.259/2001, não sendo o caso de observância ao rito previsto no CPC, como requerido pela parte autora. Trata-se de mero cumprimento de sentença, que não prevê incidência de multa ou fixação de honorários advocatícios por ocasião da execução - até porque o Processo dos Juizados Especiais apenas estabelece condenação em honorários na estrita hipótese do artigo 55 da Lei 9.099/95
. 2. O XXXVIII Encontro do Fórum Nacional de Juizados Especiais, realizado em Belo Horizonte, em novembro de 2015, conferiu nova redação ao Enunciado nº 97, compatibilizando-o ao novo Código de Processo Civil, o qual passou a viger nos seguintes termos: Enunciado 97: 'A multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 aplica-se aos Juizados Especiais Cíveis, ainda que o valor desta, somado ao da execução, ultrapasse o limite de alçada; a segunda parte do referido dispositivo não é aplicável, sendo, portanto, indevidos honorários advocatícios de dez por cento'. 3. A fixação de honorários advocatícios nos processos que tramitam perante o Juizado Especial Federal somente é cabível na situação referida no art. 55 da Lei nº 9.099/95, ou seja, na fase recursal e quando há recorrente vencido. 4. Denegada a segurança. (TRF-4 - MS: 50519638620194047100 RS 5051963-86.2019.4.04.7100, Relator: JOSÉ RICARDO PEREIRA, Data de Julgamento: 30/09/2019, QUINTA TURMA RECURSAL DO RS)
Atente-se para a fundamentação do julgado acima mencionado:
"(...) Quanto ao pedido de fixação de honorários sucumbenciais na fase de cumprimento de sentença, indefiro-o com fundamento no Enunciado 97 FONAJE – A multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 aplica-se aos Juizados Especiais Cíveis, ainda que o valor desta, somado ao da execução, ultrapasse o limite de alçada; a segunda parte do referido dispositivo não é aplicável, sendo, portanto, indevidos honorários advocatícios de dez por cento (nova redação – XXXVIII Encontro – Belo Horizonte-MG). (...) Com efeito, o cumprimento de obrigação de pagar quantia certa no âmbito dos Juizados Especiais Federais rege-se pelo artigo 17 da Lei 10.259/2001, não sendo o caso de observância ao rito previsto no CPC, como requerido pela parte autora. Trata-se de mero cumprimento de sentença, que não prevê incidência de multa ou fixação de honorários advocatícios por ocasião da execução - até porque o Processo dos Juizados Especiais apenas estabelece condenação em honorários na estrita hipótese do artigo 55 da Lei 9.099/95." (TRF-4 - MS: 50519638620194047100 RS 5051963-86.2019.4.04.7100, Relator: JOSÉ RICARDO PEREIRA, Data de Julgamento: 30/09/2019, QUINTA TURMA RECURSAL DO RS)
Ademais, a tanto acorre o tema 1.190, STJ, já aludido, nos casos em que a pretensão ao cumprimento de sentença não seja alvo de impugnação. Sustenta-se, não raro, que "
O CPC/2015 só é aplicável nos Juizados Especiais naquilo que não contrariar os seus princípios norteadores e a sua legislação específica."
(
Enunciado 151, do FONAJEF
- aprovado no XII FONAJEF).
2.56. Cumprimento de sentença - caso em exame:
No caso em exame, deixo de arbitrar honorários advocatícios no âmbito do cumprimento de sentença, a despeito do art. 523 e ss., CPC. Tenho em conta, é fato, que foram arbitrados processos na fase do processo de conhecimento, medida acobertada pelo trânsito em julgado da sentença.
De todo modo, registro - que toca à presente fase de cumprimento de sentença - o entendimento de que a exoneração ditada pelo art.
18 da lei de ação civil pública se aplita a todas as partes, por simetria
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS . ART. 18 DA LEI N. 7.347/85 . PRINCÍPIO DA SIMETRIA. INEXISTÊNCIA DE MÁ-FÉ. RECURSO DESPROVIDO. I . CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que, ao julgar procedente o pedido em ação civil pública, deixou de condenar o Município de Iomerê/SC ao pagamento de honorários sucumbenciais, com base no art. 18 da Lei 7.347/1985 . II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em definir a aplicabilidade do art. 18 da Lei 7 .347/1985 à condenação de honorários sucumbenciais na ação civil pública, considerando o princípio da simetria e a ausência de má-fé. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A questão está atualmente afetada no Superior Tribunal de Justiça no Tema repetitivo 1 .777: Definir se é possível ou não a condenação da União ao pagamento de honorários de sucumbência em sede de ação civil pública. 4. O entendimento majoritário vigente do Superior Tribunal de Justiça reconhece que, em razão da simetria, descabe a condenação em honorários advocatícios da parte requerida em ação civil pública, quando inexistente má-fé, de igual sorte como ocorre com a parte autora, por força da aplicação do art. 18 da Lei 7 .347/1985. 5. A análise dos autos não revela elementos que configurem má-fé por parte do Município de Iomerê/SC, razão pela qual a condenação em honorários não é cabível. IV . DISPOSITIVO 6. Recurso desprovido.
(TRF-4 - AC - Apelação Cível: 50016019620234047211 SC, Relator.: ELIANA PAGGIARIN MARINHO, Data de Julgamento: 19/02/2025, 11ª Turma, Data de Publicação: 20/02/2025)
Assim, deixo de arbitrar honorários quanto à presente etapa de cumprimento de sentença, diante do alcance do art. 18, LACP, e por não divisar má-fé na atuação dos requeridos, a despeito do inadimplemento que persiste.
2.57. Multa prevista no art. 523, CPC:
Note-se, por outro lado, que o enunciado 97 do FONAJE preconizou que
"
a multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 aplica-se aos Juizados Especiais Cíveis, ainda que o valor desta, somado ao da execução, ultrapasse o limite de alçada; a segunda parte do referido dispositivo não é aplicável, sendo, portanto, indevidos honorários advocatícios de dez por cento
."
JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS NA FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESCABIMENTO.1. A lei de regência dos Juizados Especiais definiu, taxativamente, as hipóteses de arbitramento de honorários de sucumbência: a) na sentença, quando restar demonstrado que o autor ajuizou a ação de má-fé; e b) quando o recorrente for vencido no recurso que interpôs contra a sentença, desde que o vencedor tenha advogado constituído nos autos.2.
Inexiste na legislação que disciplina o processo no âmbito dos juizados especiais previsão de pagamento de honorários de sucumbência relativos à fase de cumprimento de sentença, o que, em virtude da especialidade, afasta a aplicação das previsões do CPC
. ( 5006620-76.2019.4.04.7000, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO PR, Relator GUY VANDERLEY MARCUZZO, julgado em 04/07/2019).
Quando se trata de cumprimento de sentença deflagrado em desfavor da Fazenda Pública, aplicam-se as normas dos arts. 534 e 535, CPC/15. Note-se que o art. 534, §2º, CPC, preconiza
"
A multa prevista no § 1º do art. 523 não se aplica à Fazenda Pública
."
2.58. Eventual reserva de honorários contratuais:
Segundo o art. 22, §4º d lei n. 8.906/1994: "
Se o advogado fizer juntar aos autos o seu contrato de honorários antes de expedir-se o mandado de levantamento ou precatório, o juiz deve determinar que lhe sejam pagos diretamente, por dedução da quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este provar que já os pagou
."
Percebe-se que a lei assegurou aos advogados a satisfação direta dos seus créditos, com desbaste dos valores a serem percebidos pelo seu cliente, nem necessidade de deflagrar ação de cobrança. Em determinados casos, remanescendo conflito entre advogado e cliente, o juízo deve manter as importâncias em depósito, no aguardo da solução da controvérsia.
Assim,
"
Independentemente do ajuizamento de nova demanda, tem o advogado o direito de descontar do valor inscrito em RPV ou precatório, a parcela relativa aos honorários contratados com seu constituinte, desde que junte aos autos o contrato antes de expedir-se o mandado de levantamento ou precatório
."
(TRF4, agravo de instrumento n. 5029946-16.2019.4.04.0000/PR).
Tem-se reconhecido o caráter alimentar da verba honorária, seja sucumbencial, seja convencional, como ilustra o seguinte julgado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. PRECATÓRIO. DESTAQUE DE HONORÁRIOS. CONDIÇÕES. NATUREZA ALIMENTAR. - O STF, no julgamento da ADI 3453, firmou o entendimento no sentido da impossibilidade de imposição de condicionamentos ao levantamento de valores de precatórios devidos pela Fazenda Pública além do disposto nas normas constitucionais. -
A par disso, como é sabido, os Tribunais Superiores já reconheceram a natureza alimentar dos honorários advocatícios, independentemente de serem originados em relação contratual ou em sucumbência judicial
(RE 470407/DF, DJ 13.10.2006, Rel. Min. Marco Aurélio e REsp 1.032.747/RS, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe 17.4.2008), podendo ser pagos nos próprios autos da causa que o advogado patrocina, deduzidos da quantia a ser recebida pela parte autora, e desde que apresentado o respectivo contrato antes de expedido o mandado de levantamento ou o precatório, nos termos do artigo 22, § 4º, do Estatuto da Advocacia, e arts. 18 e 19 da Resolução CJF 405 de 2016. - Agravo de instrumento parcialmente providos. (AGRAVO DE INSTRUMENTO SIGLA_CLASSE: AI 5016219-17.2019.4.03.0000, TRF3 - 7ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 24/03/2020)
Outro não é o conteúdo da súmula vinculante 47, Supremo Tribunal Federal:
"
Os honorários advocatícios incluídos na condenação ou destacados do montante principal devido ao credor consubstanciam verba de natureza alimentar cuja satisfação ocorrerá com a expedição de precatório ou requisição de pequeno valor, observada ordem especial restrita aos créditos dessa natureza
. "
Note-se, portanto, que a regra do art. 22, §4º da lei n. 8.906/1994 cuida dos casos em que há requisição de pagamento, a ser incluído no orçamento da entidade de direito público, ou
quando há expedição de alvará de pagamento
a favor da parte devedora dos honorários contratuais, sendo dado ao(à) advogado(a) postular o desbaste do seu crédito junto ao aludido montante a ser pago ao seu cliente/sua cliente. Trata-se, assim, de um mecanismo para acelerar o pagamento de tais valores, evitando-se um processo de conhecimento ou execução de título extrajudicial - preenchidos os requisitos do art. 784, III ou dos demais títulos extrajudiciais listados na legislação, atentando-se ainda para o art. 24 da lei 8.906/1994.
NO CASO EM EXAME, referido instituto não se coloca, em primeiro exame, considerando o estado da causa até esta fase.
2.59.
Responsabilização
patrimonial:
Por força do art. 789, CPC/15, as pessoas respondem por suas dívidas com o emprego do seu patrimônio, bens presentes e futuros. Não raras vezes, porém, os interessados celebram contratos considerando a existência de determinados bens no patrimônio do seu devedor, mas - no momento da cobrança da dívida -, constatam que eles já restaram alienados.
Convém atentar para a lição de Araken de Assis, ao discorrer sobre a fraude à execução:
"
Desnecessário se afigura ressaltar a estreita ligação da problemática da fraude à execução com a responsabilidade patrimonial. Do art. 591, CPC/73, deriva a consequência de que somente os bens do devedor respondem por suas obrigações. É, por outro lado, tão só na execução patrimonial aparece o problema de recuperar os bens subtraídos pelo obrigado à execução
.
Toda rigidez da regra se esgarça, porém, assevera Cândido Rangel Dinamarco, quando ela incide sobre bens passados, bens que pertenceram ao devedor, mas no momento da execução não lhe pertencem mais
. E dentre tais bens figuram os alienados em fraude contra credores, fraude à execução, bem como os bens hipotecados ao credor e depois alienados a terceiros.
Realmente, o patrimônio de alguém, no exato ângulo entrevisto por Pontes de Miranda, sempre está in fieri, modificando-se por acréscimo ou diminuição de bens e frutos. E a ordem jurídica não inibe as atividades econômicas de quem assume obrigações. Logo, o devedor conserva a livre disponibilidade dos seus bens, incumbindo aos seus credores respeitar-lhes os atos negociais, embora seus resultados sejam nocivos e até provoquem a insolvência.
Acontece, às vezes, de os atos de disposição do obrigado - e o art. 591 não estatui qualquer congelamento patrimonial -, em vez de retratarem alterações normais, revelarem o propósito de frustrar a realização do direito alheio. Neste caso, aparece a pretensão de revogá-los ou desfazê-los
.
Em princípio, se mostra impossível apartar o negócio hígido do fraudulento, pois eles apenas se diferenciam, substancialmente, quanto à finalidade
. E convém enfatizar que se coíbe a redução artificial do patrimônio, restando consentidas modificações naturais, como se conclui da leitura do art. 164 do Código Civil que dispõe: 'Presumem-se, porém, de boa-fé e valem os negócios ordinários indispensáveis à manutenção de estabelecimento mercantil, rural, ou industrial, ou à subsistência do devedor e de sua família.'
Por isso, as hipóteses de fraude, em suas modalidades, se encontram tipificadas: a fraude contra credores, na lei civil (arts. 158 a 165, CC) e a fraude à execução (art. 593, CPC).
Estas duas formas de fraude se distinguem na medida em que os atos dispositivos do devedor às vezes ocorrem na dependência de uma relação processual. E urge sublinhar o primeiro aspecto, que antecede o elemento cronológico: há que ocorrer ato de disposição do obrigado
.
Não há fraude concebível sem a manifestação de vontade do devedor. Por isso, a primeira turma do STJ acentuou o seguinte: Na hipótese de arrematação ou adjudicação judicial a vontade do devedor é irrelevante, o que obsta a caracterização da fraude. E, de fato, a ausência de ato pelo qual o obrigado dispõe do bem elimina, na raiz, eventuais controvérsias acerca da finalidade do negócio e do seu animus
nocend
i.
Seja como for, na hipótese de o executado dispor de algum bem na pendência do processo, como parece curial, a fraude adquire expressiva gravidade. O eventual negócio não agride somente o círculo potencial de credores. Está em jogo, agora, além dos interesses particulares, a própria efetividade da atividade jurisdicional do Estado. O devedor que adota semelhante expediente pratica fraude à execução, recebendo seu ato reação mais severa e imediata.
Nesta espécie de fraude, segundo o entendimento hoje uniforme da doutrina brasileira, os atos de alienação ou de oneração realizados pelo obrigado se ostentam ineficazes.
Ensina, a este propósito, Theodoro Jr.: o negócio jurídico, que frauda a execução, diversamente do que se passa com o que frauda credores, gera pleno efeito entre alienante e adquirente. Apenas não pode ser oposto ao exequente. Assim, a força da execução continuará a atingir o objeto da alienação ou oneração fraudulenta, como se estas não tivessem ocorrido. O bem será de propriedade do terceiro, num autêntico exemplo de responsabilidade sem débito. Neste mesmo sentido, assentou a 4ª Turma do STJ: na fraude de execução, o ato não é nulo, inválido, mas sim ineficaz em relação ao credor.
Em outras palavras, o ato fraudulento existe e vale entre os figurantes do negócio jurídico, mas é 'como se' não existisse perante o credor, que poderá ignorá-lo, penhorando, desde logo, o bem fictamente presente no patrimônio obrigado. Por isso, o juiz declarará a fraude, incidentalmente, nos próprios autos de execução
.
Em contrapartida, dentro da visão tradicional, a fraude contra credores é causa de anulabilidade do ato (art. 171, II, CC), cujo reconhecimento, e o consequente desfazimento daquele, ocorre em ação própria, prevista no art. 161, CC/2002. Em tal demanda, competirá ao credor prejudicado provar a insolvência do devedor e o concerto fraudulento com o terceiro, admitido o largo emprego de indícios, a exemplo da transmissão do bem a quem não ostenta condições financeiras para adquiri-lo, anulando o negócio e reintegrando o bem no patrimônio.
No entanto, Cândido Rangel Dinamarco sustenta, a partir da distorção dos efeitos do ato fraudulento, arredados dos efeitos programados justamente, porque fraudam o direito alheio, e na constatação de que a fraude não exige nenhum defeito intrínseco, a identidade de duas figuras, motivo por que estima igualmente ineficazes quaisquer atos em fraude contra credores. Cuidar-se-ia, aqui, de uma ineficácia (rectius: intra-eficácia, porque relativa, atingindo somente credores) sucessiva, diversa da que ocorre na fraude à execução, quando é originária. E, por este motivo, a fraude contra credores continua reclamando a actio pauliana
.
Pontes de Miranda averba a tese exposta de discrepar da história e da dogmática e increpa a construção de obra artificial, tentada por alguns juristas italianos. O argumento principal de Pontes de Miranda, ao fundamentar tão veemente repulsa, se concentra na ilusão provocada pela extensão da responsabilidade executiva (!), pois, por decorrência da ação pauliana, quando se penhoram os bens fraudados, estes são do devedor, como quaisquer outros. Na verdade, cuida-se de italianismo, porque, de acordo com o art. 602, 2ª parte, CPC peninsular, a decretação da fraude implica somente a ineficácia do negócio perante o autor da revocatória. Entre nós, a fraude constitui vício da vontade, corrigido através de ação constitutiva negativa, cuja eficácia é repristinatória, a teor do art. 182, CC/2002, conforme doutrina pátria." (ASSIS, Araken.
Manual da execução.
13. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: RT, 2013. p. 293-295)
2.60. Penhora de bens no patrimônio do(a) executado(a):
Por outro lado,
"
A penhora é o ato executivo que afeta determinado bem à execução, permitindo sua ulterior expropriação, e torna os atos de disposição do seu proprietário ineficazes em face do processo
."
(ASSIS, Araken de.
Manual de execução.
18. ed. São Paulo: RT. 2016. p. 911).
Em outras palavras,
"
a penhora isola bens no patrimônio excutido, e, em consequência, afeta o bem penhorado à atividade da expropriação (art. 824), por meio do expediente de imprimir a marca da ineficácia no poder de disposição do executado, preservando, assim, o caráter instrumental do ato
. Este sinal não é um
sogello
, mas o corolário da ineficácia dos atos de disposição, que, de resto, se afiguram existentes, válidos e eficazes no plano do direito material."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 911).
Dentre vários outros efeitos, a penhora enseja a perda do direito de fruição da coisa, em toda a sua extensão, por parte do executado. Cuidando-se da penhora de recursos,
"descoberto dinheiro sob a forma de depósito ou aplicação financeira (art. 835, I),
inexiste a necessidade de atuação do oficial de justiça. Realizado o ato de indisponibilidade do ativo financeiro, a teor do art. 854, caput, a penhora em si realiza-se na forma eletrônica
, segundo critérios uniformes do CNJ (art. 837), documentada sob a forma de termo de penhora. Às vezes, os ativos financeiros do executado concentram-se em ações negociadas em bolsa. Existem registros disponíveis da Câmara Brasileira de Liquidação e Custódia (CBLC), órgão equivalente à Depository Trus & Clearing Corporation norte-americana, localizados através do número de inscrição no Cadastro das Pessoas Físicas (CPF) da Receita Federal - informados no requerimento e na petição inicial (art. 524, I e art. 798, II, b), embora os negócios na bolsa realizem-se em nome da corretora de valores."
(ASSIS, Araken de.
Obra citada.
p. 924).
2.61. Penhora de ativos - SISBAJUD:
A penhora de ativos é um mecanismo destinado a conferir um mínimo de efetividade para as execuções, conforme art. 854, CPC/15, o que está em plena conformidade com a responsabilização patrimonial prevista no art. 789, do Código de Processo Civil/15.
Reporto-me à lição de Renato de Oliveira Alves:
"Não há de se exigir, igualmente, que o credor demonstre ter esgotado todos os meios à sua disposição para localizar bens do executado. Isso porque, sendo o dinheiro o primeiro bem na ordem legal a ser penhorado, possui o credor o direito de pretender fazer a penhora incidir preferencialmente sobre ele. Aliás, isso contribui, como tido alhures, para a celeridade processual, princípio constitucional a ser observado por todos os operadores do direito."
(ALVES, Renato de Oliveira.
Execução fiscal.
Belo Horizonte: Del Dey, 2008, p. 91).
Esse foi o entendimento consolidado, por sinal, pelo STJ ao julgar REsp 1.112.943-MA, Rel. Min. Nancy Andrighi, com repercussão geral.
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO CIVIL. PENHORA. ART. 655-A DO CPC. SISTEMA BACEN-JUD. ADVENTO DA LEI Nº 11.382/2006. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO PENHORA ON LINE. a) A penhora on line, antes da entrada em vigor da Lei nº 11.382/2006, configura-se como medida excepcional, cuja efetivação está condicionada à comprovação de que o credor tenha tomado todas as diligências no sentido de localizar bens livres e desembaraçados de titularidade do devedor. b) Após o advento da Lei nº 11.382/2006, o Juiz, ao decidir acerca da realização da penhora on line, não pode mais exigir a prova, por parte do credor, de exaurimento de vias extrajudiciais na busca de bens a serem penhorados. II - JULGAMENTO DO REGURSO REPRESENTATIVO - Trata-se de ação monitória, ajuizada pela recorrente, alegando, para tanto, titularizar determinado crédito documentado por contrato de adesão ao Crédito Direto Caixa, produto oferecido pela instituição bancária para concessão de empréstimos. A recorrida, citada por meio de edital, não apresentou embargos, nem ofereceu bens à penhora, de modo que o Juiz de Direito determinou a conversão do mandado inicial em título executivo, diante do que dispõe o art. 1.102-C do CPC. - O Juiz de Direito da 6ª Vara Federal de São Luiz indeferiu o pedido de penhora on line, decisão que foi mantida pelo TJ/MA ao julgar o agravo regimental em agravo de instrumento, sob o fundamento de que, para a efetivação da penhora eletrônica, deve o credor comprovar que esgotou as tentativas para localização de outros bens do devedor. - Na espécie, a decisão interlocutória de primeira instância que indeferiu a medida constritiva pelo sistema Bacen-Jud, deu-se em 29.05.2007 (fl.57), ou seja, depois do advento da Lei nº 11.382/06, de 06 de dezembro de 2006, que alterou o CPC quando incluiu os depósitos e aplicações em instituições financeiras como bens preferenciais na ordem da penhora como se fossem dinheiro em espécie (art. 655, I) e admitiu que a constrição se realizasse preferencialmente por meio eletrônico (art. 655-A). RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (STJ - REsp: 1112943 MA 2009/0057117-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 15/09/2010, CE- CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 23/11/2010)
Atente-se para o mencionado art. 854, CPC/2015: "
Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, sem dar ciência prévia do ato ao executado, determinará às instituições financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade supervisora do sistema financeiro nacional, que torne indisponível ativos financeiros existentes em nome do executado, limitando-se a indisponibilidade ao valor indicado na execução."
2.62. Decretação da indisponibilidade de bens:
Teço algumas considerações, ademais, a respeito de outros instrumentos de efetivação do crédito. Cogita-se da decretação da indisponibilidade de bens, amparando-se nos arts. 789, 797, 824 e 139, IV, CPC/15. A medida tem sido reconhecida como devida pelos Tribunais, na medida em que inibe eventual alienação de bens no patrimônio do(a)(s) executado(a)(s).
2.63. Eventual mitigação do
sigilo
fiscal:
O sigilo de dados financeiros, fiscais e telemáticos é uma projeção da tutela jurídica dispensada à vida privada, consoante já decidiu o STF ao apreciar o MS 23.639/DF, rel. Celso de Mello
. Também nesse sentido, menciono Paulo José da Costa Jr.
O direito de estar só.
RT, p. 105.
Nem sempre, porém, o acesso aos dados bancários de alguém revelará detalhes da vida íntima, das convicções pessoais, do relacionamento familiar etc. A levar a extremos, os próprios Registros Públicos seriam inconstitucionais, o mesmo ocorrendo com SPC, SERASA, etc. O simples conhecimento de detalhes patrimoniais, em si considerados, não está compreendido necessariamente na dicção 'vida privada' ou 'intimidade', para os fins dispostos no art. 5º, X, CF. Pode ser uma das suas manifestações; mas já provaria demasiado tomar como inacessível qualquer informe patrimonial.
Acolho, com pontuais reservas, o entendimento de Tércio Sampaio Ferraz Jr. - Sigilo Bancário
in
Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem nº, 14, out/dez de 2.001, com reedição com pontuais alterações na obra
Direito Constitucional.
Barueri: Manole, 2.007, p. 167 e ss. Reporto-me também ao voto do Min. Francisco Resek por época do julgamento do MS 21.709-4, DJU de 19/10/01, p. 33.
O tema do sigilo fiscal deve ser alocado no âmbito do art. 5º, X, da Lei Maior e não no âmbito do inc. XII. O art. 5º, XII, CF acautela a comunicação de dados, em si considerada: o ato de comunicação, inerente ao seu conteúdo de liberdade, somente suscetível de restrição mediante ordem judicial, ou nas excepcionais e indesejadas hipóteses dos artigos 136 e 139, CF.
Firmada esta premissa, o sigilo bancário/fiscal - projeção da tutela à vida privada - não encontraria uma cláusula expressa de reserva de jurisdição autorizativa, tal como ocorre com o monitoramento telefônico (art. 5º, XII, CF). Aliás, em sentido oposto, Ives Gandra Martins, sustenta que
"
Pessoalmente, entendo que nem mesmo a autoridade judiciária poderia determinar a quebra de sigilo de dados, visto que a referência à autorização judicial do art. 5º, X e XII, diz respeito à comunicação telefônica e não ao sigilo de dados
, muito embora Tércio Sampaio tenha defendido, como procurador geral da Fazenda Nacional, exegese diversa do dispositivo, no sentido de que o acesso das autoridades a dados implicaria a obrigação de preservá-los perante terceiros."
(MARTINS, Ives Gandra da Silva
in
Direitos Fundamentais do Contribuinte.
RT, p. 67).
Essa análise restritiva proposta por Gandra da Silva não vingou junto aos Tribunais, porém. Tércio Sampaio Ferraz explica o que segue:
"O sigilo, no inciso XII do art. 5º, está referido à
comunicação
, no interesse da defesa da privacidade. Isto é feito, no texto, em dois blocos: a Constituição fala em sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas. Note-se, para a caracterização dos blocos, que a conjunção e une correspondência com telegrafia, segue-se uma vírgula e depois, a conjunção de dados com comunicações telefônicas. Há uma simetria nos dois blocos.
Obviamente o que se regula é comunicação por correspondência e telegrafia, comunicação de dados e telefônica
.
O que fere a liberdade de omitir pensamento é, pois, entrar na comunicação alheia, fazendo com que o que devia ficar entre sujeitos que se comunicam privadamente passe ilegitimamente ao domínio de um terceiro
.
Se alguém elabora para si um cadastro sobre certas pessoas, com informações marcadas por avaliações negativas, e o torna publico, poderá estar cometendo difamação, mas não quebra sigilo de dados. Se estes dados, armazenados eletronicamente, são transmitidos, privadamente, a um parceiro, em relações mercadológicas, para defesa do mercado, também não estará havendo quebra de sigilo. Mas se alguém entra nesta transmissão, como um terceiro que nada tem a ver com a relação comunicativa, ou por ato próprio ou porque uma das partes lhe cede o acesso indevidamente, estará violado o sigilo de dados." (Tércio Sampaio.
artigo citado
)
Esta exegese de Tércio Sampaio foi acolhida pelo STF, conf. RE 219.780, rel. Min. Carlos Velloso, DJU de 10/09/99. Pontuo, contudo, que - por época do julgamento do MS 21.729-4/STF - o Min. Carlos Velloso, revisando em parte este entendimento, sustentou o que segue:
"
Esse inciso XII, de certa forma, também pode ser trazido ao debate, tendo em vista que ele protege o sigilo de dados
". Ao que sobreveio a pertinente consideração do Min. Pertence: Preocupa-me muito esta afirmação, porque se se protegem os dados em si - e o eminente relator mostrou isso, recordando, salvo engano, o estudo do prof. Tércio Ferraz - leva a conseqüências absolutamente irreais."
Note-se que
"
São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação
".
Repito que, no mais das vezes, o sigilo financeiro será uma projeção da vida privada. A tutela dispensada ao instituto está em conformidade com uma concepção de Estado Limitado, infenso à
panopticons
(
big brothers
). Qualquer pretensão à submissão individual a uma perene sindicância estatal se revela incompatível com postulados Constitucionais.
Em que pese registrar, portanto, o caráter de
ultima ratio
de tais mecanismos, é igualmente certo que o sigilo bancário e fiscal cede diante diante de interesses públicos relevantes. Sem adentrar no histórico do sigilo financeiro - muito bem delineado pelo Min. Maurício Correa, no voto apresentado por época do julgamento do MS 21.729-4/DF e também delineado pelo Juiz Federal José Paulo baltazar Jr.
(Sigilo bancário e privacidade.
Livraria do Advogado, 2.005), menciono os seguintes diplomas normativos, que tangenciam o instituto: - Art. 17 do Código Comercial, de 1850; - Art. 154 do Código Penal de 1940; - Art. 207 do Código de Processo Penal, de 1941; - Art. 3º do Decreto-lei 8.495, de 1945; - Art. 38 da Lei 4.595, de 1.964; - Art. 197 parágrafo único, do CTN, de 1966; - Art. 18 da Lei 7.492, de 1986; - Art. 44 da Lei 5.10, de 1966; - Art. 8º da Lei 8.021, de 1990; - Art. 10 da Lei 8.033, de 1990; - Art. 2º da Lei 9.034, de 1995 (ADIn 1.517-6/STF) - Art. 1º da LC 105, de 2001.
O art. 38 da Lei n. 4.595 não exigia - ao menos, não expressamente - a prévia autorização judicial, para a quebra de sigilos bancários e fiscais (apenas fazia menção à
'
autoridade competente'
). Aquele art. 38, §5º fora interpretado, inicialmente, de modo a franquear a quebra de sigilo bancário pelas autoridades fiscais (p.ex., extinto Tribunal Federal de Recursos, AC 47.875/MG, rel. Min. Moacir Catunda, j. 30/06/82).
A partir, porém, da apreciação, pelo Superior Tribunal de Justiça, do
REsp 37.566
(rel. Min. Demócrito Reinaldo) restou assente que apenas a Autoridade Judiciária poderia mitigar o sigilo financeiro, exegese também dispensada pela maioria dos comentaristas reunidos na obra
Direitos fundamentais do contribuinte.
RT, com exceção de Wagner Balera, Yoshiaki Ichihara e Othon saraiva.
Ainda à guisa de informação histórica, anoto que o jurista Othon Pontes Saraiva teceu comentários críticos à decisão do STJ (Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho, Relativizar o sigilo bancário em face da Administração Tributária.
Fórum Administrativo.
Belo Horizonte, v. 1, n. 6, p. 746-767, ago. 2001). A largo destes embates, o fato é que a Legislação atualmente em vigor autoriza - como não poderia mesmo deixar de ser - a
disclosure
bancária e fiscal, caso presentes indícios da prática de crimes.
É o que se infere do art. 1º da LC 105/2001 e também do art. 198, CTN, como sabido. Também nesse sentido, reporto-me aos seguintes precedente:
"O direito ao sigilo das informações bancárias e fiscais, eminentemente de caráter individual, não pode ser absoluto, a ponto de obstaculizar a legítima ação do Estado no sentido de, no interesse coletivo, zelar pela legalidade; ao revés, é sempre mitigado quando contraposto ao interesse maior da sociedade, e restarem devidamente evidenciadas circunstâncias que justifiquem a medida, como ocorre in casu. Inexiste constrangimento ilegal quando decisão judicial que decretou a quebra do sigilo bancário e fiscal demonstra a necessidade de complementar investigação criminal que já se iniciou, com elementos suficientes para indicar o rumo das diligências a serem efetuadas."
(STJ, 5ª Turma, HC 125.846, rel. Min. Laurita Vaz, DJE de 30.11.2009, omiti parte da ementa.)
Ademais,
"
O entendimento desta Suprema Corte consolidou-se no sentido de não possuir caráter absoluto a garantia dos sigilos bancário e fiscal, sendo facultado ao juiz decidir acerca da conveniência da sua quebra em caso de interesse público relevante e suspeita razoável de infração penal. Precedentes
".
(STF, Agravo regimental no agravo de instrumento n. 541.265, julgamento em 04.10.2.005, omiti parte da ementa.)
Tais vetores se aplicam também ao sigilo fiscal, previsto nos arts 197 e 198 do Código Tributário Nacional - CTN. Aludida confidencialidade deve ser preservada, salvo quando presente justa causa para a obtenção de tais informações.
2.64. Consulta ao SNIPER:
Em princípio, o mecanismo SNIPER - veiculado na plataforma do CNJ - não chega a indicar bens e valores porventura presentes no patrimônio do demandado. A medida se destina a verificar eventuais vínculos com terceiros e situações de desconsideração da personalidade jurídica, não configurando ferramenta apta a localizar diretamente bens penhoráveis para satisfação da dívida.
Sem dúvida, porém, que, em determinados casos, quando presentes sinais de vínculos societários, a medida pode contribuir para eventual desconsideração da personalidade jurídica de entidades societárias e, derivado disso, para eventual penhora de ativos de tais empresas. Assim, não se pode descartar em absoluto o emprego de tal ferramenta no caso em análise, conforme entendimento do Tribunal Regional Federalk da 4. Região:
PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AÇÃO MONITÓRIA. SISTEMA NACIONAL DE INVESTIGAÇÃO PATRIMONIAL E RECUPERAÇÃO DE ATIVOS (SNIPER). PESQUISA DE BENS. POSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência dos Tribunais Superiores é pacífica no sentido de que a execução se justifica para a satisfação do credor, razão pela qual deve ser feita a consulta aos sistemas eletrônicos (INFOJUD, BACENJUD, RENAJUD, DOI, DIMOB) colocados exclusivamente à disposição da autoridade judiciária, para dar celeridade e efetividade aos processos executivos, sem necessidade de esgotamento, por parte do credor, dos meios possíveis na procura do endereço ou bens do devedor. 2. De acordo com informações do CNJ, o Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos (Sniper) foi desenvolvido pelo Programa Justiça 4.0, a fim de permitir a investigação patrimonial de forma otimizada, sendo a primeira solução nacional e sem custo aos tribunais. 3. O acesso ao Sniper é exclusivo para servidores, servidoras, magistrados e magistradas de todos os tribunais brasileiros integrados à Plataforma Digital do Poder Judiciário (PDPJ), como é o caso deste TRF4. 4. Cabe considerar que a nova ferramenta possibilita consulta a bases de dados de diversos órgãos públicos, que não estão integradas aos sistemas já utilizados no processo (SISBAJUD, Renajud, e Infojud), devendo ser deferido o requerimento de uso do Sniper. (TRF-4 - AI: 50226353220234040000, Relator: ROGER RAUPP RIOS, Data de Julgamento: 15/08/2023, TERCEIRA TURMA)
DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. TENTATIVAS DE LOCALIZAÇÃO DE BENS INFRUTÍFERAS. CONSULTA AO SISTEMA NACIONAL DE INVESTIGAÇÃO PATRIMONIAL E RECUPERAÇÃO DE ATIVOS (SNIPER). PESQUISA DE BENS. POSSIBILIDADE. 1. A utilização de sistemas eletrônicos pelo Judiciário, para localização de bens dos devedores passíveis de serem penhorados, concretiza o entendimento de que a execução deve atender o interesse do credor, a teor do art. 797 do Código de Processo Civil. 2.
Conforme considerações colhidas no site do Conselho Nacional de Justiça, o SNIPER (Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos) é uma solução tecnológica desenvolvida pelo Programa Justiça 4.0 que agiliza e facilita a investigação patrimonial para servidores, servidoras, magistrados e magistradas de todos os tribunais brasileiros integrados à Plataforma Digital do Poder Judiciário (PDPJ). 3. O acesso é exclusivo para servidoras, servidores, magistrados e magistradas dos tribunais integrados à Plataforma Digital do Poder Judiciário (PDPJ), como é o caso deste Tribunal, sendo possível o acesso ao SNIPER no âmbito da Justiça Federal da 4ª Região, devendo ser autorizada a utilização da ferramenta, com vistas à localização de bens do devedor.
4. Agravo provido. (TRF-4 - AI: 50260468320234040000, Relator: JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, Data de Julgamento: 23/08/2023, DÉCIMA SEGUNDA TURMA)
2.65. Eventuais medidas executivas atípicas:
O
Código de Processo de 2015
preconizou, por outro lado, medidas executivas atípicas, enquanto mecanismos dissuasórios do inadimplemento. Atente-se para o exame promovido por Araken de Assis:
"O direito brasileiro consagra o princípio da tipicidade dos meios executórios. Não pode ser diferente, porque a CF/1988 tem feição garantista e o art. 5.º, LIV, exige que a privação de bens obedeça ao devido processo legal. A tese da relativa aticipidade, defendida com base na regra equivalente ao atual art. 536, § 1., esbarra na falta de exemplos práticos convincentes e, ainda, nos valores consagrados na CF/1988.
Esse sistema fechado, derivado do devido processo legal, não satisfaz aos que advogam a efetividade da tutela jurisdicional a todo custo. É preciso levar em conta, mais uma vez, a existência de limites práticos e políticos na função jurisdicional executiva (retro, 2). Simplesmente, se a execução visa a realizar a regra jurídica concreta consubstanciada no título, criado pelo Estado-juiz (título judicial) ou pelo Estado-legislador (título extrajudicial), no mundo real, em primeiro lugar deparar-se-á com as limitações do real, em que há objetivos (ainda) inalcançáveis (v.g., resgatar os corpos da vítima de naufrágio, localizando-se os destroços da embarcação em grandes profundidades). E há limites políticos, alcançados pela evolução histórica, que tornam a execução, de regra, patrimonial, e, portanto, eximem o devedor desprovido de patrimônio do cumprimento da obrigação. Não pode vigorar, senão como meta ideal, a proibição do non factibile. O volume dos processos executivos pendentes não é razão bastante para justificar a responsabilização pessoal do executado.
Estudo de elevado merecimento não descarta, entretanto, a possibilidade de aplicarem-se meios atípicos. Arrolam-se exemplos: (a) compelir o obrigado (v.g., o cantor) a prestar, sob a pena de impedir contratações vindouras; (b) estipular recompensa judicial (v.g, a diminuição da pena pecuniária), estimulando o executado à cooperação. Na mesma linha, o art. 139, IV, parece ter ampliado o imperium judicial, autorizando o órgão judicial a adotar “todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias” tendentes ao cumprimento dos pronunciamentos, “inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”. Em relação ao art. 536, § 1.º, a novidade consiste na extensão dessas medidas à execução das obrigações de quantia certa.
É duvidosa, senão patente, a inconstitucionalidade do art. 139, IV. É bem de ver que, nos casos de coerção pessoal (prisão) ou patrimonial (astreinte), os efeitos jurídicos são predeterminados: (a) prisão por determinado tempo; e (b) formação de crédito pecuniário, por sua vez exequível à medida que existam bens penhoráveis no patrimônio do executado. Essa predeterminação das consequências jurídicas para o executado recalcitrante torna essas medidas compatíveis com o art. 5º, LIV, da CF/1988. Ao invés, a aplicação do art. 139, IV, a par de gerar abusos dificilmente controláveis (v.g., a privação do sono, mediante transmissão de música estridente, para induzir a desocupação de imóvel; a apreensão do passaporte de quem trabalha no exterior, necessitando deslocar-se periodicamente para outro país, e a carteira de habilitação do motorista profissional), carece dessas características. E, a mais das vezes, traduzirá pena civil, sem precisão específica, em razão do inadimplemento “culposo” e arrogantemente ostensivo. Concebe-se que o recalcitrante incorra na ira da contraparte, mas é inadmissível que a pessoa investida na função judicante decida embalada por paixão análoga, amesquinhando o executado com o poder do Estado. E não parece exato que, além da pressão psicológica da prisão ou da multa, outras medidas atinjam a pessoa e, não, o patrimônio do executado. A inscrição do executado no cadastro dos inadimplentes restringe o crédito e, portanto, atinge o patrimônio. Seja como for, sustenta-se que a aplicação dos meios indeterminados subordina-se, todavia, à ponderação dos valores em jogo e a estruturação de postulados normativos. Em especial, observados os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da proibição do excesso, a aplicação de meio atípico subordinar-se-ia aos seguintes requisitos: (a) subsidiariedade, porque somente teria lugar após a frustração dos meios típicos; (b) prévio requerimento do exequente; (c) prévia audiência do executado; (d) a “customização” da medida concreta à pessoa do executado; (e) indícios de ocultação eficaz de patrimônio penhorável; (f) prévio exame da matéria de defesa do executado; e (g) motivação substancial do ato decisório. O mérito dessa laboriosa e inteligente construção consiste em erigir barreiras ao deferimento irrefletido de providências atípicas, retaliando o executado burlão, não lhes emprestando a necessária constitucionalidade. A rigor, ademais, enfrentaria o órgão judicial construção trabalhosa e artificial nessa permanente ponderação de valores, pouco condizente com as reais condições de trabalho da pessoa investida na função judicante no direito pátrio, de resultados incertos. A esse propósito, outro estudo digno de registro, no qual se destaca a impossibilidade de certas medidas (v.g., a privação do sono, de resto forma de tortura; o corte do fornecimento de luz e de água, etc.), arrolou número tão expressivo de diretrizes que, aplicadas todas conjuntamente, dificilmente abrir-se-ia espaço para medida atípica. E, acima de tudo, ao utilizar medida não especificada na lei, incorre-se em flagrante inconstitucionalidade. É preferível seguir o roteiro legalmente predeterminado. Ele oferece previsibilidade e segurança, além de observância estrita ao art. 5º, LIV, da CF/1988.
O meio executório não se confunde com a seriação dos atos processuais no processo. Idêntico meio executório é objeto de procedimentos diferentes. Assim, a expropriação é empregada tanto no procedimento comum (Capítulo IV – Da Execução por Quantia Certa – do Título II – das Diversas Espécies de Execução – do Livro II da Parte Especial do CPC), quanto na Lei 5.741/1971, embora as diferenças sejam mínimas.
Em matéria de procedimento, o CPC inovou, admitindo (a) convenção das partes, versando a causa direitos que admitem autocomposição, acerca do procedimento (art. 190), independentemente do consentimento judicial, todavia existente para controlar a validade dessa convenção, especialmente nos contratos de adesão, em que uma das partes pode encontrar-se em manifesta posição de desvantagem; e (b) de comum acordo com o órgão judicial, o chamado fast track, ou seja, a estipulação de calendário para a prática de atos processuais (art. 191)
. São inovações a cujo respeito aguarda-se o uso pelos litigantes e, notadamente, a admissão do órgão judicial, pouco propenso a abdicar de seus poderes de direção formal e material do processo em proveito das partes. Seja como como for, não se pode excluir, a priori, o emprego de convenção das partes para disciplinar o procedimento in executivis. Ao nosso ver, impõe-se uma ressalva: a necessidade de respeitar o meio executório, em nome da sua tipicidade, simples reflexo do indisponível direito processual fundamental do art. 5.º. LIV, da CF/1988." (ASSIS, Araken de.
Manual de
execução
.
18. ed. SP: RT. 2021. tópico 2. §5, item 19).
O STJ tem declarado, no essencial, a validade da maioria das medidas executivas atípicas, como ilustra o julgado abaixo:
"RECURSO EM HABEAS CORPUS - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - MEDIDAS ATÍPICAS EXECUTIVAS - APREENSÃO DE CARTÕES DE CRÉDITO E DE PASSAPORTE - PARCIAL CONHECIMENTO DO RECURSO PORQUANTO, NO TOCANTE À APREENSÃO DE CARTÕES DE CRÉDITOS, NÃO HÁ VIOLAÇÃO DE DIREITO DE LOCOMOÇÃO - DEVEDOR QUE OSTENTA PATRIMÔNIO E SE FURTA AO PAGAMENTO - MEDIDA SUBSIDIÁRIA - RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE VERIFICADAS NO CASO EM CONCRETO - LEGALIDADE - PRECEDENTES. 1. No que consiste à determinação judicial de cancelamento dos cartões de crédito, não merece ser conhecido, porquanto não há, para a viabilização do remédio constitucional, qualquer violação ao direito de locomoção do interessado, de modo que este tema deveria ter sido objeto de impugnação em recurso próprio e adequado. 2.
A aplicação das medidas atípicas (art. 139, IV, do CPC)é uma consequência lógica e fática do poder geral de efetivação das decisões judiciais, exercido pelos juízes, diante das circunstâncias fáticas de cada caso, por não se tratar de um enunciado apriorístico, objetivando realizar a efetividade do processo, pois, não é possível olvidar que todo feito, incluídas as fases de conhecimento e executiva, deve chegar a um fim factível, atingindo a satisfatividade da tutela executiva pleiteada
. 3. As diretrizes firmadas pelo Tribunal da Cidadania, que constituem freios à atuação discricionária do juiz, são, diante das peculiaridades da hipótese em concreto: a) a existência de indícios de que o recorrente possua patrimônio apto a cumprir com a obrigação a ele imposta; b)
a decisão deve ser devidamente fundamentada com base nas especificidades constatadas; c) a medida atípica esteja sendo utilizada de forma subsidiária, dada a menção de que foram promovidas diligências à exaustão para a satisfação do crédito; e d) observou-se o contraditório e o postulado da proporcionalidade. Precedentes do STJ
. 4.
Diante dessa nova forma de compreender o sistema processual, não é mais correto afirmar que a atividade satisfativa, sobretudo a tutela executiva, somente poderá ser obtida mediante a aplicação de regras herméticas, pois o legislador notoriamente conferiu ao magistrado (arts. 1º e 4º do CPC/2015) um poder geral de efetivação, desde que, é claro, fundamente adequadamente sua decisão a partir de critérios de ponderação, de modo a conformar, concretamente, os valores incidentes ao caso em análise
. 5. A decisão judicial restou fundamentada na existência de indícios patrimoniais e na conduta renitente do devedor de obstar a efetividade da prestação jurisdicional executiva. Nada impede que o juízo processante revise a efetividade do ato judicial com o decurso do tempo. 6. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido." (STJ - RHC: 153042 RJ 2021/0279685-8, Data de Julgamento: 14/06/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/08/2022)
2.66. Registro em cadastros de inadimplentes:
A averbação do nome do(a) executado(a) em cadastros restritivos ao crédito é autorizada pelo art. 139, IV, CPC, que dispõe que o Juízo deverá
"determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária."
Já o art. 782, CPC estipula que
"A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes."
O STJ tem aplicado aludida regra:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE, APÓS RECONSIDERAR DELIBERAÇÃO ANTERIOR, DEU PARCIAL PROVIMENTO AO APELO NOBRE. INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE AGRAVANTE. 1. "
Dispõe o art. 782, § 3º, do CPC/2015 que, a requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes. [...] depreende-se da redação do referido dispositivo legal que, havendo o requerimento, não há a obrigação legal de o Juiz determinar a negativação do nome do devedor, tratando-se de mera discricionariedade. A medida, então, deverá ser analisada casuisticamente, de acordo com as particularidades do caso concreto
". ( REsp 1887712/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/10/2020, DJe 12/11/2020). 2. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 1664199 DF 2020/0035446-0, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 21/02/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/02/2022)
2.67. Tratamento do tema pela lei 8.078/90:
No âmbito da regulação privada do tema - código de defesa do consumidor -, em que pese o credor possa promover o lançamento do nome do devedor em cadastros de restrição ao crédito, em princípio isso demanda o rigoroso preenchimento dos requisitos dos arts. 43 e 44 do Código de Defesa do Consumidor (lei n. 8.078/1990). Assim, para tanto, deve ser encaminhada missiva prévia para o endereço atual do cliente, conforme art. 43, §2º, CDC/1990. A averbação indevida pode ensejar danos morais aferíveis
in re ipsa -
ou seja, a partir dos fatos havidos.
No regime do CPC/15, não há necessidade de tais medidas, previstas na lei 8.078/1990, devendo o devedor ser intimado da inscrição respectiva. Conquanto se possa cogitar que haja diferenciação entre execução de título extrajudicial ou cumprimento de sentença, por conta da localização do referido dispositivo, no âmago do Código, os Tribunais têm reputado aplicação o dispositivo em ambas as espécies de execução:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. Execução de título extrajudicial. Decisão que indeferiu o pedido de inclusão do nome da executada junto aos órgãos de proteção ao crédito. Insurgência. Admissibilidade. A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, conforme previsto no art. 782, § 3º, do CPC. Referida possibilidade aplica-se tanto à execução de título extrajudicial quanto ao cumprimento definitivo de sentença, a teor do art. 782, § 5º, do CPC. Decisão reformada. Recurso provido. (TJ-SP - AI: 21819483520238260000, Relator: Helio Faria, Data de Julgamento: 03/11/2023, 18ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 03/11/2023)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. INSCRIÇÃO CADASTRAL COM BASE NO ART. 782, e § 3º, DO CPC. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. ADMISSIBILIDADE. RESP. 1.807.180/PR; TEMA 1026 DO STJ. 1. O art. 782, § 3º, do CPC, ao prever que "o requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes", aplica-se também às execuções de títulos extrajudiciais. 2. Recurso conhecido e provido. (TJPR - 15ª Câmara Cível - 0027532-59.2022.8.16.0000 - Xambrê - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU JOSÉ RICARDO ALVAREZ VIANNA - J. 22.08.2022) (TJ-PR - AI: 00275325920228160000 Xambrê 0027532-59.2022.8.16.0000 (Acórdão), Relator: José Ricardo Alvarez Vianna, Data de Julgamento: 22/08/2022, 15ª Câmara Cível, Data de Publicação: 23/08/2022)
Ainda sobre o mencionado instituto, destaco a análise de Araken de Assis, como transcrevo:
"
O crédito tem expressiva relevância na sociedade de massas para aquisição de bens e de serviços. E sua concessão, incluindo no âmbito dos negócios entre particulares, jamais se mostrou automática, dependendo da pontualidade em negócios anteriores. É um dado essencial à liberdade de contratar para ambos os figurantes
.
Progressivamente, criam-se bancos de dados com essas informações, a partir da metade do século XX, e, segundo consta, pioneiramente na Associação Comercial de São Paulo. O art. 43 da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor) disciplinou os aspectos essenciais. O art. 782, § 3.º, do CPC, permite a inclusão do nome do executado no “cadastro dos inadimplentes” por ordem do órgão judiciário. Entende-se por “cadastro dos inadimplentes” qualquer serviço que disponibilize informações positivas ou negativas para uso no comércio jurídico, utilizando em sua base de busca, o número do cadastro da pessoa natural na Receita Federal, conhecido pela sigla CPF e dado ministrado pelo exequente na petição inicial da execução (art. 524, I, e art. 798, II, b). O Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC) é mantido por empresa privada, mas, fictamente, considerado entidade pública, a teor do art. 43, § 4.º, da Lei 8.078/1990.
O objetivo do art. 782, § 3.º, é o de exercer pressão econômica sobre o executado, compelindo-o ao pagamento, similarmente ao expediente do protesto do título executivo judicial (art. 517). À diferença desse último, específico para o título judicial, vez que o título extrajudicial é protestado, ou não, facultativa ou obrigatoriamente, antes da execução, a inscrição tem cabimento na execução de título judicial e extrajudicial, conforme a desnecessária remissão do art. 782, § 5.º, pois a incidência já decorreria do art. 513, caput. E, de resto, apenas acrescenta informação disponível no cadastro, porque o banco de dados registra a distribuição da causa e, conseguintemente, da pretensão a executar.
Corresponde à experiência comum o cliente da empresa de banco tomar ciência, em primeira mão, do ajuizamento de demanda quando almeja renovar seu contrato de abertura de crédito ou cheque especial. A inscrição cogitada no art. 782, § 3.º, subordina-se à exclusiva iniciativa da parte. Evidencia essa circunstância a cláusula de abertura da regra. Não cabe ao juiz determinar a providência ex officio. Desse ato ilegal caberá agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único). Por outro lado, a inscrição só pode ocorrer uma vez proposta a pretensão a executar, pois envolve o executado, consoante o art. 782, § 3.º, e, não, o “devedor”. Não se subordina ao vencimento do prazo de cumprimento (v.g., na execução de título judicial, ao interstício de quinze dias do art. 523, caput).
E, conforme os trâmites posteriores, o juiz determinará seu imediato cancelamento, ocorrendo uma de três situações
: (a) pagamento; (b) realização de penhora; (c) extinção do processo (art. 782, § 4.º). Far-se-á a inscrição mediante ofício expedido pelo órgão judiciário. O serviço destinatário da ordem judicial comunicará a realização da providência (Súmula do STJ, n.º 359), mediante correspondência para essa finalidade, diretamente ao executado, no endereço constante nos autos e que será indicado no ofício, aplicando-se, destarte, o art. 43, § 2.º, da Lei 8.078/1990.
E não perdurará indefinidamente, pois há de ser cancelado após cinco anos, a teor do art. 43, § 1.º, da Lei 8.078/1990 (Súmula do STJ, n.º 323)
. Assim, não se vincula unicamente à ulterior extinção do processo, por qualquer motivo, como poder-se-ia inferir do art. 782, § 4.º. É inelutável a integração do art. 782, § 3.º, às disposições do art. 43 da Lei 8.078/1990, porque a medida de pressão interfere no mercado de consumo. Os frutos dessa medida são incertos. Dependerão da coleta de dados empíricos de difícil apuração. Nem sempre o executado, ao remir a execução (art. 826), revela o móvel do ato e, feita inscrição, não parece possível reconhecer-lhe a condição de causa hábil automaticamente. Seja como for, caberá ao CNJ levantar os casos em que há cumprimento voluntário feita ou não a inscrição. E convém notar que registro da litispendência, realizado atualmente no banco de dados, não contribuiu decisivamente para esse fim. Tal não implica a inutilidade da providência do art. 782, § 3.º, importante novidade do CPC." (ASSIS, Araken.
Processo de execução.
SP: RT. 2021 capítulo 3, item 32.).
Menciono ainda o tema 1026 do STJ:
"
Inscrição do devedor em cadastros de inadimplentes por decisão judicial. Execução fiscal. Art. 1º da Lei n. 6.830/1980. Aplicação subsidiária do CPC. Possibilidade. Deferimento do requerimento de negativação. Desnecessidade de esgotamento prévio de outras medidas executivas
."
2.68. Prazo máximo de manutenção da inscrição:
D'outro tanto, o prazo máximo para duração da medida é de
05 anos, conforme art. 43, § 1.º, da Lei 8.078/1990 (Súmula do STJ, n.º 323
). ANOTO, contudo, que cabe à parte executada promover diligências, junto ao presente Juízo, comunicando a proximidade do aludido prazo ou mesmo seu esgotamento, dado seu interesse na medida, do que deve ser oportunamente INTIMADA. Deve-se evitar, com isso, que o aludido controle do prazo de duração/persistência fique submetido ao Estado, dada a ausência de um sistema informatizado de controle de prazos de duração de tais medidas ou alguma rotina que viabilize aludida análise.
Ademais, como o tema é interesse da parte executada, lhe caberá fazer aludido controle, quando seja deferida tal medida, comunicando ao Juízo qualquer hipótese de cancelamento da medida - detalhadas acima -, para que a averbação seja então levantada, preenchidos os requisitos de lei.
2.69. Eventual retenção de passaporte:
O STJ tem reputado válida a retenção do passaporte, ainda que possa significar uma mitibação da garantia do art. 5, XV, da Constituição - direito de ingresso e retirada do território nacional.
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. IMPROBIDADE. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MEDIDAS COERCITIVAS. SUSPENSÃO DE CNH E APREENSÃO DE PASSAPORTE. POSSIBILIDADE. ART. 139, IV, DO CPC/15. MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS. APLICAÇÃO EM PROCESSOS DE IMPROBIDADE. PAR METROS A SEREM OBSERVADOS. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Trata-se, na origem, de cumprimento de sentença proferida em Ação por Improbidade Administrativa, na qual se narrou apropriação indevida de salários de estagiários contratados pela Secretaria de Estado de Cultura .2. Após o trânsito em julgado da decisão condenatória, a execução da sanção pecuniária ficou frustrada, por não se localizar patrimônio penhorável, razão pela qual o Ministério Público postulou a adoção de medidas executivas atípicas, como apreensão da Carteira Nacional de Habilitação e do passaporte da executada .3. Consoante o acórdão recorrido, tentou-se executar a multa imposta na sentença condenatória transitada em julgado, mas, "decorridos alguns anos, sem que houvesse a satisfação do débito, e frustradas todas as possibilidades para localização de bens passíveis de penhora, o Ministério Público Estadual requereu a apreensão da Carteira Nacional de Habilitação e do seu passaporte" (fl. 135, e-STJ). Entendeu o Tribunal de origem que a medida requerida "caracteriza como restrição aos direitos pessoais e não tem relação com seu patrimônio." (fl. 136, e-STJ). DA FUNDAMENTAÇÃO ESTRITAMENTE JURÍDICA E INFRACONSTITUCIONAL 4. O acórdão recorrido assim consignou ao decidir a controvérsia (fls. 136, e-STJ): "Sabe-se que, por força da regra esposada no artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil, o Juiz está autorizado a tomar as medidas atípicas para garantir a satisfação do direito do credor em face do devedor. Veja-se: (...) No caso vertente, verifico que, de fato, o
Cumprimento da Sentença tramita por longo período e o Agravante esgotou todos os meios típicos, para a satisfação do débito, mas não obteve sucesso. Contudo, o pedido de apreensão da Carteira Nacional de Habilitação e do passaporte da Recorrida não merece acolhimento, porque se caracteriza como restrição aos direitos pessoais e não tem relação com seu patrimônio. Ademais, inexiste qualquer evidência de que as medidas postuladas, caso deferidas, possam levar ao adimplemento do débito.Ao contrário, trata-se de meios absolutamente desproporcionais para a satisfação da obrigação perseguida. Não há desconsiderar que a CRFB estabelece, como regra, a plena liberdade de ingresso e saída do território nacional. Assim, a adoção da exceção viola os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, pois restringe, em demasia, o uso e gozo plenos desta liberdade que a CRFB qualifica como de caráter fundamental
. Nessa quadra, é certo que a apreensão da CNH e do passaporte da Agravada não se coaduna com a norma contida no artigo 139, IV, do Código de Processo Civil, tampouco cumpre o objetivo do procedimento executório consistente na satisfação do débito" .5. Embora existam referências à Constituição Federal de 1988, o raciocínio desenvolvido é, ainda, uma interpretação do artigo 139, IV, do CPC, segundo a qual o preceito não poderia ser entendido de determinada forma em decorrência da ordem constitucional, ou seja, há a ideia de ofensa reflexa à Constituição .6.
Por isso, no STF, embora a matéria esteja sob apreciação na ADI 5.941 (ainda não decidida), não se está conhecendo dos Recursos Extraordinários com o fundamento de que se trata de controvérsia infraconstitucional. Nesse sentido, as decisões monocráticas nos seguintes feitos: RE 1.221.543, Rel. Min. Alexandre de Moraes
, DJe 7.8.2019; RE 1.282.533/PR, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe 25.8.2020;RE 1.287.895, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 21.9.2020; RE 1.291.832, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 1.3.2021. Trata-se, portanto, de saber se as instâncias ordinárias negaram ou não vigência ao artigo 139, IV, do CPC/2015. JURISPRUDÊNCIA DO STJ 7. Há no Superior Tribunal de Justiça julgados favoráveis à possibilidade da adoção das chamadas medidas atípicas no âmbito da execução, desde que preenchidos certos requisitos. Nesse sentido: "O propósito recursal é definir se a suspensão da carteira nacional de habilitação e a retenção do passaporte do devedor de obrigação de pagar quantia são medidas viáveis de serem adotadas pelo juiz condutor do processo executivo [...] O Código de Processo Civil de 2015, a fim de garantir maior celeridade e efetividade ao processo, positivou regra segundo a qual incumbe ao juiz determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária (art. 139, IV)." (REsp 1.788.950/MT, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 26.4.2019). Na mesma esteira: AgInt no REsp 1.837.309/SP, Relator Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 13.2.2020; REsp 1.894.170/RS, Relatora Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 12.11.2020 .8. Há, também, decisão da Primeira Turma que indefere as medidas atípicas, mas mediante expressa referência aos fatos da causa.Afirmou-se no julgado: "O TJ/PR deu provimento a recurso de Agravo de Instrumento interposto pelo Município de Foz do Iguaçu/PR contra a decisão de Primeiro Grau que indeferiu o pedido de medidas aflitivas de inscrição do nome do executado em cadastro de inadimplentes, de suspensão do direito de dirigir e de apreensão do passaporte.
O acórdão do TJ/PR, ora apontado como ato coator, deferiu as indicadas medidas no curso da Execução Fiscal. Ao que se dessume do enredo fático-processual, a medida é excessiva. Para além do contexto econômico de que se lançou mão anteriormente, o que, por si só, já justificaria o afastamento das medidas adotadas pelo Tribunal Araucariano, registre-se que o caderno processual aponta que há penhora de 30% dos vencimentos que o réu aufere na Companhia de Saneamento do Paraná-SANEPAR. Além disso, rendimentos de sócio-majoritário que o executado possui na Rádio Cultura de Foz do Iguaçu Ltda. - EPP também foram levados a bloqueio
(fls. 163/164)" (HC 45.3870/PR, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 15.8.2019). RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE DAS MEDIDAS ATÍPICAS EM PROCESSOS DE IMPROBIDADE 9. Além de fazer referência aos fatos da causa - coisa que o Tribunal de origem não fez, pois considerou não razoáveis e desproporcionais as medidas em abstrato -, essa última decisão, da Primeira Turma, foi proferida em Execução Fiscal. Aqui, diversamente, trata-se de cumprimento de sentença proferida em Ação por Improbidade Administrativa, demanda que busca reprimir o enriquecimento ilícito, as lesões ao erário e a ofensa aos princípios da Administração Pública.10. Inadmissíveis manobras para escapar da execução das sanções pecuniárias impostas pelo Estado, sob pena de as condutas contrárias à moralidade administrativa ficarem sem resposta. Ora, se o entendimento desta Corte - conforme a jurisprudência supradestacada - é o de que descabem medidas executivas atípicas para a satisfação de obrigações de cunho estritamente
patrimonial
, com muito mais razão elas devem ser admitidas em casos em que o cumprimento da sentença se dá para tutelar a moralidade e o patrimônio público.
Superada a questão da impossibilidade de adoção de medidas executivas atípicas de cunho não
patrimonial
pela jurisprudência do STJ (premissa equivocada do acórdão recorrido), não há como não considerar o interesse público, na satisfação da obrigação, importante componente para definir o cabimento (ou não) delas à luz do caso concreto.
11. Não ocorre, portanto - ao menos do modo abstrato como analisado o caso na origem -, ofensa à proporcionalidade ou à razoabilidade pela adoção de medidas não patrimoniais para o cumprimento da sentença. PAR METROS 12. Os parâmetros construídos pela Terceira Turma para a aplicação das medidas
executivas atípicas encontram largo amparo na doutrina e se revelam adequados também ao cumprimento de sentença proferida em Ação por Improbidade.13. Conforme tem preconizado a Terceira Turma, "A adoção de meios executivos atípicos é cabível desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidad
e." (REsp 1.788.950/MT, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 26.4.2019).14. Consigne-se que a observância da proporcionalidade não deve ser feita em abstrato, a não ser que as instâncias ordinárias expressamente declarem inconstitucional o artigo 139, IV, do CPC/2015. Não sendo o caso, as balizas da proporcionalidade devem ser observadas com referência ao caso concreto, nas hipóteses em que as medidas atípicas se revelem excessivamente gravosas e causem, por exemplo, prejuízo ao exercício da profissão (REsp 1.929.230/MT, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 1.7.21).CONCLUSÃO 15.
Recurso Especial parcialmente provido para determinar a devolução dos autos à origem, a fim de que o requerimento de adoção de medidas atípicas, feito com fundamento no artigo 139, IV, do CPC, seja analisado de acordo com o caso concreto, mediante a observância dos parâmetros acima delineados
. (STJ - REsp: 1963739 MT 2020/0335063-0, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 26/10/2021, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/12/2021)
Logo, eventual retenção dos documentos depende de indicativos de que o executado estaria ocultando bens à penhora. A medida deve ser vista com redobradas reservas, por violar o direito assegurado no art. 5, XV, CF/88.
2.70. Retenção da CNH:
Quanto à retenção de CNH, os Tribunais têm decidido como segue:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INADIMPLEMENTO. MEDIDAS ATÍPICAS. BLOQUEIO DE CARTÃO DE CRÉDITO. APREENSÃO DE CNH. 1. No caso em exame, os elementos dos autos evidenciam que foram adotados, sem sucesso, todos os procedimentos ordinários na busca de bens e ativos penhoráveis em nome dos executados. É o que se depreende do fato de não terem sido localizados bens por meio dos sistemas BACENJUD e RENAJUD, por exemplo. 2.
Assim, a agravante comprovou o esgotamento das medidas judiciais convencionais sem atingir o resultado pretendido, ou seja, a satisfação do seu crédito. De outro lado, foi oportunizado o contraditório aos executados/agravados, tanto na ação de origem quanto neste recurso. Dessa forma, encontram-se presentes os requisitos para o deferimento do pedido da exequente. 3. Destaca-se que a utilização de medidas executivas atípicas é admitida pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de modo subsidiário, desde que observado o contraditório e o princípio da proporcionalidade
. (TRF4, 3ª Turma, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5028886-08.2019.4.04.0000, Relatora Desembargadora Federal V NIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 10/11/2020)
"(...) 3. O Código de Processo Civil de 2015, a fim de garantir maior celeridade e efetividade ao processo, positivou regra segundo a qual incumbe ao juiz determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária (art. 139, IV). 4. A interpretação sistemática do ordenamento jurídico revela, todavia, que tal previsão legal não autoriza a adoção indiscriminada de qualquer medida executiva, independentemente de balizas ou meios de controle efetivos. 5. De acordo com o entendimento do STJ, as modernas regras de processo, ainda respaldadas pela busca da efetividade jurisdicional, em nenhuma circunstância poderão se distanciar dos ditames constitucionais, apenas sendo possível a implementação de comandos não discricionários ou que restrinjam direitos individuais de forma razoável. Precedente específico. 6. A adoção de meios executivos atípicos é cabível desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade.
7. Situação concreta em que o Tribunal a quo indeferiu o pedido do exequente de adoção de medidas executivas atípicas sob o singelo fundamento de que a responsabilidade do devedor por suas dívidas diz respeito apenas ao aspecto patrimonial, e não pessoal. 8. Como essa circunstância não se coaduna com o entendimento propugnado neste julgamento, é de rigor - à vista da impossibilidade de esta Corte revolver o conteúdo fático-probatório dos autos - o retorno dos autos para que se proceda a novo exame da questão. 9. De se consignar, por derradeiro, que o STJ tem reconhecido que tanto a medida de suspensão da Carteira Nacional de Habilitação quanto a de apreensão do passaporte do devedor recalcitrante não estão, em abstrato e de modo geral, obstadas de serem adotadas pelo juiz condutor do processo executivo, devendo, contudo, observar-se o preenchimento dos pressupostos ora assentados
. Precedentes. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (REsp 1782418/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/04/2019, DJe 26/04/2019)
A medida pode se tornar gravosa caso a condução de veículos seja inerente à atividade profissional do autor, dado cuidar-se de instrumento do trabalho e, portanto, algo impenhorável - art. 833, CPC/15.
2.71. Cancelamento de cartões de crédito:
A medida pode se revelar proporcional em muitos casos, podendo ser deferida, contanto que sejam preservados os créditos da administradora. Em princípio, a medida não chega a comprometer o mínimo existencial do executado.
2.72. Cancelamento da chave PIX:
Quando se cuide de executado pessoa física, a medida revela-se desproporcional na maioria dos casos, dado que a utilização da chave PIX é mecanismo para pagamentos reiterados e pode consistir também em fonte de renda, necessária para a preservação do mínimo vital. A medida depende de uma consistente demonstração de justa causa.
ADMINISTRATIVO E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS. APREENSÃO DE CNH. BLOQUEIO DE CARTÕES. RESTRIÇÃO DE PASSAPORTE. REQUISITOS NÃO ATENDIDOS. 1. Não se vê óbice, em tese, ao deferimento das medidas ora requeridas. No entanto, é preciso que, no caso concreto, elas sejam suscetíveis de permitir o atingimento do fim proposto, que é o de obter o pagamento do valor devido ao credor (fim precípuo do processo de execução), já que se trata de medidas indutivas ou coercitivas para a obtenção do pagamento, e não de sanções impostas ao devedor pelo não pagamento. 2. Destaca-se que a utilização de medidas executivas atípicas é admitida pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de modo subsidiário, desde que , observado o contraditório e o princípio da proporcionalidade e comprovado o esgotamento das medidas judiciais convencionais sem que se atinja o resultado pretendido - a satisfação do crédito -, verifique-se a existência de indícios de que o devedor possui patrimônio expropriável. 2. Na hipótese específica dos autos originários, não é o caso de deferimento das medidas requeridas, porque, conforme se extrai das informações constantes daquele feito, a parte executada não apresentou declaração de renda em patamares mínimos nos últimos exercícios pesquisados e tampouco possui valores ou veículos livres de restrições em seu nome, não havendo indícios de existência de patrimônio expropriável, que, oculto, poderia garantir o pagamento da dívida, objetivo que se busca induzir. Note-se, ainda, que não se possibilitou o contraditório à parte executada, quanto às medidas pretendidas. 3. A inexistência de bens passíveis de penhora indica que a a adoção das medidas pretendidas pela CEF seria inócua para o propósito de induzir o devedor ao adimplemento da dívida, uma vez que não foi demonstrada a existência indícios de ocultação de patrimônio, nem propósito deliberado de frustrar a execução. 4. Agravo de instrumento a que se dá provimento. (TRF-4 - AI: 50199802420224040000, Relator: GISELE LEMKE, Data de Julgamento: 08/02/2023, DÉCIMA SEGUNDA TURMA)
2.73. Penhora de faturamento:
D'outro tanto, a
penhora de fração do faturamento de empresa executadad, equiparada à constrição do próprio estabelecimento industrial ou comercial, tem sido admitida pelos tribunais em caráter excepcional, quando restem infrutíferas as tentativas de penhora
sobre os outros bens do devedor, exatamente o que se observou na espécie dos autos, em que restou clara a dificuldade em localizar bens em nome da parte executada, conforme informações obtidas nos eventos 67, 70, 73, 88, 95 e 126.
Nesse sentido, vejam-se os precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça, como transcrevo abaixo:
TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PENHORA SOBRE O FATURAMENTO DA EMPRESA. MEDIDA EXCEPCIONAL. PRECEDENTES.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de que a penhora sobre o faturamento da empresa, em execução fiscal, é providência excepcional e só pode ser admitida quando presentes os seguintes requisitos: a) não localização de bens passíveis de penhora e suficientes à garantia da execução ou, se localizados, de difícil alienação; b) nomeação de administrador (art. 677 e seguintes do CPC); e, c) não comprometimento da atividade empresarial.
2. Existentes Bens a garantirem a satisfação do crédito, incabível a medida excepcional pleiteada; porquanto, a penhora sobre o faturamento da empresa não equivale à penhora sobre dinheiro. Precedentes. Agravo regimental improvido. (STJ, AGREsp nº 1170822, Rel Min. Humberto Martins, 2ª Turma, DJE 17/11/2010)
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. PENHORA SOBRE O FATURAMENTO. REQUISITOS. INVIABILIDADE DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. 1. Admiti-se, em casos excepcionais, a penhora do faturamento de empresa, desde que a) o devedor não possua bens para assegurar a execução, ou estes sejam insuficientes para saldar o crédito; b) haja indicação de administrador e esquema de pagamento, nos termos do art. 677, CPC; c) o percentual fixado sobre o faturamento não torne inviável o exercício da atividade empresarial. Precedentes. 2. Na hipótese dos autos, contudo, a análise da possibilidade de penhora de parte do rendimento da empresa executada implicaria a revisão do conjunto fático-probatório, especialmente no que se refere a inviabilização do exercício da atividade empresarial. Incidência da Súmula 7/STJ. 3. Para a configuração do dissídio jurisprudencial, faz-se necessária a indicação das circunstâncias que identifiquem as semelhanças entre o aresto recorrido e o paradigma, nos termos do parágrafo único, do art. 541, do Código de Processo Civil e dos parágrafos do art. 255 do Regimento Interno do STJ.
4. Recurso especial não conhecido.
(STJ, REsp nº 489508, Rel Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, DJE 24/05/2010)
Com alguma frequência, porém, aludida penhora de faturamento se revela ineficaz, sobremodo quando as empresas executadas já estão em vias de encerramento de atividade.
Essas são algumas considerações no que toca ao cumprimento de sentença para pagamento de quantia certa em face de entidades submetidas ao regime jurídico de direito privado
.
2.74. Mínimo existencial:
Note-se, ainda, que a tutela do mínimo existencial é um consectário direto do reconhecimento da dignidade humana (art. 1º, III, CF), enquanto alicerce do Estado. Quanto à dignidade do homem, oportuna a lição de Ingo Wolfgang Sarlet, quando sustenta o que segue:
"Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão dos demais seres humanos."
(SARLET, Ingo Wolfgang.
Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 60)
Por seu turno, Ricardo Lobo Torres argumenta que
"
O Mínimo Existencial é direito subjetivo protegido negativamente contra a intervenção do Estado e, ao mesmo tempo, garantido positivamente pelas prestações estatais. Diz-se, pois, que é direito de status negativus e de estatus positivus, sendo certo que não raro se convertem uma na outra ou se complicam mutuamente a proteção constitucional positiva e negativa
."
(TORRES, Ricardo Lobo.
Tratado de direito constitucional financeiro e tributário:
vol. III: os direitos humanos e a tributação. Imunidades e Isonomia. 3. ed. RJ: Renovar, p. 187).
Ainda segundo Torres,
"Os direitos da liberdade exigem o status negativus, que significa o poder de autodeterminação do indivíduo, a liberdade de ação ou de omissão sem qualquer constrangimento por parte do Estado.
O status negativus do mínimo existencial se afirma, no campo tributário, através das imunidades fiscais: o poder de imposição do Estado não pode invadir a esfera de liberdade mínima do cidadão representada pelo direito à subsistência. Mas essa imunidade é paradoxal, eis que protege tanto o pobre como o rico, dentro dos limites mínimos necessários à garantia a dignidade humana."
(TORRES, R.L.
Obra citada.
p. 188).
Em sentido semelhante, registro ainda a obra de BARCELLOS, Ana Paula de.
A eficácia jurídica dos princípios constitucionais.
Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 305; FACHIN, Luiz Edson.
O estatuto jurídico do patrimônio mínimo.
2. ed., Renovar, 2006 e TORRES, Ricardo Lobo.
Direito ao
mínimo existencial
.
Rio de Janeiro: Renovar, 2009.
Isso se projeta na exoneração de determinados tributos, a exemplo da isenção do IRPF quando o sujeito tenha auferido rendimentos aquém de determinado limite. Também encontra amparo no instituto do "bem de família", previsto na lei n. 8.099/1990 e arts. 1711 e ss., Código Civil; art. 833, Código de Processo Civil, prestações assistenciais como o LOAS ou auxílio emergencial, dentre outros. Logo, sempre que seja demonstrado que determinada constrição judicial realmente afeta o mínimo existencial do executado ou dos seus empregados, isso há de ensejar o levantamento - total ou parcial - da penhora/arresto, em atenção aos aludidos vetores.
2.75. Eventual caracterização de bem de família:
No que toca ao bem de família, deve-se atentar para a lei n. 8.009/1990, para os arts. 1.711-1.722, do Código Civil/02, art. 833, Código de Processo Civil.
"art. 1.711 - Código Civil.
Podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial
."
No que diz respeito ao bem de família, atente-se para o art. 1º e 3º da lei n. 8.009/1990:
Art.1º
O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei
. Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: (...) II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato; III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida; IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar; V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar; VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens. VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
O tema também é versado pelos arts. 1.711 a 1.722 do Código Civil, merecendo destaque o que segue:
Art. 1.711.
Podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial
. Parágrafo único. O terceiro poderá igualmente instituir bem de família por testamento ou doação, dependendo a eficácia do ato da aceitação expressa de ambos os cônjuges beneficiados ou da entidade familiar beneficiada.
Art. 1.712. O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família.
Art. 1.714. O bem de família, quer instituído pelos cônjuges ou por terceiro, constitui-se pelo registro de seu título no Registro de Imóveis.
Art. 1.715. O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio. Parágrafo único. No caso de execução pelas dívidas referidas neste artigo, o saldo existente será aplicado em outro prédio, como bem de família, ou em títulos da dívida pública, para sustento familiar, salvo se motivos relevantes aconselharem outra solução, a critério do juiz.
Aludidos dispositivos são alvo do comentário de Rita Vasconcelos:
"O conteúdo da Lei 8.009/1990 pode ser traduzido, em resumo, no disposto em seu art. 1.º, caput, que prescreve: O imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta Lei.Neste tópico serão abordadas somente as questões relativas à definição do imóvel próprio e à circunstância de ele não responder por dívida de qualquer natureza. A problemática em torno da entidade familiar de que trata a lei, refletida nesse mesmo dispositivo, será tratada a seguir, no Capítulo 3, numa análise mais cuidadosa das várias formas de constituição de família.Inicialmente, observa-se que o benefício da impenhorabilidade legal se dirige, principalmente, às pessoas naturais.
O instituto do bem de família não foi concebido para beneficiar pessoas jurídicas, que podem ser beneficiadas de forma indireta, quando do reconhecimento da impenhorabilidade arguida pelo sócio, quanto ao bem de sua propriedade.É possível, no entanto, que a impenhorabilidade seja reconhecida em favor do empresário individual (que mesmo tendo inscrição no CNPJ não constitui pessoa jurídica), que exerce pessoalmente suas atividades e assume responsabilidade ilimitada, bem como em favor de pequenas empresas de caráter essencialmente familiar, com sede muitas vezes na própria moradia dos sócios, integrantes da família. Admite-se esse entendimento porque, numa verdadeira confusão de patrimônios, há casos em que, não havendo bens da empresa, são os bens dos membros da família que respondem pelas obrigações por ela contraídas.
Outra consideração importante, é a de que o objeto da impenhorabilidade legal, tal como definido na Lei 8.009/1990, pode consistir, em tese, tanto na mais simples quanto na mais luxuosa residência, visto que a lei não faz qualquer menção à área ou à localização do imóvel, tratando do assunto com uma injustificável generalidade
. Há quem defenda até mesmo a inconstitucionalidade da lei em razão da ausência de critérios seguros para definir a habitação familiar abrangida pelo benefício. Carlos Callage, para quem a Lei 8.009/1990 está repleta de equívocos, aponta como uma das causas de sua inconstitucionalidade, a inexistência de regulamentação quanto ao valor, localização ou metragem do imóvel residencial familiar. E essa inexistência de critérios seguros para definir o imóvel residencial impenhorável fez com que a jurisprudência evoluísse no sentido de admitir o desmembramento do imóvel tido como residencial familiar, aplicando-se analogicamente o § 2.º do art. 4.º da lei sob exame, a fim de que a impenhorabilidade recaia somente sobre a área indispensável à fixação da residência, quando esta comportar individualização.
Ressalte-se, entretanto, que a pluralidade de construções não pressupõe necessariamente a divisibilidade do imóvel.Esse entendimento vai ao encontro da ressalva introduzida pela Lei 11.382, de 06.12.2006, no rol dos bens impenhoráveis do Código de Processo Civil de 1973, no sentido de não se considerarem impenhoráveis os móveis de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida (regra mantida no Código de Processo Civil de 2015, art. 833, II).No tocante à titularidade do bem, a despeito da caracterização como bem de família, o imóvel continua pertencendo ao seu respectivo titular, e não propriamente à família, que não é ente dotado de personalidade jurídica.
E não apenas a propriedade é protegida pela impenhorabilidade legal; também a pos-se é abrangida pelo benefício.14 Ainda que a penhora deva incidir sobre bens de propriedade do executado, é possível que, diante da aparência de domínio, a penhora recaia sobre a posse do devedor sobre o bem. Mesmo nesses casos, a finalidade social da Lei 8.009/1990 admite sua aplicação para proteger a moradia do devedor e de sua família. A expressão imóvel residencial próprio, vale dizer, compreende também o imóvel que está sendo adquirido, desde que incontroverso o compromisso de compra e venda." (VASCONCELOS, Rita.
Impenhorabilidade do bem de família.
São Paulo: RT. 2015. capítulo II).
2.76. Boa-fé objetiva:
Deve-se ter em conta, ademais, o postulado da boa-fé objetiva, enquanto preceito que deve regular a relação entre os sujeitos, entre estes e o Poder Público, mesmo entre distintas unidades da Administração Pública.
Com efeito, "
ao impor sobre todos um dever de não se comportar de forma lesiva aos interesses e expectativas legítimas despertadas no outro, a tutela da confiança revela-se, em um plano axiológico-normativo, não apenas como principal integrante do conteúdo da boa-fé objetiva,
mas também como forte expressão da solidariedade social, e importante instrumento de reação ao voluntarismo e ao liberalismo ainda amalgamados no direito privado como um todo
."
(SCHREIBER, Anderson.
A proibição de comportamento contraditório:
tutela da confiança e
venire contra factum proprium.
Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 91).
Ademais,
"Os princípios da segurança jurídica e da boa-fé objetiva, bem como a vedação ao comportamento contraditório (venire contra factum proprium),
impedem que a parte, após praticar ato em determinado sentido, venha a adotar comportamento posterior e contraditório
."
(AGRESP 200802418505, ARNALDO ESTEVES LIMA, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:29/03/2010).
Acrescento que
"O Poder Público não é um poder irresponsável e arbitrário, ele se vincula e se limita pelos seus próprios atos. Não se pode reservar o privilégio, que se resume na mais cínica das prerrogativas que se arrogava o poder absoluto, de surpreender a boa-fé dos que confiam na sua palavra ou nas suas promessas, violando aquela ou anulando essas, depois de haver conseguido, por causa de uma ou de outras, as prestações cuja execução havia sido feita na boa-fé, fundamental não só ao seu comércio jurídico, como à convivência moral, de que a ninguém é dado retirar a palavra empenhada ou desfazer a promessa mediante a qual obteve vantagem de outrem ou lhe causou ou infligiu sacrifício."
(CAMPOS, Francisco.
Direito administrativo.
vol. I. Livraria Freitas Bastos, 1958, p. 70-71)
O respeito à boa-fé objetiva corresponde a "
uma norma de conduta que impõe aos participantes de uma relação obrigacional um agir pautado pela lealdade, pela consideração dos interesses da contraparte. Indica, outrossim, um critério de interpretação dos negócios jurídicos e uma norma balizamento ao exercício de direitos subjetivos e poderes formativos
."
(MARTINS-COSTA, Judith.
Comentários ao novo Código Civil.
RJ: Forense, 2005, p. 42).
Com as devidas adequações, essas regras também são oponíveis ao Estado. Nâo se pode reconhecer à Administração Pública a prerrogativa de surpreender os sujeitos, cobrando valores sem que lhes tenha comunicado anteriormente a causa dessa obrigaçã, ou modificando de inopino cláusulas contratuais.
"
Este Tribunal já decidiu que a frustração de expectativas legítimas criadas pelo poder público configura verdadeira afronta ao princípio da boa-fé objetiva, em seu postulado da proibição ao `venire contra factum proprium, que também deve ser respeitada pela Administração Pública
. Através da referida cláusula, vedam-se os comportamentos contraditórios que aviltam direitos e deveres previamente fixados entre as partes e quebram a relação de confiança que deveria prevalecer"
(TRF-1 - REOMS: 10056493420184013200, Relator: Desembargador Federal João Batista Moreira, Data de Julgamento: 06/07/2020, Sexta Turma, Data de Publicação: 07/07/2020).
De modo semelhante, aludidos preceitos são oponíveis aos particulares, no âmago de processos judiciais, conforme se infere do art. 5º, CPC/15:
"Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé."
Semelhante é o conteúdo do art. 322, §2º, e do art. 489, §3º, CPC/15, para além do disposto nos arts. 77 a 81, CPC/15.
2.77. Ônus da prova:
Em regra, no âmbito do cumprimento de sentença, aplicam-se as mesmas balizas, previstas para o processo de conhecimento, no que diz respeito à distribuição dos encargos demonstrativos.
No caso, em que pese a natural assimetria entre o autor e a UFPR, eis que ela se cuida de uma autarquia federal, com razoável poder burocrático e econômico, não há lastro para inversão do ônus da prova. Até porque a comprovação de que determinados valores comporíam o mínimo existencial, para fins de decretação de impenhorabilidade, é mais facilitada ao executado do que à exequente, no caso em análise.
Aplico ao caso, portanto, o art. 373, I e II, CPC/15, o que implica que compete ao executado o ônus de comprovar a impenhorabilidade das verbas bloqueadas junto ao seu patrimônio.
2.78. Elementos de convicção - cumprimento de sentença:
No evento 167, o IBAMA apresentou a seguinte planilha de cálculos:
Nesse valor, estavam inclusos os R$ 5.000,00 arbitrados a título de reparação de danos morais coletivos, na temática ambiental, e os honorários arbitrados em 10% do valor da causa, corrigido.
No evento 180, encontram-se documentos concernentes à pesquisa de inventário porventura promovido quanto ao instituidor da herança
Altair Wiese
, falecido em 16 de outubro de 2018. No evneto 193, há fotos áreas da área, que evidenciariam, segundo o IBAMA, o descumprimento da ordem judicial de recuperação da área. No evento 193, anexo 2 há fotos de um descampado.
O IBAMA sustentou que,
"Quanto a Valoração do dano: Tanto na Ficha de campo quanto no Relatório consta que " O interessado deverá promover o enriquecimento com espécies zoocóricas e secundárias, bem como a re rada ou anelamento das exó cas residuais"; ou seja verificou-se em campo a necessidade da adoção de técnica de plan o de mudas para promoção do enriquecimento com espécies secundárias e zoocóricas; diante de tal informação a valoração ob da conforme Informação Técnica 36 (SEI nº 12984602) a ser considerada é R$ 438.611,1624."
Fotos coloristas indicando uma clareira na mata encontram-se no evento 193, anexo-4. No evento 211, encontram-se documentos alusivos à constituição da empresa VIMADE-VITORIA INDUSTRIA E COMERCIO DE MADEIRAS LTD.
No evento 215, encontra-se cópia de petição protocolada no âmbito administrativo com o fim de atender, segundo a empresa requerida, a ordem de apresentação do PRAD:
A peça é datada de 02 de março de 2010!
O IBAMA sustentou que o
"PRAD anexado ao referido petitório é o mesmo que foi apresentado administrativamente perante esta autarquia e não executado; motivo que ensejou o ajuizamento da presente ação civil pública."
2.79. Cogitada má-fé da empresa:
Conquanto tenha anotado que, quanto à maioria dos executados, não divisei sinais de má-fé para fins de arbitramento de honorários quanto à etapa de cumprimento de sentença desta ação civil pública, destaco ser extravagante a atuação do requerido
FRANCISCO PIGATTO NETO
no evento 2015, quando sustentou:
"Embora não faça parte da Diretoria da empresa Ré destes Autos Agroflorestal Baptista Pigatto, o ora manifestante reporta-se aos fatos no sentido de que tem conhecimento de que o PRAD foi implantado na área. Para tal, a fim de dar cumprimento à ordem judicial da qual foi intimado, junta em anexo o comprovante do protocolo do PRAD perante o IBAMA, de modo que desde logo demonstra estar satisfeita esta ordem judicial."
Ele apresentou um PRAD elaborado antes da deflagração desta demanda, parecendo olvidar que o Juízo determinou a confecção de novo, no curso da demanda - decisão antecipatória -, fixando prazo para tanto na sentença. O requerido juntou documento já apreciado pelo Juízo no curso do processo, dando a entender cuidar-se de medida orientada a satisfazer o comando judicial, o que não ocorre.
Deixo, porém, de cominar multa neste momento em desfavor do requerido (arts. 77 e ss., CPC), dado que aludida questão há de ser apreciada adiante, atentando para a garantia do devido processo legal.
2.80. Liquidação de sentença - considerações gerais:
Convém ter em conta, assim, as várias espécies de liquidação de sentença, conforme já preconizava o anterior CPC, de 1973:
"No sistema precedente à lei 11.232/2005, originava-se, ademais, um processo autônomo, relativamente ao que formou o título, e preparatório à futura execução. Ao invés, na disciplina vigente, há cumulação sucessiva de pretensões,
in simultaneo processu,
no que tange ao provimento originário do processo, e respeitante às liquidações por arbitramento e por artigos. Não se forma, portanto, outra relação processual. E o chamamento do réu se realiza na forma do art. 475-A, §1º, mediante intimação na pessoa do advogado e publicação no órgão oficial (art. 236). Idêntico fenômeno se verifica, por exemplo, na reconvenção."
(ASSIS, Araken.
Manual da execução.
13. ed. São Paulo: RT, 2010, p. 327).
Anote-se, por outro lado, que
"
Liquida-se por arbitramento a obrigação que requeira concurso de especialista. Por tal motivo, o art. 475-C, II, prevê o arbitramento quando o exigir a natureza do objeto da liquidação
."
(Araken de Assis.
Manual cit.
p. 347). Já a liquidação por artigos é cabível quando se faça necessária a prova de fato novo (art. 475-F, CPC/1973). Ora,
"A liquidação por cálculo cabe sempre que a liquidez se obtenha mediante cálculos aritméticos. A rigor, contendo a sentença todos os elementos necessários para efetuar o cálculo, não há iliquidez. Esta hipótese corresponde, no direito português, à liquidação pelo exequente: na petição inicial da execução, utilizando os dados do próprio título, o credor apresente memória de cálculo."
(ASSIS.
Obra citada.
p. 337).
Por conseguinte, vê-se que
"Diversamente do que ocorre na liquidação por artigos (CPC/73, art. 475-E), na
liquidação por arbitramento não há oportunidade para se alegar e provar fato novo. A perícia a ser realizada incidirá sobre elementos já definidos, no curso da ação
."
(WAMBIER, Luiz Rodrigues.
Sentença civil: l
iquidação e cumprimento. 3. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 124). Assim,
"
O cabimento da liquidação por arbitramento decorre, portanto, da necessidade de labor pericial para a quantificação do valor devido
. Assim, somente nos casos em que há a necessidade de participação de perito, que dispõe de conhecimentos técnicos necessários à resolução da questão, é que se impõe a liquidação da sentença."
(WAMBIER.
Obra citada.
p. 125).
Na síntese de Luiz Rodrigues Wambier,
"
A liquidação por artigos será necessária, portanto, quando, para se determinar o valor da condenação, houver necessidade de prova de fato que tenha ocorrido depois da sentença
, e que tenha relação direta com a determinação da extensão da obrigação nela constituída, ou de fato que, mesmo não sendo a ela superveniente, não tenha sido objeto de alegação e prova no bojo do anterior processo de conhecimento, embora se trate de fato vinculado à obrigação resultante da sentença."
(WAMBIER.
Obra citada.
p. 128).
Tais considerações se coadunam plenamente com o art. 509, CPC/2015, sendo relevante a lição de Araken de Assis, ao comentar aludidos dispositivos legais:
"
Liquida-se por arbitramento obrigação que requeira concurso de especialista para apurar o quantum debeatur. Por esse motivo fundamental, o art. 509, I in fine, prevê o arbitramento quando "exigido pela natureza do objeto da liquidação
". O art. 509, I, também antecipa a hipótese de o órgão judiciário determinar o arbitramento na sentença, admitida, outrossim, a convenção das partes a respeito. Naquele caso, porém, revelando-se posteriormente inadequada a modalidade de liquidação prevista no provimento judicial, nada impede sua alteração, decidiu o STJ. A Súmula do STJ, n.º 344, consolidou o entendimento: "A liquidação por forma diversa da estabelecida na sentença não ofende a coisa julgada".
Fundamentalmente, a liquidação por arbitramento se relaciona com as formas de reparação do dano e os meios para avaliá-lo. À diferença do que ocorre na liquidação por artigos, em que outros meios de prova prestam-se para demonstrar a veracidade das alegações de fato do liquidante, no arbitramento produz-se perícia. E, nesse caso, a prova pericial guiar-se-á por elementos constantes dos autos, não se apreciando "fatos novos". (ASSIS, Araken.
Obra citada.
p. 4456 e ss.).
2.81. Liquidação de sentença - danos ambientais:
Na sentença, como registrei acima, o Juízo condenou os demandados, em regime de solidariedade passiva (arts. 275 e ss., art. 942, parágrafo único, Código Civil) a reparem os danos ambientais decorrentes da atividade desempenhada na área em questão.
Reportando-se à
Informação Técnica nº 2/2023-Nubio-PR/Ditec-PR/Supes-PR, o IBAMA sustentou que, quando menos, o conteúdo econômico do dando ambiental em questão remontaria a R$ 438.611,17. Ao mesmo tempo, postulou a deflagração de um incidente próprio, vinculado aos presentes autos, para delimitação do montante devido.
Defiro aludido pleito, como destaco abaixo. Com isso, reputado saneado este cumprimento de sentença.
III - EM CONCLUSÃO
3.1. ANOTO que o presente Juízo é competente para o presente cumprimento da sentença, nos termos da
resolução nº 258, de 01/12/2022, do Tribunal Regional da 4. Região.
3.2. DESTACO que não há sinais de litispendênica no caso em análise ou de conexão com alguma outra demanda em curso. Tampouco há lastro para a suspensão deste processo, na forma do art. 313, CPC.
3.3.
ANOTO que o IBAMA e os requeridos estão legitimados para figurarem na relação processual subjacente ao presente
cumprimento de sentença. O demandante atua com interesse processual, como destaquei acima.
3.4. DISCORRI acima sobre a legitimidade dos sucessores do sr.
Altair Wiese
, destacando que a execução, no que lhes toca, há de ser promovida atentando para as forças da herança, na forma do art. 1.792, Código Civil. Cabe aos requeridos, porém, a comprovação de eventual excesso.
3.5. REGISTRO que o MPF atua na causa como
custos legis,
tendo apresentado parecer no curso do cumprimento de sentença - art. 5, §1, lei da ação civil pública - lei 7.347/1985.
3.6. TRANSCREVI o título executivo transitado em julgado, ao tempo em que destaquei o relevo da imposição de respeito à coisa julgada.
3.7. TECI considerações sobre o alcance do art. 492, CPC, ao tempo em que destaquei que o caráter condicional da sentença em exame decorreria da inviabilidade de se precisar o alcance dos danos no curso do processo. Ademais, nos seus exatos termos, a sentença restou mantida pelos Tribunais, tendo transitado em julgado.
3.8. DESTACO que a pretensão executiva não foi atingida pela prescrição no caso em exame. O instituto da decadência não se aplica à situação submetida à apreciação neste incidente processual.
3.9. DETALHEI a forma como se dá a intimação no processo eletrônico,. com referência à lei n. 11.419/2006, art. 5.
3.10. DESTACO que já se esgotaram, há muito, os prazos fixados pelo Juízo para cumprimento das obrigações cominadas na sentença. Logo, os requeridos se encontram em
mora debitoris.
Por sinal, vencido o prazo e inadimplida a obrigação, a mora se dá de forma automática, conforme
dies interpellat pro homine.
3.11. DISCORRI acima sobre o instituto das
astreintes.
Registro que, no caso, a cominação das astreintes se dá mediante intimação por meio do eproc, na forma da lei n. 11.419/2006.
3.12. MAJORO a multa para R$ 1.000,00 - um mil reais para cada um dos executados, para cada dia de atraso no cumprimento da obrigação. A multa passa a incidir no novo valor a partir da intimação, sem prejuízo da obrigação de pagar as multas já vencidas no curso da demanda, de modo corrigido, como destaco adiante.
3.13. DESTACO que as astreintes devem ser pagas de modo corrigido, de modo a preservar seu poder aquisitivo. O termo inicial da correção deve recair na data em que a multa tenha incidido - ou seja, em série histórica. A incidência se dá no exato momento de caracterização do atraso dos requeridos no cumprimento da antecipação de tutela, observados os prazos da sentença. Termo final da correção, data do efetivo pagamento. Caso seja aplicada a SELIC, quanto ao mês de pagamento, não estando definida a taxa SELIC, deverá ser aplicado 1% (um por cento) ao mês, de modo linear e pro rata die, a título de correção, conforme aplicação analógica do art. 39, §4, da lei n. 9.250/1995.
3.14. REGISTRO que, quanto à reparação de danos morais coletivos, o termo inicial da correção deve recair na data da prolação da sentença, conforme lógica da súmula 362, STJ. Aplicação do IPCA-E com termo inicial na data da prolação da senteança e termo final em 07 de dezembro de 2021. Aplicação da SELIC quanto ao período de 08 de dezembro de 2021 em diante, até efetivo pagmaento. Quanto ao mês de pagamento, não estando definida a taxa SELIC, deverá ser aplicado 1% (um por cento) ao mês, de modo linear e pro rata die, a título de correção, conforme aplicação analógica do art. 39, §4, da lei n. 9.250/1995.
3.15. O valor dos honorários deve ser pago de modo corrigido. Dado que foi fixado tomando por base o valor da causa, o termo inicial da correção recai na data da distribuição da peça inicial, com aplicação do IPCA-E. O termo final da aplicação do IPCA-E recai em 07 de dezembro de 2021, inclusive. Quanto ao período de 08 de dezembro de 2021, inclusive, até o efetivo pagamento, deve ser aplicada a taxa SELIC. Caso seja aplicada a SELIC, quanto ao mês de pagamento, não estando definida a taxa SELIC, deverá ser aplicado 1% (um por cento) ao mês, de modo linear e
pro rata die,
a título de correção, conforme aplicação analógica do art. 39, §4, da lei n. 9.250/1995. O pagamento deve ser promovido na forma dos arts. 523 e ss., CPC.
3.16. DESTACO serem devidos juros moratórios sobre o valor devido pelos requeridos a título de reparação de danos morais coletivos, conforme destaquei no item 2.47 acima, detalhando termos inicial e final, e fatores de indexação.
3.17. REGISTRO que aludido critério, quanto aos juros moratórios e correção monetária ser aplicam também quanto aos danos ambientais em sentido estrito, a serem apurados em liquidação de sentença. Termo inicial da correção: data da ocorrência do dano e termo final: data da efetiva reparação. Juros moratórios a serem aplicados na mesma forma da reparação dos danos morais coletivos, com termo inicial na data da citação e critérios detalhados no tópito 2.47 acima.
3.18. REGISTRO que os requeridos incorreram em preclusão temporal quanto à oportunidade de impugnação do cumprimento de sentença, exceção feita à atuação no âmbito da liquidação de sentença.
3.19. DESTACO que, em princípio, são indevidos honorários quanto à presente etapa do cumprimento de sentença, conforme interpretação dispensada ao art. 18 da lei da ação civil pública, o que não prejudica a cobrança da verba arbitrada quanto ao processo de conhecimento, dado o trânsito em julgado da sentença em questão.
3.20. APLICA-SE ao caso, porém, a multa prevista no art. 523, Código de Processo Civil - 10% do valor devido em fase de execução, devidamente atualizado e com juros moratórios, quando seja o caso.
3.21. TECI considerações acima sobre os distintos mecanismos de responsabilização patrimonial, de modo a tornar efetiva a decisão do Juízo.
3.22. REPUTO que, no âmbito deste incidente, incumbe ao IBAMA o ônus de apresentar elementos de convicção a respeito da sua narrativa sobre os fatos, na forma do art. 373, I, CPC, incumbindo à parte requerida o encargo de apresentar comprovantes da ocorrência de eventuais fatos obstativos da execução, contanto que tenham sido alegados.
3.23. DETALHEI os elementos de convicção vertidos nos autos, nessa fase de cumprimento de sentença e que convertem para o reconhecimento do descumprimento da sentença até este momento.
3.24. COGITA-SE de atuação de má-fé na juntada do documento de evento 215, a ser alvo de apreciação adiante, depois de se assegurar contraditório ao requerido.
3.25. DISCORRI sobre as formas de liquidação de sentença, sendo necessária a liquidação por arbitramento quanto à apuração dos danos materiais ambientais havidos na área em questão.
3.26. DEFIRO o pedido do IBAMA quanto à deflagração de um incidente para promoção da liquidação do julgado, quanto ao tópico.
3.27. REGISTRO que caberá ao IBAMA extrair cópia das peças necessárias - sentença, acórdãos, elementos de convicção - para liquidação da sentença, com distribuição como procedimento apenso ao presente processo. Prazo de 30 dias úteis, contados da intimação desta deliberação.
3.28. APRECIAREI, então, no âmbito do aludido incidente, as medidas necessárias para apuração dos danos ambientais em causa.
3.29. INTIME-SE o IBAMA, ademais, para, querendo, apresentar planilha detalhando o valor do crédito a título de multas-diárias, danos morais coletivos e horários sucumbenciais, conforme critérios acima delimitados. Prazo de 30 dias úteis, contados da intimação.
3.30. ANOTO que caberá ao IBAMA, ademais, promover os atos necessários à satisfação do seu crédito, atentando-se para as regras de responsabilização patrimonial pertinente. Prazo de 30 dias úteis, contados da intimação.
3.31. REPUTO saneado este cumprimento de sentença.
3.32. INTIMEM-SE as partes e o MPF a respeito desta decisão.
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