Crefisa Sa Credito Financiamento E Investimentos x Elmo Pereira
ID: 280813462
Tribunal: TJSC
Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5073429-89.2023.8.24.0930
Data de Disponibilização:
27/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MILTON LUIZ CLEVE KUSTER
OAB/SC XXXXXX
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SIMON MANCIA
OAB/SC XXXXXX
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Apelação Nº 5073429-89.2023.8.24.0930/SC
APELANTE
: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS (RÉU)
ADVOGADO(A)
: MILTON LUIZ CLEVE KUSTER (OAB SC017605)
APELADO
: ELMO PEREIRA (AUTOR)
ADVOGA…
Apelação Nº 5073429-89.2023.8.24.0930/SC
APELANTE
: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS (RÉU)
ADVOGADO(A)
: MILTON LUIZ CLEVE KUSTER (OAB SC017605)
APELADO
: ELMO PEREIRA (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: SIMON MANCIA (OAB SC057083)
DESPACHO/DECISÃO
CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS interpôs recurso de apelação contra a sentença prolatada pelo 4º Juízo da Vara Estadual de Direito Bancário que, nos autos da ação revisional de contrato bancário ajuizada por
ELMO PEREIRA
, julgou procedentes os pedidos iniciais.
Em suas razões recursais, alega, preliminarmente, cerceamento de defesa e carência de fundamentação. Também sustentou a prescrição da pretensão autoral. De modo introdutório, resumiu o perfil dos contratos que confecciona, afirmando serem de alto risco. No mérito, ressalta que a média de mercado divulgada pelo Bacen não é ferramenta suficiente para determinar se os juros remuneratórios contratados são ou não abusivos. Afirma, no ponto, que os altos percentuais estão correlacionados com o risco da operação. Sustenta, outrossim, a inviabilidade da repetição do indébito, porque ausente qualquer abusividade contratual. Por fim, aponta irregularidade no arbitramento da verba honorária. Requer, assim, a reforma da sentença, para manter as cláusulas contratuais conforme inicialmente pactuadas (
evento 60, APELAÇÃO2
).
Apresentadas contrarrazões (
evento 69, CONTRAZ1
), os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça.
Esse é relatório.
De início, imperioso registrar que o presente reclamo comporta julgamento monocrático, nos termos do que dispõe o art. 932 do CPC e art. 132, XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
Dito isso, passa-se à análise do recurso.
1. Cerceamento de defesa
Postula a instituição financeira apelante a anulação do julgado, em virtude da ausência de realização de perícia técnica contábil e de prova testemunhal.
Razão não lhe assiste.
A ação de revisão de contrato visa, apenas, a análise da existência, ou não, de encargos abusivos. Isso,
in casu
, pode ser facilmente averiguado por meio dos documentos juntados aos autos, tornando, a toda evidência, desnecessária a realização de provas pericial e testemunhal.
Ademais, a finalidade da prova no processo é, sobretudo, permitir que o juiz - destinatário final da prova - forme sua convicção quanto à existência do fato, extraindo daí o resultado jurídico. Assim, cabe ao magistrado verificar e decidir sobre a necessidade ou não da produção de outras provas, além daquelas já amealhadas aos autos, a fim de formar seu livre convencimento, de modo que o julgamento antecipado da lide, por si só, não enseja nulidade da decisão por cerceamento de defesa.
Em situações análogas, já decidiu esta Corte de Justiça:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. PRELIMINARES. ADMISSIBILIDADE. PEDIDO SUCESSIVO DE LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS A UMA VEZ E MEIA A MÉDIA DE MERCADO. INOVAÇÃO RECURSAL. RECURSO NÃO CONHECIDO NESSA PARTE. PRELIMINARES. CERCEAMENTO DE DEFESA. AFASTAMENTO. PERÍCIA JUDICIAL DESNECESSÁRIA. SUPOSTA NULIDADE DA PROCURAÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. OUTORGA DE PODERES AOS ADVOGADOS. PRETENSÃO DE ENVIO DE OFÍCIO AO NUMOPEDE. INSUBSISTÊNCIA. MÁ-FÉ PROCESSUAL NÃO VERIFICADA. MÉRITO. POSSIBILIDADE DE REVISÃO DAS TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS DEFINIDAS NO CONTRATO. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. JUROS PACTUADOS EM PERCENTUAL EXORBITANTE. PARTICULARIDADES DA NEGOCIAÇÃO NÃO EVIDENCIADAS. ÔNUS DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ADEQUAÇÃO DEVIDAMENTE PROMOVIDA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES COBRADOS A MAIOR NA FORMA SIMPLES. RECURSO DA PARTE AUTORA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL NO TOCANTE AO TERMO INICIAL PARA INCIDÊNCIA DA CORREÇÃO MONETÁRIA. RECURSO NÃO CONHECIDO NESSA PARTE. JUROS MORATÓRIOS SOBRE O MONTANTE CONDENATÓRIO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 405 DO CÓDIGO CIVIL. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ARTIGO 85, §§2º, 8 E 8-A DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MAJORAÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 85, 11 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL INCABÍVEL. RECURSOS DA PARTE RÉ PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO. RECURSO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5050576-86.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Vitoraldo Bridi, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 07-05-2024).
RECURSOS DE APELAÇÃO. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA PARA LIMITAR OS JUROS REMUNERATÓRIOS MENSAIS ÀS MÉDIAS DE MERCADO; DESCARACTERIZAR A MORA; E DETERMINAR A REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES. INCONFORMISMOS DE AMBAS AS PARTES.
RECURSO DA CASA BANCÁRIA.
A
RGUIÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA ANTE O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. ALMEJADA REALIZAÇÃO DE PERÍCIA CONTÁBIL PARA "DEMONSTRAR O PERFIL DO RISCO DO CLIENTE PELA ANÁLISE DO PERITO". DILAÇÃO PROBANTE DESNECESSÁRIA. EVENTUAL ABUSIVIDADE CONTRATUAL QUE É AFERIDA A PARTIR DA DOCUMENTAÇÃO JUNTADA AO FEITO.
POSTULADO AFASTAMENTO DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DESNECESSIDADE DA PROVA DO ERRO. RESTITUIÇÃO/COMPENSAÇÃO DOS VALORES DEVIDA, NA FORMA SIMPLES.
ALMEJADA MINORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA SUCUMBENCIAL. ACOLHIMENTO INVIÁVEL. SENTENÇA COMBATIDA EXARADA QUANDO JÁ ESTAVA EM VIGOR A LEI N. 14.365/22, QUE ACRESCENTOU O 8º-A AO ART. 85 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. IMPERATIVA MANTENÇA DOS HONORÁRIOS DEVIDOS PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA EM 75% (SETENTA E CINCO POR CENTO) DE R$ 4.000,00 (QUATRO MIL REAIS), DE MODO A: FAZER PREVALECER O MAIOR IMPORTE, NO COMPARATIVO ENTRE OS VALORES RECOMENDADOS PELA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL A TÍTULO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E O LIMITE MÍNIMO DO PERCENTUAL ESTABELECIDO NO § 2º DO ART. 85 DO REFERIDO CODEX; E PRESERVAR O DESFECHO DE DERROCADA RECÍPROCA ENTRE AS PARTES.
PONTO DE IRRESIGNAÇÃO COMUM AOS CONTENDORES.
PRETENDIDA MANTENÇA DOS JUROS REMUNERATÓRIOS PELO BANCO RÉU OU, SUCESSIVAMENTE, A UTILIZAÇÃO DA SÉRIE 25464, REFERENTE À "TAXA DE JUROS COM RECURSOS LIVRES - TAXA MÉDIA DE JUROS - PESSOAS FÍSICAS - CRÉDITO PESSOAL NÃO CONSIGNADO". DEMANDANTE, POR OUTRO LADO, QUE REQUER A LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS ANUAIS ÀS MÉDIAS DE MERCADO, DESTACANDO A APLICAÇÃO DA SÉRIE TEMPORAL N. 20743, DIVULGADA PELO BACEN PARA AS "OPERAÇÕES DE CRÉDITO COM RECURSOS LIVRES - PESSOAS FÍSICAS - CRÉDITO PESSOAL NÃO CONSIGNADO VINCULADO À COMPOSIÇÃO DE DÍVIDAS". PROVIMENTO APENAS DO RECLAMO DO AUTOR. AJUSTE EM REVISÃO QUE FOI FIRMADO PARA QUITAR DÍVIDAS PERANTE O BANCO. INEXISTÊNCIA, CONTUDO, DE INDICAÇÃO DA MODALIDADE/NATUREZA DA OPERAÇÃO RENEGOCIADA, PELO QUE DEVE SER MANTIDO O EMPREGO, COMO PARÂMETRO BALIZADOR, DA "TAXA MÉDIA DE JUROS DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO COM RECURSOS LIVRES - PESSOAS FÍSICAS - CRÉDITO PESSOAL NÃO CONSIGNADO VINCULADO À COMPOSIÇÃO DE DÍVIDAS" - ATINENTE ÀS SÉRIES N. 25465 E 20743, POR SER MAIS BENÉFICA AO POLO CONSUMIDOR. TAXAS PACTUADAS QUE, NA HIPÓTESE, SE REVELAM EXCESSIVAMENTE SUPERIORES ÀS MÉDIAS DE MERCADO. LIMITAÇÃO QUE SE IMPÕE. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE, PARA TAMBÉM LIMITAR OS JUROS ANUAIS À MÉDIA MERCADOLÓGICA .
APELO DO AUTOR.
EXAME DE ADMISSIBILIDADE. ALMEJADO DEFERIMENTO DO PEDIDO DE EXIBIÇÃO DO AJUSTE N. 0307000040397. CONHECIMENTO INVIÁVEL. RAZÕES RECURSAIS QUE NÃO COMBATEM O CONTEÚDO DA SENTENÇA - NA QUAL CONSTOU EXPRESSAMENTE QUE A REVISÃO FICARIA LIMITADA À AVENÇA ENCARTADA AO FEITO, HAJA VISTA A AUSÊNCIA DE DISCRIMINAÇÃO MÍNIMA DO PACTO REMANESCENTE -, EM CLARA OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE.
SUCUMBÊNCIA. REQUERIDA ATRIBUIÇÃO DO ÔNUS INTEGRALMENTE AO BANCO ACIONADO. DESCABIMENTO, ANTE O RESULTADO DE DERROCADA RECÍPROCA DA DEMANDA. REPARTIÇÃO DO ÔNUS ENTRE AS PARTES QUE SE MANTÉM, NA PROPORÇÃO ESTABELECIDA PELA SENTENÇA - DE 25% (VINTE E CINCO POR CENTO) PARA A PARTE AUTORA E DE 75% (SETENTA E CINCO POR CENTO) PARA O BANCO RÉU -, QUE SE MANTÉM ADEQUADA AO JULGAMENTO.
APELO DO DEMANDANTE CONHECIDO, EM PARTE, E PARCIALMENTE PROVIDO.
RECURSO DO BANCO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. SENTENÇA PUBLICADA APÓS A ENTRADA EM VIGOR DO NOVO CPC. IMPOSIÇÃO DO ART. 85, §§ 1º E 11, DA NORMA PROCESSUAL. SUCUMBÊNCIA RECURSAL DA CASA BANCÁRIA. ESTIPÊNDIO DEVIDO AOS PATRONOS DA PARTE ADVERSA MAJORADO EM R$ 300,00 (TREZENTOS REAIS).
(TJSC, Apelação n. 5023815-18.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Tulio Pinheiro, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 07-05-2024) - grifou-se.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. PRELIMINAR. JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO (ART. 355, I, CPC). CABIMENTO. REVISIONAL DE CONTRATO. PRESCINDIBILIDADE DE PRODUÇÃO DA PROVA PERICIAL PARA RESOLUÇÃO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO EVIDENCIADO. MÉRITO. JUROS REMUNERATÓRIOS APLICADOS A PRESTAÇÃO MENSAL SUPERIOR AQUELES EFETIVAMENTE PACTUADOS. ALEGAÇÃO DE ATO LÍCITO. INSUBSISTÊNCIA. MATEMÁTICA DA PARCELA MENSAL DO MÚTUO BANCÁRIO QUE NÃO É RESTRITA A INCIDÊNCIA DOS JUROS REMUNERATÓRIOS, ENGLOBANDO OUTROS ENCARGOS E CUSTOS RETRATADOS NO PACTO. ILEGALIDADE NÃO CONSTATADA. CONFUSÃO ENTRE JUROS REMUNERATÓRIOS E CUSTO EFETIVO TOTAL QUE DEVE SER DESMISTIFICADA. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. INDÉBITO PARA REPETIR INEXISTENTE. ATO ILÍCITO NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA.SUCUMBÊNCIA INALTERADA.HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO QUE SE IMPÕE. ART. 85, § 11º, DO CPC E OBSERVÂNCIA ÀS ORIENTAÇÕES CONSTANTES NO ED. NO AI DO RESP. 1.573.573/RJ DO STJ.RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (Apelação nº 5006328-47.2021.8.24.0011/SC, rel. Desembargador Guilherme Nunes Born, j. em 01.06.2023).
Ainda, nos termos do art. 434 do CPC, a instituição financeira deveria ter demonstrado, na contestação, que no momento da imposição das taxas de juros no contrato, ou seja, no momento da concessão do crédito ao consumidor, procedeu à análise do risco do crédito e do perfil do consumidor.
Ora, como bem salientado pelo Excelentíssimo Desembargador Mariano do Nascimento, no julgamento da apelação cível nº 5035527-05.2023.8.24.0930:
[...] Deveria, portanto, a instituição financeira, quando da apresentação de defesa, ter demonstrado cabalmente que, para a incidência da taxa de juros nesse patamar, valeu-se, no caso em concreto, de análise objetiva de risco de crédito da operação e do perfil do tomador, acostando aos autos a prova documental que embasou o enquadramento da parte autora a tal perfil alegado como de alto risco de inadimplência.
Até mesmo porque, é notório que no ato da concessão do crédito, as instituições financeiras não se valem de prova pericial para definir o risco de cada tomador, mas sim de elementos objetivos que alimentam seus sistemas internos para, em conjunto com informações advindas do sistema bancário, obterem a avaliação de risco do crédito e do tomador.
Logo, as "circunstâncias como o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos" (STJ, REsp n. 1.821.182/RS, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. em 23-6-2022, DJe de 29-6-2022), são informações que não poderão ser, de forma alguma, esclarecidas por perito, mas sim, a partir de prova documental daquilo efetivamente utilizado pelo banco como parâmetro quando da concessão do crédito à parte autora (TJSC, Apelação n. 5035527-05.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Mariano do Nascimento, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 15-02-2024).
Portanto, afasta-se a preliminar suscitada.
2. Carência de fundamentação
Postula a instituição recorrente, ainda, a nulidade da sentença por carência de fundamentação.
Sobre a matéria, destaca-se o regramento do CPC:
Art. 489. [...]
§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
No caso, o juízo de origem demonstrou suficientemente as razões que o levaram a acolher os pedidos deduzidos na petição inicial, não incorrendo em nenhuma das hipóteses de nulidade previstas na legislação processual civil.
A sentença recorrida, diferentemente da narrativa apresentada pela instituição financeira, está bem fundamentada.
In casu
, o Juízo
utilizou linguagem clara e precisa, detalhando de forma lógica e coerente os fatos e as provas apresentadas. A decisão, ademais, reflete análise cuidadosa do contrato objeto do processo, de maneira suficiente para averiguar a existência, ou não, de abusividade contratual. Tal abordagem, inclusive, assegura que a decisão seja compreensível e justificada.
Além disso, a fundamentação é sólida e embasada na legislação e jurisprudência aplicáveis ao caso. A correlação entre os fatos apresentados, as provas analisadas e o direito aplicado está claramente delineada na sentença, o que reforça a validade e a legalidade da decisão proferida.
Desse modo, rejeita-se a preliminar.
3. Da prescrição
A apelante arguiu a prescrição do direito autoral, pois "
não pairam dúvidas de que o Apelado tomou conhecimento da taxa de juros remuneratórios no próprio ato da contratação do empréstimo, sendo a respectiva data de contratação o termo inicial para cômputo do prazo prescricional quinquenal
".
Antecipa-se que razão não lhe assiste.
A pretensão em tela envolve direito pessoal e, ante a ausência de previsão legal específica, o prazo de prescrição é decenal, conforme estabelece o art. 205 do Código Civil,
in verbis
:
Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.
Tal entendimento é sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça que, inclusive, definiu o termo inicial de fluência da prescrição corresponde à data de assinatura do contrato. Nesse sentido:
AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. MÚTUO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. DATA DA ASSINATURA DO AJUSTE. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.1. Consoante entendimento desta Corte Superior, o termo inicial do prazo prescricional, nas ações de revisão de contrato bancário, em que se discute a legalidade das cláusulas pactuadas, é a data da assinatura do contrato. Precedentes.2. No caso, o eg. Tribunal de origem afastou a ocorrência da prescrição, uma vez que não haviam decorrido 10 (dez) anos entre o vencimento do contrato e o ajuizamento da ação, dissentindo, portanto, do entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça.3. Agravo interno a que se nega provimento.(AgInt nos EDcl no REsp n. 1.888.677/RS, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 26/10/2022, DJe de 17/11/2022.)
Esta Câmara de Direito Comercial, já decidiu a respeito:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSOS DE AMBAS AS PARTES.
RECURSO DA CASA BANCÁRIA.
PRELIMINAR. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. AUSÊNCIA DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. DESNECESSIDADE. SUBSTRATO PROBATÓRIO CONSTANTE NOS AUTOS SUFICIENTE AO CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. ART. 371 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PREFACIAL AFASTADA. ADEMAIS, PERÍCIA QUE É MEIO INIDÔNEO PARA DEMONSTRAR O PERFIL ECONÔMICO DO CONSUMIDOR. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE POSSUI O DEVER DE PRODUZIR PROVA DOCUMENTAL A RESPEITO. TESE AFASTADA.
PRELIMINAR. PRESCRIÇÃO DO DIREITO AUTORAL. INOCORRÊNCIA. IMPRESCRITIBILIDADE DA PRETENSÃO REVISIONAL. PEDIDOS DE CUNHO CONSTITUTIVO E DECLARATÓRIO. EFEITOS PECUNIÁRIOS. APLICAÇÃO DO PRAZO PREVISTO NO ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. PERÍODO NÃO EXAURIDO. PRELIMINAR REJEITADA.
ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS. AFERIÇÃO BASEADA NA OBSERVÂNCIA DAS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO (SITUAÇÃO DA ECONOMIA À ÉPOCA, GARANTIAS OFERECIDAS, PERFIL DO CONTRATANTE E RISCOS DA OPERAÇÃO). TAXA MÉDIA DITADA PELO BANCO CENTRAL (BACEN) QUE INDICA, TÃO SOMENTE, UM CRITÉRIO ÚTIL DE AFERIÇÃO CONSIDERANDO AS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA QUE DEIXOU DE COMPROVAR, MINIMAMENTE, A RAZOABILIDADE DA TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADAS. AUSÊNCIA DE APONTAMENTO DAS CIRCUNSTÂNCIAS RELACIONADAS ÀS OPERAÇÕES BANCÁRIAS EFETUADAS E AO PERFIL DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE INFORMAÇÕES SOBRE O CUSTO DA OPERAÇÃO, FONTES DE RENDA DO CONTRATANTE, RESULTADO DA ANÁLISE DE RISCO, GARANTIAS, ETC. TAXAS REMUNERATÓRIAS CONTRATADAS QUE DESTOA SUBSTANCIALMENTE DAS MÉDIAS DE MERCADO. JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS. NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DAS TAXAS MÉDIAS DO BACEN. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO PREJUDICADO.
RECURSO DA PARTE AUTORA.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO. TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. ENCARGO DEVIDO DESDE A CITAÇÃO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 405 DO CÓDIGO CIVIL E 240 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. SENTENÇA MANTIDA.
REQUERIMENTO DE FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS POR EQUIDADE E EM OBSERVÂNCIA À TABELA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB). PARCIAL PROVIMENTO. SENTENÇA QUE NÃO POSSUI CUNHO CONDENATÓRIO. PROVEITO ECONÔMICO QUE AINDA É INCERTO. CAUSA VALORADA EM R$ 866,47 (OITOCENTOS E SESSENTA E SEIS REAIS E QUARENTA E SETE CENTAVOS). IMPORTE MUITO BAIXO PARA FINS DE UTILIZAÇÃO DA REGRA INSCULPIDA NO ART. 85, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. IMPERIOSO O ARBITRAMENTO DA REMUNERAÇÃO ADVOCATÍCIA POR EQUIDADE, NOS TERMOS DO ART. 85, §§ 8º E 8º-A, DO DIPLOMA PROCESSUAL. TABELA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB) QUE, ENTRETANTO, NÃO VINCULA O MAGISTRADO. ESTIPÊNDIOS PATRONAIS QUE DEVEM SER FIXADOS EM R$ 1.500,00 (UM MIL E QUINHENTOS REAIS).
HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO. DESPROVIMENTO DO RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. HIPÓTESE QUE AUTORIZA A MAJORAÇÃO PREVISTA NO ART. 85, § 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PRESENÇA CUMULATIVA DOS REQUISITOS FIXADOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
RECURSO DA PARTE RÉ CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DA AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5019898-88.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Silvio Franco, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 21-03-2024).
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
PRELIMINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE QUE NÃO PERMITIU A REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL PARA DEMONSTRAÇÃO DO "PERFIL DO RISCO DO CLIENTE PELA ANÁLISE DO PERITO". DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DA PROVA PRETENDIDA QUANDO OS ELEMENTOS PELOS QUAIS SE PRETENDE PROVAR A AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS ESTÃO AO ALCANCE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. PREFACIAL REJEITADA.
POSTULADO RECONHECIMENO DA PRESCRIÇÃO. APLICADO PRAZO DECENAL NAS AÇÕES DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO, EM QUE SE DISCUTE A LEGALIDADE DAS CLÁUSULAS PACTUADAS. INICIO DA CONTAGEM QUE SE DÁ NA DATA DA ASSINATURA DO CONTRATO. AÇÃO DE CUNHO PESSOAL. EXEGESE DO ART. 205 DO CC/02. INSURGÊNCIA NÃO ACOLHIDA.
JUROS REMUNERATÓRIOS. POSTULADA A MANUTENÇÃO DOS CONTRATOS E ALEGADA UTILIZAÇÃO DE SÉRIE TEMPORAL QUE NÃO CORRESPONDE À DETERMINADOS PACTOS. JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS QUE SUPERARAM A MÉDIA DE MERCADO EM MAIS DE 100% (CEM POR CENTO). REDUÇÃO PARA AS TAXAS DIVULGADAS PELO BACEN PARA OS PERÍODOS PACTUADOS. SÉRIES TEMPORAIS UTILIZADAS QUE SE COADUNAM COM AS AVENÇAS FIRMADAS. RECLAMO DESACOLHIDO.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO. NECESSIDADE DE RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS A MAIOR, DEPOIS DE OPERADA A COMPENSAÇÃO ENTRE CRÉDITOS E DÉBITOS PREVISTA NO ART. 368 DO CC. EXEGESE DOS ARTS. 884 E SEGUINTES DO CC E 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. INSURGÊNCIA AFASTADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5086408-20.2022.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Giancarlo Bremer Nones, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 29-02-2024).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO PESSOAL NÃO CONSIGNADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. PRELIMINAR ARGUIDA EM CONTRARRAZÕES. PRESCRIÇÃO. PRAZO DECENAL EM SE TRATANDO DE REVISIONAIS DE CONTRATO. RELAÇÃO ESTABELECIDA ENTRE AS PARTES FUNDADA EM DIREITO PESSOAL. ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. LAPSO TEMPORAL NÃO DECORRIDO. PROEMIAL REFUTADA. [...] RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5008160-71.2021.8.24.0058, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rocha Cardoso, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 15-06-2023).
No caso em apreço, verifica-se que o mais antigo dos contratos acostados foi firmado em dezembro de 2017 e a ação revisional foi ajuizada em agosto de 2023 (Evento 1), ou seja, antes que decorrido o prazo decenal do art. 205 do Código Civil.
Com relação ao contrato n. 32610000015, como bem registrou o nobre Magistrado
a quo,
não há qualquer demonstração mínima a corroborar a alegação da ré no sentido de que a celebração efetivamente se deu nas datas mencionadas (CPC, art. 434,
caput
), tendo em vista que o instrumento contratual não foi juntado aos autos.
Logo, a preliminar deve ser rejeitada.
4. Juros remuneratórios
No que se refere à taxa de juros remuneratórios, verifica-se que o magistrado de origem promoveu a revisão da taxa prevista no contrato impugnado por considerá-la demasiadamente acima da média de mercado.
A instituição financeira recorrente, por sua vez, defende a possibilidade de cobrança da taxa contratada alegando, para tanto que a taxa média de mercado é apenas um parâmetro de aferição e não um limitador.
No tocante à matéria, o entendimento jurisprudencial desta Corte é pacífico ao orientar que, para aferir a abusividade dos juros remuneratórios, deve-se utilizar como parâmetro a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil.
O verbete sumular 648 do Supremo Tribunal Federal, que ensejou a divulgação da Súmula Vinculante 7, e a Súmula 296 do Superior Tribunal de Justiça, estabelecem:
Súmula Vinculante 7 do STF: "A norma do § 3º do art. 192 da Constituição, revogada pela EC 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar".
Súmula 296 do STJ: "Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado".
No mesmo sentido, o Grupo de Câmaras de Direito Comercial deste Tribunal de
Justiça editou enunciados sobre o assunto:
Enunciado I - Nos contratos bancários, com exceção das cédulas e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12 % (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil.
Enunciado IV - Na aplicação da taxa média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, serão observados os princípios da menor onerosidade ao consumidor, da razoabilidade e da proporcionalidade.
De acordo com a orientação adotada no julgamento do REsp. 1.061.530/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, de relatoria Ministra Nancy Andrighi, "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1°, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto."
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, após discussões sobre o tema e ao analisar caso concreto em que a ora recorrente figurava como parte, externou o entendimento de que "
a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central para cada segmento de crédito é referencial útil para o controle da abusividade, mas o simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa média de mercado não significa, por si só, abuso.
Ao contrário, a média de mercado não pode ser considerada o limite, justamente porque é média; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco. Foi expressamente rejeitada a possibilidade de o Poder Judiciário estabelecer aprioristicamente um teto para taxa de juros, adotando como parâmetro máximo o dobro ou qualquer outro percentual em relação à taxa média.
O caráter abusivo da taxa de juros contratada haverá de ser demonstrado de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto (...)
" (STJ, REsp n. 1.821.182/RS, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. em 23-6-2022, DJe de 29-6-2022 – grifou-se).
Esmiuçando a situação apresentada, a Corte Superior concluiu que a utilização das taxas divulgadas pelo Banco Central do Brasil como balizador único para a indicação da prática de juros abusivos não se mostra a medida mais acertada, devendo ser analisado cada caso e suas particularidades, levado em consideração alguns critérios como “o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos.”
Deixou-se claro, portanto, que não cabe ao Poder Judiciário intervir no mercado financeiro para tabelar ou mesmo fixar limites máximos de taxa de juros, de modo geral e abstrato, mas tão somente corrigir eventuais abusos a serem demonstrados diante das circunstâncias concretas.
Na presente situação, o Juízo singular utilizou como índice paramétrico nos contratos ns. 032610011543, 32610012123, 32610023258 e 32610023745, a tabela
"Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado vinculado a composição de dívidas
".
A instituição financeira, por sua vez, defende que seja utilizada as séries temporais relativas a crédito pessoal não consignado, apenas.
Com razão.
Isso porque os contratos correspondem à verdadeira operação de renovação de crédito da mesma natureza dos pactos anteriores, "com o que se costuma chamar de 'troco', isto é, a parte tomadora, que não se encontrava inadimplente, aproveitando ter quitado parte do saldo devedor do contrato antecedente e, assim, alcançada nova margem de crédito, renova o contrato antecedente tomando para si mais crédito que será diluído conjuntamente ao se recalcular as parcelas, ou seja, soma-se ao reparcelamento do crédito antigo um crédito novo que assume a feição de uma nova contratação" (TJSC, Apelação n. 5074027-77.2022.8.24.0930, rel. Luiz Zanelato, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 27-06-2024).
Esclarece-se que até pouco tempo atrás esta Relatora aplicava a série temporal referente à composição de dívidas, entretanto, ao aprimorar o entendimento, entendeu-se que o mais escorreito nesses casos é usar a tabela "Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado", conforme alegado pela apelante.
Aliás, é o que se extrai da orientação do Banco Central em relação à mencionada série temporal, em "Dados básicos/Metadados" (https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries), veja-se:
A propósito:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO. EMPRÉSTIMOS PESSOAIS NÃO CONSIGNADOS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR.
JUROS REMUNERATÓRIOS. PEDIDO DE REVISÃO DAS TAXAS CONTRATADAS. CABIMENTO. RELAÇÃO DE CONSUMO. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. OBSERVÂNCIA DAS TAXAS MÉDIAS DIVULGADAS PELO BACEN APENAS A TÍTULO REFERENCIAL. JUROS PACTUADOS AINDA ASSIM EXORBITANTES, À MÍNGUA DE JUSTIFICATIVA PLAUSÍVEL PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ÔNUS QUE LHE INCUMBIA. ART. 373, INC. II, DO CPC. ENTENDIMENTO DO STJ. ILEGALIDADE ASSENTADA. LIMITAÇÃO DEVIDA. SENTENÇA REFORMADA.
CONTRATO DE RENEGOCIAÇÃO. PRETENSA ADEQUAÇÃO NO PARÂMETRO REVISOR CONFORME A SÉRIE PREVISTA PARA COMPOSIÇÃO DE DÍVIDAS. INSUBSISTÊNCIA. HIPÓTESE DE REPACTUAÇÃO DE DÉBITO ORIUNDO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL NÃO CONSIGNADO. TAXAS QUE DEVEM SER NORTEADAS CONFORME AS MÉDIAS APLICÁVEIS À OPERAÇÃO DE ORIGEM. PRECEDENTES DESTA CORTE. IRRESIGNAÇÃO INFRUTÍFERA NO PONTO.
[...]
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJSC, Apelação n. 5052603-42.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rubens Schulz, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 11-07-2024 - grifou-se).
Em precedente recente desta colenda Quinta Câmara de Direito Comercial:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO CUMULADA COM REPETIÇÃO DO INDÉBITO. EMPRÉSTIMO PESSOAL NÃO CONSIGNADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ.
[...]
MÉRITO. JUROS REMUNERATÓRIOS. DEFENDIDA A LEGALIDADE DO ENCARGO OU, SUBSIDIARIAMENTE, A LIMITAÇÃO A UMA VEZ E MEIA À MÉDIA DE MERCADO E A CORREÇÃO DA SÉRIE ELEITA NA SENTENÇA. ACOLHIMENTO PARCIAL. POSSIBILIDADE DE REVISÃO JUDICIAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS. RELATIVIZAÇÃO DOS PRINCÍPIOS PACTA SUNT SERVANDA E DA AUTONOMIA DA VONTADE EM DETRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO E DA BOA-FÉ OBJETIVA. RESTABELECIMENTO DO EQUILÍBRIO DA RELAÇÃO JURÍDICA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 6º, V, E 51, IV, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E ARTS. 421 A 424 DO CÓDIGO CIVIL. OBSERVÂNCIA DAS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO E DA TAXA MÉDIA DE MERCADO ANUNCIADA PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL COMO REFERÊNCIA PARA AFERIÇÃO DE ABUSIVIDADE. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. ENUNCIADOS I E IV DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO COMERCIAL.
HIPÓTESE DOS AUTOS RELATIVA A CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL NÃO CONSIGNADO COM CONFISSÃO DE DÍVIDA DA MESMA MODALIDADE CONTRATUAL. EQUÍVOCO NA UTILIZAÇÃO DA SÉRIE TEMPORAL DO BACEN NOMINADA DE "TAXA MÉDIA DE JUROS DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO COM RECURSOS LIVRES - PESSOAS FÍSICAS - CRÉDITO PESSOAL NÃO CONSIGNADO VINCULADO À COMPOSIÇÃO DE DÍVIDAS". RUBRICA CABÍVEL APENAS EM COMPOSIÇÃO DE DÍVIDAS DE MODALIDADES DISTINTAS. ADEQUAÇÃO DO JULGADO PARA A APLICAÇÃO DA "TAXA MÉDIA DE JUROS DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO COM RECURSOS LIVRES - PESSOAS FÍSICAS - CRÉDITO PESSOAL NÃO CONSIGNADO".
ESTIPULAÇÃO CONTRATUAL EM PERCENTUAL SUBSTANCIALMENTE SUPERIOR À MÉDIA DE MERCADO PRATICADA EM OPERAÇÕES DA ESPÉCIE NO MÊS E ANO DA CONTRATAÇÃO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS SUFICIENTES PARA JUSTIFICAR A ELEVADA TAXA APLICADA. ONEROSIDADE EXCESSIVA VERIFICADA, AINDA QUE AFASTADO O MERO COTEJO ENTRE A TAXA EFETIVAMENTE PRATICADA E A MÉDIA DIVULGADA PELO BACEN. ABUSIVIDADE NÃO INFIRMADA. ALCANCE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS À UMA VEZ E MEIA DA TAXA MÉDIA DE MERCADO NÃO ADMITIDO. LIMITAÇÃO DO ENCARGO PRESERVADA, PORÉM COM ALTERAÇÃO DA SÉRIE ELEITA NA SENTENÇA.
[...]
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.
(TJSC, Apelação n. 5113830-33.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Felipe Schuch, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 25-07-2024 - grifou-se).
No caso em análise, constata-se:
Contrato
Data da assinatura
Taxa de juros mensal pactuada
Taxa de juros anual pactuada
Taxa média de mercado mensal
Taxa média de mercado anual
095010328062
28/05/2019
22,00%
987,22%
6,79%
119,94%
032610023745
08/04/2019
22,00%
987,22%
7,07%
126,90%
032610023258
13/11/2018
20,50%
837,23%
6,91%
123,07%
032610012123
18/04/2018
18,50%
666,69%
6,99%
125,00%
032610011543
07/12/2017
18,50%
669,69%
6,52%
113,28%
095010094618
06/06/2018
22,00%
987,22%
6,58%
114,85%
A consulta foi realizada no
site
do Banco Central do Brasil, ente governamental que presta informações sobre as operações de crédito praticadas no mercado financeiro, segundo a Circular n. 2.957, de 30/12/1999 (www.bcb.gov.br), utilizando a tabela "
Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado (séries temporais 20742 e 25464)
".
Como já explanado, o simples cotejo da média de mercado com a taxa pactuada, por si só, não indica abusividade, sendo imperioso considerar as particularidades do contrato celebrado entre as partes.
Embora a instituição financeira recorrente sustente que trabalha com um “perfil diferenciado de clientes, os de alto risco e negativados” e que “os empréstimos realizados possuem altos índices de inadimplência, especialmente porque os clientes não deixam saldo em conta corrente para realização dos débitos”, tal alegação, pura e simples, não justifica a adoção de taxas tão elevadas, que beiram 1.000% (mil por cento) acima da média de mercado, quando não mais.
Conforme delineado pelo Tribunal Superior, compete à instituição financeira, neste caso específico em que a taxa pactuada de fato está “muito acima” da média de mercado, apresentar elementos plausíveis capazes de justificar a adoção da taxa cobrada.
Nessa perspectiva, da detida análise do caderno processual, verifica-se que a instituição financeira recorrente não se desincumbiu de tal ônus, vez que da consulta ao Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC) exibida no
evento 23, ANEXO15
), observa-se que os registros efetuados no nome do consumidor são posteriores à data dos contratos
sub judice
(primeira inscrição ocorrida em 21/01/2020), de modo que não podem ser utilizados como razão determinante para a manutenção dos juros remuneratórios pactuados nos contratos sob revisão.
Frise-se, deveria a instituição financeira, quando da apresentação de defesa, ter demonstrado que no momento da imposição das taxas de juros nos contratos, ou seja, no momento da concessão do crédito ao consumidor, procedeu à análise do risco do crédito e do perfil do tomador.
Em situação análoga, já decidiu esta Corte de Justiça:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. TOGADO DE ORIGEM QUE JULGA PROCEDENTE A PRETENSÃO INAUGURAL. INCONFORMISMO DE AMBAS AS PARTES. RECURSO DO BANCO PRELIMINAR DE NULIDADE DA DEMANDA POR VÍCIO DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. INSUBSISTÊNCIA. DEFEITO SANADO. PREFACIAL RECHAÇADA. PRETENDIDA EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO AO NÚCLEO DE MONITORAMENTO DO PERFIL DE DEMANDAS (NUMOPEDE), À ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), DELEGACIA DE POLÍCIA LOCAL, BEM COMO INTIMAÇÃO PESSOAL DA AUTORA, PARA QUE SEJA APURADA EVENTUAL PRÁTICA DE INFRAÇÃO DISCIPLINAR OU CONDUTA TÍPICA. NÃO ACOLHIMENTO. DOCUMENTOS QUE INSTRUEM OS AUTOS QUE NÃO INDICAM NENHUMA IRREGULARIDADE. POSSIBILIDADE, CASO ENTENDA EXISTIREM INDÍCIOS DA PRÁTICA DE INFRAÇÃO ÉTICA OU CONDUTA TÍPICA, DA PRÓPRIA PARTE ACIONAR OS ÓRGÃOS COMPETENTES SEM NECESSIDADE DE INTERVENÇÃO DO ESTADO-JUIZ. JUROS REMUNERATÓRIOS. ADMISSÃO DO RECURSO ESPECIAL N. 1.061.530/RS, DE QUE TRATA A MULTIPLICIDADE DE RECURSOS COM FUNDAMENTO IDÊNTICO À QUESTÃO DE DIREITO, COMO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO, SOB A RELATORIA DA MINISTRA NANCY ANDRIGHI, QUE ESTIPULOU: (1) A AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE NA ESTIPULAÇÃO DE JUROS REMUNERATÓRIOS SUPERIORES A 12% AO ANO; (2) A POSSIBILIDADE DE REVISÃO DAS TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS QUANDO CARACTERIZADA A RELAÇÃO DE CONSUMO E A ABUSIVIDADE RESTAR CABALMENTE DEMONSTRADA, ANTE AS PECULIARIDADES DO JULGAMENTO EM CONCRETO. ANÁLISE CONFORME OS PARÂMETROS DITADOS NO RESP REPETITIVO N. 1.061.530/RS E RESP N. 2.009.614/SC.
CASO VERTENTE EM QUE: I) RESTOU CONFIGURADA A RELAÇÃO DE CONSUMO; II) FOI EXPOSTA AS TAXAS DE JUROS PACTUADAS ABSURDAMENTE ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO; III) A FINANCEIRA NÃO VERTEU JUSTIFICATIVA ACERCA DA ENORME DISCREPÂNCIA DA TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS QUANDO O ÔNUS ERA SEU, POR SE TRATAR DE RELAÇÃO DE CONSUMO. ABUSIVIDADE PATENTEADA. LIMITAÇÃO DOS JUROS COMPENSATÓRIOS AO TETO VEICULADO PELO BANCO CENTRAL DO BRASIL QUE RESULTA IMPERATIVA. PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE LIMITAÇÃO A VALOR NÃO INFERIOR UMA VEZ E MEIA DA MÉDIA DE MERCADO INVIÁVEL. COLEGIADO QUE ADOTA O PARÂMETRO DE REDUÇÃO À MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN QUANDO HOUVER CARACTERIZAÇÃO DE POTESTATIVIDADE. SENTENÇA INDENE NESSA SEARA.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PAGAMENTO DE JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS. PRESCINDIBILIDADE DE PRODUÇÃO DA PROVA DO VÍCIO. INTELIGÊNCIA DO ART. 42 DO CDC. APLICAÇÃO DO VERBETE N. 322 DO STJ. PERMISSIBILIDADE NA FORMA SIMPLES. COMANDO JUDICIAL PRESERVADO. RECURSO DA AUTORA ALMEJADA MODIFICAÇÃO DO PARÂMETRO PARA AFERIÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS. TESE REPELIDA. CRITÉRIO MAIS ADEQUADO, PARA O EXAME DOS EMPRÉSTIMOS PESSOAIS REALIZADOS, INDEPENDENTEMENTE DE SE TRATAR DE CONFISSÃO DE DÍVIDA OU NÃO, É A TAXA MÉDIA MENSAL E ANUAL DE JUROS DAS "OPERAÇÕES DE CRÉDITO COM RECURSOS LIVRES - PESSOAS FÍSICAS - CRÉDITO PESSOAL NÃO CONSIGNADO" (SÉRIES TEMPORAIS N. 20742 E 25464). APELADA QUE OBTEVE, ALÉM DA QUITAÇÃO DE SALDO DEVEDOR ANTERIOR, A DISPONIBILIZAÇÃO DE NOVO CRÉDITO, AINDA QUE EM PARTE. CONTRATOS QUE CORRESPONDEM A VERDADEIRA OPERAÇÃO DE RENOVAÇÃO, QUE SE COSTUMA CHAMAR DE "TROCO". ENTENDIMENTO HODIERNO DESTE COLEGIADO. SENTENÇA INCÓLUME. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. PRETENDIDA MODIFICAÇÃO DO CRITÉRIO FIXADO PELO JULGADOR DE ORIGEM. ALBERGAMENTO. DIRETRIZES DELINEADAS NO INFORMATIVO DE JURISPRUDÊNCIA N. 645 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. IMPERATIVIDADE DE OBEDIÊNCIA ÀS REGRAS OBJETIVAS PREVISTAS NO ART. 85, § 2º, DO CPC/15. PRECEDENTES DO TRIBUNAL DA CIDADANIA. OBSERVÂNCIA À "ORDEM DE VOCAÇÃO" ESTABELECIDA PELO LEGISLADOR NO NOVEL CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. CASO CONCRETO QUE ADMITE A FIXAÇÃO DA VERBA PROFISSIONAL COM BASE NO VALOR DA CAUSA. REFORMA DA APRESENTAÇÃO DA TUTELA JURISDICIONAL. RECLAMO DA RÉ IMPROVIDO E RECURSO DA AUTORA E ALBERGADO PARCIALMENTE. (TJSC, Apelação n. 5057994-75.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. José Carlos Carstens Kohler, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 02-04-2024) - grifou-se.
Assim sendo, mantém-se a limitação dos juros remuneratórios à média de mercado, utilizando-se como parâmetro, no entanto, as séries temporais 20742 e 25464 (
Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado
).
5. Repetição do indébito
A casa bancária sustenta o descabimento da repetição do indébito.
Razão não lhe assiste.
É consabido que aos contratos bancários são aplicáveis as normas de defesa do consumidor (Súmula 297 do STJ). Assim, o art. 42, parágrafo único, da Lei n. 8.078/90 destaca que o consumidor cobrado em quantia indevida possui direito à repetição dos valores pagos a maior, porquanto é vedado à instituição financeira se locupletar às custas de outrem.
De acordo com o entendimento desta Câmara, "o instituto tem por fundamento vedar o enriquecimento sem causa, de maneira que aquele que cobrado em quantia indevida possui direito à repetição dos valores pagos a maior. Assim, caso apurado eventual pagamento indevido, será dever da instituição financeira promover a devolução de valores eventualmente cobrados a maior, na forma simples, ou sua compensação, uma vez que não restou demonstrada a má-fé ou o dolo por parte daquela, não sendo necessário, ainda, a comprovação de erro" (TJSC, Apelação n. 0318255-70.2017.8.24.0008, rel. Cláudio Barreto Dutra, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 18-08-2022).
Destarte, a devolução de valores com a possível compensação é devida na forma simples - uma vez que não há prova de má-fé ou dolo por parte da instituição financeira - e, sendo assim, não depende da comprovação de erro. Tal medida é adotada com fundamento nas normas consumeristas e no princípio do enriquecimento sem causa.
Deste Tribunal de Justiça, são exemplos nesse sentido: Apelação n. 0300113-64.2018.8.24.0046, rel. Cláudio Barreto Dutra, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 28-07-2022; Apelação n. 5019019-03.2020.8.24.0020, rel. Salim Schead dos Santos, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 09-08-2022; e Apelação n. 5005812-58.2021.8.24.0033, rel. Tulio Pinheiro, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 09-08-2022.
Portanto, constatada a cobrança de valores indevidos, resulta assegurado ao consumidor o direito à repetição do indébito na forma simples. Primeiramente, faz-se a compensação com o que é devido. Por último, faz-se a restituição de eventual indébito à parte autora, na forma simples, acrescidos de juros de mora, desde a citação, além de correção monetária, a partir do efetivo pagamento, conforme estabelecido em sentença.
Logo, mantém-se hígida a decisão nesse ponto.
6. Honorários advocatícios sucumbenciais
A casa bancária postula redução do valor arbitrado a título de honorários advocatícios sucumbenciais.
Consoante dispõe o artigo 85, § 2º, do CPC, os honorários advocatícios devem observar os seguintes critérios de fixação: o grau de zelo do causídico, o lugar da prestação do trabalho, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado e o tempo despendido.
Sobre os critérios para fixação dos honorários, comentam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery:
São objetivos e devem ser sopesados pelo juiz na ocasião da fixação dos honorários. A dedicação do advogado, a competência com que conduziu os interesses de seu cliente, o fato de defender seu constituinte em comarca onde não resida, os níveis de honorários na comarca onde se processo a ação, a complexidade da causa, o tempo despendido pelo causídico desde o início até o término da ação, são circunstâncias que devem ser necessariamente levadas em conta pelo juiz quando da fixação dos honorários de advogado (Comentários ao Código de Processo Civil. 2ª tiragem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 433).
Em primeiro grau, o juízo
a quo
fixou a verba honorária em 15% sobre o valor da condenação.
No caso em exame, verifica-se que o valor da condenação (proveito econômico) obtido, neste momento, é inestimável, mas, a toda evidência, perfaz o valor da causa, valorada em R$ 14.537,56 (quatorze mil quinhentos e trinta e sete reais e cinquenta e seis centavos, montante que não é excessivo.
Portanto, o reclamo da casa bancária ré deve ser desprovido.
7.
Ônus sucumbenciais
Considerando que a sentença foi reformada apenas para alterar a tabela do Bacen utilizada para limitação da taxa de juros remuneratórios, mantém-se a distribuição dos ônus de sucumbência conforme realizada em primeiro grau.
Por derradeiro, incabíveis os honorários recursais, dado que não se encontram presentes, neste caso, os critérios cumulativos estabelecidos pelo Superior Tribunal de Justiça (EDcl no AgInt no REsp n. 1.573.573/RJ).
8. Conclusão
Ante o exposto, com fundamento no art. 932, VIII, do CPC c/c art. 132, XV, do RITJSC, dou parcial provimento ao recurso, a fim de determinar que a limitação da taxa de juros remuneratórios tenha por base a tabela "Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado", nos termos acima referidos.
Intimem-se.
Transitada em julgado, devolvam-se os autos à origem.
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