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Processo nº 1004127-51.2023.4.01.3602

ID: 298241642

Tribunal: TRF1 Órgão: 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Rondonópolis-MT Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1004127-51.2023.4.01.3602

Data de Disponibilização: 13/06/2025

Polo Ativo:

ENZO GABRIEL BORGES PEDROSO DA SILVA

Polo Passivo:

Sentença Tipo A

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Rondonópolis-MT 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Rondonópolis-MT SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1004127-51.2023.4.01.3602 CLASSE: PROCED… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Rondonópolis-MT 1ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Rondonópolis-MT SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1004127-51.2023.4.01.3602 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: E. G. B. P. D. S. POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS VISTOS EM INSPEÇÃO S E N T E N Ç A Cuida-se de ação cognitiva ajuizada porE. G. B. P. D. S., menor impúbere, representado por sua avó, Sra. Cláudia Cristina Ferreira da Silva,em desfavor doINSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, em que se objetiva a concessão do benefício assistencial de prestação continuada à pessoa com deficiência. A parte autora alega ser portadora de síndrome nefrótica corticodependente (CID N04) desde os 3 anos de idade, enfermidade que o obrigaria ao uso contínuo de medicação imunossupressora e acompanhamento em nefrologia pediátrica. Sustenta que, em virtude da doença, encontra-se impedido de participar plenamente da sociedade em igualdade de condições com as demais crianças de sua idade. Afirma ainda viver em situação de miserabilidade, com renda per capita familiar declarada de R$ 105,00 e dependência integral da avó materna, que está desempregada, sendo beneficiário do Auxílio Brasil. (ID 1748601144) A petição inicial informa que houve requerimento administrativo junto ao INSS, protocolado em 22/03/2018 sob o nº 702919802-7, o qual foi indeferido sob o fundamento de que não restaram comprovados os critérios legais, especialmente quanto à renda familiar superior ao limite legal e à não apresentação de documentos exigidos. O pedido de tutela de urgência foi indeferido, ID 1767750574, sob o fundamento de ausência de elementos suficientes à comprovação da miserabilidade e da deficiência exigida, apontando a necessidade de produção de prova técnica. A perícia médica judicial foi realizada em 14/12/2023 pela perita Janine de Araújo Kestrin, ID 1996853150. O laudo concluiu pela existência de diagnóstico de síndrome nefrótica compensada, mas sem identificar qualquer limitação funcional significativa, considerando o autor assintomático, com desenvolvimento escolar normal, ausência de comprometimento em atividades cotidianas e possibilidade futura de inserção no mercado de trabalho. A deficiência foi classificada como intermitente, temporária e sem impacto funcional relevante, sendo excluído, naquele momento, o impedimento de longo prazo exigido pela LOAS. O INSS apresentou contestação, ID 2026218653 , na qual requereu o reconhecimento da prescrição quinquenal e decadência, além de pugnar pela improcedência da ação, com base no laudo pericial que não identificou deficiência e na ausência de comprovação de miserabilidade nos moldes exigidos pelo Decreto 6.214/2007 e art. 20 da Lei 8.742/93. Em réplica, ID 2077395172 , a parte autora renunciou ao valor excedente ao teto dos Juizados Especiais Federais, com vistas à remessa dos autos ao JEF. Contudo, por decisão de ID 2131269695, foi determinado que tal renúncia era inválida por ausência de poderes específicos na procuração outorgada à Defensoria Pública da União, sendo concedido prazo para regularização. Posteriormente, a DPU apresentou petição de retratação, ID 2137526132 , informando que a renúncia anterior fora equivocada e requerendo o prosseguimento do feito na Vara Comum, com manutenção integral dos pedidos e dos valores originalmente pleiteados. Por decisão de ID 2158961653, o juízo acatou a retratação da renúncia e determinou a realização de estudo socioeconômico domiciliar, diante da ausência de prova efetiva sobre as condições materiais da parte autora. O laudo social foi elaborado pela assistente social Andrea Maforte Silva (CRESS 4608), em 07/02/2025, e concluiu que, embora a renda per capita formal do grupo familiar fosse nula, havia contribuição indireta do companheiro da avó, com renda mensal de R$ 3.000,00, não considerada oficialmente para fins do benefício. Constatou que o menor reside em habitação em bom estado, com acesso a serviços básicos, alimentação, escola regular e proteção familiar, não sendo identificado quadro de vulnerabilidade social grave. (ID 2170981478) Aparte autora apresentou manifestação sobre o laudo social, ID 2175383383 , impugnando suas conclusões, por entender que a análise pericial ignorou aspectos emocionais, ausência da genitora (encarcerada), dependência psíquica da avó e episódios de bullying escolar. Defendeu a possibilidade de comprovação da miserabilidade por outros meios e requereu o julgamento de procedência do pedido. É o relatório. Decido. O acervo probatório reunido nos autos, com destaque para a prova técnica e para o estudo socioeconômico realizado no endereço do requerente, é suficiente para o julgamento do objeto da demanda, sendo viável, portanto, o julgamento antecipado do mérito, na forma do art. 355, I do CPC. O benefício assistencial, no valor de um salário-mínimo, previsto no regramento constitucional, foi regulamentado pela Lei nº 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), sendo devido às pessoas portadoras de deficiência e aos idosos a partir de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, quando incapazes de prover suas próprias manutenções, ou de tê-las providas por suas famílias (art. 20, caput, Lei n.º 8.742/93 c/c art. 203, V, da Constituição da República). São dois, portanto, os requisitos para a pessoa obter o benefício assistencial: a) ser portadora de deficiência ou possuir mais de 65 anos de idade; b) não ter condições de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família (condição de miserabilidade). No que tange ao segundo requisito (miserabilidade), é oportuno frisar que o artigo 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93, considera que há incapacidade da família para prover o sustento do interessado quando a renda mensal per capita dos integrantes do núcleo familiar for inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. Vale observar que, no que tange aos benefícios assistenciais, o conceito de família é previsto no § 1º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, in verbis: “para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto” Assim, para verificar se a renda mensal da família não ultrapassa o limite legal (1/4 do salário-mínimo), devem ser consideradas apenas as pessoas que moram na mesma casa, conforme decisão proferida pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 1.747.057/SP, de rel. do Ministro napoleão Nunes Maia Filho (DJe de 14.6.2019). Fixadas essas premissas, verifica-se que o caso em exame versa sobre o benefício assistencial devido às pessoas portadoras de deficiência, de forma que o interessado deve comprovar, além da miserabilidade (ou seja, a impossibilidade de prover a sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família), a condição de pessoa com deficiência, considerando-se como tal a pessoa que tem “impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” (art. 20, § 2º da Lei n. 8.742/93, redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015). Consoante o laudo da perícia médica realizada em 14/12/2023 (ID 1996853150), a parte autora é portadora de síndrome nefrótica CID N04 (quesitos 3). Ao narrar o histórico da doença, a perita assim consignou, in verbis: Menor 10 anos de idade, acompanhado do avô Marcelo. Relata diagnóstico de sindrome nefrótica desde os 3 anos. Acompanha com nefrologia pediátrica (em cuiabá 1-2 meses), e faz uso de prednisona 20 mg. tratamento em cuiabá de 1-2 meses . No momento doença compensada. sem queixas. Para os itens I; III ao XI; XIII ao XVIII do quesito 5 (funções mentais, funções sensoriais da audição, funções sensoriais da voz e da fala, funções sensoriais da visão ,funções do sistema cardiovascular, funções do sistema hematológico, funções do sistema imunológico, funções do sistema respiratório, funções do sistema digestivo, funções dos sistemas metabólico e endócrino, às funções neuromusculoesqueléticas e relacionadas ao movimento, funções da pele, aprendizagem e aplicação do conhecimento, tarefas e demandas gerais, comunicação, mobilidade e cuidado pessoal), a perita apontou o zero como resposta: nenhuma deficiência, nenhuma dificuldade, deficiência ou dificuldade ausente/escassa, de 0% a 4%. Para o item XI do quesito 5, a perita respondeu que, em relação às funções geniturinárias, o periciando apresenta deficiência/dificuldade apresenta deficiência/dificuldade leve/baixa/pouca, com intervalo percentual de 5% a 24%. No quesito 7, a médica respondeu que impedimento do autor não limita o desempenho de atividades próprias à idade do(a) periciando(a) ou restringe a sua interação social, inclusive participação escolar. Em resposta ao quesito 7.3 , a expert afirmou que há possibilidade de o(a) periciando vir a desempenhar atividade laborativa quando de sua maioridade, considerado o contexto social em que vive. Em resposta ao quesito 16.1, restou consignado que o autor está apto : “Menor apresenta exame fisico satisfatório, assintomático. Não se comprova incapacidade nomomento. Conclusão embasada na anamnese, exame fisico, análise documental e análise literatura médica.” Assim, não restou caracterizado comprometimento para realização de atividades da vida diária. É lícito inferir que a parte autora pode ter vida independente, dentro das limitações da sua idade. No ponto, friso que não é qualquer doença ou dificuldade que caracteriza a condição de pessoa com deficiência para fins assistenciais. No que se refere ao conceito de pessoa com deficiência - previsto no § 2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/1993, com a redação dada pela Lei nº 13.146/2015, passou a ser assim considerada aquela com impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, possam obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Assim, ratificou-se o entendimento de que o rol previsto no art. 4º do Decreto nº 3.298/1999 (regulamentador da Lei nº 7.853/1989, que dispõe sobre a Política Nacional da Pessoa Portadora de Deficiência) não era exaustivo. Se fosse constatado, portanto, que os males sofridos pelo postulante impedissem sua inserção social, restaria preenchido um dos requisitos exigidos para a percepção do benefício. Menciona-se também o conceito apresentado pela ONU, elaborado por meio da Resolução nº 3.447/1975: “1. O termo ‘pessoa deficiente’ refere-se a qualquer pessoa incapaz de assegurar a si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas ou mentais”. Luiz Alberto David Araujo propõe um norte mais seguro para a identificação da pessoa protegida, cujo fator determinante do enquadramento ou não no conceito de pessoa com deficiência seja o meio social: O indivíduo portador de deficiência, quer por falta, quer por excesso sensorial ou motor, deve apresentar dificuldades para seu relacionamento social. O que define a pessoa portadora de deficiência não é falta de um membro nem a visão ou audição reduzidas. O que caracteriza a pessoa portadora de deficiência é a dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade. O grau de dificuldade para a sua integração social é o que definirá quem é ou não portador de deficiência. (A Proteção Constitucional das Pessoas Portadoras de Deficiência. Brasília: Ministério da Justiça, 1997, p. 18-22). Assim, quanto mais complexo o meio social, maior rigor se exigirá da pessoa com deficiência para sua adaptação social. De outra parte, na vida em comunidades mais simples, como nos meios agrícolas, a pessoa com deficiência poderá integrar-se com mais facilidade. Desse modo, o conceito de Luiz Alberto David Araujo é adequado e de acordo com a norma constitucional, motivo pelo qual é possível seu acolhimento para a caracterização desse grupo de pessoas protegidas nas várias situações reguladas pela Constituição Federal, nos artigos 7º, XXXI, 23, II, 24, XIV, 37, VIII, 203, V e 208, III. Mas é preciso delimitar a proteção constitucional apenas àquelas pessoas que realmente dela necessitam, porquanto existem graus de deficiência que apresentam menores dificuldades de adaptação à pessoa. Luiz Alberto David Araujo salienta que os casos-limite podem, desde logo, ser excluídos, como o exemplo do bibliotecário que perde um dedo ou do operário que perde um artelho; em ambos os casos, as pessoas continuam integradas socialmente. Em outro exemplo, pequenas manifestações de retardo mental (deficiência mental leve) podem passar despercebidas em comunidades simples, pois essa pessoa poderá “não encontrar problemas de adaptação a sua realidade social (escola, trabalho, família)”, de maneira que não se pode afirmar que ela deverá receber proteção, “tal como aquele que sofre restrições sérias em seu meio social” (obra citada, p. 42-43). “A questão, assim, não se resolve sob o ângulo da deficiência, mas, sim sob o prisma da integração social. Há pessoas portadoras de deficiência que não encontram qualquer problema de adaptação no meio social. Dentro de uma comunidade de doentes, isolados por qualquer motivo, a pessoa portadora de deficiência não encontra qualquer outro problema de integração, pois todos têm o mesmo tipo de dificuldade” (obra citada, p. 43). Enfim, a constatação da existência de graus de deficiência é de fundamental importância para identificar aqueles que receberão a proteção social prevista no art. 203, V, da Constituição Federal. Feitas essas considerações, torna-se possível inferir que não será qualquer pessoa com deficiência que se subsumirá no molde jurídico protetor da Assistência Social. Nesse cenário, friso que não foram constatadas pela perícia dificuldades que pudessem constituir barreiras ou mesmo limitações, já que a parte autora não se encontra inválida. Em verdade, o autor não experimenta propriamente a segregação experimentada por pessoas com deficiência. Nada impede, portanto, sua plena inclusão na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas. Evidentemente, o juiz não está adstrito ao laudo pericial. Contudo, não há nos autos elementos probatórios que possam infirmar as conclusões da perícia médica. E mais, quem afere a idoneidade e a instrumentalidade do laudo como meio de se solucionar a lide é o magistrado, não as partes, que, segundo suas posições parciais, tenderão sempre a dizer que um resultado contrário aos seus interesses está eivado de vício. No entanto, não basta afirmar que o laudo é defeituoso, devendo a parte, para tanto, estar munida de fundamentos sólidos. A impugnação aos termos técnicos da ciência médica deve ser fundada em parecer de assistente técnico com formação médica. Argumentações pertinentes às doenças que acometem o periciando, desprovidas do respectivo laudo do assistente técnico, são mera retórica, não tendo o condão de afastar o laudo elaborado por perito médico judicial. Ressalto que o laudo judicial é elaborado por perito da confiança do Juízo e equidistante das partes, do que se presume a sua imparcialidade. Assim, resta não configurada a hipótese de conversão do julgamento em diligência para realização de nova perícia médica ou de esclarecimentos médicos, eis que o laudo pericial produzido é claro e preciso, não apresentando nenhuma contrariedade que justifique novo exame. De todo modo, in casu, a parte autora não se amolda ao conceito de pessoa com deficiência tipificado no art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/1993. A concessão do benefício assistencial requer a coexistência de requisitos cumulativos, a teor do disposto no art. 20, caput, da Lei nº 8.742/1993. Com efeito, entendendo pela ausência da condição de deficiência que justifique a concessão do benefício assistencial correspondente (art. 371 do CPC), prescindível a sindicância acerca dos demais requisitos (hipossuficiência/miserabilidade). Ante o exposto, resolvo o processo, com enfrentamento de mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para julgar improcedentes os pedidos iniciais. Condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, estes em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, verbas que ficam com a exigibilidade suspensa em razão da concessão dos benefícios da gratuidade da justiça ao sucumbente. Decorridos em branco os prazos recursais, arquivem-se os autos, com as cautelas de praxe. Sentença não sujeita ao reexame necessário. Rondonópolis/MT, data e hora do sistema. Assinatura Digital Juiz(a) Federal indicado(a) no rodapé

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Processo nº 1004127-18.2024.8.11.0041

ID: 291606334

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO / REMESSA NECESSáRIA Nº Processo: 1004127-18.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 06/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ANTONIO JOSE DA COSTA

Acórdão

Advogados:

FERNANDO CRUDE GOMES

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1004127-18.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (1728) Assunto: [Liminar, Revo… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1004127-18.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (1728) Assunto: [Liminar, Revogação/Concessão de Licença Ambiental] Relator: Des(a). JONES GATTASS DIAS Turma Julgadora: [DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] Parte(s): [ANTONIO JOSE DA COSTA - CPF: 162.213.461-34 (APELADO), FERNANDO CRUDE GOMES - CPF: 301.199.948-10 (ADVOGADO), ; ILMO. SUPERINTENDENTE DA SUPERINTENDÊNCIA DE SEMA (APELANTE), SECRETARIA DE ESTADO DE MEIO AMBIENTE - SEMA - CNPJ: 63.601.769/0001-85 (APELANTE), MATO GROSSO GOVERNO DO ESTADO - CNPJ: 03.507.415/0016-20 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCIO VIDAL, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, RATIFICOU A SENTENÇA E NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, DES. JONES GATTASS DIAS E M E N T A Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. APELAÇÃO CÍVEL. CONVERSÃO DE MULTA AMBIENTAL. PROGRAMA DE ADESÃO. ATO JURÍDICO PERFEITO. APLICAÇÃO RETROATIVA DE DECRETO MAIS GRAVOSO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta pelo Estado de Mato Grosso contra sentença que, nos autos de mandado de segurança impetrado por Antonio José da Costa, concedeu parcialmente a ordem para determinar que a autoridade coatora observasse os percentuais de desconto previstos no Decreto Estadual n.º 1.436/2022 à época da protocolização do pedido de conversão de multa ambiental, formulado em 10.04.2023, no âmbito do Processo Administrativo n.º 475855/2021, afastando a aplicação retroativa do Decreto Estadual n.º 275/2023. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em definir se o impetrante tem direito líquido e certo à aplicação dos percentuais de desconto previstos no Decreto Estadual n.º 1.436/2022, vigente na data do requerimento de adesão ao Programa de Conversão de Multas, afastando a incidência retroativa das alterações introduzidas pelo Decreto Estadual n.º 275/2023. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O mandado de segurança é cabível para proteger direito líquido e certo demonstrado por prova pré-constituída, desde que o ato coator seja identificável, atual e praticado por autoridade pública no exercício de suas atribuições. 4. A documentação constante dos autos comprova que o requerimento de conversão da multa foi apresentado em 10.04.2023, sob a vigência do Decreto Estadual n.º 1.436/2022, atendendo aos requisitos legais e administrativos então vigentes. 5. O Decreto Estadual n.º 275/2023, ao reduzir os percentuais de desconto no Programa de Conversão de Multas Ambientais, não pode ser aplicado retroativamente a requerimentos já formalizados sob a égide do decreto anterior, sob pena de afronta aos princípios da legalidade, segurança jurídica, boa-fé e proteção da confiança legítima. 6. A superveniência de norma mais gravosa não autoriza a Administração a condicionar a manutenção do requerimento à ratificação com base em regras posteriores, quando o administrado já houver validamente aderido ao programa conforme a legislação vigente à época. 7. O princípio do “tempus regit actum” impõe a aplicação da norma vigente ao tempo do ato jurídico, sendo inadmissível alteração posterior que prejudique o particular sem amparo em lei expressa autorizadora. 8. A jurisprudência do TJMT e do STJ confirma a impossibilidade de retroatividade de normas administrativas sancionatórias mais gravosas, quando já manifestado o interesse do administrado nos termos da norma anterior. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso desprovido. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, II, XXXVI e LXIX; Decreto Estadual n.º 1.436/2022, arts. 68 e 70; Decreto Estadual n.º 275/2023; Lei 12.016/2009. Jurisprudência relevante citada: STJ, RMS 64.181/MT, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 12/04/2021; TJMT, Apelação/Remessa Necessária Cível 1035210-86.2023.8.11.0041, Rel. Des. Vandymara Zanolo, j. 21/11/2024, pub. 25/11/2024; TJMT, Apelação 1041214-42.2023.8.11.0041, Rel. Des. Helena Maria Bezerra Ramos, j. 05/02/2025, pub. 14/02/2025. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara Cuida-se de Apelação Cível interposta pelo ESTADO DE MATO GROSSO contra a r. sentença proferida pelo juízo da Vara Especializada do Meio Ambiente da Comarca de Cuiabá/MT, que, nos autos do mandado de segurança impetrado por ANTONIO JOSÉ DA COSTA, concedeu parcialmente a ordem para determinar à autoridade coatora que observasse os percentuais de desconto estabelecidos no Decreto Estadual n.º 1.436/2022 à época do protocolo do requerimento de conciliação, ocorrido em 10.04.2023, no bojo do Processo Administrativo n.º 475855/2021, sem prejuízo do preenchimento integral dos requisitos exigidos em lei. A controvérsia gravita em torno da legalidade da aplicação retroativa do Decreto Estadual n.º 275/2023 – que alterou as regras atinentes ao Programa de Conversão de Multas em Serviços Ambientais –, com redução dos percentuais de desconto anteriormente previstos no Decreto Estadual n.º 1.436/2022, inclusive para fatos pretéritos, notadamente no que tange à conversão de multa ambiental solicitada pelo impetrante antes da vigência da nova norma. O apelante sustenta a legalidade do ato administrativo que exigiu a ratificação da manifestação de interesse com base nas novas regras, afirmando a inexistência de direito adquirido a descontos anteriores à decisão da Administração Pública e requerendo, ao final, a reforma da sentença para denegar a segurança. Contrarrazões foram apresentadas, pugnando pela manutenção da sentença de primeiro grau. A douta Procuradoria de Justiça Ambiental manifestou-se pelo provimento do recurso, sustentando a inexistência de direito adquirido à fruição dos percentuais de desconto previstos no Decreto anterior, diante da ausência de ato jurídico perfeito e do caráter negocial da conciliação administrativa. É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: O mandado de segurança, nos termos do artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, e conforme disciplina a Lei n. 12.016/2009, é o remédio constitucional destinado à proteção de direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, diante de ilegalidade ou abuso de poder praticado por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal estabelece, como condições inafastáveis à concessão da ordem mandamental, a demonstração simultânea e inequívoca de três requisitos essenciais: a existência de direito líquido e certo, a identificação de ato coator ilegal ou abusivo praticado por autoridade pública, e a presença de prova pré-constituída e documental, pois o mandado de segurança não comporta dilação probatória. Direito líquido e certo é aquele que decorre de uma situação jurídica objetiva, fundada em norma legal ou constitucional, cuja existência e extensão possam ser demonstradas de plano, sem necessidade de atividade instrutória complexa. Trata-se de um direito cujo conteúdo está claramente delimitado e pode ser demonstrado por documentos idôneos já reunidos ao ajuizamento da impetração. O ato coator deve ser concretamente identificável, atual ou iminente, de conteúdo lesivo e atribuído a autoridade pública no exercício de suas funções. No presente caso, o ato coator consiste no despacho administrativo que readequou o percentual de desconto da multa ambiental com base no Decreto Estadual n.º 275/2023, embora o pedido de conversão da penalidade tenha sido formulado sob a égide do Decreto anterior, de n.º 1.436/2022. A prova pré-constituída, outro requisito essencial, é que os documentos comprobatórios da lesividade do ato e da titularidade do direito invocado estejam todos reunidos no momento da impetração, não se prestando, portanto, o mandado de segurança, à fase de instrução probatória, sendo ônus do impetrante apresentar elementos aptos à demonstração do direito invocado. No caso concreto, verifica-se que o impetrante instruiu o mandamus com documentação idônea – inclusive cópia do requerimento de adesão ao programa de conversão de multas, protocolado em 10/04/2023, antes da edição do Decreto n.º 275/2023 – bem como comprovante do despacho administrativo impugnado, elementos que satisfazem o requisito da prova pré-constituída. A controvérsia, portanto, limita-se à correta interpretação da legislação ambiental infraconstitucional e à possibilidade de sua aplicação retroativa, matéria que, por ser de direito e passível de demonstração exclusivamente documental, é plenamente cognoscível na via estreita do mandado de segurança. Dessa forma, presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, notadamente a tempestividade recursal, a regularidade formal da peça, o preparo e a legitimidade das partes, conheço do recurso de apelação. Do mérito recursal O cerne da controvérsia reside na verificação da possibilidade jurídica de aplicação retroativa do Decreto Estadual n.º 275/2023, com consequente revogação dos percentuais de desconto anteriormente conferidos pelo Decreto Estadual n.º 1.436/2022, aos processos administrativos em que já houvera adesão tempestiva ao Programa de Conversão de Multas Ambientais. É fato incontroverso nos autos que o impetrante foi autuado pela prática de infração ambiental, consistente na supressão irregular de vegetação nativa, ensejando a lavratura do Auto de Infração n.º 210433601 e o Termo de Embargo/Interdição n.º 210442373. Posteriormente, no exercício regular de faculdade legal prevista no art. 68, §1º, inciso I, do Decreto Estadual n.º 1.436/2022, protocolizou, em 10.04.2023, requerimento de conversão da multa em serviços de preservação ambiental, com base na norma vigente à época, que lhe conferia direito a um desconto de até 90% na penalidade imposta, por se tratar de infração de menor potencial ofensivo. A superveniência do Decreto Estadual n.º 275/2023, que limitou os descontos a, no máximo, 60%, inclusive para condutas como a do impetrante, ensejou a emissão de novo despacho administrativo, condicionando a manutenção da adesão à ratificação do interesse com base nos novos percentuais. Todavia, conforme corretamente observado pelo juízo de origem, a legislação posterior não pode retroagir para atingir atos jurídicos perfeitos, tampouco pode surpreender o administrado que, agindo com boa-fé, aderiu validamente ao programa em momento anterior à modificação normativa. No ponto, o parecer ministerial é firme ao assentar que “não nos parece que um simples requerimento, no qual o interessado demonstre interesse em conciliar com a Administração, enseje o reconhecimento do direito adquirido a determinado percentual de desconto se não houve análise ou decisão do órgão ambiental” – mas reconhece, por outro lado, que a Administração, no momento da análise, deve observar os preceitos legais vigentes à época da formalização do pedido. Destarte, a sentença que concedeu parcialmente a segurança para impedir a aplicação retroativa do Decreto n.º 275/2023 e assegurar a observância dos percentuais e requisitos da norma vigente à época do requerimento deve ser mantida por seus próprios fundamentos. Não se trata, aqui, de reconhecer direito adquirido ao desconto pretendido de forma absoluta, mas apenas de impor à Administração o dever de respeitar a norma vigente quando o administrado exerceu seu direito de adesão, sob pena de violação aos princípios da segurança jurídica e da legalidade. Com efeito, a jurisprudência pátria é firme no sentido de que “é defeso à Administração Pública impor nova regra restritiva de direito quando o particular, no exercício regular de prerrogativa legal, já tiver concluído o ato regido por norma mais benéfica”, sendo vedada a retroatividade normativa em prejuízo ao administrado (STJ, RMS 64.181/MT, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 12/04/2021). Dessa forma, impende ressaltar que a superveniência do Decreto Estadual n.º 275/2023, ao alterar substancialmente os percentuais de desconto anteriormente previstos no Decreto Estadual n.º 1.436/2022 para fins de conversão de multa ambiental, não pode produzir efeitos retroativos sobre requerimentos formalizados sob a égide da norma anterior, como é o caso do impetrante, que aderiu regularmente ao Programa de Conversão em 10 de abril de 2023, antes da vigência da novel disciplina normativa. A tentativa de impor ao particular as consequências de uma alteração normativa posterior, ignorando o regime jurídico vigente à época do exercício do seu direito de adesão, implica manifesta violação aos princípios constitucionais da segurança jurídica, boa-fé objetiva, proteção da confiança, irretroatividade das normas administrativas desfavoráveis, bem como ao direito adquirido. A aplicação retroativa de nova legislação ou regulamento administrativo, especialmente no contexto do direito sancionatório ambiental, deve ser repelida quando inexistir expressa autorização legal e quando representar majoração de ônus ou supressão de prerrogativas anteriormente asseguradas. Como cediço, o princípio do “tempus regit actum” impõe que os atos jurídicos sejam regidos pela legislação vigente no momento de sua prática, sob pena de instabilidade das relações jurídicas. Nesse contexto, o simples fato de o procedimento administrativo ainda não ter sido finalizado não autoriza a imposição de nova disciplina normativa que altere, em prejuízo do administrado, as condições já constituídas sob a égide do ordenamento então vigente. A mera pendência procedimental não afasta a proteção conferida aos atos jurídicos perfeitos, ao direito adquirido e à legítima expectativa de tratamento isonômico segundo as regras estabelecidas na data da manifestação de vontade do impetrante. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a Administração deve observar a norma vigente à época do requerimento administrativo, sob pena de violação ao princípio da segurança jurídica, assim se inferindo dos seguintes acórdãos: “DIREITO PÚBLICO. AMBIENTAL. REEXAME NECESSÁRIO COM APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONVERSÃO DE MULTAS AMBIENTAIS. APLICAÇÃO RETROATIVA DE DECRETO. PREVISÃO DE DECISÃO CONFORME O MOMENTO DO PEDIDO DE CONVERSÃO. PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE. SENTENÇA RATIFICADA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Trata-se de reexame necessário e de apelação interposta pelo Estado de Mato Grosso contra sentença que, nos autos de Mandado de Segurança, concedeu parcialmente a segurança para determinar que a autoridade coatora observasse os percentuais de desconto estabelecidos no Decreto Estadual n. 1.436/2022, à época da protocolização do requerimento de conversão de multa, impedindo a aplicação retroativa do Decreto Estadual n. 275/2023 ao processo administrativo. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em verificar se o Impetrante possui direito líquido e certo à aplicação dos percentuais de desconto previstos no Decreto Estadual n. 1 .436/2022, nos termos da redação do § 1º do art. 68 do referido decreto, sem a alteração introduzida pelo Decreto Estadual n. 275/2023, que entrou em vigor após a protocolização do requerimento de conversão da multa. III. Razões de decidir 3. A regra do "Tempus regit actum" determina que os atos processuais sejam regidos pela lei em vigor no momento de sua prática, não se admitindo a aplicação retroativa de normas processuais. 4. O requerimento de conversão de multa foi protocolizado na vigência da redação original do Decreto 1 .436/2022, antes da entrada em vigor do novo decreto, o que impõe a aplicação das regras vigentes à época, conforme estabelece o art. 70 do decreto 1.436/2022. IV. Dispositivo e tese 5. Recurso de apelação desprovido. Sentença ratificada. Tese de julgamento: "A alteração do caput do § 1º do art. 68 do Decreto Estadual 1 .436/2022, introduzida pelo Decreto Estadual n.º 275/2023, que modifica as condições para a aplicação dos percentuais de desconto na conversão de multas ambientais previstas, não se aplica aos casos em que o pedido de conversão da multa tenha sido protocolizado sob a vigência do Decreto Estadual n.º 1.436/2022, em observância ao que dispõe a redação do art . 70 do Decreto 1.436/2022 e ao princípio da irretroatividade." Dispositivos relevantes citados: Decreto Estadual n. 1.436/2022, art. 68, 70. Decreto Estadual 275/2023. Jurisprudência relevante citada: NU 1030068-04 .2023.8.11.0041, Helena Maria Bezerra Ramos, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 02/10/2024, Publicado no DJE 05/10/2024; NU 1034339-56 .2023.8.11.0041, Maria Aparecida Ferreira Fago, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 22/10/2024, Publicado no DJE 25/10/2024; A1035249-83 .2023.8.11.0041, Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 25/09/2024, Publicado no DJE 03/10/2024 . (TJ-MT - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL: 10352108620238110041, Relator.: VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO, Data de Julgamento: 21/11/2024, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 25/11/2024 – destaquei.) No mesmo sentido: (TJ-MT - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL: 10412144220238110041, Relator.: HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Data de Julgamento: 05/02/2025, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 14/02/2025) Ademais, a conciliação ambiental, embora possua natureza negocial, não afasta o dever de respeito aos princípios da legalidade e da vinculação ao ato normativo anterior, sobretudo quando a parte aderente cumpre de forma tempestiva e integral os requisitos estabelecidos. A retroatividade normativa, em hipóteses como a presente, não encontra respaldo jurídico e compromete gravemente os fundamentos do Estado de Direito, em especial a confiança legítima depositada pelo administrado no cumprimento das normas estatais. Portanto, correta a sentença ao determinar que a Administração observe o regime jurídico previsto no Decreto n.º 1.436/2022, em sua redação original, prevalecente à época da adesão do impetrante, vedando a aplicação retroativa de norma mais gravosa ausente de respaldo legal específico. Em face do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo inalterada a sentença que concedeu parcialmente a segurança, nos moldes em que lançada. Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/06/2025

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Processo nº 1004127-50.2025.4.01.3903

ID: 335912598

Tribunal: TRF1 Órgão: Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Altamira-PA Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 1004127-50.2025.4.01.3903

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

CARMEN LUCIA ALVES CORDEIRO

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

WELTON FRANCA ALVES DE MESQUITA

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Altamira-PA Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Altamira PA PROCESSO: 1004127-50.2025.4.01.3903 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) PO… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Altamira-PA Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Altamira PA PROCESSO: 1004127-50.2025.4.01.3903 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) POLO ATIVO: CARMEN LUCIA ALVES CORDEIRO REPRESENTANTES POLO ATIVO: WELTON FRANCA ALVES DE MESQUITA - PA26953 POLO PASSIVO: COORDENADOR DA PERÍCIA MÉDICA FEDERAL e outros DECISÃO Vistos, etc. Trata-se de mandado de segurança impetrado em face de ato de GERENTE EXECUTIVO DA GERÊNCIA EXECUTIVA DO INSTITUTO NACIONAL DA SEGURIDADE SOCIAL EM ALTAMIRA-PA, buscando provimento jurisdicional, inclusive em sede liminar, que lhe garanta a realização de sua perícia médica no âmbito de processo administrativo vocacionado à concessão de benefício previdenciário/assistencial por incapacidade. Alega, em síntese, que (a) protocolou requerimento administrativo, em data 22/05/2025, para a concessão de benefício por incapacidade; b) a perícia médica foi agendada pela autarquia previdenciária para 29/04/2026; e c) conforme laudos médicos, encontra-se em delicado estado de saúde em virtude de enfermidades, que lhe impede de exercer atividades laborais. É o breve relatório. Vieram-me para decisão. Decido. Após muito refletir sobre a problemática trazida a conhecimento desta Vara Federal relativamente ao agendamento de perícias para datas absolutamente incondizentes com o quadro de saúde narrado pelos segurados que buscam o reconhecimento de benefícios por incapacidade (temporária e permanente), entendo necessário modificar a orientação deste Juízo, alinhando-a aos parâmetros assumidos pela própria UNIÃO e pelo INSS. 1. Preliminarmente Em inúmeros mandados de segurança que tramitam nesta Unidade, tem sido recorrente a alegação, pela Gerência Executiva local (e pelo próprio INSS), de sua ilegitimidade para figurar no polo passivo de impetrações dessa natureza. O fundamento para essas alegações é de que houve uma modificação de competência legal na estrutura dos médicos peritos com o advento da L13.846/2019, os quais passaram a integrar o quadro do Ministério do Trabalho e da Previdência, encontrando-se vinculados ao Departamento de Perícia Médica Federal – DPMF (art. 2º, II, do D 11.356/2003), integrante do Ministério da Previdência Social (art. 17, XXV, da L14.600/2023). A alegação é reiteradamente repudiada pelo TRF1, conforme ilustram os seguintes arestos: PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO DO INSS. LITISCONSÓRCIO PASSIVO . DESNECESSIDADE. CESSAÇÃO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. NÃO OPORTUNIZADO PRAZO PARA A IMPETRANTE REQUERER A PRORROGAÇÃO. VIOLAÇÃO A DIREITO LÍQUIDO E CERTO . APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS. 1. O recurso de apelação interposto contra sentença concessiva da segurança deve ser recebido, em razão do caráter auto executório do julgado, apenas em seu efeito devolutivo (art. 14 da Lei nº 12 .016/2009). Preliminar de atribuição de efeito suspensivo rejeitada. 2. O Coordenador de Perícia Médica Federal não necessita ser incluído à lide na condição de litisconsorte passivo necessário, pois, a autoridade competente para corrigir a ilegalidade aventada é aquela que detém meios para praticar o ato quando da impetração do mandado de segurança, sendo o Gerente Executivo do INSS autoridade competente para deferimento, indeferimento, suspensão e cancelamento do benefício . Portanto, possui legitimidade para figurar no polo passivo do mandado de segurança. 3. No caso dos autos, a parte autora impetrou Mandado de Segurança visando à obtenção de medida liminar para determinar o restabelecimento do benefício previdenciário, sob o argumento de que foi cessado sem oportunizar à parte o pedido de prorrogação. 4 . Sem reparos a sentença recorrida que determinou que fosse assegurado o direito de requerer a prorrogação do benefício e determinou sua reativação até a apreciação de novo requerimento. 5. Apelação e remessa oficial desprovidas. (TRF-1 - APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA: 10120060920224013000, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO OSWALDO SCARPA, Data de Julgamento: 30/04/2024, NONA TURMA, Data de Publicação: PJe 30/04/2024 PAG PJe 30/04/2024 PAG) PROCESSUAL CIVIL E ASSISTENCIAL. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. REMESSA NECESSÁRIA. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS AFASTADA . REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEMORA DESPROPORCIONAL NA REALIZAÇÃO DE PERÍCIA MÉDICA. ANTECIPAÇÃO. POSSIBILIDADE . VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DURAÇÃO RAZOÁVEL PROCESSO. ACORDO HOMOLOGADO PELO STF NO ÂMBITO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 1.171 .152/SC. ILEGALIDADE CONFIGURADA. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDAS. 1 . Na situação de que se trata nestes autos, verifica-se que a parte impetrante, ora apelada, protocolou o requerimento administrativo de benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência em 24/3/2023, mas perícia médica foi agendada somente para a data de 4/8/2023, ou seja, mais de 4 (quatro) meses após o protocolo do requerimento. 2. Ainda que, com o advento da Lei n. 13 .846/19, os órgãos e agentes com atribuições atinentes à atividade de perícia médica tenham sido deslocados para a estrutura orgânica da União, cabe ao INSS decidir sobre o requerimento administrativo de benefício assistencial e, em última análise, a ambos tanto ao ente político como à entidade autárquica zelar pela observância do princípio constitucional da duração razoável do processo administrativo, extraído do art. 5º, LXXVIII, da CRFB, impondo-se, por conseguinte, o afastamento da preliminar de ilegitimidade do INSS para figurar no polo passivo da demanda sob exame. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência desta Corte Regional Federal, consoante se depreende, exemplificativamente, dos seguintes julgados: 2ª Turma, AC n. 1003828-66 .2022.4.01.4101, Relator Desembargador Federal Joao Luiz De Sousa, PJe 30/06/2023; 2ª Turma, AC n . 1011640-77.2022.4.01 .3902, Relator Desembargador Federal Rafael Paulo, PJe 06/06/2023. (...) (TRF-1 - APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA: 10114830620234013600, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL RUI COSTA GONCALVES, Data de Julgamento: 21/03/2024, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: PJe 21/03/2024 PAG PJe 21/03/2024 PAG Bem se vê, portanto, que não há ilegitimidade passiva do INSS (ou da Gerência Executiva local), na medida em que há uma obrigação de toda arquitetura estatal de velar pelo regular andamento do processo administrativo, ainda que parcela de seus servidores componham estruturas distintas no contexto da Administração Direta e Indireta. A despeito dessas considerações, entendo que as alegações do INSS e da Gerência Executiva local não podem ser simplesmente desconsideradas. Além das modificações legislativas indicadas pela autarquia, há um obstáculo operacional no cumprimento das ordens de marcação de perícia, as quais serão melhor executadas se houver a integração do Coordenador Regional da Perícia Médica Federal no Centro-Oeste/Norte, diretamente ligado ao Departamento de Perícia Médica Federal – DPMF. Digo isso em razão de ter percebido que a manutenção isolada da Gerência Executiva nos polos passivos dos mandados de segurança nesta Unidade tem revelado um sucessivo quadro de descumprimento dos comandos liminares, sujeitando a autarquia a elevadas multas por recalcitrância. Na qualidade de magistrado, naturalmente não posso compelir a impetrante a incluir qualquer pessoa no polo passivo. Tal providência demandaria a existência de um litisconsórcio necessário, o que, evidentemente, não há. Contudo, posso condicionar a fluência de multas a inclusão da referida autoridade no polo passivo, na medida em que, a despeito da obrigação solidária e comum do INSS e da UNIÃO em providenciar o bom andamento dos processos administrativos, há uma dificuldade local. 2. Da tutela de urgência A concessão de medida liminar em sede de mandado de segurança pressupõe fundamento relevante e do ato impugnado e risco de ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica (L12.016/2009, art. 7º, III). Concretamente, entendo presentes os requisitos para o deferimento da medida liminar. Explico. Sabe-se que a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (CF, art. 5º, LXXVIII). Nas palavras da doutrina: A EC nº 45/04 (Reforma do Judiciário) assegurou a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, pois, “o direito ao julgamento, sem dilações indevidas, qualifica-se como prerrogativa fundamental que decorre da garantia constitucional do ‘due process of law’. O Supremo Tribunal Federal entendeu, por exemplo, que a ‘a demora demasiada para o julgamento do recurso, em razão do elevado número de substituição de relatores’ desrespeita o princípio da razoável duração do processo e determinou seu imediato julgamento." (MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2023. E-book) A nível administrativo, o art. 49, da L9.784/99 estabeleçam um prazo de 30 (trinta) dias para a Administração decidir: Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada. Sucede que os procedimentos previdenciários foram alvos de negociação específica entre a Ministério Público Federal e o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e chancelada pelo Supremo Tribunal Federal. Refiro-me à Petição ARESV/PGR Nº 294561/2020, de 16/11/2020, (RE 1171152/SC Tema 1066), homologada em 08/02/2021, no âmbito da qual foram regulamentados os prazos máximos de atendimento aos segurados junto a tal órgão, de acordo com a espécie e complexidade do benefício requerido, sendo estipulado em sua cláusula primeira o seguinte: CLÁUSULA PRIMEIRA 1. O INSS compromete-se a concluir o processo administrativo de reconhecimento inicial de direitos previdenciários e assistenciais, operacionalizados pelo órgão, nos prazos máximos a seguir fixados, de acordo com a espécie e o grau de complexidade do beneficio: ESPÉCIE PRAZO PARA CONCLUSÃO Benefício assistencial à pessoa com deficiência 90 dias Benefício assistencial ao idoso 90 dias Aposentadorias, salvo por invalidez 90 dias Aposentadoria por invalidez comum e acidentária (aposentadoria por incapacidade permanente) 45 dias Salário maternidade 30 dias Pensão por morte 60 dias Auxílio reclusão 60 dias Auxílio doença comum e por acidente do trabalho (auxílio temporário por incapacidade) 45 dias Auxílio acidente 60 dias CLÁUSULA SEGUNDA 2.1. O início do prazo estabelecido na Cláusula Primeira ocorrerá após o encerramento da instrução do requerimento administrativo. 2.2. Para os fins deste acordo, considera-se encerrada a instrução do requerimento administrativo a partir da data: I - da realização da perícia médica e avaliação social, quando necessária, para a concessão inicial dos benefícios de: a) prestação continuada da assistência social à pessoa com deficiência; b) prestação continuada da assistência social ao idoso; c) aposentadoria por invalidez (aposentadoria por incapacidade permanente), acidentária ou comum; d) auxílio doença (auxílio por incapacidade temporária), acidentário ou comum; e) auxílio-acidente; e f) pensão por morte, nos casos de dependente inválido. II - do requerimento para a concessão inicial dos demais benefícios, observada a Cláusula Quinta. CLÁUSULA TERCEIRA 3.1. A União compromete-se a promover a realização da perícia médica necessária à instrução e análise do processo administrativo de reconhecimento inicial de direitos previdenciários e assistenciais operacionalizados pelo INSS, no prazo máximo de até 45 (quarenta e cinco) dias após o seu agendamento. 3.1.1. O prazo de realização da perícia médica será ampliado para 90 (noventa) dias, nas unidades da Perícia Médica Federal classificadas como de difícil provimento, para as quais se exige o deslocamento de servidores de outras unidades para o auxílio no atendimento. 3.1.1.1. A Subsecretaria da Perícia Médica Federal (SPMF) divulgará trimestralmente as unidades que estejam com limitação operacional de atendimento, não podendo superar o percentual de 10% das unidades em nível nacional. CLÁSULA QUARTA 4.1. A realização da avaliação social, nos benefícios previdenciários e assistenciais, em que a aferição da deficiência for requisito à concessão do beneficio, dar-se-á no prazo de até 45 (quarenta e cinco) dias após agendamento. 4.1.1. O prazo de realização da avaliação social será ampliado para 90 (noventa) dias nas unidades classificadas como de difícil provimento, exigindo o deslocamento de servidores de outras unidades para auxiliar no atendimento. 4.1.1.1. O INSS divulgará trimestralmente as unidades que estejam com limitação operacional de atendimento, não podendo superar o percentual de 10% das unidades em nível nacional. CLÁUSULA QUINTA 5.1. Verificando-se que o interessado não apresentou a documentação necessária para a conclusão da análise do pedido de beneficio, o INSS promoverá o envio de comunicação de exigências, de que trata o art. 678 da IN INSS nº 77/2015, suspendendo-se a contagem do prazo estabelecido na Cláusula Primeira, cujo reinicio ocorrerá após o encerramento do lapso temporal fixado para apresentação dos documentos solicitados ou com a apresentação dos documentos, o que ocorrer primeiro, garantindo-se o prazo restante de, no mínimo, 30 (trinta) dias. 5.1.1 A comunicação para o cumprimento de exigência deve ocorrer pelo menos de duas formas diversas e concomitantes viabilizando a efetiva ciência pelo requerente da documentação a ser apresentada. 5.2 Exaurido o prazo estabelecido para a apresentação da documentação complementar prevista no item 5.1, sem que o requerente tenha apresentado qualquer manifestação, e quando não for possível a análise ao benefício por ausência de informações, o INSS arquivará o processo (art. 40 da Lei nº 9.784/1999). Desse cenário negocial, imperativo reconhecer que a Administração Pública possuí o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para a realização da perícia médica, após o agendamento pelo segurado. Trata-se de uma obrigação voluntariamente assumida (e judicialmente chancelada), a qual não pode ser desconsiderada por invocação genérica de entraves burocráticos e de deficiência de pessoal, empecilhos criados pelo próprio Estado e que não servem de respaldo para sonegar os direitos dos segurados. Tal é a orientação da Corte de Sobreposição: PROCESSUAL CIVIL E ASSISTENCIAL. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. REMESSA NECESSÁRIA. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS AFASTADA . REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEMORA DESPROPORCIONAL NA REALIZAÇÃO DE PERÍCIA MÉDICA. ANTECIPAÇÃO. POSSIBILIDADE . VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DURAÇÃO RAZOÁVEL PROCESSO. ACORDO HOMOLOGADO PELO STF NO ÂMBITO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 1.171 .152/SC. ILEGALIDADE CONFIGURADA. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDAS. (...) 3. Do inciso LXXVIII do art. 5º da CRFB/88, introduzido no texto constitucional pela EC n . 45/04, extrai-se o princípio da duração razoável do processo, corolário do supraprincípio do devido processo legal, segundo o qual "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. 4. Por sua vez, a Lei n. 9 .784/99, que disciplina o processo administrativo no âmbito da Administração Pública federal, estipula, em seu art. 49, que, "[c]oncluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada". 5. Recentemente, em julgado noticiado no Boletim Informativo de Jurisprudência n . 644 do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, esta 2ª Turma reconheceu que o atraso injustificado do INSS implica lesão a direito subjetivo da parte impetrante, sendo possível que o Poder Judiciário estabeleça prazo razoável para que a entidade autárquica providencie o processamento e julgamento dos processos administrativos atinentes a benefícios previdenciários e assistenciais (2ª Turma, Ap 1011437-66.2022.4.01 .3304 PJe, Rel. Desembargador Federal Rafael Paulo, j. 31/03/2023, v. Boletim Informativo de Jurisprudência TRF1 n . 644). 6. Nesse particular, convém mencionar o acordo celebrado pela Procuradoria-Geral da República, pela Advocacia-Geral da União, pela Defensoria Pública Geral da União, pelo Procurador-Geral Federal e pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e homologado em 8/2/2021 pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito do Recurso Extraordinário n. 1 .171.152/SC, por meio do qual foram estabelecidos prazos "para a conclusão dos processos administrativos de reconhecimento inicial de direitos previdenciários e assistenciais, operacionalizados pelo INSS, de modo a tornar efetiva a proteção dos cidadãos". 7. Conforme se depreende da cláusula primeira, item n . 1, do termo do acordo, o INSS se compromete a concluir os processos administrativos de reconhecimento inicial de benefício assistencial à pessoa com deficiência no prazo máximo de 90 (noventa) dias, que terá início após o encerramento da instrução do requerimento administrativo (cláusula segunda, item n. 2.1), o que ocorre a partir da data da realização da perícia médica e avaliação social, quando necessária (cláusula segunda, item n. 2 .2, I). De outro lado, de acordo com os itens das cláusulas terceira e quarta do acordo, convencionou-se que a perícia médica e a avaliação social serão realizadas no prazo máximo de até 45 (quarenta e cinco) dias após o seu agendamento, sendo possível a sua ampliação para 90 (noventa) dias nas unidades classificadas como de difícil provimento, para as quais se exige o deslocamento de servidores de outras unidades para o auxílio no atendimento. 8. Diante desse quadro, em razão da inequívoca e desproporcional mora administrativa, conclui-se que foram violados o princípio constitucional da duração razoável do processo e o direito líquido e certo da parte impetrante de ter o seu requerimento administrativo de benefício assistencial apreciado em tempo razoável, de modo que se afigura cabível a fixação de prazo, pelo Poder Judiciário, para que as autoridades impetradas adotem as providências necessárias à conclusão do processo administrativo, sobretudo se considerado o caráter alimentar do benefício pleiteado . 9. Os honorários advocatícios são incabíveis, nos termos do art. 25 da Lei n. 12 .016/09, fruto do entendimento veiculado no enunciado n. 105 do da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, assim como no enunciado n. 512 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. 10 . Apelação do INSS e remessa oficial desprovidas. (TRF-1 - APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA: 10114830620234013600, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL RUI COSTA GONCALVES, Data de Julgamento: 21/03/2024, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: PJe 21/03/2024 PAG PJe 21/03/2024 PAG Naturalmente, dita perícia deve ser agendada e realizada na Unidade mais próxima da residência declarada do segurado, não sendo razoável (também expressão da legalidade) admitir que seja designada agência que dista quilômetros de seu local de domicílio. Entendimento inverso também implicaria em uma negativa de acesso aos serviços estatais por via oblíqua, o que também não pode ser chancelado judicialmente. No caso concreto, verifico que o(s) documento(s) id 2197727414 demonstra(m) que, embora o requerimento administrativo tenha sido protocolado em 22/05/2022, a perícia foi designada para o dia 29/04/2026, o que viola o direito da impetrante em ter seu pedido apreciado a tempo e modo, encontrando-se desalinhado dos parâmetros estabelecidos na Petição ARESV/PGR Nº 294561/2020, de 16/11/2020, (RE 1171152/SC Tema 1066). É com o que defiro a medida liminar. Decisão ANTE O EXPOSTO, na forma da fundamentação, defiro a medida liminar (L12.016/2009, art. 7º, III) para determinar que as impetradas providenciem a marcação da perícia médica da impetrante no prazo máximo de 45 (quarenta e cinco) dias, contabilizados da data do ingresso do requerimento administrativo, sob pena de multa de R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento. Acaso já ultrapassado esse prazo nesta data, as impetradas deverão providenciar a urgente marcação de perícia, num prazo impostergável de 10 (dez) dias, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais). Deverão, igualmente, comprovar a medida perante este Juízo no prazo máximo de 15 (quinze) dias. Intime-se a impetrante para que, em emenda à inicial, providencie a inclusão do Coordenador Regional da Perícia Médica Federal no Centro-Oeste/Norte, diretamente ligado ao Departamento de Perícia Médica Federal – DPMF, no polo passivo deste mandado de segurança, sob pena de afastamento da multa acaso mantida, exclusivamente, a impetração em face Gerente Executivo da Agência de Previdência Social local. Também deverá juntar aos autos declaração de hipossuficiência, sob pena de indeferimento do pedido de Jusitiça Gratuita. Concedo-lhe, para tanto, um prazo de 10 (dez) dias. Acaso a autoridade já tiver sido incluída no polo passivo, o comando acima deverá ser desconsiderado. Emendada a inicial ou já incluído o Coordenador Regional no polo passivo, notifiquem-se as autoridades impetradas para que, no prazo de 10 (dez), prestem informações (L12.016/2009, art. 7º, I) e cumpram a medida liminar deferida. Dê-se ciência deste writ às pessoas jurídicas interessadas (UNIÃO e INSS) para que, querendo, ingressem no feito (L12.016/2009, art. 7º, III). Após, vista ao MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (L12.016/2009, art. 12) para manifestação, no prazo de 10 (dez) dias, inclusive para avaliar o eventual descumprimento do acordo Petição ARESV/PGR Nº 294561/2020, de 16/11/2020, (RE 1171152/SC Tema 1066) pelas Agências de Previdência Social que atuam em Municípios abrangidos por esta Subseção Judiciária. Finalmente, voltem-me conclusos para sentença. Altamira/PA, na data da assinatura eletrônica. PABLO KIPPER AGUILAR Juiz Federal

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Euzimar Miranda De Moura x Banco Daycoval S.A.

ID: 260605132

Tribunal: TJMG Órgão: Vara Única da Comarca de Paraguaçu Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5000575-85.2024.8.13.0472

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

EUZIMAR MIRANDA DE MOURA

Polo Passivo:

BANCO DAYCOVAL S.A.

Intimação

Advogados:

IVAN DE SOUZA MERCEDO MOREIRA

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CAMILLA LINO MARTINS

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Paraguaçu / Vara Única da Comarca de Paraguaçu Rua Nestor Eustáquio, 237, Centro, Paraguaçu - MG - CEP: 37120-000 P… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Paraguaçu / Vara Única da Comarca de Paraguaçu Rua Nestor Eustáquio, 237, Centro, Paraguaçu - MG - CEP: 37120-000 PROCESSO Nº: 5000575-85.2024.8.13.0472 CLASSE: [CÍVEL] PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO: [Tarifas] AUTOR: EUZIMAR MIRANDA DE MOURA CPF: 706.311.903-68 RÉU: BANCO DAYCOVAL S.A. CPF: 62.232.889/0001-90 SENTENÇA I – RELATÓRIO Cuida-se de ação revisional de contrato, na qual o requerente afirma ter contraído uma alienação fiduciária, para a aquisição de um veículo Volvo, placa JYA5815, na quantia de R$ 43.913,45 (quarenta e três mil novecentos e treze reais e quarenta e cinco centavos) com o banco réu. Todavia, alega a parte autora que, ao longo do negócio jurídico, detectou abusividade em suas cláusulas, especialmente, no que se refere à taxa de juros, à comissão de permanência, ao registro de contrato e à avaliação do bem. Diante disso, requer a procedência do feito para que sejam declaradas nulas as referidas cláusulas, bem como seja condenada a empresa ré a efetuar a repetição em dobro dos montantes indevidamente cobrados. Com a inicial, vieram os documentos de IDs 10198551655 a 10198556950. Pelo despacho de ID 10206157879, foi determinada a comprovação da condição de hipossuficiente pela demandante, o que foi feito, no ID 10224591229. Na decisão de ID 10232763855, foi indeferida a gratuidade da justiça à parte autora, tendo ela comprovado o recolhimento das custas, no ID 10247756147. Em seguida, a inicial foi recebida e designada a audiência de conciliação (ID 10252658483). Na assentada, não foi possível a autocomposição entre as partes (ID 10274235772). Em sua defesa (ID 10286346477), a instituição financeira impugnou os cálculos apresentados pela requerente. Além disso, reafirmou a legalidade dos juros remuneratórios, da capitalização de juros, da tarifa de cadastro, das despesas referentes a serviços prestados por terceiros. Assim, pugna pela improcedência do feito, inclusive, quanto ao pedido de repetição em dobro. Com a contestação, foram juntados os documentos de IDs 10286342626 a 10286347141. Réplica, no ID 10293240234. Intimadas para especificarem as provas que pretendiam produzir, as partes informaram que não tinham interesse na instrução do feito (ID 10294086483 e 10298968236). É o relatório. Decido. II – FUNDAMENTAÇÃO 1. DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE A questão versada nestes autos não está a desafiar a produção de qualquer outra prova, pois se trata de matéria exclusivamente de direito, razão pela qual comporta o julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 355, inciso I, CPC. 2. MÉRITO a) Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor De pronto, é de se dizer que a relação jurídica entabulada entre as partes deve ser solucionada com o que dispõe o Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a relação existente entre os pactuantes se enquadra na legislação consumerista, por ser o autor consumidor final do serviço e do crédito disponibilizado pelo réu, que é o fornecedor daquele serviço. Aliás, esta matéria se encontra pacificada pelo STJ, com a edição da Súmula nº 297, que dispõe: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.”. Porém, o CDC se aplica somente no que couber, haja vista que existem normas específicas que regulam a atividade financeira no país. Assim, ainda que se atente à regra de que deve prevalecer a vontade das partes no âmbito dos contratos, o certo é que tal circunstância não implica a impossibilidade de revisão de suas cláusulas pelo Poder Judiciário, decotando os excessos e adaptando-se aos exatos limites preconizados nas legislações de regência, suprimindo, se for o caso, cláusula abusiva. b) Dos encargos contratuais TARIFAS e SERVIÇOS A questão deve ser apreciada sob o prisma das decisões proferidas pelo STJ, nos julgamentos do REsp 1.251.331/RS e REsp 1.578.553, submetido ao rito previsto no artigo 543-C do CPC, tema 958/STJ. Após o julgamento dos aludidos recursos, eleitos como representativos de controvérsia na forma do art. 543-C do CPC, restou pacificado o entendimento pelo Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, a partir da vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30.4.2008, a cobrança das tarifas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pelo Banco Central do Brasil. Confira o julgado: EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. COMPENSAÇÃO/REPETIÇÃO SIMPLES DO INDÉBITO. RECURSOS REPETITIVOS. TARIFAS BANCÁRIAS. TAC E TEC. EXPRESSA PREVISÃO CONTRATUAL. COBRANÇA. LEGITIMIDADE. PRECEDENTES. FINANCIAMENTO DO IOF. POSSIBILIDADE. (...) 10. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - 1ª Tese: Nos contratos bancários celebrados até 30.4.2008 (fim da vigência da Resolução CMN 2.303/96) era válida a pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, ressalvado o exame de abusividade em cada caso concreto. - 2ª Tese: Com a vigência da Resolução CMN 3.518/2007, em 30.4.2008, a cobrança por serviços bancários prioritários para pessoas físicas ficou limitada às hipóteses taxativamente previstas em norma padronizadora expedida pela autoridade monetária. Desde então, não mais tem respaldo legal a contratação da Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) e da Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador. Permanece válida a Tarifa de Cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. - 3ª Tese: Podem as partes convencionar o pagamento do Imposto sobre Operações Financeiras e de Crédito (IOF) por meio de financiamento acessório ao mútuo principal, sujeitando-o aos mesmos encargos contratuais. 11. Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (REsp. Nº 1.251.331 - RS - Rel. Min. MARIA ISABEL GALLOTTI, Dje. 24/10/2013) 1) Da taxa de registro e de avaliação do bem Conforme se constata, no julgado do REsp 1.578.553, restou firmado o entendimento de que as despesas com serviços de terceiros, tarifas de registro de contrato e avaliação do bem são válidas, contudo, tornam-se abusivas as cobranças quando o serviço não tenha sido efetivamente prestado. Vejamos: RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 958/STJ. DIREITO BANCÁRIO. COBRANÇA POR SERVIÇOS DE TERCEIROS, REGISTRO DO CONTRATO E AVALIAÇÃO DO BEM. PREVALÊNCIA DAS NORMAS DO DIREITO DO CONSUMIDOR SOBRE A REGULAÇÃO BANCÁRIA. EXISTÊNCIA DE NORMA REGULAMENTAR VEDANDO A COBRANÇA A TÍTULO DE COMISSÃO DO CORRESPONDENTE BANCÁRIO. DISTINÇÃO ENTRE O CORRESPONDENTE E O TERCEIRO. DESCABIMENTO DA COBRANÇA POR SERVIÇOS NÃO EFETIVAMENTE PRESTADOS. POSSIBILIDADE DE CONTROLE DA ABUSIVIDADE DE TARIFAS E DESPESAS EM CADA CASO CONCRETO. 1. DELIMITAÇÃO DA CONTROVÉRSIA: Contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente, seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das Documento: 1777473 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 06/12/2018 Página 1 de 5 Superior Tribunal de Justiça relações de consumo. 2. TESES FIXADAS PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 2.1. Abusividade da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser efetivamente prestado; 2.2. Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva; 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto. 3. CASO CONCRETO. 3.1. Aplicação da tese 2.2, declarando-se abusiva, por onerosidade excessiva, a cláusula relativa aos serviços de terceiros ("serviços prestados pela revenda"). 3.2. Aplicação da tese 2.3, mantendo-se hígidas a despesa de registro do contrato e a tarifa de avaliação do bem dado em garantia. 4. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. Assim sendo, resta analisar se, no caso em tela, houve a cobrança abusiva das tarifas ou, efetivamente, restou demonstrada a prestação do serviço. Compulsando detidamente a documentação acostada nos autos, especificamente a integralidade do instrumento particular firmado entre as partes (ID 10198558654), verifica-se que está prevista, no contrato, a tarifa de registro do contrato (item III, alínea “i”), no valor de R$ 223,01 (duzentos e vinte e três reais e um centavo). Contudo, ainda que a demandada afirme ter havido o registro do contrato, juntando o print da tela sistêmica de ID 10286347140, ele nada comprova a respeito de tal despesa. Outrossim, no que se refere à taxa de avaliação do bem, em que pese ela constar do item 3, alínea “m”, do mesmo instrumento contratual, ela não foi efetivamente cobrada, razão pela qual não se pode constatar a ilegalidade da conduta da instituição financeira, nesse aspecto. Dessa maneira, conclui-se que apenas a taxa de registro não tem cabimento, pois ausente a prova de que ele teria sido efetivado, nos moldes do art. 373, CPC, tornando-se abusiva a sua exigência. 2) Dos Juros Remuneratórios É cediço que os juros remuneratórios ou também chamados compensatórios constituem o fruto do capital emprestado (art. 591, CC), podendo ser cobrado durante a vigência do contrato. Sobre o limite da taxa dos juros compensatórios nos contratos celebrados por instituição financeira, o STJ não vacila, encontrando-se pacífico o seu entendimento, conforme adiante: CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 296-STJ. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. INACUMULABILIDADE COM QUAISQUER OUTROS ENCARGOS REMUNERATÓRIOS OU MORATÓRIOS. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. ANUALIDADE. ART. 591 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. INAPLICABILIDADE. ART. 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA N. 1.963-17/2000 (2.170-36/2001). LEI ESPECIAL. PREPONDERÂNCIA. (...) II. Não se aplica a limitação de juros remuneratórios de 12% a.a., prevista na Lei de Usura, aos contratos bancários não normatizados em leis especiais, sequer considerada excessivamente onerosa a taxa média do mercado. Precedente uniformizador da 2ª Seção do STJ. (REsp 906.054/RS, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 07/02/2008, DJe 10/03/2008) No tocante aos juros remuneratórios, não incide a limitação a 12% ao ano, prevista no Decreto nº 22.626/33, salvo hipóteses legais específicas, visto que as instituições financeiras, integrantes do Sistema Financeiro Nacional, são regidas pela Lei nº 4.595/64. Tal entendimento, ressalte-se, não foi alterado após a vigência do Código de Defesa do Consumidor, cujas normas também se aplicam aos contratos firmados por instituições bancárias. Visando à harmonização dos referidos diplomas legais, esta Corte Superior consagrou a manutenção dos juros no percentual avençado pelas partes, desde que não reste sobejamente demonstrada a exorbitância do encargo." (AgRg no REsp 1065245/MG, Rel. Ministro CARLOS FERNANDO MATHIAS (juiz federal convocado do TRF 1ª Região), QUARTA TURMA, julgado em 14/10/2008, DJe 28/10/2008). Destarte, é permitido às instituições financeiras, aplicar taxas de juros remuneratórios superiores às limitações fixadas pelo Decreto 22.626/33 (12% ao ano), em razão da edição da Lei 4.595/64, desde que não reste claramente demonstrada a exorbitância do encargo. Nesse sentido, a Súmula 382 do STJ: "A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.". No que tange à aplicação do art. 192, § 3º da Constituição da República (já revogado), a Súmula Vinculante nº 07 do STF assim dispõe: "A norma do § 3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional nº 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar". Como a Lei Complementar prevista na referida Súmula não foi editada, não pode ser aplicado o art. 192, § 3º da Constituição da República (revogado) para limitar a taxa dos juros em 12% ao ano. Com efeito, a limitação da taxa de juros em face da suposta abusividade somente teria razão diante da comprovação de que estaria discrepante em relação à taxa de mercado. Assim, somente na hipótese de os juros cobrados se mostrarem extremamente excessivos, caberia a intervenção do Poder Judiciário, a fim de reduzi-los ao patamar adequado. Todavia, a Lei 10.931/2004 não estipula o limite dos juros em 12% ao ano como preceitua a Cédula de Crédito Rural, podendo os mesmos ser livremente pactuados. Portanto, em sede de contratos de cédula de crédito bancário, os juros devidos são os avençados pelas partes, salvo quando provada cabalmente a existência de distorção e onerosidade excessiva. Para a aferição da abusividade, basta verificar a referência ditada pelo próprio mercado financeiro, uma vez que o Banco Central do Brasil passou, a partir de 1999, a divulgar as taxas médias para os juros praticados pelas instituições financeiras, nas operações de crédito, conforme se vê do Ofício Circular nº 2957, de 30/12/1999. Dessa forma, consultando a Internet, que é de livre acesso a qualquer cidadão, se vê em www.bcb.gov.br, com referência ao mês de janeiro/2022, que a taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres – Pessoas Físicas – Aquisição de Veículos - Cod. 25471 e Cod.20749 - relativa ao crédito em questão, atingiu 1,70% a.m e 22,40% a.a. Assim sendo, como se constata no contrato de ID 10198558654, item 3, alínea “d”, que se pretende revisar, a taxa de juros aplicada foi de 2,85% a.m. e 40,10% a.a., ou seja, tem-se que na data da celebração do contrato objeto da presente ação, ou seja, em janeiro/2022, a taxa de juros cobrada pela parte ré estava em desacordo com a média praticada pelo mercado financeiro, pelo que, neste caso, deve ser considerada abusiva a taxa de juros aplicada quando da celebração do contrato objeto da presente. Importante frisar, que o Egrégio Superior Tribunal de Justiça se posicionou, inclusive em sede de Recurso Repetitivo, no seguinte sentido: “BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONTRATO QUE NÃO PREVÊ O PERCENTUAL DE JUROS REMUNERATÓRIOS A SER OBSERVADO. I – JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTGERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO. JUROS REMUNERATÓRIOS. 1- Nos contratos de mútuo em que a disponibilização do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios deve ser consignado no respectivo instrumento. Ausente a fixação da taxa no contrato, o juiz deve limitar os juros à média de mercado nas operações da espécie, divulgada pelo Bacen, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente. 2 – Em qualquer hipótese, é possível a correção para a taxa média se for verificada abusividade nos juros remuneratórios praticados. II – JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO - Consignada, no acórdão recorrido, a abusividade na cobrança da taxa de juros, impõe-se a adoção da taxa médica de mercado, nos termos do entendimento consolidado neste julgamento”. (Resp 1112879/PR – RECURSO ESPECIAL 2009/0015381-8, Rel. Ministra NACY ANDRIGHI, Segunda Seção, j. 12/05/2010, DJe 19/05/2010 ) Dessa maneira, tem-se que, na espécie dos autos, é de se reconhecer a ocorrência de abusividade da taxa de juros contratada, haja vista que a mesma se situa em 2,85% a.m. e 40,10% a.a., ou seja, acima da média vigente no mercado financeiro, de modo que assiste parcial razão à parte autora, devendo, na fase de cumprimento de sentença, ser decotado o excesso dos juros aplicados, tendo como base os limites de1,70% a.m e 22,40% a.a. 3) Da Comissão de Permanência No tocante à comissão de permanência verifica-se que esta não pode vir cumulada com juros de mora, multa e correção monetária. Acerca da impossibilidade de cumulação das referidas verbas, o Superior Tribunal de Justiça assim vem, reiteradamente, decidindo: É admitida a cobrança da comissão de permanência durante o período de inadimplemento contratual, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo BACEN, limitada à taxa do contrato, não podendo ser cumulada com a correção monetária, com os juros remuneratórios e moratórios, nem com a multa contratual. (AgRg no REsp 1004127/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 18/09/2008, DJe 13/10/2008). Vencido o prazo para pagamento da dívida, admite-se a cobrança de comissão de permanência. A taxa, porém, será a média do mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, desde que limitada ao percentual do contrato, não se permitindo cumulação com juros remuneratórios ou moratórios, correção monetária ou multa contratual. (AgRg no Ag 877.081/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/09/2008, DJe 13/10/2008). Diante desse entendimento jurisprudencial, é inadmissível a cobrança cumulada da comissão de permanência. Na situação em testilha, para o caso de inadimplência, o contrato previu a cobrança cumulada de juros remuneratórios capitalizados diariamente, já inclusos no valor das parcelas a serem adimplidas, conforme item 3. Juros, ressarcimentos e pagamentos de despesas, tarifas de serviços financeiros e impostos. Portanto, não havendo cobrança de comissão de permanência, não há nenhuma irregularidade na referida cláusula. c) Da Repetição de Indébito Além da revisão contratual, a parte autora formulou o pedido de repetição em dobro dos valores cobrados indevidamente, com fundamento na legislação consumerista. Sobre essa situação, necessário se faz elucidar o cabimento do pleito de repetição do indébito em dobro, no Código de Defesa do Consumidor: Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. Todavia, na hipótese em testilha, para a específica situação de taxas e juros indevidamente cobrados do contraente, a jurisprudência firmou o seguinte entendimento: "Quanto à devolução em dobro dos valores pagos a maior, a jurisprudência deste Tribunal é assente no sentido de que tal determinação só é cabível em caso de demonstrada má-fé, o que não foi comprovado na hipótese dos autos."(STJ, AREsp 439770 Relator(a) Ministro SIDNEI BENETI Data da Publicação 07/02/2014) "AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS. CONTRATOS NÃO JUNTADOS AOS AUTOS. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO. JUROS MORATÓRIOS. SÚMULA N° 379/STJ. REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N° 322/STJ. (...) 3. Acerca da repetição do indébito, firmou-se que é cabível, de forma simples, não em dobro, quando verificada a cobrança de encargos ilegais, tendo em vista o princípio que veda o enriquecimento sem causa do credor, independentemente da comprovação do equívoco no pagamento, pois diante da complexidade do contrato em discussão não se pode considerar que o devedor pretendia quitar voluntariamente débito constituído em desacordo com a legislação aplicável à espécie. A questão está pacificada por intermédio da Súmula n° 322 do STJ. 4. Agravo regimental a que se nega provimento."(STJ, AgRg no AREsp 394042 / RS, Relatora Min. MARIA ISABEL GALLOTTI, DJe 04/02/2014) "AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA DO MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA NEGANDO PROVIMENTO AO RECURSO. INSURGÊNCIA DO AUTOR. (...) 3. Nos termos da consolidada jurisprudência desta Corte, a devolução em dobro do valor indevidamente recebido depende da constatação da má-fé, dolo ou malícia por parte do credor, o que não ocorreu no caso dos autos. (STJ, AgRg nos EDcl no Ag 1227068 / PR, Relator Ministro MARCO BUZZI, Órgão Julgador T4 - QUARTA TURMA, DJe 04/02/2014) Portanto, não tendo a parte autora se desincumbido de comprovar que houve má-fé da instituição financeira demandada, ao cobrar os valores acima destacados, nos moldes do art. 373, inciso I, CPC, não há que se falar em repetição em dobro dos valores. Logo, o requerente fará jus apenas à restituição simples dos importes que lhe foram exigidos de forma ilícita, com embasamento na vedação ao enriquecimento ilícito, vedado pelo Código Civil, nos arts. 884 a 886. III – DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão da parte autora, nos termos do art. 487, inciso I, CPC, para: a) declarar nulo o item III, alínea “i”, afastando a cláusula abusiva de tarifa de registro do contrato, no valor de R$ 223,01 (duzentos e vinte e três reais e um centavo).; b) declarar nulo o item 3, alínea “d” do contrato que estabelece a taxa de juros superior à taxa média de mercado, reduzindo-a para o importe de 1,70% a.m e 22,40% a.a; b) condenar a demandada na restituição simples dos montantes indevidamente cobrados, referentes à tarifa de registro e à diferença das taxas de juros, a serem apurados em fase de liquidação de sentença, os quais deverão ser corrigidos monetariamente, de acordo com os índices da CGJ/TJMG, a contar do ajuizamento da ação e acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação. Quanto aos demais pedidos formulados pelo requerente, JULGO-OS IMPROCEDENTES. Ante a sucumbência recíproca, condeno as partes no pagamento de metade das custas e despesas processuais, cada uma, com fundamento no art. 82, §2º., CPC. De outro lado, condeno a autora no pagamento de honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor dos pedidos não acolhidos, nos termos do art. 85, §2º do CPC. Noutro giro, condeno a ré no pagamento de honorários advocatícios, os quais serão devidamente apurados em fase de liquidação, consoante o disposto no art. 85, §4º., inciso II, CPC. Transitada em julgado, arquive-se. P. R. I. C. Paraguaçu, 24 de abril de 2025. Paula Ozi Silva Rosalin de Oliveira Juíza de Direito

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