Processo nº 0802195-25.2023.8.14.0107
ID: 325032140
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Cível da Comarca de Dom Eliseu
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0802195-25.2023.8.14.0107
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANDREZA REGO BARBOSA RICHART
OAB/PA XXXXXX
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Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado do Pará Vara Cível e Empresarial da Comarca de Dom Eliseu 0802195-25.2023.8.14.0107 [Indenização por Dano Material] AUTOR: FLAVIO SOUSA DA SILVA Nome: F…
Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado do Pará Vara Cível e Empresarial da Comarca de Dom Eliseu 0802195-25.2023.8.14.0107 [Indenização por Dano Material] AUTOR: FLAVIO SOUSA DA SILVA Nome: FLAVIO SOUSA DA SILVA Endereço: RUA ANTONIO JOSE DE SOUZA SANTOS, 16, LT 33, ELDORADO, DOM ELISEU - PA - CEP: 68633-000 REQUERIDO: NU FINANCEIRA S.A. - SOCIEDADE DE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO Nome: NU FINANCEIRA S.A. - SOCIEDADE DE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO Endereço: RUA CAPOTE VALENTE, 39, PINHEIROS, SãO PAULO - SP - CEP: 05409-000 SENTENÇA 1. RELATÓRIO Trata-se de “ação de reparação por danos materiais e morais (devolução de valores) por fraude bancária”, ajuizada por FLÁVIO SOUSA DA SILVA em face de NU FINANCEIRA S.A. – SOCIEDADE DE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, partes qualificadas nos autos. Em síntese, a parte autora alega que, entre os dias 13/09/2023 e 15/09/2023, teve sua conta e aplicativo Nubank hackeados, ocasião na qual foram realizadas diversas operações fraudulentas, como transferências PIX, pagamentos de boletos, compras com cartão de crédito e aplicações, totalizando o valor de R$ 50.329,91, dos quais R$ 44.828,25 foram debitados diretamente de sua conta corrente. Narra, ainda, que, ao acessar o aplicativo bancário, identificou as transações indevidas e, de imediato, entrou em contato com a instituição requerida, solicitando o bloqueio do cartão de crédito e o estorno dos valores, sem sucesso. Informa ainda que compareceu à delegacia para lavratura de boletim de ocorrência e protocolou contestação formal junto ao banco. Acrescenta que, na fatura do cartão de crédito de outubro/2023, identificou novas cobranças não reconhecidas, no total de R$ 5.501,66, alegando que as movimentações destoam de seu perfil financeiro, conforme demonstrado nos extratos bancários dos meses anteriores. Sustenta a existência de falha na prestação do serviço bancário, ante a ausência de mecanismos de segurança para impedir as movimentações atípicas. Invoca a responsabilidade objetiva da instituição financeira, nos termos da Súmula 479 do STJ, e requer: (a) a declaração de inexigibilidade de débitos; (b) a devolução dos valores debitados indevidamente e (c) indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00. Na decisão ID 103948356, o juízo concedeu prazo à parte autora para que pagasse as custas iniciais ou comprovasse os requisitos para concessão da gratuidade de justiça, sob pena de cancelamento da distribuição. Em resposta ID 104780876, a parte autora reitera o pedido de justiça gratuita, com base na documentação complementar apresentada. Em nova decisão (ID 105797100), o juízo concedeu os benefícios da justiça gratuita, determinou a inversão do ônus da prova, deferiu a tutela de urgência, designou audiência de conciliação e determinou a citação da ré. Citada, a instituição bancária ofereceu contestação ID 109429953, sustentando, em síntese: (a) ilegitimidade passiva, sob o argumento de que os atos questionados decorreram de conduta exclusiva do autor, que teria efetuado transferências via PIX mediante inserção da própria senha de 4 dígitos, sem verificar a identidade do interlocutor; (b) inexistência de falha na prestação do serviço, pois as transações teriam sido realizadas com dispositivo autorizado e senha válida, não havendo violação dos sistemas de segurança do banco; e (c) culpa exclusiva de terceiro ou da própria vítima, razão pela qual requer a improcedência da ação. Em réplica ID 109505626, a parte autora argumenta que a contestação é genérica e não impugna especificamente os fatos narrados na inicial, configurando violação ao art. 341 do CPC. Reitera que sua conta foi hackeada e que as transações destoam de seu padrão de consumo, não se tratando apenas de transferências via PIX. Aponta contradições na argumentação da requerida e reforça a responsabilidade objetiva da instituição financeira, citando precedentes do STJ e dispositivos da LGPD. Requer a aplicação dos efeitos da revelia quanto aos fatos não impugnados. Na audiência de conciliação designada, realizada em 22/02/2024, registrou-se a ausência do autor, mas a presença de sua advogada. Compareceu a preposta da parte requerida, acompanhada de sua advogada. Não houve proposta de acordo. O juízo abriu prazo de 15 (quinze) dias para apresentação de réplica pela parte autora, com posterior conclusão dos autos (ID 109443847). Certificou-se a ausência de manifestação da parte autora (ID 119454083) que, em seguida, impugnou a certidão apresentada, alegando que já havia apresentado réplica anteriormente (ID 122684539). Os autos vieram conclusos. Sendo o necessário relato, fundamento e decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO De proêmio, verifico que assiste razão à parte autora em sua petição ID 122684539, pois ela já havia juntado sua réplica à contestação antes mesmo da audiência designada, portanto, torno sem efeito a certidão ID 119454083, para considerar a tempestividade da peça processual. Tendo em vista que o conjunto probatório colacionado aos autos é suficiente para a formação do convencimento do Juízo (art. 370, CPC), sendo, portanto, desnecessária a produção de outras provas, o caso comporta o julgamento antecipado da lide na forma do art. 355, I, do CPC. Impende esclarecer que a sua realização não configura faculdade, e sim dever constitucional do Juízo, em atenção ao princípio da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF). A preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela parte requerida confunde-se com o mérito da demanda, porquanto exige a análise sobre a regularidade ou não das transações bancárias impugnadas, bem como sobre eventual falha na prestação do serviço por parte da instituição financeira. Tais questões estão diretamente ligadas à existência ou não do dever de indenizar, não sendo possível, nesta fase processual, concluir pela ausência de pertinência subjetiva da parte ré. Assim, por demandar apreciação probatória e exame de fundo quanto à alegada culpa exclusiva do autor ou de terceiro, a preliminar deve ser rejeitada, com a consequente apreciação do mérito da controvérsia. Não havendo outras preliminares, passo ao mérito. A relação estabelecida entre as partes enquadra-se no conceito de relação de consumo, em que se busca a responsabilidade civil do fornecedor pelo defeito no fornecimento de serviço. Em razão disto, deve ser analisada sob a égide da disciplina consumerista, consoante os arts. 2º e 3º, § 2º, da Lei 8.078/1990, bem como, da Súmula 297 do STJ, que assim estabelecem: CDC Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. Súmula 297/STJ – O código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. Estabelecida relação de consumo, eventuais prejuízos decorrentes do risco do empreendimento explorado devem ser suportados pelo empreendedor. É o denominado risco empresarial, que, na ótica consumerista, deve ser imposto àquele que se beneficia de tal ramo de atividade, daí a responsabilidade civil objetiva. Nesse sentido, é o que preceitua o art. 14 do Código de Defesa do Consumidor e a orientação fixada pela Súmula 479/STJ, in verbis: CDC. Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Súmula 479/STJ - As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias. ___________________________________________________ RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS. DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FORTUITO INTERNO. RISCO DO EMPREENDIMENTO. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno. 2. Recurso especial provido (REsp. 1.199.782/PR, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, STJ, 2a Seção, DJe 12/09/2011). Assim, em caso de dano, o fornecedor apenas elide sua responsabilidade se demonstrar culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros, a fim de afastar a indenização pleiteada pela falha no serviço. Ademais, não se questiona que nas relações de consumo, a distribuição do ônus da prova não está ligada ao princípio clássico da correlação do que se alega, segundo o qual ao autor incumbe a prova quanto ao fato constitutivo do seu direito e ao réu quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Nos processos envolvendo lide de consumo, vigorando o princípio da inversão do ônus da prova (artigo 6º, VIII, do CDC), o que deve prevalecer na seara da distribuição do ônus da prova é o princípio da racionalidade ou razoabilidade. Nesse cenário, exigir do consumidor prova de que não contratou com a requerida significa, em regra, impor ônus, na prática, intransponível. Esse ônus pertence ao fornecedor, porque mais habilitado para fazê-lo. Com efeito, é razoável que seja do fornecedor o ônus de provar a formalização da avença, acostando aos autos cópia do contrato ou prova idônea da manifestação válida de vontade da parte contratante. Vale ressaltar, contudo, que tal situação não afasta o ônus do consumidor de apresentar as provas mínimas de suas alegações, em especial quanto à apresentação de prova documental cuja produção esteja a seu alcance, em atenção inclusive ao dever de colaboração com a Justiça (art. 6º, CPC). Compulsando os autos, verifico que a controvérsia se cinge em analisar se houve falha na prestação do serviço por parte da instituição financeira requerida e, em caso afirmativo, o dever de indenizar os danos materiais e morais suportados pelo(a) autor(a). O(a) requerente logrou êxito em comprovar os fatos constitutivos de seu direito, conforme o art. 373, I, do CPC. Os extratos bancários (ID 103941686 a ID 103943765) demonstram a efetiva ocorrência das transações impugnadas, em valores e frequência que, de fato, destoam do padrão de consumo do(a) autor(a). Ademais, a imediata comunicação à autoridade policial (Boletim de Ocorrência ID 103941678) e ao próprio banco (Protocolos ID 103941680) confere alta verossimilhança à sua narrativa e demonstra sua boa-fé. Destaca-se que o(a) autor(a) afirmar desconhecer as transações impugnadas, não tendo as autorizado, e que foi possível vítima de hacker/fraude. Por outro lado, a instituição bancária requerida, em sua contestação, se limitou a tecer alegações genéricas de culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, sem, contudo, produzir qualquer prova capaz de corroborar sua tese ou de afastar a sua responsabilidade, não tendo se desincumbido de seu ônus probatório (art. 373, II, do CPC). Caberia à ré, detentora de toda a expertise e tecnologia, trazer aos autos elementos concretos que comprovassem a regularidade das transações, como registros de logs de acesso, endereços de IP, ou qualquer outra evidência de que as operações foram validadas de forma segura e inequívoca pelo autor. A simples alegação de que a senha pessoal foi utilizada é insuficiente, pois a própria segurança dessa credencial faz parte do serviço oferecido pelo banco. A jurisprudência pátria é uníssona em reconhecer a falha do banco em casos análogos: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO DO RÉU IMPROVIDA. CONSUMIDOR. FRAUDE. INVASÃO DE APLICATIVO DO BANCO RÉU. FALHA NO SISTEMA DE SEGURANÇA. INEXISTÊNCIA DE ATO CULPOSO OU DOLOSO PRATICADO PELO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DE FORNECIMENTO DE SENHA. DANOS MATERIAIS E DANOS MORAIS CONFIGURADOS. Ação de indenização. Sentença de procedência. Recurso da instituição financeira. Primeiro, reconhece-se a existência de defeito do serviço bancário. Consumidor vítima de fraude perpetrada por terceiros, que invadiram aplicativo instalado em seu aparelho celular. Operações de transferências via PIX e TED, e empréstimos no valor total de R$ 25.000,00. Falha de segurança do serviço bancário, ao permitir acesso dos criminosos, via aplicativo, à conta corrente do autor e sua movimentação. Inexistência de qualquer ato, culposo ou doloso, por parte do consumidor. Autor que entrou em contato com a instituição financeira, imediatamente. Todavia, o banco réu não agiu com eficiência e presteza. Consumidor compelido a repetir as ligações ao setor de fraudes por diversas vezes, sendo atendido por cinco atendentes, até conseguir falar com o setor responsável. Transferência via PIX que trouxe para as instituições financeiras obrigações maiores e mais relevantes, no campo da segurança. Transações que se mostraram manifestamente suspeitas, uma vez que feitas no mesmo dia, em sequência, e em valores altos. Cabia ao setor de fraudes impedi-las. Violação do regulamento do PIX (art. 39, 88 e 89). Incidência do art. 14 do CDC com aplicação da súmula 479 do STJ. Segundo, mantém-se a reparação dos danos materiais. Reconhecida a falha e responsabilidade do banco réu, devido o retorno das partes à situação anterior. Ressarcimento dos valores decorrentes das transferências não reconhecidas e dos empréstimos. E terceiro, reconhece-se a existência de danos morais passíveis de indenização. A consumidora experimentou dissabores, transtornos e aborrecimentos advindos não somente da falta de segurança do sistema bancário, mas também do atendimento inadequado recebido para sua reclamação e do fato de ter sido privada indevidamente dos valores. Consumidor que teve seu nome inserido no banco de dados de proteção ao crédito. Indenização fixada em R$ 10 .000,00, dentro dos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade admitidos pela Turma Julgadora. Ação julgada procedente. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível: 1004356-81.2023.8.26 .0077 Birigüi, Relator.: Alexandre David Malfatti, Data de Julgamento: 09/04/2024, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 09/04/2024) Além disso, o volume e a natureza das transações não condizem com o comportamento usual do(a) cliente, o que deveria imediatamente ter acionado os mecanismos de segurança e alerta do banco requerido. Conforme a jurisprudência consolidada, é dever das instituições financeiras adotarem medidas eficazes de segurança para evitar fraude e proteger os interesses de seus clientes, conforme preceituado no Código de Defesa do Consumidor e na Resolução n.º 4.658/2018 do Banco Central do Brasil, que dispõe sobre a política de segurança cibernética das instituições financeiras. Nesse sentido: CONSUMIDOR. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS. DEVER DE SEGURANÇA. FRAUDE PERPETRADA POR TERCEIRO. CONTRATAÇÃO DE MÚTUO. MOVIMENTAÇÕES ATÍPICAS E ALHEIAS AO PADRÃO DE CONSUMO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Ação declaratória de inexistência de débitos, ajuizada em 14/8/2020, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 21/6/2022 e concluso ao gabinete em 17/2/2023. 2. O propósito recursal consiste em decidir (I) se a instituição financeira responde objetivamente por falha na prestação de serviços bancários, consistente na contratação de empréstimo realizada por estelionatário; e (II) se possui o dever de identificar e impedir movimentações financeiras que destoam do perfil do consumidor. 3. O dever de segurança é noção que abrange tanto a integridade psicofísica do consumidor, quanto sua integridade patrimonial, sendo dever da instituição financeira verificar a regularidade e a idoneidade das transações realizadas pelos consumidores, desenvolvendo mecanismos capazes de dificultar fraudes perpetradas por terceiros, independentemente de qualquer ato dos consumidores. 4. A instituição financeira, ao possibilitar a contratação de serviços de maneira facilitada, por intermédio de redes sociais e aplicativos, tem o dever de desenvolver mecanismos de segurança que identifiquem e obstem movimentações que destoam do perfil do consumidor, notadamente em relação a valores, frequência e objeto. 5. Como consequência, a ausência de procedimentos de verificação e aprovação para transações atípicas e que aparentam ilegalidade corresponde a defeito na prestação de serviço, capaz de gerar a responsabilidade objetiva por parte da instituição financeira. 6. Entendimento em conformidade com Tema Repetitivo 466/STJ e Súmula 479/STJ: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". 7. Idêntica lógica se aplica à hipótese em que o falsário, passando-se por funcionário da instituição financeira e após ter instruído o consumidor a aumentar o limite de suas transações, contrata mútuo com o banco e, na mesma data, vale-se do alto montante contratado e dos demais valores em conta corrente para quitar obrigações relacionadas, majoritariamente, a débitos fiscais de ente federativo diverso daquele em que domiciliado o consumidor. 8. Na hipótese, inclusive, verifica-se que o consumidor é pessoa idosa (75 anos - imigrante digital), razão pela qual a imputação de responsabilidade há de ser feita sob as luzes do Estatuto do Idoso e da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos, considerando a sua peculiar situação de consumidor hipervulnerável. 9. Recurso especial conhecido e provido para declarar a inexigibilidade das transações bancárias não reconhecidas pelos consumidores e condenar o recorrido a restituir o montante previamente existente em conta bancária, devidamente atualizado. (STJ - REsp: 2052228 DF 2022/0366485-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 12/09/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/09/2023) Mesmo que esteja configurada a fraude perpetrada por terceiros (ressaltando que não há provas de que a parte autora tenha faltado com seu dever de cuidado e guarda de seus dados pessoais), restou nítido nos autos que as movimentações financeiras realizadas na conta bancária da parte autora destoam de seu perfil usual, o que evidencia a falha no dever de segurança do banco requerido, portanto, o dever de indenizar. Veja-se que, em apenas três dias (13 a 15 de setembro de 2023), movimentou-se mais de R$ 44.000,00 da conta bancária da parte autora, bem como, realizou-se mais de R$ 5.000,00 em compras / serviços com o cartão de crédito. Ora, observando os extratos bancários do autor, é possível identificar que o padrão de movimentações financeiras ao longo dos meses de maio de 2023 até o início de setembro de 2023, revelam um perfil de transações de valores moderados, com predominância de transferências pix e pagamentos de boletos em valores geralmente inferiores à R$ 1.500,00, ainda que eventualmente tenha realizados movimentações pontuais de maior vulto, como aplicações e resgates de RDB. Contudo, só no dia 13 de setembro, realizaram-se 02 transferências pix, totalizando R$ 8.453,78; 04 pagamentos de boleto para o mesmo destinatário (“mercadopago.com”), no total de R$ 28.749,49 e uma aplicação RDB, no valor de R$ 7.624,98, conforme os extratos juntados (ID 103943740, p.4), resultando em uma movimentação vultosa no montante de R$ 44.828,25. Tal volume de transações concentradas em um único dia, sem qualquer histórico anterior de movimentações semelhantes em frequência ou valor, configura uma quebra abrupta no padrão comportamental do correntista. Todas essas informações deveriam, no mínimo, ter chamado a atenção do banco requerido, no sentido de atuar em prol da segurança que sua atividade requer, de modo que possui responsabilidade em relação aos danos causados à Requerente. Em caso análogo: EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER E RESSARCIMENTO DE VALORES E DANOS MATERIAS E MORAIS COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. CONSUMIDOR. FORNECIMENTO DE DADOS BANCÁRIOS ATRAVÉS DA INTERNET. REALIZAÇÃO DE MOVIMENTAÇÕES FINANCEIRAS ATÍPICAS. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DEVER DE SEGURANÇA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. NÃO EVIDENCIADA. DEVER INDENIZAR. PRESENTE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPA – Apelação cível n.º 0830655-90.2021.8.14.0301. Relator(a) Des(a). CONSTANTINO AUGUSTO GUERREIRO – 1ª Turma de Direito Privado, julgado em 15/03/2023). Destarte, a ausência de mecanismos de segurança capazes de detectar e barrar movimentações financeiras atípicas e fraudulentas configura clara falha na prestação do serviço, ensejando o dever de reparar os danos causados. Em relação aos danos materiais: O dano material, decorrente da falha na segurança do serviço prestado pela ré, restou devidamente comprovado nos autos. O prejuízo total gerado pela fraude alcançou o montante de R$ 50.329,91, sendo composto por duas naturezas distintas de dano, que exigem reparações específicas. A primeira parte do prejuízo, no valor de R$ 44.828,25, refere-se a valores efetivamente subtraídos da conta corrente do autor por meio de transferências e pagamentos fraudulentos. Trata-se de um dano material clássico, uma perda patrimonial direta e imediata. Portanto, a reparação deve se dar pela restituição integral deste valor. A segunda parte, no montante de R$ 5.501,66, corresponde a compras fraudulentas lançadas na fatura do cartão de crédito do autor. Neste ponto, é crucial observar que o dano se configura como a criação de um débito inexigível, e não como uma perda patrimonial já consolidada, uma vez que não há nos autos prova de que o autor tenha efetuado o pagamento da referida fatura. Dessa forma, determinar a “restituição” deste valor seria inadequado e poderia gerar enriquecimento sem causa ao autor. A medida judicial correta para reparar este dano específico é a declaração de inexigibilidade do débito, o que efetivamente cancela a cobrança indevida e restaura o estado anterior à fraude. Assim, a reparação material total se dará pela combinação da restituição do valor debitado da conta com a anulação da cobrança no cartão de crédito. Em relação ao pedido de indenização por danos morais: Consigno que esse é um tema que por muito tempo passou ao largo do poder judiciário. É que, segundo orientação da antiga doutrina, os direitos da personalidade não eram suscetíveis de reparação patrimonial. Ocorre que após a CF/88 a dignidade da pessoa humana e os direitos da personalidade passaram a receber proteção jurídica expressa, prevendo o direito à indenização nos arts. 1º, III, e 5º, V e X. Reforçando o texto constitucional, o CDC estabeleceu no art. 6º, VI, que são direitos básicos do consumidor a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais bem como o acesso aos órgãos judiciários com vistas à prevenção ou reparação de danos morais causados (art. 6º, VII). No caso posto, o dever de o(a) Demandado(a) indenizar a parte autora repousa na prática de ato ilícito (art. 327 c/c art. 186 do CC), consistente em permitir que terceiros golpistas e estelionatários retirassem vultosos valores de sua conta bancária, bem como, realizassem compras/serviços com seu cartão de crédito, passando a arcar com o ônus de pagar as faturas. Caberia ao banco requerido se resguardar acerca das operações financeiras realizadas junto a esta. Não se trata de mero aborrecimento. É o caso, então, de acolher o pedido de indenização por danos morais, contudo, em valor bem menor que o pleiteado na exordial, tendo em vista os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, bem como, os objetivos nucleares da reparação moral – desestimular o comportamento ilícito e assegurar uma contrapartida pelas ofensas sofridas – pelo que entendo razoável o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), em atenção, inclusive, aos valores comumente adotados por este E.TJPA. 3. DISPOSITIVO Por essas razões, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para o fim de: a) CONFIRMAR a tutela de urgência anteriormente deferida; b) DECLARAR a inexigibilidade dos débitos fraudulentos lançados na fatura do cartão de crédito do autor, no montante de R$ 5.501,66 (cinco mil, quinhentos e um reais e sessenta e seis centavos); c) CONDENAR a NU FINANCEIRA S.A. – SOCIEDADE DE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO a restituir à parte autora o valor de R$ 44.828,25 (quarenta e quatro mil, oitocentos e vinte e oito reais e vinte e cinco centavos), a título de danos materiais, acrescido de correção monetária pelo INPC até 29/08/2024 e, a partir de 30/08/2024, pelo IPCA (entrada em vigor da Lei n.º 14.905/2024), com fulcro no art. 389, §ú, do CC, cujo termo inicial fixa-se a partir da data de cada transação – efetivo prejuízo (Súmula 43/STJ), e juros moratórios de 1% ao mês até 29/08/2024 e, a partir de 30/08/2024 (entrada em vigor da Lei n.º 14.905/2024), juros moratórios pela taxa SELIC, subtraída a correção monetária, conforme art. 406, §1º, do CC, cujo termo inicial fixa-se a partir da data de citação – por se tratar de responsabilidade contratual (art. 405, do CC, c/c art. 240, do CPC), devendo a metodologia de cálculo observar o disposto na Resolução CMN n.º 5.171/2024 (art. 406, §2º e §3º, do CC), cujo valor deverá ser apurado mediante cálculo a ser apresentado em fase de cumprimento de sentença (art. 509, §2º, do CPC); d) CONDENAR a NU FINANCEIRA S.A. – SOCIEDADE DE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO a pagar à parte autora, a título de indenização por danos morais, o montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de correção monetária pelo IPCA, nos termos do art. 389, §ú, do CC (incluído pela Lei n.º 14.905/2024), cujo termo inicial fixa-se a partir desta decisão – arbitramento (Súmula 362/STJ), e juros moratórios de 1% ao mês até 29/08/2024 e, a partir de 30/08/2024 (entrada em vigor da Lei n.º 14.905/2024), juros moratórios pela taxa SELIC, subtraída a correção monetária, conforme art. 406, §1º, do CC, cujo termo inicial fixa-se a partir da data de citação – por se tratar de responsabilidade contratual (art. 405, do CC, c/c art. 240, do CPC), devendo a metodologia de cálculo observar o disposto na Resolução CMN n.º 5.171/2024 (art. 406, §2º e §3º, do CC), cujo valor deverá ser apurado mediante cálculo a ser apresentado em fase de cumprimento de sentença (art. 509, §2º, do CPC); e) CONDENAR a NU FINANCEIRA S.A. – SOCIEDADE DE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, por ônus de sucumbência, ao pagamento das custas processuais finais, se houver, e em verba honorária que, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação; Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de admissibilidade a ser exercido pelo Juízo “a quo” (art. 1.010, CPC), sem nova conclusão, intime-se a parte contrária para oferecer resposta, no prazo de 15 (quinze) dias. Em havendo recurso adesivo, também deve ser intimada a parte contrária para oferecer contrarrazões. Após, tudo devidamente certificado, remetam-se os autos à Superior Instância, para apreciação do recurso de apelação. Havendo o trânsito em julgado, inexistindo outras providências a serem tomadas, certifique-se e arquivem-se os autos. Determino, na forma do provimento n. 003/2009, da CJMB - TJE/PA, com redação dada pelo provimento n. 011/2009, que essa sentença sirva como mandado, ofício, notificação e carta precatória para as comunicações necessárias. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. Dom Eliseu-PA, data registrada no sistema. PEDRO HENRIQUE FIALHO Juiz de Direito Núcleo de Justiça 4.0 do Empréstimo Consignado, Contrato Bancário, Saúde Pública, Violência Doméstica e Demandas sobre Energia Elétrica (Portaria n.º 1481/2025-GP, de 14 de março de 2025)
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