Processo nº 1013120-42.2025.8.11.0000
ID: 293184928
Tribunal: TJMT
Órgão: Terceira Câmara Criminal
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL
Nº Processo: 1013120-42.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1013120-42.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Contrabando …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1013120-42.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Contrabando ou descaminho, Habeas Corpus - Cabimento] Relator: Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JUANITA CRUZ DA SILVA CLAIT DUARTE] Parte(s): [ANDERSON AMARAL ROSA - CPF: 892.419.321-04 (ADVOGADO), CESAR DE LIMA RODRIGUES - CPF: 046.768.681-54 (PACIENTE), JUIZ DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE DOM AQUINO (IMPETRADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), JUÍZO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE DOM AQUINO (IMPETRADO), ANDERSON AMARAL ROSA - CPF: 892.419.321-04 (IMPETRANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DENEGOU A ORDEM. E M E N T A Ementa. Direito processual penal e penal. Habeas corpus. Tráfico de drogas e contrabando. Prisão em flagrante convertida em preventiva. Gravidade concreta. Risco de reiteração delitiva. Necessidade da custódia cautelar. Ordem denegada. I. Caso em exame 1. Habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de réu preso em flagrante por tráfico de drogas e contrabando, cuja prisão foi convertida em preventiva pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Dom Aquino/MT. A defesa sustenta ausência de fundamentos concretos, pleiteando substituição da prisão por medidas cautelares alternativas ou prisão domiciliar, alegando condição de saúde do paciente. II. Questões em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) verificar se a decisão que decretou a prisão preventiva está suficientemente fundamentada; (ii) definir se estão presentes os requisitos legais para manutenção da custódia cautelar, ante a alegação de ausência de periculum libertatis e existência de condições pessoais favoráveis; e (iii) aferir a possibilidade de substituição da prisão preventiva por domiciliar, em razão de suposta condição de saúde do paciente. III. Razões de decidir 3. A decisão que converte a prisão em flagrante em preventiva apresenta fundamentação concreta, baseada na gravidade dos delitos, na quantidade de entorpecentes apreendidos e em indícios de envolvimento com organização criminosa, justificando a necessidade da segregação para garantia da ordem pública. 4. A existência de outro processo criminal em curso contra o paciente demonstra risco concreto de reiteração delitiva, reforçando a necessidade da custódia. 5. A presença de condições pessoais favoráveis, como primariedade, emprego lícito e residência fixa, não impede a decretação ou manutenção da prisão preventiva quando presentes os requisitos legais. 6. A alegação de enfermidade não veio acompanhada de documentação comprobatória da gravidade da condição médica ou da ausência de tratamento adequado na unidade prisional, razão pela qual não se revela possível a concessão da prisão domiciliar. 7. O pedido de substituição por prisão domiciliar não foi previamente submetido ao juízo de origem, configurando indevida supressão de instância, o que inviabiliza sua apreciação direta por este Tribunal. IV. Dispositivo e tese 8. Ordem denegada. Teses de julgamento: "1. A prisão preventiva está suficientemente fundamentada quando baseada na gravidade concreta do crime, na existência de elementos que indicam o envolvimento do agente com organização criminosa e no risco de reiteração delitiva. 2. Condições pessoais favoráveis não impedem a decretação ou manutenção da prisão preventiva quando presentes os requisitos legais. 3. A concessão de prisão domiciliar exige prova da gravidade da enfermidade e da impossibilidade de tratamento no estabelecimento prisional, cuja ausência inviabiliza a medida. 4. A apreciação originária de pedido de substituição da prisão por domiciliar é de competência do juízo de primeiro grau, sob pena de supressão de instância." ____________________ Dispositivos relevantes citados: CPP, arts. 282, § 6º, 312, 318, II, e 319. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, AgRg no RHC n. 197.292/MG, Rel. Min. Messod Azulay Neto, Quinta Turma, j. 01.07.2024; STJ, AgRg no RHC n. 195.319/RS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, j. 16.10.2024; STJ, AgRg nos EDcl no HC n. 907.374/RS, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, j. 05.03.2025; STJ, AgRg no HC n. 916.506/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, j. 05.03.2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA: Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pelo advogado Anderson Amaral Rosa em favor de Cesar de Lima Rodrigues, apontando como autoridade coatora o Juízo da Vara Única da Comarca de Dom Aquino/MT. Colhe-se desta impetração que o paciente foi preso em flagrante delito no dia 26 de março deste ano, pela suposta prática dos crimes de tráfico de drogas e contrabando, cuja custódia foi convertida em preventiva no Auto de Prisão em Flagrante n. 1000208-08.2025.811.0034. Sustenta, o impetrante, que a autoridade acoimada de coatora decretou a prisão preventiva do paciente em decisão desfundamentada, eis que não apontou elementos concretos que indiquem o perigo gerado pela sua liberdade; acrescentando, outrossim, que, na espécie, não estão presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal. Assevera que, na espécie, ocorre uma antecipação do juízo de culpabilidade, em violação ao princípio da presunção de inocência, de modo que “a prisão preventiva está sendo utilizada como antecipação de eventual pena o que, obviamente, é inadmissível”. Destaca que o paciente ostenta predicados pessoais favoráveis, tais como: a ausência de condenações criminais, emprego lícito e residência fixa, circunstâncias, essas, que permitem que a sua prisão preventiva seja substituída por medidas cautelares alternativas. Aduz que o paciente “precisa de tratamento e acompanhamentos especializado, inclusive com uso de bomba de insulina”, de modo que, em razão da grave condição de saúde, bem como da impossibilidade de tratamento adequado no ambiente prisional, faz-se necessária a conversão de sua prisão preventiva em domiciliar. Com base nas razões acima consignadas, requer, liminarmente, a colocação imediata do paciente em liberdade, com a expedição de alvará de soltura em seu favor, ainda que mediante a aplicação de medidas cautelares alternativas previstas no art. 319 do Código de Processo Penal. E, no mérito, a convolação da medida de urgência, porventura deferida, em definitiva. O pedido de urgência foi indeferido por intermédio das razões encontradiças no ID 283302395. Nesta instância revisora, a Procuradoria-Geral de Justiça, no parecer constante no ID 284809856, manifestou pela denegação da ordem. É o relatório. V O T O R E L A T O R No que diz respeito à falta dos requisitos legais autorizadores à prolação do referido édito judicial, impõe-se ressaltar que essa tese não se sustenta, eis que o juízo de primeiro grau considerou como elemento autorizador da custódia provisória reprochada: a garantia da ordem pública, em razão gravidade concreta do crime em discussão, bem como na sua retinência delitiva. A propósito, eis o trecho do decisum que decretou a prisão do paciente: [...] Diante de tais elementos, entendo que os requisitos necessários para conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva estão demonstrados nos autos. Sobre os elementos de materialidade e autoria delitiva, foi relatado pelos agentes de segurança pública que, em diligências voltadas ao combate de facções criminosas, houveram informações de que o flagrado é integrante da facção criminosa Comando Vermelho e utiliza do seu estabelecimento comercial “Bar do Catarino” para a venda de entorpecentes e exploração de jogos de azar. Afirmaram que compareceram até o local e que, de livre vontade, foi fraqueado o acesso. Informaram que no interior de cômodo, localizaram 21 (vinte e uma) porções de substância análoga a maconha bem como 01 (uma) balança digital, 01 (uma) caixa contendo pacotes de papel seda, a quantia de R$ 2.644,00 (dois mil, seiscentos e quarenta e quatro reais), 17 (dezessete) maços de cigarro da marca “Fox” e 18 (dezoito) carteiras de cigarro da mesma marca. Em ocasião de interrogatório policial, o flagrado afirmou que o entorpecente se destinava ao consumo próprio. Consoante laudo pericial provisório, a porção de maconha apreendida totaliza o total de 135 (cento e trinta e cinco) gramas Sobre as hipóteses de prisão preventiva, compreendo que a medida de restrição de liberdade deve ser utilizada para acautelamento da ordem pública. No caso em análise, deve ser ponderado que se trata de grande quantidade, notadamente quando se considera as circunstâncias e tamanho da cidade de Dom Aquino/MT. Além disso, existe suspeita de envolvimento com a facção criminosa “Comando Vermelho” e utilização do próprio estabelecimento comercial como ponto para venda de entorpecentes. Sobre o tema, eis o entendimento jurisprudencial: TJMT – n. 1002882-08.2018.8.11.0000 (...) “Não se revela cabível na via estreita do habeas corpus discussão acerca da autoria do delito” (TJMT, Enunciado Criminal 42). A análise da assertiva “de que a droga seria para consumo pessoal se revela imprópria na estreita via do habeas corpus, por demandar o exame aprofundado das provas a serem colhidas no curso da instrução criminal” (TJMT, HC nº 89432/2016). Mostra-se “cabível a decretação da prisão preventiva, quando se imputa ao paciente a manutenção de uma ‘boca de fumo’, evidenciando-se a gravidade concreta da conduta e a necessidade de constrição cautelar” (STJ, RHC nº 80819MS). A “fundada probabilidade de reiteração delitiva justifica a ordem de prisão cautelar” (STF, HC nº 137558AgR). Os predicados pessoais não autorizam, em si, a revogação da custódia cautelar, consoante pacífica posição jurisprudencial do c. STJ (HC nº 369.027/SP), notadamente em tráfico de drogas, considerados seus efeitos difusos à saúde e à segurança pública. “Designada data próxima para [...] audiência de instrução e julgamento, ocasião em que restará finda a instrução, mostra-se prudente manter o paciente segregado por conveniência da instrução processual [...]” (TJMT, HC nº 98343/2014). “A reiteração criminosa específica não autoriza a substituição da custódia preventiva por medidas alternativas” (TJMT, HC nº 71201/2016). (N.U 1002882-08.2018.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS MACHADO, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 08/05/2018, Publicado no DJE 15/05/2018) Friso que em consulta ao sistema PJE, denota-se que o flagrado possui a ação penal n. 0001970-23.2018.811.0034 atualmente em trâmite. Com isto, o risco de reiteração delitiva se encontra demonstrado. Neste sentido, eis o enunciado orientativo do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso: Enunciado n. 06: O risco de reiteração delitiva, fator concreto que justifica a manutenção da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, pode ser deduzido da existência de inquéritos policiais e de ações penais por infrações dolosas em curso, sem qualquer afronta ao princípio da presunção de inocência. Logo, presentes os requisitos legais (fumus comissi delicti e periculum libertatis), agregado ainda o fato de se tratar de crime doloso com pena superior a 04 (quatro) bem como que as medidas cautelares se mostram ineficazes para acautelamento da ordem pública, a decretação da prisão preventiva, é de rigor. [...] Destaques no original Constata-se, pois, que ao revés do afirmado nesta impetração, estão presentes, sim, os requisitos para a decretação da custódia cautelar do paciente, tendo em vista que se encontra embasada em elementos concretos que demonstram a necessidade de garantir a ordem pública, em razão do paciente, em tese, praticar o crime de tráfico de drogas de forma estruturada e organizada, utilizando-se, aparentemente, de seu estabelecimento comercial para o comércio malsão e exploração de jogos de azar, situação que indica uma possível dedicação a atividade criminosa. Aliás, observa-se que foram apreendidas 21 (vinte e uma) porções de maconha de diferentes tamanhos, balança de precisão, papel seda, além da quantia de R$ 2.644,00 (dois mil seiscentos e quarenta e quatro reais) em dinheiro, durante a Operação Tolerância Zero (voltada ao combate às organizações criminosas), tudo a indicar a existência do periculum libertatis autorizador da utilização da medida extrema, de modo que sua liberdade, neste momento, configura risco à garantia da ordem pública, pela gravidade dos ilícitos sob apuração e da periculosidade do paciente. Além disso, há que ser observada a sua contumácia delitiva, dado que responde a outro processo criminal pela prática, em tese, do crime de receptação, cuja denúncia foi recebida em 22 de abril de 2025 (Ação Penal n. 0001970-23.2018.8.11.0034). Logo, impõe-se reconhecer que a decisão prolatada pela autoridade acoimada de coatora está, mais um vez, embasada, sendo de bom alvitre destacar que, acerca damanutenção da prisão provisória para evitar a reiteração delitiva, a Turma de Câmaras Criminais Reunidas deste Tribunal de Justiça aprovou o Enunciado Orientativo n.6, com a seguinte redação: “O risco de reiteração delitiva, fator concreto que justifica a manutenção da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, pode ser deduzido da existência de inquéritos policiais e de ações penais por infrações dolosas em curso, sem qualquer afronta ao princípio da presunção de inocência.”. A propósito, faz-se imperioso destacar que a quantidade dos entorpecentes apreendidos, embora não seja extremamente elevada, não é irrisória, motivo pelo qual, aliado às demais circunstâncias fáticas, justifica a prisão para a garantia da ordem pública. Sobre a temática, o Superior Tribunal de Justiça firmou o seguinte entendimento: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. QUANTIDADE E VARIEDADE DE DROGAS. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE NOVOS ARGUMENTOS APTOS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I - A segregação cautelar deve ser considerada exceção, já que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo Penal. II - In casu, a prisão preventiva do Agravante se encontra devidamente fundamentada em dados concretos extraídos dos autos, que evidenciam a necessidade de encarceramento provisório, notadamente se considerada a gravidade concreta da conduta supostamente perpetrada; haja vista a quantidade e a variedade das drogas apreendidas, (6 tabletes de maconha, pesando 102,59 gramas; um papelote de cocaína, pesando 4,24 gramas e oito porções de haxixe, pesando 37,03 gramas); havendo informações de que os entorpecentes seriam distribuídos através de um sistema de "delivery". Tais circunstâncias evidenciam um maior desvalor da conduta e a periculosidade do agente, justificando a segregação cautelar para a garantia da ordem pública. Precedentes. III - A presença de circunstâncias pessoais favoráveis, tais como primariedade, ocupação lícita e residência fixa, não tem o condão de garantir a revogação da prisão se há nos autos elementos hábeis a justificar a imposição da segregação cautelar, como na hipótese. Pela mesma razão, não há que se falar em possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. IV - É assente nesta Corte Superior que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos. Precedentes. Agravo regimental desprovido. (AgRg no RHC n. 197.292/MG, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 1/7/2024, DJe de 2/8/2024.) Destacamos É necessário ressaltar, ainda, que, não obstante o impetrante alegueque o paciente ostenta condições pessoais favoráveis para responder ao processo em liberdade, tais atributos não têm o condão de, por si sós, ensejar a restituição da sua liberdade, tal como entendeu este Tribunal de Justiça, ao editar o Enunciado n. 43 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas, vazado nos seguintes termos: “As condições pessoais favoráveis não justificam a revogação, tampouco impedem a decretação da custódia cautelar, quandopresente o periculum libertatis.”. Noutro giro, em relação à afirmação de que a prisão cautelar do paciente ofende o princípio da homogeneidade por se consubstanciar em antecipação da pena a ser cumprida em caso de eventual condenação, é necessário que se reconheça que a simples possibilidade de vier a ser condenado a cumprir a sua pena em regime menos gravoso do que o fechado, por óbvio, não é suficiente para lhe conferir a liberdade almejada neste habeas corpus. Isso porque é de trivial sabença que toda e qualquer prisão, antes da sentença condenatória transitada em julgado, tem caráter provisório e cautelar, que não se confunde com o regime de cumprimento de pena, isso autorizando concluir que o encarceramento processual nas hipóteses elencadas no art. 312 do Código de Processo Penal, por si só, não fere o postulado em referência. Diante disso, embora o ordenamento jurídico pátrio reconheça a liberdade como regra, tem-se que o carcer ad cautelam imposto aopaciente deve ser mantido, por estarem configurados, na hipótese: o periculum libertatis, decorrente da necessidade da medida extrema para garantir a ordem pública, satisfazendo, por isso, o comando normativo emanado do art. 312 do Código de Processo Penal; bem assim o fumus comissi delicti, externado pela existência da materialidade e pelos indícios suficientes da autoria delitiva. Sobre o conceito de ordem pública para dar embasamento à manutenção de prisão preventiva, Guilherme de Souza Nucci assevera que: [...] Garantia da ordem pública: trata-se da hipótese de interpretação mais extensa na avaliação da necessidade da prisão preventiva. [...] Entende-se pela expressão a necessidade de se manter a ordem na sociedade, que, como regra, é abalada pela prática de um delito. Se este for grave, de particular repercussão, com reflexos negativos e traumáticos na vida de muitos, propiciando àqueles que tomam conhecimento da sua realização um forte sentimento de impunidade e de insegurança, cabe ao Judiciário determinar o recolhimento do agente. [...]. Uma das causas de afetação da ordem pública é a própria credibilidade do Judiciário, como vêm decidindo os tribunais. Apura-se o abalo à ordem pública também, mas não somente, pela divulgação que o delito alcança nos meios de comunicação – escrito ou falado. Não se trata de dar crédito ao sensacionalismo de certos órgãos da imprensa, interessados em vender jornais, revistas ou chamar audiência para seus programas, mas não é menos correto afirmar que o juiz, como outra pessoa qualquer, toma conhecimento dos fatos do dia a dia acompanhando as notícias veiculadas pelos órgãos de comunicação. [...] Outro fator responsável pela repercussão social que a prática de um crime adquire é a periculosidade (probabilidade de tornar a cometer delitos) demonstrada pelo réu e apurada pela análise de seus antecedentes e pela maneira de execução do crime. Assim, é indiscutível poder ser decretada a prisão preventiva daquele que ostenta, por exemplo, péssimos antecedentes, associando-se a isso a crueldade particular com que executou o crime. [...] Em suma, extrai-se da jurisprudência o seguinte conjunto de causas viáveis para autorizar a prisão preventiva, com base na garantia da ordem pública: a) gravidade concreta do crime; b) envolvimento com o crime organizado; c) reincidência ou maus antecedentes do agente e periculosidade; d) particular e anormal modo de execução do delito; e) repercussão efetiva em sociedade, gerando real clamor público. O ideal é a associação de, pelo menos, dois desses fatores. (In Código de Processo Penal Comentado, 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020, pp. 1147 a 1150). Destacamos Em relação à temática, deve ser registrado, também, que a Lei n. 12.403/11 – que modificou a redação do art. 282, § 6º, do Código de Processo Penal –,estabeleceu de forma clara e insofismável que “A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).”. Destarte, por disposição legal a medida extrema deverá ser decretada quando realmente se mostrar necessária e adequada às circunstâncias em que cometido o delito e às condições pessoais do agente. E, no caso em tela, tal como asserido linhas volvidas, as circunstânciasque revelam a periculosidade do agente. Daí por que,impende ressaltarque, no caso em debate, não se mostra suficiente a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão elencadas no art. 319 do Código de Processo Penal,porqueas circunstâncias dos delitos, em tese, praticados pelopaciente revelaram queprovidência menos gravosa do que a custódia provisória não seria capaz de garantir a ordem pública, tal como o entendeu o Superior Tribunal de Justiça no julgado abaixo ementado: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES E POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PERICULOSIDADE DO AGENTE. QUANTIDADE DA DROGA APREENDIDA. CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO. NECESSIDADE DE GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. INSUFICIÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Presentes elementos concretos para justificar a manutenção da prisão preventiva, para garantia da ordem pública. As instâncias ordinárias afirmaram que, em liberdade, o agravante representava risco concreto à ordem pública em razão de sua periculosidade e da gravidade concreta da conduta, evidenciadas pela quantidade, variedade e natureza das drogas apreendidas - 99 pedras de crack, pesando aproximadamente 10,9g, 64 porções de cocaína, pesando aproximadamente 16,02g e três porções de maconha, pesando aproximadamente 3,78g - circunstância que, somada à apreensão de arma de fogo carregada com doze munições e numeração suprimida, demonstra o maior envolvimento com o narcotráfico e o risco ao meio social. 2. É entendimento do Superior Tribunal de Justiça que as condições favoráveis do paciente, por si sós, não impedem a manutenção da prisão cautelar quando devidamente fundamentada. 3. Inaplicável medida cautelar alternativa quando as circunstâncias evidenciam que as providências menos gravosas seriam insuficientes para a manutenção da ordem pública. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no RHC n. 195.319/RS, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 16/10/2024, DJe de 22/10/2024.) Destacamos. Por fim, em relação à concessão de prisãodomiciliar preconizada no art. 318, II, do Código deProcessoPenal, é sabido que a pretendida substituição somente é admitida se houver prova concomitante dos requisitos objetivo e subjetivo previstos no aludido dispositivo normativo. E, na espécie, não ficou demonstrado que o paciente levou a conhecimento do juiz do processo de conhecimento os documentos comprobatórios da gravidade da doença que o acomete; da extrema debilidade do paciente; ou que o sistema penitenciário onde ele se encontra não tem condições de realizar o adequado e necessário tratamento, motivo pelo qual, essa postulação não pode ser atendida, impondo-se reconhecer que o pleito deve ser devidamente apreciado pelo juízo de origem, o qual detém maior amplitude instrutória para valoração aprofundada dos elementos probatórios constantes dos autos, inclusive no que diz respeito à eventual necessidade de realização de prova médica complementar. Nesse contexto, fica claro que não foioportunizado ao juízo de primeiro grau a apreciação da tese posta nesta ação mandamental – situação, essa, que afrontaria o princípio do juízo natural e inviabiliza o exercício do poder jurisdicional do julgador –, de modo que não havendo manifestação pretérita da indicada autoridade coatorasobre as matérias aqui suscitadas,a concessão da ordem,neste momento, por este órgão revisor, implica em supressão de instância, que é vedado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, conforme demonstram os julgados abaixo ementados: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. PEDIDO DE PRISÃO DOMICILIAR HUMANITÁRIA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Agravo regimental interposto contra decisão que denegou ordem de habeas corpus, mantendo a prisão preventiva do agravante, acusado de homicídio doloso, porte ilegal de arma de fogo de uso restrito e receptação. 2. O agravante, ferido na perna durante a prisão em flagrante, alega necessidade de prisão domiciliar humanitária devido à falta de assistência médica adequada no estabelecimento prisional. 3. A prisão domiciliar humanitária é medida excepcional, exigindo prova inconteste da impossibilidade de acompanhamento adequado do estado de saúde do preso na casa prisional, o que não foi demonstrado no caso. 4. A análise de novas informações sobre o estado de saúde do agravante não pode ser realizada, pois não foram submetidas às instâncias de origem, evitando-se a supressão de instância. 5. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no HC n. 907.374/RS, relator Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 5/3/2025, DJEN de 12/3/2025.) Destacamos PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. SUBSTITUIÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR POR DOMICILIAR POR MOTIVO DE SAÚDE. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PROVAS DA GRAVIDADE DA SITUAÇÃO DE SAÚDE. CONDENAÇÃO POR CRIME GRAVE EM REGIME FECHADO. PEDIDO SUBSIDIÁRIO NÃO APRECIADO NA ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. O agravante foi condenado ao cumprimento de pena privativa de liberdade por crime grave em regime fechado, estando presentes os requisitos da prisão preventiva. 2. No caso, a substituição da prisão preventiva por domiciliar não é medida imprescindível porque não foi demonstrada gravidade na situação de saúde do agravante. 3. O pedido subsidiário não foi examinado pelas instâncias de origem e não pode ser enfrentado nesta Corte Superior, sob pena de supressão de instância. Ausência de ilegalidade evidente. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 916.506/SP, relator Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 5/3/2025, DJEN de 12/3/2025.) Destacamos Posto isso, em sintonia com o parecer ministerial, julgo improcedentes os pedidos deduzidos em favor de Cesar de Lima Rodrigues e, por consequência, denego a ordem de habeas corpus almejada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 04/06/2025
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