Processo nº 1000857-32.2023.8.11.0037
ID: 295616764
Tribunal: TJMT
Órgão: Regime de Cooperação da 2ª Câmara de Direito Público
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1000857-32.2023.8.11.0037
Data de Disponibilização:
11/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO REGIME DE COOPERAÇÃO DA 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO Número Único: 1000857-32.2023.8.11.0037 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Acidente de Trânsito, Aciden…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO REGIME DE COOPERAÇÃO DA 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO Número Único: 1000857-32.2023.8.11.0037 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Acidente de Trânsito, Acidente de Trânsito] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). ANTONIO VELOSO PELEJA JUNIOR, DES(A). MARCOS FALEIROS DA SILVA] Parte(s): [ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0001-44 (APELANTE), MUNICIPIO DE TESOURO - CNPJ: 03.543.303/0001-49 (APELANTE), DANILO RODRIGUES DE SOUZA - CPF: 997.581.481-68 (ADVOGADO), EDMILSON VASCONCELOS DE MORAES - CPF: 690.343.541-72 (ADVOGADO), FABIANA DIAS PACHECO - CPF: 020.266.721-99 (APELADO), VANESSA ALVES DE OLIVEIRA - CPF: 054.227.171-04 (ADVOGADO), NAYARA DA SILVA MENDES - CPF: 046.260.331-80 (ADVOGADO), I. P. D. S. - CPF: 090.264.151-41 (APELADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (TERCEIRO INTERESSADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a REGIME DE COOPERAÇÃO DA 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA POR OMISSÃO. ACIDENTE EM PONTE DE ESTRADA VICINAL. MORTE E LESÃO GRAVE. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO MUNICÍPIO. DEVER DE INDENIZAR. DANOS MORAIS E PENSIONAMENTO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta pelo Município de Tesouro contra sentença que julgou procedente ação de reparação de danos morais e materiais ajuizada por Fabiana Dias Pacheco e seu filho menor, em decorrência de acidente ocorrido em ponte localizada em estrada vicinal, que resultou na morte do esposo da primeira autora e pai do segundo autor. A sentença condenou o ente público ao pagamento de pensão mensal de um salário-mínimo, dividido entre os autores, e de indenização por danos morais no valor de R$ 40.000,00 para cada um dos requerentes. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há quatro questões em discussão: (i) definir se o Município de Tesouro possui legitimidade passiva para responder pelos danos; (ii) estabelecer se ficou caracterizada a omissão estatal e a responsabilidade subjetiva do ente municipal; (iii) determinar se é cabível a indenização por danos morais e o pagamento de pensão mensal; e (iv) avaliar a possibilidade de redução do quantum indenizatório. III. RAZÕES DE DECIDIR A legitimidade passiva do Município decorre da aplicação da teoria da asserção, segundo a qual se reconhece a pertinência subjetiva com base nas alegações formuladas na petição inicial, cabendo ao mérito a análise da eventual responsabilidade. A responsabilidade civil por omissão da Administração Pública é subjetiva, exigindo a demonstração do dever legal de agir, do dano, do nexo de causalidade e da culpa estatal, conforme jurisprudência consolidada do STF e STJ. As provas técnicas constantes no laudo pericial criminal atestam o estado precário da ponte, com estruturas apodrecidas, ausência de proteção lateral e falta de sinalização, evidenciando falha grave na prestação do serviço público municipal. É dever do Município conservar e sinalizar adequadamente as vias vicinais, ainda que localizadas em propriedade privada, desde que destinadas ao uso público, conforme os arts. 30 e 144, § 10º, II, da CF/1988 e normas do CTB. O acidente foi causado pela omissão do Município, sendo descartada a alegação de culpa exclusiva da vítima, pois o laudo concluiu que a ruptura da estrutura da ponte provocou a perda de controle do veículo. O dano moral restou configurado diante da perda de ente familiar e da lesão grave sofrida, sendo a indenização fixada em R$ 40.000,00 para cada autor compatível com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. É devida a pensão mensal à viúva até a data em que o falecido completaria 76 anos, e ao filho menor até completar 25 anos, conforme presunção de dependência econômica em famílias de baixa renda, nos termos da jurisprudência do STJ. O pagamento da pensão deve ocorrer de forma mensal, sendo inaplicável a conversão em parcela única prevista no art. 950, parágrafo único, do CC, por tratar-se de pensão por morte. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A legitimidade passiva do Município se define pelas alegações da inicial, conforme a teoria da asserção. 2. A omissão estatal na manutenção e sinalização de ponte em estrada vicinal configura falha no dever legal de agir, ensejando responsabilidade subjetiva do ente municipal. 3. A ausência de sinalização e o estado precário da ponte são elementos suficientes para estabelecer o nexo causal entre a omissão e o acidente fatal. 4. É cabível a indenização por danos morais e o pensionamento mensal em virtude da morte de provedor familiar, sendo presumida a dependência econômica em núcleos de baixa renda. 5. A pensão por morte deve ser paga mensalmente, sendo vedada sua conversão em parcela única.” ---------------------------- Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 30, 37, § 6º, e 144, § 10º, II; CC, arts. 43 e 950, parágrafo único; CPC, arts. 85, § 4º, II, e 492; CTB, arts. 1º, 24, I-VI, e 60. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 695.887/PB; STJ, REsp 1.040.895/MG; STJ, AgInt no REsp 1.795.855/RS; STJ, AgInt no AREsp 1.672.059/RJ; TJMT, ApCiv 0000262-39.2014.8.11.0078, j. 17/04/2024; TJMT, ApCiv 1004015-91.2020.8.11.0040, j. 24/06/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo MUNICÍPIO DE TESOURO contra sentença que julgou procedente ação de reparação de danos morais e materiais ajuizada por Fabiana Dias Pacheco e I.P.D.S., para condenar o ente público ao pagamento de pensão mensal equivalente a 1 (um) salário-mínimo, dividido entre a viúva e o filho – sendo que para o filho até completar 25 anos e para a viúva até a data em que o falecido completaria 76 anos –, além de indenização por danos morais no valor de R$ 40.000,00 para cada requerente, totalizando R$ 80.000,00. Insurge-se o Apelante contra a sentença, sustentando, em síntese, (1) sua ilegitimidade passiva, argumentando não ter responsabilidade pela manutenção da ponte; (2) a ausência de comprovação de conduta omissiva; (3) a inexistência de nexo causal entre eventual omissão e o acidente; (4) culpa exclusiva da vítima, que teria perdido o controle do veículo; (5) a impossibilidade de condenação em danos morais; e (6) o descabimento do pensionamento. Diante disso, requer o provimento do recurso para, reformando a sentença, julgar totalmente improcedente a demanda ajuizada em seu desfavor. Subsidiariamente, requer a redução do valor arbitrado em danos morais. Contrarrazões em ID 172713383. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R V O T O(PRELIMINAR) – DA ILEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO DE TESOURO EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: A parte Apelada argumenta que não é parte legítima para figurar no polo passivo da ação, eis que, em tese, não é responsável pelos fatos narrados na inicial. Assim, pugna pelo reconhecimento da sua ilegitimidade. No entanto, tenho que tais alegações não comportam acolhimento. A legitimidade para agir consiste na capacidade da parte de sofrer os influxos da decisão a ser proferida, como sujeito da relação jurídica deduzida. Sendo assim, possui legitimidade processual a parte que tiver vínculo com o direito material reivindicado. No caso em exame, é possível a aplicação da teoria da asserção, eis que a legitimidade deverá ser analisada de acordo com as assertivas da parte autora, que atribui à Ré a responsabilidade pelos danos relatados na exordial. A matéria afeta a tal ponto é exclusivamente de mérito, e será analisada sob tal aspecto. Nessa linha de intelecção: "AGRAVO DE INSTRUMENTO – ILEGITIMIDADE AD CAUSAM PASSIVA - APLICAÇÃO DA TAXATIVIDADE MITIGADA DO ROL PREVISTO NO ARTIGO 1015 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – INCIDÊNCIA DA TEORIA DA ASSERÇÃO – ANÁLISE DA RESPONSABILIDADE DO BANCO-AGRAVANTE QUE DIZ RESPEITO AO MÉRITO – DENUNCIAÇÃO DA LIDE – INADMISSIBILIDADE – INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 88 DO CÓDIGO CONSUMERISTA E DO ARTIGO 125, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – RECURSO IMPROVIDO. As condições da ação devem ser verificadas de acordo com a teoria da asserção, ou seja, à luz das afirmações do autor constantes na petição inicial. A existência ou não de responsabilidade do réu pelos fatos narrados é questão de mérito que não autoriza, nesse momento, o reconhecimento da ilegitimidade ad causam passiva invocada". (TJSP, AI 2189025-66.2021.8.26.0000, j. 22/09/2021) Logo, rejeito a preliminar É como voto. V O T O(MÉRITO) EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Como visto, trata-se de recurso de apelação interposto pelo Município de Tesouro contra sentença que julgou procedente ação de reparação de danos morais e materiais ajuizada por FABIANA DIAS PACHECO e I.P.D.S. Os autores, na origem, relatam que em 12 de julho de 2019, Fabiana Dias Pacheco trafegava com seu esposo Wagno Euclecio da Silva em uma ponte de madeira localizada na Fazenda Santa Maria, zona rural do município de Tesouro. Prosseguem aduzindo que a ponte, em precário estado de conservação, não suportou o peso do veículo (uma caminhonete Ford F1000), resultando em sua queda no córrego. O acidente causou o falecimento de Wagno Euclecio da Silva e graves lesões à requerente Fabiana Dias Pacheco, que fraturou o fêmur esquerdo, necessitando de procedimentos cirúrgicos com implantação de parafusos. Por sua vez, o segundo requerente se trata de I.P.D.S, filho menor do casal, que ficou órfão de pai. Nas contrarrazões, o Município defende a ausência de responsabilidade pelo acidente. Afirma que não há nexo de causalidade entre o acidente e eventual conduta omissiva do ente público, razão pela qual não há falar em indenização por danos morais ou em pensão aos requerentes. O juízo de origem julgou procedente o pedido inicial, nos seguintes termos: “Vistos. Trata-se de AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS ajuizada por FABIANA DIAS PACHECO e I. P. D. S. em face do ESTADO DE MATO GROSSO e do MUNICÍPIO DE TESOURO/MT, devidamente qualificados nos autos. Narra a inicial, em síntese, que a requerente FABIANA DIAS PACHECO e seu esposo trafegavam no município de Tesouro, quando ao passarem sobre a ponte localizada na Fazenda Santa Maria, aquela não suportou o peso do veículo, tendo quebrado e ocasionou o acidente de ambos. Relata que o esposo da requerente sofreu Traumatismo Craniano Grave, tendo falecido no local. Na mesma ocasião a requerente fraturou o fêmur esquerdo, sendo necessário realizar procedimento cirúrgico, com a implantação de parafusos. Aduz que, além da cirurgia realizada no dia 17/07/2019, recentemente teve novamente que realizar outro procedimento cirúrgico, pois o pino do parafuso de sua perna quebrou. Assim, desde o acidente ocasionado por negligência do poder público, não conseguiu obter a reestruturação de sua saúde, devido às cirurgias de correções que é obrigada a se submeter. Alega que nunca superou a morte de seu esposo e seu filho sofre com a ausência de seu genitor, sendo que o falecimento causou dano moral a ambos. Assim, requer a procedência da ação, condenando a parte requerida ao pagamento de danos morais e de pensão mensal. Com a inicial vieram documentos. Devidamente citado, o ESTADO DE MATO GROSSO apresentou contestação no id n. 117810449, alegando, em síntese, preliminares de inépcia da petição inicial e ilegitimidade passiva, bem como a ausência de responsabilidade civil do Estado, ante a inexistência de nexo de causalidade entre conduta estatal e o acidente alegado, eis que decorrente de culpa exclusiva do condutor do veículo, pugnando pela improcedência da ação. O MUNICÍPIO DE TESOURO, devidamente citado, apresentou contestação nos ids n. 118525951 e 119936242, alegando, em síntese, preliminares de inépcia da petição inicial e ilegitimidade passiva, bem como a culpa exclusiva do condutor do veículo, pugnando pela improcedência da ação. Impugnação às contestações no id n. 121587232. Decisão de saneamento e de organização do processo no id n.126406018, na qual foi determinada a exclusão do ESTADO DE MATO GROSSO do polo passivo. Em audiência de instrução foram ouvidas 2 (duas) testemunhas e o preposto do MUNICÍPIO DE TESOURO. As partes apresentaram razões finais nos ids n. 132041903 e n. 132803567. É o relatório. Fundamento e decido. Cuida-se de AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS ajuizada por FABIANA DIAS PACHECO e I. P. D. S. em face do MUNICÍPIO DE TESOURO/MT. Ausentes questões preliminares pendentes, passo à análise do mérito. O processo está em ordem, não havendo nulidades a serem sanadas ou a serem reconhecidas de ofício. Todos os pressupostos processuais de desenvolvimento válido e regular do processo se fazem presentes, assim como as condições da ação, estando o feito apto a receber um julgamento com resolução de mérito. Cinge-se a questão controvertida sobre a responsabilidade da parte requerida pelos danos supostamente sofridos pela parte requerente. Nas palavras de Washington de Barros Monteiro, “A reparação do dano tem como pressuposto a prática de um ato ilícito. Todo ato ilícito gera para o seu autor a obrigação de ressarcir o prejuízo causado. É de preceito que ninguém deve causar lesão a outrem. A menor falta, a mínima desatenção, desde que danosa, obriga o agente a indenizar os prejuízos consequentes ao seu ato” (Curso de Direito Civil, Saraiva, 19ª. ed., 5º. vol., pág. 398). Silvio Rodrigues ensina que “a responsabilidade civil é a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam” (RODRIGUES, 2003, p. 6). Para Carlos Roberto Gonçalves é “um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário” (CARLOS ROBERTO GONÇALVES, São Paulo, 2003, p 07). Desse modo, havendo ato ilícito, deve o prejudicado ser ressarcido, de forma a restaurar seu equilíbrio moral e patrimonial. A responsabilidade civil, ou obrigação de indenizar, compele o causador a arcar com as consequências advindas da ação violadora, ressarcindo os prejuízos de ordem moral ou patrimonial, decorrente de fato ilícito próprio, ou de outrem a ele relacionado. A responsabilidade civil da Administração Pública é disciplinada pelo art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Via de regra, responde o Estado e seus delegatários de serviços públicos objetivamente pelos danos que seus agentes, nesta qualidade, causarem a terceiros. Nessa seara, o art. 43 do Código Civil dispõe que “As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo”. Sob tal conjuntura, para fazer jus a indenização deve o autor provar a ocorrência do ato ou fato, do dano que consiste no efetivo prejuízo por ele experimentado, bem como o nexo de causalidade entre o ato/fato e o dano. Assim existindo o nexo de causalidade entre o fato e o dano ocorrido, resta caracterizada a responsabilidade civil da Administração, a quem compete, para eximir-se da obrigação de indenizar, comprovar, se for o caso, a existência de culpa exclusiva da vítima ou de terceiros. No caso sub judice, a parte requerente argumenta que a parte requerida é responsável pelo dano ocorrido, afirmando que a má conservação da ponte ocasionou o acidente. Da análise do conjunto fático-probatório dos autos, observa-se que restou demonstrada a ocorrência do dano, assim como o nexo causal entre o dano e a omissão do agente público, tendo em vista que a ponte em que ocorreu o acidente foi construída de maneira inadequada, não possuía proteção lateral, estava em condições ruins, tampouco havia sinalização acerca do peso suportado ou até mesmo de que havia uma ponte naquela localidade. Com efeito, no laudo pericial criminal elaborado pela Politec constam as seguintes constatações sobre as condições da ponte e do acidente (id n. 117810450): D) DOS VESTÍGIOS D1) MARCAS DE FRENAGENS Não havia na pista marcas de frenagens produzidas pelo veículo acidentado, havendo, porém, poucas marcas pneumáticas nas primeiras tábuas da entrada na ponte, no sentido BR 070 para o Tesouro / MT, as quais davam conta que ao adentrar na ponte, tais tábuas se romperam e se deslocaram “para frente”, possivelmente fazendo com que o condutor perdesse o controle da direção deste veículo (ver anexos fotográficos do n.º 3 ao n.º 5). D2) DO PONTO DE SAÍDA DA PISTA Conforme já salientado acima, a saída de pista deste veículo se deu sobre a referida ponte, quando, tendo perdido o controle da direção, este veículo saiu para a direita da ponte (observando o sentido BR 070 – Tesouro / MT), vindo a colidir sobre a “tesoura” de madeira existente em ambas as laterais centrais desta ponte, a qual por se encontrar com a madeira “comprometida”, bastante apodrecida, rompeu-se permitindo assim que o veículo e parte da madeira da estrutura da referida ponte (inclusive ambas as tesouras) se rompesse e se precipitasse para o leito do córrego, caindo da ponte, a 5,10m (cinco metros e dez centímetros) de altura (ver anexos fotográficos n.º 7, 8 e 9). Compre ressaltarmos que ao cair no leito do córrego, o veículo, após derrubar a “tesoura” da lateral direita do seu deslocamento, fez com que todo o madeiramento da ponte se “repuxasse” e boa parte de sua estrutura rompesse, caindo no leito do córrego (ver anexos fotográficos n.º 7 e 8). Ao analisarmos visualmente as condições de tal madeiramento, observamos que muitas dos grandes “blocos”, alguns medindo 0,25m x 0,32m de espessura da madeira (vulgarmente conhecida por piúva) “tabebuia sp”, se mostravam “apodrecidos” se desprendendo facilmente do seu lenho (ver anexos fotográficos n.ºs 7, 8 e 9). (...) F) VELOCIDADE DO VEÍCULO A velocidade do veículo não foi calculada em virtude de não termos elementos seguros para tal aferição e principalmente por não ser elemento determinante da causa do acidente (saída de pista). (...) I) CONCLUSÃO Assim, em face do analisado e exposto, conclui o Signatário que a causa determinante do acidente em estudo, foi a perda do controle da direção efetuada pelo seu condutor, Sr.º WAGNO EUCLECIO DA SILVA, ocasionada pelo rompimento de parte do madeiramento da referida ponte, vindo a provocar a colisão do veículo contra a “tesoura e madeiramento” de sustentação lateral direita da ponte, resultando em sair da pista (ponte) para a direita do seu deslocamento, caindo assim o veículo de uma altura de 5,10m (cinco metros e dez centímetros) dentro do leito do córrego. (sem grifos no original) Destarte, o laudo pericial criminal e seus registros fotográficos demonstram que a condição da ponte era precária e isso foi a causa do acidente que acarretou na lesão da requerente FABIANA DIAS PACHECO e no óbito de seu cônjuge, pai do requerente I. P. D. S.. Assim, com base nas provas colacionadas aos autos, bem como nos depoimentos colhidos em audiência de instrução, observo que a omissão estatal em realizar a devida manutenção da ponte ocasionou o acidente que acabou tirando a vida de Wagno Euclecio da Silva e, consequentemente, causou danos aos requerentes. Vejamos o entendimento jurisprudencial: [...] Concernente ao ente responsável pelas manutenções da referida ponte, percebe-se que se trata de estrada vicinal e, no depoimento do preposto do Município e das testemunhas, foi apontado que é o ente municipal quem realiza as obras de manutenção da referida via e da respectiva ponte. Portanto, verifica-se que o Município é responsável pela reparação dos danos que a omissão de manutenções à ponte causou à parte requerente. Referente ao quantum devido a título de danos, em especial à pensão mensal, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é de que é devido o arbitramento em quantia equivalente a 2/3 (dois terços) do salário mínimo ou da remuneração do “de cujus”. No presente caso, o valor da pensão mensal deve incidir sobre o salário mínimo, conforme requerido na petição inicial, em observância ao princípio da adstrição, nos termos do art. 492 do Código de Processo Civil, e será devido desde a data do óbito, devendo ser dividido entre a viúva e o filho, sendo que para o filho deverá ser pago até a data em que completar 25 (vinte e cinco) anos de idade e para a viúva até a data em que o “de cujus” atingiria idade correspondente à expectativa média de vida do brasileiro no ano do óbito, ou seja, 76 (setenta e seis) anos, consoante constatado pelo IBGE (https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/29502-em-2019-expectativa-de-vida-era-de-76-6-anos). A forma de pagamento dos valores vincendos deve ser mensal, ante ao entendimento jurisprudencial de que “O pagamento da indenização em parcela única, previsto no parágrafo único, do art. 950, do Código Civil, se refere à hipótese de incapacidade permanente da vitima, sendo, portanto, inaplicável no caso de pensão mensal por morte.” (TJ-MG -Apelação Cível1.0313.14.017868-9/001, Relator(a): Des.(a) Tiago Pinto , 15ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 09/05/2019, publicação da súmula em 17/05/2019). Nesse sentido: [...] A respeito dos danos morais, convém esclarecer que estes devem atender a uma dupla finalidade: reparação e repressão. Ademais, o valor deve ser arbitrado conforme os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, de acordo com o dano sofrido, bem como observando os perfis financeiros dos requerentes e dos requeridos, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa da parte. De acordo com o magistério de Carlos Alberto Bittar, para a fixação do valor do dano moral “levam-se, em conta, basicamente, as circunstâncias do caso, a gravidade do dano, a situação do lesante, a condição do lesado, preponderando em nível de orientação central, a ideia de sancionamento ao lesado”. (in Reparação Civil por Danos Morais”, 3ª ed, São Paulo, Editora Revistas dos Tribunais, 1999, p. 279). Veja-se: [...] Destarte, entendo como razoável e proporcional que o requerido MUNICÍPIO DE TESOURO deva pagar a cada requerente o valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) pelos danos morais causados, valor este acrescido de juros de mora a partir da data do evento danoso, conforme dispõe a Súmula 54 do STJ, bem como de correção monetária a partir da data do arbitramento, in casu, a data desta sentença, nos termos da Súmula 362 do STJ. Assim, no cotejo com as provas apresentadas pelas partes, restou demonstrada a responsabilidade civil do MUNICÍPIO DE TESOURO, de modo que sua condenação ao pagamento de indenização por danos morais e pensão mensal é medida que se impõe. Ante o exposto e por tudo o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO INICIAL, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR o MUNICÍPIO DE TESOURO, ao pagamento de: a) pensão mensal no valor de 1 (um) salário mínimo, a partir da data do óbito, dividido entre a viúva e o filho, sendo que para o filho deverá ser pago até a data em que completar 25 (vinte e cinco) anos de idade, e para a viúva, até a data em que o “de cujus” atingiria 76 (setenta e seis) anos; b) indenização pelos danos morais no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) para cada requerente, totalizando R$ 80.000,00 (oitenta mil reais). Juros a partir da data do evento danoso e correção monetária a partir da presente data, nos termos das Súmulas 54 e 362 do Superior Tribunal de Justiça, observando-se a tese firmada no Tema 905 do STJ, bem como a Emenda Constitucional nº 113, de 8 de dezembro de 2021. Tratando-se de sentença ilíquida, os honorários serão arbitrados após a liquidação do julgado, nos termos do art. 85, § 4º, II, do Código de Processo Civil. Sem custas e despesas processuais.(...)” A fundamentação se baseou na responsabilidade civil subjetiva do ente municipal por omissão na manutenção e sinalização da ponte, conforme demonstrado pelo laudo pericial criminal, que atestou o estado precário da estrutura de madeira e a ausência total de sinalização no local. Irresignado, o Município de Tesouro interpôs recurso de apelação. Pois bem. A questão central reside na definição da responsabilidade civil do ente municipal pelo evento danoso, considerando os deveres constitucionais e legais da Administração Pública na manutenção e conservação das vias públicas sob sua competência. A responsabilidade civil da Administração Pública se encontra disciplinada no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, que estabelece a responsabilidade objetiva do Estado pelos danos que seus agentes causarem a terceiros no exercício de suas funções. Contudo, quando se trata de conduta omissiva estatal, a jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores se orienta pela aplicação da responsabilidade subjetiva, exigindo-se a demonstração da culpa ou dolo do agente público, conforme a teoria da "faute du service" (falta do serviço): “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. ROMPIMENTO DE BARRAGEM. INUNDAÇÃO. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. ANÁLISE DA COMPROVAÇÃO, OU NÃO, DA CULPA DO ENTE PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA N. 279 DO STF. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.” (STF, RE 695.887/PB) Para a configuração da responsabilidade civil por omissão, devem estar presentes o dever legal de agir e a omissão no cumprimento desse dever, o dano e o nexo causal entre a omissão e o resultado danoso e, por fim, a culpa ou dolo. DO DEVER LEGAL DE AGIR O dever legal de agir decorre da obrigação da Administração Pública de atuar positivamente sempre que estiver juridicamente vinculada a evitar um resultado danoso. Trata-se de um dever que nasce quando o ente público está em posição de garantir a proteção de direitos fundamentais, como a vida, a integridade física e a segurança dos cidadãos. A omissão é juridicamente relevante quando o Estado tinha o poder-dever de agir para evitar o evento danoso e, mesmo podendo fazê-lo, se manteve inerte. Nessas hipóteses, sua conduta não é neutra, e configura falha na prestação do serviço. A jurisprudência nacional é pacífica neste ponto: “[...] Dever de agir do Município que encontra previsão legal e permite sua concreção por meio de ordem judicial. Poder discricionário limitado ao interesse maior da vida, da integridade física e da dignidade da pessoa humana. Zona com risco de deslizamento, situação noticiada pelos moradores desde 2016. Necessidade das providências determinadas para resguardar os direitos à vida, à moradia e à dignidade das famílias que ocupam a área. Ausência de ofensa ao princípio da separação de poderes previsto na Constituição Federal. Em situações excepcionais, o Poder Judiciário pode determinar à Administração Pública que adote medidas para assegurar direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais. Manutenção da multa diária. Observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Sentença mantida. Recurso não provido.” (TJSP, ApCiv 1009627-12.2017.8 .26.0197, j. 07/07/2020) (g.n) “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. ÁRVORE SITUADA EM VIA PÚBLICA. QUEDA DE GALHOS NAS DEPENDÊNCIAS DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS AO ENTE MUNICIPAL. NÃO ATENDIDO. RESPONSABILIDADE CIVIL. OMISSÃO ESPECÍFICA. DEVER DE INDENIZAR. 1. A omissão do Estado reclama nexo de causalidade em relação ao dano sofrido pela vítima nos casos em que o Poder Público ostenta o dever legal e a efetiva possibilidade de agir para impedir o resultado danoso. 2. Deve ser reconhecido o Município de Goiânia como ente público responsável pela manutenção e conservação da arborização urbana, o qual tem o dever de fiscalizar as árvores existentes nas vias públicas a fim de evitar danos a terceiros. 3. No caso, ficou comprovado que a omissão do ente público, na realização do serviço de manutenção da arborização existente em logradouro público, foi o fato determinante para o incidente relatado na inicial, tem-se por reconhecido o dever do Município de Goiânia ressarcir o autor pelos prejuízos suportados com a queda dos galhos da árvore em suas dependências. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA.” (TJGO, ApCiv 5041021-80.2023.8.09.0051) (g.n) DA COMPETÊNCIA MUNICIPAL SOBRE ESTRADAS VICINAIS À luz dos arts. 30 e 144, § 10º, II da Constituição Federal, os Municípios detêm responsabilidade direta sobre o planejamento, a operação e a fiscalização das vias municipais, que incluem as estradas vicinais, inclusive as privadas de uso coletivo. Do ponto de vista jurídico, as estradas vicinais possuem natureza de bem público de uso comum do povo, o que significa que são de propriedade pública e se destinam ao uso coletivo, permitindo a livre circulação de pessoas e bens. Em termos de gestão, são geralmente de responsabilidade dos municípios, que devem cuidar da manutenção e conservação dessas vias para garantir sua funcionalidade, em conformidade com as legislações locais e diretrizes estabelecidas por políticas de transporte e infraestrutura. À vista disso, indubitável que o Município de Tesouro possuía competência legal e material para manter a estrada vicinal onde se deu o acidente em condições adequadas de tráfego, ainda que localizada em propriedade privada. Isso porque a via em questão era de uso coletivo irrestrito, caracterizando bem público de uso comum do povo, de modo que a responsabilidade municipal permanece inalterada. Desse modo, a aplicação das normas independe da titularidade formal da estrada, importando apenas se são abertas à circulação pública, conforme inteligência dos artigos 1º, 24, I a VI e 60 do Código de Trânsito Brasileiro. DA OMISSÃO MUNICIPAL CONFIGURADA Constatada, portanto, a competência do Município para atuar na estrada vicinal em questão, cabia-lhe o dever jurídico de manter a via em condições seguras de tráfego, com fiscalização e sinalização adequadas. A ausência dessas providências configura omissão relevante, pois diz respeito a obrigação legal específica, não a mera expectativa de conduta. No campo da responsabilidade civil, é pacífico o entendimento de que a omissão estatal gera dever de indenizar quando há descumprimento de um dever jurídico de agir, isto é, quando a Administração deixa de atuar em situação em que lhe era exigível providência concreta. Nessas hipóteses, aplica-se a responsabilidade subjetiva, exigindo-se a comprovação de culpa ou falha na prestação do serviço. O Superior Tribunal de Justiça reforça esse entendimento: “A jurisprudência desta Corte tem se posicionado no sentido de que, em se tratando de conduta omissiva do Estado, a responsabilidade é subjetiva e, neste caso, deve ser discutida a culpa estatal. Este entendimento cinge-se no fato de que na hipótese de responsabilidade subjetiva do Estado, mais especificamente, por omissão do Poder Público, o que depende é a comprovação da inércia na prestação do serviço público, sendo imprescindível a demonstração do mau funcionamento do serviço, para que seja configurada a responsabilidade. [...]” (STJ, REsp 1.040.895/MG) No caso em exame, a Nota Técnica emitida pela Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística – SINFRA (ID 117810453) comprova inequivocamente que se trata de estrada vicinal sob responsabilidade municipal, sendo irrelevante sua localização em propriedade particular, uma vez que sempre foi utilizada pela população local para acesso entre comunidades rurais. Neste ponto, convém assinalar que eventual participação de particulares na abertura da estrada não se confunde com a responsabilidade pela construção e manutenção da ponte onde ocorreu o acidente. Dessa forma, não há como transferir a terceiros o ônus que incumbe ao ente municipal, sendo descabida qualquer tentativa de exoneração de responsabilidade com base em tal argumento. A esse respeito, é significativa a manifestação expressa do próprio recorrente nas razões recursais (ID 169709144, p. 14), na qual reconhece ter contribuído para a construção da ponte onde ocorreu o acidente, o que evidencia o uso coletivo da estrutura e reforça a necessidade de atuação municipal contínua. De mais a mais, o próprio depoimento do preposto municipal, Sr. Paulo Fernando Lopes dos Santos, confirmou que o município realiza manutenções nas estradas rurais, incluindo pontes, ainda que de forma esporádica e sem planejamento sistemático. Por sua vez, a testemunha dos apelados, Sr. Pedro Graciel Martinez Barbosa, corroborou que a comunidade havia solicitado repetidamente a manutenção da ponte, a qual foi realizada apenas após o acidente (vide audiência de instrução – ID 130217881). A propósito, contrariamente ao sustentado pelo apelante, o próprio ato de contribuir para a construção e realizar o reparo da ponte logo após o acidente reforça a competência e responsabilidade municipal sobre a via, constituindo verdadeiro reconhecimento da omissão anterior. Assim, cabia ao ente municipal a fiscalização, manutenção preventiva e, no mínimo, a sinalização da ponte, a fim de alertar os usuários quanto a eventuais riscos. Sua omissão nesse contexto revela o descumprimento de um dever jurídico claro e específico, apto a ensejar responsabilidade civil subjetiva. 3. DO NEXO CAUSAL O laudo pericial criminal elaborado pela POLITEC (ID 117810450) demonstra de forma técnica e inequívoca que a madeira da ponte se encontrava "comprometida" e "bastante apodrecida", que a estrutura não possuía proteção lateral adequada e que grandes blocos de madeira se desprendiam facilmente, o que indica que a ponte carecia de adequada manutenção. O documento aponta, ainda, que inexistia qualquer tipo de sinalização de trânsito no local, o que demonstra grave omissão quanto ao dever de segurança e informação do condutor, e que a causa determinante do acidente foi “o rompimento de parte do madeiramento da referida ponte”. Por fim, o laudo conclui que a perda de controle do veículo decorreu do rompimento das tábuas da ponte logo na entrada, evidenciando o estado precário da estrutura. Por todo o exposto, compreende-se que, se as manutenções da referida via estivessem ocorrendo regularmente, ou, ainda, se houvesse ao menos sinalização próxima ao local que indicasse o perigo da zona, peso e velocidade permitidos, ou indicação de rota mais favorável à frente, o acidente poderia ter sido evitado. Dessa forma, conclui-se pela presença do nexo de causalidade entre o fato ocorrido e a conduta omissiva da Apelante, que não cumpriu com o dever de manutenção e segurança que lhe competia (falha na prestação de serviço). 4. DO DEVER DE INDENIZAR Uma vez comprovada a existência de nexo causal entre a conduta omissiva do município e o dano causado aos apelantes, é dever do ente público indenizar as vítimas pelos transtornos sofridos. É inequívoco que os danos decorrentes do acidente foram gravíssimos. Como relatado, a presente ação de indenização busca obter a reparação moral e material pelos inúmeros traumas físicos e psicológicos da primeira apelada, que foi uma vítima sobrevivente do acidente. Por sua vez, o segundo apelado é menor impúbere, filho da primeira apelada e da vítima falecida no local, o condutor Sr. Wagno Euclécio da Silva, marido da apelada. Também não se pode olvidar a perda material em razão da destruição do veículo e dos bens dentro dele, bem como os impactos da redução da renda familiar, sem a remuneração mensal do falecido. À vista disso, a reparação por danos morais possui dupla finalidade: de um lado, visa proporcionar à vítima uma compensação adequada pelo sofrimento experimentado, restaurando, na medida do possível, o equilíbrio psíquico e moral abalado; de outro, busca desestimular a reiteração de condutas lesivas, conferindo caráter pedagógico e preventivo à condenação. Nessa perspectiva, o quantum indenizatório deve observar critério de proporcionalidade e razoabilidade, situando-se em patamar que, sem importar locupletamento indevido ao lesado, seja suficientemente expressivo para cumprir sua função reparatória e, simultaneamente, dissuasória. Não se pode, portanto, fixar a indenização em montante tão exorbitante que configure enriquecimento ilícito, tampouco em valor tão módico que se revele incapaz de mitigar o abalo sofrido ou de produzir reflexão no causador do dano acerca da necessidade de adoção de condutas mais diligentes. Na presente situação, a indenização por danos morais imposta no ato sentencial, no valor R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) para cada apelante, mostra-se compatível, considerando as particularidades do pleito e dos fatos assentados, bem como os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Aliás, quanto ao pleito subsidiário de redução do montante indenizatório devido, entendo que não deve prosperar, ante o risco de esgotar o caráter punitivo-pedagógico da medida. Nesse sentido: “APELAÇÃO – AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – PERÍCIA GRAFOTÉCNICA REALIZADA NOS AUTOS – LEGITIMIDADE DA CONTRATAÇÃO NÃO COMPROVADA – DESCONTOS IMOTIVADOS – INDENIZAÇÃO DEVIDA – RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO– MÁ-FÉ DO CREDOR CONSTATADA – RECURSO NÃO PROVIDO. Se a instituição financeira não comprova a regularidade do empréstimo consignado, tem-se por inexistente a dívida. O montante indenizatório deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade bem como ao caráter satisfativo-pedagógico da medida. [...]”. (TJMT, ApCiv 1002948-20.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 02/07/2024, p. 02/07/2024) (g.n) Assim, mantenho a condenação por danos morais no valor fixado na sentença. 5. DO PENSIONAMENTO Quanto ao pedido de reforma da sentença referente ao pagamento de pensão à esposa e filho pela morte do marido/pai, entendo que, no caso em questão, tal indenização é cabível e plenamente justificada. Essa compensação reveste-se de caráter essencial, sobretudo em contextos de famílias de baixa renda, para as quais a perda de um dos provedores representa não apenas um abalo emocional irreparável, mas também a privação de uma expectativa de suporte econômico futuro. A indenização por pensionamento busca mitigar a vulnerabilidade financeira que se impõe aos familiares, considerando que o salário proveniente de sua atividade laborativa contribuía significativamente para o sustento familiar. Esse amparo financeiro assegura que as famílias mais necessitadas não fiquem desamparadas diante da perda precoce, alinhando-se ao princípio da dignidade da pessoa humana e à função reparatória do direito. A jurisprudência tem reiteradamente reconhecido a relevância dessa medida. Com efeito, a orientação do STJ é no sentido de que "há uma presunção de assistência econômica recíproca entre os integrantes da família, estabelecida ainda quando a vítima contribua com os serviços domésticos, o qual possui conteúdo econômico e, portanto, é indenizável, motivo pelo qual é cabível o pensionamento mensal." (REsp 612.694/MG, Rel. Min. Marco Buzzi, p. 03/06/2016). Essa posição está solidamente amparada em decisões judiciais, como exemplificado: “O companheiro sobrevivente tem direito à pensão por morte decorrente de acidente de trânsito, e a dependência financeira é presumida, não precisa ser comprovada, especialmente quando se trata de pessoas de baixa renda. “(...) a obrigação de pagamento de pensão mensal por morte de cônjuge, resultante da prática de ato ilícito, tem como termo final a data em que a vítima do evento danoso atingiria idade correspondente à expectativa média de vida do brasileiro prevista no momento de seu óbito, segundo a tabela do IBGE, ou até o falecimento do beneficiário, se tal fato vier a ocorrer primeiro”. (AgInt no REsp. 1.795.855/RS).” (TJMT, ApCiv 0000262-39.2014.8.11.0078, r. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, j. 17/04/2024, Quarta Câmara de Direito Privado, p. 18/04/2024) “[...] Nas famílias de baixa renda, há presunção relativa de dependênciaeconômica entre os seus integrantes. Precedentes. Nas famílias de baixa renda há presunção relativa de assistênciavitalícia dos filhos frente aos seus genitores, mas essa relação dedependência diminui depois que o filho completa 25 anos de idade ouconstitui sua própria família. Precedentes. Recurso especial não provido.” (REsp 1.252.961/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRATURMA, j. 06/12/2011) "Em se tratando de família de baixa renda, se presume a existência de ajuda mútua entre os integrantes da família, de modo que não é exigida prova material para a comprovação da dependência econômica em relação ao companheiro, para fins de obtenção de pensionamento mensal em virtude do falecimento deste" (STJ, AgInt no AREsp 1.672.059/RJ) “ACIDENTE DE TRÂNSITO. INDENIZAÇÃO MATERIAL E MORAL. Responsabilidade do requerido. [...] Ato ilícito configurado. Responsabilidade configurada. Pensionamento ao filho menor da vítima. Óbito do genitor do requerente que ocorreu quando este ainda era menor de idade. Dependência financeira presumida. Termo final do pensionamento. Jurisprudência que se consolidou no sentido de a pensão por morte ser devida ao filho da vítima até que este complete 25 anos de idade, quando se presume que terá concluído ensino superior ou curso profissionalizante para ingresso no mercado de trabalho de forma autossuficiente. [...].” (TJSP, ApCiv 1008460-22.2022.8.26.0637, j. 03/04/2024) Essa indenização não configura um ganho desproporcional, mas sim uma medida equitativa e necessária, destinada a amparar os dependentes diante da perda profunda de um ente querido e das oportunidades de suporte e desenvolvimento familiar que jamais se concretizarão. Por fim, destaco que o pagamento da indenização em parcela única não é compatível com a natureza da pensão por morte, conforme entendimento consolidado pelo colendo Superior Tribunal de Justiça. A jurisprudência é firme ao afirmar que a regra prevista no parágrafo único do artigo 950 do Código Civil, que autoriza o pagamento de indenização em parcela única nos casos de incapacidade permanente decorrente de lesões corporais, não se aplica às situações de pensão por morte. Nesse sentido, dispõe o STJ: “A regra do parágrafo único do artigo 950 do Código Civil, autorizando o pagamento de indenização em parcela única na hipótese da incapacidade permanente da vítima de lesões corporais, não se mostra compatível com a pensão por morte. Precedentes do STF e do STJ” (REsp 1.354.384⁄MT, Rel. Ministro Paulo De Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 18-12-2014, DJe 04-02-2015). Esse entendimento reforça que a pensão por morte deve ser paga de forma periódica, preservando sua função de garantir uma compensação contínua e previsível aos beneficiários, em conformidade com a finalidade de amparo econômico que a medida busca proporcionar. Este também é o entendimento consolidado por este Tribunal: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – FALECIMENTO DE FILHA MENOR – FAMÍLIA BAIXA RENDA – PRESUNÇÃO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA – OBSERVÂNCIA DA SÚMULA 491/STF – PAGAMENTO DE PENSÃO MENSAL – MANTIDO – MAJORAÇÃO DE QUANTUM INDENIZATÓRIO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...] A regra do parágrafo único do artigo 950 do Código Civil que possibilita o pagamento da indenização em parcela única se refere à hipótese de incapacidade permanente da vítima, sendo, portanto, inaplicável na hipótese de pensão mensal por morte, como o caso dos autos. (TJMT, ApCiv 1004015-91.2020.8.11.0040, r. JOSE LUIZ LEITE LINDOTE, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, j. 24/06/2024,p. 28/06/2024) Conclui-se, portanto, que a periodicidade no pagamento da pensão por morte é imprescindível para manter a função reparatória da indenização, garantindo estabilidade financeira aos beneficiários e alinhando-se ao princípio da continuidade do amparo necessário à manutenção do núcleo familiar. 6. CONCLUSÃO Com essas considerações, NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto por Município de Tesouro, mantendo inalterada a sentença vergastada por estes e seus próprios fundamentos. Deixo de majorar os honorários advocatícios, que deverão ser fixados quando da liquidação do julgado, nos termos do art. 85, § 4º, II, do CPC (STJ. EDCL no REsp 1.785.364/CE, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, j. 06/04/2021), observada a majoração prevista no art. 85, § 11º, do CPC, tendo em vista o desprovimento do presente Recurso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/06/2025
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