Processo nº 1003207-06.2022.8.11.0044
ID: 329348384
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1003207-06.2022.8.11.0044
Data de Disponibilização:
18/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
EDUARDO CHALFIN
OAB/PR XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003207-06.2022.8.11.0044 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Espécies de Contratos, Seguro, Indenização por D…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003207-06.2022.8.11.0044 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Espécies de Contratos, Seguro, Indenização por Dano Moral] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [ALDERICO DA SILVA FERREIRA - CPF: 050.970.353-48 (APELANTE), ELIANA NUCCI ENSIDES - CPF: 336.013.748-54 (ADVOGADO), JOAO BATISTA ANTONIOLO - CPF: 283.886.378-94 (ADVOGADO), DANIEL ANTONIOLO ESTEVAO - CPF: 318.650.618-24 (ADVOGADO), BRADESCO VIDA E PREVIDENCIA S.A. - CNPJ: 51.990.695/0001-37 (APELADO), ICATU SEGUROS S/A - CNPJ: 42.283.770/0001-39 (APELADO), EDUARDO CHALFIN - CPF: 689.268.477-72 (ADVOGADO), MAPFRE VIDA S/A - CNPJ: 54.484.753/0001-49 (APELADO), BRADESCO VIDA E PREVIDENCIA S.A. - CNPJ: 51.990.695/0001-37 (TERCEIRO INTERESSADO), MAPFRE VIDA S/A - CNPJ: 54.484.753/0001-49 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA C/C DANOS MORAIS. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTE TOTAL POR DOENÇA (IFPD). LAUDO PERICIAL DESFAVORÁVEL. IMPUGNAÇÃO TARDIA À QUALIFICAÇÃO DO PERITO. PRECLUSÃO CONFIGURADA. COBERTURA SECURITÁRIA CONDICIONADA À PERDA DA EXISTÊNCIA INDEPENDENTE. NÃO COMPROVAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME: Apelação Cível interposta contra sentença da 2ª Vara Cível da Comarca de Paranatinga/MT, que julgou improcedente Ação de Indenização Securitária c/c Danos Morais ajuizada em face de Icatu Seguros S/A. O Apelante sustenta, preliminarmente, nulidade da sentença por cerceamento de defesa em razão da nomeação de perita médica sem especialização em ortopedia, e, no mérito, pleiteia a condenação da seguradora ao pagamento de indenização securitária e compensação por danos morais, alegando ter sido acometido por doença ocupacional geradora de invalidez. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: Há duas questões em discussão: (i) verificar se a ausência de especialização da perita judicial configura nulidade da sentença por cerceamento de defesa; (ii) examinar se o Apelante faz jus à indenização securitária por Invalidez Funcional Permanente Total por Doença, conforme previsto na apólice contratada. III. RAZÕES DE DECIDIR: A parte deve apresentar impugnação à nomeação de perito judicial na primeira oportunidade de manifestação nos autos após sua designação, sob pena de preclusão, nos termos do art. 278, parágrafo único, do CPC. O Apelante não impugnou tempestivamente a nomeação da perita judicial, tendo apresentado manifestação contrária somente após a juntada do laudo desfavorável, caracterizando preclusão. O laudo pericial, ainda que elaborado por profissional sem especialização em ortopedia, contém os elementos técnicos suficientes para fundamentar a conclusão judicial, não havendo demonstração de prejuízo à parte. A cobertura securitária prevista na apólice condiciona o pagamento da indenização à comprovação de Invalidez Funcional Permanente Total por Doença, caracterizada pela perda da existência independente do segurado. O laudo pericial conclui pela ausência de invalidez funcional do autor, afirmando expressamente que o Apelante está apto para o trabalho, não estando enquadrado na cobertura contratada. Os documentos médicos apresentados pelo Apelante não são suficientes para infirmar a conclusão do laudo judicial. IV. DISPOSITIVO E TESE: 9. Recurso desprovido. Tese de julgamento: A impugnação à qualificação técnica do perito judicial deve ser apresentada na primeira oportunidade após sua nomeação, sob pena de preclusão. Não configura cerceamento de defesa a ausência de nova perícia quando o laudo apresentado é suficiente, idôneo e não impugnado tempestivamente. A indenização securitária por Invalidez Funcional Permanente Total por Doença somente é devida quando comprovada a perda da existência independente do segurado, nos termos da apólice contratada e da Circular SUSEP nº 302/2005. Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, arts. 156, 278, parágrafo único, 465; CDC, arts. 2º e 3º; Circular SUSEP nº 302/2005, art. 17. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.039.422/PE, Rel. Min. Assusete Magalhães, 2ª Turma, j. 19.10.2017, DJe 27.10.2017; STJ, AgInt no REsp 1.644.779/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 08.08.2017, DJe 25.08.2017; TJMT, AC 1000845-31.2022.8.11.0044, Rel. Des. Sebastião de Arruda Almeida, j. 21.01.2025; TJGO, AC 5604437-37.2019.8.09.0137, Rel. Des. Héber Carlos de Oliveira, j. 08.04.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por ALDERICO DA SILVA FERREIRA, contra a sentença proferida pelo Juiz da 2ª Vara Cível da Comarca de Paranatinga/MT, Dr. Leonardo Lucio Santos, que, nos autos da Ação de Indenização Securitária c/c Danos Morais ajuizada em desfavor de ICATU SEGUROS S/A, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. Em suas razões recursais, o Apelante sustenta, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, sob o argumento de que a prova técnica fundamental para o deslinde da controvérsia foi produzida por médica perita sem especialização na área de ortopedia ou traumatologia, áreas diretamente relacionadas às lesões por ele alegadas – tendinopatias e bursite nos ombros, decorrentes de esforço físico repetitivo no ambiente de trabalho. Defende que a profissional designada, com formação em Ginecologia e Obstetrícia e em Medicina Legal, não detém qualificação técnica compatível com o objeto da perícia, conforme exigido pelos artigos 156 e 465 do Código de Processo Civil, salientando que a ausência de especialização compromete a idoneidade técnica do laudo pericial, gerando ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa. No mérito, realça que há nos autos farto conjunto documental – composto por laudos médicos, exames de imagem, receitas e relatórios clínicos – que atesta, de forma clara e consistente, a existência de lesões incapacitantes e a necessidade de afastamento das atividades laborativas. Destaca que as conclusões da perita judicial destoam dos elementos clínicos constantes nos autos e não apresentam fundamentação suficiente, havendo, inclusive, contradição entre o outro laudo colacionado no processo. Com essas considerações, requer o provimento do recurso para que seja anulada a sentença e determinada a reabertura da instrução probatória, com a nomeação de perito especializado em Ortopedia e Traumatologia. Subsidiariamente, pleiteia a valoração das provas documentais acostadas aos autos e a consequente condenação da seguradora ao pagamento da indenização securitária prevista no contrato. O Apelante litiga sob o manto da justiça gratuita, conforme certificado ao ID 296168583. Em suas contrarrazões, o Apelado pugnou pelo desprovimento recursal (ID 295273489). É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R V O T O – PRELIMINAR (CERCEAMENTO DE DEFESA) EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Cinge-se dos autos que ALDERICO DA SILVA FERREIRA ajuizou Ação de Indenização Securitária c/c Danos Morais em desfavor de ICATU SEGUROS S/A, afirmando ser beneficiário de Seguro de Vida em Grupo, estipulado por suas empregadoras e garantido pela ré a todos os funcionários. Ressaltou que a apólice contratada prevê cobertura para os eventos de morte, morte acidental, invalidez permanente por acidente e invalidez funcional permanente total por doença. Alegou ter sido acometido por enfermidade de natureza ocupacional, equiparada a acidente de trabalho, o que, nos termos contratuais, assegura-lhe o direito à percepção da indenização securitária correspondente, bem como à reparação por danos morais decorrentes da negativa indevida de cobertura. Após a devida instrução processual, o Magistrado singular julgou improcedente a demanda, fundamentando-se no laudo pericial que concluiu pela inexistência de invalidez funcional permanente total por doença do autor. Contra essa sentença recorre o Apelante, suscitando, preliminarmente, a nulidade do laudo pericial e, por consequência, da sentença que nele se fundamentou, uma vez que a perita nomeada pelo juízo não possui especialidade na área médica objeto da lide. Sem maiores delongas, após detida análise dos autos, verifico que não assiste razão ao Apelante quanto à preliminar arguida. De início, cumpre ressaltar que a convicção do Magistrado se forma por diversos meios, dentre os quais se destaca a prova pericial. Isso ocorre porque, em certas demandas, devido ao alto grau de complexidade, as provas testemunhais ou mesmo documentais se mostram insuficientes para a comprovação do fato em litígio. Sendo assim, torna-se necessária a realização de perícia para subsidiar a decisão judicial. Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery ensinam: “O objeto da prova pericial é o fato ou os fatos que foram alegados na inicial ou na contestação que careçam de perícia para sua cabal demonstração. Se a alegação do fato surgiu durante o processo, de forma fugaz e pouco consistente, apenas como recurso de retórica, não pode ter o condão de impor a necessidade de produção de prova.” (Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 778). Assim, não se pode olvidar que a finalidade da perícia é a de esclarecer da forma mais precisa possível as questões técnicas suscitadas no caso concreto, de modo a propiciar a correta solução do litígio, sendo recomendável que o expert detenha especialidade no campo da medicina que guarde estreito vínculo com o caso sob exame. No caso concreto, verifica-se que o Magistrado de origem afastou a impugnação ao laudo pericial apresentado pelo autor em razão da ausência de especialidade da perita em ortopedia nos seguintes termos: “Inicialmente, cumpre destacar que a impugnação da parte autora em relação a especialidade da perita está preclusa, eis que a parte não impugnou em momento oportuno a decisão saneadora que nomeou a perita judicial, apresentando manifestação contrária somente após apresentação do laudo médico desfavorável. Ademais, a fim de evitar futuras interposições de recursos, esclareço que, em que pese a discordância da parte autora quanto ao conteúdo da perícia, entendo que as manifestações desacompanhadas de parecer de assistente técnico não ultrapassam o mero inconformismo, razão pela qual entendo que o laudo apresentado é completo, contendo todos os requisitos necessários para munir este juiz de elementos suficientes à prolação de futura sentença.” De fato, o Apelante somente se manifestou a respeito da qualificação da perita após a apresentação do laudo que concluiu em seu desfavor, não tendo impugnado oportunamente a decisão que determinou a nomeação da profissional, muito embora tenha se manifestado nos autos em duas oportunidades antes da juntada do laudo (apresentando quesitos e peticionando sobre a demora na entrega do laudo). Nesse contexto, não se pode olvidar que a impugnação quanto à especialidade médica do perito deve ser apresentada na primeira oportunidade em que a parte for intimada após a decisão que o nomeia, conforme preceitua o artigo 278, parágrafo único, do Código de Processo Civil, sob pena de preclusão. Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça “(...) firmou orientação no sentido de que a discordância para com a formação profissional do perito judicial deve ser deduzida na primeira oportunidade que a parte tem para se manifestar nos autos, sob pena de preclusão.” (AgInt no AREsp n. 1.039.422/PE, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 19/10/2017, DJe de 27/10/2017) No mesmo sentido: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA DE SEGURO OBRIGATÓRIO (DPVAT)– IMPROCEDÊNCIA – INVALIDEZ PERMANENTE NÃO VERIFICADA – IMPUGNAÇÃO AO LAUDO PERICIAL REALIZADO POR PERITO JUDICIAL NÃO CADASTRADO – NULIDADE – NÃO OCORRÊNCIA – PRECLUSÃO DA MATÉRIA E PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS – PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO REJEITADOS. O instituto da exceção de suspeição e impedimento de perito (art. 465, § 1º, I, CPC) dispõe que: Incumbe às partes, dentro de 15 (quinze) dias contados da intimação do despacho de nomeação do perito: arguir o impedimento ou a suspeição do perito, se for o caso”, restando pois, preclusa a exceção de suspeição requerida após a realização da perícia. A não observância à formalidade prevista no Código de Processo Civil para nomeação de perito judicial (art . 156 do CPC/15) não implica em sua nulidade quando o ato, apesar de praticado em desconformidade com a lei, atingir a sua finalidade, conforme o princípio da Instrumentalidade das Formas, ressalvada a demonstração de prejuízo para a parte. (TJ-MT 10042922920178110003 MT, Relator.: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 27/01/2021, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/01/2021) (g.n.) “APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO OBRIGATÓRIO. DPVAT. COBERTURA. INDENIZAÇÃO. IMPUGNAÇÃO. ESPECIALIDADE. PERITO. PRECLUSÃO. DANO NEUROLÓGICO. VALORAÇÃO. PROVA. PERSUASÃO RACIONAL. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. RECURSO DESPROVIDO. (...) 3. A impugnação a respeito da especialidade médica do perito deve ser feita logo após a decisão que o nomeou, pois ao contrário ficará configurada a preclusão. 4. É inapropriado impor ao Juiz a realização de perícia para o exame de eventual dano neurológico nos casos em que os documentos juntados aos autos comprovam a inexistência de referidos danos. Aplica-se ao caso, portanto, a regra prevista no art. 472 do CPC. 5 . Diante da valoração da prova, o magistrado segue o sistema da persuasão racional, metodologia segundo a qual o juiz deverá formar seu convencimento de acordo com os elementos probatórios coligidos aos autos, com a devida justificativa dos critérios adotados para tanto. 6. Apelação conhecida e desprovida. (TJ-DF 07250490320188070001 DF 0725049-03 .2018.8.07.0001, Relator.: ALVARO CIARLINI, Data de Julgamento: 03/10/2019, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 10/10/2019) (g.n.) APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO PREVIDENCIÁRIA - PERÍCIA - ESPECIALIDADE - QUESITAÇÃO COMPLEMENTAR - PRECLUSÃO. "A impugnação da nomeação do perito deve ser alegada na primeira oportunidade de falar nos autos, sob pena de preclusão" (STJ, AgRg no AREsp 428.933/SP). Sendo o processo uma marcha para a frente, não pode a parte pedir nova perícia depois de acatar a especialidade e, em seguida, apresentar quesito complementar, postulando em seguida por nomeação de profissional em outra área, por se tratar de inconformismo que não observa as fases do processo. (TJ-MG - AC: 10000212088256001 MG, Relator.: José Augusto Lourenço dos Santos, Data de Julgamento: 03/02/2022, Câmaras Cíveis / 12ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 09/02/2022) (g.n.) Muito embora tenha decidido, em casos semelhantes, por declarar a nulidade da sentença e determinar o retorno dos autos à origem para realização de nova perícia por expert com especialização no campo da medicina que guarde estreito vínculo com o caso, tais decisões foram tomadas no âmbito de processos em que houve a devida insurgência acerca da nomeação do perito na primeira manifestação da parte nos autos após a nomeação do profissional. Na hipótese, considerando que o autor não apresentou impugnação à qualificação técnica do perito nomeado no momento oportuno, por ocasião da designação do expert, impõe-se o reconhecimento da preclusão quanto à alegação de ausência de especialidade. Assim, revela-se adequada a decisão que indeferiu a realização de nova perícia por profissional médico com especialização em ortopedia, não havendo que se falar em cerceamento de defesa. Essas são as razões pelas quais REJEITO a preliminar arguida pelo Apelante. É como voto. V O T O – MÉRITO EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Ultrapassada a questão preliminar, resta saber se há nos autos conjunto probatório suficiente a alterar a sentença que concluiu pela ausência de invalidez funcional permanente total por doença do segurado e inexistência do dever da seguradora ré em adimplir a indenização securitária contratada. Para melhor elucidação, transcrevo a sentença impugnada: “(...) Restringe-se o objeto da lide à cobrança de seguro em grupo firmado pelo autor em desfavor da ré, a fim de condená-la ao pagamento da indenização por invalidez e danos morais. A lide guarda relação com o Código de Defesa do Consumidor, eis que o autor e a seguradora se enquadram, respectivamente, nos conceitos definidos pelos artigos 2º e 3º da referida norma. Analisando a apólice de Seguro, verifico que ela prevê as seguintes coberturas: a) Morte; b) Morte Acidental; c) Invalidez permanente total ou parcial por acidente; d) Invalidez funcional permanente total por doença; e) Doenças Congênitas e f) Auxílio Funeral e Cesta Básica (ID. 95833940). Na hipótese de invalidez funcional permanente total por doença, a qual encontra amparo junto ao art. 17, da Circular 302/05, da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), do Ministério da Fazenda, a qual conceitua a IFPD da mesma forma que a apólice contratada, a indenização será devida quando o segurado apresentar perda de sua capacidade de existência independente, a qual se caracteriza pela ocorrência de quadro clínico incapacitante, decorrente de doença que inviabilize, de forma irreversível, o pleno exercício das relações autônomas do segurado, in verbis: (...) Certo é, portanto, que o risco coberto pela apólice demanda a perda da existência independente e autonômica do segurado, o que não se configura no presente caso. Explico. Em exame minucioso dos documentos carreados, em especial o laudo pericial realizado em juízo, entendo que o pleito não merece procedência. Isso porque, o laudo médico concluiu que a parte autora não apresenta incapacidade. Vejamos: “CONCLUSÃO: Com base nos elementos e fatos expostos, conclui-se que o autor está apto para a atividade laboral e, portanto, não foi comprovada invalidez funcional.” Oportunamente, consigno que os documentos médicos apresentados pela parte autora não foram aptos a atestarem a alegada invalidez. Bem se sabe que o julgador não está vinculado a nenhuma prova dos autos para proferir seu julgamento, cabendo-lhe apenas fundamentar o ato decisório de forma motivada. Contudo, entende-se que, na hipótese destes autos, a prova pericial é determinante ao deslinde deste feito, haja vista que esclarece questões cujo domínio foge dos limites de conhecimento judicante do magistrado no exercício de sua função. Pois, a dúvida quanto à aferição da capacidade laboral da parte autora, inolvidável que o laudo pericial traz em seu conteúdo informações fundamentais que, analisadas em conjunto com o restante do acervo probatório do feito, permitem a formação de convicção segura para o julgamento. A perita concluiu que não há invalidez por acidente ou doença, requisito imprescindível para concessão do pedido inicial, de modo que não há nos autos elementos autorizativos aptos para concessão do provimento judicial pleiteado. Assim, restando satisfatoriamente comprovado nos autos que não há invalidez funcional permanente total por doença do segurado, não faz ele jus ao recebimento da indenização securitária contratada. (...) Neste espeque, em que pese a solidariedade deste juízo com o quadro médico do autor, cuida-se de questão contratual, não se vislumbrando, na análise dos autos, elementos que permitam a desconstituição da cláusula elaborada, posto que clara, expressa e em consonância com os termos da circular da superintendência responsável pelos planos de seguro. Assim, não se materializado o risco coberto pelo contrato de seguro celebrado entre as partes, através da empregadora do autor, estipulante da avença, impõe-se a rejeição do pedido de indenização securitária e consequente, fica prejudicada a análise do pedido indenizatório por danos morais”. Conforme bem destacado pelo Magistrado sentenciante, a apólice contratada pelo Apelante prevê cobertura securitária para os casos de morte, morte acidental, invalidez permanente por acidente (IPA) e invalidez funcional permanente total por doença. Logo, como se vê, o risco coberto pela apólice não se refere à simples invalidez decorrente de doença, mas sim à perda da existência autônoma do segurado, caracterizada quando o quadro clínico incapacitante compromete, de forma irreversível, o pleno exercício de suas atividades com independência funcional e pessoal. A garantia do pagamento da indenização por Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (IFPD) se dá, portanto, quando a invalidez é consequência de doença que cause a perda da existência independente do segurado, ocorrida quando o quadro clínico incapacitante inviabilizar de forma irreversível o pleno exercício das suas relações autonômicas (art.17 da Circular SUSEP n. 302/2005). No caso em comento, o Laudo Médico pericial concluiu que “o autor está apto para a atividade laboral e, portanto, não foi comprovada invalidez funcional”. Além disso, a perita afirmou especificamente que o autor não está enquadrado como IFPD ao responder negativamente o seguinte quesito: “12-Incapacidade funcional total e permanente (IFPD) é a perda da existência independente. Não tem nenhuma relação com qualquer limitação ou incapacidade para o trabalho do autor. Será caracterizada pela ocorrência de quadro clínico incapacitante, decorrente de DOENÇA, que inviabilize de forma irreversível a existência independente (Circular SUSEP). Esta é a situação do Autor?”. O conjunto probatório apresentado pelo Apelante não se revela suficiente para comprovar a existência de invalidez funcional permanente e total por doença, nos termos exigidos pela apólice contratada, não sendo possível concluir que sua condição clínica o incapacite de forma irreversível para o exercício de suas relações autonômicas, requisito indispensável à percepção da indenização securitária por Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (IFPD). Ademais, conforme consignado no laudo pericial, o autor permanece desempenhando normalmente suas atividades laborais como desossador, circunstância que corrobora o entendimento adotado pelo juízo de origem ao julgar improcedente o pedido. Em relação à cláusula prevista na apólice, o Superior Tribunal de Justiça já reconheceu, no julgamento do recurso repetitivo (Tema 1068) que “não é ilegal ou abusiva a cláusula que prevê a cobertura adicional de invalidez funcional permanente total por doença (IFPD) em contrato de seguro de vida em grupo, condicionando o pagamento da indenização securitária à perda da existência independente do segurado, comprovada por declaração médica”. A propósito: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SEGURO DE VIDA EM GRUPO COM ADICIONAL DE COBERTURA POR INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTETOTAL POR DOENÇA - IFPD. INCAPACIDADEPERMANENTEPARA A PROFISSÃO. DESEMPENHODE ATIVIDADESLABORAIS. DEFINIÇÃO DA APÓLICE: INVALIDEZ FUNCIONAL. ATIVIDADES AUTONÔMICAS DA VIDA DIÁRIA. PRESERVAÇÃO. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA INDEVIDA. SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ. NÃO INCIDÊNCIA.(...) 3. Embora a cobertura IFPD (invalidez funcional) seja mais restritiva que a cobertura ILPD (invalidez profissional ou laboral), não há falar em sua abusividade ou ilegalidade, tampouco em ofensa aos princípios da boa-fé objetiva e da equidade, não se constatando também nenhuma vantagem exagerada da seguradora em detrimento do consumidor. De qualquer modo, a seguradora deve sempre esclarecer previamente o consumidor e o estipulante (seguro em grupo) sobre os produtos que oferece e existem no mercado, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e as suas consequências, de modo a não induzi-los em erro. 4. Não incide nos óbices das Súmulas nºs 5 e 7/STJ o julgado que considera dados do contrato e do estado de saúde do autor constantes do próprio acórdãoestadual.5. Agravo interno não provido.” (STJ - AgInt no REsp: 1644779 SC 2016/0329767-7, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 08/08/2017, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/08/2017) (g.n.) “(...) 3. O laudo pericial conclusivo demonstrou a ausência de invalidez permanente funcional da apelante, não havendo provas suficientes para contestar as conclusões do perito. 4. Inexistência de argumentos ou provas capazes de demonstrar erro no laudo pericial, e a alegação de necessidade de nova perícia não se sustenta, uma vez que o laudo é adequado e válido. 5. O laudo pericial concluiu que a parte autora apresenta incapacidade parcial e temporária, não comprovando a invalidez funcional permanente total por doença. 6. A apólice de seguro prevê cobertura apenas para casos de invalidez funcional permanente total por doença, não sendo devida a indenização em casos de incapacidade parcial e temporária. 7. Inexistência de comprovação de invalidez funcional permanente total por doença, conforme exigido pela apólice de seguro. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “A indenização securitária por invalidez funcional permanente total por doença só é devida quando comprovada a perda da existência independente do segurado, conforme previsto na apólice de seguro.” (...)” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10008453120228110044, Relator.: SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Data de Julgamento: 21/01/2025, Quinta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 23/01/2025) (g.n.) “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE VIDA COLETIVO. CDC. APLICABILIDADE. INVALIDEZ FUNCIONAL POR DOENÇA. PERDA DA EXISTÊNCIA INDEPENDENTE. NÃO COMPROVAÇÃO. PREVISÃO CONTRATUAL. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. INCAPACIDADE LABORATIVA. COBERTURA NÃO CONTRATADA. LIMITES DA APÓLICE. DEVER DE INFORMAÇÃO. OBRIGAÇÃO DO ESTIPULANTE. SENTENÇA MANTIDA. (...) 2. Por ocasião do julgamento dos Recursos Especiais nº 1845943/SP e 1867199/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema 1.068), o Superior Tribunal de Justiça fixou tese jurídica no sentido de que não há ilegalidade ou abusividade na cláusula prevista em contrato de seguro de vida em grupo com cobertura adicional de invalidez funcional permanente total por doença (IFPD) que condiciona a indenização à perda da capacidade de existência independente do segurado. 3. Considerando que não há comprovação nos autos que a autora/apelante perdeu a capacidade de existência independente, de modo que não restou caracterizada a invalidez funcional permanente e total por doença (IFPD) coberta pela apólice, a qual não se confunde com invalidez laborativa, resulta que a requerente não faz jus ao recebimento da indenização pleiteada, cuja apólice não prevê cobertura para o caso de incapacidade para o trabalho. 4. No julgamento dos Recursos Especiais nº 1.874.811/SC e 1.874.788/SC, o Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese jurídica: “na modalidade de contrato de seguro de vida coletivo, cabe exclusivamente ao estipulante, mandatário legal e único sujeito que tem vínculo anterior com os membros do grupo segurável (estipulação própria), a obrigação de prestar informações prévias aos potenciais segurados acerca das condições contratuais quando da formalização da adesão, incluídas as cláusulas limitativas e restritivas de direito previstas na apólice mestre.” (Tema repetitivo nº 1.112). APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA.” (TJGO, AC 5604437-37.2019.8.09.0137, Rel. Desembargador HÉBER CARLOS DE OLIVEIRA, 1ª Câmara Cível, julgado em 08/04/2024, DJe de 08/04/2024) (g.n.) Assim, não restando comprovada a existência de invalidez funcional permanente e total por doença capaz de impedir o Apelante de exercer suas atividades de forma autônoma, não se configura o direito à percepção da cobertura securitária pleiteada, nos termos previstos na apólice contratada. Ante o exposto, CONHEÇO do recurso interposto e lhe NEGO PROVIMENTO, mantendo incólume a sentença combatida. Estando desprovido o recurso, majoro a condenação em honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa, atendendo ao que dispõe o art. 85, §11, do CPC, mantende a suspensão da exigibilidade em razão da justiça gratuita concedida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025
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