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Processo nº 1012380-37.2023.8.11.0006

ID: 278250420

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1012380-37.2023.8.11.0006

Data de Disponibilização: 26/05/2025

Polo Ativo:

JUNIO SOUTO RODRIGUES

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JESUS VIEIRA DE OLIVEIRA

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ANDREI TEIXEIRA COSTA TAKAKI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1012380-37.2023.8.11.0006 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Limitação de Juros, Bancários] Relator: Des(a). … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1012380-37.2023.8.11.0006 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Limitação de Juros, Bancários] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES] Parte(s): [JUNIO SOUTO RODRIGUES - CPF: 062.739.541-43 (APELANTE), JESUS VIEIRA DE OLIVEIRA - CPF: 924.435.911-15 (ADVOGADO), BANCO MERCANTIL DO BRASIL SA - CNPJ: 17.184.037/0001-10 (APELADO), ANDREI TEIXEIRA COSTA TAKAKI - CPF: 712.279.701-53 (ADVOGADO), ISABELLE DE OLIVEIRA AMORIM E SILVA - CPF: 070.958.575-63 (ADVOGADO), LUCAS LAENDER PESSOA DE MENDONCA - CPF: 012.546.246-86 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE: JUNIO SOUTO RODRIGUES APELADO: BANCO MERCANTIL DO BRASIL SA. EMENTA. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. EMPRÉSTIMO PESSOAL. ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS. NÃO CONSTATAÇÃO. ÍNDICES DENTRO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO. CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS. INADMISSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PREVISÃO EM CONTRATO. LEGITIMIDADE DA COBRANÇA. PRECEDENTES STJ. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DESCABIMENTO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de apelação interposto por consumidora em face de sentença que julgou improcedente pedido de revisão de contrato bancário, mantendo a validade da cobrança de juros remuneratórios, capitalização mensal, utilização da Tabela Price e cobrança de seguro prestamista. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Discussão acerca da legalidade dos juros remuneratórios pactuados, da capitalização de juros, da validade do sistema de amortização por Tabela Price e da legalidade da contratação de seguro prestamista. III. RAZÕES DE DECIDIR A taxa de juros contratada (9,99% a.m.) não se mostra abusiva frente à taxa média de mercado divulgada pelo BACEN (5,55% a.m. e 91,25% a.a.) no período da contratação. A capitalização mensal é válida, por estar expressamente pactuada em contrato celebrado após a edição da MP nº 1.963-17/2000 (MP nº 2.170-36/2001). A Tabela Price, por si só, não configura anatocismo e sua utilização é considerada legítima e amplamente aceita. A contratação do seguro prestamista se deu de forma facultativa e com possibilidade de escolha do consumidor, não configurando venda casada. IV. DISPOSITIVO E TESE. Recurso conhecido e desprovido. Teses de julgamento: “A jurisprudência do STJ orienta que a circunstância de a taxa de juros remuneratórios, praticada pela instituição financeira, exceder a taxa média do mercado, não induz, por si só, à conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa apenas em um referencial a ser considerado, e não em limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras”. “O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price”. “Havendo previsão contratual, não há ilegalidade na incidência da capitalização mensal dos juros, posto que foi pactuada de forma expressa.” “Se o contrato sob revisão não padece de qualquer abusividade ou ilegalidade nos encargos cobrados, não há se falar em devolução de valores”. “A contratação facultativa de seguro prestamista não configura venda casada”. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, III e VIII; 46 e 52, II; MP nº 2.170-36/2001. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.061.530/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, S2, j. 22.10.2008, DJe 10.03.2009; STJ, AgInt no AREsp 2276235/RS, Rel. Min. Raul Araújo, j. 05.06.2023, DJe 13.06.2023; STJ, REsp 1.388.972/SC, Rel. Min. Marco Buzzi, j. 08.02.2017; STJ, AgRg no Ag 707143/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 25.05.2010; TJMT, Ap 78790/2017, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 23.08.2017, DJE 25.08.2017; TJMT, N.U 1006335-12.2023.8.11.0040, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 27.08.2024, DJE 30.08.2024. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por JUNIO SOUTO RODRIGUES, ora Apelante, contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Cáceres - MT, que nos autos da Ação Revisional de Contrato, ajuizada em face do Apelado BANCO MERCANTIL DO BRASIL S.A, julgou improcedente os pedidos iniciais, ante a inexistência de ilegalidade na cobrança de juros praticada pelo banco apelado, em contrato de empréstimo pessoal entabulado entre as partes. Em suas razões recursais a parte recorrente invoca os seguintes questionamentos fático-jurídicos: Da ilegalidade na cobrança dos juros remuneratórios. Da indevida capitalização de juros. Da substituição da Tabela Price pela Gauss. Da repetição do indébito dos valores pagos indevidamente. Dos danos morais suportados. Recurso tempestivo e isento de recolhimento de custas. (ID 284478351). A parte recorrida apresenta suas contrarrazões, rebatendo, no mérito, as alegações da recorrente, defendendo o desprovimento recursal. (ID. nº 283222857). É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador V O T O R E L A T O R APELANTE: JUNIO SOUTO RODRIGUES APELADO: BANCO MERCANTIL DO BRASIL SA. VOTO Egrégia Câmara: Mérito Recursal 1.1. Dos juros remuneratórios acima da taxa média do mercado. De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Conforme relatado anteriormente, extrai-se dos presentes autos, que as partes entabularam contrato de empréstimo pessoal, valor total de R$ 1.580,73 (mil quinhentos e oitenta reais e setenta e três centavos), a serem pagos em 2 parcelas mensais, no importe de R$ 971,83 (novecentos e setenta e reais e oitenta e três centavos). A parte Apelante sustenta, em síntese,que a modalidade de financiamento, por ela contratado com a apelada, deve ser revisado, eis que estaria eivada de abusividades. Assevera que no presente caso, restou utilizado método de amortização desvantajoso ao consumidor (Tabela Price, que adotaria amortização a partir de juros compostos, exponenciando o saldo devedor). Afiança que a aplicação de juros capitalizados acima do permitido em lei, além de ilegal, oneraria excessivamente o valor do negócio jurídico firmado, eis que no contrato há estipulação de capitalização, conhecida também como anatocismo. Assim, sob a alegação de cobrança indevida, requer provimento deste Recurso, a fim de que a sentença seja reformada para o que o contrato firmado entre as partes seja revisado, com a devida compensação dos valores pagos a maior, como reanálise das taxas abusivas e nulidade das cláusulas indevidas, bem como a utilização do método de amortização. Lado outro, aduz a instituição financeira apelada, que no presente caso, não há qualquer ilegalidade na cobrança dos valores, bem como, que não há que se falar em onerosidade excessiva praticada, conforme demonstrado por meio de documentos acostados aos autos. Assevera ainda, que fora devidamente cumprido os critérios estabelecidos pelo STJ no que se refere a cobranças tarifárias. Por fim, afirma que a sentença vergastada não merece reparos, pois, fora devidamente constatado a regularidade da contratação e serviços efetivamente prestados. Pois bem. Inicialmente, cumpre ressaltar que o caso é de relação jurídica sujeita aos efeitos do Código de Defesa do Consumidor sendo que neste sentido é a Súmula do Superior Tribunal de Justiça. Vejamos: Súmula 297/STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”. Súmula 479/STJ: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. Dessa forma é aplicável ao caso o Código de Defesa do Consumidor que determina a inversão do ônus da prova em razão de relação consumerista prevista no artigo 6º, VIII, in verbis: “Art. 6°. São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. Quanto aos juros remuneratórios, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, consolidou o entendimento de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação definida na Lei de Usura (Súmula n. 596/STF), bem como de que a estipulação acima de 12% ao ano, por si só, não configura abuso. Ainda, no julgamento do mencionado repetitivo, definiu que é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e demonstrado o excesso capaz de colocar o consumidor em vantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC. Veja-se: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO. (...)I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada ? art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.(...)” (STJ - REsp: 1061530 RS 2008/0119992-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 22/10/2008, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/03/2009 RSSTJ vol. 34 p. 216 RSSTJ vol. 35 p. 48) (grifo nosso) Na oportunidade, foi rechaçada a possibilidade de se estabelecer um critério genérico e universal para se aferir a abusividade dos encargos remuneratórios, restando consignado que a abusividade da taxa de juros contratada deve ser demonstrada de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, já que a média de mercado não é um limitador, mas um referencial a ser seguido. A propósito: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE MÚTUO. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. TAXA MÉDIA DE MERCADO. COBRANÇA ABUSIVA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência do STJ orienta que a circunstância de a taxa de juros remuneratórios, praticada pela instituição financeira, exceder a taxa média do mercado, não induz, por si só, à conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa apenas em um referencial a ser considerado, e não em limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras (REsp 1.061.530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe de 10/3/2009). 2. No caso concreto, no entanto, a Corte de origem concluiu pelo caráter abusivo dos juros remuneratórios pactuados, pois fixados em 101,22% ao ano, enquanto a taxa média de mercado, para o mesmo período, atingiu o patamar de 27,89% ao ano, o que impõe sua redução. 3. Agravo interno desprovido.” (STJ - AgInt no AREsp: 2276235 RS 2023/0005973-0, Relator: RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 05/06/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/06/2023) (grifo nosso) Denota-se que no contrato firmado entre as partes foi estipulada a incidência de juros remuneratórios de 9,99% ao mês. (ID nº 210208718). Desta feita, em consulta ao Sistema Gerenciador de Séries Temporais do Banco Central do Brasil – SGS, a taxa média de juros para a modalidade de contrato firmado entre as partes em junho de 2023 era de 5,55% ao mês e 91,25% a.a., de modo que não se vislumbra a alegada discrepância em relação à taxa média praticada no mercado financeiro paraa modalidade de contrato pactuada entre as partes ou qualquer excesso capaz de colocar o consumidor em vantagem exagerada. Além disso, está expressamente previsto no contrato que, além dos juros mensais, a avença estipulou a incidência de capitalização de tais juros, assim como a cobrança de outras taxas, tarifas e tributos, tudo a compor o denominado “custo efetivo total”, ou seja, o total de encargos que conduzem à prestação mensal final. Nesta senda, visualiza-se a previsão de custo efetivo total de 10,73% a.m., ou seja, o percentual aplicado estaria dentro dos patamares permitidos. Restando referidas taxas inferiores à taxa média do mercado divulgada pelo BACEN – Banco Central – aplicada no período na modalidade contratada, não há que se falar em abusividade como narrado na inicial e, portanto, o decisum vergastado merece reforma neste ponto recursal. Da ilegalidade na capitalização de juros. A apelante defende a ilegalidade da capitalização dos juros sem a expressa anuência do contratante. Sobre a questão, prevalece no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que, nos contratos firmados posteriormente à entrada em vigor da MP n. 1.963-17/2000, atualmente reeditada sob o n. 2.170-36/2001, a capitalização mensal dos juros é lícita, desde que pactuada, de forma clara e expressa. Nesse sentido, dispõe o enunciado da Súmula 539, do Superior Tribunal de Justiça, e a tese firmada no citado REsp 1.388.972/SC, conforme segue: Súmula 539-STJ É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após, 31/3/2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor como MP nº 2.170-01, desde que expressamente pactuada. [...] A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida quando houver expressa pactuação. [...] (STJ. 2ª Seção. REsp 1.388.972-SC, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 8/2/2017 . Info 599). Especificamente quanto à forma de pactuação, no Superior Tribunal de Justiça se sobrepõe o entendimento que ela pode ser considerada como “clara e expressa” quando a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual é superior ao duodécuplo da mensal, vejamos: “AGRAVO REGIMENTAL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1- O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 973.827/RS, Relª para acórdão Minª Maria Isabel Gallotti, submetido ao procedimento dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), assentou entendimento de que é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31/3/2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor como MP nº 2.170-01, desde que expressamente pactuada. 2 - A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para caracterizar a expressa pactuação e permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. 3- Agravo regimental provido.” (AgRg no AREsp 63478/SC, 4ª Turma Rel. Min. Marco Buzzi, j. 06.11.2012) Desse modo, em casos que a taxa de juros anual é superior à soma das 12 parcelas da taxa mensal, resta-se pactuada a capitalização de juros e, portanto, em conformidade com a supracitada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Da substituição da Tabela Price pela Gauss. O apelante aduz que a inserção de juros compostos, com aplicação de capitalização diária, inclusive com utilização da Tabela Price, não foi expressamente prevista no contrato. Desse modo, assevera que a falta de previsão sobre a forma de capitalização de juros acarreta violação ao direito de informação do consumidor, nos termos dos arts. 6º, III; 46 e 52, II, do Código de Defesa do Consumidor, e resulta no direito do apelante para que ocorra o recálculo dos valores pela taxa de juros contratada de forma simples. Pois bem. Apesar das alegações do apelante, também deve ser mantida a sentença, neste item. Em relação à Tabela Price, esta, por si só, não constitui capitalização de juros e a sua utilização para correção do saldo devedor não induz à prática de anatocismo. A propósito na doutrina de ARNALDO RIZZARDO: Sistema da Tabela Price, ou sistema francês de amortização, as prestações, desde o início do contrato, mantêm valor uniforme. As prestações são constantes, em termos reais, para todos os meses do financiamento. Sendo o valor da prestação fixo, a utilização da Tabela Price implica em se realizar pequenas amortizações iniciais do saldo devedor, sendo a maior parte da prestação representada pelo pagamento de juros. (Contratos de Crédito Bancário. 7ª ed. 2007, p.173). E na maioria dos casos, é este sistema de amortização que permite ao adquirente a realização do negócio, dada a estabilidade concedida ao financiamento de longo prazo, e, uma vez contratado, não há ser reputado ilegal ou abusivo. Registre-se, ainda, que o mencionado sistema francês é de larga aplicabilidade, não somente neste país, como em diversos outros. Ademais, em muitas situações é esse sistema de amortização que permite ao adquirente a realização do negócio, haja vista revelarem-se os valores das parcelas iniciais do contrato bastante acessíveis. Sobre o tema, cito trecho de julgado do Superior Tribunal de Justiça: [...] Tabela Price. Legalidade. O critério de prévia atualização do saldo devedor e posterior amortização não fere a comutatividade das obrigações pactuadas no ajuste, uma vez que a primeira prestação é paga um mês após o empréstimo do capital, o qual corresponde ao saldo devedor. Precedentes...” (STJ, AgRg no Ag 707143/DF,Rel. Ministra Nancy Andrighi, j. 25/05/2010). Desse modo, não há dúvidas de que a incidência da Tabela Price, como critério de amortização de financiamento em contratos bancários, constitui método legal, pois a sua utilização não caracteriza prática de anatocismo e muito menos é abusiva. Neste sentido é a jurisprudência hodierna: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL – CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO – CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA – JULGAMENTO DA LIDE SEM REALIZAÇÃO DE PERÍCIA CONTÁBIL – DESNECESSIDADE – MATÉRIA DE DIREITO – CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS – INADMISSIBILIDADE – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS – PACTUAÇÃO EXPRESSA – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA – SENTENÇA ESCORREITA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price.” (N.U 1004004-79.2020.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/10/2023, Publicado no DJE 23/10/2023) “CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL – RECURSOS DE APELAÇÃO – REVISIONAL DE CONTRATO –CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – EMPRÉSTIMO PESSOAL – PROVA PERICIAL CONTÁBIL – DESNECESSIDADE – PRELIMINAR REJEITADA – CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS – INADMISSIBILIDADE – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS – PACTUAÇÃO EXPRESSA – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA – LEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS PREVISTOS NO CONTRATO – COMPROVAÇÃO – TAXA FIXADA DE ACORDO COM MÉDIA PRATICADA PELO MERCADO NA ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO – ABUSIVIDADE – NÃO COMPROVADA – TARIFA DE CADASTRO – COBRANÇA VÁLIDA – ABUSIVIDADE NÃO DEMONSTRADA – RESP. nº 1251331-RS E TEMA 958 do STJ – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (...) 3. Não há irregularidade na utilização da Tabela Price, em razão da distribuição dos juros no decorrer do contrato que permite que todas as parcelas a serem pagas sejam de valor constante. 4. O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price. 5. Havendo previsão contratual, não há ilegalidade na incidência da capitalização mensal dos juros, posto que foi pactuada de forma expressa.” (N.U 1006335-12.2023.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/08/2024, Publicado no DJE 30/08/2024) Da devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente e dos danos morais suportados. Neste ponto recursal, restou-se prejudicado a análise dos referidos pedidos ante o fracasso recursal do apelo interposto pela recorrente, conforme motivos expostos alhures. Por essas razões, conheço do recurso de Apelação e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a r. sentença fustigada. Ante o resultado do julgamento, majoro os honorários de sucumbência fixados em desfavor da recorrente pelo Juízo de 1º Grau, para 13% (treze por cento) do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §11, do CPC, todavia, a execução de valores ficará suspensa, tendo em vista o benefício da assistência judiciária, de acordo com o art. 98, §3º, do Código de Processo Civil. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Data da sessão: Cuiabá-MT, 20/05/2025

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Processo nº 1012380-37.2023.8.11.0006

ID: 278250424

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1012380-37.2023.8.11.0006

Data de Disponibilização: 26/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BANCO MERCANTIL DO BRASIL SA

Acórdão

Advogados:

LUCAS LAENDER PESSOA DE MENDONCA

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ISABELLE DE OLIVEIRA AMORIM E SILVA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1012380-37.2023.8.11.0006 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Limitação de Juros, Bancários] Relator: Des(a). … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1012380-37.2023.8.11.0006 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Limitação de Juros, Bancários] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES] Parte(s): [JUNIO SOUTO RODRIGUES - CPF: 062.739.541-43 (APELANTE), JESUS VIEIRA DE OLIVEIRA - CPF: 924.435.911-15 (ADVOGADO), BANCO MERCANTIL DO BRASIL SA - CNPJ: 17.184.037/0001-10 (APELADO), ANDREI TEIXEIRA COSTA TAKAKI - CPF: 712.279.701-53 (ADVOGADO), ISABELLE DE OLIVEIRA AMORIM E SILVA - CPF: 070.958.575-63 (ADVOGADO), LUCAS LAENDER PESSOA DE MENDONCA - CPF: 012.546.246-86 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE: JUNIO SOUTO RODRIGUES APELADO: BANCO MERCANTIL DO BRASIL SA. EMENTA. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. EMPRÉSTIMO PESSOAL. ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS. NÃO CONSTATAÇÃO. ÍNDICES DENTRO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO. CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS. INADMISSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PREVISÃO EM CONTRATO. LEGITIMIDADE DA COBRANÇA. PRECEDENTES STJ. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DESCABIMENTO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de apelação interposto por consumidora em face de sentença que julgou improcedente pedido de revisão de contrato bancário, mantendo a validade da cobrança de juros remuneratórios, capitalização mensal, utilização da Tabela Price e cobrança de seguro prestamista. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Discussão acerca da legalidade dos juros remuneratórios pactuados, da capitalização de juros, da validade do sistema de amortização por Tabela Price e da legalidade da contratação de seguro prestamista. III. RAZÕES DE DECIDIR A taxa de juros contratada (9,99% a.m.) não se mostra abusiva frente à taxa média de mercado divulgada pelo BACEN (5,55% a.m. e 91,25% a.a.) no período da contratação. A capitalização mensal é válida, por estar expressamente pactuada em contrato celebrado após a edição da MP nº 1.963-17/2000 (MP nº 2.170-36/2001). A Tabela Price, por si só, não configura anatocismo e sua utilização é considerada legítima e amplamente aceita. A contratação do seguro prestamista se deu de forma facultativa e com possibilidade de escolha do consumidor, não configurando venda casada. IV. DISPOSITIVO E TESE. Recurso conhecido e desprovido. Teses de julgamento: “A jurisprudência do STJ orienta que a circunstância de a taxa de juros remuneratórios, praticada pela instituição financeira, exceder a taxa média do mercado, não induz, por si só, à conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa apenas em um referencial a ser considerado, e não em limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras”. “O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price”. “Havendo previsão contratual, não há ilegalidade na incidência da capitalização mensal dos juros, posto que foi pactuada de forma expressa.” “Se o contrato sob revisão não padece de qualquer abusividade ou ilegalidade nos encargos cobrados, não há se falar em devolução de valores”. “A contratação facultativa de seguro prestamista não configura venda casada”. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, III e VIII; 46 e 52, II; MP nº 2.170-36/2001. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.061.530/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, S2, j. 22.10.2008, DJe 10.03.2009; STJ, AgInt no AREsp 2276235/RS, Rel. Min. Raul Araújo, j. 05.06.2023, DJe 13.06.2023; STJ, REsp 1.388.972/SC, Rel. Min. Marco Buzzi, j. 08.02.2017; STJ, AgRg no Ag 707143/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 25.05.2010; TJMT, Ap 78790/2017, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 23.08.2017, DJE 25.08.2017; TJMT, N.U 1006335-12.2023.8.11.0040, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 27.08.2024, DJE 30.08.2024. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por JUNIO SOUTO RODRIGUES, ora Apelante, contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Cáceres - MT, que nos autos da Ação Revisional de Contrato, ajuizada em face do Apelado BANCO MERCANTIL DO BRASIL S.A, julgou improcedente os pedidos iniciais, ante a inexistência de ilegalidade na cobrança de juros praticada pelo banco apelado, em contrato de empréstimo pessoal entabulado entre as partes. Em suas razões recursais a parte recorrente invoca os seguintes questionamentos fático-jurídicos: Da ilegalidade na cobrança dos juros remuneratórios. Da indevida capitalização de juros. Da substituição da Tabela Price pela Gauss. Da repetição do indébito dos valores pagos indevidamente. Dos danos morais suportados. Recurso tempestivo e isento de recolhimento de custas. (ID 284478351). A parte recorrida apresenta suas contrarrazões, rebatendo, no mérito, as alegações da recorrente, defendendo o desprovimento recursal. (ID. nº 283222857). É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador V O T O R E L A T O R APELANTE: JUNIO SOUTO RODRIGUES APELADO: BANCO MERCANTIL DO BRASIL SA. VOTO Egrégia Câmara: Mérito Recursal 1.1. Dos juros remuneratórios acima da taxa média do mercado. De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Conforme relatado anteriormente, extrai-se dos presentes autos, que as partes entabularam contrato de empréstimo pessoal, valor total de R$ 1.580,73 (mil quinhentos e oitenta reais e setenta e três centavos), a serem pagos em 2 parcelas mensais, no importe de R$ 971,83 (novecentos e setenta e reais e oitenta e três centavos). A parte Apelante sustenta, em síntese,que a modalidade de financiamento, por ela contratado com a apelada, deve ser revisado, eis que estaria eivada de abusividades. Assevera que no presente caso, restou utilizado método de amortização desvantajoso ao consumidor (Tabela Price, que adotaria amortização a partir de juros compostos, exponenciando o saldo devedor). Afiança que a aplicação de juros capitalizados acima do permitido em lei, além de ilegal, oneraria excessivamente o valor do negócio jurídico firmado, eis que no contrato há estipulação de capitalização, conhecida também como anatocismo. Assim, sob a alegação de cobrança indevida, requer provimento deste Recurso, a fim de que a sentença seja reformada para o que o contrato firmado entre as partes seja revisado, com a devida compensação dos valores pagos a maior, como reanálise das taxas abusivas e nulidade das cláusulas indevidas, bem como a utilização do método de amortização. Lado outro, aduz a instituição financeira apelada, que no presente caso, não há qualquer ilegalidade na cobrança dos valores, bem como, que não há que se falar em onerosidade excessiva praticada, conforme demonstrado por meio de documentos acostados aos autos. Assevera ainda, que fora devidamente cumprido os critérios estabelecidos pelo STJ no que se refere a cobranças tarifárias. Por fim, afirma que a sentença vergastada não merece reparos, pois, fora devidamente constatado a regularidade da contratação e serviços efetivamente prestados. Pois bem. Inicialmente, cumpre ressaltar que o caso é de relação jurídica sujeita aos efeitos do Código de Defesa do Consumidor sendo que neste sentido é a Súmula do Superior Tribunal de Justiça. Vejamos: Súmula 297/STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”. Súmula 479/STJ: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. Dessa forma é aplicável ao caso o Código de Defesa do Consumidor que determina a inversão do ônus da prova em razão de relação consumerista prevista no artigo 6º, VIII, in verbis: “Art. 6°. São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. Quanto aos juros remuneratórios, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, consolidou o entendimento de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação definida na Lei de Usura (Súmula n. 596/STF), bem como de que a estipulação acima de 12% ao ano, por si só, não configura abuso. Ainda, no julgamento do mencionado repetitivo, definiu que é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e demonstrado o excesso capaz de colocar o consumidor em vantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC. Veja-se: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO. (...)I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada ? art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.(...)” (STJ - REsp: 1061530 RS 2008/0119992-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 22/10/2008, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/03/2009 RSSTJ vol. 34 p. 216 RSSTJ vol. 35 p. 48) (grifo nosso) Na oportunidade, foi rechaçada a possibilidade de se estabelecer um critério genérico e universal para se aferir a abusividade dos encargos remuneratórios, restando consignado que a abusividade da taxa de juros contratada deve ser demonstrada de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, já que a média de mercado não é um limitador, mas um referencial a ser seguido. A propósito: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE MÚTUO. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. TAXA MÉDIA DE MERCADO. COBRANÇA ABUSIVA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência do STJ orienta que a circunstância de a taxa de juros remuneratórios, praticada pela instituição financeira, exceder a taxa média do mercado, não induz, por si só, à conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa apenas em um referencial a ser considerado, e não em limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras (REsp 1.061.530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe de 10/3/2009). 2. No caso concreto, no entanto, a Corte de origem concluiu pelo caráter abusivo dos juros remuneratórios pactuados, pois fixados em 101,22% ao ano, enquanto a taxa média de mercado, para o mesmo período, atingiu o patamar de 27,89% ao ano, o que impõe sua redução. 3. Agravo interno desprovido.” (STJ - AgInt no AREsp: 2276235 RS 2023/0005973-0, Relator: RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 05/06/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/06/2023) (grifo nosso) Denota-se que no contrato firmado entre as partes foi estipulada a incidência de juros remuneratórios de 9,99% ao mês. (ID nº 210208718). Desta feita, em consulta ao Sistema Gerenciador de Séries Temporais do Banco Central do Brasil – SGS, a taxa média de juros para a modalidade de contrato firmado entre as partes em junho de 2023 era de 5,55% ao mês e 91,25% a.a., de modo que não se vislumbra a alegada discrepância em relação à taxa média praticada no mercado financeiro paraa modalidade de contrato pactuada entre as partes ou qualquer excesso capaz de colocar o consumidor em vantagem exagerada. Além disso, está expressamente previsto no contrato que, além dos juros mensais, a avença estipulou a incidência de capitalização de tais juros, assim como a cobrança de outras taxas, tarifas e tributos, tudo a compor o denominado “custo efetivo total”, ou seja, o total de encargos que conduzem à prestação mensal final. Nesta senda, visualiza-se a previsão de custo efetivo total de 10,73% a.m., ou seja, o percentual aplicado estaria dentro dos patamares permitidos. Restando referidas taxas inferiores à taxa média do mercado divulgada pelo BACEN – Banco Central – aplicada no período na modalidade contratada, não há que se falar em abusividade como narrado na inicial e, portanto, o decisum vergastado merece reforma neste ponto recursal. Da ilegalidade na capitalização de juros. A apelante defende a ilegalidade da capitalização dos juros sem a expressa anuência do contratante. Sobre a questão, prevalece no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que, nos contratos firmados posteriormente à entrada em vigor da MP n. 1.963-17/2000, atualmente reeditada sob o n. 2.170-36/2001, a capitalização mensal dos juros é lícita, desde que pactuada, de forma clara e expressa. Nesse sentido, dispõe o enunciado da Súmula 539, do Superior Tribunal de Justiça, e a tese firmada no citado REsp 1.388.972/SC, conforme segue: Súmula 539-STJ É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após, 31/3/2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor como MP nº 2.170-01, desde que expressamente pactuada. [...] A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida quando houver expressa pactuação. [...] (STJ. 2ª Seção. REsp 1.388.972-SC, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 8/2/2017 . Info 599). Especificamente quanto à forma de pactuação, no Superior Tribunal de Justiça se sobrepõe o entendimento que ela pode ser considerada como “clara e expressa” quando a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual é superior ao duodécuplo da mensal, vejamos: “AGRAVO REGIMENTAL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1- O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 973.827/RS, Relª para acórdão Minª Maria Isabel Gallotti, submetido ao procedimento dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), assentou entendimento de que é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31/3/2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor como MP nº 2.170-01, desde que expressamente pactuada. 2 - A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para caracterizar a expressa pactuação e permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. 3- Agravo regimental provido.” (AgRg no AREsp 63478/SC, 4ª Turma Rel. Min. Marco Buzzi, j. 06.11.2012) Desse modo, em casos que a taxa de juros anual é superior à soma das 12 parcelas da taxa mensal, resta-se pactuada a capitalização de juros e, portanto, em conformidade com a supracitada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Da substituição da Tabela Price pela Gauss. O apelante aduz que a inserção de juros compostos, com aplicação de capitalização diária, inclusive com utilização da Tabela Price, não foi expressamente prevista no contrato. Desse modo, assevera que a falta de previsão sobre a forma de capitalização de juros acarreta violação ao direito de informação do consumidor, nos termos dos arts. 6º, III; 46 e 52, II, do Código de Defesa do Consumidor, e resulta no direito do apelante para que ocorra o recálculo dos valores pela taxa de juros contratada de forma simples. Pois bem. Apesar das alegações do apelante, também deve ser mantida a sentença, neste item. Em relação à Tabela Price, esta, por si só, não constitui capitalização de juros e a sua utilização para correção do saldo devedor não induz à prática de anatocismo. A propósito na doutrina de ARNALDO RIZZARDO: Sistema da Tabela Price, ou sistema francês de amortização, as prestações, desde o início do contrato, mantêm valor uniforme. As prestações são constantes, em termos reais, para todos os meses do financiamento. Sendo o valor da prestação fixo, a utilização da Tabela Price implica em se realizar pequenas amortizações iniciais do saldo devedor, sendo a maior parte da prestação representada pelo pagamento de juros. (Contratos de Crédito Bancário. 7ª ed. 2007, p.173). E na maioria dos casos, é este sistema de amortização que permite ao adquirente a realização do negócio, dada a estabilidade concedida ao financiamento de longo prazo, e, uma vez contratado, não há ser reputado ilegal ou abusivo. Registre-se, ainda, que o mencionado sistema francês é de larga aplicabilidade, não somente neste país, como em diversos outros. Ademais, em muitas situações é esse sistema de amortização que permite ao adquirente a realização do negócio, haja vista revelarem-se os valores das parcelas iniciais do contrato bastante acessíveis. Sobre o tema, cito trecho de julgado do Superior Tribunal de Justiça: [...] Tabela Price. Legalidade. O critério de prévia atualização do saldo devedor e posterior amortização não fere a comutatividade das obrigações pactuadas no ajuste, uma vez que a primeira prestação é paga um mês após o empréstimo do capital, o qual corresponde ao saldo devedor. Precedentes...” (STJ, AgRg no Ag 707143/DF,Rel. Ministra Nancy Andrighi, j. 25/05/2010). Desse modo, não há dúvidas de que a incidência da Tabela Price, como critério de amortização de financiamento em contratos bancários, constitui método legal, pois a sua utilização não caracteriza prática de anatocismo e muito menos é abusiva. Neste sentido é a jurisprudência hodierna: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL – CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO – CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA – JULGAMENTO DA LIDE SEM REALIZAÇÃO DE PERÍCIA CONTÁBIL – DESNECESSIDADE – MATÉRIA DE DIREITO – CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS – INADMISSIBILIDADE – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS – PACTUAÇÃO EXPRESSA – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA – SENTENÇA ESCORREITA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price.” (N.U 1004004-79.2020.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/10/2023, Publicado no DJE 23/10/2023) “CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL – RECURSOS DE APELAÇÃO – REVISIONAL DE CONTRATO –CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – EMPRÉSTIMO PESSOAL – PROVA PERICIAL CONTÁBIL – DESNECESSIDADE – PRELIMINAR REJEITADA – CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS – INADMISSIBILIDADE – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS – PACTUAÇÃO EXPRESSA – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA – LEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS PREVISTOS NO CONTRATO – COMPROVAÇÃO – TAXA FIXADA DE ACORDO COM MÉDIA PRATICADA PELO MERCADO NA ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO – ABUSIVIDADE – NÃO COMPROVADA – TARIFA DE CADASTRO – COBRANÇA VÁLIDA – ABUSIVIDADE NÃO DEMONSTRADA – RESP. nº 1251331-RS E TEMA 958 do STJ – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (...) 3. Não há irregularidade na utilização da Tabela Price, em razão da distribuição dos juros no decorrer do contrato que permite que todas as parcelas a serem pagas sejam de valor constante. 4. O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price. 5. Havendo previsão contratual, não há ilegalidade na incidência da capitalização mensal dos juros, posto que foi pactuada de forma expressa.” (N.U 1006335-12.2023.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/08/2024, Publicado no DJE 30/08/2024) Da devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente e dos danos morais suportados. Neste ponto recursal, restou-se prejudicado a análise dos referidos pedidos ante o fracasso recursal do apelo interposto pela recorrente, conforme motivos expostos alhures. Por essas razões, conheço do recurso de Apelação e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a r. sentença fustigada. Ante o resultado do julgamento, majoro os honorários de sucumbência fixados em desfavor da recorrente pelo Juízo de 1º Grau, para 13% (treze por cento) do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §11, do CPC, todavia, a execução de valores ficará suspensa, tendo em vista o benefício da assistência judiciária, de acordo com o art. 98, §3º, do Código de Processo Civil. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Data da sessão: Cuiabá-MT, 20/05/2025

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Processo nº 1003551-45.2024.8.11.0002

ID: 259075436

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1003551-45.2024.8.11.0002

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

MARIA DA GLORIA PEREIRA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

VITOR RODRIGUES SEIXAS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003551-45.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003551-45.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de Contrato] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [MARIA DA GLORIA PEREIRA - CPF: 345.964.291-20 (APELANTE), VITOR RODRIGUES SEIXAS - CPF: 442.710.298-07 (ADVOGADO), JOAO OTAVIO PEREIRA - CPF: 230.757.048-90 (ADVOGADO), BANCO PAN S.A. - CNPJ: 59.285.411/0001-13 (APELADO), CRISTIANE BELINATI GARCIA LOPES - CPF: 991.502.399-53 (ADVOGADO), DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA - CPF: 568.962.041-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE: MARIA DA GLORIA PEREIRA APELADO: BANCO PAN S.A. EMENTA. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. EMPRÉSTIMO PESSOAL. ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS. NÃO CONSTATAÇÃO. ÍNDICES DENTRO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO. CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS. INADMISSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PREVISÃO EM CONTRATO. LEGITIMIDADE DA COBRANÇA. PRECEDENTES STJ. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DESCABIMENTO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de apelação interposto por consumidora em face de sentença que julgou improcedente pedido de revisão de contrato bancário, mantendo a validade da cobrança de juros remuneratórios, capitalização mensal, utilização da Tabela Price e cobrança de seguro prestamista. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Discussão acerca da legalidade dos juros remuneratórios pactuados, da capitalização de juros, da validade do sistema de amortização por Tabela Price e da legalidade da contratação de seguro prestamista. III. RAZÕES DE DECIDIR A taxa de juros contratada (2,60% a.m. e 36,07% a.a.) não se mostra abusiva frente à taxa média de mercado divulgada pelo BACEN (1,80% a.m. e 23,99% a.a.) no período da contratação. A capitalização mensal é válida, por estar expressamente pactuada em contrato celebrado após a edição da MP nº 1.963-17/2000 (MP nº 2.170-36/2001). A Tabela Price, por si só, não configura anatocismo e sua utilização é considerada legítima e amplamente aceita. A contratação do seguro prestamista se deu de forma facultativa e com possibilidade de escolha do consumidor, não configurando venda casada. IV. DISPOSITIVO E TESE. Recurso conhecido e desprovido. Teses de julgamento: “A jurisprudência do STJ orienta que a circunstância de a taxa de juros remuneratórios, praticada pela instituição financeira, exceder a taxa média do mercado, não induz, por si só, à conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa apenas em um referencial a ser considerado, e não em limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras”. “O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price”. “Havendo previsão contratual, não há ilegalidade na incidência da capitalização mensal dos juros, posto que foi pactuada de forma expressa.” “Se o contrato sob revisão não padece de qualquer abusividade ou ilegalidade nos encargos cobrados, não há se falar em devolução de valores”. “A contratação facultativa de seguro prestamista não configura venda casada”. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, III e VIII; 46 e 52, II; MP nº 2.170-36/2001. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.061.530/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, S2, j. 22.10.2008, DJe 10.03.2009; STJ, AgInt no AREsp 2276235/RS, Rel. Min. Raul Araújo, j. 05.06.2023, DJe 13.06.2023; STJ, REsp 1.388.972/SC, Rel. Min. Marco Buzzi, j. 08.02.2017; STJ, AgRg no Ag 707143/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 25.05.2010; TJMT, Ap 78790/2017, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 23.08.2017, DJE 25.08.2017; TJMT, N.U 1006335-12.2023.8.11.0040, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 27.08.2024, DJE 30.08.2024. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por MARIA DA GLORIA PEREIRA, ora Apelante, contra sentença (ID. 276696381) proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Especializada em Direito Bancário de Várzea Grande - MT, que nos autos da Ação Revisional de Contrato, ajuizada em face do Apelado BANCO PAN S.A, julgou improcedente os pedidos iniciais, ante a inexistência de ilegalidade na cobrança de juros praticada pelo banco apelado, em contrato de empréstimo pessoal entabulado entre as partes. Em suas razões recursais a parte recorrente invoca os seguintes questionamentos fático-jurídicos: Da ilegalidade na cobrança dos juros remuneratórios. Da indevida capitalização de juros. Da substituição da Tabela Price pela Gauss. Da repetição do indébito dos valores pagos indevidamente. Dos danos morais suportados. Recurso tempestivo e isento de recolhimento de custas. (ID 277030376). A parte recorrida apresenta suas contrarrazões, rebatendo, no mérito, as alegações da recorrente, defendendo o desprovimento recursal. (ID. nº 276696384). É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador V O T O R E L A T O R APELANTE: MARIA DA GLORIA PEREIRA APELADO: BANCO PAN S.A. VOTO Egrégia Câmara: Mérito Recursal 1.1. Dos juros remuneratórios acima da taxa média do mercado. De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Conforme relatado anteriormente, extrai-se dos presentes autos, que as partes entabularam contrato de empréstimo pessoal, valor total de R$ 1.168,87 (mil cento e sessenta e oito reais e oitenta e sete centavos), a serem pagos em 96 parcelas mensais, no importe de R$ 41,00 (quarenta e um reais). A parte Apelante sustenta, em síntese,que a modalidade de financiamento, por ela contratado com a apelada, deve ser revisado, eis que estaria eivada de abusividades. Assevera que no presente caso, restou utilizado método de amortização desvantajoso ao consumidor (Tabela Price, que adotaria amortização a partir de juros compostos, exponenciando o saldo devedor). Afiança que a aplicação de juros capitalizados acima do permitido em lei, além de ilegal, oneraria excessivamente o valor do negócio jurídico firmado, eis que no contrato há estipulação de capitalização, conhecida também como anatocismo. Assim, sob a alegação de cobrança indevida, requer provimento deste Recurso, a fim de que a sentença seja reformada para o que o contrato firmado entre as partes seja revisado, com a devida compensação dos valores pagos a maior, como reanálise das taxas abusivas e nulidade das cláusulas indevidas, bem como a utilização do método de amortização. Lado outro, aduz a instituição financeira apelada, que no presente caso, não há qualquer ilegalidade na cobrança dos valores, bem como, que não há que se falar em onerosidade excessiva praticada, conforme demonstrado por meio de documentos acostados aos autos. Assevera ainda, que fora devidamente cumprido os critérios estabelecidos pelo STJ no que se refere a cobranças tarifárias. Por fim, afirma que a sentença vergastada não merece reparos, pois, fora devidamente constatado a regularidade da contratação e serviços efetivamente prestados. Pois bem. Inicialmente, cumpre ressaltar que o caso é de relação jurídica sujeita aos efeitos do Código de Defesa do Consumidor sendo que neste sentido é a Súmula do Superior Tribunal de Justiça. Vejamos: Súmula 297/STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”. Súmula 479/STJ: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. Dessa forma é aplicável ao caso o Código de Defesa do Consumidor que determina a inversão do ônus da prova em razão de relação consumerista prevista no artigo 6º, VIII, in verbis: “Art. 6°. São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. Quanto aos juros remuneratórios, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, consolidou o entendimento de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação definida na Lei de Usura (Súmula n. 596/STF), bem como de que a estipulação acima de 12% ao ano, por si só, não configura abuso. Ainda, no julgamento do mencionado repetitivo, definiu que é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e demonstrado o excesso capaz de colocar o consumidor em vantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC. Veja-se: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO. (...)I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada ? art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.(...)” (STJ - REsp: 1061530 RS 2008/0119992-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 22/10/2008, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/03/2009 RSSTJ vol. 34 p. 216 RSSTJ vol. 35 p. 48) (grifo nosso) Na oportunidade, foi rechaçada a possibilidade de se estabelecer um critério genérico e universal para se aferir a abusividade dos encargos remuneratórios, restando consignado que a abusividade da taxa de juros contratada deve ser demonstrada de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, já que a média de mercado não é um limitador, mas um referencial a ser seguido. A propósito: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE MÚTUO. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. TAXA MÉDIA DE MERCADO. COBRANÇA ABUSIVA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência do STJ orienta que a circunstância de a taxa de juros remuneratórios, praticada pela instituição financeira, exceder a taxa média do mercado, não induz, por si só, à conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa apenas em um referencial a ser considerado, e não em limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras (REsp 1.061.530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe de 10/3/2009). 2. No caso concreto, no entanto, a Corte de origem concluiu pelo caráter abusivo dos juros remuneratórios pactuados, pois fixados em 101,22% ao ano, enquanto a taxa média de mercado, para o mesmo período, atingiu o patamar de 27,89% ao ano, o que impõe sua redução. 3. Agravo interno desprovido.” (STJ - AgInt no AREsp: 2276235 RS 2023/0005973-0, Relator: RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 05/06/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/06/2023) (grifo nosso) Denota-se que no contrato firmado entre as partes foi estipulada a incidência de juros remuneratórios de 2,60% ao mês e 36,07% ao ano. (ID nº 276696363). Desta feita, em consulta ao Sistema Gerenciador de Séries Temporais do Banco Central do Brasil – SGS, a taxa média de juros para a modalidade de contrato firmado entre as partes em setembro de 2020 era de1,80% ao mês e 23,99% a.a., de modo que não se vislumbra a alegada discrepância em relação à taxa média praticada no mercado financeiro paraa modalidade de contrato pactuada entre as partes ou qualquer excesso capaz de colocar o consumidor em vantagem exagerada. Além disso, está expressamente previsto no contrato que, além dos juros mensais, a avença estipulou a incidência de capitalização de tais juros, assim como a cobrança de outras taxas, tarifas e tributos, tudo a compor o denominado “custo efetivo total”, ou seja, o total de encargos que conduzem à prestação mensal final. Nesta senda, visualiza-se a previsão de custo efetivo total de 2,87% a.m. e 41,03% ao ano, ou seja, o percentual aplicado estaria dentro dos patamares permitidos. Restando referidas taxas inferiores à taxa média do mercado divulgada pelo BACEN – Banco Central – aplicada no período na modalidade contratada, não há que se falar em abusividade como narrado na inicial e, portanto, o decisum vergastado merece reforma neste ponto recursal. Da ilegalidade na capitalização de juros. A apelante defende a ilegalidade da capitalização dos juros sem a expressa anuência do contratante. Sobre a questão, prevalece no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que, nos contratos firmados posteriormente à entrada em vigor da MP n. 1.963-17/2000, atualmente reeditada sob o n. 2.170-36/2001, a capitalização mensal dos juros é lícita, desde que pactuada, de forma clara e expressa. Nesse sentido, dispõe o enunciado da Súmula 539, do Superior Tribunal de Justiça, e a tese firmada no citado REsp 1.388.972/SC, conforme segue: Súmula 539-STJ É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após, 31/3/2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor como MP nº 2.170-01, desde que expressamente pactuada. [...] A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida quando houver expressa pactuação. [...] (STJ. 2ª Seção. REsp 1.388.972-SC, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 8/2/2017 . Info 599). Especificamente quanto à forma de pactuação, no Superior Tribunal de Justiça se sobrepõe o entendimento que ela pode ser considerada como “clara e expressa” quando a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual é superior ao duodécuplo da mensal, vejamos: “AGRAVO REGIMENTAL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1- O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 973.827/RS, Relª para acórdão Minª Maria Isabel Gallotti, submetido ao procedimento dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), assentou entendimento de que é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31/3/2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor como MP nº 2.170-01, desde que expressamente pactuada. 2 - A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para caracterizar a expressa pactuação e permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. 3- Agravo regimental provido.” (AgRg no AREsp 63478/SC, 4ª Turma Rel. Min. Marco Buzzi, j. 06.11.2012) Desse modo, em casos que a taxa de juros anual é superior à soma das 12 parcelas da taxa mensal, resta-se pactuada a capitalização de juros e, portanto, em conformidade com a supracitada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Da substituição da Tabela Price pela Gauss. O apelante aduz que a inserção de juros compostos, com aplicação de capitalização diária, inclusive com utilização da Tabela Price, não foi expressamente prevista no contrato. Desse modo, assevera que a falta de previsão sobre a forma de capitalização de juros acarreta violação ao direito de informação do consumidor, nos termos dos arts. 6º, III; 46 e 52, II, do Código de Defesa do Consumidor, e resulta no direito do apelante para que ocorra o recálculo dos valores pela taxa de juros contratada de forma simples. Pois bem. Apesar das alegações do apelante, também deve ser mantida a sentença, neste item. Em relação à Tabela Price, esta, por si só, não constitui capitalização de juros e a sua utilização para correção do saldo devedor não induz à prática de anatocismo. A propósito na doutrina de ARNALDO RIZZARDO: Sistema da Tabela Price, ou sistema francês de amortização, as prestações, desde o início do contrato, mantêm valor uniforme. As prestações são constantes, em termos reais, para todos os meses do financiamento. Sendo o valor da prestação fixo, a utilização da Tabela Price implica em se realizar pequenas amortizações iniciais do saldo devedor, sendo a maior parte da prestação representada pelo pagamento de juros. (Contratos de Crédito Bancário. 7ª ed. 2007, p.173). E na maioria dos casos, é este sistema de amortização que permite ao adquirente a realização do negócio, dada a estabilidade concedida ao financiamento de longo prazo, e, uma vez contratado, não há ser reputado ilegal ou abusivo. Registre-se, ainda, que o mencionado sistema francês é de larga aplicabilidade, não somente neste país, como em diversos outros. Ademais, em muitas situações é esse sistema de amortização que permite ao adquirente a realização do negócio, haja vista revelarem-se os valores das parcelas iniciais do contrato bastante acessíveis. Sobre o tema, cito trecho de julgado do Superior Tribunal de Justiça: [...] Tabela Price. Legalidade. O critério de prévia atualização do saldo devedor e posterior amortização não fere a comutatividade das obrigações pactuadas no ajuste, uma vez que a primeira prestação é paga um mês após o empréstimo do capital, o qual corresponde ao saldo devedor. Precedentes...” (STJ, AgRg no Ag 707143/DF,Rel. Ministra Nancy Andrighi, j. 25/05/2010). Desse modo, não há dúvidas de que a incidência da Tabela Price, como critério de amortização de financiamento em contratos bancários, constitui método legal, pois a sua utilização não caracteriza prática de anatocismo e muito menos é abusiva. Neste sentido é a jurisprudência hodierna: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL – CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO – CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA – JULGAMENTO DA LIDE SEM REALIZAÇÃO DE PERÍCIA CONTÁBIL – DESNECESSIDADE – MATÉRIA DE DIREITO – CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS – INADMISSIBILIDADE – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS – PACTUAÇÃO EXPRESSA – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA – SENTENÇA ESCORREITA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price.” (N.U 1004004-79.2020.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/10/2023, Publicado no DJE 23/10/2023) “CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL – RECURSOS DE APELAÇÃO – REVISIONAL DE CONTRATO –CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – EMPRÉSTIMO PESSOAL – PROVA PERICIAL CONTÁBIL – DESNECESSIDADE – PRELIMINAR REJEITADA – CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS – INADMISSIBILIDADE – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS – PACTUAÇÃO EXPRESSA – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA – LEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS PREVISTOS NO CONTRATO – COMPROVAÇÃO – TAXA FIXADA DE ACORDO COM MÉDIA PRATICADA PELO MERCADO NA ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO – ABUSIVIDADE – NÃO COMPROVADA – TARIFA DE CADASTRO – COBRANÇA VÁLIDA – ABUSIVIDADE NÃO DEMONSTRADA – RESP. nº 1251331-RS E TEMA 958 do STJ – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (...) 3. Não há irregularidade na utilização da Tabela Price, em razão da distribuição dos juros no decorrer do contrato que permite que todas as parcelas a serem pagas sejam de valor constante. 4. O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price. 5. Havendo previsão contratual, não há ilegalidade na incidência da capitalização mensal dos juros, posto que foi pactuada de forma expressa.” (N.U 1006335-12.2023.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/08/2024, Publicado no DJE 30/08/2024) Da suposta ilegalidade na cobrança da tarifa de seguro prestamista. Neste particular, a parte requerida/apelante requereu a revisão do contrato quanto à contratação de seguro, sustentando que se trata de venda casada sendo, portanto, abusiva. A legalidade da cobrança de tal seguro nos contratos como o da espécie, fora firmada a tese contida no Tema 972, sendo que, a aplicação da Tese foi delimitada para os contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das relações de consumo. Vejamos: “Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada.” No entanto, isso não significa que toda e qualquer disposição contratual prevendo a cobrança de seguro é inválida. Nesse ínterim, assentou-se entendimento de que o consumidor tem liberdade de contratar ou não seguro, sendo válida, em princípio, se houver sua concordância. Contudo, se não ficar assegurada, ao consumidor, a possibilidade de escolha da seguradora, que é imposta pela instituição financeira, a própria liberdade de contratar resta afetada, configurando venda casada e, por consequência, abusividade que deve ser coibida. Na hipótese, constata-se que o pacto foi celebrado depois de 30/04/2008, e a cópia da Cédula de Crédito Bancário em discussão evidencia que não houve a prática de venda casada do seguro, posto que foi oportunizado ao apelante a contratação ou não do seguro, tendo este optado por contratá-lo. Nesse sentido, é a jurisprudência hodierna: “APELAÇÃO CÍVEL - CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSGINADO - COTRATAÇÃO DE SEGURO PRESTAMISTA - VENDA CASADA NÃO COMPROVADA - REPETIÇÃO DE INDÉBITO - INDEVIDA - DANO MORAL - NAO CONFIGURADO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Não comprovada que a contratação de determinado negócio jurídico foi condicionada a de um acessório, não há a configuração da venda casada, máxime se verificada a possibilidade de não contratação do seguro”. (grifo nosso) (TJMT - Ap 78790/2017, DES. GUIOMAR TEODORO BORGES, QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 23/08/2017, publicado no DJE 25/08/2017) Da análise do contrato entabulado entre as partes, denominado Cédula de Crédito Bancário, extrai-se que a cláusula “Proposta de Adesão – Produto Pan Consignado Super Proteção” – prevê a cobrança do seguro, bem como, que a parte autora/apelante, possuía a liberalidade de contratar o seguro, inclusive, trata-se de empresa de grupo econômico diverso, o que demonstra a legitimidade na cobrança. (ID nº 276696363 – pág. 8-13) Noutro giro, percebo que a cobrança da tarifa, no importe total de R$ 108,58, sendo que, portanto, não se vislumbra onerosidade excessiva no presente caso. Portanto, nessas condições, afigura-se válida a contratação, bem como, não evidenciada ilegalidade/abusividade na cobrança do seguro, a sentença não merece reparos neste ponto recursal. Da devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente e dos danos morais suportados. Neste ponto recursal, restou-se prejudicado a análise dos referidos pedidos ante o fracasso recursal do apelo interposto pela recorrente, conforme motivos expostos alhures. Por essas razões, conheço do recurso de Apelação e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a r. sentença fustigada. Ante o resultado do julgamento, majoro os honorários de sucumbência fixados em desfavor da recorrente pelo Juízo de 1º Grau, para 13% (treze por cento) do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §11, do CPC, todavia, a execução de valores ficará suspensa, tendo em vista o benefício da assistência judiciária, de acordo com o art. 98, §3º, do Código de Processo Civil. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1003551-45.2024.8.11.0002

ID: 259075448

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1003551-45.2024.8.11.0002

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BANCO PAN S.A.

Acórdão

Advogados:

CRISTIANE BELINATI GARCIA LOPES

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003551-45.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003551-45.2024.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de Contrato] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [MARIA DA GLORIA PEREIRA - CPF: 345.964.291-20 (APELANTE), VITOR RODRIGUES SEIXAS - CPF: 442.710.298-07 (ADVOGADO), JOAO OTAVIO PEREIRA - CPF: 230.757.048-90 (ADVOGADO), BANCO PAN S.A. - CNPJ: 59.285.411/0001-13 (APELADO), CRISTIANE BELINATI GARCIA LOPES - CPF: 991.502.399-53 (ADVOGADO), DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA - CPF: 568.962.041-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE: MARIA DA GLORIA PEREIRA APELADO: BANCO PAN S.A. EMENTA. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. EMPRÉSTIMO PESSOAL. ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS. NÃO CONSTATAÇÃO. ÍNDICES DENTRO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO. CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS. INADMISSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PREVISÃO EM CONTRATO. LEGITIMIDADE DA COBRANÇA. PRECEDENTES STJ. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DESCABIMENTO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de apelação interposto por consumidora em face de sentença que julgou improcedente pedido de revisão de contrato bancário, mantendo a validade da cobrança de juros remuneratórios, capitalização mensal, utilização da Tabela Price e cobrança de seguro prestamista. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Discussão acerca da legalidade dos juros remuneratórios pactuados, da capitalização de juros, da validade do sistema de amortização por Tabela Price e da legalidade da contratação de seguro prestamista. III. RAZÕES DE DECIDIR A taxa de juros contratada (2,60% a.m. e 36,07% a.a.) não se mostra abusiva frente à taxa média de mercado divulgada pelo BACEN (1,80% a.m. e 23,99% a.a.) no período da contratação. A capitalização mensal é válida, por estar expressamente pactuada em contrato celebrado após a edição da MP nº 1.963-17/2000 (MP nº 2.170-36/2001). A Tabela Price, por si só, não configura anatocismo e sua utilização é considerada legítima e amplamente aceita. A contratação do seguro prestamista se deu de forma facultativa e com possibilidade de escolha do consumidor, não configurando venda casada. IV. DISPOSITIVO E TESE. Recurso conhecido e desprovido. Teses de julgamento: “A jurisprudência do STJ orienta que a circunstância de a taxa de juros remuneratórios, praticada pela instituição financeira, exceder a taxa média do mercado, não induz, por si só, à conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa apenas em um referencial a ser considerado, e não em limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras”. “O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price”. “Havendo previsão contratual, não há ilegalidade na incidência da capitalização mensal dos juros, posto que foi pactuada de forma expressa.” “Se o contrato sob revisão não padece de qualquer abusividade ou ilegalidade nos encargos cobrados, não há se falar em devolução de valores”. “A contratação facultativa de seguro prestamista não configura venda casada”. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, III e VIII; 46 e 52, II; MP nº 2.170-36/2001. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.061.530/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, S2, j. 22.10.2008, DJe 10.03.2009; STJ, AgInt no AREsp 2276235/RS, Rel. Min. Raul Araújo, j. 05.06.2023, DJe 13.06.2023; STJ, REsp 1.388.972/SC, Rel. Min. Marco Buzzi, j. 08.02.2017; STJ, AgRg no Ag 707143/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 25.05.2010; TJMT, Ap 78790/2017, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 23.08.2017, DJE 25.08.2017; TJMT, N.U 1006335-12.2023.8.11.0040, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 27.08.2024, DJE 30.08.2024. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por MARIA DA GLORIA PEREIRA, ora Apelante, contra sentença (ID. 276696381) proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Especializada em Direito Bancário de Várzea Grande - MT, que nos autos da Ação Revisional de Contrato, ajuizada em face do Apelado BANCO PAN S.A, julgou improcedente os pedidos iniciais, ante a inexistência de ilegalidade na cobrança de juros praticada pelo banco apelado, em contrato de empréstimo pessoal entabulado entre as partes. Em suas razões recursais a parte recorrente invoca os seguintes questionamentos fático-jurídicos: Da ilegalidade na cobrança dos juros remuneratórios. Da indevida capitalização de juros. Da substituição da Tabela Price pela Gauss. Da repetição do indébito dos valores pagos indevidamente. Dos danos morais suportados. Recurso tempestivo e isento de recolhimento de custas. (ID 277030376). A parte recorrida apresenta suas contrarrazões, rebatendo, no mérito, as alegações da recorrente, defendendo o desprovimento recursal. (ID. nº 276696384). É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador V O T O R E L A T O R APELANTE: MARIA DA GLORIA PEREIRA APELADO: BANCO PAN S.A. VOTO Egrégia Câmara: Mérito Recursal 1.1. Dos juros remuneratórios acima da taxa média do mercado. De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Conforme relatado anteriormente, extrai-se dos presentes autos, que as partes entabularam contrato de empréstimo pessoal, valor total de R$ 1.168,87 (mil cento e sessenta e oito reais e oitenta e sete centavos), a serem pagos em 96 parcelas mensais, no importe de R$ 41,00 (quarenta e um reais). A parte Apelante sustenta, em síntese,que a modalidade de financiamento, por ela contratado com a apelada, deve ser revisado, eis que estaria eivada de abusividades. Assevera que no presente caso, restou utilizado método de amortização desvantajoso ao consumidor (Tabela Price, que adotaria amortização a partir de juros compostos, exponenciando o saldo devedor). Afiança que a aplicação de juros capitalizados acima do permitido em lei, além de ilegal, oneraria excessivamente o valor do negócio jurídico firmado, eis que no contrato há estipulação de capitalização, conhecida também como anatocismo. Assim, sob a alegação de cobrança indevida, requer provimento deste Recurso, a fim de que a sentença seja reformada para o que o contrato firmado entre as partes seja revisado, com a devida compensação dos valores pagos a maior, como reanálise das taxas abusivas e nulidade das cláusulas indevidas, bem como a utilização do método de amortização. Lado outro, aduz a instituição financeira apelada, que no presente caso, não há qualquer ilegalidade na cobrança dos valores, bem como, que não há que se falar em onerosidade excessiva praticada, conforme demonstrado por meio de documentos acostados aos autos. Assevera ainda, que fora devidamente cumprido os critérios estabelecidos pelo STJ no que se refere a cobranças tarifárias. Por fim, afirma que a sentença vergastada não merece reparos, pois, fora devidamente constatado a regularidade da contratação e serviços efetivamente prestados. Pois bem. Inicialmente, cumpre ressaltar que o caso é de relação jurídica sujeita aos efeitos do Código de Defesa do Consumidor sendo que neste sentido é a Súmula do Superior Tribunal de Justiça. Vejamos: Súmula 297/STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”. Súmula 479/STJ: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. Dessa forma é aplicável ao caso o Código de Defesa do Consumidor que determina a inversão do ônus da prova em razão de relação consumerista prevista no artigo 6º, VIII, in verbis: “Art. 6°. São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. Quanto aos juros remuneratórios, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, consolidou o entendimento de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação definida na Lei de Usura (Súmula n. 596/STF), bem como de que a estipulação acima de 12% ao ano, por si só, não configura abuso. Ainda, no julgamento do mencionado repetitivo, definiu que é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e demonstrado o excesso capaz de colocar o consumidor em vantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC. Veja-se: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO. (...)I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada ? art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.(...)” (STJ - REsp: 1061530 RS 2008/0119992-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 22/10/2008, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/03/2009 RSSTJ vol. 34 p. 216 RSSTJ vol. 35 p. 48) (grifo nosso) Na oportunidade, foi rechaçada a possibilidade de se estabelecer um critério genérico e universal para se aferir a abusividade dos encargos remuneratórios, restando consignado que a abusividade da taxa de juros contratada deve ser demonstrada de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, já que a média de mercado não é um limitador, mas um referencial a ser seguido. A propósito: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE MÚTUO. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. TAXA MÉDIA DE MERCADO. COBRANÇA ABUSIVA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência do STJ orienta que a circunstância de a taxa de juros remuneratórios, praticada pela instituição financeira, exceder a taxa média do mercado, não induz, por si só, à conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa apenas em um referencial a ser considerado, e não em limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras (REsp 1.061.530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe de 10/3/2009). 2. No caso concreto, no entanto, a Corte de origem concluiu pelo caráter abusivo dos juros remuneratórios pactuados, pois fixados em 101,22% ao ano, enquanto a taxa média de mercado, para o mesmo período, atingiu o patamar de 27,89% ao ano, o que impõe sua redução. 3. Agravo interno desprovido.” (STJ - AgInt no AREsp: 2276235 RS 2023/0005973-0, Relator: RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 05/06/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/06/2023) (grifo nosso) Denota-se que no contrato firmado entre as partes foi estipulada a incidência de juros remuneratórios de 2,60% ao mês e 36,07% ao ano. (ID nº 276696363). Desta feita, em consulta ao Sistema Gerenciador de Séries Temporais do Banco Central do Brasil – SGS, a taxa média de juros para a modalidade de contrato firmado entre as partes em setembro de 2020 era de1,80% ao mês e 23,99% a.a., de modo que não se vislumbra a alegada discrepância em relação à taxa média praticada no mercado financeiro paraa modalidade de contrato pactuada entre as partes ou qualquer excesso capaz de colocar o consumidor em vantagem exagerada. Além disso, está expressamente previsto no contrato que, além dos juros mensais, a avença estipulou a incidência de capitalização de tais juros, assim como a cobrança de outras taxas, tarifas e tributos, tudo a compor o denominado “custo efetivo total”, ou seja, o total de encargos que conduzem à prestação mensal final. Nesta senda, visualiza-se a previsão de custo efetivo total de 2,87% a.m. e 41,03% ao ano, ou seja, o percentual aplicado estaria dentro dos patamares permitidos. Restando referidas taxas inferiores à taxa média do mercado divulgada pelo BACEN – Banco Central – aplicada no período na modalidade contratada, não há que se falar em abusividade como narrado na inicial e, portanto, o decisum vergastado merece reforma neste ponto recursal. Da ilegalidade na capitalização de juros. A apelante defende a ilegalidade da capitalização dos juros sem a expressa anuência do contratante. Sobre a questão, prevalece no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que, nos contratos firmados posteriormente à entrada em vigor da MP n. 1.963-17/2000, atualmente reeditada sob o n. 2.170-36/2001, a capitalização mensal dos juros é lícita, desde que pactuada, de forma clara e expressa. Nesse sentido, dispõe o enunciado da Súmula 539, do Superior Tribunal de Justiça, e a tese firmada no citado REsp 1.388.972/SC, conforme segue: Súmula 539-STJ É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após, 31/3/2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor como MP nº 2.170-01, desde que expressamente pactuada. [...] A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida quando houver expressa pactuação. [...] (STJ. 2ª Seção. REsp 1.388.972-SC, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 8/2/2017 . Info 599). Especificamente quanto à forma de pactuação, no Superior Tribunal de Justiça se sobrepõe o entendimento que ela pode ser considerada como “clara e expressa” quando a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual é superior ao duodécuplo da mensal, vejamos: “AGRAVO REGIMENTAL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1- O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 973.827/RS, Relª para acórdão Minª Maria Isabel Gallotti, submetido ao procedimento dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), assentou entendimento de que é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31/3/2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000, em vigor como MP nº 2.170-01, desde que expressamente pactuada. 2 - A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para caracterizar a expressa pactuação e permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. 3- Agravo regimental provido.” (AgRg no AREsp 63478/SC, 4ª Turma Rel. Min. Marco Buzzi, j. 06.11.2012) Desse modo, em casos que a taxa de juros anual é superior à soma das 12 parcelas da taxa mensal, resta-se pactuada a capitalização de juros e, portanto, em conformidade com a supracitada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Da substituição da Tabela Price pela Gauss. O apelante aduz que a inserção de juros compostos, com aplicação de capitalização diária, inclusive com utilização da Tabela Price, não foi expressamente prevista no contrato. Desse modo, assevera que a falta de previsão sobre a forma de capitalização de juros acarreta violação ao direito de informação do consumidor, nos termos dos arts. 6º, III; 46 e 52, II, do Código de Defesa do Consumidor, e resulta no direito do apelante para que ocorra o recálculo dos valores pela taxa de juros contratada de forma simples. Pois bem. Apesar das alegações do apelante, também deve ser mantida a sentença, neste item. Em relação à Tabela Price, esta, por si só, não constitui capitalização de juros e a sua utilização para correção do saldo devedor não induz à prática de anatocismo. A propósito na doutrina de ARNALDO RIZZARDO: Sistema da Tabela Price, ou sistema francês de amortização, as prestações, desde o início do contrato, mantêm valor uniforme. As prestações são constantes, em termos reais, para todos os meses do financiamento. Sendo o valor da prestação fixo, a utilização da Tabela Price implica em se realizar pequenas amortizações iniciais do saldo devedor, sendo a maior parte da prestação representada pelo pagamento de juros. (Contratos de Crédito Bancário. 7ª ed. 2007, p.173). E na maioria dos casos, é este sistema de amortização que permite ao adquirente a realização do negócio, dada a estabilidade concedida ao financiamento de longo prazo, e, uma vez contratado, não há ser reputado ilegal ou abusivo. Registre-se, ainda, que o mencionado sistema francês é de larga aplicabilidade, não somente neste país, como em diversos outros. Ademais, em muitas situações é esse sistema de amortização que permite ao adquirente a realização do negócio, haja vista revelarem-se os valores das parcelas iniciais do contrato bastante acessíveis. Sobre o tema, cito trecho de julgado do Superior Tribunal de Justiça: [...] Tabela Price. Legalidade. O critério de prévia atualização do saldo devedor e posterior amortização não fere a comutatividade das obrigações pactuadas no ajuste, uma vez que a primeira prestação é paga um mês após o empréstimo do capital, o qual corresponde ao saldo devedor. Precedentes...” (STJ, AgRg no Ag 707143/DF,Rel. Ministra Nancy Andrighi, j. 25/05/2010). Desse modo, não há dúvidas de que a incidência da Tabela Price, como critério de amortização de financiamento em contratos bancários, constitui método legal, pois a sua utilização não caracteriza prática de anatocismo e muito menos é abusiva. Neste sentido é a jurisprudência hodierna: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL – CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO – CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA – JULGAMENTO DA LIDE SEM REALIZAÇÃO DE PERÍCIA CONTÁBIL – DESNECESSIDADE – MATÉRIA DE DIREITO – CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS – INADMISSIBILIDADE – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS – PACTUAÇÃO EXPRESSA – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA – SENTENÇA ESCORREITA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (...) O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price.” (N.U 1004004-79.2020.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/10/2023, Publicado no DJE 23/10/2023) “CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL – RECURSOS DE APELAÇÃO – REVISIONAL DE CONTRATO –CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – EMPRÉSTIMO PESSOAL – PROVA PERICIAL CONTÁBIL – DESNECESSIDADE – PRELIMINAR REJEITADA – CONVERSÃO DA TABELA PRICE PARA O MÉTODO GAUSS – INADMISSIBILIDADE – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS – PACTUAÇÃO EXPRESSA – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA – LEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS PREVISTOS NO CONTRATO – COMPROVAÇÃO – TAXA FIXADA DE ACORDO COM MÉDIA PRATICADA PELO MERCADO NA ÉPOCA DA CONTRATAÇÃO – ABUSIVIDADE – NÃO COMPROVADA – TARIFA DE CADASTRO – COBRANÇA VÁLIDA – ABUSIVIDADE NÃO DEMONSTRADA – RESP. nº 1251331-RS E TEMA 958 do STJ – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (...) 3. Não há irregularidade na utilização da Tabela Price, em razão da distribuição dos juros no decorrer do contrato que permite que todas as parcelas a serem pagas sejam de valor constante. 4. O Método de Gauss não é exato, já que não se tem a certeza de que, ao final, os juros são calculados de forma simples, sendo inadequada sua aplicação em substituição à Tabela Price. 5. Havendo previsão contratual, não há ilegalidade na incidência da capitalização mensal dos juros, posto que foi pactuada de forma expressa.” (N.U 1006335-12.2023.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/08/2024, Publicado no DJE 30/08/2024) Da suposta ilegalidade na cobrança da tarifa de seguro prestamista. Neste particular, a parte requerida/apelante requereu a revisão do contrato quanto à contratação de seguro, sustentando que se trata de venda casada sendo, portanto, abusiva. A legalidade da cobrança de tal seguro nos contratos como o da espécie, fora firmada a tese contida no Tema 972, sendo que, a aplicação da Tese foi delimitada para os contratos bancários celebrados a partir de 30/04/2008, com instituições financeiras ou equiparadas, seja diretamente seja por intermédio de correspondente bancário, no âmbito das relações de consumo. Vejamos: “Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada.” No entanto, isso não significa que toda e qualquer disposição contratual prevendo a cobrança de seguro é inválida. Nesse ínterim, assentou-se entendimento de que o consumidor tem liberdade de contratar ou não seguro, sendo válida, em princípio, se houver sua concordância. Contudo, se não ficar assegurada, ao consumidor, a possibilidade de escolha da seguradora, que é imposta pela instituição financeira, a própria liberdade de contratar resta afetada, configurando venda casada e, por consequência, abusividade que deve ser coibida. Na hipótese, constata-se que o pacto foi celebrado depois de 30/04/2008, e a cópia da Cédula de Crédito Bancário em discussão evidencia que não houve a prática de venda casada do seguro, posto que foi oportunizado ao apelante a contratação ou não do seguro, tendo este optado por contratá-lo. Nesse sentido, é a jurisprudência hodierna: “APELAÇÃO CÍVEL - CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSGINADO - COTRATAÇÃO DE SEGURO PRESTAMISTA - VENDA CASADA NÃO COMPROVADA - REPETIÇÃO DE INDÉBITO - INDEVIDA - DANO MORAL - NAO CONFIGURADO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Não comprovada que a contratação de determinado negócio jurídico foi condicionada a de um acessório, não há a configuração da venda casada, máxime se verificada a possibilidade de não contratação do seguro”. (grifo nosso) (TJMT - Ap 78790/2017, DES. GUIOMAR TEODORO BORGES, QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 23/08/2017, publicado no DJE 25/08/2017) Da análise do contrato entabulado entre as partes, denominado Cédula de Crédito Bancário, extrai-se que a cláusula “Proposta de Adesão – Produto Pan Consignado Super Proteção” – prevê a cobrança do seguro, bem como, que a parte autora/apelante, possuía a liberalidade de contratar o seguro, inclusive, trata-se de empresa de grupo econômico diverso, o que demonstra a legitimidade na cobrança. (ID nº 276696363 – pág. 8-13) Noutro giro, percebo que a cobrança da tarifa, no importe total de R$ 108,58, sendo que, portanto, não se vislumbra onerosidade excessiva no presente caso. Portanto, nessas condições, afigura-se válida a contratação, bem como, não evidenciada ilegalidade/abusividade na cobrança do seguro, a sentença não merece reparos neste ponto recursal. Da devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente e dos danos morais suportados. Neste ponto recursal, restou-se prejudicado a análise dos referidos pedidos ante o fracasso recursal do apelo interposto pela recorrente, conforme motivos expostos alhures. Por essas razões, conheço do recurso de Apelação e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a r. sentença fustigada. Ante o resultado do julgamento, majoro os honorários de sucumbência fixados em desfavor da recorrente pelo Juízo de 1º Grau, para 13% (treze por cento) do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §11, do CPC, todavia, a execução de valores ficará suspensa, tendo em vista o benefício da assistência judiciária, de acordo com o art. 98, §3º, do Código de Processo Civil. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 5002910-50.2024.8.13.0481

ID: 313589799

Tribunal: TJMG Órgão: Núcleo de Justiça 4.0 - Cooperação Judiciária Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5002910-50.2024.8.13.0481

Data de Disponibilização: 02/07/2025

Polo Ativo:

MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

ADRIELLI CUNHA

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Belo Horizonte / Núcleo de Justiça 4.0 - Cooperação Judiciária RUA MANAUS, 467, 6º Andar, SANTA EFIGÊNIA, Belo Hori… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Belo Horizonte / Núcleo de Justiça 4.0 - Cooperação Judiciária RUA MANAUS, 467, 6º Andar, SANTA EFIGÊNIA, Belo Horizonte - MG - CEP: 30150-350 PROCESSO Nº: 5002910-50.2024.8.13.0481 CLASSE: [CÍVEL] PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO: [Aposentadoria por Idade (Art. 48/51), Aposentadoria Rural(Art. 48/51)] AUTOR: MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES CPF: 024.892.719-11 RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL CPF: 29.979.036/0001-40 SENTENÇA RELATÓRIO MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES ajuíza a presente ação em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, buscando a concessão de aposentadoria por idade rural. 1. Petição inicial Síntese dos fatos narrados pela parte autora: - A autora, nascida em 23/04/1963, afirma ter completado o requisito etário de 55 anos em 23/04/2018 e, desde 16/08/1994, exercer atividade rural como diarista/boia-fria em diversas fazendas da região de Patrocínio/MG, com vínculos formais intermitentes registrados na CTPS e no CNIS e longos períodos sem registro por omissão dos empregadores. - Afirma que, em 17/01/2023, protocolou o requerimento administrativo de aposentadoria por idade rural (NB 204.985.764-5), que foi indeferido pelo INSS sob alegação de “falta de carência”. Sustenta, contudo, possuir mais de 180 meses de labor rural, computados: pelos vínculos anotados e pelos períodos trabalhados sem registro, a demonstrar por prova testemunhal; e, subsidiariamente, mediante a regra de cômputo diferenciado do art. 3º da Lei 11.718/2008 para empregado rural, que multiplica por três (2011-2015) ou por dois (2016-2020) cada mês comprovado. - Alega que o trabalhador boia-fria se equipara ao segurado especial (art. 11, VII, Lei 8.213/91) e, portanto, está dispensado do recolhimento de contribuições, bastando início de prova material corroborado por prova oral, conforme Súmula 14 da TNU, Súmula 577 do STJ e Tema repetitivo REsp 1.321.493/PR. - Fundamenta o pedido nos arts. 201 § 7º II da CF, 39, 48 § 1º e 142 da Lei 8.213/91, e nos arts. 256 e 258 da IN 128/2022, defendendo que basta comprovar atividade rural, ainda que descontínua, no período correspondente à carência. Pedido de tutela de urgência: Implantação imediata do benefício de aposentadoria por idade rural. Pedido de tutela definitiva: Pede a concessão dos benefícios da gratuidade de justiça. Pede o reconhecimento do exercício de atividade rural na condição de boia-fria/diarista de 16/08/1994 até a DER e concessão da aposentadoria por idade rural a contar do requerimento administrativo (17/01/2023), com pagamento das prestações em atraso. 2. Despacho inicial em ID 10211082646 Deferido os benefícios da justiça gratuita. Indeferido o pedido de tutela de urgência em sede de cognição sumária. 3. Contestação – síntese da resistência apresentada em ID 10226842574 - O réu alega preliminar de existência de coisa julgada, sob o argumento de que nos autos n. 1001271-21.2022.4.01.3806, o pedido de aposentadoria por idade rural da parte autora foi julgado improcedente, ao argumento de que a documentação apresentada pela parte autora, na ocasião, não possuía eficácia probatória suficiente para comprovar o labor rural por 180 meses, no período imediatamente anterior ao implemento da idade e/ou requerimento administrativo. Assim, requereu, a extinção do feito e a condenação da parte autora em litigância de má-fé. - No mérito, sustenta a inexistência de início de prova material contemporânea suficiente para comprovar o alegado labor rural da parte autora, especialmente no período necessário à formação da carência legal de 180 meses. Afirma que os documentos juntados não comprovam o efetivo exercício de atividade rural como boia-fria, de modo contínuo e habitual, nos termos exigidos pela legislação previdenciária. - Argumenta que a autora não se enquadra como segurada especial, pois exerceu atividade rural como empregada rural diarista, categoria que exige o recolhimento de contribuições previdenciárias por parte do empregador. Portanto, defende que a autora não pode se beneficiar da regra do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, tampouco da jurisprudência aplicável aos segurados especiais. - Ressalta que, ainda que se considerem os vínculos constantes do CNIS, não há comprovação de tempo suficiente de contribuição ou de trabalho rural para preencher a carência mínima exigida para a aposentadoria por idade rural. - Sustenta que o encerramento dos vínculos rurais no cadastro da parte autora coincide com o início do labor exclusivamente urbano exercido por seu cônjuge desde o ano de 2013. Afirmou que, apesar de o trabalho urbano, por um dos membros da família, por si só, não descaracterizar a qualidade de segurado dos demais componentes do grupo familiar, no caso dos autos, a renda decorrente do trabalho urbano do marido da parte autora tem repercussão importante na renda familiar, de modo de que o trabalho rural é dispensável ou complementar e, portanto, descaracteriza a qualidade de segurado. - Aponta que não incidem as regras do art. 3º da Lei 11.718/2008 no caso concreto, uma vez que a autora não comprova atividade como segurada empregada rural com os registros legais devidos. - Ao final, pugna pela total improcedência do pedido, com a condenação da parte autora em custas e honorários advocatícios. 4. Impugnação à contestação – síntese da manifestação de ID 10251806711 - Em relação à preliminar alegada pela parte ré, a parte autora sustenta que a nova ação não reproduz integralmente a anterior (processo n. 1001271-21.2022.4.01.3806), pois, embora haja identidade de partes, os pedidos e a causa de pedir são distintos. O primeiro processo baseava-se em requerimento administrativo de 2021 e buscava o reconhecimento da carência com base em outro período, ao passo que a presente demanda se funda em requerimento de 2023, envolvendo diferentes períodos de prova e pedidos. - Destaca que, mesmo se houvesse identidade, a coisa julgada em matéria previdenciária deve ser relativizada, conforme entendimento doutrinário e jurisprudencial, pois o direito à prestação previdenciária se rege por princípios como o da dignidade da pessoa humana, do devido processo legal e da busca pela verdade real. Argumenta-se que a decisão anterior não impede a rediscussão da matéria diante de novas provas e de um novo requerimento administrativo, sendo inaplicável a preclusão material quando há possibilidade de comprovação posterior do direito. - Cita, ainda, entendimento de que a coisa julgada no âmbito previdenciário opera-se secundum eventum probationis, ou seja, pode ser superada se a negativa anterior decorreu da insuficiência de provas, o que justifica nova demanda com base em novos elementos probatórios. - No mérito, assevera que as atividades urbanas de seu cônjuge não descaracterizam a sua condição de trabalhadora rural, pois não é segurada especial em regime de economia familiar, mas diarista rural/boia-fria individualmente. Aduz que o § 9º do art. 11 da Lei 8.213/91 estabelece que apenas o membro que exerce atividade urbana tem a sua condição de segurado especial descaracterizada, uma vez que o vínculo previdenciário se dá pelo trabalho e não pela renda. - Rebate os argumentos do INSS e reafirma que sempre exerceu atividade rural como boia-fria, em caráter habitual e descontínuo, em diversas fazendas da região de Patrocínio/MG, o que a equipara à condição de segurada especial. - Defende que, sendo boia-fria, está dispensada do recolhimento de contribuições previdenciárias, e que o tempo de labor rural pode ser comprovado por início de prova material, ainda que extemporâneo, corroborado por prova testemunhal, conforme entendimento consolidado na jurisprudência, inclusive nas Súmulas 14 da TNU e 577 do STJ. - Argumenta que os documentos acostados aos autos, como contratos de trabalho e extratos do CNIS, formam um conjunto probatório válido que, aliado à prova oral a ser produzida, comprova o exercício rural no período exigido para a carência. Ressalta, ainda, que a regra do art. 3º da Lei 11.718/2008 deve ser aplicada, pois a autora exerceu atividade como empregada rural sem a devida formalização, por omissão dos empregadores. 5. Instrução processual Ata Notarial com depoimento das testemunhas em ID 10348678192. 6. Outras manifestações relevantes: Alegações finais da parte autora em ID 10360259813. O julgamento foi convertido em diligência em ID 10439382683, ocasião em que foi determinada a intimação da parte autora para se manifestar sobre a preliminar de coisa julgada alegada pela defesa. A parte autora manifestou-se em ID 10446823572 e informou que não há que se falar em coisa julgada, pois a ação de nº 1001271-21.2022.4.01.3806 baseia-se em requerimento administrativo diverso do que foi indicado nestes autos. Além disso, afirmou que foi concedido a ela o benefício de incapacidade permanente nos autos nº 5005876-20.2023.8.13.0481, porém o benefício ainda não tinha sido implantado e não impediria a análise de seu direito neste processo, pois não conflita com o § 9º do art. 11 da Lei n. 8213/91. Juntou cópia dos autos em ID 10446840658. Intimado (ID 10447434456), o INSS manifestou em ID 10450379058, reiterando os termos da contestação e das manifestações posteriores. FUNDAMENTAÇÃO Questões preliminares e/ou questões processuais pendentes 1.1 Preliminar de coisa julgada. A preliminar de coisa julgada suscitada pela autarquia previdenciária não merece acolhida. Em ações previdenciárias, cabe salientar que a análise da coisa julgada possui particularidades. Embora nas ações civis o CPC conceitue coisa julgada pela repetição de partes, causa de pedir e pedido, nas ações previdenciárias a jurisprudência admite nova demanda, se houver novas provas e mudanças nas circunstâncias fáticas e jurídicas não verificadas na ação anterior. Nesse sentido, o Tribunal Regional da 1° Região tem se posicionado: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. SENTENÇA PROFERIDA NA VIGÊNCIA DO CPC DE 1973. PRELIMINAR DE COISA JULGADA REJEITADA. RELAÇÃO PROCESSUAL COM SUJEITOS DISTINTOS. NÃO IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE MÉRITO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE CONCEDEU O BENEFÍCIO À FILHA DO INSTITUIDOR. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS ALTERADOS DE OFÍCIO. 1. Recurso de apelação em que se questiona a ocorrência da coisa julgada uma vez que a suposta companheira do falecido, genitora da parte autora, já havia ingressado anteriormente com uma ação para a concessão de pensão por morte, na qualidade de companheira do de cujus, que foi julgada improcedente, tendo a decisão transitado em julgado. 2. A coisa julgada configura-se quando há identidade de ações, ou seja, quando as partes, a causa de pedir e o pedido são os mesmos em duas ações distintas, sendo que uma delas reproduz uma anterior já decidida por sentença da qual não cabe mais recurso. 3. A jurisprudência tem-se firmado no sentido de que, em razão do caráter social que permeia o Direito Previdenciário, ela opera efeitos secundum eventum litis ou secundum eventual probationis, permitindo, assim, a propositura de nova demanda pelo segurado postulando o mesmo benefício, diante de novas circunstâncias ou novas provas que acarretem a alteração da situação fática e jurídica verificada na causa anterior.(...). (AC 0067159-86.2013.4.01.9199, DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM, TRF1, SEGUNDA TURMA, PJe 28/05/2024 PAG - Destaques acrescidos) Embora as partes e o pedido (concessão de aposentadoria por idade rural) sejam os mesmos, a causa de pedir apresenta distinção material relevante, pois os fundamentos da nova postulação estão baseados em requerimento administrativo diverso, realizado em 17/01/2023 (NB 204.985.764-5), o qual não foi objeto da ação anterior, que tinha como base o requerimento realizado em 17/06/2021 (ID 10446840658, pág. 20). Na presente ação, a autora busca o reconhecimento de vínculos rurais e eventual reafirmação da DER com base em conjunto probatório atualizado e distinto daquele apreciado na demanda anterior. A esse respeito, tem decidido a jurisprudência: PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADORA RURAL. SEGURADA ESPECIAL. POSTULAÇÃO JÁ ANALISADA EM PROCESSO ANTERIOR. NOVO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS. RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA. CTPS. PROVA PLENA. SENTENÇA ANULADA. TEMA 905 STJ. INVERTIDO O ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. RECURSO PROVIDO. (...) 3. Afasto a preliminar de coisa julgada, pelo fato da parte autora ter apresentado novo requerimento administrativo datado em, 27/1/2020 e novos documentos. Compulsando os autos, verifico que a parte autora trouxe provas materiais acerca da sua qualidade de segurada especial rural, em especial a CTPS com diversos registros de trabalhadora rural dentro do período de carência (fl. 170 a 174 da rolagem única). 4. Assim, o conjunto probatório revela o exercício do labor rural, bem como o cumprimento da carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91. Portanto, atendidos os requisitos indispensáveis à concessão do benefício previdenciário - início de prova material apta a demonstrar a condição de rurícola da autora, corroborada por prova testemunhal, e idade mínima, é devido o benefício de aposentadoria por idade rural. 5. Tendo em vista o princípio da dignidade da pessoa humana, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, têm consolidado entendimento no sentido da flexibilização da rigidez processual, com vistas a favorecer a concessão legítima de benefício previdenciário, seja no campo da coisa julgada relativamente a provas não constituídas em processo anterior, seja na seara da decadência. 6.Apelação a que se dá provimento (AC - 1002602-15.2024.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUO NETO, TRF1, NONA TURMA, PJe 03/12/2024 PAG - destaques acrescidos. Dessa forma, considerando que a presente ação foi instruída por novo requerimento administrativo e novas provas, afasto a preliminar de coisa julgada arguida pelo réu. 1. Pontos Controvertidos Considerando o que se expôs no relatório quanto às alegações iniciais e à contestação, têm-se como pontos controvertidos a serem dirimidos nesta sentença: - Comprovação do exercício de atividade rural pela parte autora, na condição de boia-fria, em período suficiente para o cumprimento da carência exigida para a aposentadoria por idade rural. - se a condição de trabalhador urbano do marido da parte autora descaracteriza a condição de segurada especial. - Possibilidade de aplicação da regra de cômputo diferenciado da carência prevista no art. 3º da Lei n. 11.718/2008, considerando o enquadramento da autora como empregada rural com vínculos intermitentes e eventual informalidade. 2. Requisito etário e carência no caso concreto Para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, exige-se, primeiramente, a comprovação do critério de idade estabelecido no art. 48, § 1º, da Lei 8.213/91, qual seja, atingir 60 anos de idade para homem e 55 anos para mulher. Embora não tenha sido controvertido esse ponto, é importante destacar que a parte autora atingiu os 55 anos de idade em 23/04/2018 (ID10193997308). Este requisito etário encontra-se, portanto, preenchido. Outro requisito é a comprovação do tempo de carência, considerando o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício (art. 142 da Lei nº 8.213/91). No caso em análise, a parte autora completou 55 anos em 2018, exigindo-se 180 meses (15 anos) de atividade rural para o cumprimento da carência, conforme a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91. Este período de carência deve ser contado retroativamente à data em que a autora implementou o requisito etário (23/04/2018) ou à data do requerimento administrativo judicial (17/01/2023). 3. Análise das provas produzidas Para a solução de processos relacionados à aposentadoria por idade rural, é necessário considerar a peculiaridade do trabalho rural e as dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores para comprovar o vínculo empregatício, especialmente em razão da informalidade, como a ausência de registro em carteira, comum em vínculos de curta duração. Diante disso, exige-se uma análise diferenciada dos demais benefícios previdenciários, permitindo-se maior flexibilidade na avaliação das provas apresentadas, de modo a evitar que esses trabalhadores sejam prejudicados pela falta de documentação formal, devendo-se considerar as particularidades de cada caso concreto. Por isso, não existe prova tarifada em sede de Direito Previdenciário, sendo autorizado o emprego de todos os meios legais, bem como moralmente legítimos, para que o interessado demonstre seu pretenso direito (art. 369, CPC). Em outros termos, não há previsão legal, nem jurisprudencial, de que seja exigível a produção de um ou outro tipo específico de prova, em processo de natureza previdenciária (Tema 554, STJ). O que se limita é tão somente a instrução processual com prova de natureza exclusivamente oral (art. 55, § 3º, Lei 8.213/91 e Súmula 149, STJ). Como início de prova material, a parte autora juntou: i) CNIS de ID 10193996960, no qual consta curtos períodos de vínculos empregatícios no período de 16/08/1994 a 14/09/1994, 16/01/1995 a 03/02/1995; 16/01/1995 a 03/02/1995; 02/06/1997 a 24/06/1997; 06/07/1998 a 04/08/1998; 27/08/1998 a 10/09/1998; 23/11/2009 a 05/02/2010; 18/02/2010 a 21/03/2010; 12/05/2010 a 12/07/2010; 20/07/2010 a 23/08/2010; 04/01/2011 a 25/04/2011; 17/06/2011 a 01/08/2011; 07/11/2011 a 14/04/2012. Além de vínculos como contribuinte individual, no período de 01/03/2014 a 28/02/2015. Deve ser reconhecido ainda, que, conforme alegado pelo próprio réu na contestação de ID 10226842574, nos autos n. 1001271-21.2022.4.01.3806, a 1ª Turma Recursal da SSJ de Uberlândia-MG, reconheceu e determinou a averbação de tempo de serviço rural exercido pela parte autora, nos anos de 1994, 1995, 1997, 1998, 2009, 2010, 2011 e 2012, que foi devidamente realizado pelo INSS, conforme documentos de ID 10446840658, pág 258 a 260, totalizando, assim, 8 anos de trabalho rural. Em relação aos períodos de trabalho a serem comprovados por prova material, a jurisprudência tem decidido que “não é exigido que essa prova abranja todo o período que se quer comprovar, bastando ser contemporânea aos fatos e referir-se a, pelo menos, uma fração daquele período, corroborado com prova testemunhal, a qual amplie sua eficácia probatória”. Veja-se: PREVIDENCIÁRIO. EMPREGADO RURAL. COMPROVAÇÃO DO TRABALHO RURAL EM CTPS. CONTEMPORANEIDADE DA PROVA EM RELAÇÃO AOS FATOS ALEGADOS. PROVA TESTEMUNHAL COERENTE. DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO DO INSS. 1. O rol de documentos previsto no art. 106 da Lei 8213/91 é meramente exemplificativo, sendo admissível, inclusive, a apresentação de documentos em nome de terceiros, notadamente de parentes, desde que, em razão do cotejo com outros elementos probatórios contidos nos autos, o julgador se convença do exercício de atividade rural pela parte. 2. Não se exige que a prova material abranja todo o período que se quer comprovar, bastando o início de prova material ser contemporâneo aos fatos alegados e referir-se, pelo menos, a uma fração daquele período, corroborado com prova testemunhal, a qual amplie sua eficácia probatória (STJ - Segunda Turma - AgRg no AREsp 385318 / PR - Rel. Min. Humberto Martins - Data do julgamento: 24/09/2013 - Dje 04/10/2013). 3. Destaco que as anotações lançadas em carteira de trabalho gozam de presunção legal de veracidade juris tantum, recaindo sobre o réu os ônus de comprovar a falsidade de suas anotações. 4. A prova testemunhal foi suficiente a comprovar o exercício de trabalho rural pelo período de carência necessário à concessão do benefício. 5. Dar provimento à apelação do autor. (TRF6, AC 1010600-30.2023.4.06.9999, 1ª Turma - PREV/SERV, Relator para Acórdão LEONARDO AUGUSTO DE ALMEIDA AGUIAR, D.E. 21/02/2025 - destaques acrescidos). Além das provas documentais, a parte autora apresentou declarações de terceiras pessoas, colhidas em Ata Notarial (ID 10348678192), conforme trechos abaixos transcritos: DEPOENTE NARIA MARIA DA COSTA PINHEIRO: " (...). Declara que conheceu a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES trabalhando na lavoura. Depoente declara que também conheceu os pais da MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES porque a família da MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES morava no bairro Carajás na cidade de Patrocínio/MG, local onde os irmãos da Depoente moravam. Depoente declara que se mudou para Patrocínio/MG em 2006 (dois mil e seis) e desde então, passou a conhecer a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES. Depoente declara que trabalhou muito com a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES como diarista rural, principalmente na época da colheita. Depoente declara que sempre cruzava com a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES na lavoura. Depoente declara que ela e a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES trabalhavam por dias ou meses em uma mesma fazenda e depois disso, ambas se mudavam para outra fazenda. Depoente afirma que trabalhou em diversas fazendas com a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES, sendo estas: a Fazenda do Zé Martin, Fazenda Gerson Barbosa, Fazenda do José Carlos Grossi, Fazenda Chapadão de Ferro, Fazenda Luciana, Fazenda do João Nico e na Fazenda do Caio Veloso. Depoente declara que nessa época, ela e a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES moravam na cidade e iam trabalhar na roça todos os dias. Depoente declara que as fazendas que eram perto, ela e a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES iam trabalhar de pé, já as fazendas mais distantes, como por exemplo, a Chapadão de Ferro, ela e a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES iam trabalhar de caminhão. Depoente declara que nas fazendas distantes, havia um caminhão que passava na cidade, buscava a turma de trabalhadores rurais nos pontos e os levava para as fazendas. Depoente declara que ela e a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES trabalharam por muitos anos como diaristas rurais e safristas, porém, sem registro na carteira de trabalho. Depoente afirma que ela e a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES trabalharam em várias fazendas sem o registro na carteira de trabalho. Depoente declara que os fazendeiros não faziam nem um contrato com o trabalhador rural. Depoente declara ela e a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES trabalhavam todos os dias, porque se não trabalhassem, elas não tinham o que comer. Depoente declara que outras pessoas costumavam a falhar no serviço, mas ela e a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES não falhavam no trabalho porque ambas precisavam do dinheiro para se alimentar. Depoente declara que desde quando conheceu a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES, nunca viu a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES com algum marido. Depoente declara que houve diversos momentos que a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES comentava que estava trabalhando na roça em jejum porque a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES não tinha dinheiro nem para comprar o pão para comer. Depoente declara já dividiu a marmita com a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES várias vezes nas fazendas. Depoente declara que a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES sempre foi uma pessoa sofrida. Depoente declara que desde quando conheceu a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES, em 2006 (dois mil e seis), até o presente o momento, em 2024 (dois mil e vinte e quatro), afirma que a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES sempre trabalhou na roça. Depoente declara que sempre viu a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES trabalhando na lavoura de café. Nada mais tem a declarar." DEPOENTE IVONETE REIS DOS SANTOS SILVA: "Declara que não é amiga íntima ou próxima da MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES, mas apenas conhecida de muitos anos. Declara não ser parente nem inimiga. Declara que nada a impede de dizer a verdade neste depoimento. Declara que não tem nenhum tipo de interesse no processo. Declara que conheceu a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES trabalhando na roça. Depoente declara que morava na Bahia e se mudou para Patrocínio/MG em 2012 (dois mil e doze). Depoente declara que quando se mudou para Patrocínio/MG, passou a ter contato com a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES porque ambas trabalhavam juntas nas lavouras de café. Depoente afirma que já trabalhou em diversas fazendas com a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES, sendo estas: a Fazenda do José Carlos Grossi, na Fazenda Chapadão de Ferro e na Fazenda Boa Vista. Depoente declara que nessas fazendas, via a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES capinando, colhendo, plantando e desbrotando café. Depoente declara que ela e a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES costumavam trabalhar nas lavouras de café. Depoente informa que a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES morava na cidade e ia trabalhar todos os dias na roça, já a Depoente morava na roça. Depoente declara que ambas se encontravam na roça. Depoente narra que havia um ônibus que buscava a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES e toda a turma da cidade para os levar para as fazendas. Depoente declara em todas as fazendas que trabalhou junto com a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES, ambas não tiveram a carteira de trabalho assinada. Depoente declara que era muito comum trabalhar na roça sem o registro na carteira de trabalho. Depoente declara que isso acontecia principalmente na época da colheita, porque os fazendeiros chamavam a turma para trabalhar por cerca de 15 (quinze) a 20 (vinte) dias e por isso, os fazendeiros não assinavam a carteira de trabalho. Depoente declara que ela e a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES trabalharam muito como diaristas rurais/boias-frias. Depoente declara que desde quando conheceu a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES, em 2012 (dois mil e doze), até o presente momento, em 2024 (dois mil e vinte e quatro), afirma que nunca viu a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES trabalhando na cidade, somente na roça. Depoente informa que sempre que entrava em contato com a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES, a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES informava que estava na lavoura. Depoente declara que nunca viu a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES realizando atividades urbanas, somente atividades braçais rurais. Depoente declara que a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES sempre foi uma mulher muito trabalhadora. Depoente declara que desde quando conheceu a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES, sabe que a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES não tinha marido e por causa disso, a MARIA APARECIDA QUEIROZ GEMES sempre trabalhou muito para sustentar a casa. Nada mais tem a declarar." Observa-se que a testemunha MARIA MARIA DA COSTA PINHEIRO afirmou conhecer a parte autora desde o ano de 2006 e ter trabalhado com ela em várias fazendas da região como boia-fria/diarista, sem registro formal em carteira, bem como que, desde que conheceu a parte autora, esta sempre trabalhou no meio rural, em lavouras de café. Depoimento este que foi corroborado pela testemunha IVONETE REIS DOS SANTOS SILVA, que afirmou conhecer a parte autora desde o ano de 2012 e acrescentou nunca tê-la visto realizando atividades urbanas, sempre atividades rurais, até o ano de 2024. Em que pese os depoimentos das testemunhas, após o ano de 2012, a parte autora não juntou aos autos nenhum início de prova material do exercício de atividade rural como boia-fria/diarista, a fim de corroborar os depoimentos, de modo que cabe apenas o reconhecimento do labor rural exercido pela parte autora nos anos de 2006, 2007 e 2008, haja vista que, conforme acima exposto, já houve o reconhecimento dos anos de 2009, 2010, 2011 e 2012, em ocasião anterior. Assim, restaram comprovados 12 anos de atividade rural, tempo inferior à carência necessária para a concessão do benefício. Além de não existir prova início de prova material de efetivo labor rural após o ano de 2012, a parte ré alega que o cônjuge da parte autora, no ano de 2013, passou a exercer atividade urbana, o que descaracterizaria a sua condição de segurada especial. A esse respeito, verifica-se que as testemunhas afirmaram que a parte autora não tinha marido e, por isso, sempre trabalhou muito para sustentar a casa. No entanto, a própria parte autora não impugnou a alegação da parte ré de que é casada, de que o Sr. STEFANO ALEXANDRE GEMES é seu marido e de que ele exercia atividade urbana no período em que se pretende a comprovação da condição de trabalhadora rural como boia-fria/diarista. Assim, entendo que não há controvérsia neste ponto e, portanto, a matéria independe de prova (art. 374, III, do CPC). Em sede de contestação, o réu apontou que a data do último registro formal no CNIS da parte autora como trabalhadora rural, em 14/04/2012 (ID10226842575), coincide com a data de registro de atividade urbana desempenhada pelo cônjuge da autora como motorista, em 06/2013 (ID10226842577), o que descaracterizaria a qualidade de segurada da parte autora, uma vez que a remuneração recebida por ele com tal atividade tem repercussão importante na renda familiar. A parte autora, por outro lado, afirmou que a atividade urbana desempenhada por seu cônjuge não descaracteriza sua condição de trabalhadora rural, uma vez que o trabalho era exercido individualmente como boia-fria/diarista, e não em regime de economia familiar. Em relação aos trabalhadores rurais boia-fria/diarista, é importante destacar que a jurisprudência os equipara aos segurados especiais no que tange aos requisitos para a concessão de benefícios previdenciários. Veja-se: PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DO TRABALHADOR BÓIA-FRIA. EQUIPARAÇÃO AO SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, VII DA LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Esta Corte consolidou a orientação de que o Trabalhador Rural, na condição de bóia-fria, equipara-se ao Segurado Especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, no que tange aos requisitos necessários para a obtenção de benefícios previdenciários. 2. Exigindo-se, tão somente, a apresentação de prova material, ainda que diminuta, desta que corroborada por robusta prova testemunhal, não havendo que se falar em necessidade de comprovação de recolhimentos previdenciários para fins de concessão de aposentadoria rural (REsp. 1.321.493/PR, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 19.12.2012). 3. É inegável que o trabalhador bóia-fria exerce sua atividade em flagrante desproteção, sem qualquer formalização e com o recebimento de valores ínfimos, o que demonstra a total falta de razoabilidade em se exigir que deveriam recolher contribuições previdenciárias. 4. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento. (REsp n. 1.762.211/PR, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 27/11/2018, DJe de 7/12/2018.). Desse modo, tem-se que, para os trabalhadores rurais boia-fria/ diarista, também devem ser observadas as regras atinentes aos segurados especiais. Assim, apesar de o § 9º do art. 11 da Lei n. 8.213/91 estabelecer que não é considerado segurado especial apenas o membro da família que possuir outra fonte de rendimento, o §10, II, “b”, do art. 11 da referida Lei, prevê que o segurado especial fica excluído dessa categoria se o grupo familiar que a pertence excerder o limite de dias em atividade remunerada estabelecidos no inciso III do § 9o deste artigo, ou seja, 120 dias corridos ou intercalados no ano civil, que é flexibilizado pelo STJ para até 24 (vinte e quatro) meses (AgRg no REsp 1.354.939/CE, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima, o AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.771.821/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, julgado em 23/5/2022, o AgInt no REsp n. 1.768.946/PR, relator Ministro Manoel Erhardt, julgado em 3/10/2022). No caso dos autos, observa-se no Dossiê previdenciário do cônjuge da parte autora juntado em ID 10226842577, que ele exerceu atividade urbana do ano de 2013 até pelo menos o ano de 2024, ou seja, aproximadamente 9 (nove) anos. Assim, considerando que este período abrange o período em que a parte autora pretende comprovar a carência como trabalhadora rural para fins de concessão da aposentadoria por idade rural, a sua condição de segurada especial estaria descaracterizada, no que tange ao período de 2013 a 2024. No mesmo sentido é o entendimento jurisprudencial do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, veja-se: EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REQUISITOS. SEGURADO ESPECIAL. PROVA MATERIAL. EMPREGOS URBANOS DO CÔNJUGE. DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. HONORÁRIOS RECURSAIS. 1. O artigo 48, §'s 1º e 2º, da lei 8.213/91 define os requisitos necessários à aposentadoria por idade rural, que, em síntese, são: a) satisfação do requisito etário (60 anos e 55 anos, respectivamente homens e mulheres); b) exercício de atividade rural pelo lapso exigido em lei equivalente à carência exigida para concessão do benefício, devendo ser explicado que, por atividade rural, entende-se emprego rural, trabalho rural eventual, trabalhador avulso rural e trabalho rural na situação de segurado especial; c) e comprovação da atividade rural. O trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do artigo 11 da lei 8.213/91. O período de carência consta do artigo 142 da lei 8.213/91 e varia de acordo com o ano em que o segurado completou a idade mínima para se aposentar. O artigo 143 da lei 8.213/91 prevê que, completados 15 anos de trabalho rural, o segurado pode requerer a aposentadoria rural por idade. 2. A autora nasceu em 06.02.1963 e completou 55 anos de idade em 06.02.2018. DER em 09.07.2019. Em sua petição inicial, a autora alega que exerceu atividade rural na situação de segurada especial e emprego rural. De fato, ela exerceu vários vínculos de emprego rural, os quais somam mais de 12 anos de trabalho rural. É preciso distinguir a figura do empregado rural, regulada pela Lei 5.889/1973, da figura do segurado especial, regulada pela Lei 8.213/91. A diferença existe e deve ser observada, seguindo o regramento legal dado às situações. Os segurados especiais são segurados obrigatórios do RGPS, segundo o artigo 11, inciso VII, da Lei 8.213/91. Entende-se por regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes (artigo 11, VII, § 1º, da Lei 8.213/91). 3. O reconhecimento de tempo de serviço prestado na condição de segurado especial em regime de economia familiar exige início razoável de prova material a ser reafirmada por prova testemunhal, a teor da Súmula 149 do STJ e do Tema 297 do STJ. É pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que o rol de provas do artigo 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo (STJ AgRG no REsp 1073730/CE). Segundo o Superior Tribunal de Justiça - STJ, a situação do trabalhador rural é socioeconomicamente vulnerável, a ponto de os trabalhadores rurais não se preocuparem muito em produzir documentos acerca da condição de rurícola, o que deve ser considerado pela Justiça, por ocasião do julgamento de causas nas quais se pedem benefícios previdenciários. Para o Superior Tribunal de Justiça - STJ, as certidões de nascimento, casamento e óbito, bem como certidão da Justiça Eleitoral, carteira de associação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais, ficha de inscrição em Sindicato Rural, contratos de parceria agrícola, podem servir como início da prova material nos casos em que a profissão de rurícola estiver expressamente mencionada. É firme a orientação jurisprudencial no sentido de que, para concessão de aposentadoria por idade rural, não se exige que a prova material do labor agrícola se refira a todo o período de carência, desde que haja prova testemunhal apta a ampliar a eficácia probatória dos documentos, como na hipótese em exame. Por fim, a jurisprudência consigna a possibilidade de extensão da situação de rurícola do cônjuge lavrador à sua esposa ou companheira. 4. A prova material referente à qualidade de segurada especial da autora consiste na carteira de trabalho, a qual informa que a autora exerceu vários vínculos de emprego rural, na situação de safrista. O safrista é equiparado pela jurisprudência ao segurado especial. Precedentes: REsp n. 1.667.753/RS, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 7/11/2017, DJe de 14/11/2017; AC 1036422-88.2020.4.01.0000, Desembargador Federal Morais Da Rocha, Trf1 - Primeira Turma, PJe 14/06/2023 PAG.; e Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) 0001191-14.2016.4.01.3506, Ivanir Cesar Ireno Junior - Turma Nacional De Uniformização, 29/04/2021. 5. A prova material não sustenta a procedência do pedido, porque o CNIS do cônjuge da autora revela que ele exerceu extensos vínculos de emprego urbano, muitos dos quais na situação de motorista de ônibus. Os vínculos de emprego do cônjuge da autora se iniciaram em 1983 e terminaram em 2011, sendo que, desde 2004, ele recebe aposentadoria urbana. O trabalho rural da autora em regime de economia familiar foi descaracterizado. Assim, a sentença deve ser reformada, a fim de que o pedido seja julgado improcedente, por falta de cumprimento de carência de 15 anos. 6. Apelação do INSS provida. Tutela antecipada revogada. (TRF6, AC 1001603-33.2022.4.01.9999, 1ª Turma - PREV/SERV , Relator para Acórdão GRÉGORE MOREIRA DE MOURA , D.E. 25/06/2025). Outrossim, existindo renda alternativa, o entendimento jurisprudencial é de que, não basta ter havido exercício de trabalho rural, fazendo-se necessária a demonstração da relevância dessa atividade para o sustento da família. Veja-se: EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL EFICAZ. RENDA URBANA DO CÔNJUGE. PROVA UNICAMENTE TESTEMUNHAL. IMPOSSIBILIDADE. BENEFÍCIO INDEVIDO. RECURSO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO. 1. Nos termos do art. 48, §1º, da Lei nº 8.213/91, o trabalhador rural, enquadrado na condição de segurado especial (art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91), e o empregado rural (art. 11, I, a, da Lei nº 8231/91), para fazerem jus à aposentadoria por idade, necessitam preencher os seguintes requisitos: idade de 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher, e 60 (sessenta) anos, se homem, e comprovar o efetivo exercício de atividade rural (na forma do art. 106 da Lei nº 8.213/91), ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência estabelecida no art. 142 c/c art. 143 da Lei 8.213/1991 (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91). 2. A comprovação do efetivo labor como trabalhador rural em regime de economia familiar (segurado especial) se dá nos termos do art. 106 da Lei nº 8.213/91 e, na esteira de precedentes do STJ, por meio de início razoável de prova material, complementado por prova testemunhal, e, por ser apenas o início de prova, os documentos não precisam abranger todo o período a ser comprovado, como bem aponta o enunciado nº 14 da TNU. 3. A parte autora trouxe aos autos, junto da inicial, documentos que consideram válidos para comprovação de sua atividade campesina. Contudo, a despeito da presença de trabalho rural, tais documentos não consubstanciam início de prova material eficaz da alegada condição de segurada especial da parte, em regime de economia familiar e de subsistência. 4. Com efeito, além da escassez da prova documental colacionada aos autos, há comprovação de que a suposta atividade rural desenvolvida pelo autor não se dava em regime de economia de economia familiar e de subsistência. Registre-se que sua esposa sempre foi trabalhadora urbana (professora), conforme comprovado pelo CNIS (fls. 103/115 do processo em PDF), trabalhando para o Município de Januária, desde 1999, e para o Estado de Minas Gerais, desde 1990, auferindo rendimentos bem superiores ao salário-mínimo. No caso, se há prova da existência de renda alternativa, não basta ter havido exercício de trabalho rural, fazendo-se necessária a demonstração da relevância desse labor para o sustento da família, não tendo sido produzida prova nesse sentido nos autos. 5. Ressalte-se, ainda, que a prova testemunhal produzida nos autos não se presta, por si só, para comprovar o tempo de serviço rural, sendo imprescindível a existência de início de prova material contemporâneo, conforme preconiza o art. 55, §3º, da Lei 8.213/91, o que, como dito, não sucedeu no presente caso. 6. Assim sendo, em razão da fragilidade da prova documental colacionada aos autos, a conclusão a que se chega é que não restou demonstrada, de forma razoavelmente satisfatória, a condição de segurado especial, devendo ser mantida a sentença de julgamento sem resolução do mérito. 7. Considerando-se que a sentença recorrida foi proferida sob a vigência do CPC/2015 e que ao presente recurso é negado provimento, em observância ao princípio da causalidade, impõe-se a majoração dos honorários advocatícios sucumbenciais em dois pontos percentuais, na forma do § 11 do art. 85 do Código de Processo Civil, cuja execução fica, contudo, suspensa por litigar a parte recorrente sob o benefício da justiça gratuita. 8. Recurso da parte autora desprovido. Majorados os honorários advocatícios. (TRF6, AC 6000131-97.2024.4.06.9999, 1ª Turma - PREV/SERV, Relator para Acórdão EDILSON VITORELLI DINIZ LIMA, D.E. 27/09/2024 - destaques acrescidos). Destarte, no caso em tela, observa-se que, além da ausência de início de prova material acerca a atividade rural como diarista/boia fria após o ano de 2012, e do longo período de atividade urbana exercida pelo cônjuge, a parte autora não comprovou a relevância do alegado labor rural para a subsistência da família, ônus que lhe incumbia (art. 373, I do CPC). Diante disso, considerando a ausência de comprovação do efetivo labor rural, no período de carência estabelecido em lei, verifica-se a impossibilidade de deferimento do benefício postulado na petição inicial. Ante o exposto, REJEITO a pretensão inicial (CPC, art. 487, I). Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, além dos honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §2º do CPC. No entanto, suspendo a exigibilidade diante da gratuidade que lhe foi deferida, nos termos do art. 98, §3º do CPC. Transitada em julgado e nada mais requerido, devolvam-se os autos à origem, para diligências finais, baixa e arquivamento.

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