Processo nº 1040925-46.2022.8.11.0041
ID: 299287552
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1040925-46.2022.8.11.0041
Data de Disponibilização:
16/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DENISE FERNANDES BERGO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1040925-46.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1040925-46.2022.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Empréstimo consignado] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [PEDRO MACIEL DE PAULA GARCIA - CPF: 843.594.635-53 (EMBARGADO), DENISE FERNANDES BERGO - CPF: 540.769.000-49 (ADVOGADO), BANCO MASTER S.A. (EMBARGANTE), GUSTAVO ALMEIDA MARINHO - CPF: 825.852.535-20 (ADVOGADO), BANCO PAN S.A. - CNPJ: 59.285.411/0001-13 (EMBARGADO), CARLOS AUGUSTO TORTORO JUNIOR - CPF: 221.436.208-88 (ADVOGADO), FELICIANO LYRA MOURA - CPF: 026.383.794-76 (ADVOGADO), IRAN MAIA DE SOUZA - CNPJ: 30.033.826/0001-18 (EMBARGADO), IRAN MAIA DE SOUZA - CPF: 413.892.548-10 (EMBARGADO), BANCO PAN S.A. - CNPJ: 59.285.411/0001-13 (TERCEIRO INTERESSADO), IRAN MAIA DE SOUZA - CNPJ: 30.033.826/0001-18 (TERCEIRO INTERESSADO), IRAN MAIA DE SOUZA - CPF: 413.892.548-10 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), BANCO PAN S.A. - CNPJ: 59.285.411/0001-13 (EMBARGANTE), CARLOS AUGUSTO TORTORO JUNIOR - CPF: 221.436.208-88 (ADVOGADO), BANCO MASTER S/A - CNPJ: 33.923.798/0001-00 (EMBARGANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. FRAUDE PRATICADA POR TERCEIRO. INTERMEDIAÇÃO FRAUDULENTA. CONTRATAÇÃO VICIADA POR ERRO ESSENCIAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. FORTUITO INTERNO. DANO MATERIAL E MORAL CONFIGURADOS. COMPENSAÇÃO PARCIAL DOS VALORES DEPOSITADOS. RECURSO DO BANCO MASTER DESPROVIDO. RECURSO DO BANCO PAN PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelações cíveis interpostas por Banco Master S.A. e Banco Pan S.A. contra sentença que, em ação de nulidade contratual cumulada com indenização por danos morais e materiais ajuizada por Pedro Maciel de Paula Garcia, julgou procedentes os pedidos, anulou contratos de empréstimo consignado firmados mediante indução a erro por intermediário fraudulento e condenou solidariamente os bancos ao pagamento de indenizações por danos morais e materiais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se houve vício de consentimento capaz de anular os contratos de empréstimo consignado; (ii) estabelecer se os bancos são responsáveis pelos danos decorrentes da fraude praticada por terceiro; (iii) determinar se é possível compensar os valores efetivamente depositados na conta do consumidor. III. RAZÕES DE DECIDIR A contratação dos empréstimos se deu mediante erro substancial induzido por terceiro que se apresentou como preposto das instituições financeiras, prometendo falsa quitação de dívidas anteriores e condições mais vantajosas, o que não se concretizou. A atuação do fraudador, com acesso a sistemas bancários, dados pessoais e papel timbrado dos bancos, configura fortuito interno, atraindo a aplicação da Súmula 479 do STJ e a responsabilidade objetiva das instituições financeiras. As instituições financeiras falharam na fiscalização de seus correspondentes e procedimentos internos, permitindo a perpetração da fraude e validando os contratos, com descontos indevidos em folha de pagamento, o que caracteriza defeito na prestação do serviço. A vulnerabilidade do consumidor não é afastada por sua formação acadêmica, sendo presumida nas relações de consumo, nos termos do art. 4º, I, do CDC. Os danos materiais e morais restaram configurados, sendo proporcional a fixação da indenização moral em R$ 10.000,00, diante da gravidade da fraude e dos efeitos danosos à vida financeira do autor. É cabível a compensação parcial dos valores efetivamente creditados na conta do autor, para evitar enriquecimento sem causa, nos termos dos princípios da boa-fé objetiva e equidade. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso do Banco Master desprovido. Recurso do Banco Pan parcialmente provido para autorizar a compensação dos valores efetivamente recebidos. Tese de julgamento: A contratação viciada por indução a erro essencial, mediante intermediação fraudulenta de terceiro, é nula, sendo irrelevante o nível de instrução acadêmica do consumidor. As instituições financeiras respondem objetivamente por fraudes praticadas por terceiros com aparência de legitimidade, quando vinculadas à estrutura ou aos riscos de sua atividade, nos termos da Súmula 479 do STJ. A vulnerabilidade do consumidor é presumida, não sendo afastada por sua instrução acadêmica ou profissional. É devida a indenização por danos morais e materiais em razão da contratação viciada, sendo possível a compensação dos valores efetivamente repassados ao consumidor para evitar enriquecimento indevido. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de recursos de apelação cível interpostos por BANCO MASTER S.A. e BANCO PAN S.A contra sentença prolatada pelo MM. Juiz de Direito da 9ª Vara Cível de Cuiabá, que, na presente Ação de Nulidade Contratual com Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Morais e Materiais com Pedido de Tutela de Urgência e Evidência Inaudita Altera Pars, ajuizada por PEDRO MACIEL DE PAULA GARCIA, julgou procedentes os pedidos formulados pelo Autor, para anular o contrato formalizado com indução a erro e condenar os Requeridos solidariamente ao pagamento a título de indenização por danos morais em R$ 10.000,00 (dez mil reais) e indenização por danos materiais em R$ 52.308,24. Em suas razões, o BANCO MASTER S.A. sustenta a necessidade de reforma do decisum, uma vez que não há qualquer vínculo entre o Sr. Iran Maia e a instituição financeira e não deve ser imputada responsabilidade à Apelante por culpa exclusiva de terceiros. Afirma, também, ser inequívoca a contratação, bem como o depósito de valores na conta do Apelado, e que o Autor, na condição de professor universitário e doutor, “tinha plenas condições de discernir que as solicitações feitas pelo Sr. Iran Maia, como a transferência de dinheiro para uma conta pessoal do Sr. Iran, não condiziam com práticas bancárias legítimas”. Assevera, outrossim, que ao realizar descontos na folha de pagamento do Autor, estava apenas cumprindo com o contrato realizado, razão pela qual não há que se falar em dano indenizável. Isto posto, requer o provimento do recurso, com integral reforma da sentença, para que seja julgada totalmente improcedente a ação ajuizada pelo Autor. Subsidiariamente, requer a redução dos danos morais arbitrados em R$ 10.000,00 para quantia não superior a R$ 500,00. Contrarrazões no id. 252050727. Por sua vez, o BANCO PAN S.A. também interpôs recurso de apelação, sustentando, em síntese, a validade da relação jurídica e ausência de vício de consentimento. Alega, também, a ausência de responsabilidade quanto aos valores transferidos a terceiro, por se tratar de fraude praticada por terceiro e a inexistência de falha na prestação dos serviços, afirmando a ocorrência de culpa exclusiva da vítima. Defende a ausência de solidariedade entre os réus, bem como a necessidade de compensação dos valores disponibilizados ao autor e a inexistência de danos morais, requerendo, subsidiariamente, a redução do quantum indenizatório. Contrarrazões no ID 252050727. Cumpridos os requisitos de admissibilidade, submeto o recurso ao julgamento colegiado. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR): Egrégia Câmara: Ab initio, considerando que, no despacho de ID 271250361, houve a desconstituição do acórdão anulado e, consequentemente, foram julgados prejudicados os embargos de declaração opostos, passo à análise dos recursos de apelação. Extrai-se dos autos que, inicialmente, trata-se de Ação de Nulidade Contratual com Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Morais e Materiais movida por Pedro Maciel de Paula Garcia, contra Banco Master S.A., Banco Pan S.A. e Iran Maia de Souza, na qual o Autor alega que os bancos demandados delegaram ao terceiro réu, Iran Maia de Souza, a captação de clientes para empréstimos consignados, vinculando seus atos às instituições financeiras. Sustenta que foi induzido a firmar múltiplos contratos intermediados pela “Sul América Promotora”, representada pelo terceiro réu, sob a falsa promessa de que as novas operações reduziriam parcelas e substituiriam os contratos anteriores. Afirma que os bancos ratificaram os contratos ao continuar descontando valores diretamente do contracheque, mesmo diante das práticas enganosas atribuídas ao intermediário. Colhe-se da inicial que o Autor propôs a presente ação visando o acolhimento do pedido, para que seja declarada a nulidade do contrato, a devolução em dobro dos valores indevidamente cobrados e a indenização por danos morais em R$ 60.000,00. Na contestação apresentada, o Banco Master S/A defende que não houve qualquer irregularidade na contratação dos empréstimos consignados, alegando que todas as operações foram realizadas em conformidade com a legislação vigente e com o consentimento do autor. A instituição assevera, também, que o Autor estava plenamente ciente das condições contratuais e que os procedimentos adotados seguiram os padrões internos do banco. Por fim, refuta as acusações de práticas fraudulentas, sustentando que os descontos efetuados no contracheque do Autor são legítimos e correspondem aos contratos formalizados. Por sua vez, o Banco Pan S/A assevera que as contratações foram realizadas dentro dos limites legais e com a expressa autorização do Autor, que as operações foram conduzidas de forma transparente e que o autor tinha total conhecimento dos termos acordados. Ademais, nega qualquer vínculo com os prejuízos relatados pelo Autor, alegando ausência de provas que indiquem irregularidades nas transações financeiras. O MM. Juiz de Direito prolatou sentença, sendo os seguintes pontos os que importam à discussão: “(...) O autor afirma que lhe foram feitas promessas de que os novos contratos substituiriam as dívidas anteriores por condições mais vantajosas, como a redução do número de parcelas e do valor das mensalidades. No entanto, essas promessas não foram cumpridas, e ele acabou acumulando mais dívidas, com todos os empréstimos ainda ativos, resultando em um ônus financeiro maior do que o esperado. (...) Havia uma previsão nos contratos de que, após o pagamento de um determinado número de parcelas (especificamente após a "fidelização contratual"), o número total de parcelas seria reduzido. Por exemplo, um contrato específico mencionava a possibilidade de redução das parcelas de 96 para 71 após o pagamento da 12ª parcela, desde que certas condições fossem atendidas. No entanto, o que se vê é que, embora essas promessas de redução estivessem nos contratos, na prática, não ocorreram conforme previsto, levando-o a acreditar que teria condições mais vantajosas do que realmente obteve. (...) Em vez disso, os descontos referentes aos contratos anteriores continuaram a ser feitos em seu contracheque, gerando uma situação em que ele estava pagando múltiplos empréstimos simultaneamente, em vez de consolidar as dívidas em um único contrato mais vantajoso. Ou seja, realmente o autor foi induzido a erro, pelo que deve ser anulado o contrato entre as partes, com a devida devolução dos valores pagos indevidamente. A análise dos autos revela que, de fato, a parte autora sofreu descontos relativos a três contratos, cujos detalhes foram devidamente comprovados: Contrato nº 10-2100420455 (Banco Master): 20 parcelas de R$ 1.775,52, totalizando R$ 35.510,40 (período de 03/2021 a 10/2022) Contrato nº 74569959481 (Banco Pan): 10 parcelas de R$ 1.104,54, totalizando R$ 11.045,40 (período de 04/2021 a 01/2022). Contrato nº 74605443851 (Banco Pan): 9 parcelas de R$ 639,16, totalizando R$ 5.752,44 (período de 05/2021 a 01/2022). (...) Diante do exposto, (...), com fulcro no artigo 487, I do CPC, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, para: CONDENAR os requeridos solidariamente ao pagamento a título de indenização por danos morais, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), acrescidos de juros de mora 1% a.m. a partir da citação e correção monetária pelo índice INPC/IBGE a partir desta data, importância que considero ponderada, razoável e proporcional ao dano verificado. CONDENO ao pagamento a título de indenização por danos materiais a quantia de R$ 52.308,24, acrescido de juros de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária pelo índice do INPC/IBGE a partir da data de cada desembolso. CONDENO, ainda, a demandada, ao pagamento das custas processuais, bem como a arcar com os honorários advocatícios, que, nos termos do que preceitua os §§ 2º e 8º do art. 85 do CPC, arbitro em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação.” (g.n) Apesar dos esforços argumentativos das Apelantes, entendo que a sentença não merece reforma, pelas razões que passo a expor. Pois bem. 1. RECURSO DO BANCO MASTER S.A. Na contestação apresentada, o Banco Master S/A defende que não houve qualquer irregularidade na contratação dos empréstimos consignados, alegando que todas as operações foram realizadas em conformidade com a legislação vigente e com o consentimento do autor. A instituição assevera, também, que o Autor estava plenamente ciente das condições contratuais e que os procedimentos adotados seguiram os padrões internos do banco. Por fim, refuta as acusações de práticas fraudulentas, sustentando que os descontos efetuados no contracheque do Autor são legítimos e correspondem aos contratos formalizados. Primeiramente, quanto à alegação de contratação inequívoca e cumprimento do contrato, o Autor não negou a realização da contratação. Com efeito, cinge-se a controvérsia à validade do negócio jurídico, que foi pactuado mediante indução ao erro. Extrai-se dos autos que o Autor foi levado a crer que os novos contratos substituiriam os anteriores, com condições mais vantajosas, o que não ocorreu. Em vez disso, passou a ter múltiplos descontos simultâneos em seu contracheque. A Apelante sustenta excludente de sua responsabilidade por culpa exclusiva de terceiro (Sr. Iran Maia), no entanto, tal tese não merece acolhimento, em especial porque, conforme bem fundamentado na sentença, aplica-se ao caso a Súmula 479 do STJ, segundo a qual "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". É o entendimento em casos análogos: “APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - PAGAMENTO DE BOLETO FRAUDADO - FORTUITO INTERNO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA – ILEGITIMIDADE DA EMPRESA PAG SEGURO – MANTIDA – DANO MORAL - CONFIGURAÇÃO – DANO MATERIAL PERDAS E DANOS – AFASTADO – TERMO INICIAL DOS JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA – RECURSO DO BANCO IMPROVIDO E DO CLIENTE PARCIALMENTE PROVIDO. (...) As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias. Compete às instituições financeiras adotarem medidas de segurança em seus sistemas, a fim de se evitar a ocorrência de fraudes, como a geração de boletos falsos. A culpa exclusiva de terceiros capaz de elidir a responsabilidade do fornecedor de serviços ou produtos pelos danos causados é somente aquela que se enquadra no gênero de fortuito externo, ou seja, aquele evento que não guarda relação de causalidade com a atividade do fornecedor, absolutamente estranho ao produto ou serviço. (...)” (TJ-MS - AC: 08043785820218120021 Três Lagoas, Relator: Des. Divoncir Schreiner Maran, Data de Julgamento: 03/04/2023, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 05/04/2023) (g.n) "APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - BOLETO FRAUDADO - RELAÇÃO DE CONSUMO - FORTUITO INTERNO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - RESTITUIÇÃO DA QUANTIA PAGA - DANOS MORAIS - CARACTERIZAÇÃO. Diante de ineficiência do sistema de segurança do banco, com emissão de boleto falso, caracteriza-se fortuito interno, uma vez que inerente à atividade exercida, estando dentro da margem de previsibilidade e do risco de sua atividade, com responsabilidade objetiva da instituição financeira. De acordo com a Súmula 479 do STJ "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". Quanto aos danos materiais, deve ser restituída, de forma simples, a quantia que foi objeto do pagamento, no boleto fraudulento. No que tange aos danos morais, evidenciam-se caracterizados, diante dos transtornos e angústias invariavelmente experimentados com a situação, tendo em vista que, apesar de ter efetivado pagamento, continuou em débito com o credor originário, além de ficar desprovido do respectivo numerário.” (TJ-MG - AC: 10000204710339002 MG, Relator: Octávio de Almeida Neves, Data de Julgamento: 09/02/2023, Câmaras Cíveis / 15ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 14/02/2023) (g.n) A atuação do Sr. Iran Maia configura fortuito interno, inserido nos riscos da atividade bancária, pois, como demonstrado, o Sr. Iran Maia atuava com aparente legitimidade e vinculação aos bancos réus, tendo acesso a dados bancários e informações pessoais do autor, utilizando papel timbrado das instituições e demonstrando profundo conhecimento dos procedimentos bancários e sistemas internos. Além disso, a instituição financeira se beneficiou da contratação viciada ao realizar descontos na folha de pagamento do Autor e falhou com seu dever de fiscalizar e controlar adequadamente suas operações, seus prepostos e seus sistemas. Ao falhar neste dever de cuidado, permitindo que terceiros atuem em seu nome e validando operações irregulares, deve responder pelos danos causados aos consumidores. Quanto à alegação de que o erro não seria escusável por ser o autor professor universitário, tal argumento não afasta a responsabilidade do banco. Por óbvio, o fato de o consumidor ter formação acadêmica não elide sua vulnerabilidade técnica frente às instituições financeiras, especialmente considerando a complexidade dos produtos bancários e as práticas comerciais agressivas. A vulnerabilidade reconhecida pelo CDC não se confunde com falta de instrução formal, mas sim com o desequilíbrio técnico e informacional inerente à relação de consumo. Para além disso, a própria sofisticação do esquema, com uso de documentos oficiais, acesso a sistemas bancários e conhecimento detalhado de dados pessoais e financeiros do autor, tornava praticamente impossível ao consumidor, independentemente de sua formação acadêmica, identificar a fraude. Nesse contexto, a conduta da instituição financeira, ao permitir a contratação viciada dos empréstimos, causou evidentes transtornos que ultrapassam o mero aborrecimento, afetando a situação financeira e o bem-estar do autor. Assim, o valor arbitrado a título de danos morais se mostra adequado e proporcional, atendendo às finalidades compensatória e pedagógica da indenização. Quanto ao pleito subsidiário de redução do montante indenizatório devido, entendo que não deve prosperar, ante o risco de esgotar o caráter punitivo-pedagógico da medida. Nesse sentido: “APELAÇÃO–AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – PERÍCIA GRAFOTÉCNICA REALIZADA NOS AUTOS – LEGITIMIDADE DA CONTRATAÇÃO NÃO COMPROVADA – DESCONTOS IMOTIVADOS – INDENIZAÇÃO DEVIDA – RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO– MÁ-FÉ DO CREDOR CONSTATADA – RECURSO NÃO PROVIDO. Se a instituição financeira não comprova a regularidade do empréstimo consignado, tem-se por inexistente a dívida. O montante indenizatório deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade bem como ao caráter satisfativo-pedagógico da medida. Constatada a má-fé, as parcelas imotivadamente descontadas devem ser restituídas em dobro (art. 42 do CDC)”. (N.U 1002948-20.2022.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/07/2024, Publicado no DJE 02/07/2024) (g.n) Vale ressaltar que o banco, como instituição financeira profissional, tem o dever de zelar pela lisura das contratações e pela adequada prestação de informações aos consumidores. A falha nesse dever, permitindo a perpetração de práticas comerciais abusivas, justifica plenamente sua responsabilização, sendo cabível, por conseguinte, a restituição dos valores conforme determinado pelo MM. Juiz de Direito. Por derradeiro, considerando que a instituição financeira não logrou êxito em infirmar as alegações do Autor, nem demonstrou, de modo incontestável, que não houve vício de consentimento ou proveito sobre o contrato firmado mediante indução a erro, e em observância aos princípios que norteiam as relações consumeristas, notadamente o da vulnerabilidade do consumidor e o da interpretação mais favorável ao consumidor, entendo que a sentença deve ser mantida integralmente. Perfilhando este entendimento, destaca-se: “(...)1. A inversão do ônus da prova libera o consumidor da obrigação de provar a existência dos fatos constitutivos do seu direito, passando a incumbência à parte contrária que deverá comprovar a existência de fatos impeditivos do direito da recorrida, em virtude da presunção passar a ser favorável a ela. 2. Sentença mantida. 3. Recurso conhecido e não provido.” (TJ-MT - RI: 10286014420228110002, Relator: LUIS APARECIDO BORTOLUSSI JUNIOR, Data de Julgamento: 31/10/2023, Primeira Turma Recursal, Data de Publicação: 31/10/2023) Logo, o recurso deve ser desprovido. 2. RECURSO DO BANCO PAN S.A. Por sua vez, o Banco Pan S.A. assevera que as contratações foram realizadas dentro dos limites legais e com a expressa autorização do Autor, que as operações foram conduzidas de forma transparente e que este tinha total conhecimento dos termos acordados. Ademais, nega qualquer vínculo com os prejuízos relatados pelo Autor, alegando ausência de provas que indiquem irregularidades nas transações financeiras. Pois bem. No caso em tela, verifica-se que o cerne da controvérsia reside na responsabilidade da instituição financeira pelos prejuízos experimentados pelo autor em decorrência de fraude perpetrada por terceiros, que o induziram a contratar empréstimos consignados mediante promessa de condições mais vantajosas. A questão deve ser analisada sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, sendo objetiva a responsabilidade da instituição financeira, nos termos da Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça. Com efeito, o banco apelante, na condição de fornecedor de serviços, responde independentemente de culpa pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, só se eximindo de responsabilidade se comprovar a inexistência de defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros, nos termos do art. 14, § 3º do CDC. No que tange à validade da relação jurídica e à inexistência de vício de consentimento, não assiste razão ao apelante. Da análise detida dos autos, é evidente que o autor foi induzido a erro substancial, comprometendo sua manifestação de vontade em virtude de premissas falsas que afetaram diretamente a causa do negócio jurídico, pois o contrato previa expressamente a redução das parcelas após determinado período de "fidelização", como a diminuição de 96 para 71 prestações após o adimplemento da 12ª parcela. Todavia, embora essas condições estivessem formalmente estipuladas, não se concretizaram, revelando-se um artifício ardiloso destinado a assegurar a adesão do consumidor. De igual modo, não prospera a alegação de inexistência de falha na prestação dos serviços. Com efeito, o modus operandi empregado pelos fraudadores expõe a vulnerabilidade do sistema bancário, considerando que atuaram com aparente legitimidade, acessando dados bancários e informações pessoais do autor, além de se valerem de documentação oficial e demonstrarem familiaridade com os procedimentos e sistemas internos da instituição financeira. Tais circunstâncias evidenciam falha na prestação do serviço, pois a fraude foi viabilizada a partir da própria estrutura do sistema financeiro, caracterizando-se, assim, o fortuito interno, nos termos da Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça. Outrossim, não merece acolhida a tese de ausência de responsabilidade por fato de terceiro. Isso porque, conforme bem pontuado no aresto embargado, os elementos dos autos demonstram que a fraude foi viabilizada através da própria estrutura do serviço bancário oferecido, caracterizando típico fortuito interno. Oportunamente, colaciono trecho do v. acórdão que bem ilustra a subsunção do caso concreto ao conceito de fortuito interno, evidenciando o modus operandi que caracteriza a responsabilidade da instituição financeira: “[...] A atuação do Sr. Iran Maia configura fortuito interno, inserido nos riscos da atividade bancária, pois, como demonstrado, o Sr. Iran Maia atuava com aparente legitimidade e vinculação aos bancos réus, tendo acesso a dados bancários e informações pessoais do autor, utilizando papel timbrado das instituições e demonstrando profundo conhecimento dos procedimentos bancários e sistemas internos. [...]” (g.n) Com efeito, os golpistas se valeram de informações privilegiadas do autor para induzir a contratação dos empréstimos, tendo inclusive acesso a dados que somente poderiam ser obtidos através dos sistemas bancários. Trata-se, portanto, de risco inerente à atividade desenvolvida pela instituição financeira, que deve responder pelos prejuízos daí decorrentes. Igualmente não prospera a alegação de culpa exclusiva da vítima. Embora o autor tenha, de fato, realizado as transferências bancárias para terceiros, tal circunstância decorreu diretamente da fraude perpetrada, não se podendo exigir do consumidor, parte vulnerável da relação jurídica, que tivesse expertise para identificar a sofisticação do golpe aplicado. Quanto à alegada ausência de solidariedade entre os réus, melhor sorte não assiste ao apelante, pois, muito embora trate de contratos distintos, as operações foram realizadas de forma concatenada e mediante atuação conjunta dos fraudadores, que se valeram da estrutura de ambas as instituições financeiras para perpetrar o golpe, atraindo a incidência do art. 7º, parágrafo único, do CDC. A propósito: “AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. (...) Alegação de Ilegitimidade passiva – Não cabimento. Hipótese em que o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 7º, parágrafo único, preconiza a solidariedade entre os participantes da cadeia de fornecimento do produto e do serviço, a fim de que se garanta a reparação do dano experimentado pelo consumidor, parte hipossuficiente do negócio. Recurso não provido.” (TJSP, ApCiv 1000472-37.2022.8.26.0414, j. 19/12/2022) No que diz respeito à compensação de valores, por sua vez, ainda que o negócio jurídico em questão tenha sido declarado inexistente, o que afastaria a sua validade desde o início, não se pode ignorar que houve, de fato, o envio de valores à conta do Autor (ID 252050698), o que demonstra que, embora o negócio jurídico tenha sido invalidado, houve um repasse de recursos que, em tese, beneficiou o Autor, ainda que não tenha sido solicitado, configurando uma relação de recebimento efetivo de numerário. Dessa forma, é adequado o acolhimento do pedido de compensação, uma vez que não seria razoável permitir o enriquecimento sem causa do consumidor, de modo que, havendo prova inequívoca de que o autor recebeu valores, esses devem ser devidamente compensados com a condenação imposta à requerida. Assim, a fim de resguardar o princípio da boa-fé objetiva que rege as relações consumeristas, e considerando todos os elementos probatórios constantes nos autos, bem como o efeito devolutivo em profundidade, o qual transfere ao Tribunal a apreciação de todos os fundamentos da inicial e da defesa pertinentes à matéria impugnada, por força do comando inserto no art. 1.013, §§ 1º e 3º, do Código de Processo Civil, acolhe-se o pedido de compensação formulado pela instituição financeira, nos exatos termos acima delineados, como forma de assegurar a equidade entre as partes e a justa aplicação do direito. No tocante aos danos morais, a sua configuração é inequívoca, pois o autor foi vítima de fraude sofisticada que lhe causou significativo abalo psicológico e financeiro, com comprometimento expressivo de sua renda mensal através de descontos indevidos. Em casos desta natureza, como já mencionado, a responsabilidade da instituição financeira é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, prescindindo da demonstração de culpa, uma vez que o dever de indenizar decorre do próprio risco da atividade bancária. Ademais, o dano moral configura-se in re ipsa, ou seja, deriva do próprio fato lesivo, sendo desnecessária a comprovação do abalo psicológico experimentado pela vítima, pois os transtornos causados pela fraude e pelos descontos indevidos ultrapassam a esfera do mero dissabor cotidiano. Nesse contexto, colaciono precedente que bem sintetiza a questão: "CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. FRAUDE. DÉBITO. DANOS MORAIS. CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE DO BANCO. RISCO DA ATIVIDADE NEGOCIAL. INDENIZAÇÃO RAZOÁVEL. MANUTENÇÃO. 1. A instituição financeira age de forma negligente quando celebra negócio jurídico com pessoa sem a conferência da identificação da mesma, conduta inaceitável na prática comercial que domina, configurando notável falha na prestação do serviço oferecido. Precedentes do STJ. 2. A realização de descontos indevidos mediante fraude bancária configura danos morais in re ipsa, devendo o consumidor ser ressarcido pela conduta lesiva da instituição financeira. Precedentes do STJ e do TJES. 3. A alteração do valor da indenização por danos morais é admissível quando o montante arbitrado pela instência de origem se mostrar exorbitante, considerando as particularidades do caso concreto. Precedentes do STJ." (TJES, ApCiv 0012252-72.2016.8.08.0035, p. 13/03/2023) (g,n) Outrossim, como já destacado neste voto, tenho que o quantum indenizatório fixado em R$ 10.000,00 se mostra adequado aos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade. Ainda, considerando que a instituição financeira não logrou êxito em infirmar as alegações do Autor, nem demonstrou, de modo incontestável, que não houve vício de consentimento ou proveito sobre o contrato firmado mediante indução a erro, e em observância aos princípios que norteiam as relações consumeristas, notadamente o da vulnerabilidade do consumidor e o da interpretação mais favorável ao consumidor, entendo que deve ser mantida a sentença em todos os seus termos, possibilitada, no entanto, a compensação dos valores em relação ao Banco PAN S.A. Por fim, visando evitar a oposição de embargos declaratórios, saliento que reputo prequestionados todos os dispositivos legais invocados, sendo certo que toda a matéria abordada no recurso foi analisada minuciosamente, levando em consideração os elementos de convicção apresentados pela parte, à luz do que consta nos autos, e levando em conta o que estabelece a Constituição Federal, as leis, a doutrina e a jurisprudência aplicáveis. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto por Banco Master S/A e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de Banco PAN S/A, tão somente para autorizar a compensação dos valores depositados na conta bancária do autor. Em relação ao Banco Master S.A., uma vez desprovido o recurso, majoro os honorários advocatícios para 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. Quanto ao Banco PAN S.A, não há que se falar em majoração dos honorários recursais, uma vez que condicionados ao desprovimento ou não conhecimento do recurso da instituição financeira, sendo, portanto, incabíveis quando for provida a apelação, ainda que parcialmente, como na espécie (STJ, Tema 1059). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025
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