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Francirlei Da Silva Mendes x Brdu Spe Sao Mateus Ltda

ID: 339473167

Tribunal: TJMT Órgão: 8ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1010425-65.2020.8.11.0041

Data de Disponibilização: 31/07/2025

Polo Ativo:

FRANCIRLEI DA SILVA MENDES

Polo Passivo:

BRDU SPE SAO MATEUS LTDA

Sentença

Advogados:

ROQUE PIRES DA ROCHA FILHO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

CARLOS EDUARDO CAMPOS RESENDE

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 8ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Processo n. 1010425-65.2020.8.11.0041 Vistos e examinados. I - RELATÓRIO FRANCIRLEI DA SILVA MENDES propôs AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 8ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Processo n. 1010425-65.2020.8.11.0041 Vistos e examinados. I - RELATÓRIO FRANCIRLEI DA SILVA MENDES propôs AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E MORAL C/C PEDIDO LIMINAR em desfavor de BRDU SPE SAO MATEUS LTDA, ao argumento, em síntese, que firmou contrato de compra e venda de imóvel com a aludida sociedade, em 02/05/2014, mediante aquisição um terreno junto ao Loteamento Residencial Mirante do Parque, situado na Avenida B, Quadra 19, Lote 13, com área total de 200 (duzentos) metros quadrados, devidamente registrado no Cartório de Registro de Imóveis de Cuiabá, 2a Circunscrição, pelo valor de R$ 45.979,91 (quarenta e cinco mil, novecentos e setenta e nove reais e noventa e um centavos), embora após a quitação de 39 (trinta e nove) parcelas tenha decidido por rescindir, em razão de problemas financeiros, situação que levou a contatar a vencedora, que enviou distrato com valor de retenção acima do permitido pela jurisprudência dos tribunais, motivo pelo qual busca a rescisão contratual, com a declaração de nulidade da cláusula contratual 15, a qual determina a retenção de 10% a título de taxa de administração, mais 25% correspondente as despesas com publicidade e corretagem na comercialização do empreendimento, devendo ser, assim, na proporção de 90% e, ainda, indenização por danos materiais e morais passíveis de reparação. Determinada a emenda, adveio manifestação e a inicial restou recebida (ID 31573416), com inversão do ônus da prova em favor do demandante, deferimento da tutela provisória de urgência, liminarmente, bem como determinada a citação da BRDU SPE São Mateus LTDA. Citada, a BRDU SPE São Mateus LTDA. apresentou resposta (ID 157988980). Refuta a concessão do benefício processual da gratuidade de justiça ao autor. No mérito, resumidamente, contesta a inversão do ônus da prova a favor do autor e ressalta a inexistência de nulidade e/ou abusividade de cláusulas contratuais. Aduz que o demandante é quem deu causa ao distrato e que a devolução das parcelas pagas com desconto ínfimo e em parcela única é totalmente descabida, devendo ser aplicada a Súmula 543 do Superior Tribunal de Justiça, que consolidou a possibilidade de retenção de 25% sobre o valor das parcelas pagas em caso de pedido de rescisão contratual injustificado pelo comprador, como é o caso. Por fim, sustenta a ausência de dano moral passível de reparação, devendo a demanda ser julgada improcedente. Impugnação à contestação (ID 171000675). Instadas a especificarem provas, as partes envolvidas manifestaram pelo julgamento antecipado da lide (IDs 172977314 e 173121198). Vieram os autos conclusos. É o que merece registro. DECIDO. II - FUNDAMENTAÇÃO 2.1. - Do julgamento antecipado da lide. O Art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil dispõe que o juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando não houver necessidade de produção de outras provas. Ademais, instadas a especificarem provas que porventura tivessem relevância para o desfecho da lide, as partes demonstraram desinteresse na produção de outras além das já existentes dos autos (IDs 172977314 e 173121198). Oportuno, ainda, trazer que o ordenamento processual vigente, à luz do dever constitucional de motivação dos atos judiciais (Art. 93, inciso IX da CF), adotou o princípio da persuasão racional, segundo o qual o juiz, ao proferir decisão, formará livremente seu convencimento. Nesse compasso, passo ao exame da questão posta. 2.1.1. - Do mérito. Presentes os pressupostos de constituição, validade regular do processo e demais condições da ação, inexistindo nulidades a serem sanadas, e/ou questões prejudiciais de mérito arguidas pelas partes ou suscitadas ex officio, adentro ao cerne da contenda. Pois bem. Cumpre mencionar que o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento de que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) é aplicável aos contratos de compra e venda de imóveis, desde que o comprador seja seu destinatário final (REsp 1.087.225). Sendo assim, evidente a aplicação do microssistema de defesa do consumidor ao caso em tela, uma vez que o demandante e a empresa demandada se amoldam nos conceitos de fornecedor e consumidor estampados nos Arts. 2º e 3º do referido diploma. Para além das considerações supra, cinge-se a controvérsia quanto ao pedido de rescisão do “INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA LOTEAMENTO RESIDENCIAL MIRANTE DO PARQUE”, referente à aquisição de terreno no Loteamento Residencial Mirante do Parque, situado na Avenida B, Quadra 19, Lote 13, com área total de 200 (duzentos) metros quadrados, registrado no Cartório de Registro de Imóveis de Cuiabá, 2a Circunscrição (ID 30018574), bem como as pretensões de condenação da empresa demandada na restituição dos valores pagos na proporção de 90%, inerentes as avenças contratuais, e indenização por danos morais. Da análise do caderno processual, observa-se prova documental escrita através do instrumento contratual firmado entre as partes (ID 30018574); o que permite vislumbrar a existência da relação jurídica e das obrigações ali estampadas - além da manifestação de vontade na rescisão (ID 30018588), permanecendo a controvérsia apenas quanto ao valor de retenção das parcelas efetivamente quitadas. Sem maiores delongas, a par do constante em contrato, consta que foi pactuado o pagamento de uma entrada no importe de R$ 2.538,45 (dois mil, quinhentos e trinta e oito reais e quarenta e cinco centavos), com vencimento para 02/05/2014, além de 03 (três) parcelas de R$ 362,18 (trezentos e sessenta e dois reais e dezoito centavos), estas com vencimento para 20/05/2014, e mais 144 (cento e quarenta e quatro) parcelas de R$ 537,98 (quinhentos e trinta e sete reais e noventa e oito centavos), devidamente corrigidas, conforme Cláusula “3 - DO PREÇO E FORMA DE PAGAMENTO” (ID 30018574). Na petição de ingresso, o próprio demandante confirma a inadimplência e a vontade de rescindir em razão da situação financeira delicada. Desta feita, há que se reconhecer a culpa do demandante pela rescisão do contrato. Sobre o assunto, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 543. Vejamos: “Súmula nº 543 do STJ - Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento”. A partir daí, no que se refere aos numerários despendidos, entendo que a taxa de corretagem é de responsabilidade do comprador, conforme se verifica de forma clara na Cláusula 15a, do instrumento contratual. Assim, aplicável ao caso dos autos a segunda tese do Tema 938 do STJ, firmado pela Segunda Seção do STJ por ocasião do julgamento do REsp n. 1599511/SP e REsp n. 1551956/SP, em recursos repetitivos, que concluiu pela “Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem; (vide REsp n. 1.599.511/SP)”. Contudo, é abusiva a cláusula contratual que determina a restituição dos valores devidos de forma parcelada, na hipótese de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel, por culpa de quaisquer contratantes. Aliás, acerca da matéria, há recurso repetitivo, in verbis: “RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE COMPRA DE IMÓVEL. DESFAZIMENTO. DEVOLUÇÃO DE PARTE DO VALOR PAGO. MOMENTO. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: em contratos submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, é abusiva a cláusula contratual que determina a restituição dos valores devidos somente ao término da obra ou de forma parcelada, na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel, por culpa de quaisquer contratantes. Em tais avenças, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. 2. Recurso especial não provido.” (STJ, Segunda Seção, REsp nº 1300418/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, julgado em 13/11/2013, DJe 10/12/2013). Sobre o percentual a ser restituído em caso de desistência do comprador, a jurisprudência do STJ possui orientação de que, nas hipóteses de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel por inadimplemento do comprador, poderá haver a flutuação do percentual de retenção pelo vendedor entre 10% e 25% do total da quantia paga. Confira-se: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO. DEFICIÊNCIA NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE PRODUÇÃO DE PROVA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. REEXAME. SÚMULA 7/STJ. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESCISÃO PELO COMPRADOR. RETENÇÃO DE VALORES. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. ARRAS. RESTITUIÇÃO. ABUSIVIDADE. REVISÃO. SÚMULAS 5 E 7/STJ. AGRAVO DESPROVIDO.[...]2. Nos termos do entendimento jurisprudencial desta Corte Superior, no julgamento antecipado da lide, não há violação aos princípios do contraditório e da defesa quando o julgador, entendendo pela suficiência dos elementos probatórios inseridos nos autos, indefere motivadamente a produção de provas. 3. A revisão das conclusões adotadas pelo Tribunal de origem esbarraria no óbice imposto pela Súmula 7/STJ. 4. De acordo com a jurisprudência deste Tribunal Superior, na rescisão unilateral de contrato de promessa de compra e venda de imóvel pelo comprador, é possível a retenção de 10% a 25% da quantia despendida com a execução do contrato. 6. Agravo interno desprovido.” (STJ, Terceira Turma, AgInt no AREsp 1537245/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, julgado em 09/12/2019, DJe 12/12/2019). “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE COMPRA DE IMÓVEL. DESFAZIMENTO. VALOR PAGO. DEVOLUÇÃO PARCIAL. MOMENTO. TEMA 577/STJ. PERCENTUAL. RETENÇÃO. COMISSÃO DE CORRETAGEM. COBRANÇA. ABUSIVIDADE CONFIGURADA. RECURSO REPETITIVO. TEMA 938. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. CLÁUSULAS CONTRATUAIS. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Esta Corte firmou o entendimento de que é imediata a devolução dos valores pagos pelo comprador, na hipótese de resolução do contrato de compra e venda de imóvel. Tema 577/STJ, firmado no Recurso Especial nº 1.300.418/SC, julgado sob o rito dos recursos repetitivos. Incidência da Súmula nº 568/STJ.3. O acórdão recorrido não destoou do entendimento firmado por esta Corte Superior no julgamento do REsp nº 1.551.951/SP, sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (Tema 938), no sentido de que a validade da cláusula contratual que transfere ao promitente comprador a obrigação de pagar a taxa de corretagem exige a ciência inequívoca do consumidor quanto ao valor da comissão, o que não ocorreu na hipótese. 4. A jurisprudência desta Corte de Justiça, nas hipóteses de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel por inadimplemento do comprador, tem admitido a flutuação do percentual de retenção pelo vendedor entre 10% (dez por cento) e 25% (vinte e cinco por cento) do total da quantia paga. 5. Rever a conclusão do tribunal local demandaria o reexame de cláusulas contratuais e de matéria fático-probatória, procedimentos inadmissíveis em recurso especial, nos termos das Súmulas nºs 5 e 7/STJ. 6. Agravo interno não provido.” (STJ, Terceira Turma, AgInt no AREsp 1247150/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, julgado em 28/08/2018, DJe 10/09/2018). Nesse ponto, ainda que possível a retenção de 25% dos valores efetivamente pagos, o percentual máximo, segundo entendimento jurisprudencial, se mostra excessivo, considerando que o promitente comprador/autor sequer fez uso/habitou no imóvel, não havendo maiores prejuízos à construtora/incorporadora, razão pela qual, diante da casuística, a retenção deverá ser feita no percentual mínimo de 10% dos valores pagos. O nosso Tribunal entendeu: “EMENTA: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – CONTRATO PARTICULAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – PARCIAL PROCEDÊNCIA – RESCISÃO – REPROVAÇÃO DO FINANCIAMENTO JUNTO AO BANCO – AUSÊNCIA DE CULPA DA CONSTRUTORA – RETENÇÃO DE 25% DOS VALORES PAGOS – CLÁUSULA PENAL ABUSIVA – REDUÇÃO PARA O PERCENTUAL MÍNIMO – 10% DO VALOR PAGO – IMÓVEL NÃO HABITADO – AUSÊNCIA DE PREJUIZO À CONSTRUTORA – PRECEDENTES DO STJ – DANO MORAL – NÃO CARACTERIZAÇÃO – RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE. Nas hipóteses de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel por culpa do comprador, poderá haver a flutuação do percentual de retenção pelo vendedor entre 10% e 25% do total da quantia paga, como forma de recompensar as perdas e danos pela rescisão. Assim, deve ser reformada a sentença para determinar a retenção de 10% do valor pago pela adquirente do imóvel, pois a empresa demandada poderá revender o imóvel (o qual sequer foi habitado pela compradora) e auferir vantagem com os valores retidos, além da própria valorização do bem. Uma vez não configurada a culpa da construtora pela rescisão do contrato de compra e venda do imóvel, não há falar-se em indenização por danos morais.”(RAC n. 1006008-60.2018.8.11.0002, 2ª Câmara de Direito Privado, Rel. Desa. Marilsen Andrade Addario, J. 10.08.22). (destaquei) De todo o expendido, reconhecida a culpa da demandante pela rescisão do contrato, não há falar-se em reparação de danos materiais e morais. E sobre as mencionadas pretensões, com propriedade leciona o festejado Paulo Nader, na obra "Curso de direito civil, volume 7: responsabilidade civil./Paulo Nader. – 6. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016", p. 52/53: “10. NOÇÕES DE REPARAÇÃO E INDENIZAÇÃO De um modo geral a doutrina não distingue as noções de reparação e indenização, aplicando-as como fórmula de satisfação à vítima por danos decorrentes de inadimplemento negocial ou de ato ilícito. Como anota Paulo Luiz Netto Lôbo, reparação é gênero, enquanto indenização é espécie. O Código Civil de 2002, ao tratar da prescrição no art. 206, §3º, refere-se à reparação civil como gênero, fixando o prazo de três anos para a pretensão do ofendido. Igual critério é considerado, entre outras disposições, no caput do art. 932. Reparação, lato sensu, é prestação devida pelo ofensor ao ofendido em decorrência de violação ou descumprimento de obrigação. Apresenta-se sob três modalidades possíveis: a) reparação in natura; b)reparação específica; c) indenização. A primeira – in natura – consiste no modo mais eficaz de satisfação da lesão provocada; é quando o ofensor, às suas expensas, recompõe o quadro fático ao estado em que se encontrava (restitutio in integrum). Se alguém abalroa o veículo de outrem, haverá reparação in natura se o ofensor volve o objeto ao statu quo ante, assumindo as despesas correspondentes. Diz-se específica a reparação prevista pela ordem jurídica como forma substitutiva da satisfação in natura, como a estipulada pela Constituição Federal, art. 5º, inciso V, que dá o direito de resposta ao ofendido em casos de injúria, calúnia ou difamação, sem prejuízo do pleito de indenização por danos materiais e morais. Indenização consiste na reparação mediante pagamento, pelo ofensor ao ofendido ou seus dependentes, estipulado pelo juízo em razão de danos materiais ou morais. O vocábulo provém de indemnis, equivalente à expressão 'que não teve prejuízo'; daí dizer-se que a indenização visa a tornar o ofendido indene, ou seja, sem prejuízo. Teixeira de Freitas denomina indene não o estado decorrente da satisfação de um dano, mas o próprio ofendido que 'por motivo da indenidade, e da indenização, recebe alguma coisa de outrem'. Por indenidade considera o 'que se dá a alguém, para que não sofra algum dano'. A terminologia, porém, não é corrente na literatura jurídica.(…)”. E sobre os danos reparáveis pontua (ob. citada, p. 53/54): "11. DANOS REPARÁVEIS A responsabilidade civil, consoante já assentado, impõe ao ofensor a plena reparação dos danos injustamente impostos à vítima. O cumprimento desta obrigação se faz ressarcindo a pessoa diretamente atingida ou os seus dependentes. Por maior que sejam os prejuízos, estes devem ser arcados pelo responsável, ressalvada a hipótese de excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o prejuízo (art. 944, parágrafo único, do CC). O quantum indenizatório é considerado, para efeito de recurso junto ao Superior Tribunal de Justiça, matéria de direito. Nem todo dano implica a responsabilidade civil, como se verifica, por exemplo, no âmbito das concorrências comerciais ou quando o agente atua em legitima defesa, no exercício regular do seu direito ou para remover perigo iminente." Em relação aos danos material e moral, arremata (ob. citada, p. 120/122): “44. DANOS PATRIMONIAIS Ao expressar a noção de ato ilícito, o art. 186 do Código Civil não faz restrição a qualquer modalidade de prejuízo. Assim, desde que o agente, culposamente, produza dano ao direito alheio, não ocorrendo alguma exclusão de ilicitude, haverá a responsabilidade de reparação. O agente deve ser compelido a recompor a situação fática ao statu quo ante ou, não sendo isto possível, a indenizar a vítima com o valor correspondente à extensão do seu prejuízo. O dano se diz patrimonial quando provoca a diminuição do acervo de bens materiais da vítima ou, então, impede o seu aumento. Materializa-se por danos emergentes, com a diminuição do patrimônio, ou por lucros cessantes, quando a vítima se vê impedida da atividade que lhe traria proveito econômico. A ocorrência do dano patrimonial não requer, necessariamente, que o agente atinja diretamente bens materiais, pois é possível que advenha, reflexamente, de ofensas morais à vítima. Se um órgão de imprensa, levianamente veicula calúnias contra um diretor de estabelecimento de ensino, envolvendo a prática de pedofilia com alunos, a conduta do agente é meio eficaz para provocar danos patrimoniais à vítima, pois inevitavelmente ocorrerá a evasão de alunos e, com ela, os prejuízos, tanto por danos emergentes quanto por lucros cessantes. (…) 45. DANOS MORAIS Os patrimônios individuais são formados por bens materiais e imateriais. Os primeiros se compõem de riquezas suscetíveis de avaliação pecuniária, enquanto os segundos não comportam tal estimativa, como a vida, a honra, a liberdade. Os prejuízos causados aos bens materiais por damnum emergens ou lucrum cessans configuram os danos patrimoniais, enquanto os afetos aos bens imateriais são os danos morais. A indenização por danos morais não visa à reparação, pois não há como a vítima se tornar indene; condena-se com dupla finalidade: a de proporcionar à vítima uma compensação e para se desestimular condutas desta natureza. (…)”. Cediço que os danos materiais exigem sólida e precisa comprovação, ou seja, devem ser cabalmente demonstrados, não admitindo presunção e nem estimativa do prejuízo vivenciado, na medida em que a reparação respectiva deverá se dar exatamente no montante da perda financeira experimentada pela vítima. Nos autos não há comprovação de desfalque patrimonial por parte do autor. Por fim, constata-se que o alegado abalo moral decorre de mera frustração negocial, fato que, por si só, não configura violação a direito da personalidade. Não há provas de qualquer conduta da empresa demandada que tenha ultrapassado os limites da boa-fé objetiva, tampouco exposição vexatória, publicidade ou dolo. Ao contrário, os documentos coligidos aos autos evidenciam que o obstáculo ao adimplemento pontual foi de origem pessoal e exclusiva do demandante. III - DISPOSITIVO Isto posto, e por tudo mais que dos autos constam, JULGO PROCEDENTES, em parte, as pretensões deduzidas na petição de ingresso, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do Art. 487, inciso I, do CPC, para: RESCINDIR o “INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA LOTEAMENTO RESIDENCIAL MIRANTE DO PARQUE”, à aquisição de terreno no Loteamento Residencial Mirante do Parque, situado na Avenida B, Quadra 19, Lote 13, com área total de 200 (duzentos) metros quadrados, registrado no Cartório de Registro de Imóveis de Cuiabá, 2a Circunscrição (ID 30018574), celebrado entre o demandante, FRANCIRLEI DA SILVA MENDES, e a empresa demandada, BRDU SPE SAO MATEUS LTDA; CONDENAR a empresa demandada à restituição do valor de R$ 34.219,80 (trinta e quatro mil, duzentos e dezenove reais e oitenta centavos) (ID 30018588) ao demandante/comprador/adquirente do terreno, com retenção de 10% do valor pago e da taxa de corretagem - esta última se devidamente especificado o valor no contrato - em parcela única, devendo incidir sobre o numerário a ser restituído, correção monetária e juros moratórios em observância ao disposto na Lei nº 14.905/2024, a contar dos desembolsos. Esclareço que, diante do início da eficácia da Lei n. 14.905/2024 (cf. seu art. 5º): I – o índice da correção monetária será: i - até a data de 29/08/2024, o INPC; e ii - a partir 30/08/2024, o do IPCA ou do que vier a substituí-lo (art. 389, parág. único, CC); e II - os juros de mora serão: i- de 1% a.m. até a data de 29/08/2024; e ii- a partir 30/08/2024, o da taxa legal, que corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 do CC (art. 406, CC). Condeno, ainda, a empresa demandada, ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes que fixo em 15% sobre o montante da condenação, nos termos do Art. 85, §2º, do Código de Processo Civil. Transitada em julgado, arquivem-se os autos, com as anotações de estilo. Às providências. Cuiabá, data registrada no sistema. Alexandre Elias Filho Juiz de Direito

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Joyce Alves De Morais x Mrv Prime Projeto Mt N Incorporacoes Spe Ltda

ID: 334782379

Tribunal: TJMT Órgão: 8ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1008177-58.2022.8.11.0041

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

JOYCE ALVES DE MORAIS

Polo Passivo:

MRV PRIME PROJETO MT N INCORPORACOES SPE LTDA

Sentença

Advogados:

SALATIEL DE LIRA MATTOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

FABIANA BARBASSA LUCIANO REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO FABIANA BARBASSA LUCIANO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 8ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Processo n. 1008177-58.2022.8.11.0041 Vistos e examinados. I - RELATÓRIO JOYCE ALVES DE MORAIS propôs AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C DE… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 8ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ Processo n. 1008177-58.2022.8.11.0041 Vistos e examinados. I - RELATÓRIO JOYCE ALVES DE MORAIS propôs AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO DE QUANTIAS PAGASE PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL em desfavor de MRV PRIME PROJETO MT N INCORPORACOES SPE LTDA, ao argumento, em síntese, que em outubro de 2018 foi procurada por uma pessoa por nome Gabriela, alegando ser vendedora da empresa MRV, vez que portava uniforme e crachá de identificação da empresa MRV, e ofertou imóvel em construção no condomínio residencial Chapada Boulevard, situado na Av. Manoel José de Arruda, Bairro Bela Marina, em Cuiabá, no valor integral de R$ 133.720,93 (cento e trinta e três mil, setecentos e vinte reais e noventa e três centavos) e parcelas no patamar de R$ 550,00 (quinhentos e cinquenta reais) mensais, com parcelas fixas, embora, após a assinatura do contrato de compra e venda e ciência do real valor que deveria pagar, tenha visualizado tratar-se de golpe, de modo que deve ocorrer a rescisão contratual, devolução dos valores pagos e indenização por danos morais passíveis de reparação. A inicial restou recebida (ID 79358879), com concessão do benefício processual da gratuidade de justiça, designada audiência para tentativa de conciliação e determinada a citação da MRV. Citada, a MRV Prime Projeto MT N Incorporações SPE LTDA apresentou resposta (ID 85035031). Preliminarmente, suscita a inépcia da inicial, em razão da ausência de documentos indispensáveis à sua propositura da demanda, bem como necessária a alteração do valor da causa, eis que não condizente. Como prejudicial de mérito, venda a prescrição trienal. No mérito, resumidamente, ressalta que a autora é pessoa dotada de conhecimentos e assinou o contrato de compra e venda, após a devida leitura das cláusulas, com valores, parcelas e financiamento. Aduz que a proposta foi no sentido de que se a autora estivesse dentro dos requisitos necessários, teria isenção de ITBI e Registro do imóvel, e que, no caso, não foram gerados, e nem cobrados. Pondera que nem mesmo a segunda parcela do sinal foi pago de maneira pontual, pois o vencimento estava previsto para 08/12/2018, só adimplido em 24/01/2019 e que o restante dos valores não tiveram liberação através de financiamento bancário, em virtude de restrição cadastral. Por fim, diz que não houve qualquer culpa, sequer concorrente, no que tange ao pedido de rescisão, fato esse confesso na inicial e, portanto, incontroverso, devendo ser devolvido os valores pagos, de forma parcial, vez que a autora quem deu causa ao desfazimento, inexistindo dano moral, já que restou comprovado que atendeu as exigências necessárias para a rescisão contratual. A audiência para composição amigável não teve sucesso (ID 85691485). Réplica no ID 87562856. Instadas a especificarem provas, as partes envolvidas manifestaram (IDs 129146128 e 129174513). Decisão de saneamento e organização do processo no ID 168482494. Na audiência de instrução e julgamento não houve oitiva de testemunhas, ensejando o seu encerramento (ID 173891273). Alegações finais pelas partes nos IDs 175408284 e 175647935. Vieram os autos conclusos. É o que merece registro. DECIDO. II - FUNDAMENTAÇÃO 2.1. - Do julgamento no estado em que se encontra. O julgamento conforme o estado do processo é o momento em que o juiz decide se os elementos reunidos até o momento permitem, ou não, que seja proferida a sentença. No caso, na hora aprazada para a audiência de instrução e julgamento, constatou-se a ausência de testemunhas, razão pela qual a aludida solenidade não teve prosseguimento, ensejando seu encerramento. Mais. Despicienda a produção de outras provas além das já existentes nos autos, vez que a pretensão buscada é inerente a contrato de compra e venda de imóvel - relacionamento negocial vivenciado entre as partes envolvidas na lide, aferível mediante prova documental; suficiente, pois, ao deslinde do feito. Assim, passo ao julgamento da questão posta. 2.1.1. - Das preliminares. 2.1.1.1. - Inépcia da inicial - documentos indispensáveis à propositura da ação Vale apontar que há sensível diferença entre os conceitos de "documentos indispensáveis à propositura da ação" e de "documentos essenciais à prova do direito alegado”. Somente a ausência dos primeiros autoriza a conclusão acerca da inépcia da petição inicial. A ausência dos demais não configura qualquer deficiência a viciar a demanda desde sua propositura, mas tão-somente uma deficiência probatória que pode ser sanada a qualquer tempo pelas partes integrantes da demanda. REJEITO, assim, a alegação preliminar. 2.1.1.2. - Alteração do valor atribuído à causa. O valor dado à causa está em consonância com o disposto na Cláusula 3.1 do “QUADRO RESUMO” - e "3) PREÇO” (ID 79077420). Desta feita, AFASTO a preliminar suscitada. 2.1.2. - Da prejudicial de mérito - prescrição trienal. O C. Superior Tribunal de Justiça há muito entende: “EMENTA: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. PRAZO DECENAL. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. REGIMES JURÍDICOS DISTINTOS. UNIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ISONOMIA. OFENSA. AUSÊNCIA. 1. Ação ajuizada em 14/08/2007. Embargos de divergência em recurso especial opostos em 24/08/2017 e atribuído a este gabinete em 13/10/2017. 2. O propósito recursal consiste em determinar qual o prazo de prescrição aplicável às hipóteses de pretensão fundamentadas em inadimplemento contratual, especificamente, se nessas hipóteses o período é trienal (art. 206, §3, V, do CC/2002) ou decenal (art. 205 do CC/2002). 3. Quanto à alegada divergência sobre o art. 200 do CC/2002, aplica-se a Súmula 168/STJ (“Não cabem embargos de divergência quando a jurisprudência do Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado”). 4. O instituto da prescrição tem por finalidade conferir certeza às relações jurídicas, na busca de estabilidade, porquanto não seria possível suportar uma perpétua situação de insegurança. 5. Nas controvérsias relacionadas à responsabilidade contratual, aplica-se a regra geral (art. 205 CC/02) que prevê dez anos de prazo prescricional e, quando se tratar de responsabilidade extracontratual, aplica-se o disposto no art. 206, § 3o, V, do CC/02, com prazo de três anos. 6. Para o efeito da incidência do prazo prescricional, o termo “reparação civil” não abrange a composição da toda e qualquer consequência negativa, patrimonial ou extrapatrimonial, do descumprimento de um dever jurídico, mas, de modo geral, designa indenização por perdas e danos, estando associada às hipóteses de responsabilidade civil, ou seja, tem por antecedente o ato ilícito. 7. Por observância à lógica e à coerência, o mesmo prazo prescricional de dez anos deve ser aplicado a todas as pretensões do credor nas hipóteses de inadimplemento contratual, incluindo o da reparação de perdas e danos por ele causados. 8. Há muitas diferenças de ordem fática, de bens jurídicos protegidos e regimes jurídicos aplicáveis entre responsabilidade contratual e extracontratual que largamente justificam o tratamento distinto atribuído pelo legislador pátrio, sem qualquer ofensa ao princípio da isonomia. 9. Embargos de divergência parcialmente conhecidos e, nessa parte, não providos. (Fonte: STJ - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP No 1.280.825 - RJ - 2011/0190397-7) Logo, com arrimo no entendimento acima, NÃO ACOLHO a prejudicial aventada. 2.1.3. - Do mérito propriamente dito. Presentes os pressupostos de constituição, validade regular do processo e demais condições da ação, inexistindo nulidades a serem sanadas, em tempo, adentro ao cerne da contenda. Pois bem. Cumpre mencionar que o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento de que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) é aplicável aos contratos de compra e venda de imóveis, desde que o comprador seja seu destinatário final (REsp 1.087.225). Sendo assim, evidente a aplicação do microssistema de defesa do consumidor ao caso em tela, uma vez que a autora e a empresa ré se amoldam nos conceitos de fornecedor e consumidor estampados nos Arts. 2º e 3º do referido diploma. Para além das considerações supra, cinge-se a controvérsia quanto ao pedido de rescisão do “Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda de Unidade Imobiliária, Com ou Sem Financiamento Imobiliário, Garantia de Alienação Fiduciária e Outras Avenças” (ID 79077422), referente à aquisição de unidade imobiliária, n° 403, Bloco 33, no Chapada Boulevard, bem como as pretensões de condenação da empresa ré na restituição dos valores pagos, inerentes as avenças contratuais, e indenização por danos morais. Da análise do caderno processual, observa-se prova documental escrita através do instrumento contratual firmado entre as partes (ID 85035038); o que permite vislumbrar a existência da relação jurídica e das obrigações ali estampadas - notadamente o que consta da “7) CLÁUSULA SÉTIMA: DA RESOLUÇÃO CONTRATUAL”. Neste particular, incontroversa a possibilidade de rescisão contratual, além da declaração de vontade das partes envolvidas na lide, pairando o litígio apenas e tão somente com relação ao valor a ser restituído (Instrumento Particular de Distrato confeccionado, ID 79077429 e troca de mensagens eletrônicas entre a autora e a empresa ré, ID 79077424, mediante canal “relacionamento@mrv.com.br") E atento ao alegado pela autora na peça de ingresso, cujo teor dá conta de eventual golpe, em razão da divergência quanto ao valor das parcelas assumidas e o ofertado em sede pré-contratual, entendo que o contrato é válido e legítimo, celebrado por agentes maiores e capazes e que só após o pagamento dos valores atinentes ao princípio de pagamento, pela própria autora, é que se insurgiu sobre o patamar das parcelas. Pois bem. Oportuna a lição do denodado Paulo Nader, notadamente quanto a promessa de compra e venda: “(…) A promessa de compra e venda, também denominada compromisso, contrato preliminar e pré-contrato, gera a obrigação de as partes celebrarem o pacto definitivo, salvo se previsto o direito de arrependimento. A promessa pode ser unilateral ou bilateral. Na primeira hipótese, apenas um dos contratantes se obriga a celebrar o contrato definitivo, podendo ser o promitente-vendedor ou o promitente-comprador. Na promessa bilateral – a mais comum – ambas as partes se obrigam à celebração do contrato de compra e venda.(…)"(Curso de direito civil, v. 3: Contratos / Paulo Nader. – 8. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 227). E o Art. 171 do Código Civil, na clareza de seus incisos, dispõe que o negócio jurídico será anulável, por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores. Nessa linha de intelecção, a voz do festejado Flávio Tartuce: "2 .5 .5 Vícios ou defeitos do negócio jurídico O estudo dos defeitos do negócio jurídico, vícios que maculam o ato celebrado, é de vital importância para a civilística nacional. Tais vícios atingem a sua vontade ou geram uma repercussão social, tomando o negócio passível de ação anulatória ou declaratória de nulidade pelo prejudicado ou interessado. São vícios da vontade ou do consentimento: o erro, o dolo, a coação, o estado de perigo e a lesão. Os dois últimos constituem novidades, eis que não estavam tratados pelo Código Civil de 1916. O problema acomete a vontade, repercutindo na validade do negócio celebrado (segundo degrau da Escada Ponteana)."(Manual de direito civil: volume único/Flávio Tartuce. 6. ed. rev., atual. e ampl. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, p. 253). Frise-se: é da parte autora o ônus da prova quanto aos fatos constitutivos do direito alegado (Art. 373, inciso I, do CPC) - destarte, incumbia a ela comprovar o suposto "golpe" ou a ignorância a respeito das circunstâncias em que se deu a conclusão do negócio jurídico e, ainda, da situação pré-contratual e adjacente ao objeto do contrato de compra e venda da unidade imobiliária. Não bastasse a ausência de prova neste tocante, a validade do contrato somente se verá maculada "quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio" (Art. 138 do CC). Conforme a sistemática processual vigente, o ônus da prova incumbe à parte autora quanto ao fato constitutivo do seu direito, enquanto à parte ré incumbe a comprovação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito daquele (autor), nos termos do Art. 373, incisos I e II, do CPC. O ônus da prova é regra fundamental em nosso Estado Democrático de Direito, que certamente atraiu para a autora o encargo de provar de forma robusta suas alegações, ônus este do qual não se libertou. Forte a lição de Fredie Didier Jr.: "O princípio da aquisição processual - chamado por alguns de princípio do ônus objetivo, em terminologia que não é a nossa - não se confunde com o ônus objetivo da prova, mas com ele se relaciona. O ônus objetivo entra em campo quando há uma insuficiência probatória e impõe a regra de julgamento desfavorável àquele que tinha o encargo de produzir provas, mas dele não se desincumbiu.” (Curso de Direito Processual Civil, Teoria Geral da Prova, v. 2, 4ª Ed., Bahia: Editora JusPodivm, 2009). Por conseguinte, suficientemente comprovada a situação de inadimplência por parte da autora e consequente culpa pelo descumprimento de avenças, devem as partes retornar ao "status quo ante”. A respeito da devolução de valores nos contratos de compra e venda, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula n. 543, que prevê: “Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.” É cediço que os contratos de compra e venda, nos quais a incorporadora se obriga a construir unidades imobiliárias, estão submetidos à legislação consumerista, consoante entendimento do STJ, verbis: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SÚMULA Nº 83/STJ. 1. O Código de Defesa do Consumidor atinge os contratos de compra e venda nos quais a incorporadora se obriga a construir unidades imobiliárias mediante financiamento. Acórdão em harmonia com a jurisprudência deste Superior Tribunal. Precedentes. Incidência da Súmula nº 83/STJ. 2. Agravo regimental não provido.” (AgRg no AREsp n. 120.905/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 06.05.2014”). Logo, não prospera a pretensão de restituição da integralidade da quantia paga a titulo de parcelas, tampouco o disposto na “7) CLÁUSULA SÉTIMA: DA RESOLUÇÃO CONTRATUAL”, subitem “7.2) “d)” (ID 79077422), vez que, operando a desistência do negócio pelo comprador, o STJ tem autorizado que a promitente vendedora retenha o percentual de 10% a 25% do valor pago, consoante se infere: “EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. RESOLUÇÃO. RETENÇÃO. PERCENTUAL DE 10%. RAZOABILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte de Justiça, nas hipóteses de rescisão de contrato de promessa de compra e venda por inadimplemento do comprador, tem admitido a flutuação do percentual de retenção pelo vendedor entre 10% a 25% do total da quantia paga. 2. O percentual a ser retido pelo vendedor é fixado pelas instâncias ordinárias em conformidade com as particularidades do caso concreto, de maneira que não se mostra adequada sua revisão na via estreita do recurso especial. 3. O Tribunal de origem, ao analisar os documentos acostados aos autos, bem como o contrato firmado entre as partes, entendeu abusiva a cláusula contratual que previa a retenção de 25% do valor das quantias pagas em caso de rescisão por inadimplemento. Analisando as peculiaridades do caso, fixou a retenção em 10% do valor das parcelas pagas, o que não se distancia do admitido por esta Corte Superior. 4. Agravo regimental não provido.” (AgRg no AREsp 600.887/PE, 4ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, j. 19.05.2015). Nesse ponto, ainda que possível a retenção de 25% dos valores efetivamente pagos, o percentual máximo, segundo entendimento jurisprudencial, se mostra excessivo, considerando que a promitente compradora/autora sequer fez uso/habitou no imóvel, pois ainda em construção, não havendo maiores prejuízos à construtora/incorporadora, razão pela qual, diante da casuística, a retenção deverá ser feita no percentual mínimo de 10% dos valores pagos. O nosso Tribunal entendeu: “EMENTA: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – CONTRATO PARTICULAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – PARCIAL PROCEDÊNCIA – RESCISÃO – REPROVAÇÃO DO FINANCIAMENTO JUNTO AO BANCO – AUSÊNCIA DE CULPA DA CONSTRUTORA – RETENÇÃO DE 25% DOS VALORES PAGOS – CLÁUSULA PENAL ABUSIVA – REDUÇÃO PARA O PERCENTUAL MÍNIMO – 10% DO VALOR PAGO – IMÓVEL NÃO HABITADO – AUSÊNCIA DE PREJUIZO À CONSTRUTORA – PRECEDENTES DO STJ – DANO MORAL – NÃO CARACTERIZAÇÃO – RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE. Nas hipóteses de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel por culpa do comprador, poderá haver a flutuação do percentual de retenção pelo vendedor entre 10% e 25% do total da quantia paga, como forma de recompensar as perdas e danos pela rescisão. Assim, deve ser reformada a sentença para determinar a retenção de 10% do valor pago pela adquirente do imóvel, pois a empresa demandada poderá revender o imóvel (o qual sequer foi habitado pela compradora) e auferir vantagem com os valores retidos, além da própria valorização do bem. Uma vez não configurada a culpa da construtora pela rescisão do contrato de compra e venda do imóvel, não há falar-se em indenização por danos morais.”(RAC n. 1006008-60.2018.8.11.0002, 2ª Câmara de Direito Privado, Rel. Desa. Marilsen Andrade Addario, J. 10.08.22). (destaquei) Quanto ao dano moral pleiteado, cristalino que a construtora/incorporadora não praticou ato ilícito apto a ensejar a sua condenação ao pagamento de indenização por dano moral, vez que não restou caracterizada sua culpa pela resolução do negocio jurídico, de modo que à mingua da culpa, pressuposto essencial ao reconhecimento do ato ilícito, não cabe condenação por dano moral. E sobre as pretensões, com propriedade leciona o festejado Paulo Nader, na obra "Curso de direito civil, volume 7: responsabilidade civil./Paulo Nader. – 6. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016", p. 52/53: “10. NOÇÕES DE REPARAÇÃO E INDENIZAÇÃO De um modo geral a doutrina não distingue as noções de reparação e indenização, aplicando-as como fórmula de satisfação à vítima por danos decorrentes de inadimplemento negocial ou de ato ilícito. Como anota Paulo Luiz Netto Lôbo, reparação é gênero, enquanto indenização é espécie. O Código Civil de 2002, ao tratar da prescrição no art. 206, §3º, refere-se à reparação civil como gênero, fixando o prazo de três anos para a pretensão do ofendido. Igual critério é considerado, entre outras disposições, no caput do art. 932. Reparação, lato sensu, é prestação devida pelo ofensor ao ofendido em decorrência de violação ou descumprimento de obrigação. Apresenta-se sob três modalidades possíveis: a) reparação in natura; b)reparação específica; c) indenização. A primeira – in natura – consiste no modo mais eficaz de satisfação da lesão provocada; é quando o ofensor, às suas expensas, recompõe o quadro fático ao estado em que se encontrava (restitutio in integrum). Se alguém abalroa o veículo de outrem, haverá reparação in natura se o ofensor volve o objeto ao statu quo ante, assumindo as despesas correspondentes. Diz-se específica a reparação prevista pela ordem jurídica como forma substitutiva da satisfação in natura, como a estipulada pela Constituição Federal, art. 5º, inciso V, que dá o direito de resposta ao ofendido em casos de injúria, calúnia ou difamação, sem prejuízo do pleito de indenização por danos materiais e morais. Indenização consiste na reparação mediante pagamento, pelo ofensor ao ofendido ou seus dependentes, estipulado pelo juízo em razão de danos materiais ou morais. O vocábulo provém de indemnis, equivalente à expressão 'que não teve prejuízo'; daí dizer-se que a indenização visa a tornar o ofendido indene, ou seja, sem prejuízo. Teixeira de Freitas denomina indene não o estado decorrente da satisfação de um dano, mas o próprio ofendido que 'por motivo da indenidade, e da indenização, recebe alguma coisa de outrem'. Por indenidade considera o 'que se dá a alguém, para que não sofra algum dano'. A terminologia, porém, não é corrente na literatura jurídica.(…)”. E sobre os danos reparáveis pontua (ob. citada, p. 53/54): "11. DANOS REPARÁVEIS A responsabilidade civil, consoante já assentado, impõe ao ofensor a plena reparação dos danos injustamente impostos à vítima. O cumprimento desta obrigação se faz ressarcindo a pessoa diretamente atingida ou os seus dependentes. Por maior que sejam os prejuízos, estes devem ser arcados pelo responsável, ressalvada a hipótese de excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o prejuízo (art. 944, parágrafo único, do CC). O quantum indenizatório é considerado, para efeito de recurso junto ao Superior Tribunal de Justiça, matéria de direito. Nem todo dano implica a responsabilidade civil, como se verifica, por exemplo, no âmbito das concorrências comerciais ou quando o agente atua em legitima defesa, no exercício regular do seu direito ou para remover perigo iminente." Tocante aos danos material e moral, arremata (ob. citada, p. 120/122): “44. DANOS PATRIMONIAIS Ao expressar a noção de ato ilícito, o art. 186 do Código Civil não faz restrição a qualquer modalidade de prejuízo. Assim, desde que o agente, culposamente, produza dano ao direito alheio, não ocorrendo alguma exclusão de ilicitude, haverá a responsabilidade de reparação. O agente deve ser compelido a recompor a situação fática ao statu quo ante ou, não sendo isto possível, a indenizar a vítima com o valor correspondente à extensão do seu prejuízo. O dano se diz patrimonial quando provoca a diminuição do acervo de bens materiais da vítima ou, então, impede o seu aumento. Materializa-se por danos emergentes, com a diminuição do patrimônio, ou por lucros cessantes, quando a vítima se vê impedida da atividade que lhe traria proveito econômico. A ocorrência do dano patrimonial não requer, necessariamente, que o agente atinja diretamente bens materiais, pois é possível que advenha, reflexamente, de ofensas morais à vítima. Se um órgão de imprensa, levianamente veicula calúnias contra um diretor de estabelecimento de ensino, envolvendo a prática de pedofilia com alunos, a conduta do agente é meio eficaz para provocar danos patrimoniais à vítima, pois inevitavelmente ocorrerá a evasão de alunos e, com ela, os prejuízos, tanto por danos emergentes quanto por lucros cessantes. (…) 45. DANOS MORAIS Os patrimônios individuais são formados por bens materiais e imateriais. Os primeiros se compõem de riquezas suscetíveis de avaliação pecuniária, enquanto os segundos não comportam tal estimativa, como a vida, a honra, a liberdade. Os prejuízos causados aos bens materiais por damnum emergens ou lucrum cessans configuram os danos patrimoniais, enquanto os afetos aos bens imateriais são os danos morais. A indenização por danos morais não visa à reparação, pois não há como a vítima se tornar indene; condena-se com dupla finalidade: a de proporcionar à vítima uma compensação e para se desestimular condutas desta natureza. (…)”. Novamente cito e sigo decisão do nosso Tribunal: "E M E N T A: AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – RESCISÃO POR CULPA DO PROMITENTE COMPRADOR – FINANCIAMENTO REPROVADO - RETENÇÃO DE 10% – DANO MORAL – INDEVIDO – AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – AFASTADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador, integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento, admitida a retenção do percentual de 10% a 25% dos valores pagos. Afigura-se excessiva a retenção de 25% das parcelas pagas, quando o promitente comprador sequer fez uso/habitou o imóvel, impondo-se a redução no percentual mínimo de 10%, cujo valor deve ser acrescidos de juros de mora e correção monetária. É indevida a retenção das arras confirmatórias (sinal) na resolução contratual por inadimplemento do comprador. Uma vez não configurada a culpa da construtora pela rescisão do contrato de compra e venda do imóvel, não há falar-se em indenização por danos morais. Deve ser afastada a condenação em litigância de má-fé, à mingua de elementos que corroborem conduta desleal da parte no processo. Recurso parcialmente provido. (N.U 1007203-60.2018.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 19/12/2022, Publicado no DJE 19/12/2022) III - DISPOSITIVO Isto posto, e por tudo mais que dos autos constam, JULGO PROCEDENTES, em parte, as pretensões deduzidas na petição de ingresso, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do Art. 487, inciso I, do CPC, para: RESCINDIR o “Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda de Unidade Imobiliária, Com ou Sem Financiamento Imobiliário, Garantia de Alienação Fiduciária e Outras Avenças” (ID 79077422), e seus anexos, referente à um aquisição de imóvel descrito e caracterizado como Unidade Imobiliária, n° 403, Bloco 33, no Chapada Boulevard, em Cuiabá (ID 149552993), celebrado entre a autora, JOYCE ALVES DE MORAIS, e a empresa ré, MRV PRIME PROJETO MT N INCORPORAÇÕES SPE LTDA; CONDENAR a empresa ré à restituição do valor declarado no ID 79077426, qual seja: R$ 2.815,46 (dois mil, oitocentos e quinze reais e quarenta e seis centavos), em parcela única, com a retenção do percentual equivalente a 10% (dez por cento), devendo incidir sobre o numerário a ser restituído, correção monetária e juros moratórios em observância ao disposto na Lei nº 14.905/2024, a contar do desembolso. Esclareço que, diante do início da eficácia da Lei n. 14.905/2024 (cf. seu art. 5º): I – o índice da correção monetária será: i - até a data de 29/08/2024, o INPC; e ii - a partir 30/08/2024, o do IPCA ou do que vier a substituí-lo (art. 389, parág. único, CC); e II - os juros de mora serão: i- de 1% a.m. até a data de 29/08/2024; e ii- a partir 30/08/2024, o da taxa legal, que corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 do CC (art. 406, CC). Considerando que a autora decaiu em parte mínima do pedido, condeno, ainda, a empresa ré ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes que fixo em 15% sobre o montante da condenação, nos termos do Art. 85, §2º, do Código de Processo Civil. Transitada em julgado, arquivem-se os autos, com as anotações de estilo. Às providências. Cuiabá, data registrada no sistema. Alexandre Elias Filho Juiz de Direito

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Processo nº 1006008-61.2023.8.11.0042

ID: 325096296

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1006008-61.2023.8.11.0042

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

ADRIANA INACIO DE SOUZA BARBOSA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ROGERIO DE BARROS CURADO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1006008-61.2023.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Promoção, constitu… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1006008-61.2023.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Promoção, constituição, financiamento ou integração de Organização Criminosa] Relator: Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), KELLY BEATRIZ NERIS DE SOUZA - CPF: 052.749.791-65 (APELANTE), NEIVA MARIA BOENO DA SILVA - CPF: 481.940.851-87 (APELANTE), NAIARA SOARES DIAS (APELANTE), GUILHERME FELIPE LAVA CORTES - CPF: 071.401.351-00 (APELANTE), AKAUA GALIAZZO SILVA SOARES - CPF: 060.568.511-84 (APELANTE), WANDERSON CANDIDO DA SILVA (APELANTE), JARDEL DE SOUSA RIBEIRO - CPF: 611.507.673-08 (APELANTE), ALISSON MATHEUS DE CARVALHO DIAS - CPF: 056.590.811-18 (APELANTE), DANIEL AUGUSTO ARRUDA - CPF: 060.893.681-21 (APELANTE), ADRIANA INACIO DE SOUZA BARBOSA - CPF: 001.153.411-70 (APELANTE), ROGERIO DE BARROS CURADO - CPF: 566.364.661-20 (ADVOGADO), NAIARA SOARES DIAS - CPF: 073.519.441-64 (APELANTE), WANDERSON CANDIDO DA SILVA - CPF: 708.974.351-92 (APELANTE), Anamaria Machado Costa (ASSISTENTE), Allan Vitor Sousa da Mata (ASSISTENTE), Rodolpho Garcia G. Bandeira (ASSISTENTE), Honório G. dos Anjos Neto (ASSISTENTE), Edison Pereira da Silva (ASSISTENTE), Rafael Tramarin (ASSISTENTE), Gilvan Antônio Sá Teles (ASSISTENTE), Dalton Ribas Nery (ASSISTENTE), Joab Vinicius Martins de Siqueira (ASSISTENTE), Pedro Manoel Moreno Delgado (ASSISTENTE), BEATRIZ SOUZA FARIA - CPF: 039.220.191-70 (ASSISTENTE), JONAS GOMES MOREIRA - CPF: 378.318.601-34 (ASSISTENTE), ISABELLA APARECIDA GATTO FORTES DA SILVA - CPF: 057.558.471-85 (ASSISTENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), WANDERSON CANDIDO DA SILVA - CPF: 708.974.351-92 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A “APELAÇÃO CRIMINAL – SENTENÇA CONDENATÓRIA – ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA [ART. 2º DA LEI Nº 12.850/2013] – ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA – IMPROCEDÊNCIA – MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS – DEPOIMENTOS POLICIAIS HARMÔNICOS E CONSISTENTES – ANOTAÇÕES DE CONTROLE DE PAGAMENTOS E REGISTRO DE "LOJISTA" DO TRÁFICO APREENDIDAS COM LÍDER DA FACÇÃO – ESTABELECIMENTO COMERCIAL VINCULADO À APELANTE – PRÁTICA DO CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA CONFIGURADA – ENUNCIADO ORIENTATIVO Nº 8 DA TCCR DO TJMT – COMANDO VERMELHO – DOSIMETRIA ADEQUADA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Comprovado que a ré integrava organização criminosa (Comando Vermelho) na qualidade de "lojista", pagando taxas mensais para comercializar drogas no interesse da facção, utilizando seu estabelecimento comercial como ponto de venda de entorpecentes, impõe-se a manutenção da condenação pelo crime previsto no art. 2º da Lei nº 12.850/2013. "Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal" (Enunciado Orientativo nº 8 da TCCR do TJMT). No caso, os depoimentos dos policiais em juízo, corroborados pelos elementos colhidos na fase investigativa, como as anotações encontradas com o líder da organização criminosa, comprovam a participação da ré na estrutura criminosa, exercendo a função de "lojista", mediante pagamento de taxa mensal para comercialização de drogas. A alegação de que seu estabelecimento teria nome diverso do apontado nas anotações da organização criminosa não tem o condão de afastar as provas contundentes de sua participação na ORCRIM, especialmente quando a própria ré reconhece o apelido ("KELI") e confirma ser proprietária de bar no endereço indicado. Dosimetria da pena realizada de forma adequada, com análise pormenorizada das circunstâncias judiciais e valoração negativa justificada da culpabilidade, em razão da integração da ré a grupo criminoso nacionalmente conhecido pela violência e estrutura hierárquica que representa verdadeiro poder paralelo.” R E L A T Ó R I O Cuida-se de recurso de apelação criminal interposto por ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA contra sentença proferida pelo Juízo da 7ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT, que julgou parcialmente procedente a denúncia e condenou a apelante pela prática do delito previsto no art. 2º da Lei nº 12.850/2013, à pena de 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão, em regime inicial semiaberto, além do pagamento de 13 (treze) dias-multa. Inconformada com a sentença condenatória, a apelante interpôs recurso de apelação (ID 239549743), apresentando razões recursais (ID 242613163), nas quais sustenta, em síntese: 1. Que não há provas suficientes nos autos que a vinculem à organização criminosa ou à prática de tráfico de drogas; 2. Que os policiais ouvidos em juízo não foram capazes de apontar elementos concretos de sua participação na organização criminosa; 3. Que não foi apreendida qualquer substância entorpecente em sua residência ou local de trabalho durante as buscas realizadas; 4. Que o estabelecimento comercial de sua propriedade se chama "Toa Toa Bar" e não "Kelly Bar" como afirmado na acusação; 5. Que não possui CNH, contradizendo a informação policial de que seu endereço constaria em tal documento; 6. Que não possui o apelido de "Malévola", não tendo sido apresentada prova que lhe vincule a tal alcunha. Por fim, pleiteou a reforma da sentença com sua consequente absolvição, com fundamento no art. 386, incisos II, IV, V e VII, do Código de Processo Penal. O Ministério Público apresentou contrarrazões (ID 244383667), pugnando pelo desprovimento do recurso e manutenção integral da sentença condenatória, argumentando que a materialidade e autoria delitivas estão plenamente demonstradas pelo conjunto probatório dos autos. A Procuradoria de Justiça, em parecer (ID 246291162), manifestou-se pelo desprovimento do recurso, entendendo comprovada a participação da apelante na organização criminosa denominada "Comando Vermelho", como "lojista" (traficante doméstico), conforme demonstrado pelos depoimentos prestados pelos policiais em juízo e demais elementos probatórios colhidos durante a investigação. Segue ementa: “Apelação Criminal: Organização criminosa - Irresignação defensiva – Requestada absolvição do crime organização criminosa (art. 2º da Lei 12.850/13), em observância aos princípios da presunção de inocência e in dubio pro reo, sob o argumento da inexistência de provas aptas a ensejar a condenação - Inadmissibilidade - Plexo probatório constante do feito é robusto e maciço a comprovar a materialidade e autoria imputada à recorrente quanto ao delito de organização criminosa, sobretudo pelo Relatório de Investigação nº 2022.13.71123, corroborada pelos depoimentos judicializados das testemunhas policiais - Enunciado Orientativo n.º 8 da TCCR do TJMT – “Não há que se cogitar de absolvição do réu quanto à autoria do crime previsto no art. 2º, §2º, da Lei nº. 12.850/13, se a prova pericial, associada às provas orais colhida em Juízo, são capazes de demonstrar indene de dúvida que o réu integra o “Comando Vermelho do Estado de Mato Grosso”, conhecida organização criminosa estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, com objetivo de obter vantagem mediante a prática de infrações penais diversas, havendo efetivo vínculo organizacional.” (TJMT, N.U 1001135-40.2021.8.11.0025 )” (TJMT - N.U 1000502-08.2021.8.11.0032) - Pelo desprovimento do apelo interposto pela apelante.” É o relatório. V O T O R E L A T O R Eminentes pares, o recurso merece conhecimento, pois preenche os requisitos de admissibilidade. Em conformidade com a exordial acusatória, a apelante, entre os meses de fevereiro e março de 2022, na cidade de Primavera do Leste/MT, integrava pessoalmente a organização criminosa denominada "Comando Vermelho", exercendo função no quadro de "Lojista", responsável pelo comércio de entorpecentes mediante pagamento mensal de taxas e aquisição de drogas com membros da organização criminosa. Segundo consta, a apelante seria proprietária do estabelecimento comercial denominado "Kelly Bar" ou "Keli Bar", local que funcionava como ponto de venda de entorpecentes. A acusação baseou-se em investigações da Polícia Civil que, ao analisar cadernos e dados telefônicos apreendidos com o líder da organização criminosa, Leandro Miranda dos Santos, vulgo "Léo do Chevette" ou "Bugiganga", identificou o nome "Keli Bar" associado ao pagamento de taxa como "lojista", terminologia utilizada pela organização para designar pontos de venda de drogas. Consta ainda que o "Keli Bar" foi identificado como pertencente à denunciada, sendo o endereço registrado em nome da ré, na Rua Olivério Porta, nº 726, Bairro Centro Leste, Primavera do Leste/MT. A polícia informou que a acusada já era conhecida no meio policial por envolvimento com o tráfico de drogas. A controvérsia recursal cinge-se à análise da existência de provas suficientes para a condenação da apelante pelo crime de integrar organização criminosa (art. 2º da Lei nº 12.850/2013). Inicialmente, destaco que a materialidade do delito está demonstrada pelo conjunto de elementos probatórios coletados na fase investigativa, notadamente o Relatório Técnico nº 004/2022, que analisou dados extraídos do aparelho celular de Leandro Miranda dos Santos, líder da organização criminosa; os Relatórios de Inteligência Financeira; o Termo de Apreensão nº 2022.16.13807; e medidas cautelares de quebra de sigilo. O ponto central da impugnação recursal é a alegação de insuficiência probatória para vincular a apelante à organização criminosa denominada "Comando Vermelho". Vejamos as provas lançadas na sentença: “DO MÉRITO Verifica-se que o processo buscou apurar o delito tipificado no art. 2º da Lei 12.850/2013. Acerca do crime de organização criminosa, dispõe o art. 1º, §1º, da Lei n. 12.850/2013 que: Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. Deste dispositivo é possível extrair três requisitos para configuração de uma organização criminosa, a saber: a) Associação de 4 (quatro) ou mais pessoas; b) Estrutura ordenada que se caracterize pela divisão de tarefas, ainda que informalmente; c) Finalidade de obtenção de vantagem de qualquer natureza mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou de caráter transnacional; Já o tipo penal incriminador assim dispõe: Art. 2º Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa. Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas. Da análise do tipo penal, extraem-se as condutas delitivas de promover, que consiste em gerar, dar origem a algo, fomentar; constituir, o que significa formar, organizar, compor; financiar, ou seja, sustentar os gastos, custear, bancar, prover o capital necessário para o desenvolvimento de determinada atividade; e integrar, o que pode ser conceituado como tomar parte, juntar-se, completar. Trata-se de crime comum e formal, ou seja, não exige qualidade especial do sujeito ativo do crime e se consuma com a simples associação de quatro ou mais pessoas para a prática de crimes com pena superior a quatro anos, prescindindo de resultado naturalístico. Com efeito, o tipo penal descrito no art. 2º da Lei 12.850/2013 se caracteriza como crime abstrato cometido contra a coletividade, punindo-se o simples fato de se figurar como integrante do grupo. Da materialidade A materialidade delitiva do crime de organização criminosa restou cabalmente comprovada por meio do Relatório Técnico n. 004/2022 (Id. 114802199); Autos do Inquérito Policial n. 307.4.2022.9249 (Id. 109670839); Relatórios de Inteligência Financeira (Id. 136076048), Termo de Apreensão de n. 2023.16.13807 (Id. 114802202), medidas cautelares de n. 1002146-34.2022.8.11.0037, 1008019-15.2022.8.11.0037, 1004518-04.2023.8.11.0042 e depoimentos prestados em Delegacia e em Juízo. Da autoria Consta da denúncia que: [...] No dia 26 de março de 2022, no munícipio de Goiânia/GO, bem como em diversas outras cidades da Federação, em especial na cidade de Primavera do Leste-MT, a Polícia Judiciária Civil de Primavera do Leste-MT em apoio à Delegacia Estadual de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco – PJC/GO), cumpria os mandados de prisão e busca e apreensão (PJE nº 1002146-34.2022.8.11.0037) expedidos em desfavor de Leandro Miranda dos Santos, conhecido nas atividades criminosas como "Léo do Chevette ou Bugiganga". Naquela ocasião, a Polícia Judiciária Civil logrou êxito em localizar diversos objetos que seriam de interesse para as investigações, haja vista a existência de informações referentes a uma Organização Criminosa destinada ao tráfico de entorpecentes, dentre os quais, pode-se destacar a existência de quatro cadernos e o aparelho telefônico de Leandro Miranda. Na sequência, após realizar a devida análise das informações extraídas do aparelho celular e dos cadernos encontrados na residência de Leandro Miranda dos Santos, vulgo "Léo do Chevette ou Bugiganga", a Polícia Judiciária Civil percebeu a existência de uma Organização Criminosa, na medida em que fora possível identificar os seus integrantes, hierarquia e, inclusive, movimentação financeira, os quais praticavam reiteradamente diversos ilícitos, tais como: tráfico de drogas, associação ao tráfico, entre outros. III – INTEGRANTES DA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA QUE NÃO EXERCEM FUNÇÃO DE COMANDO/LIDERANÇA Consta do incluso inquérito policial que entre os meses de fevereiro de 2022 a março de 2022, na cidade de Primavera do Leste e região, os denunciados Kelly Beatriz Neris de Souza, Neiva Maria Boeno da Silva, Naiara Soares Dias, Guilherme Felipe Lava Cortes, Akauan Galiazzo Silva Soares, WANDERSON CANDIDO DA SILVA, Jardel de Sousa Ribeiro, Alisson Matheus Carvalho Dias, Daniel Augusto Arruda e ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, agindo em unidade de desígnios, integraram, pessoalmente, a Organização Criminosa denominada "Comando Vermelho", com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática dos crimes de tráfico ilícito de drogas, associação para o tráfico, crimes patrimoniais e outros ilícitos penais. III.I – DA CONDUTA DOS DENUNCIADOS SEM FUNÇÃO DE COMANDO OU LIDERANÇA: Extrai-se da investigação que a conduta de cada denunciado se dava da seguinte maneira, conforme o relatório final (ID nº 109673413) da Autoridade Policial. [...] 6. WANDERSON CANDIDO DA SILVA O denunciado WANDERSON CANDIDO DA SILVA, vulgo "OCULTO", foi apontado como um dos integrantes da Organização Criminosa denominada "Comando Vermelho" na cidade de Primavera do Leste-MT, exercendo uma função no "Tráfico de Drogas", na medida em que era responsável por expor a venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar os entorpecentes em obediência aos ditames impostos pela Organização Criminosa. Segundo consta no Relatório de Investigação nº 2022.13.71123, especificamente na página 28, nos cadernos apreendidos na residência de Leandro Miranda dos Santos, vulgo "Léo do Chevette ou Bugiganga (Líder da ORCRIM), havia uma espécie de "lista ou controle de integrantes/faccionados", na qual consta o vulgo "OCULTO" associado a Matrícula (registro faccional) nº 16.472. Conforme apurado, o vulgo "OCULTO" seria referente ao denunciado WANDERSON CANDIDO DA SILVA. Nos dias 17 e 18/03/2022, o Leandro Miranda (Líder da ORCRIM) entra em contato com o denunciado WANDERSON CANDIDO DA SILVA, ocasião em que conversam a respeito de "balas", cujo teor, segundo a Polícia Civil, faria alusão a drogas sintéticas, e, inclusive, é indicado para o denunciado Wanderson realizar a retirada do entorpecente com o vulgo "Sabotagem" (integrante da ORCRIM, matrícula 13.339, identificado como Jardel de Sousa Ribeiro). Posteriormente, Leandro Miranda informa ao denunciado WANDERSON CANDIDO DA SILVA como deverá realizar a distribuição dos entorpecentes e repasse de valores. Percebe-se, portanto, que o denunciado WANDERSON CANDIDO da Silva, vulgo "OCULTO", Matrícula nº 16.472, é integrante da Organização Criminosa denominada "Comando Vermelho - CVMT", na qual desempenha uma função no comércio espúrio de entorpecentes. [...] 10. ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA A denunciada ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, vulgo "MALÉVOLA", proprietária do estabelecimento comercial denominado "Kelly Bar ou Keli Bar" foi apontada pelas investigações como uma das integrantes da Organização Criminosa denominada "Comando Vermelho – CVMT" na cidade de Primavera do Leste-MT, exercendo uma função no quadro "Lojistas", na medida em que era responsável por expor a venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar os entorpecentes mediante pagamento mensal de taxas e aquisição dos entorpecentes com os indivíduos outrora indicados pela ORCRIM. Segundo consta no Relatório de Investigação nº 2022.13.71123, especificamente na página 213, nos cadernos apreendidos na residência de Leandro Miranda dos Santos, vulgo "Léo do Chevette ou Bugiganga" (Líder da ORCRIM), havia uma espécie de "relação/controle de integrantes", na qual consta o nome "Keli Bar" associada ao pagamento de taxa de lojista, este é o termo utilizado pela ORCRIM para se referir aos pontos de venda de entorpecentes, haja vista que tais "pontos" deverão realizar o pagamento de uma espécie de concessão para a realização da atividade espúria. Conforme apurado, o estabelecimento comercial Keli Bar seria pertencente à denunciada ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, inclusive, o endereço registrado em sua CNH é idêntico ao do estabelecimento comercial, qual seja: Rua Olivério Porta, nº 726, bairro Centro Leste 1ª Parte, Primavera do Leste-MT. De mais a mais, a Polícia Judiciária Civil informou ainda que a denunciada ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, vulgo "MALÉVOLA", já é uma pessoa conhecida na seara policial, tendo em vista seu considerável histórico criminal pelo delito de tráfico de entorpecentes e ouros ilícitos, bem como que o seu estabelecimento comercial já foi apontado como ponto de venda de estupefacientes conforme Boletim de Ocorrência nº 2020.107080. Percebe-se, portanto, que a denunciada ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, vulgo "MALÉVOLA", é integrante da ORCRIM denominada "Comando Vermelho", na qual desempenha a função no quadro "Lojista", sendo responsável pelo comércio de entorpecentes. Do réu WANDERSON CANDIDO DA SILVA, vulgo "OCULTO" Narra a denúncia que WANDERSON CANDIDO DA SILVA, utilizando a alcunha "OCULTO", integra pessoalmente a organização criminosa denominada Comando Vermelho, exercendo o tráfico de drogas no interesse da Orcrim cidade de Primavera do Leste/MT. Interrogados em juízo, WANDERSON CANDIDO negou possuir qualquer envolvimento com a organização criminosa Comando Vermelho, assim como afirmou não possuir o apelido indicado nos autos (Relatório de Mídias de Id. 135714411). Pois bem. Em que pese haver nos autos indícios de que a pessoa de vulgo "OCULTO" possua envolvimento com a Orcrim investigada, os elementos de autoria limitam-se a informações angariadas na fase policial quanto ao referido apelido, o qual não foi corroborado por outras provas a não ser os depoimentos dos delegados de polícia e policiais civis. Nesse tocante, há nos autos apenas o Relatório Técnico n. 004/2022 (Id. 114802199), que analisou os dados extraídos do aparelho celular de Leonardo Miranda, vulgo "Léo do Chevette ou Bugiganga", traz apenas um diálogo em que este e a pessoa de vulgo "OCULTO" trocam mensagens sobre drogas sintéticas, sem, contudo, indicar qual elemento vincula WANDERSON CANDIDO ao aludido apelido. No mesmo sentido, o fato do vulgo "OCULTO" estar presente nas listas de controle do tráfico e dos membros da Orcrim apreendidas na residência de Leonardo Miranda, inexiste comprovação de que se refira ao réu. Conclui-se, portanto, que os indícios de autoria que autorizaram a deflagração da ação penal não se confirmaram durante a instrução processual, razão pela qual a absolvição de WANDERSON CANDIDO DA SILVA é medida que se impõe. Da ré ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, vulgo "MALÉVOLA" De acordo com a inicial acusatória, ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, vulgo "MALÉVOLA", integra pessoalmente a organização criminosa denominada Comando Vermelho, praticando o tráfico de drogas no interesse da aludida Orcrim. Em seu interrogatório judicial, ADRIANA, apesar de negar o apelido "MALÉVOLA" e a prática do delito que lhe foi atribuído, afirmou possuir o apelido de "KELI" e ser proprietária de um bar em Primavera do Leste/MT (Relatório de Mídias de Id. 132598020). Durante as investigações no âmbito do Inquérito Policial n. 307.4.2022.9249, a Polícia Judiciária Civil localizou 04 cadernos e o aparelho telefônico de Leandro Miranda dos Santos, vulgo "Léo do Chevette ou Bugiganga", cuja análise dos dados permitiu identificar hierarquia, movimentação financeira e parte dos integrantes, que praticavam reiteradamente diversos ilícitos como tráfico de drogas e associação ao tráfico. Isso porque Leandro, vulgo "Léo do Chevette ou Bugiganga", exercia o controle da distribuição das drogas, das taxas pagas pelo comércio e por integrantes da Orcrim, bem como dos pontos de venda de drogas, conforme indicado no Relatório Técnico n. 04/2022, sendo o responsável por toda a movimentação financeira do núcleo criminoso e contendo, em um dos cadernos apreendido, o ponto "KELI BAR" registrado como "loja", ou seja, local de comércio de drogas. Em posse dessas informações, os investigadores de polícia identificaram que a aludida "loja" se tratava do bar de propriedade da ré ADRIANA, conhecida como "MALÉVOLA" ou "KELI", localizado na rua Olivério Porta, n. 726, Bairro Centro Leste, 1ª Parte, do município de Primavera do Leste/MT (Id. 109672372). Corroborando com os elementos colhidos, verificou-se que a ré possuía o mesmo logradouro registrado no Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo de sua motocicleta (Id. 135443489) – erroneamente indicado como Carteira Nacional de Habilitação – CNH nos relatórios policiais. Assim, muito embora a defesa de ADRIANA alegue se tratar de pessoa diversa, uma vez que a ré não possui CNH, fato é que esta reconhece o vulgo de "KELI" e confirma possuir um bar no endereço informado, o que aliado aos demais elementos probatório, comprova a autoria delitiva. Nesse contexto, percuciente foram os memoriais finais do Ministério Público, acostados no Id. 141765178, lavrado pela Promotora de Justiça, Dra. Élide Manzini de Campos, que bem delineou o contexto fático dos autos e os elementos probatórios acerca da autoria do delito por parte do denunciado, os quais adoto como razão de decidir, "in verbis": Após regular instrução do feito, a autoria dos crimes imputados aos acusados de ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, vulgo "MALÉVOLA ou KELLY BAR" e WANDERSON CANDIDO DA SILVA vulgo "OCULTO", como incursos no tipo penal do art. 2º, da Lei Federal nº 12.850/2013, restou cabalmente comprovada pelas provas produzidas tanto durante a fase inquisitiva como na fase judicial e sob o crivo do contraditório e ampla defesa, comprovando os fatos narrados da denúncia, devendo a ação penal ser julgada totalmente procedente. [...] A denunciada ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, vulgo "MALÉVOLA ou KELLY BAR", foi apontada como uma das integrantes da Organização Criminosa denominada "Comando Vermelho – CVMT" na cidade de Primavera do Leste-MT, atuando em tráficos de drogas ligados à ORCRIM. Segundo consta no Relatório de Investigação nº 2022.13.71123, especificamente na página 213, num dos cadernos apreendidos na residência de Leandro Miranda dos Santos, vulgo "Léo do Chevette ou Bugiganga" (Líder da ORCRIM), havia uma espécie de "relação/controle de integrantes", bem como, das lojinhas de venda de droga da facção (boca de fumo fixa), dentre os quais fora possível constatar "KELLY BAR" associada ao pagamento mensal da taxa como lojista vendedor de drogas, estabelecimento, o qual, conforme o apurado, trata-se da denunciada ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, vulgo "MALÉVOLA". De mais a mais, a Polícia Judiciária Civil informou ainda que a mesma, possui histórico criminal no tráfico de drogas, entre outros crimes, apontando que o estabelecimento fora denunciado como ponto de venda de drogas. Percebe-se, portanto, que o pagamento pela concessão de venda de drogas da fação demonstra o vínculo da denunciada ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, vulgo "MALÉVOLA" integra a Organização Criminosa da CVMT "Comando Vermelho" na qual desempenha a função do quadro "Lojista", sendo responsável pelo comércio de entorpecentes. Consoante a apuração da PJC de Primavera do Leste/MT, constante do relatório de investigação n. Relatório de Investigação nº 2022.13.71123: [Imagens de documentos policiais] Percebe-se, portanto, que a denunciada ADRIANA, vulgo "MALÉVOLA ou KELLY BAR", é integrante da OCRIM denominada "Comando Vermelho". Em Juízo, prova oral produzida corrobora integralmente os termos da acusação descrita na exordial: Oitiva da testemunha, DELEGADA ANAMARIA, presidente do inquérito que culminou na presente ação penal: "ADRIANA INÁCIO DE SOUSA é o vulgo MALÉVOLA. Ela é traficante de droga, ela está na lista nas análises dos materiais, como lojista, biqueira, que é a que paga uma taxa mensal para comercializar droga da própria facção, inclusive ela tem um bar, gera investigado aqui pela polícia como estava todo como uma boca de fumo, que é o KELLY BAR, que foi constatado que o bar é dela e ela atua no tráfico de drogas. Na facção, inclusive pão é o vulgo, do marido dela, que é outro faccionado à organização criminosa." INVESTIGADOR RODOLPHO "Ela também seria lojista, ela tinha, inclusive, um estabelecimento comercial aqui onde era conhecido pelos policiais que trabalham na delegacia como boca de fumo. Onde era, comercializava drogas, então a função dela na organização seria de lojista mesmo, do comércio, fim do tráfico de drogas. Então, era comumente esses lojistas pagavam uma taxa mensal, as lideranças dessas organizações. Então todos esses lojistas pagavam, os traficantes também que pagavam as taxas chamadas camisas também. Então, de fato é, esses lojistas pagaram essas taxas aí para as, para as lideranças, para comercializarem as drogas, dado o comando vermelho. Salvo engano, esse pagamento era no valor de 100 BRL ou algo nesse sentido, aproximadamente 100 BRL. Geralmente, agora não me recordo, se eles pagavam direto as lideranças, mas salvo engano, passavam seu valor aos gerentes, denominados gerentes da organização. Então esse gerente repassava esses valores para a liderança. Salvo o maior juízo, eles passavam a parte, para gerente de tráfico de drogas da organização do Município." INVESTIGADOR DALTON "ADRIANA, ela é dona de um bar KELLY BAR, um bar que fica ao lado da feira, ela é dona desse bar. Eu lembro que teve um boletim de ocorrência muito anterior a essa investigação que denunciava aquele local como ponto de tráfico de drogas. E quando, nos deparamos naquela relação dos lojistas, do dono de boca de fumo KELLY BAR, nós já associando, tinha aquela denúncia de que o lugar era ponto de tráfico. Estava entre a relação do Leandro Miranda como uma lojista que paga taxa por traficar. E, inclusive, até acrescento que era ele, até na nas próprias anotações, pode olhar que ele usa o termo lojista, pra aqueles que são dono de boca de fumo. Uso o termo comércio para aqueles que pagavam pela segurança. Então, ele faz a distinção na relação que o senhor pode analisar. E também o KELLY BAR que, é da ADRIANA o estabelecimento. Ela é conhecida como MALÉVOLA, eu não vou me lembrar como. Sua função seria Lojista vendedora." INVESTIGADOR GILVAN "Essa ADRIANA, ela possui um bar, chamado KELLY BAR. Inclusive, já foram feitas outras diligências no local. É por denúncias de tráfico de droga. Existe uma denúncia também é em 2018, em quem vincula a ADRIANA com o vulgo KELLY bar, numa denúncia de tráfico de drogas e também a CNH dela mostra o endereço nesse local, nesse estabelecimento comercial." INVESTIGADOR RAFAEL "Então, já em relação a ADRIANA, ela já foi investigada anteriormente também por tráfico de drogas. Ela era relacionada com uma pessoa de alcunha pão, que também era traficante. É, acho que está preso por crime de tráfico de drogas também, e ela tinha um bar chamado KELLY BAR, que também já foi alvo de denúncias anteriores de tráfico de drogas. É utilizava lá o comércio lá para a venda de entorpecente, a venda de drogas." Logo, pelas provas colhidas durante as investigações, corroboradas pelos depoimentos prestados em Juízo, evidencia-se o vínculo entre o réu e a organização criminosa investigada, incidindo, assim, nas penas do art. 2º da Lei n. 12.850/2013. DO DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na denúncia, a fim de: a) CONDENAR a ré ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA, já qualificada, como incursa nas sanções do art. 2º da Lei n. 12.850/2013; b) ABSOLVER o réu WANDERSON CANDIDO DA SILVA, já qualificado, do delito imputado na denúncia, nos termos do art. 386, VII, do Código de Processo Penal, por entender que não há provas suficientes para sustentar sua condenação. Passo a dosar a pena a ser aplicada, nos termos do art. 68 do Código Penal. Do crime previsto no art. 2º da Lei nº 12.850/2013: O delito apresentou culpabilidade exacerbada, tendo em vista que a ré integra a Organização Criminosa Comando Vermelho grupo bem articulado, com várias ramificações, divisão de funções definidas, reconhecida nacionalmente por atos de extrema violência e voltada para a prática não apenas do comércio ilegal de entorpecentes, mas de outros delitos, como tortura, homicídio, roubo e lesão corporal. Outrossim, o grupo criminoso se instaura como verdadeiro Poder Paralelo causador de inúmeros problemas na sociedade, atuando dentro e fora dos presídios de todo o país, ordenando "salves" e até morte de desafetos, pelo que merece valoração negativa, como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ - AgRg no HC: 601992 AC 2020/0191318-8, Relator: Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Julgamento: 01/12/2020, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/12/2020); a ré não possui maus antecedentes criminais, à vista que não há nos autos informações sobre delitos que tenham transitado em julgado antes do fato ora em julgamento; poucos elementos foram coletados a respeito da conduta social da agente; o motivo do crime restringiu-se aos limites próprios do tipo; as circunstâncias estão relatadas nos autos, nada tendo a valorar negativamente; poucos elementos foram coletados a respeito da personalidade do agente, razão pela qual deixo de valorá-la; as consequências do crime fazem parte do tipo penal, de modo que não cabe a valoração negativa; a vítima é toda sociedade, nada tendo a valorar. Desta forma, verificando-se a existência uma circunstância judicial desfavorável (culpabilidade), fixo a pena base acima do mínimo legal, dosando-a em 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão, a qual torno definitiva pela ausência de circunstâncias atenuantes ou agravantes e causas de diminuição ou aumento da pena. Em atenção ao critério trifásico de dosimetria da pena e ao princípio da proporcionalidade, fixo a pena de multa em 13 (treze) dias-multa, correspondentes a um trigésimo do salário mínimo vigente à data dos fatos. Repise-se que, levando em consideração o tempo de segregação provisória da ré e que pela detração a pena será inferior a 04 (quatro) anos (cujo cálculo será devidamente aferido pelo juízo da execução penal), fixo o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena do condenado, com base no art. 33, §2º, alínea "b", e §3º, do Código Penal, pela valoração negativa da culpabilidade. Ausentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, descabida a substituição da pena por restritiva de direitos. DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE Haja vista o regime acima fixado, concedo à ré ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA o direito de recorrer em liberdade, mediante o cumprimento das seguintes medidas cautelares: • Manutenção do endereço atualizado nos autos; • Proibição de manter contato com outros corréus da "Operação Alter Ego", salvo parentes em linha reta ou colateral até o segundo grau; • Proibição de frequentar bares, boates, prostíbulos, bocas de fumo ou outros estabelecimentos congêneres; • Proibição de portar facas, canivetes, estiletes ou outros objetos que possam malferir a integridade física de outrem. Deve o responsável pelo cumprimento do alvará de soltura ressaltar à condenada que O DESCUMPRIMENTO DAS MEDIDAS CAUTELARES SUPRA DEFERIDAS PODERÁ ENSEJAR EM SUA PRISÃO. Expeça-se alvará de soltura em favor de ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA. DOS BENS APREENDIDOS Com efeito, inexistindo bens apreendidos na posse da ré ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA ADRIANA, apesar de comprovada a culpabilidade, deixo de destiná-los. Em continuidade, no que tange aos bens apreendidos em posse de WANDERSON CANDIDO DA SILVA, que foi absolvido, e dos demais investigados, cuja denúncia foi rejeitada, determino a restituição de eventuais bens apreendidos deverão ser reclamados até o prazo máximo de 90 (noventa) dias do trânsito em julgado da sentença, com exeção daqueles que, pela natureza, sejam diretamente vinculados a infrações legais, como armas, munições, entorpecentes. Decorrido o prazo sem qualquer manifestação, desde já, decreto o perdimento, devendo os bens inservíveis (papéis, cadernos, eletrônicos e seus acessórios) serem destruídos, uma vez que, pelo lapso temporal decorrido e natureza dos bens, certamente não apresentarão condições de uso ou valor econômico viável para realização de leilão judicial. DISPOSIÇÕES FINAIS Condeno a denunciada ADRIANA INÁCIO DE SOUZA BARBOSA ADRIANA ao pagamento das custas e despesas processuais.” (sic). Ao analisar detidamente os autos, verifico que a condenação da apelante está embasada principalmente em três elementos: 1) existência do nome "Kelly Bar" na lista de "lojistas" apreendida com o líder da organização criminosa; 2) coincidência entre o endereço do estabelecimento comercial mencionado e o endereço vinculado à apelante; 3) depoimentos de policiais civis que participaram das investigações. A apelante, em seu interrogatório judicial, confirmou ser proprietária de um bar no endereço indicado pela acusação, mas alegou que o nome do estabelecimento seria "Toa Toa Bar", e não "Kelly Bar". Afirmou que não possui CNH e negou possuir o apelido de "Malévola". Admitiu, contudo, ser conhecida pelo apelido de "Keli" e reconheceu que o endereço de seu estabelecimento era Rua Olivério Porta, nº 726 (posteriormente alterado para nº 722 pela prefeitura). Relatou ainda que pagava uma taxa de R$ 100,00, mas que seria para um serviço de segurança do bairro e não para a organização criminosa. Os depoimentos prestados pelos policiais civis em juízo foram convergentes no sentido de apontar a apelante como integrante da organização criminosa, na condição de "lojista", utilizando seu estabelecimento comercial como ponto de venda de drogas. A Delegada Anamaria Machado Costa afirmou que a ré é traficante de droga, estava na lista de "lojistas" apreendida e pagava taxa mensal para comercializar drogas da facção. Declarou que o estabelecimento "Kelly Bar" pertence à ré e era utilizado como "boca de fumo". O Investigador Rodolpho Garcia G. Bandeira corroborou essa versão, informando que a apelante era conhecida como "lojista" e pagava taxa mensal de aproximadamente R$ 100,00 para comercializar drogas vinculadas ao Comando Vermelho. Os Investigadores Dalton Ribas Nery e Gilvan Antônio Sá Teles também confirmaram essa versão, relatando a existência de denúncias anteriores relacionando o estabelecimento da ré ao tráfico de drogas. Cumpre salientar que os depoimentos dos policiais, sendo harmônicos entre si e com as demais provas dos autos, possuem valor probante, conforme entendimento pacificado na jurisprudência dos Tribunais Superiores e expresso no Enunciado Orientativo nº 8 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas do TJMT: "Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal." Ademais, verifica-se que os elementos colhidos na fase investigativa, em especial os apontamentos encontrados nos cadernos e celular apreendidos com o líder da organização criminosa, Leandro Miranda dos Santos, foram confirmados pela prova oral produzida sob o crivo do contraditório e ampla defesa em juízo. O fato de não terem sido apreendidas substâncias entorpecentes com a apelante não é determinante para afastar sua condenação pelo crime de organização criminosa, uma vez que este delito se configura pela simples integração à organização, independentemente da prática de outros crimes. Trata-se de crime autônomo, cuja consumação independe da prática dos crimes-fim da organização. Quanto à alegação de que seu estabelecimento se chamaria "Toa Toa Bar" e não "Kelly Bar", observo que a própria apelante reconhece ser conhecida pelo apelido de "Keli", o que corrobora a identificação feita pelos investigadores. A divergência quanto ao nome exato do estabelecimento não é suficiente para afastar as demais evidências que apontam para o envolvimento da ré com a organização criminosa. No que se refere à argumentação de que não possui CNH, de fato houve um equívoco na documentação policial, pois o endereço foi verificado no Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo de sua motocicleta, e não em uma CNH. No entanto, esse equívoco não compromete a conclusão quanto à identidade entre o endereço do estabelecimento investigado e o endereço vinculado à apelante. Destarte, o conjunto probatório é robusto e coeso, revelando que a apelante integrava a organização criminosa denominada "Comando Vermelho" na condição de "lojista", pagando taxa mensal para poder comercializar entorpecentes em seu estabelecimento comercial. Nesse sentido, é o entendimento consolidado deste Tribunal de Justiça: "Demonstradas a materialidade do crime e a autoria dos acusados por meio de interceptações telefônicas, relatórios policiais e depoimentos testemunhais prestados em juízo, descabe o acolhimento do pleito absolutório. Evidenciado nos autos que o grupo criminoso é constituído por mais de quatro pessoas, possui uma estrutura hierárquica ordenada e complexa, com divisão de tarefas e cuja finalidade é a obtenção de vantagem decorrente da prática de infrações penais cujas penas são superiores a quatro anos, fica configurado o delito de constituição de organização criminosa." (TJMT, Segunda Câmara Criminal, N.U 0005292-42.2018.8.11.0037, Rel. Des. Pedro Sakamoto, julgado em 25/10/2022). "Não há que se cogitar de absolvição do réu quanto à autoria do crime previsto no art. 2º, §2º, da Lei nº. 12.850/13, se a prova pericial, associada às provas orais colhida em Juízo, são capazes de demonstrar indene de dúvida que o réu integra o 'Comando Vermelho do Estado de Mato Grosso', conhecida organização criminosa estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, com objetivo de obter vantagem mediante a prática de infrações penais diversas, havendo efetivo vínculo organizacional." (TJMT, N.U 1001135-40.2021.8.11.0025). Assim, tendo em vista o conjunto probatório consistente e o entendimento jurisprudencial consolidado, não há como acolher a tese defensiva de insuficiência probatória. Diante do exposto, em consonância com o parecer ministerial, DESPROVEJO o recurso de apelação interposto, mantendo integralmente a sentença condenatória. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025

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