Processo nº 5003361-88.2025.4.02.5102
ID: 272745146
Tribunal: TRF2
Órgão: 14ª Vara Federal do Rio de Janeiro
Classe: MANDADO DE SEGURANçA COLETIVO
Nº Processo: 5003361-88.2025.4.02.5102
Data de Disponibilização:
26/05/2025
Polo Passivo:
Advogados:
LUIZ GUILHERME OUROFINO IRINEU RODRIGUES
OAB/RJ XXXXXX
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MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO Nº 5003361-88.2025.4.02.5102/RJ
IMPETRANTE
: ASSOCIACAO BRASILEIRA DE BARES E RESTAURANTES REGIONAL - ABRASEL NIT/LAGOS
ADVOGADO(A)
: LUIZ GUILHERME OUROFINO IRINEU ROD…
MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO Nº 5003361-88.2025.4.02.5102/RJ
IMPETRANTE
: ASSOCIACAO BRASILEIRA DE BARES E RESTAURANTES REGIONAL - ABRASEL NIT/LAGOS
ADVOGADO(A)
: LUIZ GUILHERME OUROFINO IRINEU RODRIGUES (OAB RJ112249)
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de Mandado de Segurança Coletivo impetrado por
ASSOCIACAO BRASILEIRA DE BARES E RESTAURANTES REGIONAL - ABRASEL NIT/LAGOS
em face de
DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - UNIÃO - FAZENDA NACIONAL - CABO FRIO, UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM MACAÉ - RJ - UNIÃO - FAZENDA NACIONAL - MACAÉ e DELEGADO REGIONAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - UNIÃO - FAZENDA NACIONAL - NITERÓI
, objetivando "
a concessão de medida liminar, nos termos do art. 7º, III, da Lei 12.016/2009, para determinar à autoridade coatora que se abstenha de aplicar os efeitos do ADE RFB nº 02/2025 em relação aos associados da Impetrante regularmente habilitados no PERSE, mantendo a aplicação da alíquota zero para IRPJ, CSLL, PIS e COFINS até o prazo final de 60 (sessenta) meses, contado de março de 2022
" (
1.1
).
Expõe a impetrante que "
os associados da Abrasel, em sua totalidade, exercem as suas atividades no segmento de alimentação fora do lar, incluindo bares, restaurantes, lanchonetes, restaurantes industriais e de refeições coletivas, casas noturnas, estabelecimentos com atividades conexas e instituições afins, comprovadamente ligadas ao setor, abrangendo as cidades de Niterói, São Gonçalo, Itaboraí, Maricá, Saquarema, Rio Bonito, Tanguá, Araruama, Iguaba, São Pedro da Aldeia, Arraial do Cabo, Cabo Frio, Armação de Búzios, Silva Jardim, Casimiro de Abreu e Rio das Ostras
".
Relata que "
como é de conhecimento público muitos associados da Impetrante (bares e restaurantes) sofreram impactos significativos em decorrência das restrições impostas durante a pandemia da COVID-19. Ocorreu que com o objetivo de amenizar os efeitos econômicos dessa crise, em sinal de sensibilidade do Congresso Nacional e do governo vigente à época, foi criado o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE), o que se deu por meio da Lei nº 14.148/20213 , permitindo que muitos dos associados da Impetrante passassem a usufruir da alíquota zero dos tributos IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, pelo prazo estabelecido de 60 (sessenta) meses, com início em março de 2022
".
Alega que "
tudo corria bem até que a Lei nº 14.859/2024, de 14/05/2024, foi editada alterando as regras do PERSE, e estabelecendo um limite financeiro global de R$ 15 bilhões para o total de benefícios fiscais. 4 No ano corrente, a Receita Federal do Brasil, por meio do Ato Declaratório Executivo RFB nº 2/2025, publicado em 24 de março de 2025, declarou extinto o PERSE a partir de abril de 20255 , com base no suposto atingimento do limite de R$ 15 bilhões previsto no art. 4º-A da lei
".
Sustenta que "
o Ato Declaratório Executivo (ADE) RFB nº 02/2025, ao comunicar o alegado esgotamento do teto financeiro global fixado pela Lei nº 14.859/2024 e, com base nisso, impor de forma imediata a EXTINÇÃO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS relacionados ao PERSE, atua em evidente desvio de finalidade. Tal conduta representa clara extrapolação de sua função administrativa, traduzindo-se em indevida invasão da esfera de competência do Poder Legislativo, além de afrontar o princípio da legalidade em matéria tributária
".
Argumenta que "
ainda que se admita, para fins argumentativos, a validade do limite financeiro global introduzido pela Lei nº 14.859/2024, não é possível que tal restrição seja operacionalizada mediante instrumento infralegal, especialmente quando isso implica a supressão de direitos adquiridos sob a égide de norma anterior mais benéfica. Agrava-se esse cenário quando se constata que a cessação dos benefícios não decorre de comando legal expresso, mas sim de interpretação subjetiva e discricionária da própria autoridade administrativa
".
Assevera que "
ao efetivar a interrupção de incentivos fiscais garantidos legalmente, o ADE nº 02/2025: (i) excede os limites de sua natureza jurídica declaratória; (ii) interfere indevidamente em matéria reservada ao Legislativo; (iii) viola a legalidade tributária consagrada no art. 150, inciso I, da Constituição Federal; e (iv) compromete direitos adquiridos e princípios basilares como o da segurança jurídica e da proteção à confiança legítima
".
Aduz que "
o relatório bimestral que serve de base para o referido ADE, ao alegar o atingimento do teto financeiro de R$ 15 bilhões, adota critérios de apuração extremamente controversos, incluindo na estimativa valores referentes a tributos cuja exigibilidade está suspensa por decisões judiciais ainda pendentes de trânsito em julgado. Tal metodologia artificialmente inflaciona o montante contabilizado como “renúncia fiscal”, comprometendo a validade do fundamento utilizado para restringir os benefícios
".
Alude à vedação à revogação antecipada de benefício fiscal concedido por prazo certo e sob condições específicas, e invoca o enunciado da Súmula 544 do STF.
Acrescenta que "
a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal reconhece que, embora haja distinções técnicas entre isenção e alíquota zero, os efeitos práticos — desoneração do contribuinte — são equivalentes, motivo pelo qual é legítima a aplicação analógica da proteção prevista no art. 178 do CTN a ambos os casos. No julgamento do RE nº 475.551/PR, o STF deixou claro que “embora a isenção e a alíquota zero tenham naturezas jurídicas diferentes, a consequência é a mesma, em razão da desoneração do tributo”, consolidando o entendimento de que não se pode suprimir tais benefícios de forma unilateral e prematura quando concedidos por prazo certo e sob condições definidas
".
Sustenta, também a necessária observância aos princípios da anterioridade tributária.
A União informou interesse em ingressar no feito e manifestou-se no evento
3.1
. Suscitou, inicialmente, a ausência de requisitos para a concessão do pedido liminar.
Sustenta que "
é imperiosa a extinção do benefício fiscal a partir do mês seguinte àquele em que a Receita Federal demonstra, em audiência pública do Congresso Nacional, que o custo fiscal acumulado atingiu o limite fixado, o que ocorreu em 12 de março de 2025
".
Argumenta que "
é perfeitamente legítima a opção do legislador de estabelecer o limite da renúncia de receita na própria lei instituidora do benefício fiscal, de forma transparente e impessoal, zelando pela gestão fiscal responsável e pelo equilíbrio da atividade financeira estatal
".
Aduz que "
é preciso advertir que não foi o ADE/RFB nº 2/2025 que extinguiu o PERSE. É completamente errado afirmar que o indigitado ato infralegal tenha sido o responsável pela extinção de qualquer direito adquirido pelo contribuinte
".
É o relatório do necessário. Decido.
Processo de competência territorial da
Subseção Judiciária de Niterói
recebido neste juízo por equalização, nos termos dos artigos 33 e seguintes da Resolução nº
TRF2-RSP-2024/00055
(ev. 2).
Inicialmente, quanto à legitimidade ativa para impetração do Mandado de Segurança Coletivo, o art. 5º, LXX, 'b' da Constituição Federal preconiza que o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por "
organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados"
.
No mesmo sentido, o art. 21 da Lei 12.016/09 prevê que o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por associação legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial.
No caso, conforme estatuto social juntado no evento
1.2
, a ASSOCIACAO BRASILEIRA DE BARES E RESTAURANTES REGIONAL - ABRASEL NIT/LAGOS está constituída há mais de 1 (um) ano.
Assim, atendido o disposto no art. 5º, LXX, 'b' da Constituição Federal, aprecio o pedido liminar.
A concessão de medida liminar em sede mandamental exige a presença, concomitante, de fundamento relevante da alegação apresentada (
fumus boni iuris
) e que o ato impugnado possa tornar ineficaz o provimento jurisdicional final pleiteado (
periculum in mora
) consoante os termos do art. 7º, III, da Lei 12.016/09.
A Lei nº 14.148/2021, que instituiu o Programa de Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), assim dispôs quanto àqueles que são elegíveis a integrar o aludido programa fiscal, com nossos destaques:
Lei nº 14.148/2021
"Art. 2º Fica instituído o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse),
com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos possa mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública
reconhecido pelo
Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020
.
§ 1º Para os efeitos desta Lei,
consideram-se pertencentes ao setor de eventos as pessoas jurídicas, inclusive entidades sem fins lucrativos, que exercem as seguintes atividades econômicas, direta ou indiretamente
:
I - realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos;
II - hotelaria em geral;
III - administração de salas de exibição cinematográfica; e
IV - prestação de serviços turísticos, conforme o
art. 21 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.
§ 2º
Ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos referida no § 1º deste artigo
."
Em consonância com o disposto no § 2º do art. 2º da Lei nº 14.148/2021, foi editada a Portaria ME nº 7.163/21, que definiu os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (“CNAE”) considerados como "
setor de eventos"
para fins de enquadramento no referido Programa, tendo sido classificados em dois Anexos distintos.
Veja-se:
Portaria ME nº 7.163/21
"O MINISTRO DE ESTADO DA ECONOMIA, no uso da atribuição que lhe confere o inciso II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e tendo em vista o disposto no § 2º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, , resolve:
Art. 1º Definir os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE que se consideram setor de eventos nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, na forma dos Anexos I e II.
§ 1º As pessoas jurídicas, inclusive as entidades sem fins lucrativos, que já exerciam, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, as atividades econômicas relacionadas no Anexo I a esta Portaria se enquadram no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos - Perse.
§ 2º As pessoas jurídicas que exercem as atividades econômicas relacionadas no Anexo II a esta Portaria poderão se enquadrar no Perse desde que, na data de publicação da Lei nº 14.148, de 2021, sua inscrição já estivesse em situação regular no Cadastur, nos termos do art. 21 e do art. 22 da Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008.
Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação"
Posteriormente, a Lei nº 14.592/2023 foi editada alterando a Lei nº 14.148/2021 nos seguintes termos:
Lei 14.592/2023
:
Art. 1º O art. 4º da
Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021,
passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 4º
Ficam reduzidas a 0% (zero por cento) pelo prazo de 60 (sessenta) meses, contado do início da produção de efeitos desta Lei, as alíquotas dos seguintes tributos, incidentes sobre o resultado auferido pelas pessoas jurídicas pertencentes ao setor de eventos abrangendo as seguintes atividades econômicas, com os respectivos códigos da CNAE:
hotéis (5510-8/01); apart-hotéis (5510-8/02); albergues, exceto assistenciais (5590-6/01); campings (5590-6/02), pensões (alojamento) (5590-6/03); outros alojamentos não especificados anteriormente (5590-6/99); serviços de alimentação para eventos e recepções - bufê (5620-1/02); produtora de filmes para publicidade (5911-1/02); atividades de exibição cinematográfica (5914-6/00); criação de estandes para feiras e exposições (7319-0/01); atividades de produção de fotografias, exceto aérea e submarina (7420-0/01); filmagem de festas e eventos (7420-0/04); agenciamento de profissionais para atividades esportivas, culturais e artísticas (7490-1/05); aluguel de equipamentos recreativos e esportivos (7721-7/00); aluguel de palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário, exceto andaimes (7739-0/03); serviços de reservas e outros serviços de turismo não especificados anteriormente (7990-2/00); serviços de organização de feiras, congressos, exposições e festas (8230-0/01); casas de festas e eventos (8230-0/02); produção teatral (9001-9/01); produção musical (9001-9/02); produção de espetáculos de dança (9001-9/03); produção de espetáculos circenses, de marionetes e similares (9001-9/04); atividades de sonorização e de iluminação (9001-9/06); artes cênicas, espetáculos e atividades complementares não especificadas anteriormente (9001-9/99); gestão de espaços para artes cênicas, espetáculos e outras atividades artísticas (9003-5/00); produção e promoção de eventos esportivos (9319-1/01); discotecas, danceterias, salões de dança e similares (9329-8/01); serviço de transporte de passageiros - locação de automóveis com motorista (4923-0/02); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, municipal (4929-9/01); transporte rodoviário coletivo de passageiros, sob regime de fretamento, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/02); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, municipal (4929-9/03); organização de excursões em veículos rodoviários próprios, intermunicipal, interestadual e internacional (4929-9/04); transporte marítimo de cabotagem - passageiros (5011-4/02); transporte marítimo de longo curso - passageiros (5012-2/02); transporte aquaviário para passeios turísticos (5099-8/01); restaurantes e similares (5611-2/01); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, sem entretenimento (5611-2/04); bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento (5611-2/05); agências de viagem (7911-2/00); operadores turísticos (7912-1/00); atividades de museus e de exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares (9102-3/01); atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental (9103-1/00); parques de diversão e parques temáticos (9321-2/00); atividades de organizações associativas ligadas à cultura e à arte (9493-6/00):
Em seguida foi publicada a Lei nº 14.859/2024 inseriu na Lei nº 14.148/2021 os artigos 4º-A e 4ºB que previram um limite máximo de custo para o benefício fiscal de R$ 15.000.000.000,00 (quinze bilhões de reais) e o condicionamento à habilitação prévia, veja-se:
Lei 14.859/2024:
Art. 1º A
Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021
, passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 4º-A
.
O benefício fiscal estabelecido no art. 4º terá o seu custo fiscal de gasto tributário fixado, nos meses de abril de 2024 a dezembro de 2026, no valor máximo de R$ 15.000.000.000,00 (quinze bilhões de reais),
o qual será demonstrado pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil em relatórios bimestrais de acompanhamento, contendo exclusivamente os valores da redução dos tributos das pessoas jurídicas de que trata o art. 4º que foram consideradas habilitadas na forma do art. 4º-B desta Lei, com desagregação dos valores por item da CNAE e por forma de apuração da base de cálculo do IRPJ, sendo discriminados no relatório os valores de redução de tributos que sejam objeto de discussão judicial não transitada em julgado, ficando o benefício fiscal extinto a partir do mês subsequente àquele em que for demonstrado pelo Poder Executivo em audiência pública do Congresso Nacional que o custo fiscal acumulado atingiu o limite fixado.”
“Art. 4º-B.
A fruição do benefício fiscal previsto no art. 4º desta Lei é condicionada à habilitação prévia, no prazo de 60 (sessenta) dias a contar da regulamentação deste artigo, restrita exclusivamente à apresentação, por plataforma eletrônica automatizada da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, dos atos constitutivos e respectivas alterações.
§ 1º As pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real ou no lucro arbitrado informarão, no procedimento de habilitação prévia de que trata o caput deste artigo, se, durante a vigência do Perse, farão uso:
I - de prejuízos fiscais acumulados, de base de cálculo negativa da CSLL e do desconto de créditos da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins em relação a bens e serviços utilizados como insumo nas aquisições de bens, de direitos ou de serviços para auferir receitas ou resultados das atividades do setor de eventos; ou
II - da redução de alíquotas de que trata o art. 4º desta Lei.
§ 2º A habilitação posterior não impede a aplicação do benefício fiscal sobre períodos anteriores.
§ 3º Transcorrido o prazo de 30 (trinta) dias após o pedido de habilitação da pessoa jurídica sem que tenha havido a manifestação da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, a pessoa jurídica será considerada habilitada para a fruição do benefício fiscal enquanto ele perdurar.
§ 4º Observado o direito à ampla defesa e ao contraditório, a habilitação será:
I - indeferida, na hipótese de a pessoa jurídica não atender aos requisitos previstos no art. 4º desta Lei; ou
II - cancelada, na hipótese de a pessoa jurídica deixar de atender aos mesmos requisitos.
[...]
Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 22 de maio de 2024; 203º da Independência e 136
o
da República.” (g.n.)
No caso concreto, a impetrante se insurge contra a revogação dos benefícios regulamentados pela Lei 14.148/21 (Lei do PERSE).
A RFB – Receita Federal do Brasil, por meio do Ato Declaratório Executivo RFB nº 2/2025
1
, extinguiu os benefícios oriundo do PERSE, em razão de ter atingido o teto de R$ 15.000.000.000,00 (quinze bilhões de reais), custo fiscal máximo do Governo Federal para o benefício e a impetrante alega que a revogação do benefício foi efetivada sem respeitar qualquer princípio constitucional referente à segurança jurídica, confiança, boa-fé objetiva da Administração Pública, anterioridade, dentre outros.
Com relação à possibilidade de revogação do benefício fiscal, assim dispõe o art. 178 do CTN:
"Art. 178 -
A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo
, observado o disposto no inciso III do art. 104.
(Redação dada pela Lei Complementar nº 24, de 1975)
" (g.n.)
Para alcançar a correta aplicação do art. 178 do CTN, é preciso compreender quais condições seriam essas que tornaria a isenção insuscetível de ser revogada ou modificada a qualquer tempo.
No caso, conforme dispõe o art. 2º da Lei nº 14.148/21, o PERSE foi instituído com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos pudesse mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública em decorrência da pandemia de Covid-19. Em outras palavras, tratou-se de iniciativa do governo federal voltada à desoneração fiscal, com o propósito de atenuar os impactos econômicos enfrentados pelo setor de turismo, sem a imposição de contrapartidas às empresas beneficiadas.
O enunciado da Súmula 544 do STF definiu que, apenas as
"isenções tributárias concedidas, sob condição onerosa, não podem ser livremente suprimidas".
Esse entendimento afastaria o alegado direito da empresa impetrante, pois a isenção concedida pelo PERSE não trouxe condição onerosa.
Observadas essas considerações, coaduno do entendimento de que a fruição dos benefícios fiscais do PERSE pelos contribuintes, justamente porque não condicionada a qualquer contraprestação por parte deles, configura hipótese de desoneração não onerosa. Por esse motivo, podem ser validamente reduzidos ou suprimidos por lei, a qualquer tempo, sem que se possa cogitar de direito adquirido à sua manutenção, ou de ofensa ao art. 178 do CTN pela sua extinção, após ter sido atingido o teto de R$ 15 bilhões previsto no art. 4º-A da Lei nº 14.148/2021.
A respeito da natureza não onerosa do PERSE, cito os seguintes julgados:
"AGRAVO INTERNO CONTRA DECISÃO MONOCRÁTICA– HIPÓTESE DE APLICAÇÃO DO ARTIGO 932 DO CPC – MANDADO DE SEGURANÇA – BENEFÍCIOS TRIBUTÁRIOSPREVISTOS NO PROGRAMA EMERGENCIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS - PERSE - LEI Nº 14.148/2021 - MP Nº 1.202/2023 - POSSIBILIDADE DE REVOGAÇÃO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS- AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. O mandado de segurança é meio processual destinado à proteção de direito dito líquido e certo da parte impetrante, aferível de imediato. 2. Dos termos da Lei nº 14.148/2021, extrai-se que,
muito embora o benefício fiscal do PERSE tenha sido concedido por prazo determinado
,
não houve a imposição de condição onerosa ao contribuinte
. 3. A condição onerosa mencionada pelo CTN, a qual ensejaria a irrevogabilidade do benefício, relaciona-se à contrapartida por parte contribuinte. Entretanto,
a norma instituidora do PERSE previu como requisito para a obtenção da isenção o desempenho de determinadas atividades no setor de eventos
,
o que não se confunde com a imposição de ônus para as partes
. 4. Observa-se da leitura dos termos da Medida Provisória impugnada a observância ao princípio da anterioridade. 5.Agravo interno improvido." (g.n.) (TRF-3, AC 5007142-41.2024.4.03.6100, Sexta Turma, Rel. Min. Des. Fed. Mairan Gonçalves Maia Júnior, julgado em 06/03/2025)
"
TRIBUTÁRIO. PROGRAMA ESPECIAL DE RETOMADA DO SETOR DE EVENTOS - PERSE. REVOGAÇÃO. 1. O
PERSE consubstancia desoneração legítima, fundada em razões sociais e econômicas, atreladas às dificuldades financeiras enfrentadas pelo setor do turismo no período da pandemia da COVID-19
.
Por não exigir contrapartidas
,
não constitui isenção onerosa
, insuscetível de revogação a qualquer tempo por força do princípio da segurança jurídica e da interpretação a contrário sensu do art. 178 do Código Tributário Nacional. 2.
Aplica-se-lhe, portanto, a regra da revogabilidade a qualquer tempo das isenções
, consagrada diretamente por este dispositivo da codificação tributária
". (g.n.) (TRF-4, AC 5055994-13.2023.4.04.7100, Primeira Turma, Relator Juiz Federal Convocado Paulo Paim da Silva, julgado em 18/12/2024)
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. ALEGADO
DIREITO DE USUFRUIR DO PERSE
. PORTARIA ME Nº 7.163, DE 2021. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.147, DE 2022. INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 2.144, DE 2022. AUSÊNCIA DE PRÉVIA ANÁLISE DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA. DUVIDOSA ADMISSIBILIDADE DO MANDADO DE SEGURANÇA.
INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO A BENEFÍCIO FISCAL, QUE NÃO SE TRATA ADEMAIS DE ISENÇÃO ONEROSA
. COMPATIBILIDADE DA INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 2.114, DE 2022, COM A LEI Nº 14.148, DE 2021. RELEVÂNCIA DA FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA. LIMINAR INDEVIDA." (g.n.) (TRF4, AG 5014392-02.2023.4.04.0000, Segunda Turma, Relator Des. Fed. Rômulo Pizzolatti, , julgado em 18/07/2023)
No mesmo sentido, destaco ainda as decisões monocráticas, proferidas nos AI nº 5004385-34.2025.4.02.0000/RJ e AI nº 5004318-69.2025.4.02.0000/RJ, as quais rejeitaram a pretensão de contribuintes de gozo do benefício até fevereiro de 2027.
O Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário RE 147365 discutiu, à luz das previsões do artigo 150; II; "b"; e "c", da Constituição Federal, a possibilidade de aplicação do princípio de anterioridade tributária, geral e nonagesimal, em razão da revogação de regime tributário mais favorável ao contribuinte, fato que importa em majoração de alíquota e, consequentemente, do tributo em si. No RE 147365 foi reconhecida a Repercussão Geral e fixada a seguinte tese:
Tema 1383
“O princípio da anterioridade tributária, geral e nonagesimal, se aplica às hipóteses de redução ou de supressão de benefícios ou de incentivos fiscais que resultem em majoração indireta de tributos, observadas as determinações e as exceções constitucionais para cada tributo.”
Contudo, o limite máximo de custo para o benefício fiscal do PERSE foi fixado pela Lei nº 14.859 em 22.05.2024, assim, não há que se falar em violação aos princípios da segurança jurídica, confiança, boa-fé objetiva uma vez que é prevista a possibilidade de revogação ou modificação por lei a qualquer tempo nos termos do art. 178 do CTN, nem em relação à anterioridade anual e nonagesimal porquanto já superados o exercício financeiro do ano em que a lei foi publicada e o decurso de noventa dias desde a publicação da respectiva lei.
Assim, o Ato Declaratório Executivo RFB nº 2/2025 que indicou que o benefício fiscal estabelecido no art. 4º da Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021 - Lei do PERSE, foi extinto para os fatos geradores a partir do mês de abril de
2025
, em função do atingimento do limite de R$ 15.000.000.000,00 (quinze bilhões de reais) para o gasto tributário, conforme estabelecido no art. 4º-A da mesma lei, encontra respaldo nas normas e Jurisprudência atinentes ao caso, como acima demonstrado.
Não há extrapolação do caráter regulamentar do decreto, já que a limitação de custo para o benefício fiscal do PERSE foi fixada por ato do Poder Legislativo, a Lei nº 14.859 em 22.05.2024, e o Ato Declaratório Executivo RFB nº 2/2025 limitou-se a declarar o atingimento do limite do gasto tributário.
Igualmente não há direito adquirido à desoneração fiscal, a qual é concedida por liberalidade do Poder Legislativo.
De outro lado, não compete ao Poder Judiciário avaliar a adequação do critério para fixação do teto financeiro, sob pena de indevida ingerência nas competências dos Poderes Legislativo e Executivo.
Sob outro prisma, não se afigura consubstanciado, ao menos nessa análise perfunctória, o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo que pudesse justificar a concessão da liminar ora postulada.
Com efeito, tratando-se de matéria tributária, verifica-se, via de regra, que o perigo na demora natural da prestação jurisdicional somente ocorreria quando a parte autora demonstra concretamente que não pode arcar com a cobrança que se lhe impõe enquanto não proferido o provimento final, de modo que, acaso reconhecido seu direito, a medida seria realmente ineficaz, ante as consequências porventura advindas de seu inadimplemento.
Desta forma, o perigo da demora guarda intrínseca relação com a capacidade contributiva e somente se configura, repita-se, quando o contribuinte comprovadamente não tem condições econômicas de efetuar o recolhimento impugnado, o que não ocorre no presente caso.
De fato, não há que se cogitar de
ineficácia
da medida se a parte autora possui condições, visto que, se reconhecida ao final a procedência do pedido, poderá se valer da repetição de indébito ou da compensação tributária.
Nesse sentido, destaco:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPOSTO SOBRE A RENDA. CONVENÇÃO BRASIL-HOLANDA (DECRETO 355/91). APLICABILIDADE. REMESSA DE VALORES AO EXTERIOR PARA PAGAMENTO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS TÉCNICOS SEM A RETENÇÃO DO IRPJ NA FONTE. AUSÊNCIA DE PERICULUM IN MORA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (...) 17. Assim sendo, verifica-se a presença da verossimilhança nas alegações trazidas pelo impetrante, ora agravante.
Contudo, em regra, uma decisão judicial, somente produz seus efeitos após seu trânsito em julgado
. 18.
Excepcionalmente, admite-se a concessão de liminar ou antecipação da tutela de mérito, quando, além da plausibilidade do direito substancial deduzido na exordial, a antecipação se revelar imprescindível para evitar o perecimento do direito, que não pode, sem risco de dano irreparável ou de difícil reparação, a guardar a regular tramitação do devido processo legal
. 19.
Ao devedor, que se verá compelido ao pagamento dos encargos de mora, cujos efeitos podem se tornar extremamente excessivos caso a liminar posteriormente revista se protraia de modo prolongado no tempo, e ao credor, ao retirar-lhe os meios legais de cobrança de eventual débito, sem a exigência de qualquer garantia idônea em caso de posterior reforma da tutela precária
. 20.
Em conclusão, verifica-se, na hipótese em tela, não ser possível afirmar, de plano, que a exação tributária, ora em questionamento, seja de grandeza tal que venha a configurar risco de dano irreparável ou difícil reparação à ora agravante ou à prestadora holandesa (FULGRO MARINES SERVICES B.V. FULGRO MARINES), requisito indispensável à atribuição de efeitos imediatos à tutela jurisdicional que antecipa o provimento final pretendido (art. 7º, II, da Lei 1 2.016/2009)
. 21. De mais a mais, este Tribunal Regional Federal da 2ª Região tem posicionamento consolidado no sentido de que a reforma de decisão judicial, por meio de agravo de instrumento, somente deverá ocorrer quando o juiz der à lei interpretação teratológica, fora da razoabilidade jurídica, ou quando o ato se apresentar flagrantemente ilegal, ilegítimo ou abusivo, o que não é o caso. 2 Agravo de instrumento desprovido.” (grifos nossos) (AG 00030553920154020000, DESEMBARGADOR FEDERAL FERREIRA NEVES, TRF2 – 4ª TURMA ESPECIALIZADA, DATA DA DECISÃO: 17/06/2016, DATA DA PUBLICAÇÃO: 23/06/2016)
No caso concreto, ao menos por ora, além de ausente a probabilidade do direito invocado, não se sustenta a alegação genérica de que "
a ameaça de cobrança imediata dos tributos IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, a partir de abril de 2025, em decorrência da interpretação unilateral da Receita Federal sobre o suposto esgotamento do limite fiscal, constitui risco concreto e iminente de grave lesão aos direitos dos associados da Impetrante
"
, não se justificando a preterição do princípio do contraditório, consagrado na Constituição Federal, o que acarreta a necessidade de justificativa robusta para o seu descumprimento.
Ademais, nem a possibilidade de autuação fiscal pela eventual falta do recolhimento tributário se revela suficiente, na medida em que o agente administrativo atua de forma vinculada e, assim, sempre haveria o
periculum in mora
nas hipóteses de discussão da legalidade de determinada exação, independentemente do caso concreto trazido a juízo.
Por todo o exposto,
INDEFIRO A LIMINAR
requerida.
Notifiquem-se
, com urgência, a autoridade impetrada e o órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada para ciência e oferecimento de informações, nos termos do art. 7º, I e II da Lei nº 12.016/2009.
Vinda a resposta da autoridade impetrada,
dê-se vista ao MPF
para os fins do art. 12 da Lei nº 12.016/2009.
Tudo cumprido,
retornem os autos conclusos para sentença.
1. https://normasinternet2.receita.fazenda.gov.br/#/consulta/externa/143375
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